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Thales Augusto Mairesse Silva
RA: 064661
O Som de J.T. Meirelles: Transcrio e
Anlise dos Solos
Projeto Final de Graduao (MU999A) apresentado
Universidade Estadual de Campinas UNICAMP,
como parte dos pr-requisitos necessrios para a
obteno do ttulo de Bacharel em Msica Popular.
Orientador: Prof. Dr. Rafael dos Santos
Campinas
2011
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2
Resumo
Este trabalho tem como objetivo, analisar as transcries dos
solos
improvisados pelo saxofonista J.T. Meirelles no disco "O Som",
gravado em 1964, e
a partir destas anlises, mapear e classificar os elementos
meldicos recorrentes.
Palavras-chave: J.T, Meirelles, O Som, Improvisao,
Samba-jazz.
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3
SUMRIO
Introduo
...............................................................................................................................................
4
1. Biografia
.............................................................................................................................................
5
2. Transcries e Anlises
...................................................................................................................
8
2.1. Elementos Recorrentes
...........................................................................................................
9
2.1.1. Sequncia
...........................................................................................................................
9
2.1.2. Repetio
..........................................................................................................................
12
2.1.3. Padro Escalar e de Digitao
......................................................................................
13
2.1.4. Arpejos
..............................................................................................................................
15
2.1.5. Escalas
Pentatnicas......................................................................................................
18
2.1.6. Cromatismos
....................................................................................................................
19
2.1.7. Enclosure
..........................................................................................................................
21
2.1.8. Ornamentaes
...............................................................................................................
22
2.1.9. Quartas
.............................................................................................................................
25
3. Consideraes Finais
.....................................................................................................................26
Bibliografia
............................................................................................................................................27
Discografia
............................................................................................................................................27
Anexo Solos Transcritos e Analisados
....................................................................................
28
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4
Introduo
A finalidade do trabalho aqui apresentado a de mapear os
recursos
meldicos utilizados, no ato criativo da improvisao, pelo
saxofonista J.T. Meirelles,
tido como um dos fundadores do estilo musical que se
convencionou chamar por
samba-jazz.
Msico reverenciado, porm pouco pesquisado/estudado, Meirelles
teve, no
cenrio da msica popular brasileira, importante atuao como
instrumentista,
arranjador, compositor e produtor musical.
Aqui, o foco recai sobre os improvisos do instrumentista.
Foram ento transcritos seis solos, todos retirados do disco "O
Som" de 1964.
Atravs das anlises dessas transcries, foi possvel identificar
alguns recursos
meldicos recorrentes, que sero conceituados e exemplificados no
captulo 2.
Mas antes, no captulo 1, um breve levantamento biogrfico ser
realizado
abordando o incio de carreira, a consagrao na primeira metade da
dcada de 60
perodo em que lanou seus dois primeiros lbuns autorais , a queda
e o
ostracismo nas dcadas de 80 e 90, e a retomada da carreira nos
anos 2000.
Por ltimo, um terceiro captulo com as consideraes finais,
seguido de um
Anexo com os seis solos analisados.
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1. Biografia
Joo Theodoro Meirelles nasceu em 10 de outubro de 1940, na
capital
fluminense. Filho do primeiro flautista da Orquestra Municipal
do Rio de Janeiro, J.T.
Meirelles iniciou seus estudos musicais aos oito anos de idade1.
Aos 15, quando
tocava clarinete na banda da escola, teve o primeiro contato com
a msica de um
dos instrumentistas que lhe serviu como grande referncia: "Eu
tinha 15 anos, parei
numa loja na Galeria Cruzeiro. O disco era 'Charlie Parker with
Strings'. Fiquei em
estado de choque porque aquilo era muito novo, mas ao mesmo
tempo muito natural
para mim, sei l porque".2 Profissionalmente, j como saxofonista,
suas primeiras
atuaes foram ao lado de Joo Donato3, animando bailes de carnaval
na extinta
boate Pigalle4. Mudou-se posteriormente para So Paulo, onde
atuou ao lado do
pianista Lus Loy e como integrante da Orquestra de Sylvio
Mazzuca por trs anos.
De volta ao Rio em 1963, montou o grupo "Meirelles e Os Copa
5"5, com o qual se
apresentava no "Beco das Garrafas".6 No mesmo ano, escreveu os
arranjos para o
estreante Jorge Ben em seus dois primeiros sucessos: "Mas Que
Nada" e "Por
Causa de Voc, Menina". A bem-sucedida parceria com Jorge Ben
abriu as portas
para o primeiro trabalho autoral de J.T.: o disco "O Som" de
1964. Sobre esse
perodo, declara Meirelles:
(...) foi no finalzinho de 1963. Voltei para o Rio, formei o
Copa 5 e o
Jorge Ben nos chamou para gravar. (...) A gente j vinha tocando
essa
msica [Mas Que Nada] no Beco das Garrafas. Ele [J. Ben] j
aparecia
para dar canja e a gente j gostava da msica. Quando chegamos
no
estdio s fiz a composio dos arranjos. Gravamos o compacto, com
Mas
Que Nada e Por Causa de Voc, Menina. Devido ao sucesso
dessas
duas msicas, a gravadora acabou se interessando em fazer o LP.
(...)
1 Disponvel em: . Acesso em: 22 nov. 2011.
2 Em entrevista concedida ao jornalista Paulo Roberto Pires.
Disponvel em:
. Acesso em: 22 nov. 2011. 3 Joo Donato
(pianista/compositor/arranjador) atuando, ento, curiosamente, como
trombonista.
4 Bairro de Copacabana.
5 Inicialmente composto por J.T.Meirelles (sax tenor), Pedro
Paulo (trompete), Luiz Carlos Vinhas (piano), Dom
Um Romo (bateria), e Manoel Gusmo (baixo). 6 "Nome pelo qual
ficou conhecido o conjunto de casas noturnas, localizadas entre os
edifcios de nmeros 21 e
37 da rua Duvivier, em Copacabana (RJ), inauguradas na dcada de
1950, sendo cenrio do samba-cano.(...) No incio dos anos 1960,
tornou-se conhecido como o "Templo da bossa nova", com destaque
para as boites Baccara, e principalmente Little Club e Bottle's
Bar". Fonte:
http://www.dicionariompb.com.br/beco-das-garrafas/dados-artisticos.
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6
Perguntaram se a gente tinha material prprio e j estava tudo
ensaiado,
gravamos as msicas que a gente j tocava no Beco das Garrafas.
Foi s
marcar a gravao, mais ou menos um ms depois. (...) Participamos
nos
trs primeiros discos do Jorge Ben. Arranjei mais ou menos a
metade das
msicas dos trs.7
Aps "O Som", disco fundamental para a configurao do estilo
que
posteriormente foi chamado de samba-jazz, seguiu-se "O Novo
Som", segundo disco
de Meirelles e os Copa 5, agora com nova formao.8 Os dois discos
seguintes,
numa fase ps-ascenso, foram lanados em 1969 e 1974
"Tropical/Meirelles e Os
Copa 7" e "Brazilian Explosion", respectivamente e ao contrrio
dos anteriores,
no possuam composies prprias. Sobre este novo momento, Ruy
Castro9 d seu
parecer: "Ele [J.T.] e outros msicos de seu calibre foram vtimas
da jovem guarda,
que como todo fenmeno, altera os rumos do mercado do disco."
Entre 1965 e 2000,
Meirelles deixou de atuar como compositor, prosseguindo como
instrumentista,
produtor e arranjador.
Como arranjador e/ou produtor, constam em seu currculo trabalhos
com:
Nara Leo, Alcione, Doris Monteiro, Lisa Ono, Carmen Costa, Rosa
Maria, Silvio
Csar, Ablio Manoel, Pery Ribeiro, Ed Motta, Emlio Santiago,
Claudia, Simonal,
Gonzaguinha, Tito Madi, Jorge Ben, Gilberto Gil, Agostinho dos
Santos, Taiguara,
Orquestra Tabajara, Sexteto Radams Gnatalli, Ed Maciel, Los
Tropicanos e outros.
Trabalhou ainda como arranjador em duas edies do Festival
Internacional da
Cano, e at 1975 foi msico contratado da EMI-Odeon, onde exercia
as trs
atividades acima citadas. Em seguida, viajou para o Mxico, onde
foi contratado para
atuar com um grupo sueco, com o qual se transferiu para a
Europa, por l
permanecendo durante 3 anos.
As dcadas de 80 e 90 foram as mais difceis para Meirelles: no
ostracismo,
chegou a vender seus instrumentos em 1995 para estudar
informtica.
A participao de J.T.Meirelles na gravao da faixa "Bananeira", em
1999, a
convite de Ed Motta, para o lbum songbook de Joo Donato, e a
redescoberta do
samba-jazz por parte da mdia e da indstria fonogrfica nos anos
2000, deram novo
flego a carreira de Meirelles, culminando tanto na remasterizao
de seus dois
principais discos - "O Som" e "O Novo Som" - pela gravadora
Dubas, quanto no
7 Em entrevista concedida a Ramiro Zwetsch para o site Radiola
Urbana. Disponvel em: . Acesso: 22 nov. 2011. 8 A nova formao era:
J.T. Meirelles (flauta e sax tenor), Roberto Menescal (violo) /
Waltel Branco (guitarra),
Eumir Deodato (piano), Edison Machado (bateria), e Manoel Gusmo
(baixo). 9 Jornalista e autor do importante livro, Chega de
Saudade.
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7
lanamento, pela mesma gravadora, de dois novos lbuns com msicas
autorais "
Samba Jazz" e "Esquema Novo".
No dia 4 de Junho de 2008, Joo Theodoro Meirelles faleceu, aos
67 anos.
Discografia
(2005) Esquema novo (Meirelles e os Copa 5) Dubas Msica CD
(2002) Samba Jazz!! (Meirelles e os Copa 5) Dubas Msica CD
(1974) Brazilian explosion (Meirelles e Sua Orquestra) Odeon
LP
(1973) Golden Sounds Alvarado (Meirelles) Coronado/EMI-Odeon
(1972) Brazilian beat vol. 5 (Meirelles e Sua Orquestra)
London/Odeon
(1971) The Gimmicks of Sweden LP
(1969) Tropical (Meirelles e os Copa 7) London/Odeon
(1969) Brazilian beat vol. 4 (Meirelles e Sua Orquestra)
London/Odeon LP
(1967) Brazilian beat vol. 2 (Meirelles e Sua Orquestra)
London/Odeon
(1966) Aquele Som dos Gatos (Os Gatos) Philips LP
(1965) O novo som (Meirelles e os Copa 5) Philips/Dubas
Msica
(1964) O Som (Meirelles e os Copa 5) Philips/Dubas Msica
(1964) O LP (Os Cobras) RCA Victor LP
(1964) Os Gatos (Os Gatos) Philips LP
(1962) Joo & His Bossa Kings - Cool samba (JT Meirelles)
Battle (EUA) LP
Influncias
Constam como principais influncias de J.T. Meirelles, os
saxofonistas:
Charlie Parker, Sonny Rollins, John Coltrane, Paul Desmond e
Stan Getz.
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8
2. Transcries e Anlises
Para este trabalho foram transcritos e analisados os solos
improvisados por
J.T.Meirelles no disco O Som de 1964. Seguindo o formato
"tema-improvisao-
tema", prtica comum no jazz e que foi absorvida pelos
instrumentistas brasileiros,
cada uma das seis faixas gravadas10 contam com sesses de
improvisao, onde se
encontram os solos analisados.
Por ter sido Meirelles um msico que, declaradamente, teve sua
formao
musical pautada pelo jazz11, foi utilizado para as anlises
material bibliogrfico
proveniente de autores que buscaram, para fins didticos,
metodizar/organizar os
recursos empregados pelos msicos de jazz no decorrer da histria
do gnero.
Trata-se de obras como: How To Improvise: an approach to
practicing
improvisation, de Hal Crook12; Elements of the Jazz Language for
the developing
improviser, de Jerry Coker13; How to Play Bebop Vol. 1, de David
Baker14; e
Bebop Jazz Piano, de John Valerio15. Estas obras foram
importantes para a
conceituao de alguns dos elementos encontrados nas anlises, tais
como:
Sequncias, Ornamentos, Arpejos, Cromatismos, Escalas Pentatnicas
e Bebop,
Padro Escalar e Padro de Digitao. As definies de outros dois
elementos
tambm analisados, como Repetio e intervalos de quarta para a
construo
meldica, esto apoiadas, respectivamente, nas obras de autores
como
Lawn/Hellmer16 e Ricker17, e foram acessadas indiretamente
atravs de Silva
(2009)18. Em Elementos Recorrentes, encontram-se conceituados os
recursos
musicais que mais aparecem no decorrer dos solos, e exemplos de
como Meirelles
os emprega.
10
Quintessncia, Solitude, Blue Bottle's, Nordeste, Contemplao e
Tnia, todas autorais. 11
Em entrevista dada a revista Jazz+ em julho de 2003, responde
Meirelles pergunta sobre suas influncias: "(...) minha formao foi
no jazz. Eu tinha 23 anos, vivia jazz, ouvia o tempo inteiro o jazz
americano". 12
CROOK, Hal. How To Improvise: an approach to practicing
improvisation. Rottenburg: Advanced Music, 1991. 13
COKER, Jerry. Elements of the Jazz Language for the developing
improviser. Miami: Warner Bros. Pubilcations, 1991. 14
BAKER, David. How to Play Bebop Volume 1: The Bebop Scale and
Other Scales in Common Use. Bloomington: Alfred Publishing Company,
1985. 15
VALERIO, John. Bebop Jazz Piano. Milwaukee: Hal Leonard
Corporation, 2003. 16
LAWN, Richard J.; HELLMER, Jeffrey L. Jazz Theory and Practice.
Los Angeles: Alfred Publishing Company, 1993. 17
RICKER, Ramon. Technique Development in Fourths for Jazz
Improvisation. Los Angeles: Alfred Publishing Company, 1976. 18
SILVA, Raphael Ferreira da. A construo do estilo de improvisao
de Vincius Dorin. Dissertao de Mestrado apresentada Instituto de
Artes da UNICAMP, Campinas, 2009.
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9
2.1. Elementos Recorrentes
2.1.1. Sequncia
Sequncia uma das formas de se desenvolver um motivo19.
Ocorre,
segundo Crook (1991), quando um ou mais elementos musicais de um
motivo so
os mesmos, ou similares, ao do motivo anterior, conferindo
continuidade20. Uma
sequncia pode ser:
1) rtmica: quando se repete (de forma exata ou com alguma
variao) a
estrutura rtmica da unidade meldica precedente.
2) meldica: quando se conservam (de forma exata ou com alguma
variao)
as relaes intervalares das notas, ou a curva meldica, do
motivo
precedente.
3) meldica e rtmica: quando se conservam (de forma exata ou com
alguma
variao), tanto a estrutura rtmica quanto as relaes intervalares,
ou
curva meldica, do motivo precedente.21
Crook, assim como outros autores, refere-se a essas
transformaes
meldicas e/ou rtmicas como Variaes (VA), que podem vir
precedidas ou
sucedidas por um novo material meldico, chamado de Extenso
(EX).
A seguir, alguns exemplos do uso de sequncias por
J.T.Meirelles.
Exemplo 1: Sequncias
a) Quintessncia, compassos 6 ao 11:
b) Quintessncia, compassos 24 ao 28: 19
Segundo Kostka (2004), "um motivo a menor ideia musical
identificvel. Um motivo pode consistir de um modelo meldico,
rtmico, ou ambos". 20
"Continuidade A relao entre duas ou mais ideias, ou, o resultado
de ideias que possuem ao menos um elemento musical em comum, como o
mesmo ritmo, ou notas da melodia, ou curva meldica. Por ex.: quando
dois motivos tem em comum o mesmo (ou similar) ritmo, a
continuidade criada pelo ritmo." (CROOK, 1991, p. 86). 21
Nota: vale observar que quando uma sequncia rtmica e meldica
d-se de forma exata, o resultado equivale a uma transposio.
-
10
c) Quintessncia, compasso 29:
d) Solitude, compassos 5 ao 8:
e) Solitude, compassos 21 ao 22:
f) Solitude, compassos 29 ao 32:
g) Blue Bottle's, compasso 5:
h) Blue Bottle's, compassos 13 ao 14:
-
11
i) Nordeste, compassos 5 ao 7:
j) Nordeste, compassos 8 ao 10, e 11 ao 12:
k) Nordeste, compasso 17:
l) Nordeste, compasso 28 ao 31:
m) Tnia, compassos 10 ao 12:
n) Tnia, compassos 19 ao 21:
-
12
o) Tnia, compassos 53 ao 54:
Ainda podem ser encontrados outros exemplos em Nordeste
compassos 23
ao 25 - , em Contemplao compassos 1-7, 8-10, 10-13, 14-16, 18-22
e em
Tnia - compassos 2-4, 14-16, 32-35, 36-39, 39-41 e 43-46.
2.1.2. Repetio
a repetio exata de um motivo. Segundo Lawn/Hellmer (1993), apud
Silva
(2009, p. 64), "a repetio fornece continuidade a uma melodia,
alm de propiciar ao
ouvinte uma oportunidade de antecipar o prximo acontecimento
musical". Este
efeito da repetio sobre o ouvinte pode-se estender ao elemento
anteriormente
visto, a sequncia, por igualmente fornecer a ideia de
continuidade.
A seguir, os exemplos do uso de repeties por J.T.Meirelles.
Exemplo 2: Repetio
a) Quintessncia, compassos 1 ao 4:
b) Quintessncia, compassos 10 ao 11:
-
13
c) Quintessncia, compassos 26 ao 27:
d) Blue Bottle's, compassos 14 ao 16:
e) Nordeste, compassos 13 ao 14:
f) Tnia, compassos 49 ao 50, e 52:
2.1.3. Padro Escalar e de Digitao
De acordo com Coker (1991, p. 8), padres escalares so padres
meldicos
construdos com as notas de uma nica escala, podendo, s vezes,
conter algum
cromatismo ou nota no-diatnica. So geralmente usados para
acordes de longa
durao (dois ou mais compassos), ou em progresses do tipo II-V-I,
onde a escala
referente a I empregada para acomodar os trs acordes22. So, ou
podem ser, do
tipo non-terminal23.
J os padres de digitao so clulas de 4 a 8 notas estruturadas de
acordo
com o valor numrico de cada nota tendo como referncia a tnica
do
22
Em uma progresso do tipo II-V-I em C maior seria empregada, por
exemplo, a escala de C maior; em C menor, a escala seria C menor
harmnica, 23
Termo dado aos padres escalares que podem ser tocados de forma
contnua "perptua", como o padro da escala em teras: em C maior:
C-E-D-F-E-G-F-A-G-B-A-C-B-C-E-D-F etc...
-
14
acorde/escala.24 Assim, num padro do tipo 1-2-3-5, 1 seria a
tnica, 2 o segundo
grau da escala (ou a 9 do acorde), 3 o terceiro grau da escala
(ou 3 do acorde), e
assim por diante. Um mesmo padro pode ainda ser tocado de forma
reversa (5-3-2-
1, baseando-se no exemplo acima fornecido), e adaptado para que
"se encaixe"
dentro de outros tipos de acorde (ex: 1-3-5-3 para acordes
maiores, e 1-b3-5-b3
para acordes menores). Segundo Crook (1991, p. 67), esses padres
so
frequentemente usado como pontos de partida (send-off) para uma
nova frase
meldica.
Embora no se possa afirmar que J.T.Mereilles fizesse uso deste
recurso em
seus improvisos, foram encontrados, a partir das anlises feitas,
fragmentos
meldicos que esto de acordo com as definies dadas por Coker.
A seguir, alguns exemplos de padres escalares e de digitao
encontrados
nos de Meirelles.
Exemplo 3: Padro Escalar e Padro de Digitao
a) Solitude, compasso 8:
b) Tnia, compasso 6:
c) Tnia, compassos 50 ao 51:
24
Id. ibid.
-
15
d) Solitude, compassos 21 ao 22:
e) Nordeste, compasso 1 e 3 ao 4:
2.1.4. Arpejos
Um arpejo uma srie de saltos entre notas de um acorde em uma
mesma
direo25, e frequentemente, segundo Valerio (2003, p. 35), est
precedido por um
prefixo uma nota meio-tom ou um tom abaixo ou acima da primeira
nota do arpejo.
So utilizados geralmente de trs formas:
1) Arpejando-se o acorde do momento, com o objetivo de delinear
a
harmonia.
2) Arpejando-se uma trade/ttrade que contenha as tenses
permitidas do
acorde do momento.26 Ex: uma trade de D arpejada sobre o acorde
C7M,
adicionando-se a este as tenses: 9 (D), #11 (F#) e 6 (A).
3) Arpejando-se uma trade/ttrade com notas estranhas harmonia,
com o
objetivo de se tocar outside27.
O emprego de arpejos pelo improvisador propicia ainda a
possibilidade de se
criar linhas meldicas angulosas, com muitos saltos e que podem
cobrir uma grande
extenso.28
25
PANKHURST, Tom. ShenkerGUIDE: a brief handbook and website for
Schenkerian analysis. Nova York: Routledge, 2008. 26
Para maiores informaes sobre as tenses ditas permitidas,
conferir Crook (1991, p. 55). 27
Quando se toca deliberadamente fora do tom, com o objetivo de
criar tenso. 28
Crook (1991, p. 72 e 78).
-
16
Nas anlises foi possvel verificar que Meirelles, em alguns
momentos, arpeja
acordes diminutos sobre acordes dominantes, o que resulta na
apario da tenso
b9, como mostra os exemplos (e) e (f). Ainda no exemplo (f),
verifica-se a
sobreposio de uma ttrade arpejada de Bb7M sobre um acorde
Em7(b5),
resultando nas aparies das tenses b9 e 11. Outro caso de
sobreposio
acontece no exemplo (g), onde a fundamental da ttrade arpejada,
Cm7, a 13 do
acorde do momento, Eb7. Foi possvel tambm observar arpejos
prefixados por
ornamentos, como mostram os exemplos (h) e (i).
A seguir, os exemplos de arpejos nos solos de J.T.Meirelles:
Exemplo 4: Arpejos
a) Blue Bottle's, compasso 25:
b) Nordeste, compassos 28 ao 31:
c) Tnia, compassos 25 ao 27:
d) Tnia, compassos 53 ao 54:
e) Solitude, compasso 19:
-
17
f) Quintessncia, compassos 24 ao 25:
g) Quintessncia, compasso 14:
h) Quintessncia, compasso 13:
i) Solitude, compasso 23:
Outros exemplos de arpejos nos solos de Meirelles podem ser
encontrados
em: Quintessncia, compassos 22, 26 e 27; Solitude, compassos 25
ao 27; Blue
Bottle's, compassos 8 e 37; Nordeste, compassos 28 ao 31; e
Tnia, compassos 3,
7, 14, 33, 43 e 44.
-
18
2.1.5. Escalas Pentatnicas
Segundo Crook (1991, p. 108), so escalas constitudas de cinco
notas,
sendo a mais comum a pentatnica maior, construda com os graus I,
II, III, V, e VI
da escala maior.29 J a pentatnica menor pode ser formada com os
graus I, bIII, IV,
V e bVI, ainda tendo-se como referncia e escala maior.30
Se o uso exclusivo de arpejos implica em linhas meldicas
angulares, por s
conterem saltos (leaps)31, as linhas meldicas improvisadas com
pentatnicas, por
sua vez, so mais equilibradas pois permitem tanto o movimento
meldico por grau
conjunto, quanto por uma grande variedade de intervalos, com a
facilidade de conter
apenas cinco notas.
A tabela abaixo, retirada de Crook (1991. p. 109), esclarece
essa situao.
Tabela 1
A seguir, os exemplos de pentatnicas encontradas nos solos de
Meirelles:
Exemplo 5: Pentatnicas
29
A escala pentatnica de C seria ento: C-D-E-G-A. 30
A escala pentatnica da C seria ento: C-Eb-F-G-Bb. 31
Qualquer intervalo meldico superior a uma 2 maior.
-
19
a) Nordeste, compassos 5 ao 7:
b) Nordeste, compassos 15 ao 16:
c) Nordeste, compassos 33 ao 34:
d) Tnia, compassos 28 e 29:
2.1.6. Cromatismos
Segundo Coker (1991, p. 81), em uma linha improvisada, notas
cromticas
so geralmente acrescentadas para que a frase se ajuste ao nmero
de tempos de
um compasso. Cromatismos tambm podem aparecer num solo como
consequncia
do uso da escala cromtica, ou de uma poro dela.
Nos solos analisados foram encontrados cromatismos lineares e
no-lineares,
sendo que estes, se apresentam de duas formas: 1) tocando-se
sequencialmente
meio-tom abaixo grupos de duas notas, conservando-se o intervalo
entre elas, como
nos exemplos (b) e (c) ; 2) reduzindo-se gradualmente em
meio-tom o intervalo entre
duas notas at que estas convirjam para um mesmo ponto, como no
exemplo (f).
Exemplo 6: Cromatismos linear e no-linear:
-
20
a) Quintessncia, compasso 5:
b) Quintessncia, compassos 22 (linear), e 23-24 (no-linear):
c) Solitude, compassos 27 e 28 (no-linear):
d) Blue Bottle's, compasso 3 (linear):
e) Tnia, compasso 7 (linear):
f) Tnia, compasso 42 (no-linear):
-
21
Ainda h a ocorrncia de cromatismos em: Quintessncia, compasso
16;
Solitude, compassos 18, e 29 ao 32; e Nordeste, compasso 26.
2.1.7. Enclosure
De acordo com Coker (1991, p. 50), enclosure um artifcio meldico
em que
uma nota alvo alcanada atravs (precedida) de duas notas
vizinhas: a primeira
meio-tom acima, e a segunda, meio-tom abaixo. Pode-se, ainda,
acrescentar notas
ornamentais ao enclosure, como nos exemplos (c) e (d).
A seguir, os exemplos de enclosure nos solos de
J.T.Meirelles:
Exemplo 7: Enclosure
a) Quintessncia, compasso 21:
b) Solitude, compassos 13-14:
c) Solitude, compasso 23:
d) Blue Bottle's, compasso 4:
-
22
e) Nordeste, compasso 21:
2.1.8. Ornamentaes
Nota-se nos solos de Meirelles um intenso uso de ornamentaes,
como : i)
aproximaes: semelhante ao enclosure (cf. 2.1.7), porm, uma das
notas vizinhas,
ou ambas, pode estar a um tom da nota alvo; ii) bordaduras
simples [b]: quando uma
nota meldica ou seja, uma nota diatnica ou cromtica no
pertencente ao
acorde aparece acima ou abaixo da nota principal (Kostka, 2004),
ou ainda,
segundo Almada32: "caso especial de nota de passagem, diferindo
desta apenas
pelo fato de retornar mesma nota que a preparou"; iii) mordentes
e mordentes
invertidos; iv) turns: segundo Valerio (2003, p. 42), uma
combinao de um
mordente inferior e um superior, ou vice-versa, podendo esse
conjunto de notas
ornamentais ser tocado ante ou aps a nota principal33; v)
ornamentos diversos
como os propostos por Valerio34 (2003, p. 42 e 43), ou ento,
grupos de notas que
embora no se encaixem em alguma das classificaes acima, esto
enfeitando
uma nota principal.
A seguir, os exemplos de ornamentao nos solos de
J.T.Meirelles:
Exemplo 8: Ornamentaes
a) Quintessncia, compasso 13: (i)
b) Blue Bottle's, compasso 32: (i)
32
ALMADA, Carlos. Arranjo. Campinas: Ed. da UNICAMP, 2000. p. 138.
33
Equivalente a um grupetto. 34
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23
c) Nordeste, compasso 20: (i)
d) Tnia, compasso 5: (i)
e) Tnia, compasso 48: (i)
f) Solitude, compassos 9,10, 12, 13 e 14: (ii) (iii) e (v)
g) Blue Bottle's, compassos 1 e 2: (iii)
h) Nordeste, compassos 5 e 6: (iii)
-
24
f) Tnia, compasso 23: (iii)
g) Tnia, compasso 29: (iii)
h) Solitude, compasso 25: (iv)
i) Blue Bottle's, compasso 9: (iv)
j) Contemplao, compasso 10 (iv)
Ainda possvel encontrar outros exemplos em: Quintessncia,
compassos 7,
15, 16, 18, 22; Solitude, compassos 18, 24 ao 25, 27, 34 e 35;
Contemplao,
compassos 11, 12 e 22; e Tnia, compassos 7 e 43.
-
25
2.1.9. Quartas
Conforme Silva (2009, p. 68), o uso de intervalo de quarta,
tanto no aspecto
harmnico quanto no aspecto meldico, remete a uma negao harmonia
tonal.
Em Contemplao, um tema modal, Meirelles emprega
essencialmente
intervalos de quarta nos compassos 1 ao 10. Ainda h ocorrncias
desse intervalo
nos compassos 19 e 21, como mostra o exemplo abaixo. Notar ainda
o uso regular
de sequncias durante todo o solo.
Exemplo 9: Quartas
a) Contemplao, compassos 1 ao 10, 19 e 21:
Em Anexo so oferecidas as seis transcries dos solos improvisados
de
J.T.Meirelles na ntegra.
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26
3. Consideraes Finais
Inicialmente, fez-se um breve levantamento biogrfico sobre os
momentos
mais importantes da carreira do saxofonista J.T.Meirelles; sua
atuao como
instrumentista, compositor, arranjador e produtor; sua ascenso
entre os anos de
1963 com a participao bem-sucedida nas msicas "Mas Que Nada" e
"Por
Causa de Voc, Menina", de Jorge Bem, e que abriu as portas, em
1964, para o
disco autoral "O Som", tido como fundamental para o samba-jazz e
1965, ano em
que gravou o seu segundo disco autoral, "O Novo Som".
Posteriormente, fez-se uma definio terica dos elementos musicais
mais
encontrados nos seis solos improvisados por Meirelles em "O
Som", como:
sequncias, repeties, padres escalar e de digitao, arpejos,
escalas
pentatnicas, cromatismos, enclosure, ornamentaes e uso do
intervalo de quarta
para construo de melodias, sendo possvel constatar que: J.T.
Meirelles faz amplo
uso de sequncias rtmicas e meldicas o que demonstra sua
capacidade de (e
sua predileo por) desenvolver as prprias ideias e explorar
motivos [os solos em
Quintessncia, Nordeste, Contemplao e Tnia so bons exemplos neste
caso] e
de ornamentos diversos criando linhas intrincadas como as de
Solitude. Por fim:
espero com os exemplos fornecidos ter contribudo de alguma forma
para a
definio do estilo de improvisao de J.T. Meirelles.
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Bibliografia
ALMADA, Carlos. Arranjo. Campinas: Ed. da UNICAMP, 2000.
BAKER, David. How to Play Bebop Volume 1: The Bebop Scale and
Other Scales
in Common Use. Bloomington: Alfred Publishing Company, 1985.
COKER, Jerry. Elements of the Jazz Language for the developing
improviser. Miami:
Warner Bros. Pubilcations, 1991.
CROOK, Hal. How To Improvise: an approach to practicing
improvisation.
Rottenburg: Advanced Music, 1991.
PANKHURST, Tom. ShenkerGUIDE: a brief handbook and website for
Schenkerian
analysis. Nova York: Routledge, 2008.
SILVA, Raphael Ferreira da. A construo do estilo de improvisao
de Vincius
Dorin. Dissertao de Mestrado apresentada Instituto de Artes da
UNICAMP,
Campinas, 2009.
VALERIO, John. Bebop Jazz Piano. Milwaukee: Hal Leonard
Corporation, 2003.
Discografia
O Som. Meirelles e Os Copa 5. Dubas, 2001.
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Anexo Solos Transcritos e Analisados
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