Paz e hegemonia: Uma proposta de leitura sobre peacebuilding e Virada Local Prof. Dr. Aureo de Toledo Gomes Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais Universidade Federal de Uberlândia [email protected]Introdução. O presente trabalho deve ter seu título compreendido literalmente. O objetivo nesse momento restringe-se a apresentar uma proposta de interpelação da área que hoje comumente se designa estudos críticos sobre construção da paz (peacebuilding) a partir dos aportes da teoria do discurso de Ernesto Laclau. Trata-se, portanto, de construir um preâmbulo, onde se espera apresentar as linhas gerais do argumento e explorar algumas das implicações teóricas do diálogo ora proposto. O resultado final jaz em algum momento do futuro próximo. Para tanto, o texto divide-se em três movimentos principais, excetuando-se esta pequena introdução. Na primeira seção, apresentaremos as principais características da literatura crítica sobre construção da paz, dando especial ênfase para o que se convencionou chamar virada local. A meta é discutir como tal contribuição oxigenou o debate, porém não nos esquivando de apontar as principais lacunas teóricas ainda existentes. À luz de tais insuficiências é que aportamos as ideias de Ernesto Laclau para a discussão, no segundo momento do texto. Nessa seção, o argumento desenvolve-se a partir de uma sistematização dos principais conceitos laclaunianos que informarão a análise e a subsequente derivação das teses de trabalho. Contudo, é importante destacar que, seguindo os ensinamentos de Laclau explicitados em entrevista recente (Laclau, 2015, p. 19), o intento aqui vai além de uma análise teoricamente informada. Espera-se também refletir sobre como tal
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Paz e hegemonia:
Uma proposta de leitura sobre peacebuilding e Virada Local
Prof. Dr. Aureo de Toledo Gomes
Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais
O presente trabalho deve ter seu título compreendido literalmente. O objetivo nesse
momento restringe-se a apresentar uma proposta de interpelação da área que hoje comumente
se designa estudos críticos sobre construção da paz (peacebuilding) a partir dos aportes da teoria
do discurso de Ernesto Laclau. Trata-se, portanto, de construir um preâmbulo, onde se espera
apresentar as linhas gerais do argumento e explorar algumas das implicações teóricas do diálogo
ora proposto. O resultado final jaz em algum momento do futuro próximo.
Para tanto, o texto divide-se em três movimentos principais, excetuando-se esta
pequena introdução. Na primeira seção, apresentaremos as principais características da literatura
crítica sobre construção da paz, dando especial ênfase para o que se convencionou chamar virada
local. A meta é discutir como tal contribuição oxigenou o debate, porém não nos esquivando de
apontar as principais lacunas teóricas ainda existentes.
À luz de tais insuficiências é que aportamos as ideias de Ernesto Laclau para a
discussão, no segundo momento do texto. Nessa seção, o argumento desenvolve-se a partir de
uma sistematização dos principais conceitos laclaunianos que informarão a análise e a
subsequente derivação das teses de trabalho. Contudo, é importante destacar que, seguindo os
ensinamentos de Laclau explicitados em entrevista recente (Laclau, 2015, p. 19), o intento aqui
vai além de uma análise teoricamente informada. Espera-se também refletir sobre como tal
interpelação pode eventualmente proporcionar rebatimentos teóricos que ensejem reflexões
críticas sobre a própria teoria do discurso.1
Por fim, a última seção sintetiza as ideias apresentadas e aponta os rumos do diálogo
proposto. Salvo melhor juízo, para além da potencial contribuição específica para a discussão
sobre peacebuilding e segurança internacional, espera-se igualmente que a proposta possa ser
mais uma ponte entre a teoria do discurso laclauniana e a área de Relações Internacionais.2
Peacebuilding e a Virada Local.
À luz das consequências tanto humanitárias quanto securitárias3 que conflitos civis
impõem ao sistema internacional, o debate contemporâneo sobre peacebuilding, especialmente
após os atentados de 11 de setembro de 2001 e as subsequentes controversas intervenções
militares no Afeganistão e Iraque, foi paulatinamente enquadrado a partir do que se convencionou
chamar paz liberal. Grosso modo, o argumento posto à prova relaciona a estabilidade do sistema
internacional com o regime político dos Estados e avança a hipótese de que uma vez que
sociedades liberais tendem a ser mais pacíficas tanto interna quanto em suas relações exteriores
(RUSSET; O’NEAL, 2001), a solução seria fomentar a implantação de democracias e economias
orientadas ao mercado em países saídos de guerras civis.4 Dentre os principais componentes
1 Na citada entrevista, Laclau argumentou que insistia junto a seus orientandos de tese que eles não deveriam se limitar a escrever simplesmente análises empíricas, mas que o empirismo tem de estar a serviço de uma reformulação teórica. O conselho vai adiante: (...) baseado em estudos concretos, deve-se repensar a teoria e, com base na teoria, devem ser formuladas perguntas concretas (Laclau, 2015, p. 19).
2 Até o momento, a utilização de aportes laclaunianos em Relações Internacionais é pequena. No exterior, destacamos os trabalhos de Methman (2010), Herschinger (2012), Renner (2014) e Solomon (2015). No Brasil, temos as contribuições de Resende (2012), Gomes (2012; 2014) e Nilson (2012). Ademais, quando em caixa alta, Relações Internacionais refere-se ao campo do conhecimento. Em minúsculas, relações internacionais faz referência ao conjunto de fenômenos sob investigação.
3 As consequências humanitárias das guerras civis referem-se, sobretudo, às mortes de militares e civis assim como o fluxo de refugiados fruto dos embates. Por sua vez, as consequências securitárias aqui apontadas fazem referência especialmente a como tais conflitos civis impactam a rationale estratégico-militar de países e organismos internacionais como, por exemplo, a associação entre os chamados Estados Falidos e a proliferação do terrorismo transnacional. Para uma ampla revisão sobre ambas consequências, sugere-se Newman (2014), particularmente os capítulos 2 e 3.
4 Este argumento bebe na fonte da teoria da Paz Democrática, famosa na área de Relações Internacionais especialmente durante os anos 1990. A principal ideia desse corpo teórico é construída a partir do que se afirma ser uma constatação objetiva: historicamente, democracias não guerrearam entre si. Uma revisão da literatura sobre o tema pode ser encontrada em Chan (1997).
dessa chamada paz liberal teríamos promoção democrática, Estado de Direito, boa governança,
promoção dos direitos humanos e reformas econômicas liberalizantes.
Contudo, a paz liberal encontra-se em crise (COOPER, 2007). Os problemáticos
legados das já citadas intervenções no Afeganistão e Iraque, assim como a qualidade da paz
produzida na Bósnia, Kosovo, Timor Leste, entre outros países, seriam os principais sintomas do
fracasso do projeto liberal de reconstrução pós-conflito. Frente a tal estado de coisas, o debate
político e acadêmico sobre o tema circunscreveu basicamente três grandes posicionamentos
(GOMES, 2013).
Primeiramente, os reformistas não disputam o conteúdo político-ideológico da
chamada paz liberal, porém questionam sua operacionalização em campo, isto é, o que deve ser
repensado é a forma e o timing para se transplantar as reformas em tela. Em segundo lugar, as
críticas estruturais interrogam o peacebuilding a partir do próprio funcionamento do sistema
internacional e interpretam tal expediente como uma ferramenta para a manutenção do status quo.
Por fim, e certamente uma das principais contribuições recentes na discussão sobre construção
da paz, temos o que se convencionou chamar virada local, foco central deste trabalho.
Em linhas gerais, para uma compreensão mais acurada das complexidades
usualmente envolvidas na construção da paz em situações pós-conflito, aonde atores
internacionais tencionam introduzir novas formas de organização política e social em sociedades
com histórias próprias de práticas políticas e sociais, autores e autoras alinhados à esta
perspectiva criaram os conceitos de ordem política híbrida e/ou paz híbrida (Clements et al, 2007;
Mac Ginty, 2011; Richmond, 2011).
Inspirados por insights oriundos da literatura pós-colonial, sobretudo de autores como
Homi Bhabha (1994) e Nestor Canclini (1995) e suas ideias de hibridismo e hibridização,5 os
argumentos desenvolvidos até o momento avançam a ideia de que nessas atividades o que ocorre
é um tipo de interação entre agentes internacionais e atores locais cujo resultado final é uma forma
negociada – ou mesmo uma subversão – do projeto liberal. No entanto, conforme recentemente
bem apontou Richmond (2014), as relações de poder que circulam nessas interações e as
subsequentes estruturas políticas que dali emergem não resultam necessariamente em formas
mais emancipatórias de paz. Em suma, podemos ter uma manutenção, ou mesmo deterioração,
de um cenário de desigualdades e violência estrutural.
5 Para uma revisão de como o conceito de hibridismo é aportado à discussão de peacebuilding, ver Peterson (2012).
Sob tal perspectiva, em termos ontológicos todos os Estados e sociedades são
fenômenos híbridos. Em termos epistemológicos, qualquer tentativa de se compreender e produzir
conhecimento sobre as dinâmicas de intervenções internacionais deve evitar, por exemplo,
conceitos problemáticos como Estados Falidos6 e centrar as atenções em como atores confrontam
e negociam suas ações, interesses e necessidades embebidos em contextos sociopolíticos
específicos. Logo, de acordo com Mac Ginty e Sanghera (2012), o hibrismo como lente para
interpretar a construção da paz oferece-nos ao menos quatro vantagens: (1) aponta-nos a
necessidade de se observar as trocas entre os atores; (2) encoraja pesquisadoras e pesquisadores
a reconhecer a fluidez entre os grupos; (3) afasta-nos de análises focadas apenas no nível das
elites e nos incentiva a levar o nível local a sério; e, por fim, (4) incentiva-nos a ir além de
abordagens institucionais e estadocêntricas.
Em termos metodológicos, ao menos duas propostas se sobressaem com relação a
como compreender tais dinâmicas. De um lado, Mac Ginty (2011) propõe um framework para
mapeamento de processos de hibridização em contextos de construção da paz a partir de 4 pontos
principais: (1) a habilidade e poderes dos agentes externos em forçar a observância (compliance)
do modelo liberal de construção da paz; (2) os incentivos externos para a instalação da paz liberal;
(3) a habilidade dos atores locais em resistir, ignorar ou se adaptar as intervenções; e (4) a
habilidade desses mesmos atores em apresentar e manter alternativas ao modelo liberal. O
esquema abaixo ilustra a proposta:
(Adaptado de Mac Ginty, 2011, p.9)
6 Dentre as principais críticas sobre o conceito de Estado Falido podemos apontar o argumento de que esta literatura tende a naturalizar a causa dos problemas nas sociedades locais e representar atores internacionais como os redentores do problemático atual estado de coisas. Para revisões da discussão sobre tal tema, ver Monteiro (2006) e Gomes (2011).
Por sua vez, considerando hibridismo como um espectro, Millar (2014) o divide em
quatro tipos ideais. Hibridismo institucional (institutional hybridity) seria a integração ou
combinação de diferentes formas institucionais de dois lugares distintos. Em situações pós-
conflito, híbridos institucionais são criados propositadamente, combinando atores locais e
internacionais numa tentativa de fomentar experiências positivas de paz. Hibridismo prático
(practical hybridity) refere-se a maneira como atores internacionais se engajam em práticas
cotidianas da população local. Hibridismo ritual (ritual hybridity) seria a mistura de símbolos e
cerimônias para formar novos rituais de ou apropriação de rituais existentes, porém com novos
propósitos. Por fim, hibridismo conceitual (conceptual hybridity) seria a combinação de ideias e
crenças sobre o mundo na mente dos indivíduos. A grande diferença desse nível de hibridismo
vis-à-vis os outros três é que este é insulado de influência e administração: mesmo atores locais
seriam incapazes de planejá-lo e administrá-lo.
A despeito de todas essas tentativas, a especificidade e o estatuto ontológico do que
estamos chamando de local ainda é um dos principais pontos de controvérsia. Grosso modo, no
corrente debate tal dimensão é discutida basicamente de três formas distintas, de acordo com
Schierenbeck (2015). Em primeiro lugar, o local é comumente relacionado às instituições locais,
isto é, governos locais e autoridades locais. Em segundo lugar, o local é também tratado como
agência local, os movimentos da sociedade civil e outros atores e como tais ações podem
contribuir ou não para processos cotidianos de formação estatal. Por fim, o local é definido como
processo que precisa ser sempre contextualizado e situado no tempo e no espaço e dentro do
qual os atores envolvidos posicionam-se e reposicionam-se entre si e vis-à-vis as atividades de
construção da paz.
Independentemente das formulações apresentadas, as mesmas não estão isentas
de contestações, muito bem sintetizadas por Paffenholz (2015). De acordo com a autora, talvez a
principal deficiência desse corpo conceitual é a construção do local e do internacional como
opostos binários, o que redunda em uma série de implicações problemáticas. Primeiramente,
temos uma frágil conceptualização dos atores primários (o local e o internacional), incluindo uma
ênfase excessiva nos atores ocidentais dentro do chamado internacional. Segundo, uma
interpretação romantizada de estruturas híbridas de governança como solução para o problema
de países saídos de conflitos. Por fim, o não-questionamento do papel das elites locais e a
sobrevalorização do papel da resistência local. Tomando de empréstimo as palavras de
Heathershaw (2013), muitas vezes assume-se que agentes internacionais pretendem sempre
dominar e/ou buscar consentimento enquanto que locais apenas resistem e/ou geram alternativas
ao modelo liberal, o que é um apriorismo bastante questionável.
Em artigos recentes, Mac Ginty e Richmond (2013; 2015; RICHMOND; MAC GINTY,
2014) tentam de alguma maneira responder a algum dos principais questionamentos endereçados
à ideia de hibridismo nas discussões sobre peacebuilding. Conforme os autores, hibridismo deve
ser visto como ferramenta para interrogar categorias e combater dicotomias preguiçosas, assim
como entender tensões políticas e resistência aos processos de construção da paz. Ademais, o
local deve ser pensado como escala, e não como categoria fixa. Entretanto, a partir de uma
perspectiva laclauniana, cremos ainda que tal resposta é insuficiente. O porquê de tal afirmação é
objeto de investigação da seção seguinte.
Discurso e hegemonia com (e contra) a Virada Local.7
Toda a construção teórica de Ernesto Laclau, sobretudo a partir da publicação de
Hegemony and the Socialist Strategy, de 1985 e escrita a quatro mãos com Chantal Mouffe,8 pode
ser entendida como um esforço intelectual com vistas a proporcionar ferramentas teóricas para a
explicação de fenômenos sociopolíticos. Dada a ambição dos autores e o complexo conjunto de
categorias desse empreendimento teórico, o objetivo desta seção é sintetizar aquelas que serão
mais diretamente mobilizadas em nosso argumento.
De forma geral, o objetivo fundamental dos autores foi a criação de uma teoria da
política como ontologia do social, ou seja, uma teoria que pretende interrogar o social como um
terreno de disputas políticas constantes para a fixação de identidades e sentidos. Segundos os
autores, qualquer apreensão da realidade demanda a inserção dos fatos físicos, naturais e
humanos em sistemas de significação que os situem e os ordenem no mundo. Decorrência disso
é que na teoria do discurso nenhum objeto tem significado a priori e as construções de sentidos
7 A sistematização da teoria do discurso aqui apresentada retoma, porém também expande, partes da síntese teórica de Laclau apresentada em Gomes (2014).
8 Após a publicação da obra em conjunto, é possível encontrar uma divisão dos trabalhos de Ernesto Laclau e Chantal Mouffe. Enquanto o primeiro procurou aprimorar suas ideias sobre discurso e hegemonia como categorias para análise da política, a segunda envidou esforços na direção da filosofia política, com especial destaque para a noção de democracia radical. Sem desmerecer a grande contribuição de Mouffe, porém reconhecendo tal divisão, é que chamaremos nosso referencial de teoria do discurso de Ernesto Laclau ou teoria do discurso laclauniana.
são resultados da constituição de campos discursivos, os quais tem caráter contingente e precário,
pois sempre serão ameaçadas por outras articulações igualmente possíveis.
Nesse sentido, são necessárias algumas considerações sobre a noção de discurso.
Primeiramente, há de se ressaltar que discurso é uma categoria teórica, não descritiva e tampouco
empírica, cuja meta é compreender as regras de produção de sentido por meio das quais um dado
fenômeno encontra seu lugar no mundo social. Em segundo lugar, discurso é uma categoria que
unifica palavras e ações, isto é, discurso é prática, visto que quaisquer ações empreendidas por
sujeitos, identidades, grupos sociais, dentre outros, são ações significativas.9 O que se nega não
é o fato de que existem objetos externamente ao pensamento, mas sim a ideia de que eles se
constituem enquanto objetos fora de quaisquer condições discursivas de emergência.
Em terceiro lugar, discurso é resultado de uma prática articulatória e esta é definida
por Laclau e Mouffe (1985) como qualquer prática que estabeleça uma relação tal entre elementos
que suas identidades sejam modificadas como resultado da prática articulatória. É também
importante frisar que a articulação, da forma como é proposta pela teoria do discurso, ocorre
sempre em torno de um ponto nodal, um signo privilegiado em torno do qual outros seriam
ordenados, e que a totalidade estruturada resultante da prática articulatória seria o discurso.
Dessa forma, a tarefa do pesquisador seria analisar o social a partir de lógicas
discursivas, cabendo-lhe compreender as regularidades de sentidos desses sistemas discursivos.
Para tanto, uma das maneiras mais eficazes para a constituição de articulações é o que Laclau e
Mouffe (1985) chamam de lógica da equivalência. Segundo os autores, se afirmamos que A e B
são equivalentes existiria obrigatoriamente um termo que não é nem A e nem B, mas que permitiria
identificar a equivalência e que impediria que os termos ganhassem objetividade. O exemplo
proposto por Mendonça (2009, pp. 157-158) é bastante didático e nos auxilia na compreensão da
prática articulatória:
Um país que passa por um governo autoritário que, ao longo do tempo, é visto como corrupto, não acolhedor de demandas de variados setores da sociedade, além de, evidentemente, não democrático, passa a sofrer uma série de resistências dos mais variados grupos sociais. Desta forma, num primeiro momento, trabalhadores dos mais variados setores laborais, estudantes, grupos sociais os mais diversos veem que suas demandas particulares não têm sido acolhidas por este governo inepto. Isoladamente,
9 Para explicar sua noção de discurso e dizer porque rejeita a distinção entre práticas discursivas e não discursivas, Laclau se ancora na ideia de jogos de linguagem de Wittgenstein e traz o seguinte exemplo (LACLAU; BASKHAR, 2003, p. 13): (...) Se eu for ali e abrir a porta, por um lado, eu quero abrir a porta, por outro, isto me força a um ato material, que é abrir a porta. A performance desse ato é o que chamo discurso; não é que o discurso produza algum tipo de efeito material, mas que o ato material de produzi-lo é o que o discurso é.
esses diversos grupos sociais demandam suas questões específicas e sentem-se frustrados pela não acolhida das mesmas, quando não o são ainda brutalmente sufocados pelo aparelho repressor do Estado. Nesse momento inicial, segundo a perspectiva da teoria do discurso, estes grupos são vistos como elementos (...). São elementos, uma vez que não mantêm qualquer relação a priori entre si, mas tão somente com o frustrante governo autoritário. Num determinado instante – a partir de um discurso comum articulador de todas essas diferenças (ponto nodal), como por exemplo, a demanda comum por democracia no contexto daquele Estado – esses grupos se articulam e passam a ser momentos (...) de uma articulação que tem, como corte antagônico, o regime autoritário10.
Além da construção de uma relação de equivalência, é possível depreender do
exemplo acima dois outros pontos. Primeiramente, temos a ideia do antagonismo: a cadeia de
equivalência entre as lutas só se tornou possível devido ao antagonismo frente o hipotético regime
autoritário. Contudo, para Laclau (2011) antagonismo não deve ser entendido meramente como o
embate entre duas identidades pré-constituídas. Para o autor, um discurso antagônico ameaça a
constituição do discurso antagonizado ao mesmo tempo em que é sua condição de possibilidade,
visto que este último só se constitui sob a ameaça da presença do primeiro. Ainda a partir do
exemplo acima podemos entender o caráter paradoxal do antagonismo: simultaneamente, a
existência do discurso antagônico, no caso o regime autoritário, tentar frear a expansão da cadeia
de equivalência, porém é a condição de possibilidade para a mesma.
Em segundo lugar, temos a ideia do significante vazio, um ponto nodal privilegiado
que teria a capacidade de aglutinar múltiplos significados a ponto de perder seu sentido inicial
justamente pelo excesso de significados incorporados e assim conseguir a adesão de um conjunto
vasto e variado de indivíduos. No exemplo acima, a demanda por democracia seria um poderoso
significante vazio, na medida em que conseguiria congregar as demandas particulares dos
segmentos da população. Contudo, a polissemia de sentidos seria limitada. Inicialmente, uma
cadeia de equivalências em torno de um significante vazio teria liberdade para se expandir, mas
uma vez estabelecido determinado núcleo, a expansão fica restrita, visto que certas relações
seriam incompatíveis com as particularidades integrantes da cadeia. Em outras palavras, a
democracia enquanto significante vazio não pode incorporar sua negação, isto é, discursos que
pretendam legitimar a exclusão (Pinto, 1999, p. 97).11
10 Além da situação hipotética criada por Mendonça (2009), a análise de Howarth (2000) sobre o Movimento Consciência Negra na África do Sul durante o apartheid (1948-1984) é outro bom exemplo que ilustra o funcionamento da lógica da equivalência e do antagonismo.
11 Laclau e Mouffe (1985) também apresentam a categoria do significante flutuante, outro ponto nodal privilegiado que seria disputado por diferentes discursos para a fixação de sentido. Igualdade, por exemplo, poderia ser entendido como significante flutuante, dado que seu sentido pode ser alterado se estiver articulado dentro de um discurso liberal ou de um discurso socialista.
Com o terreno preparado, ao arsenal teórico apresentado devemos acrescentar uma
última categoria: a noção de hegemonia. Para Laclau e Mouffe (1985), hegemonia é uma forma
de relação política que tenta estabelecer uma ordem dita universal. Dado que o terreno do social
é caracterizado por constante disputa política pela construção de sentidos hegemônicos,
hegemonia seria um projeto político particular no qual um determinado discurso sobre, por
exemplo, como o Estado, economia e sociedade civil devem se organizar consegue se impor sobre
tantas alternativas possíveis. Tal imposição seria alcançada uma vez que, ao expandir seus
sentidos mediante a construção de cadeias de equivalências, pontos nodais e significantes vazios,
o discurso condensaria outros sentidos dispersos e conseguiria enfim se apresentar enquanto
universal, porém um universal precário, dado que estaria sempre sob a sombra de outros discursos
rivais, correndo o risco de ser deslocado e substituído por outro projeto hegemônico. Em suma,
como nos diz Laclau (1993, p. 45):
Hegemonizar um conteúdo equivaleria, por conseguinte, a fixar sua significação em torno de um ponto nodal. Assim, o campo do social pode ser visto como uma guerra de trincheiras em que diferentes projetos políticos tentam articular em torno de si um número cada vez maior de significantes sociais. Da impossibilidade de se conseguir uma fixação total se derivaria o caráter aberto do social.12
Com base nas ideias apresentadas, é possível derivar quatro teses de trabalho,
oriundas do que entendemos ser a interpelação da chamada virada local a partir da teoria do
discurso, e duas possibilidades de reflexões críticas sobre a própria teorização de Laclau
pensadas a partir do objeto de estudo em tela.
1ª Tese: Interrogar as categorias híbrido/hibridismo/hibridização
Conforme supracitado, insights da literatura pós-colonial, especialmente as ideias de
hibridismo e hibridização, foram fundamentais para a construção da ideia de uma paz híbrida. Tais
conceitos foram utilizados como fundamento teórico para destacar o fato de que o fracasso da
implementação da paz liberal seria na verdade um sinal do ‘sucesso’ de clamores locais por
autonomia e da capacidade de agência de atores que até então eram vistos apenas como
12 Todas as traduções de trechos em línguas estrangeiras para o português realizadas ao longo do texto são de nossa responsabilidade e para uso exclusivo neste trabalho.
empecilhos e obstáculos a serem superados. Em suma, o híbrido enquanto lente analítica permitiu
a conceptualização de formas de paz que emergem quando estratégias, instituições e normas
internacionais colidem com as práticas cotidianas de atores locais afetados por conflitos
(Richmond; Mitchell, 2011).
Contudo, do que se tratam o híbrido, hibridismo e hibridização? Em linhas gerais,
Bhabha (1994) usa os termos para questionar a natureza dos encontros coloniais. Para o autor,
tais experiências envolveram negociação ao invés de apenas negação e alteridade e tais
estratégias de negociação seriam oportunidades para a criação de novos espaços de agência para
o sujeito pós-colonial. O que é importante salientar sobre o conceito de hibridismo, segundo o
próprio Bhabha, seria o seguinte ponto:
Para mim a importância do hibridismo não é ser capaz de mapear dois momentos originais a partir dos quais um terceiro emerge. Ao invés disso, hibridismo é para mim um terceiro espaço que permite que outras posições surjam. Este terceiro espaço desloca as histórias que o constituem e cria novas estruturas de autoridade, novas iniciativas políticas, as quais são compreendidas de forma inadequada se pensadas a partir de conhecimentos pré-estabelecidos (Bhabha, 1990, p. 211).
Por sua vez, Canclini (1995, p. xxv) define hibridização como processos
socioculturais a partir dos quais práticas e estruturas que existiam previamente, porém
separadamente, combinam-se e acabam por gerar novas estruturas, objetos e espaços. Para
Canclini, o conceito de hibridização é o central e tais processos devem ser o foco das
investigações.
Brevemente sintetizados, tais conceitos são o fundamento para afirmações como a
de Mac Ginty (2011, p.1), quando diz somos todos híbridos. Em última instância, parece-nos que
a apropriação da ideia de híbrido/hibridismo feita pelos autores e autoras alinhados à virada local
culmina em uma categoria ontológica outorgada a todos as identidades, seja tanto em termos
teóricos quanto em termos históricos. Logo, apropriando-nos dos argumentos de Parry (1987) e
Norval (1999), se o híbrido é uma categoria ontológica inescapável, alcançamos um aparente
paradoxo: uma categoria que, dentre outros pontos, veio com o intuito de recuperar a capacidade
de agência de atores marginais, aparentemente não abre espaço suficiente para teorizarmos como
nos tornamos híbridos. Trocando em miúdos, teríamos dificuldades teóricas para apreendermos a
capacidade de agência dos atores em tela.
Nessa dimensão, a utilização do híbrido demanda um corretivo teórico, o qual pode
ser buscado na ideia de articulação tal qual apresentada por Laclau e Mouffe, isto é, qualquer
prática que estabeleça uma relação entre elementos em tal medida que suas identidades se
transformem como resultado de tal intervenção. Salvo melhor juízo, embutir na discussão sobre
hibridismo tais ideias apresenta-nos ao menos duas vantagens. A primeira é trazer para a
discussão a dimensão do poder, na medida em que o híbrido pode ser considerado o terreno da
indecibilidade, em cujos contornos ocorreriam disputas para hegemonizá-lo. A segunda vantagem
é de natureza metodológica. Concordamos com as avaliações de Howarth (2009), Methman
(2010) e Herschinger (2012) de que conceitos laclaunianos como ponto nodal, lógica da
equivalência, significante vazio, dentre outros, oferecem insights interessantes para a
compreensão de como sentidos são criados e disputados durante o processo de construção de
identidades – no caso, durante contextos designados como de hibridismo e de hibridização.
2ª Tese: Quem é / O que é o local?
Decorrente da introdução das ideias de Laclau, especialmente articulação e discurso,
é possível também interrogarmos quem é ou mesmo o que é o local. Conforme citado
anteriormente, o local usualmente é tratado como instituições locais, agência local ou ainda
processos localizados. Mac Ginty (2015) recentemente propôs pensar o local de forma
desterritorializada, como atividades e processos fluídos. Contudo, ainda que se destaque o caráter
da fluidez em detrimento de eventuais essencializações, a formação ainda que provisória e
contingente de uma dada identidade local não é tratada.
Cremos ser bastante frutífero aportar à discussão a teorização laclauniana sobre
formação de identidades. Grosso modo, parece-nos possível pensar o local a partir de identidades
que se formam de maneira relacional e mediante um corte antagônico. Para além, acreditamos
que há potencial para a introdução da discussão de Laclau (2005) sobre populismo. Para o autor,
o populismo deve ser compreendido como uma lógica de constituição do político e o próprio povo
seria uma construção política que depende de um contexto específico para emergir.
Seguindo Laclau, a unidade mínima para uma experiência populista seria a
demanda,13 que pode ser entendida ora como um pedido, ora como uma reivindicação. No primeiro
sentido, demanda enquanto pedido seria algo como um requerimento realizado junto aos canais
13 Em entrevista recente (Laclau, 2014, p. 189), Laclau disse que quando uma demanda existe, ela vai ser sempre coletiva. O que pode haver inicialmente é uma sensação de insatisfação com a situação presente. Logo, não há algo como uma demanda individual e o que seria a vontade individual se construiria coletivamente.
institucionais do Estado. Aqui jaz a especificidade desse primeiro sentido de demanda: o
atendimento ou não da mesma no plano administrativo do Estado. Se a demanda é atendida, o
problema termina e ela dissipa-se. Por outro lado, se a demanda não for atendida, ela pode
estabelecer uma relação de articulação com outras demandas. Demanda enquanto reivindicação
seria, portanto, o momento em que esta passa a confrontar o Estado fora do plano administrativo
e acaba por dar origem a um corte antagônico que divide o espaço social. Por fim, o campo popular
se constitui quando uma demanda particular assume a tarefa hegemônica e passa a representar
toda a cadeia equivalencial, ainda que de forma contingente e precária. A figura abaixo é uma
ilustração gráfica desse processo:14
(Adaptado de Laclau, 2005, p. 148)
Preparado o terreno, por analogia cremos ser possível pensar o local a partir de
demandas que se relacionam de maneira equivalencial a partir de um corte antagônico. A natureza
fluída do local seria assim oriunda das dificuldades de se formar uma cadeia de equivalências,
dado que estas sempre são construções políticas contingenciais, pois dependem de contextos e
histórias particulares e precárias, assim como podem ser desafiadas por forças contra
hegemônicas.
1ª Reflexão Crítica: o corte antagônico
14 M e N na figura seriam, segundo o próprio Laclau (2005, p. 187), pontos que não podem ser articulados dentro de nenhum dos polos antagônicas e representam assim a heterogeneidade do social.
Um ponto que potencialmente pode levar a reflexões sobre o próprio arcabouço
teórico laclauniano refere-se ao corte antagônico. Não queremos questionar a natureza do
antagonismo,15 porém o que a discussão sobre peacebuilding nos leva a refletir é como precisar
o próprio momento do corte antagônico. Nesse caso, estamos frente a contextos que o
antagonismo não se dá apenas entre atores locais e o Estado. Muitas vezes, temos atores
internacionais, comumente agrupados sob a categoria paz liberal, o governo do país sob
intervenção e uma heterogeneidade de atores locais com demandas próprias.
É fato que relações internacionais não foi uma problemática privilegiada por Laclau.
Assim, parece-nos razoável assumir que sua elaboração teórica e a própria disputa por hegemonia
tem como pano de fundo os contornos de Estados nacionais. Em tais conjunturas é verossímil
pensarmos em situações de polarização que resultam em última instância em uma lógica bipolar
que em alguma medida facilita a percepção do antagonismo. Contudo, em processos
internacionais, sobretudo de intervenções, como precisar o momento do corte antagônico? Até o
momento, cremos que compreender a constituição do local em processos de construção da paz
complexifica a análise, abrindo assim ao menos três caminhos iniciais.
Primeiramente, uma análise empírica mais profunda para que se verifique de fato a
formação do antagonismo em dois campos, com alguns elementos fora dessa estruturação. Em
segundo lugar, verificarmos se a dificuldade em precisarmos a fronteira dicotômica não seria
resultado de pressões estruturais que determinado significante recebe de cadeias equivalenciais
distintas, culminando em trazer para a análise o conceito de significante flutuante, aquele cujo
sentido é disputado por dois ou mais projetos hegemônicos (LACLAU, 2005). Por fim, talvez
tenhamos que rumar em direção a uma eventual reflexão que nos leve a pensar a possibilidade
teórica de deslocamentos profundos que resultem em mais de um corte antagônico para a
formação de identidades.
3ª Tese: Heterogeneidade social e emancipação
15 O primeiro questionamento ao antagonismo veio de Zizek (1993), que culminou em uma revisão de Laclau (1993) e a consequente introdução da categoria do deslocamento, o encontro com o Real no sentino lacaniano do termo. Para Laclau, o antagonismo seria agora o lugar ôntico privilegiado no qual uma relação de deslocamento se verifica. Uma discussão sobre o tema, que inclusive problematiza o papel do antagonismo na teoria de Laclau pode ser encontrada em Mendonça (2012).
A luz dos ensinamentos laclaunianos, há uma contradição presente na literatura
crítica sobre peacebuilding. Boa parte da discussão sobre a virada local repousa sobre uma ideia
de que o social é um campo composto por atores heterogêneos que, cada qual a seu modo, podem
ignorar, resistir ou mesmo subverter o modelo liberal de construção da paz. Contudo, a um só
tempo, apregoa-se a heterogeneidade do local associada a possibilidade de emancipação sempre
pensada no singular.16
Recentemente, Mac Ginty e Richmond (2015, p.11) argumentaram que, em termos
locais, emancipação caminharia sob uma linha tênue entre respeitar autonomia e diferença e
melhorar direitos, necessidades e os arcabouços institucionais para organização da política. No
âmbito internacional, emancipação deve equilibrar a necessidade de se intervir para salvar vidas
com a necessidade de se encontrar formas para lidar com violência estrutural e ocupações.
Ademais, em determinado momento, os autores tratam formas híbridas de paz e hegemonia como
opostos binários. Formas híbridas de paz seriam aqueles que, a partir da interação entre local e
internacional, carregam em si o potencial tanto para emancipação quanto para sustentação de
situações de violência estrutural. Por sua vez, hegemonia seriam uma situação em que
determinadas elites, nacionais e internacionais, são capazes de se manterem no poder.
Ora, a partir da teoria do discurso não é possível defender heterogeneidade do social
e uma emancipação e tampouco faz sentido utilizar hegemonia como conceito descritivo. Para
Laclau, o social é marcado por uma constante disputa entre discursos que procuram hegemonizá-
lo e são bem-sucedidos aqueles que conseguem expandir sua cadeia de significações e
condensar sentidos dispersos. Logo, não é possível pensarmos em emancipação, mesmo que a
mesma seja vista como processos amplos, tal como os autores a trabalham até o momento.17
O que temos é a possibilidade de emancipações precárias e contingentes,
dependentes das cadeias de equivalências e do discurso hegemônico no momento. Nesses
termos, a utilização da categoria de hegemonia para enfrentar tais questões relativas à
emancipação seria interessante por dois motivos principais, apontados por Mendonça (2015,
p.85): primeiro, por ser um conceito para análise do social, mas também ter capacidade de
16 Até o presente momento, Visoka (2011) é um dos poucos que questionou o fato de que emancipação pode ser algo relativo, dependendo do grupo, inclusive o fazendo a partir de insights de Laclau. Contudo, a apropriação de Laclau pelo autor é bastante restrita, apenas para embasar suas conclusões empíricas, e não para informar a análise.
17 É importante frisar que não se trata de ingenuidade dos autores o tratamento dispensado à discussão sobre emancipação. Tomando como referência temporal a fundação do jornal Peacebuilding, editado por Richmond e Mac Ginty em 2012 e considerado o marco de tais discussões, a virada local tem aproximadamente 4 anos e o centro das discussões até o momento é mais a capacidade de agência de atores locais do que possibilidades de emancipação.
prescrição normativa, na medida em que pressupõe justamente a constante instabilidade das
relações políticas concretas e das precárias tentativas de normatizar a “boa política”.
4ª Tese: Paz e hegemonia
Toda a discussão realizada até o presente momento toca em uma questão fundante
da área de Relações Internacionais: o estatuto da paz. Desde a fundação do primeiro
departamento de Relações Internacionais na universidade escocesa de Aberystwyth em 1917,
uma preocupação normativa informava os esforços dos acadêmicos ali congregados: a disciplina
estaria organizada em torno do estudo da questão da guerra, porém precisamente com o intuito
de livrar a humanidade de suas consequências, as quais ainda eram bastantes recentes após a
Primeira Grande Guerra (1914-1918).
Ao longo do período conhecido como Guerra Fria (1947-1989), diversos
desenvolvimentos acadêmicos e políticos marcaram a evolução da preocupação da disciplina com
a questão de como se evitar a guerra e, por conseguinte, se alcançar a paz. Em particular, dois
deles merecem destaque.18 O primeiro são os esforços do que se convencionou chamar Escola
de Resolução de Conflitos, liderada, dentre outros, por figuras como Kenneth Boulding. As
investigações estavam centradas em como se evitar e como terminar conflitos. Uma das ideias
discutidas seria que se a guerra é uma consequência da característica inerente do sistema de
estados soberanos, logo poderia ser evitada a partir de uma reforma de organizações
internacionais e desenvolvimento de capacidades de pesquisa e informação.
Outro desenvolvimento importante seria aquele liderado por Johan Galtung e o que
doravante se designou Estudos para a Paz. Enquanto os conflict researchers estavam
interessados em uma agenda mais restrita, preocupados em diminuir a incidência de conflitos, os
peace researchers tinham metas mais amplas e buscavam compreender quais os caminhos para
uma paz sustentável. Nessa toada, Galtung (1969) faz a famosa divisão entre paz negativa, vista
apenas como ausência de conflito, e paz positiva, aquela que procura ir além da violência direta e
ataca elementos estruturais que permitem a perpetuação da violência. A despeito de todos os
18 Para visões gerais sobre o tratamento dispensado à questão da paz em Relações Internacionais, ver Richmond (2008).
problemas e debates originados a partir da conceituação proposta pelo autor,19 em boa medida
ela ainda é referência inescapável no debate político e acadêmico da área.
Uma potencial contribuição laclauniana para o debate pode ser direcionada para as
discussões relativas ao conteúdo da paz, seja em questões relativas a conflitos civis, ou mesmo
em escala global. Há toda uma discussão normativa teoricamente informada por realistas, liberais
e marxistas20 que asseveram quais deveriam ser as características para uma paz sustentável.
Mediante a teoria do discurso, parece-nos bastante razoável afirmar que paz deve ser
compreendida como um horizonte, impossível de ser alcançado, porém sempre necessário. Paz
seria, consequentemente, uma construção radicalmente contingente, dependente de uma
configuração de forças que nada tem de natural. Paz seria, portanto, hegemonia.
2ª Revisão Crítica: Relações Internacionais em Laclau
Como afirmado acima, relações internacionais nunca foi uma preocupação central no
pensamento de Laclau. O que temos recentemente são esforços individuais de pesquisadores que
tentam, mediante os aportes da teoria do discurso, analisar temas tradicionalmente privilegiados
pela área de Relações Internacionais. Há um acumulado de análises importantes até o momento,
mas ainda não encontramos nada que se assemelhasse a uma concepção de relações
internacionais no pensamento de Laclau – se é que é possível encontrarmos uma concepção
laclauniana de relações internacionais. Há, contudo, algumas pistas interessantes que podem nos
dar subsídios para escrutinizar este tema.21
A primeira delas, e bastante recente, encontra-se em uma das entrevistas já citadas
de Laclau (2015). Em determinado momento, quando questionado sobre a relação de sua obra
com Carl Schmitt, Laclau afirma que a relação amigo-inimigo de Schmitt é primariamente uma
relação que ocorre no nível das relações internacionais, diferente de sua noção de antagonismo,
19 Dentre as críticas, argumenta-se que paz positiva seria um conceito muito amplo e que, em última instância, se torna tudo o que Galtung não gosta (Boulding, 1977, p. 84). Para outras críticas importantes à formulação de Galtung, ver Boulding (1977).
20 Grosso modo, para os realistas a paz alcançável seria aquela oriundo de um equilíbrio de poder entre potências. Para os liberais, envolveria questões relativas à interdependência comercial e expansão de valores democráticos. Com relação aos marxistas, envolveria questões de justiça redistributiva e social e a derrubada do sistema capitalista. Um resumo de como cada uma dessas perspectivas discute paz pode ser encontrada em Richmond (2008).
21 O foco aqui são passagens de Laclau. Convém, contudo, frisar que Chantal Mouffe já vem flertando com temas ligados à área de Relações Internacionais, sobretudo em seu último livro, Agonistics (2013).
mais relacionada à guerra de posições gramsciana. Um segundo momento, já em A razão
populista, temos um pequeno trecho no qual Laclau discorre sobre como devemos conceber a
História. Segundo ele, História não pode ser concebida como um avanço infinito em direção a
determinada meta. Pelo contrário, História é uma sucessão descontínua de formações
hegemônicas que não podem ser ordenadas segundo um script que transcenda sua historicidade
contingente (Laclau, 2005, p. 226). Por fim, um pouco adiante, Laclau lança mão da ideia de
capitalismo globalizado (globalized capitalism):
(...) um complexo no qual determinações econômicas, políticas, militares, tecnológicas, dentre outras – cada qual com sua lógica própria e certa autonomia – entram na determinação do movimento do todo como um todo. Em outras palavras, heterogeneidade pertence à essência do capitalismo e a estabilização parcial deste seria hegemônica por natureza (Laclau, 2005, p. 230).
Cremos ser possível afirmar que se tentarmos extrair uma concepção de relações
internacionais de Laclau ela teria, em alguma medida, afinidades ao posicionamento gramsciano.
De acordo com conhecida passagem de Gramsci (1971, p. 176):
As relações internacionais precedem ou derivam (logicamente) de relações sociais fundamentais? Não há dúvida de que derivam. Qualquer inovação orgânica da estrutura social, por meio de suas expressões técnico-militares, também modifica organicamente relações absolutas e relativas no campo internacional
Conforme afirma Cox (2007, p. 113), a afirmação gramsciana nos diz que as
mudanças básicas nas relações de poder internacional podem ser retrocedidas a mudanças
fundamentais que ocorrem nas relações sociais dos principais países de determinada conjuntura
histórica. A despeito das diferenças entre a teoria do discurso e marxismo gramsciano sobre como
se daria um processo hegemônico, parece-nos razoável assumir que Laclau concordaria com a
afirmação de que uma eventual formação hegêmonica internacional deriva de formações
hegemônicas que partem de determinados países. Para além, novamente guardadas as
diferenças entre Gramsci e a teoria do discurso, Laclau também concordaria com a ideia de Cox
(2007, p. 117) de que um Estado, para se tornar hegemônico, teria de fundar e proteger uma
ordem mundial que fosse universal em termos de concepção, isto é, uma ordem em que os
principais países no sistema a considerem compatível com seus interesses.
Em suma, ainda que em boa medida os avanços analíticos produzidos pela teoria do
discurso passem pelo aporte pós-estruturalista e psicanalítico introduzido por Laclau sobretudo
após Emancipation(s), derivar uma concepção laclauniana sobre relações internacionais nos
demandaria retornar aos fundamentos gramscianos presentes no autor22 e o colocarmos em
diálogo com todo uma tradição de economia política internacional que discute as possibilidades
teóricas e históricas de hegemonias internacionais. A própria ideia de capitalismo global posta por
Laclau - assim como seu necessário desenvolvimento teórico - poderia ser um ponto de partida
interessante, associada a discussão sobre ordens mundiais que Cox, Gill, Morton e outros
neogramscianos já realizaram.
Contudo, para além dessa avenida mais óbvia de trabalho, um diálogo deveras
importante – e talvez até mais instigante – seria entre Laclau e um conjunto de obras considerado
pós-estruturalista e pós-colonial que tratam de temas tradicionalmente ligados a Relações
Internacionais. Por exemplo, autores e autoras (Campbell, 1992; Rae, 2002; Hansen, 2006)
apontam como a própria ideia de soberania e Estado emerge de uma contraposição com o que
chamamos de internacional, além de conhecidos trabalhos que destacam como Relações
Internacionais seria apenas uma importante dimensão de nossa concepção moderna de política,
que divide o espaço entre o dentro e o fora e assim permitiria a afirmação da autoridade estatal
(Walker, 1993). Talvez com o auxílio de tais aportes, pudéssemos pensar algo como os
fundamentos retóricos da sociedade internacional,23 e mostrar que o internacional pode ser sim
compreendido - assim como o social já o é - como um terreno aonde ocorrem lutas de trincheiras
com o intuito de hegemonizá-lo.
Considerações finais
Tal como dito inicialmente, o objetivo do presente trabalho é servir como prólogo para
tarefa a ser executada proximamente. Precisamente, trata-se de interpelar um debate candente
em Relações Internacionais, toda a discussão sobre construção da paz em situações pós-conflito
a partir da teoria do discurso laclauniana. Inicialmente, quatro teses principais foram elaboradas,
derivadas a partir de contato prévio com ideias como articulação, hegemonia, significante vazio,
dentre outras, assim como duas possibilidades de refletirmos criticamente sobre a obra do autor.
Contudo, tendo como referência o espírito laclauniano, são teses contingentes, que ainda serão
postas à prova de pesquisas teóricas e empíricas mais aprofundadas. Logo, nessas considerações
22 Salvo engano, foi no âmbito da Escola de Altos Estudos em Teoria do Discurso, promovida pela UERJ durante o período de 15 de julho a 09 de setembro de 2013, que Laclau afirmou que dentre as principais influências marxistas que ainda estão presentes em seu pensamento a principal é a crítica ao funcionamento do sistema capitalista. 23 A referência aqui é, claro, ao último livro de Laclau, a coletânea intitulada The rhetorical foundations of society.
finais cabe-nos apresentar o que entendemos ser os encaminhamentos para o desenvolvimento
futuro.
O primeiro passo é uma investigação teórica rigorosa sobre o estatuto do conceito de
hibridismo e como o mesmo fundamenta a discussão crítica sobre peacebuilding. Tomamos como
referência inicial os trabalhos de Bhabha e Canclini, porém estes não são os únicos autores
informando a virada local. Michel de Certeau, James Scott e Pierre Bourdieu também são figuras
comuns nessas discussões e podem eventualmente ser trazidos para a discussão, sobretudo
quando enfrentarmos o debate sobre quem é / o que é local. Aqui, Laclau parece-nos bastante
atrativo pois, especialmente como afirma logo no início de A Razão Populista, um de seus objetivos
é atacar a natureza e a lógica da formação das identidades coletivas e parte substancial de seu
esforço teórico resultou numa série de conceitos que nos auxiliam nessa tarefa.
Uma segunda tarefa importante é revisar as análises empíricas já realizadas sobre
construção da paz. Existe uma diversa gama de trabalhos que discute a capacidade de agência
local em situações de intervenções internacionais e que nos apontam concretamente como atores
locais não só ignoram, resistem ou apresentam alternativas, mas também contribuem para a
implementação da paz liberal e/ou manutenção de situações de violência estrutural.
Esta etapa é particularmente importante dado que interessa-nos compreender de
forma mais acurada a formação do antagonismo em situações que vão além das fronteiras do
Estado. Ao menos até o presente momento, o deslocamento e o subsequente corte antagônico
que permitiriam a formação de identidades coletivas ainda é difuso e difícil de precisar. Em última
instância, o que está em jogo nesse debate é a formação de nova ordem a partir de regimes que
sofreram deslocamentos estruturais. Trata-se, portanto, de irmos ao encontro do momento do
político, no qual ordens são desafiadas e instauradas. É por esse e outros motivos, alguns deles
explicitados ao longo do texto, que cremos que o diálogo de Laclau com a área de Relações
Internacionais deve ser aprofundado.
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