MARCEL ANICETO O REAL TORNA-SE O IDEAL Um estudo sobre a edição fotográfica nas páginas de uma revista masculina. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Escola de Comunicações e Artes Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo Curso de Especialização em Publicidade e Mercado: Poéticas Visuais São Paulo, 2005
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MARCEL ANICETO
O REAL TORNA-SE O IDEAL Um estudo sobre a edição fotográfica nas páginas de uma revista masculina.
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Escola de Comunicações e Artes
Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo Curso de Especialização em Publicidade e Mercado: Poéticas Visuais
São Paulo, 2005
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MARCEL ANICETO
O REAL TORNA-SE O IDEAL Um estudo sobre a edição fotográfica nas páginas de uma revista masculina.
Monografia apresentada ao Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, em cumprimento parcial das exigências do Curso de Especialização para obtenção do Título de Especialista em Publicidade & Mercado: Poéticas Visuais, sob orientação do Prof. Dr. Vander Casaqui.
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Escola de Comunicações e Artes
São Paulo, 2005
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Membros da Comissão Julgadora
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Agradecimentos
A meus pais Reinaldo e Roseli, que me deram todo o suporte necessário para que
o curso fosse concluído, aos meus professores que deram todas as luzes do conhecimento, ao
meu orientador pelas sábias idéias, meus companheiros de curso e aqueles que se propuseram
a ajudar com conversas, entrevistas, dados e tudo mais.
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Dedicatória
Esta obra é dedicada principalmente ao meu filho Yves Gonçalves Aniceto, que
sabe como superar adversidades.
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Resumo:
Aproveitando um gancho do fato de uma modelo brasileira, ao posar para uma
revista masculina e para uma campanha publicitária ao mesmo tempo, ter as fotos editadas e
não editadas digitalmente caírem ao conhecimento público; gerando uma discussão sobre o
assunto, analisando o conceito de real e ideal com a edição fotográfica, levando a uma análise
semiótica e buscando o entendimento nas mudanças do mercado e na ética nesse mundo pós-
moderno.
Abstract:
Using to advantage a hook of the fact of a Brazilian model, when posed for a adult
masculine magazine and an advertising campaign at the same time, having her photos edited
and not edited digitally to fall to the public knowledge; generating a discussion on the subject,
analyzing the Real and ideal concepts with the photographic edition, taking to an semiotics
analysis and searching the understanding in the changes of the market and the ethics in this
Figura 1 - Nascimento de Vênus – Sandro Botticelli (1483).............................. 15 Figura 2 -Vênus de Urbino - Ticiano Vecellio (1538)........................................ 16 Figura 3 - Nú Feminino Deitado - Rafael Frederico (1896) ............................... 17 Figura 4 - Foto Alemã - S/A (1910)................................................................... 17 Figura 5 - S/T - Frantisek Drtikol - Rep. Tcheca (1925) .................................... 18 Figura 6 - S/T - S/A - (1960) - A fotos ousam em novas posições..................... 18 Figura 7 - Juliana Paes - foto: JR Duran - http://playboy.abril.com.br............... 27 Figura 8 - Juliana Paes sem manipulação digital - fonte: internet ...................... 28
Para um publicitário todas as questões relacionadas a mudanças de comportamento
no mercado devem ser analisadas para que seja possível um maior entrosamento com o
mercado e com o público consumidor. Para um pesquisador as mudanças devem ser estudadas
a fundo para que o conhecimento sobre determinado assunto possa ser transmitido e que sirva
como base para a atual e futura geração compreender somente um pouco dessa maravilha que
é a cultura do ser humano.
A proposta deste estudo é entender um pouco mais sobre a mudança que ocorre nos
meios de comunicação, tendo como ponto de análise a edição fotográfica nas revistas
masculinas.
Estamos em um mundo pós-moderno, com tecnologias cada vez mais poderosas, a
comunicação interpessoal necessitando cada vez mais velocidade e o consumidor apto a
possuir bens que mesclem essas duas realidades já citadas.
A imagem sempre fascinou o homem, desde os seus sinais pré-históricos nas
cavernas o ser humano sonha em ser criador de uma realidade virtual, substituindo o aspecto
divino.
Farei nesse estudo uma recapitulação da história da reprodução do corpo humano até
chegar à era digital, colocando alguns aspectos das representações semióticas. Passarei então
a um breve tratado sobre o real e o ideal, levantando argumentos para a edição fotográfica.
Nos próximos momentos analisaremos então as revistas masculinas e o que
realmente muda com a edição fotográfica nos pontos de vista semiótico e no mercado de
consumo editorial e publicitário. Farei um estudo de caso sobre a Revista Playboy da modelo
Juliana Paes e colocarei, finalizando, alguns pontos contraditórios sobre essa transformação
do real e do ideal.
Não pretendo em momento nenhum desta monografia criticar ou muito levantar
polêmica sobre personalidades, veículos de comunicação ou os que realizam a edição de fotos
já que realmente me tornaria vítima e autor, pois já utilizei deste processo muitas vezes em
meu ambiente profissional.
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Metodologia
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Para proceder com esse trabalho tive de pesquisar em várias fontes. Busquei
principalmente analisar o ponto de vista do publico em geral, fazendo pesquisa de campo e
pesquisas pela internet. Ao mesmo tempo bibliografias referentes ao tema foram procuradas
sem muito sucesso, pois a edição fotográfica não é, por enquanto, tema de pesquisadores.
Seguindo na busca procurei entrar em contato com alguns representantes de destaque
da categoria de revistas femininas para realizar entrevistas sem muito sucesso.
Por fim de muita leitura e insistência apresento este trabalho classificado teórico,
com o qual espero levantar uma visão sobre as mudanças provocadas pela edição fotográfica.
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Da Matéria aos bits
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A construção do corpo tem sido desde estes primeiros instantes da criatividade a sua
obsessão. As pinturas rupestres da pré-história se transformaram na escultura e quando esta
arte chegou próxima à perfeição um período de supressão iniciara. A era católica no ocidente,
o islamismo e o judaísmo colaboraram como um freio às expressões artísticas que depunham
contra a moral da época, sendo somente restabelecidas com a Renascença.
“o corpo civilizado também tinha uma selvageria
própria para explorar. Em sua alegre redescoberta deste corpo
privado, mantido oculto após os tempos de Grécia e Roma, a
Renascença tornou visíveis as partes que a sensibilidade do
início da Idade Média deixara escondidas. A forma humana
nua”. (MANGUEL, 2001)1
O nu retorna com peso na Itália pelas mãos de Donatello, no séc. XIV, se expandindo
com os estudos de anatomia e chegando ao auge com as várias pinturas com o tema a Deusa
Vênus, símbolo de graça e beleza.2 O padrão do “belo ideal” clássico vem a tona e se expande
nos próximos quatro séculos atingindo além da escultura e da pintura, também o desenho.
Figura 1 - Nascimento de Vênus – Sandro Botticelli (1483)
1 MANGUEL, Alberto. Lendo Imagens: uma história de amor e ódio. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. 2 NÚ. Enciclopédia de Artes Visuais. Instituto Itaú Cultural, 2003. Disponível em: http://www.itaucultural.org.br/AplicExternas/Enciclopedia/artesvisuais2003/index.cfm?fuseaction=Detalhe&CD_Verbete=3880. Acessado em 15 jan 2005.
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Figura 2 -Vênus de Urbino - Ticiano Vecellio (1538)
No Século XIX eis que surge a fotografia revelando ao mundo a perfeição e
imperfeição do corpo humano. Eunice Tomé3, dissertando sobre o nu feminino na fotografia
fala sobre a ansiedade das modelos femininas ao ter uma exposição ao fiel da fotografia e se
tornarem de eróticas a pornográficas. De certa forma isso veio a acontecer gerando uma
confusão entre fotos artísticas de nu e pornográficas. Certos profissionais do fim do Séc. XIX
começaram até a copiar efeitos de pinturas gerando uma semelhança entre a as telas e a
fotografia.
Enfim, com o advento de câmeras cada vez mais acessíveis, como a “KODAK” do
fim do século XIX, a fotografia ganhou popularidade e reduziu a necessidade de pinturas que
representavam à realidade, sendo um dos motivos que gerou movimentos de revolução
modernistas que, no Brasil, chegariam ao grande público pela Semana da Arte Moderna de
1929 em São Paulo.
3 TOMÉ, Eunice. O Corpo da Mulher. São Paulo: USP, 2002.
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Figura 3 - Nú Feminino Deitado - Rafael Frederico (1896)
Figura 4 - Foto Alemã - S/A (1910)
Se a arte no início do Século XX se transforma a fotografia por sua vez atinge seu
objetivo de transformar-se em arte. Os nus se tornam mais aceitos a partir da segunda década
com os estúdios assumindo a autoria das fotos, ousando nas posições e assumindo algumas
características dos movimentos artísticos. Abaixo segue uma foto que assumiu o movimento
Figura 6 - S/T - S/A - (1960) - A fotos ousam em novas posições
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Com o advento da cor na metade do século XX e a popularização e novas técnicas de
impressões gráficas, a fotografia começa a se tornar peça fundamental para a imprensa,
transformando-se de arte a instrumento da comunicação de massa para imergir o receptor e
conseguir o lucro.
Mas a tecnologia não se estagnou. O vídeo e a TV surgiram e a necessidade criou os
satélites e a comunicação digital, transformando os sinais (ondas) analógicos em planos de
bits (1 e 0) . Neste momento extingue-se a definição fotográfica encontrada na dissertação de
Denise C. F. de Camargo:
“A fotografia sempre existiu de duas maneiras: direta,
realizável por intermédio de sua origem técnica, e ambígua,
porque capaz de interpretar a realidade. As diversas
interpretações e análises da imagem fotográfica, realizadas nas
décadas de setenta e oitenta, tiveram como base uma concepção
fundamentalmente preocupada com a busca da essência da
fotografia, a natureza técnica de seu processo, suas
conseqüências e a relação com o aparelho.”4
A Tecnologia capta a imagem do objeto em um suporte inexistente (ou virtual)
chamado memória do computador. Transformando-a em pequenos quadrados chamados pixel
que são um conjunto de informações de 1 e 0, que traduzidos significam uma cor e quando
postos lado a lado compõem na tela do computador essa imagem.
A Fotografia Digital chega para revolucionar o modo como o fotógrafo pensa o
mundo. A produção dessa técnica se torna triádrica de acordo com Lúcia Santaella5. A
infografia (nome que ela dá as imagens digitais) passa além da habilidade do artista que
manuseia o pincel, ou do sujeito que manuseia o equipamento fotográfico, recai sobre o
programador e no especialista de software.
A possibilidade dos “pixel” serem transformados individualmente é ponto de nossa
discussão nos próximos capítulos, pois ela permite uma edição fotográfica que modifica o real
e o ideal.
4 CAMARGO, Denise C. F. de. Rito Digital. A fotografia sob o impacto da tecnologia digital. São Paulo: Edusp, 2001. 5 SANTAELLA, Lúcia. Os três paradigmas da imagem. In: SAMAIN, Etienne (Org.). O Fotográfico. São Paulo: HUCITEC, 1998.
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O Real e o Ideal
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A partir deste momento analiso de uma forma mais semiótica o entendimento do real
e do ideal na edição fotográfica.
Se pensarmos filosoficamente e pela etimologia o real é tudo que é concreto, não
falso ou então genuíno. Encaixando essa etimologia na semiótica, o “Referente fotográfico”
de Barthes não é nada mais que a coisa necessariamente real que foi o alvo do fotógrafo.
Na fotografia tradicional, que necessita do processo físico-químico, apesar das
influências da mira do fotógrafo, o instante capturado é um “rastro do real” (Sotag, 1986),
ainda mesmo uma prova que determinada cena aconteceu. A foto deveria transmitir ao
expectador os mesmos índices que o referente transmite, mas ela também serve como ícone na
medida em que ela tem sua simbologia para com o expectador.
No caso de uma revista masculina, definida desta forma pelas fotos de nudez de uma
modelo do sexo feminino que geralmente famosa, um corpo midiático, as fotografias encenam
uma história narrada por um texto secundário e muitas vezes desnecessário.
Mas como o Real se transformou no Ideal?
A resposta encontra-se nas transformações culturais da última década quando com o
barateamento das tecnologias digitais de manipulação de imagens, juntamente com o
crescimento das mídias e das grandes propagandas relativas ao corpo saudável, mudaram o
enfoque do “gosto” de acordo, principalmente, com a exposição dos meios de comunicação,
assim como afirma Novaes.
“A fotografia, o cinema, a televisão, a publicidade, são
hoje elementos presentes no nosso cotidiano de modo cada vez
mais intenso. Agimos e interagimos com as imagens sem
percebermos o quanto elas impregnam o mundo contemporâneo
transmitindo e moldando valores fundamentais da nossa
cultura. Estas imagens não falam por si sós, mas expressam e
dialogam constantemente com modos de vida típicos da
sociedade que as produz.” 6
A fotografia encanta e torna-se também uma máquina de criar sonhos. Quando o
Referente passa a transmitir signos quais a tornam simbólica, estética e epistêmica, esta vai
6 NOVAES, Sylvia Caiuby. O uso da imagem na artopologia. In: SAMAIN, Etienne (org.) O Fotográfico. São Paulo: HUCITEC, 1998.
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ultrapassar seu reconhecimento e encontrar-se com as expectativas do espectador
transformando-a em rememoração gerando e decodificando o esquema.7
Mas quais são as expectativas do espectador de uma revista masculina?
A figura abaixo mostra o perfil dos leitores da Revista Playboy em 2004:
Tabela 1- Público Playboy 2004 - http://publicidade.abril.com.br/geral_perfil_leitor.php - em 17/06/2004
Um público notadamente masculino, jovem e de alto poder aquisitivo requere, assim
como em sua relação com a moda e demais produtos de consumo, novidades trazidas pelo
mass-media. Lipovetsky com o assunto da moda discursa muito bem sobre a cultura de massa
e sobre essa troca constante de gostos e de consumo.
“A cultura de massa é ainda mais representativa do
processo de moda do que a própria fashion. Toda cultura mass-
midiática tornou-se um formidável maquina comandada pela lei
da renovação acelerada, do sucesso efêmero, da sedução, da
diferença marginal... para a música e os livros, a cada mês um
disco expulso o outro, um livro um outro livro – a obsolescência
aí reina como em nenhuma outra parte.”8
Essa alteração também se confirma quando as modelos que posam nuas já eram
corpos midiáticos, famosas por serem atrizes, como por exemplo, Juliana Paes ou a Flávia
Monteiro, a jogadora de basquete Hortência ou a assistente de palco do programa Caldeirão
7 AUMONT, Jacques. A Imagem. Campinas, SP: Papirus, 1993. p. 80-84 8 LIPOVETSKY, Gilles. O Império do Efêmero. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. p. 205
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do Huck Ana de Biase, ou ainda outras celebridades que marcaram sua época e que ainda
causam seu frisson.
Dessa forma uma revista como a Playboy utiliza o objeto dinâmico, ou seja o
resultado das fotos, para invocar uma série de sentimentos que são levados como signos pelos
objetos imediatos, desta forma tudo o que se sabe sobre a modelo fotografada entra como
mediador, no caso todo o conhecimento informado pela mídia.
Se a fotografia utiliza-se do potencial dos objetos imediatos de criar sonhos, os
receptores aderem a esse propósito com todo o afinco, entrando no ambiente de sedução e
realizando os seus mais intrínsecos desejos pelos ícones nos níveis de imagem e metáfora.
Essa adaptação ocorre individualmente e depende totalmente dos conhecimentos e histórias de
vida de cada receptor sobre o referente e nos ícones de mulher sensual, perfeita pela estética.
Boris Kossoy defende essa pluralidade de sentidos: “as imagens fotográficas, por
sua natureza polissêmica permitem sempre uma leitura plural, dependendo de quem as
aprecie. Estes já trazem embutido no espírito, suas próprias imagens mentais preconcebidas
acerca de determinados assuntos.” 9
Mas se o propósito do sonho é o ideal e as mudanças sociológicas discutidas
anteriormente requerem a utopia do “corpo perfeito”, como esse sonho pode se tornar o mais
ideal possível?
A resposta para essa pergunta é clara. A manipulação ou edição digital das fotos.
Gastando hoje aproximadamente Mil Dólares ou quase 3 Mil Reais para comprar um
computador e uma maquina fotográfica digital, é possível a qualquer pobre conhecedor da
informática corrigir imperfeições nas fotos como olhos vermelhos, iluminação, cor e
imperfeições de pele. Em um nível mais avançado, já se pode fazer alterações mais profundas
como consertar silhuetas, retirar graves imperfeições e arrumar brilho e coloração da pele,
realmente alongar pernas, braços, corrigir estrias, celulites... enfim, tudo o que a imaginação
mandar.
Em geral, o público consumidor da Playboy já tem o conhecimento, se não a certeza,
de que isso pode estar ocorrendo com as revistas masculinas, mas da mesma forma não se
importam por isso já ter virado hábito, por exemplo ao publicar suas fotos em seu blog
pessoal ou ainda realizar montagens nas fotos dos amigos e brincar lhes mandando por e-mail.
9 KOSSOY, Boris. Realidades e Ficções na Trama Fotográfica. Cotia, Ateliê Editorial, 1999. p. 44
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Então chegamos ao ponto da história onde o fotógrafo deixa de ser o principal agente
nestas mediações simbólica e divide junto ao especialista digital os objetivos das mensagens
que a foto emite.
Seguindo as idéias de Flusser (1985: 28-29) e Santaella & Nöth (1997: 119) se o
fotógrafo é o aparelho, e é o fruto de sua ação, produzindo símbolos, concluo que o
especialista de software se torna vital na parte de ajustar esses símbolos e criar até novos não
imaginados pelo aparelho primário. Torna-se desta forma uma nova construção de aparelho-
instrumento, a primeira constitui-se de máquina fotográfica e fotógrafo e a segunda de
hardware/software e especialista digital, ou operador do computador.
Essas mudanças criam profissionalmente mudanças profundas e inegáveis. Camargo
elucida bem essa questão em sua Dissertação:
“A abordagem digital da fotografia remexe com o
campo perceptivo, e chega ao conceitual, cujo código da
representação organiza-se em um novo discurso – o que tem
deixado atônitos os fotógrafos que se dirigem para o novo
mundo das imagens – é que as relações do homem com o mundo
não são mais as mesmas depois do surgimento da tecnologia
digital: a simulação e a virtualidade repercutem sensivelmente
nos novos sentidos da imagem, a realidade em que vivemos é
regulada por uma estratégia digital invisível, que provoca
efeitos em um plano real.” 10
A publicidade tem cada vez mais utilizado das técnicas de edição fotográfica. Os
argumentos textuais continuam sendo apropriados, mas nessa sociedade cada vez mais
imagética um forte peso cai sobre a parte visual da propaganda.
A edição fotográfica, nas mãos das equipes de criação permite gerar especificamente,
tanto utilizando modelos (masculinos ou femininos) quanto nos cenários e ambientes, os
signos necessários para que uma comunicação estreita com o público alvo e gerando cada vez
mais uma publicidade que atenda ao mercado e modifique estratégias provocando mudanças
profundas em como o público vê a informação que consome.
É nesses efeitos no plano real e em como a informação é consumida que
analisaremos o próximo capítulo.
10 CAMARGO, Denise Conceição Ferra de. Rito Dígito. A fotografia sob o impacto da tecnologia digital. São Paulo: USP, 2001. p.64
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O Caso Real de Juliana Paes
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Uma das atuais musas da mídia brasileira é a atriz Juliana Paes. Conhecida por várias
participações em novelas da Rede Globo, conquistou os sonhos dos espectadores em senas de
sedução e erotismo onde mostrava partes de seu corpo.
Após muitas ofertas da Editora Abril, mais especificamente da Revista Playboy,
Juliana aceitou a proposta e foi capa e modelo principal da revista em maio de 2004. O
público estava todo na expectativa e algumas matérias e entrevistas prévias até citaram que a
Playboy afirmou não ter existido a necessidade de retoques nas fotos pela beleza e perfeição
da modelo11, mas nem uma semana após o lançamento da edição surgem na internet fotos da
atriz, tiradas no mesmo dia, pelo mesmo fotógrafo, para uma campanha publicitária da
Cerveja Antártica, sem a manipulação digital, causando um rebuliço em toda a imprensa.
(Figuras 7 e 8)
11 Ver Anexo I.
27
Figura 7 - Juliana Paes - foto: JR Duran - http://playboy.abril.com.br
28
Figura 8 - Juliana Paes sem manipulação digital - fonte: internet
O fato foi comprovado pela própria Juliana Paes que admitiu ter celulite, mas
comprovou que não participou nem viu as fotos da internet. Mas se a posição de um veículo
de comunicação forte como a Playboy, que já chegou a ter tiragem de mais de 1 milhão de
cópias mensais assumiu publicamente que não houve retoques nas fotos, como fica a ética?
Barros Filho exemplifica bem esse processo:
29
“No caso hipotético da adoção da mentira como regra
do processo comunicativo, o real deixaria de ser referência.
Nesse caso a percepção da realidade seria inútil para a
seqüência da relação intersubjetiva. A construção mental, que
assume o papel de referência, rompe com a realidade e institui a
“falta absoluta” (Legendre) como única certeza do processo
comunicativo. Para alguns autores, a ruptura com o real quebra
o processo comunicacional.”12
Mas em um cotidiano das mass-media as coisas não funcionam bem assim, como
explica Santaella:
“A lógica da mídia é brutalista, desconhece as
sutilezas das diferenças. Atende cegamente aos ditames do
consumo. Se uma imagem é um bom produto, se vende bem, essa
imagem será perseguida sem tréguas e sem limites. Quanto a
isso, entretanto, não há novidade nenhuma. Os mecanismos da
mídia já foram esquadrinhados, criticados, vivipendiados à
sociedade e, muitas vezes, por agentes que atuam na própria
mídia, dela fazendo necessárias autocríticas. Mas a lógicas das
mídias é também uma lógica de auto-sobrevivência: é vender ou
perecer.” 13
Toda a questão da manipulação é confirmada pelo ex-diretor de Arte da Revista
Playboy Michel Spitale, que atualmente desempenha o mesmo papel na Revista VIP, também
da Editora Abril, em entrevista de Eunice Tomé:
“É ainda o Diretor de arte da Playboy [Michel Spitale]
que fala das novas tecnologias a serviço de melhorar as
imperfeições, derrubando mitos e mostrando que beldades, que
parecem tão perfeitas, são produzidas e transformadas. E nos
lembramos muito da Jogadora de Basquete Hortência, que
12 BARROS FILHO, Clóvis de. Ética na Comunicação. – 4ª Ed. – São Paulo: Summus, 2003. p. 38. 13 SANTAELLA, Lúcia. Semiótica aplicada. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2004. p.99
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nunca ostentou predicados de deusa e foi mostrada nas páginas
da revista como sendo de uma beleza impecável.14
Segundo a diretora de fotografia da Playboy em 2002, Ariani Carneiro, em entrevista
de Tomé, a foto representa a realidade com arte, principalmente no nu. Mas em um veículo de
comunicação como as revistas masculinas a foto pode ser considerada como arte?
Marco Terzi, Diretor de Criação de uma agência de Publicidade em São Paulo, e que
já realizou jobs das mais diversas mídias para campanhas da Playboy acredita que as
manipulações digitais tem um propósito exclusivo para alavancar as vendas e essas
manipulações vão ficar cada vez mais severas.
Compondo essa questão temos os pensamentos de Walter Benjamim em seu clássico
artigo “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica” (1935) onde uma obra de arte
possui uma “aura” e quando se é possível fazer cópias perfeitas a partir de uma matriz única,
ou seja, uma obra distribuída em milhares de exemplares, essa perde sua aura, seu valor de
culto em favor de seu valor de exposição. Ela se torna mais uma obra comum no meio da
imensidão de imagens que cercam nosso dia a dia.
Mas pode não ser este o caso da Playboy. O próprio objetivo da revista, como
afirmado por Michel Spitale e Ariani Carneiro, ela mistura a arte por uma produção artística
de luz, cenário com o momento único que jamais poderia ser visto ao vivo. E sem tudo isso a
foto nunca poderia ser vista em todos os detalhes.
No meu ponto de vista, a manipulação digital na revista masculina vai complementar
essa mescla de realidades. Tendo o ideal conferindo sim, um status aurático à fotografia
manipulada. Porque expressa e estimula sentimentos em seus espectadores, mesmo com a
existência de uma multiplicidade do “gosto” individual15, sendo ele comum de época e que
não possamos dizer o que ultrapassa a estética e o que se difere entre o real e o ideal.
Mas a realidade mercadológica é outra, mesmo com todas essas controvérsias a
edição de maio de 2004 da Revista Playboy vendeu mais de 700 mil unidades onde a
circulação normal em março de 2005 foi de 233 mil exemplares16. A posição pública de
Juliana Paes foi correta ao assumir suas fotos e conseguiu manter sua imagem de garota
propaganda da campanha da Cerveja Antártica que vem fazendo um enorme sucesso.
14 TOMÉ, Eunice. O Corpo da Mulher. São Paulo: USP, 2002. p.111 15 AUMONT, Jacques. A Imagem. Campinas, SP: Papirus, 1993. p.300-305 16 Fonte: http://publicidade.abril.com.br/geral_circulacao_revista.php em 23/05/05
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Conclusões
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É inegável que as tecnologias digitais vieram para ficar. É simplesmente observar
todo o processo de substituição do Long Play de vinil pelos Compact Disks (CD) para ter-se
uma idéia do que é esperado no processo fotográfico.
As mudanças no campo da fotografia e das mídias ainda estão acontecendo, mas
muito rapidamente e os conceitos culturais estão em ebulição de novas idéias e de como as
pessoas vêem e decodificam o mundo ao seu redor.
Nos conflitos éticos a mídia dita o que falar. O agenda setting é a realidade que foi
vista nos meios de comunicação quando ocorreu o caso Juliana Paes e ainda não foi
estabelecida, não pela ética, mas pela moral, o que significa, e como entender essas
manipulações fotográficas.
A arte mudou. Seu conceito é inadequado e questionado por vários artistas e autores.
O Gesto Artístico e a reflexão estão assumindo um novo mundo e incorporando as tecnologias
e os meios de comunicação à longa distância.
Num contraponto, o mercado está acompanhando essas mudanças pós-modernas de
uma maneira rápida, tendo a experimentação como argumento, e os resultados como provas
de que seu novo modelo de produção de informação e marketing é viável, delegando às
agências de publicidade total liberdade para criar.
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BIBLIOGRAFIA
AUMONT, Jacques. A Imagem. Campinas, SP: Papirus, 1993. p. 80-84
BAIRON, Sergio e PEREZ, Clotilde. Comunicação & Marketing. São Paulo:
Futura: 2002.
BARROS FILHO,Clóvis de. Ética na Comunicação. São Paulo: Summus, 2003.
BENJAMIN,Walter. "A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica". In:
Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural,
CAMARGO, Denise C. F. de. Rito Digital. A fotografia sob o impacto da
tecnologia digital. São Paulo: Edusp, 2001.
KOSSOY, Boris. Realidades e Ficções na Trama Fotográfica. Cotia, Ateliê
Editorial, 1999.
LIPOVETSKY, Gilles. O Império do Efêmero. São Paulo: Companhia das Letras,
1989.
MANGUEL, Alberto. Lendo Imagens: uma história de amor e ódio. São Paulo:
Companhia das Letras, 2001.
NÚ. Enciclopédia de Artes Visuais. Instituto Itaú Cultural, 2003. Disponível em: