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Jos Luiz De Lorenzo
5O Ecossistema Bucal
INTRODUO
Ns vivemos, desde o nosso nascimento,cercados por um nmero
incontvel de microrga-nismos. Muitos deles (calcula-se que cerca
de100 trilhes), na verdade, estabeleceram umamorada perene na
superfcie de nossa pele, denossos dentes e das mucosas que tm
contatocom o meio externo. Assim, vrios dos nossoscompartimentos
orgnicos abrigam uma srie demicrorganismos que infectam esses
locais mes-mo no estado de sade, constituindo as micro-biotas
prprias de cada local.
Comeando a raciocinar em termos de Eco-logia razo deste captulo
devemos enten-der, primeiramente, o motivo da no existnciade uma
microbiota nica, igual em todas as re-gies do nosso corpo;
entender, por exemplo,por que a microbiota nasal bastante
diferenteda vaginal e, ambas, da intestinal. Uma boa ex-plicao
inicial reside no fato de cada regio serum habitat diferente, de
cada regio oferecerdiferentes condies ambientais. Existem
dife-rentes composies teciduais, portanto diferen-tes receptores
para a aderncia e diferentes nu-trientes necessrios para cada
microrganismo,diferentes teores de umidade, diferentes pH,maior ou
menor teor de oxignio, diferentes ou-tros fatores, e evidente que s
colonizam umacerta regio, um certo habitat, os microrganis-mos que
se adaptam sua condio ecolgica.No por acaso, pois, que o termo
ecologia
originado do grego ikos, que significacasa, habitao.
Existe, porm, no nosso corpo, um rgoecologicamente especial, um
local que, em fun-o de sua complexidade anatmica, no alber-ga uma
microbiota nica, mas vrias microbiotascom diferenas marcantes em
suas composiesqualitativa e quantitativa: esse local a cavida-de
bucal, o nosso campo de atuao mdica. Naverdade, devido existncia
dos dentes e doperiodonto, a boca no um stio ecolgico ni-co, mas
apresenta vrios stios ecolgicos, cadaqual com caractersticas
ambientais prprias e,conseqentemente, cada qual com sua microbio-ta
peculiar. Assim, existe a microbiota das super-fcies mucosas lisas,
a microbiota da mucosa dodorso lingual que no lisa, a microbiota da
su-perfcie dental sadia, a microbiota da superfciedental cariada, a
microbiota do sulco gengivalsadio, a microbiota da bolsa
periodontal, portan-to vrias microbiotas dentro da boca.
Analisada como um todo, a microbiota bucal a mais complexa de
todo o nosso corpo: s debactrias existem mais de 30 gneros
diferentes,abrangendo mais de 500 espcies diferentes.Socransky e
Haffajee (2002) relataram que, naboca, existem aproximadamente 350
espciesbacterianas j cultivadas e mais de 200 que foramreconhecidas
por mtodos genticos. Em nme-ro total de microrganismos, a
microbiota bucals encontra um concorrente na microbiota
intes-tinal, mas a bucal bem mais complexa, em n-
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mero de espcies, porque sem dvida a boca um habitat muito mais
complexo que o trato in-testinal, principalmente devido existncia
dosdentes.
Como qualquer outra microbiota encontradaem qualquer outro
habitat da Natureza, a micro-biota bucal constituda por
microrganismosque so classificados como residentes ou
comotransitrios.
Residentes ou autctones so as espciessempre presentes na
microbiota e, de acor-do com sua freqncia, so subclassifica-das
como indgenas ou como suplemen-tares.
Uma espcie residente considerada ind-gena quando existe em altos
nmeros na micro-biota, em proporo maior do que 1,0% do totalde
microrganismos.
A espcie residente considerada suple-mentar quando ocorre em
baixos nmeros, ouseja, em proporo menor do que 1,0%; nestegrupo,
esto inseridas bactrias patognicascomo os estreptococos do grupo
mutans, lacto-bacilos, Prevotella intermedia,
Porphyromonasgingivalis, Candida albicans e Treponema spp,cujos
nmeros s aumentam se houver alteraoambiental.
Transientes ou alctones so as espciesocasionais, vindas de
outros habitatscomo ar, alimentos, bebidas e mos. Essasespcies
exgenas s se instalam se ocor-rer severo desequilbrio na microbiota
lo-cal; o caso, por exemplo, do encontro deenterobactrias e de
Pseudomonas aerugi-nosa (bactria ambiental patognica e mui-to
resistente a antibiticos) na placa den-tal de pessoas
imunodeprimidas e das quese submetem antibioticoterapia
durantetempos prolongados.
A microbiota bucal compe, com seu habitat,a nossa boca, o
complexo ecossistema bucal,alvo da anlise deste captulo, que tem
comoobjetivos fundamentais os estudos:
1o) dos mecanismos e das condies de im-plantao da microbiota
bucal;
2o) das influncias do hospedeiro sobre a mi-crobiota bucal;
3o) das relaes intermicrobianas, ou seja,das relaes biticas
estabelecidas entre osmembros da microbiota bucal;
4o) das influncias da microbiota bucal sobreo hospedeiro.
EVOLUO DA MICROBIOTA BUCAL AO LONGODA VIDA DO HOSPEDEIRO
A microbiota bucal passa por vrias altera-es, muitas vezes
significantes, no decorrer danossa vida.
Na vida intra-uterina, a boca isenta demicrorganismos. Os
primeiros chegam nossa boca na hora do nascimento e sotransitrios;
quando o parto normal, somicrorganismos vindos do canal vaginal
dame, tais como estreptococos, lactobaci-los, difterides,
coliformes, leveduras comoCandida albicans e alguns vrus e
proto-zorios.
Algumas horas aps o nascimento, a bocacomea a ser infectada por
microrganismosbucais provenientes das pessoas que es-to em maior
contato com o beb, sobretu-do da me (transmisso vertical).
Nessafase, a boca constituda apenas por umamucosa lisa bastante
arejada, portanto asbactrias que se instalam so as tolerantesao
oxignio, ou seja, as aerbias e asanaerbias facultativas adaptveis
muco-sa. Numerosos estudos nos mostram queas primeiras espcies que
se instalam comoindgenas so Streptococcus salivarius,do mesmo
sorotipo encontrado na boca dame, S. oralis e S. mitis biovar 2. No
pri-meiro ano de vida, cerca de 70% da micro-biota bucal so
constitudos por Strepto-coccus spp, principalmente da espcieS.
salivarius, que tem grande afinidade pelamucosa; o restante da
microbiota cons-titudo principalmente por estafilococos,Veillonella
spp e Neisseria spp.
A complexidade da microbiota bucal inicia-se com a erupo dos
dentes, que criaduas novas situaes ecolgicas, dois no-vos habitats
mpares no nosso corpo: asuperfcie dental e o sulco gengival.
A superfcie dental propicia as condiesnecessrias para a instalao
de bactrias quetm a capacidade de se fixar a ela, tais comoS.
sanguinis, S. gordonii, S. oralis e algumas es-pcies de
Actinomyces, consideradas como ascolonizadoras iniciais da
superfcie do esmalte(fase de formao inicial da placa dental). Em
cir-cunstncias especiais analisadas nos Captulos6 e 7 (Placa Dental
e Cariologia: Etiopatogenia daCrie Dental, respectivamente), os
estreptococos
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do grupo mutans tambm se instalam na super-fcie do dente; o
estabelecimento de S. mutansocorre posteriormente ao de S.
sanguinis, mos-trando sua dependncia do cido para-amino-benzico
(PABA) produzido por S. sanguinis.Tambm interessante salientar que
certas re-gies anatmicas do dente, como as reasinterproximais e os
sulcos e fissuras do esmalte,por serem menos atingidas pelo
oxignio, forne-cem condies para o desenvolvimento de bac-trias
anaerbias, sejam facultativas ou at mes-mo estritas.
Por sua vez, o sulco gengival um nichocom baixssimo teor de
oxigenao, possibilitan-do a instalao de bactrias anaerbias
estritas.O aumento numrico de bactrias periodontopa-tognicas no
sulco gengival, como Porphyro-monas gingivalis e Prevotella
intermedia, geral-mente s ocorre a partir da puberdade, pois elasso
favorecidas por hormnios sexuais (fatoresde desenvolvimento) que se
fazem presentes noexsudato ou fluido gengival.
Na fase de adulto dentado, a microbiotabucal atinge as suas
propores mximas:em 1,0ml de saliva, existe uma mdia de 100milhes
(108) de bactrias, e, na placa den-tal, a concentrao bacteriana
ainda maior,cerca de 109 a 1010/g (10 bilhes/g).
Se a pessoa perder alguns dentes, a micro-biota integral s
persiste nas regies pro-vidas de dentes.
Se ocorrer perda total dos dentes, pratica-mente vo desaparecer
as bactrias quetm tropismo para os dentes e para operiodonto,
voltando ao predomnio dasformas aerbias e facultativas que
apresen-tam afinidade pelas mucosas. Portanto,nos desdentados
totais, ocorre severa re-duo do nmero total de
microrganismosbucais.
Quando a pessoa coloca dentadura artifi-cial, voltam a
instalar-se vrias espciesque apresentam afinidade para
superfciesduras e vrios anaerbios, devido pre-sena dos dentes
artificiais e de regies debaixa oxigenao existentes na base
inter-na da prtese. Se a prtese for implanto-suportada, haver
recolonizao das esp-cies prprias do periodonto, desde as no-nocivas
at as nocivas, conforme o graude higienizao e de inflamao dos
teci-dos de suporte.
PRINCPIOS QUE REGEM O ESTABELECIMENTODA MICROBIOTA BUCAL
Aps esta anlise, podemos concluir que acomposio da microbiota
bucal vai-se alteran-do de acordo com as mudanas do ambiente
bu-cal, obedecendo, portanto, s leis bsicas daEcologia.
Baseados nessas leis, devemos entender porque, de todas as
espcies bacterianas de A aZ, somente as espcies A, B, C e
Dconseguem implantar-se na boca humana. Avan-ando mais neste
raciocnio, devemos entenderos motivos pelos quais a bactria A
conseguecolonizar facilmente o epitlio bucal e no a su-perfcie dos
dentes, pelos quais as bactrias Be C s so encontradas em grande
nmero noambiente subgengival e pelos quais a bactriaD isolada das
fissuras oclusais dos dentese quase nunca das suas superfcies
lisas.
Como primeira explicao, o tecido infectadotem que fornecer uma
srie de condies favo-rveis para o desenvolvimento desta ou daque-la
espcie. Isto absolutamente fundamental,mas no suficiente. preciso
haver algumacoisa que fixe ou que retenha a bactria no seunicho
ecolgico. Para que uma determinada bac-tria se instale em qualquer
estrutura, ela deve,preferencialmente, aderir ativamente a essa
es-trutura ou, ento, pelo menos ficar retida emreentrncias
existentes nessa estrutura. O inver-so desse raciocnio totalmente
verdadeiro: sea bactria no dispuser de recursos para aderirou se no
ficar retida nesse local, ela ser mera-mente transitria, sendo
rapidamente eliminada.
Aderncia ou Adeso de Bactrias
Aderncia significa a fixao ativa de umabactria, com recursos
prprios, a uma determi-nada superfcie, que pode ser qualquer
estrutu-ra orgnica ou inorgnica, inclusive a superfciede outra
bactria (coagregao). Portanto, exis-tem dois tipos de aderncia que
permitem queuma bactria inicie a colonizao de uma super-fcie:
a) a aderncia direta da bactria superfcie(Fig. 5.1);
b) a aderncia da bactria a outra que j es-teja previamente
aderida superfcie (Fig. 5.2).
Por exemplo, muitas bactrias periodontopa-tognicas
Gram-negativas no aderem superf-
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cie dental, mas tm stios de aderncia ao epit-lio da bolsa
periodontal e tambm a Streptococ-cus spp e a Actinomyces spp, que
esto entre oscolonizadores iniciais da superfcie
dental.Fusobacterium nucleatum (representado emposio vertical na
Fig. 5.2) parece ser um elo deligao importante neste aspecto, pois
apresen-ta afinidade de ligao para com colonizadoresiniciais da
pelcula adquirida da superfcie den-tal, como S. mitis, S. oralis e
S. gordonii e, tam-bm, com patgenos periodontais como
Actino-bacillus actinomycetemcomitans, Prevotellaintermedia,
Porphyromonas gingivalis e outros.
Aderncia a superfcies bucais: na boca,as bactrias tm duas
possibilidades deaderncia: a fixao a uma superfcie molecomo a
mucosa e a fixao estrutura dura,mineralizada do dente.
Em qualquer desses casos, a aderncia me-diada por dois elementos
bsicos. Na superfciedas bactrias, existem macromolculas
ligantesgenericamente chamadas adesinas, geralmenteencontradas nas
fibrilas e principalmente nas fm-brias. Na superfcie dos tecidos do
hospedeiro,existem molculas receptoras que reconhecem asadesinas
bacterianas e com elas interagem espe-cificamente. Dessa interao
bioqumica altamen-
te especfica, formam-se pontes de ligao, queso as bases da
aderncia bacteriana.
As adesinas mais bem conhecidas so aslectinas e as adesinas
hidrofbicas.
Lectinas so adesinas proticas que tm afi-nidade especfica por
carboidratos. Assim, elass se fixam nos tecidos (mucosa ou
superfciedental) em cujas superfcies exista o carboidratoque lhes
afim, que funciona como receptor(Fig. 5.3).
Importantes exemplos desta interao soS. sanguinis e S. oralis,
que esto entre os pou-cos colonizadores iniciais da superfcie
dentalpor possurem lectinas especficas para saca-rdios (galactose e
o trissacardio cido silico)existentes na pelcula adquirida de
saliva que re-cobre os dentes (glicoprotena salivar).
Por outro lado, a interao hidrofbica en-volve dois componentes
lipdicos, como os tri-glicerdios (gorduras), os fosfolipdios
(princi-pais constituintes das membranas celulares) e osesteris.
Essas molculas contm cidos graxoscom cadeia longa, constitudas por
muitos radi-cais hidrocarboneto (CH2) desprovidos de cargaeltrica
(apolares), portanto insolveis em gua
Fig. 5.2 Aderncia interbacteriana (coagregaes homo-tpicas e
heterotpicas).
Fig. 5.1 Aderncia direta a superfcies.
Fig. 5.3 Representao esquemtica da adeso bacteriana a estruturas
orgnicas, por meio de lectinas.
Estruturaorgnica Bactria
= lectina bacteriana (adesina)
= carboidrato receptor
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(hidrofbicos). Nesse tipo de ligao, tanto asadesinas bacterianas
como os receptores teci-duais so hidrofbicos (Fig. 5.4). Em presena
degua, esses elementos de ligao se agrupam,pois no se solubilizam.
A. naeslundii, S. san-guinis, S. mitis e P. gingivalis so
altamentehidrofbicos para a hidroxiapatita do dente, en-quanto S.
mutans, S. salivarius e P. intermediao so moderadamente.
Alm das ligaes via lectinas e hidrofbicas,so conhecidos outros
recursos de adernciadireta ao esmalte dental e glicoprotena
salivarque se deposita sobre ele:
Interao eletrosttica via Ca++ salivar: uti-lizada por S.
mutans.
Interao via IgA-S salivar: S. sanguinis. Interao com
glicosiltransferase (GTF) e
glucanos: S. mutans e S. sobrinus. Interao com protenas
salivares acdicas
ricas em prolina: S. gordonii, A. naes-lundii, F. nucleatum.
Interao com estaterina (fosfoprotenasalivar): F. nucleatum, A.
naeslundii.
Interao com a amilase salivar: S. gordonii. Interao com
fragmentos de clulas bac-
terianas depositados sobre a pelcula adqui-rida: S. sanguinis,
S. oralis, S. gordonii.
Interaes com outros receptores: S. mitis,S. sanguinis, S.
oralis, S. gordonii, F.nucleatum, Capnocytophaga ochraceae.
Seja qual for o mecanismo de adeso utiliza-do, o importante que
as adesinas bacterianasse liguem aos receptores do hospedeiro
forman-do pontes de unio. Evidentemente, quanto maioro nmero dessas
pontes, mais forte ser a liga-o. Na verdade, a aderncia deve ser
firme, es-tvel, para superar todas as foras que tendema desalojar a
bactria, como o movimento brow-niano, a repulso eletrosttica
(bactrias, clulas
epiteliais e glicoprotena salivar tm carga eltricanegativa) e,
principalmente, a fora de arraste dofluxo salivar e dos movimentos
dos msculos daboca.
Algumas bactrias consolidam sua adernciausando polmeros de
carboidratos, polissacar-dios extracelulares complexos muito
hidratados,abreviados como PEC (explicao no item se-guinte). Os
PEC, principalmente o glucano inso-lvel, aglutinam as clulas
bacterianas e os re-ceptores teciduais, conferindo uma adeso
bas-tante firme entre eles. Exemplos: S. salivarius naclula
epitelial (levano) e estreptococos do gru-po mutans (EGM) e A.
naeslundii sorotipo 2 nasuperfcie dental (glucano e
heteropolissacardio,respectivamente).
Mas o aspecto mais importante que temos aressaltar, no estudo da
aderncia, que existeum elevado grau de especificidade na
interaoadesinas receptores. Essa especificidade expli-ca por que
diferentes espcies bacterianas, mes-mo pertencentes a um mesmo
gnero, tm afini-dades por diferentes estruturas da boca.
Porexemplo, S. sanguinis isolado em grandesquantidades quando
raspamos a superfcie dodente e praticamente no encontrado nas
mu-cosas bucais. O contrrio ocorre com S. sali-varius, que a espcie
bacteriana predominan-te na superfcie das mucosas e quase no
apa-rece na dental. S. mitis mais ecltico, pois im-planta-se bem
tanto na mucosa como no dente.No ambiente periodontal, algumas
bactriascomo P. gingivalis e P. intermedia so providasde fmbrias ou
de fibrilas que contm adesinasque permitem sua adeso ao epitlio da
bolsaperiodontal.
Aderncia interbacteriana (coagregao): a responsvel por conferir
volume mi-crobiota, sendo de grande importncia,
Fig. 5.4 Esquema representando uma ligao hidrofbica.
Receptor hidrofbico (tecido)
Adesina hidrofbica (bactria):cido lipoteicico, fosfolipdios,
lipoprotenas
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por exemplo, na fase de estratificao oumaturao da placa
bacteriana. Uma bact-ria pode se fixar superfcie de outra bac-tria
da mesma espcie (coagregaohomotpica) ou, ento, de espcies
diferen-tes (coagregao heterotpica) e estes fe-nmenos ocorrem por
diversos mecanis-mos, todos com carter de especificidade.
a) Aderncia mediada por PEC: um impor-tante mecanismo de
aderncia entre bactrias damesma espcie. O exemplo mais conhecido
ocor-re na superfcie do dente (biofilme dental) e con-siste na
agregao de clulas de S. mutans en-tre si pelo glucano, que um
polmero da glico-se derivada da clivagem enzimtica da
sacarose.Quando existe excesso de acar no meio am-biente, algumas
espcies bacterianas produzeme acumulam PEC extracelularmente, como
reser-va nutritiva e energtica.
A sacarose a maior fonte de energia para osestreptococos do
grupo mutans (EGM). Quandoexiste pequena quantidade de sacarose na
placabacteriana, S. mutans elabora uma enzima cons-titucional, uma
glicosiltransferase (GTF) conhe-cida como invertase, que fragmenta
a molculade sacarose em seus componentes glicose efrutose. Esses
monossacardios so pequenos e,assim, so absorvidos pela clula
bacteriana, oxi-dados e transformados em energia.
Mas quando existe maior concentrao desacarose na placa, S.
mutans aproveita uma partedo acar para sua necessidade atual,
oxidando-a pela via glicoltica e assim obtendo energia. Orestante
do acar armazenado para os pero-dos entre as refeies,
principalmente noite,quando ocorre escassez dessa fonte de
energia.O acar armazenado principalmente na formade PEC. Algumas
GTF sintetizam n molculas
de glicose formando os glucanos solvel e inso-lvel (mutano), que
so homopolmeros de glico-se (Glicose-Glicose-Glicose...). A GTF-B
formaglucano insolvel, a C forma ambos e a D formaglucano solvel.
Por outro lado, a FTF (frutosil-transferase) une n molculas de
frutose compon-do o frutano ou levano, que um homopolmero defrutose
(Frutose-Frutose- Frutose...). Esses meca-nismos esto
esquematizados na Fig. 5.5.
O glucano insolvel, que apresenta estrutu-ra fibrilar e persiste
maior tempo na placa bac-teriana, une as clulas de S. mutans entre
si, fa-vorecendo sua colonizao na superfcie do es-malte dental
(Fig. 5.6 e 5.7).
Mas o glucano, que tambm produzido porS. sanguinis, S. gordonii
e S. oralis, noaglutina as clulas dessas espcies. Ocorre que,para
ligar as clulas, o glucano tem que encon-trar receptores nas
superfcies dessas clulas.
Fig. 5.5 Esquema de formao de PEC por Streptococcus mutans.
Fig. 5.6 Microscopia eletrnica de varredura mostrandovrias
clulas de S. mutans sobre a superfcie dental, unidaspelo glucano
(estrutura fibrilar) (Acervo Disciplina Microbiolo-gia Oral
ICBUSP).
{
S. mutans
invertase
Sacarose
Glicose Glucanos
Frutose Frutano (levano)FTF
GTFInsolvel (mutano)
Solvel (dextrano)
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Provavelmente, apenas os EGM possuem recep-tores para glucanos
(lectinas com afinidade paraglucanos e dois tipos de GTF unidas
clula) e,por este motivo, a colonizao via glucano sejauma
capacidade exclusiva dessas espcies. Noentanto, acredita-se que o
mutano pode aprisio-nar, de maneira no especfica, outras
bactrias.
O frutano ou levano, produzido por vriasespcies, principalmente
por S. salivarius, pro-vavelmente no exerce funo adesiva muito
in-tensa, por ser o mais solvel dos PEC e por serdegradvel por
algumas bactrias que elaboramfrutanases.
Outro PEC muito importante na adernciainterbacteriana o
heteropolissacardio produzi-do por A. naeslundii 2 a partir de
vrios carboi-dratos, inclusive o amido.
Ento, a colonizao via PEC feita principal-mente pelos
estreptococos do grupo mutans epor A. naeslundii.
a) Aderncia mediada por constituintes dasaliva e do fluido
gengival: a aderncia entrebactrias da mesma espcie tambm pode
sermediada por constituintes da saliva e do exsuda-to gengival. Por
exemplo, S. sanguinis, S. oralis(que no se acumulam via PEC) e A.
naeslundiiformam homoagregados quando colocados napresena desses
dois elementos in vitro.
Neste tipo de aderncia, esto implicadospolmeros de alto peso
molecular como amucina ou glicoprotena salivar (Fig. 5.8) e
an-ticorpos aglutinantes como a IgA-S dimrica dasaliva e a IgM
pentamrica do fluido gengival(Fig. 5.9).
Fig. 5.7 Esquematizao da aderncia inter-S. mutans mediada pelo
glucano extracelular insolvel (mutano).
Fig. 5.8 Aderncia de bactrias da mesma espcie mediada pela
glicoprotena salivar (GPS).
Receptor do glucano(glicosiltransferase unida clula e
lectinas)
Mutano (polissacardio filamentoso)
Clula de S. mutans
Superfcie do esmalte dental
Pelcula adquirida (GPS)
Adesina bacteriana (lectina)
Receptores sacardicos da GPS(galactose e cido silico)
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S. sanguinis e S. oralis dispem de lectinascom afinidade pela
galactose e pelo cido silico,um constituinte trissacardico
perifrico da glico-protena salivar. A aderncia via
glicoprotenasalivar provavelmente necessite de ons Ca++,pois o EDTA
evita a agregao ou dissolve osgrumos j formados.
b) Aderncia mediada por constituintes desuperfcie de bactrias de
diferentes espcies: aagregao de bactrias de espcies diferentestambm
especfica, envolvendo adesinas deuma espcie (contidas nas fmbrias,
fibrilas ou nasuperfcie externa da parede celular) e receptoresda
superfcie de outra espcie. Um exemplo cls-sico desta interao a
chamada espiga de mi-lho, tpica da placa supragengival madura;
tra-ta-se de agregaes entre bacilos filamentosos(Actinomyces spp ou
Corynebacterium matru-chotii) e estreptococos como S. sanguinis eS.
mitis (Fig. 5.10 e 5.11). Outro exemplo interes-sante a chamada
forma em cepilho ou esco-
va, encontrada na microbiota subgengival asso-ciada periodontite
crnica e que consiste na in-terao de um bacilo filamentoso com
bacilos fu-siformes, como Fusobacterium spp (Fig. 5.12).
As agregaes heterotpicas favorecem aacumulao do biofilme, pois
as espcies pionei-ras fornecem receptores para a implantao
doscolonizadores intermedirios e estes para os tar-dios. Em grande
parte dos casos, os patgenosperiodontais so colonizadores
intermedirios eprincipalmente tardios, necessitando dos
iniciaispara sua implantao.
Algumas coagregaes heterotpicas descri-tas so:
Streptococcus oralis* e S. sanguinis*com S. gordonii*,
Actinomyces naes-lundii*, Veillonella atypica**, Haemo-philus
parainfluenzae** e Prevotellaloeschei**.
S. mitis* e S. oralis* com S. gordonii*,Capnocytophaga
ochraceae* e Fuso-bacterium nucleatum***.
S. gordonii* com S. oralis*, S. san-guinis*, S. mitis*, A.
naeslundii*, F. nu-cleatum*** e Propionibacterium acnes**.
C. ochraceae* com S. mitis*, S. oralis* eF. nucleatum***.
A. naeslundii* com S. sanguinis*, S.oralis*, S. gordonii*, V.
atypica** e F.nucleatum***.
Fusobacterium nucleatum*** com S.oralis*, S. mitis*, S.
gordonii*, A. naes-lundii*, C. ochraceae*, Actinomycesisraelii**,
Capnocytophaga gingiva-lis**, P. acnes**, Prevotella denticola**,H.
parainfluenzae**, V. atypica**, Cap-nocytophaga sputigena***,
Prevotella
Fig. 5.9 Aderncia entre bactrias da mesma espcie me-diada por
anticorpos.
Fig. 5.10 Micrografia eletrnica mostrando formaes emespiga de
milho na placa supragengival madura (acervo Dis-ciplina
Microbiologia Oral ICBUSP).
Fig. 5.12 Representao esquemtica da formao emcepilho (vista
lateral).
Fig. 5.11 Representao esquemtica da formao emespiga de milho
(vista lateral).
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intermedia***, Porphyromonas gingiva-lis***, Actinobacillus
actinomycetem-comitans***, Eubacterium spp***, Tre-ponema
denticola*** e Selenomonasspp***.
* = colonizadores iniciais da superfcie dental;** =
colonizadores intermedirios;*** = colonizadores tardios.
Reteno de Microrganismos
Outro recurso de implantao microbiana areteno, usado
principalmente por microrganis-mos que no se caracterizam pela
capacidade deaderncia a tecidos, como lactobacilos e bact-rias
mveis. Esses microrganismos ficam retidosem reentrncias naturais e
patolgicas da boca,tais como as papilas da lngua, as fossetas e
fis-suras dos dentes, as cavidades de crie, o sul-co gengival e a
bolsa periodontal. Quanto maiora reentrncia, maior o nmero de
microrganismosretidos. Uma maneira de reduzir drasticamente onmero
desses microrganismos eliminar ou re-duzir esses stios de reteno. O
nmero delactobacilos significativamente reduzido quan-do promovemos
o fechamento das leses de c-rie, mesmo com materiais provisrios. O
nmerode bactrias mveis diminui consideravelmenteaps a reduo
cirrgica da profundidade dabolsa periodontal. Ao conjunto desses
procedi-mentos foi conferida a denominao adequaodo ambiente bucal
sade.
INFLUNCIAS DO HOSPEDEIRO SOBRE AMICROBIOTA BUCAL (REGULAO E
CONTROLE)
Analisados os mecanismos de implantaoda microbiota bucal, vamos
estudar, agora, asinfluncias do hospedeiro sobre essa microbio-ta.
Em outras palavras, vamos analisar os princi-pais recursos
utilizados pelo hospedeiro para re-gular e controlar a microbiota
bucal, tentandomant-la num equilbrio biolgico que no o pre-judique.
Esses fatores so em grande nmero epodem ser divididos em trs
grandes grupos:
a) endgenos (saliva, fluido gengival, pre-sena ou ausncia de
dentes, integridade dosdentes e de seus tecidos de sustentao e
des-camao epitelial);
b) exgenos (dieta do hospedeiro, qualidadeda higiene bucal e uso
de antimicrobianos);
c) fatores sistmicos.
Saliva
Sendo um fluido que banha constantementea nossa boca, a saliva
pode ser considerada amaior responsvel pela regulao da
microbiotasupragengival. Para a microbiota, a saliva umafaca de
dois gumes. De um lado, alm de ofe-recer excelentes condies
ambientais para asbactrias (temperatura, pH, umidade etc.), a
sa-liva um excelente sopo nutritivo, principal-mente por conter
todos os nutrientes derivadosda dieta do hospedeiro que nela se
encontramsolubilizados. Na saliva, disposio da micro-biota
supragengival, existem muitas protenas eaminocidos (glicoprotenas,
albumina, globuli-nas; cidos asprtico e glutmico, leucina,glicina,
cistina etc.), muitos carboidratos (cadeiasacardica do cido silico,
glicose, galactose,manose etc.), vrios lipdios (triglicerdios,
fosfo-lipdios e colesterol), vrias vitaminas e vrioscompostos
inorgnicos (ons Ca, PO, Na, K,HCO3 etc.) necessrios para o
metabolismo bac-teriano.
Mas, por outro lado, na saliva, existem vriosmecanismos que
limitam o desenvolvimentomicrobiano, principalmente substncias
antimi-crobianas, alteraes prolongadas de pH e aomecnica de lavagem
(fluxo salivar).
Substncias antimicrobianas: desde a An-tigidade, o homem j usava
sua salivapara o tratamento de leses microbianascomo herpes, lceras
infectadas, teris,varola, hansenase etc. Hoje, sabemos quea saliva
tem uma relativa atividade antimi-crobiana atribuda a algumas
substnciasnela presentes:
a) Anticorpos, principalmente da classe IgA-S, que, alm de
participarem da destruio micro-biana, ainda aglutinam
microrganismos, impedin-do sua aderncia aos tecidos e facilitando
suadeglutio.
b) Lisozima: enzima descoberta por Fleming(1922), encontra-se
amplamente distribuda nosleuccitos, em todas as secrees humanas e
napele. Sua concentrao na saliva parotidiana semelhante no sangue,
mas muito menor doque na lgrima (1/300) e no muco nasal (1/45).
Alisozima tem efeito bactericida porque hidrolisa opeptidoglicano,
importante componente da pare-de celular, fazendo com que a
bactria, principal-mente a Gram-positiva, fique muito sensvel a
al-teraes osmticas e seja lisada.
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c) Lactoferrina: liga ons ferro, reduzindo aconcentrao necessria
para o desenvolvimen-to bacteriano; bactericida para S. mutans
mes-mo em concentraes diminutas.
d) Lactoperoxidase: reage com perxido dehidrognio ons tiocianato
(SCN-) formandohipotiocianato (OSCN-), que reage com
grupossulfidrila de enzimas bacterianas, inativando es-sas enzimas
e levando morte das bactrias.
Alteraes prolongadas de pH: em condi-es normais, a saliva tem um
pH (logarit-mo negativo da concentrao de ons H+)em torno de 6,0 a
7,0, fisiolgico tanto parao hospedeiro como para as bactrias.
EssepH mantido pelos tampes salivares, prin-cipalmente pelos ons
bicarbonato (HCO3),responsveis por cerca de 85% da capaci-dade
tamponante da saliva; os outros 15%so garantidos por alguns outros
saiscomo fosfatos, por protenas e por amino-cidos. As clulas
glandulares em repou-so produzem pequenas quantidades de
bi-carbonato, mas essa produo aumentabastante quando as glndulas so
estimu-ladas. Assim, durante as refeies, a capa-cidade tampo atinge
o auge e, entre as re-feies, o mnimo. Conseqentemente, acapacidade
tampo da saliva diretamen-te proporcional quantidade de fluxo
sa-livar.
O mecanismo mais bem conhecido de tampo-namento se exerce sobre
os cidos. O pH bucalpode ser alterado principalmente:
a) pelo pH de substncias introduzidas naboca, levando a alteraes
transitrias; porexemplo, quando ingerimos refrigerantes ou fru-tas
cidas e seus sucos, o pH cai para em tor-no de 3,0.
b) pela produo de cidos (ons H+) resul-tantes da fermentao
bacteriana de carboi-dratos.
O aumento da concentrao de ions H+ (ci-dos ionizados) o
responsvel pelo declnio dopH e os tampes servem para
contrabalanaressa alterao e estabilizar novamente o pH.
Quando o pH da saliva se torna cido, o onHCO3 associa-se com um
on H+ livre, pela aoda enzima anidrase carbnica, formando
cidocarbnico (H2CO3) e parte desse cido carbni-co se dissocia em
H2O + CO2. Assim, o on H+fica aprisionado na molcula de H2O,
deixandode acidificar o meio ambiente (Fig. 5.13).
Porm, quando a alterao de pH intensa efreqente, os tampes no
conseguem contra-balan-la; nesses casos, a microbiota pode
serprofundamente alterada, levando riscos para ohospedeiro. Sem
dvida, o risco mais bem co-nhecido ocorre quando o pH da placa
dentalpermanece cido durante muito tempo, porque aconsistncia
gelatinosa do biofilme retarda con-sideravelmente o ingresso da
saliva e de seustampes.
Toda vez que ingerimos acares, muitasbactrias da placa dental os
fermentam, produ-zindo cidos orgnicos que causam o declnio dopH da
placa. Quando o pH atinge ndices inferio-res a 5,5 e permanece
nesse nvel durante umtempo prolongado, essa acidez inibe
temporaria-mente o metabolismo da grande maioria das bac-trias da
placa. Durante todo esse tempo, ocor-re no biofilme dental a seleo
de bactriasacidricas ou acidfilas, como os EGM e os lac-tobacilos,
que so intensamente acidognicasmesmo em pH cido, causando a
desmineraliza-o do esmalte dental, ou seja, a leso inicial decrie
dental (ver Captulo 7 Cariologia: Etiopa-togenia da Crie
Dental).
Fluxo salivar: para que as substncias an-timicrobianas e a
capacidade tampo atuemcom eficincia, necessrio um fluxo sali-var
adequado. As glndulas salivaressecretam 1,0 a 1,5 litro de saliva
por dia,promovendo uma benfica lavagem damucosa bucal e da
superfcie dos dentes.Esta constante ao de limpeza remove re-sduos
alimentares e boa parte dos micror-ganismos no aderidos, que so
degluti-dos, impedindo que eles colonizem os te-cidos. A ao de
limpeza do fluxo salivar auxiliada, ao longo do dia, pela
mastigao
Fig. 5.13 Esquema do mecanismo bsico de tamponamento do pH cido
na saliva.
anidrase carbnica
HCO3 + H+ livre H2CO3 H2O + CO2
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e pelos movimentos musculares, que pro-movem aumento do fluxo
salivar, com aflu-ncia de todos os fatores que regulam amicrobiota
e que reduzem o nmero de mi-crorganismos.
Em contrapartida, quando dormimos, o fluxosalivar fica
extremamente reduzido, favorecendoum considervel aumento numrico de
microrga-nismos, fazendo aumentar o risco de crie den-tal e de
doenas periodontais. Da a extrema im-portncia de uma higienizao
bucal rigorosaantes de dormirmos, para diminuirmos o nmerode
bactrias e os nutrientes necessrios para seudesenvolvimento. Nas
ltimas dcadas, foi adi-cionada mais uma vantagem a esse
procedimen-to: os dentifrcios contm fluoretos e a estasesalivar faz
com que eles permaneam muito maistempo em contato com os dentes.
Alm da redu-o do fluxo salivar que ocorre quando dormi-mos, outros
fatores afetam consideravelmente ataxa de secreo do fluxo salivar,
conforme de-monstra a Tabela 5.1.
Fluido Gengival
No domnio subgengival, o principal fator re-gulador no a saliva,
mas o exsudato gengival,que resulta da resposta inflamatria
montadacontra a agresso das bactrias subgengivais.Esse fluido
existe mesmo em gengivas clinica-mente sadias, mas em quantidade
mnima, emquantidade fisiolgica suficiente para controlar
o nmero de bactrias presentes no mbitosubgengival. Mas medida
que o nmero des-sas bactrias vai aumentando, principalmentecomo
conseqncia de uma higienizao inade-quada, a resposta inflamatria
vai se tornandocada vez mais intensa. O aumento da permeabi-lidade
capilar traz como resultado a exsudaodo plasma sangneo (fluido
gengival) no tecidoe no sulco gengival.
Na condio de sade periodontal, o fluidogengival uma faca de dois
gumes para a mi-crobiota subgengival. Por um lado, uma exce-lente
fonte de nutrientes, principalmente de pro-tenas que favorecem o
desenvolvimento dasbactrias dotadas de metabolismo proteoltico.Em
contrapartida, um excelente recurso de de-fesa local: nele existem
fagcitos, anticorpos(principalmente IgG) e o sistema
complemento(C); alm disso, seu fluxo carrega bactrias noaderidas
para fora do sulco gengival, reduzindoo contingente microbiano
subgengival.
No entanto, quando se instala a inflamao,o exsudato gengival
torna-se mais favorvel paraas bactrias, inclusive patognicas, e
mais des-favorvel para o hospedeiro. O aumento de seufluxo faz com
que aumente a disponibilidade lo-cal de protenas; esta nova situao
favorece oaumento numrico de bactrias proteolticas,que tambm vo se
alimentar das protenas teci-duais como o colgeno. Alm disso, no
sanguee conseqentemente no fluido gengival, existemaltos teores de
hemina, de vitamina K (menadio-
Tabela 5.1Fatores Modificadores da Taxa de Secreo do Fluxo
Salivar
Fatores que afetam a taxa de fluxo salivar
Aumentando o fluxo Reduzindo o fluxo
Inflamaes agudas da boca, Climatrio como estomatites Diabetes
melito herptica e aftosa Hipotireoidismo Hipertireoidismo
Alcoolismo Retardamento mental Desnutrio e m nutrio (sndrome de
Down) Periodos febris Regurgitao cida Crises emocionais Erupo
dental Parotidite infecciosa (caxumba)
SialolitaseMedicao prolongada com anorexiantes,
anti-hipertensivos, antidepressivos,anti-histamnicos,
antiparkinsonianos, diurticos, anticolinrgicos etc.Supresses
permanentes por sndrome de Sjgren, radiaes teraputicas,extirpao
cirrgica das glndulas e paralisia cerebral
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na) e de hormnios como o estradiol e a proges-terona e essas
substncias so fatores essen-ciais para o desenvolvimento de P.
gingivalis,P. intermedia, espiroquetas e outras
bactriasperiodontopatognicas (Fig. 5.14).
Presena ou Ausncia de Dentes
Outro fator importante que influencia a com-posio da microbiota
bucal a presena ou au-sncia de dentes, condies j analisadas no
in-cio deste captulo.
Integridade dos Dentes e de seus Tecidosde Sustentao
Alm da presena dos dentes, muito impor-tante o seu grau de
integridade, incluindo o dosseus tecidos de sustentao
(periodonto).
Quanto aos dentes, cavidades de crie pos-sibilitam a reteno de
restos alimentares e demaior nmero de bactrias, especialmente
dasque necessitam de stios de reteno, como oslactobacilos. Alm das
cavidades, defeitos estru-turais, restauraes inadequadas com
excessoou deficincia de material, prteses em geral,apinhamentos
dentais e aparelhos ortodnticosso fatores que permitem o aumento da
microbio-ta bucal, aumentando o risco de crie dental parao
paciente.
Por outro lado, a microbiota subgengival so-fre grandes alteraes
qualitativas e quantitati-vas quando se forma a bolsa periodontal.
O sul-co gengival contm um nmero relativamentegrande de bactrias,
parte das quais anaerbia.Quando se forma a bolsa periodontal e
medi-da que ela se aprofunda, vai-se ampliando o cam-po fsico para
a instalao de um nmero aindamaior de bactrias, caracterizando a
alteraoquantitativa. A alterao qualitativa ocorre por-que, na
profundidade da bolsa, existe uma mni-ma tenso de oxignio molecular
(apenas 1 a2%), que favorece o amplo predomnio das esp-cies
anaerbias estritas sobre as demais. O teormdio de oxignio no ar
atmosfrico de 21%,
correspondente a 16mm de Hg; nas regies dodorso da lngua e dos
terceiros molares, o teorest reduzido metade (12 a 14%) e, na
bolsaperiodontal, a cerca de 1/10 (1 a 2%) (ver expli-cao no
Captulo 9 Microbiologia das Doen-as Periodontais).
Em qualquer nicho anaerbio, os compostosqumicos so mais
reduzidos (tm mais eltrons)do que oxidados, impossibilitando o
desenvolvi-mento dos aerbios. Eh (potencial de xido-re-duo) exprime
a tendncia de um meio ambien-te ou composto oxidar (retirar
eltrons) ou redu-zir (acrescentar eltrons) uma molcula. Tecidosou
microrganismos aerbios necessitam Eh+ e osanaerbios necessitam Eh-
(Treponema spp exi-ge 180mV). A placa dento-bacteriana inicialtem
Eh+ (200mV); devido ao consumo de O2 pe-las bactrias, o Eh cai para
0,0 em placas comtrs a cinco dias de evoluo; nas mais maduras,o Eh
cai para 112 a 141mV (anaerobiose). O Ehsempre diminui em locais
onde ocorre acmulode microrganismos, como a placa dental,
favore-cendo o desenvolvimento de anaerbios obriga-trios (sucesso
bacteriana).
Descamao Epitelial
Outro fator regulador importante na regula-o da microbiota a
descamao do epitliobucal. A mucosa a superfcie mais extensa danossa
boca, portanto a que fornece maiorcampo para a colonizao
microbiana. A mu-cosa protege todos os tecidos internos e essegrau
de proteo depende de seu teor de quera-tinizao, que muito varivel,
sendo nulo noepitlio do sulco gengival e atingindo o mximono palato
duro. Alm disso, depende, tambm,de sua constante descamao, pois
todos osepitlios so reciclveis: as clulas superficiaismais
envelhecidas vo sendo eliminadas, carre-gando consigo um nmero
enorme de microrga-nismos aderidos a elas. Esse um fenmenousado
para compensar o nmero de bactriasneoformadas e manter a microbiota
em nveiscompatveis com a integridade dos tecidos. Num
Fig. 5.14 Influncia da inflamao e do aumento do fluxo de
exsudato gengival sobre o risco de doenas periodontais.
Inflamao > fluxo de fluido gengival desequilbrio da
microbiota > risco de periodontopatia
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ecossistema equilibrado, uma virtude compen-sa uma deficincia;
assim, o epitlio do sulcogengival, para compensar a ausncia de
queratini-zao, tem um grau de descamao muito maiordo que o dos
outros epitlios bucais, renovan-do-se integralmente em quatro a
seis dias.
Dieta do Hospedeiro
um fator exgeno de extrema importncia naregulao particularmente
da microbiota supra-gengival. Tudo o que comemos ou bebemos
ficaretido na boca durante algum tempo, maior oumenor. Assim,
certos hbitos e comportamentosalimentares influenciam decisivamente
as com-posies quantitativa e qualitativa principalmen-te da placa
supragengival, que fica exposta dire-tamente aos resduos de nossa
alimentao. Ainfluncia mais bem conhecida diz respeito aosEGM, que
dependem de uma dieta rica em saca-rose para se desenvolverem na
superfcie dodente e, quando o fazem, produzem placas volu-mosas
conhecidas como placas cariognicas.Por outro lado, pessoas que
consomem peque-nas quantidades de sacarose tm, em seu biofil-me
dental, um domnio expressivo de S. san-guinis, S. gordonii e
Actinomyces spp, que soos principais colonizadores iniciais da
pelculaadquirida do esmalte e que no representam ris-co de
doenas.
Outra influncia pode ser determinada pelaslectinas
extracelulares. Como j analisamos,lectinas so adesinas proticas que
tm a capa-cidade de se ligar a resduos de carboidratos.Vrios dos
nossos alimentos contm lectinasque podem ligar bactrias s nossas
clulas epi-teliais ou superfcie dental, formando uma pon-te de unio
entre elas. Mas, s vezes, a lectina doalimento ocupa os receptores
teciduais destina-dos a ligar certas bactrias, dificultando
suasaderncias. Por exemplo, lectinas existentes noamendoim cru e no
germe de trigo fazem aumen-tar a aderncia de S. sanguinis.
Trabalhos de-senvolvidos em nosso laboratrio (Simionato etal.,
1994) demonstraram, in vitro, que a adern-cia de S. salivarius a
epitelicitos bucais incre-mentada por lectinas derivadas de
diversos ve-getais (amendoim, feijo, lentilha, abacate, bata-ta,
germe de trigo) e reduzida na presena dalectina do tomate. Por
outro lado, a adeso deS. mutans hidroxiapatita revestida por
saliva
significativamente favorecida pela lectina do to-mate e inibida
pela existente no abacate.
Um aspecto crtico da nossa dieta a suaconsistncia. Ces
alimentados com dieta pasto-sa formam placas muito mais volumosas e
de-senvolvem mais gengivites do que os alimenta-dos com rao
consistente, dura. Numerososestudos demonstraram, em humanos, o
maiorpotencial cariognico de alimentos pegajosos ecom alta
concentrao de acar. O estudo so-bre crie dental experimental em
humanos, reali-zado em Vipeholm (Sucia), comentado no Cap-tulo 7
(Cariologia: Etiopatogenia da Crie Den-tal), foi o primeiro a
mostrar a intensa cariogeni-cidade gerada por caramelos e balas
toffees, prin-cipalmente quando ingeridos ao longo do dia,nos
perodos entre as refeies principais.
Mas, sem dvida, o aspecto mais crtico dacariogenicidade a
ingesto de carboidratosfermentveis fora das refeies principais,
afreqncia de ingesto de alimentos cariogni-cos. Toda vez que
fizermos uso de carboidratosfermentveis, principalmente de acar, o
pH daplaca dental vai cair, ficar cido durante um bomtempo
favorecendo a desmineralizao do den-te (pH < 5,5) e, depois, vai
voltar ao normal, fa-vorecendo a remineralizao da leso. Se
istoacontecer trs ou quatro vezes ao dia, nas refei-es,
praticamente no vai haver problema, por-que o tempo de
remineralizao vai ser maior doque o tempo de desmineralizao. O
risco de c-rie dental aumenta significativamente quando apessoa
ingere produtos aucarados vrias vezespor dia, nos intervalos entre
as refeies, pois,nesse caso, o pH do ecossistema
saliva/placadental/superfcie dental ficar cido praticamenteo dia
todo, impedindo a remineralizao.
Qualidade da Higienizao Bucal
Outro fator exgeno de suma importncia aqualidade da higienizao
bucal, que consistena combinao do uso constante e adequado daescova
e do fio dental, da remoo peridica deplaca bacteriana e de trtaro
pelo profissional,alm de eventuais correes ortodnticas. A hi-giene
bucal, seguramente, o melhor meio demantermos a microbiota em
nmeros fisiolgi-cos, compatveis com a nossa sade. A limpezaperidica
do dorso da lngua, que pouca gentefaz, muito importante, porque a
lngua o gran-de depsito bacteriano da boca.
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Uso de Antimicrobianos
O uso de substncias antimicrobianas, embo-ra eventual, pode
interferir drasticamente no sen-tido de desequilibrar a microbiota.
Quando usa-mos determinado antibitico durante algum tem-po, esse
antibitico suprime um grupo de micror-ganismos mas no suprime
outros que, assim,so selecionados durante aquele tempo. Umexemplo
clssico refere-se utilizao de anti-biticos de amplo espectro de ao,
que supri-mem a grande maioria das bactrias de qualquerregio do
nosso corpo, abrindo espao para osuperdesenvolvimento de espcies
resistentes ede fungos como Candida albicans. Os antibi-ticos e os
antisspticos de uso local desequili-bram abruptamente a microbiota,
acarretando ris-cos para a pessoa; portanto, devemos desenco-rajar
o uso desnecessrio dessas substncias.
Fatores Sistmicos
A boca faz parte do universo do nosso cor-po, influenciando e
recebendo influncias deoutros sistemas do mesmo. Assim, a
microbiotabucal pode sofrer algumas modificaes em fun-o de alteraes
sistmicas fisiolgicas e pato-lgicas como:
Alteraes hormonais: na puberdade, soproduzidos hormnios sexuais,
que apre-sentam estrutura qumica semelhantes davitamina K
(menadiona), portanto favore-cem o desenvolvimento de alguns
patge-nos periodontais como Porphyromonasgingivalis, Prevotella
intermedia e A.actinomycetemcomitans. O aumento dataxa de
progesterona na gravidez, nas mu-lheres que tomam contraceptivos
orais enas que fazem reposio hormonal, favo-rece o desenvolvimento
de P. intermedia,predispondo ao aparecimento de gengivi-te, se a
mulher no executar eficiente con-trole de placa bacteriana.
RELAES INTERMICROBIANAS POSITIVAS ENEGATIVAS
A ecologia bucal altamente influenciadapelas relaes biticas
mantidas entre o grandenmero de espcies microbianas que constituema
microbiota bucal. Este estudo fundamentalporque, muitas vezes,
essas relaes repercutembenfica ou malevolamente no hospedeiro.
Relaes Positivas: Comensalismo eSinergismo (Protocooperao)
Como em qualquer outra microbiota, as rela-es mais comuns entre
as centenas de espciesda microbiota bucal so as relaes positivas,
asrelaes diplomticas como comensalismo e osinergismo. Em situao
normal, a microbiota for-ma uma comunidade socialista que acaba
be-neficiando todos os seus componentes. Alm deobter nutrientes a
partir da dieta e dos tecidosdo hospedeiro, as bactrias ainda so
alimenta-das por substncias produzidas por suas vizi-nhas,
estabelecendo uma complexa cadeia ali-mentar entre elas, que
caracteriza o comensalis-mo (Fig. 5.15).
Um excelente exemplo de relao sinrgicaocorre na placa
bacteriana, com implicaes noprocesso de crie dental. A placa contm
altosnmeros de Veillonella spp, uma bactria Gram-negativa que tem o
lactato como fator de desen-volvimento; mas apesar de serem
anaerbias es-tritas, essas bactrias no dispem das
enzimasglicoquinase e frutoquinase, portanto no con-seguem
fermentar carboidratos e, assim, no socapazes de formar o lactato
necessrio para elas.Vrias espcies de estreptococos esto presen-tes
em nmeros ainda maiores na placa; a maio-ria delas, principalmente
os EGM, apresenta me-tabolismo essencialmente sacaroltico;
conse-qentemente, fermenta diferentes carboidratosproduzindo
quantidades significantes de lactato(fermentao lctica) que so
liberadas na placa
Leucemia Diabetes Imunodeficincias Quimioterapia anticncer
Defeitos em neutrfilos e na quimiotaxia
reduo do fluxo salivar
maior risco de infeces
Estresse Diabetes melito insulino-dependente (tipo I) }
}
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dental. Assim, parte desses cidos pode seraproveitada para o
metabolismo das veillonellas,que se beneficiam desse
relacionamento. Mascomo se trata de uma relao sinrgica,
asveillonellas retribuem esse favor. Com exceodos EGM, a maioria
dos estreptococos, comoS. sanguinis, muito sensvel ao dos ci-dos,
tendo expressiva reduo do metabolismoem pH cidos. Como as
veillonellas metabolizamgrande parte do cido lctico, desdobrando-o
emcidos mais fracos e volteis como os cidosactico e propinico, o pH
no cai at os nveisintolerveis para os estreptococos e para a
gran-de maioria das bactrias do biofilme, que neleassim se mantm.
Mesmo os EGM, que soacidricos, so beneficiados, pois no suportampH
inferior a 4,0. Na verdade, os nossos dentestambm se beneficiam
dessa simbiose porque asespcies do gnero Veillonella, reduzindo
aquantidade de cido lctico na placa, contri-buem para diminuir o
risco de desmineralizaodo esmalte dental.
Relao Negativa: Antagonismo ouAntibiose
Uma comunidade bacteriana no estabeleceexclusivamente relaes
pacficas. Existem mui-tos mecanismos de antagonismo entre
seusmembros, sendo os mais conhecidos a competi-o por ocupao de
espao (receptores teci-duais), a competio por nutrientes e a
produode metabolitos txicos para outras espcies.Quanto a este
aspecto, vrios estreptococosbucais, como S. sanguinis, uma das
espciespredominantes na placa dental, produzem H2O2que inativa A.
actinomycetemcomitans, um pat-geno muito agressivo para o
periodonto de adul-tos e, principalmente, de jovens. Este
antagonis-mo bilateral, pois A. actinomycetemcomitanstambm inibe
estreptococos bucais, tanto assimque, nas faces dentais proximais
corresponden-tes s leses de periodontite agressiva localiza-da
(antes de 1999 denominada periodontite juve-nil localizada),
dificilmente so encontradas le-
Fig. 5.15 Cadeia alimentar entre importantes componentes da
placa dental madura.
StreptococcusActinomyces
Lactato
Succinato Treponema IsobutiratoPutrescina
PABA
NH4
CO2
AcetatoFormiato
Veillonella
Vrios Gram-positivos
H2
HeminaMenadiona
FusobacteriumEubacterium
S. mutans
CapnocytophagaEikenella
A. actinomycetem-comitans
FusobacteriumEubacteriumBacteroides
Peptostreptococcus
CampylobacterWolinellaB. gracilis
P. gingivalisP. intermedia
P. endodontalis
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ses de crie dental. Em nosso laboratrio, DeLorenzo, Campos e
Silva Jr. (1981) demonstraram,in vitro, que o pigmento produzido
por patge-nos Gram-negativos anaerbios estritos na po-ca
denominados Bacteroides melaninogenicus(na atualidade,
Porphyromonas spp e Prevo-tella spp) inibe o desenvolvimento de
S.mutans (Fig. 5.16). No prximo item, sero ana-lisados outros
exemplos de grande importnciapara o hospedeiro.
RELAES ENTRE A MICROBIOTA BUCAL E OHOSPEDEIRO: BENEFCIOS E
PREJUZOS
A relao normal estabelecida entre a micro-biota e o hospedeiro
uma coexistncia pacfi-ca, uma convivncia harmoniosa que ocorre
ge-ralmente sem prejuzo para nenhuma das partesenvolvidas.
Benefcios da Microbiota para oHospedeiro
Alm de geralmente no ser prejudicado pe-las diferentes
microbiotas locais, o hospedeiro claramente beneficiado por elas,
sob algunsimportantes aspectos. O melhor exemplo queconfirma esta
assertiva a inequvoca e decisi-va contribuio da microbiota indgena
para adefesa biolgica da boca. Esses microrganis-mos j esto
assentados, em altos nmeros,nesse terreno e o defendem contra a
invasodos sem-terra aliengenas. Para que umpatgeno exgeno consiga
instalar-se na boca,ele tem que competir com a microbiota
previa-
mente instalada e essa luta no nada fcil parao invasor. Ele tem
que competir por receptoresj ocupados, competir por nutrientes, e,
almdisso, enfrentar a antibiose comentada no itemanterior.
Um exemplo magnfico refere-se a S. pyoge-nes (beta-hemoltico,
grupo A de Lancefield), umimportante patgeno que causa
freqentesdoenas em estruturas contguas boca comofaringe e tonsilas,
mas que muito raramente seinstala em nossa boca. Isto porque na
microbiotabucal existem vrias espcies antagnicas aS. pyogenes.
Alguns estreptococos bucais (bac-trias do mesmo gnero) produzem
vrias subs-tncias, genericamente chamadas de bacterio-cinas, que
inibem S. pyogenes.
Uma bacteriocina bem conhecida a mutaci-na, elaborada por S.
mutans e que inibe o desen-volvimento de S. pyogenes,
Staphylococcusaureus, S. sanguinis e A. naeslundii. S. sali-varius
produz bacteriocinas contra S. pyogenese A. naeslundii.
Lactobacillus spp elabora bac-teriocinas contra S. pyogenes, fungos
e entero-bactrias.
A microbiota bucal tambm contribui para anutrio do hospedeiro,
produzindo, por exem-plo, vitaminas que so constantemente
degluti-das pelo hospedeiro. Este fato no deve causarsurpresas,
pois h muito se sabe que a microbio-ta intestinal sintetiza e
excreta grandes quantida-des de vitaminas do complexo B e de
vitamina K,que so absorvidas pelo homem, que no tem acapacidade de
sintetiz-las.
As enzimas (proteases, sacarases, lipasesetc.) produzidas por
essas bactrias e constan-temente deglutidas tambm devem
contribuirpara nosso processo digestivo. Essa contribui-o deve ser
to eficiente que animais isentosde germes, portanto desprovidos de
enzimasbacterianas, necessitam de uma quantidade dealimento quatro
vezes maior do que os animaisconvencionais.
Microrganismos instalados nas diversas mi-crobiotas contribuem,
por outro lado, para o de-senvolvimento de determinados rgos e
teci-dos. Em animais isentos de germes, constatou-se ausncia de
desenvolvimento normal do sis-tema linftico e do intestino; a
ausncia de mi-crorganismos resulta em ausncia de estmuloimunognico,
conduzindo atrofia, por hipofun-o, dos rgos imunitrios fundamentais
para adefesa do hospedeiro.
Fig. 5.16 Inibio do desenvolvimento de S. mutans ao re-dor de
colnias previamente desenvolvidas de bacilosperiodontopatognicos
Gram-negativos anaerbios produtoresde pigmento negro (De Lorenzo,
Campos e Silva Jr., 1981).
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Prejuzos da Microbiota para oHospedeiro
De acordo com o analisado, em condiesnormais, homeostticas, a
microbiota comensalauxilia o hospedeiro em vrios aspectos. No
en-tanto, em circunstncias especiais, o equilbriobiolgico pode ser
severamente rompido, permi-tindo o aumento numrico de algumas
espciespatognicas e resultando em prejuzo para a sa-de do
hospedeiro. A maioria dos microrganismospatognicos para nossa boca
faz parte da micro-biota residente, mas em pequenas
proporesrelativas (< 1,0% da microbiota total), em nme-ros
insuficientes para lhe causar dano. O nme-ro desses microrganismos
s aumenta como re-sultado de um desequilbrio ecolgico. O proble-ma
que, agora em altos nmeros, esses micror-ganismos, conhecidos como
oportunistas oupatgenos potenciais ou mais adequadamentecomo
anfibiontes (Rosebury, 1962), conseguemexpressar a sua virulncia.
So eles os respons-veis pelo aparecimento das doenas
infecciosasendgenas da boca, tais como crie dental, dife-rentes
doenas periodontais, perimplantites in-fecciosas, pulpopatias
infecciosas e periapicopa-tias, candidase, actinomicose etc. Essas
doenasso chamadas de endgenas porque no neces-sitam da instalao de
nenhum microrganismoaliengena; os patgenos se encontram
normal-mente na boca, mas em pequeno nmero, umnmero restringido
pelas defesas locais.
Como exemplos de anfibiontes bucais devi-damente reconhecidos
citamos os estreptococosdo grupo mutans, Lactobacillus spp, A.
naes-lundii, P. gingivalis, A. actinomycetemcomitans,B. forsythus,
P. intermedia, P. endodontalis, A.israelii e C. albicans.
As doenas infecciosas endgenas apresen-tam algumas
caractersticas especiais que as di-ferenciam das exgenas:
1a) Seus agentes etiolgicos fazem parte damicrobiota residente,
portanto esto presentestanto no estado de doena como no de
sade,embora em nmeros diferentes, ou seja, em dife-rentes propores
relativas.
2a) Normalmente necessrio um grandenmero de anfibiontes para
desencadear a le-so.
3a) O aumento da populao dos anfibiontesresulta da interferncia
de fatores predisponen-tes inerentes a cada doena e so
justamente
esses fatores predisponentes que causam o rom-pimento do
equilbrio biolgico.
4a) As doenas geradas por presena de bio-filme (crie,
periodontopatias e perimplantites)geralmente demoram para se
evidenciar clinica-mente aps a infeco se instalar, e seus cursosso
lentos.
5a) Induzem a baixa imunidade clnica, por-tanto se repetem, s
vezes, com elevada freqn-cia ao longo de nossa vida.
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