CENTRO UNIVERSITÁRIO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA – IESB COMUNICAÇÃO SOCIAL – JORNALISMO BHÁRBARA MARTINS DE CARVALHO O TELESPECTADOR BRASILIENSE: Estudo de recepção sobre o sotaque no telejornalismo BRASÍLIA 2014
Nov 03, 2015
CENTRO UNIVERSITRIO INSTITUTO DE EDUCAOSUPERIOR DE BRASLIA IESB
COMUNICAO SOCIAL JORNALISMO
BHRBARA MARTINS DE CARVALHO
O TELESPECTADOR BRASILIENSE:Estudo de recepo sobre o sotaque no telejornalismo
BRASLIA
2014
BHRBARA MARTINS DE CARVALHO
O TELESPECTADOR BRASILIENSE:Estudo de recepo sobre o sotaque no telejornalismo
Trabalho de Concluso de Curso
apresentado ao curso de Comunicao
Social do Instituto de Educao
Superior de Braslia, como requisito
parcial para obteno do grau de
Bacharel em Jornalismo.
Orientadora: Profa. Dra. Luciane Agnez
BRASLIA
2014
BHRBARA MARTINS DE CARVALHO
O TELESPECTADOR BRASILIENSE:Estudo de recepo sobre o sotaque no telejornalismo
Trabalho de Concluso de Curso
apresentado ao curso de Comunicao
Social do Instituto de Educao
Superior de Braslia, como requisito
parcial para obteno do grau de
Bacharel em Jornalismo.
Orientadora: Profa. Dra. Luciane Agnez
Banca Examinadora:
______________________________
Profa. Dra. Luciane Agnez Orientadora
______________________________
Profa. Dra. Alzimar Ramalho Convidada
______________________________
Profa. Dra. Chalini Torquato Gonalves de Barros Convidada
DEDICATRIA
Ao regente do Universo, que sempre me concede
grandes experincias e aprendizados e que,
imprevisivelmente, me convence de que o avesso
o meu lado certo.
Aos meus pais, pela criao, confiana, pacincia e
por me ensinarem desde cedo que os outros
passaro, eu passarinho.
Aos meus irmos, Matheus e Jade, eternos
companheiros e por nunca me deixarem esquecer
daqueles tempos.
Ao meu pequeno Henrique, por me apresentar o
lado bom da vida, junto ao meu grande Gustavo.
E, pelo menos, que o amor nos salve da vida.
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, aos meus pais, que me proporcionaram a realizao de um dos meus
sonhos, e tambm aos meus familiares, que me apoiaram em todas as fases de
elaborao deste trabalho. Admito que compartilhamos, em alguns momentos, o
nervosismo e a ansiedade diante desse desafio, mas, no fim, o que se destacou foi o
carinho e a dedicao de todos.
Aos meus amigos, as que no estavam no Brasil ou aos que no esqueceram de oferecer
ajuda, mesmo quando no tinham tempo nem para me encontrar. Aos que estavam em
terras brasileiras e que me ajudaram a sonhar e colocar em prtica esta experincia.
Tambm aos que, junto comigo, fizeram das bibliotecas de Braslia um refgio de
dedicao e foco.
Aos grandes mestres que tive o prazer de conhecer no IESB. Em especial minha
orientadora, Luciane Agnez, a quem agradeo pela motivao acadmica e tambm por
me incentivar para a realizao do que quero ser quando crescer. A ela a minha eterna
admirao.
Talvez elas nem faam ideia da sua importncia delas para a concluso dessa etapa, mas
agradeo a todas as moas que trabalham na minha casa, as empregadas ou babs.
Imagino outros tempos, em que a rotina do lar impossibilitava a presena das mulheres
nas universidades e no mercado de trabalho. Minha realidade outra e, se aqui estou, foi
porque essas moas ficaram na minha casa, me substituindo nos meus deveres
domsticos, enquanto eu estudava e podia batalhar pelos meus sonhos. A meu ver, est
a a importncia dessas guerreiras: elas no s cuidaram das minhas atribuies, mas
tambm passaram para mim o direito de conquistar a formao acadmica que tanto
sonhei.
EPGRAFE
Emlia no achou que fosse caso de conservar
na cadeia o pobre matuto. Alegou que ele
tambm estava trabalhando na evoluo da
lngua e soltou-o.
-V passear, seu Jeca. Muita coisa que
hoje esta senhora condena vai ser lei um dia.
Foi voc que inventou o VOC em vez de TU, e
s isso quanto no vale? Estamos livres da
complicao antiga do Tuturututu.
Monteiro Lobato
RESUMO
O presente trabalho baseia-se na elaborao de grupos focais, com telespectadores doDistrito Federal, com a finalidade de reunir dados de recepo sobre o sotaque notelejornalismo da Rede Globo e os efeitos da padronizao do falar na TV. Conhecidospela provvel excluso do sotaque um falar neutro os brasilienses parecem apoiar aneutralidade nos telejornais. Faz-se necessria uma continuao da pesquisa paraafirmar a investigao e para ilustrar a dimenso da repercusso do padro de qualidade.
Palavras chave: Grupo focal; Telejornalismo; Recepo; Sotaque; Preconceito lingustico.
ABSTRACT
The present work is based on the elaboration of focal groups, with the finality of gatheringdata of reception about the accents in the television journalism of the station Rede Globoand the effects of standardization of the voice in TV, together with the television viewers ofthe Federal District (DF). Known for their likely exclusion of the accent a neutral voice the Brazilian people seem to support the neutrality in TV journalism. It is necessary tomake a continuation of the research to reaffirm the investigation and to illustrate theprobable dimension of the repercussion of the standard for quality.
Key Words: Focal groups; Television journalism; Reception; Accent; Linguisticdiscrimination.
LISTA DE ILUSTRAES
Figura 1 Idade, sexo e classe social dos telespectadores da Globo Braslia..................37
Figura 2 Convite usado para divulgao.........................................................................38
Figura 3 Trechos dos ncoras da tomada 01..................................................................41
Figura 4 Trechos dos reprteres da tomada 02...............................................................41
Figura 5 Apresentadora, reprter e entrevistada da reportagem da tomada 03..............42
Figura 6 Reprter nordestino para o Jornal Hoje da tomada 04.......................................42
Figura 7 Chamada para a srie especial da tomada 05..................................................43
Figura 8 Reprteres de outras regies do Brasil que trabalham na Globo Braslia da
tomada 06...........................................................................................................................43
Figura 9 - Reprteres de Braslia e de outras regies nos jornais locais da capital da
tomada 07...........................................................................................................................44
Figura 10 Relao de gnero e idade dos participantes..................................................46
Figura 11 Grfico de nvel de escolaridade dos participantes.........................................46
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 rea profissional dos participantes do GF I...................................................46
Quatro 02 rea profissional dos participantes do GF II...................................................47
Sumrio
INTRODUO.....................................................................................................................11
1. OBJETIVOS:....................................................................................................................14
1.1 Objetivo geral:...........................................................................................................14
1.2 Objetivos especficos:...............................................................................................14
2. JUSTIFICATIVA................................................................................................................15
3. METODOLOGIA..............................................................................................................16
4. A regionalizao do telejornalismo..................................................................................19
5. O sotaque e o preconceito lingustico..............................................................................25
6. O falar do telejornalismo..................................................................................................30
7. Os grupos focais..............................................................................................................36
7.1. Memorial descritivo...................................................................................................36
7.1.1 Os integrantes...................................................................................................37
7.1.2 O convite...........................................................................................................38
7.1.3 Roteiro de perguntas.........................................................................................39
7.1.4 Primeira etapa: os vdeos..................................................................................40
7.1.6 Segunda etapa: documentos finais...................................................................44
7.1.7 Registros do evento..........................................................................................45
7.2. Anlise dos dados.....................................................................................................46
7.2.1 Questionrios socioeconmicos........................................................................46
7.2.2 Ouvindo o telespectador....................................................................................48
7.2.3 Questionrio final................................................................................................60
CONSIDERAES FINAIS.................................................................................................62
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS:...................................................................................64
APNDICES........................................................................................................................68
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INTRODUO
O telejornalismo passou, como ainda passa, por grandes mudanas ao longo
de sua trajetria no Brasil. No caso da linguagem televisiva, se o sotaque no era
bem-vindo na TV Globo de 1970, hoje possvel perceber, ainda que amenizada,
um pouco da diversidade do falar brasileiro em seus jornais. A partir disso, este
trabalho busca analisar, por meio de grupos focais, os efeitos de percepo do
pblico brasiliense sobre a presena de reprteres com e sem sotaque nos jornais,
iniciando, assim, uma reflexo sobre at que ponto a excluso do sotaque no
telejornalismo uma forma de a TV perpetuar o preconceito lingustico.
A lngua heterognea e varivel, o que torna o monolinguismo uma fantasia.
No caso do portugus brasileiro, essa variao est presente em muitos nveis
estruturais e sociais, como a variao regional (BAGNO, 2013). Essa diversidade
lingustica compe a identidade cultural dos falantes e, nesse casamento, condenar
um condenar o outro. Dessa forma, excluir um ou mais sotaques do jornal deixar
de retratar um Brasil plural e enobrecer, no ar, uma s regio entre tantas:
preciso evitar a prtica distorcida de apresentar a variao como seela existisse apenas nos meios rurais e menos escolarizados, comose no houvesse variao (e mudana) lingustica entre os falantesurbanos, socialmente prestigiados e altamente escolarizados [](BAGNO, 2012, p. 40).
Em um pas banhado por diversidade, riqueza cultural, grande em territrio e
em habitantes, esta pesquisa se concentra no exame do preconceito lingustico
existente na televiso brasileira, que, alis, ainda passa despercebido por muitos. Ao
levar essa realidade para o Distrito Federal, que est no centro dessa multiplicidade,
buscaremos verificar, a partir da histria de sua formao, como os seus moradores
recebem a variante lingustica no jornal de TV.
A intensa miscigenao do DF, em funo dos processos migratrios para a
construo da nova capital, fez surgir um falar prprio da cidade, que nem sempre
percebido pelos falantes. Dessa mistura, aparece uma fala definida por alguns
estudiosos como limpa ou neutra, o que inusitado, uma vez que, com a
diversidade, esperava-se uma fala rica em sotaques de vrios lugares do Brasil e
no a excluso das variantes.
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Dentro desse quadro lingustico, investigaremos a maneira como o pblico
brasiliense se relaciona com a presena, ou ausncia, do sotaque nos telejornais
locais e nacionais. Sobre os veculos de comunicao, analisaremos somente a
recepo dos jornais da Rede Globo, em funo da bibliografia limitada sobre o
tema e pela sua notabilidade:
No Brasil, a Rede Globo de Televiso, da famlia Marinho, , segundoo IBOPE, lder de audincia na maior parte dos horrios,configurando-se, h quase quatro dcadas, como a mais importanteempresa do mercado televisivo nacional e como a que mais investena regionalizao da programao (BAZI, 2007, p. 4).
A ferramenta utilizada para traar esse produto da recepo ser a
metodologia do grupo focal. A prtica consiste em simular um ambiente de conforto,
como se fosse natural, para que os participantes compartilhem pensamentos e
opinies sobre o tema. Por serem grupos heterogneros, contamos com um debate
rico e diversificado sobre o que os brasilienses pensam sobre o sotaque, e a
ausncia dele, no jornalismo da Rede Globo.
No primeiro contato com a bibliografia disponvel, nota-se que a televiso
brasileira parece tratar o sotaque como uma disformidade capaz de atrapalhar o
carter qualitativo da produo telejornalstica. Alm de desmotivar a sua ocorrncia
na fala dos reprteres dos jornais exibidos nacionalmente, com a regionalizao da
programao, o mesmo parece acontecer nos jornais locais no qual, para todos os
efeitos, o sotaque deveria ser um trao cultural da regio representada.
Se a variao presente na fala brasileira no conquistou, ainda, um espao
representativo nos jornais, objetivamos examinar quais foram as possveis
influncias do Padro Globo de Qualidade na elaborao de um jeito caracterstico
de falar no ar. Observando a inclinao da emissora em neutralizar, no passado, o
sotaque e em ameniz-lo, no presente, muitas vezes transformando-o num linguajar
do eixo RJ/SP.
O presente trabalho est organizado em quatro captulos: a regionalizao do
telejornalismo; o sotaque e o preconceito lingustico; o falar do telejornalismo; os
grupos focais.
No primeiro captulo, explicaremos a tendncia de regionalizao da
produo televisiva, mesmo que o fenmeno ainda no possua definio, passando
pela nacionalizao e pelo Padro Globo de Qualidade. Alm disso, indicaremos
14
pontos da Constituio Federal e do Cdigo de tica dos Jornalistas que defendem
o regionalismo, mas no so obedecidos pelas emissoras e pelos profissionais da
rea.
Ao falar sobre o sotaque e o preconceito lingustico, no captulo dois,
explicaremos o significado das expresses, mostrando a variao nas lnguas e,
principalmente, no falar do Distrito Federal. Mostraremos quatro tipos de variao
(diacrnica, diatpica, diastrtica e diamsica) e como a rejeio delas pelo
jornalismo de TV pode alimentar a intolerncia variao pelo telespectador.
A partir desses termos, analisaremos, no captulo trs, a fala dos reprteres
de TV. Levantaremos as definies de alguns manuais de telejornalismo que
defendem a simplicidade gramatical no texto televiso e, em paralelo, a tentativa de
diminuir a incidncia de jornalistas com sotaque, suavizando-o ou substituindo-o.
Nesse momento, abordaremos como a excluso do sotaque interfere na identidade
dos jornais locais e dos reprteres e no entendimento da notcia.
Por fim, no captulo quatro, encontra-se o memorial descritivo, uma narrao
detalhada dos grupos focais. Em seguida, divulgaremos os resultados dos eventos
realizados com telespectadores, moradores do Distrito Federal, subdivididos em
faixa etria, de 18 aos 29 anos e 30 ou mais.
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1. OBJETIVOS:
1.1 Objetivo geral:
Analisar o posicionamento do telespectador do Distrito Federal sobre a
presena e a ausncia do sotaque no telejornalismo da Rede Globo.
1.2 Objetivos especficos:
Identificar, por meio da realizao de grupos focais, a impresso
que o telespectador do DF tem sobre o aparecimento ou a
ausncia do sotaque nos telejornais;
Descrever o conceito e os efeitos do regionalismo da televiso
brasileira e a sua relao com o aparecimento de diversos
sotaques na TV;
Compreender as tcnicas de linguagem no telejornalismo, a partir
do Padro Globo de Qualidade, que foi estabelecido como
modelo para o telejornalismo brasileiro.
Refletir se a excluso do sotaque no telejornalismo contraria leis e
deveres de conduta dos jornalistas e quais so as possveis
consequncias desse feito;
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2. JUSTIFICATIVA
Pela experincia da autora como aluna do curso de Letras e de Jornalismo,
surgiu a ideia de um tema capaz de reunir o que mais apreciava nas disciplinas. Da
Sociolingustica veio o sotaque e da Comunicao, o telejornalismo. Ao assistir ao
jornal com outras pessoas ou ao mencionar o visto, notava, com certa frequncia,
que a maioria delas faziam comentrios sobre o sotaque dos reprteres. Alguns,
alm de focar nas diferenas, tambm mostravam-se incomodados.
Desse retrato do incmodo com a variedade do portugus brasileiro na TV,
veio a iniciativa de pesquisar o porqu da excluso do sotaque nos telejornais,
inclusive nos da programao local. Um dos motivos que impulsionou o
desenvolvimento do trabalho nessa linha foi a carncia de estudos sobre o sotaque
no jornalismo e tambm na rea de recepo. Vemos que as tcnicas do jornalismo
esto sempre em discusso, mas que o foco para o pblico ainda pouco.
Tambm de relevncia a escolha do tema para identificar se a diversidade
de grupos de falantes do Distrito Federal, possivelmente estabelecido por classes
sociais e a variedade de regionalismos, interfere na forma de dar a notcia e at na
forma em que ela entendida pelo telespectador brasiliense.
17
3. METODOLOGIA
Entre a variedade de mtodos cientficos, adotamos uma abordagem terica
da pesquisa qualitativa. O modelo adequado para a seguinte pesquisa, a princpio,
por defrontar a multiplicidade. Em outras palavras, como ressalta Flick (2004, p. 17),
a relevncia especfica da pesquisa qualitativa para o estudo das relaes sociais
deve-se ao fato da pluralizao das esferas de vida.
O mtodo tambm planejado para conter a relao de influncia do
pesquisador sobre o fenmeno estudado, ainda que proporcione a interao com o
tema para evitar a falta de familiaridade do observador com os observados (FLICK,
2004). A pesquisa qualitativa induz diversidade e a uma viso realista no processo
de coleta de dados.
Assim, optamos por investigar o processo de recepo das reportagens
produzidas por reprteres com sotaque. Os estudos de recepo, de acordo com
Jacks (1995), inserem o receptor na pesquisa, tornando-o componente importante
no processo: [] visam compreenso da complexidade do real em que est
imerso eu sujeito, encontram os elementos simblicos que realizam o contato do
indivduo com seu campo social (JACKS, 1995, p.153).
O intuito no entender a adaptao do jornalista aos padres
fonoaudiolgicos das emissoras e, sim, explorar como o telespectador recebe e
interpreta o contedo sem ou com a neutralizao do sotaque. importante
destacar que esse receptor, como prope Martn-Barbero (1995), no uma figura
frgil que recebe o que veiculado na TV sem se opor. Na verdade, os estudos de
recepo resgatam a relao entre o emissor e o receptor, devolvendo o papel
participativo para o ltimo. Sobre o telespectador, Sousa diz:
O receptor deixa de ser visto, mesmo empiricamente, comoconsumidor necessrio de suprfluos culturais ou produtomassificado apenas porque consome, mas resta-se nele tambm umespao de produo cultural; um receptor em situaes econdies, e por isso mesmo cada vez mais a comunicao buscana cultura as formas de compeend-lo, emprica e teoricamente(SOUSA, 1995, p. 26-27).
18
Para provocar a variedade de opinies, na linha da abordagem indireta,
aplicamos o grupo focal (GF). Segundo Powell e Single (1996, p. 449 apud GATTI,
2005, p. 7): um grupo focal um conjunto de pessoas selecionadas e reunidas por
pesquisadores para discutir e comentar um tema, que objeto de pesquisa, a partir
de sua experincia pessoal.
A escolha dessa ferramenta justificada por vrios fatores. Entre eles, o fato
de que a prtica provoca a interao entre os participantes e expe o que, como e
porque os grupos pensam sobre o objeto da pesquisa. Inclusive, como cita Gatti
(2005, p. 9): [] um grupo focal permite ao pesquisador conseguir boa quantidade
de informao em um perodo de tempo mais curto.
Outra vantagem assegurar que o pblico estudado, em virtude da
heterogeneidade dos grupos, sinta-se vontade com as condies e o ambiente
para compartilhar opinies e pensamentos. Se os falantes no reconhecem a
existncia do preconceito lingustico, como defende Bagno (2013, p. 24),
acreditamos que o mtodo proporcione ao telespectador brasiliense queira falar
espontaneamente sobre o assunto:
Pode ser que as pessoas no queiram responder certas perguntas,ou mesmo que elas no consigam faz-lo. Talvez elas no desejemdar respostas verdadeiras a perguntas que invadam sua privacidade,causem desconforto ou tenham impacto negativo sobre seu ego oustatus (MALHOTRA, 2010, p. 111-112).
Realizamos dois grupos focais, cada um composto por 06-12 pessoas, valor
recomendado por Costa (2010), delimitados por caractersticas como a faixa etria
dos membros (18 aos 29 e 30 para cima) e mesclados com nascidos ou no em
Braslia. Nesse caso, brasileiros advindos de outros estados, que tinham em comum
o fato de residir na capital federal por, no mnimo, trs anos, fizeram parte da
pesquisa.
Como requisito indispensvel para o desenvolvimento do GF, procuramos
estabelecer, pelo menos, um ponto em comum entre os participantes. Por isso,
determinamos que eles precisavam assistir a qualquer telejornal, nacional ou local,
com qualquer frequncia. Alguns jornalistas e linguistas se interessaram pelo tema
proposto, todavia decidimos que, talvez, a participao desse pblico poderia
influenciar nas respostas gerais e, assim, decidimos que esses poderiam assistir a
dinmica, mas no participar dela.
19
Atravs da internet, divulgamos o convite para o encontro duas semanas
antes de sua realizao. No texto, publicado em redes sociais, foi exposto que seria
uma conversa sobre o telejornalismo produzido no DF. Dessa forma, os participantes
sabiam que o assunto seriam os jornais brasileiros e suas caractersticas, mas no
sabiam que o foco seria a presena do sotaque. As reunies aconteceram no Centro
Universitrio IESB nos dias 19 e 20 de setembro de 2014 com durao de,
aproximadamente, 1h e 30min.
Ao escolher o grupo focal como metodologia, conhecamos os
possveis limites e benefcios da experincia para o trabalho. A todo momento, o
objetivo era desenvolver uma comunicao entre os participantes para conseguir
captar o que, como e o porqu que cada membro pensava sobre o tema:
O grupo focal permite fazer emergir uma multiplicidade de pontos devista e processos emocionais, pelo prprio contexto de interaocriado, permitindo a captao de significados que, com outros meios,poderiam ser difceis de se manifestar (GATTI, 2010, p. 09).
Como expomos no incio desse trabalho, o preconceito lingustico um tema
evitado, e at mesmo desconhecido, por muitas pessoas. Comentar sobre a
presena do sotaque no telejornalismo seria uma tarefa difcil de ser feita por meio
de um questionrio, por exemplo. Fez-se necessrio estar presente e fazer o tema
aparecer como um assunto percebido pelo grupo e no como algo que pudesse
causar desconforto para os entrevistados.
No fim, notamos que o mtodo foi capaz de ajudar na captao, de maneira
dialogada, das opinies sobre o tema. Pelos comentrios finais e assuntos ps GF,
notamos que muitos dos presentes expressaram que nunca tinham parado para
pensar no tema e que, depois da experincia, passariam a reparar mais na presena
do sotaque no telejornalismo e at que ponto eles se incomodaram (ou no) com a
presena dele na TV.
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4. A regionalizao do telejornalismo
Nas ltimas seis dcadas, a televiso conquistou o Brasil: 95,1% dos lares
brasileiros possuem, pelo menos, um aparelho de televiso, de acordo com o Censo
2010 do IBGE. Essa tecnologia, como afirmam Bistane e Bacellar (2008, p. 9) a
principal fonte de informao e diverso de uma parte significativa dos brasileiros.
Alm de informar, a tecnologia pode ir mais alm:
[] a televiso, um definidor de culturas lingusticas, responsvelpela disseminao no s de entretenimento, informao e notcia,mas dotado de prticas discursivas que interferem de uma formaabrangente o povo brasileiro (BATISTA; FIGUEIREDO, 2009, p. 2)
Os jornais impressos no Brasil, nas grandes capitais, reduziram as tiragens
dirias e um dos fenmenos que explicam essa realidade foi o incremento do
telejornalismo (TEODORO, 1980). Para ele, migraram os que no tinham dinheiro
para comprar diariamente o impresso, parte dos que faziam isso de maneira rotineira
e a parcela analfabeta da poca. Ao trocar palavras por imagens, o telespectador
adotou a televiso como guia para se informar sobre o que acontece no pas e no
mundo, e o telejornal ganhou o seu destaque. Como defende Camila Guimares
(2006, p. 6, grifo nosso): o telejornalismo exerce um importante papel na televiso
com sua funo social: a de formar uma opinio pblica, prestar servio comunidade e permitir um amplo acesso informao.
Para entender como chegamos tendncia de regionalizar o telejornalismo
necessrio voltar aos anos 1970, dcada marcada pelo conceito de integrao
nacional. Em pleno Regime Militar, o Brasil dos anos 1970 foi marcado pela
represso e por grande censura imprensa. A poltica dos militares era expandir e
unificar o territrio brasileiro, com o intuito de notabilizar o patriotismo. Maria Rita
Kehl (1980, p. 24) defende que 'integrar a nao pode significar, em termos
polticos, afinar o coro dos descontentes de acordo com o tom ditado pela minoria
satisfeita.
Nesse contexto entrava no ar, no dia 1 de setembro de 1969, a mais nova
produo da TV Globo: o Jornal Nacional. Pensando na integrao regional via
televiso, o jornal estabeleceu como objetivo, desde o incio, reproduzir diariamente
o que acontecia de mais importante no Brasil e no mundo durante o dia. Nas
21
palavras de Cid Moreira (apud ZAHAR, 2005, p. 25), ao encerrar o primeiro
programa, o Brasil ao vivo a na sua casa.
A partir da, a programao ficou sob controle do eixo Rio de Janeiro/So
Paulo. Alm de unir o Brasil em uma s estrutura de transmisso, essa integrao
nacional tambm uniformizou linguagens e reduziu o tempo destinado para a
programao regional (KEHL, 1980, p. 8-13). A TV Globo aparentava adotar uma
viso de que, para produzir um jornal para todo o Brasil, era necessrio padronizar
um estilo para ser seguido pelos reprteres de todos os estados afiliados.
O telejornalismo da TV Globo estabeleceu padres, ao criar um manual
prprio de como fazer o jornal. Parmetros que no s ditam normas estticas como
tambm criam uma forma nica de transmitir a notcia (CARVALHO, 1980, p.34).
Esse prottipo ganhou nome: Padro Globo de Qualidade.
A Globo ento se sobressai pelo seu produto mais moderno: o'padro Globo de qualidade'. este um poderoso instrumentoutilizado pela emissora para neutralizar a sua linguagem e o que adestaca, entre outras coisas, das demais emissoras, quanto formade veicular o discurso dominante (RIBEIRO; BOTELHO, 1980, p. 79).
Sobre o assunto, Ribeiro e Botelho (1980, p. 96-97) publicam a opinio de
Homero Snchez, diretor do departamento de Anlise e Pesquisa da TV Globo em
1971: ainda Homero Sanchez que afirma que a Globo no tem inteno de
homogeneizar, mas sim de encontrar uma linguagem comum. Essa unificao no
objetivava ser simples para atender o pblico-alvo. Freire Filho (2004, p. 101)
argumenta que o padro global de qualidade consubstanciava o intento declarado
da emissora do Jardim Botnico de ser popular sem ser popularesca.
Como explica Silva (2002), essa exigncia para estabelecer a qualidade do
telejornalismo acaba sendo um dos obstculos para a ampliao da produo local
na programao das emissoras. Existe, por exemplo, a batalha enfrentada pelas
prprias afiliadas da Rede Globo para atender ao padro de qualidade do
telejornalismo. Essas, para entrar no ar, por volta de trs vezes ao dia, j obedecem
a tantas regras que, se o horrio destinado programao local aumentasse,
cresceria tambm a lista de exigncias e de gastos para cobrir. Sem contar que
mais fcil monitorar se as normas esto sendo seguidas quando no extenso o
tempo de programao local.
22
As regras tambm atingiram outras realidades: na busca por audincia,
diversas emissoras brasileiras precisaram seguir o padro aplicado pela TV Globo.
Era perigoso inovar e ir contra ao modelo global, que j conquistava grande parte do
pblico brasileiro. Canais como Cultura, Bandeirantes e Tupi tentaram reproduzir o
novo tipo de noticirio, mas a carncia de recursos tecnolgicos como a falta de
cmeras modernas e grandes estdios foi um dos fatores que fizeram a tentativa
fracassar:
As demais emissoras, na nsia de reconquistar um pblico quemaciamente transferiu sua preferncia para a programao global,cairiam fatalmente na cpia. E, como nenhuma delas jamaisconseguiu dispor de condies tcnicas capazes de levar ao ar oshow telejornalstico iluminado pelo brilho de paets e nacarados, acpia era invariavelmente ruim, mal-acabada e pobre (CARVALHO,1980, p. 39).
Na pretenso de ser gigante, uma das consequncias da integrao do
pblico foi a inexistncia de uma produo local e, quando ainda existe,
insignificante (RIBEIRO; BOTELHO, 1980, p. 97), contrariando a Constituio
Federal de 1988 que, no art. n 22, inciso III, prev a regionalizao da produo
cultural, artstica e jornalstica, conforme percentuais estabelecidos em lei. Desde
2002, tramita no Senado o projeto de lei 7.075/02, de autoria do senador Antero
Paes (PSDB/MT), que determina que as emissoras nacionais de rdio e TV devem
produzir, no mnimo, 30% de programao regional. No caso da televiso, o horrio
entre 18h e 22h seria destinado veiculao da cultura local.
Existe a exigncia da regionalizao, mas falta a definio do conceito dentro
da legislao brasileira de radiodifuso. No meio acadmico, ainda so novas as
pesquisas e explicaes para o termo. Silva (2002) define o fenmeno de
regionalizao da programao como a volta valorizao da produo local e da
cultura popular. Por outro lado, as emissoras interpretam que regionalizar a
programao fazer menos que isso:
[] Os programadores entendem produo regional como sendoaquela programao produzida e gerada por uma emissora afiliadadentro da grade nacional dirigida a um pblico especfico em horrionobre (MATTOS, 2012, p. 21).
Com esse entendimento, para regionalizar a programao de maneira tmida,
a Rede Globo criou telejornais locais em horrios estabelecidos antes dos jornais de
23
exibio nacional: o Bom Dia Brasil, o Jornal Hoje e o Jornal Nacional. Como diz
William Bonner, editor e ncora do Jornal Nacional, ao explicar como funciona esse
revesamento de transmisso local e nacional:
O telespectador pode acompanhar de perto, pelo jornalismocomunitrio, os problemas que afetam sua cidade e seu estado. Achamada 'grade de programao' da Rede reserva faixas de horriopara as produes locais (BONNER, 2009, p. 33).
A Globo Braslia, por exemplo, criou o DFTV, que foi ao ar pela primeira vez
no dia 03 de janeiro de 1983, s 19h45. O telejornal local chegou a ter, em 1983,
trs edies. A 3 edio do DFTV, com o resumo dos acontecimentos do dia, era
transmitida s 23h40, mas saiu do ar em 1989 (GUIMARES, 2006, p.23).
Hoje, a emissora apresenta duas edies do DFTV, de segunda a sbado, a
primeira por volta de 12h05 e a segunda ainda s 19h45. Alm disso, a emissora
tambm exibe, de segunda a sexta-feira, o Bom dia DF. O tempo de durao dos
jornais varia, computando-se a publicidade: o DFTV 2 com 15 min, o DFTV 1 com
30 min e o Bom Dia DF com 1 hora.
Esses jornais locais cativaram os telespectadores, por exemplo, pela escolha
de acontecimentos das cidades do DF para virarem pautas dirias. Temas desde a
falta de transporte coletivo at os buracos das vias de Ceilndia, uma das regies
administrativas do DF, aproximaram a emissora do pblico brasiliense. Os telejornais
adquiriram outra funo: o papel assistencialista. Em suma, Gomes (2006) explica
que o fato de o cidado procurar as redaes dos jornais locais para expor
problemas da cidade uma ao que revela a necessidade dos moradores de
serem representados:
O receptor se conecta com a cidade atravs do telejornal; partilha,assiste pela tela da televiso cidados como ele vivendo problemassemelhantes ao dele. O telejornal local um mediador entre oreceptor e a cidade, influencia o sentimento de pertencimento docidado em seu espao pblico (GOMES, 2006, p. 6).
No caso dos jornais locais da Rede Globo no Distrito Federal, essa
representao parece moderada e garantida pelas pautas e no por caractersticas
culturais da capital. Se temos o reprter narrando um acidente na Esplanada dos
Ministrios, este no usa, no retrato da fala, expresses locais e muito menos o
sotaque da cidade. Assim, percebemos que a padronizao do telejornalismo
24
nacional, estabelecida por conceitos como o Padro Globo de Qualidade, tambm
atingiu a produo local.
Quando esse modelo de como fazer o jornal encontra a produo regional,
vrios conceitos entram em conflito. No caso do jeito de falar na televiso, aparece a
falta de identidade lingustica no jornal mesmo quando ele produzido para um
determinado pblico. Essa carncia faz com que os grandes meios de comunicao
no Brasil tornem-se os maiores difusores do preconceito lingustico (BAGNO, 2013).
Ao ver o reprter na televiso, o telespectador entende que o falar bem e com
clareza exige a excluso do sotaque, mesmo que a pessoa que assista ao jornal
possua as mesmas caractersticas culturais na fala que o jornalista.
O reprter fonte de referncia para quem assiste ao jornal. Em outras
palavras, ao obedecer a um padro, ele tambm perpetua essa doutrina, difundindo
uma imagem do jeito certo de falar no ar. O jornalista de TV tambm possui
responsabilidades profissionais, zeladas pelo Cdigo de tica dos Jornalistas
Brasileiros. O mesmo estabelece no Captulo III, art. 12, inciso VIII, que o jornalista
deve preservar a lngua e a cultura do Brasil, respeitando a diversidade e as
identidades culturais.
Para preservar a lngua, o reprter deveria defender e at mesmo garantir
que as diferentes formas de falar estivessem presentes em um jornal local. Excluir o
sotaque por completo para atender ao molde de qualidade, alm de contrariar o
Cdigo de tica, um desafio dirio para esse profissional. Medeiros (2006) explica
que eles passam a confrontar todos os dias a existncia de duas referncias: a
identidade regional e a identidade profissional. O jornalista assume um jeito diferente
de falar na televiso para produzir uma reportagem sem rudos, sem considerar
que a apario do sotaque pode ser, por exemplo, uma forma de aproxim-lo do
telespectador:
O reprter no se deu conta, ainda, que, ao narrar uma histria, osotaque pode ser um recurso a mais, como os grandes romancistasfazem na escrita, mantendo expresses regionais (MEDEIROS,2006, p. 71).
A excluso do sotaque no telejornalismo vem acompanhado de uma srie de
exigncias de um padro que, nos anos 1970, tinha outra fora, outra razo para
existir. A presena do regional na televiso brasileira est muito diferente do que h
25
50 anos, mas, mesmo assim, ainda se faz necessrio excluir os vestgios de um
antigo padro de qualidade.
Aplicar o que se prev em lei talvez no seja uma forma de garantir o
multiculturalismo na televiso, mas pode ser o comeo e uma das formas de diminuir
o preconceito lingustico que a televiso brasileira vem, desde o seu incio,
alimentando diariamente com jornais locais sem identidade prpria.
26
5. O sotaque e o preconceito lingustico
Para entender o porqu da existncia do sotaque e as consequncias de
discrimin-lo do telejornalismo importante citar e explicar, atravs da lingustica, a
origem de conceitos bsicos da lngua falada. Faz-se necessrio tambm lembrar
que a lingustica uma entre as muitas reas que estudam a linguagem, mas, para
a elaborao do trabalho, escolhemos usar as teorias desse campo.
Muitos estudiosos buscaram definir a diferena entre linguagem e lngua e,
como resultado, acabaram por definir tambm a apario de outro elemento: a fala.
Saussure (1972) defendia que a linguagem era complexa e abrangia vrios
domnios. Uma manifestao dela seria a lngua, a parte social da linguagem
formada pelo conjunto de signos:
O signo a unio de um conceito com uma imagem acstica, queno o som material, fsico, mas a impresso psquica dos sons,perceptvel quando pensamos numa palavra, mas no a falamos. []Ao conceito Saussure chama significado e imagem acstica,significante. [] O significado no a realidade que ele designa,mas a sua representao. [] o significante o veculo dosignificado, que o que se entende quando se usa o signo, suaparte sensvel (FIORIN, 2010, p. 58).
Do encontro desses dois termos aparece a fala. Essa seria o resultado da
combinao dos cdigos lingusticos feita pelos falantes. Petter (2010, p. 14) diz que
a lngua condio para se produzir a fala, mas no h lngua sem o exerccio da
fala.
A lingustica est voltada para a linguagem em geral, enquanto o movimento
que vai estudar a lngua em seu uso cotidiano a sociolingustica. Norteado pelo
linguista William Labov, surgiu nos Estados Unidos na dcada de 1960 e se
preocupa em analisar o lado social da linguagem, das diferenas entre falantes das
comunidades e at mesmo as caractersticas de fala de pequenos grupos sociais.
tambm denominada como a teoria da variao:
A sociolingustica parte do princpio de que a variao e a mudanaso inerentes s lnguas e que, por isso, devem sempre ser levadasem conta na anlise lingustica. O sociolinguista se interessa portodas as manifestaes verbais nas diferentes variedades de umalngua (CEZARIO; VOTRE, 2010, p. 141).
27
Analisa-se a variao entre formas diferentes na lngua, sem a alterao do
significado bsico. Por exemplo, a variao da fala no uso dos pronomes pessoais
na primeira pessoa do plural a gente e ns. Cezario e Votre (2010) explicam que
existem trs tipos bsicos de variao lingustica: a variao regional, a variao
social e a variao de registro. A primeira est associada aos diferentes estados
brasileiros e at mesmo a varivel geogrfica entre os pases e a segunda variante
est relacionada as diferenas entre os grupos socioeconmicos. Por fim, a ltima
diz respeito aos meios de comunicao e a formalidade exigida para o seu uso,
como a produo de um jornal ou de um e-mail.
Ilari e Basso (2012) incluem mais um tipo de variao existente e, assim,
passamos a ter quatro formas: a variao diacrnica, a diatpica, a diastrtica e a
diamsica. Comparando com Cezario e Votre (2012), a variao regional seria a
diatpica, a variao social seria a diastrtica e a diamsica se compara variao
de registro. A disparidade seria a variao diacrnica, que acontece na passagem do
tempo. Percebe-se a sua existncia comparando diferentes geraes e
caractersticas de suas falas, como o uso de grias de diferentes perodos.
Em sntese, a variao ocorre por conta do favorecimento do ambiente
lingustico. Por exemplo, Ilari e Basso (2012) alegam que os traos regionais
costumam aparecer mais ntidos em falas informais. Esse tipo de situao favorece
o aparecimento do sotaque porque o indivduo, dentro da comunidade, procura
firmar grupos no qual possa partilhar traos comuns. Conforme Cezario e Votre
(2010, p. 150), para ocorrer uma mudana lingustica, no entanto, necessria a
interferncia de fatores sociais, refletindo as lutas pelo poder, o prestgio entre
classes, sexos e geraes. A busca por essa categorizao pode evoluir para o
enquadramento por faixa etria, escolaridade, profisso e at mesmo por sexo. Em
ntidas separaes de classes, podemos perceber semelhanas, e diferenas, no
modo de falar uma lngua.
Um exemplo o sotaque, que aparece dentro da variao diatpica ou
regional. Romaine (2000) diz que o sotaque uma das formas de pronunciar uma
variante. Para facilitar a definio do termo, muitos estudiosos diferenciam sotaque
de dialeto. O sotaque est ligado, exclusivamente, variedade de pronncia e o
dialeto tambm conta com a diferena de gramticas e de vocabulrios.
28
J Bonora (2004, p. 82) resume o sotaque como [] o estilo caracterstico de
falar ou pronunciar slabas, palavras ou frases. Coupland (2007, p. 5) expande a
definio alegando que os falantes no so plenamente estveis em como usam os
recursos do sotaque ou dialeto. A fala muitas vezes, por exemplo, apresentam uma
mistura das formas 'padro' e 'no padro' no mesmo discurso1.
Um dos fatores que provocam a existncia e a sustentao do sotaque a
convivncia em grupo:
[] a fala do carioca da maneira que porque a comunicao, nosentido de contato lingustico, entre os membros da comunidade defala carioca muito mais intensa do que sua comunicao commembros de outras comunidades. As chances cotidianas de umcarioca falar com outro carioca so muito maiores do que suasoportunidades de falar com um paulistano ou com um gacho. Dessemodo, ao mesmo tempo que a comunicao intensa entre membrosde uma comunidade leva manuteno de suas caractersticaslingusticas, a falta de contato lingustico entre comunidades favoreceo desenvolvimento de diferenas lingusticas (BELINE, 2002, p. 129).
No caso dessa pesquisa, levamos em conta o sotaque do Distrito Federal.
Sabemos que ainda comum, entre os moradores da capital federal, surgir a
afirmao de que brasiliense no possui sotaque. Essa alegao contestada no
s por estudiosos, mas tambm por outros brasileiros, que detectam a existncia de
uma forma de falar de Braslia.
importante citar um detalhe essencial da histria, a questo da criao da
cidade. Em meados de 1956, no incio da construo da nova capital, muitos
migrantes vieram para ajudar a erguer a estrutura da cidade e, assim como saram
de diversas regies brasileiras, tambm trouxeram uma vastido de sotaques.
Dessa mistura, podemos notar o aparecimento de vrios fenmenos
lingusticos. Entre os migrantes, a mudana no sistema fonolgico na convivncia
multidialetal e, nos nascidos no DF, aparece o uso de padres lingusticos diferentes
dos paternos (BARBOSA, 2002). Essa alterao, ou at mesmo a excluso de
caractersticas da forma de falar de outros locais do Brasil, um dos fatores que
construiram um jeito de falar brasiliense. Em outras palavras, em vez de misturar as
influncias regionais, nota-se que a forma de falar local surge da rejeio.
1 COUPLAND, traduo livre da autora. Speakers are not fully consistent in how they use accent ordialect features. Their speech will often, for example, show a mixture of 'standard' and 'non-standard'forms of the same speech feature.
29
Um dos primeiros estudos sobre o falar do DF foi o de Hanna (1986), que
defendia que o jeito de falar dos brasilienses de classe mdia do Plano Piloto
aparentava ausncia de sotaque e que parecia com o jeito neutro de falar dos
telejornalistas. J Barbosa (2002) questionou se esse sotaque neutro no seria uma
forma de a classe mdia, ao juntar vrios sotaques, criar um padro destacado e
limpo de falar:
O que vemos acontecer em Braslia, talvez por verificarmos ali umfenmeno claro de mudana em processo, a exarcebao de umvalor negativo atribudo a sotaque no processo de afirmao de umafala prpria aos brasilienses. Isso foi verificado junto a indivduos declasse mdia. Fica aberta e premente a investigao de mesmanatureza com indivduos de classes baixas, menos escolarizados,menos identificados com a ideologia da moderna capital (BARBOSA,2002, p. 73-74).
Podemos inferir dos estudos feitos pelas autoras que o jeito de falar de
Braslia neutro para manter o discurso de que brasiliense no possui sotaque.
Talvez esse seja um dos fenmenos lingusticos que acontecem quando algumas
pessoas definem o sotaque como uma imperfeio e o tratam como um
enfraquecimento da lngua. Infelizmente, no momento em que o sotaque passa a
ser tratado como anormal que o problema aparece. Nesse processo, comum
misturar as caractersticas da variao diatpica (regional) e diastrtica (social). Isso
acontece porque, alm da extenso territorial do Brasil ser enorme, ainda possvel
observar, em muitas regies, as camadas urbanas e rurais, muitas vezes
censuradas por classes sociais opostas. Bagno (2013) nomeia essa oposio de
abismo lingustico. A televiso pode, de certa forma, ajudar a alimentar a variao
diastrtica. Da Vi (1977, p. 17) lembra que os meios de comunicao atingem os
grupos sociais, quebram sua estrutura e contribuem formao de um novo
conceito de classe, resultando em busca natural e inconsciente de ascenso social.
O falso julgamento da falha na lngua pode ganhar foras. Essas diferenas
de classes sociais e de territrio, quando incorporam as normas gramaticais, em
outras palavras o jeito certo de se falar, fazem aparecer uma outra forma de
intolerncia variao: quando a norma padro da lngua encontra suas variantes
que aparece o preconceito lingustico:
[] independentemente de quem somos, normal quemantenhamos algum tipo de interao com pessoas de outrasclasses sociais, de outra idade, de outro sexo, assim como normal
30
para qualquer um de ns produzir textos escritos e falados queutilizam formatos diferentes. Nessas vrias formas de interao, alngua que utilizamos muda, em alguma medida, para adaptar-se aointerlocutor e ao contexto ou situao. Portanto, variao existe, quergostemos disso, quer no. Mas h muita gente para quem esse fato um problema: essas pessoas se sensibilizam com a variaodiastrtica e tendem a achar que falar uma variedade diferente davariedade padro um problema srio para a sociedade e paraquem o faz, talvez um vcio, talvez um crime, talvez umamanifestao de inferioridade (ILARI; BASSO, 2012, p. 195).
Em nenhum momento, a lngua deve ser usada para provocar a excluso
social. Consequentemente, o jornalismo tambm deve cuidar para no fazer
germinar, mesmo que sem querer, essa excluso. Bagno (2013) alega que,
atualmente, a mdia brasileira uma das maiores divulgadoras e perpetuadoras do
preconceito lingustico. Exemplo disso so as novelas que, mesmo com tanta
riqueza na produo, acabam retratando regies do Brasil de forma caricaturesca.
Levando essa realidade para o jornalismo de TV produzido no Brasil,
encontramos telejornais sem expresso regional e padronizados. A excluso do
sotaque, por exemplo, to evidente que, ao assistirmos ao jornal, notamos a
diferena entre o reprter e os entrevistados que possuem caractersticas da fala de
outras regies brasileiras. Alm disso, tambm vemos que os telejornais regionais,
que existem na ideologia de representar uma cidade, no possuem, ou talvez no
possam ter, ao menos o falar prprio do local representado.
No prximo captulo, discutiremos quais so os efeitos dessa padronizao
na forma de falar no telejornalismo.
31
6. O falar do telejornalismo
Bistane e Bacellar (2008) aprovam um falar coloquial, direto e com frases
curtas para o reprter de TV. Destacam, tambm, a importncia de empregar o falar
do dia a dia, da mesma forma que conversamos com o zelador do prdio, por
exemplo. Maciel (1995) sustenta o mesmo pensamento e o completa citando a
importncia do uso da linguagem conversada:
Estudiosos da linguagem de televiso e profissionais maisexperientes costumam dizer que, diante do telespectador, temos denos comportar como se estivssemos contando as notcias do diapara um parente ou amigo, sentado no sof da sala de visitas(MACIEL, 1995, p. 31).
Bonner (2009, p. 223) tambm transmite a relevncia de falar de maneira
clara e com sentido para quem est assistindo ao jornal. O pblico alvo, o que o
Jornal Nacional busca atingir, ganha, nas palavras do autor, o perfil semelhante ao
personagem Homer Simpson: Um chefe de famlia trabalhador, protetor, classe
mdia, nvel intermedirio de instruo, cansado, ao fim do dia.
Em sntese, a maioria dos estudiosos e professores da rea concordam em
que o falar no telejornalismo deve ser, em uma palavra, simples. Se o objetivo
atingir qualquer tipo de telespectador, do analfabeto ao graduado, importante
manter uma linguagem que conquiste o coletivo. Pensando assim, comum usar a
expresso a lngua que falamos.
O jeito com que falamos diariamente no envolve o uso das normas
gramaticais por completo. Na verdade, vemos com frequncia regras da norma-
padro sumirem das nossas conversas ao longo do dia. Exemplo seriam os
pronomes oblquos de 3 pessoa o, as, os, as que entram na velha questo do
eu a vi na loja, como diz a regra, e o eu vi ela, que, por mais que retrucado por
alguns (viela uma rua pequena), falado rotineiramente pelos brasileiros.
Para o desenvolvimento deste trabalho, importante lembrar que no
entraremos na discusso do uso de termos gramaticais no ar, como se certo o uso
de expresses populares como o a gente no lugar de ns. Esse debate no nos
importa. O que levaremos em questo o emprego do sotaque no telejornalismo.
Assim sendo, chegamos num contrassenso: mesmo que o jornal seja produzido para
32
que at os no letrados possam entender de que se trata, o uso do sotaque no
bem-vindo na televiso, por questes de padro de qualidade.
Dessa forma, se os jornais repensassem a sugesto de criar uma identidade
prpria para si, acreditamos que assistiramos a telejornais com a presena de
reprteres e apresentadores com sotaque. Afinal, o objetivo de qualquer reprter ,
ao construir uma reportagem, se aproximar do telespectador o mximo possvel,
para que ele entenda o que est sendo retratado na televiso. Nessa viso, o uso do
falar local poderia ser uma das ferramentas que destacariam o olhar do jornalista
sobre o assunto coberto.
Nota-se que o sotaque no est to ausente da televiso brasileira como j
esteve no passado. Mesmo que em poucos jornais, mais fcil achar um reprter no
Jornal Nacional com sotaque hoje do que nos anos 1970, por exemplo. Se essa
variao ganhou espao na TV, isso aconteceu por persistncia dos falantes.
Medeiros (2006) lembra que muitos reprteres relatam que, em outros
tempos, sofreram algum tipo de rejeio ou preconceito por conta do sotaque. A fala
carregada de expresso de uma regio do Brasil, que no fosse de a So Paulo ou
a do Rio de Janeiro, acabava sendo um problema. E a qualidade da matria
chegava, muitas vezes, a nem ser avaliada por conta disso. Para a autora, por um
lado, essas ocorrncias serviram para mudar o que vemos atualmente. So esses
jornalistas que hoje selecionam quem trabalhar no jornal televisivo. Pela bagagem
histrica, pelo que enfrentaram para entrar na profisso, esses so mais flexveis e
ajudaram a diminuir a imagem de que um tipo de fala especfico, sem sotaque,
fundamental.
Contudo, o sotaque parece ainda ser indesejado nos telejornais, mas as
palavras usada por autores brasileiros para defender a banalizao da variao so
outras. Bistane e Bacellar (2008, p.102, grifo nosso), em um captulo nomeado de
TEM CONSERTO, alegam que bons reprteres de televiso tiveram problemas
com a voz ou com o sotaque muito acentuado. E conseguiram melhoraconsidervel. Bonora (2004, p. 82, grifo nosso) diz que o sotaque no pode ser um
rudo na comunicao, chamando mais ateno que a notcia. Maria (2004, p.02,grifo nosso) alega que [] o sotaque muito forte no funciona em televiso.
33
Desses trechos podemos entender, de forma geral, que o sotaque no
consegue atender a qualidade exigida pelo telejornalismo. Se o falante melhorou,
significa que antes ele apresentava uma disfuno, um distrbio na fala. Dentro
dessa viso, o sotaque ainda um obstculo e que, para ir ao ar nos telejornais
brasileiros, precisa ser moldado.
Da tentativa de diminuir a incidncia de jornalistas com sotaque na televiso,
nasceu a ideia de suaviz-lo:
No perodo de implantao do telejornalismo, havia mais de umdesafio: era a primeira experincia da tev em rede nacional. Assim,tnhamos reprteres de vrias regies do pas. Nosso objetivo era terdiversidade no ar. E, claro, queramos ter os diversos sotaques. []Com orientao da Glorinha, partimos para manter os sotaques como cuidado de suaviz-lo (MARIA, 2004, p. 02).
Porm, Bonora (2004) diz que a Rede Globo, por um tempo, adotou uma
postura mais voltada neutralizao da variao, por exemplo, o trabalho feito pela
assessoria de fonoaudiologia da emissora em Recife, no ano de 1994. Sobre as
definies de suavizao e neutralizao, a autora aponta que:
Com a suavizao, os excessos do regionalismo seriam retirados, ecom a neutralizao eles seriam modificados para um padro semidentificao regional, o que acarretaria uma perda de identidadevocal do profissional (BONORA, 2004, p. 83).
Maria da Glria Cavalcanti Beuttenmller, conhecida como Glorinha, uma
fonoaudiloga carioca que, ao ser convidada por Alice-Maria e Armando Nogueira
para trabalhar na TV Globo em 1974, ajudou a construir um jeito de falar para a
televiso brasileira (MEDEIROS, 2006). interessante ressaltar que esse jeito de
falar, elaborado puramente para a TV, muitas vezes chamado de neutro. Nas
palavras de Mendes (2006, p. 13) sobre a linguagem dos jornalistas: Falam com um
sotaque que no remete a lugar algum especificamente e aparentam propor, assim,
certa neutralidade e maior compreensibilidade da notcia.
Em entrevista concedida para Medeiros (2006), Glorinha diz que a televiso
brasileira possui um jeito de falar prprio, conquistado atravs da suavizao dos
sotaques do Brasil: Eu insisto muito em suavizar as pronncias porque esse pas
to grande tem que ter uma certa uniformidade [] (apud MEDEIROS, 2006, p. 27).
Apesar de a fonoaudiloga defender que o sotaque era suavizado, a histria
prova o contrrio. Em 1956, em um congresso de filologia em Salvador, ficou
34
estabelecido que "[] a pronncia padro do portugus falado no Brasil seria a do
Rio de Janeiro, com algumas restries. Os 'esses', no poderiam ser muito
sibilantes e os 'erres' no poderiam ser muito arranhados, guturais" (RIBEIRO, 2004,
p. 123). Ou seja, a suavizao do falar da TV Globo no envolvia somente a
conteno do sotaque, mas tambm mold-lo para atender ao eixo RJ/SP.
Por conta desse determinado acontecimento, percebemos a presena do
preconceito lingustico j na construo do falar da TV brasileira. Ao definir que o
sotaque carioca seria o modelo adotado pela emissora, estabeleciam ali no s uma
referncia, mas tambm esculpiam um jeito certo e, principalmente, bonito de
como falar no ar. Ento, o falar nordestino e o erre caipira do interior de So Paulo,
por exemplo, ganhavam o semblante indigesto e, em alguns momentos, engraado,
um tom caricato. Quando estabeleceram essa regra, vivamos tempos de
nacionalizao do jornal, como mostrado no primeiro captulo do trabalho, e, ao
trazermos esse acontecimento para os dias atuais, defendemos que manter essa
viso alimentar, cada vez mais, o preconceito lingustico que a televiso brasileira
sustenta, mesmo que sem querer.
Indo mais alm, ao conduzir essa realidade para os tempos de regionalismo,
nos deparamos com um universo inseguro, assim como o da regionalizao da TV
no Brasil. Se ainda no conseguimos conceituar o que , torna-se difcil tambm
analisar quais foram as vantagens (e desvantagens) desse acontecimento na
questo do falar do telejornalismo. Alguns autores arriscam:
Tambm contribuiu para a suavizao o fato de que no final dos anos90, a programao oferecida pela televiso foi regionalizada, comprogramas locais, com o intercmbio e migrao de reprteres devrias regies do Brasil. Os telejornais locais e de rede ganharamum sotaque mais rico e variado. Os reprteres tinham ento desuavizar o sotaque, sem perder a identidade regional e sem gerar umrudo na comunicao (BONORA, 2004, p. 86, grifo nosso).
Os telejornais locais, no fim, ganharam algo: um jeito de falar copiado do
modelo nacional. Dizer que adquiriram mais sotaques e ainda mais variados uma
iluso que serve para explicar o motivo que faz com que o jornal local ainda no
tenha uma identidade prpria. No Distrito Federal talvez no fique to claro os
efeitos dessa pasteurizao, j que os poucos reprteres da Rede Globo Braslia
que possuem sotaque suavizado de outras regies, junto com os que apresentam o
35
falar neutro do brasiliense, no so capazes de deixar o jornal com um falar
desigual, contribuindo para a uniformizao da fala.
Em outras palavras, o pblico brasiliense parece estar acostumado com a
ausncia do sotaque e, por isso, dar-se conta da presena da variao da fala entre
os jornalistas e os poucos entrevistados que a possuem. Essa inconstncia aparece
com mais destaque em regies do Nordeste, por exemplo. Nos jornais locais, como
o JPB 1 edio, que seria semelhante ao DFTV 1 edio, os jornalistas empregam
a fala neutralizada, o que torna evidente o sotaque dos entrevistados.
Eessa padronizao do falar na televiso pode ser percebida no estudo de
Evangelista e Almeida (2014) feito com 10 jornalistas sobre o sotaque e regionalismo
no telejornalismo da Paraba:
Para 100% dos entrevistados, o sotaque deve ser suavizado no quediz respeito ao telejornalismo. Ou seja, na contramo dos quecriticam a personalizao do sotaque na TV, os prpriosprofissionais do meio acreditam que este padro da fala benficopara a formao da notcia, e conseqentemente, para oentendimento do pblico (EVANGELISTA; ALMEIDA, 2014, p. 09).
Essa sequela do padro chega a ser anormal quando lembramos que muitos
jornalistas lutaram contra esse novo jeito de falar do telejornalismo brasileiro.
Bonora (2004) relata que muitos contestaram por acreditar que era uma atitude
capaz de faz-los perder sua identidade com a comunidade e tambm ali estava um
motivo que, no fim, atrapalharia a credibilidade das reportagens.
Falta aos jornalistas e s emissoras entenderem que possvel ser
compreendido mesmo quando se fala com sotaque. Na novela, por exemplo,
entendemos o texto de qualquer personagem, mesmo quando ele apresenta um jeito
de falar de uma regio diferente da nossa.
Essa mesma realidade pode ser observada no telejornalismo. Medeiros
(2006) sintetiza esse pensamento explicando que a fala clara que garantir o
entendimento da reportagem e no o uso de um jeito de falar no ar. Para ela, o
texto que precisa ser simples e carregado de criatividade para, no fim, conquistar o
telespectador.
O reprter privilegia a comunicao, lembrando que, no caso da televiso, ela
construda no s com o seu falar, mas tambm com imagens. E a fica claro que
36
talvez coloquemos o peso da falta de clareza no jeito de falar, quando no jornal de
TV, existem muitos outros fatores que atrapalham a compreensibilidade.
Colaborar com essa ideia , cada vez mais, contribuir para que o sotaque
possa ajudar a construir uma identidade cultural nova para os jornais. Sobre a
imagem que ele possui atualmente, Batista e Figueiredo (2009) dizem que o
telejornalismo atual no consegue representar totalmente os locais brasileiros, em
mbito nacional, por conta da excluso da variante at mesmo em regies com
sotaque.
No prximo captulo, agruparemos os pontos levantados at agora para
analisar, a partir de grupos focais, quais so os efeitos da criao de um jeito prprio
de falar do telejornalismo da Rede Globo nos telespectadores do Distrito Federal.
37
7. Os grupos focais
A seguir, mostraremos no s a descrio dos procedimentos, mas tambm
entraremos em detalhes para, se possvel, contribuir com outros pesquisadores e
trabalhos. Dividimos este captulo em duas partes: o memorial descritivo e a anlise
de dados. Primeiro, contaremos como foi a experincia e, em seguida, revelaremos
os dados das dinmicas e dos questionrios.
7.1. Memorial descritivo
Ao decidirmos pela metodologia do grupo focal, estabelecemos com cerca de
um ms de antecedncia as datas e os horrios para a realizao dos encontros.
Um dos primeiros desafios foi localizar uma sala em Braslia com fcil acesso para
mais de um meio de transporte e por um preo atrativo. Devido ao alto valor do
aluguel de espaos na capital federal, optamos pelo uso de salas do Instituto de
Educao Superior de Braslia (IESB), cedidas pela coordenao.
Aps resolvido o local, estabelecemos que o primeiro GF seria no dia 19 de
setembro (sexta-feira) e o outro no dia seguinte, dia 20/09 (sbado). Notamos que,
devido ao pouco tempo, a prtica no ms de setembro nos deixava com um perodo
suficiente para a captao e anlise dos resultados. Dentro do tempo disponvel
para uso das salas, o primeiro encontro ficou marcado para as 16h e o segundo para
as 10h.
Depois de estabelecidos os passos iniciais para colocar em prtica os
encontros, foi necessrio planejar os detalhes de cada grupo focal. Como o GF
requer a dedicao at nos mnimos pontos, cada dia tornava-se mais clara a
importncia da antecedncia da programao. importante lembrar que a ateno
com vrios fatores, desde a disponibilidade de sala ao uso de projetor, o que faz o
diferencial para a garantia de que, no dia, tudo ocorra como o planejado.
Todo o empenho no deixa de ser uma das tticas para conquistar a
espontaneidade e a participao ativa dos membros. Por mais que o GF exista num
ambiente e razo fabricados, notamos que, ao afastar a rigidez do encontro, tambm
38
trazemos os voluntrios para o conforto do debate. por isso que, nos dias
escolhidos, at mesmo a disposio da sala, com as cadeiras formando um
semicrculo, j havia sido planejada para fugir do padro de uma escola ou de uma
reunio de negcios, por exemplo.
Outro detalhe que exemplifica essa preocupao com o bem-estar do grupo
foi a determinao do momento para servir o lanche: no primeiro dia, as pessoas
serviram-se aps o bate papo, j que o encontro estava marcado para 16h. J na
segunda sesso, marcada para 10h, o lanche serviu como a abertura do encontro,
proporcionando uma conversa inicial com os presentes.
J no comeo dos preparativos, estabelecemos que a autora deste trabalho
seria a moderadora dos grupos focais. A ela coube a tarefa de coordenar o evento e
garantir, principalmente, que todos pudessem falar e compartilhar seus gostos e
pensamentos.
7.1.1 Os integrantes
Os participantes, alm de ter que assistir telejornais ao menos uma vez por
semana, tambm precisavam ser moradores do Distrito Federal. Para delimitar a
idade dos presentes, seguimos o perfil da audincia da Rede Globo Braslia:
Figura 1 Idade, sexo e classe social dos telespectadores da Globo Braslia
Fonte Comercial Rede Globo2
2 Disponvel em Acessado em 30 de out. de 2014.
39
O sexo e a classe social no foram fatores determinantes nesse primeiro
contato com o tema. Na verdade, o diferencial seria a idade dos participantes,
sustentado pela variao diacrnica. De incio, exclumos os menores de idade, j
que a participao deles requereria a autorizao dos responsveis legais. Assim,
ficamos com quatro opes de idades (18-24, 25-34, 35-49 e 50+). Devido ao pouco
tempo, escolhemos agrup-las e trabalhar com dois grupos (18-29 e 30-50+).
Nos dias dos GF, percebemos que a heterogeneidade do grupo no foi um
problema e sim uma caracterstica que contribuiu para a pesquisa. Cada participante
levantou um olhar sobre o assunto capaz de provocar o surgimento de perspectivas
diferentes, que tornavam mais fcil o debate.
7.1.2 O convite
Talvez a etapa mais cansativa da realizao de um grupo focal seja esta.
necessrio convidar o mximo de pessoas possveis para, no dia, ter o mnimo
recomendado. Sem contar que desconfortvel a sensao de no ter certeza de
que o GF dar certo ou no. Afinal, no adianta nada passar meses projetando a
dimenso do evento para, no dia, no funcionar por conta do mnimo de pessoas
para a realizao do debate.
Com os horrios, dias, locais e o perfil do pblico esperado, comeamos a
divulgar o grupo focal para chamar os telespectadores do DF. Disparamos, por e-
mail, redes sociais e mensagem de celular, a seguinte mensagem:
Figura 2 Convite usado para divulgao.
Fonte imagem criada pela autora
40
Para no direcionar os convidados ao tema central dos grupos focais,
definimos que no divulgaramos que o bate papo seria sobre o sotaque no
telejornalismo. Assim, ao chamar as pessoas para o evento, tanto pelo convite digital
e por conversa, comentvamos que era um debate sobre o jornalismo de TV.
Inclumos o sorteio de 10 brindes, no fim de cada GF, para motivar a ida de
mais participantes. Entre as prendas, compramos filmes, livros e kits de manicure.
No fim, notamos que a prtica, alm de instigar a ida das pessoas tambm serviu
para criar um clima de menos rigor possvel.
Pela regra definida por ns, amigos e parentes da autora no poderiam
participar do grupo focal. Alm disso, optamos por excluir a presena de jornalistas e
linguistas nessa etapa. Cogitamos que a figura de pessoas dessas reas poderiam
criar um ambiente de respostas certas e erradas, diferente do que era a nossa
proposta de deixar os participantes vontade.
Na vspera dos grupos focais, a lista de pessoas confirmadas para o evento
j atendia ao que espervamos. No primeiro, sete pessoas avisaram que estariam
presentes e, no segundo, mais de 20 pessoas indicaram que gostariam de participar.
Porm, foi grande o nmero de desistncias: dos sete compareceu uma pessoa e no
sbado, 11 pessoas.
comum achar, em outras pesquisas acadmicas, autores narrando que o
primeiro grupo focal no funcionou por conta da falta de participantes. No nosso
caso, a persistncia foi o segredo. Com apenas uma pessoa na sala, no primeiro
dia, passamos a andar pela faculdade convidando alunos para se juntar ao grupo.
importante citar isso para que outras pessoas, quando optarem por essa
metodologia, fiquem cientes de que, para assumir uma responsabilidade acadmica
dessas, importante, desde o incio, estar preparado para qualquer eventualidade.
Mesmo com todos os desafios, os grupos focais acabaram acontecendo
dentro do dia e horrio planejados. O encontro de sexta durou cerca de 1h e 30
minutos e, o de sbado, 1h e 50 minutos.
7.1.3 Roteiro de perguntas
Para a dinmica da ao, elaboramos um roteiro de questes3, uma espcie
de guia, como prope Costa (2010) que serviu como auxlio e no como um manual3 Roteiro disponvel nos apndices I do trabalho.
41
de como deveria ser feito e conduzido o encontro. Por isso, era possvel que a
moderadora trocasse certas questes de ordem de acordo com a necessidade de
prolongar ou trocar o assunto.
O ritmo de questes desse documento foi elaborado com a ideia de permitir
que o tema sotaque no telejornalismo surgisse voluntariamente. Os tpicos que
abriram o debate permitiam que cada participante interagisse comentando sobre
qualquer detalhe captado e, no fim, as perguntas, mais estruturadas, j previam
certos rumos de respostas. Costa (2010) lembra que a sequncia das perguntas
tambm um diferencial para o andamento do grupo focal. Optamos pelo uso de
perguntas abertas, j que possibilita a apario das contestaes e dos
entendimentos. Se a ideia preservar o debate natural, outra vantagem desse tipo
de pergunta o surgimento de comentrios diferentes dos que eram esperados.
Cada sesso foi dividida em dois momentos: o de exibio e debate sobre os
vdeos e o de preenchimento dos questionrios finais. Na primeira parte, exibimos
reportagens e cabeas4 de jornais da Rede Globo e, em seguida, pedamos para os
participantes fizessem comentrios sobre o vdeo assistido. Por mais que a
moderadora incitasse um assunto, a ideia era, a todo momento, preservar o debate
natural e espontneo. Depois, entregamos os questionrios sociodemogrficos5 e
algumas perguntas escritas6 para as consideraes finais.
7.1.4 Primeira etapa: os vdeos
Decidimos que, para garantir o compartilhamento de opinies, exibiramos
algumas reportagens antes de propor um assunto. No queramos que os membros
presentes se sentissem pressionados a ter que comentar e sim que, da maneira
mais espontnea possvel, eles argumentassem sobre o que fora visto no vdeo.
Alm disso, a ideia era analisar o que o telespectador nota ao assistir aos
jornais de TV. Trazer vdeos para introduzir o assunto era, no fim, uma forma de
simular uma situao em que eles estivessem assistindo juntos e comentando o que
notaram. Em outras palavras, o objetivo ao exibir o material era trazer para o grupo
4 Texto lido pelo ncora no incio da reportagem.5 Questionrio sociodemogrfico disponvel nos apndices II do trabalho.6 Documento de perguntas escritas disponvel nos apndices III do trabalho.
42
focal o cenrio da sala de estar dos participantes, tirando do roteiro de perguntas o
peso da seriedade e tornando o debate natural.
Ao total, montamos uma lista com sete vdeos e um udio. Todo o material
possua relao com o roteiro de perguntas, mesmo que, muitas vezes, o vdeo
encaminhasse os participantes para tpicos diferentes do que espervamos. Cada
um possua um diferente foco para o debate.
Contamos com a participao do telespectador desde o inicio. Para chegar
nessa lista, passamos duas semanas anotando nomes de reprteres com sotaque,
indicados por conhecidos que assistiam aos jornais:
Tomada 01: Composto por quatro trechos de ncoras de jornais locais da
Rede Globo, o NETV 1 edio, o JPB 2 edio, o Bom Dia DF e o Bom Dia
PA. Durao de 01:16''.
Figura 3 Trechos dos ncoras da tomada 01.
Fonte: Youtube (NETV7, JPB8, BOM DIA DF9, BOM DIA PA10)
Tomada 02: Dois trechos de reportagens dos jornais exibidos para todo o
Brasil, o Jornal Hoje e o Jornal Nacional. Durao de 00:41''.
7 Disponvel em: Acessado em 30 de out. de2014.
8 Disponvel em: Acessado em 30 de out. de2014.
9 Disponvel em: Acessado em 30 de out. de2014.
10 Disponvel em: Acessado em 30 de out. de2014.
43
Figura 4 Trechos dos reprteres da tomada 02.
Fonte: Youtube (Jornal Hoje11, Jornal Nacional12)
Tomada 03: Reportagem do JPB 1 edio sobre a Miss Paraba. Durao de
02:41''.
Figura 5 Apresentadora, reprter e entrevistada da reportagem da tomada 03.
Fonte: Youtube13
Tomada 04: Trecho de reportagem do Jornal Hoje, da coluna T de folga,
sobre a ilha de Itamarac PE. Em seguida, dois udios gravados com um
reprter nordestino, um com e o outro sem a neutralizao do sotaque.
Durao de 00:44''.
11 Disponvel em Acessado em 30 de outubro de2014.
12 Disponvel em Acesso em 30 de out. de2014.
13 Disponvel em Acessado em 30 de out. de2014.
44
Figura 6 Reprter nordestino para o Jornal Hoje da tomada 04.
Fonte: Portal do Jornal Hoje14
Tomada 05: ncoras do Jornal Hoje em trecho da chamada para o quadro
Sotaques do Brasil. Durao de 00:16''.
Figura 7 Chamada para a srie especial da tomada 05.
Fonte: Portal do Jornal Hoje15
Tomada 06: Trechos de reportagens para o Jornal Nacional e para o DFTV 1
edio, com reprteres da Globo Braslia. Durao de 00:41''.
Figura 8 Reprteres de outras regies do Brasil que trabalham na Globo Braslia da tomada 06.
Fonte: Youtube16 e site do DFTV 1 edio17
14 Disponvel em Acessado em 30 deout. de 2014.
15 Disponvel em Acessado em 30 de out. de 2014.
16 Disponvel em Acesso em 30 de out. de 2014.
45
Tomada 07: Trechos de reportagens do DFTV 1 edio com dois reprteres
nascidos em Braslia e dois de outras regies. Durao de 01:10''.
Figura 9 - Reprteres de Braslia e de outras regies nos jornais locais da capital da tomada 07.
Fonte: Portal do DFTV 1 edio18 19 20 e Bom Dia DF21
7.1.6 Segunda etapa: documentos finais
Aps o debate, distribumos dois documentos para serem preenchidos pelos
participantes. Um deles era a pesquisa sociodemogrfica, responsvel por nos
ajudar a entender qual era a realidade dos presentes nos grupos focais. A partir dele
pudemos, por exemplo, traar o perfil completo dos membros.
Tambm optamos por distribuir um questionrio no final do evento. Essa
deciso se justifica por vrios fatores, os mais importantes:
a) no revelar pelo questionrio o tema do grupo focal, caso ele fosse
entregue no incio do encontro;
17 Disponvel em Acessado em 30 de out. de2014.
18 Disponvel em Acesso em 30 de out. de2014.
19 Disponvel em Acesso em 30 de out. de 2014.
20 Disponvel em Acesso em 30 de out. de2014.
21 Disponvel em Acesso em 30 de out. de 2014.
46
b) obter dois tipos de vises sobre o tema: uma com os vdeos e debate e
outra no fim da dinmica.
c) como o sotaque no jornalismo e o preconceito lingustico no so temas
muito debatidos, os participantes poderiam escrever o que, talvez, eles no tivessem
compartilhado ao assistir os vdeos.
7.1.7 Registros do evento
Entre as vrias maneiras existentes para registrar as interaes, escolhemos
a presena de quatro documentadores e a gravao de vdeo do encontro com uma
cmera digital. Os documentadores estavam posicionados de forma a poder
observar todos os membros da sala. Alm disso, cada um estava responsvel por
escrever numa tabela22 o que eles reparavam em cada fala e atitude dos
participantes.
Essa escolha foi baseada no que diz Maria Eugnia (2010), que, quando os
documentadores escolhidos no sabem como funciona um grupo focal, o
recomendado que se defina um nmero maior de pessoas nessa funo. Sobre o
registro digital, Gatti explica a preferncia pelo registro do udio e no da imagem:H depoimentos de pesquisadores experientes sobre o trabalho comgrupo focais, segundo os quais as pessoas tendem a se sentir mais vontade com a gravao em udio do que em vdeo. Neste, h umaexposio por inteiro, rostos, gestos, palavras esto l, associados. Aquesto da prpria imagem, da exposio dos participantes, dosriscos de ruptura da confidencialidade, cria certo desconforto (GATTI,2005, p. 26).
Notamos que nenhum dos presentes mostrou-se constrangido ou
desestimulado a falar por conta da tecnologia. No discurso inicial feito pela
moderadora, deixou-se claro a gravao do encontro por meio de uma cmera no
canto da sala e o estabelecimento de critrios de confidencialidade. Esse foi
mantido, por exemplo, pelo sigilo dos nomes dos participantes durante todas as
sesses. Ao chegar, cada pessoa recebeu um nmero e assim foi identificada at o
final do GF.
7.2. Anlise dos dados
22 Tabela dos observadores disponvel nos apndices IV do trabalho.
47
7.2.1 Questionrios socioeconmicos
Atravs do questionrio socioeconmico, podemos traar detalhes dos perfis
dos que estavam presentes nos grupos focais. O cruzamento de algumas dessas
informaes com as respostas durante o GF so importantes para entendermos, por
exemplo, em qual contexto social o participante est inserido:
1. Idade:Figura 10 Relao de gnero e idade dos participantes.
GF I GF II
Fonte: elaborao da autora
2. Escolaridade:Figura 11 Grfico de nvel de escolaridade dos participantes
GF I GFII
48
Fonte: elaborao da autora
3. Profisso:
Quadro 1 rea profissional dos participantes do GF I.
P.1, P.2, P.3, P.4,P.5 e P.6
Estudantes
Fonte: elaborao da autora
Quadro 2 rea profissional dos participantes do GF II.
P.1 Funcionrio pblicoP.2 Auxiliar de servios geraisP.3 CozinheiraP.4 (em branco)P.5 BabP.6 Empregado domsticoP.7 Empregada domsticaP.8 DelegadaP.9 Recepcionista
P.10 Servidor pblicoP.11 Servidora pblica
Fonte: elaborao da autora
4. Estado civil:
De todos os integrantes do grupo focal I (GF), somente um no era solteiro.
J o GF II apresentava pessoas em estados civis diferentes: no total, eram dois
49
solteiros, dois divorciados, seis casados e um integrante do grupo se incluiu na
opo Outro.
5. Naturalidade dos participantes, de seus pais e o local de residncia:
Dos seis integrantes do primeiro grupo focal, cinco nasceram no DF e um
nasceu no Rio Grande do Sul. Deles, todos moram em Braslia, exceto um que vive
no Gama. Novamente, o GF II apresenta grandes diferenas: trs nasceram no DF,
trs vieram do Cear, dois da Paraba, um da Bahia, um do Rio de Janeiro e um de
Minas Gerais. J seis dos entrevistados vivem em Braslia e os outros nas regies
administrativas de guas Claras, de Sobradinho, de Ceilndia e de guas Lindas de
Gois. Um no respondeu.
Em relao aos pais dos participantes de ambos os grupos focais, todos,
exceto dois, so de fora de Braslia. A maioria veio do Cear, Paraba, Minas Gerais
e Goinia.
6. Aparelhos eletrnicos:
J no quesito de aparelhos de comunicao, o nmero final de eletrnicos do
GF I: 24 televises, 10 rdios, 17 computadores e 26 celulares. No GF II, um total de
30 televises, 18 rdios, 22 computadores e 36 celulares.
Todos os integrantes do GF I possuam, em suas residncias, televiso a
cabo e Internet. Somente trs dos integrantes assistiam aos jornais locais da Rede
Globo, entre eles o DFTV 2 edio e o Bom Dia DF. Uma pessoa afirmou no
assistir a programao da Rede Globo, mas de outras emissoras.
Oito integrantes do Grupo Focal II possuam televiso a cabo e dez tm
acesso Internet. A grande maioria do segundo grupo, alm de preferir a Rede
Globo, assistiam ao DFTV 1 e 2 edio.
7.2.2 Ouvindo o telespectador
Tpico 1:
Exibimos quatro trechos de cabeas de jornais locais da Rede Globo com
ncoras com sotaques da regio Nordeste, do Norte e do Sul. Em seguida,
perguntamos o que os participantes notaram no vdeo:
50
GF I: Na primeira chamada eu achei que a moa falou muito rpido. P.1
GF II: Eles do muita pausa, no sei se pra gente entender melhor a
reportagem. P.6A inflexo da voz quando eles querem pegar pontos. A inflexo (da voz) na
palavra-chave da chamada. P.8.
Quando decidimos abrir o debate com essa pergunta, sabamos que, por ela
permitir uma amplitude de comentrios, qualquer resposta poderia aparecer. Talvez
os figurinos, a maquiagem ou at mesmo a beleza dos jornalistas poderia ser o
destaque dos grupos. Para a nossa surpresa, a narrao dos jornalistas foi o ponto
mencionado.
Assim que os P.6 e P.8, do GF II, fizeram os seguintes comentrios, um dos
documentadores anotou: Todos concordam com um balanar de cabea, mas no
dizem nada. claro que precisamos lembrar que, por ser o primeiro tpico, poucos
quiseram participar, mas podemos concluir que todos repararam no jeito de narrar
dos jornalistas, mas no fizeram comentrios sobre o sotaque.
Por mais que todos os participantes do primeiro GF tambm no tenham
mencionado a captao do sotaque, percebemos, pelo comentrio acima, que a
variedade regional da fala foi reparada, mesmo que s pela alegao do uso de um
ritmo diferente.
Outro detalhe que refora essa constatao o fato de que os quatro
documentadores, do primeiro grupo focal, registraram que, assim que a primeira
ncora apareceu com o sotaque paraibano, trs participantes deram risadas
disfaradas. Nesse momento, nenhum deles comentou sobre a variedade, mas, no
desenvolver do debate, eles citaram como exemplo o sotaque da jornalista dessa
primeira tomada.
Tpico 2:
Na tomada 2, mostramos dois reprteres com sotaque, uma carioca e um
amapaense. Ambos tm, como forte caracterstica regional, um destaque no
51
fonema /s/. Popularmente falando, os jornalistas falam as palavras com o s chiado.
Perguntamos qual das reportagens chamava mais ateno e, se a fala do jornalista
no era destacada, questionamos o que eles achavam da narrativa dos
profissionais.
GF I:Ela (a reprter carioca) chamou mais ateno porque o sotaque dela muito
forte. Me incomodou o fato dela (reprter) ser jornalista e ter sotaque. P.1Parece que o reprter est afobado. P.6O sotaque muito forte, o 's'. E muitas vezes eu, pelo menos, no presto
ateno no que eles falam s para reparar no sotaque. P.3
GF II:Ele fala to rpido que se voc no tiver prestando ateno, voc no vai
entender nada. Eu no entendi nada. P.6 Desde a roupa at o modo dele (o reprter) falar, ele parecia um amador, um
estagirio. Ele (reprter) tem um sotaque muito pronunciado regional e o jornalista
no pode chamar mais ateno que a matria. P.8No GF I, assim que acabou a exibio do vdeo, os participantes j
comentaram sobre o sotaque dos reprteres, antes de questionados sobre a opinio
do jeito da fala da dupla. Por mais que os dois jornalistas destacassem o s, a
maioria revelou julgar o sotaque carioca. O P.3, do primeiro grupo, alegou que no
tinha entendido o assunto da reportagem porque estava reparando no sotaque e,
assim que a moderadora perguntou com quem mais isso tinha acontecido, todos os
presentes afirmaram que passaram pela mesma situao.
J no segundo grupo focal, os membros no comentaram de incio sobre o
sotaque, muito menos relataram o emprego dele pelos jornalistas. O grupo inteiro
criticou o reprter do Amap, desde a sua vestimenta at o jeito de falar. Quando o
P.8 alegou que ele possua sotaque, a moderadora perguntou o que os participantes
achavam do outro sotaque, o da carioca. De incio, o grupo afirmou no ter
percebido que ela tinha a variante regional. Exibimos mais uma vez o trecho da
reprter e as opinies foram outras: para a maioria, o jeito de falar carioca no
chamava tanta ateno quanto o amapaense.
52
Tpico 3:
Aps o sotaque aparecer nos comentrios dos participantes, exibimos uma
reportagem de um jornal local da Paraba sobre a Miss Paraba. A ncora do jornal e
a reprter possuam o sotaque neutralizado, nem mesmo amenizado, e a
entrevistada sim. Questionamos se eles repararam na forma de falar das mulheres
do vdeo e o que eles achavam, caso tivessem notado algo de diferente entre as
trs.
GF I:Eu acho que o jornal tem que ter uma forma mais clara de falar. E o sotaque,
muitas vezes, pode atrapalhar. Tem que tirar o mximo do sotaque para ter o melhor
entendimento. O jornalista no pode ter sotaque, mas o entrevistado no tem
problema.P.1 Engraado que s a entrevistada tinha sotaque. Se eu fosse paraibana, eu ia
me incomodar de assistir um jornal local sem o sotaque do meu estado. Pra mim,
que sou de Braslia, causa estranheza, mas pro povo de l deve ser normal. Isso,
por exemplo, me faz mudar de canal. Me incomoda. P.3
GF I