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O BINMIO PROFESSOR-ALUNO: REFLEXES SOBRE
PAPEIS E INTERAES SOCIAIS ENTRE OS ATORES DESTA
RELAO
Pedro Colombaroli Zoppi - bacharel em Letras (latim-portugus)
pela UNESP Araraquara,
Acadmico do Curso de Direito do Centro Universitrio Estcio
Uniseb de Ribeiro Preto.
Elizabete David Novaes doutora em Sociologia pela Unesp
Araraquara; docente do Centro
Universitrio Estcio Uniseb de Ribeiro Preto.
A lua, o luar: vejo esses vaqueiros que viajam a boiada,
mediante o madrugar,
com lua no cu, dia depois de dia. [...] Mestre no quem sempre
ensina, mas
quem de repente aprende. Por que que todos no se renem, para
sofrer e
vencer juntos, de uma vez? Grande Serto: Veredas
Resumo
O presente trabalho intenta situar a relao professor-aluno como
relao essencialmente
humana. Para tanto, parte de uma compreenso sociolgica a
respeito da educao, e
subsequentemente volta-se para uma reflexo de esteio
psicanaltico, buscando entender a
relao professor-aluno a partir de uma teia de reflexes que
enriqueam a prtica docente.
Palavras-chave: Educao. Relaes humanas. Docncia. Aprendizado.
Psicanlise.
Sociologia.
Abstract
The present work intends to situate the relationship between
teacher and student in the human
sphere through a psychoanalytical basis. Moreover, sociological
concepts will be used in order
to make an epistemic counterpoint. As a result, very important
reflexions and statements on the
problem are expected to be made, therefore enriching the
teaching practice.
Keywords: Human relationships. Education. Teaching. Learning.
Psychoanalisis. Sociology.
Introduo
Existe uma gama de constantes e padres no ser humano e em sua
interao com o
outro, assim, no sem razo que Terncio celebrizou a frase sou
humano: nada do que
humano me alheio.
Como conjecturou Freud, o cerne da psique humana perpetrado pelo
incessante
conflito entre (ros) e (Thnatos), o amor (enquanto vida, criao,
preservao)
e a morte (destrutividade, tendncia de retorno ao inanimado), as
duas vertentes de nosso
universo pulsional (FREUD, 2004a). Na formao anmica do homem, h
processos vivenciais
e condies existenciais que transcendem s culturas e teia do
tempo, ainda que por eles sejam
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esculpidos e caracterizados. Trata-se do que Guimares Rosa, em
Grande Serto: Veredas,
to belamente chamou de [...] homem humano... Travessia (2006, p.
608).
No bojo do humano, o pensador destaca a presena marcante de
fenmenos
edificadores e norteadores do indivduo, como as pulses, o
Complexo de dipo, as intrincadas
relaes objetais, a transferncia, a contratransferncia, o
recalque, a sublimao, o
deslocamento, entre outros mecanismos de lida e interao com a
prpria psique e com o meio
externo.
No meio externo, o sujeito se defronta com um duro e constante
desafio: o outro;
que constitui o cerne do paradoxo ontolgico to caracterstico sua
natureza. Como bem
definiu W. Bion: O ser humano s e dependente. Tal condio ambgua,
dplice, deixou
lastros e marcas particulares em uma dimenso imemorial de nosso
passado originrio ecoando
no presente, a saber: a forja de nossa memria filogentica, o
registro mais atemporal da
evoluo humana, em cujo imo encontra-se uma das relaes
intersubjetivas mais universais; e
que figura como objeto do presente estudo: a relao entre mestre
e aprendiz, professor e aluno.
luz deste breve panorama introdutrio, apresenta-se a seguir uma
reflexo acerca
da construo da identidade, da dinmica intersubjetiva e do
soerguimento de conhecimento na
relao educativa, o que se faz, a princpio, por meio de uma
abordagem sociolgica, que se
desdobra posteriormente numa abordagem psicanaltica a respeito
da relao professor-aluno.
1. A Escola e a Socializao do Indivduo
A sociologia da educao vem se dedicando, desde as contribuies
clssicas de
Emile Durkheim, tentativa de entender a escola e seus agentes,
dentro de um contexto mais
amplo, qual seja, a sociedade da qual participa e se insere.
Como cincia social, a sociologia estuda essencialmente as formas
de
relacionamento entre os grupos, assim como as consequncias dessa
relao, voltando seu
objeto para as diferentes formas de interao social (SIMMEL,
2006). Desta forma, tendo como
principal alvo o estudo da sociedade, a sociologia percebe a
educao como uma forma valorosa
de relacionamento entre as pessoas, buscando compreender melhor
o comportamento dos
grupos sociais e, por conseguinte, as relaes entre agentes
escolares.
Como mencionado, Emile Durkheim apresenta-se classicamente como
um dos
principais socilogos a se preocupar com tal temtica,
especialmente voltado para a questo da
socializao do indivduo, enfatizando o papel que a escola possui
neste processo. Em obras
como Educao e Sociologia (1978), A Evoluo Pedaggica na Frana
(1995) e Educao,
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Moral e Sociologia (2001), considera o autor que a escola se
coloca como uma instituio
fundamental para formao do indivduo, medida que a escola e a
sociedade interagem e se
completam.
Vendo a sociedade como um organismo em funcionamento, em que
diversas partes
trabalham conjuntamente para um objetivo final, a escola aparece
como uma instituio que
reflete as condies sociais da realidade em que se insere. Assim,
cabe escola socializar o
indivduo, transmitindo-lhe e inculcando-lhe as regras sociais
atravs da reproduo dos hbitos
e valores.
Numa viso semelhante, Talcott Parsons, especialmente na obra A
Estrutura da
Ao Social (1937), trouxe a percepo de que processo de socializao
do indivduo permite
que este aprenda a desempenhar determinados papis sociais,
possibilitando que este
aprendizado leve formao de uma determinada personalidade. Isto
ocorre porque a educao
leva o indivduo a internalizar as normas sociais, permitindo que
seja formada uma determinada
identidade social.
Percebe-se como resultado, evidenciado tanto por Durkheim quanto
por Parsons,
que a educao, como processo de socializao, capaz de moldar os
seres sociais, favorecendo
a manuteno da vida social, exercendo assim uma funo dentro de
uma sociedade, que se
tornou historicamente mais complexa, especialmente por
decorrncia da diviso do trabalho.
Vale resgatar, para efeitos desta reflexo que aqui se faz,
algumas linhas de
pensamento que se voltaram a entender os processos de socializao
a partir de uma perspectiva
microssociolgica, enfatizando o cotidiano dos indivduos e suas
aes sociais, colocando como
objeto especial nesta perspectiva, as interaes sociais e o
estudo dos grupos sociais. Tal
abordagem, embora prpria da psicologia social, possibilita que a
anlise das relaes entre
mente e sociedade tambm faa parte dos estudos sociolgicos acerca
do meio familiar, do meio
escolar, dentre outros.
Vrios autores permitem diferentes ensaios sobre a aproximao
entre indivduo e
sociedade, evidenciando que ao tratar de questes sociais, no se
pode limitar ao estudo do
indivduo, dado que existe algo que se sobressai a ele, resultado
das diferentes formas de
interao social. Como expressa Simmel (2006), trata-se da sociao,
conceito que, para
Simmel, demonstra que a sociedade no uma realidade em si mesma,
ela , de fato, resultado
da interao entre os dois polos (indivduo e sociedade).
Numa perspectiva microssociolgica encontra-se George Herbert
Mead, que,
especialmente por meio da obra Mind, Self, and Society (1932)
aborda os processos de formao
file:///C:/wiki/Talcott_Parsonsfile:///C:/wiki/Papel_socialfile:///C:/wiki/Aprendizadofile:///C:/wiki/Personalidadefile:///C:/wiki/Identidade_socialfile:///C:/wiki/Microssociologiafile:///C:/wiki/A%25C3%25A7%25C3%25A3o_socialfile:///C:/wiki/Intera%25C3%25A7%25C3%25A3o_socialfile:///C:/wiki/Grupo_socialfile:///C:/wiki/Psicologia_socialfile:///C:/wiki/George_Herbert_Mead
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da subjetividade (Self) a partir da capacidade dos indivduos de
se representarem no lugar do
outro (o Outro generalizado).
Representando a microssociologia americana, encontra-se uma
importante
contribuio em Erving Goffman, notadamente na obra A Representao
do Eu na vida
Cotidiana (2009), em que o autor aborda as interaes sociais
entre indivduos, segundo a
perspectiva da micro-interao, ou seja, aquela que se expressa
entre um pequeno grupo, num
momento e num espao especficos. De acordo com esta perspectiva,
os indivduos emergem
como atores sociais, que desempenham papeis sociais decorrentes
das interaes face-a-face.
Segundo esta perspectiva, pode-se considerar a interao
professor-aluno como um
encontro de interao, em que as partes procuram obter informao a
respeito do outro,
buscando antecipar ou estabelecer as expectativas em relao ao
outro. Cada parte, em meio a
interao que se estabelece, busca definir (consciente ou
inconscientemente), qual a maneira de
agir ser eleita. Em outros termos, os sujeitos definem qual o
personagem que iro incorporar
ao longo da interao que estabelecem.
Na interao professor-aluno, observa-se um encontro, no qual se
estabelece um
contato face-a-face das partes envolvidas, que se ajustam aos
papeis a serem desempenhados.
Observa-se, assim, que embora exista um processo de socializao
promovido pela escola, que
inculca valores e padres nos alunos, a interao social expressa
um processo ativo, em que as
partes constroem modelos de conduta, de pertencimento e de
expresso social.
Resta evidente que as relaes entre agentes escolares, mais
especificamente entre
professor-aluno, por serem relaes humanas, so, sem dvida, relaes
complexas. Tais
relaes envolvem conflitos, interesses, intenes, nem sempre
claras para nenhuma das partes
envolvidas em tal interao.
Como se observa, isoladamente, a sociologia no d conta de
compreender tais
relaes, o que na realidade, no se pode fazer por meio de nenhuma
cincia isolada, seno
recorrendo s contribuies dos dilogos interdisciplinares. o que
se busca fazer a seguir,
resgatando as reflexes decorrentes da psicanlise.
2. A relao Professor-Aluno sob a tica Psicanaltica
Intenta-se neste tpico compreender teoricamente a dinmica da
sala de aula, sob a
tica psicanaltica dando foco especial aos conceitos freudianos,
no alijando, contudo, os
desenvolvimentos posteriores das sendas desbravadas por Freud;
isto , no seria possvel
excluir as contribuies seminais de psicanalistas como Anna
Freud, M. Klein e Bion de nossa
file:///C:/wiki/Self
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base terica uma vez que, aps pesquisa preliminar, constatou-se
ser enriquecedora no
mergulho descritivo da alma humana.
Buscando uma leitura mais penetrante da obra freudiana, sempre
positivo
trabalhar com os textos originais1, uma vez que, como assinalou
Bruno Bettelheim em seu s
de percucincia e sensibilidade, Freud e a alma humana, as
tradues sobretudo a inglesa
so seriamente defeituosas em importantes aspectos e tm levado
formulao de concluses
errneas, no s a respeito do homem Freud, mas tambm no que diz
respeito psicanlise
(1982, p. 7).
Para o presente trabalho, pois, fundamental levar em conta a
dimenso
humanstica, filosfica - e no exclusivamente cientfica - dos
escritos freudianos2, mesmo no
sendo os autores deste artigo especialistas da rea.
2.1 A construo da identidade
Freud coloca a frustrao provocada pela falta do objeto materno
que M. Klein
(1959) posteriormente reviu e aprofundou como a dicotomia
infante/seio materno como a
ausncia primria, gerativa de perambulaes subsequentes e
consequncias permanentes na
vida psquica do indivduo. A falta do objeto em questo mobiliza e
estrutura no sujeito
processos compensatrios e substitutivos, ensejando o processo de
individuao (a
diferenciao primordial entre o Eu e o Outro), de simbolizao e,
por fim, de pensamento na
mente da criana (BION, 1994).
Portanto, na esfera da frustrao e da ausncia que surge a
primeira necessidade
de busca de conhecimento e, mais que isso, se desenvolve o
Instinto Epistemoflico; e a partir
da distino primeva entre o Eu e o Outro que se principia a linha
reflexiva acerca da questo
proposta3.
Contudo, no de todo vlido tentar prolongar esta etapa
singularista de nossa
proposta terica. Sobretudo quando se estuda a relao
mestre-aprendiz, a contemplao isolada
de um Eu e um hipottico alijamento do Tu so infrutferos,
estrdios. Fundamental na anlise
que ora se apresenta o esmiuamento dos meandros da
intersubjetividade. Figurativamente:
seria possvel pensar isoladamente em Dom Quixote e Sancho Pana?
Sim. Mas apenas
1 A Fischer Verlag, atualmente, detm os direitos de publicao em
alemo da obra do pensador. 2 No se trata apenas dos clssicos
empecilhos de traduo, como Unbehagen, Trieb, Seele, entre outros
que
exigem extensas notas de rodap, mas de ter compreenso lmpida de
um corpus extremamente denso.
3 Klein, no captulo Sobre Identificao (1975, p.74), prope que na
emergncia da ansiedade depressiva no
beb, em consequncia de uma maior capacidade de integrao de
ambivalncias vivenciadas nas relaes objetais,
que se estrutura o processo de simbolizao e se originam as
primeiras instigaes epistemoflicas.
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superficialissimamente uma distino tal concebvel. Quanto mais
nos afastamos de Sancho
Pana e perdemos o fio do dualismo, menos conhecemos sobre seu
mestre. Em suma: trata-se
de um problema que, em sua plenitude, apenas ganha vigor e
luminosidade sob o prisma
dialtico. O dilogo entre bacia do carbeiro e o elmo de mambrino
(SAAVEDRA, 2004, p.
463-473) revela a essncia interacional de nossa identidade e a
inevitabilidade de se voltar o
olhar relao humana como via summa de acesso a um suposto Eu.
Apesar disso, ao passo que se versa sobre a identidade dos
elementos humanos
envolvidos na trama educacional, acrescenta-se simultaneamente
um parecer crtico sobre o
conceito psicanaltico envolvido, valendo-nos, para tanto,
indicao de especialistas
consultados, do Dicionrio de Psicanlise de Roudinesco e Plon
(1998), alm da prpria obra
de Freud e de alguns ps-freudianos, que perambulam pelas citaes
literais e pelas entrelinhas
deste artigo. Destarte, objetiva-se maior coerncia e sustentao
para o gradeado de
pensamentos aqui colacionados.
O encargo de professor dos mais rduos que h. Contudo, precedendo
prxis
educativa, h consideraes de natureza idiossincrtica, ontolgica
(numa acepo mais livre),
a se tecer questionamentos que identifiquem constantes de
identidade, trazendo luz
posteriormente perscrutao da vivncia da subjetividade e da
intersubjetividade, a saber: o
que ou, antes, quem o professor? O que caracteriza sua condio
(qui, essncia) de
mestre? E, fundamentalmente: quais seriam as condies de
existncia, num sentido identitrio,
do mestre? Em suma, como situar o docente, em sua plenitude, na
esfera do humano?
O dilema da individualidade frente coletividade onipresente na
literatura
universal e foi, talvez, Shakespeare quem melhor o sintetizou,
quando atribui a Rei Lear a
indagao quem que pode me dizer que rei sou eu?. No original, a
pergunta composta s
por monosslabos, o que salienta o sentimento de solido de quem
busca o prprio eu: Who is
this that can tell me who I am?.
A princpio, h que se ressaltar que, sob a tica psicanaltica, o
professor , antes
de tudo, um ser humano cujas circunvolues inconscientes o
motivaram ao ofcio em questo4.
Ora, isso representa um investimento alto de afeto em dois
objetos, a saber o aluno (figurando
no papel do Outro) e o conhecimento (a ponte ou via conectiva).
a catexia ou investimento
que todo mestre perfaz; sendo em absoluto cabvel aqui mencionar
a definio de um conceito
4 Segundo Boholavsky (apud SILVA, 1994, p.13), a escolha
profissional est relacionada com as primeiras
figuras de identificao, identificaes estas no distorcidas,
dependendo de uma boa integrao dos objetos
internalizados, da elaborao dos conflitos. Anlise e sntese,
frutos da integrao das identificaes, permitem
que o ego confronte fantasia e realidade. [...] Portanto, quem
escolhe no est escolhendo somente uma carreira,
[...] est pensando num sentido para a vida.
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to psicanaliticamente essencial: [...] mobilizao da energia
pulsional que tem por
conseqncia ligar esta ltima a uma representao, a um grupo de
representaes, a um objeto
ou a partes do corpo. No Brasil, usa-se tambm [o termo] catexia
(ROUDINESCO; PLON,
1998, p.398).
Assim sendo, consoante o modelo at aqui elaborado, a natureza
humana do
professor e de sua escolha e vivncias enquanto tal fatalmente o
leva a defrontar-se com
seus desejos, convices e aspiraes; de modo que seja
absolutamente inevitvel que, permeio
o contato com o Outro e sob as obrigatoriedades regenciais do
sistema escolar, ele no vivencie
o sentimento de quebra de expectativa e frustrao, em algum grau.
Essa, supe-se, a segunda
tnica identitria do mestre.
Evidentemente, tudo isso faceia seu receptor: o aluno; uma vez
que todo seu labor
e aspiraes e convices e nsias sero postos frente ao e s vezes em
coliso com o
aprendiz. No caso tentador de imp-los em vez de prop-los,
elimina-se a individualidade do
aluno e a reciprocidade constitutiva da relao saudvel e
transforma-se o processo educativo
em martrio silente5.
Como situar, nesse nterim, o aluno? Sem dvida, h uma comunho
identitria com
o professor no sentido de ambos terem voz e aspiraes e desejos.
So humanos. No entanto,
pela prpria origem e desenvolvimento do instinto epistemoflico
(KLEIN, 1959), a busca pelo
conhecimento , por natureza, tendente ao caos, desregrada,
anrquica, provida de imensa carga
libidinal. Diante disto, pode-se concluir que a catexia
intrnseca condio de aluno dirigida
ao conhecimento, que o enleia ao mestre.
Nessas circunstncias, constata-se que h uma via transferencial
de mo dupla em
ao no decorrer do processo educativo. Por transferncia,
designa-se
... um processo constitutivo do tratamento psicanaltico mediante
o qual os desejos
inconscientes do analisando concernentes a objetos externos
passam a se repetir, no
mbito da relao analtica, na pessoa do analista, colocado na
posio desses diversos
objetos [...] O termo transferncia no prprio do vocabulrio
psicanaltico.
Utilizado em inmeros campos, implica sempre uma ideia de
deslocamento, de
transporte, de substituio de um lugar por outro, sem que essa
operao afete a
integridade do objeto (ROUDINESCO; PLON, 1998, p. 766-767)
Freud, nas Cinco lies de Psicanlise, publicadas em 1910, prope
que a
transferncia no advm do trabalho realizado em setting
psicanaltico. O fenmeno emerge
naturalmente na interao humana, evocando vivncias da esfera
inconsciente, trazidas ao palco
5 Silva (1994, p.12) de igual parecer: Na dinmica da
transferncia, que se estabelece na relao professor-
aluno, tanto pode emergir uma relao construtiva que possibilite
o desenvolvimento do ato educativo quanto
possvel que se estabelea uma relao de poder, negativa, por parte
do professor, um mau uso do lugar que ocupa.
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do dilogo e projetadas no interlocutor. Couto (2003) argui de
maneira categrica a importncia
de se pensar a fundo um fenmeno to recorrente no processo
dialtico do aprendizado:
'Necessidade inevitvel, a transferncia surge espontaneamente em
todas as
relaes humanas, reinstalando os equivalentes simblicos do desejo
sexual infantil
inconsciente que transitou pelo circuito sedutor me-filho, e
invocando, nas
subjetividades que se encontram, algo que falta. Esses fenmenos
vividos e
teorizados por Freud parecem ser o ncleo de uma questo que
circula entre
educadores e psicanalistas: o fenmeno transferencial na relao
professor-aluno
(p.75-76; nossos grifos)
O mestre, por conseguinte, representa simbolicamente a figura
materna e
paterna ao aluno. Da me, toma o afeto e os cuidados; do pai, a
autoridade que garanta a ordem
e o bom andamento da educao remetendo conformao do superego
(FREUD, 1992a).
Portanto, uma vez que a busca discente anrquica, cabe ao mestre,
enquanto representativo
do pai, conter os mpetos caticos do aprendiz; sem deixar,
figurando no papel materno, de
respeitar, valorizar e canalizar a fora inerente ao caos, no af
de construir o conhecimento.
Mas, j mencionada a reciprocidade transferencial, o que
representaria o aluno ao
mestre? O aluno personifica a criana em busca de conhecimento
que o mestre traz em si: no
mbito da relao, h um mergulho, uma tentativa inconsciente de
resgate duma parte de si
mesmo. Silva (1994, p.31) observa que o professor tenta
despertar nos alunos a mesma
curiosidade epistemoflica que produziu nele o desejo de
aprender. E o processo de reparao
dos objetos primitivos perdidos na infncia repete-se, sendo
recriado no incio de cada ano, a
cada turma de novos alunos. Couto (2003, p. 81-82) leva adiante
a perscrutao do lao:
Professor e aluno esbarram um no outro como mulher-me. Essa
relao tambm
veicula significantes enigmticos que envolvem o aprendiz e o
mestre no significante
da dvida o outro, que quer de mim? [...] O ato de ensinar marca
a fogo essa mesma
pergunta, reinstalando-a. O desejo, eco da natureza no
conclusiva dessa pergunta,
deve continuar em aberto, diz Lajonquire.
Trata-se, portanto, da conjuno ideal para que se perfaa a
dialtica educacional;
conjuno esta que introduz um dilema: havendo o imbrglio
transferencial j mencionado
(que, na prtica, no se desenrola la perfection, como se mostrar
a seguir), o inconsciente
presente na vida do indivduo e o aluno diante do mestre, ser
possvel que as partes entrem
num acordo, abrindo mo de seus mais ardentes desejos ss em prol
do dilogo na relao? Em
outras palavras, levando em considerao a problemtica desfiada,
possvel que o professor
abra mo de suas utopias e o aluno, de seu caos-curiosidade em
nome dalgo maior, qual seja:
a dialtica do saber?
2.2 As interaes entre as Individualidades
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Quem abdica? Quem fala? Como conjuminar as individualidades?
Trata-se do
dilema das vozes constitutivo da educao: concomitantemente fala,
o indivduo v-se s
voltas com a necessidade de ouvir; isto , h um alijamento do
monlogo em prol do dilogo;
h uma oscilao dialgica entre a perspectiva de receptor e
emissor, que, na prtica,
dificlima.
Comungando da condio de seres humanos, relevo irregular em
abismo, de que
forma professor e aluno entram em acordo, se que ele possvel? O
complexo dilema das
vozes, envolvendo dois referenciais subjetivos (aprendiz e
mestre) e uma via de interseco (o
conhecimento) sem entrar a fundo na ideia de inconsciente
configura o que alguns usaro
como mais um argumento para afirmar que a educao, do ponto de
vista da psicanlise, uma
tarefa impossvel (KUPFER, 1992, p.50).
O dilema das vozes talvez a mais primordial barreira interativa
no panorama
estudado. Contudo, h inda outro. Psicanaliticamente, o mais
digno de nota a
contratransferncia a rigor concebida como fenmeno intrnseco ao
processo analtico, mas
que se utiliza em sentido lato , a saber:
Conjunto de manifestaes do inconsciente do analista relacionadas
com as da
transferncia de seu paciente [...], que se instala na pessoa do
mdico atravs da
influncia do paciente na sensibilidade inconsciente do mdico.
Estava prximo o
momento, acrescentou Freud, em que seria lcito formularmos a
exigncia de que o
mdico reconhea e domine obrigatoriamente em si essa
contratransferncia'
(ROUDINESCO; PLON, 1998, p. 133)
O intento aqui transpor esse insight obtido em espao teraputico
para a relao
professor-aluno. imprescindvel, porm, pausar os pormenores de
nossa reflexo psico-
educacional e inquirir: at que ponto uma dita transposio
conceitual vlida, j que as
investigaes da psicanlise ocorrem em espao analtico? Ou, antes,
como se deve facear, no
plano hipottico, o modelo a que se busca chegar? Em outras
palavras: a trama dos conceitos
psicanalticos densa, complexa, bem elaborada, mas seu espao de
concepo e aplicao,
primordialmente, concerne teoria e prtica clnicas. Como aplicar
tal trama num sentido mais
amplo, no intento de ponderar sobre a dialtica educacional?
Ora, at mesmo Freud, ao publicar Zur Psychopatologie des
Alltagslebens
(1992c)6, deixou claro que a psicanlise muito mais abrangente
que uma simples cincia em
busca da compreenso e cura da dor humana; trata-se, antes, de um
sistema de pensamento
6 Comumente traduzido por Psicopatologia da vida cotidiana. Os
tradutores da edio Standard simplesmente
ignoraram o Zur contido no ttulo original, que, expressivamente,
mostra como o autor deixava claro que seu
intento era refletir sobre suas teorias, no havendo, portanto, o
propsito de cunhar axiomas cientficos. Freud era
um pensador da alma humana. Uma traduo mais fiel seria
[Reflexes] Acerca da psicopatologia da vida
cotidiana (BETTELHEIM, 1982, p.98-100)
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visando redefinio e ao aprofundamento da prpria noo de ser
humano, proporcionando
assim novas ferramentas para que o homem conhea a si mesmo ou
conhea a prpria
ignorncia7 , esclarecendo os conflitos e dualidades atrelados
sua natureza e, portanto,
mudando o trato mais profundo que se tem consigo mesmo e com o
outro. Portanto, a
psicanlise pode e deve ser considerada como novo sustentculo e
amparo para outras doutrinas
e circunstncias que digam respeito ao homem. A educao, para o
autor, segundo Kupfer,
uma delas: [...] as ideias freudianas sobre educao encontram-se
em ntima conexo com as
ideias por ele produzidas para compor sua teoria psicanaltica
(1992, p.12-13).
Desse modo, esclarece-se o intento de perscrutar o que h de
humano na esfera
educativa, inserindo, no lugar do duo paciente-analista, uma noo
mais genrica de Eu-Outro;
sendo de todo cabvel, pois, retomar o modelo transferencial
construdo e refletir sobre seu
contraponto, ou seja, a contratransferncia. Ou ainda: constatar
a incompatibilidade entre
psicanlise e educao.
Enquanto arcabouo de paixes humanas, o aluno desperta no mestre
um sem-
nmero de sentimentos, tais como amor, dio, inveja, ternura,
curiosidade, asco, frustrao,
realizao, entre outros componentes afetivos inerentes a toda e
qualquer relao a dois. Ao
professor, cabe, pois, absorver a carga afetiva e saber
trabalh-la em si; isto , metaboliz-la a
fim de que se sustente uma relao saudvel. Maria Cristina Kupfer
(1992, p.62-66) chega a
argumentar que este seria um ponto positivo para a incluso da
psicanlise na formao do
professor, j que apenas pela compreenso mais profunda dos
prprios conflitos e, por que
no, da vida emocional como um todo, que se torna possvel lidar
com a troca afetiva intrnseca
relao.
Caso no seja capaz de faz-lo, o docente por a relao merc de seus
processos
inconscientes, figurando o estmulo no seio educacional como um
chamariz de suas vivncias
passadas, objetos internos, conflitos mal resolvidos; de sua
mundividncia inconsciente, em
suma. Com isto, a relao est fadada a percalos e duras
crises.
Sujeitos em maior ou menor grau ao inconsciente, os professores
tiveram sua
profisso, ironicamente, desacreditada por Freud (1992c, p.40):
Educar, ao lado de governar e
psicanalisar, uma profisso impossvel. Ou seja, a condio humana,
sob o prisma freudiano,
to sujeita a processos que transcendem esfera da conscincia (ao
contrrio das ideias
7 Bettelheim (1982, p.34-45), em sua brilhante releitura do
Complexo de dipo, mostra que, embora seu
movimento fosse de busca por conhecer-se e tenha decifrado o
enigma da Esfinge (que propunha exatamente um
mergulho na prpria condio), dipo colocou enorme resistncia ao
Conhece-te a ti mesmo do Orculo de
Delfos, sendo essa recusa irracional da prpria identidade a
fora-motriz da tragdia.
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defendidas por Sartre em O Ser e o Nada, As palavras etc) que no
se faz possvel administrar
relaes, como o tm de fazer o governante, o psicanalista e o
professor.
Mezan (1982) menciona a amplificao de horizontes conceituais de
Freud, com o
desenrolar dos tempos, compreendendo mais aprofundadamente a
dinmica do inconsciente:
Ao concluir A Interpretao dos Sonhos, Freud demonstrara trs
pontos essenciais
para a teoria da psicanlise: a ocorrncia de processos de
pensamento inconscientes
em indivduos normais, o papel preponderante do desejo na vida
psquica e o imenso
alcance do fenmeno da represso. [...] Estas descobertas, e
especialmente a da
eficcia do inconsciente, conduziram-no a uma nova ordem de
trabalhos, voltada para
a deteco de mecanismos similares na esfera chamada normalidade'
(p.99; grifos
nossos)
Ora, h que se lhe atriburem as devidas honras pelos insights a
respeito de nossos
mecanismos inconscientes. Freud teve a primazia em estudar com
rigor cientfico8 a psique
humana e compreender que tambm os ditos homens normais so
sujeitos ao prprio
inconsciente. Mas, igualmente, no se pode concordar com a ideia
pessimista do pensador
acerca da educao.
Considerando-a impossvel, chegou mesmo a ser visto como
antipedagogo, embora
apenas desacreditasse da possibilidade de se fazer uma educao
psicanaliticamente lcida,
coerente e efetiva. Acredita-se que os processos inconscientes
em andamento empecilham a
relao; sobretudo quando no se sabe lidar com eles. Mas isso no
anula a imprescindibilidade
da educao9. O professor deve, portanto, refletir criticamente
sobre as situaes de afeto que
se lhe afiguram.
Entretanto, h outro bice educativo digno de meno, vinculado s
vivncias do
aluno: trata-se dos processos edpicos, que configuram igualmente
um dos cernes conceituais
da teoria psicanaltica, aparecendo desde os primrdios (como nA
interpretao dos Sonhos)
at a fase madura do pensador (como em Moiss e o Monotesmo).
Freud dedicou, pois,
exaustivos estudos ao Complexo de dipo e lhe atribuiu imenso
peso no que concerne
evoluo e aos processos psquicos do indivduo (haja vista o
Pequeno Hans, os casos de histeria
e os escritos da maturidade aambarcando suas ideias
psico-antropolgicas acerca de
civilizao e cultura), embora no tenha feito uma incurso clara e
unitria no campo
educacional, no aprofundando o duo psicanlise e educao.
8 Bettelheim (1982) mostra de uma maneira quase potica que Freud
no foi um cientista, como o querem os
tradutores ingleses. Foi, antes, um intrprete de ns mesmos. Um
pensador, um humanista em sentido lato. Por
isso evitamos, no presente estudo, considerar sua obra como
pura, fria e simples cincia.
9 Kupfer (1992, p. 12) prope que h certa dose de ironia no
parecer do psicanalista. Cremos, contudo, que seu
egrgio pessimismo, sobretudo o de seus ltimos anos, contribuiu
para que o autor lanasse certa descrena sobre
a educao e o futuro dos jovens, haja vista sua cruel perseguio
pelos nazistas, seu exlio em Londres e a
desiluso com a perspectiva de mudana desse panorama. O percurso
histrico de Freud, por conseguinte, salienta
nosso ponto de vista.
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J se aludiu figurao simblica do professor como pai mantenedor da
ordem e
me acolhedora e propiciadora do desenvolvimento das
potencialidades. Trata-se duma
vivncia primordial, atemporal, levada sala de aula. O que se
passa no caso do dipo do aluno
no estar bem resolvido e apresentar tremores? E no caso de
adolescentes, em turbulncia de
crescimento com as referidas situaes?
Antes de perquirir a problemtica proposta, cabe definir o que se
entende por
Complexo de dipo, a fim de lanar mais intensa luz a respeito da
teoria de que se vale no
presente trabalho. Primeiramente, evocando Roudinesco e Plon
(1998, p. 166):
O complexo de dipo a representao inconsciente pela qual se
exprime o desejo
sexual ou amoroso da criana pelo genitor do sexo oposto e sua
hostilidade para com
o genitor do mesmo sexo. [...] Na histria da psicanlise, a
palavra dipo acabou
substituindo a expresso Complexo de dipo. Nesse sentido, o dipo
designa, ao
mesmo tempo, o complexo definido por Freud e o mito fundador
sobre o qual repousa
a doutrina psicanaltica como elucidao das relaes do ser humano
com suas
origens e sua genealogia familiar e histrica. (nosso grifo)
Bettelheim (1992, p.34-44) aponta que, embora esses sentimentos
complexos nos
sejam vetados conscincia quando adultos, por terem passado por
uma slida e renitente
represso, eles permanecem vivos no plano inconsciente, atrelados
culpa que se alimenta por
senti-los. O mito de dipo nos ensina que, tornadas conscientes,
tais vivncias afetivas nos
fazem facear suas consequncias; mas s a partir do contato
consciente com o dipo que se
pode tentar metaboliz-lo, i.e., tomar medidas para lidar com ele
e suas implicaes.
A relao conturbada com a figura dos genitores, portanto, pode
desenrolar um
intrincado processo transferencial que traz abalos relao se ao
menos uma das partes a
lgica aponta para o professor, que deve evitar processos
contratransferenciais no refletir,
contemporizar e lidar criticamente com a situao, sob o risco de
o vnculo sofrer ataques e, em
ltima instncia, haver uma ruptura.
3. Educao e Psicanlise: epistemes inconciliveis?
At aqui, expuseram-se alguns dos principais fenmenos encontrados
na relao
professor-aluno, norteadores da construo e manuteno do vnculo
que os enleia e reveladores
de aspectos identitrios essenciais dos sujeitos e objetos
envolvidos na trama da dialtica
educacional.
Retomando a bibliografia disponvel acerca do universo tratado,
nota-se que a
posio de Kupfer (1992, p.12-13; p.50; p.62-66) referente
possibilidade da prtica
educacional sob a gide da psicanlise no clara e bem definida. Ao
passo que mostra o
ceticismo pessimista de Freud no s quanto educao, mas ao futuro
em sentido mais amplo,
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e expe uma das contradies do pensador10, que tambm estava
convicto de que a psicanlise
deveria ser usada como esteio para os outros campos das
humanidades, se exime de emitir
opinio prpria e versar sobre a legitimidade, procedncia e
validade do duo que intitula o
presente item.
Digual maneira, nada de esclarecedor e especfico pode ser
encontrado em Couto
(1994) e Silva (1993), cabendo, apesar disto, a ns indagar:
consoante a teoria psicanaltica, a
educao se faz possvel? De que maneira? Quais os empecilhos
esperados? Ou ainda: sendo
possvel a educao, igualmente possvel estabelecer um vnculo de
parceria ou relao de
complementaridade com a psicanlise? Em caso afirmativo, como
inserir a psicanlise na
prtica educacional?
Todas essas questes tm grande importncia e ainda no se
refletiu
suficientemente a seu respeito, no sendo, evidentemente,
pretenso deste modesto artigo fazer
uma elaborao de resposta, nem tampouco sendo aceitvel que se
feche os olhos para o
problema. H que se fazerem, portanto, os apontamentos e
ponderaes que diagnostiquem o
atual estado das tentativas de conciliao do binmio em
questo.
O posicionamento frente a esse polmico problema, deve rumar para
algo
ligeiramente alm do horizonte pura e simplesmente freudiano e
avaliar como seu rebento
psicanaltico portou-se ou portar-se-ia diante do impasse que se
nos afigura.
So afamadas as discusses de questes cientficas, administrativas
e educacionais
entre os seguidores de Melanie Klein e Anna Freud na Sociedade
Britnica de Psicanlise entre
os anos de 1941 e 194611. As tenses se acirraram aps a famlia
Freud emigrar para Londres
em fuga das perseguies nazistas. Este momento marcou,
provavelmente, a primeira fortssima
polmica sobre a aplicabilidade da psicanlise, entre outras
coisas no cabveis de pormenor.
Anna Freud representava a escola clssica, em franca e rigorosa
sucesso do criador
da psicanlise. Defendia uma aplicao geral da psicanlise como
base para as outras cincias
humanas. Melanie Klein, alm das inovaes na tcnica psicanaltica,
arguia que a psicanlise
se restringe a si mesma e no deve servir de prisma para estudos
outros.
3.1 A psicanlise e o corolrio de cincias humanas
10 Mezan (1982, p.XVI) prope a necessidade de uma leitura
diacrnica e extremamente cuidadosa, j que, em seu
percurso, Freud reviu, desenvolveu e aprofundou
ininterruptamente suas concepes. Da Famlia neuroptica ao
Modelo Pulsional. A educao, contudo, um tema sobre o qual o
pensador nunca se pronunciou delongadamente:
h idias esparsas, soltas, que mostram que, embora no tenha se
ocupado diretamente com a problemtica
educativa, ela o acompanhou do princpio ao fim de sua obra
(KUPFER, 1992, p.12-13). 11
http://www.enotes.com/psychoanalysis-encyclopedia/controversial-discussions-anna-freud-melanie-klein
Acesso: 15/06/2016
http://www.enotes.com/psychoanalysis-encyclopedia/controversial-discussions-anna-freud-melanie-klein
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A psicanlise, para alcanar a cura pela palavra, visa,
fundamentalmente, a
propiciar o conhecimento de si mesmo por meio de livres
associaes do paciente. Em outras
palavras, defende-se que o mergulho em si mesmo seja a via de
construo do dito
conhecimento de si.
Entretanto, percebe-se que o mergulho na subjetividade e na
individualidade
constitui o cerne no apenas da investigao psicanaltica, como
tambm de sua concepo
mais ampla do humano.
Ora, o sistema escolar remonta dissoluo da individualidade no
seio das prticas
disciplinares. Nem ao menos em um plano mais superficial h espao
para o mergulho
consoante com a psicanlise. Para que o grupo ande, o indivduo
deve abrir mo de grande
parte de si mesmo, submetendo-se a regras, a programas, imposio
de silncio etc. Em
outras palavras: a diferena basilar exposta impede a
possibilidade de, mais que coexistncia,
complementariedade das duas vises no processo educativo?
Aplicabilidade imediata da psicanlise em sala de aula como j se
mostrou
incompatvel. O que a psicanlise tem a oferecer uma compreenso
aprofundada da realidade
humana de cada indivduo, surgindo aporias epistemolgicas quando
se tenta coadun-la com
uma realidade grupal.
No obstante, h outra episteme que fornece uma compreenso da sala
de aula
enquanto fato social e encara a realidade individual, grupal e
as malhas do tecido social de uma
maneira completamente diversa. Diante disto, indaga-se: como se
d a relao professor aluno
sob o prisma sociolgico? Em que em sntese a sociologia tem a
contribuir para uma
compreenso da sala de aula? Como a realidade escolar se
relaciona com a complexa rede de
fatos sociais?
Consideraes finais
No transcurso do presente artigo, clarificou-se como a noo de
sujeito concebida
por Freud, por neofreudiano e elaborada por conceitos
psicanalticos, analisando de modo
geral, todas as tramas e conflitos que a psicanlise perscruta
projetados ao binmio professor-
aluno. Alm disto, exps-se claramente como a psicanlise refratria
a anlises grupais
sistemticas e este fato, longe de apontar uma imperfeio, mostra
os limites objetivos desta
cincia.
A perspectiva sociolgica evidencia, por sua vez, que a relao
professor-aluno ,
ao mesmo tempo, contraditria e complementarmente, uma relao de
socializao em si
mesma, bem como fruto de um processo de socializao. Contudo, tal
processo se d dentro de
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uma realidade social e cultural, em meio a qual se constroem
perspectivas, expectativas e modos
de agir, envolvendo portanto, aspectos psquicos, mentais e
emocionais. Embora no se trate de
uma relao estritamente psicanaltica, no sentido da triangulao
pai-me- filho, envolve
relaes microssociais entre indivduos que vivenciam uma realidade
mais ampla, assimilam
normas e modelos sociais e desempenham papeis socialmente
valorizados.
Ao traar-se um paralelo entre a sociologia e a psicanlise, salta
aos olhos a
importncia do dilogo entre disciplinas para que se lance
distinta luz sobre o binmio
professor-aluno, permitindo inferir-se que em regime de
complementariedade os diferentes
ramos do saber formam um aparato epistemolgico um pouco mais
gabaritado a diagnosticar
fenmenos complexos que envolvam, a um s tempo, o indivduo
enquanto infinidade psquica
e actante num contexto sociocultural.
Cada vez mais, no sculo XXI, portanto, deve-se estimular a
interdisciplinariedade
e a quebra de dominao de uma episteme sobre a outra, com
referida integrao inclusive
enriquecendo individualmente cada ramo do saber, o que na educao
e nas reflexes que a
tomam como objeto, coloca-se como essencial.
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