MARÇO 2013 Mythologies Roland Barthes Segundo as ideologias do autor, o que mudou não foi a sociedade nem os mitos, mas sim a forma de interpretá-los. E é isto que se propõe fazer nesta sua obra aqui em estudo. A sua análise do processo de significação tornou-se “famosa”, na qual o autor dividia esse processo em duas fases – a denotação, que se refere à perceção superficial de algo, e a conotação, que se refere às mitologias (tema tratado na obra de Barthes que aqui será analisada). Roland Barthes - Formado em Letras Clássicas em 1939 e Gramática e Filosofia em 1943 na Universidade de Paris, fez parte da escola estruturalista, influenciado pelo linguista Ferdinand de Saussure. Crítico dos conceitos teóricos complexos que circularam dentro dos centros educativos franceses nos anos 50. Entre 1952 e 1959 trabalhou no Centre National de la Recherche Scientifique - CNRS. CRÍTICA LITERÁRIA AYR Consulting, Trends & Innovation | Lisboa | Madrid | São Paulo | Miami Documento licenciado a Luis Rasquilha com o email [email protected]
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MARÇO 2013
Mythologies
Roland Barthes
Segundo as ideologias do autor, o que mudou não foi a sociedade nem os mitos, mas sim a
forma de interpretá-los. E é isto que se propõe fazer nesta sua obra aqui em estudo. A sua
análise do processo de significação tornou-se “famosa”, na qual o autor dividia esse
processo em duas fases – a denotação, que se refere à perceção superficial de algo, e a
conotação, que se refere às mitologias (tema tratado na obra de Barthes que aqui será
analisada).
Roland Barthes - Formado em Letras Clássicas em
1939 e Gramática e Filosofia em 1943 na
Universidade de Paris, fez parte da escola
estruturalista, influenciado pelo linguista Ferdinand
de Saussure. Crítico dos conceitos teóricos
complexos que circularam dentro dos centros
educativos franceses nos anos 50. Entre 1952 e 1959
trabalhou no Centre National de la Recherche
Scientifique - CNRS.
CRÍTICA LITERÁRIA
AYR Consulting, Trends & Innovation | Lisboa | Madrid | São Paulo | Miami
Roland Barthes foi um teórico (reduzindo em muito todos os cargos que lhe podíamos
atribuir) francês, do século XX, tendo vivido entre 1915 (12 de novembro) e 1980 (26
de março).
Barthes foi um grande seguidor da escola e tradição Estruturalista, muito por culpa de
Ferdinand de Saussure1, em quem viu um grande exemplo a seguir.
Em termos académicos, Roland Barthes formou-se em Letras Clássicas (1939) e
Gramática e Filosofia (1943), ambos pela Universidade de Paris.
Roland Barthes foi um dos grandes semiólogos europeus. Preferiu adotar a
designação de “semiótica”, preterindo “semiologia”. Uma das grandes novidades que
introduziu a este ramo foi a sua conceção política, levando a análise do discurso a
assumir um carácter político, só por si.
A sua análise do processo de significação tornou-se “famosa”, na qual o autor dividia
esse processo em duas fases – a denotação, que se refere à perceção superficial de
algo, e a conotação, que se refere às mitologias (tema tratado na obra de Barthes que
aqui será analisada). Não só por isto ficou Barthes conhecido, também as suas ideias
sobre a morte do autor, entre muitas outras, fizeram com que se tornasse um marco
na história da crítica literária, filosofia e semiótica do século XX.
A sua lista de obras originais é extremamente vasta, de onde podemos realçar:
. Mythologies (1957);
. Elements de semiologie (1965);
. Le plaisir du texte (1973)2;
. Fragments d’un discours amoreux (1977);
. Etc..
1 F. Saussure (1857-1913) foi considerado o “pai” da semiologia, isto é, do estudo dos signos – distingue
o significante (parte física do conceito) e o significado (parte mental). 2 Esta obra será usada como referência na presente crítica, sendo utilizada a sua versão em português,
todo o conhecimento em si contido. Contrariamente, quanto mais se tentava
materializar a inteligência deste génio, mais mágica ela se tornava, algo resultante da
simples impossibilidade de conseguir realmente extrair a sua genialidade e transformá-
la em uma qualquer forma física.
Assim, pode dizer-se que todas as lógicas associadas à mente de Einstein se acabam
por tornar epítome do reino dos simbolismos e metáforas. Veja-se o seguinte exemplo:
“The historic equation E=mc2, by its unexpected simplicity, almost embodies the pure
idea of a key, bare, linear, made of one metal, opening with a wholly magical ease a
door which had resisted the desperate efforts of centuries”10.
Ornamental Cookery – Voltando a mencionar a revista francesa Elle, Barthes fala-nos
agora a partir de uma outra perspetiva, que tem mais que ver com estratos sociais do
que com comida, como o texto pode aparentar à primeira vista. Novamente, é
sublinhado um caráter de protocolo social extremamente mascarado, mas essencial
para a vivência e aceitação de cada um pelos seus pares.
O autor francês foca ainda outro ponto curioso: Sendo a revista Elle segmentada para
os grupos femininos de classe média-baixa, seria natural que tentasse apelar e
suprimir as necessidades deste mesmo grupo em especial. Mas ao contrário disso,
“(...) it is very careful not to take for granted that cooking must be economical”11. O que
quer então isto dizer? Basicamente, existe naquelas fotografias de cozinha, bastante
elaboradas, o intuito de satisfazer por si só, não de ensinar como confecionar os
referidos pratos em casa.
É possível ir mais longe na análise desta perspetiva do autor: o que na verdade a
secção de culinária da Elle tentou fazer, enquadra-se nas Tendências The Beautiful
People e Bottom of the Social Pyramid12, na medida em que conduz as suas leitoras a
sentirem-se parte de algo “superior”, uma classe à qual possivelmente nunca
chegarão, sem ser pelo imaginário reproduzido por esta publicação francesa. Tudo isto
representa o mito da necessidade de pertença e de desejo de inclusão em algo mais
do que nós mesmos13.
10
In BARTHES, Roland, Mythologies, The Noonday Press, New York, 1991, p. 69. 11
Idem, p. 79. 12
Estas duas Tendências foram identificadas e analisadas pela AYR Consulting e pelo Trends Research Center, no início deste ano de 2012. 13
Também no Jornalismo isto se encontra bastante presente. As reportagens e notícias sobre o casamento real britânico entre William e Kate Middleton são um dos melhores exemplos disso. Um dos principais intuitos das publicações é precisamente o de cativar o leitor através da narração de algo que faz parte do imaginário de todos nós. Numa última instância, apela mesmo ao mito do Príncipe e da Princesa e à mítica frase de que “Viveram felizes para sempre”.
1. Roland Barthes transporta-nos para o universo de mitologias que, embora antigas, são extremamente atuais e revelam aplicabilidade a vários níveis.
2. A sociedade move-se de forma cíclica e de acordo com necessidades que não estão a ser supridas. Neste momento, está a ser conduzida até ao âmago da moralidade e daquilo que é correto, pois desde os anos 60 do século XX, que os mais conservadores consideram que o tecido social se encontra em decadência extrema.
3. Através de uma ironia acutilante e única, Barthes expressa a sua opinião acerca de determinadas noções nunca abandonadas pela sociedade em que vivemos.
aceite dentro do grupo – e que não necessariamente correto – e que por alguma
razão, vai frequentemente contra a corrente de pensamento vigente na restante
sociedade.
Hoje, esta classe intelectual de Direita toma forma pelas mãos dos chamados
hipsters26, tribo fortemente caracterizada por se mover nos meios urbanos e
suburbanos, assumindo uma postura e identidade muitas vezes apelidada de “pseudo-
intelectual”. Mas o que é realmente curioso absorver desta noção é a sua lógica
altamente subvertida. A explicação do conceito de mainstream é importante para
compreender o pensamento expresso por Barthes nesta obra. Mainstream caracteriza
tudo aquilo que se torna universal e que pode ir desde ideias, passando pelo vestuário
ou por uma simples atitude ou comportamento. Hoje em dia, existe uma certa
“elegância” em afirmar que se é avant-garde. Mas para este grupo de intelectuais,
essa posição de constante aceitação em favor do vanguardismo, transforma-se, em
última instância, numa posição de mainstream assegurada. Concluindo, pode dizer-se
que atualmente aquilo que é considerado de vanguarda, será certamente adaptado
pelas massas enquanto original o que, contrariando a sua função e lógicas primárias,
acabará por se tornar claramente mainstream.
Voltemos então à análise de alguns pontos expressos em Mythologies. Aquando da
redação desta obra, a noção de Direita de Barthes era praticamente a mesma dos dias
de hoje, apenas adaptada a uma época diferente. Se afirmarmos que ambas a
esquerda como a direita são consideradas altamente intelectuais, a diferença está
então no grau de conservadorismo ou abertura existente. Neste caso, pode dizer-se
que a Direita é claramente conservadora em toda a sua essência, começando pela
forma como pensam e como se expressam, até aos seus gostos, atitudes,
comportamentos e principalmente, tipo de linguagem usada.
Para explicar o tipo de grupo em questão, Barthes comenta sete pontos, que acabam
por caracterizar a Direita e a sua essência, baseando-se nos mitos que asseguram a
continuação destes intelectuais.
1. Inoculação – Tal como todos os subgrupos sociais, também este detém
alguns “dogmas”, problemáticas para as quais não existe uma resposta correta.
São tidos como pequenos males ou desconfortos que irão sempre existir, de
forma a assegurar o balanço da lógica social: “the bourgeoisie no longer
hesitates to aknowledge some localized subversions: the avant-guarde, the
irrational in childhood, etc.”27. Esta citação exprime precisamente esta
condescendência disfarçada que tanto caracteriza a Direita;
26
De acordo com o website http://www.urbandictionary.com/define.php?term=hipster, hipster significa “a subculture of men and women typically in their 20's and 30's that value independent thinking, counter-culture, progressive politics, an appreciation of art and indie-rock, creativity, intelligence, and witty banter”. 27
In BARTHES, Roland, Mythologies, The Noonday Press, New York, 1991, p. 152.
são aspetos específicos e altamente exteriores à sua verdadeira essência, que
muitas vezes caracterizam uma peça teatral ou uma obra poética30.
7. The Statement of Fact – Este ponto tem por parte de Barthes, uma
abordagem jocosa e irónica ao mesmo tempo. Aquilo a que comumente
apelidamos de provérbios costumam ter um propósito lógico por detrás, algo
que não acontece com a versão de ditos populares da Direita, as chamadas
“máximas”. Estes são, segundo o autor, simples noções de senso comum,
aplicadas de forma elaborada no discurso corrente, com o intuito de o tornar
menos coloquial, mais exclusivo.
30
Um dos exemplos que ilustra esta situação é a vaga de lotação dos cinemas, aquando da estreia do filme Twilight, inspirado no livro homónimo e que tem vampiros e outros elementos místicos como figuras centrais. Este filme é considerado pelos críticos intelectuais, como desprovido de qualidade, mas não tendo em conta a natureza da qualidade cinematográfica, mas sim porque não encaixa dentro dos seus conformes.
Parte II – Ideias
1. A subcultura contemporânea hipster é um dos melhores exemplos da exaltação da Direita de Barthes.
2. O autor refere sete importantes pontos que resumem – ainda que com variações – a estrutura do pensamento deste grupo mais conservador de pensadores e críticos.
3. O seu intuito é, no fundo, abordar uma série de questões mas nunca aprofundar realmente nenhum dos assuntos.
4. Existe a ideia generalizada de que mostrar inteligência e superioridade perante a restante sociedade, é, contrariamente ao que se possa pensar, confessar inferioridade ou falta de conhecimento perante aqueles que são considerados grandes artistas.