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Ambiente Construdo
On-line version ISSN 1678-8621 Ambient. constr. (Online) vol.11
no.1 Porto Alegre Jan./Mar. 2011
http://dx.doi.org/10.1590/S1678-86212011000100003
ARTIGOS
Avaliao da resistncia compresso, resistncia trao e formao de
microfissuras em concretos produzidos com diferentes tipos de
cimentos, quando aplicado um pr-carregamento de compresso
Evaluation of compressive strength, tensile strength and
microcracking formation in concretes produced with different
cements, when a preloading of compression is applied
Geilma Lima VieiraI; Denise Carpena Coitinho Dal MolinII
ICentro Tecnolgico, Departamento de Engenharia Civil,
Universidade federal do Esprito Santo, Av. Fernando Ferrari, 514,
Goiabeiras, Vitoria - ES - Brasil, CEP 29075-510,Tel.: (27)
4009-2652. E-mail: [email protected] IIEscola de Engenharia,
Departamento de Engenharia Civil, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Av. Osvaldo Aranha, 99, 3 andar, Farroupilha, Porto
Alegre - RS - Brasil, CEP 90035-190, Tel.: (51) 3308-3321. E-mail:
[email protected]
RESUMO
Muitas empresas construtoras que querem competitividade no
mercado buscam solues para aumentar a velocidade de seus
empreendimentos, tal como a reduo do tempo de execuo da estrutura,
reduo do tempo de escoramento e execuo antecipada das alvenarias,
sem respeitar o prazo mnimo de cura do concreto. A retirada precoce
do escoramento submete a estrutura a uma carga prematura. Os danos
causados pela incompleta reao de hidratao e cura do concreto podem
desencadear um processo generalizado de formao de microfissuras. O
presente estudo avaliou o comportamento de diferentes tipos de
concretos produzidos com quatro diferentes tipos de cimentos,
quando submetidos a uma carga precoce de compresso, analisando-se
suas propriedades mecnicas. A anlise incluiu a avaliao da
resistncia compresso, resistncia trao e microestrutura interna do
concreto, atravs de microscopia eletrnica de varredura. Os
resultados indicaram que h possibilidade de um processo de formao
de microfissuras causadas pelo carregamento precoce no concreto e
que h tendncia de diminuio dos valores de resistncia trao.
Entretanto, verificou-se, mediante anlise de microscopia, que as
microfissuras formadas pelo carregamento precoce tendem a se
recuperar se o processo de cura for retomado ou se cessar o
pr-carregamento.
Palavras-chave: Concreto. Pr-carregamento. Resistncia compresso.
Resistncia trao. Microfissuras
ABSTRACT
Many construction companies seeking competitive advantage in the
market search for solutions to increase the speed of their
projects, such as reducing the structure execution time, cutting
shoring
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time and expediting the construction of masonry walls,
disregarding the minimal time limit for curing concrete. Early
withdrawal of the concrete structure shoring submits it to a
premature load. The damage caused by incomplete hydration reaction
and curing of the concrete can trigger a widespread process of
formation of microcracks. This study examined the behavior of
different types of concrete produced with four different types of
cements, subjected to an early compressive load, analyzing their
mechanical properties. The analysis included an evaluation of the
compressive strength, tensile strength and internal microstructure
of the concrete, using scanning electron microscopy. The results
indicated that there is a possibility of forming microcracks due to
preloading on concrete, and that there is a tendency of reaching
lower tensile strength values. However, microscopic analysis showed
that the microcracks formed by preloading tend to recover if either
the curing process is resumed or if early loading stops.
Keywords: Concrete. Preload. Compressive strength. Tensile
strength. Microcracking
Introduo
O processo de racionalizao e industrializao da construo trouxe
profundas alteraes na forma de construir edificaes no Brasil. O
processo construtivo est modificado, assim como o clculo estrutural
e as tcnicas gerenciais. Houve uma evoluo da resistncia do
concreto, as estruturas e tipologias esto mais arrojadas e as
alvenarias mais precisas. Alm disso, tm surgido novos fenmenos,
antes no observados nas construes e ainda pouco conhecidos pelos
profissionais. Paredes de vedao esto se rompendo, fissuras nas
alvenarias so visveis e problemas nos revestimentos so cada vez
mais frequentes. Fissuras e trincas em alvenaria originam-se devido
ao mecanismo inerente que os materiais possuem de aliviar tenses
que lhe so impostas. Fissuras de origem externa decorrem, em geral,
da incompatibilidade entre estruturas de concreto armado e
alvenarias de vedao. Essa incompatibilidade tem sido observada em
funo dos movimentos diferenciais entre os elementos de concreto
armado e as paredes. A inadequao da sequncia e velocidade de execuo
e a ausncia de um projeto que considere corretamente a interao
entre esses subsistemas na definio de materiais, detalhes de
projeto e tcnicas executivas podem ser apontadas como aspectos
fundamentais nessa questo.
Entre as hipteses assumidas e muitas vezes no verificadas que
influenciam diretamente a deformao da estrutura esto: o mdulo de
elasticidade considerado no dimensionamento e no obtido em obra; o
aumento da fluncia e retrao devido velocidade de execuo; e o
carregamento e a diminuio da rigidez devido microfissurao em
trabalho.
Muitas empresas construtoras, para garantir competitividade no
mercado, buscam solues capazes de aumentar a velocidade de suas
obras, tais como a reduo do tempo de execuo da estrutura e do
perodo de escoramento, e antecipao do incio das alvenarias, como
pode ser observado na Figura 1.
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A retirada antecipada do escoramento submete a estrutura a um
carregamento precoce, sem que haja tempo suficiente de ocorrerem
todas as reaes de hidratao do cimento, podendo desencadear um
processo de microfissurao no concreto. Como consequncia, as
deformaes instantneas e lentas tendem a aumentar, podendo
intensificar a incidncia de manifestaes patolgicas nas edificaes
(MEDEIROS, 2005).
Pela Figura 1, o ciclo de concretagem de 7 dias e s h dois jogos
de escoramento (situao A). Nessa configurao, para os procedimentos
de concretagem do terceiro pavimento (situao B), ter de ser
deslocado o escoramento. Para essa situao ter de ser retirado o
escoramento do primeiro pavimento (situao A), que est apenas com
cura de 15 dias e que suportar, alm do peso prprio, as cargas
provenientes dos elementos superiores.
Cada elemento recm-concretado suportado por outro, que, por sua
vez, ainda no desenvolveu resistncia suficiente para suportar as
cargas adicionais. Aliado a isso, tem-se a execuo antecipada das
alvenarias (situao C), que mais uma etapa construtiva e somatiza
possveis efeitos indesejveis na estrutura como um todo, pois a cada
etapa construtiva realizada nova parcela de ao absorvida pelos
elementos estruturais, curados ou no.
Sem resistncia suficiente e escoramento permanente que possa
suportar as cargas adicionais, podem ocorrer deformaes no previstas
em projetos em funo desse ciclo de concretagem e disponibilidade
insuficiente de escoramento. Tais deformaes, no previstas, podem
provocar o surgimento de fissuras em funo dos esforos
prematuros.
As normas brasileiras vigentes (NBR 14931) no estabelecem prazos
para a retirada de formas e escoramentos, mas indica que estes s
podem ser removidos quando houver suficiente resistncia do concreto
para resistir s aes que atuarem sobre ele e no conduzir a uma
configurao de deformaes inaceitveis, em funo do baixo mdulo de
elasticidade do concreto e maior deformao diferida no tempo quando
o concreto solicitado com idades inferiores a 28 dias. A norma NBR
14931 (ABNT, 2003) recomenda que sejam atendidos os requisitos de
monitoramento da gradual evoluo da resistncia do concreto nas
primeiras idades.
Frana (2005) aponta alguns fatores crticos que influenciam nas
deformaes de estruturas de concreto, entre elas a macroestrutura do
concreto, os ciclos de execuo e reescoramento. Uma soluo eficaz,
segundo o autor, retardar o primeiro carregamento do concreto, ou
seja, definir um cronograma de construo de modo a permitir que
sejam asseguradas as resistncias mecnicas do concreto (compresso,
trao e mdulo de elasticidade), assim como definir um bom projeto de
reescoramento.
Alm da tomada de deciso sobre os corretos procedimentos de
clculo, projeto e execuo de estruturas de concreto, o conhecimento
da tecnologia dos materiais constituintes do concreto pode ajudar a
minimizar tais efeitos.
O desenvolvimento de novos materiais da construo civil e o
conhecimento do desempenho das estruturas em um nvel mais
aprofundado surgem como parmetros de grande importncia na busca do
melhor desempenho das estruturas dentro do processo de
racionalizao. Avaliao isolada de algumas propriedades como a
resistncia compresso torna-se um parmetro insuficiente no estudo do
desempenho da estrutura quando submetida a cargas precoces. Nesse
contexto, torna-se relevante o estudo de outras propriedades
mecnicas (resistncia trao) do concreto, seus materiais
constituintes, assim como suas fases de hidratao quando submetidos
a um carregamento precoce, no sentido de garantir a segurana e o
bom desempenho da estrutura ao longo do tempo.
Comportamento mecnico do concreto sob carregamento de
compresso
No concreto, as tenses de trao induzidas pelas deformaes na
retrao trmica e na secagem so grandes o suficiente para causar
microfissurao na zona de transio, mesmo que o concreto no seja
submetido a qualquer carga externa. A resistncia ruptura do
elemento sob carga controlada pela propagao e reunio de uma parte
do sistema de microfissuras na pasta de cimento hidratada. De uma
forma geral, a resistncia do concreto aumenta com a idade enquanto
as partculas no hidratadas de cimento continuam a formar produtos
de hidratao, que tendem a reduzir o tamanho e o volume total de
vazios. Genericamente, na faixa de relao gua/aglomerante de 0,5 a
0,7, pode-se
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dizer que a microestrutura da zona de transio impede o concreto
de comportar-se como um material composto (AITCIN, 2000; NEVILLE,
1997).
em funo da presena da zona de transio que o concreto rompe a um
nvel de tenso consideravelmente mais baixo do que a resistncia dos
dois constituintes principais (agregado e pasta). Conforme
comentado anteriormente, mesmo antes da aplicao do carregamento, j
existem microfissuras na regio da interface, que so geradas durante
o processo de endurecimento da pasta e causadas pela exudao, retrao
por secagem, entre outros. A Figura 2 ilustra a evoluo da fissurao
nessa interface, sob condies de carregamento.
Em nveis no muito elevados de energia para estender as fissuras
j existentes na zona de transio, com tenses de 40% a 70% da
resistncia ltima, j se percebem incrementos de deformao por unidade
de fora aplicada. Em nveis de tenses maiores do que 70% da carga
ltima, j se formam novas fissuras, propagando-se gradativamente at
se unirem s fissuras da zona de transio. Esse fato pode levar o
material ruptura. Sob cargas de trao, as fissuras se propagam a um
nvel muito mais baixo. Em relao ao mdulo de elasticidade, a
estrutura da zona de transio, principalmente o volume de vazios
considerado e a presena de microfissuras, provoca grande
interferncia. No concreto, a zona de transio serve de ponte entre a
matriz e o agregado grado. Mesmo que os materiais constituintes
(argamassa e agregado grado) possuam elevada rigidez, a rigidez do
material composto pode ser baixa em funo da presena dos vazios e
das microfissuras presentes na zona de transio, as quais no
permitem transferncia de resistncia (MEHTA; MONTEIRO, 1994).
Quando um corpo de prova de concreto submetido a um carregamento
de compresso axial, a curva tenso-deformao apresenta um ramo
ascendente, seguido por um pico que conhecido como a resistncia
compresso do concreto, como pde ser visto na Figura 2. Embora a
parte inicial da curva parea uma reta, medies mais detalhadas
mostram que existe uma curvatura desde o incio do carregamento, em
funo dos processos de retrao e endurecimento do cimento. Com isso
surgem concentraes de tenses de trao na interface entre agregados e
a pasta de cimento, causando microfissuras que podem se propagar
quando estiverem sujeitas a carregamentos externos.
Uma importante classificao para o estudo de uma fissura ou
trinca o modo como ela est solicitada. Existem trs modos possveis,
conforme se pode observar na Figura 3.
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O modo I caracterizado por um esforo de trao unidirecional, com
a fissura se desenvolvendo num plano perpendicular ao do
carregamento. O modo II caracteriza-se pelo escorregamento entre as
faces das fissuras, com esforo cisalhante aplicado na direo
paralela ao defeito. O modo III tambm se caracteriza por
escorregamento entre as faces, mas com esforo cisalhante atuando na
direo perpendicular da fissura. Esses so os modos de solicitao;
qualquer outro constitui uma superposio desses aqui apresentados
(BOTTA, 1998; KANG; BITTENCOURT, 1999; SANTOS, SOUZA; BITTENCOURT,
2003).
De acordo com Botta (1998), anlises da danificao do concreto sob
compresso permitem concluir que de 0% a 30% ou 40% da tenso mxima
do ensaio uniaxial as fissuras permanecem estveis na regio da
interface. Desse ponto at 70% ou 80% da carga mxima as fissuras se
desenvolvem segundo os modos II (fissuras a 45 em relao direo da
carga) e I, ainda na regio da interface agregado-argamassa. A
partir da ocorre instabilidade e rupturas locais na argamassa,
conduzindo o material iminente ruptura devido intensa degradao.
Em compresso uniaxial a danificao tem as caractersticas
indicadas na Figura 4.
A primeira fissura aparece com modo II de abertura na regio do
contorno do agregado, aproximadamente a 30 em relao horizontal. A
fissura progride ao longo da interface, passando a apresentar um
modo I de abertura. Em seguida, sua evoluo se d na direo da
solicitao, deixando a regio da interface para se propagar na
matriz. Para elevados nveis de solicitao evidencia-se um panorama
de fissuras paralelas direo do carregamento (PITUBA, 2003; MAZARS;
BAZANT, 1989).
Dessa forma, a ruptura ocorre ortogonalmente direo da carga
aplicada, como no ensaio de trao por compresso diametral. H grande
possibilidade de que no exista uma tenso-limite, mas uma
deformao-limite por trao, que determina a resistncia do concreto
sob solicitao esttica. A ruptura final sob ao de uma compresso
uniaxial uma ruptura por trao de gros de cimento ou uma ruptura da
aderncia em uma direo perpendicular carga aplicada, ou, ainda, a
runa causada pelo surgimento de planos inclinados de cisalhamento.
Por esse motivo explica-se a ruptura em forma de cone e com planos
cisalhantes a 45 em corpos de prova de concreto de formato
cilndricos. A Figura 5 apresenta exemplos dessa forma de ruptura
(MAZARS; BAZANT, 1989; LANDIS; NAGY; KEANE, 2003; NEVILLE,
1997).
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Metodologia Experimental
Os concretos produzidos foram ensaiados em quatro nveis de
pr-carregamento de compresso (0%, 25%, 50% e 75% em relao carga de
ruptura), aplicados aos 1, 3 e 7 dias de idade, utilizando-se
diferentes relaes gua/cimento (0,35, 0,50 e 0,70). Os concretos
submetidos ao pr-carregamento foram ensaiados em diferentes idades,
inclusive aos 28 dias, que a idade de ensaio e parmetro de
referncia da maioria dos projetos estruturais. Buscou-se verificar
a influncia da microfissurao na resistncia compresso axial, na
resistncia trao e na formao de microfissuras dos diferentes tipos
de concretos produzidos. Foram utilizados quatro tipos diferentes
de cimentos (CPV ARI, CPV ARI RS, CPIV RS e CPII Z) com o objetivo
de verificar a influncia de suas diferentes composies e seu
desempenho sob carregamento de compresso nas primeiras idades de
cura e hidratao.
Os ensaios de resistncia compresso axial foram executados de
acordo com os procedimentos da NBR 5739 (ABNT, 1994) Concreto
Ensaio de compresso de corpos-de-prova cilndricos Mtodo de ensaio,
no que se refere velocidade de carregamento, equipamento e preparao
das amostras, nas idades predeterminadas no programa experimental.
Os corpos de prova permaneceram em cmara mida at a idade do ensaio.
Tambm, na idade de 1, 3 e 7 dias, os corpos de prova foram capeados
com enxofre para aplicao do pr-carregamento. Aps o pr-carregamento,
os corpos de prova retornavam cmara mida, permanecendo l at a idade
de 28 dias, para a execuo dos ensaios.
A execuo do ensaio de resistncia trao por compresso diametral
seguiu as especificaes da NBR 7222 (ABNT, 1994) Argamassa e
concreto Determinao da resistncia trao por compresso diametral de
corpos-de-prova cilndricos. Os corpos de prova permaneceram em
cmara mida at a idade de pr-carregamento e dos ensaios previstos. A
execuo do ensaio de trao por compresso diametral pode ser visto na
Figura 6.
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Na produo dos concretos foi adotado o procedimento de dosagem
IPT/EPUSP. A Tabela 1 mostra os valores dos traos unitrios, consumo
de cimento/m3, a mdia dos abatimentos obtidos, assim como os
valores de temperatura e umidade relativa na etapa de execuo e
moldagem dos concretos.
Aps a moldagem dos corpos de prova de acordo com a NBR 5738
(ABNT, 1994), os concretos permaneceram em um local protegido para
evitar a sada de gua por evaporao nas primeiras 24 horas. Aps esse
perodo, os corpos de prova foram desmoldados, identificados e
mantidos em cmara mida com umidade relativa superior a 95% e
temperatura de 23 2 C, at as idades de ensaios.
A velocidade de aplicao do carregamento ao longo dos ensaios foi
mantida constante para todos os percentuais de cargas. Ficou
estabelecida uma taxa de 200 kN/min (aproximadamente 0,50 MPa/s). A
Figura 6 apresenta a execuo do pr-carregamento na prensa. Os
ensaios de pr-carregamento foram realizados no Laboratrio de
Ensaios e Modelos Estruturais (LEME) da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. Aps o pr-carregamento, os corpos de prova retornavam
ao ambiente de cura at a idade de ensaio.
Resultados e discusso
Na avaliao dos resultados de resistncia compresso e resistncia
trao por compresso diametral foi realizado um tratamento estatstico
para anlise de significncia das variveis envolvidas nos ensaios
(idade, relao gua/cimento, porcentagem de carregamento, idade de
carregamento) para os diferentes tipos de cimento. Foram
desenvolvidos modelos de regresso linear mltipla para as variveis
de resposta (resistncia compresso e resistncia trao) medidas.
Os valores de resistncia compresso e de resistncia trao por
compresso diametral obtidos pelo modelo so expressos sob a forma de
grficos de comportamento dos concretos produzidos em funo das
variveis relao gua/cimento (ac), idade, percentual de
pr-carregamento (carregam) e idade de carregamento (idadecar).
Na Tabela 2 possvel verificar que os modelos matemticos de
regresso linear mltipla ajustados para observar o comportamento da
resistncia compresso em funo das variveis citadas possuem
coeficientes de determinao (R2) esto todos acima de 95%. Isso
significa que os modelos matemticos desenvolvidos explicam mais de
95% da variabilidade dos resultados dos ensaios e, portanto, so
confiveis.
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A Figura 7 apresenta os grficos do efeito da interao entre o
percentual de pr-carregamento e a relao a/c sobre a resistncia
compresso do concreto, para cada tipo de cimento. Ao contrrio do
que se esperava, houve aumento da resistncia medida que aumentava o
percentual de pr-carregamento. O processo de formao de
microfissuras atravs da resistncia compresso no pode ser explicado
simplesmente por critrios de observao macroscpica. No entanto,
algumas observaes podem ser feitas a respeito desse
comportamento.
Nas primeiras idades, apesar do baixo grau de hidratao, alguns
cimentos j possuem uma estrutura interna razoavelmente formada, com
compostos capazes de formar uma grande quantidade de etringita e,
consequentemente, silicatos hidratados de clcio (CSH). Alm disso,
ocorre a formao de cristais orientados de hidrxido do clcio
(CaOH2), que tm seu tamanho diretamente proporcional porosidade do
concreto. Esses produtos cristalinos consistem de cristais
relativamente grandes e formam uma estrutura mais porosa na regio
da zona de transio. Quando o concreto recebe um pr-carregamento,
possivelmente ocorre um efeito de compactao da estrutura,
expulsando a gua
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contida nos poros capilares e quebrando os cristais de hidrxido
de clcio, alm de outros cristais mais fracos. Com isso, a estrutura
interna do material se rearranja, liberando a rea antes ocupada
pelo hidrxido de clcio e preenchendo os vazios formados com
produtos resistentes remanescentes, provavelmente com hidratao de
compostos anidros.
Com o progresso da hidratao, o CSH remanescente e uma segunda
gerao de cristais menores de etringita e hidrxido de clcio comeam a
preencher os espaos vazios deixados pelos cristais grandes de
hidrxido de clcio, ajudando a aumentar a densidade e,
consequentemente, a resistncia do material. Por esse motivo,
explica-se o maior ganho de resistncia para relaes a/c menores.
Nas relaes a/c maiores a resistncia no concreto explicada como
uma consequncia natural do progressivo enfraquecimento da matriz
devido ao aumento da porosidade. Como no h quantidade suficiente de
compostos resistentes remanescentes, ocorre apenas a quebra dos
cristais de hidrxido de clcio. Ainda assim o efeito benfico, uma
vez que o carregamento quebra os cristais mais fracos,
reorganizando a estrutura e tornando-a mais compacta.
Burlion, Bourgeois e Shao (2005) realizaram experimentos em
testemunhos de concreto confinando o corpo de prova numa direo,
deixando livre a outra direo e aplicando uma fora de compresso no
lado confinado. Os autores afirmam que a presso exercida num corpo
de prova de concreto provoca um confinamento da estrutura do
concreto na direo de aplicao da carga e com isso induz a um aumento
da resistncia. Isso ocorre, segundo os autores, porque a presso de
confinamento provoca uma diminuio dos espaos intersticiais da
composio da mistura. Quando os corpos de prova submetidos a cargas
ficam expostos a um ambiente mido, a gua tende a percolar os
interstcios formados pelas microfissuras, hidratando compostos
qumicos que ainda no se hidrataram, e, assim, proporciona um
aumento da resistncia. Os autores observaram aumento da resistncia
da ordem de at 15%.
Na Figura 7 so mostrados os grficos com o efeito da interao
entre a idade em que o concreto foi pr-carregado e a relao a/c. Os
valores da resistncia compresso foram obtidos por meio das equaes
de regresso linear obtidas para cada tipo de cimento.
Os grficos da Figura 8 indicam que nos cimentos de reaes de
hidratao mais lentas, como o CPII Z, por exemplo, o ganho de
resistncia foi maior em todas as relaes a/c medida que aumentava a
idade de pr-carregamento. Tal fato se deve, provavelmente, evoluo
do processo de hidratao, o que no ocorreu com os cimentos de alta
resistncia inicial, em que o aumento de idade de pr-carregamento
provoca pouca influncia no ganho da resistncia compresso.
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Cada um dos tipos de cimento Portland apresenta uma velocidade
de hidratao diferente. Quanto mais fino o cimento, mais rpida a
evoluo da resistncia do concreto. Comparando a matriz do concreto
de um cimento de alta resistncia inicial com a de outro cimento
comum, a baixas idades, a primeira matriz ser muito menos porosa.
Ao longo do tempo, os poros da matriz do cimento comum so
preenchidos pelos produtos de hidratao, e a porosidade final poder
ser a mesma do concreto de alta resistncia inicial. Portanto, a
influncia do tipo de cimento mais significativa para baixas idades.
O cimento de alta resistncia inicial (ARI) possui um ndice de
finura maior que os outros tipos, o que explica o comportamento de
maior resistncia nas primeiras idades (NEVILLE, 1997).
Resistncia trao
Para a anlise da resistncia trao foi desenvolvido um modelo
matemtico atravs da anlise de regresso mltipla, considerando todas
as variveis (relao a/c, idade de ensaio, idade de pr-carregamento e
percentual de pr-carregamento). Assim como na resistncia compresso,
na avaliao da resistncia trao por compresso diametral foi
desenvolvido um modelo matemtico para cada tipo de cimento. Na
Figura 9 apresentado o efeito isolado do percentual de
pr-carregamento sobre a resistncia trao do concreto.
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Diferentemente do que apontou a resistncia compresso, no foram
observados aumentos da resistncia trao medida que se aumentava o
percentual de carga, o que pode induzir a um possvel estado de
microfissurao. O efeito de colmatao das microfissuras ficou
evidente para a resistncia compresso, mas para resistncia trao h
indcios de que a recuperao das microfissuras no ocorre totalmente.
Esse processo vai depender da quantidade de material anidro
remanescente disponvel, da quantidade de microfissuras formadas e
abertas. Alm disso, quando o concreto submetido a um carregamento
de compresso, a direo e a propagao das microfissuras tendem a se
distribuir perpendicularmente direo do carregamento, o que
prejudica fortemente a resistncia trao. Apesar do aumento da
resistncia compresso, provavelmente originada por uma resistncia
residual, o pr-carregamento no implicou o aumento da resistncia
trao.
O efeito da interao entre o percentual de pr-carregamento e a
relao a/c apresentado na Figura 10. Os valores foram determinados a
partir das equaes obtidas nas modelagens de regresso linear da
Tabela 3.
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Na Figura 10 observa-se que a relao a/c tem influncia direta no
percentual de carregamento. Com o aumento do percentual de carga
ocorre uma diminuio da resistncia trao, principalmente para relaes
a/c maiores e principalmente para o CPV ARI. Para o CPIV RS, os
valores permanecem inalterados.
Para relaes a/c menores, os nveis de resistncia trao permanecem
inalterados, ao contrrio dos resultados de resistncia compresso. Em
relaes a/c maiores o grau de fissurao causado pelo pr-carregamento
no possibilitou melhorias dessa propriedade. Com a aplicao da
carga, a possvel quebra dos cristais de hidrxido de clcio no
proporcionou melhora nos nveis de resistncia trao do concreto. A
possvel recuperao parcial de microfissuras formadas no suficiente
para manter os nveis de resistncia trao em patamares de referncia
(sem carregamento), pois se um nmero considervel de microfissuras
formado necessrio que todas sejam recuperadas para a manuteno dessa
propriedade.
A interao entre o percentual de pr-carregamento e a idade de
pr-carregamento tambm foi analisada. Os grficos dessa interao podem
ser visualizados na Figura 11.
A partir dos grficos da Figura 11 pode-se observar que os
concretos que foram pr-carregados em maiores idades tiveram maiores
valores de resistncia trao. medida que aumentava o percentual
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de carregamento, diminuam os valores de resistncia trao, para
todos os cimentos estudados, exceto para o CPIV RS, cujos valores
permaneceram em patamares estveis. Nos percentuais de 75% de
carregamento, a perda de resistncia trao chega a 15%,
aproximadamente, em todas as idades de carregamento quando
comparado aos valores de referncia (sem carregamento).
Nessa configurao possvel verificar a influncia do
pr-carregamento na trao e pode-se, de alguma forma, relacionar a
perda de resistncia trao com a formao e propagao de microfissuras,
em funo do carregamento precoce. Para Neville (1997), seria possvel
representar os critrios de fissurao e ruptura do concreto
substituindo vrios fatores atuando conjuntamente (cura, tipo de
cimento, tenses atuantes) por um nico parmetro de resistncia, tal
como a resistncia trao uniaxial. Tal propriedade responde pelo
desencadeamento de um processo de microfissurao na estrutura
interna do concreto, especialmente na zona de transio.
Microestrutura do concreto submetido ao pr-carregamento
Uma forma de constatar o processo de microfissurao por meio da
anlise de imagens, obtidas pelo microscpio eletrnico de varredura.
Essa tcnica permite um maior entendimento da estrutura interna do
concreto submetido a diferentes percentuais de carga. Assim, ser
possvel observar o desenvolvimento e a propagao de microfissuras
que podem ter se formado com a aplicao do carregamento. As anlises
foram realizadas no Centro de Microscopia da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul.
A deteco e visualizao de microfissuras foi possvel atravs da
tcnica de microscopia eletrnica de varredura, realizada em amostras
de concreto com relao a/c de 0,5, idade de carregamento de 7 dias,
percentual de pr-carregamento de 50% e para os cimentos CPV ARI e
CPIV RS.
A Figura 12 apresenta diferentes pontos da zona de interface
entre o agregado e a pasta. Para facilitar a visualizao foram
identificados trs pontos da zona de transio e ampliado em 110 vezes
o grau de detalhe da regio. Tambm foi destacado em cor vermelha o
delineamento da zona de interface entre o agregado grado e a pasta
de cimento.
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Nota-se, pela Figura 11, que no h presena de microfissuras na
regio de interface para os concretos de referncia, ou seja, para as
misturas produzidas com cimento CPV ARI que no receberam
pr-carregamento.
A Figura 13 indica uma condio de microfissurao nas amostras que
receberam 50% de pr-carregamento.
Pela Figura 13 constata-se a presena de microfissuras nos
concretos que receberam pr-carregamento de 50%. O caminho das
microfissuras parece seguir uma trajetria aleatria na pasta de
cimento. Em regies com presena de vazios as microfissuras tendem a
procurar o caminho preferencial para dentro do poro (Figura 13c),
por ser uma regio de grande concentrao de tenses (BARBIRATO, 1999).
Os vazios presentes na argamassa favorecem a propagao das
microfissuras. Por ser uma regio fraca, sem ligao com outros
compostos, a regio que contm poros pode favorecer a formao de
microfissuras. Com a aplicao de carregamento externo os poros
tendem a se deformar em todas as direes, originando possveis
microfissuras decorrentes da concentrao de tenses de trao nessa
regio.
Ao cessar o carregamento, possveis microfissuras formadas tendem
a se recuperar em funo de as reaes de hidratao do concreto ainda
estarem relativamente no incio. Neste trabalho, os corpos de prova
retornavam ao ambiente de cura mida aps receberem a aplicao da
carga, fato que pode ter colaborado para uma possvel recuperao das
ligaes entre os compostos de cimentos que ainda no foram
hidratados.
A Figura 14 apresenta micrografias dos concretos que receberam
pr-carregamento aos 7 dias e logo aps retornavam para a cmara
mida.
-
Pelas imagens apresentadas na Figura 14 pode-se verificar que
houve recuperao das microfissuras causadas pelo carregamento
precoce. Os concretos retornavam cmara mida e as partculas de gua
proveniente do ambiente de cura percolaram para o interior do corpo
de prova, atingindo os interstcios formados pelas microfissuras,
favorecendo a hidratao de compostos ainda no hidratados, que
ficaram expostos com a abertura das microfissuras. Com isso, a gua
que permeou para o interior do concreto possibilitou a colmatao e a
recuperao delas.
Esse comportamento foi verificado para o cimento CPV ARI. Dessa
forma, constata-se que realmente ocorre a hidratao de produtos
ainda no hidratados com a abertura das microfissuras, fato que
contribui para a recuperao da resistncia compresso aps receber
diferentes percentuais de pr-carregamento. No entanto, apesar da
caracterstica de recuperao das microfissuras possvel observar que
nem todas foram fechadas. Como mostra a Figura 14 (b, d, e),
algumas microfissuras formadas no foram recuperadas, apesar das
mesmas condies de cura. Nesse caso, as pontes de microfissuras no
foram interrompidas, ou talvez no tenha percolado gua suficiente
para hidratar os compostos de cimento que ficaram expostos com a
abertura da microfissura. Esse comportamento pode explicar o
desempenho da resistncia trao, na qual no houve melhoria dessa
propriedade com a aplicao da carga em diferentes percentuais.
-
Concluses
Pelo que foi exposto possvel explicar alguns comportamentos
verificados ao longo do trabalho. Com os ensaios de microscopia foi
possvel detectar e visualizar um processo de microfissurao nos
concretos pr-carregados. Alm disso, a recuperao das microfissuras
verificadas corrobora a teoria de que ocorre colmatao autgena,
quebra de cristais mais fracos e hidratao de compostos resistentes
remanescentes, melhorando os valores da propriedade de resistncia
compresso. No entanto, essa recuperao no completa, fato que foi
comprovado na visualizao de microfissuras no recuperadas, o que
pode ter influenciado negativamente nos resultados de resistncia
trao.
De uma forma geral, os resultados puderam comprovar a existncia
de um processo de microfissurao causado pela ao de um carregamento
precoce nos concretos com pouca idade. Tal fato remete a um
problema citado no incio deste trabalho: as aes de construo
decorrentes de um processo acelerado de execuo de uma edificao
devem ser consideradas. Apesar do bom desempenho em relao
resistncia compresso, os valores da resistncia trao foram
prejudicados de alguma forma com a aplicao do carregamento.
A adoo de medidas simples como o respeito aos prazos de cura,
hidratao e evoluo da resistncia do concreto e, principalmente, como
respeito s exigncias normativas reduziria sensivelmente os
problemas decorrentes dessas aes, alm do aprimoramento das tcnicas
construtivas utilizadas. Esses procedimentos poderiam minimizar a
formao de microfissuras no concreto, a baixa resistncia entrada de
agentes agressivos, a baixa resistncia mecnica de trao. Com isso, a
resposta da estrutura a essas aes indevidas, ainda na fase de
construo, seria a reduo do surgimento de manifestaes patolgicas
dessa natureza.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento
Cientfico e Tecnolgico (CNPq) pela concesso da bolsa, sem a qual
esta pesquisa no teria sido realizada.
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Recebido em 24/09/2010 Aceito em 22/01/2011