-f'- '. ,. \li " Junte-se ao Processo nos termos do Art. 261 do Regimento Interno do Senado \p Federal CPI - TRAFICPES Vol 1. TRÁFICO. DE PESS10AS: UMA ANALISE COMPARATIVA DA . NORMATIVA NACIONAL E FRANS NEDERSTIGT
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Junte-se ao Processo nos termos do Art.261 do Regimento Interno do Senado\p Federal
CPI - TRAFICPES
Vol 1. ~ TRÁFICO. DE PESS10AS:UMA ANALISE COMPARATIVA DA
. NORMATIVANACIONAL E INTERNACIONAI(~/
FRANS NEDERSTIGT
APRESENTAÇÃO
Projeto Trama teve início em abril de 2004, mediante a formação de um consórcio entre
quatro entidades não governamentais: a Organização de Direitos Humanos Projeto Legal; o
Instituto Brasileiro de Inovações em Saúde Social-IBISS; a Organização de Mulheres Negras
CRIOLA; e, o Núcleo de Direitos Humanos da Universidade do Grande Rio - UNIGRANRIO,
todas sediadas e com reconhecida atuação na defesa, garantia e promoção de direitos
humanos no Estado do Rio de Janeiro.
Considerando o tráfico de pessoas como uma grave violação dos direitos humanos e um
problema ligado à globalização e a desigualdade social, bem como a questões de gênero,
raça e etnia. O Projeto Trama tem como missão enfrentá-lo através da afirmação dos direitos
humanos, de modo a evitar a vitimização e a discriminação.
Este caderno não é tão somente destinado a operadores de direito, mas a todos àqueles que
têm interesse na ampliação do Acesso à Justica de pessoas trafícadas. Acesso no sentido
formal do processo e Justiça no sentido material para a vítima. Não procura de forma alguma
pregar uma única verdade, e sim provocar outras percepções sob a dura realidade do tráfico
de pessoas, bem como abordar temas transversais tais como trabalho, gênero e migração.
Pretende ainda, cumprir a função de estimular a aprendizagem porém muito mais quer motivar
pela desaprendizagem.
Em sintése, este caderno visa incentivar o debate jurídico crítico, aumentando assim o
intercâmbio de experiências, análises e estratégias de ações de enfrentamento ao tráfico de
pessoas cada vez mais qualificadas.
Boa leitura!
Rio de Janeiro, abril de 2009
Consórcio Projeto Trama
Volume 1
SUMÁRIO
13.....NORMATIVA INTERNACIONAL
www.projetotrama.org.br
1 INTRODUÇÃO
2 CONCEITUANDO TRÁFICO DE PESSOAS2 A Definição Universal do Protocolo Anti-Tráfico Humano da ONU2 Tráfico de Pessoas: Causa e Conseqüência de Violações de Direitos Humanos3 0 Enfrentamento do Tráfico de Pessoas no seu Contexto Histórico
5 NORMATIVA NACIONAL5 Política e Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas6 Abordagem Trabalhista: Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo8 Abordagem Penal: As mudanças trazidas pela lei Nº11.1 06/20059 Crimes Correlatos13 Abordagem Civil: Reparação de Danos
da exploração econômica (56% do total contra 44% dehomens e meninos) e corno maiores vítimas de exploração sexual comercial (98% do total contra 2% de homense meninos). Segundo a Pesquisa Sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil- PESTRAF, existem241 rotas (131 internacionais e 110nacionais), envolvendo um fluxo permanente de predominantemente mulherese adolescentes, afrodescendentes, com idade entre 15 e25 anos (PESTRAF, 2002).
No enfrentamento ao tráfico de pessoas, ações sãopropostas em diversas áreas de atuação e por organizações da sociedade civil, governos e organizações internacionais. Entretanto, o interesse deste estudo está nocampojurídico.
O objetivo principal deste estudo é a realizaçãode urna análise comparativa, identificando as diferenças funcionais entre a legislação brasileira quanto àrepressão, à prevenção do tráfico de pessoas, e à atenção às vítimas de tráfico de pessoas, na esfera trabalhista, penal e cível, em relação à normativa internacional mais relevante sobre o terna do enfrentamentoao tráfico humano.
Os eixos que servirão de indicadores dentro doobjeto proposto por este estudo e já mencionados são:repressão, prevenção e atenção às vítimas de tráficode pessoas. O Protocolo Anti-Tráfico Humano da Organização das Nações Unidas - ONU, utiliza no seuArtigo 4°, referente ao âmbito de sua aplicação, essamesma divisão:
O presente Protocolo aplicar-se-á, salvo disposição em contrário, à prevenção (artigo 9Q
), investigação e repressão das infraçõesestabelecidas em conformidade com o Artigo 5do presente Protocolo, quando essas infraçõesforem de natureza transnacional e envolveremgrupo criminoso organizado, bem como à proteção das vítimas (artigo 6º) dessas infrações.(ONU 2000 apud BRASIL, 2004, grifo meu)
No primeiro capítulo conceituaremos o tráfico humano, primeiramente, através da definição universalmente reconhecida no Protocolo Anti-Tráfico Humano da ONU, para, em seguida, melhor entender esseproblema mundial corno causa e conseqüência de violações de direitos humanos, bem corno no seu contexto histórico.
No segundo capítulo trataremos da primeira parte da análise comparativa, sendo a normativa nacional referente ao tráfico humano, abordando inicialmente a recente Política Nacional de Enfrentamento aoTráfico de Pessoas e o ainda mais recente Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas PNETP. Depois, analisaremos a legislação nacional,
1. INTRODUÇÃO
"O tráfico de pessoas é urna das formas mais explícitas de escravidão moderna. Embora tenha sidoabolida oficialmente, a escravidão nunca foi realmente erradicada." (GLOBAL ALLIANCE AGAINSTTRAFFIC IN WOMEN, 2007, p. 87, tradução nossa).
Essa frase, escrita em relação ao contexto brasileiro, sintetiza a problemática a ser abordada nesteestudo e ao mesmo tempo possibilita a reflexão sobrea complexidade desta temática. Numa abordagem maisjurídica, encontrada nos direitos humanos, pode-seafirmar que: "[...] tráfico de pessoas é causa e conseqüência de violações de direitos humanos [... ]"(GAATW-BRASIL, 2006, p.l).
É conseqüência de violações de direitos humanos porque o tráfico humano origina-se da desigualdade social-econômica, da precariedade de políticaspúblicas básicas, da falta de perspectivas de empregoe de realização pessoal e da luta diária pela sobrevivência. Em outras palavras: é principalmente causadopor violações de direitos humanos econômicos, sociais e culturais, também chamados os direitos humanos da segunda geração! (ou dimensão). O tráfico depessoas, em outras palavras, encontra terra fértil naviolação de direitos humanos econômicos, sociais eculturais.
Mas o tráfico humano, por sua vez, também provoca violações de direitos humanos porque causa aexploração da pessoa humana, degrada a sua dignidade e limita o seu direito de ir e vir. Em outras palavras:viola os direitos humanos, inclusive os direitos civisda primeira geração (ou dimensão).
Corno citado a escravidão na verdade nunca foierradicada. Segundo as estimativas do Escritório Contra Drogas e Crime das Nações Unidas - UNODC(2007), o tráfico internacional de mulheres, crianças eadolescentes movimenta a cada ano entre US$ 7 bilhões e US$ 9 bilhões, sendo uma das atividades maislucrativas do crime organizado transnacional senão amais lucrativa depois do tráfico de drogas e tráfico dearmas. Calcula-se, de acordo com recentes estatísticas da Organização Internacional do Trabalho - OIT(2005a), que no mundo 12,3 milhões de pessoas exerçam trabalho forçado, e que deste número 2,45 milhões pessoas foram traficadas. Isto significa que aproximadamente 20% do trabalho forçado é produto dotráfico de pessoas, porém nos países industrializadoso tráfico de pessoas representa 75% do trabalho forçado. Destes, 43% acabam na exploração sexual comercial.
Das pessoas traticadas (OIT, 2005a), destacamse as mulheres e as meninas corno as maiores vítimas
CADERNO JURíDICO 1
Autor:Frans Nederstigt
Consórcio Projeto Trama
Rio de Janeiro - RJDezembro de 2008
Copyright © 2009Consórcio Projeto Trama
Consultores:Ebe Campinha dos Santos
Carlos Nicodemosluciana Campello Ribeiro de Almeida
Edição e Projeto Gráfico:Thiago Ansel
Tráfico de Pessoas:uma análise comparativa da normativa
nacional e internacional
23 BIBlIOGRAFIA
28 TABElAS
13 0 Protocolo Anti-Tráfico Humano da ONU e a Situação de Vulnerabilidade15 0 Impacto Jurídico no Direito Interno Brasileiro do Protocolo Anti-Tráfico Humano16 Repressão, Prevenção e Atenção às Vítimas do Tráfico de Pessoas no Protocolo Anti-Tráfico Humano18 0utras Normativas Internacionais
19 0NU19 0EA19 MERCOSUl
19 CONSIDERAÇÕES FINAIS
21 NOTAS
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Cadernos Projeto TRAMA
relevante para o tema do enfrentamento ao tráfico de pessoas, no seu contexto trabalhista, penal e civil, identificando, desde já, possíveis problemas e lacunas, principalmente na área penal (inclusive através de uma tabela).
No terceiro capítulo trataremos da segunda parteda análise comparativa, sendo a normativa internacionalreferente ao tráfico humano, abordando inicialmente umdos temas mais polêmicos no Protocolo Anti-Tráfico Humano da ONU: a utilização do termo "situação devulnerabilidade", tema chave para entender o tráfico humano como conseqüência de violações de direitos humanos. Em seguida, adentramos no impacto jurídico do Protocolo da ONU para o direito interno brasileiro. Atravésdos eixos de repressão, prevenção e atenção às vítimasde tráfico de pessoas, detalharemos o significado do Protocolo para o enfrentamento do tráfico de pessoas. Ocapítulo sobre a normativa internacional será completado,por fim, detalhando as outras normas internacionais daONU, da Organização dos Estados Americanos~OEA,e do Mercado Comum do Sul~MERCOSUL, aplicáveis no Brasil e relevantes para o enfrentamento do tráficode pessoas. Além disto, será apresentada uma (segunda)tabela listando os instrumentos jurídicos nacionais e internacionais mais relevantes para o enfrentamento ao tráficode pessoas no Brasil.
Esta publicação, por fim, apontará os principaisproblemas quando compararmos a normativa nacional e a normativa internacional aplicável no Brasil.
2. CONCEITUANDO TRÁFICO DEPESSOAS
2.1. A DEFINiÇÃO UNIVERSAL DO PROTOCOLO ANTI-TRÁFICO HUMANO DA ONU
Em 15 de novembro de 2000 foi adotado pelaAssembléia Geral das Nações Unidas o ProtocoloAdicional à Convenção das Nações Unidas contra oCrime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, emespecial Mulheres e Crianças, adiante denominado deProtocolo Anti-Tráfico Humano, também conhecidocomo Protocolo de Palermo'. Aprovado em 29 de maiode 2003 pela resolução n° 231 do Congresso Nacionale posteriormente promulgado pelo Decreto Presidencial n° 5.107 de 12 de março de 2004, tornou-se, pelomenos, lei ordinária federal no âmbito interno.'
Pela primeira vez na história existe um conceitouniversalmente reconhecido de tráfico de pessoas (sejainterno, seja internacional), definido pelo ProtocoloAnti-
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Tráfico Humano da ONU no seu artigo 3°, alínea (a),como:
[...Jo recrutamento, o transporte, atransferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas,recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, aoengano, ao abuso de autoridade ou à situaçãode vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação depagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridadesobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, aservidão ou a remoção de órgãos. (ONU 2000apud BRASIL, 2004)
2.2 TRÁFICO DE PESSOAS: CAUSA E CONSEQÜÊNCIA DE VIOLAÇÕES DE DIREITOSHUMANOS
Mariana e as Políticas Sociais
Três filhos pequenos, de pais diferentes, nenhumcontribuindo com sua educação. Mariana, 21anos, mora em Belém em uma casa de madeira que pertence a sua mãe, quer dizer, oficialmente não, porque se trata de uma área de "ocupação", mas foi ela e seus irmãos que a construíram. Mariana acabou de perder seu emprego numa loja no shopping da cidade, que demitiu uma parte dos seus funcionários depois doNatal. Sem ensino médio completo, devido àstrês gravidezes e o cuidar dos filhos, ela ajuda amãe lavar roupas de outras famílias, o que rende um salário mínimo por mês. Os filhos têm 5,3 e 2 anos. A bolsa família de 95 reais", que elaconseguiu, mal dá para comprar leite e remédios para os filhos. O programa Primeiro Emprego não a cadastrou, porque ela não estava estudando e sua carteira de trabalho já mostravaseis meses de trabalho como vendedora, alémde existir um número limitado de vagas para participar (em 2005 foram 1500 jovens, em 2006 oprograma não funcionou).5 Sua filha mais novasofre de constantes ataques de asma. No postode saúde, quando ela conseguiu ser atendidadepois de várias noites aguardando em frentedo posto de saúde, o médico pediu um raio-x dotórax e exame de pele e sangue. Mariana conseguiu agendar os exames só para três mesesdepois da consulta. O médico prescreveu também dois remédios, um bronco dilatador e umantiinflamatório, que infelizmente não estavamdisponíveis no posto.
Presentes, brinquedos, roupas novas, produtos
de higiene, ... não estão dentro do orçamento,menos ainda cinema, passeios ou restaurantes.Os cartões de crédito, entregues nas casas populares por lojas e supermercados, já estouraram com as primeiras compras e as dívidassaltaram para valores gigantescos. Sem créditona praça, a única diversão é a televisão e osamigos da esquina, onde há um barzinho e ponto de táxi, conhecido como boca de fumo e objeto de constantes investidas policiais (para receberpropinas ou exigirpagamento para não prender certas pessoas...)
Que Políticas Públicas chegaram até esta mulher jovem? A de moradia? Educação? Assistência? Emprego e Renda? Lazer?Profissionalização? Segurança?
Chegou um convite: viajar para Suriname paraganhar, em pouco tempo, dinheiro para saldardívidas e pagar um médico particular para seusfilhos, além de contribuir na reforma da casa. Éarriscado, com certeza vai ter sofrimento, mas...é o que se apresenta neste momento. (HAZEU,2007, p. 21-22)
Após esse exemplo sobre a situação (devulnerabilidade) da Mariana, é obvio que as violações dedireitos humanos econômicos, sociais e culturais batem àsportas de muitas Marianas. Não é um problema teórico.Não é mera hipótese. Justamente por isto deve-se evitarfalar em tráfico de seres humanos, como se fosse umamodalidade do tráfico de animais silvestres, atividade criminosa também combatidapela PolíciaFederal como avisam, desde 2003, cartazes6 nos aeroportos brasileiros.Ao contrário, deve se falar empessoas traficadas; pessoas com nomes, pessoas com sonhos para achar o caminho na vida que chegará a felicidade, pessoas ousadasque arriscam o seu hoje para um amanhã melhor.
Por este mesmo motivo, numa perspectiva de direitos humanos, não se deve rotular as pessoas traficadascomo pessoas vulneráveis. Ao contrário. No máximo sãopessoas que se encontram em uma situação devulnerabilidade. 7 A diferenciação entre pessoas vulneráveis e pessoas em uma situação de vulnerabilidadenão é uma questão meramente terminológica. Faz diferença na abordagem dessas pessoas. A expressão pessoa vulnerável refere-se a uma incapacidade individual:a vítima, decorrente da sua fragilidade, coloca-se nestasituação inferior e por isso precisa de ajuda, pois não écapaz de sair dela sozinha, sendo lhe atribuídauma condição de passividade. Uma pessoa em uma situação devulnerabilidade é em princípio capaz de sair dela, estánela por razões externas e pode, se suficientementeempoderada, exigir um reconhecimento dos direitos dela,mas não é vulnerável como se fosse uma característicainerente a pessoa. Em síntese, a abordagem da pessoa
Volume 1
traficada dependerá da forma como se conceberá, teórica e ideologicamente, a visão sobre esta.
O Projeto Trama, consórcio' de enfrentamento aotráfico de pessoas no Rio de Janeiro, iniciativa de referênciana temática, bemcomo a GlobalAllianceAgainstTrafficin Women- GAATW (Aliança Global contra Tráfico deMulheres, tradução nossa) e seus oito membros brasileiros, entendem que o tráfico de pessoas é uma violaçãodos direitos humanos e umfenômeno ligado à globalizaçãoe a desigualdade social. (PROJETO TRAMA, 200S)
O tráfico de pessoas, enquanto problemática queinclusive atravessa as fronteiras de países, precisa deum enfrentamento compartilhado e internacionalizado, pois os países e locais de destino, de trânsito e deorigem estão interligados. O enfrentamento, composto de repressão, prevenção e atenção às vítimas, somente será efetivo através de redes articuladas, dizemos especialistas no assunto (GAATW, 2007; ONU,2002).
2.3 O ENFRENTAMENTO DO TRÁFICO DEPESSOAS NO SEU CONTEXTO HISTÓRICO
Ao analisar as estratégias e metodologias deenfrentamento ao tráfico de pessoas no seu contextohistórico é importante entender a sua multidimensionalidade:
O conceito de tráfico de pessoas, conseqüentemente, é uma mescla de vários fenômenos eenfoques, juntando movimentos que se organizam em torno de questões tais como direitoshumanos, migração, discriminação (racial e/oude gênero), exploração sexual, prostituição, trabalho sexual, exploração do trabalho, direitos trabalhistas, escravidão moderna, globalização,crime transnacional, etc. (PROJETO TRAMA,2008).
Dependendo do enfoque utilizado para entender otráfico de pessoas é possível encontrar diferentes estratégias e metodologias de enfrentar o problema. Com isso, oenfrentamento do tráfico toma-se menos transparente. Pois,para cada um destes enfoques, existem diversas estratégias e metodologias de enfrentamento.
Inclusive, as respostas jurídicas dadas ao tráfico humano, pelos poderes legislativo, executivo ejudiciário, sãoinfluenciadas pela multi-dimensionalidade do problema.Existem abordagens diferenciadas no direito trabalhista(e.g. contra a exploração do trabalho); no direito penal•(e.g. repressão dos crimes transnacionalmente organiza-dos; abolição da prostituição; proteção da moral públicasexual); e no direito cível (e.g. indenização pordanos moraise materiais). Abordagens ora complementares, oraconflitantes. Respostas com caráter repressivo, ou visan-
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Cadernos Projeto TRAMA
do o protagonismo e o empoderamento das pessoastraficadas e das pessoas em situação de vulnerabilidadepara serem traficadas.
Assim o tema de enfrentamento do tráfico de pessoas, por se situar no cruzamento de várias temáticas, atépode ser utilizado para realizar outras agendas ou parajustificar outras políticas, como por exemplo, para a abolição da prostituição, parapolíticas anti-migratórias ou para"inglês ver" (PROJETO TRAMA, 2008).
Quando o Brasil declarou sua independência dePortugal em 1822, seu maior parceiro comercialera Inglaterra. Enquanto os britânicos ofereciamvárias formas de apoio e amizade em troca doacesso aos portos brasileiros e o direito ao comércio no Brasil, a Inglaterra já havia declaradoser ilegal a importação de escravos africanosem suas colônias e, encorajava outros países afazer o mesmo. Além de argumentos morais,Brasil- economicamente dependente do baratotrabalho escravo nas plantações de açúcar, cafée algodão - foi também considerado um competidor desigual pelos britânicos e suas colônias, que produziam os mesmos produtos e aboliram a escravidão já por volta dos anos 1830.Como resultado, sob pressão britânica, umasérie de leis brasileiras foi aprovada visando oficialmente a abolição do comércio de escravos,embora pequeno ou inexistente impacto. Essasiniciativas eram para inglês ver. Uma dessas leis,a Lei de Euzébio de Queiroz, que proibia o tráfico de escravos em 1831, não teve efeito algum- após a proibição, o comércio ilegal de escravos até mesmo aumentou significativamente(BETHELL, 1989; MIL/TÃO, 2005; apudGAATW, 2007, p. 87, tradução nossa).
O tráfico humano ou escravidão moderna, em
bora tenha sido abolida oficialmente, nunca foi realmente erradicada. Desde o começo do século passa
do, uma década e meia depois do Brasil, como últi
mo país das Américas, abolir a escravidão (1888), otráfico de pessoas continuou a ser objeto de preocupação da comunidade internacional.
O primeiro documento internacional contra o tráfico (1904) mostrou-se ineficaz não somenteporque não era propriamente universal, comotambém porque revelava uma visão do fatocentrada na Europa. O segundo documento, de1910, complementou o primeiro na medida emque incluía provisões para punir aliciadores, masobteve apenas 13 ratificações. (JESUS, 2003,p.27)
Vale ressaltar que o tratado de 1910 era denominado Convenção Internacional contra o Tráfico de Escravas Brancas, pois naquela epóca foram transporta-
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das mulheres Europeas comdestino a lugares comoBuenosAires e Rio de Janeiro para o trabalho na prostituição.Claramente eurocentrista, o documento não se estendia aproteção de mulheres negras, crianças, adolescentes ouhomens. Os instrumentos internacionais seguintes, de 1921e 1933, elaborados no âmbito da Liga das Nações, erammais abrangentes, mas continuaram definindo o tráficohumano independentemente do consentimento da mulhere somente para fins de prostituição. Todos esses instrumentos foram consolidados pela Convenção e Protocolo Final para a Supressão do Tráfico de Pessoas e doLenocínio de 1949 (JESUS, 2003), ratificada por 72países, inclusive pelo Brasil em 1958. Durante décadaspermaneceu como o único instrumento especificamentevoltado ao problema do tráfico de pessoas, partindo deuma perspectiva proibicionista e abolicionista da prostituição. O instrumento ainda está em vigor e relaciona tráfico de pessoas diretamente à exploração de prostituição,sêja autônoma e/ou voluntária, seja forçada.
Em 1992, Gilberto Dimenstein, à partir de uma pesquisa realizada pelo Movimento Nacional de Meninos eMeninas de Rua - MNMMR, denunciou o crescenteproblema da exploração sexual comercial de meninas,especialmente na Amazônia. Este livro, intitulado Meninas da Noite, no entanto, ainda não reconheceu a prostituição forçada de meninas-escravas como tráfico de pessoas. No mesmo ano, Americas Watch publicou seu relatório A Luta pela Terra no Brasil, Violência Rural Continua, denunciando internacionalmente diversas fazendaspelo uso do trabalho forçado, fornecido pelos gatos (contratantes que recrutam trabalhadores, geralmente com falsas promessas) para o desmatamento, especialmente naregião sul do Pará. Esse relatório, em inglês, utilizou basicamente as informações da Comissão Pastoral da Terra- CPT, uma organização ativista ligada a ConferênciaNacional de Bispos do Brasil-CNBB, fonnadaem 1975para o monitoramento de abusos de direitos no interiordo país (GAATW, 2007).
No Rio de Janeiro, em 1995, o Centro de Articulação de Populações Marginalizadas - CEAP, lançou aprimeira campanha e pesquisa sobre tráfico de pessoascom o slogan, Tráfico de Mulheres é Crime: um sonho,um passaporte, um pesadelo. Naquele momento, contudo, as agendas políticas dos governos nos àmbitos federal, estadual e local, assim como diversas organizaçõesnão governamentais - ONGs, ainda não estavam prontas para responder ao problema do tráfico de pessoas,apesar de já existirem algumas iniciativas acerca doenfrentamento à exploração sexual comercial de crianças(GAATW,2007).
No Brasil a questão do enfrentamento do tráfico depessoas entrou na agenda política apenas no início do novo
milênio, quando a já mencionada pesquisa PESTRAF(2002) sendo realizada através da articulação de ONGs
e universidades9 brasileiras, com o substancial apoio in
ternacional, possibilitou a visibilidade do problemano Bra
sil, através do mapeamento de rotas internas e internacio
nais, da caracterização do perfil das vítimas e dos aliciadores, entre outras informações.
Aposterior ratificação pelo Brasil do ProtocoloAnti
Tráfico Humano da ONU (2000) em 29 de janeiro de
2004 foi um passo fundamental, colocando a temática de
finitivamente naagendapolítica, inclusive através dojáexistente Programa Global contra Tráfico de Seres Humanos
(GPAT) do UNODC executado pela Secretaria Nacionalde Justiça do Ministério da Justiça.
3. NORMATIVA NACIONAL
3.1 pOLíTICA E PLANO NACIONAL DEENFRENTAMENTO DO TRÁFICO DE PESSOAS
Em 26 de Outubro de 2006 foi promulgado o Decreto n° 5.948 promulgando a Política Nacional deEnfrentamento ao Tr4fico de Pessoas. Pela primeira vezna história brasileira, todas as modalidades mencionadasno ProtocoloAnti-Tráfico Humano da ONU - a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou aremoção de órgãos o trabalho escravo e formas similaresà escravidão - foram oficialmente consideradas comotráfico humano.
A Política Nacional baseia-se nos princípios de direitos humanos (artigos 1° e 3°), uma vez que, por exemplo, declara que nenhum direito da vítima é condicional asua colaboração em processos judiciais (artigo 3°, incisoIII).
Em 8 de janeiro de 2008 o Presidente da República,Luiz Inácio Lula da Silva, instituiu, pelo Decreto n° 6.347,o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (PNETP), com vigência de dois anos, que ampliou oescopo do tema. O PNETP agrega diferentes instrumentos e atores governamentais de, pelo menos, 13 ministérios diferentes, e, especificou os eixos estratégicos, prioridades, ações e atividades necessárias, bem como estipulametas concretas a serem atingidas.
Importante frisar que os mencionados decretos encontram sua base legal no artigo 84, inciso VI, alínea (a),da Constituição da República Federativa do Brasil-CF(1988), o que significa, embora sendo atos normativos,estes não têm status de lei, sendo regulamentações administrativas.
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A Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, define o tráfico de pessoas no seu artigo 2°, fazendo referência direta à definição no Protocolo Anti-Tráfico Humano. No entanto, o parágrafo7° do mesmo artigo introduz uma diferença bastantesignificativa, pois estipula que "o consentimento dadopela vítima é irrelevante para a configuração do tráfico de pessoas".
Assim, elimina referência direta ao artigo 3° (b)
do Protocolo Anti-Tráfico Humano, que reza:
O consentimento dado pela vítima de tráfico depessoas tendo em vista qualquer tipo de exploração descrito na alínea (a) do presente Artigoserá considerado irrelevante se tiver sido utilizado qualquer um dos meios referidos na alínea(a). (ONU 2000 apud BRASIL, 2004)
Em outras palavras, por ignorar a possibilidadeda vítima (inicialmente) consentir em seu recrutamento, e assim ignorar qualquer análise sobre o uso (ounão) de qualquer meio para conseguir o consentimento induzido ou viciado, o Brasil parece ter adotado umadefinição simplificada, com a intenção de evitar discussões interpretativas e o mau uso da definição nostribunais (GAATW, 2007).
Entretanto, reduzir a definição de tráfico de pessoas do Protocolo J\nti-Tráfico Humano através da eliminação da questão do consentimento, significa que aPolítica Nacional brasileira, de fato, considera o tráfico de pessoas como o recrutamento, o transporte,transferência, alojamento ou acolhimento de pessoaspara a finalidade de exploração.
A exploração é ainda interpretada conforme oartigo 3°, alínea (a) do Protocolo, como:
A exploração incluirá, no mínimo, a exploraçãoda prostituição de outrem ou outras formas deexploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos.(ONU 2000 apud BRASIL, 2004, grifo meu)
Na Política Nacional foi adotada uma definição diferente daquela reconhecida pela comunidade internacional e isto pode gerar conflitos:
Sem uma definição mais clara e especifica sobrea 'exploração', daquela mencionada no Protocolode Palermo, as atividades pagas de profissionaisde sexo adultos e não-autônomos, que fizeramuma escolha genuinamente voluntária em trabalhar em um bordel onde seus direitos são plenamente respeitados, pode ser considerado um atocriminoso de 'exploração da prostituição de outrem' e conseqüentemente, tráfico de pessoas.(GMTIIII, 2007, p. 90, tradução nossa)
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Cadernos Projeto TRAMA
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Dê fato, a solução prática em ignorar a discussãosobre o consentimento torna impossível a análise individuaI (caso-a-caso) e elimina os elementos subjetivos quedeveriam ser levados em consideração para determinaronde precisamente, em casos individuais, termina a autonomia e inicia a exploração (GAATW, 2007). Especialmente nos casos onde a já citada e universalmente aceitadefinição mínima de exploração mencionado no Protocolo Anti-Tráfico Humano, não pode ser facilmente aplicada, porque é pouco precisa, pouco detalhada e só estipulaumrol exemplificativo e mínimo.
3.2 ABORDAGEM TRABALHISTA: TRÁFICODE PESSOAS E TRABALHO ESCRAVO
A superexploração de mão-de-obra não-especializada quando adotada por empresas e fazendas pode diminuir custos de produção, garantindo assim a competitividade nos mercados interno e externo - sem que seja necessária aredução nos lucros dos acionistas. Essa possibílídade existe, pois há uma grande quantidadede mão-de-obra ociosa no país, principalmentena região Nordeste. A diferença abissal entre aoferta e a procura por força de trabalho diminuie muito o valor pago pelo serviço. [.. .j. O desemprego e a concentração fundiária nesses estados é grande, proporcional ao fluxo de pessoasque precisam sair de suas casas e rumar parafora em busca de serviço. Nesse momento, aparece o gato, contratando mão-de-obra a serviçodo fazendeiro. (OIT, 2005b, p. 41)
Assim podemos compreender as raízes e razões daexistência continuada do trabalho escravo, contrariando anormas trabalhistas, pois: "Devemos trazer à lembrança,em primeiro lugar, que hoje existe liberdade de trabalho,pois não impera a escravidão ou a servidão, sendo as parteslivres para contratar, salvo em relação a disposições daordem pública." (PINTO MARTINS, 2005, p. 96) Essas disposições de ordem pública podem ser encontradasno artigo 7° da Constituição da República Federativa doBrasil- CF, espalhadas na Consolidação dos Leis deTrabalho - CLT, e nas várias Convenções da OIT, especificamentenas Convenções n° 29 (1930, ratificado peloBrasil em 1957) e n° 105 (1959, ratificado pelo Brasil em1965) ambos tratando do enfrentamento e abolição dotrabalho forçado. É fundamental ressaltar que o direito dotrabalho, segundo alguns doutrinadores, está arraigado epode ser resumido em seis princípios fundamentais, pelosquais a importância deste ramo de direito peloenfrentamento do tráfico de pessoas, pode ser compreendido ainda melhor:
(a) princípio da proteção
[podendo ser subdividido em: (i) o in dúbio pro
operário; (ií) o da aplicação da norma mais favorável ao trabalhador; (ííí) o da aplicação da condição mais benéfica ao trabalhador};
(b) princípio da irrenunciabílídade de direitos;
(c) princípio da continuidade da relação de emprego;
(d) princípio da primazia da realidade
[i. e. são privilegiados os fatos, a realidade darelação de trabalho, sobre a forma ou a estrutura do contrato};
(e) o princípio da razoabilidade;
(f) princípio da boa-fé. (AMÉRICO PLÁRODRIGUES, 1999, apud PINTO MARTINS,2005, p. 96)
No Brasil o enfrentamento do tráfico de pessoaspara fins do trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura inclui estratégias de repressão, prevenção e atenção às vítimas, e naprática se traduz em, como veremos mais adiante: (1)checar denúncias; (2) propositura de ações civis públicas e coletivas; (3) fomentar restrições ao crédito;(4) identificação da cadeia produtiva; (5) e até a desapropriação de terra (OIT, 2005b).
O ponto de partida são os chamados Grupos Móveis de Fiscalização, que checam denúncias in loco, libertam trabalhadores em condição análogo à de escravo e autuam os fazendeiros, conforme os procedimentos dos artigos 626 a 634 da Consolidação das Leis deTrabalho - CLT. A propositura de ações civis públicase ações coletivas depende desse esforço preliminar realizado pelos Grupo Móveis, compostos por auditoresfiscais do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE,agentes e delegados da Polícia Federal e procuradoresdo Ministério Público do Trabalho - MPT.
A ação civil pública, de àcordo com o artigo 3° daLei n° 7.34311985 (Lei daAção Civil Pública), pode resultar na condenação em dinheiro ou no cumprimento dealguma obrigação de fazer ou não fazer. A ação civil pública é um mecanismo processual que tem por objetivo agarantia de quaisquer direitos ou interesses difusos oucoletivos, conforme dispõe o artigo 1°, inciso IV, acrescentado pela Lei n° 8.07811990 (Código do Consumidor- CDC). Artigo 81, inciso I do CDC define os direitosdifusos como ''[. ..] os transindividuais, de naturezaindivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadase ligadas por circunstâncias de fato", enquanto os direitoscoletivos, segundo inciso 11, são "[...] os transindividuais,de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoriaou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base". Ou, em outras palavras, os direitos difusos e coletivos: "Pertencem ao grupo
e não podem ser exercidos e defendidos senão pelo grupo ou em seu benefício." (THEODORO JÚNIOR, 2008,p.544)
A ação civil pública pode ser proposta pelo Ministério Público, pela União, pelos Estados, Municípios e por associações civis, considerando os critériosda artigo 5°, incisos I e 11 e parágrafos 1° a 6° da referida lei. No caso de trabalho escravo uma eventualcondenação em dinheiro para pagar uma indenizaçãopelo dano causado é revertida para o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e nunca diretamente ao trabalhador lesado, conforme artigo 13° da Lei da AçãoCivil Pública.
A ação civil coletiva, por sua vez, tem sim comoobjetivo obter indenização por dano moral para as vítimas individualmente ou em grupo, de acordo comos artigos 91 a 100 da Lei nO 807811990 (CDC). Tratase da tutela dos chamados direitos individuais homogêneos, possibilitando indenizações individuais, poissão definidos em artigo 81, inciso III como "[...] osdecorrentes de origem comum". "Em suma, não sepode confundir defesa de direitos coletivos (objeto daação civil pública) com defesa coletiva de direitos (realizável pela ação coletiva de consumo em prol dostitulares de direitos individuais homogêneos)."(THEODORO JÚNIOR, 2008, p. 544)
O Ministério Público do Trabalho e a Justiça doTrabalho, cujas competências para reprimir crimescontra a organização do trabalho são reconhecidas,conseguem condenações trabalhistas que resultam em,cada vez maiores, indenizações em dinheiro.
Neste mesmo contexto é bom lembrar que o tráfico de pessoas (artigos 231 e 231-A do Código Penal), tradicionalmente lO referia-se às mulheres indo e vindo do exterior, tão somente para fins de prostituição,não diferenciando entre prostituiçãoll forçada de um lado,e a prostituição autônoma e/ou voluntária de outro lado.O trabalho escravo, na prática, refere-se ao homem nocampo, sendo cada vez mais comum a condenação daqueles que se utilizam de mão-de-obra escrava no pagamento de indenizações em dinheiro. Mas na exploraçãoda prostituição, na qual a maioria são mulheres, este caminho é quase!2 impossível:
De acordo com Camargo,'3 procurador federaldo trabalho e membro do CONATRAE, o resgate dos trabalhadores escravos foi aplicado comsucesso assim corno o seguro desemprego(pago pelo estado) [através do MP 74 de 23 deOutubro de 2002 que altera a Lei n° 7.99812002}e as indenizações trabalhistas (muitas pagaspelos antigos empregadores). Vítimas de outrasformas de tráfico de pessoas - onde nenhumaforma regular de trabalho pode ser detectada,no caso do trabalho forçado de profissionais do
sexo - são tradicionalmente consideradasdesprotegidas pelas progressistas leis trabalhistas brasileiras. Contudo, as profissionais do sexopodem pedir compensações, como qualqueroutro, através das longas e custosas ações civis, baseado na condenação penal. Embora oagencíamento da prostituição seja ilegal, as prbfissionais do sexo, no entanto, deveriam de alguma forma buscar indenização trabalhista emcasos de violação, considerando que a aplicação da jurisprudência aparentemente tambémhonra as reclamações trabalhistas daquelesempregados no setor ilegal, como no jogo dobicho.(GAATW, 2007, p. 97, tradução nossa)
Devem ser mencionados também as chamadasmedidas econômicas para reprimir escravagistas. Nestesentido o MTE, no uso da sua atribuição conferidapelo artigo 87, parágrafo único, inciso 11, e tendo emvista o disposto no artigo 186, incisos III e IV, da CF,implantou, através da portaria n° 540, de 15 de outubro de 2004, o "Cadastro de empregadores que tenhammantido trabalhadores em condições análogas à deescravo".
Esta chamada lista suja é atualizada semestralmente pelo MTE, com base no artigo 2° da referidaportaria: "A inclusão do nome do infrator no Cadastroocorrerá após decisão administrativa final relativa aoauto de infração lavrado em decorrência de ação fiscal em que tenha havido a identificação de trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo."O artigo 4°, parágrafo 1° define ainda que: "A exclusão do nome do infrator do Cadastro ficará condicionada ao pagamento das multas resultantes da ação fis-.cal, bem como, da comprovação da quitação de eventuais débitos trabalhistas e previdenciários."
Em 2 de outubro de 2008, a lista suja continha osnomes de 206 empregadores que exploravam trabalhadores nas suas propriedades rurais. Como resultado dessa tática, os empresários e companhias mencionadas nalista suja não recebem empréstimos de bancos públicos,como o Banco do Brasil, o Banco do Nordeste do Brasil,o Banco daAmazônia, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social- BNDES (e ainda algunsbancos privados). Interessante é a classificação da listasuja, pela própria OIT (2005b), como medida de re
pressão ao trabalho escravo, reconhecendo assim que,embora que sejam medidas de caráter administrativa enão penais, servem para reprimir o tráfico de pessoas,algo bastante inovador:
Além da restrição ao crédito, a divulgação dasuiistas sujas" criou uma base de trabalho paraas instituições governamentais e não-governamentais que atuam na repressão à escravidão,
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fomentando assim a criação de outros mecanismos como os que podem ser vistos a seguir.[.. .} Identificação da cadeia dominial das propriedades rurais [. ..} Identificação da cadeia produtiva do trabalho escravo [i.e. alertarao varejo, atacadistas, exportadores e indústria para que nãoadquiram produtos que podem ter utilizado mãode-obra escrava] (OIT, 2005b, p. 62-64)
Por fim, como última prática de enfrentamento dotrabalho escravo, deve ser lembrado que em 2004, comuma decisão judicial sobre desapropriação de uma fazenda por trabalho escravo, abriu-se um importante precedente não só para o enfrentamento à escravidão modernae à superexploração do trabalho, mas também para aefetivação da função social da propriedade no Brasil e daprópria reforma agrária. O artigo 5°, inciso XIII e, maisespecificamente artigo 186 da CF afirma que a funçãosocial da propriedade é cumprida quando a propriedaderural atende, simultaneamente, aos seguintes critérios:
I) aproveitamento racional e adequado;
11) utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
111) observância das disposições que regulamas relações de trabalho;
IV) exploração que favoreça o bem-estar dosproprietários e dos trabalhadores. (grifo meu)
No caso exemplar comentado, a situação de reincidência em trabalho escravo na fazenda CastanhalCabaceira, foi considerada tão extrema que o governodecretou a sua desapropriação para fins de reforma agrária. "A reforma agrária [artigo 184a 191 da CF] éconsiderada por entidades da sociedade civil e setores do governo federal como um dos mais importantes instrumentos de prevenção ao trabalho escravo." (OIT, 2005b, p.108, grifo meu)
3.3 ABORDAGEM PENAL: AS MUDANÇASTRAZIDAS PELA LEI Nº 11.106/2005
O Código Penal Brasileiro - CP, que se referiaapenas ao tráfico internacional de mulheres para fins deprostituição, criminaliza, desde 28 de março 2005, também explicitamente o tráfico interno de pessoas, aplicando-se também a homens. Os novos artigos (Artigo 231 e231-A do CP)l4 podem ser encontrados na Parte Especial, Título VI, Dos Crimes contra os Costumes" e tutelam, segundo Luiz Regis Prado (2003) e Delmanto (apudSUIAMA, 2005) a moral pública sexual, e não, comomais modernamente e com referência à Constituição se
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costuma dizer (SUIAMA, 2005), a dignidade da pessoahumana ou a liberdade ou autonomia (sexual). Os artigosreferem-se somente a uma modalidade do tráfico de pessoas, sendo o tráfico para fins de prostituição. Enfatiza-sena legislação nacional o tráfico de pessoas para a finalidade de prostituição, sem o foco mais específico utilizadopelo Protocolo Anti-Tráfico Humano da exploração daprostituição de outrem.
Os Artigos 231 e 23 l-A não levam em conta a diferença entre prostituição forçada de um lado, e, a prostituição autônoma e/ou voluntária do outro lado. Isto importa porque a prostituição autônoma no Brasil não écriminalizada e constanaClassificação Brasileirade Ocupações do Ministério de Trabalho e Emprego - MTEcomo item 5198: Profissionais de Sexo (MTE, 2008).Na verdade: "O Código Penal Brasileiro, datado de 1940,considera a prostituição como crime, não para a prostituta, que não se insere em nenhum crime, mas para osGhamados agentes (hotel, cabaré, donos de bordeis), assim como para qualquer outrapessoa inserida na industriado sexo" (LEITE, 2000, p. 11).
Em outras palavras: facilitar alguém (por exemplodisponibilizarum empréstimo para a compra de uma passagem) a exercer a prostituição autônoma no exteriorpodeser tipificado como tráfico de pessoas, mesmo que hajapleno e verdadeiro consentimento de uma prostituta autônoma (PISCITELLI, 2006, p.65).
Além disto, os artigos 231 e 231-A do CP não dizem respeito às outras modalidades de tráfico humanoprevisto no Protocolo. Embora não explicitamenteintitulado como tráfico de pessoas, muitas dessas outrasmodalidades estão, em parte, tipificadas em outros artigos do CP ou estão previstas em leis especiais (ver Tabela 1).
As referidas mudanças no Código Penal,introduzidas pela Lei n° 11.106 (adotada em 29 de Março de 2005), foram feitas um ano depois do Brasilratificar o Protocolo Anti-Tráfico Humano (29 de Janeiro de2004). A ratificação deu ao Protocolo (que entrou emvigor no Brasil em 28 de Fevereiro de 2004) pelo menos 15 o mesmo status legal como uma lei ordináriainfraconstitucional, assim como a mais recente, apesar demais restrita, Lei n° 11.106. Conseqüentemente, existemdois instrumentos legais sobre (parcialmente) o mesmoassunto, não sincronizados entre eles (GAATW, 2007).
As recentes modificações introduzidas pela Lei n°11.10612005, claramente mostram que o entendimentodo conceito de tráfico de pessoas no Brasil continua limitado e controvertido.
Importante, para mostrar o valor acrescido muitorelativo da Lei n° 11.10612005, é o seguinte:
De fato, a legislação brasileira já penaliza a exploração da prostituição através dos Artigos 228
a 230 do Código Penal. Portanto, o Artigo 231-A,que define o tráfico interno de pessoas, é redundante e pode ser considerado conseqüentemente algo apenas para "inglês ver". Além disso, esseartigo não criminaliza a ofensa de "exploraçãoda prostituição", mas refere-se à "promoção efacilitação da prostituição". (GAATw, 2007, P 89,tradução nossa)
3.3.1 CRIMES CORRELATOS
Como fora mencionado, os artigos anti-tráfico 231e 231-A do CP não tipificam nenhuma outra modalidadede exploração referida no ProtocoloAnti-Tráfico Humano como o trabalho ou serviços forçados, escravatura oupráticas similares à escravatura, a servidão ou a remoçãode órgãos ou qualquer outra forma de exploração sexual.Algumas destas práticas são, parcialmente ou integralmente, consideradas crimes em outros artigos do CP ou emleis especiais (ver Tabela 1), e os mais importantes serãoconsiderados a seguir.
O artigo 149 do CP (reduzir alguém a uma condiçãode trabalho análoga a escravidão) tutela (pRADO, 2003)a liberdade pessoal e implica afronta insanável ao princípio da dignidade da pessoa humana, de índole constitucional (artigo 1°, inciso UI da CF).
O artigo merece atenção, considerando sua alteração pela Lei n° 10.803 de 11 de Dezembro de 2003.Antes, artigo 149 era capaz de cobrir diferentes tipos deexploração análoga à de escravidão (que poderia incluir ocasamento servil), porém em 2003, seu escopo foi limitado para condição análoga ao trabalho escravo.
Fato é que a OIT (2005b) confirmou que no Brasilninguém foi preso por explorar mão de obra escrava:
É verdade que houve um número maior de julgamentos desfavoráveis ao réu do que apenasnesses casos. Contudo, devido ao longo tempode tramitação do processo na Justiça, ele acaba prescrevendo, a condenação é anulada e oproprietário rural permanece como réu primário.A lei número 109 [sic., trata-se do artigo 109 doCP] do Código Penal especifica o prazo para aprescrição de um crime. O cálculo considera otempo entre o momento da denúncia do Ministério Público e a sentença do juiz. Isso não seriaum problema caso fosse dada a pena máximaprevista (oito anos), o que implicaria um prazode prescrição de 12 anos. Nesse espaço, dificilmente não haveria tempo para o julgamento eos recursos. Porém, normalmente a Justiça optapela pena mínima, de dois anos. De acordo coma legislação, se o processo durou quatro anos eo juiz deu dois, o crime prescreve. (OIT, 2005b,p.105)
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Além disto duas esferas judiciais, a estadual e a federal (esta última baseada no artigo 109, inciso VI da CF),defendem que o julgamento dos crimes contra o trabalhoescravo são da sua competência. "As instâncias judiciaissuperiores não têm chegado a um consenso se ela deveficar com a Justiça Federal ou com as Justiças Estaduais."(OIT, 2005b, p. 53) "Aindefinição é antiga e tem sido umdos principais fatores que dificultam o combate à impunidade, a ponto de haver juristas que pedem uma definiçãourgente, para qualquer um dos lados. Se todos reivindicam a competência para o crime, na prática, ninguém atem." (OIT, 2005b, p. 105-106)
A Emenda Constitucional n° 45 de 8 de dezembrode 2004, que, entre outros, acrescentou o inciso V-A c/cparágrafo 5°, do artigo 109, da CF, o Procurador-Geralda República pode, perante o Superior Tribunal de Justiça - STJ, em qualquer fase do inquérito ou processo,suscitar o deslocamento de competência para a JustiçaFederal, porém apenas em casos concretos de grave violação de direitos humanos. A chamada "federalização doscrimes contra os direitos humanos", na prática, somenteacontecerá desde que, reconhecidamente, a esfera estadual não tenha conseguido dar respostas satisfatórias aoproblema. Em outras palavras: a Emenda Constitucionalnão significa que agora todos os casos de trabalho escravo serão enviados para a esfera federal; cada caso seráanalisado separadamente.
Vale lembrar, que: "A OIT entende o tráfico de pessoas para fins de exploração sexual comercial e trabalhoforçado como uma agressão à dignidade humana e umagrave violação dos direitos humanos fundamentais e dotrabalho." (OIT, 2008, p.1, grifo meu). Além disto, o então Secretário-Geral da ONU, KofiAnnan, em 2 de agostode 2002 já afirmou publicamente que o tráfico de pessoasé "uma das maiores violações de direitos humanos dehoje." (ONU, 2002, p. 1, grifo meu)
A solução mais estrutural para acelerar os julgamentos dos crimes do artigo 149 do CP, porém, aparece numadefinição clara da competência da Justiça Estadual ouFederal (OIT, 2005b).
O artigo 206 do CP, podendo ser encontrado naParte Especial, Título IV, "Dos Crimes contra a Organização do Trabalho" tutela, segundo Luiz Regis Prado(2003) o interesse público na permanência dos trabalhadores no país e criminaliza o recrutamento fraudulentodos traballiadores para a finalidade de emigração. Segundo o doutrinador "recrutar" seria atrair, aliciar, sendoindispensável que o recrutamento seja exercido mediante fraude (falsas propostas de trabalho ou de salário),caso contrário a conduta será atípica.
O artigo 207 do CP também pode ser encontradono mesmo Título IV, "Dos Crimes contra a Organizaçãodo Trabalho" e tutela, segundo Prado (2003), evitar o
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êxodo de trabalhadores no território nacional. Refere-seexplicitamente ao aliciamento (sem fraude), e no seu parágrafo 1° (acrescido pela Lei n° 9.777 de 29 de dezembro de 1998), especificamente ao aliciamento mediantefraude ou cobrança de qualquer quantia dos trabalhadores para transportá-los dentro do território nacional. Visto que a lei usa o temio "trabalhador" no plural, Prado(2003) entende que seja necessário para a configuraçãodos crimes dos artigo 206 e 207 do CP, sempre o recrutamento de pelo menos três trabalhadores.
Mesmo que, segundo Prado (2003) os artigos visam proteger o trabalhador contra sua exploração econômica, estes podem ser considerados exemplos clássicos da função controladora do "Estado Novo" (19371945) idealizado por Getúlio Vargas, uma vez que oCódigo Penal brasileiro data de 7 de dezembro de 1940.Os artigos claramente não visam a proteção do trabaIbador individual, sendo necessário pelo menos trêstrabalhadores para configuração dos crimes.
Incompreensível é o fato do legislador, atravésda Lei n° 9.777/1998, ter continuado a considerar crime o aliciamento (recrutamento) sem fraude de trabalhadores com o fim de levá-los de uma para outra localidade no território nacional. Além de um afronta àliberdade de locomoção (artigo 5°, inciso XV da CF eartigo 13, inciso 1 da Declaração Universal dos Direitos Humanos) revelando intenções de políticas migratórias restritivas, significa ainda que as chamadas agências de emprego ou recrutamento parecem incorrer nocometimento de um crime, quando recrutam alguémpara trabalhar em outra localidade.
A Lei n° 9.434, de 4 defevereiro de 1997, alteradapela Lei n° 10.211 de 23 de março de 2001, no seu artigo14 proíbe a remoção de órgãos de uma pessoa viva ou deum cadáver, contrário aos procedimentos legais. No entanto, o artigo 9°, declara que, de acordo com a lei, épermitido à pessoa juridicamente capaz, após autorização judicial, dispor gratuitamente de tecidos, órgãos epartes do próprio corpo vivo, para fins terapêuticos oupara transplantes, se isso não implicar em qualquer riscopara sua saúde ou integridade física do doador.
É importante frisar que em contraste ao ProtocoloAnti-Tráfico Humano da ONU, nenhum desses crimesmencionados acima emprega o termo "exploração" comoelemento descritivo do seu tipo penal. Conseqüentemente, o escopo prático desses artigos para aplicação em casosde tráfico de pessoas, mesmo sendo possível, será limitado. Além disto, as vítimas dos crimes acima mencionados, não serão consideradas vítimas de tráfico de pessoas. Condição que, segundo diversas normas internacionais (como artigo 6° do Protocolo Anti-Tráfico Humanoda ONU) urge o Brasil a oferecerproteção especial, comoainda veremos.
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Finalizando, a recente Lei n° 11.690, de 09 de junho de 2008 e a igualmente recente Lei n° 11.719, de 20de junho de 2008 trazem uma série de mudanças importantes para o Código de Processo Penal - CPP, masaqui ressaltamos, em específico, as inovações trazidas nosnovos artigos 201 e 387, ambos do CPP, que, como veremos, melhora consideravelmente a posição da vítimanoprocesso penal:
Art. 201. Sempre que possível, o ofendido seráqualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seuautor, as provas que possa indicar, tomando-sepor termo as suas declarações.
§ 1Q Se, intimado para esse fim, deixar de comparecer sem motivo justo; o ofendido poderá serconduzido à presença da autoridade.
§ 2Q O ofendido será comunicado dos atos processuais relativos ao ingresso e à saida do ,acusado da prisão, à designação de data para audiência e à sentença e respectivos acórdãos quea mantenham ou modifiquem.
§ 3Q As comunicações ao ofendido deverão serfeitas no endereço por ele indicado, admitindose, por opção do ofendido, o uso de meio eletrônico.
§ 4Q Antes do início da audiência e durante a suarealização, será reservado espaço separadopara o ofendido.
§ 5Q Se o juiz entender necessário, poderá encaminhar o ofendido para atendimentomultidisciplinar, especialmente nas áreaspsicossocial, de assistência jurídica e de saúde,a expensas do ofensor ou do Estado.
§ 6Q O juiz tomará as providências necessáriasà preservação da intimidade, vida privada, honra e imagem do ofendido, podendo, inclusive,determinar o segredo de justiça em relação aosdados, depoimentos e outras informações constantes dos autos a seu respeito para evitar suaexposição aos meios de comunicação. (Alterado pela Lei n° 11.690/2008)
Art. 387 - O juiz, ao proferir sentençacondenatória:
IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando osprejuízos sofridos pelo ofendido (inciso IVacrescido pela Lei nQ 11.719/2008)
Assim ojuiz, ao proferir sentençacondenatória, deverá fixar valorminimo (sem que o artigo estipula limite máximo) para reparação dos danos causados pela infração,considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido, a se-
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rem constatados no procedimento do novo artigo 201 doCPP. Esta previsão legal tem escopo na necessidade deagilizar a indenização por danos materiais e morais da vítima de um ilícito penal (ALVES GOMES AGUIAR,2008).
É ressaltado que o novo artigo 387 do CPP nãoimpede que a vítima mova ação civil indenizatória (ochamado ação civil ex delito), nos termos dos artigos63 a 68 do CPP. A inovação decorre do fato da sentença penal condenatória transitada em julgado, que antes desta mudança já era um título executivo judicial(artigo 475-N, inciso II do Código de Processo Civil- CPC c/c artigo 935 do Código Civil- CC), agoratambém fixará o valor mínimo indenizatório o quefacilitará sua execução, pois agora não será mais necessário liquidar a sentença penal ainda ilíquida naesfera civil (artigo 475-A a 475-H do CPC).
Vale observar que o parágrafo 5° do novo artigo201 do CPP, prevê proteção especial para a vítima(atendimento multidisciplinar, especialmente nas áreas psicossocial, jurídica e de saúde), porém acondiciona ao bem-entender do juiz. Quanto à assistência jurídica, esse deve ser entendido, pelo menos,como complementar aos artigos 268 a 273 do CPP,que prevêem a possibilidade do ofendido (ou seu representante legal) assistir o Ministério Público através da chamada "assistência à acusação".
Entretanto, o parágrafo 1° do novo artigo 201 (parágrafo único do antigo artigo 201) do CPP ainda pressupõe uma obrigatoriedade do ofendido na colaboração no processo criminal, mesmo que a Política Nacional, declare como um dos seus princípios a "proteção e assistência integral às vítimas diretas e indiretas, independentemente de nacionalidade e de colaboração em processos judiciais" (artigo 3°, inciso IIIdo anexo do decreto 5.948/2006, grifo meu).
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PROTOCOLO ANTI-TRÁFICO DE PESSOAS DA ONU
Tabela 1': Convergências e Divergências entre o Crime do Tráfico de Pessoas no Brasil econforme o Protocolo Anti-Tráfico de Pessoas da ONU
O Protocolo Anti-Tráfico Humano da ONU no seuartigo 3°, alínea (a), define o tráfico de pessoas como:
[...Jo recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas,recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, aoengano, ao abuso de autoridade ou à situação
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4. NORMATIVA INTERNACIONAL
4.1 O PROTOCOLOANTI-TRÁFICO HUMANO DAONU E A SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE
"A vítima, como regra geral, dentro da responsabilidade decorrente da culpa, deve provar os elementosconstitutivos do ato ilícito para obter a reparação do dano."(VENOSA, 2004, p. 614). A produção dessas provasda responsabilidade civil, porém, não é fácil, principalmente para umavítima de tráfico de pessoas, uma vez queem muitos casos o aliciador e o explorador não são asmesmas pessoas, além da reclamação de muitas vítimasde que seus pertences foram confiscados pelos exploradores. Por fim, o custos processuais de uma ação civilindenizatória, além de assistência advocatícia necessária,podem impossibilitar, na prática, o acesso à justiça paraum vítima de tráfico de pessoas - mesmo que existe apossibilidade, dificilmente de ser encontrada na prática,de acionar a defensória pública e invocar a gratuidade dejustiça.
Já vimos no parágrafo anterior outras duas possibilidades independentes e complementares para que umavítima!6 de crime de tráfico de pessoas ou qualquer outrocrime possa obter reparação de danos:
(I) a fixação de valor mínimo para reparação dosdanos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido, na sentença penalcondenatória transitada em julgado, conforme artigo387, inciso IV do CPP, sendo assim um titulo executivo judicial líquido e certo, sendo aplicáveis, de imediato, os artigos referentes ao cumprimento da sentença(artigo 475-1 a 475-R do CPC);
(2) a propositura de uma ação civil ex delito (artigos 63 a 68 do CPP), pelo ofendido, na sentença penal condenatória transitada em julgado, sendo assimum título executivo judicial certo (artigo 475-N do CPCc/c 935 do CC), ainda necessitando de liquidação (artigo 475-A a 475-H do CPC). Neste contexto vale ressaltar quando o titular do direito à reparação do danofor pobre (artigo 32, parágrafos 1° e 2° do CPP) a execução da sentença condenatória (artigo 63 do CPP) oua ação civil (artigo 64 do CPP) será promovida, a seurequerimento, pelo Ministério Público.
Uma pessoa traficada (independentemente daresponsabilidade criminal ou não do réu, conformeartigo 935 do CC) ou qualquer outra pessoa que foilesada nos seus direitos, pode propor uma açãoindenizatória, sendo aquela fundamentada na responsabilidade civiL Artigo 927 do CC, neste sentido, reza:"Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causardano a outrem, fica obrigado a repará-lo".
Os conceitos de perdas e danos e indenizaçãopodem ser encontrados no artigo 5°, incisos V e X daCF, mas também no artigo 12, e ainda nos artigos 402a 405 e 944 a 954, todos do Cc. Os mencionados artigos podem fundamentar uma ação civil indenizatóriapor danos matérias e/ou morais. Importante frisar queartigo 206 § 3°, inciso V do CC determina um prazode três anos para prescrição da pretensão para reparação civil.
Além do prazo de prescrição existem outros obstáculos como a necessidade de provar a responsabilidade civil ou dever de indenização, composta por quatro ekmentos essenciais: (I) ação ou omissão da agente; (2) dano; (3) nexo causal; e (4) culpa. Faltando algum desses elementos, desaparece o dever de indenizar (VENOSA, 2004).
A ação é o elemento subjetivo da responsabilidade civil, no sentido de que é sempre um sujeito quepratica o ato ilícito causador da responsabilidade civil, por meio de uma ação ou omissão.
O dano é o elemento objetivo da responsabilidade civil, caracterizado como o resultado causado pelaação do réu. O dano pode ser material ou moral, atingindo, portanto, a esfera patrimonial ou extrapatrimonial do sujeito lesado. Importante ressaltar quesem o dano, que deve ser quantificado, mesmo havendo ato ilícito, não existe obrigação de reparação.
O nexo causal é o elemento lógico da responsabilidade civil, caracterizado pela relação de causa e efeitoentre a ação ilícita do agente e o resultado danoso a umterceiro. Deve existir essa relação de causa e efeito paraque haja o dever de reparar, i.e., que a ação seja a causae que o dano seja o efeito daquela.
Porfim, a culpa (subjetiva), caracteriza-se nas modalidades de negligência, imperícia ou imprudência. Quando o réu quis o resultado, a culpa é objetiva, no direitocivil, assim englobando o dolo. E ainda existem os casosespecificados em lei ou quando as atividades desenvolvidas pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscopara os direitos de outrem, em que a responsabilidade éobjetiva, independentemente da culpa do agente (artigo927, parágrafo único do CC).
3.4 ABORDAGEM CIVIL: REPARAÇÃO DE DANOS
O que não é considerado tráfico de pessoas pelo ProtocoloAnti-Tráfico de Pes-
soas da ONU
- Redução à condição análoga à de escravo(artigo 149 do Código Penal)- Aliciamento de trabalhadores para fins deemigração (artigo 206 do Código Penal)- Aliciamento fraudulento de trabalhadores deum local para outro do território nacional (artigo207, §1° do Código Penal)- Entrega de filho menor a pessoa inidônea(artigo 245 do Código Penal)- Subtração de incapazes (artigo 249 do CódigoPenal)- "Venda" de criança ou adolescente (artigo 238do Estatuto da Criança e do Adolescente)- Tráfico internacional de criança ou adolescente (artigo 239, parágrafo único do Estatuto daCriança e do Adolescente)- Remoção ilegal de órgãos (artigo 14, Lei n°9.434/1997 e Lei n° 10.211/2001)- Dominação (sexual) por um homem(H"casamento servil) (indiretamente protegidopelo artigo 10, inciso lU; artigo 5°, incisos 1,11 elU; e artigo 226, §5° da Constituição Federal etambém, por exemplo, por artigo 147 (ameaça);artigo 148 (seqüestro e cárcere privado); artigo213 (estupro); e artigo 216-A (assédio sexual)todos do Código Penal, também quando o autoré casado com a vítima
O que é considerado tráfico de pessoas pelo
Protocolo Anti-Tráfico de Pessoas da ONU
Oqueécriminalizado,bem comoconsideradoexpl icitamentetráfico de pessoas pela legislação penalbrasileira
...Iu;~mOz...11------~ Oqueéw criminalizado,a.. porém nãoO explicitamente'5. considerado« tráfico de~ pessoas pela(5 legislação penal~ brasileira
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de-vulnerabilídade ou à entrega ou aceitação depagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridadesobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, aservidão ou a remoção de órgãos. (ONU 2000apud BRASIL, 2004)
Assim temos umanorma penal não incriminadora (emrazão da não vinculação a uma pena), que deve orientaras normas penais incriminadoras sobre tráfico de pessoas17. Neste caderno, porém, é importante enfocar nas violações de direitos humanos, que podem anteceder (ascausas do tráfico de pessoas) ou suceder (as conseqüências do tráfico de pessoas) a este crime. Muitos estudosdizemrespeito a esta última questão, mas é raro encontrarum estudo jurídico que relaciona as violações de direitoshumanos ao campo das causas do tráfico de pessoas, também o campo mais fértil para se pensar medidas preventivas.
Nesse mesmo contexto, já tratamos da diferençal8
entre pessoas vulneráveis e pessoas em situaçâo devulnerabilidade. Mas além do termo ter uma importãncia sociológica e social-econômica, no Protocolo AntiTráfico Humano também ganhourelevãnciajurídica.
Inusitado é o uso do termo "situação devulnerabilidade", como um dos meios que, quando empregado, invalidaumeventual consentimento (inicial) dadopela vítima. Lembramos que o artigo 3°, alínea (b) do ProtocoloAnti-TráficoHumano, reza que:
O consentimento dado pela vítima de tráfico depessoas tendo em vista qualquer tipo de exploração descrito na alínea (a) do presente Artigoserá considerado irrelevante se tiver sido utilizado qualquer um dos meios referidos na alínea(a). (ONU 2000 apud BRASIL, 2004)
Em outras palavras, recorrer à situaçâo devulnerabilidade tem uma grande relevãncia jurídica,porque é um dos meios que vicia o consentimento deuma pessoa adulta, e por isto merece atenção e umamaior explicação. Uma pessoa adulta em situação devulnerabilidade que inicialmente acredita na promessa e aceita a proposta, para posteriormente ser explorada, deve ser considerada traficada, por ter seu consentimento inicial induzido. Isto significa que recorrer à situação de vulnerabilidade de uma potencial vítima é um dos meios aliciadores utilizados por 'traficantes de pessoas'.
O artigo 3°, alínea (a) do Protocolo mencionavários meios aliciadores, dentre os quais a situação de
vulnerabilidade parece ser o meio 'resíduo', que dependede uma análise de caso a caso: somente quando nâo há
"ameaça ou uso da força ou outras fonnas de coação,rapto, fraude, engano, abuso de autoridade ou a entregaou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter oconsentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração", é que pode haver umaanálise sobre se, no caso concreto, recorreu-se a umasituação de vulnerabilidade no momento em que a pessoatraficada foi recrutada. Presume-se então que é essenciala avaliação das circunstâncias concretas de cada caso,em especial a situação de vulnerabilidade (ou não) da pessoa traficada, o que supõe uma grande sensibilidade e umprofundo entendimento do profissional..
O ProtocoloAnti-Tráfico Humano não define o quedeve ser considerado situação de vulnerabilidade. '
Nas notas aos trabalhos preparatórios dos nego~
ciadores do Protocolo Anti-Tráfico Humano, porém,
pode sim, ser encontrada a seguinte definição:[...J'abuso de situação de vulnerabilidade é entendida como significando qualquer situação emque a pessoa em causa não tem outra alternativa real e aceitável senão submeter-se ao abusoem questão.' (ONU, A/55383, Add.l, parágrafo63, apud UNODC, 2003b, p. 26).
Essa "definição" afirma a necessidade de umaanálise de caso a caso, uma vez que utiliza termos subjetivos como "alternativa real e aceitável". A definição nos trabalhos preparatórios reconhece que a linhadivisória entre o término da autonomia de uma pessoa e o começo da sua exploração, é traçado diferentemente por cada pessoa. Exatamente porque a situação de vulnerabilidade, embora tenha contornos objetivos, é uma situação subjetiva de vulnerabilidade(BOBEIO, 1992).
Porém, existem critérios mínimos e máximosestabelecidos na normativa internacional e nacional,que delimitam, de fonna mais objetiva, uma situaçãode vulnerabilidade. Para encontrar esses contornosobjetivos, podemos recorrer a outros instrumentos dedireitos humanos na normativa internacional, fazendo jus ao princípio da interdependência dos direitoshumanos (PIOVESAN, 2007). ADeclaraçâoJ9 da ONUSobre os Direitos das Pessoas Pertencentes a Minorias Nacionais ou Étnicas, Religiosas e Lingüísticas(ONU, 1992), mesmo não definindo o que é exatamente uma minoria, identifica duas característicasfundamentais, sintetizadas de maneira especialmenteoportuna pelo sociólogo português Boaventura de Souza Santos: "[...] as pessoas e os grupos sociais têm odireito a ser iguais quando a diferença os inferioriza, eo direito a ser diferentes quando a igualdade osdescaracteriza." (SANTOS, 1997, p. 122).
É bom ressaltar que a igualdade não está oposta à .diferença e sim à desigualdade. Diferença mantém ~ela-
ção direta com diversidade e se opõe àpadronizaçâo, a'tudo o mesmo' .Assim os princípios da nâo-discriminaçâo e igualdade não derrogam o direito de ser diferenteou vice versa. Ou, em outras palavras: a obrigação de
. reconhecer as diferenças entre as pessoas, não significarl!negação de seus direitos universalmente reconhecidos.
Para entender melhor o valor agregado do tema dasminorias para a compreensão da situação devulnerabilidade, é necessário voltar às pessoas emquestão: aquelas pertencentes a minorias e pessoas emsituação de vulnerabilidade. O conceito de minoriaserá, agrosso modo, o genericamente aceito pela ONU:
Grupos distintos dentro da população do Estado, possuindo características étnicas, relígiosasou Iíngüísticas estáveis, que diferem daquelasdo resto da população; em princípio numericamente inferiores ao resto da população; em umaposição de não dominância; vítima de discriminação (MARIZ MAIA, 2008, p.1).
Assim definidas, pessoas pertencentes a minorias, muitas das vezes, estarão em uma situação devulnerabilidade, porém, nem sempre. A recíproca também' é verdadeira: uma pessoa em situação devulnerabilidade nem sempre pertence a uma minoria.As características das pessoas pertencentes a uma minoria são, como vimos, estáveis - as característicasétnicas até são fixas - e por isto não necessariamentedetenninam uma situação de vulnerabilidade, que pordefinição, como vimos, deve ser considerada uma situação temporária, causada por razões externas20
• Daíconfirma-se a dificuldade em generalizar o conceitoda situação de vulnerabilidade.
Mas é necessário um alerta, uma vez que não podeser objetivamente definida o que é uma situação devulnerabilidade. Pode-se, enquadrar nela visõesprotetivas e emancipatórias, mas também visões repressivas e conservadoras, desqualificando o indivíduo pela sua incapacidade de poder consentir ou autodeterminar-se por simplesmente estar em uma situação de vulnerabilidade. Pois o Protocolo possibilita ainterpretação de que quem consente, estando em umasituação de vulnerabilidade, deve ser consideradatraficada.
Um outro prisma a ser utilizado para uma análisecorreta, caso a caso, de uma situação devulnerabilidade, ou a identificação de uma pessoa quese encontra nela, é o reconhecimento do direito à proteção especial. Esta proteção especial pode estar contida nos inúmeros tratados, convenções, pactos, protocolos, ou acordos internacionais tratando sobre direitos humanos de determinados grupos ou coletividades, alguns ratificados pelo Brasil. Quando existe umtratado de direitos humanos que se refere a um grupo es-
Volume 1
pecífico ou coletividade de pessoas, isto na verdade é umreconhecimento pelacomunidade internacional de que essegrupo de fato precisa de proteção especiaFl.
Logo depois da Declaraçâo Universal dos Direitos Humanos (1948), começou o chamado processo de'juridicização" visando transfonná-laem um tratado internacional que fosse juridicamente obrigatório e vinculanteno âmbito do direito internacional. Esse processo foi concluído em 1966 com a elaboração de dois tratados internacionais, sendo o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, conjuntamente com a Declaração Universal denominados: International Bill ofRights. (PIOVESAN, 2007). Depois, muitos outros documentos em relação à matéria passaram a tutelar determinados grupos tidos como vulneráveis (ou melhor: emsituação de vulnerabilidade) e, ainda, outros relativos adetenninadas violações, até então não tuteladas peloordenamento existente. Existem, porexemplo22, instrumentos internacionais e regionais tratando dos direitos humanos da mulher, da criança, contra todas as formas de discriminação racial e dos direitos do trabalhadormigrante edos membros da sua família23 .
Na visão do Norberto Bobbio na sua clássica obraA Era dos Direitos (1992) o processo de "multiplicaçãode direitos":
[. ..J envolveu não apenas o aumento dos bensmerecedores de tutela, mediante a amplíação dosdireitos a prestação (como os direitos sociais,econômicos e culturais), como também a extensão da titularidade de direitos, com o alargamento do próprio conceito de sujeito de direito, quepassou a abranger, além do indivíduo, as entidades de classe, as organizações sindicais a coletividade, os grupos vulneráveis e a própria humanidade. Esse processo implicou ainda aespecificação do sujeito de direito, tendo emvista que, ao lado do sujeito genérico e abstrato, delineia-se o sujeito de direito concre·to, visto em sua especificidade e naconcretude de suas diversas relações.(BOBBIO, 1992, apud PIOVESAN, 2007, p. 184,grifo meu).
4.2. O IMPACTO JURíDICO DO PROTOCOLOANTI-TRÁFICO HUMANO NO DIREITO INTERNO BRASILEIRO
Até a recente modificação na Constituição Federaldo Brasil (Emenda Constitucional n° 45, de 8 de Dezembro de 2004), houve um intenso debate jurídico no Brasilcom foco no status legal dos tratados internacionais ratificados pelo Brasil. Particularmente se os tratados de direitos humanos têm, ou não têm status de norma Constituci-
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,..,,-------~
Cadernos Projeto TRAMA
onal.Primeiramente o ProtocoloAnti-Tráfico Humano (ra
tificado pelo Brasil em 29 de Janeiro de 2004) deve serentendido como umtratado de direitos humanos (OFFICEOF THE UNITED NATIONS HIGH COMISSIONERFOR HUMAN RIGHTS, 2008). Porém não foi aprovado pelo Congresso Brasileiro através do, naquelemomentoainda inexistente, procedimento especial Constitucional doartigo 5°, parágrafo 3° (que estipula que apenas tratadosinternacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasilterão status constitucional quando aprovados duas vezespelas duas Câmaras por três quintos do quorum).
Assim o Protocolo, no âmbito interno, deve ser considerado, pelo menos, como uma lei ordinária federal (CAPEZ, 2006, p. 245-246; PIOVESAN, 2007,p. 72). "Pelo menos", porque Flávia Piovesan (2007)entende que os tratados de direitos humanos ratificados anteriormente à Emenda Constitucional n° 45/2004, contaram com ampla maioria na Câmara dosDeputados e no Senado Federal, excedendo, inclusive, o quorum dos três quintos dos membros em cadacasa, porém somente provados em um único turno devotação. Ela continua defendendo, com razão. o seguinte:
Uma vez mais, corrobora-se o entendimento deque os tratados internacionais de direitos humanos ratificados anteriormente ao mencionadoparágrafo, ou seja, anteriormente à EmendaConstitucional n. 45/2004, têm hierarquia constitucional, situando-se como normas material eformalmente constitucionais. Esse entendimento decorre de quatro argumentos: a) a interpretação sistemática da Constituição, de forma adialogar os §§ 2Q e 3Q do art. 5Q
, já que o últimonão revogou o primeiro, mas deve, ao revés, serinterpretado à luz do sistema constitucional; b) alógica e racionalidade material que devem orientar a hermenêutica dos direitos humanos; c)a necessidade de evitar interpretações que apontem a agudos anacronismos da ordem jurídica;e d) a teoria geral da recepção do Direito brasileiro. (PIOVESAN, 2007, p.73).
Sendo, pelo menos, uma lei ordinária federal surge a pergunta, meramente teórica, se o Protocolo AntiTráfico Humano da ONU poderia ter sido revogadotacitamente pela Lei n° 11.10612005, já comentada,uma vez que lex posterior derogat legi priori (o quesignifica que uma lei mais nova do mesmo tema substitui a antiga quando as duas encontram-se em conflito). A Lei nO 11.106/2005 implicitamente coloca delado o Protocolo Anti-Tráfico Humano da ONU? Isto,claramente, nunca foi o pretendido e não pode ser aceito, especialmente quando consideramos a posteriorPolítica NaciOlíal de Enfrentamento ao Tráfico de
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Pessoas, promulgada pelo decreto presidencial n°5.94812006, que define tráfico de pessoas em seu artigo 2°, fazendo referência direta à definição do Protocolo.
Além disto, Piovesan, afirma: "Logo, na hipótese de eventual conflito entre o Direito Internacionaldos Direitos Humanos e o Direito Interno, dota-se ocritério da prevalência da norma mais favorável à vítima" (PIOVESAN, 2007, p. 101), "salvando" aqui oProtocolo Anti-Tráfico Humano.
4.3. REPRESSÃO, PREVENÇÃO E ATENÇÃOÀS VíTIMAS DO TRÁFICO DE PESSOAS NOPROTOCOLO ANTI-TRÁFICO HUMANO DAONU
O próprio Protocolo Anti-Tráfico Humano daONU, mesmo sendo inovador em trazer uma definição universal do tráfico de pessoas, e devendo ser considerado um tratado internacional de direitos humanos, faz parte de uma convenção "mãe" que objetiva arepressão da criminalidade organizada transnacional.Esse chamada Convenção de Palermo tem por objetivo promover a cooperação a fim de prevenir, investigar e reprimir mais eficazmente a criminalidade organizada transnacional (artigos 1° e 3°) e visa globalizara resposta aos crimes envolvendo:
·grupos criminosos organizados (artigo 2°, alínea(a) c/c artigo 5°);
·branqueamento de capitais produto de crime (artigo 6° e 7°);
.corrupção (artigos 8° e 9°) e obstrução à justiça(artigo 23);
·e/ou aos crimes graves (artigo 2°, alínea (b)), casosejam de natureza transnacional (artigo 3°, parágrafo2°) e envolvendo grupos criminosos organizados (artigo 2°, alínea (a) c/c artigo 3°, parágrafo 2°, alínea(b)) (UNODC, 2003a).
Mesmo sendo louvável a repressão dos crimescontra os direitos humanos, esta não necessariamenteserá a estratégia mais efetiva de enfrentar o tráfico depessoas, que acima de tudo é uma conseqüência deproblemas sócio-econômicos estrnturais, do mercadocapitalista e suas leis de oferta e demanda, e ademaisum resultado da globalização e das desigualdades.Como repetidamente apontado, o tráfico de pessoasdeve ser entendido como causa e conseqüência de violações de direitos humanos e por isso, a repressãocriminal em si só não resolverá o problema, pois estará principalmente atacando os sintomas do problema.Sem um enfoque de protagonismo e empoderamentodas pessoas em situação de vulnerabilidade para terem seus direitos humanos violados (ou para serem
traficadas), as medidas repressivas se tornarão ocas.O Protocolo Anti-Tráfico Humano da ONU, quan
to às obrigações dos estados parte que o ratificaram,pode ser dividido em quatro partes, interdependentes,sendo (UNODC, 2003c):
(1) Criminalização do tráfico de pessoas (artigos3°,5° e 11);
(2) Prevenção (artigos 9°, 11, 12 e 13);(3) Assistência e proteção às vítimas do tráfico
(artigos 6°, 7° e 8° e);(4) Cooperação (artigos 6°,8°,9°, 10, 11 e 13).Num primeiro olhar parece que o Protocolo Anti
Tráfico da ONU é bastante equilibrado, quanto a divisão de quantidades de artigos referentes à repressão,prevenção e atenção às vítimas. Porém, num segundoolhar mais detalhado, não há como evitar a conclusãoque o Protocolo, mesmo devendo ser considerado umtratado de direitos humanos, é, em essência, um instrumento repressivo de combate ao crime, com poucaatenção para a prevenção do problema e atenção àsvítimas. Assim a conotação genérica do"enfrentamento" é reduzida à simples repressão, esquecendo-se dos elementos de prevenção e atenção àsvítimas que integram o conceito mais neutro e amplode enfrentamento.
Quanto ao eixo de repressão (combate oucriminalização), este permeia quase o Protocolo todo,e não somente nos mencionados artigo 3°, 5° e 11. Arepressão também pode ser encontrado nos artigos 9°,parágrafo 1°, alínea (a), 10, 12 e 13. O combate aocrime, através de medidas repressivas de caráter criminal e de medidas de intensificação de controle nasfronteiras, segurança e controle da legitimidade e validade dos documentos, ganhou um espaço privilegiado no Protocolo Anti-Tráfico Humano da ONU. Prova disto, inclusive é o fato de várias agênciasespecializadas da ONU, ou fora dela, terem emitidosdocumentos adicionais, que especificam ecomplementam os direitos das vítimas do tráfico de pessoas2
'.
Quanto ao eixo da prevenção, o artigo 9", contém meramente obrigações de esforço para os estadosparte, ainda precisando de efetivação (normasprogramáticas), e nenhum direito líquido e certo. Assim, o parágrafo 4° do artigo 9°, reconhece a importância da prevenção englobar a erradicação das causas estruturais do tráfico de pessoas:
Os Estados Partes tomarão ou reforçarão asmedidas, inclusive mediante a cooperação bilateral ou multi/ateral, para reduzir os fatores comoa pobreza, o subdesenvolvimento e a desigualdade de oportunidades que tornam as pessoas,especialmente as mulheres e as crianças, vul-
Volume 1
neráveis ao tráfico. (ONU 2000 apud BRASIL,2004)
Os artigos 11, 12 e 13, agrupados como medidaspreventivas conforme a UNODC (2003c), referem-se,respectivamente, a intensificação de medidas nas fronteiras; segurança e controle dos documentos; e, legitimidadee validade dos documentos. Assim, a prevenção é de certa forma reduzida à iniciativas policiais de intensificaçãode controle dos documentos de viajantes e migrantes edas próprias fronteiras, de alguma forma esquecendo queo tráfico de pessoas também ocorre em casos de migração regular.
Quanto ao eixo da atenção às vítimas de tráfico depessoas os artigo 6°, 7° e 8° do Protocolo também contémmeramente normas programáticas, ainda precisandode efetivação pelos estados parte, e nenhum direito líquido e certo. Particularmente, a redação do parágrafo 3°do artigo 6°, reduz o seu conteúdo quanto iírecuperaçãofísica, psicológica e social das vítimas de tráfico de pessoas, de um obrigação de esforço para uma obrigação ocade cada Estado parte somente ter que levar "em consideração a aplicação" destas medidas. Além disto o artigo 8°visa a repatriação das vítimas de tráfico de pessoas, semabrir a possibilidade para que essas vítimas, sujeitos dedireitos, possam optar por ficar no país (ou local) ondeforam exploradas. Em verdade, uma vítima de tráfico depessoas também é (ou pelo menos era) um migrante, queprocura(va) em outra localidade a possibilidade de melhorar ou mudar o rumo da sua vida.
Nesse contexto é importante ressaltar que o Protocolo Anti-Tráfico Humano da ONU foca a atenção somente às vítimas de tráfico de pessoas, o que, na prática,deve limitar essa atenção às vítimas que foram devidamente reconhecidas como ofendidas num processo criminal que visa responsabilizar o "traficante de pessoas". Asvítimas que optam pornão colaborar em processos judiciais, ou aquelas vítimas em processos criminais que nãoresultam em uma sentença condenatória, podem ficar semproteção e assistência integral, quando não há outro mecanismo a não ser ojudiciário para a identificação de vítimas (legítimas) de tráfico de pessoas. Ademais, em nenhum momento o Protocolo Anti-Tráfico Humano daONU estende a assistência e a proteção à pessoas emsituação de vulnerabilidade para serem traficadas.
Lembramos aqui novamente, que a Política Nacional, deliberadamente amplia a "proteção e assistência integral às vítimas diretas e indiretas, independentemente de nacionalidade e de colaboração em processosjudiciais" (artigo 3°, inciso III do anexo do decreto5.94812006, grifo meu), deixando o conceito clássico eestritamentejuridico de vítima do lado.
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li!Volume 1
Noâmbitoregionaltambéméimportanteressaltarqueem16 novembro 2005 os países do Mercado Común dei SurMERCOSUR(MercadoComumdoSul-MERCOSUL,criadoem1991 eincluindoBrasil,Argentina,ParaguaieUruguai),assinaramjuntocomOJile,Bolívia,Peru,VenezuelaeEquador(os chamados Estados associados), achamadaDeclaração de
Montevidéu contra Tráfico de Pessoas, que prevê a cooperaçãopolicialeointercâmbiodeinformaçõesnesses países, comfocono tráficodepessoas (especificamentecrianças, ado1escentesemulheres)parafinsdeprostituição.A1émdaintensificaçãonocombateacrimestransnacionais,foi formalizada, naopor1unidade, aadesão desses países aoPrograma Pátria Grande, elaboradopelaArgentina,pararegularizaçãomigratóriaEm2006essadeclaraçãoganhouumsignificadomaispráticoatravésdaadoçãodo Plmw de Ação de Luta contra o Tráfico de Pessoas entreosEstadosParte do MERCOSULe EstadosAssociadas, concebidoemBuenosAireseidentificando, entreoutros,pontosfacaisemtodos os governos responsáveispelaimplementaçãodoPlanoRegional,queprevêcampanhasinfonnativas,trocadeinformações, capacitaçãodeatores governamentaisenãogovernamentais e assistências às vítimas de tráfico de pessoas. NoBrasil oPlano deAção do MERCOSULfoi recebido através da portaria n °2.167 de 7 de dezembro de 2007.
4.4.3. MERCOSUL
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
ILEGAL, 2006, p. 100-109). Gabriel Garcia, chefe daunidade de combate ao tráfico humano do Departamentode Segurança Nacional e Controle de Fronteiras dos Estados Unidos, em entrevista com a jornalista MaríliaMartins, correspondente de O Globo em Nova York, falou sobre a (falta de) efetividade das políticas migratóriasrestritivas no enfrentamento ao tráfico de pessoas:
O Brasil reduziu o número total de imigrantes ilegais para os EUA por causa da mudança de legislação mexicana, que passou a exigir vistospara brasileiros, dificultando assim o acesso àprincipal rota para entrada em território americano. [...J Mas percebemos um aumento no número de casos de vítimas de tráfico com vistasà exploração sexual. (GLOBO, 2007)
A legislação penalbrasileira, bem como a legislaçãotrabalhista e cível, não reflete o paradigmajurídico universal do Protocolo Anti-Tráfico Humano da ONU que oBrasil se obrigou a respeitar. A normativa nacional relevante não traduz de forma plena a repressão ao crime,prevenção e atenção às vítimas de tráfico de pessoas, prevista no referido Protocolo e complementada por outros
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Na esfera da Organização dos Estados Americanos(OEAlOAS) também é importante ressaltar que váriasconvenções que reconhecem direitos humanos no planoregional e das quais o Brasil é Estado parte, também tratam direta ou indiretamente da prevenção do tráfico depessoas e da assistência e proteção à pessoas traficadase pessoas em situação de vulnerabilidade para seremtraficadas.
Assim temos:·a Convenção Interamericana para Prevenir e
Punir a Tortura (1985, ratificado em 1989);·a Convenção Americana sobre Direitos Huma
nos, também chamada de Pacto de São José de CostaRica (1969, ratificado em 1992);
·a Convenção Interamericana Para Prevenir,Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, também chamada de Convenção de Belém do Pará (1994,ratificado em 1995);
·a Convenção Interamericana sobre Tráfico Internacional de Menores (1994, ratificado em 1997);
·o Protocolo Adicional à Convenção Americanasobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1988, ratificado em1999).
Importante mencionar que a ComissãoInteramericana de Direitos Humanos em Washingtone a Corte Interamericana de Direitos Humanos em SãoJosé de Costa Rica, além de receber relatórios sobre asituação de direitos humanos em estados parte da OEA,também emitem recomendações, prestam visitas inloco e recebem denúncias de Estados e de particulares (através de queixas individuais) sobre a violaçãode direitos enunciados nas referidas convenções.
Por fim, também no âmbito da OEA o Brasil deveconsiderar as conclusões e recomendações aprovadasnaprimeira Reunião de Autoridades Nacionais em Matéria de Tráfico de Pessoas no âmbito da OEA (Is1aMargarita, Venezuela, 14 a 17 de março de 2006).
No âmbito da OEA é interessante para analisar apolítica migratória restritiva dos Estados Unidos, pelabandeira de estar combatendo o tráfico de pessoas. AComissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) sobre Emigração Ilegal no seu relatório final (2006) identifica que os Estados Unidos pressionaram o Méxicopara que este pedisse um visto aos brasileiros, com oobjetivo implícito de reprimir os fluxos irregulares debrasileiros que usam o território Mexicano para entrarem território norte-americano (CPMI EMIGRAÇÃO
4.4.20EA
fissional dos fluxos de pessoas que passam por suas fronteiras.
Paradoxalmente, essas normas internacionaisprotagonizadoras, que empoderam migrantes em situaçãode maior vulnerabilidade (isto é: estar indocumentado, semos documentos e/ou visto e/ou autorização de trabalho,exigidos pelo país de destino), ainda não foram amplamente reconhecidas como medidas efetivas e eficazes deenfrentamento ao tráfico de pessoas: nenhumpaís de destino de tráfico de pessoas na Europa ouAmérica do Norte ratificou a Convenção do Trabalhador Migrante. Comcerteza isto tem haver com apolítica migratória restritiva,ou pelo menos seletiva, dos países de destino que queremconter amigração dapobreza e controlar a qualidade pro-
tados (ou até de particulares, através de queixas individuais) sobre a violação de direitos enunciados nos referidostratados.
Por fim vale ressaltar a existência de outro tratadode direitos humanos, que é muito relevante no contextode enfrentamento ao tráfico de pessoas: A ConvençãoInternacional da ONU sobre a Proteção dos Direitosde Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membrosda sua Família (1990), ainda não ratificado pelo Brasil.Essa Convenção do Trabalhador Migrante é consideradaum dos tratados de direitos humanos mais importantes esua implementação é monitorada pelo Comitê de Trabalhadores Migrantes (CMW), que inclusive recebe queixas individuais, sendo necessário que o Estado parte reconheça esta competência específica do Comitê de formaexplícita (artigo 77).
Essa convenção reconhece e protege diversos direitos dos migrantes e membros da sua família e identificaalgumas categorias especiais de migrantes. Inclusive, reconhece grande parte desses direitos (artigo 7° a 35) amigrantes indocumentados ou em situação irregular (artigos 5°, alínea (a) e (b» (ONU, 1990). Além do Preâmbul028 da referidaconvenção, hámovimentos de migrantes,organizações de direitos humanos e organizações comoGAATW (2007) e Projeto Trama (2008) que acreditamque umapolítica migratória não restritiva traz benefíciospara o enfrentamento ao tráfico de pessoas. Durante oDiálogo Tripartite sobre Políticas Públicas de Migraçãopara o Trabalho (São Paulo, 25 a 28 de agosto de 2008),organizado pela 01T e a Comissão Nacional de Imigração - CNIg, do MTE, foi adotada, entre várias outraspara servirem como contribuição de políticas públicasvoltadas àmigração para o trabalho, a seguinte recomendação que sintetizaessa importância:
Considerando que políticas migratórias restritivas estimulam o tráfico de pessoas e o contrabando de migrantes, assim como, inversamente, políticas migratórias acolhedorasdesestimulam a atuação de redes criminosas.(CN/G/OIT, 2008, p. 3).
4.4.1 ONU
É importante ressaltar que vários outros tratadosinternacionais na área de direitos humanos, também chamados de convenções, pactos, declarações, protocolos,cartas, ou acordos25
, reconhecidos no plano internacionale ratificados pelo rasil, também tratam direta ou indireta'mente da prevenção do tráfico de pessoas e da assistência e proteção à pessoas traficadas e pessoas em situaçãode vulnerabilidade para serem traficadas.
Assim podem ser mencionados:·a Convenção sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação Racial (1965, ratificado em1969);
·a Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979, ratificado em 1984);
·a Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes(1984, ratificado em 1989);
·a Convenção dos Direitos da Criança (1989, ratificado em 1990);
·o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966, ratificado em 1992); e,
·o Pacto Internacional de Direitos Econômicos,Sociais e Culturais (1966, ratificado em 1992).
Como já vimos esses tratados de direitos humanostêm, pelo menos, status de lei ordinária federal, mas segundo Piovesan (2007), e outros doutrinadores, têm statusconstitucional26
•
Vale resltar que nos tratados de direitos humanos2?,
ratificados pelo Brasil e acima mencionados, foi previso acriação de Comitês, formados por especialistas nomeados e que estão encarregados com o monitoramento daimplementação das referidas convenções. Assim temos,respectivamente (siglas eminglês):
·CERD (Comitê da Eliminação da DiscriminaçãoRacial);
·CEDAW (Comitê daEliminação da Discriminaçãocontra a Mulher);
·CAT (Comitê Contra Tortura); CRC (Comitê dosDireitos da Criança);
·CCPR (Comitê dos Direitos Civis e Políticos);:CESCR (Comitê dos Direitos Sociais, Econômi
cos e Culturais.Esse monitoramento pode incluir: o recebimento de
relatórios dos Estados parte (às vezes obrigatórios); a emissão de recomendações para a implementação do referidotratado; visitas in loco; recebimento de denúncias de Es-
4.4 OUTRAS NORMATIVAS INTERNACIONAIS
Cadernos Projeto TRAMA
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Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. (Alterado pela Lei nº 11.106-2005)
Art. 231 ~ Promover, intermediar ou facilitar a entrada, no território nacional, de pessoa que venha exercer a prostituição ou a saídade pessoa para exercê-Ia. no estrangeiro: (Alterado pela Lei nº 11,106/2005)
7 Ver parág rafo 4.1.
14 Código Penal Brasileiro:
13 Luis Antõnio Camargo de Melo, Procurador do Ministério Público de Trabalho e Membro do Conselho Nacional de Erradicaçãodo Trabalho Forçado - CONATRAE, Brasília, entrevista, 19 de Setembro de 2006.
Belém tem uma população estimada em mais de 1.400,000 pessoas, dos quais mais de 400,000 são jovens na faixa etária de 16a 24 anos, Dos jovens dos municipios de Belém, Aranindeua, Marituba, Benevides e Santa Bárbara 42,5% estão fora da escola,destes 68,9%, além de não estudarem, também não trabalham (Consórcio Social da Juventude de Belém - Wapokai, Belém,2005),
11 A prostituição 'autônoma' não é proibida no Brasil, mas o fato de terceiros se aproveitarem disto é considerado crime (artigos228, 229 e 230 do Código Penal).
'" Somente através da Lei nº 11.106/2005 o artigo 231 do Código Penal que até então definiu o crime de tráfico internacional demulheres para fins de prostituição, foi alterado e agora também inclui tráfico internacional de homens (artigo 231 do Código Penal)e tráfico interno (artigo 231-A do Código Penal). Ver parágrafo 3.3.
9 A PESTRAF no estado de Rio de Janeiro foi coordenado pelo Instituto Brasileiro de Inovações em Saúde Social - IBISS eexecutado pelo Núcleo de Direitos Humanos da então Escola de Direito da UNIGRANRIO, sob a supervisão da professora EbeCampinha dos Santos.
4 http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/o_programa_bolsa_familialbeneficios-e-contrapartidas
8 "O Projeto TRAMA teve inicio em abril de 2004 com o objetivo de desenvolver ações de enfrentamento do tráfico de pessoas parafins de exploração sexual. Esta iniciativa ocorreu mediante a formação de um consórcio de quatro entidades não-governamentais:a Organização de Direitos Humanos Projeto Legal; o Instituto Brasileiro de Inovações em Saúde Social - IBISS: CRIOLA (umaorganização de mulheres afro-brasileiras); e a Universidade do Grande Rio - UNIGRANRIO, todas sediadas no estado do Rio deJaneiro e com reconhecida atuação e experiência na defesa, garantia e promoção de direitos humanos (PROJETO TRAMA, 2008).
, O apelido Protocolo de Palermo é pouco preciso porque a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional(também chamado de Convenção de Palermo e ratificado pelo Brasil em 29 de janeiro de 2004, http://www2.mre.gov.br/dai/m_5015_2004.htm acesso em 27-05-2008) conta com três protocolos adicionais: um primeiro protocolo contra o tráfico depessoas, ratificado pelo Brasil em 29 de janeiro de 2004 (http://www2.mre.gov.br/dai/m_5017_2004.htm acesso em 27-05-2008):um segundo protocolo contra o contrabando de migrantes, ratificado pelo Brasil em 29 de janeiro de 2004 (https://www.planalto.gov.br/cciviL03/_At02004-2006/2004/Decreto/D5016.htm acesso em 27-05-2008): e, um terceiro protocolo contra a fabricação e o tráficoilicito de armas de fogo, suas peças, componentes e munições, ratificado pelo Brasil em 16 de março de 2006 (http://www2.mre.gov.br/dai/m_5941_2006.htm acesso em 27-05-2008).
5 http://www,mj.gov.br/noticias/2003/julho/RLS090703-biopirataria.htm, Acesso em 02-05-2007: http://www,mj.gov.br/noticias/2003/setembro/RLS020903-pf.htm, Acesso em 02-05-2007.
1 Direitos humanos econômicos, sociais e culturais, também denominados de direitos humanos da segunda geração, sãoaqueles direitos humanos que (ao contrário dos direitos humanos civis e políticos ou da primeira geração) precisam de umaintervenção ativa do Estado para a sua realização, Exemplo: direito ao emprego e um salário digno, (PIOVESAN, 2007, p. 174-183;GUERRA, 2005, p. 189).
NOTAS
5 http://www,mte,gov,br/delegacias/palpa_relatori02005,pdf, http://www,serpro,gov,br/noticiasSERPRO/20040901_1 O,
Volwne 1
3 Conforme parágrafo 4.2.
Tráfico Internacional de Pessoas
§ 1º - Se ocorre qualquer das hipóteses do § 1º do Art. 227:
12 Nesse sentido duas jurisprudências excepcionais do Tribunal Regional de Trabalho, 18' região (Goiás) merecem um estudomais aprofundado, sendo Processo TRT RO-01401-2005-101-18-00-6 de 22 de fevereiro de 2006 e Processo TRT - RO - 007792006-111-18-00-0 de 31 de Outubro de 2006, respectivamente disponivelem:http://www.trt18.gov.br/pls/site/jurisp_show2?p_idrecord=63634&p_word1=reconhecimento&p_word2=vincu lo&p_word3=p rostituição (Acesso em 10-11-2008)e http://www.trt18.gov.br/pls/site/jurisp_show2?p_idrecord=71 023&p_word1 =reconhecimento&p_word2=vínculo&p_word3=prostituição (Acesso em 10-11-2008).
nar a repressão ao crime, prevenção e atenção às vítimasde tráfico humano mais efetivas, ampliando suaaplicabilidade para qualquer modalidade de tráfico humano. Instrwnentos jurídicos que têm a possibilidade de incentivar o protagonismo das pessoas traficadas e aquelasem situação de vulnerabilidade para serem traficadas, visando a afirmação dos seus direitos humanos. Lembramos das possibilidades já existentes, o mais relevantes,que inclusive poderiam ter seu escopo ampliado: a açãocivil pública; a ação civil coletiva; o seguro desemprego; aindenização trabalhista; a federalização dos crimes contraos direitos hwnanos; a assistência à acusação; reparaçãode danos no processo penal30
; e, a responsabilidade civilobjetiva.
Porém, a maior barreira que o enfrentamento ao tráfico de pessoas provavelmente tem como desafio a superar, é precisamente descrita na seguinte sentença: "Ape~ar da legislação brasileira de tráfico de pessoas neGessitemelhoramento, a preocupação maior é que leis, em geral,não têm efetividade." (GAATW, 2007, p. 88, traduçãonossa) É por isto, que o instrumentário jurídico disponível, seja nos âmbitos nacional e/ou internacional, tem deser empregado na efetivação dos direitos humanos daspessoas traficadas e aquelas em situação de vulnerabilidadepara serem traficadas, independentemente de serem reconhecidas num processo criminal como vítima.
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[i Cadernos Projeto TRAMA
I';i tratados internacionais de direitos hwnanos que o Brasil
ratificou. Mesmo considerando as inovações na aplicação da legislação trabalhista no enfrentamento ao tráficode pessoas e as recentes melhorias da posição da vítima no processo penal, existem ainda várias lacunasna normativanacional, que, em alguns momentos, até estáafrontando à normativa internacional.
Como vimos a definição do tráfico de pessoas naPolitica Nacional (decreto n° 5.94812006), embora façareferência direta à definição pelo Protocolo Anti-TráficoHumano da ONU, suprime o termo consentimento, eliminando assimos elementos subjetivos, tão necessários para,por exemplo, definir a situação de vulnerabilidade, quenecessita de uma análise de caso a ca~o.
Os novos artigos 231 e 231-A do CP que dizemrespeito ao tráfico de pessoas, ao mesmo tempo, ampliam e restringem suas definições quando comparado como ProtocoloAnti-Tráfico Humano da ONU. Os dois artigos criminalizam o tráfico de pessoas para fins de prostituição, incluindo assim a prostituição autônoma e/ou voluntária, ignorando a tipificação mais restrita utilizadapeloProtocolo de Palermo da "exploração da prostituição deoutrem". Ao mesmo tempo os artigos 231 e 231-A doCP não tipificam as outras formas de tráfico hwnano previsto no Protocolo. Embora não intitulado explicitamentecomo tráfico de pessoas, muitas dessas outras formas são,em parte, crimes segundo outros artigos do CP ou espalhadas em leis especiais. O tráfico humano para fins dotrabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura ainda é tratada de forma distinta ediferente, pela legislação penal e, de certa forma, tambémpela legislação trabalhista.
A práticajurídica acerca da erradicação do trabalhoescravo no Brasil, pode trazer benefícios para umenfrentamento ampliado do tráfico de pessoas. O trabalho escravo e a prostituição forçada são problemas distintos, porém, também têm muitos aspectos em comum; e,portanto, as estratégias e metodologias de repressão, prevenção e atenção às vítimas também poderão ter algo emcomwn.
Vale ressaltar que o Protocolo Anti-Tráfico Hwnanoobriga o Brasil a adequar sua legislação penal (mas também sua legislação trabalhista e civil) à normativa internacional, algo também identificado durante o processo deconstrução do Plano Nacional de Enfrentamento aoTráfico de Pessoas (PNETP) em 2007, que identificacomo atividade n° 6A: ''Criar wn subgrupo de especialistas para elaborar proposta intergovernamental de aperfeiçoamento da legislação brasileira relativa aoenfrentamento ao tráfico de pessoas e crimes correlatos."(MINISTÉRIO DE JUSTIÇA, 2008).
Nesse subgrupo devem ser considerados alguns instrumentos jurídicos, às vezes inovadores, que podem tor
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•
Cadernos Projeto TRAMA
Pena - recrusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa. (Alterado pela Lei nº 11.106/2005)
§ 2º - Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude, a pena é de reclusão, de 5 (cinco) a 12 (doze) anos, e multa, além dapena correspondente à violência. (Alterado pela Lei nº 11.106/2005)
Tráfico Interno de Pessoas
Art. 231 ~A Promover, intermediar ou facilitar, no território nacional, o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou oacolhimento da pessoa que venha exercer a prostituição: (Acrescentado pela Lei nº 11.106/2005)
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.
Parágrafo único. Aplica-se ao crime de que trata este artigo o disposto nos §§ 1º e 2º do Art. 231 deste Decreto-Lei.
" Ver parágrafo 4.2.
16 Assim considerada pois no processo penal com sentença condenatória transitado em julgado foi identificado como ofendido.
17 Além dos artigos 231 e 231-A do Código Penal, que se referern explicitamente ao tráfico de pessoas, há outros crimes que estãorelacionados ao tráfico de pessoas, como aqueles definidos nos artigos 148, 149, 206, 207, 245, 249 do Código Penal; nosartigos 238 e 239 do Estatuto da Criança e do Adolescente; e nas Leis nº 9.434/1997 e nº 10.211/2001. Ver Tabela 1.
'" Ver parágrafo 2.2.
"O Pacto Internacional da ONU Sobre os Direitos Civis e Políticos (1966) em seu artigo 27 estipula que: Nos estados em que hajaminorias étnicas, religiosas ou lingüísticas, as pessoas pertencentes a. essas minor'las não poderão ser privadas do direito de ter,conjuntamente com outros membros de seu grupo, sua própria vida cultural, de professar e praticar sua própria religião e usar suaprópria língua.
" Ver parágrafo 2.2.
" Ver, por exernplo, parte do Preâmbulo da Convenção Internacional dos Direitos da Criança da ONU (1989): "Tendo em conta quea necessidade de proporcionar à criança uma proteção especial foi enunciada na Declaração de Genebra de 1924 sobre osDireitos da Criança e na Declaração dos Direitos da Criança adotada pela Assernbléia Geral ern 20 de novembro de 1959, ereconhecida na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no Pacto Internacional de direitos Civis e Políticos (em particular nosArtigos 23 e 24), no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (em particular no Artigo 10) e nos estatutos einstrumentos pertinentes das Agências Especializadas e das organizações internacionais que se interessam pelo bem-estar dacriança;" (grifo meu).
22 Para mais exemplos de instrumentos internacionais que fazem referência explícita aos diversos direitos humanos relacionadosao tráfico de pessoas, veja também: GAATW, 2006, p. 18-23.
" Ver parágrafos 4.3, 4.4 e Tabela 2.
24 Por exemplo: Princípios e Diretrizes Recomendados sobre Direitos Humançs e Tráfico de Pessoas (2002) do Alto-Comissariadoda ONU para os Direitos Humanos (CNUDH/UNHCHR); Recomendações de Etica e Segurança para entrevistar Mulheres Traficadas(2003) da Organização Mundial de Saúde (OMSIWHO); Diretrizes sobre a Proteção de Crianças Vítimas de Tráfico (2006) do Fundoda ONU para a Infância (UNICEF); Diretrizes sobre Proteção Internacional e Tráfico de Pessoas (2006) do Alto-Comissariado daONU para Refugiados (ACNUR/UNHCR); Aspectos de Saúde Mental de Tráfico de Pessoas - Um Conjunto de Normas Mínimas(2004) da Organização Internacional de Migração (OIM/IOM); Estratégias de Intervenção Psicossocial para a Assistência Direta aVítimas de Tráfico de Pessoas (2006) da Organização Internacional de Migração (OIM/IOM) (tradução nossa).
25 ''Têm-se apresentado vários nomes para designar tratados. [... ] A despeito dos vários nomes utilizados o que importa é aessência, ou seja, se há a produção da norma internacional proveniente do tratado celebrado." (GUERRA, 2005, p. 36)
26 Conforme parágrafo 4.2.
27 A Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (também chamado de Convenção de Palerma) e osseus três protocolos, (ainda) não contam com um Comitê ou outro órgão de monitoramento para a sua implementação.
28 O Preârnbulo da Convenção do Trabalhador Migrante: [... ] Considerando que os problemas humanos decorrentes das migrações são ainda mais graves no caso da migração irregular e convictos, por esse motivo, de que se deve encorajar a adoção demedidas adequadas a fim de prevenir e eliminar os movimentos clandestinos e o tráfico de trabalhadores migrantes, assegurando ao mesmo tempo a proteção dos direitos hurnanos fundamentais destes trabalhadores; Considerando que os trabalhadoresindocumentados ou em situação irregular são, freqüentemente, empregados em condições de trabalho menos favoráveis queoutros trabalhadores e que certos empregadores são, assim, levados a procurar tal mão de obra a fim de beneficiar da concorrência desleal; [...] (ONU, 1990).
29 Todos os instrumentos internacionais mencionados são ratificados pelo Brasil. O "R" ·seguido pelo ano indica o ano daratificação.
:w Artigo 387, inciso IV do CPP, acrescido pela Lei n° 11.719/2008.
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Volume 1
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illano de Açãoe Luta.contraTráfico deessoas (2006,2006)
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200S, R2005)
ConvençãoAmericana sobre DireitosHumanos (1969,R1992)Art, 52, se, 7!!
ConvençãointeramericanaPara Prevenir,Punir e Erradicara Violência ContraaMuiher(Convenção deBelém do Pará)(1994, R1995)Art. 2"-62
ConvençãoInteramericanasobre Tráficointernacional deMenores (1994,R1997), Art. 4, 5,7-11
Normativa Internacional
Convenção dos DIreitos da Criança(1989, R1990) e Protocolos OpcionaisArt. 16, 19, 32,'34-37
Pacto Internacionaldos Direitos Civis ePolíticos (1966,R1992)Art. 22, 32, 7".....IiP
Pacto Internacionaldos Direitos Econ~
micos, SociaiseCulturais (1966, R1992)Art, 22, 3e
Protocolo Anti-Tráfico Humano (2000,R2004) Art, 32, 52, se,§1e(a), 10-13
Art. 62 do Decreto n2 5,94812006 (PolíticaNacional)
Normativa Nacional
Art. 62 do Decreto n2 5.94812006 (PolíticaNacional)
Art, 109, V-A ele§ 52 CF(federalização
Art, 626-634 CLT Ide graves violação de direitoshumanos)
Art. 149, 206,207 CP
Portaria n2 540104 do MTE ("lista suja") Art. 147, 148,
149, 206, 207,Art. 62 do Decre- 213, 216A, 231,to n2 5,948/2006 231A, 245, 249(Política Nacio- CP;nal)
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Tabela 2: Os instrumentos jurídicos de repressão. prevenção e atenção às vítimas de tráfico de pessoas aplicáveis no Brasil
I Trabalhista Penal Cível ONU OEA IMERCOSULI \ C -d M C - IArt, 72 CF Art. SO, XLIII CF Art. 11, 12, onvençao as u- onvençao
186 187 206 Iheras (1979, R~984) Interamericanao ' eProtocoloOpcional para Prevenir e
§3-, V, 402-405, Art. 52 Punir a Tortura927, 944-954 _ (1985 R1989)CC (responsa~ Convençao contra a Art -:e-. se 12
Tortura eOutros Tra- '"bilidade civil) lamentos ou Penas
Cru~is, Desumanosou Degradantes(1984,fl1989)Art,12
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C/) ele Lei n2 1.0601 ele Lei n21.0601
m 1950 ele Lei Art 63-68, 268- 1950 ele LeiE 6.465/1977 (as- 273 (assistência 6.46511977 ele.-
ct::::: sistência jurídi- à acusação), 201, §52Cpp>C/) ca integral e . 201, 387, IV Cpp (assistência jurí-
,m gratuita)dica integrai e
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Art. 72CFereto 5.948/2006
(.)os:: (Política Nacio- Art. 52, V, X CFW nal) Súmula 37 do- Art, 52, I, 11, 81,« STJ, Súmula 562
91 a 100 da Lei Lei n2 9.807/1999 STFn° 8078/1990 (proteção às(ação coletiva) testemunhas) IArt. 11, 12, 186,
MP 74/2002 alte- Decreto 6.2311
187206 §32, V,402-405, 927, 9
rando Lei n° 2007 (programa 954 CC (respo
7.998/2002 (se- de proteção a sabilidade civil
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Pretende ainda, ctllTlprir a funç.ão de estimular a aprendizagemporém muito .mais que,r motivar pela desaprendizagem.Em sintese, este caderno visa incentivar o dehate juridicocritico, aumentando assim o ,intercâmbio de experiências,análises e estratégias de ações de enfrentamento ao tráfico depessoas cada vez mais qualificadas.
'l~~·~:iL~;=~:;:~~~~1Cé~~.l~." apre.se.nta: . f)1, . CADERNO 1 "~.f..., ~I .,. Este caderno não é tão somente destinado a operadores de direito,~ mas a todos àqueles que têm interesse na ampliação do Acesso 'à_ Justica por pessoastraf~cadas. Acesso no sentido formal do t_ processo e Justiça no sentido material para a vitima.
I,
i..••'.,·.' Não procura de forma alguma pregar uma única verdade, e sim. provocar outras percepções sob a dura realidade do tráfico deI pessoas, hem como abordar temas transversais tais como trabalho,tL fio. "~, ' generoe m~graçao.
(I,~
IO Projeto Trama, consórcio de quatro entidades não.
W governam.entais: a Organização de Direitos Humanos Projeto Legal; ,i,ilIt"•.. o Instituto Brasileiro de Inovações em Saúde Social - IBISS;c, CRIOLA, organização de mulheres negras; e o Núcleo de Direitos~ Humanos da Universidade do Grande Rio - UNIGRANRIO; entende or. tráfico de pessoas corno uma grave violação dos direitos humanos_ e como um. problema ligado à globalizaçãó e a desigualdade social,~.. hem como a questões de gênero, raça e etnia, tendo como missão, enfrentá-lo através da afirmação dos direitos humanos, de modo
a evitar a vitimização ea discriminação.