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Suplemento Cultural do Dirio Oficial do Estado de Pernambuco n
72 - Distribuio gratuita - www.suplementopernambuco.com.br
UM DOSSI SOBRE WALTER BENJAMIN, O HOMEM QUE VIU ATRAVS DO HORROR
DAS DUAS GRANDES GUERRAS
PEDRO
MELO
PAULO SCOTT | ENTREVISTA COM JULIN FUKS | SOBRE A ARTE DE
ENCERRAR UM LIVRO
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 20122
CARTA DO EDITOR
HELIA SCHEPPA
GALERIA
Fotgrafa do Jornal do Commercio, Helia comeou a usar o Instagram
como uma curiosidade. Foi no sentido de brincar mesmo, no comeo.
Mas depois, percebi que estava reciclando o meu olhar, com a
liberdade visual de fotografar sem ser profi ssionalmente e ainda
assim dividir isso com as pessoas.
http://www.fl ickr.com/heliascheppa e no instangram seu nome de
usurio heliascheppa
GOVERNO DO ESTADODE PERNAMBUCOGovernador Eduardo Campos
Secretrio da Casa CivilFrancisco Tadeu Barbosa de Alencar
COMPANHIA EDITORADE PERNAMBUCO CEPEPresidenteLeda AlvesDiretor
de Produo e EdioRicardo MeloDiretor Administrativo e
FinanceiroBrulio Meneses
CONSELHO EDITORIALEverardo Nores (presidente)Antnio
PortelaLourival HolandaNelly Medeiros de CarvalhoPedro Amrico de
Farias
SUPERINTENDENTE DE EDIOAdriana Dria Matos
SUPERINTENDENTE DE CRIAOLuiz Arrais
EDIORaimundo Carrero e Schneider Carpeggiani
REDAOMariza Pontes, Debra Nascimento, Mariana Oliveira e Marco
Polo
ARTE, FOTOGRAFIA E REVISOGilson Oliveira, Janio Santos, Karina
Freitas, Milito Marques e Sebastio Corra
PRODUO GRFICAEliseu Souza, Joselma Firmino, Jlio Gonalves,
Roberto Bandeira e Sstenes Fernandes
MARKETING E PUBLICIDADEAlexandre Monteiro, Armando Lemos e
Rosana Galvo
COMERCIAL E CIRCULAOGilberto Silva
PERNAMBUCO uma publicao da Companhia Editora de Pernambuco
CEPERua Coelho Leite, 530 Santo Amaro RecifeCEP: 50100-140Contatos
com a Redao3183.2787 | [email protected]
O nome de Walter Benjamin mais do que conhecido por todos
aqueles que exploram as cincias humanas. A amplitude do seu olhar
faz com que ele ilumine as mais diversas reas, da literatura
comunicao. Esse ms trazemos um dossi a seu respeito, aprovei-tando
nova edio de Origem do drama trgico alemo, pela editora Autntica. O
reprter Pau-lo Carvalho, um admirador do pensamento benjaminiano,
saiu em busca de alguns dos principais especialistas brasileiros do
escritor, para que eles discutissem essa que uma das suas obras
menos compreendidas.O escritor Manoel Ricardo de Lima, profes-
sor de literatura da Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro, buscou compreen-der o impacto do trabalho de Benjamin, num
texto de sensvel teor filosfico: As escolhas que Benjamin fez,
naquele momento, come-o do sculo 20, no eram to bvias. A sua prtica
de pensamento tem a ver diretamente com essas escolhas que fez a
partir de um uso deflagrado da ateno; no toa seus textos no
comportam qualquer resultado conclu-sivo, ao contrrio, sugerem a
constituio abissal do paradoxo naquilo que ele passa a chamar de
imagem dialtica.
O Pernambuco desse ms tambm se volta a discutir duas das obras
mais comentadas da recente produo brasileira de romances: A procura
do romance, de Julin Fuks, e Habitante irreal, de Paulo Scott.
Ronaldo Correia de Brito, que lana este ano o seu segundo romance,
Eu estive l fora, escreveu uma crnica em que relata o momento em
que o autor tem de se livrar de um livro e colocar o ponto final
nele. O escritor trata essa questo a partir da tcnica de fazer caf,
uma de suas paixes. J no existe a profisso de torradeira de caf.
Ningum mais escuta falar nessas mulheres que trabalhavam nas casas
de famlia, em dias agendados com bastante antecedncia. As
profissionais, famosas pela qualidade do servio, nunca tinham hora
livre. Cobravam caro e s atendiam freguesas antigas. No era
qualquer uma que sabia dar o ponto certo da torrefao, reconhecer o
instante exato em que os gros precisavam ser retirados do fogo. Um
minuto a mais e o caf ficava queimado e amargo. Um minuto a menos e
ficava cru, com sabor travoso, observa Ronaldo. Talvez a fico exija
o mesmo cuidado.
Boa leitura e timo Carnaval e at maro.
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 20123
Paulo Scott
difcil traar um roteiro seguro, absoluto, de passos infalveis.
Cada livro, cada projeto estabelece sua prpria dinmica. Enxergar e
administrar esse trn-sito, sua inconstncia e os seus ritmos, o
primeiro passo a ser dado quando se pretende uma carreira de
escritor. Nem toda ideia, nem todo nimo, impulso, inrcia vingaro;
nem tudo que se conclui vale a pena mostrar. Habilitar-se para esse
julgamento exige um distanciamento delicado, arriscado at, pois a
autocrtica que deve existir no pode ser de forma a travar o
processo criativo penso que por essa razo muitos acadmicos
escritores tm tanta dificuldade em produzir; as referncias que
carregam so tantas e os parmetros de avaliao to elabo-rados que
acabam por jog-lo numa imobilidade de enorme resistncia, numa srie
de moldes cuja funcionalidade existe para evitar falhas, mas que na
prtica os impediro de inovar o contexto literrio. Por no ter erudio
literria expressiva, por no
ambicionar t-la (t-la para fora da minha condi-o de leitor
compulsivo), tenho menos receio de errar do que muitos dos vrios
outros escritores de talento que conheo. Imagino que meu processo
seja mais simples, mais intuitivo. Tendo inveno de personagens que
me interessem e, em seguida, a desenvolver na minha cabea suas
idiossincrasias, suas ambies em especial e a partir disso contar a
histria. Evito as anotaes detalhadas, descries fsicas dos
protagonistas, antagonistas, coadjuvantes (dificilmente isso ser
relevante), no completo ma-pas minuciosos para s ento comear a
trabalhar. Nada disso. Gosto, sinceramente, de ir contando aos
amigos o que estou fazendo; verbalizar, discor-rer sobre minhas
intenes me ajuda a sedimentar a histria, a descobrir sadas, a
entender o que no funciona. No tenho medo de revelar o que estou
fazendo. Histrias, boas histrias, no faltam por a, o segredo
conseguir cont-las acrescentando algo de relevante tradio literria
isso, hoje em dia, quando so despejadas centenas e centenas de
livros novos nas estantes das livrarias brasileiras a cada ms, um
dado impossvel de negligenciar.Outro aspecto que imagino tambm seja
digno
de nota o estado de entusiasmo com o que se est escrevendo. Pode
parecer tolice, mas no . Logo que a atividade literria deixa de ser
novidade e passa a ser profisso, encontrar os mecanismos do
entusiasmo e de como conseguir mant-lo crucial, eu diria. Por isso
s vezes no me importo
de me deter por longos perodos na linguagem, no artesanato das
palavras (deixando um pouco de lado a nfase em torno da narrativa),
mesmo que parea imprudncia. Admito o capricho porque a linguagem o
fator que me empolga, me diverte, me leva a escrever com mais
vivacidade, mesmo sabendo que depois terei de cortar trechos,
par-grafos inteiros. Toda estrutura narrativa precisa de muitas
verses, eleies, selees, precisa ser concretizada para depois ser
enxugada. Tento no cair na pressa que eventualmente possa
prejudicar a distncia entre a criao e a reviso. Alimento a
desconfiana do que foi produzido; sobretudo: desconfio de quando me
dou por satisfeito.Penso que um dos segredos da escrita, do
texto
com alguma qualidade, esteja no fato do autor ter bons leitores,
pessoas com preparo e honestidade suficientes para dizer, de
maneira cruel at (ima-gino que no exista outro caminho), quando
aquilo que foi produzido ficou ruim. Se o autor vai aceitar a
avaliao, a leitura, o ataque, bem, isso j outra histria. Gosto de
escutar crticas negativas (aprecio a sinceridade dos meus
interlocutores; no se vai a lugar algum com tapinhas nas costas),
quer dizer: no tenho problema em escutar quando algum diz que no
gostou daquilo que escrevi. O texto se faz da leitura, a leitura
faz surgir a obra, possvel que a leitura, que nunca idntica
pretenso do escritor, venha a melhorar o livro, claro poder tambm
estrag-lo. H meia dzia de romances que, quando li pela primeira
vez, me pareceram ruins (pura falta de maturidade, de ambincia),
mas que depois se mostraram grandes obras. Se voc est convicto do
que fez, se escrever
no passou de aventura, deve estar pronto para enfrentar o teste
das crticas. Imediatamente, po-dem trazer desconforto, mas,
mediatamente, seja pela impertinncia ou pertinncia, ingressaro no
rol das coisas que te faro escrever melhor, que te faro chegar a
uma voz prpria, autntica, inova-dora, na medida em que ainda seja
vivel atingir tais ideais, tais desconfortos.
As nuances do raio X de uma criao ficcionalO autor de um dos
livros mais elogiados hoje no Brasil, o romance Habitante irreal,
sobre a histria recente do Pas, descreve os pormenores do seu
processo criativo
BASTIDORES
CARTUNSRODRIGO AGUIAR GAFAHTTP://RODRIGOGAFA.CARBONMADE.COM/
Habitante irrealEditora AlfaguaraPginas 262Preo R$ 40,00
O LIVRO
JANIO SANTOS
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 20124
ENSAIO
A conscincia das escolhas que so feitas Quais as caractersticas
do escritor que tambm se reconhece como um crtico? Felipe
Charbel
capaz de atuar simultaneamente, e com brilho, nessas duas
frentes.No ensaio A cortina, Milan Kundera compara o
romancista que escreve sobre sua arte com o pintor que recebe
algum em seu ateli: ele falar de si mesmo, mas ainda mais dos
outros, dos romances que ama e que esto secretamente presentes na
sua prpria obra. O autor-crtico algum que sabe e deseja se
posicionar publicamente em relao s prprias escolhas, explicitando
procedimentos de leitura que atuam na contramo dos trabalhos de
monumentalizao das tradies literrias. Sua visada anticannica
demanda uma reescrita da histria da literatura, com base no critrio
do va-lor de uso das obras particulares, esparramadas
sincronicamente, apropriadas em funo de uma potica do romance, que
no pertence seno a ele, o autor-crtico, e naturalmente, portanto,
se ope potica de outros escritores.Mas trata-se de uma histria
literria muito pe-
culiar, executada por um anti-historiador, para quem o tempo no
um fluxo contnuo, e sim massa de modelar. Uma histria literria
baseada no anacronismo. O leitor-visitante do ateli do romancista
convidado a visualizar, como que de dentro, o making of de uma voz,
l no poro da histria, onde, ainda nas palavras de Kundera, o futuro
do romance est se decidindo, se trans-formando, se fazendo, em
lutas, em conflitos, em confrontos. Faroleiro de si mesmo,
hermeneuta dos seus prprios projetos estticos, o autor-crtico um
fagocitador voraz de leituras, responsvel pela pilhagem dos
mausolus das tradies letradas.Leitor especialmente bem-talhado nas
jornadas
particulares da Bildung a formao no cnone e contra o cnone , o
autor-crtico, como perce-beu a ensasta Leila Perrone-Moiss em seu
timo
Existe algo de especfico na crtica literria feita por
escritores? Alguma coisa que s autores de fico so capazes de
apreender, quando escre-vem sobre literatura? So perguntas que me
fao quando leio resenhas, artigos, aulas e conferncias de Milan
Kundera e J. M. Coetzee, Italo Calvino e Cesar Aira, Thomas Mann e
Vladimir Nabokov, Elias Canetti e Jorge Luis Borges. Esse tipo de
crtica exerce sobre mim um fascnio especial. E, a julgar pelas
sucessivas edies de coletneas e ensaios de escritores, devem
interessar a muito mais gente. Por qu, afinal?Se houver algum tipo
de predicado intrnseco
ao ensasmo de autor, pouco provvel que esse atributo seja condio
suficiente para lhe assegurar um lugar especial em relao s demais
variedades de crtica. As fronteiras so muito tnues, porosas, e o
que est do outro lado sequer se configura como unidade a crtica de
no autor. Os textos en-sasticos de um ficcionista tambm so marcados
por idiossincrasias e parcialidades: podem ser bons ou maus,
elogiosos ou frios, preguiosos ou afia-dos. No adquirem um estatuto
diferenciado apenas pelo fato de terem sido escritos por
romancistas, contistas ou poetas.O que parece ser o aspecto
diferencial na crtica
de autor, sua especificidade, a coexistncia, em uma mesma obra,
de projetos autorais simultneos, um crtico e outro ficcional, que
podem ser para-lelos (Mann), articulados em alguma medida
(Na-bokov, Canetti, Calvino), ou mesmo indissociveis (o caso de W.
G. Sebald, cujo Guerra area e literatura, por exemplo, pode ser
lido como uma espcie de brao armado de sua fico). Na confluncia
dessas linhas aparentemente contraditrias reside a sin-gularidade
da crtica de autor ao menos de uma certa crtica de autor, produzida
pelo seleto grupo
KARINA FREITAS
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 20125
obra do autor-crtico, adquire contornos instveis, porque
destitudo de pretenses universalistas e voltado para seu processo
de formao e dissoluo no interior de uma potica particular. O cnone
subjetivo, mas ainda assim, ou talvez exatamente por isso,
carregado de autoridade.Isso significa que a crtica de autor
puramente
instrumental? Que ela se apresenta como um mero tubo de ensaio
do ficcionista? Que por no se despir totalmente da persona de
criador, o autor-crtico ter sempre um olhar monolgico, pouco
generoso com tudo que no diz respeito ao seu gosto? Se for assim,
por que essa crtica haveria de interessar a mais algum, alm do
autor que a elabora, ou outros escritores preocupados com as
tcnicas e filigranas de um saber-fazer?O foco do autor-crtico no
seu projeto esttico
no deve ser confundido com uma egotrip hermti-ca. Como terico da
prxis, ele obrigado, em sua viagem ao redor do prprio umbigo, a se
afastar de si mesmo, na tentativa de dar conta do que mais lhe
interessa nas obras alheias: os procedimentos que conferem algo de
nico, de singular, de ino-vador, a certos escritos. Ou, o que o
outro lado dessa moeda, o exame de fracassos, desacertos e
limitaes. Os textos crticos de J. M. Coetzee apre-sentam pouco mais
que lampejos de sua voz como ficcionista. Mas ela est l, atenta ao
que importa, produzindo atritos. Se o ensasmo de autor possui uma
evidente dimenso instrumental, ele tam-bm uma espcie de lio de
anatomia cujas con-dies de possibilidade so o saber-fazer (alguma
coisa que eles, os autores-crticos, compartilham), e a longa
experincia na dissecao minuciosa de um objeto a prpria literatura.S
os escritores, escreve Roberto Calasso em
A literatura e os deuses, esto em condies de abrir-
KARINA FREITAS
-nos os seus laboratrios secretos. Guias capri-chosos e
evasivos, so, no entanto, os nicos a conhecer passo a passo o
terreno. evidente a afeio de Calasso, ele mesmo um autor-crtico, a
uma espcie de conhecimento secreto partilhado por poucos, a formas
de sensibilidade vedadas aos meros mortais: Quando lemos os ensaios
de Baudelaire ou de Proust, de Hofmannsthal ou de Benn, de Valry ou
de Auden, de Brodski ou de Mandelstam, de Marina Cvetaeva ou de
Karl Krauss, de Yeats ou de Montale, de Borges ou de Nabokov, de
Manganelli ou de Calvino, de Canetti ou de Kundera, percebemos logo
ainda que um possa detestar o outro, ou ignor-lo ou opor-se a ele
que todos falam do mesmo objeto.No ensasmo de ficcionistas,
palavras como li-
teratura, autor e obra possuem concretudes muito tangveis.
Reconhecidas e compartilhadas por um grupo heterogneo e acfalo
precariamente reu-nido em torno de um saber-fazer e de um interesse
comum , essas categorias conferem ao escritor o sentido de
pertencimento a uma comunidade, alm de possibilitarem uma philia,
uma amizade, tanto pela coisa em si, a literatura, como pelos que a
cul-tivam, os leitores (sem os quais essa comunidade impensvel), no
que talvez seja o ltimo vislumbre da noo romntica e humanista de
Weltliteratur, literatura mundial, como pensada por Goethe e
retomada, quando j era impossvel reviv-la, por Auerbach. Para alm
das fronteiras nacionais e das amarras tericas, o ensasmo de autor
um dos ltimos espaos em que ainda possvel amar a literatura sem a
preocupao, ou o xtase, com seu desaparecimento.
Felipe Charbel professor adjunto de Teoria da his-tria na
UFRJ
Altas literaturas, demonstra plena conscincia da radicalidade
intrnseca ao desafio fundador da modernidade: a autocertificao. Mas
o autor--crtico algum que no se contenta com a ins-tituio dos
prprios critrios de ajuizamento: ele quer, sobretudo, compreender
suas alternativas e situ-las no horizonte das escolhas realizadas
por outros ficcionistas. Quer se certificar da pr-pria
autocertificao. Para tanto, o autor-crtico explora os projetos
autorais de outros escritores compreendidos, ou designados, como
produtos de escolhas coerentes, estticas intencionais. Nesse caso,
a ideia de projeto ela mesma uma fico, mais uma dentre suas fices.O
desejo de autognose, de um conhecimento que
parta de si e atue para si, solicita uma reconstru-o do cnone
literrio estilhaado. Mas este, na
O foco do autor-crtico no seu projeto esttico no deve ser
confundido apenas com uma egotrip hermtica
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 20126
Um autor entre os acertos e as falcias tpicas da memria
ENTREVISTAJulin Fuks
Entrevista a Lus Henrique Pellanda
Assim como Sebastin, protagonista de Procu-ra do romance, o
escritor paulistano Julin Fuks vive s voltas com um excesso de
conscincia narrativa. Assim como seu personagem, Fuks jovem,
brasileiro, filho de argentinos exila-dos no Brasil e, enquanto
tenta escrever um romance buscando, quem sabe, um pouco de inovao ,
revisita a mesma Buenos Aires de sua infncia. No se trata de tarefa
simples, claro, pois
no existe mais isso de contar uma hist-ria e ponto final. Hoje
preciso ir alm. Ou no? Entre erros e acertos, aps toda
expe-rimentao e renovao estticas do sculo 20, alguma novidade ainda
seria possvel, ou
Aps um elogiado livro de contos em que tematizou a cegueira, o
escritor paulistano fala dos desafios de escrever seu primeiro
romance e das questes do contemporneo
mesmo necessria? E as tramas, tornaram-se inviveis? O que dizer
de realmente relevan-te num livro de fico? E como diz-lo? para
responder a essas questes que o novo livro de Fuks se atira num poo
aparente-mente sem fundo, apresenta-se como obra em construo que,
desde a origem, j se confessa em crise.E so esses assuntos que o
escritor tam-
bm autor de Histrias de literatura e cegueira e Fragmentos de
Alberto, Carolina, Ulisses e eu revi-sita na entrevista abaixo. O
grande vazio em que pode cair (ou j caiu?) a literatura atual. O
vnculo entre memria e imaginao. A falsa relao que se cria entre
obra de arte e mentira. O longo processo de escrita de Procura do
romance. Temas que assombram tanto Julin quanto Sebastin.
Numa entrevista recente (para a Unesp), voc disse que no Brasil,
apesar de no haver um aprofundamento real do debate literrio,
alguns autores ainda seriam capazes de perceber o grande vazio em
que camos. Que vazio esse a que voc se refere e que tanto assombra
o protagonista de Procura do romance, Sebastin?O vazio que me
assombra e que emprestei ao meu protagonista a impossibilidade de
renovao esttica a que est submetido qualquer escritor contemporneo,
como qualquer artista. O sculo 20 foi um sculo de muita
experimentao e muita vertigem, e dele herdamos, alm de belssimas
obras, uma derradeira agonia: depois de tanta inovao, a ambio do
novo parece inatingvel. O escritor que, hoje, pretenda inserir sua
obra em algum contexto de desenvolvimento histrico ou artstico,
v-se de imediato sem sada, ou indeciso entre duas opes
insatisfatrias. Pode desvencilhar-se da obrigao do novo e
simplesmente contar histrias, ou vasculhar com obstinao as
novidades do passado para ver se alguma delas foi negligenciada ou
esquecida. Digo assim, mas poderia dizer de outro jeito: essa
apenas uma entre tantas formulaes possveis para esta onipresente
sensao de crise.
Alis, h muitas crises em Procura do romance: a crise argentina,
a crise familiar e pessoal de Sebastin como indivduo e aspirante a
escritor e a crise da fico literria em geral. Logo no incio do
livro, o narrador fala da ninharia de ocorrncias que distinguem seu
personagem, e sobre a ausncia de aventura que marca sua existncia.
De forma geral, o escritor de hoje no tem mais nada a contar? O
enredo se tornou invivel?No que diz respeito crise do romance,
penso que no se trata tanto da falta de algo para contar, e sim de
uma incapacidade de encontrar para esse algo a forma mais
pertinente, mais adequada, a forma que no se mostre repetitiva ou
arcaica. Mas de fato
FOTO: DIVULGAO
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 20127
assim que hoje se quer a literatura: um passatempo andino que
nos indigne ou nos comova por um instante nfimo
Se h algo que nosso tempo explicita com eloquncia a relao to
ntima entre imaginao e memria
h outras crises entremeadas a essa, e creio que a inviabilidade
de enredo que voc menciona tem relao com uma questo mais
abrangente, uma questo poltica. Muito se falou em fim da histria,
em fim das utopias, em uma concepo de que o capitalismo que vivemos
seria o nico modelo possvel, e evidente que em grande medida essa
concepo falaciosa atingiu uma gerao inteira. A ausncia de aventura
que nos marca tambm uma desistncia, um conformismo generalizado, a
ausncia de militncia em um mundo que esconde a todo custo suas
alternativas.
Na escola, Sebastin se orgulha do elogio de uma professora a uma
de suas redaes: para ela, seu aluno possua uma imaginao de
escrevedor de livros. No entanto, o orgulho do menino dura pouco:
ele logo percebe a fragilidade daquele elogio. A imaginao no (ou
deixou de ser) um atributo essencial aos escritores? frgil o elogio
porque falso: aquilo que a professora compreendera como fruto da
imaginao do menino era uma narrativa calcada em ocorrncias de sua
vida. Mas talvez haja nessa incompreenso entre os dois uma confuso
bastante comum e significativa: a ideia de que a imaginao possa
estar desvinculada da memria, que surja do nada sem qualquer
origem, que seja uma construo sem base, sem alicerce, pairando
sobre o vcuo como uma fantasmagoria. Se h algo que
nosso tempo explicita com grande eloquncia a relao to ntima
entre imaginao e memria. Nessa imensa quantidade de personagens
semelhantes aos seus autores que hoje vemos, no romance que tantas
vezes mostra sua face de autobiografia fictcia, revela-se com
clareza que esses dois atributos so indistinguveis.
Voc tem muito em comum com seu protagonista. Ambos dividem sua
identidade nacional entre dois pases vizinhos e, sob alguns
aspectos, antagnicos. Brasileiro, filho de argentinos, criado tanto
no Brasil quanto na Argentina, a qual tradio literria voc mais se
sente ligado ou, em outras palavras, de qual voc mais gostaria de
se libertar? uma pergunta difcil. Nasci em So Paulo, vivi a maior
parte da minha vida aqui, escrevo em portugus; tudo isso faz de
mim, sem empecilhos, um escritor brasileiro. No entanto, talvez no
seja fcil detectar alguma brasilidade no que escrevo, se que se
pode dizer algo assim. Talvez a origem dbia me distancie um pouco
da tradio que aqui temos, por mais mltipla que ela seja. E possvel
que minha escrita um tanto cerebral, como algum j disse seja
realmente de um tipo mais frequente na Argentina, cuja literatura
eu acompanho com tanto interesse e tanta devoo quanto a brasileira.
Acho que de nenhuma delas quero me ver livre.
Seu narrador deixa claro que Sebastin branco, heterossexual,
abastado, aspirante a escritor, supostamente privilegiado. O que
voc acha do atual debate em torno da identidade dos narradores e
protagonistas brasileiros contemporneos, na sua maioria homens,
brancos, heterossexuais e de classe mdia? Voc v problema nessa
hegemonia?Vejo problema em que essa hegemonia se perpetue em
diversos campos da cultura e da sociedade, no apenas na literatura
brasileira. Vejo problema em que se considere que j atingimos
alguma igualdade, seja racial ou de gnero, quando to evidente que
um perfil especfico continua sendo privilegiado, protegido, ouvido
com mais ateno, sobrevalorizado. Procurei abordar a questo pela
perspectiva desse homem porque era a que me resultava mais
acessvel. No caso do meu personagem, em se tratando de um sujeito
cujo trao principal talvez seja o rigor excessivo e a autocrtica,
essa percepo de privilgio no poderia deixar de constituir um de
seus fantasmas, uma de suas crises.
Os autores que mais lhe interessam so os que equilibram fico,
ensaio e crtica literria? Entre brasileiros e estrangeiros, quem
dorme na sua cabeceira?Acho que sim, essa uma formulao possvel, mas
eu diria que os autores que me interessam so os que produzem uma
fico mais
analtica, uma fico que rejeita qualquer soberania e em vez disso
se disseca, se problematiza. No atual estado das coisas, penso que
a que se verifica a postura mais crtica, a que rejeita os modelos
prontos, as solues j sabidas, tudo aquilo que o mercado tenta impor
massiva produo de livros. Vejo no argentino Juan Jos Saer um dos
grandes expoentes dessa tentativa, mas h outros ainda vivos, como
Ricardo Piglia ou a chilena Diamela Eltit. No Brasil, Nuno Ramos e
Alberto Mussa fazem trabalhos interessantssimos que se aproximam
dessa linha, mas poderia citar outros autores e outras tantas
virtudes cabveis.
J ouvi voc dizer que, medida que escrevia Procura do romance, ia
lendo trechos do livro para um grupo de quatro amigos escritores
com os quais costuma se reunir. Quem so esses eles? Voc tambm
relatou que o intercmbio de opinies e experincias promovido por
esses encontros o fazia ponderar sobre a seguinte questo: Para onde
estou levando minha literatura?. Voc j tem uma resposta?Demorei
quatro anos para escrever o livro e nesse tempo o plantel do grupo
variou um pouco, mas por ele passaram Tony Monti, Abilio Godoy,
Leandro Rodrigues, Tiago Novaes Lima, todos jovens escritores
paulistas. H entre ns mais diferenas que semelhanas, no
compartilhamos nenhum
projeto esttico especfico, mas foi pela divergncia que pudemos
pr prova nossas ideias, nossas pretenses, nossas propostas
narrativas. Foi importante submeter o livro, enquanto ainda o
elaborava, a esse crivo impiedoso; fui ganhando mais conscincia do
que fazia. Sei, portanto, para onde acabei levando a minha
literatura, mas tudo se turvou um pouco quando dei o romance por
findo, e ainda no sei bem para onde a levarei nos livros por
vir.
Num timo trecho de seu livro, uma mulher, diante do Guernica, de
Picasso, tranquiliza o filho pequeno: Es slo arte, es de mentira.
Para voc, h alguma verdade nessa afirmao?No, no h verdade alguma
nisso, uma mentira conveniente que o mundo insiste em alardear por
a. nesse princpio que reside a ideia de arte como diverso, de
literatura como entretenimento, concepes to difundidas e que acabam
por desconciliar o que vida e o que cultura. assim que hoje se quer
a literatura: um passatempo andino que nos indigne ou nos comova
por um instante nfimo, sem que se produza uma assimilao profunda,
um aguamento crtico, para que fechemos o livro e sigamos
tranquilamente com a nossa rotina. Ao escritor, creio eu, cabe
fazer uso de todos os recursos de que disponha para resistir a tudo
isso.
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 20128
Em Como funciona a fico, publicado recentemente pela Cosac
Naify, James Wood fala claramente do ritmo e, sobretudo, do
andamento da narrativa, a partir de Gustave Flaubert. Ele esmiua o
olhar do protagonista de Educao sentimental, Frdric, pioneiro
daquilo que denominamos de flneur o ocioso que vagueia pelas ruas
sem pressa, olhando, vendo, refletindo. O olhar do ocioso, pela
prpria natureza, torna
o andamento mais lento, devagar, espaado, quase parando o tempo
e se fixando, quase sempre, em ce-nrios ou personagens de muda
atividade, sem pressa, quieto, mesmo dentro de um quadro de ao
rpida, observa Wood. Est a o fundamento do flneur, umas das criaes
mais notveis de Flaubert, gnio imbatvel quando falamos na montagem
do texto. Tomemos como exemplo um trecho de Educao sentimental:A
plancie, revolta, dava uma impresso de vagas
runas. A linha das fortificaes formava uma salincia
Raimundo CARRERO
Por favor, no pise jamais no p do seu leitorCada histria tem um
ritmo certo, cabe ao escritor no atravessar a orquestra
REPRODUO/MONTAGEM: KARINA FREITAS
horizontal nos passeios de terra que ladeavam as es-tradas ,
arvorezinhas sem ramos eram defendidas por ripas eriadas de pregos.
Estabelecimentos de produtos qumicos alternavam com estncias de
madeireiros. Portes altos, como h nas fazendas, deixavam ver, pelos
batentes entreabertos, o interior de ptios ig-nbeis, cheios de
imundices, tendo a meio charcos de gua suja. Compridas tabernas cor
de sangue e bichos ostentavam altura do primeiro andar, entre as
janelas, dois estandartes. Observa-se a que o andamento bem
lento,
com muitas vrgulas, quase frase sobre frase, na verdade, uma
frase puxando a outra, com muitos, muitos detalhes. De forma que o
leitor obrigado a diminuir a marcha da leitura, tornando-a quase
parada. o tempo prprio do ocioso, que v len-tamente, e com
detalhes, s vezes desnecessrios, mas que tem tempo para a leitura,
at letra por letra. Um romance pode ter muitos andamentos, mas
MERCADOEDITORIAL
Marco Polo
Regina Carvalho (foto) est lanando seu quinto livro de poemas.
Como, alm de poetisa, tambm artista plstica, ela sempre associa de
algum modo as artes visuais sua escrita, procurando, ainda, uma
forma de personalizar cada livro (ela j chegou ao extremo de lanar
uma edio em que cada capa era feita mo, diferenciando uma da
outra). Para Azuis (Edio da Autora)
ela pediu a amigos, de vrios pases, que lhe enviassem fotos em
que predominasse a cor azul (frutas, paisagens, cenas urbanas etc).
Cada livro traz trs fotos e quem adquirir um tem o direito a
escolher mais sete. Quanto sua poesia, a matria o cotidiano, de
onde podemos colher momentos de felicidade, descoberta de enigmas
e, sobretudo, maravilhosa incerteza.
POESIA
A poetisa e artista plstica Regina Carvalho lana seu quinto
livro de poemas acompanhado de fotos
DIVULG
AO
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-
I Os originais de livros submetidos Cepe, exceto aqueles que a
Diretoria considera projetos da prpria Editora, so analisados pelo
Conselho Editorial, que delibera a partir dos seguintes
critrios:
1. Contribuio relevante cultura.
2. Sintonia com a linha editorial da Cepe, que privilegia:
a) A edio de obras inditas, escritas ou traduzidas em portugus,
com relevncia cultural nos vrios campos do conhecimento, suscetveis
de serem apreciadas pelo leitor e que preencham os seguintes
requisitos: originalidade, correo, coerncia e criatividade;
b) A reedio de obras de qualquer gnero da criao artstica ou rea
do conhecimento cientfico,
consideradas fundamentais para o patrimnio cultural;
3. O Conselho no acolhe teses ou dissertaes sem as modificaes
necessrias edio e que contemple a ampliao do universo de leitores,
visando a democratizao do conhecimento.
II Atendidos tais critrios, o Conselho emitir parecer sobre o
projeto analisado, que ser comunicado ao proponente, cabendo
diretoria da Cepe decidir sobre a publicao.
III Os textos devem ser entregues em quatro vias, em papel A4,
conforme a nova ortografia, em fonte Times New Roman, tamanho 12,
com espao de uma linha e meia, sem rasuras e contendo, quando for o
caso, ndices e bibliografias apresentados conforme as normas
tcnicas em vigor.
IV Sero rejeitados originais que atentem contra a Declarao dos
Direitos Humanos e fomentem a violncia e as diversas formas de
preconceito.
V Os originais devem ser encaminhados Presidncia da Cepe, para o
endereo indicado a seguir, sob registro de correio ou protocolo,
acompanhados de correspondncia do autor, na qual informar seu
currculo resumido e endereo para contato.
VI Os originais apresentados para anlise no sero devolvidos.
Companhia Editora de PernambucoPresidncia (originais para
anlise)Rua Coelho Leite, 530 Santo AmaroCEP 50100-140Recife -
Pernambuco
CRITRIOS PARA RECEBIMENTO E APRECIAO DE ORIGINAIS PELO CONSELHO
EDITORIAL
A Cepe - Companhia Editora de Pernambuco informa:
O jornalista e poeta Robson Sampaio publicou o livro Arrecifes
(Edio do Autor, 2011), que completa a trilogia formada por O Recife
& Outros poemas (Companhia Editora de Pernambuco, 2007) e Eu
sou Capibaribe (Instituto Maximiano Campos/Edies Bagao, 2009). Como
os ttulos deixam ver, a capital de Pernambuco seu principal tema.
Seus poemas so crnicas da cidade, que sintetiza no verso O Recife
um estado de ser...
O romance Rolide, do escritor pernambucano Homero Fonseca, j est
venda nas livrarias digitais. O e-book (livro digital) est no
formato ePub, o mais aceito nos variados aparelhos onde se pode ler
livros digitais, dos eReaders (Nook, Sony Reader, Alpha e outros)
aos Smartphones, do iPad ao iPhone, passando ainda pelos PCs
(computadores pessoais).
URBANO
Robson Sampaio termina trilogia sobre o Recife
E-BOOK
Romance Rolide, do escritor pernambucano Homero Fonseca, j est
sendo vendido em formato digital
Por enquanto s no acessvel no Kindle, que exige o formato Mobi,
exclusivo da Amazon. Os livros podem ser comprados on line nos
seguintes endereos: Saraiva (www.livrariasaraiva.com.br), Cultura
(www.livrariacultura.com.br), Curitiba
(www.livrariascuritiba.com.br), Copia (Submarino),
(submarino.thecopia.com/home/index.html), Livraria Abril
(www.iba.com.br), Positivo (livros.mundopositivo.com.br).
apenas um ritmo. O ideal que o autor altere os andamentos de
acordo com o sentimento da cena; triste, mais triste, alegre, mais
alegre. Mexendo assim com o ritmo psicolgico do leitor.James Wood
chega a indicar compassos na mu-
dana de andamento, mas no sei at onde o escri-tor est preparado
para isso, nem se necessrio ser assim to rigoroso. Basta que se
arme o ritmo mentalmente, usando-se, sempre que possvel, vrgulas,
ponto e vrgulas, pontos, comentrios, travesses, digresses, cortes,
elipses ou avanos, sempre de acordo com a mudana de andamento. Se
algum disser ao autor ou at mesmo ao leitor que o compasso 3/1 ou
ternrio, possvel que no se obtenha resultado algum; mas se pedir
uma valsa, ento ser atendido prontamente; se 2/4 um compasso comum;
pede-se, porm, um ritmo de bolero, de uma cano, e o problema estar
solucionado. Mas ateno: tudo depende do per-
sonagem a quem se entrega a narrativa. Se o autor conhece bem o
personagem, ento conhece bem o compasso. Nada de extremamente
complicado nem difcil. O autor sempre saber que ritmo ou que
andamento quer seguir.James Wood volta a falar em Flaubert e sua
Madame
Bovary, referindo-se famosa cena do jantar em casa do Conde, que
prepara Emma para a vida dissoluta que ela levar ao longo do livro.
A cena, que se revela metafrica, uma das mais belas e mais
reveladoras do texto flaubertiano: Na extremidade da mesa, so-zinho
entre todas aquelas mulheres , curvado sobre seu prato cheio e com
o guardanapo preso s costas feito uma criana, um ancio comia,
deixando cair da boca gotas de molho. Tinha os olhos congestionados
e trazia os cabelos presos na nuca, por uma fita preta. Era o sogro
do velho marqus, o antigo favorito do conde de Artois ao tempo das
caadas de Vadreuil, na residncia de Conflans e que fora, dizia-se,
de Maria Antonieta , entre os srs. De Coigny e de Lauzun. Levara
uma ruidosa vida de dissipao, cheia de duelos, de apostas, de
mulheres raptadas, devorara sua fortuna e preocupara toda
famlia.Percebe-se, claramente, que os detalhes so bem
selecionados pelo olhar que, no entanto, no perde a capacidade
de refletir, sobretudo nas ltimas linhas, o que leva a imaginar que
se trata, tambm, de algo metafrico, onde Emma pode vislumbrar seu
prprio futuro, naquele instante em que ela ainda ansiedade e
desejo. Portanto, este pode ser classificado de um caso para se
detalhar e esque-matizar, para recorrer, num captulo de passagem.
Ou seja, aquele captulo que prepara o leitor para o destino
narrativo que se segue.Para aperfeioar a tcnica, o autor pode
recorrer ao
desenho, como era o caso de rico Verssimo, e no procurar
detalhes de ltima hora. Pode usar os detalhes numa segunda verso e
s ento dar o texto por encer-rado. preciso esquematizar e no apenas
improvisar. A criao pede vrios caminhos. Faa vrios estudos e vrias
verses. De forma a passar ao olhar do persona-gem a voz que seria
do narrador onisciente. No Brasil, a tcnica do olhar e da voz do
personagem/narrador substituindo o narrador onisciente muito bem
usada por Cristovo Tezza, sobretudo em Beatriz,seu livro de contos,
publicado pela Record. Exemplo:Ele to fofinho, Arminda pensou ( e
os estudantes
olharam para mim, como a avaliar se deviam mesmo acreditar no
que eu dizia, esse velho e superado nar-rador onisciente, quem
acredito nisso? A palestra prxima do final, a voz sumindo), mas
temeu confessar em voz alta; o marido compreende o que ela quer
dizer claro, mas h limites um bom silncio vale ouro. claro que o
autor pode e deve escrever como lhe
parecer mais conveniente. Mas no custa lembrar que ritmo e
harmonia sempre foram destaques especiais do estudo da esttica.
Nessa aula estu-damos ritmo e andamento, mas, lembrando o dito
popular, sem perder a harmonia.
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O sentimento que s Benjamin traduziu
Paulo Carvalho
A expresso Trauespiel continua desafiando os especialistas e
crticos
Walter Benjamin (1892-1940) est em trs linhas da Histria da
literatura ocidental, de Otto Maria Carpeaux (1900 1978), que
ganhou recentemente nova edio pela Editora Leya: Walter Benjamin,
mais crtico da cultura que da literatura, desenterrou o teatro
barroco alemo e escreveu excelentes ensaios sobre Baudelaire, Gide,
Kafka, Brecht e Dblin (a edio da obra de Carpeaux comeou em 1959,
mesmo ano em que se inicia a traduo do pensador alemo para um
segundo idioma, o francs). So trs linhas ainda frescas porque
Benjamin, mais crtico da cultura que da literatura, continua a
desenterrar o barroco. Continua a reafirmar-se como o primeiro
crtico de literatura alem.Desenterra o barroco pela primeira vez em
sua
obra mais complexa, Origem do drama barroco alemo (de 1925,
publicado em 1928 e a partir de agora re-ferida como ODBA), tese de
livre-docncia rejeitada pela Universidade Frankfurt. A banca, da
qual fazia
parte Franz Schultz, professor de germanstica que havia sugerido
o tema a Benjamin, no entendeu a ambiguidade do meio milho de
citaes sobre a forma do Trauerspiel (expresso que j foi traduzida
de inmeras formas: drama barroco alemo, na traduo de Srgio Paulo
Rouanet, publicada em 1984; ou drama trgico, como sugere a traduo
do portugus Joo Barrento, de 2004, publicada s agora no Brasil pela
editora Autntica. No ttulo do tradutor portugus, temos: Origem do
drama trgico alemo).Como afirma Hanna Arendt em Homens em
tempos
sombrios, o barroco nunca esteve realmente vivo na Alemanha e,
nesse sentido, contava para o estranha-mento causado pela ODBA a
admisso por Benjamin de que o passado s falava diretamente atravs
de coisas que no haviam se transmitido. Uma forma morta (ou que
nunca esteve viva), mas em cujos textos o filsofo localizou a
potncia de dar a ver no tempo no qual nasceram, o tempo que os
conhece.
CAPA
PEDRO MELO
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 201211
No drama barroco, o alemo encontrou a origem de prticas polticas
de seu tempo sombrio e, como um pssaro anunciando mudana nos ares,
torceu a teoria da soberania de Carl Schmitt para colecionar os
sinais que pragmaticamente interpretou to mal ao custo da prpria
vida.Benjamin viu, no Trauerspiel, alegoria e melanco-
lia: um drama que representava uma queda sem sada, que no
pretendia distrair, nem consolar, em que o essencial e o acessrio
se confundiam, a agitao poltica no era escatolgica, e a linguagem
se tornava violenta e cifrada para acompanhar os acontecimentos.
Citando a observao do escritor J. M. Coetzee a respeito da
originalidade do filsofo, Benjamin tambm havia compreendido que a
poltica apresentada como um teatro grandioso, e no como discurso e
debate, no se limitava a explicar o fascnio do fascismo, mas era o
fascismo em essncia. O barroco era ento uma atual encenao de
personagens deriva no palco, a caminho de uma catstrofe melanclica,
que s poderia ser contornada (e talvez por isso s pudesse ser
intensificada) pelo estado de exceo.Autora de ttulos como
Benjaminianas: cultura capitalista
e fetichismo contemporneo e O iluminismo visionrio: Benja-min,
leitor de Descartes e Kant, Olgria Matos sugere que o drama barroco
est repleto de fantasmas. Diferente da tragdia antiga, neste novo
mundo no existem solues definitivas: os homens, como os homens do
tempo de Benjamin, aparecem dominados pelo mundo das coisas, onde
os xitos so transitrios e as catstrofes, a regra.Quando uma obra de
pensamento forte, ela
permanece no tempo porque ela desafia a vida do esprito. Ela
continua a ser reaberta e a ser reinter-pretada porque cada perodo
encontra nas obras a sua inteligibilidade interna. Imagine uma obra
que no foi entendida, foi recusada pela academia, que foi a maior
obra jamais escrita sobre o barroco e at
hoje continua causando espanto, por seu mtodo, por parecer
heterclita. Na ODBA, Benjamin trabalha em vrios registros literrio,
poltico, histrico, dra-matrgico e filosfico. Mas uma obra que no
tem nada de ecletismo: o que h a busca de afinidades, e as
afinidades no reconhecem uma relao causal entre os enunciados. Por
isso o mtodo de Benjamin um mtodo se fazer do pensamento. Isto , o
pen-samento se fazendo, precisou se valer da literatura, precisou
ir s artes, precisou ir medicina, precisou falar do Expressionismo,
precisou falar da poltica, observa Olgria em entrevista ao
Pernambuco.Michael Lwy, brasileiro radicado na Frana, pes-
quisador do Centre National de la Recherche Scientifique, tambm
lembra que o custo da preservao da ODBA caiu, em primeiro lugar,
sobre a vida do prprio Benjamin. Ela custou-lhe a carreira
universitria. Ao recusar essa obra, a Universidade de Frankfurt
cortou pela raiz a possibilidade de ele fazer uma carreira na
universidade e isso o empurrou para a vocao de crtico literrio, que
ele assumiu, com muita dedi-cao. O itinerrio intelectual e pessoal
de Benjamin resultou um pouco desse fracasso acadmico da ODBA, o
que se deve ao fato de o livro ter um carter, digamos, esotrico em
particular em seu prefcio, que muito hermtico, difcil de entender.
Por isso o jri da Universidade de Frankfurt declarou: J que ns no
entendemos, nos recusamos a julgar a tese. A indeciso dos monarcas,
a servilidade dos corte-ses so coisas atuais, muito evidentes na
Europa de hoje, mas eu pessoalmente no acho que a ODBA seja um dos
livros mais atuais de Benjamin. Sem dvida em outros trabalhos
podemos encontrar melhor essas constelaes entre o presente que
vivemos hoje e o presente do drama barroco, a exemplo das Teses
sobre o conceito de histria (1940). Lwy autor de Walter Benjamin
Aviso de incndio.A ODBA foi baseada numa ousada teoria neopla-
tnica das formas literrias, ia contra as regras da
academia, deve ser considerado como um dos textos mais radicais
e um dos frutos mais inteligentes da cultura europeia da primeira
metade do sculo 20. o que acena Mrcio Seligmann-Silva, profes-sor
livre-docente de Teoria Literria na Unicamp, autor de ttulos como A
atualidade de Walter Benjamin e de Theodor W. Adorno e Ler o livro
do mundo. Como para mim Benjamin tem uma grande atualidade, o mesmo
vale para essa obra. Ela pode ser pensada como nossa contempornea
em vrios sentidos. Por seu mtodo, que transdisciplinar, une
filosofia, histria da arte, teoria poltica e teoria literria, de um
modo original e muito inspirador.Tambm pelas temticas abordadas,
continua
Seligmann-Silva em entrevista para o Pernambuco, esse ensaio
atual, como a teoria da soberania, da melancolia, da alegoria, do
barroco, da tragdia: todos esses conceitos ainda possuem um grande
valor e isso no apenas para a reflexo esttica. Podemos pensar a
atual crise da modernidade (ou da ps-modernidade, como alguns
preferem chamar) utilizando esses con-ceitos. Para Benjamin, o
mundo da alegoria barroca tem como sua fora centrpeta a referida
fidelidade aos objetos do melanclico e alegorista, que colecio-na
as runas do mundo. J em Baudelaire, no sculo 19, Benjamin
identifica um gesto semelhante, o do trapeiro que rene e investe de
sentido aquilo que a sociedade joga fora, transformando o lixo em
seu tesouro. Essa dialtica entre o resto, o que sobra e descartado
e, por outro lado, a sua transformao em tesouro, central, como um
procedimento heurstico onipresente na obra de Benjamin. O prprio
drama barroco alemo era uma espcie de resto, j que era um gnero
desprezado pela historiografia literria. Benjamin soube extrair
dessas obras esquecidas poderosos insights que at hoje iluminam a
crtica cultural. interessante perceber que apesar de ter elegido
dois temas eminentemente germansticos em seu doutorado e tambm em
sua livre-docncia,
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 20121212
CAPA
contemplativa, de inrcia, a atitude do corteso que simplesmente
se adapta aos poderosos. Esse um tema que Benjamin trata na ODBA,
mas de uma forma histrica, acadmica, porque devemos lembrar: foi um
livro escrito em um perodo em que Benjamin no havia descoberto o
marxismo. uma problemtica um pouco metafsica, teolgica e literria,
que bastante impressionante, mas que no chega a ter realmente uma
expresso poltica mais contundente. com a descoberta do marxismo,
que se d logo em seguida, que Benjamin vai repensar essa e outras
questes, e reformul-las em outros termos. A questo da acdia volta
nas Teses sobre o conceito de histria. O tema aparece para designar
o equivalente moderno do corteso que o historiador conformista,
responsvel pelo historicismo que apenas repete e reproduz a histria
dos vencedores, acena Lwy.Segundo Mrcio Seligmann-Silva, para quem
a
comparao dessa acdia com o conceito de tdio profundo, de
Heidegger, no seria vlida, Benjamin tambm falava criticamente de
uma melancolia de esquerda. Por outro lado, sua anlise da
melancolia no seu livro sobre o drama barroco alemo deixa pa-tente
que ele percebia uma relao entre esse estado anmico e a fidelidade
ao mundo das coisas. Essa fidelidade essencial para se entender o
universo do prprio Benjamin, ele mesmo um grande coleciona-dor e
algum com muitos traos do melanclico. No gostaria de aplicar o
termo tdio profundo para essa
melancolia, j que no se trata aqui de tdio nem de algo profundo.
Pelo contrrio, o melanclico se apega materialidade do mundo, sua
superfcie desprovida de toda transcendncia. Isso no tem nada a ver
com a neometafsica heideggeriana. Benjamin tambm opunha o tempo
mtico (da repetio, no qual no existe experincia), que caracteriza
os personagens de Kafka, ao tempo messinico, que surge em Benjamin
como uma interrupo absoluta, um tempo do agora (Jetztzeit). J o
soberano barroco, que Benjamin carac-teriza como figura paradoxal
que ao mesmo tempo decide o estado de exceo e um incapaz de tomar
decises, permite introduzir na teoria poltica um ponto de vista que
coloca de ponta-cabea a teoria do decisionismo de Carl Schmitt. Ao
invs do soberano absoluto e autossuficiente, vemos em Benjamin a
figura de um indeciso, vtima das intrigas de sua corte.Na leitura
de Tereza Callado, Benjamin reconceitua,
com base nas alegorias do Trauerspiel, a melancolia que aparece
como taedium vitae entre os medievais. A tona-lidade afetiva do
melanclico no s inao ou ao de repetio, mas algo que desativa o
tempo, suspende o ato: espera o pensamento fazer seu trabalho
paciente. O filsofo observa nela a criatividade para dilatar a
percepo sobre a realidade. Desse modo, a torna criativa; do mesmo
modo, a poesia spleen de Baude-laire, originada no tdio, capaz de
denunciar o status quo, que na modernidade consiste no tempo
infernal da repetio. Nos dois casos, o olhar que tenta digerir
Ao invs de soberano e autossuficiente, vemos em Benjamin um
indeciso, uma vtima de intrigas da sua corte
ou seja, nos ensaios sobre o romantismo e o barroco alemes, em
nenhum momento Benjamin sucum-biu ao pensamento nacionalista. Pelo
contrrio, ele desenvolve abordagens que desmontam a postura
nacionalista que enaltece as grandes obras nacionais como um
patrimnio intocvel que merece apenas venerao. Da Benjamin se sentir
livre para resgatar um gnero como o drama barroco alemo que, por
seu elemento grotesco, no facilitava uma leitura nacionalista e
ufanista. Benjamin vai justamente enfatizar esse aspecto grotesco
do barroco alemo.De acordo com Tereza Callado, professora de
Fi-
losofia da Universidade Estadual do Cear, organi-zadora do
Encontro Internacional Walter Benjamin e editora dos Cadernos
Walter Benjamin (www.gewebe.com.br/cadernos.htm), o drama barroco
se diferencia da tragdia clssica, entre outros aspectos, pela
natu-reza noturna da narrativa e pela negativa da sntese (Benjamin
rejeita a dialtica idealista hegeliana). O drama barroco noturno, e
concebido tempo-ralmente num sentido figurado, parasitrio, onde o
mal se configura investido de um poder soteriolgico, inexplicvel,
construdo de uma ideologia fechada, que se transforma em causa, na
ptica de Benjamin, de todo o sofrimento no mundo, onde os limites
esto fundidos aos da morte. esse o motivo pelo qual Benjamin exclui
a sntese. O Trauerspiel a construiu de forma dramtica. Para o
filsofo, a sntese concreta e paralisa o pensamento. Ao se
concretizar no mundo e isso vai acontecer quando ela se personifica
em uma ideologia , so excludos todos aqueles que se posicionaram
avessos a ela. Foi o que aconteceu ao regime da cortina de ferro,
ao totalitarismo nazista, s ditaduras da Amrica Latina e a por
diante, at s ortodoxias religiosas... como estamos assistindo nos
fundamentalismos. Em suma, o sistema fechado causa de sofrimento.
Ao contrrio, a leitura aberta da histria possibilita a felicidade.
E no estado de in-definio em que vivemos atualmente, com a
morte
da crtica, perigoso se tender para o lado da sntese. Ela
possibilita a tragdia. Para o que Benjamin nos acena? A histria
precisaria permanecer aberta, para que seja possvel se educar para
a deciso, na ao poltica compreendida lato sensu, acredito. Por isso
Benjamin viu no Trauerspiel o drama barroco e no a tragdia,
desfiada pelo destino. Trauerspiel o drama da existncia, que inclui
o conflito, a tenso, e da o aspecto lutuoso, sem deixar de ser
Spiel artifcio, jogo, para alm do luto, a partir da deciso.
A ACDIA O drama barroco fala da ausncia de referncia em um mundo
sem Deus, falta de transcendncia que pe em xeque a capacidade de
deciso dos soberanos. O monarca do drama barroco no capaz de
decidir: a prolixidade dos seus pensamentos faz a ao se con-verter
em inao. O tirano tem ao mesmo tempo poder e medo, intrigas e
traies encontram seu palco na histria convertida em um tempo
interminavelmente longo e as aes se tornam gratuitas em um mundo e
em vidas desprezadas pelo tdio. Da que a melancolia seja um tema
central da ODBA.Mas a questo da acdia se refere no s ao
monarca,
mas tambm ao oportunismo espiritual do corteso. O corteso no
qual essa preguia melanclica do esprito serve de pretexto para
acompanhar o poder. Servir de eco, de sombra ao poder. Servir
simplesmente como uma cauda ao poder real, monrquico. Essa
atitude
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 201213
a realidade com o Grbeln (o ruminar reflexivo) com o objetivo de
vislumbrar sadas, mesmo labirnticas, possibilitado pelo estado de
nimo que acomete o melanclico, aquele que est sob o signo de
Saturno. No sentimento de insatisfao e rejeio diante do mesmo
fenmeno na sua pr e ps-histria (aqui me refiro incapacidade de
decidir do prncipe barroco que causa a vertigem, que tambm a
vertigem da existncia na metrpole), o mtodo do desvio desvela a
inexorabilidade da Verhngnis (fatalidade) que aco-mete o homem
barroco (quando o mundo se torna vazio de sentido), tanto quanto
aquele que debrua seu olhar sobre a vitrine.A diluio de sentido do
objeto antigo a mesma,
continua Tereza. L, o esvaziamento do sentido desencadeado pelo
rigor da moral luterana, que previne o cristo contra os artifcios
da indulgncia plenria (recompensa pela ao caridosa). Essa nova
mentalidade se alastra, tinge tudo e a todos de melancolia,
sobretudo os grandes, aqueles que tem que decidir, como o prncipe
barroco. Ali, a fatalidade vem aliada injustia, aos jogos de poder
alcanados pela ambio e o egosmo e constroem um conceito de histria
para a poca histria naturalizada. Es-sas relaes de fora so
desencadeadas como uma avalanche sobre o homem.Aqui entra, no
conceito de estado de exceo
expediente poltico sugerido pelo direito cons-titucional da
poca, a digresso feita por Benjamin
contra a teoria da soberania vigente no absolutismo barroco. O
monarca que o responsvel absolu-to pela salvaguarda do seu povo
coagido pelas contingncias do conflito civil religioso, gerado pela
reforma luterana, a interferir nessa situao delicada por se tratar
de uma disputa de irmos na mesma crena, ento dividida em moral
catlica e moral luterana. Seja utilizando a imparcialidade, o
conformismo, seja a apateia medieval aconselhada como recurso
contra o pecado da vanitas, o Estadista no consegue contornar o
conflito, embora impe-riosa seja a contingncia a exigir uma
deciso.Nesse impasse, aponta ainda a professora de filo-
sofia, agua-se a percepo da fragilidade da insgnia real,
descoberta na solido do soberano. Na tragdia dos antigos, dipo
tambm descobre sozinho o peso do destino, mas enquanto dipo se
pereniza como heri, o drama barroco no conhece personagens, nem
escatologia. As figuraes esto sob a ordem de um destino que a
condio de mortal, a ser expiada por todos. O cenrio o da
naturalizao da histria, onde a physis, ao invs de definir a
harmonia pr--estabelecida no cosmos, na percepo dos antigos, tende
ao decadente, ao precrio. Esse dado dispensa a necessidade de uma
culpa. Assim todos so mani-pulados, seja pelas leis de ferro da
natureza, a morte, seja pela histria, na verdade histria do poder,
e a os papis se alternam, se invertem. Nessa dialtica na
imobilidade (com a qual Benjamin rejeita a dia-
ltica idealista hegeliana) tanto o soberano conhece a
superioridade do bufo em desarticular por um instante a sua
tristeza, como o fiel conselheiro ir fazer o papel de conspirador,
traindo o prncipe por apatia. da natureza do drama barroco, na
fixidez da sua forma, que nenhum dos personagens exiba o menor
sopro de ideal revolucionrio. No h tragdia, pois todo conflito se
enquadra nas leis dilatadas da calculabilidade da criatura, onde a
histria con-cebida dessa forma.Benjamin desenterra com a ODBA no s
um gnero
que sequer esteve vivo, mas a atualidade intensiva de Benjamin,
um modo de pensar que funda outra noo de atual sob a ideia que a
felicidade, sempre tocada pela nostalgia, reabre o passado
atualidade que faz de Benjamin mais do que belos livros de Walter
Benjamin uso aqui, para concluir, a perti-nente expresso de
Jeanne-Marie Gagnebin em seu ensaio para Pensamento alemo no sculo
XX, em crtica glamourizao do pensador. Desenterramos com a ODBA,
enfim, a fora da alegoria, do no compreen-dido, do recalcado,
sempre pronto para apontar para o nosso prprio sculo aquilo que ele
tem de mais fantasmtico, conspiratrio e lutuoso. O que nele se
dissimula por afasia, inapetncia, falta de gosto e deciso, sintomas
de nossa total, ou quase total, submisso ordem das coisas.
Paulo Carvalho mestre em Comunicao Social
PEDRO MELO
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 20121414
CAPA
Trs anotaes para voc lercom BenjaminAlgumas possibilidades para
o leitor compreender todo o prazer do texto benjaminiano Manoel
Ricardo de Lima
ANOTAO 1.Ler o que Walter Benjamin nos deixou como legado de
pensamento , de certa maneira, incorporar a di-menso de sua escrita
que se compe a partir do uso do fragmento e, principalmente, de um
conhecimento de arquivista elaborado a partir da montagem. Ele ,
talvez, o pensador moderno par excellence; aquele que desfia o
problema da alegoria do drama barroco at o livro sobre Charles
Baudelaire e a modernidade armando o tempo inteiro uma disparidade
entre as modificaes da linguagem e o que isto implica sobre as
condies de vida do homem. Uma reflexo propositiva do homem e da
arte no centro nervoso da experincia circular do sistema de produo
do capital; reflexo que vai, por exemplo, do teatro de Bertolt
Brecht literatura de Franz Kafka, passando pela memria involuntria
de Marcel Proust e pelos impasses das narrativas de Robert Walser.
As esco-lhas que Benjamin fez, naquele momento, comeo do sculo 20,
no eram to bvias. A sua prtica de pensamento tem a ver diretamente
com essas escolhas que fez a partir de um uso deflagrado da ateno;
no toa seus textos no comportam qualquer resulta-do conclusivo, ao
contrrio, sugerem a constituio abissal do paradoxo naquilo que ele
passa a chamar de imagem dialtica. O enfrentamento e o prazer de
ler Benjamin se do
diretamente a, com os usos da imagem dialtica que elaborou para
pensar e repensar a lgica impositiva
da histria e da modernidade, entre a autonomia e o aparelho
burgus, ou seja, da luta de classes para uma luta das imagens. Os
exemplos so inmeros e esto espalhados por toda a sua obra, mas um
bom caminho e comeo a um leitor mais desavisado so os fragmentos de
Rua de mo nica; estes fragmen-tos compem uma espcie de srie
armazenada de fotogramas da memria e se organizam atravs do
registro e das lacunas do registro num fluxo cont-nuo de escrita
que, por sua vez, impe o fluxo de percepo da operao crtica do
Benjamin leitor de semelhanas imateriais. Num desses fragmentos,
pois, intitulado Viagem atravs da inflao alem, a certa altura, ele
anota: as pessoas s tem em mente o mais estreito interesse privado
quando agem, mas ao mesmo tempo so determinadas mais que nunca em
seu comportamento pelos instintos da massa. E mais que nunca os
instintos da massa se tornaram desatinados e alheios vida. O crtico
cultural Ral Antelo nos lembra que Ben-
jamin j propunha, para ler a poesia de Charles Bau-delaire, que
a vida moderna ou seja, a modernidade o fundo das imagens
dialticas, logo paradoxais e tambm, ao mesmo tempo e
principalmente, am-bivalentes; em Baudelaire, disse Benjamin, h um
confronto da vida moderna como havia um confronto entre o sculo 17
com a antiguidade. E isto no seno uma luta das imagens que recoloca
outro olhar sobre a histria, talvez o do significante vazio, do sem
sentido,
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 201215
da ausncia, da falta etc. Para Ral Antelo, Benjamin nos faz, por
exemplo, revisar tambm as contradies de Baudelaire, porque fato
sabemos Baudelaire no fala em nenhum momento da arte moderna, mas
sim da vida moderna.
ANOTAO 2.H um pequeno texto de Walter Benjamin, de 1933,
intitulado Experincia e pobreza, em que se l acerca do
desenvolvimento da tcnica sobrepondo-se ao ho-mem e o que o
singulariza: a experincia. O famoso e conhecido e despedaado texto
A obra de arte na era da reproduo tcnica, que vincularia de vez o
pensamento de Benjamin a esta problemtica, de 1935/36, dois anos
depois. Neste ensaio, ele afirma que Todos os esforos no sentido de
tornar esttica a poltica cul-minaro em uma s coisa: guerra..
Ficamos diante daquilo que Susan Buck-Morss leria em Benjamin como
anesttica, quando remete s preocupaes dele de pensar a modernidade
a partir da introduo definitiva da esttica na vida poltica. Ela
ainda diz que a partir de uma anesttica que estabelecemos um gozo
narcsico com a viso de nossa prpria destruio. E a modernidade que
Benjamin leu parece se colocar a, num engendramento entre
experincia esttica e experincia histrica, o que ele entende muito
bem e com sofisticao. Para ele, a vida moderna que est em jogo numa
condio mltipla que vai da banalida-de ao fazer diante do horror ,
arte tal qual a vida.
Mas ler Benjamin , principalmente, segundo sua prpria lio, ler o
que nunca foi escrito. E aqui no se trata de uma entrelinha, um
espao em branco ou algo parecido, mas, muito mais, uma armadilha
das imagens do pensamento que armam possibilidades de outras
constelaes de sentidos para que, assim, se possa mover outras
perspectivas e outras lembranas do presente. A questo, para ele, o
tempo histrico em geral que se d a partir de um encontro dos
tem-pos, numa espcie de coliso de um presente ativo com seu passado
reminiscente, como bem lembra o pensador francs Didi-Huberman. Por
isso que a constatao, naquele texto, de que os
homens voltam da guerra absolutamente silenciosos, logo muito
mais pobres em experincias comunic-veis, coloca em xeque exatamente
este limiar ambi-valente de enfrentamento prprio da modernidade
diante do tempo histrico: a potica e a tcnica. Um vetor , para
Benjamin, a guerra de trincheiras, de sabotagem, porque nunca houve
experincias mais radicalmente desmoralizadas que a experincia
es-tratgica pela guerra de trincheiras, a experincia econmica pela
inflao, a experincia do corpo pela fome, a experincia moral pelos
governantes. O que surge diante desse espetculo de emudecimento em
que a troca de experincias no mais possvel, em que a experincia se
empobrece sobrepujada pela tcnica e se abre sobre a humanidade ,
diz ele, uma nova barbrie. E a pergunta que vem : qual o valor
de todo o nosso patrimnio cultural, se a experincia no mais o
vincula a ns? Alguns anos depois, em 1940, Benjamin escreveu
um documento intitulado Sobre o conceito de histria. Logo
depois, tentava escapar de uma Frana que denunciava Gestapo os
refugiados judeus e, em 26 de setembro deste ano, em Port-Bou, na
fronteira espanhola, opta pelo suicdio. O documento se compe de 18
teses e dois apndices. Texto marcadamente denso, sempre olhado como
leitura difcil por causa da variao de sugestes entre as proposies
marxistas do mate-rialismo histrico e da teologia judaica. Como
lembra Michel Lwy, h nessas teses uma srie de questes fundamentais
acerca do progresso, da religio, da histria, da utopia, da poltica
etc. E nenhum leitor que se preze pode passar inclume por elas. Da
Tese 4, por exemplo, quando expande a imagem da pre-ciso marxista
de que o nico real possvel a luta de classes ao dizer que A luta de
classes, que um histo-riador educado por Marx jamais perde de
vista, uma luta pelas coisas brutas e materiais, sem as quais no
existem as refinadas e espirituais., ou da Tese 7, que conversa
diretamente com o texto de 1933, ao indicar que preciso fazer um
revs da histria em direo ao vencido, que o historiador sempre
dirige sua empatia ao vencedor, que, por sua vez, beneficia o
dominador; nesta relao refeita, d-se a ver os despojos a que
chamamos de bens culturais. E a articulao entre os textos se
remonta numa reviso tambm de nossa experincia moderna: Nunca houve
um monumento da cultura que no fosse tambm um monumento da barbrie.
A tarefa radical do materialista histrico, para Benjamin, escovar a
histria a contrapelo.
ANOTAO 3.Num fragmento de suas Imagens do pensamento intitu-lado
Desempacotando minha biblioteca, Benjamin escreve: Estou
desempacotando a minha biblioteca. Sim, estou. Os livros, portanto,
ainda no esto nas es-tantes; o suave tdio da ordem ainda no os
envolve. Tampouco posso passar ao longo de suas fileiras para, na
presena de ouvintes amigos, revist-los. Ler Benjamin um pouco
provocar-se nessa revisitao do pensamento da modernidade, porque
para enten-der como se estabelece o seu fluxo de pensamento h que
se ler antes o que ele toma como tarefa poltica que, no caso desse
texto, aparece em direo cole-o, ao colecionador, como um princpio
tambm da modernidade. Desempacotar os livros que formam o
pensamento do sculo 20 , de alguma maneira, mesmo sem querer, tocar
em Benjamin exatamente no movimento de seu pensamento, por causa da
zona limite em que se colocava. Joo Barrento, crtico portugus e
tradutor de Walter Benjamin, quem aponta esta zona, sempre fora do
cnone, entre modos novos de pensar. A grande tenso do pensamento
dele est no choque entre o messianismo judaico e o materialismo
histrico, que ele conjugou como ningum mais fez., pois, a existncia
do colecionador que impe,
para Benjamin, a sugesto de uma imagem dialtica entre a ordem e
a desordem ao observar o pequeno, o trivial. O colecionador de
livros, por exemplo, o que se entorpece com uma memria involuntria
que cada livro contm, uma espcie de memria mgica, a partir da
excitao da compra: o lugar, o preo, a ci-dade, a lngua, os entornos
etc. O colecionador , para Benjamin, uma figura mgica, capaz de
fazer magia, porque so fisionomistas do mundo dos objetos e por
isso se tornam intrpretes do destino.Ler Benjamin hoje pode parecer
uma escolha um
tanto bvia, ainda mais se lido sempre na mesma clave, com
pouqussima deriva e numa espcie de plano fechado que impede
projetar a leitura sobre o que nunca foi escrito. Ler Benjamin, com
algum prazer e proposio do poltico, tem a ver direta-mente com uma
procura para cumprir tambm, com ele, a figurao do colecionador;
assim, a partir da, se pode armar outras sries mais tensas e mais
heterogneas, se pode armar outras constelaes absolutamente dspares;
e isto seria de fato, me parece, uma tarefa mais prxima do que ele
prope. Ler com Benjamin ler o presente sem perder de vista que
estamos o tempo inteiro tentando ler o futuro diante de uma
pergunta: o que ainda nos cabe como imagem crtica?
Manoel Ricardo de Lima poeta e professor de literatu-ra da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.
PEDRO MELO
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 201216
PERFIL
Como montar uma armadilha para os amantes O novo livro da poeta
Ana Martins Marques rediscute a linguagem tpica amorosaGianni Paula
de Melo
Apesar da familiaridade com os textos poticos e do hbito da
escrita, o seu primeiro livro s ficou pronto em 2009, pela editora
Scriptum. Vida submarina foi impulsionado por acontecimentos
ocorridos nos anos anteriores. Em 2007, a mineira ganhou o Pr-mio
Cidade de Belo Horizonte, em uma categoria de autores estreantes.
No ano seguinte, venceu o mes-mo concurso, mas, desta vez, na
categoria poesia. Essas premiaes foram muito importantes para mim,
que estava s voltas com uma grande insegu-rana em relao quilo que
escrevia, comenta. Seu trabalho, no entanto, no fruto de uma rotina
da escrita, na qual a poesia tem seu horrio reservado no quadro das
obrigaes. A criao potica , an-tes, o resultado de uma ateno sensvel
ao mundo. Nesse sentido, Ana Martins alterna perodos em que escreve
diariamente com longos intervalos em que no escreve nada: Vou
anotando ideias, imagens, palavras; e espero, descreve. Para ela,
assim como para tantos outros, a escrita demanda recolhimento,
solido. Kafka, um dos seus ficcionistas preferidos, dissera outrora
que para escrever, nem a noite su-ficientemente noturna, imagem que
ela faz questo de recuperar quando reflete sobre essa exigncia de
apartamento e clandestinidade.Participar dos concursos, em 2007 e
2008, cola-
borou para que as suas poesias em repouso fizes-sem contato com
o mundo; j o reconhecimento, a partir dos prmios, revelou que o
Outro tambm se movimentava em direo aos textos de Ana. O lanamento
e a repercusso de seu segundo livro, Da arte das armadilhas,
tiveram um papel importante na sua afirmao como escritora
contempornea. O convite da Companhia das Letras para realiz-lo
chegou em 2010 e, desta vez, o resultado foi uma obra mais enxuta e
bem articulada. O ttulo surgiu no meio do processo de elaborao do
livro, a partir da conversa com um amigo antroplogo. Achei que a
imagem da armadilha poderia funcionar como ele-mento articulador
dos poemas, explica a escritora. A metfora sugerida pelo ttulo,
alis, tambm
serve como ponte entre os temas citados inicialmen-te. Pois a
linguagem sem cessar arma armadilhas. Pois o amor sem cessar arma
armadilhas. Quando escrevemos, partimos caa de palavras, mas nos
damos conta, rapidamente, de que somos ns as presas; acho que isso
tambm acontece, frequente-
Em uma poesia chamada Trapzio, a mineira Ana Martins Marques
categrica: todos os poemas so de amor. Ns, leitores, estamos
autorizados a discor-dar ou desconfiar, mas inegvel que, aos nossos
ps, aparece constantemente uma ponte que vai do amor linguagem e
retorna da linguagem ao amor. Na poesia de Ana Martins, percorremos
esse trajeto continuamente, movimentos feitos em direo ao Outro.
Afinal, no a ele que dedico meu amor? No a ele que se destina o que
escrevo? O que intentamos, no exerccio amoroso e no exerccio da
linguagem, seno, como disse a prpria escritora, um espao comum de
compartilhamento e convivncia? Ela faz questo de lembrar Paul
Celan, que diz que o poema como uma garrafa lanada ao mar,
aban-donada esperana de poder um dia ser recolhida numa praia
qualquer. E, afinal, no estamos todos ns abandonados esperana de
sermos recolhidos em algum momento? Em poucas palavras, a autora
sintetiza: podemos pensar que a linguagem uma construo amorosa, que
as lnguas se elaboram a partir de aes comuns, compartilhadas; ou
que o amor uma construo de linguagem.O dilogo entre esses elementos
atravessa, signi-
ficativamente, a obra desta jovem poetisa cuja vida est
entrelaada com a literatura h anos talvez desde o bero. parte a
formao acadmica no curso letras que seguiu at o doutorado, o
envol-vimento de Ana Martins com a escrita literria vai alm de uma
relao profissional, e comeou cedo. Na adolescncia, ela descobriu
obras como Bagagem e O corao disparado, da conterrnea Adlia Prado,
com quem j foi comparada. uma ale-gria ver minha poesia aproximada
da poesia da Adlia, no s por ser uma poetisa admirvel, mas tambm
por essa ligao afetiva que tenho com os poemas dela. Eu mesma no
vejo, porm, muitas semelhanas entre os meus poemas e a sua obra o
que, obviamente, no quer dizer que no seja possvel estabelecer
relaes a partir da leitura. A associao mais provvel entre elas diz
respeito s questes cotidianas abordadas por ambas, mas que tambm
esto presentes na obra de inmeros outros escritores modernos e
contemporneos. Po-rm, na obra de Adlia notamos um amplo espao
dedicado experincia religiosa, o que no ocorre no trabalho de Ana
Martins.
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 201217
so embaralhadas nos poemas: os objetos doms-ticos so tambm
estranhos, desobedientes; a casa se abre para o acaso, o tempo, a
decomposio.Essas imagens tambm apontam uma oposi-
o entre a aventura e o recolhimento, a partida e a espera. O que
nos leva a uma figura mitolgica bastante presente em sua obra: a
dedicada Pen-lope. Ela, espera. Ela, recolhimento. Ela, morada.
Ulisses, naturalmente, aventura, partida, mar. Na perspectiva
benjaminiana, o heri pode ser tomado como uma representao do
narrador que viaja e traz um repertrio de experincias para
transmitir aos outros. Fala-se muito de Ulisses como prottipo do
narrador, mas para mim Penlope, destecendo de noite o que tece de
dia, que pode ser tomada como figurao da escrita, explica Ana
Martins. A perso-nagem, smbolo da espera, tambm lhe serve como
metfora do amor e da criao. Acho que o que me atrai na figura de
Penlope a revelao de que a espera tambm um trabalho, cotidianamente
feito e desfeito. Isso tem a ver com a espera amorosa no livro
Fragmentos de um discurso amoroso, Barthes define o enamorado como
aquele que espera -, mas tem tambm a ver com a leitura e com a
escrita, com o texto como uma viagem que se faz em repouso.
MQUINA DE VELOCIDADESExiste uma definio bastante conhecida que
diz que a poesia uma ou duas linhas com uma imensa paisagem por
trs. Aqui, a descrio cai como uma luva, pois grande parte dos
textos da poetisa so adeptos da brevidade, do mximo no mnimo. Uma
opo, alis, cada vez mais recorrente, no se sabe se por termos
assimilado os conselhos de preciso e conciso dos cones da poesia ou
se por influncia do ritmo contemporneo que parece ser propcio ao
sucesso dos haikais, j que nos habituamos a sentir e transcender em
140 caracteres. Talvez no Brasil, de fato, a defesa da conciso
e
do corte, a verdadeira guerra que foi travada contra a
prolixidade, o derramamento, a retrica de salo, tenham tornado mais
rara, embora no de todo au-sente, experincias com o poema longo,
discursivo ou mesmo narrativo. Na verdade, no sei se essa afir-mao
verdadeira; talvez o imperativo do mnimo exista antes por parte da
crtica, avalia a escritora. Mas ela tambm relembra que a extenso de
um poema
RICARDO MOURA
no representa a garantia de nada. A nica coisa que se pode
afirmar com certeza que, como disse Machado de Assis comparando o
conto ao romance, o poema curto leva sobre o poema longo, se ambos
forem ruins, a vantagem da brevidade.Mas, sendo bons, ambos tm a
capacidade de
afetar a relao temporal do leitor com o mundo, alterando o tempo
da nossa percepo. O escritor portugus Helberto Helder afirmou que a
pontuao uma mquina de velocidades. Talvez essa seja uma boa definio
para a prpria literatura, aponta. J o anglo-americano W. H. Auden
defendia que a poesia nada faz acontecer e, de certa forma, a
escri-tora tambm concorda com essa ponderao: De modo geral, acho
que no procuramos a literatura para encontrar respostas ou definir
caminhos, no vamos buscar nela um manual de instrues (na prpria
literatura, comeando pelo Quixote, encon-tramos vrios exemplos da
insensatez que levar os livros a srio), nem mesmo um conhecimento
maior do mundo, mas talvez justamente a imagem da nossa
incompreenso, do nosso desejo, da nossa perplexidade. Por outro
lado, a poesia de certo modo age na linguagem, o que significa que
ela age de alguma forma no mundo; seu modo de agir, porm,
impondervel, muitas vezes ambivalente, quase sempre
imperceptvel.
mente, no amor, conclui Ana Martins. Seus versos, concisos e
cortantes, esto atentos ao prprio fazer potico: a captura do rato
pela ratoeira, a partilha da folha em branco entre o Eu e o Outro,
o lugar a salvo da palavra que, doa a quem doer, no h.
A MORADA E O MAR No seu mais recente livro, notamos que h,
clara-mente, uma diviso em duas partes. Da metade para o fim, a
costura dos textos feita pelo j mencionado tpico das armadilhas. Os
poemas que preenchem as pginas iniciais, no entanto, relacionam-se
com a temtica da casa, dos objetos cotidianos, e esto agru-pados em
torno da palavra interiores. Diante de ns, revela-se uma ode ao
mnimo e ao prosaico, tpica da nossa literatura desde o modernismo.
Este ambiente perigosamente familiar visitado e revisitado por Ana
Martins, que j havia reservado uma seo para tais imagens na sua
publicao de estreia. Justamente por acreditarmos estar diante do
conhecido, do previsvel, do amestrado, tornamos possvel a surpresa
provocada pelo enfrentamento do bvio, pela ateno aos detalhes
camuflados na rotina. Quem abre a torneira/convida a entrar/o lago/
o rio/ o mar.Seja naquilo que revelado pelos cmodos da
casa, nos hbitos associados aos mveis ou na na-tureza dos
pequenos utenslios, h poesia e subjeti-vidade na trivialidade que
nos cerca, e preciso ter olhos de ver. Ver as evidncias da morte na
fruteira. Os trs ramos de metal nos garfos. Os brincos es-quecidos
em cima da cmoda. A pimenteira que nos devolve o sol de ontem. E o
relgio? O r-e-l--g-i--o. O intil marcador de tempo das urgncias,
mas das urgncias vulgares. Pois o tempo que realmente importa, o
nosso, o de dentro da gente, tem seus prprios marcadores. Ao
extenso e salgado mundo dgua na fronteira
com a areia elemento que parece provocar verda-deiro fascnio em
uma escritora no litornea tam-bm so dedicados muitos versos. Ela se
questiona, inclusive, se perderia o mar, no caso de t-lo por perto,
como perde seus isqueiros e canetas, coisas baratas e fceis de
encontrar. Ao fazer da morada e do mar temas cativos, Ana cultiva
dois territrios frteis: o do conhecido e o do desconhecido. Mas no
subestima a capacidade de troca desses universos. Gosto de pensar
que essas duas categorias s vezes
De modo geral, no procuramos a literatura para encontrar
respostas ou definir caminhos, acredita a autora
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O CONTO DO GAROTO QUE NO ESPECIALLucas Mariz
Primeiro colocado da categoria Infantil no I Concurso Cepe de
Literatura Infantil e Juvenil, realizado em 2010. Conta a histria
de um menino comum, igual a de outros de sua idade, mostrando que
ningum precisa de superpoderes para ser feliz. Ilustraes de Igor
Colares.
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A CABRA SONHADORALuzil Gonalves Ferreira
A cabrinha Cordulina, que sonha com o amor de um lindo bode
chamado Matias, vive uma srie de aventuras, que incluem voar e
tomar banho de cachoeira, at que seu sonho se torna realidade.
Ilustraes do artista plstico Luciano Pinheiro.
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PANO RPIDOJoca Souza Leo
A obra uma compilao de breves e bem-humoradas histrias de
escritores, jornalistas, artistas, poetas, polticos, populares e
bomios pernambucanos, anteriormente publicadas na coluna do autor
na revista Algomais.
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TAP: SUA CENA & SUA SOMBRAAntonio Edson Cadengue
Antonio Cadengue, que estudou o Teatro de Amadores de Pernambuco
por 10 anos, mostra seus momentos mais signifi cativos, assim como
as excurses feitas em diversas cidades e capitais brasileiras e as
suas principais montagens.
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O OBSERVATRIO NO TELHADOOscar T. Matsuura
Resultado de anos de estudo sobre a vida e obra de Jorge
Marcgrave, o livro faz parte da comemorao do 4 centenrio de
nascimento do principal responsvel por grandes estudos astronmicos
e cartogrfi cos em Pernambuco.
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ANJO DE RUAManoel Constantino
Primeiro colocado da categoria Juvenil no I Concurso Cepe de
Literatura Infantil e Juvenil. Inspirado na histria real de um
menino que viveu nas ruas do Recife, mostra como uma amizade pode
perdurar, mesmo na adversidade. Ilustraes de Roberto Ploeg.
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TAPACURHomero Fonseca
Segunda edio da obra Viagem ao planeta dos boatos. O leitor
acompanha o rumor de que a barragem de Tapacur havia estourado a
partir de relatos, incluindo, no caso mais recente, a repercusso do
mesmo em redes sociais.
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projetou obras modernizadoras no Recife do sculo 19, a exemplo do
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Revoluo Praieira e O padre Lopes Gama poltico, que espelham um
trabalho em boa parte voltado para os movimentos libertrios
brasileiros, fazendo de Amaro Quintas pleno merecedor do ttulo de O
Historiador da Liberdade.
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PERNAMBUCO, FEVEREIRO 201219
O chef
INDITOS
SOBRE O AUTOR
Sidney Rocha autor de O destino das metforas (Editora
Iluminuras).
Sidney Rocha
O garom deixou o prato de sopa. Quando o homem se virou, enfiei
a colher na horizontal e verifiquei a fundura do lquido. Retirei a
sondazinha e medi o nvel. Dois centmetros, no mais. Quatro reais.
Em qualquer lugar da cidade custaria o triplo. No pude reclamar.
Eles trazem a sopa com salsa picada nas beiras do
prato de porcelana. No que querem me fazer acreditar? Que o
cozinheiro fez o meu prato s pressas, como se o restaurante
estivesse lotado de celebridades, ou estivssemos em um navio cinco
estrelas, e que certo desleixo prova de sofisticao? Detesto as
culinrias. Todas so a mxima expresso da futilidade. Lilith namora
agora um chef. Cheeef. A palavra j
nasceu pernstica. Agora todos os afeminados assu-miram o caminho
da cozinha. E as mulheres adoram esses caras. No de estranhar. No
vai demorar e eles se tornaro conselheiros e sbios e no se poder
dar um passo que no seja guiado pelos reis dos rocam-boles, dos
ragus, dos provolones. Que inteligncia pode ter algum filosofando
sobre como quebrar um ovo numa frigideira?
Seis colheres de sopa por quatro reais. No consegui fazer a
conta. Mas era caro.
***
Foi quando na outra extremidade da mesa surgiu o cara na
cadeira. Tinha o rosto que acabava numa barba fina, cor de fogo. Os
olhos eram redondos mas precisaria de culos para parecer por
completo com um professor de gramtica. Sou um dybbuk ele disse. Um
o qu?, perguntei. Um dybbuk e completou dybbuk quer dizer
demnio, em hebraico.
O restaurante era um muquifo no centro da cidade. Numa das
mesas, l no canto, havia um judeuzinho de nada, os caracis
atrapalhando a leitura do livro. Mesa errada, meu caro falei. Siga
em frente,
terceira direita.O cara olhou na direo do judeuzinho. A luz
batia
contra o vidro. Os pingos da chuva na vidraa davam lividez do
seu rosto coloraes de arco-ris e no sei porque lembrei do quadro de
So Jernimo traduzindo a Bblia. Uma perda de tempo resmungou o
dybbuk. Ele
no tem inteligncia para o que venho propor. Sim? E voc me julga
inteligente? Sim.
Acabo de pagar quatro reais em seis colheres de uma gua suja com
sal. No consigo um centavo honesto h vrios dias. No fui embora
ainda porque a Lilith no chegou. Preciso do seu dinheiro pra
apostar no preo de hoje tarde. Ainda por cima, estou aqui
conversando com o diabo em aramaico... Hebraico, em hebraico falou
ele, dentro do
meu pensamento. Que seja, d no mesmo... E voc ainda assim
acha
que sou inteligente? Tenho um negcio pra te propor. Tu ficars
rico.
19
Escuta com ateno, capeta hebreu. Ano passado foi um ano. Um
coisa-ruim nrdico, algo assim. Prometeu que me tornaria um escritor
famoso se eu escrevesse a sua histria. E ele aprovasse. E eu virei
bi-grafo de ano por um ano, foi s isso o que aconteceu. E tu
escreveste? Claro. E ele aprovou? Claro que no. Anes so todos uns
tratantes.
Nunca se meta com esses.
Era a histria de um ano chamado Mokav que mo-rava na Birmnia. Os
seus conselhos davam vitrias e mais vitrias ao rei. No final, o ano
pede em prmio a mulher do general, depois corneia o rei, sacaneia
todo mundo e foge com as riquezas do reino.O dybbuk me olhou com
surpresa. Mas a histria verdadeira. Conheo o sujeito. O
que ele reprovou? Um safado. Era um safado, completei por
fim,
jogou-me uma praga. Por isso no consigo entregar o meu romance
ao Samuel editor. E fico escrevendo continhos fuleiros. Bem, por
certo no uma obra-prima, mas a
histria est correta retorquiu. Ihh, cara. No vou discutir
literatura com voc
tambm. , tu vais precisar mudar de ramo remendou.
Por isso vim te propor um trato. Desembucha. Vou te dar uma
receita mgica. Vais virar um
cozinheiro reconhecido no mundo inteiro. Um chef. Ora, v se
foder, satans. Retire-se daqui agora.
Fora. Vejas bem disse ele tua nica chance. Fo-da-se.
Escritorzinho de merda, biografozinho de trolls.
ele disse. Foi procurar outra freguesia. E pluft
desapareceu.
Lilith no veio. Catei as quatro moedas e deixei sobre a mesa.
Andei na chuva durante o resto da tarde pensando na vida. No
apostei no meu cavalo naquele preo, e ele ganhou com vantagem. O
jquei era um ano, eu soube. No confio em anes, j disse.
***
S encontrei a Lilith dias depois. Ela me falou do namorado, que
agora especialista
em azeites. Que visitou a Palestina, onde h olivais de
quinhentos, mil anos, os melhores, e no se pode respeitar um azeite
que no tenha vindo da Palestina. Lembrei do dibbuk. Ia falar dele
quando ela se antecipou: Ah, voc soube? Deu na Times: o Paulo
Coelho
abandonou a literatura. Ufa eu disse. Foi. Assim, do nada.
Estava tomando uma sopa
em Berlim, teve uma viso, algo assim, e, pluft, de-cidiu disse
ela. E agora, vai fazer o qu da vida?, perguntei. Chef, querido.
Virou cheeeeeeeeeeeef.
PERNAMBUCO, FEVEREIRO 2012
JANIO SANTOS
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INDITOS
Eric Novello
SOBRE O AUTOR
Eric Novello autor do romance Neon azul (Editora Draco). Esses
dois contos trazem momentos distintos do personagem Lucas,
frequente na obra do escritor.
20
Luuucas! Voc precisa de foco! Como quer vender? Voc precisa
entender que o mundo mudou, somos globalizados, pense grande! Foco,
Lucas, foco foco foco! Repete comigo. Foooco!Essa frase no sai da
minha cabea.
Ouvi na ltima reunio com a editora e desde ento tenho pesadelos
globalizados. Sonho com personagens japonesas lsbi-cas imigrantes
se apaixonando por padres protestantes que se convertem ao
islamis-mo e descobrem ser grandes jogadores de futebol em um
retiro no Oriente Mdio, fazendo o gol da vitria do campeonato
mundial de sei l o qu.Outro dia, meio dormindo, imaginei
encontrar uma senhora de olhos violetas que me dizia duas
semanas em primeiro lugar em Saturno. As saturninas te amam, e
depois me bolinava com seus tentculos.Socorro. O trauma tanto que
fui pro-
curar minha psicloga e descobri que a falta de foco est
relacionada ao medo do futuro. Mas como no ter medo do futuro com
esses filmes me aterrorizando dia e noite. Sou um cara
influencivel. Leio o globo terrestre. A verso globalizada de o
Globo. Sofro at hoje pensando na baba que pingou em Alien, o oitavo
passageiro. No posso pisar em uma poa de xixi que penso: ele!Saiba
que nunca mais fui praia des-
de que vi Tubaro. Fiquei meses sem ver TV depois de Poltergeist
e larguei a ioga depois que vi a menininha de O exorcista
descendo a escada de cabea para baixo. Sei l, no era legal. Acho
que todos so ETs por causa de Men in black e toda vez que um cano
estoura na rua, acho que seremos exterminados como em Guerra dos
mundos. O nico filme que no me assusta O Chamado. No posso
respeitar um fantasma que se acha atendente de telemarketing e fica
importunando os outros com aquele papo de 7 days . Minha gerente de
banco assusta bem mais do que isso, posso garantir. Boa tarde,
se-nhor Lucas. Estamos com um novo ttulo de capitalizao 7 days my
ass.Mas o futuro pode ser bem pior que
os meus pesadelos. Voc vai encontrar aquele amigo que no v desde
sempre e falar 350 j? O corpinho de 240! E a voz robotrnica est um
charme.Ele prontamente ir responder instalei
um sintetizador vocal do Darth Vader na traqueia. Ganhei de
brinde quando comprei o sintetizador da Britney Spears para a minha
filha.Sim, porque se seremos imortais a Brit-
ney tambm ser, meu amigo. Os estdios na lua iro lotar com
apresentaes da banda Apocalypso, com entradas triunfais direto de
suas naves. E, pior, as roupas douradas que eles usam estaro na
moda para todos ns.No teremos mais nibus. Voc ser
assaltado no seu transportador de mul-tineutrons e se uma mosca
entrar com voc, j sabe, David Cronenberg avisou.
Vai ter que comprar roupas em outra rede mundial.Esquea tambm a
identidade, usare-
mos apenas leitores de digital. Tendinite certa. E o de ris? J
pensou uma epidemia de conjuntivite? No teremos mais gri-pe do
frango, pois ele, um ser evoludo, j fabricar seus prprios
antibiticos, e poderemos criar peixes fora do aqurio, levando-os
para passear na coleira.De manh, acabou o sucrilho, voc
vai para o banheiro. Quando senta na privada ouve um bom dia,
Sr. Lucas. Gostou do caf? Posso ler o seu hors-copo? Muito
inspirador. A quiromancia se transformando em leitura de linhas da
ndega esquerda. Sua linha da vida, Sr. Lucas, to longa.Mas, no
sejamos pessimistas, o futuro
tem seu lado bom. Ecologistas podero se fundir geneticamente s
espcies que defendem, estudando melhor seus modos d