O USO DA ICONOGRAFIA/IMAGEM NA EDUCAÇÃO DE SURDOS: DIÁLOGOS POSSÍVEIS Cássia Geciauskas Sofiato Universidade de São Paulo Gabriel Bertozzi de Oliveira e Sousa Leão Universidade de São Paulo Resumo O uso de iconografia e, mais especificamente, da imagem na educação de surdos no Brasil vem se consolidando a partir da década de 1990 com os estudos relativos ao bilinguismo e suas implicações. Algumas legislações específicas relacionadas à área da surdez também vislumbram esta questão e garantem a sua efetivação.Esta pesquisa, de abordagem qualitativa e do tipo bibliográfico, tem por objetivo discutir o uso de imagens/iconografia na educação contemporânea de surdos e apontar algumas possibilidades em relação às possíveis leituras da imagem no contexto de sala de aula. Após a realização do levantamento bibliográfico para a construção dos alicerces teóricos da presente pesquisa, também foram selecionados cinco trabalhos, publicados em livros ou em forma de artigos científicos, que versavam sobre o uso da imagem no contexto de sala de aula com alunos surdos.A partir da seleção dos referidos materiais e leitura cuidadosa dos mesmos foram estabelecidas categorias para a análise das produções, a saber: i. Público alvo, ii. Tipos de imagens utilizadas; iii. Contribuições do uso da imagem/iconografia para com o processo de ensino e aprendizagem dos alunos surdos.Por meio deste estudo, verificou-se que cada vez mais a imagem/iconografia vem sendo utilizada no contexto de sala de aula com diferentes objetivos e enfoques e, dessa forma, novas investigações necessitam ser feitas no que tange às múltiplas possibilidades de trabalho com este tipo de recurso. O artigo em questão aponta algumas possibilidades para a realização da leitura de imagens, a partir de autores do campo da arte e semiótica. Palavras-chave: educação de surdos,iconografia, imagem. Introdução O uso de iconografia e, mais especificamente, da imagem na educação de surdos no Brasil vem se consolidando a partir da década de 1990 com os estudos relativos ao bilinguismo e suas implicações. Na abordagem do bilinguismo o surdo é considerado um sujeito que possui uma língua que lhe é natural, que é a própria língua de sinais (L1), e a aquisição da língua majoritária utilizada em seu país de origem deve ser realizada na modalidade escrita (L2). O bilinguismo envolve mais do que a questão da aquisição de duas línguas. Consideram-se também dentro dessa perspectiva outros aspectos: Para além da questão da língua, portanto, o bilinguismo na educação de surdos representa questões políticas, sociais e culturais. Nesse sentido, a educação de surdos em uma perspectiva bilíngue deve ter um currículo organizado em uma perspectiva visual espacial para garantir o acesso a todos os conteúdos escolares na própria língua da criança, a língua de sinais brasileira (QUADROS, 2005, n.p.). Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade EdUECE - Livro 3 03090
12
Embed
O USO DA ICONOGRAFIA/IMAGEM NA EDUCAÇÃO DE … O USO DA ICONOGRAFIA... · A pessoa surda transita entre duas culturas, a surda e a ouvinte; no entanto, sua identidade constitui-se
This document is posted to help you gain knowledge. Please leave a comment to let me know what you think about it! Share it to your friends and learn new things together.
Transcript
O USO DA ICONOGRAFIA/IMAGEM NA EDUCAÇÃO DE SURDOS:
DIÁLOGOS POSSÍVEIS
Cássia Geciauskas Sofiato
Universidade de São Paulo
Gabriel Bertozzi de Oliveira e Sousa Leão
Universidade de São Paulo
Resumo
O uso de iconografia e, mais especificamente, da imagem na educação de surdos no Brasil
vem se consolidando a partir da década de 1990 com os estudos relativos ao bilinguismo
e suas implicações. Algumas legislações específicas relacionadas à área da surdez
também vislumbram esta questão e garantem a sua efetivação.Esta pesquisa, de
abordagem qualitativa e do tipo bibliográfico, tem por objetivo discutir o uso de
imagens/iconografia na educação contemporânea de surdos e apontar algumas
possibilidades em relação às possíveis leituras da imagem no contexto de sala de aula.
Após a realização do levantamento bibliográfico para a construção dos alicerces teóricos
da presente pesquisa, também foram selecionados cinco trabalhos, publicados em livros
ou em forma de artigos científicos, que versavam sobre o uso da imagem no contexto de
sala de aula com alunos surdos.A partir da seleção dos referidos materiais e leitura
cuidadosa dos mesmos foram estabelecidas categorias para a análise das produções, a
saber: i. Público alvo, ii. Tipos de imagens utilizadas; iii. Contribuições do uso da
imagem/iconografia para com o processo de ensino e aprendizagem dos alunos surdos.Por
meio deste estudo, verificou-se que cada vez mais a imagem/iconografia vem sendo
utilizada no contexto de sala de aula com diferentes objetivos e enfoques e, dessa forma,
novas investigações necessitam ser feitas no que tange às múltiplas possibilidades de
trabalho com este tipo de recurso. O artigo em questão aponta algumas possibilidades
para a realização da leitura de imagens, a partir de autores do campo da arte e semiótica.
Palavras-chave: educação de surdos,iconografia, imagem.
Introdução
O uso de iconografia e, mais especificamente, da imagem na educação de surdos
no Brasil vem se consolidando a partir da década de 1990 com os estudos relativos ao
bilinguismo e suas implicações. Na abordagem do bilinguismo o surdo é considerado um
sujeito que possui uma língua que lhe é natural, que é a própria língua de sinais (L1), e a
aquisição da língua majoritária utilizada em seu país de origem deve ser realizada na
modalidade escrita (L2). O bilinguismo envolve mais do que a questão da aquisição de
duas línguas. Consideram-se também dentro dessa perspectiva outros aspectos:
Para além da questão da língua, portanto, o bilinguismo na educação de
surdos representa questões políticas, sociais e culturais. Nesse sentido,
a educação de surdos em uma perspectiva bilíngue deve ter um
currículo organizado em uma perspectiva visual espacial para garantir
o acesso a todos os conteúdos escolares na própria língua da criança, a
língua de sinais brasileira (QUADROS, 2005, n.p.).
Didática e Prática de Ensino na relação com a Sociedade
EdUECE - Livro 303090
Dentro dessa perspectiva, de acordo com Skliar (1998), a surdez constitui-se uma
diferença a ser politicamente reconhecida e é considerada uma experiência visual.Os
surdos, ao longo da história, desenvolveram e transmitiram uma língua de modalidade
espaço-visual e no âmbito de sua educação algumas potencialidades devem ser levadas
em consideração, entre elas:
A potencialidade da aquisição e desenvolvimento da língua de sinais
como primeira língua, a potencialidade de identificação das crianças
surdas com seus pares e com adultos surdos, a potencialidade de
identificação do desenvolvimento de estruturas, formas e funções
cognitivas visuais, a potencialidade de uma vida comunitária e de
desenvolvimento de processos culturais específicos; e por último, a
potencialidade de participação dos surdos no debate linguístico,
educacional, escolar, de cidadania, etc. (p.26- grifo nosso).
O Decreto-lei nº 5626 de 2005 corrobora com essa perspectiva, ao destacar no
capítulo um, artigo 2º, a seguinte definição de pessoa surda:“considera-se pessoa surda
aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de
experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua
Brasileira de Sinais – Libras” (BRASIL, 2005). Esse discurso é ratificado também no
Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue – Língua Brasileira de
Sinais e Língua Portuguesa, produzido pelo grupo de trabalho designado pelas Portarias
nº 1.060/2013 e nº 91/2013, instituído pela Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI), em outubro de 2013. Em vários
parágrafos deste documento podemos encontrar a valorização do aspecto visual e sua
relação com o processo educacional do surdo:
A Educação Bilíngue Libras - Português é entendida, como a
escolarização que respeita a condição da pessoa surda e sua
experiência visual como constituidora de cultura singular, sem,
contudo, desconsiderar a necessária aprendizagem escolar do português
(THOMA et. al. 2014, p. 6- grifo nosso).
A pessoa surda transita entre duas culturas, a surda e a ouvinte; no
entanto, sua identidade constitui-se como outro processo por ser
definitivamente diferente, por necessitar de recursos completamente