Cátia Dias vivia a vida ao extremo. Depois de se li cenciar em Direito, aos 21 anos, co- meçou a trabalhar e continuou a es- tudar. Fez o mestrado e tirou um executive masterem Gestão. Até nas férias levava o portátil para respon der a emails de clientes. "Nunca tirei um dia de lerias pleno", admite à SÁBADO a advogada e gestora de empresas. Em 2015 teve um bebe, mas não abrandou o ritmo: "Não era o tipo de pessoa que queria estar em casa a cuidar do filho," Acordava às 6h30. deixava a criança na ama. vol- tava para jantar às 21h e trabalhava, muitas vezes até às 4h. Ao fim de três anos chegou ao limite. "Estava muito cansada, tinha olheiras enormes e até sentia falta de ar quando ia à pla- taforma Citlus ver o andamento dos processos judiciais." Teve de parar. Cerca de metade dos trabalhadores portugueses jã sentiram o mesmo. Segundo o instituto de investigação c Intervenção cm Saúde Ocupacio- nal, que há 10 anos realiza um baró metro com base nas respostas de 50 mil pessoas, entre 47% e 50% dos trabalhadores tiveram sintomas de exaustão. Entre estes incluem-se problemas de sonQ-=^^^Mlidade. fa-* alterações no apetite, pessimismo c depressão. "A perturbação do soncrr~ quando a noite não serve para repor a energia gasta, é um dos primeiros sinais", explica o psicólogo e respon- sável pelo instituto |oão Paulo Perei ra. Os grandes grupos de risco são os trabalhadores da saúde e da educa ção. "Mas há um aumento da exposi- ção ao risco na [área da ] justiça." O cansaço extremo físico e emo- cional pode ser evitado quando há realização profissional. "Mas as pes- soas não se sentem reconhecidas eo sistema não permite parar para pen- sar", diz João Paulo Pereira. "É por isso que somos o pajsffifflKj^^^ mais ans\o\Mmst&/mÈÊÊÊÊÉÊb Dafcde cabeça, insoniasrfespostas agressivas, desmotivação e uma fadigcKmiensa. Se reconhece estè>sintoma§< porque está a sofrer cte stress crónico e vai precisarde ajuda>porsusanaLúdo O As mulheres estão mais sujeitas a sofrer de exaustão emocional CERCA DE 47 A 50% DOS TRABALHA- DORES PORTUGUE- SES JÁ TIVERAM
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Transcript
CátiaDias vivia a
vida ao extremo.
Depois de se li
cenciar em Direito,
aos 21 anos, co-
meçou a trabalhar
e continuou a es-tudar. Fez o mestrado e tirou umexecutive masterem Gestão. Até nasférias levava o portátil para responder a emails de clientes. "Nunca tirei
um dia de lerias pleno", admite àSÁBADO a advogada e gestora de
empresas. Em 2015 teve um bebe,
mas não abrandou o ritmo: "Não erao tipo de pessoa que queria estar emcasa a cuidar do filho," Acordava às
6h30. deixava a criança na ama. vol-
tava para jantar às 21h e trabalhava,muitas vezes até às 4h. Ao fim de três
anos chegou ao limite. "Estava muito
cansada, tinha olheiras enormes e
até sentia falta de ar quando ia à pla-taforma Citlus ver o andamento dos
processos judiciais." Teve de parar.Cerca de metade dos trabalhadores
portugueses jã sentiram o mesmo.
Segundo o instituto de investigaçãoc Intervenção cm Saúde Ocupacio-nal, que há 10 anos realiza um baró
metro com base nas respostas de 50mil pessoas, entre 47% e 50% dos
trabalhadores tiveram sintomas deexaustão. Entre estes incluem-se
problemas de sonQ-=^^^Mlidade. fa-*
alterações no apetite, pessimismo c
depressão. "A perturbação do soncrr~
quando a noite não serve para repora energia gasta, é um dos primeirossinais", explica o psicólogo e respon-sável pelo instituto |oão Paulo Pereira. Os grandes grupos de risco são os
trabalhadores da saúde e da educa
ção. "Mas há um aumento da exposi-ção ao risco na [área da ] justiça."
O cansaço extremo físico e emo-cional pode ser evitado quando há
realização profissional. "Mas as pes-soas não se sentem reconhecidas e o
sistema não permite parar para pen-sar", diz João Paulo Pereira. "É porisso que somos o pajsffifflKj^^^mais ans\o\Mmst&/mÈÊÊÊÊÉÊb
Dafcde cabeça, insoniasrfespostas agressivas, desmotivação e umafadigcKmiensa. Se reconhece estè>sintoma§< porque está a sofrer
cte stress crónico e vai precisarde ajuda>porsusanaLúdo
OAs mulheresestão maissujeitas a sofrerde exaustãoemocional
CERCA DE 47A 50% DOSTRABALHA-
DORESPORTUGUE-
SES JÁTIVERAM
O 2017 foram vendidos 10,6 milhõesde embalagens desres medicamen-tos usados para reduzir a ansiedadee 8,4 milhões de antidepressivosquase o dobro da média europeia.
Parte do problema é o número de
horas passadas no trabalho. Em2017, foram 1.718 horas por ano, se-
gundo a Organização para a Coope-ração e Desenvolvimento Económi-co (OCDE). Longe do que acontecena Alemanha, onde cada trabalhadortrabalha 1.35 Ghoras por ano.
As mulheres estão mais sujeitas a
atingir o limite porque, para além da
profissão, acumulam a maioria dastarefas domésticas. Segundo o estu-do da Fundação Manuel dos Santos
As Mulheres em Portugal Hoje, pu-blicado em fevereiro, 10% admitemsentirem-se esgotadas - destas 47%
preferiam trabalhar se não precisas-sem do dinheiro.
O problema pode surgir em várias
fases da vida, mas há estratégias
para o evitar. Requer bons hábitos de
sono, uma alimentação equilibrada e
exercício físico regular. Mas, acimade tudo, exige disciplina em estabe-lecer períodos bem definidos para otrabalho e para o lazer.
O O cansaço intenso pode instalar-
-se logo nos primeiros anos de facul-dade. E ainda antes. "Tenho encon-trado adolescentes com 14 anos comeste cansaço extremo, por não sabe-
rem lidar com o stress e a frustra-
ção", diz a psicóloga clínica BárbaraRamos Dias. A origem está na pres-são exercida pelos pais e por eles
próprios para que tenham um de-sempenho excelente. Isto aliado às
horas passadas na escola e a estudar
pode originar ansiedade de desem-
penho. As redes sociais, onde os
amigos parecem conseguir tudo,também não ajudam. "Pode induzirna crença de que não são bons o su-ficiente. Isto pode levar à frustração,diminuição de autoestima e auto-
confiança, sintomas depressivos,
apatia, ansiedade que os pode impe-dir de agir", explica a psicóloga.
Na faculdade a pressão é aindamaior. "Os jovens chegam até nós
em fim de linha", conta a psicotera-
peuta Andreia Cavaca que prestaapoio psicológico no instituto Supe-rior de Educação e Ciências. "Vêm
com dores de cabeça, tonturas, ficamansiosos na viagem ate à faculdade,sentem falta de ar, não conseguemestudar e aos poucos instala-se um
esgotamento físico e emocional." Aexaustão traduz-se em tristeza, insa-
tisfação e dificuldade em interagir.
Alguns pensam mesmo cm desistir
do curso. "Sentem que lhes pedemmais do que eles conseguem dar."
Os alunos de cursos intensivos,como Medicina, correm mais riscos.
E há tipos de personalidade mais
propícias a atingir o limite. "Os estu-dantes que associam a sua autoesti-ma ao desempenho académico es
tão mais propensos a estes sinto-mas", diz Bárbara Ramos Dias.
Foi o caso de Ana Bárbara. Perfec-cionista e melhor aluna no secundá-
rio, a então estudante de Psicologiada Universidade de Lisboa começoua sentir-se desmotivada e deprimidano terceiro ano de faculdade. "Sentia
que não era boa o suficiente, que es-tava sempre atrasada nos trabalhos",conta. As notas eram médias - 14 e15 valores -. mas não eram o que
OCátia Dias recorreà meditação eao ioga para lidarcom o stress
ALGUNSESTUDANTESFICAM DES-MOTIVADOS
E PENSAMEM DESISTIRDOS CURSOS
sonhara. "Nem me apetecia estudar."
O volume de trabalhos pedidostambém aumentou. "Acho que na es-cola havia mais apoio dos professores.Na faculdade estamos mais sozinhos
e isso causou-me ansiedade", diz.
Recorreu a uma psicóloga: "Apren-di técnicas de respiração para controlar a ansiedade e a controlar as
expectativas, a torná-las mais realis-tas." Também usou o mindfulness,uma técnica de redução de stress
que inclui a meditação. "Quando co-meço a pensar que não vou conse-
guir, foco-me no presente, no queme rodeia e isso acalma-me."
Ao contrário de Ana Bárbara - quese licenciou o ano passado e fez umestágio na Universidade de Man-chester - a maioria dos jovens temdificuldade em assumir o problemae, muitas vezes, acaba por mentiraos pais e amigos sobre como está acorrer o curso. "Há quem recorra a
estupefacientes para lidar com o
cansaço, mas isso nãó resolve", diz a
psicoterapeuta Andreia Cavaca. Outros deixam de conseguir entrar nafaculdade ou até de sair de casa.
A solução c difícil de aplicar. "Temde se parar para pensar e recons
truir." E isso não significa desistir do
curso. "Parar é ter um espaço de
reflexão onde se analisa o passado
para perceber como se chegou àquele ponto", salienta Andreia Cavaca.
A ANSIEDADE DQPRIMEIRO EMPREGOO Há estudantes que encontram es-
tratégias para lidar com o stress no
curso e sentem dificuldades nos pri-meiros anos no mercado de traba-lho. Foi o caso de Margarida (nome
fictício), médica interna, de 29 anos.
"Quando se faz aquilo de que se gos-ta, não pensamos que isso nos podedeixar doentes", diz à SÁBADO. Amédica pensava que era uma resi-liente, mas no primeiro ano no servi-
ço de oncologia, não conseguiu
cumprir tudo o que lhe era pedido:as consultas externas, as visitas aosdoentes internados, as urgências, o
hospital de dia. "Lidamos com doen-tes muito vulneráveis que exigematenção, mas estamos constante-mente a contar o tempo. Rapida-mente passam os 20 minutos estipu-lados para a consulta." Eram muitosos dias em que entrava no hospitalde manhã cedo e saía à noite.
Depois, havia ainda o trabalho nãoassistencial: preparar relatórios,
atualizações de protocolo do serviço,ler estudos e preparar casos médicos
para apresentar. Em troca, poucorecebia. "Não há frustração maior
quando nos dedicamos até ao limitee o trabalho não é reconhecido", diz.
Ao fim de poucos meses surgiramos primeiros sintomas: "Tinha tre-mores e taquicardia quando ia parao hospital e chorava facilmente nos
corredores." Sofria de insónias e
acordava cansada. "Cheguei a dor-mir 20 horas seguidas no fim de se-mana." Mal comia, muitas vezes umasandes ao almoço e um copo de leite
ao jantar. "Não tinha energia paracozinhar, só queria ir para a cama."
O cérebro diminui com ostressMargarida sentia que trabalhavade forma mais lenta e não conse-guia raciocinar. Um estudo publi-cado o ano passado na revista
Neurology, indica que o stress
crónico pode afetar a memória e
reduzir o tamanho do cérebro. In-vestigadores da Universidade de
Harvard avaliaram as capacidadescognitivas de 2.231 voluntários aolongo de oito anos e verificaram
que os que tinham níveis mais ele-vados da hormona do stress, corti-sol, tiveram resultados mais fracos
nos testes de memória e tinhamum volume cerebral mais reduzidodo que os que tinham valores decortisol normais.
Margarida continuou a trabalhar e
começou a isolar-se: "Ir ao ginásio
passou a ser um sacrifício e preferiaficar em casa a ir jantar com os ami-gos." Foram precisos seis meses paraganhar coragem e pedir ajuda. "As
pessoas pedem ajuda profissional,muitas vezes, por insistência dos
amigos e da família", esclarece apsiquiatra no Hospital CUF Porto,Telma Falcão de Almeida. "Há casos
que são indicados por entidades
patronais, mas ainda é raro."A exaustão afeta sobretudo profis-
sões sujeitas a muita pressão comomédicos, enfermeiros, assistentes
sociais e jornalistas. "Mas cada vez é
mais transversal", continua.
Margarida recorreu a uma psiquia-tra em 2017 que lhe receitou ansiolí-ticos e antidepressivos. "Numa fase
inicial melhorei, mas a fonte do
stress mantinha-se e fiquei cada vez
pior", recorda. Um ano depois, foi a
própria chefia a sugerir uma consulta
com a psiquiatra do serviço e a pro-por um período de descanso. Dia-gnóstico: bumout a síndrome de
exaustão física e emocional extrema.Só quando ficou em casa é que
teve noção da gravidade. "Voltei a
jogar às cartas, mas não conseguiapensar nas jogadas", diz. Entretantoestá a fazer terapia cognitivo-com-portamcntal em que tenta conhecer--se melhor: "A opinião que tinha demim própria não era correra." O
"CHEGUEI ADORMIR 20
HORASSEGUIDASAO FIM DESEMANA",
DIZMARGARIDA
Conheça os sintomasÉ difícil admitir que se estáem exaustão emocional
- Cansaço físico intenso:- Irritabilidade:- Crises de choro sem motivoaparente;- Dificuldades de concentração;- Perda de interesse e desmoti-
vação;- Pequenos esquecimentos;- Dores de cabeça e de costas;- Alterações gástricas;- Baixa autoestima.
OAndreia Cavaca
A psicóloga presta apoio a
estudantes universitários doInstituto Superior de Educação
e Ciências, em Lisboa
OInês Maia como filho Bernardo.A blogger foidiagnosticadacom esgotamentomaternal
GémeosCuidar
de dois bebésrecém-nascidos
levou SôniaSantos e o
marido, Hélder,à exaustão.Perceberam
quando come-
çaram a gritarum com o outro
O Agora procura viver o presente."O meu problema foi pôr o trabalhoacima de tudo, as prioridades dos
outros à frente das minhas. Tem de
existir um equilíbrio. Pequenas coi-sas como apanhar sol numa espla-nada no inverno ou fazer passeios de
bicicleta pelo parque são imprescindíveis para mim agora."
Margarida ainda não regressou ao
hospital. "Estou a preparar-me paravoltar, com vontade de trabalharmas reconhecendo os meus limites e
respeitando as minhas necessidades.
Para tratarmos dos outros precisamos de tratar de nós também."
Lidar com expectativasHá pessoas mais suscetíveis de se
esgotarem emocionalmentc. Catari-
na Nunes, de 25 anos, era ansiosa e
percebeu que tinha de pedir ajudaquando começou a acordar cansada.
"Não tinha vontade para fazer o que
quer que fosse" conta à SÁBADO.Os sintomas começaram em 2017
quando se mudou de Coimbra parao Porto. "Surgiu uma oportunidadede trabalho e aceitei", diz. Mas o
contrato acabou por não ser assina-do e Catarina bloqueou. "Não dor-mia bem. De manhã acordava e per-guntava-me: 'Vou levantar-me paraquê? Não tenho nada para fazer.'"
Sozinha, sem amigos, nem apoiofamiliar, passou dois meses isoladaantes de recorrer a uma psicóloga.
Fez um programa de detox emo-cional e durante três semanas, quasetodos os dias, realizou psicoterapia eexercícios de relaxamento. "Na
terapia tentei conhecer-memelhor, identifiquei as mi-nhas limitações e percebi o
caminho que posso to-mar." Mas primeiro pro-curou dormir melhor."Cerca de 90% a 95%das pessoas com pro-blemas emocionais
apresentam alterações
do sono", explica a psicóloga clínica
latir Schmitt.
No programa procura-se a causada insónia e trabalha-se a rotina e
o ambiente para que o sono seja
reparador. As principais queixassão cansaço físico, fadiga crónica c
tristeza. "São pessoas que deixaramde se preocupar consigo e só vivem
para o trabalho."O objetivo do programa é retirar a
carga emocional para que a pessoaseja capaz de gerir o stress. Catari
na Nunes aprendeu a travar a an
siedade. "Agora oiço o meu corpo:se a respiração acelera, se me dóio estômago sei que estou a ficaransiosa. Faço uns exercícios de
respiração e quebro os pensa-mentos negativos."
MTOoO Não é só a sobrecarga no traba-lho que pode provocar cansaço físi-
co e emocional extremo. Os pais debebés recém nascidos correm o
j mesmo risco. Pior se forem dois
1 bebés. Sônia e Hélder Santos
começaram a acumular níveisde stress quando souberam
___ que iam ter gémeos. "Lembro me de estarmos os dois
a dobrar roupa e de começara chorar: 'São dois, são dois" 1
,
diz Sônia Santos.
Depois de uma gravidez de
risco, seguiu se uma cesariana
complicada que a deixou incapaz detomar conta dos bebés. "Nos primei-ros 15 dias foi o pai que tomou contadeles. Estava com muitas dores e não
podia pegar-lhes ao colo", recorda àSÁBADO. O descanso era quase nulo,
quando a menina adormecia, eleacordava. Os primeiros sinais da faltade descanso foram emocionais. "A
Miriam pedia mais colo, e lembro-mede chegar ao fim do dia culpada, pornão ter pegado no David."
Os bebés reagem ao nervosismodos pais e têm mais dificuldade emadormecer. "O bebé identifica o es
tado hiperalerta da mãe como ummomento em que não é seguroadormecer", explica ConstançaFerreira, terapeuta e fundadora doCentro do Bebé.
Os estados de exaustão ocorrem
quando não são satisfeitas as neces-sidades básicas. "O organismo em
privação tenta defender-se, aumen-tam os níveis de adrenalina c fica-mos mais irritáveis", explica Cons
tança Ferreira. "F nestas ocasiões
que há mais acidentes e se tomamdecisões erradas."
De repente, o casal que nunca dis-cutia começou a gritar um com o outro. Foi quando Sônia e Hélder perceberam que tinham de pedir ajuda.Um estudo realizado em 2017 pelaUniversidade Católica de Louvam,na Bélgica, avaliou o cansaço de2.000 pais através de questionários.Publicado na revista frontlers In
25%é o valorde energiagasta pelo
cérebro, que nototal representaapenas 3% do
peso do corpohumano
OTelma Falcão de
AlmeidaA psiquiatra no Hospital
CUF Porto usa o mindfuf-ness para reduzir os níveis
de stress dos doentes
Psychology, o estudo Exhaustedparents: development and preliminaryvalidation of the parental bumout
inventory concluiu que 2% a 12% dos
pais sofrem de bumout parental, ou
cansaço físico e emocional extremo.Foi esse o diagnóstico de Sônia e
Hélder Santos. Pediram ajuda ao site
Pais a Bordo, criado em 2018 pelapsicóloga clínica Ana Gomes e pelamãe e blogger Inês Mala, depois de
esta ter superado o que foi designa-do como "esgotamento materno".Na altura, mãe a tempo inteiro, Inês
Maia isolou-se em casa com o filho
depois de ter falhado o desejo de ser
uma supermãe. "Chorava desalma-damente e implorava ao meu mari-do que não fosse trabalhar para não
me deixar e ao nosso filho sozinhos",
conta à SÁBADO. O cansaço levouao afastamento do casal c a atitudes
irrcflctidas: "O começar a perder a
paciência, o levantar a voz sem que-rer, a primeira palmada sem inten-ção c o arrependimento eterno porestar a passar por uma fase destas
em que um filho, principalmente umbebé, sente e absorve tudo." Foi
acompanhada por um psicólogo,
começou a sair de casa, a guardartempo para si e recuperou ao fim de
quatro meses. Contou tudo aos se-
guidores e quando recebeu pedidosde ajuda decidiu criar um workshop.
Estes sintomas da exaustão parental
podem ser físicos - como cefaleias,
despigmentação da pele e infeção O
DoseO stress
é benéfico cmdoses peque-
nas. Um estudoda Universida-de da Califór-
nia, EUA, reve-lou que o stressleva o cérebroa criar novas
células, respon-sáveis pelamemória
"LEMBRO--ME DE ES-TARMOS OSDOIS A DO
BRAR ROUPAE COMEÇARA CHORAR",DIZ SÔNIA
SANTOS
7 TRATAMENTOSPARA O CANSAÇO
Há várias formas de evitar e tratar a fadiga extrema,física e emocional. Em casos graves, é fundamental
o acompanhamento psiquiátrico ou psicológico
Nãohá receitas mágicas, mas
pode superar a fadiga comestas terapias e conselhos.
OPsicoterapiaAs consultas permitem um auto-conhecimento e uma compreen-são de sentimentos e comporta-mentos negativos. "É um proces-so moroso porque não é possíveldestruir uma crença que estácristalizada", explica a psicólogaAndreia Cavaca.
0MindfulnessÉ um conjunto de práticas, que in-cluem meditação, ioga e técnicasde respiração que permite focar a
atenção no momento presente e
afastar pensamentos negativosque criam ansiedade. Criado em1979 na Universidade de Massa-chusetts, EUA, c uma terapia de
grupo cuja eficácia tem sido ava-liada em vários estudos científicos.
salmão, rico em ácidos gordosómega 3, "Evire agentes infla-matórios como o café, a pimen-ta, o trigo e o leite", diz o nutri-cionista Pedro Queiroz. E comadevagar.
OExercício físico regularPreparar o corpo para o stress
requer treino físico. O exercício
promove a produção de neuro-transmissores como as endorfi-nas, a serotonina e a dopamina,associadas à diminuição da dore ao bem-estar. Se não quiserrecorrer a ginásios, faça cami-nhadas ou corrida.
OTempo de lazerÉ essencial ter em atenção as
suas necessidades e reservar umperíodo do dia para si próprio.Pode ser uma caminhada sozi-nho, um momento de leitura ou
alguns minutos a apanhar sol
numa esplanada. O
O urinária - aliados a uma fadiga in-tensa. "Mas os pais consideram este
cansaço normal e tentam manter o
mesmo ritmo'', explica a psicólogaAna Gomes. A perceção irrealista de
conseguirem fazer tudo o que faziamantes e a frustração que sentem ao
perceberam que é impossível é outrosintoma. Isto provoca uma desperso-
nalização. "Os pais perdem a paciên-cia mais rapidamente, respondemcom sarcasmo e ironia. Deixam de ser
as pessoas que eram e isso é notado
pelos familiares."
O problema é que, ao contrário do
burnout profissional, não é possívelretirar os pais dos filhos para eles
recuperarem do cansaço. A solução
passa por incentivar as mães a saí-rem mais de casa e a combinaremencontros com outras famílias com
crianças para que possam falar comadultos. "É fundamental pedir ajuda,ter alguém que ajude nas tarefas
para os pais descansarem", continua.Foi isso que Sônia e Hélder fize-
ram. "Pedimos aos meus pais paraficarem com os bebés algumas ho-ras. Não nos lembrámos disso por-que achávamos que a responsabili-dade de cuidar deles era nossa", dizSônia Santos. Também redefiniram
algumas das tarefas para a mãe to-mar banho sozinha, ir às compras e
até brincar com os filhos. Quando as
crianças foram para o infantário, aos9 meses, a pressão aliviou. "Ajudou irtrabalhar, ainda que chegue cansada
ao fim do dia", diz a operadora de
logística. Agora, conseguem arranjartempo para ir almoçar e passar umatarde sem as crianças. "Os resultados
surgiram aos poucos."
O RISCO DE NÃOSABERPARARO Cátia Dias, de 33 anos, tambémficou esgotada quando foi mãe, mas
o problema vinha de trás. Advogada,era muito ativa e não conseguia estar
desocupada. Tirou um mestrado emGestão e fez cursos em Terapias Al-ternativas. Em 2015, quando foi mãe,não abrandou, apesar das noites maldormidas. "Agora olho para trás e
vejo que o Bernardo não dormia porcausa da minha energia", admite àSÁBADO. Quando em 2017, paraalém dos clientes que tinha, assumiu
um cargo numa consultora tudo se
precipitou. "Os meus dias começa-
-10mil
passos é o
número idea
que deve dardiariamente
numacaminhada
para aumentara resistência ao
stress
OJosé Soares
O professor catedrático de
Fisiologia lançou em 2018 olivro: Reload, Menos Stress,
Melhor Performance
vam às 6h30 e terminavam depoisdas 23h. Às vezes tinha 50 chamadasnão atendidas." Começou por culparo filho, que achava muito nervoso c
dependente: "Perguntei à psicólogada clínica pediátrica onde ia se o de-via colocar no ioga, apesar de achar
que parte da culpa era minha." A es-
pecialista respondeu-lhe que era ela
que precisava muito de fazer ioga.Foi quando Cátia percebeu que o
nível de trabalho que assumira se
tornara tóxico e que o filho estava areagir à ausência da mãe. "Às vezes,entrava na Via de Cintura Interna, no
Porto, e tinha de parar o carro por-que não me lembrava para onde ia."
Em julho de 2018, admitiu à médicade família estar muito cansada. Ficoude baixa um mês, mas não foi sufi-ciente. "Os clientes continuavam a li-
gar-me." No entanto, notou diferen-
ças no filho. "Tornou -se uma criançamais calma porque eu estava mais
tempo em casa."
Ainda assim, não aceitou que esta-va com um esgotamento. 'Achava
que não era burnoutporque eramuito exigente e o trabalho era a mi-nha vida." Em Novembro, a empresapressionou-a a voltar, os clientes co-
meçaram a ligar várias vezes e CátiaDias sofreu um ataque de pânico. "O
meu corpo desligou e caí para olado. Não conseguia andar, tinha a O
INES MAIASUPEROU OBURNOUT
PARENTAL ECRIOU UM
WORKSHOPPARA MÃES,
O PAIS ABORDO
Alimentos para combater a fadigaHá nutrientes que ajudam o organismo a suportar picos de stress
O visão turva, não me conseguiamexer." Aconteceu-lhe mais duas
vezes, uma delas fora de casa. "Pen-sava que estava melhor, mas regredi,estava pior do que no início", diz.
Agora está a fazer um programa de
redução de síress através do
mindfulness. "É um conjunto de prá-ticas que cultivam a consciência queemerge quando pomos a atenção nomomento presente com propósito e
sem julgamento", explica a psiquia-tra Telma Falcão de Almeida e pro-fessora de Mindfulness pela Universidade de Massachusetts, nos EUA."É uma forma de aprender a respon-der aos agentes do stress e ter mais
capacidade de regulação dos senti-mentos e dos pensamentos." O pro-grama, de oito sessões semanais fei-to em grupo, inclui meditação senta-da, ioga, debate sobre os padrões do
stress e body scan - um momentoem que, deitados, os pacientestrabalham a consciência c estar no
momento mais presente, focando a
atenção em todas as partes do corpo,dos dedos dos pés à cabeça. "A ideiaé que este conjunto de práticas se
transforme num estilo de vida de
modo a estarmos mais presentes nanossa vida", explica a psiquiatra.
A eficácia do programa tem sido
avaliada por vários estudos científi-cos. Um dos mais recentes, intitulado
Mindfulness-based interventions forpsychiatric disorders: A systematicreview and meta-analysís, publica-do em 2018 na revista Clinicai
Psychology Review, avaliou os efei-
tos do mindfulness em 12.005 pes-soas com desordens psiquiátricas. Os
resultados indicam que o programaobteve melhores resultados do queos tratamentos psiquiátricos.
O programa levou Cátia Dias a mu-dar de vida. "Gosto muito de Direito,mas a prática judicial causou-me umimpacto negativo", diz. Decidiu não
regressar à consultora. Com o
mindfulness aprendeu a caminharcalmamente e a viver no presente:"Fazemos exercícios de ioga, medi-tação e técnicas de relaxamento queajudam a manter o foco." E incluiuestas práticas no dia a dia. "Tenhomais paciência e tento reagir comconsciência. Sc o meu filho chorartenho mais calma a tentar perceber o
que se passa", garante.
ResponsabilidadeO Há cinco anos que André Oliveirasentia que carregava o peso do mun-do sobre os ombros. Tomara-se in-tolerante, uma pergunta simples so-bre o seu dia merecia logo uma res
posta ríspida. Se fosse contrariado,
explodia e entrava em conflito.
Quando a companheira o chamou a
atenção, reconheceu que tinha um
problema e tentou resolvê-lo sozi-nho. "Tentei arranjar um hobby. Tinha feito vela quando era miúdo e
decidi voltar a fazer", conta. "Mas jánão tinha o mesmo valor."
A profissão, diretor industrial, res-
ponsável por todo o planeamento da
empresa, da produção à logística,
parecia ser o problema. "É necessá-rio capacidade de planeamento e to-mada de decisões e uma adaptaçãoàs várias pessoas, com diferentes ti-
pos de escolaridade, com que se tra-balha", explica. "A pressão é conse-
guir mais resultados com menos re-cursos." Chegou a trabalhar das 7h
às 24h. Foi acompanhado por uma
psicóloga dois anos, sem grandes re-sultados. Seguiu-se um neurologistaque lhe receitou um ansiolítico e um
antidepressivo para dormir melhor."Tinha o sono muito agitado, estava
sempre a pensar no trabalho, a ante-
cipar as reações de outras pessoas."A medicação resultou alguns me-
ses, mas não resolveu a questão."Andava meio anestesiado, sentia-me menos energético e menos pro-dutivo." Há um ano recorreu à psi-quiatria que, para além dos medica-mentos, lhe receitou atividades e
também o programa de mindfulness.
"Faço uma caminhada de 30 minu-tos ao fim do dia. Gosto de ir até à
praia, estar atento à respiração parame abstrair dos problemas. E a se-
guir ao almoço reservo 15 minutos só
para mim. sem interrupções."As pausas durante o dia de traba-
lho são importantes para lidar com o
stress e para aumentar a produtivi-dade, garante o professor catedráticode Fisiologia da Faculdade de Des-
porto da Universidade do Porto, JoséSoares. No seu livro, Reload, Menos
CÁTIA DIASRECONHECEU
QUE O SEUTRABALHOAFETOU O
COMPORTAMENTO
DO FILHO
Correr com o cansaçoO treino é fundamental para a saúde do cérebro. O pref. Josií Soares indica alguns exercícioscom banda elástica que pode fazer em casa
Stress, Melhor Performance, publica-do em 2018, o agora consultor de
empresas explica que o corpo não
está preparado para trabalhar sem
interrupções. "Os intervalos são for-mas de repormos a energia gasta nastarefas que necessitam de maior dis-
pêndio energético", escreve. Para re-
cuperar, recomenda uma paragemque inclua sair da frente do compu-tador a cada 60 a 90 minutos.
Para lidar com o stress, recomendausar a mesma fórmula aplicada à
gestão da performance desportivano local de trabalho: recover (recu-
perar), refuel (alimentação), rethink
(repensar) e reenergize (energizar). Aideia é conseguir recuperar a ener-
gia, mante-la cm níveis étimos atra-vés da alimentação, aprender a geriro siress e energizar com exercício.
André Oliveira está mais sereno,
mas também porque limitou as ho-ras de trabalho. "Hoje dificilmentetrabalho depois das 19h e tenho dois
telemóveis, o profissional fica em si-lêncio quando chego a casa." Tam-bém tem cuidado para não estimularo cérebro antes de se deitar e deixou
os jogos de computador à noite.
O A dificuldade em dormir foi umdos sintomas que alarmou Maria(nome fictício). A assistente social,de Lisboa, começou a acordar à
noite e ficava uma a duas horassem conseguir adormecer. "Achava
que o cansaço era normal. Acorda-va muito cedo, pelas 6hlO, parachegar ao local de emprego a 45minutos de distância, e só chegavaàs 19h. O meu marido ajudava-me,mas entre dar banho à minha filhae fazer as tarefas da casa, deitava-me perto da meia noite", conta. Os
primeiros sintomas surgiram há 10anos. O pior foi quando começou asentir arritmias.
As alterações da frequência car-díacas podem ser um dos sintomas
de cansaço extremo. "Os sinais de
alarme físicos incluem ainda alte-
rações gastrintestinais, cefaleias,
perturbações do sono, aumento datensão arterial", enumera a psi-quiatra Telma Falcão de Almeida.
Maria estava tão cansada quechegou a dormir no gabinete de
atendimento durante meia hora. Os
problemas que tentava resolver -violência doméstica, alcoolismo,
pais com filhos toxicodependentes- começaram a pesar-lhe. "Basta-vam quatro casos graves para ficar
esgotada. Chegava a casa e enfia-va me na cama."
Para além disso, começou a acu-mular mais tarefas na empresa, fa-zia a comunicação e até trabalhavana receção. "Reclamei, mas res-
ponderam-me que fazia parte do
espírito." Tinha tanto trabalho quese esquecia de comer. "Não tinhafome", diz.
Mas a alimentação é fundamental
para gerir o stress e o cansaço ex-tremo. "Quando há picos de stress
há uma libertação de hormonas,como a adrenalina, que ativa ciclosenzimáticos de forma mais rápida,em que o nosso sistema de absor-
ção dos nutrientes é acelerado",
explica o nutricionista Pedro Quei-roz. "Por isso, as pessoas chegam a
casa e há picos de apetite, geral-mente por doces."
Os sintomas de Maria agudizaram-se. Estava magra, tinha dores de
cabeça, crises de choro no trabalho,
quando alguém batia à porta do seu
gabinete estremecia e ficava comfalta de ar quando recebia emails.Há três anos ficou com sintomas de
incontinência urinária. Depois de
uma série de exames, o urologistarecomendou uma consulta de psi-quiatria. "Só nessa altura é que pareipara pensar no que estava a viver."
Está de baixa desde novembrode 2018. "Sentia a cabeça vazia, jánão conseguia ouvir os problemasdos outros." Não foi difícil parar e
passou as primeiras semanas nacama. Também recorreu ao
mindfulness e além da meditaçãoc dos exercícios de respiração, fazcaminhadas todos os dias. "Querovoltar a trabalhar, mas com regrasbem definidas." O
OA psicólogaBárbara RamosDias já ajudouvários adolescen-tes de 14 anos alidar com o stresse a frustraçãona escola
O DIRETORINDUSTRIAL,
ANDRÉOLIVEIRA,CHEGOU A
TRABALHARDAS7HÀS24H
OJatirSchmitt
A psicóloga criou um
programa intensivo de detoxemocional que ajuda a supe-