PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social Desenvolvidas Pelas Empresas em Mato Grosso DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL SÃO PAULO 2008
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP
Tânia Maria Santana dos Santos
A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social Desenvolvidas Pelas Empresas em Mato Grosso
DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL
SÃO PAULO 2008
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP
Tânia Maria Santana dos Santos
A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social Desenvolvidas Pelas Empresas em Mato Grosso
DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutora em Serviço Social sob a orientação da Professora Doutora Mariângela Belfiore Wanderley.
SÃO PAULO 2008
Banca Examinadora ________________________________________
Mariangela Belfiore Wanderley
____________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
A Mariana, minha querida filha.
A minha mãe Sônia e ao meu pai Isaac (in memóriam) pelo amor e apoio de sempre.
A Odete Toni, amiga querida, que, aos 91 anos de
idade, mantém a lucidez e a disposição de aprender
coisas novas e fazer o que parece impossível.
AGRADECIMENTOS
Não poderia deixar de agradecer àquelas pessoas que, de alguma forma, contribuíram para que esta tese se concretizasse.
A Mariangela Belfiore Wanderley que, de modo competente, se fez presente e não mediu esforços durante todo o processo de orientação, tendo uma paciência infinita com a minha falta de disciplina.
Às amigas Izabel Cristina Dias Lira, Samira Lotfi Rocha da Silva e ao meu amigo Gilberto Haas, que acompanharam de perto o desenvolver desta tese, apoiando estimulando e incentivando.
Às Professoras Dilséa Adeodata Bonetti, Raquel Raicheles e Eloísa Helena de S. Cabral pelas valiosas críticas e sugestões durante a qualificação.
Às professoras Carmelita Yazbek , Maria Lúcia Martinelli e ao professor Evaldo Amaro Vieira, pela disponibilidade e carinho durante todo o curso.
Às amigas Ana Paula Soubhia, Isabel Arruda, Silvina Carro, Sônia Regina Nozabielli, Áurea Eleotério S. Barroso, Milene Alves Secon., Maria Conceição Silva, Cleonice Correa Araújo, e ao Fu Wen Hsien (Renato) pela convivência acadêmica e extra-acadêmica que foram de importância fundamental.
A Elóa Lourenço, Geni Catarina, Ilza Ferraz, Vera Lúcia Pinheiro, Enir Moreira, Laíde Ferroni, Wilson Cunha, Ruben Fábio Ferreira e Virgilio Ferreira, pela amizade e estímulo de longos anos.
À minha família que, como toda “tribo” que se preza, é numerosa e significa muito em minha vida. Dela fazem parte: Sônia, minha mãe, Márcia, Consuelo, Rose Mary (irmãs) Neto, Robério e Roberto (irmãos), Beto e Marçal (cunhados) Ana Carolina e Lucinéia (cunhadas) e meus sobrinhos Ana Carolina, Daniel, Celina, Karina, Pedro Henrique, Ana Luiza, Júlia, Rafael, João Gabriel e João Paulo.
Ao Jaime Giolo, pelo jeito singular de dar apoio e estímulo.
À Universidade Federal de Mato Grosso que me forneceu condições e apoio fundamentais para a realização do doutorado.
Ao Departamento de Serviço Social da UFMT, pela liberação para o doutorado.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior-CAPES - pelo apoio material, sem o qual não poderia ter cursado o doutorado.
Às empresas: Rede CEMAT – Centrais Elétricas de Mato Grosso, ELETRONORTE, AÇOFER, Usinas Itamaraty, Empresa Brasileira de Correios
e Telégrafos de Mato Grosso pela disponibilidade e presteza com que me receberam para a realização da pesquisa.
Aos gestores: Paulo Cogima, Jéferson Kopak, Gilmar Ivens Ribeiro, Luís Clemente, Rose Soares Souza, Cristina Souto Melo, Andréia Freitas Morais e às assistentes sociais: Maria Rosilene M. Medeiros, Inara Coga, Josiane Rita S. Dias, Jirlaine Moreira Leal, Carmem Santos e Silva, Maria de Lourdes Turbino, pela valiosa colaboração.
A Luísa Soares de Morais e a Kátia Cristina Silva pela presteza e solicitude que sempre me dispensaram.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABRH Associação Brasileira de Recursos Humanos
AMM Associação Mato-grossense dos Municípios
AUDIPE Associação dos Auditores Públicos do Estado
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento
CPI Comissão Parlamentar de Inquérito
CPT Comissão Pastoral da Terra
CRESS Conselho Regional de Serviço Social
FACER Faculdade Cenecista de Rondonópolis
FAMATO Federação da Agricultura de Mato Grosso
FIEMT Federação das Indústrias de Mato Grosso
FECOMÉRCIO Federação do Comércio
FGV Fundação Getúlio Vargas
GIFE Grupo de Institutos, Fundações e Empresas.
IBASE Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
IES Instituições de Ensino Superior
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
ONG’s Organizações Não Governamentais
PIB Produto Interno Bruto
PNBE Pensamento Nacional das Bases Empresariais
SEPLAN Secretaria de Planejamento
SESI Serviço Social da Indústria
SINAES Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior
SINCON Sindicato de Contabilidade
UNOPAR Universidade do Oeste do Paraná
UNITINS Universidade do Tocantins
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Mato Grosso: população – 1975 e 2005................................... 30
Tabela 2 – Investimento social privado, por região: montante de recursos investidos e comparação com o PIB, 2000 e 2004........................
93
RESUMO
SANTOS, Tânia Maria Santana dos. A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social Desenvolvidas Pelas Empresas em Mato Grosso. Tese (Doutorado). Programa de Serviço Social, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo. 2008.
Esta tese tem o objetivo de analisar a atuação do assistente social nas ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas de Mato Grosso. Para alcançarmos este objetivo buscamos estabelecer as devidas conexões entre os três eixos que consideramos de importância fundamental, e que são: - A questão social que, no nosso entendimento, se constitui em elemento central da relação entre a profissão de Serviço Social e a realidade, considerando que o objeto de trabalho do assistente social é a questão social nas suas múltiplas expressões; - A profissão de Serviço Social, enquanto profissão inscrita na divisão social e técnica do trabalho e o assistente social na condição de trabalhador assalariado que, como qualquer outro trabalhador, tem que vender a sua força de trabalho para sobreviver; - a responsabilidade social empresarial entendida como estratégia de gestão utilizada pelas empresas que em busca de legitimação social lançam mão de estratégias que venham incorporar novas dimensões aos seus negócios. Em outras palavras, a responsabilidade social como parte da racionalidade empresarial para manter-se no mercado globalizado. Assim, a partir desses eixos e dos depoimentos dos sujeitos (gestores e assistentes sociais) que desenvolvem sua atuação profissional em empresas no Estado de Mato Grosso, buscamos desenvolver o estudo proposto, ou seja, a análise da atuação do assistente social nas ações de responsabilidade social empresarial em Mato Grosso.
Palavras-chave: questão social, atuação profissional, responsabilidade social.
ABSTRACT
SANTOS, Tânia Maria Santana dos. The social worker’s performance in the practices of social responsibility developed by the enterprises of Mato Grosso. Thesis (PhD). Programme of Social Service, Pontifical Catholic University of São Paulo, São Paulo. 2008.
This thesis aims at analyzing the social worker’s performance in the practices of social responsibility developed by the enterprises of Mato Grosso. To reach this aim we sought to establish the proper connections among the three axes that we consider of extreme importance that are: The social issue, which according to our point of view is the central element of the relation between the profession of Social Work and the reality, considering that the object of work of the social worker deals with social issues in their multiple expressions; The Social Work as a profession registered in the social and technical division of work and the social assistant in the condition of an employee that, as any other worker, has to; sell his work force to survive, The entrepreneurial social responsibility understood as a management strategy used by the enterprises that in search of social legitimization use strategies that can embody new dimensions to their businesses, in other words, the social responsibility as part of an entrepreneurial rationality to keep itself in the globalized market. So, through these axis and the individuals’ testimonies (managers and social workers) who develop their profession in Mato Grosso enterprises, we try to develop this study, that is, the analysis of the social worker’s performance in the practices of entrepreneurial social responsibility in Mato Grosso.
Keywords: social issue, professional performance, social responsibility.
SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS...................................................................... 13
1. CAPÍTULO I - CONTEXTO: O ESTADO DE MATO GROSSO............... 29
2. CAPÍTULO II - A SEMPRE E VELHA QUESTÃO SOCIAL..................... 37
2.1 As transformações societárias e a intensificação da questão social no Brasil.......................................................................................
41
2.2 A questão social e suas manifestações nos tempos da globalização e do neoliberalismo...........................................................
55
2.3 A Reforma do Estado no Brasil........................................................ 58
3. CAPÍTULO III - RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL..... 63
3.1 O conceito e suas origens................................................................ 63
3.2 Responsabilidade social: contexto e percurso................................. 69
3.3 Responsabilidade social empresarial no Brasil................................ 81
3.4 Breve mapeamento da responsabilidade social no Brasil............... 88
4. CAPÍTULO IV – A ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NAS AÇÕES DE RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS EM MATO GROSSO.........................................................................................
99
4.1 Responsabilidade social empresarial: o entendimento dos sujeitos 99
4.2 O porquê das ações de responsabilidade social............................. 106
4.3 O marketing...................................................................................... 111
4.4 O público - alvo das ações............................................................... 116
4.5 A avaliação das ações de responsabilidade social.......................... 117
4.6 O balanço social............................................................................... 119
4.7 As ações de responsabilidade social............................................... 120
4.8 As dificuldades encontradas pelos assistentes sociais no desenvolvimento das ações de responsabilidade social.......................
124
4.9 Há lugar para a atuação do assistente social nas ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas em Mato Grosso?..................................................................................................
125
4.10 O voluntariado................................................................................ 128
4.11 O trabalho do assistente social...................................................... 132
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................... 136
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................ 141
ANEXOS...................................................................................................... 152
ANEXO I...................................................................................................... 153
Instrumental de Entrevista nº. 1............................................................. 153
ANEXO II..................................................................................................... 154
Instrumental de Entrevista nº. 2............................................................. 154
ANEXO III.................................................................................................... 156
LEI N° 7.687, DE 25 DE JUNHO DE 2002 - D.O. 25.06.02................... 156
13
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A idéia desta tese começa com uma questão que parece simples. Como
se dá a atuação dos assistentes sociais nas ações de responsabilidade social
empresarial desenvolvidas pelas empresas em Mato Grosso, neste momento
em que a responsabilidade social empresarial adquire lugar de destaque na
mídia e no discurso, tanto dos empresários como das pessoas em geral,
quando inclusive se ouve falar da responsabilidade social como solução para
os problemas sociais, apesar de sabermos que a realidade não é esta?
A tentativa de entender essa questão levou-nos a trilhar o caminho da
busca pelo entendimento sobre a responsabilidade social empresarial, o
contexto que possibilitou a sua emergência, e de como se dá a atuação
profissional do assistente social nas ações de responsabilidade social
desenvolvidas pelas empresas em Mato Grosso.
Encontramos, na literatura sobre responsabilidade social empresarial,
conceitos diversificados que, no nosso entendimento, evidenciam a
ambigüidade que conforma o tema. Inicialmente, recorremos às publicações do
Instituto ETHOS de Responsabilidade Social, aos documentos do Grupo de
Institutos Fundações e Empresas – GIFE- e ao Instituto Brasileiro de Análise
Social Empresarial – IBASE-, instituições que no Brasil se destacam nas ações
que se referem à responsabilidade social empresarial.
Constatamos que a bibliografia existente sobre o tema é mais extensa
na área de Administração de Empresas na qual vários autores se dedicam a
escrever e pesquisar sobre a temática. Dentre estes nos remetemos a Patrícia
ASHLEY, Fernando TENÓRIO, Adriano GOMES, SILVA & FREIRE. Não
obstante também termos encontrado importantes subsídios nas áreas das
Ciências Sociais e do Serviço Social. Na primeira, autores como Joana
GARCIA, Eloísa CABRAL, BEGHIN, foram algumas das referências
constantes. No Serviço Social, a produção sobre a temática da
responsabilidade social empresarial pode ser considerada significativa,
Carmelita YAZBEK, Carlos MONTAÑO, Nobuco KAMEYAMA, Marilda
14
IAMAMOTO, dentre outros autores se debruçaram sobre o tema da
responsabilidade social empresarial que, junto com o terceiro setor, vem
merecendo uma atenção maior. Pautamos-nos também em jornais e revistas
de circulação nacional e em artigos capturados na internet. Enfim buscamos
conhecer tudo aquilo que pudemos coletar sobre o tema eleito para estudo, o
que nos leva a afirmar que é um tema que vem despertando a atenção não só
da mídia, mas também de estudiosos que têm procurado refletir e contribuir
para o entendimento da responsabilidade social empresarial, no país.
Partimos do pressuposto de que a ação social dos empresários no Brasil
não constitui novidade, como também não parece ser novidade a atuação
profissional dos assistentes sociais nessas ações. As ações das empresas na
área social remontam vários séculos a exemplo da criação, em 1543,da
primeira Santa Casa de Misericórdia em Santos-SP que já inaugurava a
presença do setor privado nesta área.
No entanto, conforme afirmado por Iamamoto (1988, p. 137), é a partir
da desagregação do Estado Novo, no final da Segunda Guerra Mundial, que
faz-se notar a preocupação do empresariado com o social. Ressalta a autora
que tal preocupação será essencialmente imobilista e controladora voltada para
o disciplinamento do tempo livre conquistado pelo proletariado, ou seja, a
preocupação era cultivar no proletariado um padrão ético-moral e uma
racionalidade de comportamento ajustada à interiorização da ordem capitalista.
Assim, os “benefícios” concedidos aos empregados, pelas empresas, eram
condicionados ao bom comportamento diante das greves e a uma vida social
regrada. A implantação e o desenvolvimento do Serviço Social no Brasil irão
acontecer neste contexto.
Disso se depreende que o que se apresenta como novo são o interesse
e a dimensão que as ações de responsabilidade social empresarial vêm
assumindo, notadamente a partir da década de 1990 com a reforma do Estado
e o seu conseqüente encolhimento em relação às políticas sociais públicas que
passam a ser incumbência da sociedade civil e do mercado, como se estes
fossem os responsáveis pela resolução dos problemas sociais. Toda essa
15
situação traz à cena duas visões antagônicas em relação às respostas que
devem ser dadas para as demandas sociais.
De um lado, a sociedade civil e as empresas são conclamadas a
compartilhar com o Estado a responsabilidade pelo equacionamento ou
minimização dos problemas decorrentes das seqüelas da questão social que
se expressam de várias formas e crescem de modo jamais visto. De outro lado
é o momento em que também se faz presente a defesa de políticas públicas
universais e de qualidade que além de serem consideradas ultrapassadas, são
tidas como responsáveis pela crise que conforma o Estado, segundo a ótica
daqueles que defendem a reforma do Estado.
Mas, apesar dos antagonismos em relação às formas de enfrentamento
das seqüelas da questão social, este foi o contexto propício para o surgimento
da responsabilidade social empresarial nos moldes em que é concebida na
atualidade.
Neste sentido, pensamos que não podemos dissociar a responsabilidade
social empresarial da questão social tal qual se apresentava no país na década
de 1990. Período marcado pelo crescimento desenfreado do desemprego, que
certamente não se constitui no único problema, mas que tem conseqüências
desastrosas, aliado à precarização do emprego e à informalidade.
No caso do Serviço Social, os assistentes sociais, tanto quanto outros
trabalhadores vêem-se atingidos no processo de inserção no mercado de
trabalho. Convivem no seu cotidiano profissional com o crescimento do
desemprego, do subemprego, da informalidade, além de serem afetados no
desenvolvimento da sua atuação profissional, considerando que as políticas
sociais, que se constituem em suporte material da ação profissional dos
assistentes sociais sofrem diretamente o impacto do encolhimento do Estado
em relação à área social, tornando-se cada vez menos eficazes, mais pontuais
e focalizadas.
Presencia-se, assim, aquilo que Yazbek se refere como
“refilantropização da questão social” ou, como a constituição de uma “nova
16
cultura de solidariedade”, onde os dinamismos confessionais, comunitários e
humanitários que caracterizavam as ações voluntárias há séculos são
substituídos por ações que se conformam como parte de uma cidadania ativa
ou participativa relacionada com eficiência e resultados.
Assim, torna-se pertinente considerar, como nos lembra Iamamoto
(1989, p.79) que o momento histórico social que estamos vivendo traz desafios
que devem ser enfrentados com coragem e, sobretudo, com competência.
Enfim, estes tempos novos trazem a exigência de um profissional que, além de
competente, seja capaz de decifrar as gêneses dos processos sociais, suas
desigualdades e as estratégias de ação para enfrentá-las, que não recuse as
tarefas que lhe são socialmente atribuídas, mas que lhes atribua um tratamento
teórico-metodológico e ético político diferenciado. O que requer uma nova
natureza do trabalho profissional.
O discurso viabilizado pela mídia e enfatizado pelas empresas leva a
que as seqüelas da questão social sejam abordadas de uma outra forma, ou
seja, passem a ser objeto da solidariedade tanto da sociedade de uma forma
geral, como por parte das empresas que começam a ser consideradas
importantes agentes de transformação social o que as leva a financiar ou a
participar da implementação ou viabilização das ações sociais que antes eram
da competência do Estado.
Consideramos que a responsabilidade social empresarial se constitui em
uma estratégia de enfrentamento utilizada pelas empresas para garantir a sua
permanência no mercado neste momento de ebulição econômico-social e
política que estamos vivenciando e que reflete um movimento mundial cuja
repercussão tem se feito presente em todas as instâncias da vida dos
indivíduos e, obviamente afetado as profissões que se vêem obrigadas a se
redefinirem e a se repensarem.
Foram essas reflexões que despertaram em nós a curiosidade e a
vontade de realizar um estudo sobre a atuação do assistente social nas ações
de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas. Acreditávamos que
a ênfase que era dada à responsabilidade social empresarial poderia contribuir
17
para a ampliação dos espaços de atuação dos assistentes sociais na área
empresarial, que sabemos se constituir, pelo menos no Estado de Mato
Grosso, em espaço restrito de atuação profissional. Assim, estudar este tema
seria mais uma oportunidade de refletir sobre a atuação do assistente social
face às transformações que estão ocorrendo na realidade.
Assim, várias foram as indagações que nos conduziram à aproximação
do tema, mas que podem ser resumidas em três principais:
• Em que consiste a responsabilidade social desenvolvida pelas
empresas em Mato Grosso?
• Como a responsabilidade social empresarial é concebida pelos
assistentes sociais que trabalham nas empresas em Mato Grosso?
• Como se dá a atuação do assistente social nas ações de
responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas em Mato
Grosso?
Acreditamos, como afirma Michel Thiollent (1986, p.56), que as
hipóteses funcionam como diretrizes, como fios condutores de qualquer estudo.
Assim, ao propor desenvolver este estudo, também tínhamos as nossas
hipóteses. Partimos do pressuposto de que a responsabilidade social
empresarial emerge num contexto de simultaneidade entre a redução de
políticas públicas decorrentes do ajuste fiscal imposto ao Estado e que
culminou na sua reforma, e a abertura do espaço às ações sociais privadas, o
que possibilitou ao empresariado e à sociedade civil assumirem atribuições que
antes eram da competência do Estado.
Assim, o que era garantido como direito passa a ser objeto da
solidariedade e os assistentes sociais, apesar de reconhecerem que a
responsabilidade social empresarial se configura como um espaço ocupacional
vêem com certa desconfiança a sua atuação ali, ou por não se sentirem
capacitados, ou pelo fato de não acreditarem que as ações desenvolvidas
pelas empresas possam equacionar os problemas decorrentes das diversas
expressões da “questão social” ou ainda por acreditarem que o que se tem
presenciado é a emergência de um novo tipo de arranjo que põe por terra o
contrato social e o substitui pela mediação das organizações sociais privadas.
18
Foi com esse entendimento que nos aproximamos do objeto de estudo,
acreditando que a pouca inserção dos assistentes sociais nas empresas que
desenvolvem ações de responsabilidade social em Mato Grosso era decorrente
da rejeição, por parte dos profissionais em assumirem os projetos sociais
viabilizados pelas empresas.
Para o desenvolvimento deste estudo sentimos a necessidade de
estabelecer conexões entre três eixos que consideramos fundamentais:
a) A questão social, enquanto elemento central e constitutivo da relação
entre a profissão de Serviço Social e a realidade, considerando que o
assistente social tem como objeto de trabalho as suas múltiplas expressões, a
partir das quais desencadeia a sua relação com a população, a sua demanda
profissional, o seu trabalho. Nesse sentido, considera-se que a questão social
não é uma questão meramente estrutural, mas que supõe lutas e que se
expressa na vida concreta dos indivíduos1. Assim, acreditamos que a questão
social adquire novas configurações e se intensifica nos diferentes contextos
histórico-sociais, incidindo em todos os aspectos da vida social e no mercado
de trabalho do assistente social.
b) A profissão de Serviço Social, enquanto profissão inscrita na divisão
social e técnica do trabalho e o assistente social na condição de trabalhador
assalariado que tem sua inserção no mercado de trabalho mediada pela
compra e venda da sua força de trabalho, o que envolve necessariamente a
incorporação de parâmetros institucionais e trabalhistas que regulam as
relações de trabalho consubstanciadas no contrato de trabalho e estabelecem
as condições em que esse trabalho se realiza, bem como prevê a
particularização de funções e atribuições decorrentes da normatização
institucional que regula a realização do trabalho coletivo no âmbito dos
organismos empregadores, públicos e privados.
1 É pertinente lembrarmos o que aponta Iamamoto (2002, p.13) em relação ao fato de a questão social não se ater apenas à estrutura, mas se traduzir na vida cotidiana. ”Temos diferentes níveis de abstração da análise e da compreensão da questão social, diz ela. Desde esse maior (...) às particularidades nacionais regionais, culturais, sem as quais essa forma de sociabilidade se expressa nos Estados Nacionais, mas também em função da particularidade, da singularidade dos sujeitos que vivem permeados pelas suas características enquanto sujeitos únicos e singulares”.
19
c) A Responsabilidade Social Empresarial: como uma estratégia de
gestão utilizada pelas empresas que, para sobreviverem no mercado
globalizado, têm que incorporar novas variáveis que as legitimem perante a
sociedade. Em busca de legitimação as empresas são impulsionadas a
incorporar novas dimensões aos seus negócios, que estão além da
organização econômica e que dizem respeito à vida social, cultural e à
preservação ambiental. 2
A realidade social contemporânea é uma recorrência obrigatória quando
se pensa em analisar o trabalho do assistente social, assim fomos buscar
respaldo, em Octávio Ianni, José de Souza Martins, James Petras, David
Harvey, Hobsbawm e outros que nos forneceram os elementos necessários
para discorrer sobre a questão social.
No que se refere à profissão de Serviço Social, ou de forma mais
específica à atuação profissional do assistente social, recorremos a Marilda
Vilela IAMAMOTO, José Paulo NETTO, Carmelita YAZBEK, Nobuco
KAMEYAMA, Carlos MONTAÑO,dentre outros autores, que se destacam no
âmbito do Serviço Social e que têm o Serviço Social como objeto de suas
análises.
Quanto à Responsabilidade Social Empresarial, nos respaldamos na
bibliografia existente sobre o tema que, conforme afirmamos anteriormente, é
mais extensa na área de Administração de Empresas, mas que vem se
expandindo em outras áreas, inclusive no Serviço Social.
Assim, a partir desses eixos de análise buscamos delinear o nosso
universo de pesquisa que seria conformado pelas empresas de Mato Grosso
que desenvolvessem ações de responsabilidade social.
2 Cappellin et alii, 2002, citado por Nathalie Beghin, in. A filantropia empresarial: nem caridade nem direito, p.9.
20
O Universo da Pesquisa
Para a conformação do universo da pesquisa recorremos à listagem das
empresas premiadas com o Certificado de Responsabilidade Social do Estado
de Mato Grosso, 3 e ao levantamento realizado pela FIEMT, SESI, SENAI e IEL
objetivando a realização do “Prêmio SESI Qualidade no Trabalho”.
A partir desses dados, pudemos constatar que foram levantadas 210
empresas do Estado, atingindo um total de 30.179 trabalhadores. As empresas
contactadas foram classificadas nas seguintes categorias: Microempresa, com
até 19 empregados; Pequena Empresa, de 20 a 99 empregados; Média
Empresa de 100 a 499 empregados; Grande Empresa, acima de 500
empregados.
Das 210 empresas, 21, ou seja, 10%, classificadas como Média
Empresa e Grande Empresa desenvolvem ações de responsabilidade social.
Inicialmente, entramos em contato com as 21 empresas que haviam
recebido a certificação de empresas socialmente responsáveis, que, portanto,
desenvolviam ações de responsabilidade social empresarial para verificarmos a
pertinência das informações.
Um segundo passo foi verificarmos a presença do assistente social
nessas empresas. Para isto recorremos ao Conselho Regional de Serviço
Social-CRESS-MT, onde realizamos, no mês de julho de 2006, um
levantamento dos assistentes sociais que atuavam em empresas, através do
qual pudemos constatar que dos 1075 assistentes sociais inscritos, 15 estavam
atuando em empresas que desenvolviam ações de responsabilidade social,
mas nem todos participavam do desenvolvimento dessas ações. 3 O Certificado de Responsabilidade Social do Estado de Mato Grosso foi criado pela Lei nº.
7.687 de 25 de junho de 2002, que instituiu uma comissão formada pela FIEMT, SESI, CRESS,
SINCON, FECOMERCIO, BPW, ABRH, AUDIPE, AMM e FAMATO com a responsabilidade de
avaliar os balanços sociais publicados pelas empresas de Mato Grosso para a concessão dos
certificados de Empresa Socialmente Responsável.
21
A partir desses dados entramos em contato com os assistentes sociais e
com as empresas elencadas. Foi assim que chegamos à definição do nosso
universo de pesquisa que é constituído por 5 empresas, considerando que as
outras empresas, ou não tinham o assistente social no seu quadro, ou não
contavam com a participação deste profissional no desenvolvimento das ações
de responsabilidade social empresarial.
As Empresas:
Eletronorte
Fundada em 1973 a ELETRONORTE tem como maior acionista a
Centrais Elétricas do Brasil S. A, a ELETROBRÁS, com 98,2% das ações. Tem
também como acionistas prefeituras municipais, governos estaduais, empresas
distribuidoras de energia da Região Norte, pessoas físicas e jurídicas.
A empresa conta ainda com duas subsidiárias: a Manaus Energia S.A.,
com atuação em Manaus e a Vista Energia S.A.que atua no Estado de
Roraima. A Eletronorte possui instalações nos nove Estados da Amazônia
Legal(Acre, Amapá, Amazônia, Mato Grosso, Maranhão,Pará,
Rondônia,Roraima e Tocantins).Abrange uma área de mais de cinco milhões
de quilômetros quadrados e um universo populacional de aproximadamente
22,5 milhões de habitantes, um público consumidor de energia da ordem de 17
milhões, sendo 13,4 milhões atendidos pela ELETRONORTE.4
No ano de 2003, foi criada, na empresa, a Assessoria de Ações de
Responsabilidade Social, presente nos nove Estados em que a empresa atua,
através dos Comitês Regionais de Responsabilidade Social.
Rede Cemat
Ainda na década de 1950, mais especificamente em 1958 foi criada a
Centrais Elétricas Mato-Grossenses- CEMAT- com o objetivo de evitar o
4 Dados referentes ao período de 2004/2005. Fonte: Relatório Social da Eletronorte referente aos anos de 2004/2005.
22
colapso do suprimento de energia no Estado. Ao longo dos anos, a CEMAT foi
sendo ampliada passando, além da distribuição de energia, à construção e
exploração de sistemas de geração, transmissão e transformação de energia
elétrica em Mato Grosso.
Em outubro de 1994, a CEMAT abre o seu capital e, de setembro de
1996 a dezembro de 1997, foi administrada pelo Governo do Estado em
parceria com a Eletrobrás, sob a intervenção do BNDES.
A partir de novembro de 1997, a energia elétrica em Mato Grosso passa
a ser distribuída pelo Grupo Rede, que, em meio a um processo de
privatização conduzido pelo Governo do Estado, Eletrobrás e BNDES,
comprou, em um leilão, a concessionária CEMAT.
Atualmente a energia elétrica distribuída pelo Grupo Rede, em Mato
Grosso, abrange uma área de 903.358 quilômetros quadrados, beneficiando
827.762 unidades consumidoras, atendendo a uma população de 2800.000
pessoas, em 141 municípios do Estado.
Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos de Mato Grosso
Até 1890, Cuiabá mantinha-se isolada quanto aos meios de
comunicação rápidos e modernos (ALENCASTRO, 2003, p, 45). Só em 1892 é
que foi criado o Distrito Telegráfico de Mato Grosso, que administrava os
508.939 metros de linhas existentes até o Araguaia. Entre 1900 e 1906, a rede
telegráfica foi estendida de Cuiabá a Corumbá, e, a partir de 1907, o Coronel
Cândido Mariano da Silva Rondon empreendeu uma nova etapa na cidade de
Cáceres. No final de 1930, no início da interventoria de Filinto Muller foi
construído o novo prédio dos Correios e Telégrafos na Praça da República,
onde até hoje funciona a Agência Central dos Correios, em Cuiabá.
Açofer
Fundada na cidade de Várzea Grande-MT em 06 de março de 1979, a
AÇOFER era uma “pequena casa de comércio de ferros e chapas de aço para
serralheria”. Em junho de 1980, muda suas instalações para Cuiabá sendo
23
transferida em 1989 para o Distrito Industrial de Cuiabá-MT onde está até hoje.
Ali são processados todos os produtos a serem remetidos para as suas 17
filiais que estão localizadas nos Estados de Mato Grosso, Rondônia e Acre.
Atualmente a AÇOFER é considerada líder de mercado nos segmentos
de produtos siderúrgicos e esquadrias metálicas.
Usinas Itamaraty
A Usinas Itamaraty está localizada em Nova Olímpia-MT, cidade que fica
a 200Km a noroeste de Cuiabá, capital do Estado de Mato Grosso.
Criada em 1980, teve a sua primeira safra em 1983. Atua na produção
de álcool, açúcar cristal e refinado, energia elétrica (co-gerada da cana de
açúcar).
Emprega 3.800 pessoas a cada safra, sendo 2.500 mãos-de-obra fixas
que são distribuídas em 7 cidades da região: Arenápolis, Barra do Bugres,
Assari, Progresso, Denise, Nova Olímpia e Tangará da Serra.
Essas são as empresas que conformam o nosso universo de pesquisa a
partir das quais pudemos eleger os sujeitos que nos prestaram as informações
que subsidiaram este estudo.
Os Sujeitos:
Nesta tese as fontes orais têm lugar privilegiado, mas sempre
considerando o que nos ensina Tereza Caldeira (1992, p.70) "é necessário
acumular informações das fontes mais variadas”. Assim, as revistas, os jornais
e os livros constituíram fontes a que recorremos, objetivando ampliar o leque
de informações sobre a temática em estudo.
O critério para a escolha dos assistentes sociais era o de que
estivessem atuando em empresas que desenvolvessem ações de
responsabilidade social. Quanto aos gestores, seriam entrevistados aqueles
indicados pelas empresas que, conforme nos referimos, deveriam desenvolver
24
ações de responsabilidade social empresarial e ter o assistente social
participando efetivamente do desenvolvimento dessas ações. Assim, foram
escolhidos como sujeitos da pesquisa:
a) Assistentes sociais que estavam atuando em empresas que
desenvolvem ações de responsabilidade social.
b) Gestores de empresas que desenvolvem ações de responsabilidade
social empresarial em Mato Grosso cujo assistente social esteja participando
dessas ações.
Fizemos um primeiro contato por telefone e, posteriormente,
formalizamos a solicitação através de ofício. Inicialmente a pretensão era
realizarmos dez entrevistas, ou seja, com um assistente social e um gestor de
cada empresa, mas, no total foram treze as entrevistas realizadas.
O que pode ser justificado considerando que em uma das empresas a
responsabilidade social ficava a cargo de duas assistentes sociais (uma na
responsabilidade social interna e outra na responsabilidade social externa).
Nessa empresa, nos foi indicada a coordenadora do Comitê de
Responsabilidade Social para ser entrevistada, no entanto, em momento
posterior, o gestor se propôs a dar a entrevista. Assim, foram realizadas quatro
entrevistas na mesma empresa. Em outra empresa foram designadas, pelo
presidente, para serem entrevistadas, duas pessoas encarregadas pela
responsabilidade social da empresa e a assistente social. Assim foram
entrevistados seis assistentes sociais e sete gestores.
Trechos das entrevistas serão citados ao longo da tese e suas
referências obedecerão às seguintes convenções:
• P.1. Assistente Social graduada pela UFMT. Trabalha há trinta e um
anos na empresa, sendo cinco anos com programas de voluntariado.
• P.2. Assistente Social graduada pela UFMT, em 2001. Trabalha na
empresa há três anos.
25
• P.3. Assistente Social graduada pela Universidade de Uberlândia-
MG, em 1983. Trabalha na empresa há 22 anos.
• P.4. Assistente Social graduada pelas Faculdades Integradas Toledo
de Ensino, em 1998. Trabalha há dois anos na empresa.
• P.5. Assistente Social graduada, em 2005, pela UFMT. Trabalha na
empresa desde agosto de 2006.
• P.6. Assistente Social graduada, em 1995, pela UFMT. Trabalha na
empresa há dez anos.
• G.1. Diretor de Gestão de Pessoas de uma das empresas. É
graduado em Administração de Empresas.
• G.2. Gerente de Recursos Humanos. É graduada em Psicologia.
• G.3. Superintendente Regional de uma das empresas. É graduado
em Engenharia Elétrica.
• G.4. Médico do Trabalho da empresa é um dos responsáveis pelas
ações de responsabilidade social desenvolvidas pela empresa.
• G.5. Coordenadora dos Projetos Sociais da Empresa. Graduada em
Biologia.
• G.6. Chefe da sessão de Integração Social e Benefícios de uma das
empresas. É graduado em economia.
• G.7. Assistente de Comunicação, coordenadora do Comitê Regional
de Responsabilidade Social da empresa.
O Processo de Coleta dos Dados Orais:
As entrevistas foram realizadas entre os meses de julho de 2007 e
janeiro de 2008. A demora em concluir deveu-se principalmente à não
disponibilidade de tempo por parte de alguns gestores e a mudanças na
diretoria de uma das empresas.
O contato com os depoentes deu-se através de entrevistas semi-
estruturadas que foram gravadas seguindo um roteiro previamente elaborado,5
5 Roteiro em anexo.
26
que consistiu de questões abertas, possibilitando ao entrevistado dar livre
curso ao seu pensamento. O roteiro foi baseado nos seguintes itens principais:
1. Concepção de responsabilidade social empresarial.
2. Ações sociais desenvolvidas pela empresa.
3. Responsabilidade pelo desenvolvimento das ações sociais.
4. Participação, enquanto assistente social, nas ações
desenvolvidas pela empresa.
5. Perfil profissional exigido para que o assistente social possa
desenvolver as ações de responsabilidade social na empresa.
6. Dificuldades encontradas, enquanto assistente social, na
elaboração ou desenvolvimento das ações de responsabilidade
social desenvolvidas pela empresa.
7. Avaliação das ações de responsabilidade social.
8. Elaboração do balanço social.
As entrevistas foram gravadas e transcritas pela autora que considera
enriquecedor não delegar a tarefa para outras pessoas, o que, conforme é
apontado por Maria Izaura Pereira de Queiroz (1992), traz a possibilidade de
reviver ângulos não percebidos no transcorrer da entrevista ou, que tenham
sido considerados secundários, além de garantir a fidelidade por ser o próprio
investigador quem estava presente durante a entrevista.
Cada entrevista teve entre quarenta minutos e duas horas de duração.
A Análise dos Dados
A análise dos dados teve início tão logo concluímos as entrevistas. Não
obstante concordarmos com Ludke e André (1986, p.45), quando afirmam que
a análise está presente em vários estágios da investigação e que o que ocorre
é que ela se torna mais sistemática e mais formal após o encerramento da
coleta de dados. Para as referidas autoras, nós fazemos uso de procedimentos
analíticos quando procuramos verificar a pertinência das questões
selecionadas frente às características específicas da situação estudada.
Tomamos então várias decisões sobre áreas que necessitam de maior
27
exploração, aspectos que devem ser enfatizados, outros que devem ser
eliminados e novas decisões a serem tomadas. Essas escolhas são feitas a
partir de um confronto entre princípios teóricos do estudo que vai sendo
“aprendido” durante a pesquisa, num movimento constante que perdura até a
fase final do relatório.
Assim, para a realização da análise formal e final das informações
colhidas através das entrevistas, lançamos mão da análise de conteúdo que é
considerada tanto como “método de tratamento e análise de informações,
colhidas por meio de técnicas de coleta de dados”, (Cf. CHIZZOTTI, 1991)
quanto como “um conjunto de técnicas” (Cf. MINAYO, 1994; BARDIN, 1977).
A opção pela análise de conteúdo pautou-se no entendimento de que é
uma técnica que se aplica à análise de textos escritos ou de qualquer
comunicação (oral, visual, gestual) reduzida a um texto ou documento,se
adequando perfeitamente à análise das entrevistas. Um outro aspecto
importante em relação à escolha da análise de conteúdo é o fato de ser uma
técnica utilizada com o objetivo de compreender criticamente o sentido das
comunicações, seu conteúdo manifesto ou latente e as significações explícitas
ou ocultas (MINAYO, 1995).
Está tese está dividida em quatro capítulos. No primeiro, discorremos
sobre o Estado de Mato Grosso, contexto no qual está inserido o nosso objeto
de estudo, Enfocamos a localização fronteiriça, a expansão desenfreada na
década de 1970, as atividades econômicas ali desenvolvidas, o
estabelecimento de latifúndios e grilagem de terras que, dentre tantos outros
problemas refletem as seqüelas da questão social no Estado e que têm
causado sérios problemas sociais e ambientais culminando na violência que
conforma o Estado.
No segundo capítulo, tratamos da questão social no Brasil. Partimos do
seu surgimento na década de 1930,quando passa a ser reconhecida como
questão política em meio aos impactos da industrialização, enfocando as várias
feições assumidas ao longo dos anos nas diferentes conjunturas até chegar à
realidade atual, quando as suas múltiplas expressões assumem proporções
28
alarmantes e incontroláveis. Neste sentido as seqüelas mais evidentes são o
desemprego crescente e a precarização do emprego que repercutem
diretamente na atuação profissional do assistente social.
O terceiro capítulo traz a discussão sobre a responsabilidade social
empresarial. Começamos com as ambigüidades que conformam o conceito, a
forma como as instituições consideradas de referência na área da
responsabilidade social, como o Instituto ETHOS de Responsabilidade Social,
o IBASE, o GIFE, definem a responsabilidade social empresarial e discorremos
sobre o desenvolvimento da responsabilidade social empresarial no Brasil e em
Mato Grosso.
No quarto e último capítulo, tratamos da atuação profissional do
assistente social nas ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas
empresas em Mato Grosso. Procuramos, a partir do que é expresso pelos
sujeitos, analisar o que pensam, em que consiste e como se dá a atuação dos
assistentes sociais nas ações de responsabilidade social desenvolvidas nas
empresas do Estado.
Finalmente, nas considerações finais procuramos pontuar alguns
aspectos que consideramos importantes e que acreditamos possam vir a
subsidiar estudos e ações futuras.
29
1. CAPÍTULO I - CONTEXTO: O ESTADO DE MATO GROSSO
“Era grande a dificuldade de convencer os profissionais a virem para
Mato Grosso, à distância e a fama de ser um deserto apavoravam.” 6
O Estado de Mato Grosso fica situado na região Centro-Oeste do Brasil
e tem como capital a cidade de Cuiabá. Ocupa uma área de 903.357.908 km²,
sendo, em tamanho, o terceiro Estado da Federação, vindo após os Estados do
Amazonas e do Pará. Tem localizado no seu espaço geográfico o marco do
Centro Geodésico da América do Sul e faz limite com a Bolívia e com os
Estados brasileiros de Rondônia, Amazonas, Pará, Tocantins, Goiás e Mato
Grosso do Sul. É um estado que tem grande parte da sua área integrando a
Amazônia Legal que é constituída pelo norte de Mato Grosso, pelos estados da
região norte, exceto o sul de Tocantins, e pelo oeste do Maranhão,
compreendendo uma área que corresponde, aproximadamente, a 60% do
território brasileiro.
A localização fronteiriça, o fato de fazer parte da Amazônia e de
interligar o norte ao todo nacional fizeram com que o Estado de Mato Grosso
ganhasse evidência ao nível da nação.
É um Estado cuja importância geopolítica e econômica já era
reconhecida desde o Brasil Colônia. Teve seus períodos de decadência, mas
retomou seu crescimento no período do Estado Novo, quando o
desenvolvimento e a conquista do Centro-Oeste figuravam como idealizações
do governo de Getúlio Vargas que tinha como um dos objetivos a
implementação de uma política de desbravamento e integração da região
Centro Oeste ao resto do país, o que levou o Estado de Mato Grosso,
considerado de localização periférica em relação ao centro desenvolvido do
país, a destacar-se no cenário político nacional.
As terras férteis e baratas povoam os sonhos dos camponeses que
rumam para o estado, pensando encontrar, enfim, um lugar apropriado para a 6 Fala da professora Neuza Machado durante uma entrevista realizada em 04/08/1992 referindo-se a criação do curso de Serviço Social em Mato Grosso.
30
realização de suas vidas. A decepção, porém, chega antes do final do percurso
e centenas de migrantes só conseguem chegar até Cuiabá e acabam por parar
nas periferias da cidade.
As décadas de 1960, 1970 e 1980, por conta do fluxo migratório,
definem o perfil atual do Estado de Mato Grosso em termos de ocupação.
Tabela 1 - Mato Grosso: população - 1975 e 2005
DISCRIMINAÇÃO 1975 2005 Var Abs
Número de Municípios 31 142 111
População total 764.570 2.803.274 2.038.704
Fonte: 1975 - Anuário Estatístico SEPLAN 1996; e 2005 - Estimativa IBGE
FIEMT/Assessoria econômica/dados elaborados.
Em 1975, a área geográfica do Estado de Mato Grosso era formada por
31 municípios, passando em 2005 para 142, ou seja, teve um crescimento de
358% em 30 anos.
A população total que, em 1975, era de 764.570 passa, em 2005, a ser
de 2.803.274, apresentando um crescimento de 267%.
Pode-se afirmar que a ocupação de Mato Grosso deu-se, entre outras
razões, em decorrência de políticas implementadas pelo governo que
objetivava ocupar as regiões mais remotas do país, através de projetos de
colonização, estabelecimento de agropecuárias e assentamento do homem no
campo. No entanto, há que se ressaltar que esse desenvolvimento acelerado
não ocorreu sem problemas. A estrutura urbana do Estado não suporta a
velocidade com que o processo de desenvolvimento ocorre. A rede de
equipamentos sociais não consegue suprir as demandas e as conseqüências
não se fazem esperar: falta de saneamento básico, falta de infra-estrutura
básica nos setores educacional, saúde, transporte coletivo, falta de moradia e
falta de emprego.
É pertinente a análise desenvolvida por Martins (1982) em relação ao
processo de ocupação do território brasileiro e, de modo mais específico, da
31
região amazônica. Para ele a idéia de zona pioneira é ambígua e insatisfatória
porque “a rigor nós não temos autênticas zonas pioneiras”. Esse conceito, ou
essa noção,como ele se refere, provém da conhecida “Marcha para o Oeste”,
no século XIX, nos Estados Unidos da América, onde chegou mesmo a
constituir uma teoria da história americana. Ali, os pioneiros eram homens
livres que ocupavam terras igualmente livres do Oeste. No Brasil, as coisas
aconteceram de modo distinto, nem eram tradicionalmente livres os homens
que ocuparam as novas terras nem as terras eram livres. “A rigor nem temos
como contrafação, os pioneiros que lhes correspondem”.
Conforme Martins, o que ocorre na “Amazônia é, uma outra forma de
ocupação que vem de “fora”, dos centros econômica e politicamente
hegemônicos da sociedade brasileira”.7
Para ele, estamos diante de dois movimentos combinados de ocupação
territorial. O primeiro se dá através do deslocamento de posseiros, isto é, a
sociedade nacional, branca, se expande sobre territórios tribais. Essa frente de
ocupação territorial pode ser chamada de frente de expansão. Um segundo
movimento é constituído pela forma empresarial e capitalista de ocupação do
território – é a grande fazenda, o banco, a casa de comércio, a ferrovia, a
estrada, o juiz, o cartório, o Estado. É nessa frente que surge o que em nosso
país se chama hoje, indevidamente, de pioneiro, que são na verdade os
pioneiros das formas sociais e econômicas de exploração e dominação
vinculadas às classes dominantes e ao Estado. Quando se dá a superposição
da frente pioneira sobre a frente de expansão é que surgem os conflitos pela
terra.
Ao que tudo indica esses dois movimentos estão presentes no processo
de ocupação e desenvolvimento do Estado de Mato Grosso. Considerado o
maior estado da região Centro-Oeste, atraiu grandes empresas e interessados
em ocupar terras públicas o que favoreceu o estabelecimento de latifúndios e
de grilagem de terras o que tem culminado em sérios problemas sociais e
7 Conforme Martins há poucos anos os paulistas já eram proprietários de 3,3% da área cadastrada pelo Incra no Acre e Rondônia; 7,9% do Amazonas; 15,3% do Pará; 3,1% do Maranhão; 37,1% de Mato Grosso; 9,6% de Goiás. Cf. Martins 1982, p.69.
32
ambientais. Nos anos de 2004 e 2005 Mato Grosso foi o campeão em
desmatamento da região amazônica. Teve quase 7 mil quilômetros quadrados
de floresta derrubada, dos 19 mil quilômetros quadrados da região amazônica.8
Também ostenta posição de destaque entre os líderes em número de
trabalhadores libertados da escravidão. Dados da Comissão Pastoral da Terra -
CPT-indicam que o Estado está em segundo lugar no ranking das libertações:
4.690 pessoas desde 1995. 9
A violência e a corrupção têm levado o Estado de Mato Grosso a
constante exposição na mídia nacional. Basta ver na imprensa falada ou escrita
o quanto o Estado esteve presente nos últimos anos e, de modo mais acintoso,
no ano de 2006 em escândalos de repercussão nacional como o “Caso das
Sanguessugas” que teve como principais protagonistas empresários de Mato
Grosso envolvidos em um esquema de compras superfaturadas de
ambulâncias que foram distribuídas em todo o país e que culminou na
instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI.
Também estão situados no extremo norte de Mato Grosso os municípios
de Colniza, Aripuanã e Juruena que figuram como os mais violentos do Brasil.
O município de Colniza é o primeiro dentre os 5.560 municípios do país no que
se refere aos índices de violência10.O que pode ser creditado à disputa pela
posse da terra e à exploração de madeira consideradas comuns, na região.
Atualmente, em 2008, o Estado conta com os mesmos 142 municípios,
podendo chegar (conforme projeção populacional do IBGE) a 3.066.046
habitantes em 2010. (Cf. Geografia de Mato Grosso p.8).
A economia do Estado se baseia na indústria extrativista (madeira e
borracha); na agricultura (cana de açúcar, soja, arroz e milho); na pecuária e
8 CF. desmatamento e Poluição seguem o rastro do agronegócio. Disponível em www.reporterbrasil.org.br.Acessado em 20/07/2006. 9 CF. Iniciativas estaduais de combate à escravidão continuam paradas. Disponível em www.reporterbrasil.org.br. Acessado em 31/01/2008. Vanusia Gonçalves 10 Dados provenientes do Mapa da Violência dos Municípios brasileiros, coordenada pelo sociólogo Júlio Jacobo Waiselfisz. Ver entrevista à Revista Ótima, p. 12-15; edição 12, abril de 2007.
33
criações; na mineração (calcário e ouro); e na indústria (metalúrgica e
alimentícia).
Apesar dos aspectos, acima apontados, Mato Grosso é um estado que
vem, a cada dia, se tornando mais integrado à economia mundial. Tem-se
destacado não só como fornecedor de produtos básicos para o mercado
internacional, como também pelo fato de oportunizar investimentos em
diferentes áreas, atraindo assim investidores estrangeiros. Neste sentido, o
setor produtivo agropecuário merece destaque. Conforme dados da FIEMT,
entre 1994 e 2003, a agropecuária cresceu 1000%, com 100% de média
anual11, constituindo junto com o comércio, os segmentos mais dinâmicos na
geração de empregos formais do Estado.
O Produto Interno Bruto-PIB, um dos principais macroindicadores da
economia de uma determinada região geográfica, em um determinado período
de tempo, também traz resultados surpreendentes no que se refere a Mato
Grosso:
MATO GROSSO PIB 1975= US$ 689 milhões;
MATO GROSSO PIB 2005= US$ 4.101 milhões.
Outro aspecto que merece ser ressaltado é o Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH) que é adotado por muitos países da América Latina e também
pelo Brasil. O IDH é calculado a partir dos indicadores de educação
(alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (expectativa de vida ao
nascer) e renda (PIB per capita).
Mato Grosso ocupa a 9ª posição entre os estados brasileiros. Já o Brasil
está na 72ª posição no ranking dos 177 países, superando apenas o Paraguai
e a Bolívia, entre os países da América Latina. No que se refere à educação,
um dos indicadores do IDH, Mato Grosso tem avançado de modo considerável.
Conforme o Censo de 2000 realizado pelo IBGE, a população alfabetizada de
Mato Grosso, no referido ano, somava 1.761.966 pessoas, perfazendo 88,9%,
11 FIEMT 30 anos Análise de alguns indicadores macroeconômicos. Disponível em www.fiemt.com.br. Acessado em 10/01/2006.
34
do total da população residente no Estado com 10 anos de idade ou mais. (Cf.
Geografia de Mato Grosso, p.15).
É em meio a esse processo de expansão do capitalismo no Estado e do
conseqüente acirramento dos problemas sociais, que o Serviço Social, como
uma das profissões requisitadas na operacionalização das políticas sociais
formuladas e implementadas pelo Estado no enfrentamento das seqüelas da
questão social, foi chamado a intervir e dar respostas às demandas da
realidade.12
Vale ressaltar que, diferente do que ocorreu em muitos Estados, em
Mato Grosso a profissão de Serviço Social nasce desvinculada da Igreja
católica. As poucas assistentes sociais que trabalhavam em Mato Grosso, à
época, eram de outros estados e tinham vindo, a convite, prestar serviços nas
instituições de Cuiabá. Segundo o depoimento de uma das primeiras
assistentes sociais a chegar ao Estado, “era grande a dificuldade de convencer
as profissionais a virem para Mato Grosso. A distância e a fama de ser um
deserto apavoravam”. (Neuza Machado, em 04/08/1992).
O Estado de Mato Grosso, (à exceção do Acre que havia sido criado
recentemente e de Rondônia que ainda era território) era, até 1970, o único
estado da federação que ainda não possuía uma universidade federal. A onda
de expansão e de intensificação do fluxo migratório da população de outros
estados para Mato Grosso forçou o governo a promover o desenvolvimento do
estado e a implementar políticas sociais. Assim, várias escolas foram
construídas, sendo ampliado o número de vagas nas escolas de primeiro e
segundo graus, facilitando a proliferação do ensino superior e construída a
Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT.
12 Conforme Maria do Socorro L.Medeiros, as primeiras assistentes sociais de Cuiabá foram contratadas pelas seguintes instituições: SESC, LBA e COHAB-MT no ano de 1965. O que, “representou a comunhão de interesses das classes patronais e do governo em prol da melhoria dos atendimentos sociais às populações economicamente menos privilegiadas (...) passaram a se utilizar do Serviço Social como forma de atenuar os conflitos, ajustar as relações sociais entre patrões e empregados e integrar os mais carentes de recursos na comunidade” (CF.Medeiros, 1984:48-49).
35
A UFMT, localizada em Cuiabá foi construída pelo Governo do Estado,
em meio ao processo de expansão da rede de equipamentos sociais e doada
ao governo federal. A sua criação aconteceu no mês de dezembro de 1970,
pela Lei n° 5.647, em pleno governo Médici, com personalidade jurídica de
Fundação.
O curso de Serviço Social, em Mato Grosso, foi criado na década de
1970, no processo de expansão econômica, respondendo também à
necessidade de formar mão-de-obra qualificada, compatível com as
necessidades da região. Vale lembrar que os anos de 1970, em todo o país,
foram marcados por um processo de expansão da educação.
No final dos anos de 1980 as Instituições de Ensino Superior privadas
começam a fazer parte do cenário mato-grossense e vão ter épocas de pico de
crescimento e de descontinuidade.
Dados relativos à trajetória histórica da distribuição e crescimento das
instituições de Ensino Superior de Mato Grosso, provenientes dos Censos da
Educação Superior de 1991 a 2004 são ilustrativos. 13 Em 1991, Mato Grosso
possuía 17 (IES), 2 públicas e 15 privadas. No ano de 2006, o Estado conta
com 47(IES), cinco públicas e 42 privadas. Registra-se, no Estado, em torno de
10,06% de IES públicas e 89,0% de IES privadas. Não obstante, vale ressaltar
que no ano de 2004 o setor púbico detinha 38,4% das matrículas, isto porque
as duas universidades públicas (federal e estadual) concentravam o maior
número de matrículas das IES do Estado.
Além do curso de Serviço Social da UFMT, Mato Grosso conta com os
cursos de Serviço Social da UNIVAG (Universidade de Várzea Grande), e da
Faculdade Cenecista de Rondonópolis (FACER). Podemos ressaltar também a
existência de duas turmas de cursos a distância promovidos pela Universidade
do Norte do Paraná (UNOPAR) e Universidade do Tocantins (UNITINS) que
revelam o crescimento da tendência de oferta de assistentes sociais, oriundos
das escolas privadas, no mercado. 13 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censos de Educação Superior Brasileira: 1991-2004-Mato Grosso. Brasília: 2006.
36
Esses dados são importantes porque, nos mostram como a privatização
ou mercantilização do ensino repercutem na formação profissional tanto dos
assistentes sociais como também de outros profissionais.
Nesse sentido, é necessário ter presente em que condições essa
formação profissional está se dando. Como também conhecer quem é o aluno
de Serviço Social, quem é o docente do curso de Serviço Social porque com
certeza todos esses aspectos vão repercutir na atuação profissional.
37
2. CAPÍTULO II - A SEMPRE E VELHA QUESTÃO SOCIAL
A expressão questão social não é semanticamente unívoca; ao contrário, registram-se em torno dela compreensões diferenciadas e atribuições de sentido muito diversos (NETTO, 2001, P.41).
Conforme indicações de José Paulo Netto, (2001, p.43), a expressão
questão social começou a ser utilizada nos anos 30 do século XIX em meio aos
impactos da industrialização que teve início na Inglaterra no final do século
XVIII e trouxe à cena o fenômeno do pauperismo. Foi o momento em que se
despertou a consciência para as populações que foram, ao mesmo tempo,
agentes e vítimas da revolução industrial. Mas, como ressalta o referido autor,
a questão social, pela sua amplitude, não pode ser reduzida ao pauperismo, a
questão social está “elementarmente determinada pelo traço próprio e peculiar
da relação capital-trabalho – a exploração”.
Não é, portanto, um fenômeno recente, “ela é tributária das formas
assumidas pelo trabalho e pelo Estado na sociedade burguesa” (IAMAMOTO,
2001, p.11).
No Brasil, o aparecimento da questão social, conforme Iamamoto (1988,
p.127) está diretamente relacionado à generalização do trabalho livre. Assim,
não se pode perder de vista que o país tem o seu passado marcado pela
escravidão, cujas marcas não desapareceram como em um passe de mágica,
pelo contrário, as conseqüências ainda se fazem presentes.
O que se presenciou naquele momento foi um cenário marcado pela
extrema voracidade do capital por trabalho excedente e pela miséria crescente
da população operária constituída, em sua maioria, por imigrantes que viviam
em condições angustiantes tanto de sobrevivência quanto de trabalho.
Conforme escreveu Iamamoto (1998, p.131),
Essa parcela da população amontoava-se em bairros insalubres, junto as aglomerações industriais, em casas infectas, sendo muito freqüente a carência ou mesmo falta absoluta de água, esgoto, luz. Grande parte das empresas funciona em prédios adaptados, onde são mínimas as condições de higiene e segurança, e muito freqüentes os acidentes. (...) O preço da força de trabalho será constantemente pressionado para baixo... a pressão salarial força a
38
entrada no mercado de trabalho das mulheres,e das crianças de ambos os sexos com idade extremamente prematura (...) É comum a observação sobre a existência de crianças operárias de até cinco anos e dos castigos corporais infligidos a aprendizes.14
Essas condições de trabalho e de existência impulsionaram o
proletariado a reagir organizando-se como classe em torno de interesses
comuns.
Naquele contexto, a organização consistia na única via de participação
ativa na sociedade e, conseqüentemente, adquiriu conotação política,
configurando aquilo que ficou conhecido como “questão social” e que ao longo
do tempo assumiu conformações diferenciadas em decorrência do processo de
mundialização do capital que dá “um caráter cosmopolita à produção e
consumo de todos os países e, simultaneamente, radicaliza o desenvolvimento
14 Rui Barbosa em seu discurso sobre “A Questão Social e Política no Brasil”, proferido em 20 de março de 1919 faz um chamado para a situação de miséria e pauperismo em que vivia a classe operária e já ressaltava o descaso das autoridades em relação às providências a serem tomadas.
Trechos do referido discurso nos chamam a atenção: “As fábricas devoram a vida humana desde os sete anos de idade. Sobre as mulheres pesam de ordinário, trabalhos tão árduos quanto os dos homens; não percebem senão salários reduzidos e, muitas vezes, de escassez mínima. Equiparam-se aos adultos, para o trabalho, os menores de quatorze e doze anos. Mas, quando se trata de salários, cessa a equiparação. Em emergências de necessidade todo esse pessoal concorre aos serões. O horário, geralmente, nivela sexos e idades, entre os extremos habituais de nove a dez horas quotidianas de canseira”.
Ao falar sobre a habitação dos operários, recorre ao depoimento dado pelo Dr.Alfredo Leal de Sá Pereira ao Jornal do Comércio, aos 30 de janeiro de 1919: “São habitações sem ar e sem luz, onde adultos e crianças vivem na mais sórdida promiscuidade, onde os mais pudicos, quando obedecem à lei de perpetuação da espécie, abrigam-se por trás de uma cortina rota, quase transparente; onde à noite, em um ambiente fechado, respira o triplo das pessoas que o mesmo poderia comportar; onde os gêneros alimentícios, pendentes das paredes, contribuem para perfumar o ambiente malcheiroso; onde os fogareiros, de carvão ou querosene, enegrecendo os muros, asfixiam e enjoam; onde o tuberculoso, escarrando por toda a parte, mimoseia os seus próximos com presentes gregos; onde crianças imundas e enfezadas brincam em corredores sombrios; onde; em bacias de folha, se lava a roupa dentro do próprio quarto e põe-se a secar as janelas, quando as há”.
Rui Barbosa ao se referir “A Sorte do Operário” é enfático ao afirmar que “nada se construiu. Nada se adiantou nada se fez. A sorte do operário continua indefesa, desde que a lei, no pressuposto de uma igualdade imaginária entre ele e o patrão e de uma liberdade não menos imaginária nas relações contratuais, não estabeleceu, para este caso de minoridade social, as providências tutelares, que uma tal condição exige”. Quando se refere à situação das “mães operárias”, Rui Barbosa em seu discurso faz alusão e elogia os industriais. “Ainda bem, senhores, que a consciência dos nossos industriais já se vai elevando bastantemente; e, é do seio deles que, com uma autoridade insuspeita, com uma das maiores autoridades, se ouvia, há pouco mais de um ano, em 10 de setembro de 1917, pelas colunas do Jornal do Comércio, a confissão do sentimento, já existente entre os nossos mais adiantados industriais, de ser necessário conceder à gravidação e ao parto dois meses sucessivos de folga no trabalho. O industrial que assina esta declaração é o Sr. Jorge Street. Eu os convido operários, a aplaudirdes este nome”.Cf.Rui Barbosa. A questão social e política no Brasil. In. Pensamento e Ação, p.385-389.
39
desigual e combinado que estrutura as relações de dependência entre nações
no cenário internacional”.
O desdobramento da questão social está relacionado à formação da
classe operária e a sua entrada no cenário político, o que leva à necessidade
de seu reconhecimento pelo Estado através da implementação de políticas
sociais. O aprofundamento do capitalismo e o aumento numérico do
proletariado vão propiciar o deslocamento da “questão social”, que ganha
visibilidade e se torna o centro das contradições. Nesse contexto, a “questão
social” ganha uma “nova qualidade”, principalmente nos grandes centros
urbanos industriais, derivada tanto do crescimento numérico do proletariado,
quanto da solidificação dos laços de solidariedade política e ideológica que
perpassam seu conjunto, base para a construção e para a possibilidade
objetiva e subjetiva de um projeto alternativo à dominação burguesa
(IAMAMOTO, 1988, p.129).
Na primeira década do século passado aparecem outras formas de
organização que não se configuram pelos fins assistenciais, são as Ligas
Operárias que diferem dos antigos grêmios corporativos como a Associação de
Socorro Mútuo e as Caixas Beneficentes que desenvolviam atividades com fins
assistenciais e corporativos. As Ligas Operárias aglutinavam operários de
vários ofícios objetivando a defesa de seus interesses comuns.
Essas formas de agremiação, apesar da precariedade, darão origem às
Sociedades de Resistência e Sindicatos que irão se constituir na forma típica
de resistência operária organizada. É este o terreno em que as lutas operárias
vão se desenvolvendo e de onde surgirão os Congressos Operários, e as
Confederações Operárias, tidas como formas superiores de organização.
No entanto, vale ressaltar que a legitimidade dessas organizações ficará
restrita ao meio operário. Serão, quando muito, toleradas e, à medida que
foram crescendo e ganhando visibilidade, reprimidas, tendo as suas sedes
fechadas e os seus dirigentes perseguidos, presos ou mesmo deportados.
40
Em outras palavras, “o Estado se negará a reconhecer a existência da
questão social”. A violência, sempre presente na trajetória de luta do
movimento operário, é o instrumento utilizado para a manutenção da paz social
tão favorável à expansão do capitalismo.
Para Cerqueira Filho (1982, p.57), antes de 1930, no Brasil, a “questão
social’ não aparecia no discurso dominante senão como fato excepcional e
episódico, não porque não existisse já, mas porque não tinha condições de se
impor como questão inscrita no pensamento dominante. Nesse sentido a”
questão social “por ser” ilegítima “não era uma questão legal”, mas ilegal,
subversiva, marginal devendo, portanto, ser tratada pelos aparelhos
repressivos do Estado. Assim, a “questão social” no Brasil é tratada
inicialmente como “caso de polícia”. 15
Posteriormente, no governo Vargas, a “questão social” será tratada de
modo diferente. Será reconhecida como legítima, o que significa, conforme o
referido autor, o reconhecimento implícito da classe operária que passa a
merecer a atenção dos poderes públicos, cujas preocupações se voltam para a
desmobilização e despolitização da classe operária. O que em 1943 vai
culminar na promulgação da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).
A questão social se transforma em “questão eminentemente política”
requerendo, portanto, soluções mais sofisticadas de dominação, que não podia
se resumir a “chamar a polícia”16 (Cerqueira Filho,1982, p.75).
15. Especialmente na década de 1920, as medidas tendentes à integração do proletariado não podem ser, inteiramente, subestimadas. Em 1925 é criado o Conselho Nacional do Trabalho e, em 1926 uma Emenda Constitucional transfere para o Congresso Nacional a legislação sobre o trabalho, abrindo caminho para o Estado intervir na questão social, regulamentando o mercado de trabalho. Assim, nos anos de 1926 e 1927, são aprovadas leis voltadas para a proteção ao trabalho: lei de férias, acidente de trabalho, código de menores, trabalho feminino, seguro doença, etc. É importante ressaltar que tais leis terão aplicação precária e se limitarão aos setores não industriais como ferroviários marítimos e portuários (Cf.Iamamoto,1998,p.134). 16. A partir de 1930 um regime de amparo e reconhecimento de direitos começou a ser estabelecido para as nossas classes trabalhadoras em cujos horizontes se abriram novas perspectivas que se acham consubstanciadas nas leis das oito horas, da igualdade de trabalho das mulheres e dos menores, da nacionalização do trabalho, da sindicalização das classes, das convenções coletivas, do trabalho na indústria, no comércio e em numerosas outras atividades (...). Gisálio Cerqueira Filho (1982, p.83), apud Boletim do Ministério do Trabalho, nº.5, janeiro de 1935. Artigo do Sr. Heitor Muniz intitulado Justiça do Trabalho, p.131.
41
É neste cenário, conforme Iamamoto, que “surgirá o Serviço Social como
um departamento especializado da Ação Social da Igreja, embasado em sua
doutrina social”.17 É o surgimento daquilo que poderia se considerar serem as
protoformas do Serviço Social no Brasil. 18(1988, p.43). No entanto, afirma a
autora: “para o aparecimento do Serviço Social, enquanto conjunto de
atividades legitimamente reconhecidas dentro da divisão social do trabalho, se
deverá percorrer um itinerário de mais de duas décadas” (idem, p. 42). Nesta
caminhada, a profissão sofreu alterações tanto no que se refere as suas
dimensões objetivas quanto subjetivas. Conquistou espaços significativos na
esfera política e está buscando dar respostas competentes aos desafios
advindos das manifestações expressivas da questão social.
2.1 As transformações societárias e a intensificação da questão social no Brasil
É no curso da década de setenta que emergem, visivelmente, as transformações societárias que - embora já sinalizadas no decênio anterior - vão marcar os anos oitenta e noventa, revelando inflexões significativas no evolver da sociedade capitalista (NETTO,1996, p.97).
É inegável que a “questão social”, em decorrência das transformações
societárias que vêm ocorrendo no mundo, nas últimas décadas, tem se
manifestado de forma diferenciada nos diferentes contextos histórico-sociais.
Os efeitos deletérios do capitalismo vão conformando novas demandas e
incitando a busca de respostas às situações que emergem a cada instante.
17Referindo-se ao recrutamento dos leigos na defesa dos interesses da Igreja, Giolo, 1997, afirma que “embora jamais confessasse, a Igreja tomou consciência (...) que o catolicismo não poderia mais falar” como se fosse a premissa necessária e universal de todo modo de pensar e de agir (...)”Diretamente ligada à mediação feita pelos leigos entre instituição eclesiástica e as organizações sócio-políticas da sociedade, foi tomando espaço, em nível de cúpula, a preocupação com as questões sociais, derivando, daí, a doutrina social da Igreja e suas respectivas encíclicas papais. Foi a maneira encontrada, para, depois de haver perdido as esperanças de qualquer possibilidade de restauração, pôr-se em acordo com o mundo moderno e abrir, no novo contexto, uma brecha para a sua recomposição institucional”. Cf. Jaime GIOLO, Estado, Igreja e Educação no RS da Primeira República. 1997.p.180-181. 18 Segundo Iamamoto o Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo-CEAS-considerado como manifestação original do Serviço Social no Brasil surge em 1932 com o incentivo e sob o controle da hierarquia (1998, p.172).
42
Assim, a década de 1970, conforme estudiosos, constituiu-se no marco
da emergência das transformações societárias que tiveram seus indícios nos
anos de 1960 e que vão se aprofundar e adquirir novas configurações nos anos
1980 e 1990. Para Mandel (citado por NETTO, 1996, p.91), foi o período em
que ocorreu a “primeira recessão generalizada da economia capitalista
internacional”.
É um período de crise quando o capitalismo se torna mais avassalador,
provocando seqüelas que se fazem sentir em todos os aspectos da vida,
interferindo, não só na dinâmica da realidade, das classes sociais, dos
governos, mas, também, no cotidiano das profissões exigindo um constante
repensar e a busca incansável de novas estratégias de enfrentamento.
Na análise de Harvey, “a crise dos anos setenta assinalou a exaustão do
padrão capitalista monopolista fundado num regime de acumulação (...). Em
conseqüência, as décadas de 70 e 80 foram um conturbado período de
reestruturação econômica e de reajustamento social e político”. É esse
contexto, ou, como diz Harvey, este “espaço social” repleto de oscilações e
incertezas, que possibilita a passagem para um “regime de acumulação
inteiramente novo, associado a um sistema de regulamentação política e social
bem distinta”, e que é marcado por um confronto direto com a rigidez do
fordismo (2003, p.140).
Harvey (2003, p.140) denomina esse novo modo de regulação de
“acumulação flexível”. A acumulação flexível, segundo ele,
Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimentos de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. “A acumulação flexível envolve rápidas mudanças dos padrões de desenvolvimento desigual, tanto entre setores como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego, no chamado setor de serviços”, bem como conjuntos industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas (...).
Harvey aponta ainda como uma nova característica da acumulação
flexível, a “compressão do espaço-tempo”. As tecnologias de comunicação
possibilitam uma mobilidade tal que encolhe as distâncias temporais e
43
espaciais, favorecendo a expansão mais rápida do capitalismo que já não
encontra fronteiras e das suas seqüelas. A acumulação flexível traz também
sérias conseqüências para a classe trabalhadora que passa a conviver com a
projeção desordenada do desemprego que é, certamente, a conseqüência
mais funesta desse padrão de acumulação que deixa de ser temporária e
excepcional e aparece como desdobramento do modelo em vigor.
Para Octávio Ianni,
Aos poucos, ou de repente, conforme o caso, a grande maioria da população assalariada mundial se vê envolvida no mercado global; um mercado em que se movem compradores e vendedores de força de trabalho, mercadorias, valores de uso e valores de troca. São transações que multiplicam e generalizam os dinamismos das forças produtivas e relações de produção, propiciando uma acumulação acentuada do capital, em âmbito mundial (...). O modo pelo qual o capitalismo se globaliza, articulando e rearticulando as mais diversas formas de organização técnica da produção, envolve ampla transformação na esfera do trabalho, no modo pelo qual o trabalho entra na organização da vida social do indivíduo, família, grupo, classe e coletividade, em todas as nações e continentes, ilhas e arquipélagos (1996, p.22).
Na perspectiva de Costa,
Os partidos conservadores buscaram implementar reformas no Estado, visando cortes nos benefícios sociais, programas de privatizações, políticas liberalizantes voltadas para o mercado, desregulamentação do mercado de trabalho, com a modificação das leis trabalhistas e previdenciárias (2000, p.240).
É importante ressaltar que este novo padrão de desenvolvimento
capitalista não incorpora homogeneamente as economias que estão no seu
centro, o que fragiliza os países do Terceiro Mundo, como o Brasil.
Petras (1999, p.35), afirma que “a globalização é acompanhada pela
decadência nacional”. Para ele,
no Terceiro Mundo, entre as decadentes economias endividadas, não há mais empecilhos públicos, já que os” reguladores de Estado” são, em grande parte, aliados das Empresas Multinacionais. Quanto maior a integração externa, maior a exploração dos recursos internos para abastecer a expansão no exterior (...) Sob as pressões fiscais impostas pelos movimentos do capital, o Estado vende cada vez mais recursos públicos: florestas, províncias minerais, reservas naturais, recursos marítimos.
44
O autor enfatiza ainda que “a condição fundamental para a globalização
é o êxito do capital em minar o poder popular, desmantelar o Welfare State e
converter o Estado em instrumento da expansão ultramarina, e não as
mudanças tecnológicas, os novos sistemas de informação ou os imperativos do
mercado mundial. A tecnologia e os novos sistemas de informação são tão
compatíveis com os modelos nacional-estatistas quanto com os neoliberais,
como os capitalistas asiáticos já demonstraram” (1999, p.29).
É importante se ter presente que a globalização da questão social, que
se manifesta de forma diversa e adquire significados diferentes nos mais
diversos países do mundo, envolve problemas culturais, religiosos, lingüísticos
e raciais, simultaneamente sociais, econômicos e políticos.
Juntamente com o que é local, nacional, regional, revela-se o que é mundial. Todos são levados a perceber algo além do horizonte visível, a captar configurações e movimentos da máquina do mundo. (IANNI, 1996, p.25-26).
A globalização ou mundialização financeira, como é tratada por alguns
autores, ao intensificar o movimento do capital, tecnologia e força de trabalho
cria uma nova consciência nas pessoas e traz desafios teóricos que não
podem ser descartados. A busca de mão- de- obra barata nos quatro cantos do
mundo, a substituição do trabalhador pelas máquinas, o aumento incontrolável
do desemprego que leva à formação de contingentes de desempregados
permanentes que se movimentam em escala global são fatores, dentre outros,
que fazem com que a questão social adquira significados e interpretações
diferenciados.
Assim, passamos a conviver com várias formas ou tendências de se
pensar a questão social. Uma dessas tendências, considerada a mais
marcante, é aquela que leva à sua naturalização. Nesta perspectiva, as
diversas expressões da questão social são objetos de ações assistenciais
focalizadas. Uma outra forma de se conceber a questão social é considerá-la
como expressão de violência, o que a transforma em objeto de repressão e
45
segurança oficiais. Pode ainda ser concebida de forma pulverizada ou
fragmentada, o que resulta “na autonomização de suas múltiplas expressões”,
transformando-a nas várias “questões sociais”. O que, conseqüentemente, leva
a que o indivíduo seja culpabilizado por suas dificuldades, tirando a
responsabilidade da sociedade de classe pela produção da desigualdade
social, favorecendo, assim, o esvaziamento da dimensão coletiva da questão
social. (IAMAMOTO, 2001, p.18).
Acreditamos que tais tendências têm se mostrado insuficientes e
marginais para se pensar a questão social diante da magnitude e dimensão
que a mesma tem assumido na contemporaneidade. “As “soluções”
apresentadas são múltiplas, mas pecam, principalmente, por não colocarem
em pauta a questão social enquanto parte constitutiva das relações sociais
capitalistas”, ou seja, como reprodução ampliada das desigualdades sejam elas
políticas, econômicas ou sociais. Enfim, as soluções que se tem apresentado
são pontuais, focalizadas, portanto, pouco eficazes.
Nessa perspectiva, pensar a profissão de Serviço Social, na
contemporaneidade, leva à certeza de que os desafios que estão postos, e,
aqueles que vêm emergindo a cada dia, repercutem sobremaneira no cotidiano
dos assistentes sociais, tanto daqueles que estão desenvolvendo as suas
atividades nas diferentes instituições, quanto dos que se ocupam,
especialmente na academia, com a formação das novas gerações de
profissionais e com a investigação da realidade social (NETTO,2001,p.41). Não
restam dúvidas quanto ao fato de que as transformações societárias em curso
e as lutas que se travam para garanti-las ou enfrentá-las, conformam um
espaço de disputas e colocam a exigência da reconfiguração ou
redimensionamento das demandas e dos espaços sócio-ocupacionais.
Assim, não causa estranhamento a importância que a “questão social”
tem assumido no âmbito da categoria profissional dos assistentes sociais. Não
é inusitado o fato do atual Projeto Ético-Político da profissão ter suas bases de
intervenção pautadas na “questão social”.
46
Aliás, é bom lembrar que a relevância que vem sendo dada à questão
social não está circunscrita ao Serviço Social. Como afirma Iamamoto, (2007,
p.172) “nesse quadro recessivo da economia internacional, a questão social
passa a ser redescoberta pelos cientistas sociais, em especial pela “Escola
Francesa”, com amplas retrações na América Latina e, particularmente, na
literatura do Serviço Social.” No Brasil é significativa a influência dos
pensadores franceses, mais especificamente, Robert Castel e Pierre
Rosanvallon no debate atual travado pela categoria profissional dos assistentes
sociais, como também na literatura produzida pelo Serviço Social no que se
refere à questão social. 19 Na concepção desses autores a “questão social” de
hoje não é a mesma questão social do passado. Estamos diante de uma “nova
questão social”.
Castel define a questão social como uma aporia fundamental sobre a
qual uma sociedade experimenta o enigma de sua coesão e tenta conjurar o
risco de sua fratura. “É um desafio que interroga, põe em questão a capacidade
de uma sociedade (o que em termos políticos, se chama uma nação) para
existir como um conjunto ligado por relações de interdependência.”
Para ele a questão social que emergiu no início do século XIX, nos
primórdios da industrialização, mais exatamente por volta dos anos de 1830,
não é a mesma questão social de hoje. Na concepção do autor, estamos diante
de uma “nova questão social” diferente, portanto, daquela representada pelos
proletários das primeiras concentrações industriais que eram constituídas por 19Iamamoto (2007:175), ao se referir à incorporação dos autores franceses pelo Serviço Social
chama a atenção para o fato de que “a tônica tem sido reproduzir resumos dos autores
franceses sem assumir o desafio da crítica”, cujo foco, segundo ela, incide sobre os supostos
teóricos da análise apoiados em Durkheim e nos fundamentos da Escola regulacionista, cujas
fontes teóricas são ecléticas, incluindo o marxismo, a Sociologia estruturalista genética
(Bourdieu), a macroeconomia Kaleckiana, a escola histórica dos Annales e a ciência política
pública. Os regulacionistas propõem outro modo de regulação do capitalismo e de suas crises
no âmbito dos aparatos institucionais, identificando os meios pelos quais os regimes de
acumulação são estabilizados no largo prazo. (BRAGA, 2003, citado por IAMAMOTO, 2007,
p.176).
Não nos compete, neste momento, aprofundar ou discorrer sobre essas questões, fugiria do foco do nosso trabalho, mas acreditamos que as análises feitas por Iamamoto são pertinentes e devem ser consideradas.
47
populações flutuantes, miseráveis, não socializadas, alijadas de seus vínculos
rurais que colocavam em risco a ordem social. Como afirma o autor,
Os conteúdos concretos de noções como estabilidade, instabilidade ou expulsão do emprego, inserção relacional, fragilidade dos suportes protetores ou isolamento social são agora completamente distintos do que eram nas sociedades pré-industriais ou no século XIX. Inclusive são muito diferentes hoje do que eram há apenas vinte anos” ( CASTEL,1998,p.27).
Torna-se necessário, segundo ele, “restituir a memória”, ou seja, o
presente não é só contemporâneo. É também um efeito de herança, e, a
memória de tal herança nos é necessária para compreender e agir hoje. (Idem,
1998, p.23)
A nova questão social hoje, segundo Castel, “parece ser o
questionamento da função integradora do trabalho na sociedade”. O autor
elege a centralidade do trabalho para apreender a questão social. Aponta uma
desmontagem do sistema de proteções e garantias vinculadas ao emprego, ou
seja, a ruptura entre trabalho e proteção. Quando se refere às novas
configurações da questão social aponta a precarização do trabalho como a
situação mais alarmante, considerando ser ela que alimenta o desemprego
afetando de forma desigual as diferentes categorias sociais. Dos trabalhadores
aos executivos ninguém escapa do desemprego ou dessa “reestabilização das
situações de trabalho” (CASTEL, 2000, p.250).
Analisando a questão social, hoje, na França, o autor parte de uma
primeira constatação que é a desestabilização dos estáveis, ou seja,
trabalhadores que até então ocupavam postos sólidos na divisão do trabalho
clássica foram retirados dos circuitos produtivos.
Uma segunda constatação apontada pelo autor é a instalação da
precariedade que se constitui em um fenômeno novo e que atinge
principalmente os jovens na alternância de períodos de atividade e
desemprego; de trabalho temporário, de ajuda social contribuindo para o
crescimento da vulnerabilidade social, o que na concepção de Castel estaria
indicando a presença de uma “nova questão social”.
48
Uma terceira e mais inquietante constatação, conforme o autor é a
descoberta de um novo perfil de pessoas que poderiam ser chamadas de
sobrantes, pessoas que não têm lugar na sociedade, que não são integradas e
podem não vir a sê-lo. São pessoas que foram invalidadas pela nova
conjuntura econômica e social dos últimos 20 anos, são indivíduos que estão
completamente atomizados, rejeitados de circuitos que lhes poderiam atribuir
uma utilidade social. (CASTEL, 2000, p.255).
A crescente exclusão das pessoas das proteções sociais e o
esgotamento das tradicionais formas de solidariedade social que, na
atualidade, já não se constituem em bases consistentes de resistência, levam o
autor a pensar que as alternativas para a situação da sociedade salarial só
poderão vir do Estado. Na realidade, de um “Estado Interventor”. Mas, diz ele,
“este Estado deveria ajustar o melhor possível suas intervenções,
acompanhando as nervuras do processo de individualização” (Idem, 1998,
p.610).
Rosanvallon faz a distinção entre a “velha” e a “nova” “questão social”.
Para ele a expressão questão social no final do século XX se pautava nas
disfunções decorrentes do nascimento da sociedade industrial. Porém, a partir
dos anos de 1980 o crescimento do desemprego e o surgimento de novas
formas de pobreza não remetem aos problemas do passado. “Os fenômenos
atuais de exclusão não remetem às categorias antigas da exploração”. (1995,
p.7). O fim dos “Trinta Anos Gloriosos” e o fim do Estado Providência,
marcaram o final dos anos de 1970 e toda a década de 1980, puseram fim à
utopia de uma sociedade que garantia segurança e proteção aos indivíduos
dos principais riscos da existência. A questão social mudou de natureza no
começo da década de 1990, quando, além dos problemas de ordem financeira
e das disfunções, são colocados em questão os princípios organizadores da
solidariedade e a concepção dos direitos sociais. Ou seja, o problema passou a
ser de ordem filosófica.
Rosanvallon (1995, p.8-10) distingue três etapas ou dimensões da crise
do Estado Providência: primeira, a crise financeira que marcou o final dos anos
de 1970; a crise ideológica, que marcou toda a década de 1980, e, por último, a
49
crise filosófica, que teve início nos anos de 1990 e se constitui na crise atual. É
essa crise filosófica que, na concepção de Rosanvallon, conforma o surgimento
de uma “nova questão social”.
Essa “nova questão social” é marcada pela desintegração dos princípios
organizadores da solidariedade e pelo fracasso da concepção tradicional dos
direitos sociais. “Não se trata unicamente, como há dez anos, de encontrar o
caminho de uma relegitimação do Estado”. O “Estado Providência”, na sua
concepção, é insubstituível na manutenção da coesão social, mas deve ser
reinstituído na perspectiva da solidariedade.
Não imaginava nem por um instante que um homem que tivera trabalho pudesse ter um nível de ingresso tão baixo, a ponto de ser considerado quase como um indigente. Problemas que antes eram tidos com residuais ou conjunturais tomam uma dimensão massiva; “o pauperismo é um fato social massivo, dominante na classe operária” (1995, p.9).
O autor faz uma retrospectiva histórica das técnicas de seguros nos
séculos XVII ao XIX, quando tais técnicas eram reconhecidas como respostas
adequadas à gestão dos problemas sociais. Hoje, face ao desemprego e à
exclusão que deixam de ser fenômenos passageiros e passam a ser
permanentes, produzidos em grande escala, tais técnicas são consideradas
como “pouco adaptadas” ao tratamento dos problemas atuais. Tratando-se do
social, diz ele, “o conceito central atualmente é muito mais o de precariedade e
vulnerabilidade do que o de risco”. Muito embora enfatize que o conceito de
risco continue sendo pertinente. Na sua concepção, o que hoje em dia se
constitui em problema de risco catastrófico são os riscos naturais (inundação,
terremoto), acidentes tecnológicos maiores, danos de grandes amplitudes ao
meio ambiente. Riscos que já não se limitam aos indivíduos, mas a populações
inteiras (1995, p.29).
A existência de uma nova questão social se traduz, segundo
Rosanvallon, na inadaptação dos velhos métodos de gestão do social que se
encontram defasados. Para Rosanvallon, ao que tudo indica, as manifestações
da luta de classes parecem ser deslocadas para o âmbito da gestão social. A
50
questão social, nesta perspectiva, deixa de ser responsabilidade da sociedade
e passa a ser decorrente ou tributária das diferenças individuais.
Para Rosanvallon a sobrevivência do Estado tem como condição a sua
refundação intelectual e moral. Neste sentido, faz-se necessário um enfoque
político da solidariedade, ou seja, é necessário reinventar as formas de
solidariedade.
A remissão a esses autores é decorrente da influência que exercem não
só nas elaborações do Serviço Social como também por se fazerem presentes
nas discussões que a categoria tem travado sobre as Diretrizes Curriculares
quando a questão social se torna tema central.
Apesar de reconhecer a importância desses autores no âmbito do
Serviço Social, consideramos pertinente que não se perca de vista que esses
autores (Castel, Rosanvalon,) desenvolveram seus estudos e pesquisas no
contexto europeu, mais especificamente, na França. Sociedade que atingiu
patamares considerados satisfatórios na universalidade da cidadania, portanto,
totalmente diferente da realidade brasileira onde a universalidade nunca foi
atingida.
Face a toda essa situação o que se tem vislumbrado é um apelo cada
vez maior à solidariedade, o que não é novo na história do país.
Como se refere Marilda Iamamoto (2001, p.21) “a velha questão social
metamorfoseia-se, assumindo novas roupagens” que aparecem sob o cunho
da novidade. O que leva determinados autores a acreditarem na existência de
uma nova questão social.
Conforme Alexandra Pastorini (2004, p.14), as discussões sobre a
existência de uma “nova questão social” começaram na Europa e nos Estados
Unidos no final dos anos de 1970 e início dos anos de 1980. Momento em que
os problemas decorrentes do desenvolvimento e expansão do capitalismo
ganham dimensão não esperada nos países centrais que viviam, até então,
sob o impacto dos “Trinta Anos Gloriosos” e que, a partir do final dos anos de
51
1980 e nos anos de 1990, depararam-se com uma realidade considerada, por
alguns estudiosos, como “inimaginada”.
Para Pastorini, “a questão social” assume expressões particulares
dependendo das peculiaridades específicas de cada formação social (nível de
socialização da política, características históricas, formação econômica,
estágios e estratégias do capital). O movimento de globalização coloca
demandas diferenciadas e traz novidades nas manifestações imediatas da
questão social, o que não quer dizer que a questão social seja outra, “não
existe uma nova questão social”. Tal afirmação, segundo ela, poderia levar a se
pressupor que a questão social anterior tivesse sido resolvida ou superada. O
que não ocorreu. A “novidade” hoje, diz ela, “reside na forma que a questão
social assume” (2004, p.14).
Conforme Marilda Iamamoto a “questão social” é indissociável de uma
forma de sociabilidade que constitui a sociedade capitalista, mas que, por sua
vez, assume novas mediações históricas na cena contemporânea.
Essa “questão social”, em função das particularidades nacionais, em função do novo estágio de desenvolvimento do capital, sob a égide do capital financeiro, num contexto de mundialização e, articulado a uma profunda alteração das relações Estado-Sociedade civil, atinge diretamente o âmbito do trabalho e das políticas sociais e as formas de proteção aos trabalhadores. Conseqüentemente, vive-se um processo de radicalização da questão social, cujas raízes não se alteram, mas que necessitam uma análise particular dos fenômenos contemporâneos, de modo que nós possamos apreender não só, as dimensões estruturais da questão social, mas como elas se expressam na vida cotidiana dos sujeitos com os quais nós trabalhamos (IAMAMOTO,2007,p.144).
Para a referida autora, a questão social não é senão o conjunto das
expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe operária e
do seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu
reconhecimento, como classe, por parte do empresariado e do Estado. É a
manifestação, no cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e
a burguesia (IAMAMOTO, 1998, p.77).
Iamamoto (2001, p.11), ao analisar a questão social parte do
pressuposto de que esta é tributária das formas assumidas pelo trabalho e pelo
52
Estado na sociedade burguesa. Neste sentido, aponta duas perspectivas ou
ângulos, sob os quais a questão social é abordada:
Primeiro, enquanto “disfunção” ou “ameaça” à ordem e à coesão social
levando a que o seu enfrentamento seja reduzido a uma gestão mais
humanizada e eficaz dos problemas sociais. As respostas à questão social
passam a ser atribuições dos mecanismos reguladores do mercado e das
organizações privadas, que partilham com o Estado a implementação de
programas focalizados e descentralizados de combate à pobreza e à exclusão
social.
Segundo, como expressão ampliada das desigualdades sociais. Seu
enfrentamento, neste aspecto, requer a prevalência das necessidades da
coletividade dos trabalhadores, o chamamento à responsabilidade do Estado e
a afirmação de políticas sociais de caráter universal voltadas aos interesses
das grandes maiorias, condensando um processo histórico de lutas pela
democratização da economia, da política, da cultura na construção da esfera
pública. (idem, p.10).
Na concepção da referida autora a questão social é, portanto, uma
questão estrutural que certamente não vai ser resolvida ou solucionada numa
formação econômica social por natureza excludente.
Carmelita Yazbek (2001, p.33) aborda as expressões da questão social
brasileira a partir dos seguintes aspectos: pobreza, exclusão social e
subalternidade, enquanto resultantes da questão social e que permeiam a vida
das classes subalternas em nossa sociedade”.
Para Yazbek, as seqüelas da “questão social” expressas na pobreza, na
exclusão e na subalternidade de grande parte dos brasileiros tornam-se alvo de
ações solidárias e da filantropia revisitada. A autora alerta: está em construção
uma forma despolitizada de abordagem da questão social, da pobreza e da
exclusão social fora do mundo público e dos fóruns democráticos de
representação e negociação dos efetivos e diferentes interesses em jogo (2001
p.36-37).
53
José Paulo Netto (2001, p.45), parte da perspectiva de que o
desenvolvimento capitalista produz, compulsoriamente, a “questão social”.
Conforme o referido autor, não se pode dissociar a existência e as
manifestações da questão social da dinâmica do capitalismo.
A “questão social” é constitutiva do desenvolvimento do capitalismo. A dinâmica societária específica dessa ordem não só põe e repõe os corolários da exploração que a constitui medularmente: a cada novo estágio de seu desenvolvimento, ela instaura expressões sócio-humanas diferenciadas e mais complexas, correspondentes à intensificação da exploração que é a sua razão de ser. O problema teórico consiste em determinar concretamente a relação entre as expressões emergentes e as modalidades imperantes de exploração. (Netto, 2001, p.48)
Para Netto (2001, p.44), no âmbito do pensamento conservador a
“questão social”, numa operação simultânea à sua naturalização, é convertida
em objeto de ação moralizadora. E, em ambos os casos, o enfrentamento das
suas manifestações deve ser função de um programa de reformas que
preserve, antes de tudo e mais, a propriedade privada dos meios de produção.
Mais precisamente: o cuidado com as manifestações da “questão social” é
expressamente desvinculado de qualquer medida tendente a problematizar a
ordem econômico-social estabelecida; trata-se de combater as manifestações
da “questão social” sem tocar nos fundamentos da sociedade burguesa.
O que se tem presenciado, ou melhor, vivenciado com a globalização e
o neoliberalismo é que o capital não tem compromisso social. A desigualdade e
a miséria se alastram sem controle. As soluções buscadas parecem sempre
paliativas e se tem apelado, cada vez mais, à solidariedade, seja da sociedade
ou das empresas. Assim, parece mais fácil acreditar que as seqüelas do
capitalismo, expressas na questão social, sejam consideradas inusitadas ou
novas. Vivemos assim, em uma época em que tudo parece ser uma
descoberta, em que tudo parece ser novo.
Diante de toda essa movimentação que vem ocorrendo na sociedade,
seria incoerência negarmos que a questão social na atualidade apresenta
novas conformações e que se expresse de maneira diferente da questão social
que marcou os primórdios do capitalismo. A globalização financeira que se
espraiou pelo mundo impôs condições e trouxe transformações incontestáveis.
54
Nesse sentido, é pertinente recorrermos a Ianni (1996, p.13) quando
afirma que
Está em curso um intenso processo de globalização das coisas, gentes e idéias. Está em curso um novo surto de universalização do capitalismo, como modo de produção e processo civilizatório. O desenvolvimento do modo capitalista de produção, em forma extensiva e intensiva, adquire outro impulso, com base em novas tecnologias, criação de novos produtos, recriação da divisão internacional do trabalho, ultrapassam fronteiras geográficas, históricas e culturais, multiplicando-se assim as suas formas de articulação e contradição. Esse é um processo simultaneamente civilizatório, já que desafia, rompe, subordina, mutila, destrói ou recria outras formas sociais de vida e de trabalho, compreendendo modos de ser, pensar, agir, sentir, imaginar.
Concordamos com aqueles estudiosos que defendem que a questão
social apesar de reformulada e redefinida nos diferentes estágios do
capitalismo, continua vinculada à exploração que conforma a relação capital-
trabalho, que vem sofrendo modificações e se expressando de formas
diferenciadas conforme as rearticulações pelas quais passa o capitalismo, mas
que continua alicerçada nas mesmas bases que lhe deram origem. Tudo isso
só vem comprovar a perenidade da pobreza e da desigualdade que conforma a
sociedade capitalista.
Neste sentido, acreditamos que pensar a questão social exige a
consideração da realidade global e das particularidades de cada contexto.
Comungamos com a tese de que é inadequado utilizar os mesmos parâmetros
para se pensar a questão social nos países centrais, de economia mais
avançada, e nos países periféricos de terceiro mundo que têm realidades
diferentes e que recebem os impactos da globalização também de modo
diferenciado. Todavia, nos cabe lembrar que a exploração não é um traço
restrito à sociedade burguesa. Os modos de produção que a precederam
também tinham esse traço só que em intensidade muito inferior àquela que
conforma a sociedade burguesa.
Antes da instituição da ordem burguesa as desigualdades e privações
eram decorrentes do baixo nível das forças produtivas que não conseguiam
suprir as necessidades. Na ordem capitalista, as desigualdades e privações
decorrem de seqüelas produzidas socialmente, de carências provenientes dos
55
antagonismos que caracterizam a relação capital-trabalho, das contradições
entre as forças produtivas e as relações de produção.
A “questão social”, nesta perspectiva teórico-analítica,
Não tem a ver com o desdobramento de problemas sociais que a ordem burguesa herdou ou com traços invariáveis da sociedade humana; tem a ver, exclusivamente, com a sociabilidade erguida sob o comando do capital (NETTO, 2000, p.46).
2.2 A questão social e suas manifestações nos tempos da globalização e do neoliberalismo
Como afirma Octavio Ianni, É no contexto do globalismo que o liberalismo se transfigura em neoliberalismo”. A globalização que revolucionou a realidade mundial, e, colocou por terra as certezas e a segurança existentes até então, expressa um novo ciclo de expansão do capitalismo, como modo de produção e processo civilizatório de alcance mundial. Um processo de amplas proporções envolvendo nações e nacionalidades, regimes políticos e projetos nacionais, grupos e classes sociais, economias e sociedades, culturas e civilizações. Assinala a emergência da sociedade global, como uma totalidade abrangente, complexa e contraditória. Uma realidade ainda pouco conhecida, desafiando práticas e ideais, situações consolidadas e interpretações sedimentadas, formas de pensamento e vôos da imaginação (1996, p. 80).
No Brasil, onde não existiu um “Estado de Bem-Estar”, as expressões da
questão social aumentaram e continuam a aumentar de forma expressiva. O
que é retratado pela desigualdade que assola o país.
Alguns números ilustram bem a imagem da desigualdade brasileira: um
país que tem um PIB de 540 bilhões de dólares, ter 34,9% de sua população –
54,4 milhões de pessoas – alocadas na rubrica de pobres, ou seja, aqueles que
conseguem comer, mas não se vestir ou morar; e, 8,7% -13,6 milhões de
pessoas- na rubrica de indigentes, que não conseguem ter acesso nem às
necessidades básicas é certamente um país desigual. Não obstante, vale
ressaltar que dados das Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios
(pnads) 2001/2004 do IBGE afirmam que o grau de desigualdade e renda no
Brasil declinou em 4%.A renda dos 20% mais pobres do país cresceu, no
56
período, cerca de 5% ao ano, enquanto a dos 20% mais ricos diminuiu em
1%.Neste sentido, a análise desenvolvida pelo IBGE é a de que apesar da
queda recente, a desigualdade de renda brasileira permanece muito acima da
observada em países com grau de desenvolvimento semelhante ao nosso.
(IPEA-Nota Técnica. Brasília, 21 de julho de 2006).
Por outro lado, não se pode perder de vista que a desigualdade não é
atributo exclusivo do Brasil nem da América Latina, no entanto, vale ressaltar
que o Brasil é reconhecido como um dos países que apresentam os maiores
padrões de desigualdade social na América Latina e no mundo.
Analisando a pobreza e a desigualdade no mundo, no início dos anos de
1990, Erich Hobsbawm (1995, p.397) imputa ao Brasil a condição de
“candidato a campeão mundial de desigualdade”, afirmando inclusive que
nosso país se constitui em “monumento de injustiça social”. Aqui, conforme
dados citados pelo autor, referentes aos primeiros anos da década de 1990, os
20% mais pobres da população dividiam entre si 2,5% da renda total da nação,
enquanto os 20% mais ricos ficavam com quase dois terços dessa renda.
Dados mais recentes, constantes no Atlas da Exclusão Social volume 4,
apontam que “em média para cada 1 dólar recebido pelos 10% mais pobres, os
10% mais ricos recebem 65,8%, ou seja: os mais ricos se apropriam de uma
renda quase 66 vezes maior que os mais pobres”.20
Sem maiores detalhamentos, o que se pode afirmar é que o capitalismo
contemporâneo traz como conseqüências: o agravamento da pobreza e a
acentuação da desigualdade.
Como afirma Netto (2006, p.8),
Desenvolvimento capitalista é, necessária e irredutivelmente, produção exponenciada de riqueza e produção reiterada de pobreza”. Enfatiza, o referido autor, que “ainda está por inventar ou descobrir uma sociedade capitalista - em qualquer quadrante e em qualquer período histórico- sem o fenômeno social da pobreza como contra-parte necessária da riqueza socialmente produzida (idem,p.9).
20 M. Pochmann, A. Barbosa, A. Campos, R, Amorim e R.Silva(org.), Atlas da exclusão social.Volume 4. A exclusão no mundo.S. Paulo, Cortez 2004, p.62.Citado por Netto, 2006, p.5.
57
Toda essa movimentação culmina na chamada “crise do Estado” que
por sua vez vai levar à Reforma do Estado. 21 Configura-se, assim, um
momento em que a ofensiva neoliberal coloca a necessidade imperativa de
redução das funções estatais e busca fazer do mercado o único regulador
societário. As medidas não se fazem esperar.
A população passa a conviver com uma crescente alteração e
despolitização dos padrões de proteção social.
No labirinto de problemas do país, a questão do reconhecimento de
direitos sociais enfrenta recuos constitucionais. Crescem os “abismos entre o
país real e o país legal” (PAOLI e OLIVEIRA, 2000).
Os anos de 1990 são conformados, segundo Eduardo Fagnani (1999,
p.155), pelo esgotamento do nacional desenvolvimentismo e pelo alinhamento
automático e passivo das elites políticas do país ao receituário de ajuste
macroeconômico e de reforma do Estado defendido pelas potências
hegemônicas e consubstanciado no que se convencionou chamar de
“Consenso de Wasghinton, que, segundo Tavares e Fiori, (apud Netto,
2006,p.15), veio coroar o “plano de ajuste” imposto aos países periféricos.
Assim,se o Brasil não logrou passar pela experiência de ter um Estado de
Bem- Estar, não vai ficar ileso das conseqüências da ofensiva neoliberal.
O Consenso de Washington, conforme Noam Chomsky (2004, p.21), é
um conjunto de princípios orientados para o mercado traçado pelo governo dos
Estados Unidos e pelas instituições financeiras internacionais que ele controla
e por ele mesmo implementadas de formas diversas geralmente nas
sociedades mais vulneráveis, com rígidos programas de ajuste estrutural.
Resumidamente as suas regras básicas são: liberalização do mercado e do
sistema financeiro, fixação dos preços pelo mercado (“ajuste de preços”), fim
da inflação.
21 No Brasil, a crise do Estado somente se tornará clara a partir da segunda metade dos anos 80(...). A reação imediata à crise, ainda nos anos 80, logo após a transição democrática, foi ignorá-la. Uma segunda resposta, igualmente inadequada, foi a neoliberal, caracterizada pela ideologia do Estado Mínimo (Cf. Cadernos MARE da reforma do Estado; v. 2).
58
2.3 A Reforma do Estado no Brasil
No Brasil, a grande tarefa política dos anos de 1990 foi a reforma ou
reconstrução do Estado, cujo desmonte já havia começado antes.
A partir dos anos 70, em decorrência do “crescimento distorcido” e da
globalização,
o Estado entrou em crise e se transformou na principal causa da redução das taxas de crescimento econômico, da elevação das taxas de desemprego e do aumento da taxa de inflação que desde então ocorreram em todo o mundo (PEREIRA,1997,p.7).
As respostas a esta crise foram a onda neoconservadora, que se
pautava na redução do Estado, ou seja, na proposta de Estado mínimo e, nas
reformas econômicas voltadas para o mercado.
Como tais respostas foram consideradas inviáveis, emergiu, como
condição necessária, a reconstrução do Estado. “Aos poucos foi se
reconhecendo que o Estado não deve executar diretamente uma série de
tarefas. Que reformar o Estado significa, antes de mais nada, definir o seu
papel, deixando para o setor privado e para o setor público não-estatal as
atividades que não lhes são específicas” (PEREIRA, 1997, p.22). O que era
justificado.
Temos hoje, dentro do Estado, uma série de atividades na área social e cientifica que não lhe são exclusivas, que não envolvem poder de Estado. Incluem-se nesta categoria as escolas, as universidades, os centros de pesquisa científica e tecnológica, as creches, os ambulatórios, os hospitais, as entidades de assistência aos carentes, principalmente aos menores e aos velhos, os museus, as orquestras sinfônicas, as oficinas de arte, as emissoras de rádio e televisão educativa ou cultural, etc. São atividades competitivas, que podem ser controladas não apenas através da administração pública gerencial, mas também e principalmente através do controle social e da constituição de quase mercados (1997, p. 25).
Na concepção de Bresser Pereira, a Reforma do Estado deve ser
entendida no contexto da redefinição do Estado que, de responsável direto pelo
desenvolvimento econômico e social, passa a fortalecer-se enquanto promotor
e regulador do desenvolvimento.
59
Para alcançar esses objetivos, o Estado lança mão de estratégias como
a descentralização, a privatização e a publicização. As organizações sociais
também se constituem em estratégia central do Plano Diretor da Reforma do
Aparelho do Estado.
A descentralização, que é uma tendência crescente nos processos de
Reforma do Estado constitui-se num dos eixos de reestruturação das políticas
do Estado. Embora liderada por setores progressistas, não se constitui apenas
em privilégio destes setores. O FMI e o Banco Mundial também a indicam
como um dos mecanismos de saneamento fiscal.
Não resta dúvida de que a descentralização seja importante no processo
de democratização do Estado, mas, o risco é que o financiamento dos
programas sociais seja transferido para os estados e municípios sem que lhes
sejam fornecidas as devidas estruturas. Muitos municípios não têm orçamento
para arcar com a descentralização.
Em se tratando da descentralização das políticas sociais, a ênfase recai
na municipalização, o que coloca a exigência de “novas funções e
competências” para os assistentes sociais que passam a ser requisitados para
atuar na formulação e avaliação de políticas, no planejamento e gestão, em
equipes multiprofissionais, na participação nos conselhos, (capacitação de
conselheiros), elaboração de Planos de Assistência Social, acompanhamento e
avaliação de programas e projetos, ou seja, os profissionais de Serviço Social
têm ampliado o seu campo de atuação, mas, ao mesmo tempo, vêem-se
impulsionados a buscar novas qualificações.
A privatização não é um fenômeno isolado que resulta de circunstâncias
locais em épocas determinadas.
Deve ser entendida como parte de uma estratégia global que tem suas raízes num ataque à sociedade civil e à política democrática. O que se constata é que a privatização “é voltada para o crescimento do setor empresarial, que se orienta pela lógica do mercado na aplicação dos recursos públicos” (PETRAS, 1999, p.38).
60
A privatização, “no âmbito dos serviços e benefícios sociais, tem como
objetivo econômico abrir um novo campo para o investimento e os lucros
privados”. É uma privatização seletiva que pretende privatizar unicamente
aquelas atividades que possam ser rentáveis. Esta forma de privatização
requer a intervenção direta do Estado no sentido de remercantilizar os serviços
e garantir um mercado estável. Na lógica da privatização rentável, o seguro
social constitui um terreno privilegiado, porque abrange campos de grande
interesse para o capital privado, como as pensões, os serviços médicos, a
educação, envolvendo a parcela da população que potencialmente constitui um
mercado de massas (KAMEYAMA, 1995,p.15).
A “publicização” significa a transferência das responsabilidades do
Estado, ou seja, das questões públicas para o mercado ou para o “terceiro
setor”. E o mais importante é que, nessa “parceria”, “o Estado continuará a
financiar as atividades públicas, absorvidas pela organização social qualificada
para tal (...)”. A estratégia da publicização é justificada como uma forma de
“aumentar a eficiência e a qualidade dos serviços, atendendo melhor o cidadão
a um custo menor”. (Cf. Cadernos MARE da reforma do Estado; v. 2).
Tal justificativa não convence, principalmente se pensarmos nos
resultados que estão aí. Não restam dúvidas de que os custos das atividades
sociais diminuíram, estamos convivendo com a total precarização das políticas
sociais que perderam o caráter de universalidade e estão cada dia mais
focalizadas, mais localizadas. A passagem das atividades que eram
competência do Estado, portanto, de direito público, para o âmbito privado,
onde são geridos por outra lógica, que é a lógica empresarial, culminou, dentre
outras conseqüências, na crescente perda dos direitos trabalhistas sociais. O
Estado, visando garantir a “governança” e “tornar-se mais eficiente”,
desincompatibilizou-se da questão social delegando para o “terceiro setor” e
para o mercado as suas atribuições. 22
22 Pesquisa recente realizada pelo CFESS, que traça o perfil do assistente social mostra que 6,81% dos profissionais entrevistados estão inseridos no “terceiro setor”. Considero que é um dado que deve ser levado em conta, considerando que é uma demanda que está posta para a profissão.
61
É em meio a todo esse processo de retraimento do Estado e das suas
políticas públicas que as organizações do “terceiro setor” entram em cena
como alternativas eficientes, flexíveis e dinâmicas na prestação de serviços
sociais.
O que se presencia é a transferência das responsabilidades do Estado
para a sociedade civil através das organizações filantrópicas tradicionais ou
modernas, onde se inclui a chamada filantropia empresarial.
Cresce o Terceiro Setor. Aparece com força a defesa de alternativas
privatistas para a questão social, envolvendo a família, as organizações sociais
e a comunidade. Esta defesa, como já afirmamos, é legitimada pelo
renascimento de ideais liberais que referendam a desigualdade.
Assim, as propostas neoliberais, em relação ao papel do Estado quanto
à questão social, são propostas reducionistas que esvaziam e descaracterizam
os mecanismos institucionalizados de proteção social. São propostas fundadas
numa visão de política social apenas para complementar o que não se
conseguiu via mercado, família ou comunidade.
É em meio a todo esse processo de ajuste econômico e da crescente
desigualdade social que ocorre,
Um deslocamento da função assistencial, que se torna um instrumento essencial de legitimação do Estado” (Netto,2006,p.15).“Os direitos sociais perdem identidade e a concepção de cidadania se restringe; aprofunda-se a separação público-privado e a reprodução [social] é inteiramente devolvida para este último âmbito; a legislação trabalhista evolui para uma maior mercantilização(e portanto, desproteção) da força de trabalho;a legitimação (do Estado) se reduz à ampliação do assistencialismo” (Soares,apud Netto, 2006,p.15).
É desnecessário expor as conseqüências catastróficas do ajuste
neoliberal para os trabalhadores e para as classes subalternas. Convive-se
com o desemprego crescente, com um processo de privatização jamais visto
na história do país, com o aumento da informalidade e a uma onda de violência
sem controle. A desigualdade social, cujos níveis são alarmantes, vem
62
suscitando, tanto na sociedade como no empresariado, preocupações que
estimulam a solidariedade. 23
Este cenário, perpassado pela desqualificação do Estado e daquilo que
é público, conseqüentemente, abre espaço para que a iniciativa privada
assuma a sua face benemérita, favorecendo assim a consolidação da
responsabilidade Social empresarial. Daí consideramos ser pertinente à
remissão a responsabilidade social objetivando elucidar o seu significado, bem
como o percurso e as conformações que tem assumido desde o seu
surgimento no Brasil considerando que se constitui em espaço de atuação
profissional do assistente social.
Entendemos que a responsabilidade social empresarial se constitui em
uma estratégia ou alternativa liberal no sentido de dar respostas, aos
problemas decorrentes das seqüelas do desenvolvimento do capitalismo que
se expressam na questão social.
23 Conforme dados das Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (Pnads)2001/2004, do IBGE, o grau de desigualdade de renda no Brasil declinou em 4%.A renda dos 20% mais pobres do país cresceu no período cerca de 5% ao ano, enquanto a dos 20% mais ricos diminuiu em 1%. mas,apesar dessa queda, a desigualdade de renda brasileira permanece muito acima da observada em países com grau de desenvolvimento semelhante ao Brasil.(Cf.IPEA. Nota Técnica: A queda Recente da Desigualdade no Brasil.Brasília, 21 de junho de 2006).
63
3. CAPÍTULO III - RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL
A mais nova onda no mundo dos negócios se apresenta com uma vestimenta pomposa e, talvez a mais camuflada de todas. Trata-se da empresa socialmente responsável, aquela identificada com os preceitos da responsabilidade social (GOMES, 2005).
3.1 O conceito e suas origens
Muito embora esteja em voga no vocabulário das empresas e na mídia
de uma forma geral, o termo responsabilidade social empresarial não está
plenamente definido e parece não ter encontrado um grau de estabilidade
semântica, como outros termos que também fazem parte do vocabulário
empresarial. É um termo abrangente, impreciso, que abarca significados, nem
sempre homogêneos, o que nos leva a afirmar que estamos, assim, diante de
um termo em construção, ou como afirma Bruno Garcia (2002, p.27) de um
“conceito em disputa” daí não ser tarefa fácil precisar o seu significado.
Conforme Gomes (2005), dizer que uma empresa é socialmente
responsável meramente porque realizou pretensas ações para uma
comunidade no campo da educação, da saúde ou mesmo do meio ambiente,
reconhecida com prêmios de formação de institutos de formação empresarial é,
a priori, um contra-senso. Todavia, diz ele, esse tem sido o tom,
frequentemente emanado das empresas responsáveis sociais.
Assim, consideramos pertinente ressaltar como o Instituto Brasileiro de
Análises Sociais e Econômicas-BASE, o Grupo de Institutos, Fundações e
Empresas-GIFE e o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade social-
ETHOS, instituições consideradas de referência na área da responsabilidade
social do país, concebem a temática em questão, porque as concepções de
responsabilidade social empresarial emanadas dessas instituições referenciam
o entendimento que as empresas e seus funcionários têm do que vem a ser a
responsabilidade social empresarial no Brasil.
64
O IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas, criado
em 1981 pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, é uma instituição de
utilidade pública federal, sem fins lucrativos, sem vinculação religiosa e a
partido político, cuja missão é a construção da democracia, combatendo
desigualdades e estimulando a participação social. É uma instituição que tem
se destacado e impulsionado o movimento de valorização da Responsabilidade
Social Empresarial no Brasil através do Balanço Social. Foi a partir da
influência do IBASE que o Banco do Estado de São Paulo BANESPA, publicou
em 1992 um relatório completo de suas ações sociais que abriu caminhos para
que, a partir de 1993, várias empresas apresentassem os seus balanços
sociais. Assim, o IBASE desenvolve e aprimora modelos de balanço social
desde 1997 e, nos últimos anos, tem divulgado dados e análises sobre o
comportamento empresarial brasileiro.
Em linhas gerais, o IBASE tem como objetivos contribuir para uma
cultura democrática de direitos, fortalecer o tecido associativo na sociedade
civil e ampliar a capacidade de incidência em políticas públicas. Este instituto
elegeu a Responsabilidade Social e Ética nas Organizações, como uma das
linhas programáticas do seu Plano de Ação de 2007. Tal linha tem como
característica
A busca de ética, práticas responsáveis e transparência, tanto no meio empresarial como nas organizações da sociedade civil, visando contribuir para o desenvolvimento de uma sociedade cada vez mais justa e sustentável. Seu objetivo é consolidar uma cultura de organizações e instituições democráticas, a partir de práticas concretas de transparência, prestação de contas, valorização da diversidade e atuação a serviço das pessoas e da vida no planeta. 24
O GIFE surge em 1989 “objetivando a troca de experiências e o
incentivo a ações empresariais no campo da filantropia, chegando, à época, a
contar com a participação de mais de cinqüenta organizações em vários
Estados do país, que num sistema de rodízio voluntário se oferecia como sede
24 IBASE-Plano de Ação 2007, p.13. Disponível em < www.ibase.com.br>
65
das reuniões técnicas”25. Só no ano de 1991, o GIFE foi fundado oficialmente e
formalizou-se como associação em 1995, instituindo-se como pessoa jurídica.
É a primeira instituição da América do Sul a reunir empresas, institutos e
Fundações de origem privada que praticam investimento social privado, ou
seja, repasse de recursos privados para fins públicos por meio de projetos
sociais, culturais e ambientais, de forma planejada, monitorada e sistemática.
Uma das atribuições do GIFE é estimular as parcerias entre o setor privado, o
Estado e a Sociedade Civil organizada. Vale ressaltar que o GIFE é o braço
filantrópico de empresas multinacionais como a Xérox e fundações como a
Bradesco (MONTAÑO, 2002, p.212). O que lhe confere importância e faz com
que seus associados tenham fama de possuir uma condição mais bem definida
no campo da responsabilidade social.
Responsabilidade Social Empresarial, na concepção do GIFE, “é uma
forma de conduzir os negócios da empresa de tal maneira que a torne parceira
e co-responsável pelo desenvolvimento social”.
O Instituto ETHOS, fundado em 1999, desenvolve atividades
basicamente de natureza mobilizatória e tem como proposta promover a
disseminação e discussão acerca de questões relacionadas à gestão
socialmente responsável, ou seja, o objetivo do ETHOS é estabelecer
parâmetros para as empresas interessadas na responsabilidade social.
Aspectos que merecem destaque é o investimento que o Instituto
ETHOS faz em campanhas publicitárias e a sua aproximação do meio político e
da universidade, principalmente através dos cursos de administração e
marketing.
Para o Instituto ETHOS,
A Responsabilidade Social Empresarial é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais compatíveis com o
25 Luiza Mônica A. da SILVA, Filantropia empresarial: um estudo exploratório de algumas fundações metropolitanas de São Paulo. 1996, p.65. Dissertação de mestrado em Ciência Política da UNB. Citado por César Augusto Tibúrcio SILVA e Fátima de Souza FREIRE p. 21.
66
desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais.
O Instituto ETHOS preconiza que, independente do porte, do setor em
que atua ou do número de funcionários, todo tipo de empresa pode
desenvolver ações de responsabilidade social, desde que tenha vontade
política. Nesse sentido, torna-se necessário que a empresa tenha a cultura da
responsabilidade social incorporada, pois, desenvolver programas sociais
somente para divulgar a empresa, ou como forma compensatória, não traz
resultados positivos sustentáveis ao longo do tempo.
Como afirma Grajew, um dos idealizadores, fundador e presidente do
Instituto ETHOS, não se pode confundir a responsabilidade social empresarial
com um investimento isolado da empresa, o que não deixa de ser investimento
importante, mas a responsabilidade social empresarial é um conceito muito
mais amplo, e, os problemas devem ser tratados em sua “abrangência total”.
Já foi o tempo em que as empresas imaginavam estar livres para se envolver em corrupção apenas pelo fato de destinarem uma verba para o hospital da comunidade ou fazer contribuições para organizações que cuidam de idosos, e continuavam enganando o consumidor , poluindo o meio ambiente ou remunerando mal seus empregados.26
Além de instituições como o GIFE, o ETHOS e o IBASE, vários autores,
dentre os quais assistentes sociais, têm se dedicado a analisar a
responsabilidade social empresarial.
Patrícia AHSLEI, no seu livro sobre ética e responsabilidade social nos
negócios parte da perspectiva de que a responsabilidade social se constitui no,
Compromisso que uma organização deve ter para com a sociedade, expresso por meio de atos e atitudes que a afetam positivamente, de modo amplo, ou a alguma comunidade, de modo específico na sociedade e a sua prestação de contas para com ela. A organização, nesse sentido, assume obrigações de caráter moral, além das estabelecidas em lei, mesmo que não diretamente vinculadas às suas atividades, mas que possam contribuir para o desenvolvimento sustentável dos povos. Assim, numa visão expandida,
26 Oded GRAJEW, citado por GARCIA, Bruno. In. Responsabilidade social das empresas: a contribuição das universidades, VI, p.28.
67
responsabilidade social é toda e qualquer atividade que possa contribuir para a melhoria da qualidade de vida da sociedade (2002 p.6-7).
Para a autora, a responsabilidade social não se atém só aos
stakeholders27, mas, deve ter como alvo a sociedade como um todo.
Para Fernando G. Tenório, (2004, p.20),
A base conceitual contemporânea da responsabilidade social empresarial está associada aos valores requeridos pela sociedade pós-industrial. Nessa nova concepção do conceito, há o entendimento de que as companhias estão inseridas em ambiente complexo, onde suas atividades influenciam ou têm impacto sobre diversos agentes sociais, comunidade ou sociedade. Conseqüentemente, a orientação do negócio visando atender apenas os interesses dos acionistas torna-se insuficiente, sendo necessária a incorporação de objetivos sociais no plano de negócios, como forma de integrar a companhia à sociedade.
Carlos MONTAÑO realiza uma análise crítica sobre o terceiro setor e, ao
se referir à responsabilidade social empresarial, faz um alerta no sentido de
que,
A responsabilidade social do empresariado não pode ser compreendida sem fazer referência à sempre presente necessidade de aumentar a produtividade e, com ela o movimento de “relações humanas” e diversas formas de tornar o trabalho mais ameno para conquistar o trabalhador, bem como, a necessidade de conquistar o consumidor (2002, p.60).
O referido autor parte da perspectiva de que a “filantropia empresarial”
não passa de uma nova modalidade do capital objetivando incrementar a sua
lucratividade, tanto aumentando as suas vendas como diluindo seus custos. Ou
seja, a “filantropia empresarial entra nos custos da representação do capital”,
limpando a imagem da empresa, melhorando o marketing comercial, isentando
o capital de impostos estatais, conseguindo subsídios, entre outros benefícios
(idem, p. 13).
Na acepção de Nobuco Kameyama, a responsabilidade social é uma
forma moderna de camuflar as novas estratégias de exploração, negando as 27 Stakeholders, refere-se aos grupos de interesse que se relacionam, afetam e são afetados pela organização e suas atividades (público interno, comunidade, fornecedores, acionistas, proprietários e investidores, governo, concorrentes, clientes, sociedade).
68
contradições, na medida em que a consciência e a sociabilidade que se
constroem na esfera da produção deslocam-se para a esfera da reprodução,
ou seja, do consumo. Nesta perspectiva, a responsabilidade social empresarial
para a autora tem como prioridade o lucro. Ou seja, os investimentos feitos
pelas empresas visam à produtividade. Também pode trazer para as empresas
vantagem competitiva por ser um elemento que atrai o mercado, gratifica seus
funcionários e reforça a boa imagem da empresa (2000, p. 210).
Maria Célia Paoli (2005, p.379), chama a atenção para o fato de que, por
mais inovadora e tecnicamente competente que seja a proposta de
investimento sistemático empresarial privado na redução das carências mais
básicas de parcelas da população pobre brasileira, a face mais conservadora
da solidariedade privada, contraditoriamente, mostra-se por inteiro na própria
instituição da filantropia empresarial: a de retirar da arena política e pública os
conflitos distributivos e a demanda coletiva por cidadania e igualdade.
Enfim, as definições são muitas, às vezes em consonância, outras vezes
permeadas por críticas ou discordâncias, mesmo entre aqueles que a
defendem. O que, sem dúvida, retrata as mudanças que estão ocorrendo no
mundo e que rebatem diretamente nas empresas. A evolução da tecnologia, a
velocidade sem precedentes do fluxo de informações e dos processos
produtivos são acontecimentos que levam as empresas e as pessoas a terem
acesso mais rápido às informações o que as torna mais exigentes levando-as,
enquanto consumidores, “a avaliar a conduta social da empresa antes de
comprar seus produtos” (Montano, 2001, p.28)
Assim, pensar a responsabilidade social empresarial implica em ir além
das concepções, em conhecer o contexto em que emergiu e os caminhos que
tem percorrido até se revestir da importância que tem adquirido ao longo do
tempo.
69
3.2 Responsabilidade social: contexto e percurso
Afirmamos anteriormente o envolvimento de empresários com os
problemas decorrentes das várias expressões da questão social não é algo que
tenha começado recentemente. O que pode ser considerado novo é a
amplitude que a responsabilidade social ganhou nas últimas décadas, de forma
mais ostensiva a partir dos anos de 1990. Assim, o que não se pode negar é
que a responsabilidade social empresarial no Brasil está crescendo. 28
Basta ver que das 400 empresas certificadas pela AS 8000 (norma que
verifica o bem-estar e as condições de trabalho), 51 encontram-se no Brasil
(Carta Capital/ed.especial nº. 301, p.6) o que o coloca entre os quatro países
com mais certificações na Norma AS 8000 no mundo, atuando como
fomentador das Metas do Milênio e do Pacto Global da ONU no meio
empresarial. 29
No ano de 2003, levantamento realizado pelo IPEA aponta que 59% das
empresas com um ou mais empregados declararam realizar algum tipo de ação
social para a comunidade, ou seja, das 782 mil empresas nacionais, 462 mil
contribuem no campo social. (Carta capital n. 270, p.9). Este é um dado
ilustrativo do quanto a responsabilidade social vem se ampliando no país,
apesar das divergências, que não são poucas.
O discurso de que a ação social responsável não é assunto exclusivo do
Estado, mas tarefa de todos levou à adoção de novas estratégias empresariais
53
Ilustrativo, nesse sentido, é o aumento e a variedade das premiações existentes nesta área, no Brasil: Selo Empresa Cidadã (Câmara Municipal de São Paulo),Top Social ADVB (Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil), Prêmio Eco (Amcham- Câmara Americana de Comércio), Prêmio Balanço Social (Fides, Ibase, Instituto Ethos, Serasa e Bolsa de Valores de São Paulo),Selo Empresa Amiga da Criança (Fundação Abrinq),entre outras premiações nacionais e regionais (Cf. ASHLEY,2006 p.72).No Estado de Mato Grosso foi instituído pela Lei Nº 7.687 de junho de 2002, o Certificado de Responsabilidade Social a ser conferido às empresas, órgãos públicos e demais entidades que apresentarem seu Balanço Social. 29 Dados provenientes da Reunião de Constituição do Conselho Internacional do Instituto Ethos, realizada em fevereiro de 2005, estimam que cerca de 150 empresas brasileiras sejam signatárias do Pacto Global da ONU.
70
com grande impacto sobre a produtividade e a competitividade do sistema
produtivo.
Neste sentido, a fala de Oded Grajew, um dos idealizadores, fundador e
presidente do Instituto ETHOS, é pertinente. Diz ele:
Se você reparar bem, não há nenhum conceito novo quando se pensa em responsabilidade social. O que há, na verdade, é um novo olhar, uma nova maneira de compreender as questões que envolvem todas as relações humanas, inclusive- e especialmente - no universo empresarial. Quando se fala nesse assunto, estamos tratando de ética, da relação socialmente responsável da empresa em todas as suas ações, suas políticas, suas práticas, em tudo que ela faz, suas atitudes com a comunidade, empregados, fornecedores, com os fornecedores de seus fornecedores, com os fornecedores dos fornecedores de seus fornecedores, com o meio ambiente, com o governo, poder público, consumidores, mercado e com seus acionistas. É preciso pensar todas essas relações como uma grande rede que se inter-relaciona. 30
O depoimento de um dos sujeitos entrevistados é ilustrativo quando se
refere ao surgimento da responsabilidade social empresarial. Quando
questionado sobre o fato de a empresa ser responsável ele é enfático.
Sempre foi e não sabia. Essa é que é a questão. Quando surgiu esse negócio de moda da responsabilidade social a gente estava inventando um mundo de outras coisas por não enxergar que a gente faz esse processo na nossa atividade fim. Por exemplo: há quinze anos atrás nenhuma empresa da iniciativa privada levaria uma linha e interligaria Cuiabá-Sinop, porque não tem retorno financeiro nenhum, isso no nosso entendimento é praticar responsabilidade social. A gente está levando a energia que alavancou o desenvolvimento de toda aquela região, melhorou a qualidade de vida de todos que ali estavam.O que faltou, conforme analisa, foi “dar transversalidade a esse projeto é isso que a gente não soube fazer adequadamente.(G.3).
Para Gomes (2005), uma das facetas mais notáveis em administração
são os modismos, fenômenos de vida reconhecidamente efêmera
representados pela incorporação de determinado ponto de vista, e, não raro
designado por um discurso empolado no qual a retórica (em sua acepção de
discurso artificioso) é seu sustentáculo por excelência, embora, mesmo esta
não consiga encobrir a ausência de novidade no pretenso imediatismo das
30 Oded GRAJEW, Negócios e responsabilidade social”. In: ESTEVES, S. (org.). O dragão e a borboleta: sustentabilidade e responsabilidade social nos negócios. São Paulo: Axis Mundi.p.39. Citado por GARCIA, Bruno G. In: Responsabilidade social das empresas: a contribuição das universidades. p.27. São Paulo: Peirópolis,2002.
71
teorias. Já se assistiu ao “controle de qualidade”, “produtividade”, à
preocupação com os recursos humanos, ao alvorecer da “inteligência
corporativa”, “à reengenharia” (...). E agora a novidade é a “responsabilidade
social”.
Conforme Fábio Risério Moura de Oliveira (2002, p.200), a Idéia de
responsabilidade social, por parte das empresas, pode ser creditada a um
trabalho de Charles Eliot, em 1906, nos Estados Unidos, muito embora não se
tenha noticias de que esse trabalho tenha alcançado uma repercussão maior
em relação à responsabilidade social das empresas.
No entanto, grande repercussão, se pensarmos a responsabilidade
social em termos de mundo, teve o caso Henri Ford X John e Horace Dodge
que foi julgado pela Justiça americana em 1919. De um lado Henri Ford,
acionista majoritário e presidente da Ford Motor Company, do outro John e
Horace Dodge, líderes dos acionistas da companhia, que contestavam a idéia
de Ford que decidiu não distribuir parte dos dividendos aos acionistas e
investiu na capacidade de produção, no aumento de salários e em fundo de
reserva para a diminuição esperada de receitas em decorrência da redução do
preço dos carros. A Suprema Corte de Michigan decidiu a favor de Dodge, por
entender que as corporações existem para benefício dos seus acionistas, e que
os diretores precisam garantir o lucro, não podendo usá-lo para outros fins. Ou
seja, a filantropia corporativa e o investimento na imagem da corporação para
atrair consumidores poderiam ser realizados na medida em que favorecessem
os lucros dos acionistas.
Assim, a dissolução da sociedade e a constituição das duas
organizações (Ford e Dodge) que passaram a dividir o mercado estadunidense
de automóveis foi o fim inevitável.
Mas Henri Ford, ao que tudo indica, foi um dos primeiros a entender as
transformações que estavam ocorrendo na sociedade, bem como a natureza
72
dessas transformações o que o levou a instituir salário mínimo e jornada de
trabalho máxima de oito horas diárias para os empregados. 31
Quanto à sistematização, o primeiro artigo científico sobre
responsabilidade social empresarial pode ser creditado, conforme Gomes
(2005,p.51), a H.Gordon Fitch (1976). Afirma ele que os problemas sociais são
causados, em parte, pelas empresas e que caberá a elas tanto a sua resolução
no presente quanto sua previsão e respostas aos problemas no futuro. Para o
autor, as soluções devem ser encontradas de modo voluntário e não de forma
imposta, de cima para baixo como os governos costumam agir.
A França formalizou a responsabilidade social nos anos de 1975 e 1977,
a partir da iniciativa do governo num movimento junto aos sindicatos. Foi
assim, o primeiro país a obrigar as empresas a fazerem balanços periódicos do
seu desempenho social no tocante à mão - de -obra e às condições de trabalho
(SUCUPIRA, 1999).
Quanto ao Brasil, cabe ressaltar que a responsabilidade social
empresarial chega sob a influência do modelo norte-americano, o que pode ser
constatado pela análise da literatura utilizada como referência para os vários
trabalhos de divulgação da Responsabilidade Social Empresarial no país.32
No Brasil, a iniciativa em relação à Responsabilidade Social pode ser
creditada ao IBASE, uma ONG que em 1993, junto com Herbert de Souza, o
Betinho, lança a Campanha Nacional de Ação da Cidadania Contra a Fome, a
Miséria e Pela Vida, com o apoio do Pensamento Nacional das Bases
Empresariais (PNBE), que segundo Sucupira (1999), constitui-se no marco da
aproximação dos empresários com as ações sociais.
31 SROUR, citado por TENÓRIO, Fernando G. Responsabilidade social empresarial: teoria e prática, p.18. 32 Outra vertente da responsabilidade social inspirada em países como a Itália, Suécia e Inglaterra, países que implantaram modelos mais abrangentes de proteção social e, que, embora não tenham influenciado a experiência brasileira, fazem o contraponto ao modelo norte-americano, que é pautado em uma experiência cultural baseada no individualismo e na iniciativa privada, combinada a um descrédito no poder governamental. Cf.Joana GARCIA,.O negócio do social,p.27-28.
73
Mas, é pertinente lembrar que antes da “Campanha do Betinho”,
existiram outras iniciativas. No ano de 1984, a Nitrofértil, uma empresa
brasileira, publica o primeiro balanço social do país. Em 1992, o Banco do
Estado de São Paulo (BANESPA) publica um relatório completo divulgando
todas as suas ações sociais; prática que começa a ser seguida por outras
empresas, a partir de 1993.
Em 1995, o GIFE representou um salto no que se refere à
responsabilidade social. Foi a primeira entidade que voltou suas preocupações,
de forma mais enfática, sobre a filantropia, a cidadania e a responsabilidade
social e utilizou o termo “cidadania empresarial” para referir-se às ações sociais
que as empresas realizavam.
Em 1997, o IBASE cria um modelo de balanço social e o seu presidente
à época, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, se empenha na
implementação de uma campanha para estimular a divulgação voluntária do
balanço social, sendo inclusive a primeira ONG a publicar o balanço social.
O Instituto ETHOS de Empresas e Responsabilidade Social foi o
protagonista na criação e adaptação de “instrumentos que ajudam as empresas
a trilharem o caminho da responsabilidade social e do desenvolvimento
sustentável, entendido este como integrador das dimensões econômicas,
sociais e ambientais que cercam as atividades humanas”.
Para Tenório (2004), a abordagem da atuação social empresarial surgiu
no início do século XX, com o filantropismo, e, posteriormente, com o aumento
dos problemas sociais,
O conceito evoluiu, passando a incorporar os anseios dos agentes
sociais no plano de negócios das corporações. Assim, além do filantropismo,
desenvolveram-se conceitos como voluntariado empresarial, cidadania
74
corporativa, responsabilidade social corporativa e, por último, desenvolvimento
sustentável. 33
Quando se refere à caracterização da responsabilidade social
empresarial, o referido autor divide a análise em dois períodos: o primeiro que
vai do início do século XX até a década de 1950 e o segundo que vai da
década de 1950 até os dias atuais, quando a ênfase maior é dada ao
desenvolvimento sustentável.
Assim, o que se pode constatar é que no primeiro período, numa
abordagem clássica, a responsabilidade social empresarial “assume dimensão
estritamente econômica e é entendida como a capacidade empresarial de gerar
lucros, criação de empregos, pagamento de impostos e cumprimento das
obrigações legais” (Idem, 2004, p.18).
Posteriormente, no segundo período que foi marcado pelo
desenvolvimento da sociedade pós-industrial, pelo pensamento Keynesiano,
que preconizava a intervenção do Estado na economia, houve redução gradual
das incertezas do mercado. As empresas passaram a investir em tecnologia e
a acumular capital. Além disso, a transição do modelo de produção industrial
para o pós-industrial resultou em mudanças nos valores da sociedade que
passou a buscar aumento da qualidade de vida, a valorização do ser humano,
respeito ao meio ambiente, a organização empresarial de múltiplos objetivos e
a valorização de ações sociais, tanto das empresas quanto dos indivíduos.
Dessa forma, a base conceitual contemporânea da responsabilidade
social empresarial está associada aos valores requeridos pela sociedade pós-
industrial. Nessa nova concepção do conceito, há o entendimento de que as
companhias estão inseridas em ambiente complexo, onde suas atividades
influenciam ou têm impacto sobre diversos agentes sociais, comunidade ou
33 Conforme Tenório no início do século XX, a responsabilidade social limitava-se apenas ao ato filantrópico, que inicialmente assumia caráter pessoal representado pelas doações efetuadas por empresários ou pela criação de fundações como a Ford, a Rockfeller e a Guggenheim. Posteriormente, com as pressões da sociedade, a ação filantrópica passou a ser promovida pela própria empresa, simbolizando o início da incorporação da temática social na gestão empresarial. TENÓRIO, F.G. Responsabilidade social empresarial: teoria e prática, p.16.
75
sociedade. Conseqüentemente, a orientação do negócio visando atender
apenas os interesses dos acionistas torna-se insuficiente, sendo necessária à
incorporação de objetivos sociais no plano de negócios, como forma de integrar
a companhia à sociedade (Idem, p.20).
É importante não perder de vista que estamos diante de uma estratégia
ideológica utilizada nos marcos das saídas neoliberais face à crise estrutural do
capital que não se propaga só no Brasil ou na América Latina, mas que atinge
o mundo todo. Um outro aspecto que deve sempre se fazer presente quando
se pensa a responsabilidade social é o contexto no qual se deu a sua
emergência.
O Brasil, no período que vai de 1980 a 1994, viveu uma sucessão de
crises econômicas, políticas e sociais que se acumulavam e se
interpenetravam, o que levou determinado autor a afirmar que não se está
diante de uma crise, mas de uma “complexa transição estrutural”.34
Inúmeras são as variáveis a que se pode imputar a situação de crise que
assola o Brasil a partir de meados dos anos de 1980 e que, aqui, diferente de
outros países, assume conformações particulares. Dentre outras se pode
elencar:
a) o esgotamento do modelo econômico, o que conduziu o país a taxas
reais de crescimento mínimo, em torno de 1% ao ano;
b) o crescimento da dependência externa através da dívida e da
necessidade de exportação em volume crescente para se manter em dia com
as exigências dos bancos credores;
c) o esgotamento do poder de tributação do Estado que, somado ao seu
endividamento interno, de caráter financeiro, reduz sua disponibilidade de
recursos e, assim, de intervenção;
34 Cf. Furtado, 1992, citado por NASCIMENTO, 1997.
76
d) o crescimento do corpo funcional do Estado de forma desordenada e
ineficiente, em face do esgotamento de mecanismos de legitimação e os baixos
índices de crescimento econômico;
e) maior espaço para a organização de interesses e o crescimento das
pautas reivindicativas dos atores sociais, sobretudo de cunho popular, tornando
a regulação dos conflitos mais complexa;
f) perda de consenso e de credibilidade por parte dos governantes (e
não só do governo central), partidos políticos e instituições estatais em geral;
g) as disfunções do tecido social, com o surgimento de “socializações
marginais”, diante da ineficiência das intervenções estatais e da incapacidade
de absorção da força de trabalho pela estrutura produtiva.
A essas variáveis acrescenta-se, ainda, a revolução tecnológica, com
repercussões sobre a inserção do país na nova divisão internacional do
trabalho e sobre o conceito de soberania, tornando o nacionalismo dos anos 60
obsoleto (NASCIMENTO, 1997).
Esse contexto propiciou o aumento massivo das Organizações Não
Governamentais - ONGs - que crescem na mesma proporção em que os
movimentos sociais organizados foram se retraindo ou se deslocando. Vale
lembrar que os movimentos sociais mais combativos, nos anos de 1990, se
encontram no campo e não mais nas cidades.
As ONGs surgiram no Brasil nos anos de 1970, num contexto marcado
pelo regime militar e apresentavam como principal característica a oposição ao
autoritarismo. Eram organizações que tinham total independência em relação
ao Estado e consequentemente ao poder político possuíam estreita vinculação
aos novos movimentos sociais emergentes, como os da mulher, os de direitos
humanos, ecologia, associações de bairro etc.
Porém, com o processo de democratização política na década de 1980,
não só no Brasil, mas em quase todos os países da América Latina, “muda-se
o contexto político econômico e também as instituições e a visão sobre elas”.
77
Começa a confundir-se e desvanecer-se aquela percepção de um ‘Terceiro Setor’ formado por dois blocos preponderantes de instituições: um histórico tradicional e conservador ,integrado pelas instituições de caridade e beneficência, voltadas para o serviço social e, outro, as novas ONGs, guiadas por uma lógica política alternativa, opositora, moderna ,e voltada para o desenvolvimento social sustentável. É nesta fase que começa a se falar do ‘Terceiro Setor’. Além do mercado e do Estado formado por organizações dos dois blocos, ganha peso uma percepção funcional em lugar de uma percepção político - ideológica (Tompson,1999,p.44 citado por Kameyama,2001,p.26).
O aumento do desemprego, em decorrência da demissão de milhares de
trabalhadores; a flexibilização das relações de trabalho, a transformação da
relação salarial; a perda dos direitos trabalhistas são algumas dentre as muitas
conseqüências que emergem em decorrência da expansão do capitalismo.
O país avança, assim, rumo ao final do século num movimento nada
linear. “Conhece uma Constituição “cidadã”, voltará a eleger seus presidentes,
normalizará a vida democrática, domará o monstro da inflação, tomará
consciência da questão do Estado e da gestão pública, mergulhará na
globalização” (NOGUEIRA, 2004, p.24) No entanto, continuará a conviver com
índices alarmantes de pobreza e exclusão social.
É essa a herança que será deixada para os anos 90 que se constituíram
num verdadeiro desafio para os governos.
Maria da Glória GOHN (1997, p.9), refere-se ao Brasil dos anos 90
como,
Uma sociedade com características singulares, diferentes da dos anos 80, que tem criado novos espaços de interlocução e de relações sociais entre o Estado e o mercado, com reflexos positivos na cultura política do país ao colocar a questão da solidariedade como o grande eixo articulatório das ações sociais.
É o momento em que se pode constatar uma nítida desqualificação da
esfera pública universalizadora, quando se convive com a desqualificação do
Estado. Desenvolve-se, segundo Neto (1996, p.100), “uma cultura anti-Estado”.
Disso decorrem dois fenômenos:
78
1) a transferência, para a sociedade civil, de responsabilidades que
antes competiam à ação estatal;
2) a minimização de lutas democráticas dirigidas a afetar as
instituições estatais.
Pode-se enfatizar que os anos 90, na conjuntura brasileira, são
marcados pela desregulamentação do papel do Estado na economia e na
sociedade como um todo, transferindo responsabilidades do Estado para as
comunidades organizadas, com a intermediação das ONGs, e para o mercado.
Neste cenário marcado pela escalada da miséria, pelo crescimento da
pobreza, das desigualdades sociais e, consequentemente, pela violência que é
reforçada a consciência da ineficácia e da insuficiência do Estado face à
questão social.
O Estado, na sua escalada rumo ao neoliberalismo, vai
desresponsabilizando-se, cada vez mais, das suas atribuições deixando de dar
respostas às demandas e aos anseios da sociedade. A ênfase é na
minimização do Estado e das suas políticas sociais. É transferida para a
sociedade civil a responsabilidade de, em nome da solidariedade, conferir aos
excluídos sociais melhores condições de vida.
Para Fernandes (1994, p.128), a grande força do terceiro setor estaria
ancorada nos valores morais da solidariedade e voluntariedade, sendo agentes
desses segmentos: formas tradicionais de ajuda mútua, movimentos sociais e
associações civis, ONGs e filantropia empresarial.
As leituras que temos feito nos levam a afirmar que as formulações
sobre o terceiro setor ainda são muito nebulosas e polêmicas. Passa-se a
desenvolver a busca de respostas fora do espaço público, da política ou do
espaço privado do mercado. .
É uma conjuntura em que predomina a instabilidade política e social,
constituindo-se em verdadeira ameaça para a sociedade e, consequentemente,
para o mundo dos negócios que vive em função do lucro.
79
É nesse terreno que a responsabilidade social das empresas toma forma
e ganha espaço. As empresas passam a investir em áreas sociais,
tradicionalmente ocupadas somente pelo Estado.
Essa “nova postura” das empresas corresponde ao que alguns
estudiosos denominam de “novas configurações do social” que trazem à cena e
dão visibilidade a temas como responsabilidade social, cidadania empresarial,
comportamento cívico das empresas, entre outras denominações. São temas
que chamam a atenção e publicizam a atuação das empresas no âmbito social
e que são decorrentes, dentre outras razões, das propostas neoliberais que
têm como uma das suas características o retraimento do estado em relação às
políticas sociais.
Para Falconer, (1999, p.10),
Não se trata exclusivamente de filantropia, no sentido de caridade desinteressada, mas de enlightened self-interest ou investimento estratégico: um comportamento de aparência altruísta, como a doação a uma organização sem fins lucrativos, que atende também a interesses mesmo indiretos da empresa, como a contribuição à formação de uma imagem institucional positiva ou o fortalecimento de mercados consumidores futuros. Na defesa de seu próprio interesse de longo prazo, as empresas adotam a prática de apoiar atividades como projetos de proteção ambiental, promoção social no campo da educação, saúde dentre outros.
Para se ter uma idéia da dimensão que a responsabilidade social vem
assumindo basta ver os resultados do estudo realizado na Região Sudeste do
país onde foi constatado que 300 mil empresas, dos mais variados portes,
desenvolvem algum tipo de ação social (KAMEYAMA, 2001, p.31).
Assim o que se pode concluir é que são muitas as discussões em
relação à questão da responsabilidade social, à filantropia empresarial, ao
ativismo social, não importa a nomenclatura, pois, o que se está discutindo é a
“combinação entre interesses privados e virtudes públicas”. Acreditamos que
todas essas discussões sejam válidas face às complicadas circunstâncias que
conformam esse final de milênio, mas, como alerta Kameyama, “não penetram
no âmago da questão central que é a hegemonia”.
80
Não compete às empresas elaborar ou implementar políticas sociais,
mas sim ao Estado. Acreditamos que o Estado ainda se constitua no trânsito
para a plena assunção da cidadania, mas para que isso se concretize torna-se
necessário que este reassuma suas funções, voltando-se para a construção de
um novo projeto de sociedade. Mas, isso só vai se dar a partir da organização
e mobilização da sociedade civil que, não resta dúvida, tem se movimentado,
mas que ainda não é suficiente diante dos impactos sociais advindos da
reestruturação do capitalismo.
Para Nogueira (2004, p.34)
Não pode haver Estado democrático que se afirme sem cidadania ativa e sociedade participante, mas a ausência de Estado reduz o social a mero mundo de interesses, a território de caça do mercado. O social que perde a conexão com um Estado ou o reduz à subalternidade expressa apenas um mercado desvinculado de qualquer idéia republicana, ou seja, é um espaço de interesses autonomizados, mas não de direitos.
Para Francisco de Oliveira,
Há mil formas de novas parcerias entre Estado e Sociedade civil que podem ajudar na reforma do Estado, mesmo na sua redução numérica - número de funcionários, por exemplo - sem que isso signifique sua redução social e universalizante’ (1995, p.18).
Certamente, não compete às comunidades a responsabilidade da
redefinição do Estado, haja vista que nem todas as comunidades têm recursos
para atenuar as desigualdades sociais que se constituem em verdadeiros
abismos face à onda neoliberal, cuja tônica é o desmonte dos direitos sociais
conquistados ao longo dos anos e que, por algum motivo, impedem a
acumulação de capital. Por outro lado, compete à sociedade organizada a
fiscalização da coisa pública, seja através dos sindicatos, dos conselhos ou de
outras organizações da sociedade civil o que certamente vai contribuir para a
redefinição do Estado.
A participação da sociedade é fundamental para que o Estado “transite
de uma noção de carências sociais para o terreno dos direitos sociais”
(OLIVEIRA, p.1995).
81
Nesse sentido, completa Gohn (2005, p. 30), “O Estado é sempre elemento referencial definidor porque é na esfera pública estatal que se asseguram os direitos, da promulgação à garantia do acesso, e as sanções cabíveis pelo descumprimento dos direitos já normalizados e institucionalizados”.
3.3 Responsabilidade social empresarial no Brasil
A partir da industrialização, a classe operária já começa a vivenciar um
processo de degradação das suas condições de vida. No período pós-
industrialização, a situação piora e, com a globalização, atinge o ápice. A
miséria, a fome, a falta de habitação, as condições precárias de trabalho, de
higiene, são fatores, dentre muitos outros, que levaram a sociedade a se
mobilizar, pressionando o governo e as empresas a buscarem soluções para a
situação.
O discurso em voga era o de que a “ação social responsável não é
assunto exclusivo do Estado, mas tarefa de todos”. Assim, o que se propagava
era a necessidade de que fossem adotadas “novas atitudes” para enfrentar os
problemas decorrentes do acirramento da questão social.
Conforme Iamamoto (1988, p.137), a preocupação do empresariado com
o social é um fenômeno que aparece a partir da desagregação do Estado Novo
e no final da Segunda Guerra Mundial. Período que corresponde ao
aprofundamento do capitalismo, marcado pelo populismo e pelo
desenvolvimentismo, quando a repressão, por si só, já não é eficaz, trazendo à
tona a necessidade do consenso que se sobrepõe, à época, à simples coerção.
Vale ressaltar que o comportamento dos empresários em relação à questão
social será essencialmente imobilista.
A autora destaca, entre os vários elementos que compõem a prática
social do empresariado, dois aspectos que, segundo ela, estão diretamente
relacionados à implantação e desenvolvimento do Serviço Social. O primeiro,
refere-se à crítica do empresariado à inexistência de mecanismos de
socialização do proletariado. A animalidade que caracterizava o homem
comum, recrutado e recém integrado ao trabalho industrial e que só encontrava
como barreira a disciplina do trabalho. Esse homem, ao desligar-se do
82
trabalho, fica perigosamente exposto aos vícios e aos baixos instintos, assim, é
preciso eliminar o desnível entre a disciplina da fábrica e a liberdade existente
no meio operário entregue à sua própria sorte. É preciso que a sociedade atue
como extensão da fábrica. A advertência do empresariado ao governo é na
direção de alertá-lo para o fato de que ao permitir o aumento do tempo livre do
operário, estará atentando contra a base de sua própria dominação. 35
Necessário se faz um disciplinamento do tempo livre conquistado pelo
proletariado contra o capital. É preciso que o operário possa cultuar o seu lar, o
que significa elevar o proletariado a um padrão ético-moral, a uma
racionalidade de comportamento ajustada à interiorização da ordem capitalista
(Cf. IAMAMOTO, 1988, p. 40).
O segundo aspecto, apontado por Iamamoto, diz respeito ao conteúdo
da política assistencialista desenvolvida pelo empresariado no âmbito da
empresa: o não reconhecimento das organizações sindicais e a não aceitação
do operariado como capaz de participar das decisões que lhe dizem respeito,
ou seja, a prática normal de usar a repressão como forma mais eficaz de apoio
aos mecanismos econômicos de dominação. É esse o comportamento mais
evidente dos empresários na Primeira República.
A partir do primeiro pós-guerra, verifica-se a existência de uma política
assistencialista, impulsionada pelos movimentos sociais. A ganância do capital
em extrair cada vez mais lucro do valor da mercadoria força de trabalho não se
choca com a implantação de mecanismos assistenciais nas empresas (as vilas
operárias, ambulatórios, creches, escolas; não descontar o tempo das
operárias amamentarem seus filhos etc., são entre outros equipamentos
cedidos pelos empresários de forma gratuita ou a preços reduzidos). Assim,
vale ressaltar que a maioria das empresas de maior porte propiciava aos seus
empregados uma série de serviços assistenciais. Entretanto, vale destacar
também que tais benefícios eram condicionados ao bom comportamento diante
das greves e a uma vida pessoal regrada.
35 Os empresários estão se referindo à imposição pela Lei de férias remuneradas e à limitação da jornada de trabalho dos operários menores que além do problema econômico, representava também um perigo para a sociedade para a própria classe operária (Cf. IAMAMOTO, 1988:140).
83
O importante é ter presente que tais benefícios, apesar de aparecerem
sob uma aura paternalista e benemerente buscam realizar o controle social e
aumentar a produtividade e a exploração. “Diferem do assistencialismo
realizado pelas elites tradicionais da Primeira República, cujas atitudes de
benemerência consistiam na busca da salvação “pela porta estreita da
caridade, representa assim, um” custo derivado da sua posição social”. 36
No atual contexto econômico e político do país
[...], o conjunto destas distinções e conceitos tem permitido uma reflexão que permite conectar, concretamente, as políticas de desregulamentação ao empobrecimento do campo político anteriormente prometido pela ampliação da participação popular, bem como ao aprofundamento das desigualdades sociais correlacionadas à negligência e subalternidade a que foram relegadas as políticas públicas, especialmente as que representam vias de acesso fundamentais à sobrevivência das populações pobres do país, as quais, é bom lembrar, corporificam direitos e garantias constitucionais no campo social (Paoli, 2005,p.377).
É importante ressaltar que na Constituição de 1988 as reivindicações
feitas anteriormente, pela população, ganharam foro de direito. O direito ao
trabalho, o direito à auto-organização (os assalariados já haviam conquistado
esse direito ao criarem as centrais sindicais, proibidas legalmente até então), o
direito à saúde, o direito à educação, o direito da criança e do adolescente, o
direito a terra, [...] o direito a uma velhice digna e respeitada. 37
36 Para o empresariado se tratar-se-á de “construir e não de distribuir”.Sua benemerência está subordinada a uma racionalidade empresarial em que não entra nenhum sentido de redistribuição. A semelhança entre essas duas formas estará principalmente na aparência benemerente, em procurar aliviar as tensões sociais e em melhorar as condições em que a acumulação se desenvolve (P.142). 37Paulo E. ARANTES (2000, p. 17), faz apontamentos interessantes sobre a “torção semântica” que está ocorrendo na realidade, onde, segundo ele, “qualquer coisa quer dizer qualquer coisa,” significado” perdeu o significado.”Neste mundo das coisas trocadas e com significados intercambiáveis a ponto de não dizerem mais nada salvo o seu contrário (...). Neste sentido, escreve o autor: “direito tornou-se privilégio, destruição social, virou sinônimo progressista de “reforma”, previdência social, um mal entendido num país de imprevidentes crônicos; sindicalismo, crispação corporativista; cidadania, mera participação numa comunidade qualquer; “solidariedade”, filantropia, é claro; bem público, interesses agregados de grupos sociais; desempregado, indivíduo de baixa empregabilidade; “parceria”, sempre que a iniciativa privada entra com a iniciativa e o poder público com os fundos.Isto, na concepção de ARANTES, constitui-se em “espantoso deslizamento semântico” (...) os contendores estão empregando as mesmas palavras.
84
Enfim, na concepção de Francisco de Oliveira, (1999, p. 65). “Todas as
reivindicações que significam política como o processo mediante o qual se põe
em xeque a repartição da riqueza apenas entre os que são proprietários,
ganhou uma forma, talvez a mais acabada que as condições históricas
permitiam”.
Qualquer referência à Responsabilidade Social Empresarial remete, por
certo, às noções de cidadania e de direito. Na concepção de Paoli (2005,
p.376), desde a década de 1980, o conceito de cidadania ocupa um dos
centros do pensamento social e político brasileiro. O que pode ser imputado
aos elevados níveis de exclusão social e política do país que, por sua vez,
podem levar à ampliação ou à anulação da consciência e prática de direitos de
cidadania para uma sociedade.
Para a referida autora, a relevância dada a tal conceito ,na década de
1980, configura-se como uma redescoberta e vincula-se à dupla transformação
pela qual passa o país que, de um lado, passou a pautar um primeiro desafio
histórico, a passagem das formas recorrentemente autoritárias de governo para
uma democracia ampliada. De outro, a tragédia do processo neoliberal em
curso que visa à desregulamentação público-estatal da economia de mercado,
cujo funcionamento aprofunda e sedimenta os mecanismos de exclusão social
e política presentes na história da modernização do país.
Como categoria crítica aplicada aos impasses destas duas e contraditórias passagens, a construção intelectual brasileira do que se entende por cidadania tem ido além de seu aspecto teórico normativo voltado para a avaliação dos procedimentos da democracia e da justiça social.[...] Ao mesmo tempo, a produção crítica centrada na noção de cidadania tornou-se traduzível na experiência social, especialmente a das grandes cidades, nas quais se tornavam visíveis o extravasamento dos níveis “normais” de violência, do abandono, da expropriação, do desemprego, da miséria (2005,p. 376).
Neste contexto, conforme Paoli, a palavra cidadania emerge como
alternativa de segurança e ordem que já não são garantidas pelos modos
autoritários e policiais de agir e de pensar e isso suscitou, na opinião pública,
um chamamento à responsabilidade que só secundariamente foi dirigida ao
governo. No entanto,
85
[...] esta demanda foi capturada através do apelo ao ativismo social voluntário da população, e a palavra “solidariedade” tornou-se, no senso comum, a disposição altruísta voluntária de um indivíduo, uma organização ou uma empresa, um quase sinônimo de cidadania. (PAOLI, 2005, p.377).
Mas, o avanço não durou muito. Com a eleição de Color de Mello à
presidência da República, em 1989 houve um retrocesso significativo em
relação ao que havia sido conquistado até então, o que veio a culminar na
destruição das organizações populares. Collor foi eleito com a confiança das
classes dominadas e do sistema como um todo que lhe conferiram o poder de
governar o país e que, logo depois, foram surpreendidos com um seqüestro
dos ativos financeiros sem precedentes na história do Brasil.
Assim, o que se pode dizer é que o processo de desmonte e destruição
do Estado que conformou o governo Collor teve prosseguimento no governo
Fernando Henrique Cardoso, que acreditava no papel do Estado subsidiando a
formação de capital e que investiu na constituição de nova rede de relações
industriais que terminou por converter a referida dívida, em dívida interna
pública, “esgotando assim o papel de” condotiere “do Estado na expansão
capitalista”.
A crise interna do Estado colocou os holofotes sobre a despesa pública e converteu as despesas sociais públicas, no bode expiatório da falência do Estado “condotiere” quando na verdade isso se deveu à divida interna pública e ao serviço da dívida externa da simultaneidade das duas crises, com a incapacidade clássica das burguesias em abrirem-se para a política, o que significa dizer que a resolução de seus impasses não conseguia ser arbitrada, abriu o passo a que a solução burguesa viesse , uma vez mais, de fora para dentro, agora na forma de globalização .Dito de outro modo, a solução da inflação, que nada é mais que o conflito distributivo pela mais valia, foi resolvida pela abertura comercial, isto e, pela competição internacional que abocanhava partes crescentes da mais-valia produzida internamente (OLIVEIRA,1999,p.67).
Esse processo, seguindo a linha de raciocínio de Oliveira, levou a uma
subjetivação perigosa por parte da burguesia, que é o que se chama de
privatização não só das empresas, que é a sua forma mais aparente, mas
privatização do público, o que, na concepção do referido autor, significa uma
“falsa consciência da desnecessidade do público”.
86
Nessa perspectiva, a privatização se objetiva pela chamada falência do
Estado, onde a forma aparente é a de que as burguesias emprestam ao
Estado, o que faz com que se acredite que o Estado só se sustenta como uma
extensão do privado. Muito embora, além das aparências, a realidade seja
inversa, ou seja, a riqueza pública, em forma de fundo, sustenta a
reprodutibilidade do valor da riqueza, do capital privado.
A falência ou crise do Estado e o conseqüente surgimento da idéia de
Estado mínimo põem em cheque a competência do Estado e traz à cena a
desqualificação da imagem dos funcionários públicos que, aliás, são
desqualificados, como tudo que é público. São taxados de acomodados na sua
mediocridade, de terem privilégios por terem a garantia de emprego, etc. É
essa a imagem que foi sendo construída e que foi sedimentando a idéia de
“desnecessidade do público”, como se refere Oliveira. É essa a imagem que vai
corroborar para o surgimento e crescimento da responsabilização privada pelo
social, que encontra na lacuna aberta pelo desmantelamento do Estado terreno
fértil para sua expansão. 38
Não se pode perder de vista, como enfatiza Netto (1996, p.98), que o
momento atual é marcado por uma “nítida desqualificação da esfera pública
universalizadora”. O cenário hoje é conformado pelo desenvolvimento de “uma
cultura política anti-Estado”. 39 O que culmina, entre outras coisas, na
transferência, para a sociedade civil, de atribuições que antes eram do Estado,
num crescente processo de privatização que relega as organizações sociais,
movimentos e cidadãos a um papel marginal. É todo um movimento de
despolitização das demandas democráticas, ou seja, das questões públicas
38 A Reforma do Estado é vista freqüentemente como um processo de redução do tamanho do Estado, envolvendo a delimitação de sua abrangência institucional e a redefinição de seu papel (p.21). É importante conhecer as alegações presentes nos documentos do MARE e no discurso do então ministro Bresser Pereira quanto à necessidade de que o Estado fosse reformado: “O Estado cresceu em termos de pessoal, e principalmente, em termos de receita e despesa [...].Aos poucos foi se reconhecendo que o Estado não deve executar diretamente uma série de tarefas. Que reformar o Estado significa, antes de mais nada, definir o seu papel, deixando para o setor privado e para o setor público não-estatal as atividades que não lhe são específicas(p.22). Cadernos MARE da Reforma do Estado;volume II.. 39 Nesta mesma direção, Oliveira (1999, p.74) afirma que [...] a desmoralização dos trabalhadores, de funcionários públicos, a desmoralização da própria função pública, o apontar tudo que é público como inimigo de cada indivíduo tem uma carga simbólica mortífera que ampliou extraordinariamente a tragédia que já ocorria.
87
para o mercado ou para o “terceiro setor”. E o mais importante é que, nessa
“parceria”, “o Estado continuará a financiar as atividades públicas, absorvidas
pela organização social qualificada para tal”.
Francisco de Oliveira (1999, p.67) define tal processo como “a
privatização do público e a publicização do privado”. Na sua concepção é essa
conformação que abre o flanco para o ativismo social voluntário do setor
privado e das ONGs, que podem ser consideradas os “novos atores” da
década de 1990, numa adaptação do termo usado por Eder Sader ao se referir
à emersão dos movimentos sociais na década de 1980.
Dados do IBGE apontam que o número de entidades que formam o
terceiro setor no Brasil (fundações ou associações privadas sem fins lucrativos)
mais do que dobrou entre 1996 e 2002. Em 1996, havia no Brasil 107 mil
fundações privadas ou associações sem fins lucrativos. Em 2002, esse número
chegou a 276 mil, o que significa um aumento de 157% (Cf. Folha de São
Paulo, C.3, 11 de dezembro de 2004).
No ano de 2007, o que se viu na mídia foram denúncias em relação à
idoneidade das ONGs e aos recursos que o governo tem repassado para as
mesmas. Afirma-se, inclusive, que as instituições privadas sem fins lucrativos,
receberam nos últimos seis anos (2001-2006) R$ 12,4 bilhões do governo
federal. Recursos que superam o total dos investimentos dos ministérios da
Educação e da Saúde de 2001 a 2006. A Educação investiu R$ 3,3 bilhões e a
Saúde, R$ 7,4 bilhões. Situação com certeza preocupante. Muitas entidades
supostamente criadas pela sociedade civil dependem exclusivamente das
verbas públicas e, o que é pior, nem todas são honestas em seus propósitos e
na aplicação de recursos. 40
Como afirma Paoli (2005, p.377).
Cidadania e solidariedade são demandadas exatamente no momento em que os governos dos anos 90 eram impelidos, pelo modelo econômico adotado, a livrar-se do investimento em obrigações públicas de proteção e garantia eficazes dos direitos sociais.
40 Cf. Revista Isto É, n.1958 de 9/5/2007, p. 34-35.
88
Foi neste contexto em que as elites convencidas da “desnecessidade do
público” armaram-se da ilusão de serem politicamente auto-suficientes. As
classes médias agarraram-se às idéias de estabilidade monetária e do
individualismo meritocrático, em que as políticas redistributivas no país
mostravam-se ineficazes, e que proporcionaram as condições que levaram ao
entendimento da importância do surgimento relativamente recente da
sociedade civil. Inicialmente através de movimentos sociais autônomos e
politizados e, posteriormente, através das organizações não-governamentais
profissionalizadas. Deslocando, assim, a luta em prol da cidadania e justiça
social para o ativismo social pautado na solidariedade social. Neste sentido,
explicita Paoli,
Se o caminho aberto pelos movimentos e pela população carente organizada por bens públicos, o caminho das ONGs opta por representar as demandas populares em negociações pragmáticas, tecnicamente formuladas, com os governos, dispensando a base ampliada da participação popular.Desse modo, diferentes práticas de responsabilização e compromisso desenham um conflito potencial que diferencia internamente as múltiplas organizações que constituem a emergência daquilo que se entende por sociedade civil no Brasil, e que tende a se tornar critérios cada vez mais presentes no debate sobre seu sentido (2005,p.378).
3.4 Breve mapeamento da responsabilidade social no Brasil
Como afirmamos anteriormente, apesar das controvérsias, é preciso
considerar que a responsabilidade social no Brasil está crescendo41 tanto no
que se refere às empresas, quanto ao terceiro setor e ao poder público.
Presencia-se atualmente um movimento no sentido de que seja aprovada a Lei
de Responsabilidade Social na esfera federal, mas em alguns estados o
processo está mais adiantado. Os Estados do Rio Grande do Sul, Mato Grosso
e Amazonas tiveram suas Leis de Responsabilidade Social aprovadas.
O movimento por parte das empresas em relação à responsabilidade
social no Estado de Mato Grosso é incipiente, mas crescente. A Lei nº. 7.687, 41 Apenas para exemplificar, o Instituto ETHOS de responsabilidade social, em abril de 2006 ,com menos de sete anos de existência, comemorou o seu milésimo associado e isso é significativo. Um outro dado relevante é que atualmente, mais de 280 empresas brasileiras possuem o selo do IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas) que é considerado o marco da aproximação dos empresários com as ações sociais.
89
de 25 de junho de 2002, ”cria o Certificado de Responsabilidade Social no
Estado de Mato Grosso que será conferido anualmente às empresas, órgãos
públicos e demais entidades que apresentarem seu Balanço Social”. Para isto
foi criada uma comissão formada pela FIEMT, SESI, CRESS, SINCON,
FECOMÉRCIO, ABRH, AUDIPE, AMM e FAMATO à qual caberá a
responsabilidade de avaliar os balanços sociais publicados pelas empresas de
Mato Grosso e a concessão dos certificados.
Nas Instituições de Ensino Superior a responsabilidade social também
vem ganhando espaço. Como afirma Luís Carlos Merege, coordenador do
Núcleo da FGV-SP e dos cursos de administração para o terceiro setor, “as
universidades estão cada vez mais preocupadas em agregar disciplinas e
assuntos relacionados ao tema, tanto na graduação quanto na pós e nas
pesquisas”.
A preocupação das universidades vai além da formação de profissionais
para trabalhar com questões sociais, ela produz conhecimentos e metodologias
que podem ser repassadas aos outros setores. Nesse sentido, pode-se
destacar o núcleo de estudo e pesquisa da FIA/USP e o Centro de Estudos do
Terceiro Setor que têm se destacado e vêm produzindo conhecimento e
metodologias de trabalho, destacando-se no que se refere ao desenvolvimento
de ações sociais.
O Ministério de Educação a partir do entendimento de que a educação
“é uma prática social que pode dinamizar outros processos sociais,
oportunizando a construção de uma sociedade inclusiva e cidadã”, elegeu
como um dos princípios norteadores do Sistema Nacional de Avaliação do
Ensino Superior (SINAES)42 a responsabilidade social.
Para o SINAES, a responsabilidade social da instituição,
É considerada especialmente no que se refere à sua inclusão social, ao desenvolvimento econômico e social, à defesa do meio ambiente,
42 O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), instituído pela Lei nº 10.861, de 2004, é o novo instrumento de avaliação superior do Ministério da Educação e do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira- MEC/INEP.
90
da memória cultural, da produção artística e do patrimônio cultural. Enfatiza ainda que a “qualidade acadêmica não pode ser considerada de forma dissociada da responsabilidade social da educação superior, não por se tratar de um atributo abstrato, mas de juízo valorativo construído socialmente, respeitadas a identidade e a diversidade institucionais”.
Não vamos nos deter em analisar aqui a concepção de responsabilidade
social do SINAES, a referência é o sentido de ilustrar como a responsabilidade
social no Brasil vem crescendo nos últimos anos e como está sendo
contemplada não só nos discursos, mas nas propostas da educação, saúde e
outras áreas. Pensamos, ao contrário do estudioso que acredita que a
responsabilidade social está em declínio, que esta está em alta e que deve ser
melhor estudada e analisada principalmente pelas controvérsias e polêmicas
que lhe são inerentes.
Um outro aspecto que consideramos pertinente ressaltar é a procura,
por parte de profissionais que têm outra formação e que atuam no terceiro
setor ou nos programas de responsabilidade social desenvolvidos pelas
empresas, por cursos da área social. O Serviço Social é um dos cursos
demandados por esses profissionais. Tal procura pode ser justificada pela
escassez de profissionais qualificados para trabalhar na área. ”De um lado, há
bons administradores de empresa que conhecem as ferramentas de gestão,
mas têm pouca ou nenhuma vivência em questões sociais. De outro, os
profissionais do terceiro setor, com larga experiência no trabalho com as
comunidades, mas com um déficit de visão corporativa” (Marcos Kisil: Carta
Capital: Ed. Especial de dezembro de 2003, p.20). Foi a preocupação em
formar profissionais qualificados para trabalhar com responsabilidade social
corporativa que levou à proliferação de cursos de curta e longa duração,
seminários, palestras e até de programas de pós-graduação na área da
responsabilidade social. 43
Não obstante, como alerta Gonzalez,
43 Ver tabela com instituições que oferecem cursos na área de responsabilidade social no Brasil e no exterior.Carta Capital, Edição Especial. Dezembro de 2003:21.
91
O terceiro setor está sendo visto por muitos como negócio para ganhar dinheiro, por isso há muita propaganda enganosa, cursos de baixíssimo nível e em locais com pouca infra-estrutura (idem: 22).
Rosa Maria Fisher, coordenadora dos cursos oferecidos pela FIA/USP,
chama a atenção para a importância de que se saiba o real objetivo de quem
procura uma formação na área. Para Fischer é uma fantasia acreditar que o
terceiro setor seja a solução para o desemprego ou para as frustrações
profissionais, pois “o trabalho no terceiro setor é tão difícil, desgastante e
conflituoso quanto qualquer outro”.
Enfim, não restam dúvidas de que a atenção que se vem dando à
responsabilidade social é crescente tanto pelas empresas, que já têm toda uma
tradição nessa área, quanto no espaço público onde as iniciativas se alastram
a cada dia.
No ano de 2000, pesquisa realizada pelo IPEA com o título: “Iniciativa
Privada e o Espírito Público – Ação Social das Empresas Privadas no Brasil”
aponta que 59% das empresas com um ou mais empregados declararam
realizar algum tipo de ação social para a comunidade, ou seja, das 782 mil
empresas nacionais, 462 mil contribuem no campo social. (Carta capital n.
270,p.9). A reedição desta pesquisa sobre a ação social das empresas, em
julho de 2006, atualiza as informações do estudo anterior e traz dados
importantes relacionados à pesquisa realizada pelo referido órgão, em todas as
regiões do país.
No ano de 2004, nota-se que a participação empresarial na área social
aumentou 10 pontos percentuais, passando para 69% o número de empresas
que desenvolvem ações sociais, o que perfaz um total de, aproximadamente,
600 mil empresas que, voluntariamente, atuam em “prol das comunidades”. 44
Este é um dado ilustrativo do quanto a responsabilidade social vem se
ampliando no país, apesar das divergências que não são poucas.
No que se refere à distribuição das empresas que atuam na área social,
por região, tem-se o seguinte perfil: 50% encontram-se no Sudeste; 29% no 44 IPEA. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. A Iniciativa Privada e o Espírito Público: a evolução da ação social das empresas privadas no Brasil. Brasília, julho de 2006.
92
Sul; 10% no Nordeste; 8% no Centro-Oeste e 3% na região Norte.Estes dados
trazem algumas mudanças em relação aos resultados do estudo de 2000.Por
exemplo: em 2000, 64% das empresas do Sudeste desenvolviam ações
sociais, em 2004 houve um retraimento desse percentual. Já a região Sul que
contava com 16% de empresas que atuavam na área social, chega a 2004 com
29% de empresas que desenvolvem ações nesta área. As outras regiões não
passaram por grandes alterações. De modo geral, o que se pode afirmar é que,
apesar das diferenças regionais, houve um crescimento generalizado na
participação social das empresas. 45
Analisando-se esses dados a partir dos Estados, tanto na edição da
pesquisa de 2000 quanto na de 2004, a liderança continua sendo do Estado de
Minas Gerais. Os Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, com 72% de
participação, tiveram 20 pontos de crescimento no período.
No entanto, é pertinente ressaltar que o investimento financeiro das
empresas com as ações sociais não acompanhou tal crescimento, ou seja, só
R$ 4,7 bilhões foram investidos em ações sociais no ano de 2004, o que
corresponde segundo estatísticas mais recentes, a 0,27% do PIB do Brasil. Em
2000, essa relação correspondia a 0,43% do PIB do país. À época acreditava-
se que a tendência era de que esse percentual viesse a crescer, no entanto, o
que se constatou no estudo realizado em 2004, é que houve uma queda no
investimento financeiro. O que pode ser decorrente, dentre outras razões, do
retraimento dos investimentos das empresas do sudeste que em 1998,
investiram 0,66% do PIB e, em 2003, investiram 0,34%.
45 Conforme é apontado no levantamento realizado pelo IPEA, são as grandes empresas que se mantêm com maior taxa de participação em ações comunitárias em 2004(94%). Destaca-se, contudo, a expressiva participação das microempresas (de 1 a 10 empregados) 66% delas , ou 410 mil estabelecimentos deram algum tipo de contribuição para fora de seus muros.(A Iniciativa Privada e o Espírito Público: a evolução da ação social das empresas privadas no Brasil. Brasília, julho de 2006).
93
Tabela 2 - Investimento social privado, por região: montante de recursos investidos* e comparação com o PIB, 2000 e 2004.
Recursos Investidos em 2004
Recursos Investidos em Relação ao PIB (%)
(em R$) 2000 2004
Nordeste 537 Milhões 0,2 0,22
Sudeste 3,3 Bilhões 0,66 0,34
Sul 562,7Milhões 0,19 0,19
Centro
Oeste
240,8 Milhões 0,16 0,18
Norte 93,8 Milhões 0,1 0,11
BRASIL 4,7 Bilhões 0,43 0,27
Fonte: IPEA/DISOC (2006)
Nota:* Em valores constantes de 2004. Deflacionado pelo INPC médio anual.
Um outro aspecto levantado na pesquisa realizada pelo IPEA, que
chama a atenção é o reduzido uso dos incentivos fiscais. A proporção de
empresários que utilizava os benefícios fiscais em 2000 era de apenas 6%; em
2004, esse percentual caiu para 2%, ou seja, somente 2% das empresas que
desenvolveram ações na área social fizeram uso dos incentivos fiscais.Sendo
que daquelas que se beneficiaram dos incentivos fiscais a proporção maior foi
das empresas com mais de 500 empregados.
Perguntados sobre o porquê da não utilização dos incentivos fiscais,
40% dos empresários alegaram que não recorreram aos incentivos fiscais
porque o valor era muito pequeno e que, portanto, não compensava seu uso;
16% não utilizaram porque as isenções permitidas não se adequavam às
atividades desenvolvidas, e 15% nem mesmo sabiam da existência de tais
benefícios.
Quanto aos motivos que levam os empresários a desenvolverem ações
sociais, verificou-se que os motivos humanitários mobilizam 76% dos
empresários a realizarem ações sociais. Tal índice é condizente com o discurso
dos empresários que buscam em todas as oportunidades ressaltar o lado
94
humanitário da sua empresa. Já 22% são movidos por razões religiosas; o que
pode ser explicado pelo fato de que as religiões, historicamente,
desenvolveram ações humanitárias; 11% investem em ações sociais
objetivando aumentar a produtividade e melhorar a qualidade do trabalho; 25%,
das empresas buscam aumentar a satisfação dos empregados; 26% realizam
ações sociais, objetivando melhorar a imagem da empresa; 12% dos
empresários voltam suas ações para complementar a ação do governo; 17%
afirmaram que desenvolvem ações sociais para atender a solicitação de
amigos/políticos. O clientelismo, tão presente na nossa sociedade, ao que
parece, está presente também entre os motivos que levam os empresários a
realizarem ações sociais.
As ações desenvolvidas pelas empresas são diversificadas, destacando-
se a assistência social, que perfaz um total de 54% das ações; a alimentação e
abastecimento com 41% das ações.
A saúde, perfazendo um total de 17% das ações e a educação com
19%, não se constituíram em ações prioritárias. A cultura com 14% das ações,
o que pode ser considerado um percentual significativo se for levado em conta
os incentivos de que goza essa área. Também chama a atenção o percentual
de 13% das ações serem voltadas para segurança, o que talvez possa ser
imputado à crescente violência que vem conformando a realidade atual.
Em relação aos beneficiados das ações realizadas pelas empresas, as
crianças são alvo de 62% das ações, ou seja, constituem-se em uma parcela
da população que vem merecendo atenção maior por parte da sociedade.As
famílias, que perfazem um total de 42% dos beneficiados,também têm se
constituído em alvo de atenção nos últimos anos.O que nos desperta a atenção
é o fato de os portadores de doenças graves serem contemplados com,
apenas, 7% das ações.O que pode ser decorrente da relutância que as
empresas têm em apoiar projetos “mercadologicamente incorretos”, que
poderiam colocar em risco as suas marcas.
O estudo aponta, ainda, que na região Sul houve maior incremento em
relação à proporção de empresas atuantes, no período de 2000 a 2004,ou seja,
95
houve um aumento de 21 pontos percentuais. As empresas localizadas no
Nordeste ficaram em segundo lugar, tendo um aumento de 19 pontos
percentuais, ultrapassando as empresas da região Sudeste (região onde está
localizada a maioria das empresas de grande porte) que tiveram um aumento
de 4 pontos percentuais. A região Norte apresentou uma expansão de 15;
pontos percentuais e, finalmente a região Centro – Oeste que teve um
crescimento de 11 pontos percentuais, no referido período, passando de 50%
para 61%.
Em relação à região Centro - Oeste, os resultados da pesquisa apontam
que 50% das empresas, com um ou mais empregados, declararam realizar
algum tipo de ação social para a comunidade em 2000. O investimento
realizado atingiu R$ 125 milhões, o que equivale a 2% do PIB regional daquele
ano.
Quanto às ações desenvolvidas destaca-se a assistência social, que
recebe atenção maior por parte dos empresários, com 62% , seguida da
alimentação com 33%.A educação é apoiada somente por 15% das empresas,
não se constituindo, portanto, em foco prioritário. O público alvo das ações
sociais na região Centro-Oeste são as crianças, contando com 74% das ações.
Um outro aspecto que demonstra ser a atuação social das empresas um
bom negócio é a proliferação de instituições mediadoras, situadas entre a
entrada de dinheiro voltada para finalidades filantrópicas e os seus
destinatários finais (os pobres) que têm aberto verdadeiros “nichos no
mercado”, e que vêm se configurando num setor importante para a realização
do lucro mercantil.
Há instituições que ensinam o empresário a doar, outras que lhe mostram como captar recursos e fazer parcerias, outras ainda a estruturar uma entidade específica para gerir o trabalho filantrópico, organizar esta entidade de modo que propicie uma ação social mais durável, desenvolver a administração financeira e contábil própria desse tipo de atividade, enfrentar o imposto de renda, pautar matérias jornalísticas, mudar de vocabulário e mentalidade, aprender a informar-se em seminários de discussão e até mesmo compatibilizar as exigências de produtividade da empresa diante de seus trabalhadores (“funcionários”, na linguagem corrente) através da adoção de programas filantrópicos. (PAOLI, 2005, p.396).
96
Por outro lado, não deixa de ser curioso o fato de as empresas doadoras
de dinheiro para projetos sociais no Brasil, serem captadoras de recursos, ou
seja, não doam de seu bolso, mas, sim, através de alianças com outras
empresas ou com organismos internacionais, ou, em muitos casos, formando
redes de solidariedade.
Finalmente, os limites e possibilidades da filantropia empresarial, ou do
que se convencionou chamar de responsabilidade social só podem ser
conhecidos a partir da consideração do contexto em que se dá a redução do
Estado no que se refere às políticas públicas direcionadas para a promoção e
garantia dos direitos sociais e da conseqüente abertura do espaço às
organizações sociais privadas, o que leva parcela do empresariado a atuar de
forma ativa no campo social, conclamando seus pares à responsabilidade em
relação ao contexto onde operam seus negócios, ou seja, um cenário marcado
pelo aumento das desigualdades sociais e da pobreza no país. 46
Face à ineficiência burocrática do Estado e à politização dos conflitos
sociais é feito um apelo ao empresariado para que este assuma as ações
sociais. Tal fato que pode parecer inédito na história do país tem raízes mais
profundas e traz nuances da velha filantropia desenvolvida pelos empresários,e
que se apresenta, atualmente, como solidariedade. 47 Por outro lado, deve-se
46 Alguns números ilustram bem a imagem da desigualdade brasileira à época: um país que tem um PIB de 540 bilhões de dólares, ter 34,9% de sua população – 54,4 milhões de pessoas – alocadas na rubrica de pobres, ou seja, aqueles que conseguem comer, mas não vestir-se ou morar; e , 8,7% -13,6 milhões de pessoas na rubrica de indigentes, que não conseguem ter acesso nem às necessidades básicas é certamente um país desigual. Dados atuais do IBGE afirmam que houve uma queda recente da desigualdade no Brasil.Dados abrangidos pela PNAD referentes ao período 2001/2004, mostram que o grau de desigualdade de renda no Brasil declinou em 4%.A renda dos 20% mais pobres do país cresceu no período cerca de 5% ao ano, enquanto a dos 20% mais ricos diminuiu em 1%.Não obstante, a análise desenvolvida pelo IBGE é a de que apesar da queda recente, a desigualdade de renda brasileira permanece muito elevada , muito acima da observada em países com grau de desenvolvimento semelhante ao nosso. (IPEA- Nota Técnica. Brasília, 21 de julho de 2006). 47 Conforme Paoli (2005, p.386) No período conhecido como Primeira República (1899 – 1930), que abrigou o início e expansão das indústrias nacionais em um contexto no qual os empresários recusavam a regulação estatal do trabalho, as poucas e grandes fábricas realizavam serviços de assistência social aos seus trabalhadores na forma de creches, facilitação de moradia, como as vilas operárias, e alimentação. Essas iniciativas eram guiadas por um paternalismo autoritário e normativo explicito e baseado no padrão que Roberto Schwarz chamou de “favor”, a reciprocidade submissa e devedora dos trabalhadores pobres à benemerência de seus patrões. Durante a ditadura Vargas (1930-1945) estes serviços cresceram em número, com a ambição de ser uma ação alternativa a criação legal dos direitos mínimos do trabalhador. Poucas, mas famosas, fábricas orgulhavam-se de ter instalado
97
considerar que essa filantropia desenvolvida pelos empresários se coaduna
com o lucro empresarial, ou seja, se adapta, e bem, aos preceitos neoliberais
que preconizam a iniciativa individual e privada contra a ineficiência do
Estado.48
Fala de Odeb Grajew, citada por Paoli (2005, p.393), é elucidativa:
Não tenho ilusões. A lógica empresarial é o lucro e não a solidariedade. Mas de repente há a percepção que o lucro depende de posturas mais éticas e solidárias. Esta é uma conquista da sociedade civil e as empresas estão tendo que se adaptar.
Sem dúvida, a atuação social das empresas tornou-se um “diferencial de
competitividade”. Pode-se presenciar, de modo recorrente, no discurso
empresarial a expressão “valor agregado à marca”, o que significa que a
filantropia empresarial é alavancada por outros motivos que não só a
benemerência.
O aumento crescente de iniciativas voltadas para a criação ou
implementação de programas de responsabilidade social nas empresas, que se
vem presenciando nas últimas décadas, representa empenho, para serem
reconhecidas como socialmente responsáveis.
Nesta direção as ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas
empresas, ao que parece, são estratégias de sobrevivência face à voracidade
do mercado globalizado. Há que se pensar também que a necessidade de
legitimação perante a sociedade e a exigência de consumidores cada vez mais
conscientes se constituem em fatores que impulsionam tais iniciativas.
É neste espaço ocupacional marcado pela globalização e acirramento da
questão social, que as empresas são levadas a buscar diferentes estratégias
creches, ambulatórios médicos e dentários, refeitórios com cozinha dietética, escolas e campos de esportes, e moradias para as famílias de seus trabalhadores [ ]. É necessário, no entanto, precisar o sentido da volta, no tempo, da filantropia empresarial. Entre a antiga e nova filantropia houve o fordismo, e por esse ângulo o sentido da nova filantropia remonta ao conservadorismo arcaico na contemporaneidade. 48 Na concepção de Oliveira (1999, p.72), nesse processo, anulam-se as diferenças entre Estado e sociedade, entre Estado e Mercado e finalmente entre o governo e as empresas; mais freqüentemente, quem estava na empresa ontem, pode estar no Estado hoje e vice-versa.
98
para permanecer no mercado. Nesse sentido, consideramos que as ações de
responsabilidade social fazem parte dessas estratégias, que por sua vez
também podem se constituir em espaços de atuação para os assistentes
sociais.
99
4. CAPÍTULO IV – A ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NAS AÇÕES DE RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS EM MATO GROSSO
“O espaço sempre há, mas o assistente social não é convidado a
participar” (P.1).
Buscamos, neste capítulo, analisar os depoimentos dos sujeitos
entrevistados: assistentes sociais e gestores, destacando as concepções de
responsabilidade social, as ações desenvolvidas e os motivos pelos quais
desenvolvem essas ações. É a partir desses parâmetros que iremos conhecer
aquilo que é atribuído ao assistente social nas ações de responsabilidade
social desenvolvidas pelas empresas no Estado de Mato Grosso.
4.1 Responsabilidade social empresarial: o entendimento dos sujeitos
Como já afirmamos no capítulo III, o próprio termo “responsabilidade
social” é carregado de ambigüidades sendo abrangente, impreciso e tendo
vários e heterogêneos significados. É um conceito em construção o que ficou
patente nos depoimentos que nos mostraram existir diferentes formas de
entendimento do que vem a ser a responsabilidade social empresarial. No
entanto, o que nos chamou a atenção foi a recorrência tanto implícita quanto
explícita à concepção de responsabilidade social empresarial adotada pelo
Instituto ETHOS de responsabilidade social.
Como define um dos entrevistados,
O conceito de responsabilidade social que nós, empresa, entendemos é o mesmo do ETHOS, que é uma forma de gestão, é como a empresa gerencia seus recursos com os seus diversos públicos que são os funcionários, os fornecedores, os clientes externos, a comunidade. Agora como eu praticamente entendo a responsabilidade social é quando a empresa, o 2º setor, investe uma parte do seu lucro na comunidade, no entorno onde está localizada, de forma que ela possa também cumprir o seu papel. (P1)
A responsabilidade social é também definida como uma opção pessoal.
Nessa perspectiva, as ações sociais desenvolvidas pela empresa partiriam de
100
empresários individualmente engajados em proporcionar ajudas filantrópicas
que atendam às demandas que a comunidade apresenta, ou seja, a
responsabilidade social enquanto aspecto relacionado ao foro íntimo do
dirigente, ou à sua filosofia de vida. Nesse sentido, a história de vida do
empresário e a sua formação pessoal parecem contribuir para o seu
envolvimento com as ações sociais.
Responsabilidade social é algo que vem da própria diretoria. É uma forma como eles vêem os colaboradores. Então isso é natural, é uma questão de princípio do próprio conselho da empresa, isso flui naturalmente, não precisa ser forçado para ser implantado. (G.2)
Ele ajuda tantas pessoas na vida particular dele que não faz questão de mostrar na vida empresarial também. (....) É uma pessoa que tem essa mentalidade positiva, que não tem medo de investir no social. Ele nunca fala não para nenhum projeto. (P2)
Um outro aspecto apontado pelos entrevistados refere-se à preocupação
em desenvolver ações que extrapolem o âmbito interno da empresa e se
estendam ao seu entorno, à comunidade que lhe avizinha.
Aliás, a preocupação em realizar ações sociais nas proximidades da
sede da empresa parece não ser recente. Gomes (2005, p.58), se remete a
Barnaby Briggs que dá exemplo de uma empresa criada em 1769, chamada
Etruria, que já naquele ano construiu uma vila para operários com “condições
decentes de moradia”. Segundo o autor, esse fato seria precursor do que se
chama hoje de ação de responsabilidade social. No Brasil se nos remetermos
ao período do primeiro pós-guerra, como nos lembra Iamamoto (1988, p.137),
vamos nos deparar com as vilas operárias, com a criação de ambulatórios,
creches, situados nas proximidades das fábricas, que se constituíam tanto em
meio de controle social, já que sua concessão era condicionada ao bom
comportamento e a uma vida regulada, quanto serviam para aumentar a
produtividade, garantindo, assim, mais lucro para os empresários. Assim, a
preocupação em desenvolver ações sociais no entorno do negócio, além de
não se constituir em novidade, faz parte da racionalidade empresarial que é
voltada para garantir a produtividade da empresa e gerar lucro, mas que, sem
dúvidas, está sendo muito valorizada atualmente.
101
Hoje a gente começa também a ver mais uma exigência da responsabilidade social que é a responsabilidade pela sociedade ao redor. O objetivo maior, inicial era somente com os colaboradores internos. Agora a gente está começando a ter uma visão maior que é a responsabilidade com o meio ambiente, com a comunidade. (G.2)
Responsabilidade Social Empresarial nada mais é do que a parte social, tanto interna quanto externa que a empresa desenvolve, seja para os beneficiários dela, como a assistência que ela dá aos usuários que são os empregados que são os colaboradores dela, quanto às atividades de cunho social que seriam a educação, o lazer, os incentivos voltados para o bem-estar dentro da empresa, a qualidade do trabalho. Então isso é focado na responsabilidade social empresarial. (P.2)
Ela [a empresa] tem que minimizar ao máximo os efeitos de sua planta na comunidade. (P.3)
Entendo a responsabilidade social empresarial com papéis bem definidos, o 1º setor, 2º setor e o 3º setor de forma que possam estar contribuindo, cada um de uma forma, ou, de outra, para melhorar o ambiente onde está inserido, para a transformação social do ambiente onde está inserido. (P1).
(...) Tem a ver com o local onde eu estou inserido, no nosso caso, estamos inseridos em todas as comunidades do Estado, então o que é que posso fazer para provocar uma melhoria na qualidade de vida das pessoas onde eu atuo. (G.1)
A responsabilidade social empresarial é considerada também um
requisito para a empresa estar no mercado.
É uma visão bem geral de uma gestão de todas as empresas diante da necessidade de estar no mercado atuando de modo transparente com a sociedade, com os clientes de modo geral. E, isso é postura também que a empresa tem adotado para desenvolver suas ações. Também tem ações sociais desenvolvidas pela empresa, por exemplo, essas ações que a empresa desenvolve para as comunidades circunvizinhas, para as pessoas que estão envolvidas no processo da empresa. (P.4)
Em meio à globalização da economia e aos problemas sociais daí
advindos a responsabilidade social empresarial é, certamente, um fator de
competitividade. Considerando que as “empresas socialmente ativas
promovem sua imagem junto aos consumidores, melhoram o relacionamento
com as comunidades vizinhas e percebem os ganhos de produtividade de seus
trabalhadores” (PELIANO, 2001, p.28).
Em outros depoimentos o entendimento do que é responsabilidade
social empresarial se resume a “dar apoio” ou, a “cuidar”.
102
É uma coisa nova ainda. Para mim a responsabilidade social é parte da empresa, para saber que ela existe que automaticamente eu sou cliente dela, mas ela também é meu cliente. É uma via de mão dupla. Isso é que eu entendo. No nosso caso é o voluntariado junto com a responsabilidade social. (P.6)
A nossa responsabilidade social é estar dando apoio a alguém, a alguma entidade. A responsabilidade social aqui [na empresa] funciona dentro da área administrativa não na agência. No caso de Mato Grosso ela funciona aqui na gerência de RH, a gente administra, mas com o apoio de todas as agências se a gente vai fazer algum tipo de coleta, alguma doação de alimentos, tudo isso aí, a informação sai daqui, vai e volta para a gente estar administrando. A gente tem um Departamento de Ação Social em Brasília. A gente segue as metas que eles determinam para a gente. (G.6)
A responsabilidade social na empresa tem que ser vista assim como a gente tem responsabilidade com a nossa família, é cuidar. (P.3)
As assistentes sociais e os gestores das empresas pesquisadas, ao
definirem o que entendem por responsabilidade social empresarial se remetem
aos conceitos divulgados pelas entidades que vêm assessorando a
implantação e implementação das ações de responsabilidade social no país e
também no Estado de Mato Grosso. Nesse sentido o Instituto ETHOS de
Responsabilidade Social, o IBASE e o GIFE têm se destacado, sendo que no
Estado de Mato Grosso a presença maior é das duas primeiras. Em relação ao
IBASE a referência buscada é em relação à elaboração do Balanço Social.
Conforme é apontado por Melo Neto & Froes (2002, p.85), o exercício da
cidadania empresarial pressupõe uma atuação eficaz da empresa em duas
dimensões: a gestão da responsabilidade social interna e a gestão da
responsabilidade social externa, entendendo que a responsabilidade social
interna consiste em focalizar o público-interno da empresa, seus empregados e
seus dependentes. O seu objetivo é motivá-los para um desempenho ótimo,
criar um ambiente agradável de trabalho e contribuir para o seu bem-estar.
Com isso a empresa ganha a sua dedicação, empenho e lealdade. A
responsabilidade social externa tem como foco a comunidade mais próxima da
empresa ou o local onde ela está situada.
Atuando em ambas as dimensões, a empresa exerce a sua cidadania
empresarial e adquire o seu status de “empresa cidadã.” Entretanto, alertam os
autores, não é sempre que ocorre esse novo paradigma de cidadania
103
empresarial e exercício pleno de responsabilidade social. Há casos de
empresas que são mais eficazes e atuantes em apenas uma das dimensões.
A maioria das empresas pesquisadas afirma desenvolver ações voltadas
tanto para o público interno quanto para o público externo. Só uma das
empresas parece priorizar as ações internas, mas admite a necessidade de
ampliar o alcance das ações. Um dos depoimentos aponta para uma distinção
entre responsabilidade social interna e externa, segundo o qual a
responsabilidade social empresarial é a externa, as ações internas são só de
responsabilidade social. Como afirmamos anteriormente, ainda é um termo em
construção, portanto, perpassado por ambigüidades e até equívocos.
Responsabilidade social empresarial (...) é só para o público externo. Responsabilidade social interna, que seria o incentivo ao esporte. Agora a externa que seria a empresarial é só para o público externo (G.6).
Quando os entrevistados descrevem as ações desenvolvidas pelas
empresas, a preocupação com os empregados se faz presente podendo-se
constatar que, em algumas, a preocupação maior é com os empregados, muito
embora apontem a necessidade de envolver a comunidade.
A referência ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável
aparece de forma recorrente nos depoimentos, tanto das assistentes sociais
quanto dos gestores. O que é justificado, conforme os entrevistados, pela
necessidade de “reparar os danos decorrentes da atuação da empresa”, ou de
“minimizar, ao máximo, os efeitos da sua planta na comunidade”, ou ainda, de
“melhorar a qualidade de vida das pessoas nos locais em que a empresa atua”.
Não restam dúvidas de que a questão ambiental seja a tônica do
momento, 49 e como tal, não passou despercebida aos empresários que
49 Aliás, é pertinente não perder de vista que a preocupação com o meio ambiente não é recente, ela pode ser remetida à década de 1970, antecedendo, portanto, a preocupação das empresas em incluí-la com destaque nas suas ações de responsabilidade social. Isso pode ser demonstrado: 1970- 300.000 pessoas nos EUA participaram do “Dia da Terra”; 1971 - Programa Homem e a Biosfera, em Paris, cuja preocupação era conciliar o desenvolvimento com o meio ambiente; 1974 - Cientistas americanos divulgam uma pesquisa a respeito da destruição da camada de ozônio pelo CFC (cloro, flúor, carbono); 1980/1981 - Criação da Política Nacional do Meio
104
propagam a necessidade de preservação do meio ambiente e a importância da
consciência ecológica. Acreditamos que houve, por parte dos empresários,
uma apropriação do discurso dos ambientalistas que têm se mobilizado no
mundo todo em defesa da preservação do meio ambiente e do
desenvolvimento sustentável. O que, por sua vez, também é preconizado pelo
Instituto ETHOS e por outras entidades que assessoram as empresas em
relação à responsabilidade social no país.
Também não se pode perder de vista a existência de Normas como a
ISO 14.000 e toda uma legislação que colocam a exigência de que as
empresas tenham uma relação de proteção e não de degradação da natureza.
Assim, as ações de responsabilidade social empresarial muitas vezes podem
evitar demandas judiciais futuras.
Por outro lado, as ações sociais voltadas para a preservação do meio
ambiente e para o desenvolvimento sustentável se constituem, para muitas
empresas, em mais um ingrediente de marketing, passam uma imagem de
preocupação social Como exemplifica Gomes (2005, p.56), “em linguagem
publicitária, fotos de uma paisagem bucólica, de um rio límpido e cristalino,
aliadas a frases de efeito como “compromisso com a natureza”, ou, “respeito ao
meio ambiente” são amplamente exploradas pela mídia”. Assim, pensamos que
não é sem interesse o fato de que as empresas estejam tão imbuídas em
desenvolver ações voltadas para a preservação do meio ambiente e
preconizem a tese do desenvolvimento sustentável.
Ambiente, no Brasil, que implementa e regulamenta o Estudo do Impacto Ambiental (EIA) e posterior publicação do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), através da Lei 6939/de 1979; 1985-criação de agências para regulamentação do tema meio-ambiente como o SISNAMA (Sistema Nacional de Meio Ambiente), CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente) e IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais);1989 Documento da Assembléia Geral da ONU solicita um estudo para reverter os efeitos da degradação ambiental; 1992- Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92), no Rio de Janeiro. Preparação da Agenda 21 que foi um plano de ação para controlar a degradação ambiental; 1996 - Adoção da ISSO 14.001 como Norma Internacional para o reconhecimento de empresas que implementem programas de gestão ambiental; 1999- A ONU lança o Compacto Global que é um apelo aos “dirigentes do mundo dos negócios” para que eles se empenhem nas questões relacionadas aos direitos humanos, trabalhistas e questões ambientais. É o prenuncio da Responsabilidade Social Empresarial com a legitimidade das Nações Unidas. (CF.Gomes, 2005, p.55)
105
Como afirma Kameyama (2001, p.27), muito embora as empresas
historicamente e esporadicamente já desenvolvessem ou colaborassem com o
desenvolvimento de ações sociais, só a partir dos anos de 1990 é que essas
ações passaram a ser incorporadas à sua gestão. Para Kameyama, não se
pode conceber que as empresas continuem a ter a postura que tinham até os
anos de 1990, quando a preocupação maior consistia em oferecer produtos e
serviços aos seus clientes, ou a empreender ações sociais na comunidade,
sem incluí-las na sua estratégia empresarial. Atualmente, a responsabilidade
social se incorpora à gestão e abrange toda a cadeia de relacionamentos.
Como é enfatizado no depoimento de um dos gestores: “As empresas queiram
ou não queiram têm que se enquadrar dentro de uma política socialmente
responsável”. (G.5)
Na perspectiva dos gestores parece explícito o que entendem e o que
realmente pretendem com a responsabilidade social empresarial. Para eles a
responsabilidade social está incorporada à gestão, faz parte do seu negócio e
abrange toda a cadeia de relacionamentos: funcionários, clientes,
fornecedores, governo, sociedade, meio ambiente, acionistas.
Para nós, tem a ver com a gestão do nosso negócio. É voltada para os cuidados específicos de todos os públicos que nós temos. (...) É uma empresa privada, mas que atua na área do serviço público, então ela tem que ter a preocupação com todos esses públicos com os quais atua. É uma preocupação especial com a questão ambiental. A nossa empresa é de energia elétrica e tem muito a ver com a questão ambiental. Responsabilidade social é estar preocupada com essa situação (eficientização de energia) que tem a ver com a gestão. (G.1)
É a forma como a empresa está gerindo os negócios em relação a todos os públicos. Como ela age com os fornecedores, com os funcionários, com o meio ambiente. É uma forma ética e transparente de gerir. Na verdade é a forma como a empresa está se relacionando com esses públicos. Não são somente os projetos sociais que a empresa tem. Está relacionado com as Metas do Milênio. Quando se fala de RS é tudo: é pagar os impostos, cumprir os contratos etc. Na verdade uma empresa para crescer tem que ser socialmente responsável. Tem que pensar nas pessoas, nos investimentos econômicos, nas questões políticas. Se ela for pensar só no econômico ela vai quebrar. Ela tem que aprender as várias legislações tanto nacionais como internacionais. É uma necessidade para continuar atuando. (G.4)
Na fala de um outro gestor, a concepção de responsabilidade social
aparece revestida por um discurso humanitário, marcado pela preocupação
106
com os colaboradores, pelo compromisso com a comunidade e com o meio
ambiente, sem perder de vista que a postura assumida pela empresa repercute
no seu reconhecimento por parte da sociedade.
Eu vejo o seguinte, a gente tem um credo, nesse credo a nossa visão é com a energia que a gente transporta. Temos o comprometimento de ser uma empresa sustentável sob o ponto de vista social, econômico e ambiental, referencial de excelência e, em função disso tudo, ser reconhecida e valorizada pela sociedade. (G.3)
Este gestor parece ter uma forma diferente de gerir os negócios e de
entender a responsabilidade social. Para ele a grande dúvida é em relação às
intenções que levam a empresa a desenvolver ações de responsabilidade
social. Até que ponto, pergunta ele, a empresa na defesa dos seus interesses
está usando a comunidade?
4.2. O porquê das ações de responsabilidade social
As ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas
pesquisadas são decorrentes de uma gama de razões que divergem em
termos do entendimento e do que é pretendido, em termos de resultado.
Por exemplo, duas das empresas pesquisadas vinculam os motivos
pelos quais foram levadas a desenvolver ações de responsabilidade social às
Metas do Milênio50.
(...) atribui essa possibilidade desde que foram criadas as Metas do Milênio. Então dentro disso é que está começando. Ainda estamos engatinhando. (G.6)
(...) das ações que a empresa tem estão relacionadas com as Metas do Milênio. (G.5, G.4).
O que nos leva a questionar até que ponto as ações desenvolvidas por
essas empresas contemplam aquilo que é preconizado pelas Metas do Milênio 50 Os Objetivos de desenvolvimento do Milênio (ODM) foram adotados em 2000 pelos governos de 189 países - incluindo o Brasil - como um compromisso para diminuir a desigualdade e melhorar o desenvolvimento humano no mundo. Ele prevê oito grandes objetivos, a serem cumpridos, em sua maioria, até 2015: erradicar a extrema pobreza e a fome; atingir o ensino básico universal; promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental e estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento.
107
ou ainda, de que forma tais ações vão contribuir para o fim da desigualdade e
melhorar o desenvolvimento humano no mundo, conforme é preconizado pelas
Metas do Milênio. Não estamos querendo dizer que as ações sociais
desenvolvidas por essas empresas ou por outras quaisquer não tenham
importância. O que consideramos complicada é a forma como os discursos
globalizados servem para justificar ações muitas vezes pontuais, que
certamente vão ter pouca ou nenhuma ressonância em relação àquilo que é
definido como objetivo das “Metas do Milênio.” No nosso entendimento o que
está ocorrendo é a apropriação dos discursos globalizados sem que haja, de
fato, uma assimilação que leve à sua concretização, até porque, extrapolaria os
objetivos da empresa.
Em outra empresa as ações de responsabilidade social tiveram início a
partir de problemas concretos enfrentados por ela no desenvolvimento dos
seus negócios. As empresas, num país capitalista como é o nosso certamente
só vão desenvolver qualquer ação social a partir da operação custo-benefício.
Como nos alerta Gomes (2005) “as ações praticadas pelos empresários são de
caráter racional, elas são praticadas visando a um objetivo no futuro, são
embasadas no conceito da reflexividade”. Reflexividade, tal como é concebida
por Anthony Giddens (1991), é uma propriedade da ação humana. Pessoas ou
grupo de pessoas realizam determinadas ações para obter outras ações a
partir da primeira. Assim, não parece surpreender o fato de as ações sociais
desenvolvidas pelas empresas objetivarem um retorno, por fazer parte da
lógica empresarial que reafirmamos é sempre racional, é sempre voltada para
a otimização do negócio e para a garantia do lucro.
A preocupação com a questão ambiental faz parte do meu negócio 365 dias do ano. A questão da eficientização energética também tem a ver, porque não adianta pensar em vender energia. Eu tenho que pensar em vender energia e que o meu cliente tenha condições de pagar. Parte dos meus clientes são de baixa renda, aí eu tenho que buscar fazer com que eles possam me pagar para que eu possa continuar investindo. (G.1)
Um outro gestor apesar de ter clareza da lógica empresarial que
perpassa o seu negócio, questiona o fato de que as ações de responsabilidade
social desenvolvidas pela empresa sejam por interesse ou não. No entanto, é
108
honesto em admitir que a empresa sempre sai ganhando quando realiza ações
sociais.
A gente tinha um problema de desligamento de linhas, porque os meninos quebravam os isoladores, desligavam as linhas e aí a gente perdia em confiabilidade no nosso sistema e tinha um grande risco das pessoas se acidentarem, aí começamos a desenvolver um projeto, com a gente atuando na área do entorno onde estava tendo o problema, sem atacar diretamente a questão da quebra dos isoladores. Aí que surgiu o Caratê com Energia. (...)
A gente tem uma dúvida. Essa é que é a grande dúvida minha mesmo. Se estou fazendo com segundas intenções, porque, a gente está resolvendo um problema da gente, evitando acidentes a terceiros, evitando que as linhas desliguem , que joguem lixo debaixo da linha. Ta reduzindo custo porque a gente não precisa mais limpar esse lixo, na verdade, a gente tem agora defensores da gente lá, porque eles não sujam mais a faixa de servidão, evitam os acidentes e nos defendem. É uma dúvida que eu tenho, se a gente não está usando as pessoas na sutileza das coisas. (...)
Eu tenho assim, que não é interesse, que a gente ta fazendo isso pelo próprio histórico nosso. A gente era muito tecnicista, ia lá limpava e acabou. A gente tem crescido como gente, os colaboradores, por isso eu acho que não é só interesse, mas sempre tem esse pontinho de interrogação aí. Mas a gente está ganhando algo em troca. Eu não sei se conceitualmente a gente está errado com relação a isso. (...)
Aí eu tenho essa dúvida enquanto gestor. Num primeiro instante eu confesso não sei se certo ou errado era dar algo sem estar recebendo nada em troca, que é mais ou menos a lógica do voluntariado. (G.3)
Em um outro trecho da entrevista, ao se referir a uma das ações sociais
desenvolvidas pela empresa, afirma que:
Esse é um projeto 100% puro, sem segundas intenções nossas ou que vai ter alguma contrapartida. (G.3)
Como já afirmamos anteriormente, os gestores parecem ter muita
clareza do que é e do que querem alcançar com as ações de responsabilidade
social empresarial, apesar de nem sempre recorrerem à mesma forma de
atuação.
Pesquisa realizada pelo IPEA no ano de 2000 (atualizada em 2004)
sobre a ação social das empresas privadas no Brasil, aponta, dentre outros
indicadores, os motivos que levam os empresários a desenvolver ações
109
sociais. Conforme a pesquisa, os motivos humanitários mobilizam 76% dos
empresários a realizarem ações sociais. Já 22% são movidos por motivos
religiosos11% investem em ações sociais objetivando aumentar a
produtividade e melhorar a qualidade do trabalho; 25%, das empresas buscam
aumentar a satisfação dos empregados; 26% realizam ações sociais
objetivando melhorar a imagem da empresa; 12% dos empresários voltam suas
ações para complementar a ação do governo; 17% afirmaram que
desenvolvem ações sociais para atender a solicitação de amigos/políticos.51
Rosa Maria Fischer (2002) afirma que os es udos qualitativos realizados
ressaltam a grande diversidade de formas de atuação com as quais as
empresas buscam concretizar sua concepção de responsabilidade social, e
permitem identificar, também, dois tipos básicos: a empresa que concebe tais
ações como um investimento social, como um bem em si mesmo, gerador de
resultados para a comunidade ou a população-alvo e a empresa que concebe
tais ações como investimento negocial cujo retorno efetiva-se na imagem da
marca e no desempenho do produto. Ressalta a autora: esses tipos não se
opõem necessariamente. As dúvidas em relação ao fato de as ações
desenvolvidas estarem ou não permeadas por interesses do próprio negócio,
ao que parece,relacionam-se à concepção que se tem da responsabilidade
social empresarial pautada na ótica do voluntariado, cujo preceito básico é
fazer o bem sem receber nada em troca, sem outros interesses, senão o de
ajudar o próximo.
Assim, conforme afirmam Karkotli & Aragão (2004, p.16), manter-se num
mercado altamente competitivo e sem fronteiras, tem se constituído em desafio
para as empresas que têm que utilizar estratégias que levem em conta a
melhoria da qualidade de vida, a valorização do potencial humano, o equilíbrio
ecológico e a equidade social, ou seja, dentro das novas expectativas do que
51 Cf. pesquisa realizada pelo IPEA no ano de 2000 com o título: “Iniciativa Privada e o Espírito Público – Ação Social das Empresas Privadas no Brasil”. Em julho de 2006, foi lançado um novo documento do IPEA que dá continuidade aos estudos anteriores sobre a Ação Social das Empresas, mas, que procura “atualizar e aprofundar o conhecimento sobre o envolvimento do setor empresarial na área social”. Cf. A Iniciativa Privada e o Espírito Público: a evolução da ação social das empresas privadas no Brasil. Brasília, julho de 2006.
110
seja uma empresa socialmente responsável as empresas tem que cumprir uma
nova agenda de responsabilidades.
Não obstante, torna-se pertinente lembrar que, mesmo com a vigilância
que a sociedade e os organismos públicos nacionais e internacionais vêm
exercendo, a lógica do mercado não mudou. O objetivo das empresas continua
a ser o lucro. Nesse sentido, a atuação responsável nem sempre é um ato
voluntário das empresas. Comportamentos socialmente responsáveis têm sido
balizados, em parte, pelos mecanismos de controle da sociedade civil, por
ações fiscalizadoras e, também pela imagem da empresa que – para o bem ou
para o mal - se projeta para os diferentes públicos.
A empresa tem que ser transparente ética e tem que atuar de forma socialmente responsável porque senão não vai se enquadrar nos padrões comerciais, internacionais e mundiais. Não tem como ser diferente. Mato Grosso, não tem tantas empresas grandes então a gente por mais que não quisesse agir de forma responsável, a gente recebe fiscalização direta, se não quiser fazer por bem, tem que fazer por mal. A empresa segue as normas de trabalho. (...) Quero deixar claro que mesmo que a empresa não quisesse teria que fazer, por questões das normas, da fiscalização, porque esse negócio da responsabilidade social e do desenvolvimento sustentável, isso aí é mundial e quem não se enquadrar não vai ter como vender seus produtos. (G.4)
Nós temos uma agência reguladora forte, que fiscaliza que acompanha que monitora. Avaliam tudo que nós fazemos, e, se não estiver de acordo nós somos notificados. Estamos sujeitos a multas. Existe toda uma evidência de tudo que é feito, inclusive na área de responsabilidade social. (G.1)
Os depoimentos refletem essa realidade, os gerentes entrevistados
parecem ter a convicção de que os novos tempos exigem que as empresas
tenham posturas que se coadunem com o movimento da realidade, e que
considerem também os interesses daqueles que consomem seus produtos.
Em nenhum dos depoimentos foi mencionado explicitamente que a
realização das ações de responsabilidade social tivesse como alvo melhorar a
imagem da empresa, ou o Marketing, apesar de serem reconhecidos pelos
sujeitos entrevistados, a visibilidade e os ganhos que a empresa obtém com o
desenvolvimento das ações sociais.
111
Uma coisa que a empresa não faz é o marketing da responsabilidade social, isso ela não faz, nunca fez. Agora é que ela está começando a despertar para essa questão. (P.2)
A gente tem um monte de ações voluntárias que a gente nem divulga, não faz matéria, não faz nada porque é um principio nosso, uma regra de transito dos próprios voluntários, não estar explorando isso. (G.3)
Este ano estamos substituindo 3000 geladeiras. As geladeiras antigas além de terem um alto consumo de energia, são equipamentos antigos, a borracha da porta já não faz a vedação correta, isso aumenta o consumo. Então estamos trocando 3000 geladeiras antigas por geladeiras novas de baixo consumo. Elas chegam a representar 30% do consumo. Já substituímos pelo menos 2000 geladeiras em Mato Grosso. Então responsabilidade social é estar preocupado com essa situação que tem a ver com a gestão. (G.1)
Além da questão ambiental, a questão econômica, a geração de energia da sobra do bagaço da cana, principalmente em Mato Grosso, por questão da logística, porque fazer só açúcar e álcool não é viável. A geração de energia é que vai tornar a empresa viável. (...) A gente tem esse controle ambiental. As empresas queiram ou não queiram têm que se enquadrar dentro de uma política socialmente responsável. O mundo necessita disso, nessas comunidades a gente sente a alegria deles de ver o município progredindo. A usina está sendo responsável, ta gerando emprego, gerando renda. (G.4)
4.3 O marketing52
O marketing é definido por Joana Garcia (2004, p.46), como um
componente necessário da campanha pela responsabilidade social. É, assim,
uma das estratégias mais utilizadas para a sobrevivência das empresas em
ambientes competitivos e hierarquizadas. Afirma Garcia que diante de um
modo de produção altamente fragmentado e internacionalizado e de um
mercado consumidor globalizado, a finalidade do marketing passa a ser a de
construir e fortalecer as marcas não em torno de produtos, mas de uma
reputação. O marketing social constitui-se, justamente, não apenas em torno
da qualidade física dos produtos, mas do conjunto de valores éticos agregados
à marca (SIMÕES, 2007, p.425).
52 O berço do Marketing, segundo, Richers (2003), se encontra indiscutivelmente nos EUA e sua difusão pelo mundo foi relativamente lenta. Na Europa, o marketing só começou a ser aceito depois da Segunda Guerra e, no Brasil, a introdução do conceito de marketing deu-se em meados de 1954 com a organização dos primeiros cursos de administração da Escola de Administração da Fundação Getúlio Vargas. Para o referido autor, o marketing tem uma dupla finalidade, ou seja, a de detectar e de preencher oportunidades de mercado com um mínimo de recursos.
112
Isleide Fontenelli no seu livro o Nome da Marca, faz uma análise do Mac
Donalds, afirma que quando uma empresa consegue construir e consolidar um
nome de marca no mercado pelo estabelecimento de um padrão, significa que,
de um lado, a marca oferece ao consumidor a garantia de repetição de uma
experiência, cada vez que ele a consome; por outro lado (...) ela permite ao
capitalista que a possui a possibilidade de expandi-la rapidamente,
acrescentando maior riqueza ao seu patrimônio (2002, p.88).
Assim, o marketing social tem por prioridade produzir a imagem
institucional de empresas socialmente responsáveis, mais do que benefícios
sociais concretos. Nesse sentido, não restam dúvidas quanto ao ganho que o
marketing traz para as empresas: além de fortalecer a sua marca e consagrar
um novo padrão de relacionamento entre os consumidores, o marketing social
humaniza a imagem da empresa.
É interessante lembrarmos daquilo que é conhecido como “cause –
related marketing”, que livremente traduzido, significa “Marketing de Causa
Social”, que é uma forma da empresa mostrar ao público consumidor que ela
tem compromisso com as “causas sociais”. Todos nós já ouvimos falar do “Dia
Feliz” realizado pelo Mac Donald’s que destina os recursos provenientes da
venda do seu sanduíche (Big Mac) para instituições que tratam de crianças
com câncer.Vale ressaltar que o evento ocorre durante um único dia ao longo
dos 365 dias do ano e são conclamados voluntários para aderir à causa e
vender os sanduíches, o consumidor desembolsa o dinheiro para comprar o
sanduíche e o Mac Donald’s é o promotor da benemerência.
É ainda Garcia quem afirma estar a mudança de mentalidade
empresarial muito ligada à mudança no padrão de exigência do consumidor53.
Nesse sentido, escreve ela, a divulgação das ações empresariais no campo
social tem sido feita em larga escala , objetivando diferentes públicos.
53 A perspectiva dos consumidores, apesar de ser um aspecto pouco explorado na divulgação do marketing social, vem tomando corpo no Brasil. Nesse sentido podemos nos remeter ao Código do consumidor, promulgado por lei federal em 11 de julho de 1990, que instituiu também o Procon e os Juizados Especiais Cíveis.
113
Apesar de nos depoimentos a questão do marketing não ter sido
abordada de forma direta, pelo menos pelos gestores ela aparece (utilizando
um termo recorrente na fala de um dos sujeitos entrevistados) ”na sutileza das
coisas”.
A gente nunca usa. Isso a gente tem claro, a responsabilidade social para marketing. A gente tem um monte de ações voluntárias que a gente nem divulga, não faz matéria, não faz nada porque é um princípio nosso, uma regra de trânsito dos próprios voluntários, não estar explorando isso. (G.3) Às vezes (a empresa) não tem muito interesse nessa divulgação, quer que seja um trabalho de fundo social, não é comercial. O que leva (a empresa) a desenvolver essas ações não é o marketing é a responsabilidade (G.6) É uma empresa de credibilidade no mercado (...). A gente aqui é testemunha de que a empresa está fazendo de tudo para que a coisa aconteça senão não vai se enquadrar nos padrões comerciais internacionais, mundiais. Você tem que ter produtos de qualidade. (G.4)
Não existe consenso em relação à divulgação das ações sociais
desenvolvidas pelas empresas. Conforme Peliano, (2001, p.72), alguns
empresários chegam a condenar qualquer divulgação, outros entendem que
divulgar é importante para mobilizar a participação de outras empresas, para
tornar público o compromisso com a ação social e para melhorar a imagem
diante dos clientes, consumidores, governo. Os argumentos sobre se se deve
ou não divulgar são diversificados.
Em relação às ações sociais desenvolvidas pelas empresas um aspecto
que merece ser ressaltado é o local onde estão situadas essas ações. Em uma
das empresas as ações de responsabilidade social estão no Setor de
Comunicação Social, o que certamente é indicativo dos objetivos que a
empresa tem em relação ao marketing.
Na maioria das vezes os programas ficam na comunicação social, pela questão do marketing mesmo. Como utilizar isso favoravelmente à imagem da empresa e nisso eu vejo pouco de responsabilidade social, é mais o marketing (P.1)
Por outro lado, o fato de as ações de responsabilidade social estarem
localizadas no Serviço Social não vai garantir aos assistentes sociais mais
acesso ou autonomia na elaboração ou implementação das ações de
114
responsabilidade social, ou que a localização vá garantir a ampliação do
número de assistentes sociais na empresa.
Exemplo disso pode ser visto em uma das empresas pesquisadas onde
as ações sociais ficam centralizadas no Serviço Social, porém, sob a
coordenação de um médico e de uma bióloga.
Aqui no Serviço Social (da empresa) existe uma pessoa específica para a coordenação desses programas sociais. Ela não é assistente social, a formação dela é de bióloga. Ela veio para cá a pedido da diretoria para poder coordenar os projetos sociais. (P.4)
Chamou-nos a atenção o fato de profissionais de outras áreas, (no caso
o médico e a bióloga) se apropriarem da área social e do próprio Serviço
Social, sentindo-se, inclusive, “invadidos por outras áreas”. Os depoimentos
podem explicitar melhor o que queremos dizer.
A gente que ta mais ligado à área social teve que entender que se a gente sente que está sendo invadido por outras áreas, foge um pouco do controle, na verdade a gente tem que aprender a trabalhar de forma conjunta e global, envolvendo todos os segmentos da empresa, porque se a gente for fazer uma coisa só não vai funcionar. (G.4) e (G.5)
Os nossos projetos (...) está escrito na política de responsabilidade social, Aqui a gente chama de Serviço Social, não de assistência social. Está escrito na política de responsabilidade social que a (empresa) não trabalha com projetos assistencialistas, são projetos diferentes. (G.5)
Remetemo-nos àquilo que é explicitado por Garcia (2004, p.42), quando
afirma que o perfil de quem compõe a gerência dos programas de filantropia
empresarial atende ao que se pode chamar de “gestão de resultados”,
caracterizada pela preocupação com o retorno do investimento, pela utilização
de padrões de planejamento e avaliação próprios do mundo empresarial e
finalmente pelo marketing das ações e de seu desempenho. Os profissionais
são predominantemente das áreas de administração, comunicação e
marketing, o que caracteriza uma novidade no campo da intervenção social
tradicionalmente ocupado por profissionais com formação na área das ciências
humanas. A tendência de incorporação de novos profissionais evidencia,
portanto, a importância do “social” como mercado de trabalho nem tanto em
115
expansão, mas certamente em reorientação quanto à direção política dada
pelas disciplinas mais tradicionais.
Na pesquisa coordenada por Peliano (2001) foi feito um levantamento
das principais profissões encontradas na equipe responsável pela ação social
da empresa. Destas, 8% eram assistentes sociais; 5% engenheiros; 10%
profissionais da área de comunicação; 11% psicólogos; 19% administradores
de empresas. Afirma a autora que, “apesar da predominância de
administradores de empresas, a diversidade de profissões é grande e está
longe de configurar equipes multidisciplinares de profissionais do campo social,
a formação desse quadro depende mais dos setores ou departamentos das
empresas que acumulam a responsabilidade pelas atividades sociais”.
Um outro aspecto apontado por Peliano refere-se à questão de gênero,
a constatação de que, na área privada, homens e mulheres dividem meio a
meio o envolvimento nas atividades sociais. (O que difere do serviço público
onde as ações sociais ficam, em sua maioria, a cargo das mulheres) muito
embora o comando se encontre nas mãos masculinas (o que se deve ao fato
do poder de decisão das empresas encontrarem-se nas mãos dos diretores,
gerentes, altos executivos, cargos ocupados majoritariamente por homens no
mercado de trabalho).
Nesse sentido, uma questão que se faz presente refere-se ao espaço
que é conferido ao assistente social nas ações sociais desenvolvidas neste
momento pelas empresas quando, conforme apontado por Montaño (2007,
p.151), a divisão técnica do trabalho é cada vez mais difusa mais interligada e
interdependente. Onde já não há compartimentos estanques rígidos e plenos
de visibilidade. Onde profissionais como os sociólogos, psicólogos,
antropólogos, agrônomos, médicos e tantos outros realizam atividades outrora
específicas do Serviço Social.
116
4.4 O público - alvo das ações
O público-alvo das ações de responsabilidade social desenvolvidas
pelas empresas pesquisadas é diversificado vai de crianças a adolescentes e
idosos às ações voltadas para ao meio ambiente ou ainda a formação de
cooperativas nas comunidades que ficam no entorno da empresa.
O que pudemos verificar a partir das entrevistas é que a maioria das
empresas pesquisadas não tem um público alvo definido, o público ao qual se
destinam as ações parece ser rotativo. A preocupação maior é com as ações a
serem realizadas.
Temos ações belíssimas de meio ambiente, que também é um dos indicadores de responsabilidade social, só que são coordenadas pela assessoria do meio ambiente.
Nós temos um trabalho forte dentro da empresa na área do voluntariado. Nós temos mais de 2oo funcionários (dos 1500 funcionários da empresa) que são voluntários, dão apoio a creches, crianças e a pessoas idosas.
Por enquanto ainda não tem definido isso. A gente tem muitas solicitações de auxílio então isso vai conforme as necessidades ( )... Agora o nosso foco a questão da comunidade a gente ainda não tem definido. A nossa maior preocupação são os nossos colaboradores que são carentes ao nível operacional. A responsabilidade social é mais interna. (G2).
Estamos desenvolvendo esses projetos de centros comunitários. Não basta levar energia lá naquela comunidade distante, é preciso envolver a comunidade e criar um projeto de sustentabilidade (P.1)
Outro aspecto que consideramos pertinente estar pontuando em relação
ao público ao qual essas ações se destinam é que esse público já é
conhecido do assistente social. Não devemos perder de vista que o fato de ter
a questão social em suas múltiplas expressões como objeto de trabalho faz
com que os assistentes sociais tenham “contato direto e cotidiano com as
questões da saúde pública, da criança, do adolescente, da terceira idade, da
violência, da habitação, da educação etc.”. (IAMAMOTO, 1998, p.41). Assim, o
que muda para o assistente social quando passa a intervir na questão social
dentro da perspectiva da “responsabilidade social” não é o público alvo das
ações sociais, mas as bases em que são efetivadas tais ações. O que exige
117
por parte do assistente social reflexões profundas não só no que se refere à
qualidade dos serviços prestados, mas também à seletividade, à prioridade e
às escolhas que permeiam tais ações que se configuram como substitutas das
ações viabilizadas através de políticas públicas e da garantia da
universalidade no acesso.
4.5 A avaliação das ações de responsabilidade social
Entendemos, conforme nos alerta Carvalho (2004) que, apesar do
modismo e da hipervalorização que foi dada a avaliação nos dias atuais não se
pode negar a sua importância no sentido de indicar acertos e equívocos e de
sugerir correção de rumos. Assim, a avaliação constitui-se em um processo
contínuo que deve estar presente nos programas, projetos e ações durante a
sua concepção, implementação e resultados.
Como escreve Gatti (2004) citada por Carvalho, (2004) “Programas
sociais clamam por um modo de avaliar que se referencie para além do que se
convencionou chamar de eficácia ou eficiência (...)” Assim, avaliar programas
sociais não é tarefa simples. Possuem objetivos que são por sua natureza
complexos, ganham uma tessitura sócio relacional e contextualizada. Não se
limitam a apreender sua “engenharia institucional” e resultados imediatos.
No entanto é necessário não se perder de vista que, dentre outras
vantagens, a avaliação produz conhecimentos necessários à proposição de
soluções e avanços responsáveis pelo desempenho da prática social
(CARVALHO, 2004).
O que pudemos verificar a partir das respostas dos sujeitos
entrevistados é que as avaliações parecem não ocupar um lugar de destaque
nas empresas pesquisadas. São avaliações pontuais e sem sistematização.
Conforme o gestor de uma das empresas pesquisadas,
Existe a avaliação, por exemplo: Pega o projeto de voluntariado que nós temos, nós temos reuniões mensais do grupo do voluntariado e eles têm tudo o que é movimentado, o que é feito às instituições que são visitadas, os apoios que são dados. Fazemos
118
também uma doação de alimentos, os funcionários se mobilizam e fazem doações de alimentos para algumas instituições, essas doações são levantadas e apresentadas. Isso é divulgado na empresa toda. Mensalmente é feito um balanço daquilo que é feito.
A (AS) apresenta um balanço de todas as ações realizadas durante o ano, isso acontece na área do voluntariado e nas outras áreas. Os investimentos, os valores, as comunidades atendidas tudo aquilo que é feito é avaliado.
Na gestão ambiental, os empreendimentos que foram feitos os investimentos, os valores, as comunidades atendidas. Na gestão do programa de eficientização de energia, o projeto além de ser um projeto da CEMAT ele é um projeto apresentado à ANEL que é a agência reguladora nacional, então ele só passa a existir a partir do momento em que a ANEL dá ok.... A ANEL fiscaliza também, vem aqui para ver se eu realmente investi naquilo que eu propus, se substitui geladeiras , ela faz essa fiscalização o tempo todo. Os projetos têm o seu acompanhamento. (G.1)
Para a assistente social,
Não há uma avaliação. Cada um de nós tem as nossas ferramentas de avaliação, de controle, mas não há um instrumento de avaliação. Não tem um departamento estruturado de responsabilidade social, então fica mais difícil para estruturar essas avaliações. (P.1)
Em uma outra empresa gestor e assistente social afirmam que,
Isso é feito de maneira informal (G.2)
A avaliação ela é feita em cima do desempenho do planejamento. Quando a gente chega ao final do ano a gente faz um levantamento, primeiro reúne a equipe para ver o que foi bom, o que não foi, o que precisava mudar, o que é que a gente vai continuar.Eu já fiz uma pesquisa de opinião para mensurar todos esses aspectos. (P.3)
“ Ultimamente estamos fazendo visitas às entidades cadastradas e fazemos o acompanhamento , não é uma rotina mas fazemos as visitas (G.6)
A gente busca verificar se ações estão tendo resultado ou não. (P.4)
Cada projeto desses tem um ciclo de avaliação, tem os indicadores. São todos avaliados (G.3)
119
A gente faz a avaliação através de pesquisas. Através do Balanço Social a gente vai verificando o que esta acontecendo (P.5)
Os depoimentos são elucidativos e, acreditamos, explicitam como se dá
a avaliação dos programas ou das ações de responsabilidade social
desenvolvidas pelas empresas.
4.6 O balanço social
O balanço social, conforme Garcia, (2004, p.50) constitui-se em
estratégia de divulgação relevante e qualificada das empresas, tornando
transparente o montante e a destinação dos recursos aplicados.
Todas as empresas pesquisadas elaboram o balanço social o que não
quer dizer que a maioria das empresas do Estado de Mato Grosso tenham
essa prática. Na escolha do universo de pesquisa, a opção foi pelas empresas
certificadas como socialmente responsáveis. Ocorre que, para serem
certificadas a exigência fundamental feita pela Federação das Indústrias do
Estado de Mato Grosso – FIEMT é o balanço social.
Considerado um dos principais indicadores de responsabilidade social, o
balanço social é considerado como instrumento de avaliação do desempenho
da empresa no campo da cidadania empresarial, pois demonstra todas as
ações sociais desenvolvidas por ela em determinado período. No balanço
social, conforme MELO NETO & FROES (2002), as ações sociais são
discriminadas quanto à sua natureza, seja de responsabilidade social interna
ou externa, a sua especificidade (doações, investimentos) e ao valor gasto.
Uma das questões da entrevista versava justamente sobre o balanço
social. Queríamos saber como era feito, por quem, qual era a participação do
assistente social na elaboração, por ser estabelecido em uma lei estadual que
o balanço social fosse assinado por um técnico em contabilidade e por um
assistente social54.
54 No Estado de Mato Grosso, a Lei nº. 7.687, de 25 de junho de 2002, criou o Certificado de Responsabilidade Social a ser conferido anualmente às empresas, órgãos públicos e demais entidades do Estado que apresentassem seu Balanço Social. A referida Lei estabelece ainda
120
Na maioria das empresas pesquisadas, o que se constatou é que o
balanço social é elaborado pelo setor de contabilidade.
Os depoimentos mostraram que não existe a participação do assistente
social na elaboração dos balanços, como também não encontramos indícios de
que a Lei que traz a obrigatoriedade da assinatura do assistente social nos
Balanços Sociais das empresas de Mato Grosso esteja sendo cumprida, o que
nos leva a confirmar aquilo em que já acreditávamos, ou seja, que o balanço
social na maioria das empresas pesquisadas se restringe aos dados contábeis.
Repassamos os dados para a contabilidade. Não há um envolvimento maior. (G.1) O Balanço Social, a empresa faz, agora foi entregue para a certificação. Isso é feito pelo setor de contabilidade (G.2) O balanço é assim é só com eles mesmos (contabilidade). (P.2) É feito pela assessoria de planejamento, que fica em Brasília. Mandamos todas as in formações e, normalmente, o balanço sai já no ano seguinte. (G.6) Vai ser realizado através de uma consultoria, para elaborá-lo de uma forma mais detalhada. (p.4)
Fazemos. É o terceiro ano. O Balanço Social começou assim: a gente entendeu que seria um relatório, onde a gente colocaria tudo que estava fazendo em relação à responsabilidade social. Num primeiro instante ficou muito como obrigação e depois, com o passar do tempo é como um álbum de fotografia da gente. Então no balanço social a gente está vendo como está progredindo, enquanto gente, enquanto profissional. Isso a gente consegue perceber no balanço, até na forma como ele está sendo escrito. (G.3)
4.7 As ações de responsabilidade social
As ações sociais desenvolvidas pelas empresas são de natureza
diversificada, vão desde palestras sobre saúde do homem, saúde da mulher,
dependência química, plano de saúde, plano odontológico, bolsa farmácia,
bolsa de estudos, ticket alimentação, ticket supermercado, aniversariante do
mês, palestras para gestantes, acompanhamento durante o período
gestacional, horta comunitária, distribuição de kits para recém-nascidos,
que o balanço social deverá ser assinado por contador ou técnico em contabilidade e por um assistente social devidamente habilitado.
121
palestras para adolescentes nas escolas, educação financeira, coral, formação
de bandas, aulas de judô e caratê, montagem de brinquedotecas, de
bibliotecas nas escolas, doação de leite, doação de uniformes usados, doação
de computadores, plantio de mudas de arvores; até doação de geladeiras,
criação de cooperativas, associação, mutirão para construção de casa para
funcionário.
Como nos referimos, anteriormente, a intervenção das empresas na
área social não é recente. Histórica e esporadicamente as empresas
desenvolviam ou colaboravam com o desenvolvimento de ações sociais, no
entanto, a preocupação era voltada para a oferta de produtos e serviços aos
seus clientes. Seus acionistas, quando se dedicavam à filantropia, faziam-no
de forma individual, dependendo da sua visão e de seus recursos.
Posteriormente, as empresas também passaram a empreender ações
sociais na comunidade sem, no entanto, incluí-las na sua estratégia
empresarial. Só a partir dos anos de 1990, seguindo uma tendência mundial,
originada nos países desenvolvidos, essas ações passaram a ser incorporadas
à sua gestão e a ser parte dos “negócios da empresa”.
Assim, gradativamente, as doações tradicionais vão sendo trocadas pelo
trabalho social das empresas, seja em atividades imediatas como (organizar
eventos beneficentes, participar de campanhas para arrecadar alimentos,
promover festa de aniversário de funcionários ou das entidades parceiras,
motivar pessoas a doar presentes no Natal, doar bens e fazer campanhas de
vestimentas), seja em atividades de longo prazo que consistem em
implementar programas de educação alimentar, ensinar a entidade assistencial
a administrar recursos; treinar pessoas para desenvolverem programas de
comunicação; promover planejamento estratégico para melhoria da gestão da
entidade; dar cursos de gestão para os dirigentes da entidade e introduzir
programas de informática na educação (SIMÕES, 2007, p. 420).
Os depoimentos nos oportunizaram conhecer as ações de
responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas, o que consideramos
122
importante, por nos fornecer elementos para conhecermos as ações que são
da competência do assistente social na responsabilidade social empresarial.
Agora estamos com um projeto para a semana da árvore, em setembro que é a distribuição de mudas para a comunidade próxima que é o Bairro Pedra 90. São algumas ações dispersas não têm foco definido. (G.2)
O outro projeto que é muito valorizado pela diretoria é o aniversariante do mês, onde eles participam juntamente com a equipe que organiza, os colaboradores no final do mês tem o dia deles, eles podem trazer a família e vem tomar o café da manhã junto com ele, pode conhecer a indústria, tiram foto com o colaborador no seu local de trabalho. Tem o vídeo institucional que é passado para a família, para que possa conhecer a empresa, conhecer os trabalhos que a gente desenvolve. Aí eles recebem o presente que é entregue pela presidência, tiram uma foto junto com o nosso presidente. A gente encerra essa parte, vai para o almoço, tem o bolo junto com os familiares, depois a gente envia essas fotos para o colaborador. Então essa é uma forma da gente trazer a sociedade, o amigo, a família para dentro da empresa. (G.2)
Nós temos alguns projetos: “Correios Solidariedade de Espécie”, é quando existe o caso de emergência (chuvas), as agências recebem roupas e alimentos que são embalados, transportados e, direcionados para o local. Temos o “Programa Mutirão” que é a arrecadação de alimentos,de forma mais programada. Temos um projeto chamado “doação de Bens”. A gente cadastra algumas entidades do Governo (escolas e creches) e repassa esse material para eles. Isso também entra na “Inclusão Digital” Quando a empresa troca os computadores e os disponibiliza para escolas, creches, bibliotecas. (P.6)
As ações de responsabilidade social tiveram iniío, de forma mais sistemática, há quatro ou cinco anos. Foi com o projeto “Caratê com Energia”. (G.3)
Recentemente também a gente tem um projeto em Pedra Preta e esse é mais ambiental (formação de moçorocas) que são grandes aerosões que estavam caminhando em direção às nossas linhas, iam derrubar as linhas, então a gente tinha duas alternativas; ou desviava as linhas ou atacava a causa principal do problema. (...) Aí a gente resolveu atuar de maneira diferente, organizar cooperativas, organizar esses sitiantes e mostrar a importância da preservação ambiental e aí o projeto ficou maior, destacou a causa principal do problema e o legal desse projeto é que a gente criou um espírito de corpo na comunidade, conseguimos montar uma associação. (G.3)
Tem outros projetos como o alfabetizar, que não tem essa contrapartida. Nesse estamos nós, uma associação de moradores, o SESI e a Universidade popular. A clientela são pessoas do bairro Osmar Cabral e redondeza, são pessoas que estão sendo alfabetizadas. (G.3) Hoje um projeto que nós temos “Construindo um futuro sólido” que é a escola que nós temos na própria empresa, onde tem a facilidade
123
dos trabalhadores saírem do seu local de trabalho e poderem estar voltando a estudar. (...) Algumas ações já são comuns aqui como por ex. no dia da criança tem uma creche que a gente auxilia. Tem algumas instituições e, projetos que a (empresa) tem colaborado há alguns anos já, por exemplo: o Projeto Flauta Mágica, incentivo à cultura, isso já é também formalizado. Agora o nosso foco, a questão da comunidade a gente não tem definido. Agora nossa maior preocupação são os nossos colaboradores que são carentes ao nível operacional. A responsabilidade social é mais interna. (G.2),
Estamos começando a desenvolver várias ações que vêm a ser o resgate, a recuperação do reaproveitamento do material, a reciclagem do lixo, fazemos com que isso se transforme em ação para a comunidade. Temos a reciclagem do papel, que está sendo implantada em Mato Grosso, as outras regionais já implantaram (...) Fazer a conscientização da reciclagem, de materiais que seriam, a princípio, lixo, mas que não é lixo. Depois o segundo processo é a destinação. Os uniformes, as bolsas que não podem ser aproveitados como são. Eles têm que ser transformados. (G.6)
Tem um projeto que eu queria comentar que é um projeto chamado CCP-Centros Comunitários de Produção. (...) Esse projeto leva energia elétrica para as comunidades mais isoladas do meio rural para que essas comunidades tenham acesso à energia para que, através da energia, possam se fixar e produzir naquele local. (G.1)
Para a efetivação das ações, conforme consta nos depoimentos, são
importantes as parcerias. Recorremos mais uma vez aos dados provenientes
da pesquisa coordenada por Peliano (2001) quando se refere às parcerias
feitas pelas empresas privadas no Brasil. Segundo ela, as empresas nem
sempre estão sozinhas no financiamento de seus projetos principais, mais da
metade delas compartilha os gastos com terceiros. Além de outras empresas
privadas, participam do financiamento dos projetos sociais apoiados pelo setor
privado: governo, associações ou entidades de classe, empregados,
voluntários, as próprias comunidades, ou ainda, entidades executoras, como
universidades, ONGs, sindicatos e organizações internacionais.
Nas empresas de Mato Grosso essas parcerias também são buscadas.
A gente não trabalha sozinha, a gente faz as parcerias (...) dentro da empresa mesmo, com os funcionários, esposas e filhos. (P.6) Então aí entra também a prefeitura municipal, fabricantes de laticínios, a prefeitura dando apoio, às vezes criando a edificação, a comunidade se unindo em torno da compra de equipamentos, a companhia de energia e a Eletrobrás se unindo. (G.1) Por ex. tem programas que são super interessantes, mas poderia ter uma adesão maior dos envolvidos com parcerias. A nossa parceria
124
com as comunidades vizinhas é muito boa. Existe essa abertura, existe esse laço, você tem contato, você tem autonomia. (P.4)
4.8 As dificuldades encontradas pelos assistentes sociais no desenvolvimento das ações de responsabilidade social
Nenhuma das assistentes sociais entrevistadas disse ter qualquer
dificuldade em relação ao desenvolvimento das ações de responsabilidade
social. No entanto, afirmam que é um espaço no qual o assistente social tem
uma inserção restrita, não está conseguindo se fazer presente. O que é
justificado por tratar-se de “algo muito novo e por ser novo ainda não buscou
envolver muito os profissionais de Serviço Social, buscou-se envolver os
profissionais do marketing porque é uma forma de dar visibilidade a
empresa”(P.1).
Não encontro dificuldades. Não é que não encontre as dificuldades que
aparecem são trabalhadas, porque, como já disse, nós estamos
estruturando esse programa então o que vem para a gente vem como
diretrizes, com orçamento para isso então temos que administrar esse
orçamento de forma que ele possa ser utilizado. É mais ou menos
assim. ( P.1)
Não tenho dificuldades. (P.2) Eu, nenhuma ( P.3) Dificuldade mesmo, acho que não tenho ( P.5)
Quanto à exigência de determinado perfil profissional para desenvolver
as ações de responsabilidade social nas empresas, o que ficou patente é que
por ser um “conhecimento específico” traz a necessidade de “correr atrás” “de
Conhecer”. Num dos depoimentos a assistente social afirma inclusive as
dúvidas que alguns profissionais têm em relação à atuação do assistente social
na responsabilidade social empresarial.
Eu recebo ligações (de assistentes sociais) quase semanalmente para saber como atuar na área da responsabilidade social (P.2)
125
4.9 Há lugar para a atuação do assistente social nas ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas em Mato Grosso?
Veja só, eu acho que não há esse espaço. Não que eu ache que não haja o espaço, mas que o assistente social não é convidado a participar. Como você sabe, em algumas empresas, raríssimas, inclusive, que a responsabilidade social fica no RH que é onde fica o assistente social. (P.1)
Que estamos preparados eu acredito que sim. Agora eu não sei se é interessante para a organização que a função do assistente social seja em programas de responsabilidade social, porque o assistente social na organização é contratado para implementar, para que ele possa planejar, para que ele possa criar programas de saúde para o colaborador interno e no atendimento à família também. Mas ele é mais focado no cliente interno. Quando você fala em responsabilidade social cliente interno é mais um indicador. (P.1)
Perspectivas: Enquanto não se mudar um pouco a visão de responsabilidade social por parte da classe empresarial. É uma visão muito particular. Para a empresa o foco tem sido o marketing. (P.1)
Eu vejo que as profissionais de Serviço Social estão perdendo espaço. Não estão conseguindo se colocar presentes na responsabilidade social em Mato Grosso. Não porque não queiram, mas por questão de espaço mesmo. Acho que é um posicionamento que está deixando de lado o assistente social por esse lado do marketing. (P.2)
O assistente social está preparado, mas o espaço da empresa é contraditório não deixa de ter orçamento, de ter valores pessoais da empresa para você direcionar, não deixa de ter uma política interna para você encaminhar. É uma demanda nova? Até a terminologia é nova. É um foco que você trabalha não pensando no status. Às vezes você fica pensando puxa vida eu estou fazendo na empresa a obrigação do Estado, mas o que a empresa pode fazer?Complementar e auxiliar não tomar como responsabilidade dela. (P.2).
As considerações tecidas por Montaño (2007, p.101) são elucidativas.
Lembra-nos ele que o Serviço Social não é visto como uma profissão que toma
decisões, que participa “produtivamente” na divisão do trabalho, que participa
na definição dos objetivos gerais das políticas sociais ou do seu desenho com
autonomia para definir os recursos a empregar e os beneficiários da sua ação,
que possui um conhecimento teórico universal sobre o social (apesar de
diversos assistentes sociais atuarem, sim, nesses níveis). Pelo contrário, o
Serviço Social é em geral identificado (...) como uma profissão que executa as
decisões dos outros (os políticos), que conhece a realidade social por meio dos
126
olhares dos outros (os cientistas sociais) e que assiste às populações carentes,
mas como auxiliar de outros profissionais (médicos e advogados).
Dentro dessa perspectiva pode-se ressaltar como fazem Iamamoto,
(1998) e Neto, (2005; 1986) os traços que conformam o perfil social e histórico
do assistente social, e, que trazem implicações importantes. O fato de ser uma
“profissão feminina”, atravessada, portanto, pelas relações de gênero é, em
parte, responsável pelos traços de subalternidade que conformam a profissão
diante de outras de maior prestígio e reconhecimento social e acadêmico. Um
outro traço forte e recorrente é a herança da tradição católica, proveniente das
origens da profissão, responsável pelas posturas e comportamentos
messiânicos e voluntaristas55. Nesse sentido, Netto (2005, p.88) afirma que a
ruptura com o regime do voluntariado, que marcou a profissionalização do
Serviço Social, não equivaleu à ruptura com a subalternidade técnica (e social)
a que se destinava e alocava a força de trabalho feminina.
Outro elemento que vem reforçar o estigma de subalternidade que
conforma a profissão como foi apontado por Netto, refere-se à mudança no
perfil socioeconômico do alunado do curso de Serviço Social. Diferente das
origens da profissão,quando os estudantes/profissionais eram pessoas que
pertenciam às classes abastadas, a profissão passa a ser demandada por
alunos das classes baixa e média-baixa, o que pode ser creditado, entre outras
razões, à necessidade de expansão das profissões sociais que conformou as
décadas de 1960/1970 e prosseguiu nos anos de 1980. O que veio favorecer
também a expansão da categoria profissional dos assistentes sociais.
Como diz Savianni (1989, p.146) “a modernização da economia fazia da
escolarização, senão a única, pelo menos a principal via de ascensão social”.
Nesse período, segundo Maria Lúcia Martinelli (1989, p.134-135), o
aumento do número de profissionais brasileiros se deu de forma mais intensa
que em qualquer outro momento. Pautando-se em dados do Conselho Federal
55 Referindo-se à presença feminina na profissão de Serviço Social, Netto (1986:74) nos lembra que, na nossa cultura, o assistencialismo é predominantemente feminino, só nos seus pontos de direção é que há a presença masculina. Essa presença feminina massiva no Serviço Social está vinculada a um estatuto subalterno de mulher, a um estatuto de dominação.
127
de Assistentes Sociais, essa autora afirma que até o início da década de 1970
não havia mais de dez mil assistentes sociais no território brasileiro; em 1988 o
número de profissionais inscritos nos Conselhos, portanto aptos a exercer a
profissão, ultrapassava cinqüenta e quatro mil. O que não se sabe é até que
ponto essa expansão do número de profissionais garantiu a qualidade em
termos de competências, de habilidades, de conhecimentos que o exercício da
profissão requer. No entanto não se pode afirmar que isso não tenha
repercutido no perfil dos profissionais de Serviço Social.
O depoimento de um dos gestores nos chamou a atenção pela lucidez
com que analisa o Serviço Social, ou o assistente social. A sua fala nos alerta
para a forma como as pessoas que estão fora da profissão, no caso o gestor,
vêem o assistente social. A análise que ele faz é muito pertinente, remetendo,
no nosso entender, à necessidade de nós assistentes sociais, como outros
profissionais, estarmos atentos ao movimento da realidade e à compreensão
do significado social da profissão na ordem social contemporânea. Assim,
apesar de ser extenso, pensamos que vale a pena transcrevê-lo na íntegra.
O que eu entendi assim, (...) é que entre os assistentes sociais há uma linha assistencialista e outra não assistencialista. Eu entendo muito ela com esses conflitos entre assistencialismo e não assistencialismo e ela é declaradamente de uma linha não assistencialista, mais ou menos eu entendi assim que as pessoas têm que andar com as próprias pernas e tal. Na época da implantação dos projetos de responsabilidade social, no primeiro mandato do Presidente Lula, eu estou falando isso porque é uma tese sua, muito focada na área de vocês, a (AS) enxergou que pela questão política do governo, o projeto era assistencialista e não se engajou no processo. Eu enxerguei assim que ela perdeu uma grande oportunidade de estar defendendo princípios dela, a lógica dela se é que tem. Não existia essa questão interna porque eu, enquanto gestor e, os próprios empregados, não temos essa questão de assistencialismo como o fome zero e outros, também não enxergo que sejam tão assistencialistas assim. O que eu enxergo é que num primeiro momento está recompondo a condição muito crítica, se a gente for olhar na essência, até para dar condições básicas para a pessoa ter condições de pensar. Então eu acho que perdeu daí o projeto estar com a (...) que é uma pessoa que não é assistente social e que a gente teve que ter todo um remendo para que ela pudesse trabalhar e ter uma assistente social subordinada a ela. (...) Eu vejo que a assistente social perdeu a oportunidade de ocupar espaços por uma questão de política partidária. Eu vejo que poderia estar ocupando os espaços, defendendo , achando o ponto de equilíbrio, nem extremamente assistencialista nem ao contrário disso, algo no meio. Eu vejo assim, para qualquer profissional enquanto gerente, engenheiro, coordenador, assistente social, é conhecer as pessoas e
128
para isso a gente tem que conviver com elas, tem que adquirir a confiança delas e eu não vejo isso como assistencialismo. Estar presente nos momentos difíceis dos empregados, no momento em que a pessoa perde um pai, uma mãe ou a esposa, num momento de doença. Ta muito na sutileza das coisas, no interior de cada um. Eu vejo que isso abre o caminho não só do assistente social, mas de qualquer profissional. Eu particularmente trabalho muito assim, aí como engenheiro tudo bem, não é a atividade fim da profissão. A assistente social confunde muito essas coisas porque é atividade fim, aí passei a entender essa coisa de assistencialismo ou não (PAULO COJIMA).
Netto,56 ao se referir à solução para as problemáticas inerentes e
próprias da ação profissional aponta para uma dupla exigência: compreender o
significado social da profissão e compreender a dinâmica do capitalismo
contemporâneo. É essa compreensão que vai permitir ao profissional
reconhecer os limites e as possibilidades da intervenção profissional. Diz ele,
limites e possibilidades estão inextrincavelmente ligados, e os limites, desde
que explicitados, não invalidam ou deslegitimam a ação profissional. Nenhuma
ação profissional (e não só dos assistentes sociais) suprimirá a pobreza e a
desigualdade na ordem do capital. Mas seus padrões podem variar e esta
variação é absolutamente significativa se sobre ela incidir a ação profissional,
incidência que porta as possibilidades da intervenção que justifica e legitima o
Serviço Social. O conhecimento desses limites e dessas possibilidades fornece
a base para ultrapassar o messianismo, que pretende atribuir à profissão
poderes redentores e o fatalismo, que a condena ao burocratismo formalista.
Assim vale ter presente que não se deve compreender o Serviço Social a partir
de si mesmo.
4.10 O voluntariado
Indagados sobre o que lhes compete desenvolver nas ações de
responsabilidade social empresarial, os sujeitos entrevistados respondem que
é o voluntariado.
O que fica a cargo do Serviço Social é o voluntariado. O que eu quero estar colocando é que eu sou a coordenadora. Não sei como isso acontece nas outras empresas. (P.1)
56 Cf. José PAULO NETTO, A ordem contemporânea é o desafio central. Texto da 33ª Conferência Mundial de Escolas de Serviço Social. Santiago do Chile, 28/31 de agosto de 2006.
129
Todas as nossas ações de responsabilidade social estão integradas ao programa de voluntariado e cidadania, que é um programa nacional. (P.6) Eu trabalho com el a(com a coordenadora do Comitê de Responsabilidade Social)Aí tem os voluntários que são os próprios funcionários da empresa.(P.5).
A tônica no voluntariado é confirmada pelos gestores.
Nós temos um trabalho forte dentro da empresa, na área de voluntariado. Nós temos mais de 200 funcionários, dos 1.500 que a empresa emprega que são voluntários. Então temos um trabalho de voluntariado para atender a essas comunidades (crianças, pessoas idosas, creches). (G.1)
Queremos montar um grupo de voluntários para nos auxiliar com o plantio das mudas na semana do meio ambiente. Mas nós temos total apoio e incentivo da alta direção para isto. (G.2)
Nos tempos atuais, a ênfase no trabalho voluntário é notória. Não
obstante, se deva considerar que a ação dos voluntários se remete há vários
séculos, sempre vinculada a ações religiosas ou à área da saúde, sob o cunho
da benemerência (merecimento) ou da filantropia (caridade-altruísmo). Ocorre
que, em face da agudização da questão social e, consequentemente, das suas
seqüelas, nos deparamos como bem explicita Yazbek (2002), com um
processo de constituição de uma nova cultura de solidariedade, que se
expressa através de um grande número de pessoas e organizações que se
dispõem a prestar serviços sociais ou para ajudar pessoas em dificuldades. Tal
trabalho, conforme a autora é considerado como sendo parte de uma cidadania
ativa e participativa relacionando-se com eficiência e resultados.
Recorremos a Kameyama (2001, p.34) quando afirma que o voluntariado
corporativo, além de contribuir com a sociedade traz algo que toda empresa
moderna afirma buscar, ou seja, proporcionar satisfação pessoal e motivação
verdadeira para o trabalho. Constitui-se, portanto, em estratégia para obter a
participação dos funcionários, para a incorporação e disseminação dos valores
culturais empresariais e para a construção de uma imagem positiva da
empresa junto à sociedade onde atua.
130
Uma primeira constatação que tivemos, a partir dos depoimentos, é que
as ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas são, em
sua grande maioria, alicerçadas no trabalho voluntário. E o que compete às
assistentes sociais, na maioria das empresas pesquisadas, são as atividades
vinculadas ao voluntariado, seja na execução ou mesmo na coordenação das
ações sociais.
Tal constatação pode não ser surpresa se considerarmos aquilo que é
apontado por Yazbek (2002) em relação à forma como as ações sociais do
Estado estão ocorrendo nas últimas décadas57, tem colocado entre as
alternativas às seqüelas da questão social, as ações no campo da filantropia e
o trabalho voluntário que, na atualidade, se apresentam mais organizados
atraindo um número crescente de profissionais que estão buscando se
capacitar para desenvolverem trabalhos voluntários. Assim, o que se tem hoje
em grande parte das organizações, é um voluntariado constituído por um
contingente assalariado e profissionalizado que dirige, executa e garante a
qualidade dos serviços.
Em relação à Profissão de Serviço Social, ainda buscando respaldo em
Yazbek, quando faz referência ao confronto entre profissionalidade e
voluntariado, não conseguimos constatar nos depoimentos das assistentes
sociais nenhuma referência a provável mal estar, recusa ou queixa por estarem
desenvolvendo práticas voluntárias. Também não conseguimos localizar
nenhuma referência ao Projeto Ético-Político da Profissão. Em um dos
depoimentos fica explícito o modo como uma das entrevistadas refere-se às
ações voluntárias.
É o auxílio pra gente. A gente pensa que está ajudando o outro, na verdade os grandes ajudados somos nós mesmos. (P.6)
O voluntário, hoje, diz Yazbek, é o cidadão que motivado pelos valores
da solidariedade e da participação social, doa seu tempo, seu trabalho e seus 57 Conforme Yazbek, o redesenho das ações sociais do Estado caracteriza-se pela municipalização, descentralização e transferência para a iniciativa privada de serviços prestados por órgãos estatais, contexto em que ganham força alternativas privatistas para a questão social, crescem as ações no campo da filantropia e o trabalho voluntário. (2002, p. 182)
131
talentos, de modo espontâneo e não remunerado, para causas de interesse
comunitário, humanitário e social. A construção da cidadania apresenta-se
como parte das motivações para que os cidadãos assumam responsabilidades
sociais na vida em sociedade (2002, p.178).
Acreditamos ser necessário destacar alguns aspectos que julgamos
relevantes. O primeiro refere-se à abrangência que o trabalho voluntário vem
assumindo e o seu tendencial crescimento. Nesse sentido, vale ressaltar que o
voluntariado é reconhecido e estimulado em todos os países pelos organismos
internacionais e governos nacionais.
Ressalta Yazbek (2002,p.173) que, no Brasil, a ação do voluntariado
envolveu, no final de 2001, quase 20 milhões de pessoas que vêm colaborando
com as instituições de solidariedade social, dedicando parte de seu tempo e/ou
recursos ao atendimento às necessidades das populações de baixa renda , o
que equivale, afirma ela, a “333 mil empregos de 40 horas semanais cada”
(Jornal O Estado de São Paulo, 21/10/2001). Ou ainda, conforme dados da
Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais – ABONG, de
que 40% das empresas do país investem no trabalho voluntário para
desenvolver seus projetos (KAMEYAMA, 2001, p.34).
Um outro aspecto relacionado ao trabalho voluntário refere-se ao tempo
livre que “no contexto atual permeia não somente o discurso empresarial, como
também do Estado, das organizações do ‘terceiro setor’ e demais segmentos”
(ABREU, 2006).
Internamente a gente tem também o voluntariado que somos nós mesmos, que organizamos o evento e ficamos à noite. A gente tem muitos empregados que fazem o voluntariado final de semana, à noite. (P.6)
Nós somos liberados para fazer esse trabalho, inclusive em horários de expediente, o que não significa que façamos esse trabalho só no horário de expediente. Mas o que caracteriza esse programa é o fato de a gente ter a liberação da empresa. O que significa que tem o apoio da alta direção, para a gente realizar aquilo que vem sendo planejado. (P.1)
Os voluntários não só do comitê, são de toda a força de trabalho: motorista, o pessoal da limpeza, engenheiro, todos são voluntários. (G.7)
132
O trabalho voluntário, na concepção de Abreu (2006), representa um
mecanismo significativo na materialização da chamada responsabilidade social
compartilhada entre indivíduos e organizações da sociedade e o Estado, nos
atendimentos sociais e controle sobre a pobreza. Sendo assim, constitui-se em
um elemento de exploração da força de trabalho e de controle na medida em
que se funda na propagada utilização do tempo livre do trabalhador.
As ações consideradas de maior porte ou aquelas que demandam
patrocínios e envolvem um volume maior de recursos, além de darem mais
visibilidade à empresa ficam em outros setores.
Temos ações belíssimas de meio ambiente, que também é um dos indicadores de RS só que ficou coordenado pela assessoria do meio ambiente. Patrocínios pela Comunicação Social. (P.1)
Vou apresentar o que é o Serviço Social da Itamaraty. Hoje o setor de SS compreende ações diretamente ligadas ao benefício do plano de saúde a todos os empregados das Usinas Itamaraty. A parte relacionada a questões previdenciárias, ao INSS. A relacionada aos projetos sociais ficou com a (...) Ela veio para cá. A formação dela é bióloga, ela veio de Belo Horizonte. O marido dela é diretor. (P.4)
4.11 O trabalho do assistente social
É através do trabalho, segundo Marx, que o homem transforma a
natureza ao mesmo tempo em que transforma a si próprio. O trabalho é, pois
uma atividade fundamental do homem, pois é através do trabalho que o
homem satisfaz suas necessidades. Pelo trabalho o homem se afirma com um
ser social, diferente da natureza. É por meio do trabalho que o homem se
afirma como um ser que dá respostas prático-conscientes aos seus
carecimentos, às suas necessidades. É por meio do trabalho que o homem se
afirma como ser criador, não como indivíduo pensante, mas como indivíduo
que age consciente e racionalmente. É uma atividade que tem uma necessária
dimensão ética, como atividade direcionada a fins, que tem a ver com valores,
com o dever ser, envolvendo uma dimensão de conhecimento ético-moral
(IAMAMOTO, 1998).
133
O assistente social, como qualquer outro trabalhador participa do
processo de trabalho através da venda, por tempo determinado, da única
mercadoria que possui que é a sua força ou capacidade de trabalho. Como não
detém os meios de trabalho 58 necessários para a efetivação de seu trabalho
ele vai depender, para realizá-lo dos recursos materiais, financeiros e
organizacionais fornecidos pelas entidades empregadoras59. É a sua condição
de trabalhador assalariado que não só enquadra o Assistente social na relação
de compra e venda da força de trabalho, mas molda sua inserção sócio-
institucional na sociedade brasileira (IAMAMOTO, 1998, p. 63).
O fato de ser um trabalhador assalariado faz com que o assistente social
se depare com alguns limites no desenvolvimento de suas ações profissionais.
A relativa autonomia de que o assistente social dispõe é um desses limites que
fazem com que o direcionamento de suas atividades não dependa
exclusivamente da sua vontade. O assistente social deve submeter-se às
exigências de quem comprou o direito de utilizar a sua capacidade de trabalho.
Por outro lado é essa relativa autonomia que lhe abre a “possibilidade de
redirecionar o sentido das suas ações para rumos sociais distintos daqueles
esperados por seus empregadores.” Como sabemos o objeto de trabalho ou a
matéria prima de trabalho do assistente social é a questão social, ou seja, a
ação social do assistente social dar-se-á junto às várias expressões ou
manifestações da questão social que, na contemporaneidade, têm como
seqüelas mais evidentes o desemprego crescente, a perda dos direitos sociais,
a precarização do emprego, fatores, dentre outros, que incidem em todos os
58 Além das coisas que permitem ao trabalho aplicar-se a seu objeto e servem de qualquer modo para conduzir a atividade, consideramos meios de trabalho em sentido lato todas as condições materiais seja como for necessárias à realização do processo de trabalho. “Elas não participam diretamente do processo, mas este fica sem elas total ou parcialmente impossibilitado de concretizar-se”. Karl Marx. O capital, livro 1.v.I, p.205. 59 Em relação aos meios de trabalho do assistente social, Iamamoto (1998, p. 63), aponta o conhecimento como um meio de trabalho, sem o que esse trabalhador (o Assistente Social) especializado não consegue efetuar sua atividade ou trabalho. O conhecimento é um meio pelo qual é possível decifrar a realidade e clarear a condução do trabalho a ser realizado. Nessa perspectiva, o conjunto de conhecimentos e habilidades adquiridos pelo Assistente Social, ao longo do seu processo formativo, são parte do acervo de seus meios de trabalho. Por não deter todos os meios necessários a efetivação de seu trabalho (financeiros, técnicos e humanos) características das profissões liberais, o assistente social, mesmo reconhecido como profissional liberal, não atua como tal.
134
aspectos da vida em sociedade e incidem também na profissão de Serviço
Social e nas outras profissões que atuam na área social.
Sem desconsiderar a gravidade da situação, deve-se levar em conta
que esse mesmo processo, de agudização da questão social, descortina novas
possibilidades de trabalho que “necessitam ser apropriadas, decifradas e
desenvolvidas. Porque se os assistentes sociais não o fizerem, outros farão,
absorvendo progressivamente espaços ocupacionais até então a eles
reservados (IAMAMOTO, 1998).
É ainda Iamamoto (1998, p.107) quem nos alerta no sentido de não
perdermos de vista que um dos desafios maiores para decifrar o exercício
profissional está em apreender as particularidades dos processos de trabalho
que em circunstâncias diversas vão atribuindo feições, limites e possibilidades
ao exercício da profissão, ainda que esta não perca a sua identidade. Nesta
linha de raciocínio, faz-se necessário considerar alguns requisitos que são
fundamentais para entender o trabalho do assistente social:
• O assistente social é chamado a desempenhar sua profissão em um
processo de trabalho coletivo, organizado dentro de condições
sociais dadas.
• O processo de trabalho em que se insere o assistente social não é
por ele organizado e nem é exclusivamente um processo de trabalho
do assistente social, ainda que dele participe de forma peculiar e com
autonomia técnica.
• O assistente social não dispõe de um poder mágico de “esculpir” o
processo de trabalho no qual se inscreve, o que ultrapassa a
capacidade de ingerência de qualquer trabalhador assalariado
individualmente. É função do empregador organizar e atribuir unidade
ao processo de trabalho na sua totalidade, articulando e distribuindo
as múltiplas funções e especializações requeridas pela divisão social
e técnica do trabalho entre o conjunto dos assalariados.
No entanto, há que se ressaltar que, apesar das limitações que
conformam a atuação profissional, o assistente social deve buscar as
135
possibilidades que são inerentes às contradições que conformam a profissão e
a própria realidade social.
Nesse sentido, Montaño (2007, p.107) é provocativo quando afirma que
um profissional qualificado, comprometido e crítico procura ir além das
demandas imediatistas e rotineiras e desenvolver um outro tipo de prática que
incorpore as demandas do (empregador), mas que as transcenda (atingindo a
compreensão das verdadeiras causas das necessidades/ demandas da
população e intervindo nesta perspectiva de totalidade).
A fala de José Paulo Netto, na 33ª Conferência mundial de Escolas de
Serviço Social, realizada em Santiago do Chile, em agosto de 2006, é um
alerta no sentido de nos chamar a atenção para o fato de que os desafios
colocados para o Serviço Social “não se situam no âmbito de técnicas ou
procedimentos interventivos, não se inscrevem no circuito instrumental.
Inscrevem-se no âmbito da compreensão do significado social da sua
intervenção, e este significado só é inteligível se se elucidarem as condições
em que as relações sociais se processam (vale dizer: se produzem e se
reproduzem) na sociedade contemporânea”. Assim, diz ele: a ordem
contemporânea é o desafio atual.
136
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pensamos que neste momento o nosso ponto de chegada seja este.
Contudo, acreditamos que não existe chegada definitiva, o ponto de chegada é
sempre um indicativo da partida. Acreditamos que outras reflexões possam vir
a ser desenvolvidas a partir daqui.
Não temos dúvidas de que este estudo não cobre todas as questões
sobre a atuação do assistente social na responsabilidade social das empresas
de Mato Grosso, bem como, de que muitas das afirmações ou aspectos foram
abordados apenas de passagem. Contudo, esperamos que, de alguma forma,
seja mais uma contribuição no sentido de desencadear reflexões sobre o
trabalho do assistente social nas ações de responsabilidade social
desenvolvidas pelas empresas, não só em Mato Grosso, mas nas empresas de
um modo geral, considerando que embora seja motivo de controvérsias e
desconfianças, não se pode negar que a responsabilidade social empresarial
atravessa o trabalho do assistente social e como tal enseja respostas
competentes.
Uma primeira constatação que tivemos a partir dos depoimentos é que a
responsabilidade social empresarial é concebida de diferentes formas pelos
sujeitos entrevistados. “A responsabilidade social empresarial é definida como:
“apoio a alguém ou a alguma entidade”;” faz parte do meu negócio”, ou ainda,
“tem que ser vista assim como a gente tem responsabilidade com a nossa
família”; “vem da própria diretoria (..) é algo natural”.
Entendemos que a heterogeneidade encontrada quanto ao
entendimento do que seja a responsabilidade social empresarial decorre da
ambigüidade de sua própria concepção. Ainda em relação a esse aspecto o
que também chamou nossa atenção foi a recorrência, muitas vezes implícita, à
concepção adotada pelo Instituto ETHOS, o que no nosso entender demonstra
a influência que esse instituto tem em relação a responsabilidade social
empresarial em Mato Grosso.
137
Vale ressaltar também a preocupação dos sujeitos com o
desenvolvimento sustentável e com a preservação do meio ambiente, o que
além de constar nos princípios defendidos pelo Instituto ETHOS, faz parte de
um movimento mundial de defesa do meio ambiente e de um desenvolvimento
sustentável.
Quanto as ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas
empresas, pudemos ver que são diversificadas. Vão, desde palestras sobre
saúde do homem, saúde da mulher, dependência química, à doação de
geladeiras, criação de associações, e cooperativas. Vale ressaltar que as
ações, conforme relataram os sujeitos, são quase sempre motivadas por um
problema enfrentado pela empresa. Ou seja, a maioria das ações de
responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas se constituem em
respostas aos problemas que emergem em decorrência da própria atuação da
empresa.
O marketing é um outro aspecto que merece ser enfatizado. Apesar de
não aparecer como motivo que leva as empresas a desenvolver ações de
responsabilidade social se faz presente de modo inquestionável e pode ser
explicitado no reconhecimento que os gestores têm dos ganhos que advém das
ações sociais desenvolvidas pelas empresas. Isso ficou patente nos
depoimentos quando os gestores se referem a imagem da empresa, ou a
credibilidade que a empresa tem diante dos consumidores. Um outro aspecto
que denota a preocupação, ainda que não confessada, com o marketing é a
localização da responsabilidade social na empresa, por exemplo, no setor de
comunicação, o que deixa antever o que a empresa pretende com a
responsabilidade social.
Uma das hipóteses que tínhamos quando começamos este estudo é a
de que havia rejeição do assistente social à responsabilidade social
empresarial por entender tratar-se de estratégia neoliberal surgida a partir da
desresponsabilização do Estado em relação ao desmonte dos direitos sociais
universais, ou por representar um novo tipo de arranjo que viria substituir o
contrato social pela mediação das organizações privadas, ou ainda , por não
acreditar que as ações sociais desenvolvidas pelas empresas pudessem
138
solucionar os problemas decorrentes das diversas expressões da questão
social. No entanto, os depoimentos dos sujeitos entrevistados nos mostraram
outra realidade.
As ações de responsabilidade social empresarial ficam sob a
responsabilidade de profissionais de outras áreas, como médico, bióloga,
engenheiro, psicóloga. O assistente social parece não ser um dos profissionais
mais requisitados para desenvolver as ações de responsabilidade social nas
empresas. Na maioria das empresas pesquisadas, o que compete aos
assistentes sociais são as ações do voluntariado, não só enquanto
coordenadores dessas ações, mas os próprios profissionais enquanto
voluntários indicando que o voluntariado é um dos aspectos que vem
atravessando o trabalho profissional (IAMAMOTO, 2002). É uma realidade
preocupante e que não pode ser desconsiderada pelas graves conseqüências
que podem advir para a profissão.
É necessário se ter presente que a ênfase no voluntariado faz parte da
estratégia neoliberal de desresponsabilização do Estado em relação ao
desmonte dos direitos sociais universais, que transforma esses direitos em
benefícios e leva aqueles que os recebem a se sentirem favorecidos e
agradecidos. Ter presente que no momento em que o desemprego e a
precarização do emprego aparecem como marcas maiores dos
desdobramentos da questão social, o voluntarismo repercute na vida dos
trabalhadores incluindo os assistentes sociais, que passam a sofrer a
concorrência do trabalho gratuito, e, o que é pior, como se refere Iamamoto
(2002), com sérias incidências na vida dos indivíduos sociais e dos sujeitos
coletivos que passam a ser objeto da ação desinteressada e solidária de
diferentes classes sociais, em especial daquelas articuladas ao bloco do poder
ou vinculadas ao seu projeto para a sociedade.
Como nos referimos na análise, não encontramos, nos depoimentos,
nenhum aspecto que pudesse indicar que as assistentes sociais entrevistadas
se sentissem desconfortáveis ou que fizessem alguma reflexão sobre o fato de
participarem como voluntárias, nas ações desenvolvidas pelas empresas. Isso
nos remete à hipótese levantada por Batista (2002, p.279) na sua tese de
139
doutorado, de que “os assistentes sociais, em seus espaços sócio-
ocupacionais e no trabalho profissional, face às dificuldades encontradas para
colocar em movimento procedimentos teórico-metodológicos, ético-políticos e
técnico-operativos que conduzam a uma intervenção inclusiva, ontológica e
critica, estão restaurando práticas conservadoras”.
Por outro lado, é pertinente nos remetermos também ao que nos é
trazido por Iamamoto (2002, p.45) quando nos chama à atenção para o fato de
que esses “voluntários” não são necessariamente conservadores, podendo ser
absorvidos em um projeto social de outra natureza articulado pelas forças
sociais progressistas e populares, que lhes permita transitar da condição de
“cidadão de boa vontade” ao efetivo exercício da cidadania social e política. O
que requer capacitação teórica e formação política estimuladora de uma cultura
pública democrática. No entanto, a referida autora é cautelosa ao dizer que a
relação do Serviço Social com o voluntariado é uma questão que merece ser
melhor debatida e amadurecida.Trata-se, segundo ela, de um tema em aberto.
Concordamos com as considerações feitas por Iamamoto, mas
reafirmamos que consideramos preocupante o fato de não termos vislumbrado
nos depoimentos a disposição, por parte das profissionais entrevistadas, de
desencadearem qualquer reflexão a respeito da relação da profissão com o
voluntariado, parece que essa é uma situação dada que não suscita
questionamentos ou inquietações. A utilização do tempo livre nas atividades
voluntárias também não é questionado pelas assistentes sociais.
Assim, longe de ter respostas o que fica é a indagação no sentido de
querer explicitar o que realmente significa essa adesão do assistente social ao
voluntariado no atual momento histórico-social? Quais conseqüências podem
advir dessa relação e qual vai ser a repercussão na profissão daqui há algum
tempo?
Nesse sentido, a afirmação feita por Guerra (2008, p.11) é
esclarecedora. Segundo a autora, a prática profissional que não se diferencia
de ações de leigos, filantropos e voluntários ainda permanece na intervenção
profissional muito mais pela ausência de um claro referencial teórico-
140
metodológico e ético político crítico, ausência esta que limita a sociedade e o
assistente social a perceberem que na sua condição de assalariado encontram-
se as premissas reais que diferenciam a prática profissional de intervenções
assistencialistas, assistemáticas e filantrópicas.
Consideramos finalmente que esta pesquisa não tem a pretensão de
esgotar a discussão sobre a atuação do assistente social nas ações de
responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas em Mato Grosso.Pelo
contrário, consideramos este estudo como uma primeira aproximação
investigativa que deve ser continuada e refletida a partir das novas
conformações e demandas que a realidade traz a cada momento e que nos
coloca diante de desafios que devem ser desvendados.
141
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABREU, Marina Maciel. A questão da solidariedade na atual reestruturação das
relações capital X trabalho: cooperativismo e filantropia como elementos
estratégicos. Comunicação do X Encontro Nacional de Pesquisadores em
Serviço Social realizado em Recife-PE, o período de 04 a 08 de dezembro de
2006.
ACOTTO, Laura. Las organizaciones de la sociedad civil: un camino para a la
construccion de cidadanía. Buenos Aires: Espacio, 2003.
AHSLEI, Patrícia A. (Coord) Ética e responsabilidade social nos negócios. 2.ed.
São Paulo: Saraiva 2006.
ANDRÉ, Marli E.D.A. LUDKE, Menga. Pesquisa em educação: abordagens
qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.
ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaios sobre as metamorfoses e a
centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez, 1997.
_________________. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a
negação do trabalho. São Paulo: Boitempo Editorial, 1999.
ARANTES, Paulo Eduardo. Esquerda e direita no espelho das ONG’s.
Cadernos ABONG, São Paulo: Abong/Autores Associados, nº 27, maio, 2000.
BARBOSA Rui. A questão social e política no Brasil. In. Pensamento e Ação.
Março, 1919.
BARDAN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1979.
BATISTA, Alfredo. A questão social e as refrações no Serviço Social Brasileiro
na década de 1990. Tese de doutorado em Serviço Social. Puc-SP. 2002
BEGHIN, Nathalie. A filantropia empresarial: nem caridade nem direito. São
Paulo: Cortez, 2005.
142
BONETTI, Dilséa Adeodata. Serviço Social e ética: convite a uma nova práxis.
São Paulo: Cortez, 1996.
BRASIL. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria
da Reforma do Estado. Organizações sociais. Secretaria da Reforma do
Estado. Cadernos MARE da Reforma do Estado; v. 2, Brasília, 1997.
CABRAL, Eloísa Helena de. Terceiro setor: gestão e controle social. São Paulo:
Saraiva 2007.
___________ Espaço público e controle para a gestão social no terceiro setor.
Serviço Social & Sociedade, 86. São Paulo: Cortez, 2006.
CALDEIRA, Tereza. A escuta do outro. Revista do Arquivo Municipal. São Paulo, DPH, nº. 200, 1992.
CARTA CAPITAL. Edição Especial, 301, p. 6, dezembro de 2003.
CARVALHO, Maria do Carmo B. Avaliação de Projetos Sociais. Texto
produzido para o Seminário de Avaliação Econômica de Projetos Sociais.
Novembro de 1994.
CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1998.
___________ As armadilhas da exclusão. In. Desigualdade e questão social.
São Paulo: Educ, 2000.
CERQUEIRA FILHO, Gisálio. A questão social no Brasil: crítica ao discurso
político. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982.
CFESS. Código de ética profissional do assistente social e Lei n. 8.662/93, que
regulamenta a profissão de assistente social. Conselho Federal de Serviço
Social, 1994.
CHAROUX, Adriana, Guazzelli. A Ação Social das Empresas. Quem Ganha
com Isso? TCC. Fundação Armando Álvares Penteado-FAAP. Faculdade de
143
Comunicação Social/FACOM. Curso de Relações Públicas. São Paulo, junho
de 2005.
CHESNAIS, François. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996.
CHOMSKI, Noam. O lucro ou as pessoas? Neoliberalismo e ordem global. Rio
de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.
COSTA, Lúcia Cortes. A Reforma do Estado no Brasil: uma crítica ao ajuste
neoliberal. Tese de Doutorado em Serviço Social. PUC-SP, 2000.
COSTA. Maria Alice Nunes. Mudanças Empresariais no Brasil Contemporâneo;
o investimento social privado na saúde é uma nova forma de solidariedade?
Tese de Doutorado. IPPUR-UFRJ. Rio de Janeiro. março de 2006.
DAGNINO, Evelina et alii (orgs). A disputa pela construção democrática na
América Latina. São Paulo: Paz e Terra, 2006.
DIÁRIO OFICIAL do Estado de Mato Grosso. Ano CXI nº 23.400, terça feira, 25
de junho de 2002.
DIEESE. Nota Técnica, n. 29. Normas de Responsabilidade Social da ISSO e
da ABNT: subsídios para o movimento sindical. Julho, 2006.
_______.Nota Técnica, n.40. Responsabilidade Social Empresarial e
Financiamento Público para Empresas. Dezembro, 2006.
DUPAS, Gilberto. Economia global e exclusão social: pobreza, emprego,
Estado e o futuro do capitalismo. São Paulo: Paz e Terra, 2001.
ETHOS. Instituto Ethos de Responsabilidade Social. Disponível em
http://www.ETHOS.org.br.
FAGNANI, Eduardo. Ajuste econômico e financiamento da política social
brasileira: notas sobre o período 1993/98. Economia e sociedade, Campinas
(13): 155-178, dez.1999.
144
FALCONER, Andrés Pablo. As promessas do terceiro setor: um estudo sobre a
construção do papel das organizações sem fins lucrativos e do seu campo de
gestão. Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo. São Paulo,
1999.
FIEMT. Federação das Indústrias de Mato Grosso. Disponível em
http://www.fiemt.com.br.
FECOMERCIO. Federação do Comercio de Mato Grosso. Disponível em
http://www.fecomercio-mt.com.br/impressao.asp?id=360&tipo=not.
FERNANDES, Rubem César. Privado, porém público – o terceiro setor na
América Latina. Rio de Janeiro: Civicus, 1994.
FISCHER, Rosa Maria. A responsabilidade da cidadania organizacional. In.
FLEURY, Maria Tereza. As pessoas na organização. São Paulo: Gente, 2002.
FOLHA DE SÃO PAULO, Caderno 3,11de dezembro de 2004.
FONTENELLI, Isleide Arruda. O nome da marca: McDonald’s fetichismo e
cultura descartável. São Paulo: Boitempo Editorial, 2002.
FURTADO, Celso. A análise do “modelo brasileiro”. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1982.
GARCIA, Bruno Gaspar. Responsabilidade social empresarial, Estado e
sociedade civil: o caso do Instituto ETHOS. In: Responsabilidade social das
empresas: a contribuição das universidades. São Paulo: Petrópolis, 2002.
GARCIA, Joana. O negócio do social. Rio de janeiro: Jorge Zahar. Ed. 2004.
GIFE. Grupo de Institutos, Fundações e Empresas. Disponível em
http://www.gife.org.br.
GIOLO, Jaime. Estado, Igreja e educação no RS da primeira República. Tese
de Doutorado. São Paulo: Feusp, 1997.
145
GOHN, Maria da Glória. Os sem-terra, ONGs e cidadania :a sociedade civil
brasileira na era da globalização. São Paulo: Cortez, 1997.
______.O protagonismo da sociedade civil: movimentos sociais, ONGs e redes
solidárias. São Paulo: Cortez, 2005. (Coleção questões da nossa época;
v.123).
GOMES, Adriano. A (ir)responsabilidade social das empresas e seus
desmembramentos.Pesquisa realizada junto às empresas do setor financeiro,
associadas ao Instituto Ethos de Responsabilidade Social no período de 2001 a
2002.Tese de Doutorado, PUC-SP,2005.
HARVEY, David. Condição pós-moderna. Edições Loyola: São Paulo, 2003.
HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. São
Paulo: Companhia das Letras, 1995.
IAMAMOTO, Marilda V. Relações sociais e serviço social no Brasil: esboço de
uma interpretação histórico-metodológica. São Paulo: Cortez; [Lima, Peru]
CELATS,1988.
________________O serviço social na contemporaneidade; trabalho e
formação profissional. São Paulo: Cortez, 1998.
_________________Projeto profissional, espaços ocupacionais e trabalho do
Assistente Social na atualidade. Texto base da palestra proferida no XXX
Encontro Nacional do CFESS – CRESS, realizado em Belo Horizonte/MG, 03
de setembro de 2001.
____________.A questão social no capitalismo. In. Temporalis. Ano 2, n.3.
jan/jul. Brasília: ABEPSS; Grafline, 2001.
_____________. Projeto Profissional: espaços ocupacionais e trabalho do
assistente social na atualidade. Texto base da palestra sobre a política nacional
de fiscalização do exercício profissional e os espaços ocupacionais: avanços e
146
desafios, proferida no XXX Encontro Nacional do CFESS/CRESS realizado em
Belo horizonte-MG no dia 03 de setembro de 2001.
____________. Algumas das particularidades históricas que redimensionam a
produção/reprodução da questão social na atualidade. Texto utilizado na
Atividade Programada: Questão Social na Contemporaneidade, do Programa
de Estudos Pós Graduados em serviço Social da PUC-SP, em 25 de abril de
2002.
____________.Atribuições privativas do (a) assistente social. CFESS,
fevereiro, 2002.
____________. Os caminhos da pesquisa no Serviço Social. Texto base da
conferência proferida no IX Encontro Nacional de Pesquisadores em Serviço
Social: os desafios da pesquisa e da produção de conhecimento em Serviço
Social. Porto Alegre, 03 de dezembro de 2004.
____________. Serviço Social em tempo de capital fetiche; capital financeiro,
trabalho e questão social. São Paulo: Cortez, 2007.
IANNI, Octavio. A era do globalismo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1996.
INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.
Educação Superior Brasileira: 1991-2004 Mato Grosso. Brasília, 2006.
IPEA. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Disponível em
http://www.ipea.gov.br/asocial.
IPEA/DISOC. A iniciativa privada e o espírito público: a evolução da ação social
das empresas privadas no Brasil. Brasília, julho de 2006.
_________Nota Técnica: A queda recente da desigualdade no Brasil. Brasília,
21 de julho de 2006.
INSTITUTO AKATU. Pesquisa 2005: Responsabilidade social das empresas:
percepção do consumidor brasileiro. São Paulo: Instituto Akatu, 2005.
147
ISTO É, 1958, de 09/05/2007, p.34-35. São Paulo: Ed. Abril, 2007.
YAZBEK, Maria Carmelita. A política social brasileira nos anos 90: a
refilantropização da questão social. In: Cadernos ABONG. São Paulo, 1995.
___________________Os fundamentos do Serviço Social na
Contemporaneidade. Modulo IV do Curso de Capacitação em Serviço Social e
política social. CFESS/ABEPSS/CEAD/UNB, 2000, v.4, p.19-34.
___________________ Terceiro setor e despolitização. Revista Inscrita,
CFESS, v.6, p.13-19, 2000.
___________________Pobreza e exclusão social: expressão da questão social
no Brasil. In. Temporalis. Ano2, n.3, jan/jul. Brasília: ABEPSS, Grafline, 2001.
___________________ Voluntariado e profissionalidade na intervenção social.
In. Actas do Seminário “info-exclusão, info-inclusão e novas tecnologias:
desafios para as políticas sociais e para o serviço social.” Intervenção Social, n.
25/26, Lisboa, Novembro 2002.
__________________ Classes subalternas e assistência social.São
Paulo:Cortez,2003.
KAMEYAMA, Nobuco. A nova configuração das políticas sociais. Praia
Vermelha. n. 5. UFRJ. Programa de Pós-Graduação da Escola de Serviço
Social. Rio de Janeiro, 2001.
KAMEYAMA, Nobuco. Notas introdutórias para a discussão sobre
reestruturação produtiva e Serviço Social. In. A nova fábrica de consensos:
ensaios sobre a reestruturação empresarial, o trabalho e as demandas ao
Serviço Social. Ana Elizabete Mota (organizadora). São Paulo: Cortez, 2000.
KANITZ, Stephen. Responsabilidade social. Disponível em
http://www.filantropia.org/artigos/kanitz_responsabilidade_social.htm.
148
KARKOTLI, Gilson & ARAGÃO, Sueli Duarte. Responsabilidade Social: uma
contribuição à gestão transformadora das organizações. Petrópolis, RJ: Vozes,
2004.
LUKÁCS, George. As bases ontológicas do pensamento e da atividade do
homem. Temas de Ciências Humanas. No. 4 Tr. C.N. Coutinho: Livraria Ed.
Ciências Humanas. São Paulo, 1978.
MARTINELLI, Antônio Carlos. Empresa cidadã: uma visão inovadora para uma
ação transformadora. In Ioschipe, Evelyn [et.al]. 3º Setor: desenvolvimento
social sustentado. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2005.
MARTINELLI, Maria Lúcia. Serviço Social: identidade e alienação. São Paulo:
Cortez, 1989.
__________. (org). Pesquisa qualitativa: um instigante desafio. São Paulo:
Veras Editora, 1999.
MARTINS, José de Souza. Sobre o modo capitalista de pensar. São Paulo:
Editora Hucitec, 1978.
______________________.Frente pioneira: contribuição para uma
caracterização sociológica. In: Martins José de Souza. Capitalismo e
tradicionalismo. São Paulo: Pioneira, 1975.
______________________Expropriação & violência: a questão política no
campo. São Paulo: Editora Hucitec, 1982.
____________________. A sociedade vista do abismo. Novos estudos sobre a
exclusão, pobreza e classes sociais. Petrópolis/RJ: Vozes, 2002.
MEDEIROS, Maria do S. Lopes. A história do ensino de Serviço Social em
Cuiabá, de 1970 a 1982. Dissertação de Mestrado. Departamento de Serviço
Social. PUC-RJ. Rio de Janeiro,1984.
MELO NETO, Francisco de Paulo; & FROESZ, César. Responsabilidade social
& cidadania empresarial: a administração do terceiro setor. Rio de Janeiro:
149
Qualitymark, 2002.
MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa
qualitativa em saúde. 5ª ed. São Paulo/Rio de Janeiro: HUCITEC/ABASCO,
1998.
_____________(org.) Pesquisa social: teoria, método, criatividade.
Petrópolis/RJ: Vozes, 1994.
MODESTO, Marly Morbeck da Silva. Serviço Social e gestão de recursos
humanos: reflexões sobre a escassa absorção do profissional assistente social
nos pólos industriais da grande Cuiabá. Dissertação de Mestrado, Puc-RJ, Rio
de Janeiro, 1992.
MONTAÑO, CARLOS. Das “lógicas do Estado” as “lógicas da sociedade civil”.
Estado e “terceiro setor” em questão. Serviço Social & Sociedade. n. 59. São
Paulo: Cortez, 1999.
_________. Terceiro Setor e questão social: critica ao padrão emergente de
intervenção social. São Paulo: Cortez, 2002.
MORENO, Gislaine & HIGA, Tereza C.de Souza (orgs.) Geografia de Mato
Grosso: território, sociedade e ambiente. Cuiabá: Entrelinhas, 2005.
NASCIMENTO, Elimar Pinheiro do. Estado e sociedade no Brasil; novos
padrões de relacionamento? Brasília: Conselho da Justiça Federal, 1997. (Série
monografias do CEJ, vol.4).
NETTO, José Paulo. Notas para a discussão da sistematização da prática e
teoria em Serviço Social. Cadernos ABESS: A metodologia no Serviço Social.
São Paulo: Cortez, n.3,1989.
_______. Capitalismo monopolista e Serviço Social. São Paulo: Cortez,1992.
_______. Transformações societárias e Serviço Social: notas para uma análise
prospectiva da profissão no Brasil. Serviço Social & Sociedade. n. 50. São
Paulo: Cortez, 1996.
150
_______. Cinco notas a propósito da “questão social”. In. Temporalis. Ano 2,
n.3. jan/jul. Brasília: ABEPSS/Grafline, 2001.
_______. A ordem social contemporânea é o desafio central. Texto da palestra
proferida na 33ª Conferência Mundial de Escolas de Serviço Social. Santiago
do Chile, 28/31 de agosto de 2006.
NOGUEIRA, Marco Aurélio. Um Estado para a sociedade civil: temas éticos e
políticos da gestão democrática. São Paulo: Cortez, 2004.
OLIVEIRA, Fábio Risério de. Relações públicas e a comunicação na empresa
cidadã. In: Responsabilidade social das empresas: a contribuição das
universidades. São Paulo: Petrópolis, 2002.
OLIVEIRA, Francisco & PAOLI, Maria Célia (orgs). Os sentidos da democracia:
Políticas do discenso e hegemonia global. Petrópolis/RJ: Vozes; Brasília:
NEDIC, 1999.
PAOLI, Maria Célia. Empresas e responsabilidade social: os enredamentos da
cidadania no Brasil. In. Democratizar a democracia: os caminhos da
democracia participativa. Boa Ventura de Sousa Santos, organizador. 3ª ed.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.
PASTORINI, Alejandra. A categoria questão social em debate. São Paulo,
Cortez, 2004.
__________. Quem mexe os fios das políticas sociais? Avanços e limites da
categoria “concessão-conquista”. Serviço Social & Sociedade, n. 53. São
Paulo: Cortez, 1997.
PELIANO, Anna Maria T. Medeiros. A iniciativa privada e o espírito público: um
retrato da ação social das empresas no Brasil. Brasília: IPEA, 2003.
PELIANO, Anna Maria T. Medeiros; SILVA, Enid Rocha Andrade. Bondade ou
interesse? Como e porque as empresas atuam na área social. Brasília: IPEA,
2001.
151
POCHMANN. Márcio... [et. al]. Atlas da exclusão social. v. 4: a exclusão no
mundo. São Paulo, Cortez, 2004.
RAICHELIS, Raquel. Esfera pública e conselhos de assistência social:
caminhos da construção democrática. São Paulo: Cortez, 2000.
RICHERS, Raimar. O que é marketing. São Paulo: Brasiliense, 2003. (Coleção
Primeiros Passos).
ROSANVALLON, Pierre. La nueva cuestión social-repensando el Estado
providencia. Buenos Aires: Manathial, 1995.
SAVIANI, Dermeval. Educação: do senso comum à consciência filosófica. 9.
ed., São Paulo: Cortez/Autores Associados, 1989.
SILVA, César Augusto Tibúrcio & FREIRE, Fátima de Souza. Balanço social:
teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2001.
SILVA, Ivone Maria Ferreira da. A formação histórica da questão social no
Brasil e sua vinculação com o Serviço Social: uma viagem incompleta, mas
repleta de emoções. Tese Doutorado em Serviço Social, PUC São Paulo, 2005.
SIMÕES, Carlos. Curso de direito do Serviço Social. São Paulo: Cortez, 2007.
(Biblioteca básica de serviço social; v.3).
SOUZA, Herbert de. Balanço Social nas Empresas Públicas. Gazeta Mercantil,
São Paulo 6/5/97.
SUCUPIRA, João. A responsabilidade social das empresas. 1999. Disponível
em www.balançosocial.org.br . Acesso em 04/09/2005.
TENÓRIO, Fernando Guilherme. Responsabilidade social empresarial: teoria e
prática. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004.
TRAGTENBERG, Maurício. Administração, poder e ideologia. Rio de Janeiro:
Editora Moraes, 1980.
152
WANDERLEY, Luiz Eduardo. A questão social no contexto da globalização: o
caso latino-americano e o caribenho. In. Belfiore-Wanderley. Desigualdade e a
questão social. São Paulo: Educ, 1997.
WANDERLEY, Mariângela Belfiore (org). Desigualdade social e questão social.
São Paulo: Educ, 1997.
ANEXOS
153
ANEXO I
Instrumental de Entrevista nº. 1
I.ROTEIRO DA ENTREVISTA PARA O RESPONSÁVEL PELA EMPRESA (gerente ou diretor).
1. O que é responsabilidade social para esta empresa? 2. O que levou esta empresa a desenvolver ações de responsabilidade
social?(motivações)
3. Quais as ações sociais que essa empresa desenvolve? 4. Quem é o público alvo dessas ações? 5. Quem desenvolve as ações sociais na empresa? 6. Como os diferentes setores da empresa se envolvem nas ações de
responsabilidade social desenvolvidas pela empresa? 7. Como a empresa se posiciona diante:
• dos funcionários, • dos consumidores/clientes • da comunidade • dos acionistas
8. Como as ações sociais desenvolvidas pela empresa são avaliadas? 9. A empresa faz o balanço social? 10. Você considera esta empresa socialmente responsável?Por que?
154
ANEXO II
Instrumental de Entrevista nº. 2
II. ROTEIRO DA ENTREVISTA PARA O ASSISTENTE SOCIAL 1. Concepção de responsabilidade social empresarial.
2. Ações sociais desenvolvidas pela empresa:
3. Público alvo das ações:
• crianças/adolescentes • idosos • meio ambiente • cultura • esporte • lazer e recreação • educação/alfabetização • assistência social • alimentação • segurança
4. Responsabilidade pelo desenvolvimento das ações sociais:
• gerência • pessoal do RH • voluntários • assistente social
5. Envolvimento dos diferentes setores da empresa no desenvolvimento
das ações sociais.
6. Avaliação das ações de responsabilidade social:
• Como é feita? • Por quem?
7. Elaboração do balanço social:
• quem elabora; • finalidade • participação do assistente social
8. Como a empresa se posiciona diante:
• dos funcionários,
155
• dos consumidores/clientes • da comunidade • dos acionistas
9. Participação enquanto assistente social nas ações desenvolvidas pela
empresa.
• elaboração • implementação • avaliação
10. Perfil profissional exigido para que o assistente social possa
desenvolver as ações de responsabilidade social na empresa. • (existe? Não? Qual?).
11. Dificuldades encontradas, enquanto assistente social, na elaboração ou
desenvolvimento das ações de responsabilidade social desenvolvidas pela empresa.
12. Perspectivas em relação à responsabilidade social em Mato Grosso
156
ANEXO III
LEI N° 7.687, DE 25 DE JUNHO DE 2002 - D.O. 25.06.02
Autores: Deputados Humberto Bosaipo, Riva e Eliene Cria o Certificado de Responsabilidade Social no Estado de Mato Grosso e dá outras providências. O GOVERNADOR DO ESTADO DE MATO GROSSO, tendo em vista o que dispõe o art. 42 da Constituição Estadual, sanciona a seguinte lei: Art. 1º Fica instituído o Certificado de Responsabilidade Social - MT a ser conferido, anualmente pela Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso, às empresas, órgãos públicos e demais entidades com sede no Mato Grosso que apresentarem seu Balanço Social do exercício anterior. § 1º Para fins do disposto no caput as empresas e demais entidades deverão encaminhar à Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso o seu Balanço Social até o dia 30 de março do ano seguinte referente ao Balanço anterior. § 2º O prazo de avaliação dos Balanços fica estipulado até o dia 30 de abril. § 3º Poderá a comissão de avaliação solicitar documentos para averiguação ou ir in loco conferir as informações contidas no Balanço Social. Art. 2º Para fins desta lei considera-se Balanço Social o documento pelo qual as empresas e demais entidades apresentam dados que permitam identificar o perfil da sua atuação social durante o exercício contábil, a qualidade de suas relações com os empregados, o cumprimento das cláusulas sociais, a participação dos empregados nos resultados econômicos e as possibilidades de desenvolvimento pessoal, bem como a forma de interação das empresas e de demais entidades com a comunidade e sua relação com o meio ambiente. § 1º O Balanço Social de que trata o caput será assinado por contador ou técnico em contabilidade e um assistente social devidamente habilitado ao exercício profissional. § 2º Os dados financeiros constantes no Balanço Social deverão ser extraídos das respectivas demonstrações contábeis elaboradas na forma da legislação vigente. Art. 3º A Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso tornará pública a relação das empresas que apresentarem o Balanço Social, nos termos da lei, outorgando-lhes Certificado de Responsabilidade Social – MT. Parágrafo único O Certificado de Responsabilidade Social – MT, de que trata o caput deste artigo, será entregue em Sessão Solene do Poder Legislativo Estadual, onde serão divulgados os resultados. Art. 4º Dentre as empresas certificadas, a Assembléia Legislativa elegerá os projetos mais destacados, os quais agraciará com o Troféu Responsabilidade Social – Destaque MT. § 1º Os troféus serão divididos por categoria da seguinte forma: 1. micro e pequena empresa; 2. média empresa;
157
3. grande empresa; 4. ONG’s que desenvolvem projetos sociais; 5. ONG’s que desenvolvem projetos culturais; 6. ONG’s que desenvolvem projetos de turismo e meio ambiente; 7. ONG’s que desenvolvem projetos educacionais; 8. órgãos públicos. § 2º Dentre os aspectos a serem considerados por ocasião da escolha, constarão: 1. SETOR PRIVADO E ONGS: I - impostos: taxas, contribuições e impostos federais, estaduais e municipais; II - folha de pagamento bruta: valor total da folha de pagamento, incluídos os encargos sociais; III - condições de pagamentos: higiene e segurança do trabalho, número de acidentes de trabalho e número de reclamatória trabalhista; IV - alimentação: restaurante, tíquete-refeição, lanches, cestas básicas e outros gastos com a alimentação dos empregados; V - saúde: plano de saúde, assistência médica, programas de medicina preventiva, programas de qualidade de vida e outros gastos com saúde; VI - educação: treinamento, programa de estágio, reembolso de educação, bolsas de estudos, creches, assinaturas de revistas, gastos com educação e treinamento de empregados e seus familiares; VII - aposentadoria: planos especiais de previdência privada, tais como fundações previdenciárias, complementações de aposentadoria e outros benefícios aos aposentados; VIII - outros benefícios: participação nos resultados econômicos, seguros, empréstimos, gastos com atividades recreativas, transportes e outros benefícios oferecidos aos empregados; IX - contribuição para a sociedade: investimentos na comunidade nas áreas de cultura, esportes, habitação, saúde pública, saneamento, segurança, urbanização, educação; X - defesa civil, pesquisa, obras públicas e outros gastos sociais na comunidade e preservação do meio ambiente, discriminando, inclusive, o número de horas destinadas por seu quadro funcional ao trabalho voluntário; XI - investimentos em meio ambiente: reflorestamento, despoluição, gastos com introdução de métodos não poluentes e outros gastos que visem à conservação e melhoria do meio ambiente, inclusive com educação e conscientização ambiental; XII - número de empregados: número médio de empregados no exercício (registrados no último dia do período); XIII - número de admissões: admissões efetuadas durante o período; XIV - políticas adotadas visando a diminuir a exclusão de determinados segmentos sociais: descrição sintética de políticas adotadas pela empresa no sentido de diminuir a exclusão social através da admissão social dos idosos, deficientes e outros, no seu quadro funcional; 2. ÓRGÃOS PÚBLICOS: - Deverão ser considerados os itens acima, devendo ainda acrescentar os seguintes dados: I - qual o tempo de espera do contribuinte para ser atendido;
158
II - ambiente de trabalho e sala de espera dos contribuintes; III - prazo médio de retorno às consultas, requerimentos ou solicitações feitas pelos requerentes; IV - espaço reservado para a comunidade fazer suas sugestões, críticas, anúncios, etc.; V - pesquisa acerca das necessidades de cada bairro junto à sua comunidade, a fim de constar do orçamento como prioridades; VI - se há guarda municipal, quantos estão lotados, onde estão localizados os postos de atendimento; VII - quantos veículos atendem à guarda municipal, tipo; VIII - quantas horas/aula de treinamento/aperfeiçoamento foram ministradas aos guardas municipais; IX - número de telefones à disposição da comunidade para contato com a guarda; X - número de empregados no final do período, discriminando os efetivos, comissionados e temporários; número de admissões durante o ano; XI - número de empregados por sexo, idade, escolaridade, procedência; XII - número de trabalhadores deficientes; XIII - composição familiar dos servidores (número de membros da família, número e idade dos filhos), tipo de moradia (própria, aluguel, financiado); XIV - existência de creches para filhos de servidores; XV - programa preventivo de saúde física e mental para os servidores; XVI - programas de estímulo para o lazer, esporte, cultura, através de associações ou clubes recreativos; XVII - plano de saúde, previdência, assistência médica e odontológica para os servidores, inclusive terapias alternativas; XVIII - seguro de vida atividades arriscadas; XIX - alimentação (restaurante ou tíquete), transporte e educação para o trabalho; XX - ambiente de trabalho: recursos humanos e materiais, com horas de trabalho aceitável e acesso às novas tecnologias; XXI - capacitação, treinamento, reciclagem, aperfeiçoamento, com a conseqüente valorização salarial; XXII - remuneração condigna, informando o valor bruto da folha e encargos decorrentes; XXIII - outras formas de desenvolvimento humano para os servidores e sua família; 2.1. Secretaria de Saúde: I - número de hospitais municipais, com atendimento pelo SUS, indicando local, número de servidores (médicos, enfermeiros, técnicos, auxiliar de enfermagem, coordenadores, diretores, motoristas, etc.), número de leitos, número de leitos por quarto, tipos de equipamentos, tipos de serviços prestados, quantas especialidades médicas; II - número e endereço de postos de saúde; se há postos em bairros da periferia; quais especialidades médicas oferecem; se há atendimento odontológico, fisioterapia; vacinação permanente (quais); III - quanto de medicamento foi distribuído pelos postos, quantos beneficiados; IV - quantas pessoas atendidas (dia/mês) em cada unidade de saúde, discriminando o número de remoções para centros mais avançados;
159
V - quais as campanhas de vacinação foram realizadas; quantas crianças e adultos foram vacinados; quantas pessoas são vacinadas por dia nos postos de saúde (permanente); VI - número de unidades móveis de saúde (médica e odontológica); valor de cada uma; quais serviços oferecem; quantas pessoas atendidas; VII - número de ambulâncias, valor, quantos motoristas por veículo, quantas pessoas beneficiadas; VIII - quantidade e tipos de equipamentos à disposição da saúde (máquinas de Raios-X, endoscopia, ultra-sonografia, etc.); IX - Programa de Saúde Familiar: quantas casas foram visitadas e quantas pessoas beneficiadas; qual o período da visita; X - campanhas de saúde preventiva, banner’s e palestras de orientação sobre doenças contagiosas e outras, tais como: DST, Aids, Cólera, Dengue, tabagismo, Alcoolismo, Drogas, etc.; XI - qual o percentual (%) aplicado na saúde; XII - número de estação de tratamento de água, endereço; XIII - quantas residências e famílias têm acesso à água tratada; XIV - quantas campanhas de esclarecimento para não poluição dos rios e economia de água tratada pelos usuários; XV - ações de prevenção e/ou limpeza de rios que abastecem a cidade; XVI - quantos metros de esgoto sanitário foram executados, onde, quantas famílias beneficiadas; XVII - implantação e atuação do Conselho de Saúde; XVIII - outros; 2.2. Secretaria de Educação: I - número de escolas municipais, com o endereço de cada uma (urbanas e rurais); II - quantas salas de aula e a capacidade de cada uma, totalizando quantos alunos foram atendidos, por faixa etária; III - se as escolas atendem à chamada, ou seja, quantos alunos procuram vagas e quantos foram matriculados; IV - Censo Escolar: quantas crianças matriculadas, quantas repetiram e quantas evadiram, por faixa etária; V - número de professores, discriminando por sexo, idade, os leigos, a habilitação (magistério, licenciatura plena, pós-graduados); VI - número de professores por aluno (relação); VII - se a remuneração é condigna e atende ao piso básico e ao Plano de Carreira do Magistério; VIII - qual o percentual da receita do FUNDEF aplicado na remuneração do magistério; IX - se foi oferecido curso de capacitação para professores efetivos leigos, quantos foram beneficiados, quais cursos; valor; X - cursos de aperfeiçoamento/reciclagem para professores; quantos foram beneficiados; valor; XI - qual o percentual (%) da receita de impostos e transferências aplicados na educação;
160
XII - salas de aula com condições adequadas de trabalho e aprendizado: temperatura, luminosidade, móveis, equipamentos, materiais pedagógicos, quadro de giz e seus complementos; XIII - prédio escolar em condições adequadas para prestar atendimento aos alunos: salas, bibliotecas, quadras de esporte, campos esportivos, água tratada, sanitários, etc.; XIV - número de equipamentos de audiovisual por escola: computadores, retroprojetores, televisão, vídeo, etc.; XV - quantos ônibus servem ao transporte escolar; quais rotas; quantos alunos foram atendidos; XVI - quantas bibliotecas, endereço, acervo; XVII - quantas crianças são atendidas diariamente com a merenda escolar; XVIII - quantos quilos e tipo de alimentos foram oferecidos na merenda escolar; XIX - alimentação escolar: indicar valor dos recursos federais e próprios; XX - quantas unidades executoras receberam recursos do PDDE; o que foi adquirido com esses recursos; XXI - quantos convênios foram realizados; objeto e valor de cada um; execução; XXII - Bolsa-Escola: quantas famílias foram beneficiadas, quantos alunos foram atendidos; XXIII - implantação e atuação dos Conselhos (de Educação, do FUNDEF, do PNAE); XXIV - outros; 2.3. Obras e Serviços Públicos: I - quantos metros de asfalto foram executados; quais ruas e avenidas; quantos beneficiados; II - quantas casas populares foram construídas, quantas foram entregues; informar local; quantas famílias beneficiadas; III - quantos caminhões de lixo são utilizados na limpeza pública; quantas famílias beneficiadas com a coleta de lixo; IV - quantos servidores trabalham na limpeza pública (ruas, praças...); V - quantas empresas e suas respectivas frotas (número de ônibus) atendem ao transporte coletivo; se atendem à demanda; número de usuários; rotas (bairros atendidos); VI - se há abrigo em todos as paradas de ônibus; VII - se há rodoviária e aeroporto; VIII - quantos quilômetros de estradas vicinais foram abertos ou mantidos; quais (onde); IX - quais obras foram realizadas: local, área construída, valor, objetivo, quais e quantos foram beneficiados; X - espaço para feiras, beneficiados; XI - manutenção da iluminação pública; quais ruas não foram atendidas; XII - outros. 2.4. Assistência Social: I - quantas famílias comprovadamente carentes são cadastradas; II - quantas foram beneficiadas; que tipo de assistência social foi prestada; III - quantas e quais campanhas foram desenvolvidas, quantos beneficiados; IV - quantas cestas básicas foram entregues;
161
V - quantos litros de leite foram distribuídos; VI - atendimento a deficientes: centro de reabilitação equipado; VII - quais os tipos de deficiência são atendidos; quantos foram atendidos diariamente; VIII - centros comunitários, de convivência de idosos, com atividades como: trabalhos manuais, danças, pinturas, terapias e outros; IX - programas de assistência à criança de rua: quantos foram encaminhados a escolas, grupos de recuperação que desenvolvem ações através do esporte, dança, teatro, música; quantas famílias foram atendidas/orientadas; X - atuação do Conselho Tutelar na orientação de crianças e adolescentes; quantas crianças qual o trabalho realizado junto às famílias; quais os resultados. Art. 5º A Mesa Diretora da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso, no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data de publicação desta lei, constituirá uma comissão mista, composta por: um representante da Assembléia Legislativa, um representante da classe contábil, um representante do comércio, um representante da industria, representantes das ONGs, sendo um por seguimento para análise da responsabilidade social das empresas, organizações não governamentais e órgãos públicos. Art. 6º As despesas decorrentes da presente lei serão cobertas pelos recursos orçamentários próprios, à conta do orçamento da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso. Art. 7º Esta lei entra em vigor na data da publicação, revogadas as disposições em contrário. Palácio Paiaguás, em Cuiabá, 25 de junho de 2002.
JOSÉ ROGÉRIO SALLES
Governador do Estado