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II Encontro da Associao Nacional de Pesquisa
e Ps-graduao em Arquitetura e Urbanismo
Teorias e prticas na Arquitetura e na Cidade Contemporneas
Complexidade, Mobilidade, Memria e Sustentabilidade
Natal, 18 a 21 de setembro de 2012
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O workshop, entre pedagogia et ao social
Workshop in between pedagogy and social commitment
El workshop, entre pedagoga y compromiso social
Stphane HANROT Arquiteto ; Dr, HDR ; Ecole Nationale Suprieure
dArchitecture de Marseille (France);
[email protected].
RESUMO Entende-se que o workshop, ou ateli intensivo, uma
ferramenta pedaggica. Mas ele pode tambm ser um instrumento de
explorao e de debate pblico sobre questes que interessam a uma
cidade e ao seu desenvolvimento? Nossa hiptese que esta articulao
permite um benefcio mtuo para o ensino e para o debate pblico.
justamente essa pergunta que tentaremos responder baseando-nos em
casos reais de Workshop realizados em Marselha (Frana) na Escola de
Arquitetura (ENSA-M). Estes workshops tm abordados a questo
especfica do transporte pblico por barco, para alguns, e de
interface entre o porto e a cidade industrial para outros.
PALAVRAS-CHAVE: workshop, pedagogia, mobilidade urbana, debate
publico ABSTRACT Of course the workshop, used in French as charette
studio, is an educational instrument. But can he also be an
instrument of exploration and public debate on questions that
interest a city and its development? Our hypothesis is that there
is a mutual profit in this articulation for the pedagogy and for
the public debate. It is exactly this question that we are going to
try to answer by pressing us on concrete cases of workshops
realized in Marseille (France) at the school of architecture
(ENSA-M). This workshops approached in particular the question of
the public transportation by boat, for some, and the interface
between the industrial port and the city for the others. KEY-WORDS:
workshop, pedagogy, urbane mobility, public debate. RESUMEN: Claro
que el workshop, o estudio intensivo, es un instrumento pedaggico.
Pero puede tambin ser un instrumento de exploracin y de debate
pblico sobre cuestiones que interesan a una ciudad y su desarrollo?
Nuestra hiptesis es que hay un beneficio recproco a esta
articulacin para la pedagoga y para el debate pblico. Precisamente
es en la cuestin que vamos a tratar de responder apretndonos casos
concretos de workshops realizados en Marsella (Francia) en la
escuela de arquitectura (ENSA-M). Este workshops abordaron
particularmente la cuestin de los transportes pblicos por barco,
para unos, y de la interfaz entre el puerto industrial y la ciudad
para otros. PALABRAS-CLAVE : Workshop, pedagoga, movilidad urbana,
debate pblico
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1 INTRODUCTION
Na Frana, consideramos o Workshop como um ateli de projeto
intensivo que rene um conjunto de participantes em um curto espao
de tempo (entre 1 e 15 dias) para um trabalho en charrette". Isso
quer dizer que os participantes so totalmente dedicados a um
trabalho de concepo, com intensidade. Os alunos no tm outras
disciplinas e so totalmente dedicados ao workshop, dia e noite, se
quiserem.
Os workshops so praticados em vrias situaes. Tradicionalmente,
fora da estrutura curricular acadmica, eles esto abertos a
estudantes de diversas origens durante as frias escolares. Isso
como uma situao voluntria de um trabalho complementar ao currculo
formal. Mas a tendncia atual integrar o Workshop na pedagogia e dar
a ele uma valorizao especfica na grade curricular.
Originalmente, as oficinas de gerenciamento de projetos urbanos
de Cergy, que oferecem um trabalho concreto sobre temticas de
projeto urbano, eram uma universidade de vero. Hoje, eles oferecem
um diploma universitrio para aqueles que participam, um diploma que
d direito a crditos ECTS (European Credit Transfer and Accumulation
System).
Mais recentemente, as escolas de arquitetura de Lille,
Estrasburgo, Montpellier e Marselha organizam Workshops que esto
integrados na suas estruturas curriculares. Eles so opcionais ou
obrigatrios e correspondem a uma disciplina de projeto com ECTS. So
esses Workshops que nos interessam, na medida em que eles
apresentam expectativas pedaggicas especficas e procuram trabalhar
com situaes reais que envolvem um debate pblico sobre o
desenvolvimento da cidade.
A hiptese que esta articulao oferece benefcios mtuos para a
pedagogia e para o debate pblico. Assim, surge a questo de saber
como articular as expectativas pedaggicas do exerccio contribuio
para o debate pblico vigente?
Embora seja comum que os workshops usem situaes concretas de
campo como estudo de caso, j menos comum que os resultados dos
Workshops sejam usados para servir ao debate pblico. menos comum
ainda que esta interao seja desenvolvida ao longo de vrios anos com
o objetivo de aprofundar e desenvolver conhecimentos que mobilizam
uma pesquisa doutoral.
Para responder a esta pergunta, vamos inicialmente apresentar o
workshop da Escola Nacional Superior de Arquitetura de Marselha
(ENSA-M), que est tratando a questo da mobilidade nos territrios
costeiros e questiona a articulao entre as escalas do projeto
urbano e do projeto arquitetnico. Explicaremos neste contexto a
natureza das interaes entre pedagogia e debate pblico e
especificaremos os efeitos concretos na poltica urbana de
Marselha.
Em seguida, apresentaremos o modelo do workshop da ENSA-M que
permite as interaes positivas entre educao e debate pblico.
Finalmente, precisaremos o contexto da pesquisa reflexiva e da
pesquisa-ao pelo projeto que desenvolvemos a partir dessas
oficinas.
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2 A TEMTICA DOS WORKSHOPS DA ENSA-M: O ESPAO DA MOBILIDADE
Na Frana, a questo da mobilidade frequentemente colocada como
uma funo urbana de responsabilidade dos engenheiros, mas que muitas
vezes carece de um pensamento urbano. Esta constatao feita pelo
socilogos desde o final dos anos 1990.
Assim, as obras de Challas (CHALLAS, 1997) e Donzelot (Donzelot,
2004) destacam a parte essencial da mobilidade nas prticas sociais
contemporneas e o impacto da m qualidade arquitetnica e urbana das
infraestruturas rodovirias e dos transportes coletivos sobre a
marginalizao social e a segregao urbana.
A mensagem deles que a infraestrutura de mobilidade necessitam
melhorar a qualidade e coerncia para poder limitar a expanso do
carro e a cidade difusa em favor dos transportes coletivos e da
cidade polarizada e densificada. Os arquitetos urbanistas como
Mangin (Mangin, 2004) ou Secchi (Secchi, 2006) tem integrado este
componente no entendimento morfolgico da cidade contempornea e
propuseram novos modelos. Neste sentido, Secchi prope desenvolver
os sistemas de estrada segundo vrias redes de trama fina para
dispersar o fluxos dos automobilistas ao invs de concentra-los
sistematicamente em rotas principais que combinam os problemas de
intercmbio, de saturao e de poluio.
Sob a presso dessa conscientizao generalizada, a lei da
Solidariedade e Renovao Urbana de 2003 (SRU, 2003) mudou
profundamente a doutrina francesa sobre o planejamento urbano. Ela
destacou o princpio de um projeto urbano para dirigir a definio das
normas e dos planos de referncia. Os transportes coletivos e modos
suaves (bicicleta, pedestre) so favorecidos em relao ao carro e se
tornaram a condio de qualquer adensamento do existente ou de uma
urbanizao nova.
Parecia natural em 2005 que a gente se preocupasse com a questo
do espao e da arquitetura de mobilidade na ENSA-M e que a gente
desenvolvesse as competncias que os futuros profissionais deveriam
ser capazes de fornecer a escolher essas opes polticas de
desenvolvimento. Parecia tambm natural, visto a dedicao exclusiva
ao automvel que a cidade de Marselha estava promovendo h mais de 40
anos, que fosse possvel, a partir da pedagogia, chamar ateno da
populao, dos gestores e dos tcnicos sobre estas questes.
este objetivo que eu tenho atribudo ao Workshop da ENSA-M. A
meta no era de se substituir os engenheiros para o clculo da rede
de transportes, mas de fazer perguntas sobre a mobilidade a partir
de nossas competncias sobre o espao e a forma arquitetnica e
urbana. A proposta era tambm de se interessar a esta configurao
particular da cidade litornea que d ao Mar Mediterrneo um papel
urbano muito importante, pela formao da paisagem, pelas suas
atividades porturias industriais e de lazer, com seus desportos
aquticos e suas praias, e pelas suas obrigaes ambientais.
3 WORKSHOP : OS BARCO-BUS EM MARSELHA
A primeira temtica foi desenvolvida ao longo de quatro anos, de
2005 a 2009. Ela retomava uma pergunta feita pela agncia pblica de
urbanismo da cidade de Marselha (Agam), ou seja, a possibilidade de
um transporte pblico de barcos na baa de Marselha para unir as
extremidades norte e sul da cidade ao Vieux Port. Desde 1998, essa
ideia no tinha progredido
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muito na opinio pblica e entre os polticos que consideravam que
a eficcia dos barcos-bus seria limitada pela exposio aos ventos
fortes da baa e da importncia da funo de lazer dos portos que no
permitiria organizar terminais martimos.
No entanto, as condies de deslocamento do Norte ao Sul de
Marselha continuavam a piorar. Assim, optamos por retomar o debate,
proporcionando uma concretizao do que poderia dar a transformao dos
portos para acomodar esta nova funo do barco-bus, e aproveitar esta
oportunidade para repensar a transio entre a terra e o mar nestes
portos.
Figura 1: Marselha, transportes coletivos iniciais (esquerda) e
acrescentados pelos barco-bus (direita) Fonte: ENSA-M / L-AST,
(L-AST,2009)
O mapa da esquerda mostra a linha de barco-bus existente que
atende s ilhas de Frioul a partir do Vieux Port, onde se faz a
intermodalidade com as linhas de metro e bonde. O mapa da direita
mostra as linhas adicionais propostas para o norte e sul, que so
duas reservas naturais. Este dois polos induzem um grande nmero de
visitantes da primavera at o outono.
O primeiro workshop focou na reconfigurao da linha existente
para lhe dar um conforto que no existe nas ilhas do Frioul e propor
um novo terminal martimo na zona cultural que cresceu na sada do
Vieux Port, o J4. A base do programa foi estabelecida a partir de
estudos que realizei profissionalmente sobre esses dois stios. Alm
disso, noites de palestras foram organizadas com o jri que tinha
visto a interveno dos engenheiros e urbanistas da cidade de
Marselha e da comunidade urbana Marseille-Provence-Metrpole.
Estes foram ento cativados pela diversidade e relevncia dos
trabalhos dos estudantes. O fato de ser confrontados com novas
solues arquitectnicas e urbanas com tal abundncia os abriu os olhos
sobre possveis requalificaes. Na verdade, as dez equipes de dez
alunos assistidos cada uma por um profissional da regio de Marselha
ou por um professor da escola tem efetivamente produzido muitos
projetos interessantes em ambas extremidades da linha, perfazendo
vinte projetos no total. O programa, a apresentao do stio e os
vrios projetos
Frioul
Estaque
Pointe Rouge
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foram publicados num livro de formato quadrado (Hanrot, 2005,
2006, 2007, 2008) e em painis de exibio de 90x90 centmetros. A
exposio foi apresentada na escola e os livros distribudos aos
estudantes, aos profissionais monitores e aos polticos. O retorno
de interesse foi confirmado. O livro e a exposio foram apresentados
para o pblico por ocasio de reunies externas pelos alunos do
Workshop.
O segundo Workshop envolveu a entrada do Grande Porto Martimo de
Marselha (GPMM) na discusso. De fato, consideramos que a ligao
entre l'Estaque, ao norte de Marselha, poderia ser feita tanto pelo
alto mar sem parada, quanto pelo porto com cabotagem para atender
diferentes locais do porto. interessante ver, neste momento, que a
administrao do porto estava interessada em todas as ideias trazidas
pelos estudantes e ideais que eles no tinham considerado at ento. O
efeito "buzz" comeou a nascer e o trabalho dos alunos a se
espalhar. luz da experincia, os engenheiros do porto comearam a
considerar que uma temtica sobre as portas do porto e as relaes do
porto com o territrio poderia ser bastante interessante para eles
em termos de "brainstorming".
No ano seguinte, discutimos a criao de uma nova linha, a linha
do Sul para a Pointe Rouge. Na primeira anlise, o trfego de
automveis se revelou to denso para chegar at a zona sul que tem
servios de transportes coletivos de massa carentes que a viagem de
nibus, pego no engarrafamento, podia demorar mais de 1h30 na hora
do rush. A partir de ento, fizemos alguns clculos sobre o tempo de
viagem de barco. Foi demostrado que um trajeto de barco seria
sempre com a durao constante de 30 minutos, com barcos do mesmo
tipo que aqueles que atendem s ilhas de Frioul. A rosa-dos-ventos
previa vinte dias de navegao difcil por ano. Sobravam 345 dias de
navegao possvel e de eficcia no transporte.
Figura 2: O porto da Pointe Rouge redesenhado pelos alunos da
equipe 7 Fonte: ENSA-M (Hanrot,2008)
Ao longo dos workshops, os debates tm atrado um grande pblico.
Associaes e polticos que apoiavam esta ideia de barco-bus vieram
participar das discusses.
O mecanismo se ampliou nos dois anos seguintes. A perspectiva
das eleies municipais mobilizou mais ainda os tcnicos e os
candidatos e o debate sobre o barco-bus tornou-se uma questo
eleitoral.
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Abordamos o quarto workshop olhando associando questo do
transporte por barco-bus a questo da reorganizao do antigo porto de
Marselha. Este porto, no centro da cidade, criado pelos gregos 2600
anos atrs, est no corao de todos os eventos principais: fogos de
artifcio, celebrao do Olmpico de Marselha, o time de futebol,
quando ele vence. No entanto, o Vieux Port principalmente um
estacionamento para embarcaes de lazer e uma via rpida nos cais.
Alm do mais, Marselha acabava de ser escolhida como Capital
Europeia da Cultura para 2013, a questo de saber como renovar este
lugar emblemtico comeava a surgir. Levantamos esta problemtica
ampliando o tema dos barcos-bus para o Vieux Port e, de forma mais
ampla, para o centro da cidade.
Alm do mais, introduzi neste ano um outro componente de projeto.
Para preparar o Workshop, que estava acontecendo no final do
primeiro semestre, eu ofereci uma disciplina opcional sobre a
programao urbana. Com um grupo de sete alunos, encontramos os
diferentes atores, antigos e outros novos. Fomos no sitio de
interveno. Esta preparao prvia dos Workshops se revelou muito til
para legitimar as propostas das equipes. A consulta prvia dos
atores permitiu tambm que as contribuies deles durante o workshop
fossem ainda mais relevantes. Em seguida, eu dei a possiblidade aos
alunos do quinto ano que haviam preparado a anlise e o programa do
Workshop, de desenvolver o projeto final de mestrado deles sobre
este mesmo tema. Isso resultou em um projeto muito aprofundado
beneficiando-se das exploraes anteriores do workshop. Cada aluno,
em seguida, desenvolveu um projeto arquitetnico neste master
plan.
Figura 3 : O Vieux Port de Marselha e o centro da cidade
recomposto pelos alunos em PFE do grupe L-AST Fonte: ENSA-M, L-AST
(L-AST, 2009).
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Tendo constitudo elementos de exposies sobre um mesmo formato a
cada ano, assim como um livro de apresentao dos projetos, foi fcil
reunir todos os trabalhos em uma grande exposio retrospectiva. Esta
exposio ocorreu no museu das civilizaes da Europa e do Mediterrneo
(MuCEM), localizado no Vieux Port. Vrios jornais publicaram artigos
sobre o evento e a televiso realizou algumas reportagens.
O projeto de requalificao do Vieux Port de Marselha desenhado
pelos alunos para reorganizar o terminal martimo, o passeio dos
quais e a circulao automvel, mostrou tantas ideias boas que a
cidade decidiu lanar um concurso de arquitetura em vez de deixar
seus servios tcnicos resolver isso. O concurso foi lanado no ano
seguinte e foi ganho pelo grupo Desvignes-Foster. Em 2012, a obra
est em andamento. Alguns dos alunos do quinto ano participaram do
concurso e dois deles, Romain Verdet e Eric Baffie, fizeram parte
da equipe vencedora.
Outra contribuio bem sucedida dos Workshops foi a abertura em
2012 da linha entre o Vieux-Port e a Pointe Rouge. Depois de
algumas semanas, seu sucesso tal, que j foi decidido que a
experincia ser estendida e que a linha para lEstaque ser
provavelmente aberta no prximo ano. Christian Pellicani, o poltico
na frente deste projeto, usou amplamente os trabalhos do Workshop
para criar uma onda de interesse e sensibilizar o conselho da
comunidade urbana. Participamos vrias vezes de reunies pblicas para
apoiar a ideia.
3 ENTRE PEDAGOGIA E DEBATE PBLICO
Seria pretensioso afirmar que os trabalhos do Workshop foram a
origem destes sucessos. Como j dissemos, h anos a ideia j tinha
sido desenvolvida pela agncia de urbanismo da cidade de Marselha. A
contribuio desses Workshops foi o de quantificar o benefcio e os
desempenhos de uma rede desse tipo, de produzir vrias referncias de
barco-bus operacionais em outras cidades e, acima de tudo,
representar e assim tornar visveis as consequncias da implementao
desta rede na requalificao dos portos. Em suma, isso permitiu
fomentar um debate, deixando aos atores institucionais e
associativos a possibilidade de tomar posies a favor ou contra as
propostas dos alunos. Os Workshops tm ajudado a alimentar o debate
pblico e a desenvolver um conhecimento especfico sobre o
assunto.
Estes workshops tm funcionado como laboratrios de explorao pelo
projeto graas liberdade criativa dos alunos. Essa explorao teria
sido muito cara e demorada para implementar em um protocolo
profissional clssico . Teria sido tambm limitada a um modelo de
reflexo convencional. O debate pblico em torno dos trabalhos dos
alunos foi rico. Podemos dizer, no final, que eles agiram como
gatilhos. Eles permitiram a comunidade de perceber que eram
possveis solues para problemticas que ate ento eram deixadas sem
resposta. Eles permitiram aos polticos de apropriar-se das ideias e
integr-las na estratgia concreta de desenvolvimento urbano.
Um componente importante foi a contribuio dos profissionais
convidados para monitorar as equipes. Esses profissionais,
recrutados nos bons arquitetos e urbanistas da regio, desempenharam
um papel com a equipe de alunos que lhes foi confiada, mas tambm
se
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reaproximaram da escola e disseminaram uma imagem positiva no
meio profissional. Isso era importante e necessrio aps vrios anos
de hiato entre o meio profissional e o meio acadmico. O nmero de
profissionais envolvidos em quatro anos significativo: trinta.
Esses profissionais foram envolvidos nos debates pblicos e foram
sensibilizados s questes de mobilidade, outro benefcio da situao.
Para os alunos, o encontro com os profissionais fora do escritrio
ajudou a estabelecer uma outra relao que aquela dos estgios, muitas
vezes formal e distante da concepo. No contexto do workshop, os
alunos e os profissionais esto em situao de co-concepo.
Mas esse no o nico benefcio. Do ponto de vista pedaggico, o fato
de tratar um assunto urbano atual, permite que atores no mundo real
se interessem ao trabalho dos alunos e se mobilizem como expertos
no assunto. Neste contexto, eles fornecem, por um lado, informaes e
conhecimentos nas fases de concepo e elaborao de projetos e, por
outro lado, no julgamento dos trabalhos. E isso, que os estudantes,
presos no recinto acadmico, requerem com muita frequncia.
Constatamos que a avaliao anual das disciplinas, feita pelos
alunos, coloca o Workshop do Master como o ensino com maior
incidncia de satisfao (50%) e muito boa satisfao (27%).
Isto , de alguma forma, um princpio virtuoso, onde todos tm algo
a ganhar.
Vamos encerar em 2013, a segunda sesso de quatro workshops sobre
a questo das relaes do Grande Porto Martimo de Marselha (GPMM), o
porto industrial. Esta instituio, visto o alcance do workshop sobre
os Barco-bus, props que os quatro anos seguidos fossem dedicados ao
estudo das portas do porto, ou seja a relao entre o mar, o porto e
as cidades que estendem-se ao longo de seu litoral de 70 km. O
acordo com o porto est relacionado a um financiamento anual que
permite a ENSA-M produzir documentos e materiais de exposio. Em
retorno, a ENSA-M coloca disposio do GPMM o resultado dos trabalhos
pedaggicos, assegurando simultaneamente os direitos autorais dos
estudantes. Os trs primeiros Workshops foram produtivos, e o GPMM
como a ENSA-M se beneficiaram desta conveno. Mas algumas
dificuldades surgem em comparao com os Workshops Barco-bus. Se a
criatividade dos alunos e o interesse deles na relao com o mundo
real permanece intacto, uma forma de reserva na consulta dos
moradores e dos tcnicos da cidade ou mesmo dos polticos necessria
pelo fato que os patrocinadores do workshop so o GPMM. A liberdade
dos projetos e de expresso, a impertinncia das propostas so desta
forma potencialmente distorcidas.
Agora, no apenas uma contribuio de percia ou uma troca de ideias
com tcnicos ou polticos que podem criticar os resultados em total
liberdade: eles no tem responsabilidade nas propostas de estudantes
que poderiam causa incmodo. Parece que o compromisso do Workshop
com um parceiro financeiro o coloca dentro de um sistema de atores
com obrigaes. O trabalho dos estudantes, portanto, pode ser
instrumentado em jogos de influncia e estratgias que fogem
completamente ao contexto educacional.
Ser que isso penaliza a implementao pedaggica do workshop?
Segundo nossa experincia, isso no pesa realmente sobre a atividade
prpria do workshop. Os alunos permanecem totalmente investidos no
argumento do projeto apresentado para eles e eles recebem os
conhecimentos tcnicos com o mesmo interesse. No entanto, a restrio
coloca-se mais sobre a acuidade do tema abordado em termos de
debate pblico vigente e a relevncia dos trabalhos dos estudantes
neste debate.
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4 O MODELO
Este relatrio de experincia nos permite estabelecer o modelo que
organiza hoje o workshop. Refere-se ao diagrama abaixo.
O workshop est localizado no final do primeiro semestre do
primeiro ano do Mestrado, o seja o stimo semestre da grade
curricular (S7).
Ele mobiliza todos os alunos do primeiro ano de Master, ou seja
120 alunos para uma atividade correspondente 4 ECTS.
Os alunos do quinto ano S9 trabalham na preparao de elementos do
stio e do programa do Workshop num ateli que desenvolve estudos
preliminares de projeto urbano. Eles preparam as contribuies dos
especialistas da rea que daro palestras durante o workshop.
Os alunos de S9, devem preparar eles mesmos, uma palestra sobre
o tema de sua pesquisa de S9 que eles apresentam no Workshop de
S7.
Os estudantes de S9 podem tambm ser assistentes, ou seja, ajudar
os professores na organizao prtica do workshop.
Em seguida, em S10, eles desenvolvem o Projeto de Final de
Estudo de forma coletiva para definir um master-plan que resume os
elementos positivos fornecidos pelo workshop. Neste master-plan,
cada um desenvolve seu prprio projeto arquitetnico.
Isto , na verdade, uma cooperao de ensino que permite criar uma
sinergia e uma responsabilidade entre os alunos de anos diferentes.
Ela permite tambm desenvolver em profundidade os conhecimentos e os
dados fornecidos aos alunos do workshop, bem alm dos elementos
clssicos de um assunto de projeto.
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Figura 4: O modelo de um workshop anual da ENSA-Marselha,
baseado numa dinmica de ensino cooperativo Fonte: Hanrot, 2012
Este modelo mostra tambm que as equipes (entre 10 e 12) de dez
alunos so supervisionadas por um profissional. Trabalhar numa
equipe de dez requer uma capacidade de organizao que a equipe no
pode gerar, por si s. O profissional que no se posiciona como
professor, mas como moderador da equipe, deve auxili-la a
interpretar os elementos do programa, a organizar a visita do
sitio, a desenvolver seu conceito e a distribuir as tarefas na fase
de produo.
A maioria destes profissionais nunca ensinou. A meta para eles
reconectar-se com este contexto particular que eles experimentaram
anos antes. Isso provoca geralmente uma dupla revelao: o ensino
mudou e uma atividade apaixonante. Cinquenta por cento dos
supervisores so em seguida convidados a participar a outras
disciplinas e alguns revelam-se muito bons professores.
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Os Especialistas entendem precisamente o assunto e o stio. Eles
vem agregar seus conhecimentos durante a visita ao local e durante
as mesas redondas realizadas noite durante a primeira semana.
Especialistas e supervisores profissionais so convidados a
participar na crtica final dos projetos ao final dos quinze dias.
No final deste ltimo dia, os supervisores votam para eleger os trs
melhores projetos, sem ter o direito de votar para sua prpria
equipe. Os alunos fazem a mesma coisa. O resultado um prmio dos
supervisores e um prmio dos alunos que nem sempre convergem. Estes
prmios e esta modalidade de julgamento so muito populares do ponto
de vista dos alunos.
Sempre que fosse possvel, integramos estudantes e professores
estrangeiros nas equipes, o que leva, visto o nmero elevado de
alunos Erasmus presente, a olhares renovados e a um enriquecimento
dos mtodos de trabalho.
Figura 5: Modelo de temtica quadrienal com desfecho na
realidade
Fonte: Hanrot, 2012.
Um outro aspecto importante deste modelo o ciclo de quatro anos
sobre a mesma temtica aplicada em lugares diferentes. Isto muito
importante por vrias razes. O aprofundamento permite a constituio
de conhecimentos e uma percia sobre o assunto.
Ele permite tambm a constituio de uma rede de profissionais e
especialistas e enriquec-la.
Ele permite, finalmente, criar um efeito buzz e desenvolve uma
espera de um ano para o outro aumentando , assim, a presena da mdia
e o impacto sobre o debate pblico.
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importante para isso desenvolver um suporte de comunicao dos
trabalhos. Ns realizamos de forma sistemtica um livro com artigos
de sntese, painis de exposies e um website. Todos estes elementos
podem ser reunidos no final do ciclo numa reviso geral dos
trabalhos. Se a sincronia for feita com as fases de debate pblico,
esta exposio pode alcanar um grande publico.
5 O MODELO DA PESQUISA REFLEXIVA APLICADA AO WORKSHOP
A reflexo que realizamos sobre o workshop da ENSA-M refere-se
postura do "profissional reflexivo" descrita por D.Schn (Schn,
1993). Como educador reflexivo em ao, o esforo de produo dos livros
de apresentao a cada ano, no s permitiu recolher os trabalhos dos
alunos, mas tambm produzir e voltar sobre diferentes registros do
conhecimentos e constituio progressiva do modelo de
funcionamento.
Figura 6: Modelo quadrienal de pesquisa sobre os workshops
Fonte: Hanrot, 2012.
O trabalho de Naceur Hnidi, desenvolvido numa tese de doutorado
na ENSA-M, que ser defendida at o final de 2012, foi tambm til para
a "anlise estrutural" e a "construo de repertrios" (Schn, 1993)
sobre a prtica do workshop. Esta tese tem feito a observao de vrios
workshops que realizamos em Marselha. Naceur se interessou
particularmente pelas posturas de projeto das equipes e a gesto dos
conflitos de doutrina dentro das equipes. Poderamos dizer que
Naceur se interessou pela estrutura interna do workshop. Sua
pesquisa corresponde a uma pesquisa-ao, na medida em que os
resultados de suas observaes foram incorporados no workshop
seguinte, permitindo, deste maneira, melhorar a cada ano as
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condies de ensino e de superviso.
A outra pesquisa conduzida por Julien Ineichen. Alm de uma
abordagem ampliada a um corpus de workshops praticados hoje no
mundo inteiro, incluindo o workshop de Marselha, e um trabalho de
definio e classificao, a problemtica de Julien concentra-se nas
interaes entre o workshop com o seu contexto societal. Este
trabalho ir verificar se o workshop de Marselha trouxe solues
originais sobre a dualidade entre expectativas pedaggicas do
workshop e contribuio para o debate pblico. Veremos assim se o
workshop da ENSA-M pertence a uma categoria j estabelecida ou em
processo de estabelecimento.
6 EM CONCLUSO
Atravs deste artigo, apresentamos um modelo de organizao de
workshops que se baseia em uma cooperao de ensinos sobre ciclos de
quatro anos e embasada numa pesquisa reflexiva. Este modelo permite
desenvolver uma interao fecunda entre pedagogia e debate pblico.
Portanto, poderamos considerar ter trazido uma resposta questo de
saber como articular as expectativas pedaggicas do exerccio
contribuio ao debate pblico vigente. No entanto, essa articulao
poderia ser distorcida no caso de parceria financeira com uma
instituio ou associao que est ela mesma envolvida no debate pblico.
Se o ato pedaggico de qualidade, o tema e os resultados do workshop
entram numa instrumentao de posicionamentos pblicos da instituio e
podem limitar a liberdade de expresso e de proposio em favor da
palavra da instituio e de sua estratgia. , portanto, necessrio
neste caso, ficar vigilante sobre a autonomia pedaggica do workshop
que a melhor garantia de contribuies teis para o debate pblico.
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