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Museus virtuais e cibermuseus: A Internet e os museus1 Rosali
Henriques
Os museus e a Internet A Internet algo ainda muito novo, pois a
proliferao de seu uso comeou efectivamente na dcada de 90 do sculo
XX. Em termos histricos um tempo muito curto. No entanto, j possvel
verificar algumas transformaes ocorridas em vrias reas do
conhecimento em decorrncia do advento da Internet. Hoje, quase
impossvel pensar num mundo sem a sua presena, mesmo que boa parte
de seus usurios viveram sua infncia, adolescncia e juventude sem
us-la.
A Internet est revolucionando a forma como as pessoas se
comunicam. E isso no se passa de forma diferente na sua relao com a
museologia. Os museus, como qualquer instituio, esto presentes na
rede mundial de computadores. A criao de sites de museus proliferou
a partir da dcada de 90, com o avano da Internet, mas muitos museus
ainda nem possuem sites institucionais. E muito deles possuem sites
cujo nico objetivo apenas disponibilizar informaes de contato da
instituio.
Assim como uso da Internet pelos museus ainda algo recente, as
discusses sobre este uso tambm o so. Em 1991, realizou-se em
Pittsburgh, na Pensilvnia a primeira conferncia sobre o uso da
hipermdia e da interatividade nos museus. Mais conhecida pela sigla
ICHIM - International Conference on Hypermedia and Interactivity in
Museums - esta conferncia tem se realizado bianualmente nos Estados
Unidos e em alguns pases da Europa para discutir as questes sobre o
uso das novas tecnologias nos museus2. O objetivo dessas
conferncias promover o potencial da multimdia interativa nos
programas dos museus. Nesse sentido tambm, em 1993, o MDA - Museum
Documentation Association - organizou em Cambrigde um congresso
sobre Museus e Interactividade. Este congresso deu nfase ao uso da
multimdia nos museus3.
Em relao ao uso da Internet pelos museus, os primeiros debates
surgiram em 1997 quando se realizou em Los Angeles, na Califrnia, a
primeira conferncia sobre museus e Internet. Chamadas de Museums
and Web, estas conferncias so realizadas anualmente nos Estados
Unidos ou Canad e tm como objetivo reunir os profissionais dos
museus, principalmente aqueles ligados s reas de novas tecnologias,
para discutir as questes pertinentes ao uso da Internet pelos
museus4.
Em relao s discusses institucionais, preciso verificar que o
ICOM no possui um comit especfico sobre Internet e interatividade
nos museus, por isso, as discusses
1 - Este artigo parte da dissertao de mestrado em Museologia
cujo ttulo Memria, museologia e
virtualidade: um estudo sobre o Museu da Pessoa, defendida em
2004, pela Universidade Lusfona de Humanidades e Tecnologia, de
Lisboa. 2 - As informaes sobre todas as conferncias j realizadas
encontram-se no site da instituio Archives
& Museums Informatics, no endereo
http://www.archimuse.com/conferences/ichim.html. 3 - O MDA uma
organizao, criada na Inglaterra em 1977. Tem como objetivo
desenvolver atividades
de discusso, publicao e formao na rea de documentao museolgica.
Mais informaes sobre suas atividades podem ser obtidas no site do
MDA: http://www.mda.org.uk. 4 - Os programas das discusses, bem
como a publicao dos papers das conferncias podem ser
consultados no site
http://www.archimuse.com/conferences/mw.html.
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sobre as novas tecnologias nos museus so efetuadas pelo seu
comit de documentao, o CIDOC International Committee for
Documentation, atravs de um grupo de trabalho especfico sobre o uso
da Internet. Criado em 1992 durante o encontro do ICOM em Qubec,
este grupo de trabalho comeou a produzir durante o encontro na
Noruega, em 1995, um documento sobre o uso de multimdia nos
museus5. Em 1996 o documento foi finalizado e traa algumas
diretrizes sobre este novo desafio para os museus. O objetivo
esclarecer questes fundamentais sobre multimdia e a preservao do
patrimnio atravs do uso das novas tecnologias nos museus. No
entanto, diz muito pouco sobre o uso da Internet nos museus.
A Internet possibilitou transformar tomos em bits. Ou seja,
matria palpvel (objetos) em cdigo binrio. Nesse sentido, os museus
passam a trabalhar com referncias patrimoniais digitais na
Internet. E, portanto, passveis de serem trabalhadas de vrias
formas. Alm disso, a Internet possibilitou aos museus interagir de
forma globalizada, alterando a noo de tempo e de espao. Ou seja, o
museu na Internet nunca fecha.
Na Internet possvel abrir mo da exposio tridimensional
tradicionalmente usada pelos museus como forma de divulgao de seu
acervo, criando novas perspectivas de apresentao do acervo. Alm
disso, a Internet possibilita visitas virtuais, podendo atrair mais
pblico para a visita real. Ou seja, alm de ser um carto de visitas
do museu, a Internet possibilita o acesso ao patrimnio de uma forma
mais ampla.
Atualmente um grande nmero de museus possui sites
institucionais. Como qualquer instituio do sculo XXI, os museus
tambm buscam levar ao grande pblico informaes sobre o contedo do
seu acervo e sobre as atividades culturais desenvolvidas em seu
espao. Assim, o uso da Internet como meio de divulgao e comunicao
possibilitou aos museus uma interao maior com os utilizadores. Alm
da criao de sites com informaes sobre o contedo de seu acervo, os
museus utilizam tambm dos meios de comunicao prprios da Internet:
e-mails, boletins, etc., para divulgar o trabalho desenvolvido.
Segundo Maria Lusa Bellido Gant (2001), os museus transformaram a
Internet em um espao para a apresentao de seus boletins, folhetos e
catlogos, facilitando a divulgao de suas actividades.
Uma questo que se coloca como a Internet usada pelos museus.
Mais do que um veculo de comunicao, a Internet permite uma maior
interao com o pblico, mas tambm com os especialistas. Alm do uso
como uma ferramenta de marketing, a Internet possibilita a montagem
de redes de conexo entre vrias instituies afins e com objetivos
convergentes. Este uso pode ser feito atravs de listas de
discusses, fruns, rede de comunicao, etc., pois a Internet
possibilita uma troca de experincias entre os profissionais dos
museus de forma mais rpida e consistente. Nesse sentido, a troca de
informaes e discusses sobre temas no mbito da museologia, atravs da
criao de redes de informao uma ferramenta que pode ser usada na
Internet.
Outras formas de uso da Internet pelos museus so colaboraes
multi-institucionais. Nesse caso, a instituio responsvel pelo
projecto convida outras instituies a participarem com contedos
especficos, criando exposies permanentes na Internet. Um exemplo
disso a exposio Museus e Milnio, promovida pelo Museu da Civilizao
de Qubec em 2000. Naquele ano, o Museu da Civilizao convidou
vrias
5 - O documento final produzido pelo grupo de trabalho pode ser
encontrado no site do CIDOC, pelo
endereo
http://www.willpowerinfo.myby.co.uk/cidoc/multi1.htm.
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instituies museolgicas de todo o mundo para criar contedos ou
expor contedos dos seus acervos relativos ao sculo XX. O resultado
uma exposio de contedos culturais e patrimoniais de vrios museus no
mundo. Nesta exposio colaboraram doze museus de vrias partes do
mundo: Frana, Estados Unidos, Sua, Sucia, Eslovnia, Brasil, Canad,
Madagscar, Itlia e Alemanha. Este tipo de colaborao, embora mais
raro, de fundamental importncia, pois permite que os museus usem a
Internet no seu melhor: criando laos virtuais com outras
instituies. Infelizmente, a maioria dos museus ainda no viram a
potencialidade de utilizar a Internet para este tipo de colaborao
inter-institucional. Para estas instituies, a Internet serve apenas
como um grande painel para afixar suas informaes institucionais, e
no como uma ferramenta de troca e entrelaamento de referncias
patrimoniais.
Figura 1 - Pgina principal da exposio Museus e Milnio
Fonte: http://www.mumi.org
Tipos de sites de museus Os museus esto acessveis na Internet
sob mais variadas formas, mas existem trs tipos bsicos de sites,
baseadas na tipologia criada em 1996 por Maria Piacente, citada por
Lynne Teather (1998)6. Em sua tese de Masters of Arts nos Estados
Unidos, Piacente enumera trs categorias de websites de museus. A
primeira categoria de sites o folheto eletrnico, cujo objetivo a
apresentao do museu. Este tipo de site funciona como uma ferramenta
de comunicao e de marketing. O utilizador tem acesso histria do
museu, aos horrios de funcionamentos e s vezes ao corpo tcnico do
museu. o tipo mais comum em quase todos os museus. Alguns so mais
bem elaborados, dependendo dos recursos existentes no museu, mas
todos tm como objetivo principal ser uma apresentao visual, tal
como um folheto, do museu. Nesse caso, a Internet funciona como uma
forma de tornar o museu mais conhecido e tambm possibilitar um
acesso mais fcil pelos utilizadores da rede mundial de
computadores.
Sabemos que a escolha de sites mais elaborados, tanto do ponto
de vista do design quanto da navegao, depende dos recursos humanos
e financeiros disponveis da
6 - PIACENTE, Maria. Surfs Up_: Museums and the world Wide Web,
MA Research Paper, Museum
Studies Program, University of Toronto, 1996. Infelizmente no
tivemos acesso s informaes originais.
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instituio. Os custos de manuteno de um site mais simples, que no
necessita de uma base de dados, podem ser suportados por qualquer
instituio, mesmo porque existem muitos servidores que oferecem
hospedagem gratuita para este tipo de site. Por isso, queremos crer
que a escolha de um tipo de site mais simples dependa mais do tipo
de recursos que o museu tenha, do que por uma deciso da
instituio.
Para Maria Piacente, a segunda categoria de site seria museu no
mundo virtual, ou seja, neste tipo de site a instituio apresenta
informaes mais detalhadas sobre o seu acervo e, muitas vezes,
atravs de visitas virtuais. O site acaba por projetar o museu fsico
na virtualidade e muitas vezes apresenta exposies temporrias que j
no se encontram mais montadas em seu espao fsico, fazendo da
Internet uma espcie de reserva tcnica de exposies. Alm disso,
muitos deles disponibilizam bases de dados do seu acervo, mostrando
objetos que no se encontram em exposio naquele momento ou mesmo
disponibilizam informaes sobre determinado assunto.
Nesta categoria podemos encontrar alguns sites de museus
brasileiros e portugueses. Entre eles destacamos o site do Museu
Nacional de Arqueologia, tutelado pelo Instituto Portugus de Museus
de Portugal. Alm de todas as informaes pertinentes a um site de
museu, o MNA possui uma visita virtual ao seu acervo, onde possvel
conhecer todas as seces expositivas do museu. Alm disso, algumas
peas do acervo foram seleccionadas e podem ser visualizadas em trs
dimenses. possvel comprar online os produtos da loja do museu, ou
seja, o site tambm presta servio de e-commerce para o museu7. O
site do MNA no se restringe s atividades do Museu mas tambm um site
de informaes e referncias sobre arqueologia em Portugal. Premiado
pela Unesco em 2002 com Web Art d'Or, de melhor site de museus do
mundo, o Museu Nacional de Arqueologia um bom exemplo de um site de
museu no mundo virtual.
Figura 2 Pgina de entrada do site do Museu Nacional de
Arqueologia
Fonte: http://www.mnarqueologia-ipmuseus.pt/
7 - A palavra e-commerce designa o comrcio eletrnico realizado
atravs da Internet. Para ser um e-
commerce no basta apresentar os produtos, preciso que o
utilizador possa comprar os produtos sem a necessidade de se
deslocar ao museu.
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A terceira categoria a de museus realmente interativos. Neste
tipo de site, pode at existir uma relao entre o museu virtual e o
museu fsico, mas so acrescentados elementos de interatividade que
envolvem o visitante. s vezes, o museu reproduz os contedos
expositivos do museu fsico e em outros casos, o museu virtual bem
diferente do museu fsico. O que torna estes museus interativos a
forma como eles trabalham com o pblico. A interatividade a alma
desse tipo de site de museu, pois permite que o pblico possa
interagir com e no museu. Neste caso, importante salientar que o
museu na Internet no perde as suas caractersticas essenciais e que
pode adquirir novas facetas. Ou seja, os objetivos do site no so
necessariamente diferentes do museu fsico, mas um complemento dele.
Conforme veremos depois, esta categoria de site na verdade um museu
virtual e no um site.
Figura 3 Pgina de entrada do Museu Virtual Sagres
Fonte: http://sagres.mct.pucrs.br
Um bom exemplo de um website de um museu que trabalha com
interatividade o caso do Museu de Cincia e Tecnologia de Porto
Alegre, cujo formato virtual tem o nome de Sagres. Ligado Pontifcia
Universidade Catlica do Rio Grande do Sul, o Sagres possui contedos
e formatos diferentes do museu fsico. A idia original no foi
reproduzir o museu fsico, mas trabalhar os contedos do museu de
forma ldica, criando outras atividades de interao que o museu fsico
no possibilita. No projeto do Sagres, a idia bsica a interao do
pblico. Os internautas podem fazer pesquisas sobre cincia e
tecnologia e brincar com os seus conhecimentos dessas disciplinas.
Segundo Ana Bertoletti e Antnio Costa (1999), o sistema um ambiente
de educao e procura adaptar os seus contedos s caractersticas dos
utilizadores.
Utilizamos esta tipologia apenas para distinguir a forma como os
museus trabalham a Internet. No entanto, preciso deixar claro que
um site de museu no , necessariamente, um museu virtual. Ele apenas
um site de museu.
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Sobre o conceito do museu virtual O conceito de museu virtual
ainda algo muito novo na museologia. Ele surgiu a partir da dcada
de 90 do sculo XX. Antes disso, o uso da Internet estava restrito
ao ambiente acadmico. Foi somente com a proliferao da Internet
comercial, a partir de 1994, que os museus comeam a apresentar-se
de forma virtual.
Para Anna Lisa Tota (2000), os museus virtuais online so na sua
maioria, aproximaes imperfeitas dos museus fsicos. Nesse sentido,
Pierre Lvy afirma que o que comummente chamado de museu virtual
nada mais do que um catlogo na Internet.
Os museus virtuais, por exemplo, no so muitas vezes seno maus
catlogos na Internet, enquanto que o se conserva a prpria noo de
museu enquanto valor que posta em causa pelo desenvolvimento de um
ciberespao onde tudo circula com fluidez crescente e onde as
distines entre original e cpia j no tm evidentemente razo de ser.
(LVY, 2000: 202)
A questo levantada por Lvy importante, na medida em que a
discusso sobre os museus virtuais ainda incipiente. Lvy nesta
afirmao d uma pista de como os especialistas poderiam trabalhar a
questo dos museus virtuais, discutindo a prpria noo de valor e de
conservao de patrimnio. Nesse sentido, a maioria dos museus
virtuais, est mais preocupada em apresentar e justificar sua faceta
virtual atravs de representaes, do que utilizar as potencialidades
que a Internet oferece para a interaco com o utilizador.
Mas ainda h pouca discusso terica sobre os museus virtuais.
Segundo Weiner Schweibenz (1998) o conceito de museu virtual est em
constante construo e fcil confundirmo-nos com as outras denominaes,
tais como: museu eletrnico, museu digital, museu online, museu
hipermdia, meta-museu, museu ciberntico, cibermuseu e museu no
ciberespao. Por se tratar de uma temtica ainda muito nova na
museologia, no h um consenso em relao ao que considerado museu
virtual e o que seria apenas um site de museu. A maioria dos
autores que trabalha com a questo aponta para uma definio ligada
virtualizao dos objetos e sua apresentao online, sem uma discusso
mais profunda sobre os aspectos tericos deste tipo de
abordagem.
Entre estes autores que trabalharam sobre a questo dos museus
virtuais, destaca-se Bernard Deloche, que discute a questo sob um
prisma filosfico. Em sua obra Le muse virtuel, publicada em 2001,
Deloche estuda a questo da virtualidade no processo museolgico.
Debruando-se basicamente sobre os museus de arte, Deloche estuda o
que ele chama de tripla reciprocidade da arte. Para ele, a arte est
ligada a trs termos fundamentais: o esttico, o museal e o virtual.
O esttico teria como processo o sentir, o museal expor e o virtual
substituir. Para Deloche (2001: 17), o virtual onipresente e
possibilita a emergncia de uma outra cultura, pois o virtual
alargou o campo da expografia.
O museu virtual permite a dessacralizao da arte, do objeto
sensvel, mas no deve-se, afirma Deloche (2001), fazer do museu um
depsito de arte mas tambm temer a fetichizao da arte pelos museus.
Para este autor, o museu tem uma dupla funo esttica: comunicar e
analisar, pois o museu um lugar privilegiado de experincias
sensoriais.
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Em relao questo do museu virtual, Deloche afirma que o museu um
templo da imagem, utilizando o conceito de museu paralelo, ou seja,
o museu virtual aquele que existe na virtualidade, quase que como
um substituto, um museu sem lugar e sem paredes. No entanto, para
ele, no h incompatibilidade entre o museu paralelo e o fsico, a que
ele d o nome de institucional.
Em relao posio de Deloche sobre os museus virtuais, discordamos
quando ele diz que o museu virtual um museu substituto. No nosso
entendimento, o museu virtual, sendo uma vertente virtual de um
museu fsico, no um museu substituto. Ele pode sim, ser um museu
complementar, pois pode existir fisicamente e ter uma vertente
virtual. Nesse sentido, o museu virtual pode ser to ou mais eficaz
quanto o museu fsico, mas no o substituir, sim uma nova perspectiva
de interao com o patrimnio.
Tanto Antonio Battro (1999) quanto Bernard Deloche (2001)
trabalham com a concepo de museu virtual, baseados no conceito de
museu imaginrio defendida por Andr Malraux. Malraux (2000) propunha
a criao de um museu imaginrio que serviria para abrigar todas as
obras de arte do mundo, devidamente fotografadas. Esse museu,
segundo Malraux, seria um espao da memria viva. Assim, cada pessoa
poderia ter o seu prprio museu imaginrio. O museu virtual uma
espcie de um museu imaginrio porque ao mesmo tempo que trabalha com
a reproduo, prioriza o uso da imagem como referncia patrimonial.
Nesse sentido, El museo virtual es mucho ms que poner fotos en
Internet de las reservas, colecciones permanentes y muestras
temporarias. Se trata de concebir un museo totalmente nuevo8
(BATTRO, 1999). Nesse sentido, o museu virtual no a reproduo de um
museu fsico, mas um museu completamente novo, criado para traduzir
as aes museolgicas no espao virtual. O museu imaginrio proposto por
Malraux tambm um museu novo, criado por cada um de ns, com as
imagens que selecionamos e reproduzimos dos museus fsicos. Nesse
sentido, o museu imaginrio de Malraux tambm um museu virtual, pois
cada pessoa poderia ter o seu prprio museu de reprodues.
Bernard Deloche diferencia o museu virtual do cibermuseu. Para
ele, o museu virtual um museu paralelo, aberto s novas sensaes. Os
sites ou os CD-ROMs dos museus so, para ele, cibermuseus, pois
modificam ou complementam o museu fsico. J o museu virtual uma nova
concepo do mesmo patrimnio, apresentada de forma virtual.
Partindo do conceito proposto por Bernard Deloche, entendemos o
conceito de museu virtual, distinguindo-o dos sites de museus ou
cibermuseus. Os cibermuseus so reprodues online do acervo ou parte
do acervo de um determinado museu. O museu virtual um espao virtual
de mediao e de relao do patrimnio com os utilizadores. um museu
paralelo e complementar que privilegia a comunicao como forma de
envolver e dar a conhecer determinado patrimnio. No nosso
entendimento, s pode ser considerado museu virtual, aquele que tem
suas aes museolgicas, ou parte delas trabalhadas num espao virtual.
Nesse caso, chamaremos de cibermuseus aqueles sites de museus que
no se enquadram nessa concepo de museu virtual.
8 - Traduo livre: O museu virtual muito mais do que por fotos na
Internet das reservas, colees
permanentes e exposies temporrias. Trata-se de conceber um museu
novo.
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Entendemos que a virtualidade no necessariamente ligada
Internet, pois os museus virtuais podem s-lo, mesmo sem estarem
online, atravs de CD-ROMs, quiosques, exposies fsicas,
performances, etc. Os museus virtuais so aqueles que trabalham o
patrimnio, atravs de aes museolgicas, mas que no necessariamente tm
suas portas abertas aos utilizadores em seu espao fsico.
Em relao ao conceito do museu virtual preciso esclarecer que o
museu virtual pode ter duas configuraes: vertentes virtuais de
determinado museu fsico, ou seja, podem ser uma outra dimenso do
museu fsico (como o Sagres, por exemplo) ou museus essencialmente
virtuais. Nesse caso, a existncia de um museu virtual no pressupe a
existncia de um museu fsico9. No primeiro caso, os museus virtuais
so complementos do museu fsico, pois podem trabalhar suas aes
museolgicas de forma diferente em suas duas vertentes. Nesse
sentido, o processo museolgico muito enriquecedor, pois o pblico
ter duas abordagens diferentes de um mesmo patrimnio: uma abordagem
presencial e uma abordagem remota.
No segundo caso, as aes museolgicas so efetuadas, na sua
maioria, no seu espao virtual, ou seja, no um museu a ser visitado
pelo pblico em seu espao fsico. Isso, no entanto, no invalida
algumas aes museolgicas fora do seu espao virtual e do espao fsico,
mas a essncia das suas atividades museolgicas concentra-se no seu
espao virtual.
Para explicar um pouco mais esta viso de museu virtual, temos o
exemplo um projeto de musealizao de um patrimnio, que embora no se
auto-denomine museu virtual cumpre as funes do que seria um museu
virtual nessa concepo. Trata-se do Projeto Portinari. O Projeto
Portinari foi criado em 1979, na Pontifcia Universidade Catlica do
Rio de Janeiro e tem como objetivo catalogar, preservar e divulgar
as obras do pintor brasileiro Cndido Portinari. O trabalho efetuado
pela equipe do projeto no se restringe ao site, mas abrange uma
srie de atividades ligadas ao esplio do pintor, tais como exposies,
pesquisas e inventrio das obras localizadas, pesquisa sobre a
autenticidade das obras, recolha de depoimentos, criao de contedos
para escolas, etc.
A existncia da Internet deu ao projeto um novo flego, pois
permitiu que um maior nmero de pessoas tenha acesso s informaes
recolhidas pela equipe. O site, criado em 1998, a face mais visvel
do projeto. Nele, possvel consultar as rplicas digitais das obras j
localizadas e catalogadas e conhecer um pouco mais sobre a vida e a
obra de Portinari10. O site tem uma seo especfica para o trabalho
com as crianas. Nela pode-se encontrar sugestes de atividades para
os professores desenvolverem com seus alunos na sala de aula. A
ideia trabalhar o contedo do site de forma ldica e atraente para o
pblico infanto-juvenil.
O que torna o site do projeto um museu virtual no o fato de
dizer ou no que um museu virtual, mas a forma como ele trabalha o
patrimnio virtualmente. As aes museolgicas efetuadas pelo projeto
Portinari, algumas delas virtuais, fazem com ele
9 - Aqui devemos deixar claro que a no existncia do museu fsico
no pressupe a existncia somente
do site, pois o museu pode ter um endereo fsico, mas o que o
torna virtual a forma como so desenvolvidas suas aes museolgicas,
ou seja, elas so efetuadas no espao virtual e no no espao fsico. O
museu virtual, essencialmente virtual, no abre suas portas para o
atendimento ao pblico em seu espao fsico. 10
- Boa parte das obras de Cndido Portinari encontra-se nas mos de
colecionadores particulares.
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possa ser considerado um museu virtual. Para ser um museu
virtual no basta ter as reprodues das obras de arte, devidamente
catalogadas, e apresent-las ao pblico, mas fazer atividades onde o
pblico possa interagir com estas referncias patrimoniais.
Figura 4 Pgina principal do Projeto Portinari
Fonte: http://www.portinari.org.br/
Uma outra questo que pertinente quando discutimos o conceito de
museu virtual entender a concepo utilizada por alguns sites de
museus, inclusive alguns museus virtuais, de que um museu um
edifcio que comporta uma coleo, para deleite de seu pblico. Esta
uma concepo de museu enraizada no sculo XIX e que o movimento da
Nova Museologia questionou, contrapondo-a com uma nova concepo de
museu que se baseia no patrimnio, de uma comunidade, estabelecida
num determinado territrio. Ao reproduzir a configurao de um
edifcio, com todas as suas caractersticas, o museu virtual est
reforando o conceito de museu existente na mentalidade da maioria
das pessoas. Mesmo projetos de museus essencialmente virtuais, como
o caso do Museu Virtual de Arte Virtuais, criado com j com este
objetivo, continuam a reforar essa idia11.
O design do MUVA, construdo provavelmente em VRML, reproduz as
divises fsicas de um museu tradicional12. Ao entrar no site, o
utilizador tem a sensao de visitar um edifcio de um museu com os
espaos fsicos necessrios: recepo, escadas, corredores, salas para
exposies individuais, exposies coletivas, etc. Maria Lusa Bellido
Gant (2001: 252) chega mesmo a afirmar que o MUVA, enquadra-se na
tipologia mais avanada dos museus virtual, pois () se estructura
como un autntico[sic] museo, con seis plantas, todas ellas
navegables, vestbulo, passilos,
11 - O MUVA Museu de Artes Virtuais, mantido pelo jornal El Pas,
um museu virtual com
reprodues de obras de arte uruguaia. 12
- VRML - Virtual Reality Modeling Language - uma linguagem
vectorial utilizada em desenhos 3D e multimdia.
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escaleras, ascensores13. Discordamos dessa autora nesse aspecto,
primeiro porque um museu virtual j um autntico museu, ou seja, ele
no precisa reproduzir fisicamente um museu para ser considerado um
autntico museu virtual. E em segundo lugar, uma visita virtual no
faz dele um museu virtual, pode ser apenas um bom site de museu. No
se pretende aqui questionar a utilizao do MUVA, recorrendo ao
edifcio para mostrar que um museu virtual, mas sim a idia de que
para ser um museu virtual autntico necessrio reproduzir um museu
fsico.
Figura 5 - Recepo do MUVA
Fonte: http://www.elpais.com.uy/muva/
No nosso entender, um dos mritos dos museus virtuais, alm de
poderem interagir de forma mais dinmica com os utilizadores,
questionar o conceito de que para ser museu necessrio ter um
edifcio. Nesse sentido, os museus virtuais ou os sites de museus
que tm essa opo de apresentao continuam a reforar esta idia,
podendo tornar-se simulacros de museus. O que podemos definir como
museu virtual aquele que faz da Internet espao de interao atravs de
aes museolgicas com o seu pblico utilizador. Os museus virtuais so
livres, no entanto, para utilizar metforas que lhes apetecer para a
navegao, utilizando de plantas baixas ou desenhos simulando
edifcios de museus. No entanto, preciso deixar claro que a
existncia de um museu no pressupe necessariamente um espao fsico,
mesmo que simulado virtualmente.
Consideraes finais A Internet trouxe para a museologia uma nova
perspectiva. No s porque permitiu potencializar o acesso aos museus
de forma mais ampla, mas tambm por dar oportunidade aos museus de
sarem de seus muros. As aes museolgicas dos museus, exercidas
atravs da Internet podem ter um alcance muito maior do que aquelas
que so exercidas em seu espao fsico, pois elas podem abranger um
pblico muito maior. Os museus que sabem tirar proveito de todas as
possibilidades que a Internet oferece, criando seus prprios museus
virtuais, conseguem ir alm de suas fronteiras. Alm disso, a
possibilidade de uma interao maior com o pblico a grande vantagem
da criao de museus virtuais, sejam eles representaes virtuais de
museus j existentes ou criados especialmente para a rede mundial de
computadores.
13 - Traduo livre: () se estrutura como um autntico museu, com
seis andares, todos eles navegveis,
recepo, corredores, escadas, elevadores
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11
Em nosso entendimento, boa parte dos muselogos e especialistas
de museus ainda no est ciente da revoluo que a Internet pode fazer
pelos museus. Talvez isso explique a falta de interesse em utilizar
todas as possibilidades que a Internet oferece, criando sites
apenas informativos, trabalhando a Internet apenas como se fosse
apenas um folheto eletrnico do museu. No estamos aqui fazendo juzo
de valor sobre aqueles sites que so apenas informativos, pois
sabemos que uma srie de fatores responsvel pela escolha de
determinado tipo de site, entre elas, a econmica, mas alertamos
para o fato de que a maioria dos profissionais dos museus ainda no
vem a Internet como uma ferramenta que pode fazer do museu uma
instituio mais dinmica e mais interativa.
Alm disso, como vimos, muitos autores ainda vem o museu virtual
como um simulacro de um museu fsico, ou seja, esto arraigados no
conceito de museu como um espao de exposio de determinada coleo. E
isso, infelizmente, restringe o uso da Internet pelos museus,
tornando seus sites, mesmo aqueles mais interessantes e atrativos,
apenas sites de museus e no museus virtuais.
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