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Paradigmas Tecnolgicos eTeorias Econmicas da Firma
Paulo Bastos TigreProfessor do Instituto de Economia da UFRJ
RESUMOEste artigo analisa a evoluo das teorias da firma luz das
mudanas tecno-
lgicas ocorridas em trs paradigmas: (i) a Revoluo Industrial
britnica, quedominou a economia mundial durante todo o sculo XIX e
foi a base de observa-o para a elaborao da teoria neoclssica; (ii)
o paradigma Fordista, que efetiva-mente deu origem economia
industrial; e (iii) o paradigma das Tecnologias daInformao, cuja
construo terica est baseada, principalmente nas
correntesevolucionistas e neo-institucionalistas. A anlise da
evoluo das teorias da firmae sua relao com paradigmas
organizacionais distintos mostra que no existe umcorpo terico nico
e coerente, pois as teorias esto condicionadas por
diferentesfiliaes metodolgico-tericas, enfocam aspectos distintos
(produo ou transa-o) e baseiam-se em contextos institucionais,
histricos e setoriais diversos. Con-clui que o processo de mudanas
tecnolgicas e institucionais exige que a teoriaevolua
continuamente, adotando aportes interdisciplinares e recorrendo
maissistematicamente a pesquisa emprica.
PALAVRAS-CHAVE Teorias Econmicas da Firma; Paradigmas
Tecnolgicos;Evolucionismo; Tecnologias da Informao e Comunicao
CDIGOS JEL L10; L20; O33; N60
Revista Brasileira de Inovao Volume 4 Nmero 1 Janeiro / Junho
2005
Recebido: fevereiro/2005 Aprovado: abril/2005
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Revista Brasileira de Inovao
ABSTRACTThe structure of the world industry is constantly
affected by technological
innovations and by an institutional dynamics which destroy and
create firmsand markets. Historically, the increasing speed of
these changes has demanded acontinuous reformulation of the
economic theories dealing with the firm. Thisarticle examines such
theories under the analytical framework of technologicalchange in
three paradigms: (i) the British industrial revolution which
dominatedthe world economy during the XIX century and was a
starting point to the develop-ment of the neoclassical
microeconomic theory; (ii) the fordist paradigm whichgave rise to
the industrial economics; and (iii) the information technology
para-digm, in which theories are still under development, based
mainly on evolution-ist and neo-institutionalist frameworks. The
analysis of the evolution of the theoryof the firm and its
relationships with different organizational paradigms showsthat
theories are based by different methodological affiliations, focus
on differ-ent aspects (production or transactions) and are based on
a diversity of institu-tional, sectorial and historical
contexts.
KEYWORDS Economics Theories of the Firm; Tecnological Paradigms;
Evolu-tionism; Information and Comuunications Technologies
JEL-CODES L10; L20; O33; N60
Paulo Bastos Tigre
1. Introduo
Ao examinar as teorias econmicas que estudam o funcionamento
dasempresas e dos mercados, um leitor atento ir se deparar com uma
considerveldivergncia acerca do papel das diferentes foras que
influenciam o crescimentoe os objetivos das unidades produtivas. A
reviso da literatura especializada re-vela importantes diferenas
conceituais, metodolgicas e ideolgicas entre astrs principais
correntes tericas que estudam a firma: neoclssica,
organizaoindustrial e evolucionista. O que explicaria estas
divergncias, alm do clssicoconflito entre mercado versus interveno
estatal como motor do desenvol-vimento, que divide a cincia
econmica desde os tempos de Smith e Marx?
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Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
Este artigo analisa as teorias econmicas da firma sob a tica do
contextohistrico, institucional e tecnolgico no qual foram
originalmente desenvolvi-das. As empresas e organizaes no se
desenvolvem no vazio, sendo estruturadasa partir de determinados
contextos (ou paradigmas) que sofrem sucessivas trans-formaes. As
teorias, por outro lado, tendem a estabelecer princpios e mode-los
estveis, buscando adquirir um carter cientfico essencialmente
intemporale universal. Como afirmam Shapiro e Varian (1999) a
tecnologia muda, masos princpios econmicos no. Os economistas so
freqentemente vtimas desuas prprias crenas e comprometimentos com
sistemas aceitos de pensamen-to. Em conseqncia, deixam de avaliar
adequadamente o papel de novas vari-veis, a exemplo da tecnologia,
e relutam em incorporar instrumentais analti-cos oriundos de outras
correntes do pensamento e reas da cincia.
Apesar dos economistas reconhecerem que as mudanas tecnolgicas
eorganizacionais so capazes de alterar a estrutura da indstria e o
desenvolvimentodos mercados, tais variveis no foram prontamente
incorporadas na teoria eco-nmica tradicional. A grande empresa
industrial dominou o cenrio econmicopor dcadas, at que surgissem os
primeiros questionamentos tericos acerca depressupostos neoclssicos
sobre concorrncia e deseconomias de escala que, em es-sncia,
negavam a prpria existncia das grandes corporaes. A inadequao
dateoria marginalista para explicar a estrutura da indstria foi
reconhecida somentequando as estatsticas econmicas evoluram de modo
a permitir anlises empricasdo grau de concentrao da indstria e do
aumento da produtividade.
J do ponto de vista institucional, a organizao interna da firma
foi ob-servada de forma ainda mais gradual e fragmentada,
refletindo a grande com-plexidade que a observao das empresas
apresenta na prtica. As indagaessobre a natureza de seu
crescimento, objetivos e formas de organizao depen-deram no apenas
de observaes empricas, mas tambm da acumulao deconhecimentos que
deram origem a novos conceitos. O aporte de teorias oriundasde
outras reas do conhecimento, a exemplo da biologia evolucionista,
da psi-cologia cognitiva e da administrao de empresas, permite
incorporar dimen-ses mais sutis e mais difceis de serem captadas e
incorporadas pelas teoriaseconmicas convencionais. A ortodoxia
metodolgica da teoria neoclssica li-mitou a percepo de questes
complexas diante da prpria limitao de seusinstrumentos e variveis
de anlise.
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Para compreender a relao terico-emprica, faremos uma reviso
dasprincipais teorias sobre a firma luz das mudanas tecnolgicas
ocorridas aolongo de trs paradigmas. O primeiro o da Revoluo
Industrial britnica,que dominou a economia mundial durante todo o
sculo XIX, sendo a base deobservao para a elaborao da teoria
neoclssica. O segundo paradigma oFordista, surgido nos Estados
Unidos e considerado o modelo de organizaoda produo dominante na
maior parte do sculo XX. Este foi o perodo emque efetivamente
surgiram as teorias da firma e a economia industrial. Oterceiro o
paradigma das Tecnologias da Informao, cujos impactos comea-mos a
vivenciar a partir das dcadas de 1970 e 1980 e cuja construo
tericavem evoluindo gradativamente.
A questo de como a teoria tem respondido ao processo de
transformaotecnolgica e organizacional da firma ao longo do tempo
no trivial, j queno existe um modelo nico de firma capitalista.
Mesmo em um perodo detempo delimitado existem diferentes tipos de
firmas e de configuraes de mer-cado coexistindo em um mesmo
ambiente econmico. As taxonomias so sim-ples tentativas de
classific-las e agrup-las segundo determinados critrios deanlise,
sem pretenso de cobrir toda a diversidade de firmas. Os
ambientesculturais, regulatrios e sociais so diferenciados segundo
regies, pases e espa-os econmicos unificados. O fato das teorias se
referirem a um objeto real(firmas e mercados) sugere que as
diferentes anlises esto baseadas, implcitasou explicitamente, em um
arqutipo ou tipo ideal de firma e de mercado.Focar a ateno nestes
arqutipos significa reconhecer a importncia ou sim-plesmente
privilegiar a anlise de um tipo dominante ou emergente de firma,sem
negar a existncia de outros. O foco deste trabalho como a teoria
eco-nmica responde ao processo de inovao tecnolgica e
organizacional na firma-tpica de cada paradigma e aos impactos
conseqentes na concentrao do capital.
2. A teoria neoclssica e a Revoluo Industrial britnica
A teoria neoclssica tradicional, estabelecida a partir dos
modelos de equi-lbrio geral e parcial, guarda pouca relao com a
realidade econmica atual.Sua lgica como modelo abstrato de explicao
do funcionamento do merca-do nunca chegou a ser abandonada no
ensino da microeconomia, dado que no
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se obteve um modelo alternativo que fosse to fechado e completo.
Mas suaaplicao prtica para anlise de mercados e tomada de decises
nunca logroumuito xito, apesar das inmeras tentativas de aperfeioar
a metodologia utili-zada na modelagem econmica e dos esforos para
revigorar a teoria com aincorporao de elementos da realidade
econmica.
Na teoria neoclssica tradicional, o foco de interesse permanece
vinculado teoria dos preos e alocao de recursos. A firma vista como
uma caixa-preta, que combina fatores de produo disponveis no
mercado para produzirbens comercializveis. O mercado, embora possa
apresentar situaes transit-rias de desequilbrio, tende a
estabelecer condies de concorrncia e informa-es perfeitas. A firma
se depara com um tamanho timo de equilbrio. Aspossibilidades
tecnolgicas so usualmente representadas pela funo de produ-o, que
especifica o resultado da combinao possvel de fatores. As
tecnologiasesto disponveis no mercado, seja atravs de bens de
capital ou no conheci-mento incorporado pelos trabalhadores. Por
fim, assumida a racionalidadeperfeita dos agentes, diante de
objetivos da firma de maximizao de lucros.
Neste contexto, a anlise interna da firma no constitui uma
questo rele-vante, pois em situao de concorrncia perfeita, e na
ausncia de progressotcnico, a firma teria pouca escolha a fazer.
Sua nica funo transformarinsumos em produtos, e para isso basta
selecionar a tcnica mais apropriada eadquirir os insumos necessrios
no mercado, incluindo trabalho e tecnologia.O ambiente competitivo
simples e inerte, praticamente sem incertezas.
Esta imagem de firma do sistema econmico neoclssico est baseada
nosprincpios de equilbrio geral estabelecidos pioneiramente por
Leon Walras,onde os mercados determinam preos e quantidades
produzidas e o empreen-dedor considerado apenas um coordenador da
produo. A contribuio deWalras, ao construir o modelo matemtico de
equilbrio geral, foi tentar orde-nar de forma lgica o funcionamento
da economia atravs de uma srie deequaes simultneas. Sua preocupao
com as leis fundamentais que regem aoferta e a demanda levou-o a
adotar uma modelagem matemtica onde a firmaera apenas um ponto em
sua viso sistmica da economia.
Alfred Marshall (1890), considerado o pai da Economia
Industrial, pro-curou aperfeioar o modelo esttico walrasiano atravs
das teorias de equilbrioparcial. Ele no via a economia com suas
anlises e leis como um corpo de
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dogmas imutveis e universais, mas como uma mquina para a
descoberta daverdade concreta. Marshall tinha em mente um modelo
idealizado de funcio-namento da firma, derivado de observaes
casuais, que guardava certa analogiacom a realidade das firmas
tpicas de sua poca. Ele no assumiu todos os pres-supostos do que
hoje se denomina concorrncia perfeita, como tambm noidentificou os
limites do crescimento das firmas nas deseconomias de escala.Com
slida formao matemtica em Cambridge e amplo conhecimentoemprico da
indstria britnica, Marshall procurou submeter a economia orto-doxa
a um rigoroso tratamento cientfico que at hoje constitui a base
damicroeconomia tradicional.
Apesar destas importantes constataes, a teoria neoclssica
tradicional,desenvolvida a partir do incio do sculo XX, acabou
dominada pela visowalrasiana que trata a firma como agente
individual, sem reconhec-la comoentidade coletiva, dotada de
objetivos e regras diferenciadas. Atribui firmaum princpio
comportamental nico, a maximizao do lucro, desconsiderandoo
princpio de utilidade de cada um dos agentes econmicos. A firma
neoclssicaapresenta o paradoxo de ser um ator-chave na economia,
sem ter uma dimen-so correspondente (firma-ponto) e ser passiva
(firma autmato). A firma tratada no como instituio, mas sim como
ator, com um status similar aoconsumidor individual. Um ator
passivo e sem autonomia, cujas funes seresumem em transformar
fatores em produtos e otimizar as diferentes variveisde ao. A
natureza das variveis que a firma manipula no
determinadaendogenamente, mas sim pela estrutura de mercado que se
impe a ela. Consi-derando a disponibilidade de informaes, a
perfeita capacidade de clculo e aincerteza probabilizada, a firma
se comporta como um autmato, programadouma vez para sempre.
A teoria neoclssica de competio perfeita estava mais preocupada
com osistema de preos do que com competio e organizao das firmas.
Comoafirma Demsetz (1993), a teoria tem origem no debate entre
mercantilistas edefensores do livre mercado sobre o papel do Estado
na economia. A visoliberal se apoiava na mo invisvel de Adam Smith,
que j no sculo XVIIIapontava para a caracterstica auto-reguladora
do sistema de preos. Passadomais de um sculo, a necessidade de
combater aqueles que, a exemplo de Marx,evocavam a necessidade de
planejamento central para evitar o caos econmico
Paulo Bastos Tigre
127Highlight
127HighlightA competio deve ser perfeita para o sistema de preos
funcionar. Mas, no se explica a fundamental dimenso que a
concorrencia tem nas sociedades capitalistas.
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levou os liberais a examinarem mais atentamente as condies
necessrias para osistema de preos funcionar de forma a substanciar
os argumentos de Smith.Tais condies foram formalizadas no modelo de
competio perfeita.
Assim, chegou-se a um modelo abstrato e descentralizado da
economiaque, embora sem focar propriamente a firma, tinha por base
uma viso do tipode firma dominante na Revoluo Industrial. At meados
do sculo XX, poucoseconomistas desenvolveram estudos empricos sobre
a firma. Freeman (1993),resenhando a literatura sobre pensamento
econmico e inovao, conclui que aexplicao mais comum do
negligenciamento histrico dos economistas nasquestes empricas sobre
mudanas tecnolgicas e organizacionais da firma estcentrada na idia
de caixa-preta, ou seja, de que a mudana tecnolgica estariafora da
competncia e especializao da maioria dos economistas, sendo,
por-tanto do mbito profissional de engenheiros e cientistas.
Muitas das hipteses neoclssicas sobre o comportamento das firmas
fo-ram posteriormente criticadas por autores que se defrontavam com
realidadesempresariais e tecnolgicas distintas, nas quais a teoria
se mostrava irrealista.Entretanto, observando o ambiente
institucional e tecnolgico da RevoluoIndustrial britnica do sculo
XIX, no qual se espelharam Walras, Marshall e seusseguidores,
podemos compreender melhor as bases empricas destas teorias.
Primeiro, necessrio localiz-las histrica e geograficamente. Por
volta de1880, a Gr-Bretanha era responsvel por cerca de 40% das
exportaes mun-diais de produtos manufaturados, contra apenas 6% dos
Estados Unidos. Suasuperioridade organizacional e tecnolgica se
expressava tambm por uma pro-dutividade do trabalho 14% maior do
que a estadunidense.1 Certamente omodelo de operao das firmas
tpicas desta fase da Revoluo Industrial brit-nica serviu como
referencia para as formulaes tericas neoclssicas. Alm demais
desenvolvida, a Gr-Bretanha era a ptria da maioria dos autores
econ-micos da poca, o que reforava ainda mais seu papel de modelo.
Vamos entorever as hipteses tericas que parecem espelhar a
estrutura desta indstria.
O pressuposto de que as atividades produtivas so coordenadas
pelo merca-do atomizado, onde nenhuma empresa individualmente tem
fora bastante parainfluenci-lo de forma significante, constitui um
dos dogmas neoclssicos maiscriticados desde que os oligoplios se
tornaram a fora dominante dos mercados.1 Ver Lazonick (1992).
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
127Highlight
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Entretanto, a empresa industrial britnica tpica era de fato de
pequeno porte eenfrentava dificuldades institucionais, tecnolgicas
e organizacionaisintransponveis para crescer. O modelo
institucional era a firma-propriedade,gerenciada pelos prprios
donos, geralmente uma famlia ou pequeno grupo descios. Restrita
pelos seus limitados recursos gerenciais e financeiros, a
empresatendia a ter uma nica planta, especializada em uma estreita
gama de atividades.Em conseqncia, ele tinha que recorrer ao mercado
para obter os insumosnecessrios e distribuir seus produtos. O
Estado liberal se limitava manuten-o da lei e da ordem e a cumprir
funes socais bsicas como sade pblica eeducao. No tocante coordenao
da atividade econmica, a indstria eradeixada ao sabor das foras no
reguladas da oferta e da demanda.
O modelo competitivo de pequenas empresas era reforado por um
regi-me jurdico que atribua responsabilidade integral dos
proprietrios pelas dvi-das da firma. Em caso de falncia, os
proprietrios respondiam com seus benspessoais. Embora o regime de
sociedades annimas por cotas j existisse efetiva-mente, os
sucessivos escndalos decorrentes da quebra de empresas limitaram
aaceitao pblica desta forma de organizao legal. O regime de
responsabilida-de integral limitava o crescimento da firma e
evitava a concentrao do merca-do. Alm disso, fomentava o
conservadorismo da classe empresarial avessa ariscos que pudessem
resultar em sua runa pessoal.
O uso da escala de produo como fator de aumento da
produtividadeainda no despontava como uma estratgia empresarial
tpica. Por um lado,faltavam recursos tcnicos e financeiros para
promover investimentos em equi-pamentos e desenvolver formas de
organizao que garantissem a produo emmassa com qualidade. Por
outro, a presena de economias externas em distritosindustriais
dinmicos, a exemplo de Manchester, garantia a eficincia coletivadas
empresas individuais. As economias externas, como se sabe, derivam
dadisponibilidade de fatores de produo de baixo custo no mercado, e
no deuma melhor utilizao dos recursos produtivos no interior da
firma. A esserespeito, Marshall observou que as firmas podem
usufruir economias externasquando o crescimento de uma indstria
permite diluir os custos fixos j investi-dos na economia como um
todo por um volume maior de produo. Ele reco-nhecia que economias
externas podiam ser obtidas com base na coordenaopelo mercado dos
fatores de produo (e particularmente dos fatores variveis
Paulo Bastos Tigre
127Highlight
127HighlightDemonstra que a burguesia no tinha hegemonia no
Estado.
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de produo) adquiridos freqentemente pela firma. Tais princpios
permanecemat hoje adequados para descrever a fora de distritos
industriais especializados,articulando pequenas e grandes
firmas.
Uma questo ainda mais polmica na teoria neoclssica a noo
dedeseconomias de escala. Marshall reconhece as economias de escala
proporciona-das pelo uso de maquinaria especializada e atividades
administrativas, mas limitatal benefcio a algumas indstrias e
servios. Para as demais haveria deseconomiastanto internas quanto
externas, em funo do aumento dos custos variveis comotrabalho e
insumos materiais. Os custos unitrios sobem porque o aumento
dademanda por insumos variveis pressiona seus preos no mercado
(deseconomiasexternas) e porque os recursos fixos, como mquinas e
administradores, noconseguem interagir com um volume maior de
produo com a mesma pro-dutividade (deseconomias de escala
internas), dada a dificuldade em garantirqualidade, evitar
desperdcios e atrasos e controlar a eficincia da mo-de-obra.Como
mostra a curva de custo em forma de U dos textos de
microeconomia,em algum ponto as deseconomias podem superar as
economias de escala.
Observando a informalidade dos princpios organizacionais e a
dependn-cia dos recursos externos da firma novecentista, podemos
reconhecer o realis-mo circunstancial dos princpios neoclssicos de
deseconomias de escala. O au-mento da produo dependia do aumento da
oferta externa de trabalho e ma-tria-prima, implicando um padro
rgido de localizao industrial. A grandeconcentrao regional e
setorial da indstria indicava que os empresrios depen-diam no s da
oferta de trabalhadores qualificados como tambm de umainsero
favorvel em uma comunidade de negcios. Especializada em um
seg-mento da cadeia produtiva, a firma precisava de mercados
consolidados jusantee montante para poder operar eficientemente.
medida que o mercado paraum determinado bem se expandia, o
crescimento da oferta ocorria, no tantopelo crescimento das
empresas existentes, mas principalmente pela entrada denovas
empresas no mercado (Lazonick, 1992).
Apesar dos avanos da automao em determinados segmentos da
inds-tria, havia neste modelo de organizao industrial uma escala
tpica, determi-nada pela capacidade nominal dos bens de capital
disponveis no mercado epelos modelos organizacionais vigentes. Este
fato, embora conjuntural, podeter emprestado certo realismo (ainda
que momentneo) curva de custo em
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forma de U. Inovaes organizacionais eram pouco freqentes, na
medidaque os prprios trabalhadores qualificados eram responsveis
pela definio doprocesso produtivo. Trabalhadores eram encarregados
no s de estabelecer flu-xos e rotinas como tambm de contratar
trabalhadores juniores, que eram poreles treinados e
supervisionados, reduzindo assim a necessidade de investir
emestruturas administrativas. Dada a inexistncia de recursos
gerenciais que pudes-sem ampliar os mecanismos de controle, os
empresrios tendiam a se restringir operao de uma nica planta,
facilitando a entrada de concorrentes. As bar-reiras entrada no
desempenhavam um papel to importante na estruturaodos mercados. Os
empresrios se ocupavam mais com operaes de compra evenda de insumos
e produtos do que com questes organizacionais internas. Opapel da
mudana tecnolgica na dinmica econmica, negligenciado pela teo-ria
neoclssica, era igualmente pouco importante para os empresrios
britnicosdo final do sculo passado. Ao delegar as inovaes aos
trabalhadores, a firma(ou o capital) no se apropriava diretamente
do conhecimento envolvido nadefinio do processo produtivo,
justificando a hiptese neoclssica deexogeneidade tecnolgica. A
importncia das habilidades detidas pelos traba-lhadores para o
desenvolvimento industrial era tal que, segundo Landes (1969),a
produtividade britnica s foi alcanada pela Europa continental a
partir daemigrao de mecnicos experientes da Inglaterra para estes
pases.
O final do sculo XIX, particularmente o perodo entre 1873 e
1896, foium perodo caracterizado pela deflao, com uma queda mdia
nos preos dascommodities de aproximadamente 1/3. A taxa de juros
tambm caiu, a umponto tal que, segundo Landes (1969:231), os
economistas tericos passaram aadmitir a possibilidade do capital
ser abundante o suficiente para ser considera-do um bem livre. A
noo de barreiras entrada, seja tcnica ou financeira,ainda no
poderia ser incorporada pelos economistas.
A teoria neoclssica da firma , apesar de seu aperfeioamento,
criticadapor desconsiderar fatores tcnicos e organizacionais em
favor de modelos deequilbrio. A possibilidade de variao
infinitesimal da produo, em resposta variao nos preos e na demanda,
um exemplo de supremacia do lgico emdetrimento do emprico. No
entanto, outras premissas fundamentais no pa-recem irrealistas,
quando se leva em considerao o funcionamento do modeloindustrial de
maior sucesso econmico do sculo XIX. Isso inclui o princpio de
Paulo Bastos Tigre
127Highlight
127HighlightO dominio da classe trabalhadora sobre o processo
produtivo no permitia o desenvolvimento do capital.
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concorrncia (embora no perfeita), do carter exgeno da tecnologia
(incorpora-da nos trabalhadores e mquinas), do tamanho timo de
equilbrio da firma (emum ambiente de mudana tecnolgica lenta) e de
informaes disponveis (nosredutos privilegiados dos grandes
distritos industriais).
Tais fatos, no meu entender, aliados aos precrios instrumentos
metodo-lgicos, falta de dados quantitativos disponveis na poca e a
uma certa moti-vao ideolgica, podem justificar a direo assumida
pelos desenvolvimentosiniciais da teoria neoclssica. Apesar dos
esforos para aperfeioar e dar maisrealismo ao modelo neoclssico, a
microeconomia estabelecida sobre estes prin-cpios no logrou alcanar
uma compreenso realista da firma moderna. Comojustificar, diante da
diversidade de estratgia e objetivos empresariais, a hiptesede
maximizao de lucro? Por que tratar uma entidade coletiva como a
firmacomo um mero agente individual? Como compreender a
complexidade queenvolve a questo do empreendedor dentro do restrito
princpio da raciona-lidade? Tais questes ocuparam o pensamento
econmico no sculo seguinte,provocando a diviso da teoria da firma,
como veremos a seguir.
3. Teorias da firma e o Fordismo
A teoria da firma desenvolve-se verdadeiramente a partir dos
anos 1920,com os primeiros questionamentos do realismo e da
coerncia do modeloneoclssico, abrindo uma nova trajetria terica,
desvinculada de um quadrode referncia nico e abstrato. Porm, antes
de descrever tais desenvolvimentostericos, importante compreender a
natureza das transformaes tecnolgicase econmicas ocorridas ao longo
do sculo XX. O novo paradigma, estabeleci-do a partir de inovaes
tcnicas e organizacionais, abriu uma trajetria inteira-mente nova
para a organizao interna da firma e sua interao com o
mercado,alterando a dinmica da acumulao de capital.
A histria econmica mostra que as origens e as causas do processo
deconcentrao econmica esto associadas principalmente s
inovaestecnolgicas e organizacionais. Sylos-Labini (1980),
argumenta que o capitalis-mo industrial se caracterizou por
monoplios em muitas das novas produ-es e por um domnio capitalista
sobre as corporaes de ofcios, atravs deformas de trabalho por
tarefas (putting-out system). A situao se alterou com o
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
127Highlighta batalha para defender a burguesia e aumentar seu
poder no Estado e sua legitimao entre a classe trabalhadora.
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surgimento das fbricas, dando origem a um sistema concorrencial.
Mas a situ-ao mudou novamente a partir do final do sculo XIX, em
funo de progres-sos revolucionrios nos meios de comunicao e
transporte. O surgimento dotelgrafo, das ferrovias e dos navios a
vapor permitiu a unificao de mercados(locais, nacionais e
internacionais), destruindo barreiras econmicas assentadasnos altos
custos de transportes e criando oligoplios mais estveis.
Esta viso compartilhada por Chandler (1990), para quem a origem
e ocrescimento da grande empresa moderna esto associados a uma
cadeia de even-tos interligados. O primeiro elo da cadeia foi o
cluster de inovaes inter-relacionadasque juntas provocaram a
revoluo no campo dos transportes e das comunica-es. A ferrovia e o
telgrafo facilitaram um aumento substancial tanto no volu-me quanto
na velocidade da produo. Ao mesmo tempo, as inovaes permi-tiram que
determinadas firmas concretizassem a lgica dinmica do crescimen-to
e competio pela explorao das oportunidades para obter economias
deescala e de escopo e para reduzir os custos de transao. Em
conseqncia, muitosramos da indstria se tornaram oligopolistas.
Cabe lembrar que, do ponto de vista econmico, a inovao em si, ou
seja,a primeira aplicao comercial de uma inveno, pode no
representar impac-tos significativos. Muito mais importante so a
velocidade e a abrangncia dadifuso destas inovaes na economia. A
difuso de inovaes depende de umconjunto de fatores condicionantes
favorveis, incluindo inovaes comple-mentares, criao de
infra-estrutura apropriada, quebra de resistncia de empre-srios e
consumidores, mudanas na legislao e aprendizado na produo e usode
novas tecnologias. Assim, embora a inovao abra oportunidades para
em-presas crescerem, criarem mercados e exercerem um poder
monopolista tem-porrio, somente sua difuso ampla tem impacto
macroeconmico.
Alm das revolues nos transportes e comunicaes, trs sistemas de
ino-vaes contriburam para alterar a estrutura da indstria, gerando
novos mode-los de firmas e mercados: a eletricidade, o motor a
combusto e as inovaesorganizacionais fordistas-tayloristas. Tais
inovaes contriburam tambm paramudar o centro dinmico do capitalismo
para os Estados Unidos e, em menorescala, para a Alemanha e a
Frana.
A eletricidade levou quase um sculo para se difundir como a
principalfonte de energia industrial, desde a inveno do telgrafo
eltrico em 1840 at
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a quase completa substituio dos motores a vapor e outras fontes
de energiaprimria na indstria dos Estados Unidos por volta de 1930
(Ayres, 1984).Uma srie de inovaes complementares foi necessria para
viabilizar os investi-mentos na construo de uma complexa
infra-estrutura de gerao e distribui-o. Uma vez difundida, a
eletricidade contribuiu para a concentrao industri-al de duas
formas distintas.
Primeiro, as novas fontes de energia permitiram a explorao mais
ampladas economias de escala, atravs do desenvolvimento de mquinas
maiores emais eficientes e de sistemas integrados de produo, a
exemplo da linha demontagem. Segundo, a eletricidade permitiu a
criao, por inventores-empre-srios, de grandes firmas inovadoras que
praticamente monopolizaram o novoe dinmico setor produtor de
equipamentos de gerao, transmisso e aplicaode energia. Os nomes de
inventores como Werner Siemens, Alexander GrahamBell, Thomas
Edison, Elihu Thompson e George Westinghouse praticamentese
confundem com as grandes empresas oligopolistas que passaram, junto
aempresas automobilsticas, qumicas e de petrleo, a liderar a
indstria mun-dial no sculo XX. A eletrificao das grandes cidades
europias e estadunidensespermitiu a criao da indstria de
eletrodomsticos, como mquinas de cos-tura (Singer), aspiradores de
p (Hoover) e ferros eltricos. O setor eltrico jnasceu
oligopolizado, pois partiu da explorao de monoplios
temporrios,baseados em produtos inovadores que poucas empresas em
todo o mundosouberam imitar com sucesso. A entrada nestes mercados
exigia elevados inves-timentos em atividades de pesquisa e
desenvolvimento, marketing e serviosque implicavam uma capacidade
de organizao muito superior empresaneoclssica da Revoluo Industrial
britnica.
A inveno do motor a combusto interna, por sua vez, deu origem ao
auto-mvel, ao trator, ao caminho e ao avio. Embora seus primeiros
desenvolvi-mentos tenham ocorrido na Inglaterra, por volta de 1860,
o centro da ativida-de tecnolgica passou para a Frana e Alemanha.
Neste pas, o pioneirismo deNicolaus Otto na produo de motores
estacionrios a gasolina permitiu odesenvolvimento posterior de
veculos autopropulsionados por um grupo deengenheiros que vieram a
formar a Daimler-Benz, o primeiro fabricante deautomveis do mundo,
hoje lder no mercado de nibus e caminhes. Ao con-trrio da indstria
de equipamentos eltricos, a indstria automobilstica nasceu
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
127Highlight
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Revista Brasileira de Inovao
competitiva. No incio do sculo havia nos Estados Unidos cerca de
cem fabri-cantes de automveis, organizados de forma quase
artesanal, configurando umaestrutura da indstria algo prxima da
concorrncia marshaliana. Poucas dcadasdepois, graas a inovaes
organizacionais, a Ford e a General Motors domina-vam amplamente o
mercado, consolidando um oligoplio que vigora at hoje.
O grande sucesso do motor a gasolina gerou outro gigante do
sculo XX:as empresas petroleiras. A integrao vertical das
atividades de explorao, trans-porte, refino e distribuio levaram a
Standard Oil Company a se tornar amaior empresa americana no incio
do sculo.2 O controle direto de uma amplagama de recursos
produtivos e o domnio que exercia sobre o mercado de petr-leo e
derivados levou a Suprema Corte a exigir seu desmembramento em
1911,por violao do Sherman Antitrust Act. A deciso permitiu a
formao deoutras empresas de petrleo, mas no impediu a consolidao de
um oligoplioglobal conhecido como as sete irms. Fora dos Estados
Unidos, a indstria dopetrleo s se desenvolveu efetivamente na
Inglaterra, graas a seu domniocolonial das regies produtoras do
Kuwait e Iraque que comearam a produzirem 1908. A estrutura da
indstria mundial de petrleo foi condicionada pelasaltas barreiras
entrada, erigida pela grande escala e integrao vertical da produ-o,
e pelo poderio imperialista e naval estadunidense e britnico.
A terceira rea de inovao tecnolgica que favoreceu a transformao
dafirma e do mercado foi a produo em massa, associada a Henry Ford
e indstria automobilstica. As origens do sistema de produo em massa
po-dem ser encontradas na obra de Adam Smith, atravs de suas
famosas obser-vaes sobre as vantagens da diviso do trabalho em uma
fbrica de alfinetes.Tal princpio foi explorado posteriormente por
tericos industriais como CharlesBabbage, que comparava a fbrica a
uma mquina complexa, com mquinas etrabalhadores especializados em
tarefas especficas organizadas de forma sistmica.Mas foi somente
com Frederick Taylor, atravs de seus Princpios da Adminis-trao
Cientfica, publicado em 1911, que as vantagens da economia de
escalaforam definitivamente demonstradas. Taylor foi consultor de
Henry Ford emseu projeto de linha de montagem, combinando os
princpios de diviso dotrabalho, mecanizao do processo, padronizao,
intercmbio de peas eadministrao cientfica racional.2 Em 1902, a
Standard Oil foi superada pela United States Steel, mas permaneceu
no segundo lugar (Chandler, 1962:164).
Paulo Bastos Tigre
127Highlight
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Revista Brasileira de Inovao
Chandler (1977) destaca duas ondas de inovaes organizacionais
que rom-peram os limites ao crescimento da firma. A primeira,
ocorrida na virada dosculo, foi a integrao vertical em atividades
encadeadas em unidades distintas,a exemplo da indstria do petrleo.
A segunda, ocorrida a partir dos anos 1920,foi a organizao
multidivisional. Ambas contriburam para viabilizar a admi-nistrao
eficiente da grande corporao, eliminando assim as economias
inter-nas de escala. Na organizao multidivisional, um escritrio
central planeja,coordena e avalia o trabalho de diversas divises
operacionais e aloca pessoal,instalaes, capital e demais recursos
necessrios para realizar a produo. Osexecutivos responsveis por
estas divises, por sua vez, tm sob seu comando amaioria das funes
necessrias para gerir uma linha de produtos ou servios emuma ampla
rea geogrfica, sendo responsveis pela lucratividade de sua divisoe
seu sucesso no mercado.
Nas primeiras dcadas do sculo XX, o capitalismo proprietrio deu
lu-gar ao capitalismo gerencial como motor dominante do
desenvolvimentoeconmico (Lazonick, 1992). Inovaes organizacionais e
tecnolgicas per-mitiam o uso de estruturas gerenciais para planejar
e coordenar a produoem larga escala e aplicar conhecimento
cientfico indstria. O modelo decapitalismo proprietrio se mostrou
inadequado para lidar com a crescentecomplexidade da atividade
industrial e os altos custos fixos derivados da pro-duo em
massa.
Nos anos 1920, o oligoplio j caracterizava grande parte da
indstriamanufatureira dos Estados Unidos. Em meados do sculo,
firmas dominanteshaviam emergido inclusive em setores tipicamente
intensivos em trabalho, comoo txtil. No entanto, o potencial para
realizao de economias de escala noestava distribudo igualmente em
todos os setores. As maiores empresas indus-triais do mundo estavam
concentradas nos ramos de alimentos, qumica, pe-trleo, metais
primrios e os trs setores de equipamentos: mquinas eltricas
eno-eltricas e material de transporte. A realidade destes setores
dinmicos co-locava em xeque as teorias econmicas neoclssicas,
exigindo uma ampla revi-so dos princpios de concorrncia perfeita e
deseconomias de escala. No entan-to, quase meio sculo foi necessrio
entre a emergncia da grande corporao ea consolidao de um corpo
terico alternativo que lidasse com as questes deeconomias de
escala, escopo, transaes e oligoplio.
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
127Highlight
127HighlightA propriedade familiar (relao de produo
intracapitalista?) impedia a acumulao de capital.
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Revista Brasileira de Inovao
Pietro Sraffa (1926) foi um dos primeiros economistas a
assumirem estamisso, ao questionar a noo de rendimentos
decrescentes pela sua incompati-bilidade com economias de escala.
Isso o levou tambm a criticar a relao entrepreos e custos, pois
diferentes escalas determinam diferentes custos de produ-o.
Produtores mais eficientes podiam comandar preos menores e/ou
maio-res lucros, desequilibrando o mercado e provocando concentrao.
Sraffa le-vanta a contradio do dilema de Marshall como conciliar
concorrnciacom retornos crescentes de escala? 3
Joan Robinson (1933) formulou sua teoria da concorrncia
imperfeita aoperceber o irrealismo da situao de concorrncia
perfeita, onde nenhum pro-dutor teria individualmente condies de
afetar os preos. A evidncia empricadas grandes firmas usufruindo
economias de escala levou-a a afirmar que cadafirma tinha um
monoplio para seus produtos, que era resultado da prefernciados
consumidores, apesar da existncia de substitutos muito prximos
produ-zidos por outras firmas. E. H. Chamberlain desenvolveu idias
similares simul-tnea e independentemente.
As crticas ao modelo concorrencial levaram identificao do
oligopliocomo a forma mais tpica de estrutura da indstria. Kaldor
(1934) argumentaque cada vendedor est em concorrncia direta somente
com outros poucosvendedores e que a cadeia destes grupos
oligopolistas compe todo o mercado.O oligoplio , na realidade, a
condio mais geral. E. A. Robinson (1931)trabalhou uma teoria da
concorrncia monopolista dando mais realismo s te-orias neoclssicas
dos mercados e das firmas. A teoria assume nova dimenso aodeslocar
o centro de interesse da questo do equilbrio das condies de produ-o
e de distribuio de bens e servios para o estudo do comportamento e
dasinteraes entre produtores. Neste contexto, a firma passa a
assumir o papelprincipal, dada a possibilidade de recorrer
diferenciao de produtos e a esta-belecer uma poltica de vendas.
Assim, incorporam-se firma variveis conside-radas exgenas na teoria
neoclssica, como a tecnologia e os preos.
As contribuies de Sraffa, Joan Robinson, Chamberlain
permitiramreformular a ortodoxia dominante, mas mantiveram o
arcabouo esttico quecaracterizava a economia neoclssica. Segundo
Coutinho (1983), a primeira rup-tura consistente e bem-sucedida do
impasse em que se encontrava a microeconomia3 Ver Possas
(1987:17).
Paulo Bastos Tigre
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Revista Brasileira de Inovao
marshaliana e walrasiana ocorreu somente em 1952, quando Steindl
publicouMaturidade e Estagnao no Capitalismo Americano. Ele constri
uma teoriaconsistente e articulada de acumulao e de concentrao
apoiada em evidnciasempricas sobre estruturas de custos, formao de
preos e formas de concor-rncia em condies de oligoplio em nvel de
setores industriais. Assim, aocontrrio da ortodoxia que estabelecia
modelos estticos e abstratos de com-portamento da firma e mercados,
Steindl se inspira diretamente na realidade doprocesso de
concorrncia de seu tempo, reconhecendo o papel crucial da
propa-ganda, da diferenciao do produto e da inovao tecnolgica no
processo deacumulao do capital. As assimetrias entre firmas
constituem um fator essen-cial na explicao da configurao e
transformao das estruturas de mercado.As empresas com menores
custos e margens de lucros maiores so, segundoSteindl, as que tm
maiores possibilidades de crescer a longo prazo.
O processo de concentrao j havia sido reconhecido pioneiramente
porMarx, que considerava a centralizao do capital uma tendncia
histrica do capi-talismo. Seguindo este insight, Schumpeter (1942)
reconheceu a importncia dagrande empresa e da concentrao da produo
para o progresso tcnico. A rela-o entre oligoplio e o progresso
tcnico mtua: por um lado, o processo dediferenciao do produto
conduzia a expanso e a criao de novos mercadosoligopolistas. Por
outro, os altos custos de P&D, necessrios para a
sobrevivnciadas empresas nos mercados dinmicos, exigiam a presena
das grandes empresas.Embora a teoria schumpeteriana no tivesse o
reconhecimento das correntes prin-cipais do pensamento econmico,
sua contribuio influenciou progressivamen-te as teorias da firma,
at serem plenamente incorporadas pelo evolucionismo.
O estudo das conseqncias do processo de centralizao do capital
naorganizao da firma e do mercado passou a constituir uma rea de
crescenteinteresse. O instrumental analtico se diversificou,
passando a incorporar a soci-ologia, o behaviorismo e cincias do
comportamento, alm de aperfeioar ametodologia emprica. A ruptura
com os limites da teoria econmica e com opapel passivo atribudo
firma na microeconomia neoclssica abriu caminhopara o
desenvolvimento das teorias da firma, como resposta importncia
cres-cente da grande empresa.
A prpria existncia da firma parecia nebulosa na teoria
neoclssica, dianteda onipotncia atribuda ao mercado. Duas linhas de
investigao abordam esta
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
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questo. A primeira procura explicar a existncia da firma em funo
das falhasdo mercado e foi iniciada por Coase (1937), seguida por
Williamson (1979) epor autores de novos enfoques neoclssicos
(economia de troca).
A segunda linha, influenciada por Marx e Schumpeter, v a firma
comoespao de produo, lugar de criao de riqueza e inovao. Para
Coriat eWeinstein (1995), trs concepes podem ser identificadas:
(i) firma organizao: os behavioristas Simon, Cyert e March vem a
firma comouma ao coordenada entre indivduos e grupos. Para
assegurar a sobrevivn-cia da firma e seus membros tornou-se
necessria a converso do conflito emcooperao, a mobilizao de
recursos e a coordenao dos esforos;
(ii) firma instituio: segundo Hodgson (1988), os chamados velhos
institu-cionalistas vo alm da viso organizacional, incorporando a
dimensosocial (sistema poltico, social e jurdico na qual a firma se
insere e quelimita sua metamorfose). Isso inclui sistemas de
propriedade, relaes combancos, condies de produo e de mercado;
(iii) custos de transao e os novos institucionalistas: Coase
(1937) introduziunovas questes sobre a natureza da firma, passando
a consider-la umaforma particular de organizao econmica, ou seja,
um arranjo institucionalalternativo ao mercado. A questo
fundamental colocada por Coase e, maistarde desenvolvida por
Williamson, : por que a firma existe? Coase criti-cou a teoria
neoclssica por no oferecer resposta ao fato dos mercados nolograrem
exercer a coordenao que as firmas fazem internamente. Se as-sim
fosse, por que uma grande firma no poderia trabalhar to bem comoo
mercado? (Winter, 1993). Alm de questionar a capacidade da
teoriaexistente em explicar a organizao econmica, Coase critica a
falta derealismo e a nfase no indivduo como agente econmico, em
detrimentoda organizao (individualismo metodolgico). A anlise de
Williamsonsobre integrao vertical da produo destaca o potencial de
coordenaoda firma em funo de falhas de transao no mercado, diante
da possibi-lidade de comportamentos oportunistas dos agentes.
A questo dos objetivos da firma ganha interpretaes alternativas
aoenfoque esttico da maximizao de lucros a curto prazo. As
contribuies de
Paulo Bastos Tigre
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Revista Brasileira de Inovao
Sylus-Labini (maximizao de lucros a longo prazo), Baumol
(maximizaodas vendas globais), Marris (maximizar taxa de
crescimento das vendas), JoanRobinson (sobrevivncia), Galbraith
(manuteno do poder da tecnoestrutura),entre outros, abrem espao
para o reconhecimento de que os objetivos da firmapodem variar de
acordo com os objetivos de seus controladores, sem que sepossa
imputar uma regra universal. O comportamento nico e maximizadorfoi
mais tarde rejeitado pelos novos institucionalistas e autores
evolucionistasque concluram, segundo Pond (1996), que a
racionalidade substantiva oumaximizadora constitui um suposto
irreal e incapaz de modelar sem distoreso comportamento dos agentes
econmicos, na medida em que os resultadosdas aes e decises dependem
de eventos futuros que no podem ser antecipa-dos de maneira
probabilstica.
Tal discusso nos remete a outra falha da teoria microeconmica e
de umaparte considervel da economia industrial, que sua
incapacidade de incorporaro ator central da firma: o empreendedor.
A questo foi levantada inicialmentepor Dobb (1925), que reconheceu
que os empresrios so agentes que tomamas decises dominantes da vida
econmica. O mundo neoclssico do clculoracional no deixava lugar
para a iniciativa e a inovao. O papel do empreende-dor foi mais
tarde trabalhado na teoria econmica em trs aspectos fundamen-tais:
a inovao, atravs do trabalho de Schumpeter (1954); aquisio e
explo-rao da informao pela chamada escola austraca, principalmente
Hayek(1937) e Kirzner (1973); e organizao e coordenao da produo.
Inicia-seassim a passagem do equilbrio esttico para uma viso
evolucionista que incor-pora incerteza e informao.
O processo de crescimento da firma4 e oligopolizao dos mercados,
ob-servado ao longo do sculo XX, levou as teorias da firma e a
economia industriala incorporarem uma srie de contribuies,
aproximando-as mais da realidade. considerada toda uma gama de
configuraes de mercados, permitindo aelaborao de modelos de
comportamento das firmas em situao de oligoplio.A anlise das
barreiras entrada e o papel das atividades de P&D na
diferencia-o do produto passam a merecer ateno. Apesar de todo este
aporte, as teoriasacabaram sendo superadas pela nova dinmica
tecnolgica que passou a4 A questo do crescimento da firma, e sua
influncia na configurao do mercado, mereceu ateno de
economistas
como Penrose (1959) e Marris (1964) cujas idias convergem para a
concluso de que no h limite para o crescimentoda firma, mas
simplesmente restries a seu crescimento.
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
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condicionar o sistema econmico a partir do ltimo quartil do
sculo XX.Coriat e Weinstein (1995), revisando as teorias que
analisam a firma insti-tuio, firma organizao e os custos de
transao, argumentam que noh mudana nos fundamentos tericos da
anlise da firma, que permanecemos mesmos do modelo concorrencial,
baseados em hipteses imutveis. O am-biente da firma passa a ser
mais complexo, mas existem condies fundamen-tais e dadas s quais a
firma se adapta, a exemplo da tecnologia e das condi-es de produo.
O campo de suas aes bem mais amplo, mas as firmasainda so
orientadas pelos mesmos princpios de racionalidade. Ela
continuasendo fundamentalmente uma caixa-preta que reage
mecanicamente ao seuambiente. Apesar de incorporarem novas idias,
as teorias da firma no rom-peram radicalmente com a tradio
econmica, de forma a acompanhar asmudanas radicais ocorridas na
tecnologia e na dinmica competitiva ao longodo sculo. Tais limitaes
levam a uma nova trajetria terica desenvolvida apartir das
idias-chave de Schumpeter.
4. O paradigma das Tecnologias da Informao e Comunicaoe as novas
teorias da firma
No ltimo quartil do sculo XX, as empresas passaram por um novo
pro-cesso de transformaes, caracterizado pela incorporao de novos
modelosorganizacionais mais intensivos em informao e conhecimento.
A globalizaoe a liberalizao dos mercados reduziram os espaos
econmicos privilegiados,eliminando muito do carter idiossincrtico
das diferentes economias nacio-nais. As Tecnologias da Informao e
Comunicao (TIC) tm um papel centralneste processo, pois constituem
no apenas uma nova indstria, mas o ncleodinmico de uma revoluo
tecnolgica. Ao contrrio de muitas tecnologiasque so especficas de
processos particulares, as inovaes derivadas de seu usotm a
caracterstica de permear, potencialmente, todo o tecido
produtivo.
A microeletrnica est na raiz da maioria das inovaes em produtos,
pro-cessos e tcnicas organizacionais introduzidas nos ltimos 20
anos. Omicroprocessador, desenvolvido pela Intel em 1971, mudou a
trajetria tecno-lgica mundial, at ento apoiada no uso intensivo de
energia e materiais. Suadifuso, entretanto, exigiu o
desenvolvimento de uma nova infra-estrutura,
Paulo Bastos Tigre
127HighlightFaz pensar na posio levantada pelo Harvey sobre as
mudanas na forma de acumulao de capital do final do XX que
trouxeram consigo uma nova experiencia do espao e do tempo, mas no
uma nova sociedade. Parece que a critica s teorias da firma
anteriores rejeitam qualquer dimens estrutural com as quais a firma
deve lidar. A firma passa a ter autonomia plena dentro do sistema
economico. Esta posi me parece proxima a noo pos moderna de que no
h mais narrativas totalizantes. Ou melhor, parece que esta viso pos
moderna generaliza para toda a sociedade o que na verdade somente
uma nova etapa de acumulao de capital, mas no uma superao da
sociedade do capital e, portanto, no uma supero da centralidade das
classes socais
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baseada nas telecomunicaes digitais (cabos ticos, rdio e
satlites) que sforam efetivamente completadas nos anos 1990. O
aperfeioamento do compu-tador em um nico chip abriu caminho para
uma onda de inovaes comple-mentares e convergentes, cujo pice pode
ser o advento da internet e do comrcioeletrnico, que revolucionaram
a organizao do sistema produtivo.
Diante das novas trajetrias de organizao interna da firma e
novas for-mas de articulao com o mercado, a teoria econmica passou
a necessitar dereformulaes. A maior fragilidade das teorias da
firma e da organizao indus-trial sua incapacidade de atribuir a
importncia devida ao papel da mudanatecnolgica na configurao da
firma e dos mercados. Embora Schumpetertivesse levantado estes
aspectos desde meados dos anos 1950, suas idias nochegaram a
influenciar decisivamente o pensamento dominante de sua poca,seja
por requererem maior aprofundamento e sistematizao, seja por
estaremadiante de seu tempo. Foi necessria uma mudana visvel e
empiricamentecomprovvel na natureza do processo competitivo mundial
para que seu traba-lho fosse retomado, atravs da linha
evolucionista ou neo-schumpeteriana. As no-vas teorias da firma,
voltadas para o entendimento deste novo paradigma, ga-nham fora com
a anlise das empresas japonesas, principalmente pelo trabalhode
Aoki e pelas anlises histricas de Chandler sobre as inovaes
organizacionaisnas empresas americanas. Esta corrente freqentemente
chamada de neo-institucionalista.
A linha neo-schumpeteriana ou evolucionistaAs teorias econmicas
conhecidas como evolucionistas ou neo-schumpe-
terianas constituem a mais bem articulada tentativa de construir
um novo cor-po terico para o estudo da firma. Sua origem dupla: por
um lado, Freeman(1974, 1997) foi o primeiro a resgatar a contribuio
de Schumpeter no senti-do de incorporar o progresso tcnico como
varivel-chave do processoevolucionrio da firma e do mercado.
Freeman recupera, aperfeioa e atualiza ateoria dos ciclos longos de
Schumpeter, mostrando como a difuso de inova-es est no centro dos
movimentos cclicos da economia mundial. Por outrolado, Nelson e
Winter (1982) iniciaram uma linha de investigaes apoiada emSimon,
Schumpeter e idias transpostas da biologia evolucionista, lanando
asbases para a reconstruo das teorias da firma. A corrente
evolucionista se encon-
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
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tra atualmente em pleno desenvolvimento, contando com
contribuies deum nmero crescente de autores.
A transposio de conceitos derivados das cincias duras, como a
fsica e abiologia, para a economia foi inicialmente proposta por
Marshall. Apesar deoptar pela mecnica newtoniana, ele acreditava
que a analogia mais adequada seriacom a biologia, mas considerava
esta cincia complexa demais para ser transpostapara a economia. The
Mecca of the economist lies in economic biology (...) Butbiological
conceptions are more complex than those of mechanics (citado
emNelson, 1995).
A linguagem evolucionista ou desenvolvimentista tem sido muito
usadapor economistas para descrever como a estrutura de uma
economia muda aolongo do tempo. Indivduos e organizaes so entidades
que aprendem. Eco-nomistas costumam caracterizar certas indstrias
como jovens, outras comomaduras. Mas estas metforas no derivam
propriamente da biologiaevolucionista, pois o conceito geral de
evoluo, adotado pelos economistas, eraconhecido antes mesmo de sua
aplicao na biologia.
As teorias evolucionistas distinguem-se das teorias neoclssicas
e das teoriasda organizao industrial por descartarem hipteses
bsicas do pensamento eco-nmico convencional. Trs princpios podem
ser destacados como chaves paraentender as teorias evolucionistas.
O primeiro que a dinmica econmica base-ada em inovaes em produtos,
processos e nas formas de organizao da produ-o. As inovaes no so
necessariamente graduais, podendo assumir carter ra-dical causando,
neste caso, instabilidade ao sistema econmico. atribuda gran-de
importncia tambm interao entre agentes econmicos, articulados
emclusters de produo. Os conceitos de destruio criadora de
Schumpeter, deparadigmas tcnico-econmicos de Dosi (1982) e Perez e
a analogia com abiologia evolucionista de Darwin so esclarecedores
da essncia descontnua atri-buda ao crescimento econmico em funo da
inovao tecnolgica.
O segundo princpio descarta a idia de racionalidade invariante
(ou subs-tantiva) dos agentes econmicos. Tomando por base as idias
de Simon, osevolucionistas (Winter, 1993; Dosi, 1991; Coriat &
Weinstein, 1995) criti-cam as teorias de racionalidade substantiva
que pr-define o comportamentode firmas segundo o princpio da
maximizao. O conceito de maximizaono considerado til, pois envolve
muitas variveis que no podem ser,
Paulo Bastos Tigre
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a priori, conhecidas pelo empreendedor. Os evolucionistas
apontam para a ne-cessidade de desenvolver uma viso da firma
constituda de indivduos distin-tos e dotada de caractersticas
cognitivas prprias. A diversidade conduz idiade racionalidade
procedural, ou seja, de que a racionalidade dos agentes no podeser
pr-definida, pois resultante do processo de aprendizado ao longo
dasinteraes com o mercado e novas tecnologias.
O terceiro princpio se refere propriedade de auto-organizao da
firma,como resultado das flutuaes do mercado. rejeitado qualquer
tipo de equil-brio de mercado, conforme proposto pela teoria
convencional, na medida emque no possvel alcan-lo em ambiente
coletivo de flutuaes de agentes indi-viduais com rotinas e
capacitaes distintas.
Rejeitando a idia, defendida at hoje por autores neoclssicos
especial-mente aqueles ligados Escola de Chicago como Friedman,
Stigler e Becker , deque os mercados so dotados da capacidade de
eliminar eficazmente as firmasincapazes de se comportar segundo o
princpio de maximizao de lucros, osevolucionistas propem,
alternativamente, o princpio da pluralidade de ambi-entes de seleo.
Este princpio permite explicar a existncia de trajetriastecnolgicas
diferentes e a grande variedade de estruturas de mercado e de
carac-tersticas institucionais dos ambientes nos quais as firmas
evoluem. Tecnologiase estruturas de mercado so consideradas
idiossincrticas ao tipo de indstria e natureza dinmica das
configuraes particulares que condicionam o processocompetitivo.
necessrio, portanto, conhecer a natureza das barreiras entra-da, da
regulamentao, do grau de competio e as possibilidades de
explorareconomias de escala e escopo.
A competitividade de uma empresa em uma atividade particular
defini-da pelos evolucionistas como um conjunto de competncias
tecnolgicas dife-renciadas, de ativos complementares e de rotinas.
Tais competncias so geral-mente tcitas e no transferveis,
conferindo firma um carter nico e diferenci-ado. A evoluo da firma
depende da transformao das competncias secundri-as em centrais,
medida que surgem oportunidades tecnolgicas. O conceito
decompetncia central, desenvolvido principalmente por Teece, Dosi e
Winter, importante para definir uma firma, explicar por que elas
diferem e como elasevoluem. A partir dele foram elaboradas
tipologias sobre a coerncia da firma esuas possveis estratgias de
crescimento: especializao, integrao vertical, diver-
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127HighlightComo dito anteriormente: parece no haver viso
sistemica (as "leis coercitivas externas da concorrencia" como diz
Marx")
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sificao, conglomerao, participao em redes e estratgias vazias
(apoia-das na subcontratao). Assim, so retomadas importantes
questes da litera-tura de organizao industrial.
A relao entre tecnologia e estrutura da indstria retomada pelas
no-vas teorias da firma, estabelecendo uma controvrsia com o
paradigma es-trutura, conduta e desempenho, que exerceu considervel
influncia na legis-lao antitruste dos Estados Unidos. A relao entre
estrutura e desempenhoj havia sido questionada por Schumpeter que
criticou a excessiva preocupa-o dos economistas contemporneos com a
estrutura dos mercados con-corrncia e oligoplio. O problema
visualizado (pelos economistas tericos) como o capitalismo
administra as estruturas existentes, enquanto que o proble-ma
relevante como ele as cria e destri. A busca de posies monoplicas
noconstitui em si uma prtica danosa concorrncia, mas o seu mvel
principal.Isto tem implicaes importantes para as polticas de
concorrncia, que consi-deram a estrutura como a varivel exgena que
condiciona o comportamento eo desempenho das firmas.
A cadeia de causalidade vem sendo redefinida pela literatura
econmica,que passou a admitir a influncia mtua dos fatores. O
desempenho, assimcomo a conduta, tambm influencia a estrutura de
mercado. A proposta neo-schumpeteriana, no entanto, vai alm destas
relaes, associando estrutura demercado com o ciclo de evoluo
tecnolgica do produto. Nelson (1995)argumenta que antes da
emergncia de um padro ou projeto dominante, hpouco P&D
orientado para melhorar o processo produtivo, porque o projetodo
produto instvel e o mercado para cada produto pequeno. Com
aemergncia de um projeto ou padro dominante, os lucros derivados da
ex-plorao de novas formas de produo poupadoras de custos so
consider-veis. Freqentemente o desenvolvimento de um processo de
produo me-lhor envolve a explorao de economias de escala latentes e
o estabelecimentode modos de produo intensivos em capital. O
argumento proposto porAbernathy e Utterback (1975) que este modelo
de evoluo tecnolgicacausa um padro particular de evoluo da firma e
da estrutura da indstria.Nos estgios iniciais de uma indstria,
firmas tendem a ser pequenas e a en-trada no mercado relativamente
fcil, refletindo a diversidade de tecnologiasempregadas e sua rpida
mudana. Contudo, quando um padro dominante
Paulo Bastos Tigre
127Highlight"A busca de posies monoplicas no constitui em si uma
prtica danosa concorrncia, mas o seu mvel principal". Isto
totalmente marxista
127Highlight
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Revista Brasileira de Inovao
emerge, e processos de produo especializados so desenvolvidos,
barreiras entrada comeam a crescer e aumentam a escala e o capital
necessrios paraproduzir competitivamente.
A viso neo-institucionalistaA nfase no papel das novas formas de
organizao empresarial como
fonte de competitividade tem origem nos estudos pioneiros de
Chandler(1977), que centra seu interesse nas instituies e nas
caractersticas especfi-cas da sua estrutura empresarial. As anlises
histricas tm uma concepomais concreta de instituies, centrando-se
na corporao, na moderna uni-versidade de pesquisas, no sistema
financeiro e nas instituies reguladoras daatividade econmica
internacional, tais como a Organizao Mundial doComrcio OMC e o
Fundo Monetrio Internacional FMI.
A viso institucionalista, segundo North (1990), atribui a
performanceeconmica das naes natureza de suas instituies. Segundo
esta viso, asinstituies de hoje guardam fortes conexes com as de
ontem; da a importn-cia da trajetria institucional ou path
dependecy. Nenhum arranjo institucionalpode ser definido como timo,
pois eles so frutos de contingncias culturaise polticas tpicas de
cada pas. Em alguns pases as instituies se desenvolve-ram de forma
a favorecer o progresso econmico, enquanto em outros pasesno. O
ambiente institucional determina as oportunidades de lucro,
direcio-nando as decises e o processo de acumulao de conhecimentos
das organiza-es, gerando trajetrias virtuosas ou viciosas.
Rosemberg e Birdzell (1986), analisando as condies
institucionais his-tricas que permitiram o surgimento da Revoluo
Industrial, argumentamque o Ocidente enriqueceu porque rompeu os
vnculos com as velhas insti-tuies e deixou o mercado funcionar. As
revolues burguesas foram essen-ciais para construir um novo sistema
regulatrio e legal que estimulasse aacumulao, a concorrncia e a
inovao. Foram criados, ao longo do proces-so de mudanas
institucionais, mecanismos para assegurar o cumprimentodas leis e
para alter-las de forma a permitir adaptao s transformaes
eco-nmicas e sociais. Tal processo permitiu que o Ocidente
superasse economi-camente o Oriente a partir do sculo XVII na
medida em que este ficou presoa instituies feudais e religiosas que
engessavam o processo evolutivo.
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
127Highlight
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Revista Brasileira de Inovao
A viso institucionalista vem sendo revigorada pelo conceito de
SistemaNacional de Inovaes, seguindo uma linha de abordagem
iniciada por Freeman(1987) e Lundvall (1988) que vem ganhando
contribuies sucessivas da linhaneo-schumpeteriana. O principal foco
de anlise a interao entre os atoreseconmicos, sociais e polticos
que fortalece capacitaes e favorece a difusode inovaes em um
determinado pas. A literatura neo-schumpeteriana enfatizaque as
trajetrias que emergem de um paradigma tecnoeconmico raramenteso
naturais, impulsionadas apenas por fatores cientficos e tecnolgicos
ex-ternos. Fatores econmicos e sociopolticos so muito importantes
na determi-nao de trajetrias tecnolgicas em diferentes pases. O
processo de seleoocorre dentro de um ambiente especfico onde a
qualidade das instituies tc-nicas e cientficas, das estratgias do
setor privado, dos estmulos e financia-mento as inovaes cumprem
papis fundamentais. O conceito de SistemaNacional de Inovao vm
sendo aplicado regionalmente, atravs dos chama-dos arranjos
produtivos locais.
O enfoque nas inovaes organizacionaisO sucesso do Japo em
implementar uma nova onda de inovaes de
cunho organizacional nos anos 1970 e 1980 teve profundo impacto
sobre osestudos de competitividade. A introduo de tcnicas
organizacionais comojust-in-time, controle da qualidade total e
estruturas produtivas mais horizontaise integradas em clulas,
levaram empresas japonesas como a Toyota a desafiar ooligoplio
longamente estabelecido nos mercados automobilstico e de bens
deconsumo durveis. O novo paradigma comumente chamado de toyotista,
emoposio ao fordista.
Em uma economia crescentemente globalizada e competitiva, as
empre-sas se vem obrigadas a tratar os mercados como transitrios,
ou de moda,nos quais os ciclos do produto so curtos, e a mudana na
demanda entre umproduto e outro voltil. Neste contexto, essencial
assegurar total flexibili-dade e lead-time 5 reduzido, atravs da
adoo de novas formas de organiza-o da produo que enfatizem
estruturas horizontais, descentralizao daproduo e uma nova forma de
coordenao da fora de trabalho, com nfase
5 Lead-time o tempo necessrio para produzir um produto ou
servio. Quanto menor este tempo, maior a capacidadeda empresa se
adaptar a mudanas no mercado sem incorrer em altos custos de
estocagem.
Paulo Bastos Tigre
127HighlightMais uma mudana de mercado que generalizada pela
ideologia pos moderna
127HighlightO capital na atual etapa do capitalismo tem
necessidade de descentralizar a produo e coordenar os trabalhadores
de forma mais flexivel, ou seja, aumenta a segmentao das funes no
processo produtivo. entretanto, isto no significa, como quer a
ideologia pos moderna, que a organizao politica em termos de
classes sociais esteja superada, pois o que h somente uma nova
forma de manter a velha dominao sobre o trabalho.
-
Revista Brasileira de Inovao
na autonomia, polivalncia e distribuio da inteligncia. Tais
conceitos con-trastam com a organizao Fordista, assentada na
especializao, diviso dotrabalho e separao entre a concepo, execuo e
controle da produo. Anecessidade de adaptar o processo produtivo a
freqentes mudanas nas quan-tidades, mix e desenho de produtos reduz
substancialmente as vantagens dacoordenao hierrquica. Em
conseqncia, cresce tambm a importncia dasredes de firmas como forma
intermediria de coordenao entre a firmaverticalizada e o mercado
atomizado.
A anlise interna da firma como instituio-chave do capitalismo
ganhouimportncia na nova construo terica. Aoki (1988,1990)
contrastou dois tiposidealizados de empresas, a firma A tipicamente
estadunidense e Fordista ea firma J (japonesa), constatando
diferenciais de produtividade a partir dos anos1980. A opo
metodolgica de observar o funcionamento interno da firma efocalizar
as organizaes competitivas emergentes passou a ser um
elementofundamental de anlise para superar o tratamento
convencional dado firmapelas teorias de custos de transao. A anlise
de Aoki est centrada na observaoemprica das formas de organizao
adotadas por ambos os tipos de empresa. Eleelucidou a questo de
como a indstria automobilstica japonesa foi capaz desuperar a
indstria estadunidense ao analisar detalhadamente a organizao
dotrabalho, do processo de gerao e apropriao de tecnologia, e da
relao comclientes e fornecedores na Toyota e General Motors. A
comparao de mtodosorganizacionais e tecnolgicos colocou por terra
os argumentos puramente eco-nmicos como taxa de cmbio e salrios
adotados tradicionalmente para aexplicar a maior competitividade
japonesa.
Porter (1993) outro autor que tem contribudo decisivamente para
aaplicao de conceitos da economia industrial na gesto estratgica
das empre-sas. Sua crena na importncia da firma, como agente
central da competitividadedas naes, o leva a afirmar que mais
importante analisar as firmas lderes doque simplesmente olhar o
mercado ou as polticas governamentais de cada pas.
Cabe destacar aqui a diferena metodolgica apresentada pelas
diferentesvises da firma. Para Aoki, a exemplo de Chandler e
Porter, a unidade de anlise a firma, enquanto para Williamson a
anlise centrada nas transaes. Estesdois focos no so facilmente
integrveis, tornando difcil o desenvolvimentode uma teoria
unificada. A organizao interna da firma e as transaes no
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
127Highlight
127HighlightDaqui parte meu proximo artigo sobre a Rede da
Marina
127Highlight
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Revista Brasileira de Inovao
constituem aspectos de um mesmo problema, mas sim vises
diferenciadassobre os fatores determinantes das estratgias e do
crescimento das empresas.
A questo das redes de firmasUm dos aspectos mais distintivos do
novo paradigma tcnico-econmico
o processo de reespecializao das grandes empresas em suas
competnciascentrais. Gradativamente, as corporaes abandonam
determinadas atividades,consideradas perifricas ou no essenciais
para a lucratividade e segurana donegcio, transferindo-as a
terceiras empresas. A terceirizao constitui-se emum processo de
transferncia de funes ou atividades de uma empresa de ori-gem para
uma empresa ou trabalhador (Kon, 2004:125). Em decorrncia,
cele-bra-se o surgimento de redes de firmas onde as relaes entre os
participantesfreqentemente so pautadas por relaes de longo prazo e
pelo comprometi-mento mtuo dos parceiros com investimentos em
ativos especficos e padresoperacionais compatveis ao longo da
cadeia produtiva.
As novas redes de firmas so estabelecidas a partir de relaes
contratuaisformais entre agentes dispersos geograficamente,
definidos em funo de com-petncias complementares, sem
necessariamente um histrico de laos comer-ciais. Tal forma de
organizao do processo produtivo contrasta com o modelotpico de
estrutura industrial fordista que vigorou nos principais
mercadosmundiais na maior parte do sculo XX. As corporaes
caracterizavam-se pelaverticalizao da produo, dedicando-se a
desenvolver internamente todas asetapas da produo visando assegurar
um fluxo de produo eficiente e harm-nico ao longo da cadeia
produtiva. Do pinheiro ao livro, slogan adotado nosanos 1950 pela
Editora Companhia Melhoramentos, de So Paulo, ilustra avalorizao
atribuda integrao vertical.
A substituio do mercado atomizado pelo planejamento no mbito
deuma nica grande empresa foi um fato explorado por Coase (1937)
para criti-car a teoria neoclssica que considerava o mercado como a
nica forma vivelde organizao da produo. Em seu provocativo artigo
entitulado Por que afirma existe?, Coase argumenta que se o mercado
fosse to eficiente comopropunham os economistas ortodoxos, a
economia prescindiria de arranjosinstitucionais alternativos como a
grande empresa. Mais tarde Williamson(1979) retoma este tema
atribuindo a integrao vertical da produo necessi-
Paulo Bastos Tigre
127Highlight
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Revista Brasileira de Inovao
dade de coordenao do processo produtivo. Para ele, a grande
firma hierar-quizada seria uma resposta s falhas de transao no
mercado, diante da possibi-lidade de comportamentos oportunistas
dos agentes. As redes de firmas seriamformas hbridas de governana
entre o mercado atomizado e a grande empresahierarquizada.
O enfoque da economia da informao e do conhecimentoDesde que
Alvin Tofler publicou O Choque do Futuro, h cerca de 40
anos, as TICs vm sendo destacadas como instrumentos de
transformao eco-nmica e social. O uso crescente da internet em
atividades comerciais a partirde meados da dcada de 1990,
representou um novo ponto de inflexo emdireo chamada economia do
conhecimento. A possibilidade de integrarcadeias globais de
suprimentos, aproximar fornecedores e usurios e acessar in-formaes
on-line em multimdia onde quer que elas se encontrem armazena-das,
deu uma nova dimenso ao processo de transformao. A combinao
defatores dinmicos como inovao, desenvolvimento de novas aplicaes e
cres-cente competio vem contribuindo para a reduo de custos,
viabilizando ocrescimento e a expanso das TICs no s em naes
desenvolvidas como tam-bm em pases em desenvolvimento.
O uso crescente da internet em atividades comerciais representou
um novoponto de inflexo em direo chamada economia do conhecimento.
A pos-sibilidade de integrar cadeias globais de suprimentos,
aproximar fornecedores eusurios e acessar informaes on-line em
multimdia onde quer que elas seencontrem armazenadas, deu uma nova
dimenso ao processo de transforma-o. A combinao de fatores dinmicos
como inovao, desenvolvimento denovas aplicaes e crescente competio
vem contribuindo para a reduo decustos, viabilizando o crescimento
e a expanso das tecnologias da informaoe comunicao no s em naes
desenvolvidas como tambm em pases emdesenvolvimento.
O impacto das TICs sobre a economia e a sociedade tem trazido
tonaconceitos que procuram caracterizar novas formas de organizao
da produo,fontes de competitividade, e as demais transformaes em
curso no ambientesocial e produtivo. Cabe inicialmente esclarecer
os conceitos de informao econhecimento. A informao se refere a
dados codificados, enquanto que o
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
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Revista Brasileira de Inovao
conhecimento envolve principalmente aspectos tcitos. O
conhecimento fun-damental para se ter acesso informao, devido
natureza da codificaolingstica, tcnica ou cientfica exigida para
sua manipulao e transmisso.Por exemplo, um livro escrito em chins
contm informaes que no poderoser transformadas em conhecimento por
pessoas que no dominam este idio-ma. Neste sentido, Hilbert e Katz
(2002) sustentam que conhecimento envol-ve habilidades. O
conhecimento tcito de um trabalhador pode ser descritocomo capital
humano. Ele pode ser, em alguns casos, codificado (por exem-plo, em
um manual de operaes) transformando-se assim em informao.
O termo economia do conhecimento vem sendo crescentemente
em-pregado por autores e organismos internacionais enfatizando uma
concepona qual o conhecimento considerado um insumo mais importante
que terra,capital ou trabalho para o processo produtivo moderno.
Uma economia base-ada no conhecimento se apia efetivamente na
habilidade de gerar, armazenar,recuperar, processar e transmitir
informaes, funes potencialmente aplic-veis a todas as atividades
humanas.
A explorao do potencial aberto pela economia do conhecimento,
entre-tanto, requer condies que nem sempre esto disponveis em pases
menosdesenvolvidos. As tecnologias da informao permitem uma
crescentecodificao do conhecimento representando uma janela de
oportunidade parasua difuso internacional. Por outro lado, seu uso
eficiente depende de co-nhecimento tcito incorporado no capital
humano, aprendizado e desenvol-vimento organizacional. Para Soete
(2004) the knowledge divide is more thanever linked to human
capital or tacit knowledge. Neste contexto, a exploraodo potencial
das TICs depende cada vez mais da qualidade das instituies
naci-onais, da gesto do conhecimento nas empresas, do nvel do
capital humano edas instituies de ensino e do investimento sistmico
na infra-estrutura doconhecimento.
A importncia do papel do usurio para o desenvolvimento
tecnolgicoest relacionada a sua contribuio para o aperfeioamento
dos produtos (learningby using) e a definio das caractersticas da
tecnologia. A literatura sustenta queo papel do usurio nas inovaes
est longe de ser passivo, fato que induz anecessidade de capacitao.
Projetistas costumam desenvolver produtos e servi-os assumindo
(mesmo que de forma implcita) que suas prprias preferncias
Paulo Bastos Tigre
127Highlight
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Revista Brasileira de Inovao
coincidem com as dos usurios. Este fato ajuda a entender porque
determina-das tecnologias, desenvolvidas segundo um padro de gostos
e/ou custos deproduo tpicos de um determinado pas no so facilmente
transferveis paraoutros pases.
5. Concluso
A anlise da evoluo das teorias da firma e sua relao com
paradigmasorganizacionais distintos permite concluir que no existe
um corpo tericonico e coerente. As teorias esto condicionadas por
diferentes aspectos, ca-bendo destacar a filiao metodolgico-terica,
o aspecto da firma analisado(produo, transao) e o objeto da anlise
em si (indstrias e contextosinstitucionais e histricos).
QUADRO 1Teorias da firma, estrutura da indstria e sistemas
regulatrios
em trs paradigmas tecnoeconmicos
Principais correntes
tericas da firma
Preocupaes centrais
Estrutura da indstria
e organizao da
firma
Caractersticas dos
sistemas nacionais
de regulao
Revoluo Industrial
britnica
Neoclssica
Equilbrio
Racionalidade perfeita
dos agentes
nfase na anlise das
relaes de troca
(firma caixa-preta)
Pequenas empresas
Especializao vertical
Dependncia das
economias externas
Laissez-faire
Estado com funes
regulatrias mnimas
Responsabilidade plena
dos proprietrios
Fordismo
Economia Industrial
Estrutura de mercado
Economias de escala
Crescimento da firma
Racionalidade relativa
Custos de transao
Oligoplio
Empresas multinacionais
Estado intervencionista
Paradigma
da informao
Evolucionistas
neo-institucionalistas
Mudana tecnolgica
Instituies
Cooperao
Rede de firmas
Oligoplio global
Desregulamentao
Globalizao
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
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Revista Brasileira de Inovao
A filiao metodolgico-terica tem origem no apenas em motivaes
ide-olgicas, mas tambm nas preocupaes derivadas da prpria estrutura
da inds-tria e da organizao da firma. O Quadro 1 sintetiza as
principais relaes entreteoria e realidade econmica da firma ao
longo dos trs paradigmas estudados,mostrando que existe certa
coerncia entre paradigmas tecnoeconmicos e teoriasda firma. Isso
indica que, mais cedo ou mais tarde, a teoria procura se adaptar
realidade dos padres dominantes de competio, das caractersticas das
tecnologiase da organizao da produo. Em geral, observa-se uma
considervel defasagementre a realidade e sua apropriao terica. Como
afirma Winter (1993), nosltimos 50 anos, a economia tem sido muito
melhor em mudar a si prpria doque os economistas em mudarem suas
idias. Isso ocorre porque as correntes depensamento muitas vezes se
tomam prisioneiras de seus prprios dogmas, dei-xando de desenvolver
criativamente o dilogo com a realidade. Assim, idias de-senvolvidas
para um contexto so reproduzidas e (mal) adaptadas para
contextosdiversos por fora de princpios pretensamente universais e
atemporais.
As teorias formais, baseadas em metodologias matemticas, tendem
a seprender mais ao arcabouo de suas hipteses, custa de um
crescente distanciamentoda realidade. Elas geralmente tm a pretenso
de serem mais cientficas do queas teorias apreciativas, baseadas na
anlise histrica e emprica. Esta pseudo-supe-rioridade da formalizao
fica obscurecida quando aplicada a uma cincia socialcomo a
economia, onde o nmero de variveis maior e, em muitos
casos,impondervel. A diferena entre as teorias formais e
apreciativas, segundo Nelson(1995:50), apenas uma questo de
linguagem, pois ambas so teorias.
O distanciamento no significa que a teoria v inteiramente a
reboque darealidade. Muitos autores, a exemplo de Marx e
Schumpeter, foram capazes deidentificar caractersticas e tendncias
bsicas da organizao da produo que sforam amplamente reconhecidas
muitos anos aps sua publicao. Cabe aquiuma analogia entre inovao e
difuso de novas tecnologias. As novas idias, aexemplo das inovaes
tecnolgicas, no alcanam sucesso enquanto no surgemcondies
econmicas, sociais e inovaes complementares adequadas sua acei-tao.
Assim, a tendncia concentradora da economia capitalista apontada
porMarx ainda no sculo XIX precisou de algumas dcadas e evidncias
empricas paraser reconhecida. Schumpeter, por sua vez, precisou de
uma nova revoluotecnolgica (ocorrida dcadas depois de seu
falecimento) para ter sua teoria sobre
Paulo Bastos Tigre
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Revista Brasileira de Inovao
o papel da tecnologia sobre o desenvolvimento resgatada e
aperfeioada pela cin-cia econmica. A teoria incorporou seus
postulados quando estes se tornaramteis para analisar uma nova
realidade estabelecida.
Quanto ao aspecto ou foco da anlise, a complexidade e
multiplicidade defacetas que o estudo da firma pode assumir tornam
quase impossvel o desenvol-vimento de uma teoria completa e
coerente. Corpos tericos so influenciadospor uma viso particular da
realidade e carregam o peso de preocupaes diferen-ciadas. Assim,
enquanto uma corrente est preocupada em analisar a organizaointerna
da firma, outra est focada nas transaes e interaes com o
mercado.Cabe lembrar que a anlise destes aspectos est assentada em
diferentes reas doconhecimento, combinando mtodos e conceitos que
transcendem o mbito daeconomia. Os aspectos relacionados organizao
da produo so originalmen-te objeto de estudo das reas de engenharia
da produo e administrao de em-presas; as relaes industriais e
mecanismos de incentivo so um campo deestudo compartilhado com os
socilogos; o estudo da inovao e da difuso detecnologia est
assentado na contribuio de especialistas em tecnologias, en-quanto
as polticas pblicas partem do aporte terico dos cientistas
polticos.O desenvolvimento terico da firma depende, portanto de uma
maior aberturapara mltiplas disciplinas.
Por fim, o objeto da anlise constitui outro complicador para a
formulaode uma teoria unificada da firma. No existe um modelo nico
de firma capita-lista. Mesmo em um perodo de tempo delimitado
existem diferentes tipos defirmas, indstrias e mercados coexistindo
em um ambiente econmico. A idiade paradigma contribui para
estabelecer padres de comportamento e identifi-car
tecnologias-chave. Os paradigmas, no entanto, so apenas vises
idealizadasde modelos organizacionais e tecnolgicos dominantes em
certos perodos detempo. Os novos paradigmas se desenvolvem mais
rapidamente em certos pasese setores econmicos do que em outros.
Sua difuso geralmente assimtrica,resultando na heterogeneidade
econmica. Este aspecto refora ainda mais a ne-cessidade de recorrer
ao trabalho emprico para entender firmas e mercados.
Paradigmas Tecnolgicos e Teorias Econmicas da Firma
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Revista Brasileira de Inovao
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