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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 50 ISSN 2175-0947
PARMNIDES E O CAMINHO DA JUSTIA1
Hilda Helena Soares Bentes2
Resumo: Prope-se a analisar o pensamento de Parmnides,
indicativo de uma concepo de Justia a meio caminho entre o perodo
pr-socrtico e os sistemas filosficos de Plato e Aristteles.
Inscreve-se Parmnides na fronteira de um pensar mtico e na busca de
uma ordenao racional de ideias. O caminho delineado por Parmnides
estabelece vias antitticas, destacando-se o caminho do conhecimento
verdadeiro. Viagem conduzida pela Deusa Justia, em que se revela o
itinerrio rumo a um nvel de maior abstrao, afastando-se do plano da
dxa, reino das opinies contrastantes. Trata-se da viagem do homem
sbio em busca da sabedoria, dos fundamentos tericos que balizam a
condio humana e o Direito. Palavras-chave: Pr-socrticos; Justia;
Conhecimento; Filosofia do Direito. Abstract: It seeks to analyze
Parmenides thought, expressive of a conception of Justice that can
be situated between the presocratic period and the philosophical
systems of Plato and Aristotle. Parmenides is classified on the
border of a mythical thinking and a search of a rational
organization of ideas. The way outlined by Parmenides establishes
two antithetical directions, with emphasis on the way of true
knowledge. The journey is led by the Goddess of Justice, occasion
when the path towards a level of more abstraction is taken, off the
dxa stage, considered the realm of the contrasting opinions. It
concerns the journey of the wise man in search of wisdom, of the
theoretical bases that founded the human condition and the Law.
Keywords: Presocratics; Justice; Knowledge; Philosophy of Law.
1 Artigo recebido em 13/07/2011 e aprovado para publicao pelo
Conselho Editorial em 20/07/2011. 2 Doutora em Filosofia do Direito
pela PUC/SP e Professora Adjunta da Universidade Catlica de
Petrpolis UCP. Currculo Lattes:
http://lattes.cnpq.br/7621671933218419. E-mail:
[email protected].
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INTRODUO
O tema visa, principalmente, a efetuar uma abordagem sobre a
concepo de Justia
esboada pelo pr-socrtico Parmnides. Afigura-se como um caminho
necessrio para a
perfeita compreenso da Justia o resgate de pensadores que
erigiram conceitos matriciais
para a Filosofia do Direito, como Anaximandro, Herclito e
Parmnides.
Trata-se, portanto, de recuperar o sentido originrio de Justia e
do arcabouo
conceitual que os gregos, como os grandes tericos da Justia, nos
legaram. Parmnides
representa um momento culminante do perodo que antecede aos
grandes sistemas
filosficos de Plato e Aristteles, sendo, portanto, fundamental
que a ele retornemos para
extrairmos suas preciosas lies.
Na primeira parte uma breve contextualizao da biografia de
Parmnides
oferecida. Essa etapa importante para apresentar o momento
histrico em que Parmnides
viveu e refletiu sobre as vicissitudes da vida humana e as
exigncias da plis. Acentuam-se as
influncias filosficas que se cruzam no limiar do esplendor dos
grandes filsofos gregos,
tendo Scrates como o ponto de referncia.
Parte-se, em seguida, para uma anlise sobre o poema Sobre a
natureza, ttulo
comum entre os pr-socrticos e tema recorrente na reflexo levada
a cabo por esses
pensadores. Poeticamente construdo, o poema prenuncia conceitos
de enorme ressonncia
na histria do pensamento filosfico ocidental. No que concerne
questo da Justia,
avultam as figuras mticas de forte simbologia, assim como
conceituaes que permitem
vislumbrar um conceito de Justia num nvel mais abstrato.
E o caminho para a Justia delineado por Parmnides, forma pura
que busca um
sentido incorpreo. Representa o esforo do homem que persegue a
sabedoria localizada
num plano de abstrao mais pronunciado, distanciando-se do mundo
sublunar, mbil, das
opinies dissonantes. Cuida-se de seguir os passos rumo a uma
fonte de saber inusitada e
que ser desenvolvida com vigor pelos filsofos posteriores.
Nosso caminho terico e descritivo. Visa a acompanhar o
pensamento instigante
de Parmnides atravs da leitura de seu poema e de seus
comentadores. Considerados como
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os grandes tericos da Justia, os gregos lanam os alicerces de
uma poderosa interrogao e
de um problema permanente para a Filosofia do Direito, qual
seja, a Justia.
1- BREVE PERFIL DO PR-SOCRTICO PARMNIDES
Parmnides nasceu em Elia, colnia grega situada no sul da Itlia,
que viria a
constituir-se num centro filosfico de importncia capital para o
desenvolvimento do
pensamento especulativo. A sua biografia marcada por vrios
pontos obscuros e
controversos, porm sabe-se, de acordo com os relatos
doxogrficos, que Parmnides teria
tido uma enorme projeo devido ao fato de pertencer a uma famlia
de elevada
preeminncia social e de ter tido uma atuao poltica significativa
ao elaborar uma
importante legislao para sua cidade. , no entanto, no aspecto da
cronologia que as
maiores incertezas aparecem, provocando divergncias insuperveis.
Costuma-se fixar o
acme da vida de Parmnides na sexagsima nona Olimpada (504-500
a.C.), informao
derivada de Apolodoro e transmitida por Digenes Lartios3.
contemporneo de Herclito, com quem polemiza por considerar
ilusrias e
insustentveis as suas ideias sobre o devir e os opostos. Quanto
ao seu nascimento, as
discrepncias aumentam, no obstante a maior parte dos
comentadores aceite o testemunho
de Plato que relata o encontro de Parmnides, aos sessenta e
cinco anos, com o jovem
Scrates em Atenas. Como esse teria sido condenado morte, em 399
a.C., aos setenta
anos, estabelece-se, com alguma preciso, que Parmnides teria
nascido em 515 a.C. A data
do florescimento fornecida pela doxografia e a do nascimento
deduzida de Plato so
3 John Burnet (1994, p. 142-143) salienta que a informao de
Apolodoro, relatada por Digenes Lartios, leva em considerao a
fundao da cidade de Elia, ocorrida em 450 a.C., poca em que se fixa
o acme de Xenfanes de Clofon. Parmnides teria nascido nesta data,
da mesma forma como se estabelece o nascimento de Zeno,
correspondendo ao florescimento do primeiro, ou seja, por volta de
500 a.C. Vale dizer, Apolodoro costumava fazer combinaes entre o
acme e o nascimento dos pr-socrticos, o que, para Burnet, no devem
ser levadas em considerao. Consultem-se, igualmente, os seguintes
autores com relao biografia de Parmnides: Barnes (1997); Bornheim
(1991); Brun (1991); Kirk., Raven, Schofield (1994); Lartios
(1977).
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discordantes, mas o comentrio platnico tem prevalecido como
historicamente mais
relevante.4
Vrias influncias sobre o pensamento de Parmnides so apontadas
pela tradio
doxogrfica, particularmente do pitagrico Ameinias. No entanto, a
despeito de algumas
ideias msticas presentes na sua doutrina, Parmnides afasta-se do
pitagorismo devido ao
carter dualista implcito na teoria dos opostos, que converge, no
obstante, para uma
unidade numrica5 constituinte das coisas. Presume-se tambm que
teria conhecido
Xenfanes de Clofon. Da crtica ao politesmo e ao antropomorfismo
da religio,
Xenfanes postula a existncia de um Deus caracterizado pela
unicidade, identidade e
imobilismo, apreensvel pelo pensamento. Esse aspecto da concepo
religiosa de Xenfanes
considerado como uma antecipao da teoria parmenideana do Ser,
despojada do
elemento da divindade absoluta e pensada exclusivamente em
termos metafsicos6.
Importa sublinhar que Parmnides coloca-se em oposio filosofia
milesiana, em
especial ao monismo materialista, ou seja, tentativa de
encontrar uma substncia primria
criadora do cosmo, e nfase no mltiplo como gerao e corrupo das
coisas. Nega,
igualmente, o mobilismo e a doutrina dos contrrios de Herclito,
banindo o devir da
cogitao filosfica. Todavia, se o conceito de phsis no pensamento
pr-socrtico implica
uma investigao sobre o Ser em nvel metafsico, poder-se-ia
afirmar que com Parmnides
h a elaborao explcita e rigorosa de uma teoria sobre o Ser de
forma radical e definitiva. 4 O testemunho de Plato encontra-se no
dilogo Parmnides (Ou: Sobre as idias. Gnero lgico), in verbis:
Ento, Antifonte disse que Pitodoro lhe contara como, de uma feita,
Zeno e Parmnides vieram as grandes Panatenias. Parmnides j era de
idade avanada, cabeleira inteiramente branca e de presena nobre e
veneranda; poderia ter sessenta e cinco anos. [...] Scrates nesse
tempo era muito jovem [...]. In: :___. Dilogos de Plato: Parmnides
Filebo. Trad. Carlos Alberto Nunes. Belm: Universidade Federal do
Par, p. 19-85, 1974, v.VIII. (Coleo Amaznica/ Srie Farias Brito),
p. 22. 5.PESSANHA, Jos Amrico Motta. Do mito filosofia. In: Os
pr-socrticos: fragmentos, doxografia e comentrios. Trad. Jos
Cavalcante de Souza et al. So Paulo: Nova Cultural, 1996. (Os
Pensadores), p.20. 6.Quanto s informaes doxogrficas, ver
particularmente o testemunho de Digenes Lartios, na obra j
mencionada, livro IX, captulo 3, 21, p.256. Com relao aos
comentrios acerca das doutrinas pitagrica e a de Xenfanes,
consultar Bornheim, 1991, p.30 e 47-48; Kirk., Raven, Schofield
(1994, p.172-177; 228-231; 242-246). Vale transcrever o comentrio
de Aristteles na Metafsica com relao aos pitagricos: [...] Os
Pitagricos, por sua parte, disseram igualmente que existem dois
princpios, mas acrescentaram isto, que lhes peculiar: para les, o
finito e o infinito no so atributos de outras coisas, p. ex. do
fogo, da terra ou de algo semelhante, mas o prprio infinito e a
unidade constituem a substncia das coisas de que so predicados. Eis
a por que o nmero foi para les a substncia de tdas as coisas. [...]
In: ___. Metafsica. Trad. Leonel Vallandro. Porto Alegre: Globo,
1969. (Biblioteca dos Sculos), livro I, 987a, 10-20, p.49.
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A phsis (natureza; processo de nascimento e crescimento;
natureza de um ser; princpio
originrio) o Ser concebido em termos lgicos e abstratos,
superando as incertezas da
mudana e da multiplicidade7.
A importncia da doutrina parmenideana pode ser aquilatada no
curso da histria
da filosofia. Parmnides representa um corte significativo em
relao s concepes
especulativas anteriores e uma alavanca propulsora para o
desenvolvimento dos sistemas
filosficos posteriores, desde Plato e Aristteles at a Idade
Mdia, com reflexos at a
Modernidade. considerado o fundador da Metafsica e da Lgica8.
Com ele inicia-se um
perodo em que a filosofia adquire autonomia em face dos fatos
observveis da natureza,
instaurando, em contrapartida, um rgido esquema dicotmico entre
ser e no-ser, entre
essncia e aparncia, entre verdade e opinio, que repercute h mais
de vinte e cinco
sculos, ora abstraindo o homem da realidade, ora dilacerando-o,
ora apaziguando-o num
gigantesco esforo de reconciliao das antinomias propostas pelo
filsofo de Elia9.
2- O POEMA: SOBRE A NATUREZA
Parmnides autor de um poema intitulado Sobre a natureza, escrito
em versos
hexmetros e composto de duas partes distintas, aps um prlogo, de
teor marcadamente
alegrico: a primeira parte refere-se ao Caminho da Verdade, em
que Parmnides expe
com rigor a concepo sobre a verdadeira natureza do real; a
segunda denomina-se o
Caminho da Opinio, delineado segundo o padro cosmolgico jnio,
restando dessa parte
7.Cf. especialmente com referncia ao afastamento de Parmnides do
monismo materialista, Burnet (Op. cit., p.150), e Guthrie (1987
p.43-44). Quanto considerao da phsis de Parmnides entendida como a
procura absoluta do sentido do Ser, ver Gomperz (1949, p.170-172).
8. Cabe assinalar que, conquanto seja atribudo a Parmnides o mrito
de ter primeiro formalizado os princpios bsicos da Lgica, esta s
foi sistematicamente discutida e classificada a partir de
Aristteles, que, superando a dialtica platnica, instituiu os
instrumentos necessrios para a realizao do conhecimento e da
elaborao do discurso. Para um aprofundamento da noo de Lgica, suas
classificaes e desdobramentos, consultar o verbete Lgica, in Mora
(1996, p.431-437). 9.Cf. Kirk., Raven, Schofield (Op. cit., p.251);
Morente (1980, p.72-79).
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poucos fragmentos, o que contribui para manter esses versos
remanescentes envoltos numa
obscuridade difcil de ser eliminada10.
O prlogo do poema transmite ainda a viso de um mundo marcada
pela herana
mtica, ou seja, a linguagem de Parmnides ainda potica na medida
em que utiliza
recursos imagsticos provenientes da histria dos Mestres da
Verdade, expresso usada por
Marcel Detienne na sua obra Os mestres da verdade na Grcia
arcaica11, que, atravs da
palavra mgico-religiosa, haviam sido os condutores iluminados da
Altheia (Verdade).
Com efeito, o poeta, o adivinho e o rei de justia so, naquele
contexto, os portadores de
uma mensagem inspirada, como manifestao da Altheia, ou seja, da
verdade revelada
somente queles possuidores de uma memria sacralizada12, acesso
concedido aos
privilegiados que tm o dom de penetrar nos mistrios e decifrar o
invisvel, o absoluto, o
inescrutvel.
A utilizao da simbologia ligada Altheia afigura-se no somente
adequada para
veicular o sentido de uma viagem descobridora e ascensional rumo
Verdade absoluta,
como tambm, simultaneamente, para descortinar toda a carga de
ambiguidade que essa
palavra encerra, dimenso que Parmnides preserva por ser inerente
condio humana13.
Na verdade, o promio apresenta a configurao do homem sbio14 em
busca do
conhecimento filosfico, modelado ainda em conformidade com as
figuras arquetpicas da
tradio mtica, e a prefigurao da base estrutural do poema,
formada por caminhos
antagnicos impregnados por um imaginrio alternante de Dia x
Noite, de Luz x Trevas,
representaes metafricas para expressar a oposio entre Altheia e
dxa (opinio).
10.Cf. Barnes (1997, p.150); Kirk., Raven, Schofield (1994.,
p.251); Zeller (1980, p.49-50). Para um melhor entendimento, convm
transcrever o significado de verso hexmetro: Diz-se de ou verso
grego ou latino de seis ps, podendo os quatro primeiros ser dtilos
ou espondeus, sendo o quinto dtilo, e o sexto espondeu. In:
HOUAISS, Antnio; VILLAR, Mauro de Salles; FRANCO, Francisco Manoel
de Mello. Dicionrio Houaiss da lngua portuguesa. Rio de Janeiro:
Objetiva, 2009, p. 1.017. 11. Cf. 1988, passim. 12.DETIENNE,
Marcel. Os mestres da verdade na Grcia arcaica. Trad. Andra Daher.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988, p.17. 13. Detienne trata
explicitamente de Parmnides em diversas partes, podendo-se citar,
especificamente, as pginas 14, 69, 70, 71 e 72, da obra citada. Com
referncia tradio mtica e viagem rumo ao saber, vrios comentadores
abordam o tema; porm, mencionamos aqueles que mais contriburam para
a compreenso do prlogo de Parmnides: Cornford (1981, p.191-195);
Gernet (1968, p.241-249); Jaeger (1989, p. 151-152); Marques,
(1990, p.43-54). 14. JAEGER, op. cit., p.152.
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Parmnides conta esta viagem rumo sabedoria alegoricamente no
prlogo, que,
afortunadamente, foi conservado por Sexto Emprico:
As guas que me levam onde o corao pedisse conduziam-me, pois via
multifalante me impeliram da deusa, que por todas as cidades leva o
homem que sabe; [...] quando se apressavam a enviar-me as filhas do
Sol, deixando as moradas da Noite, para a luz, das cabeas retirando
com as mos os vus. l que esto as portas aos caminhos de Noite e
Dia. [...] destes Justia de muitas penas tem chaves alternantes. A
esta, falando-lhe as jovens com brandas palavras, persuadiram
habilmente a que a tranca aferrolhada depressa removesse das
portas; [...] E a deusa me acolheu benvola, e na sua a minha mo
direita tomou, e assim dizia e me interpelava: jovem, companheiro
de aurigas imortais, tu que assim conduzido chegas nossa morada,
salve! Pois no foi mau destino que te mandou perlustrar esta via
(pois ela est fora da senda dos homens), mas lei divina e justia;
preciso que de tudo te instruas, do mago inabalvel da verdade bem
redonda, e de opinies de mortais, em que no h f verdadeira. No
entanto tambm isto aprenders, como as aparncias deviam validamente
ser, tudo por tudo atravessando (grifos nossos).15
importante enfatizar que o primeiro verso coloca-nos perante a
palavra corao
(em grego, thyms, geralmente traduzida por corao ou desejo),
vital para a compreenso
15.Utilizamos a traduo de Jos Cavalcante de Souza, em PARMNIDES
DE ELIA. Fragmentos: Sobre a natureza. In: Os pr-socrticos:
fragmentos, doxografia e comentrios. Seleo de textos e superviso
Prof. Jos Cavalcante de Souza. Trad. Jos Cavalvante de Souza et al.
So Paulo: Nova Cultural, 1996. (Os Pensadores), p.121-122. Importa
sublinhar, como fazem Kirk, Raven e Schofield (op. cit., p.254),
que o promio de Parmnides tem vrias ressonncias com a Teogonia: a
origem dos deuses, de Hesodo, principalmente no que se refere s
portas do Dia e da Noite e revelao transmitida por uma divindade.
Cf. em especial os seguintes versos da Teogonia: a origem dos
deuses, v. 22-25 e 29-32, p.107: Elas [as Musas heliconades] um dia
a Hesodo ensinaram belo canto/ quando pastoreava ovelhas ao p do
Hlicon divino./ Esta palavra primeiro disseram-me as Deusas/ Musas
olimpades, virgens de Zeus porta-gide:/ (...) Assim falaram as
virgens do grande Zeus verdicas,/ por cetro deram-me um ramo, a um
loureiro vioso/ colhendo-o admirvel, e inspiraram-me um canto/
divino para que eu glorie o futuro e o passado, [...]. In: HESODO.
Teogonia: a origem dos deuses. 3. ed. rev. Traduo e estudo Jaa
Torrano. So Paulo: Iluminuras, 1995. (Biblioteca Plen).
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global do poema parmenideano. De fato, o desejo de saber
componente indispensvel
para impulsionar o homem que busca o conhecimento, vido por
alcanar a compreenso
do mundo e do Ser. E nesse percurso, o jovem que se envereda
para o caminho da verdade
encontra nas divindades uma recepo acolhedora para as suas
pretenses, porquanto as
filhas do Sol dispem-se a gui-lo at a deusa, que o recebe
afavelmente, toma-lhe a mo
direita e ensina-lhe a verdadeira senda da sabedoria16. Essa
disposio para o conhecimento
abre a possibilidade para o dilogo, permitindo ao jovem ter
acesso palavra sagrada,
memria, em suma, altheia. Este processo de des-velamento,
sugerido poeticamente
pelas filhas do Sol, que das cabeas retirando com as mos os vus,
transforma o homem
que procura o saber em sophs, palavra que est vinculada ao
adjetivo saphs (claro,
verdadeiro). O jovem atinge a sua meta: ele contempla a Luz.
Toda a riqueza polissmica da palavra Altheia manifesta-se
intensamente, pois
Peith, a doce persuaso que a acompanha, faz-se presente no
prlogo: as filhas do Sol
persuadem Dke (Justia) a abrir a porta que conduz ao caminho da
sabedoria. Associada
igualmente Altheia, encontra-se Pstis, que corresponde confiana,
fidelidade. Pstis
um elemento importante no esquema do poema na medida em que d
suporte e
credibilidade ao discurso da deusa, revelador de duas vias
mutuamente excludentes. Com
efeito, a deusa proclama no prlogo que o jovem necessita
instruir-se da verdade e da
opinio de mortais, em que no h f verdadeira. Alm disso, a
presena de Pstis refora a
idia de deciso e deliberao do jovem em seguir as palavras
divinas e consagrar-se sbio.
Esses componentes no poema so indcios relevantes para se
desfazer o equvoco de que
Parmnides seria um pensador abstrato, alheio a qualquer
considerao de natureza
emotiva, porquanto a busca da verdade, para Parmnides,
necessariamente uma questo
de f e de desejo, e apresenta assim toda sua dimenso afetiva,
pois essencialmente um
movimento humano.17
16.Consoante Marcelo Pimenta Marques (Op. cit., p. 44), fica
estabelecida uma relao de reciprocidade entre o nvel humano e o
divino, o que impulsiona o desdobramento de todo o poema.
17.MARQUES, Marcelo Pimenta. O caminho potico de Parmnides. So
Paulo: Loyola, 1990. (Coleo Filosofia 13), p.51. importante
mencionar, como acrescenta o autor citado, a crtica que Nietzsche
(1995, p. 57) dirige a Parmnides em contraposio a Herclito: [...]
tambm ele um profeta da verdade, mas parece feito de gelo e no de
fogo, e irradia sua volta uma luz fria que queima. Ver Detienne
(Op. cit.,
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Configura-se, no prlogo, uma tessitura complexa em torno da
metfora do
caminho, eixo estrutural que se desdobrar na composio de todo o
poema. O jovem
empreende uma caminhada mtica e filosfica, ultrapassando a
obscuridade e vislumbrando
a esfera luminosa do conhecimento verdadeiro. Porm, a deusa
mostra-lhe no s o
caminho da verdade, mas tambm o caminho do no-ser e o da opinio
(dxa), dos quais
ele deve instruir-se para ser capaz de chegar a um correto
discernimento. O cruzamento dos
caminhos no poema um tema controvertido, mas foroso constatar
que Parmnides no
constri simplesmente rgidos pares antitticos e irreconciliveis;
ele insere-se na
ambiguidade da palavra Altheia, trabalha os opostos como
constituintes indispensveis do
processo de desvelamento, que necessita do jogo de contrrios
para poder realizar a sntese
almejada. Ademais, em Parmnides entrecruzam-se duas direes
existenciais definidas: nele
inscrevem-se o sbio, o profeta que adquire o dom da palavra
mgica, e, simultaneamente, o
legislador, ou seja, o cidado da plis, espectador da emergncia
da palavra-dilogo, e
responsvel por ordenar as opinies que se confrontam
incessantemente18.
O tema do caminho remete a uma questo fundamental desenvolvida
no poema de
Parmnides: o mtodo (mthodos). Com efeito, mtodo composto de met
e ods
(caminho), significando precisamente uma investigao que efetuada
de acordo com um
procedimento especfico com vistas a alcanar o conhecimento de
alguma coisa19. Trata-se,
portanto, de estabelecer um percurso racional rigoroso, apto a
tornar o discurso filosfico
inteligvel, superador das sendas enganadoras do mundo sensvel,
onde se contrapem
opinies discrepantes. John Burnet considera que o grande mrito
de Parmnides reside na
inveno de um mtodo de racionar, erigindo as categorias que podem
ser pensadas e
excluindo as afirmaes contraditrias20. A apreciao de Werner
Jaeger merece ser
transcrita por descrever, com pertinncia, a correspondncia entre
a metfora do caminho e
a descoberta do mtodo:
p.70), no que concerne s foras positivas que esto agregadas
palavra altheia, conferindo-lhe eficcia e realizao. 18.Cf. com
relao temtica do caminho e da ambiguidade no poema parmenideano,
Marques (Op. cit., p.19-47). 19.Cf. Chau (2002, p.505). 20.Cf.
1994., p.150.
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A descoberta do pensamento puro e da sua necessidade rigorosa
surge em Parmnides como a abertura de um novo caminho, mais, do
nico caminho praticvel para chegar posse da verdade. A partir deste
instante, a imagem da via reta (&) da investigao aparece
constantemente. E, embora por enquanto no passe de uma imagem, j
possui, todavia, uma ressonncia terminolgica que, especialmente na
oposio entre o caminho certo e o errado, se aproxima do sentido do
mtodo. aqui que tem razes este conceito cientfico fundamental.
Parmnides o primeiro pensador que levanta conscientemente o
problema do mtodo cientfico e o primeiro que distingue com clareza
os dois caminhos principais que a filosofia posterior h de seguir:
a percepo e o pensamento. O que no conhecemos pela via do
pensamento apenas opinio dos homens. Toda a salvao se baseia na
substituio do mundo da opinio pelo mundo da verdade. Parmnides
considera esta converso como algo violento e difcil, mas grande e
libertador. [...] (grifos nossos).21
Nos versos seguintes Parmnides ir demonstrar o seu mtodo de
investigao,
apontando o Caminho da Verdade como a nica possibilidade de
aceder ao conhecimento.
O mtodo utilizado a confrontao de duas vias diante das quais o
homem tem de decidir
que direo tomar sob pena de emaranhar-se numa nvoa de contradio:
a primeira via a
afirmao de que o Ser , enquanto que a segunda a sua negao,
indicando que o No-
Ser no . Essas proposies exclusivas visam a superar a
ambiguidade mtica contida na
palavra Altheia e a acenar para uma nova formalizao com relao ao
Ser e Verdade:
claramente identificado, o Ser afasta-se do No-Ser, que diludo
no Nada, nada dele pode-
se conhecer e dizer. O Ser plenamente concebido a verdadeira
constituio das coisas, a
phsis, a partir da qual o homem metafsico que surge dessa
ruptura construir um discurso
calcado no que realmente pode ser pensvel e exprimvel. a Razo,
deificada por
Parmnides, que proclama as palavras fundantes de um novo pensar
filosfico:
Pois bem, eu te direi, e tu recebe a palavra que ouviste, os
nicos caminhos de inqurito que so a pensar: o primeiro, que e
portanto que no no ser, de Persuaso o caminho (pois verdade
acompanha);
21.Op. cit, p.151. Ver no mesmo sentido a anlise de Bruno Snell
(1965, p. 341-354.) acerca do caminho como smbolo na cultura
grega.
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o outro, que no e portanto que preciso no ser, este ento, eu te
digo, atalho de todo incrvel; pois nem conhecerias o que no (pois
no exeqvel), nem o dirias ... [...] ............. pois o mesmo a
pensar e portanto ser.(grifos nossos)22
Especialistas observam que o uso do verbo grego enai (ser),
desdobrado nos dois
enunciados caracterizadores das duas vias de investigao, ou
seja, est () e ouk est (no ),
revela o sentido de verdade, de existncia, daquilo que evidente
por si mesmo. No poema
parmenideano, verifica-se o emprego do uso veritativo do verbo
para afirmar o que ou no
real e verdadeiro, centrado na unicidade do Ser, e, igualmente,
do uso predicativo para
expressar as propriedades inerentes ao Ser nico, que pensado a
partir da negao do
nada23. Parmnides desenvolve ao mximo uma poderosa reflexo
metafsica sobre a
linguagem, utilizada como recurso para conhecer o real, em torno
de um centro
minsculo, a pequena palavra grega , o verbo ser24, como analisa
Marcel Detienne. O verbo ser transforma-se em postulado
transcendental, em Ser universal e abstrato,
porquanto o ser (t n, substantivo abstrato derivado de enai) que
percebido e pensado
(do verbo noen) constitui-se em ontologia, pois o mesmo a pensar
e portanto ser,
sentena nuclear da doutrina de Parmnides25.
3- O CAMINHO DA JUSTIA
Da univocidade do Ser e da excluso do No-Ser, Parmnides ir
enunciar os
princpios lgico-ontolgicos da identidade e da contradio, o que
implica uma
22.Traduo de Jos Cavalvante de Souza, Os pr-socrticos, da Coleo
Os Pensadores, p.122. A problemtica do Ser e do No-Ser intensamente
discutida pelos comentadores, indicando-se entre os principais:
Burnet (Op. cit., p.149-150); Brun (1991, p.61-64; Kirk., Raven,
Schofield (Op.cit, p. 255-256); Marques (Op. cit p.55-67). 23.Ver
em especial o trabalho desenvolvido por Charles H. Kahn no que
concerne ao uso veritativo do verbo ser em grego, em Sobre o verbo
grego ser e o conceito de ser, passim. 24.Op.cit, p.70. 25.Este
verso, traduzido como pois pensar e ser o mesmo, por Gerd Bornheim,
em Os filsofos pr-socrticos. 7. ed. So Paulo: Cultrix, 1991, p.55,
tem suscitado vrias polmicas entre os estudiosos do perodo
pr-socrtico. Kirk, Raven e Schofield (Op. cit., p.257) comentam que
este fragmento foi acrescentado por Clemente e Plotino, tendo sido
omitido no relato doxogrfico de Simplcio.
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 61 ISSN 2175-0947
descontinuidade com o pensamento anterior, dominado pela palavra
ambgua e mgica de
Altheia, pura epifania, para se converter em discurso racional,
regido pela lgica da
contradio26, Altheia dessacralizada. No Caminho da Verdade
anunciado, Parmnides ir
revestir Altheia de atributos que convergem para a ideia de
unidade do Ser, desviando-se da
equivocidade de predicados mltiplos e contraditrios: o Ser
ingnito, imperecvel,
indivisvel, uno, contnuo, imvel, completo. Deve-se enfatizar que
o plano
divino interfere no discurso argumentativo, pois Dke, Annke
(necessidade, destino) e
Mora (o destino de cada um)27 compem a trplice presena divina de
deusas com poderes
de ligao, ordenao, amarrao e encaminhamento unificado.28 Com
efeito, todo o
frreo encadeamento lgico elaborado por Parmnides tem na metfora
das correntes29,
que as divindades expressam, um suporte eficiente para apontar
um novo caminho, um
novo mtodo de raciocnio, como pode-se constatar na exposio da
deusa:
S ainda (o) mito de (uma) via resta, que ; e sobre esta indcios
existem, bem muitos, de que ingnito sendo tambm imperecvel, pois
todo inteiro, inabalvel e sem fim; nem jamais era nem ser, pois
agora todo junto, uno, contnuo; pois que gerao procurarias dele?
Por onde, donde crescido? Nem de no ente permitirei que digas e
pense; pois no dizvel nem pensvel que no ; [...] Nem jamais do que
em certo modo permitia fora de f
26.DETIENNE, 1988, p.74. 27.De acordo com as informaes contidas
no Glossrio de termos gregos, do livro Introduo histria da
filosofia: dos pr-socrticos a Aristteles, v.1, de Marilena Chau,
Annke significa a necessidade como constrangimento ou coero;
destino inevitvel e inelutvel determinado pelos deuses; [...]; lei
na natureza. Inicialmente indica os laos de sangue que determinam o
destino individual pelos laos do parentesco da famlia e da estirpe;
a necessidade significa que no se pode negar a origem e o destino
que ela impe a algum; juridicamente, que no se pode negar a herana
a algum e algum no pode recusar-se a receber a herana da famlia
(estes sentidos so prprios de uma sociedade aristocrtica e desta
necessidade-destino que falam as tragdias gregas). Necessidade a
ordem das coisas estabelecidas pela divindade como lei; lei da
Natureza. Coisas e humanos so forados ou constrangidos a ser como
so e a agir como agem por fora da necessidade (divina, natural).
Ope-se ao acaso. [...], p. 494-495; Mora quer dizer o destino de
cada um, a necessidade que rege o curso das coisas. uma palavra da
mesma famlia de mros, parte. [...] A mora a parte ou quinho que
cabe a cada um e, por extenso, o destino. [...], p.506. 28.
MARQUES, O caminho potico de Parmnides, p.73. 29.G.S. KIRK; J.E.
RAVEN; M. SCHOFIELD, Os filsofos pr-socrticos: histria crtica com
seleco de textos, p.259. Cf. no mesmo sentido Marques (Op. cit.,
p.72-74).
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 62 ISSN 2175-0947
nascer algo alm dele; por isso nem nascer nem perecer deixou
justia, afrouxando amarras, mas mantm; e a deciso sobre isto est no
seguinte: ou no ; est portanto decidido, como necessrio, uma via
abandonar, impensvel, inominvel, pois verdadeira via no , e sim a
outra, de modo a se encontrar e ser real. [...] Nem divisvel , pois
todo idntico; nem algo em uma parte mais, que o impedisse de
conter-se, nem algo menos, mas todo cheio do que , por isso todo
contnuo; pois ente a ente adere. Por outro lado, imvel em limites
de grandes liames sem princpio e sem pausa, pois gerao e
perecimento bem longe afastaram-se, rechaou-os f verdadeira. O
mesmo e no mesmo persistindo em si mesmo pousa. e assim firmado a
persiste; pois firme a Necessidade em liames (o) mantm, de limite
que em volta o encerra, para ser lei que no sem termo seja o ente;
[...] outro fora do que , pois Moira o encadeou a ser inteiro e
imvel; [...] Ento, pois limite extremo, bem terminado , de todo
lado, semelhante a volume de esfera bem redonda, do centro
equilibrado em tudo;[...] (grifos nossos)30
Dke, a Justia de muitas penas, potncia divina vinculada Altheia:
ela que
guarda as chaves do caminho da verdade. Implacvel, ela simboliza
a ordenao do mundo,
a sentena que declara a medida justa. No poema parmenideano,
articulada revelao da
verdade, ela assume tambm o papel corretivo da razo ao
estabelecer com rigor os
pressupostos lgicos do pensamento31. Da mais alta relevncia a
invocao que a deusa faz
da lei divina e justia, ou seja, de Thmis e Dke, intimamente
associadas para conduzir o
jovem verdadeira conscincia filosfica. Consoante aprecia Marcelo
Pimenta Marques,
utilizando Thmis e Dke conjuntamente, Parmnides articula uma lei
que ultrapassa o
humano e uma norma que se inscreve nele. A partir dessa
articulao ele aponta para os
30.Traduzido por Jos Cavalvante de Souza, em Os pr-socrticos, da
Coleo Os Pensadores, p.123-124. 31.Cf. Detienne (Op. cit.,
p.70).
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 63 ISSN 2175-0947
caminhos que se distinguem medida que se aproximam ou se afastam
da lei divina.32
As concepes relativas Thmis e Dke, vale dizer, ao sentido de
justia divina e
de prescrio imperativa, so referncias importantes na elaborao de
um discurso
filosfico de validade universal, capaz de fixar com solidez os
fundamentos essenciais que
devero nortear o homem na sua existncia. O conceito consagrado
de Thmis e Dke aflora
com mais nitidez na medida em que se investiga a origem
etimolgica dessas palavras,
conforme demonstra mile Benveniste: Thmis provm do snscrito rta
correspondente ao
vocbulo latino ars, que significa ordem, e tambm de dhaman, em
grego thmis, sentido
de lei, cuja raiz dhe quer dizer estabelecer, colocar, ou seja,
Thmis passa a representar
a lei posta que tem por base uma ordem divina33; Dke, por seu
turno, deriva da raiz deik,
resultando em grego deknumi (mostrar) e em latim dico (dizer),
donde o significado de
mostrar verbalmente, com autoridade, uma prescrio normativa34.
Em outras palavras,
Dke quem vai dizer a Justia, com fundamento na lei divina, para
mostrar ao homem que
deseja saber o caminho da verdade.
Observa-se que, no discurso do Caminho da Verdade, Parmnides
entrelaa uma
linguagem de referncias mticas com as novas exigncias do
pensamento na tentativa de
dar credibilidade ao plo subjetivo que se impe como critrio
definitivo da verdade e da
realidade. Trata-se da glorificao da deusa da Razo35, como
afirma Cornford, a qual
instaura um domnio absoluto sobre a questo do pensar e do ser,
enlaando-os firmemente
num crculo fechado, deduzido formalmente mas petrificado nas
muralhas da abstrao. A
lgica da identidade e da contradio formula um mtodo more
geometrico para perquirir a
32.Op. cit, p.51. 33.Cf. Le vocabulaire des institutions
indo-europennes: Pouvoir, Droit, Religion, v.2, p.99-103; a raiz
dhe, significando colocar, estabelecer, derivou em grego tthemi. O
sentido de Thmis encontra--se no Dictionnaire Grec-Franais, de A.
Bailly, p.922. 34.Cf. Benvnsite (Op. cit., p.107-109). Ver,
igualmente, o significado de Dke no Dictionnaire Grec-Franais, de
A. Bailly, p.511. 35.CORNFORD, Principium sapienti: as origens do
pensamento filosfico grego, p.194. Ver a respeito da razo,
ordenadora dos critrios do conhecimento e do real, MONDOLFO,
Rodolfo. O homem na cultura antiga: a compreenso do sujeito humano
na cultura antiga, Trad. Luiz Aparecido Caruso. So Paulo: Mestre
Jou, 1968, p. 102, em que afirma que a razo determina as condies da
conceptibilidade, e a conceptibilidade se erige em critrio da
realidade; as exigncias interiores do sujeito pensante se convertem
em rbitro da existncia objetiva.
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 64 ISSN 2175-0947
verdade que dar base a uma predicao coesa, inteligvel, racional.
O crculo fecha-se no
ser reflexivo, mundo inviolvel e inabalvel, construindo formas
perfeitas de verdade, que,
na viso nietzscheana, s pode habitar nas generalidades mais
plidas e usadas, nos
invlucros vazios das palavras mais indefinidas, como numa casa
de teias de aranha: e o
filsofo est agora sentado ao lado desta verdade, exangue como
uma abstraco e
completamente enredado em frmulas.36
O Caminho da Verdade tem sido considerado a via condutora da
Metafsica e da
Lgica ocidental, excluindo o no-ser de suas cogitaes. Martin
Heidegger, todavia, na
Introduo metafsica, reivindica que o caminho do no-ser deve ser
pensado, porquanto
constitui um aspecto importante da meditao ontolgica. Heidegger
insiste na mtua
correspondncia entre phsis e lgos, como momentos pertencentes ao
des-velamento do Ser,
relao rompida pela tendncia em priorizar a lgica na filosofia
posterior. O fragmento
acima transcrito, pois o mesmo a pensar e portanto ser, em que
aparece o verbo noen,
comumente traduzido por conhecer e pensar, possui tambm o
significado de perceber37, ou
seja, a phsis como vigor surgente que se mostra percepo para que
sua essencializao
seja realizada.
Essa conexo resgatada pela interpretao heideggeriana implica o
reconhecimento
no do princpio da identidade, mas a reciprocidade38 entre o
pensar e o ser Altheia revelada nesse processo de manifestao de
pertena recproca. Na verdade, a relao
originria entre phsis e lgos possibilita ultrapassar o plano
gnosiolgico e adentrar numa
dimenso ontolgica, que rene, inobstante a opinio contrria da
tradio filosfica,
Herclito e Parmnides, pois, segundo a indagao de Heidegger, onde
mais poderiam
36.A filosofia na idade trgica dos gregos, p.67. Cf. Cornford
(Op. cit., p.192), quanto ao mtodo geomtrico empregado por
Parmnides; e Marques (Op. cit., p.74-76) com relao circularidade e
ao sentido compacto do ser presente no pensamento parmenideano.
37.O significado de noen, no Dictionnaire Grec-Franais, de A.
Bailly, p.1.330, aponta o sentido de aperceber-se de, colocar no
esprito, ter no esprito um pensamento certo, justo. Cf. Brun (Op.
cit, p. 64-65); Heidegger (1987, p.137 e 161-164;) Marques (Op.
cit., p.79-81). 38.NUNES, Passagem para o potico: filosofia e
poesia em Heidegger, 2. ed. So Paulo: tica, 1992. (Ensaios 122),
p.216.
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 65 ISSN 2175-0947
estar sses dois pensadores gregos, os instauradores da dimenso
de todos os pensadores,
seno no Ser do ente?39
A unidade de phsis e lgos, resultante da mostrao do Ser e da
reunio operada em
funo do lgein, permite que o homem se instaure na dinmica da
essencializao e,
consequentemente, no ato de pensar o seu destino e de decidir
sobre o caminho que dever
trilhar: a via do acesso plenitude do Ser e verdade revelada ou
a via da aparncia, da
dissimulao, da negao do Ser. Em Parmnides, a Altheia ainda
carrega vestgios da
ambiguidade que havia caracterizado o discurso mtico na medida
em que a linguagem do
poema estabelece correlaes pertinentes entre o ser e o pensar,
intrinsecamente
relacionados para servir de fundamentao para uma anlise
abrangente da existncia.
Nesse aspecto, importante sublinhar que, aps haver unificado o
ser e o pensar,
Parmnides refora essa identidade onto-lgica, no incio do Caminho
da Verdade, onde
utiliza lgein (dizer) e noen (pensar) conjuntamente para
exprimir o ser em contraste
com o no-ser, impensvel e indizvel; esta a via contraditria
percorrida pelos mortais que
no fazem uso das suas capacidades reflexivas. Considerado como
uma crtica explcita
teoria dos contrrios de Herclito, a passagem seguinte demonstra,
no obstante, a
convergncia entre os dois filsofos: ambos lanam acerbas
admoestaes contra os que no
so capazes de estabelecer as articulaes entre o ser e o pensar
para alcanar uma identidade
reveladora, vale dizer, o lgos heraclitiano e o ser parmendico
compartilham do mesmo
pensamento originrio40:
Necessrio o dizer e pensar que (o) ente : pois ser, e nada no ;
isto eu te mando considerar. Pois primeiro desta via de inqurito eu
te afasto, mas depois daquela outra, em que mortais que nada sabem
erram, duplas cabeas, pois o imediato em seus peitos dirige errante
pensamento; e so levados
39.Introduo metafsica, p.160. Cf. a explicitao de Heidegger a
respeito da conexo entre phsis, lgos e noen, na obra citada,
p.137-200; no mesmo sentido, Brun (Op. cit., p.64-65); Marques (Op.
cit., p.78-81). 40.Cf. Kirk, Raven e Schofield (Op. cit.,
p.257-258); Marques (Op. cit., p.80-81. Vale acentuar que Martin
Heidegger (Op. cit,, p.150-151), ao resgatar o pensamento originrio
dos primeiros pensadores, procura aproximar Parmnides e Herclito,
afirmando que a oposio estabelecida entre os dois pr-socrticos,
inclusive levantada por Nietzsche, fundamenta-se numa falsa
interpretao do pensamento primordial grego, em que ser e pensar
esto reciprocamente imbricados.
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 66 ISSN 2175-0947
como surdos e cegos, perplexas, indecisas massas, para as quais
ser e no ser reputado o mesmo e no o mesmo, e de tudo reversvel o
caminho. (grifos nossos)41
O poema de Parmnides est estruturado em torno de trs
caminhos
mutuamente exclusivos, diante dos quais o jovem deve instruir-se
para chegar deliberao
correta, que conduz ao verdadeiro conhecimento. O Caminho da
Opinio dos mortais no
foi preservado na sua inteireza, porm constitui um relato ambguo
acerca da viso
cosmolgica predominante, baseada em crenas contraditrias,
convencionais, destitudas
de verdade objetiva. A dxa, entretanto, deve ser posta em
confrontao com a verdade
anunciada por Parmnides, porquanto ele est situado na plis e a
sua palavra no apenas
revelao mstica, mas sobretudo dilogo persuasivo estabelecido com
os homens42.
Ao iniciar o caminho da opinio dos mortais, a deusa reveste-se
de toda a
ambiguidade da Altheia herdada da tradio mtica, reminiscncia das
Musas na Teogonia
de Hesodo, sendo Pstis e Peith substitudas por Pseuds
(desconfiana, mentira) e
Apte (engano), dimenses negativas constitutivas de Altheia,
servindo de recurso
expressivo para contrapor a demonstrao da verdade absoluta
exposio da opinio
instvel e cambivel dos mortais:
Neste ponto encerro fidedigna palavra e pensamento sobre a
verdade; e opinies mortais a partir daqui aprende, a ordem
enganadora de minhas palavras ouvindo. Pois duas formas estaturam
que suas sentenas nomeassem, das quais uma no se deve no que esto
errantes ; em contrrios separaram o compacto e sinais puseram parte
um do outro, de um lado, etreo fogo de chama, suave e muito leve,
em tudo o mesmo que ele prprio mas no o mesmo que o outro; e aquilo
em si mesmo (puseram) em contrrio, noite sem brilho, compacto denso
e pesado. A ordem do mundo, verossmil em todos os pontos, eu te
revelo, para que nunca sentena de mortais te ultrapasse. (grifos
nossos)43
41.Versos traduzidos por Jos Cavalcante de Souza, Op. cit.,
p.122. 42.Cf. Detienne (Op. cit., p.71-72); Kirk, Raven e Schofield
(Op. cit., p.264-267); Marques (Op. cit., p.81). 43.Traduo de Jos
Cavalcante de Souza, Os pr-socrticos, da Coleo Os Pensadores,
p.124.
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 67 ISSN 2175-0947
No Caminho da Opinio, Parmnides desenvolve a metfora unificante
do poema
centrada na contraposio entre claro x escuro, Luz x Noite,
compondo uma tessitura
potica coerente, apropriada para exprimir a dualidade das posies
irredutveis. No
entanto, seguindo a leitura heideggeriana, Parmnides no estaria
propondo uma viso
dicotmica entre essncia e aparncia, entre mundo inteligvel e
mundo sensvel; ao revs,
estaria ainda submerso na ambiguidade da palavra Altheia,
desbravando o caminho do Ser
atravs de um processo de re-velao, em que o manifesto e o oculto
mesclam-se
continuamente. Para Heidegger, dxa, em sentido lato, a
considerao em que algum se
encontra44, portanto, liga-se aos mltiplos aspectos do parecer,
que constituem as opinies
no convvio dos entes. Ao invs de representar a anttese da senda
iluminada da verdade, o
mundo da aparncia integra-se na caminhada do conhecimento, pois
cabe ao homem sbio
discernir cuidadosamente os aspectos enganadores dos
verdadeiros. A dxa, por
conseguinte, deve ser pensada como elemento indecomponvel do Ser
e da Altheia, como
explica Heidegger:
Estamos aonde queramos chegar. Posto que o Ser, physis, consiste
no aparecer, no oferecer aspectos, encontra-se essencialmente e
portanto necessria e constantemente na possibilidade de apresentar
um aspecto que justamente encobre e oculta o que o ente na verdade,
isto , na dimenso do re-velado e des-coberto (Unverborgenheit).
Essa vista, em que o ente vem a estar, aparncia no sentido de
simples aparentar. Onde h re-velao, des-cobrimento
(Unverborgenheit) do ente, h tambm a possibilidade da aparncia
(Schein). E onde o ente aparece e assim se mantm firme por muito
tempo, a aparncia pode desfazer-se e desmanchar-se. (grifado no
original)45
Consoante apreciao de Marcelo Pimenta Marques, a metfora do
caminho,
poeticamente trabalhada por Parmnides, no implica excluso e
separao das vias
enfocadas; ao contrrio, o percurso do jovem rumo ao saber e
verdade pressupe a
passagem e o constante intercmbio entre as regies do ser, do
no-ser e da aparncia,
44.Op. cit., p.130. Ver tambm Gomperz (1949, book II, chapter
II, p.181), em que o autor explica o significado de dxa como sendo
opinio, mas igualmente percepo, ou seja, a idia, ou viso, ou opinio
a coisa que aparece aos homens como verdadeira. [...], no original:
the idea, or view, or opinion the thing that appears to men to be
true). 45.Ibid, p.131. Cf. no mesmo sentido Marques (Op. cit.,
p.86).
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 68 ISSN 2175-0947
porquanto o caminho dos homens que erram pelo mundo integrado
esfera de validade
do saber, pois errar uma figura da prpria verdade (Altheia) do
ser.46 Deve-se ressaltar o
significativo uso do verbo errar na medida em que remete a uma
das mais interessantes
abordagens da filosofia heideggeriana, perfeitamente aplicada
construo metafrica do
poema. De fato, a insistncia do homem em permanecer no
esquecimento de seu Ser
analisada por Heidegger como um dos aspectos da errncia.
A errncia constitui a variao simultnea entre o desvelamento e a
dissimulao em
que o homem, ao invs de afirmar sua essncia, absorvido pela
cotidianidade
massificadora, impotente para vislumbrar a plenitude da
compreenso do Ser. Mais uma
vez, o filsofo alemo surpreende com sua terminologia, pois
errncia tem o duplo
significado de equivocidade como tambm de caminhada sem rumo, no
sentido de que,
segundo a interpretao de Emmanuel Carneiro Leo,
nesse esquecimento moderno, isto , nas fases de progresso da
tcnica e da cincia, se derrama a escurido da Noite Histrica na qual
o homem, perdendo os fundamentos de sua humanidade, erra, sem
ptria, no turbilho de uma objetividade sempre mais absorvente de
subjetividade. A poca da tcnica e da cincia o imprio do homem
a-ptrida em sua essncia.47
Parmnides coloca o homem perante trs caminhos distintos,
submetido a uma
escolha para alcanar a via reveladora da verdade. Todo o
discurso parmenideano gira em
torno da metfora do caminho, indicando as vertentes que iro
consolidar-se no
pensamento filosfico ocidental. Na verdade, a opo por uma via
unilateral significa um
caminhar estril, culminando numa aporia48 no nvel gnosiolgico e
metafsico. Parmnides
46.Op. cit., p.87. 47.1967, p.17. Sobre o tema da errncia, ver
em especial Heidegger (1996, p.166-168); Stein (1993, p. 191-192).
48.De acordo com o glossrio de termos gregos, do livro Introduo
histria da filosofia: dos pr-socrticos a Aristteles, v. 1, de
Marilena Chau, p.495, apora (a*poriva) palavra composta do prefixo
negativo a- e pelo substantivo pros (passagem, via de comunicao,
caminho, trajeto). [...] Apora significa: incapacidade de encontrar
caminho ou trajeto; falta de uma via ou um meio de passagem;
impossibilidade de chegar a um lugar; por extenso: impossibilidade
de deduzir, concluir, inferir. A apora uma dificuldade
insolvel.
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 69 ISSN 2175-0947
pensa os trs caminhos, distingue-os e unifica-os numa articulao
poderosa, seguindo a
interpretao de Heidegger:
Um homem verdadeiramente sbio no aquele que persegue cegamente
uma verdade. smente aqule que conhece constantemente todos os trs
caminhos, o do Ser, o do no-ser e o da aparncia. Um saber superior
e todo saber superioridade, s concedido quele que experimentou o
mpeto alado do caminho para o Ser. Que no estranhou o espanto do
segundo caminho para o abismo do Nada. E que aceitou, como
constante necessidade, o terceiro caminho, o da aparncia. 49
A palavra da deusa Altheia, Razo um convite ao homem racional
para que
ele, cruzando os caminhos, possa efetuar a ligao correta,
instauradora da Verdade e da
Justia. Heidegger analisa o poema de Parmnides luz de um enfoque
unificador,
desviando o homem da errncia e conduzindo-o verdadeira
sabedoria.
CONSIDERAES FINAIS
Investigaram-se subsdios para explicar as primeiras formalizaes
sobre a Justia em
Parmnides. Os pr-socrticos, em particular Anaximandro, Herclito
e Parmnides, so
porta-vozes de um pensar fundacional no que concerne definio
sobre o justo, o que os
habilita a serem considerados os primeiros tericos da Justia. Na
verdade, a contribuio
dos pr-socrticos vem sendo reabilitada nos tempos modernos como
forma de recuperar as
preciosas lies que esse pensamento legou para o patrimnio
filosfico dos homens.
Por conseguinte, retornar aos gregos e, principalmente, iniciar
pelos pr-socrticos,
constituiu uma etapa imprescindvel para refazer um caminho que
nos leva a uma melhor
inteligibilidade sobre o conceito de Justia. Esse trajeto terico
pressupe uma anlise
significativa dos escritos sobre esses pensadores, e,
particularmente, Parmnides assume uma
posio destacada em virtude do papel fulcral que desempenha na
transio entre o perodo
pr-socrtico e as grandes teorizaes sobre a Justia elaboradas
pelos sistemas platnico e
aristotlico.
49 .Introduo metafsica, p.139.
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 70 ISSN 2175-0947
Com efeito, Parmnides, calcado na estrutura do poema Sobre a
natureza, estabelece
uma viso antittica sobre o plano opinativo e o abstrato,
inteligvel; para esse nvel o
homem sbio dirige-se com o intuito de desenvolver suas
capacidades cognitivas e poder
deduzir conceitos verdadeiros, hauridos de um processo
intelectivo guiado pela Razo.
Itinerrio ainda povoado por componentes mgicos, herana da tradio
mtica anterior,
porm anteviso de uma esfera dominada por ideias claras e justas,
rigidamente desenhada
para evitar as equivocidades e as contradies.
Destaca-se a metfora do Caminho, simbolizando a viagem
ascensional rumo ao
plano terico sonhado. Idealismo vista. o embrio do sujeito
cognoscente que surge
nesta estrada nebulosa, vido por saber hbris (excesso;
desmedida) do fil-sofo. E a Justia o conduz neste desiderato: o
acesso ao conhecimento verdadeiro (da Justia?), ao
fundamento ltimo que baliza o nmos (territrio; norma),
mobilizador do pensamento do
fil-sofo do direito, e questo nuclear desde o perodo
pr-socrtico.
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Lex Humana, v. 3, n. 1, 2011, p. 71 ISSN 2175-0947
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
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BARNES, Jonathan. Filsofos pr-socrticos. 2. ed. Trad. Julio
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