-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
doi: 10.7213/psicol.argum.31.075.AO04 ISSN 0103-7013Psicol.
Argum., Curitiba, v. 31, n. 75, p. 665-676, out./dez.
2013PSICOLOGIA ARGUMENTO ARTIGO
[T]Estilos de f e sentido da vida[I]Style of faith and meaning
of life
[A]
Abstract
The present paper attempts identify the stiles of faith and
yours relationships with religiosity
and existential emptiness levels. Then, the reference principal
was the existential analyses of
Viktor Frankl, this theory understand the religiosity as search
for ultimate meaning of life.
The sample was of 25 participants with mean age of 31 years. The
instruments used were
Purpose in Life Test of James C. Crumbauch e Leonard T.
Maholick, an inventory of religios-
ity attitude and the interview of the development of faith, of
James W. Fowler. The results of
the content analyses indicated types of God conceptions, what
makes life meaningful; beliefs,
values and commitments; moments of communion or harmony with God
or the universe, pur-
pose of life and what is a religious person. These results were
discussed based on logotherapy
and existential analyses of Viktor Frankl.#][K]Keywords:
Religiosity. Existential analyses. Meaning of life.#]
[R]
Resumo
O presente trabalho teve como objetivo identificar os estilos de
f e relacion-los com os nveis
de religiosidade e vazio existencial. Para tanto, utilizou-se
como principal referencial teri-
co a anlise existencial de Viktor Frankl, que compreende a
religiosidade como uma vontade
de sentido ltimo para a vida. A amostra foi constituda por 25
pessoas com idade mdia de
31 anos. Os instrumentos utilizados foram o Teste Propsito de
Vida (PIL-Test), de James C.
Crumbauch e Leonard T. Maholick, um questionrio de atitude
religiosa e seis perguntas da
entrevista sobre o desenvolvimento da f, originalmente elaborada
por James W. Fowler. Por
meio de anlise de contedo foi possvel identificar categorias
pertinentes as concepes de
Deus; o que faz a vida significante; crenas, valores e
compromissos; momentos de comunho
ou harmonia com Deus ou com o universo; propsito da vida e o que
uma pessoa religiosa.
Os resultados foram discutidos a luz da logoterapia e anlise
existencial de Viktor Frankl. [#] [P]Palavras-chave: Religiosidade.
Anlise existencial. Sentido da vida. [#]
[A]Thiago Antonio Avellar de Aquino[a], Cintya Thaiana Arajo
Cabral Dantas[b], Ianny Felinto Medeiros[b],
Imytissonara Oliveira A. Lencio de Moraes[b], Myriam de Oliveira
Melo[b], Najara Mirella Cordeiro do Nascimento[c], Samkya Fernandes
de O. Andrade[d], Maria do Socorro Abrantes[e], Vnia Nunes
Pires[b]
[a] Doutor em Psicologia Social pela Universidade Federal da
Paraba
(UFPB), professor do Departamento
de Cincias das Religies da mesma
instituio, Joo Pessoa, PB - Brasil,
e-mail: [email protected]
[b] Graduadas em Psicologia pela Universidade Estadual da
Paraba
(UEPB), Campina Grande, PB -
Brasil, e-mails: cintyadantas@
hotmail.com, iannyfelinto@hotmail.
com, imytissonara.oliveira@hotmail.
com, [email protected],
[email protected]
[c] Psicloga do Ncleo de Ateno Sade da Famlia (NASF),
Mossor,
RN - Brasil, e-mail: psinajara.
[email protected]
[d] Psicloga, mestranda em Psicologia Social pela Universidade
Federal da
Paraba (UFPB), Joo Pessoa, PB -
Brasil, e-mail: [email protected]
[e] Psicloga, atua na linha de pesquisa Sade mental do
adolescente e juventude: comportamentos especficos e
procedimentos
preventivos no campo da Sade, na
Universidade Estadual da Paraba
(UEPB), Campina Grande, PB -
Brasil, e-mail: [email protected]
Recebido: 07/12/2010
Received: 12/07/2010
Aprovado: 16/11/2011
Approved: 11/16/2011
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Aquino, T. A. A. et al. 666
Introduo
Muitos pesquisadores apontam a religio e a re-ligiosidade como
um aspecto fundamental das so-ciedades e da estrutura da psique
humana (Eliade, 1999; Otto, 2007; Jung, 1961, 1978). Esse fato
pos-sivelmente decorre da busca de sentido da existn-cia humana,
bem como da conscincia da finitude. Seguindo esse pensamento, o
presente estudo tra-tou de uma investigao emprica das concepes de
Deus e da f luz da logoterapia e anlise exis-tencial de Viktor
Frankl.
A anlise existencial de Viktor Frankl e a busca de sentido
Segundo Lukas (1990), h um desejo profunda-mente enraizado na
dimenso humana que apenas se satisfaz por meio da realizao de
sentidos e, se ele for frustrado, o ser humano pode falhar na vida.
Frankl (1991) foi o principal terico do sculo XX que investigou e
descreveu a busca de sentido para a vida.
Conforme esse mesmo autor, o fracasso na busca de sentido pode
gerar a sensao de vazio existen-cial. A etiologia do vazio est
direcionada s con-sequncias sofridas pelo homem, pois ele no usa o
instinto para dizer o que fazer, nem a tradio, como os homens
antigos faziam. Isso resulta em um ser humano conformista, querer o
que os outros querem, ou at mesmo totalitarista, fazer o que os
outros fazem (Frankl, 1990). As prprias neuroses atuais devem ser
atribudas em muitos casos a tal frustrao (Frankl, 1973).
No obstante, Frankl elenca trs tipos de valo-res em que o ser
humano pode encontrar sentidos: os criativos, os vivenciais e os
atitudinais (Frankl, 1991). Os criadores fazem referncia ao
trabalho, que consiste nas atividades desempenhadas no am-biente em
que est inserido, ou seja, criando um tra-balho ou praticando um
ato. J os valores vivenciais se realizam em momentos vividos de
forma pura e intensa, experimentando algo (verdade, beleza) ou
algum. Uma forma de experimentar outro ser hu-mano em sua
originalidade amando, pois o amor a forma mais eficaz de captar
maior profundidade da personalidade humana, isso porque por meio do
amor que o ser humano consegue demonstrar e conscientizar o outro a
realizar suas potencialida-des (Frankl, 1991).
A terceira categoria a da atitude, que compre-ende os valores
descobertos diante de um destino trgico e imutvel. Frankl demonstra
que o senti-do tambm pode ser encontrado no sofrimento, ao
encontr-lo, este passa a no ser visto mais como desespero, e
torna-se uma verdadeira realizao humana (Frankl, 1973,
1991).Religiosidade segundo Frankl
Frankl (1973) afirma que um homem religioso, apoiado na f, torna
a passagem pelo sofrimen-to mais suportvel pela atribuio de um
sentido maior, de uma causa para tal sofrimento, ainda que
desconhecida. Havendo assim, para o homem reli-gioso, uma crena na
existncia de uma providn-cia. Frankl discorda da ideia de que, em
certas situ-aes, h uma falta de sentido da vida; antes prope uma
incapacidade de compreenso do sentido em termos racionais, o que
esse autor passou a chamar de suprassentido, em outras palavras,
uma crena incondicional no sentido da vida, mesmo quando o ser
humano se encontre em um destino sofrido (Frankl, 1991). O
suprassentido no seria apreens-vel na instncia da razo, mas s
poderia ser alcan-ado por meio da f.
Segundo a anlise existencial de Frankl, a reli-giosidade seria
algo que distinguiria o homem dos outros animais, pois parte-se do
princpio de que s o homem poderia temer a Deus. Compreende-se,
ento, que a religiosidade uma manifestao ex-clusivamente humana, e
que se constituiria tambm em um caminho ou recurso para a busca do
sentido (Pintos, 2007).
Segundo Frankl, o homem religioso apoia a cons-cincia na
instncia divina. J o homem no religioso obedece apenas sua
conscincia e a considera como ltima instncia. Para esse autor, a
religio est muito mais presente no homem do que ele imagina
conscientemente, posto que Deus seria o monlogo mais ntimo do homem
(Frankl & Lapide, 2005).
Frankl tambm reconhece que muito complexo definir Deus, pois a
nica forma de se relacionar com Ele por meio do dilogo. Assim, at
os ateus tam-bm necessitam dessa conversa interior, entretanto,
eles afirmam estarem dialogando com sua prpria conscincia. No
obstante, a religiosidade do homem atual encontra-se inconsciente,
posto que reprimi-da pelo mundo cientificista (Frankl & Lapide,
2005).
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Estilos de f e sentido da vida 667
A f e a cincia se necessitam mutuamente, isso porque uma f
incapaz de se confrontar com a cin-cia corre o risco de se
transformar em superstio. No entanto, o princpio e o fim, a origem
e a consu-mao de todas as coisas so competncias exclusi-vas da
religio. Isso porque por meio da divergn-cia que se possvel uma
viso mais ampla. Dessa forma, apesar de terem segmentos distintos,
tanto a religio quanto a cincia buscam o bem-estar do homem (Frankl
& Lapide, 2005).
At aqui foram delineadas as principais ideias de Frankl sofre a
religiosidade. Entretanto, com o intuito de apontar as diferenas
entre esse autor e outras abordagens, torna-se necessrio contrastar
as vises de Frankl com a de Freud e a de Jung, o que ser descrito
na sesso seguinte.
A religiosidade na perspectiva de Freud e Jung
Para Freud, tanto a religio como Deus so pro-jees de
necessidades neurticas, que correspon-dem a situaes infantis
relacionadas segurana e proteo ou, ainda, correspondem a uma
interio-rizao da imagem do pai (Pintos, 2007). com essa perspectiva
que ele tenta buscar a etiologia de mui-tos conceitos na obra Totem
e tabu (1913-1914).
Nessa obra, Freud apresenta o conceito de reli-gio usando como
base as histrias do homem pri-mitivo. Segundo ele, esses homens
apresentavam caractersticas similares com a dos homens de sua poca.
Assim, as percepes construdas por meio das artes (entre elas as
pinturas rupestres), mitos e contos de fadas serviram para melhor
compreender essa relao que existe entre o homem e a religio. Dentre
os estudos realizados, Freud no acredita que os homens primitivos
poderiam ter qualquer tipo de religio na qual adorassem os seres
superio-res, alm de, naquela poca, no existir nem um tipo de
instituio religiosa (Freud, 1974a).
Assim, a religio para Freud estar ligada ao complexo paterno, o
desamparo e a necessidade de proteo do homem, que ele especifica em
Totem e tabu (1913-1914). Em O futuro de uma iluso (1974b), Freud
explica que a noo de desamparo inicia na criana, e que esta se
ligar a objetos que lhe assegurem proteo e segurana. Dessa forma, a
me que satisfaz as suas necessidades de fome e de segurana se torna
o seu primeiro objeto de proteo, mas logo ela substituda pelo pai,
mais
forte, que assume tal posio pelo resto da infncia.
Posteriormente, tal atitude para com o pai mo-dificada, devido ao
sentimento peculiar de ambi-valncia, em que ela tanto o teme quanto
o anseia e admira. De acordo com Freud, tal sentimento de
ambivalncia talvez seja pelo relacionamento ante-rior que a criana
teve com a me. Sendo assim, o indivduo cresce e descobre que ir
sempre precisar de proteo contra estranhos poderes superiores, e
cria para si deuses nos quais busca proteo, mas tambm os teme. Os
deuses seriam, ento, a substi-tuio da figura materna e paterna de
proteo.
J para Jung, Deus um arqutipo universal, um conjunto de ideias e
imagens inseridas no in-consciente coletivo (Pintos, 2007). Tanto
para Freud como para Jung a religiosidade essencialmente
instintiva, em que um inconsciente religioso de-terminaria uma
pessoa. Jung d aspectos psicofsi-cos na definio de arqutipos,
quando afirma que est de alguma forma ligada ao crebro.
A religio, segundo Jung, vista como aquilo que Rudolf Otto
(2007) chamou de numinosum, que sig-nifica dizer que um efeito
ativo ou uma existncia no causada por um ato arbitrrio. Pelo
contrrio, o efeito domina o ser humano. O numinoso pode ser
considerado como a influncia de uma presena in-visvel ou pode ser
propriedade de um objeto vis-vel, que produziu um efeito distinto
na conscincia do indivduo. E todas as religies se engajam nessa
definio, at mesmo as mais primitivas. Ento, po-de-se dizer que o
termo religio a atitude de uma conscincia alterada pela experincia
do numinoso (Jung, 1978).
A religio uma das formas de expresses uni-versais mais antigas
da alma humana, podendo ser considerada como uma atitude
instintiva. eviden-te sua funo de manter o equilbrio psquico do
indivduo, porque a religio nada mais que uma subordinao dos fatos
irracionais da experincia, no se referindo somente s condies
sociais e fsi-cas, e torna-se um assunto importante para muitos
indivduos (Jung, 1961, 1978).
Jung encara a religio como uma atitude do esprito humano, e que
esta palavra propaga uma relao subjetiva com certos fatores
extramunda-nos e metafsicos. O propsito e o sentido das re-ligies
permanecem na relao do indivduo para com Deus (cristianismo,
judasmo, islamismo) ou no caminho da libertao e da salvao
(budismo). As religies pregam uma doutrina de dependncia
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Aquino, T. A. A. et al. 668
realidade objetiva da percepo subjetiva (Frankl, 1992; Pintos,
2007). Tendo em vista as considera-es tericas mencionadas,
considera-se pertinente investigar empiricamente o fenmeno da
religiosi-dade. Assim, a presente pesquisa teve por objetivo
identificar a relao entre os estilos de f e as con-cepes de Deus
com os nveis de percepo do sen-tido de vida e de
religiosidade.Mtodo
Participantes
Foram entrevistadas 25 pessoas da cidade de Campina Grande - PB,
sendo 15 do sexo feminino. A mdia de idade foi de 31 anos, com
amplitude de 20 a 45 anos. Com relao atribuio religiosa, oito se
diziam protestantes, 12 catlicos, dois espritas, dois sem religio e
um judeu. No que se refere ao grau de escolaridade, 14 eram
universitrios; qua-tro possuam curso superior completo; trs
esta-vam cursando o Ensino Fundamental, enquanto um possua tal
instruo; duas pessoas tinham o Ensino Mdio completo e uma estava
cursando.
Instrumentos para coleta de dados
O Teste de Propsito de Vida (Pil-Test-R) foi originalmente
elaborado por James C. Crumbaugh e Leonard T. Maholich (1964) e
revisado por Harlow, Newcomb e Bentler (1987). Essa verso apresenta
trs fatores: desespero existencial (alfa de Cronbach de 0,69),
realizao existencial (alfa de Cronbach de 0,71) e vazio existencial
(alfa de Cronbach foi 0,72) (Aquino et al., 2009). Esse
ins-trumento tem como finalidade medir o nvel de re-alizao de
sentido e o vazio existencial, e consiste em 12 itens dispostos em
uma escala de avaliao de sete pontos, com os extremos: 1 = discordo
to-talmente e 7 = concordo totalmente. Os itens dessa escala
contemplam os seguintes aspectos: prop-sito na vida (sete itens,
ex.: tenho na vida metas e objetivos muito claros); satisfao com a
prpria vida (seis itens, ex.: se a vida rotineira, dolorosa,
excitante, triste); liberdade (trs itens, ex.: eu no sou uma pessoa
muito responsvel); medo da mor-te (um item, ex.: quanto morte,
estou preparado e sem medo); ideias suicidas (um item, ex.:
quanto
do homem com relao a Deus, tendo uma ao to sugadora quanto do
mundo sobre ele (Jung, 1961, 1978). E quanto s figuras simblicas
das religies, elas representam a expresso da atitude moral e
espiritual especficas. Portanto, a religio pode ser considerada
como uma relao com valor supremo ou mais poderoso, podendo ser
positiva ou negati-va, voluntria ou involuntria (Jung, 1978).
Crticas de Frankl a Freud e a Jung
Em se tratando de religio, Frankl considera que a teoria
freudiana apresenta Deus como a imagem do pai e a religio como uma
neurose da sociedade, degradando-a aos olhos dos pacientes e
bloqueando a porta de entrada no supra-humano. Para a logote-rapia,
embora a religio seja um objeto de estudo, ela um objeto de sumo
interesse, pois todo passo dado pelo paciente religioso possui uma
dimenso autntica e genuna (Frankl, 1973).
Freud considera o aparelho psquico como algo cuja inteno
consiste em liquidar e dominar as quantidades de estmulos e
magnitudes de ex-citao que vm do exterior e interior. No entanto,
Frankl contrape essa postura argumentando que, visto por esse
ngulo, faltaria a caracterstica de au-totranscendncia da existncia
no ser humano, que o interesse principal do homem no por condies
internas dele prprio, prazer ou equilbrio, mas, ele orientado para
o mundo l fora em busca de um sentido que pudesse realizar ou uma
pessoa que pu-desse amar (Frankl, 1992).
Com relao a Jung, Frankl aponta que este autor desloca a
religiosidade inconsciente para o id, nesse caso, o eu no
responsvel pelos elementos reli-giosos; o religioso no pertence
responsabilidade e deciso do eu, ou seja, no o ser humano quem se
decide por Deus, ficando claro que Jung no con-sidera o homem
autnomo em relao religio. Em vista disso, Frankl faz uma crtica ao
reducionismo junguiano, por tratar os fenmenos humanos como
expresses de foras impulsivas. Dessa forma, pode--se falar de
impulsos religiosos da mesma maneira que nos referimos a um impulso
sexual ou agressivo.
No que se refere a Deus, Jung o v como um ar-qutipo universal,
isto , uma srie de imagens, cren-as e ideais que se inserem no
nosso inconsciente coletivo, sendo assim, o tema da imagem tem uma
grande importncia na psicologia junguiana, sendo vista como imago,
termo usado para diferenciar a
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Estilos de f e sentido da vida 669
Procedimentos ticos
Inicialmente, a presente pesquisa foi submeti-da e aprovada no
Comit de tica da Universidade Estadual da Paraba (UEPB), sob o
protocolo n. 0519.0.133.000-09. Seguiu todas as diretrizes e normas
que regulamentam as pesquisas que envol-vem seres humanos, como
prescreve a Resoluo n. 196/96, do Conselho Nacional de Sade. Todos
os participantes leram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE) antes de participar da pesquisa em foco.
Procedimentos para coleta de dados
A entrevista foi realizada de forma individual, em lugares
pblicos junto populao em geral. O respondente era abordado e
convidado a participar da pesquisa, se aceitasse, era conduzido a
um local mais reservado para responder aos instrumentos. Os
participantes receberam a informao de que as respostas dadas seriam
confidenciais e analisadas em seu conjunto. Os pesquisadores
utilizaram gra-vaes em udio para as perguntas abertas e,
pos-teriormente, executaram a transcrio na ntegra. O tempo mdio
para responder a todos os instrumen-tos foi de 30 minutos.
Procedimentos para anlise dos dados
Os dados foram tabulados no Pacote Estatstico para Cincias
Humanas (SPSS) e foram realizadas anlises descritivas, tais como
frequncias e o tes-te t de Student. No que se refere ao material
qua-litativo, realizou-se inicialmente uma pr-anlise por meio de
uma leitura flutuante das entrevistas. Em seguida, foi feita uma
anlise temtica, que, se-gundo Rey (2005), uma forma de penetrar nas
estruturas simblicas que configuram a vida co-tidiana das pessoas
em contextos reais. Para tan-to, seguiu-se as recomendaes de Bardin
(2002) para identificar ncleos comuns de sentido no dis-curso dos
participantes, o que, posteriormente, foi agrupado em categorias.
Os pesquisadores tiveram tambm a funo de juzes, e as categorias
foram extradas por consenso. No Quadro 1 so explana-das as
categorias emergentes dos discursos dos participantes.
ao suicdio, tenho pensado seriamente ao seu res-peito como uma
sada); se a vida vale a pena (um item, ex.: se eu morresse hoje,
sentiria que minha vida foi muito valiosa). Apesar de a escala ser
cons-tituda por trs fatores, pode ser utilizada como uma estrutura
unifatorial.
Escala de atitude religiosa: este instrumento composto por 20
itens distribudos de acor-do com os componentes da atitude
afetivo--comportamental e cognitivo. Os itens esto dispostos em uma
escala intervalar com os seguintes valores: 1 = nunca; 2 =
raramente; 3 = s vezes; 4 = frequentemente; 5 = sempre. O estudo de
Diniz e Aquino (2009) indicou uma estrutura unifatorial com a
consistncia inter-na alta (alfa de Cronbach = 0,94).Entrevista
sobre o desenvolvimento da f: esta entrevista foi originalmente
elaborada por James W. Fowler (Fowler, Streib, & Keller, 2004)
e tem por objetivo avaliar os estgios da f dos indivduos. Esse
instrumento consti-tudo por 25 questes, que esto subdivididas em
quatro partes: trama de vida ou reviso de vida; relacionamentos;
valores e compromis-sos atuais; religio. No obstante, para a
pre-sente pesquisa, foram utilizadas apenas seis perguntas do
referido instrumento: (1) Como sua imagem de Deus e sua relao com
Deus mudaram durante os captulos de sua vida? Quem ou o que Deus
para voc agora?; (2) Voc sente que sua vida tem sentido
atualmen-te? O que faz a vida significante para voc?; (3) Existem
quaisquer crenas, valores ou com-promissos que parecem ser
importantes para sua vida neste momento?; (4) Quando ou onde voc se
acha mais em comunho ou harmonia com Deus ou com o universo? Voc
pensa que a vida humana tem um propsito? Em caso afir-mativo, qual
voc acha que ?; (5) H um plano para nossas vidas, ou ns somos
afetados por um poder ou poderes alm de nosso controle?; (6) Voc se
considera uma pessoa religiosa? O que significa isto pra
voc?Variveis sociodemogrficas: constitui-se de questes como idade,
sexo, escolaridade, es-tado civil, nmero de filhos, religio, o
quanto uma pessoa se sente religiosa, o que a pessoa faz a maior
parte do tempo, se o sujeito apo-sentado, pensionista e
profisso.
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Aquino, T. A. A. et al. 670
Quadro 1 - Categorias emergentes dos discursos dos
participantes
Pergunta Categoria Definio
Quem ou o que Deus?
Definio pelos atributos divinos Corresponde s atribuies
direcionadas a Deus como ser supremo, infini-to, soberano. Definio
como direo
Corresponde s respostas que atribuem a Deus como sendo uma
direo, um guia.
Definio como relao/relacio-namento de amizade Corresponde
definio da relao com Deus como uma relao de amiza-de, uma relao em
que Deus sempre est ao seu lado.Definio como tudo Corresponde s
respostas onde Deus foi determinado como tudo.
Definio como princpio propulsor ajuda a superar as
dificuldades.
Corresponde s respostas que designam Deus como sendo o ser que d
foras, encoraja, cria, ajuda a superar as dificuldades.
Sem contedo Corresponde s respostas incoerentes.
O que faz a vida significante?
Deus Corresponde s respostas nas quais Deus colocado como Aquele
em que depositada uma f, e que essa f estimula a capacidade de
enfrentar os problemas, o dia a dia, superar tudo.
Relacionamentos Corresponde s respostas que colocam as relaes
familiares, de amizades, amorosas, como sendo de fundamental
importncia e que so expostas como o sentido de sua vida.Ajudar o
prximo
Corresponde s respostas em que a satisfao se d medida que se
ajuda o outro, sair de si para ir ao encontro do outro.Projetar o
futuro
Corresponde s respostas em que a vida faz sentido porque a ela
so coloca-dos objetivos para o futuro, e o fato de querer
conquist-los e alcan-los o que proporciona o sentido.
Bem-estar Corresponde s respostas em que o fato de se ter sade,
tanto fisicamente como psiquicamente, feliz consigo mesmo, j
permite um sentido de vida.
Estar vivo Corresponde s respostas que atribuem o sentido de
vida ao fato de se ter mais uma oportunidade de acordar e ter mais
um dia de vida, todo dia dia de renovao.
Realizao profissional Corresponde s respostas em que o sucesso
no trabalho ou nos estudos com-pleta o seu sentido de vida.
Tudo Corresponde s respostas em que tudo na vida faz
sentido.
Crenas, valores ou com-promissos so importantes para a vida?
F Corresponde s religies, f em Deus, salvao, crena em Deus,
Deus.
Relacionamentos Corresponde aos compromissos e valores atribudos
famlia, amigos e outros.Relao profissional vida
Corresponde s respostas em que o trabalho e os estudos foram
colocados como compromissos importantes para sua vida.Nenhuma
Corresponde resposta de que no existia nenhuma crena, valor ou
com-promisso importante.Religio Corresponde aos valores cristos e
religio.
Valores morais Corresponde s respostas que envolvem respeito,
altrusmo, amor.
Sem contedo Corresponde s respostas incoerentes.
(Continua)
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Estilos de f e sentido da vida 671
Quadro 1 - Categorias emergentes dos discursos dos
participantes
Pergunta Categoria Definio
Quando ou onde voc se acha mais em comunho ou em harmonia com
Deus ou com o univer-so?
Em orao Corresponde s respostas em que o ato de orar aproxima-se
de Deus.
Na igreja Corresponde s respostas em que nesse local pode-se
encontrar comunho com Deus.
SozinhoCorresponde s respostas em que estar sozinho significa
estar em comu-nho ou em harmonia com Deus ou com o universo.
No larA casa apontada como o local onde se pode alcanar essa
comunho ou harmonia. Em contato com a naturezao universo
Corresponde s respostas em que a natureza permite estabelecer uma
comu-nho ou harmonia com Deus e com o universo.
Todo momento e em todo luga-rou a comunho
Corresponde s respostas em que generalizaram e colocaram todos
os luga-res para encontrar a harmonia ou a comunho.Antes de
dormirharmonia. Corresponde s respostas em que a hora antes de
dormir o momento em que se pode encontrar a comunho ou a
harmonia.Ouvindo msica Corresponde resposta em que o ato de ouvir
msica permite encontrar essa comunho.
Quando cumpro a vontade de Deus Corresponde s respostas em que
foi ressaltada a vontade de cumprir o que Deus preconiza, na medida
em que agrada a Deus pode se sentir em comunho com Ele.
Qual o prop-sito da vida?
Exaltar a Deus Corresponde s respostas em que Deus colocado como
o que tem poder sobre as vidas e a exaltao faz parte desse
propsito, como amar a Deus sobre todas as coisas.Busca pessoal
Corresponde s respostas em que cada um segue e constri o seu
prop-sito. Promoo dos propsitos
Corresponde s respostas em que o propsito da vida render adorao
a Deus e obedecer a seus preceitos. Ajudar o prximo Corresponde s
respostas em que ajudar ao prximo faz parte da misso.
Realizao pessoal Corresponde s respostas em que o viver bem,
consigo e com o outro, faz com que se tenha um propsito.
Sem contedo Corresponde s respostas incoerentes.
O que significa ser uma pessoa religiosa?
Ter uma crena/religio Corresponde s respostas que indicam que
uma pessoa, para ser religiosa, precisa ter uma crena ou
religio.
Relacionar-se com Deus ter esse contato com o ser supremo, estar
mais perto de Deus.
Fazer o bem Corresponde s respostas em que as pessoas que fazem
o bem so conside-radas religiosas. Realizar atividades espirituais
Corresponde s respostas em que os atos de orar, fazer uma leitura
bblica e participar de rituais classificam uma pessoa como sendo
religiosa.
Ter f Corresponde s respostas em que, para ser considerada uma
pessoa religiosa, deve-se ter f, crer em alguma coisa.
Seguir os ensinamentos bblicos Corresponde s respostas nas quais
so consideradas pessoas religiosas as que seguem os preceitos
cristos ou instrues bblicas.
Tudo Corresponde resposta em que a palavra tudo est relacionada
a um pero-do de mudana experimentado pelo entrevistado.
Fonte: Dados da pesquisa.
(Concluso)
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Aquino, T. A. A. et al. 672
Na Tabela 2, observa-se que a maioria das pessoas que compem a
amostra refere-se aos Relacionamentos (60%) como o que faz a vida
signi-ficante para elas: A vontade que eu tenho de viver, de ajudar
os outros, de estar com minha famlia; Meus filhos, a felicidade dos
meus filhos, isso para mim o mais importante. Outras respostas
foram verifi-cadas, como: Realizao profissional (32%): Meu trabalho
profissional tambm algo que fao com intenso prazer; [...] estar
empregada e no desem-pregada. Tambm foram observadas respostas com
relao ao Projetar o futuro (24%): [...] porque eu tenho uma viso de
futuro; Acho que a perspectiva do futuro tambm d significado vida.
Com rela-o categoria Deus (20%), observa-se as seguintes respostas:
A f em Deus supera tudo, n?; Eu tenho um Deus muito forte dentro de
mim, ento tudo, tudo vale a pena. Na categoria Ajudar ao prximo
(16%), verifica-se os seguintes discursos: A vontade que eu tenho
de viver, de ajudar os outros; A possibilidade de estar me
formando, terminando um curso e poder ajudar outras pessoas, faz
com que a minha vida te-nha sentido. Em Bem-estar (16%),
encontram-se falas como: Enquanto eu tiver sade, n?, paz [...];
porque hoje eu vivo bem, tenho sade, graas a Deus. Na categoria
Estar vivo (16%), h os seguin-tes discursos: acordar todo dia e
estar a vivendo; Eu acho que s voc ter condies de acordar. E, por
fim, na categoria Tudo (8%), as seguintes falas:
Resultados No que se refere perspectiva quantitativa do
tra-balho, observou-se que a mdia de religiosidade da amostra
investigada foi de 68,2 (DP = 14,6), tendo uma amplitude de 26 a 96
pontos. J o nvel mdio de vazio existencial foi de 23,2 (DP = 5,8),
com uma amplitude de 14 a 36 pontos. Quanto anlise qua-litativa, na
Tabela 1 possvel observar as catego-rias que emergiram por meio das
respostas ao in-ventrio de James Fowler (Fowler et al., 2004).
Tabela 1 - Categorias e frequncias das respostas pergunta: Quem
ou o que Deus para voc agora?
Nome das categoriasFI
(Frequncia absoluta)
Fr%(Frequncia
relativa)
Tudo 11 44%Atributos divinos 9 36%Direo 6 24%Relacionamento de
amizade 5 20%Princpio propulsor 4 16%
Sem contedo 1 4%Fonte: Dados da pesquisa.
De acordo com a Tabela 1, pode-se observar que a definio de Deus
para a amostra pesquisada foi diversificada, porm, houve a
predominncia da de-signao de Deus como Tudo (44%). Tal resultado
verificado por meio dos seguintes recortes: Deus tudo pra mim; Deus
tudo at agora... pra mim ele tudo. Alm dessa, outra resposta
significativa foi a que traz a definio de Deus como Atributos
divinos (36%): Deus pra mim um ser acima de tudo e de todos... e Eu
toda vida acreditei que um ser supre-mo. Dentre as outras respostas
esto as definies de Deus como Direo (24%), por exemplo: Deus hoje
para mim um guia. Em seguida, algumas res-postas definem Deus pelo
Relacionamento de ami-zade (20%): Hoje tenho uma relao de amizade
com Deus; e como Princpio propulsor (16%): ele que move, que d
esperana. Respostas sem conte-do foram apresentadas por 4% dos
entrevistados.
Tabela 2 - Categorias e frequncias das respostas pergunta: O que
faz a vida significante para voc?
Nomes das categoriasFI
(Frequncia absoluta)
Fr%(Frequncia
relativa)Relacionamentos 15 60%Realizao profissional 8 32%
Projetar o futuro 6 24%Deus 5 20%Ajuda ao prximo 4 16%
Bem-estar 4 16%Estar vivo 4 16%Tudo 2 8%
Fonte: Dados da pesquisa.
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Estilos de f e sentido da vida 673
Todo momento; Todo local. Alm dessa resposta, a referida questo
apresenta outras como Na igreja (24%), exemplificada por: Ir pra
Igreja porque l eu me sinto bem...; Todo local, mas, mais ainda na
Igreja. Em relao categoria Sozinho(a) (24%), pode ser ilustrada por
meio dos seguintes exemplos: Quando estou sozinho; Quando estou s,
quando eu ligo os louvores. A categoria Lar (20%) constata--se por
meio das respostas: Principalmente quan-do estou em casa...; No meu
lar.... Na categoria Em contato com a natureza (16%), so
encontradas as falas: Acho que sentado na areia da praia, no fim da
tarde com uma lua bem linda; Ah! Quando estou em uma praia.... Em
Antes de dormir (12%) percebe-se as seguintes falas: Acho que no
final do dia. Quando voc vai dormir. Na categoria Em orao (8%), h
os exemplos: Nos momentos de orao.; Numa prece tambm..., e em
Quando cumpre a vontade de Deus (8%): Quando eu fao aquilo que Deus
predisse, en-to amar a Deus sobre qualquer coisa. Em Ouvindo msica
(4%): Quando estou ouvindo msica.
Constatou-se que 100% das pessoas entrevista-das acreditam que a
vida humana tem um propsi-to. Pode-se observar na Tabela 5, que,
dentre os pro-psitos identificados por elas, o que mais se destaca
a Busca pessoal (28%): Caber ao ser humano
Tabela 3 - Categorias e frequncias das respostas pergunta:
Existem quaisquer crenas, valores, ou compromissos que parecem ser
importantes pra sua vida neste momento?
Nome das categoriasFI
(Frequncia absoluta)
Fr%(Frequncia
relativa)
F 12 48%Relacionamentos 7 28%Relao profissional 7 28%Valores
morais 4 16%
Religio 2 8%
Sem contedo 2 8%
Nenhuma 1 4%Fonte: Dados da pesquisa.
Tudo, tudo...; Tudo, quando eu me levanto e olho as nuvens.
Em relao s crenas, valores e compromissos, possvel observar na
Tabela 3 maior incidncia de respostas direcionadas F (48%),
indicada nos se-guintes recortes: Crena, a f, a f sempre, a f; A
reza, a f. Outras respostas apresentadas foram ca-tegorizadas como
Relacionamentos pessoais (28%), com as seguintes falas: Meus
compromissos com a minha casa, com meu trabalho, com meus filhos;
Meus filhos, minha famlia, minha vida. Com o mes-mo percentual, nos
Relacionamentos profissionais encontra-se o seguinte exemplo:
Compromissos, os prprios que eu tenho com a universidade, acho
ex-tremamente importante para minha vida, o que es-tou tendo com
meu curso, com a minha futura profis-so, esse compromisso tem
relevncia muito grande. Nos Valores morais (16%) observam-se as
seguin-tes falas: Amor e respeito; Valores, o de... ... tentar
ajudar o prximo e no tentar interferir no bem-estar do outro.... E,
quanto Religio (8%), constatou-se as seguintes afirmaes: Sim, a
religio...; Todos os valores cristos que eu tenho so importantes.
Tambm foram encontradas respostas categoriza-das como Sem contedo
(8%) e Nenhuma (4%).
Como se pode observar na Tabela 4, os entrevis-tados relataram
que se acham mais em comunho, harmonia com Deus ou com o universo
Em todos os momentos e em todos os lugares (36%). O que con-firma
esse dado o tipo de discurso que se segue:
Tabela 4 - Categorias e frequncias das respostas pergunta:
Quando ou onde voc se acha mais em comunho ou harmonia com Deus ou
com o universo?
Nome das categoriasFI
(Frequncia absoluta)
Fr%(Frequncia
relativa)Em todo momento e em todo lugar 9 36%Na igreja 6
24%Sozinho(a) 6 24%No lar 5 20%Em contato com a natureza 4 16%Antes
de dormir 3 12%Em orao 2 8%
Quando cumpre a von-tade de Deus 2 8%Ouvindo msica 1 4%Fonte:
Dados da pesquisa.
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Aquino, T. A. A. et al. 674
observado neste recorte: pra mim ser religiosa voc ter um
contato pleno e bonito, seja l com qual intensidade for, mas que
voc tenha esse contato com o ser supremo, com Deus. Em Fazer o bem
(16%), pode ser observado: [...] e fazer o bem sempre, eu acho que
no h religio sem caridade. As respos-tas que correspondem categoria
Ter f tambm apresentaram 16%, exemplificadas em: Tem que crer em
alguma coisa e uma das coisas mais certas a se apegar a f. A
categoria Seguir os ensinamentos bblicos tambm apresentou a mesma
porcentagem de 16%, como em: Acredito e sigo as instrues b-blicas
para uma vida de comunho com o Pai. A ca-tegoria Realizar
atividades espirituais (12%) visi-velmente observada neste recorte:
Ser religioso pra mim estar em orao.
Aps a realizao da anlise de contedo, foi possvel explorar quais
categorias se associam com o nvel de religiosidade e vazio
existencial. Por meio de um teste t de Student, verificou-se que as
pessoas que definem Deus por seus atributos divinos apre-sentam um
escore mdio menor na escala de atitu-de religiosa (M = 60,9) em
comparao com aque-les que no apresentaram a mesma categoria (M =
72,5) em seus discursos, t (21,7) = 2,20, p < 0,05. J as pessoas
que definem Deus como Tudo apre-sentou as maiores mdias na pontuao
da escala de atitude religiosa (M = 76,8) do que as pessoas
procurar esse propsito de vida, em minha opinio isso. Na
sequncia, as respostas com carter mais significativo foram as que
se referiram Exaltao a Deus (24%): Adorao a Deus, que nosso
criador, a ele devemos tudo que somos. Ajudar o prximo apa-rece em
20% das pessoas entrevistadas, como pode ser verificado neste
recorte: Ns viemos pra ajudar o outro. Tambm foram verificadas
respostas que se enquadram em Realizao pessoal (16%), como: Acho
que a vida humana existe para voc viver. Em relao s respostas
acerca da Promoo dos prop-sitos de Deus (12%), pode-se observar:
Promover os propsitos de Deus. Foram categorizadas como Sem contedo
4% das respostas.
Quando indagados acerca da existncia de pla-nos ou poderes
maiores, se estes os atingem ou no, 80% dos respondentes disseram
que sim, 12% disseram que no e 4% ficaram na categoria Sem
contedo.
Com relao pergunta Voc se considera uma pessoa religiosa?, 76%
dos entrevistados disseram que sim, 20% disseram que no e 4%
responderam de forma intermediria. Como sugere a Tabela 6, ao
questionar as pessoas sobre o que isso significava para elas,
obteve-se as seguintes respostas: 40% dos entrevistados responderam
Ter uma crena/re-ligio, como ser religiosa seguir uma religio [...]
sigo os preceitos de Deus, ento, acredito que sou re-ligiosa; 24%
enfatizaram o Relacionar-se com Deus, Tabela 5 - Categorias e
frequncias das respostas pergunta: Voc pensa
que a vida humana tem um propsito? Em caso afirmativo, qual voc
acha que ? H um plano para nossas vidas, ou ns somos afetados por
um poder ou poderes alm de nosso controle?
Nome das catego-rias
FI(Frequncia
absoluta)
Fr%(Frequncia
relativa)
Busca pessoal 7 28%Exaltar a Deus 6 24%Ajudar ao prximo 5
20%
Realizao pessoal 4 16%
Promoo dos pro-psitos de Deus
3 12%Sem contedo 1 4%
Fonte: Dados da pesquisa.
Tabela 6 - Categorias e frequncias das respostas para a
pergunta: Voc se considera uma pessoa religiosa? O que significa
isso para voc?
Nome das categoriasFI
(Frequncia absoluta)
Fr%(Frequncia
relativa)
Ter uma crena/religio 10 40%Relacionar-se com Deus 6 24%Fazer o
bem 4 16%
Ter f 4 16%
Seguir os ensinamentos bblicos
4 16%Realizar atividades espirituais 3 12%Tudo 1 4%
Fonte: Dados da pesquisa.
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Estilos de f e sentido da vida 675
humano interpreta a vida sempre em funo de algo ou algum que no
ele mesmo. Nesse caso, relacio-namentos estariam vinculados aos
valores viven-ciais, enquanto que a profisso estaria relacionada
aos valores criativos.
De forma mais especfica, os valores da amos-tra estudada
emergiram na ocasio da pergunta: Existem quaisquer crenas, valores,
ou compromis-sos que parecem ser importantes pra sua vida nesse
momento? As respostas indicaram os seguintes te-mas: f,
relacionamentos, relao profissional e va-lores morais. Frankl
(1973) concebe que o homem no se satisfaz em estar no mundo, mas
ele procura motivos e razes para viver. Nessa perspectiva, as
respostas sugerem que as crenas e valores dos par-ticipantes da
pesquisa constituem-se como sentidos e valores para atuar no
mundo.
Em outra pergunta Quando ou onde voc se acha mais em comunho ou
harmonia com Deus ou com o universo? Foi possvel identificar a
ne-cessidade de algumas pessoas em ter um momento de solido e
recolhimento. Segundo Frankl (1978), para que o ser humano possa
escutar a sua cons-cincia, torna-se necessrio alguns momentos de
solilquios, o que seria para o homem religioso seu dilogo interior.
Assim, os resultados sugerem que para o homo religiosus o estar em
comunho com Deus ou com o universo estar em lugares sagra-dos como
a Igreja, em uma relao dialgica com a orao ou no cumprimento de uma
vontade divina. Frankl (1992) compreende que a religiosidade s
genuna quando existencial, quando a prpria pes-soa decide por ela,
e que estamos caminhando para uma religiosidade profundamente
pessoal e cada pessoa poder encontrar sua linguagem prpria para
dirigir-se a Deus.
Outro estilo de resposta foi a de que a harmonia pode ser
alcanada pelos valores de vivncia, como ouvir msica e entrar em
contato com a natureza. Por meio das entrevistas percebeu-se que
todos os entrevistados sentem-se em sintonia com Deus em algum
momento ou lugar. Esse aspecto corrobora com o pensamento de Frankl
(1990), quando conce-be que a religiosidade pode ser vivenciada de
forma consciente ou inconsciente e percebida no relacio-namento com
um Deus pessoal, sendo este imanen-te no ser humano (Frankl,
1992).
Outra questo investigada foi se a vida huma-na possui um
propsito. Frankl concebe que a
que no apresentaram esse significado (M = 61,4), t (3,1) = 23, p
< 0,01. Por outro lado, as pessoas que concebem Deus como amigo
(M = 17,4) apresentam menor grau de vazio existencial do que
aquelas que no o fazem (M = 24,6), t (23) = 2,84, p < 0,01.
Na pergunta sobre qual seria o propsito da vida humana, o teste
t indicou que as mdias no nvel de religiosidade se diferenciaram
nas categorias ajuda ao prximo e exaltar a Deus. Assim, as pessoas
que apresentaram em seus discursos a categoria ajuda ao prximo
obtiveram mdias superiores na escala de atitude religiosa (M =
84,3) quando comparadas com aquelas que no apresentaram esse
contedo em suas respostas (M = 65,1), t (23) = 2,7, p < 0,01.
Por sua vez, aquelas pessoas que concebem que o propsito da vida
humana seria exaltar a Deus tam-bm apresentam mdias maiores (M =
80,0) do que aquelas que no apresentam esse contedo na escala de
atitude religiosa (M = 64,4), t (23) = 2,52, p < 0,01.
Discusso
O objetivo da pesquisa foi identificar a relao entre os estilos
de f e as concepes de Deus com os nveis de percepo do sentido de
vida e de re-ligiosidade. Considera-se que ele foi plenamente
alcanado, tendo em vista os resultados anterior-mente apresentados.
Entretanto, ressalta-se que os resultados no so passveis de
generalizao, ten-do em vista as limitaes da amostra
investigada.
Com relao aos resultados qualitativos, per-mitiram identificar
os diversos estilos de f e reli-giosidade dos entrevistados. Dois
estilos chamam especial ateno: o estilo racional, que define Deus
por seus atributos, e o estilo vivencial, que o define como
relacionamento. Nesse sentido, Frankl conce-be um relacionamento do
homo religiosus com um Tu transcendente. Deus tambm foi definido
pelos participantes da pesquisa por meio da categoria di-reo, ou
seja, a traduo da palavra logos. Destarte, para o homem religioso,
se h um sentido na exis-tncia humana tambm deve haver um provedor
de sentido, ou um suprassentido.
Com relao pergunta O que faz a vida significante pra voc,
observa-se que as respostas, de forma geral, relacionam-se
perspectiva da au-totranscedncia. Segundo Frankl (1991), por meio
da autocompreenso ontolgica pr-reflexiva, o ser
-
Psicol. Argum. 2013 out./dez., 31(75), 665-676
Aquino, T. A. A. et al. 676
motivao primria do ser humano a vontade de sentido, em
consonncia com essa perspectiva to-dos os respondentes afirmaram
que a vida tem um propsito. Mas, quando indagados sobre qual seria
o propsito da vida, os mesmos atriburam as se-guintes concepes:
exaltar a deus, busca pessoal, promoo dos propsitos e ajudar o
prximo. Frankl (1990) concebe que a meta da existncia humana a
autotranscendncia, pois o ser humano no se-ria uma mnada, mas um
ser aberto para o mundo. Assim, as respostas esto em consonncia com
essa viso, na medida em que indicaram algo no mundo pelo qual a
pessoa deve viver. Por meio da escala de atitude religiosa, pde-se
perceber que as pessoas mais religiosas concebem que o propsito da
vida seria ajudar o prximo e exaltar a Deus.
Nesta pesquisa foi possvel identificar que as pessoas que
pontuam mais em uma escala de ati-tude religiosa tendem a definir
Deus como tudo, e aquelas que definem Deus por seus atributos tm
menor pontuao nessa mesma escala. Dessa ma-neira, pode-se conceber
que, para a pessoa religio-sa, a sua relao com Deus no seria
impessoal, ou mesmo racional e distante de sua existncia. O que se
confirma quando a resposta Deus como amigo sugeriu menor grau de
vazio existencial na pontu-ao do Pil-test. Isso pode ser bem
compreendido quando Frankl (1992) constata um efeito colateral da
religiosidade na cura da alma, embora a funo primria da religio
seja a salvao da alma. Dessa forma, parece plausvel conceber que a
pessoa reli-giosa encontra um sentido na vivncia pessoal com um
Deus quando este percebido como um ser en-raizado em sua
existncia.
Consideraes finais
A presente pesquisa tentou demonstrar a riqueza e a amplitude
dos estudos voltados para a questo da f e suas relaes com o sentido
da vida, corrobo-rando, de forma emprica, as preocupaes ontol-gicas
com questes metafsicas ainda presentes na sociedade atual. O estudo
tambm permitiu mapear a subjetividade das pessoas religiosas e
identificar qual o estilo de f que se associa negativamente ao
vazio existencial. guisa de concluso, considera-se que a vontade de
um sentido ltimo pode ser con-cebida como uma categoria imanente, e
que a forma de expressar essa vontade est relacionada com a
situao existencial de cada pessoa, cabendo ao ser humano ler na
sua prpria existncia o anelo por um sentido
transcendente.Referncias
Aquino, T. A. A., Correia, A. P. M., Marques, A. L. C., De
Souza, C. G., Freitas, H. C. A., Arajo, I. F., Dias, P. S.,
& Arajo, W. F. (2009). Atitude religiosa e sentido da vida:
Um estudo correlacional. Psicologia Cincia e Profisso, 29(2),
228-243.
Bardin, L. (2002). Anlise de contedo (L. A. Reto & A.
Pinheiro, Trad.). Lisboa: Edies 70.
Diniz, A. C., Aquino, T. A. A. (2009). A relao da religiosi-
dade com as vises de morte. Religare, 6(2), 90-105.Eliade, M.
(1999). O sagrado e o profano: A essncia das
religies. So Paulo: Editora Martins Fontes.
Fowler, J. W., Streib, H., & Keller, B. (2004). Manual for
faith development research. (3. ed.). Bielefeld: Research Center
for Biographical Studies in Contemporary
Religion; Bielefeld; Center for Research in Faith and
Moral Development; Emory University.
Frankl, V. E. (1992). A presena ignorada de Deus. So Leopoldo:
Editora Sinodal; Petrpolis: Editora Vozes.
Frankl, V. E. (1990). A questo do sentido em psicoterapia. So
Paulo: Pafins.
Frankl, V. E. (1991). Em busca de sentido. 2. Ed. So Leopoldo:
Sinodal; Petrpolis: Vozes.
Frankl, V. E. (1978). Fundamentos antropolgicos da
psi-coterapia. Rio de Janeiro: Zahar.
Frankl, V. E. (1973). Psicoterapia e sentido de vida. So Paulo:
E.G.R.T.
Frankl, V. E., Lapide, P. (2005). Bsqueda de Dios y senti-do de
la vida. Dilogo entre un telogo y un psiclogo. Barcelona: Editorial
Herder.
Freud, S., (1974a). Totem e tabu. In: Freud, S. Edio stan-dard
brasileira das obras psicolgicas completas de Sigmund Freud
(Vol.13, pp.11-191). Rio de Janeiro: Imago. (Originalmente
publicado em 1913)
Freud, S. (1974b). O futuro de uma iluso. In: Freud, S.
Edio standard brasileira das obras psicolgicas completas de
Sigmund Freud (Vol. 21). Rio de Janeiro: Imago. (Originalmente
publicado em 1927)