-
Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC Centro de Artes
CEART Departamento de Msica Laboratrio de Ensino da rea de
Fundamentos da Linguagem Musical
contraponto & fuga 2 semestre de 2005
Prof. Srgio Paulo Ribeiro de Freitas
Contraponto com imitao | da imitao em geral Prof. Flvio de
Queiroz | Ufba1
Noes 1) Diz-se imitao a reproduo que faz uma parte [voz] de um
desenho meldico proposto por outra. O desenho a ser imitado
chama-se tema, sujeito, proposta, antecedente (dux); a sua
reproduo, resposta ou conseqente (comes):
Ex. 1 : J. S. Bach, A Arte da Fuga, Canone II.
2) A imitao distingue-se em vrios tipos: o critrio da distino o
confronto entre o sujeito e a resposta, com relao direo do
movimento meldico e ao valor das figuras. Com relao direo do
movimento meldico, a imitao pode ser natural, retrgrada, direta ou
inversa.
A imitao natural quando a resposta reproduz na ordem idntica as
notas da proposta.
Proposta A B C D . . . . . . N. Resposta A B C D . . . . . .
N.
A imitao retrgrada quando a resposta reproduz as notas da
proposta na ordem oposta, isto , de maneira que a ltima nota desta
torne-se a primeira daquela, e vice-versa.
Proposta A B C D... . . . . N. Resposta N . . . . . . D C B
A.
A imitao direta quando os intervalos da proposta so reproduzidos
na resposta em direo idntica.
Proposta Resposta
A imitao inversa quando os intervalos da proposta so
reproduzidos na resposta em direo oposta.
Proposta Resposta
1 Fonte: Prof. Flvio de Queiroz. Universidade Federal da Bahia,
Escola de Msica, Departamento de Composio, Literatura e Estruturao
Musical. http://www.clem.ufba.br. Flvio de Queiroz. Este trabalho
foi desenvolvido a partir de novembro de 2004 por Flvio Jos Gomes
de Queiroz, professor de Literatura e Estruturao Musical da Escola
de Msica da UFBA desde 1992, compositor, arranjador e poeta.
Graduado em rgo pela Universidade Catlica de Salvador (classe do
prof. Hermann Coppens). Seguiu para a Blgica, onde estudou rgo
(Kristiaan Van Ingelgem e Hubert Schoonbroodt), harmonia,
contraponto, msica de cmara, canto gregoriano e improvisao
(passando principalmente pelo Conservatrio Real de Bruxelas).
Organista do Mosteiro Beneditino de Affligem, Blgica (1985-1991).
Mestre em Educao Musical, orientado por Alda Oliveira e Jamary
Oliveira. Organista do Mosteiro de So Bento, Salvador, BA.
Organizador do grupo de canto gregoriano Signum Magnum. Praticante
e estudioso de Yoga Vidya. Doutorando em Etnomusicologia.
http://www.clem.ufba.br/
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
2Com relao ao valor das figuras a imitao se distingue em igual e
desigual, conforme os valores das figuras nas respostas sejam, ou
no, os mesmos que na proposta. A imitao desigual pode ser aumentada
ou diminuda, se os valores rtmicos na resposta sejam maiores ou
menores que na proposta. 3) As diversas espcies de imitao podem-se
combinar de diferentes maneiras. Dado isto, se tomarmos em
considerao o sujeito abaixo, sero possveis as seguintes
respostas:
4) A imitao, qualquer tipo que seja, pode ser rigorosa ou livre.
Na imitao rigorosa a resposta conserva o gnero e a espcie dos
intervalos do sujeito (ex. 1). Na imitao livre pode-se encontrar
diversos casos:
a) a resposta conserva o gnero, mas no a espcie dos intervalos
do sujeito:
Ex. 2 : J. S. Bach, A Arte da Fuga, cnone III.
Neste exemplo se v que, com exceo de trs, os intervalos da
resposta so de gnero igual, mas de
espcie diversa dos intervalos do sujeito.
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
3b) a resposta conserva apenas a direo ascendente ou descendente
dos intervalos do sujeito [contorno], mas no a mesma extenso:
Ex. 3 : J. S. Bach, O Cravo Bem Temperado, vol. I, Fuga 2.
V-se nesse exemplo que, enquanto na proposta entre a 3a e a 4a
nota temos um intervalo de 4a, e entre a 4a e a 5a nota um
intervalo de 2a, na resposta, no local correspondente, temos um
intervalo de 5a e outro de 3a.
c) a resposta conserva apenas as figuras do sujeito (imitao
rtmica).
Ex. 4 : Constanzo Porta, de uma Antifona a 4 vozes.
5) A imitao, qualquer tipo que seja, pode se dar em qualquer
intervalo [de distncia da proposta]: ao unssono, segunda, tera,
quarta, quinta, sexta, stima, oitava ( superior ou inferior). A
imitao ao unssono e oitava so necessariamente rigorosas; quarta e
quinta tambm podem ser rigorosas; as outras so livres. 6) A imitao,
qualquer tipo que seja, pode se dar ainda:
a) invertendo-se a ordem dos tempos, isto , as notas que se
encontram em tempo forte na proposta venham a se encontrar em tempo
dbil na resposta, e vice-versa (imitao em contratempo). b) fazendo
seguir cada nota da resposta de uma pausa de igual valor (imitao
interrompida).
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
4
Imitao natural igual direta Esta imitao a mais comum. Seguem
exemplos em todos os intervalos. Imitao ao unssono
Ex. 5: B. Marcelo, do Salmo XX.
Imitao segunda (2a superior ou 7a inferior) Ex. 6 : B. Marcello,
de Salmo XLV.
Obs.: Neste exemplo o contralto imita 2a
superior o tema proposto no baixo, o qual imita o
contralto 7a inferior. A resposta do contralto ao
baixo no mpletamente rigorosa,
s o a do baixo ao co
macontralto.
Imitao tera (3a superior ou 6a inferior)
Ex. 2 : J. S. Bach, A Arte da Fuga, cnone III.
Imitao quarta (4a superior ou 5a inferior)
Ex.7: Carlo Maria Clari, Madrigal.
Obs.: Neste exemplo v-se a imitao 4a
superior (A A') e depois uma imitao
5a inferior (B B').
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
5Imitao quinta (5a superior ou 4a inferior)
Ex. 8 : J. S. Bach, O Cravo Bem Temperado, vol. I, Fuga 1.
Imitao sexta (6a superior ou 3a inferior)
Ex. 9 : J. Fux, Gradus ad Parnassum.
Imitao stima (7a superior ou 2a inferior)
Ex. 10 : B. Marcello, do Salmo XIII.
Imitao oitava
Ex. 1 : J. S. Bach, A Arte da Fuga, Canone II.
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
6
Imitao natural igual inversa 1. Chama-se imitao inversa aquela
cuja resposta reproduz por movimento contrrio os intervalos
meldicos da proposta. 2. Esta imitao pode ser rigorosa ou livre. No
modo maior a imitao natural inversa rigorosa quando tnica se
responde com a 3a e vice-versa; basicamente, como a frmula
seguinte:
Ex. 11
Quando, no entanto, o mbito do sujeito no ultrapassa o
hexacorde, a imitao natural inversa pode permanecer rigorosa, no
modo maior, respondendo tnica com a 6a e 6a com a tnica, como na
frmula seguinte:
Com relao ao exemplo 11, pode-se responder rigorosamente
assim:
Ex. 12
No modo menor, a imitao inversa permanece rigorosa com a
seguinte frmula (segundo o mbito
da proposta):
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
7A imitao inversa livre a mais empregada. Damos a seguir dois
exemplos:
Ex. 13: J. S. Bach, O Cravo Bem Temperado, vol. I, Fuga 6.
Ex. 14: J. S. Bach, O Cravo Bem Temperado, vol. II, Fuga 2.
Imitao desigual
1. A imitao desigual quando as figuras [rtmicas] da resposta tm
valores diversos dos da proposta. Pode ser aumentada ou diminuda,
conforme as figuras da resposta sejam maiores ou menores que as da
proposta.
2. Como a imitao igual, tambm a desigual pode ser direta ou
inversa. Imitao desigual direta a) Imitao aumentada. Tomemos um
exemplo de imitao aumentada da Fuga 2 do vol. II d'O Cravo Bem
Temperado, de J. S. Bach, cujo tema o seguinte:
Eis o que encontramos nos compassos 14 e 15 da referida
Fuga:
Ex. 15. Fuga 2 do vol. II d'O Cravo Bem Temperado, de J. S.
Bach
b) Imitao diminuda. Tomemos um exemplo de imitao diminuda do
incio da Fuga 6 (in stile francese) d'A Arte da Fuga, de J. S.
Bach:
Ex. 16.
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
8
Imitao desigual inversa a) Imitao aumentada. Tomemos um exemplo
de imitao aumentada inversa o princpio do cnone I (canon per
augmentationem in motu contrario) d'A Arte da Fuga:
Ex. 17.
b) Imitao diminuda. Como exemplo de imitao inversa diminuda
tomemos as duas partes extremas do incio da Fuga 6 d'A Arte da
Fuga, de J. S. Bach:
Ex. 18.
Imitao retrgrada
Chama-se imitao retrgrada ou cancrizante2 aquela cuja resposta
reproduz as notas da proposta iniciando pela ltima e terminando com
a primeira. Muita cara aos polifonistas flamengos dos sculos XV e
XVI, caiu, depois, em desuso, devido dificuldade de ser
reconhecida. Tambm pode ser igual ou desigual, direta ou inversa.
Limitaremo-nos, por ora, a dois breves exemplos, reservando-nos a
voltar ao tema ao tratarmos do cnone.
2 Assim chamada devido a palavra latina cancer, caranguejo.
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
9a) Imitao retrgrada direta:
Ex. 19 : J. S. Bach, O Cravo Bem Temperado, vol. I, Fuga 4.
b) Imitao retrgrada inversa:
Ex. 20 :
Imitao sobre cantus firmus Toma-se um cantus firmus e a ele
pode-se contrapor duas, trs ou mais elaboraes meldicas
(contrapontos), em imitao. Todo novo tema deve ser separado por uma
pausa, ou, pelo menos, de um grande intervalo isto, pela facilidade
de percepo das entradas.
Ex. 21.
Neste exemplo, A uma imitao direta e B inversa.
Ex. 22. Ave maris stella (vesperale Romanum, in festis B. M.
V.), de G. P. da Palestrina
O exemplo 22 extrado da Ave maris stella (vesperale Romanum, in
festis B. M. V.), de G. P. da Palestrina. O cantus firmus passa
sucessivamente pelas trs vozes; as imitaes so mais ou menos
livremente derivadas do mesmo.
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
10Ex. 23.
Neste exemplo 23 so dois os temas: A e B; o primeiro, proposto
no soprano, imitado no tenor stima inferior; o segundo, proposto no
contralto, imitado no soprano sexta superior e no tenor quarta
inferior. A imitao do primeiro tema igual, a do segundo,
desigual.
Ex. 24. Antifona de Constanzo Porta
No exemplo 24 reproduzimos integralmente a Antifona, a quatro
partes, de Constanzo Porta. O soprano prope um motivo relacionado
palavra descendit; dois compassos depois responde o contralto
quinta, e, no prximo compasso, responde o tenor ao unssono do
contralto. No stimo compasso o contralto prope um novo tema, ao
qual responde logo o tenor [mas s com o incio (incipit) do novo
tema], e, aps, o soprano. Segue, entre contralto e tenor, imitaes
rtmicas. No compasso 12, o contralto prope um novo motivo, ao qual
responde logo o tenor e, mais tarde (compasso 15), o soprano. Esta
resposta do soprano vem a ser uma imitao diminuda do cantus
firmus.
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
11
Imitao sobre canto dado
As regras dadas para imitaes sobre cantus firmus so tambm vlidas
para o canto dado. Mostramos, como exemplo do gnero, o pequeno
preldio para rgo de J. S. Bach sobre o coral Jesus Christus unser
Heiland que, para melhor visualizao, dispusemos em quatro
sistemas:
Ex. 25: J. S. Bach , Jesus Christus unser Heiland
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
12
Imitao sem cantus firmus
Exposto o tema (sujeito) em uma parte, uma outra expor a
resposta, enquanto que a primeira continuar em contraponto, o que
se chama contrasujeito; a terceira voz retomar o sujeito, a quarta,
a resposta. Seja o tema breve e incisivo; o contrasujeito,
ritmicamente contrastante. Imitao a trs partes
Ex. 26: Fragmento do Benedictus, de Palestrina, da Missa
Emendemus, tomo 16, p. 55, da edio de Breitkopf und Hrtel.
O sujeito proposto no baixo, e o tenor lhe responde quinta
superior, e depois o contralto, ao unssono do tenor; mas, enquanto
este imita apenas o incio, o contralto imita quase todo o tema. No
oitavo compasso v-se uma breve imitao entre baixo e tenor, ao que
sucede a contraexposio do tema, isto : o contralto prope o sujeito,
ao qual responde logo o tenor quinta e, mais tarde, o baixo na
oitava do tenor.
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
13
Imitao a quatro partes Ex. 27: Incio do moteto Gaudent, in
coelis, de Toms Luis de Victoria.
Na prtica muito comum o caso em que uma parte livre seja
aplicada a outras partes em contraponto imitativo.
-
Contraponto com imitao | da imitao em geral | Prof. Flvio de
Queiroz
14 Imitao em contratempo
Ex. 28: Da Fuga VIII, parte I do Cravo Bem Temperado, de J. S.
Bach.
Imitao interrompida: Pode ser considerada tambm uma imitao
aumentada, onde, ao invs de se dobrar os valores das notas,
acrescenta-se aps cada uma delas o valor das pausas
correspondentes.
Ex. 29: Da Fuga 2 do vol. II d'O Cravo Bem Temperado, de J. S.
Bach
contraponto & fugaContraponto com imitao | da imitao em
geralProf. Flvio de Queiroz | UfbaNoesImitao natural igual
inversaImitao desigualImitao retrgradaImitao sobre canto dadoImitao
sem cantus firmus