UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS VII SENHOR DO BONFIM LUCIVANIA SILVA GONÇALVES O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA DOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA VISUAL NA CIDADE DE SENHOR DO BONFIM – BA. SENHOR DO BONFIM 2008
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS VII
SENHOR DO BONFIM
LUCIVANIA SILVA GONÇALVES
O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA DOS
ALUNOS COM DEFICIÊNCIA VISUAL NA CIDADE DE SENHOR DO
BONFIM – BA.
SENHOR DO BONFIM
2008
LUCIVANIA SILVA GONÇALVES
O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA DOS
ALUNOS COM DEFICIÊNCIA VISUAL NA CIDADE DE SENHOR DO
BONFIM-BA.
Monografia apresentada à Universidade do
Estado da Bahia – UNEB – CAMPUS VII, como
requisito parcial para a conclusão do curso de
Licenciatura Plena em Matemática, sob
orientação da Profª Msc Alayde Ferreira dos
Santos.
SENHOR DO BONFIM
2008
LUCIVANIA SILVA GONÇALVES
O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA DOS
ALUNOS COM DEFICIÊNCIA VISUAL NA CIDADE DE SENHOR DO
BONFIM-BA.
Monografia apresentada à Universidade do
Estado da Bahia – UNEB – CAMPUS VII, como
requisito parcial para a conclusão do curso de
Licenciatura Plena em Matemática.
Aprovada em __________de __________________de 2008
_______________________ _____________________
Avaliador Avaliador
______________________________________
Profª Msc Alayde Ferreira dos Santos
Orientadora
Aos meus pais que compartilharam dos meus melhores momentos e foram porto seguro naqueles mais difíceis; Aos que me apoiaram e estiveram sempre comigo dando-me força nesta caminhada.
AGRADECIMENTO
A Deus, que além da vida, proporcionou-me saúde, força, amor e perseverança
para que mais um de meus projetos se realizasse.
A professora Alayde, pela orientação, colaboração, paciência e sugestões que
muito contribuíram para a realização deste trabalho.
A minha irmã, pelos bons momentos de cumplicidade e alegria vividos.
A meu esposo, pelo amor e companheirismo.
Aos alunos e professores que contribuíram para a realização deste trabalho.
Aos bons professores que tive, por transmitirem seus conhecimentos com
clareza.
A todos que de uma forma ou de outra, direta ou indiretamente contribuíram
para a realização desse trabalho.
Resumo
Este trabalho tem como objetivo identificar as metodologias utilizadas pelos
professores no processo de ensino-aprendizagem de matemática em alunos
com deficiência visual. A pesquisa foi desenvolvida no Instituto
Psicopedagógico (escola especial) e no Núcleo CAP e também em escolas
regulares (uma particular e uma municipal) da cidade de Senhor do Bonfim -
Ba. Na abordagem teórica foram utilizados alguns autores para melhor
fundamentar a pesquisa tais como: Brandão (2006), Mazzotta (2001),
D’Ambrosio (2001) e Raíça (1990). Para alcançar os objetivos foi utilizada
como procedimento metodológico a pesquisa qualitativa, pois segundo Bogdan
e Biklen (1982), a pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como sua fonte
direta de dados e o pesquisador como seu principal instrumento, e para a
coleta de dados foram utilizadas a observação e a entrevista semi-
estruturadas. Os resultados desta pesquisa mostram que é importante que o
professor de Matemática se conscientize da relevância do seu papel no
processo educacional do aluno com deficiência visual, que ele busque uma
preparação mais adequada, inicialmente, aprendendo o sistema Braille e em
seguida procurando alternativas metodológicas que satisfaçam as
necessidades exigidas pelo aluno.
Palavras – chave: Educação Especial, Ensino de matemática e Deficiência
para crianças, adolescentes e jovens portadores de deficiência visual. O
objetivo do Núcleo é proporcionar recursos específicos e tecnológicos, oferecer
apoio pedagógico às escolas e aos professores do ensino regular comum,
tendo em vista a necessidade de suporte à inclusão de alunos com deficiência
visual na escola e na comunidade. O espaço físico divide-se em oito salas,
2 Cap - Centro de Apoio Pedagógico para Atendimento às Pessoas com Deficiência Visual.
uma sala de estimulação, uma de informática, uma brinquedoteca, uma
biblioteca, uma de administração, cozinha, banheiro e uma de alfabetização.
Além dos dois espaços citados acima foram utilizados uma escola particular e
uma escola municipal da cidade de Senhor do Bonfim. A escola particular
funciona nos três turnos e atende desde a Educação Infantil até o ensino
médio, tendo como um dos objetivos a formação integral dos alunos,
habilitando-os a viver em sociedade. E a escola municipal funciona também
nos três turnos (matutino, vespertino e noturno), com o ensino fundamental de
1ª a 8ª.
3.4 Sujeitos de pesquisa
A pesquisa foi desenvolvida com oito alunos deficientes visuais. Sete desses
alunos já estudam em escolas regulares e um deles nunca freqüentou a escola,
apenas recebe atendimento no Núcleo Cap. Os sujeitos estudados além de
freqüentar as escolas regulares, são atendidos no Instituto Psicopedagógico
todos os dias no turno oposto e no Núcleo Cap em dois dias da semana
(segunda-feira e quarta-feira), participando de atividades lúdicas, de interação
social, comunicação e linguagem, de aprendizagens específicas de
instrumentos e recursos relativos à deficiência visual como o Braille, o soroban,
a orientação e mobilidade e habilidades para a autonomia e a independência
nas atividades da vida diária.
A presente pesquisa demandou tempo para a coleta, pois foi realizada com
escolas e série diferentes, buscando assim uma visão geral sobre os
resultados da pesquisa em relação ao ensino da matemática.
CAPÍTULO IV
ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
A presente pesquisa teve como objetivo identificar as formas de como ocorre o
processo de ensino-aprendizagem da matemática com deficientes visuais. Para
isto fez-se necessário que o pesquisador observasse aulas de matemática no
Instituto Psicopedagógico (escola especial), no Núcleo CAP e também em
escolas regulares (uma particular e uma municipal) da cidade de Senhor do
Bonfim-Ba para obtenção dos dados. E, além das observações, foi realizada
uma entrevista com professores que têm em suas salas alunos com
necessidades educacionais especiais, uma vez que a vivência cotidiana com
esta realidade pode trazer informações relevantes para a melhor compreensão
do problema.
A pesquisa foi realizada com oito alunos deficientes visuais, sendo que apenas
um desses discentes nunca freqüentou a escola regular. Vale ressaltar que os
alunos além de freqüentarem as escolas regulares, são atendidos em turno
oposto nos centros especializados.
4.1 A prática pedagógica e a Educação Especial
A respeito da educação do deficiente visual, observamos muitas falhas que
prejudicam o desenvolvimento dos mesmos. Todas as pessoas sejam
deficiente ou não, têm direito a uma escola de boa qualidade onde a
afetividade esteja aliada ao aspecto cognitivo na relação professor-aluno, pois
a relação professor-aluno além de ser uma relação de transmissão de
conhecimentos é, sobretudo, uma relação interpessoal (OMOTE, 2000).
A pessoa com necessidades especiais, segundo Dechichi (2001), tem o direito
de receber uma educação que leve em consideração a sua singularidade e
eficiência, pois a partir daí poderá haver um desenvolvimento de seu potencial,
em outras palavras, o indivíduo, “sendo valorizado em suas habilidades,
auxiliando em suas dificuldades e respeitado em suas limitações” (p.56). Mas
ainda se observa na prática docente da maioria dos professores, à ausência de
uma boa formação para enfrentar o desafio de ensinar alunos com
necessidades especiais, ou seja, os docentes não estão capacitados para
receber e orientá-los. Segundo Turra (1975), o professor deve conhecer a
realidade particular de cada aluno, bem como suas possibilidades, para que
possa elaborar um programa adequado para seu desenvolvimento harmônico.
Além disso, a postura do professor e a maneira como o mesmo organiza e
efetiva sua prática em sala de aula, fundamenta-se em sua concepção de
desenvolvimento e aprendizagem humanos, e de deficiência e indivíduo
deficiente.
Mas podemos observar que nas escolas regulares observadas, não estavam
valorizando as habilidades dos seus alunos deficientes visuais. Eles estavam
indo para as escolas apenas para se integrar com os outros alunos não
deficientes, e além disso essas escolas não tem material e espaço adequados
para uma boa aprendizagem dos alunos. Os alunos apenas ouvem a
explicação dos professores sem estimulação nenhuma para aprender os
conteúdos, e apesar de passarem a estudar com alunos videntes não deixam
de ser assessoradas por um profissional especializado, em aulas individuais,
onde o mesmo procura esclarecer melhor os pontos que foram trabalhados
durante a aula.
O que ocorre, na maioria das vezes, é o professor da classe regular passar as
atividades que o aluno precisa fazer para o professor especialista para que o
mesmo possa adaptar o conteúdo para a linguagem que o cego utiliza, ou seja,
transcreve os conteúdos para o Braille. Porém, quem usualmente conhece
esse sistema é quem tem a necessidade direta dele, ou seja, alunos cegos e
professores “especialistas”. Os professores das classes regulares dificilmente
sabem como utilizá-lo, talvez porque não vejam nele um instrumento de grande
importância ou porque desconhecem sua forma de utilização. Isso dificulta
muito o aprendizado do aluno cego, uma vez que ele não tem a possibilidade
de fazer anotações segundo o seu código de escrita, depende sempre da sua
boa memória para poder abstrair o que está sendo passado. Também pode
ocorrer de o professor não entender o que ele escreveu, justamente por não
conhecer o Braille, e em conseqüência possíveis dúvidas podem ficar sem
resposta. É sabido que o processo de inclusão é, sem dúvida, um grande
passo positivo, quanto à possibilidade de socialização do indivíduo com
necessidades especiais. No entanto, percebe-se ainda, que na questão
educacional, ela ainda caminha a passos lentos, pois verifica-se nas classes
regulares, professores não preparados para atuar com o aluno com deficiência
e observa-se também a falta de recursos didáticos adequados e necessários
em sala de aula regular que abriga esses alunos.
4.2 Vivenciando na prática
As observações foram realizadas durante o período de julho a setembro de
2008, nos centros especializados e nas escolas regulares (uma particular e
uma municipal) em aulas de matemática.
Foram observados, alunos da 1ª, 6ª e 8ª séries do ensino fundamental e um
discente que nunca freqüentou a escola regular por acreditar que o processo
de inclusão nunca dará certo, pois segundo ele as escolas ainda não estão
preparadas para esse processo.
4.2.1 As aulas de matemática nas escolas regulares
As observações foram feitas em três semanas, sendo quatro horas por
semana, totalizando doze horas. Em cada escola, a carga horária, foi de duas
horas/aulas. Apesar da direção das escolas regulares ter facilitado o contato
com a equipe e com o corpo docente, era visível a curiosidade e a
desconfiança apresentada entre os professores. Na sala de aula, os alunos, a
princípio, reagiram à presença do pesquisador com agitação, curiosidade e
afeto, mas passado o primeiro impacto, acostumaram-se. Iniciamos nossas
observações com a apresentação e o objetivo da presença do pesquisador nas
escolas. Antes das observações, pudemos constatar a curiosidade dos alunos,
eles ficavam perguntando se estávamos ali para ajudar Maria3, se era algum
parente dela, etc. Durante as observações realizadas na sala de aula, as
professoras mostraram-se participativas, ajudando-me a coletar dados. No
primeiro dia de observação, na escola R1, a professora tinha pedido para que
os alunos refizessem o teste que tinha sido aplicado duas semanas antes da
observação. Então neste momento enquanto os demais alunos tentavam
responder a prova, a única aluna deficiente visual como não tinha a prova em
braille, ficou lendo um livro que não tinha nada a ver com a aula. Vale ressaltar
que a própria professora não sabia de que se tratava o livro. Sobre a
necessidade de o professor aprender o braille, Sá (2007) comenta que:
“O aprendizado do sistema braille certamente facilitará e enriquecerá
o seu trabalho, pois será mais fácil e mais ágil acompanhar a
evolução e os progressos do aluno sem a necessidade de
intermediários, especialmente no que diz respeito à leitura e á
escrita”.(p.35)
Portanto, conclui-se que o ensino de braille é fundamental para os profissionais
da escola regular que atende alunos com deficiência visual, pois sem este
recurso, ficam prejudicados tanto o professor como o aluno. O aluno, sem este
recurso não pode fazer suas anotações e nem ler nada e o docente não tem
como ajudar-lo além de não saber se o discente está progredindo ou
regredindo.
No segundo dia, foi trabalhado algumas questões utilizando problemas
envolvendo as quatro operações. A professora sugeriu à classe que
aproveitasse situações ocorridas em sala de aula ou em casa para a
elaboração de problemas, tornando assim viva a proposta para os alunos.
3 Nome fictício dada para a única aluna deficiente visual da sala, na escola R1.
Exemplo - Problema elaborado por um dos alunos da professora. Um dia, eu,
quebrei uma jarra de água da Kátia. Minha mãe deu pra ela 50,00 reais. Ela
comprou a jarra e sobrou 5,00. Qual é o preço da jarra?
Operação 50,00 - 5,00 = 45,00
50,00
-5,00
______
45,00
Esse problema mostra-nos que o aluno aproveitou um fato ocorrido na casa de
sua vizinha. A linguagem utilizada mostrou que a elaboração do enunciado foi
do próprio aluno que queria saber quanto sua mãe gastou na reposição do
material danificado. Tendo a classe vivida a situação e as discussões entre os
envolvidos e o encaminhamento dado pela professora, isso facilitou a
resolução do problema. Todos os alunos acertaram menos a aluna deficiente
visual. A aluna com deficiência visual trocava unidades por dezenas
respondendo: “Não sei.", quando indagado sobre a troca entre as unidades e
as dezenas. Não conseguia fazer a conta para saber o valor total de quatro
objetos adquiridos cada um valendo 5 reais. A professora da classe comentou
que a aluna tinha dificuldade em solucionar as situações problema nas aulas
de matemática por não conseguir lê-las, mas realizava as operações de adição
com tranqüilidade. Com essa situação podemos concluir que sem o material
concreto, fica difícil a aprendizagem dos conteúdos matemáticos.
Considerando o fato de que o desenvolvimento dos deficientes visuais se dá
mediante via alternativa distinta da dos videntes, cabendo ao educador
conhecer as características de maior importância no desenvolvimento e
aprendizagem daqueles, adaptando seus conhecimentos e suas ações
educacionais a essas características. Portanto, transmitir estes acontecimentos
de uma maneira acessível aos alunos com deficiência visual é um desafio a
qualquer educador. Por esse motivo, ele acaba vendo-se obrigado a mergulhar
em um mundo completamente diferente do seu dia-a-dia, onde os métodos e
práticas pedagógicas tradicionais não são as melhores opções na elaboração
das aulas.
Nas observações pudemos perceber que a aluna estava na sala somente para
se socializar com os outros, pois em todas as atividades a aluna não
participava de nada. Nas explicações, fazia poucas perguntas, e nesses
questionamentos percebemos que a professora às vezes não tinha como
explicar para a aluna, pois na escola não tinha material concreto e nem livro
adaptado à necessidade da aluna. Após as explicações, a professora passava
atividade, vale ressaltar que a aluna leva as atividades da escola regular para
o centro especializado onde recebe atendimento no turno oposto, lá a
atividade é adaptada para o braille e com a ajuda de um profissional a aluna
responde as questões. Nos três dias de observações que duraram seis horas,
a rotina da aluna foi à mesma. Em conversa com a docente sobre a rotina da
aluna na sala de aula, ela nos explicou que a aluna estava freqüentando a
escola para socializar-se com os outros alunos e que os colegas ajudavam-na
muito. E que era com a ajuda dos colegas que ela enviava as atividades para o
centro especializado, onde ela respondia as questões e devolvia no dia
seguinte. Em relação ao material, a professora reclamava de falta de material
concreto, o que dificultava muito o seu trabalho com a aluna deficiente visual.
Segundo Meire Cavalcante4:
“O pouco preparo dos professores para atendê-los ou o pouco apoio
dado a esses profissionais fazem com que, em alguns casos, o direito
de estudar seja exercido pela metade: muitos ainda acham que a
escola, para quem tem deficiência, é espaço só para recreação”.
(revista Nova escola, p.12).
Notou-se que falta mais preparo por parte dos professores, pois muitos estão
vivenciando o processo de inclusão, mas pouco tem cursos específicos. No
caso da escola supracitada, em relação ao braille, a professora explicou que
não entendia nada dessa escrita. Alguns autores consideram ser importante
que o professor de matemática tenha conhecimentos neste domínio, no sentido
de acompanhar o trabalho desenvolvido pelo aluno cego, à semelhança do que
faz para os alunos que usam a escrita a negro (Santos & César, 2007).
4 Repórter da revista Nova escola.
Já na escola R2, pudemos observar que a rotina do aluno era um pouco
diferente da aluna da escola R1, o aluno também não fazia as atividades na
sala de aula, todas as atividades eram feitas no centro especializado que no
caso é o mesmo da aluna da escola R1. Mas para não ficar na sala sem fazer
nada, o professor propôs responder problemas matemáticos envolvendo
adição, subtração, multiplicação e divisão. Para as aulas, o aluno sempre leva
o soroban, a professora lia a questão para o aluno enquanto ele resolvendo-as
em seu material. Em relação ao conteúdo passado pelo docente em cada aula,
o aluno tentava o máximo memorizá-lo, para depois responder as questões
enviadas, junto com um especialista do centro. Pudemos notar que o dia-a-dia
desse discente é um pouco “diferente” da aluna supracitada. Este aluno fazia
mais perguntas para a professora, discutia com os colegas em atividades que
eram realizadas em grupo, e fazia de tudo para ser um aluno exemplar, apesar
de suas necessidades e de todas as barreiras enfrentadas na escola. César
(2003) considera que os alunos cegos devem ser incluídos em pequenos
grupos, que incluam também alunos ditos normovisuais, potenciando as
oportunidades de participação de todo e qualquer aluno, tal como subscrevem
os princípios da educação inclusiva, nas atividades da sala de aula. Importa,
para que tal seja possível, que todos os alunos tenham a possibilidade de
desenvolver as mesmas tarefas, ainda que o façam em níveis ou com ritmos
diferentes.
Em todas as observações nas escolas regulares, foi possível perceber, por
parte dos professores, grande resistência em aceitar o desafio colocado pelo
processo de construção da escola inclusiva, o que consideramos perfeitamente
compreensível, dada à ausência de sua formação para enfrentar esse desafio.
Em conversa com as professoras comentou-se, ainda, a relevância da
presença de outra professora na sala de aula (professor itinerante), para
auxiliá-las, pois, segundo elas, o atendimento às crianças deficientes visuais
tem de ser individualizado, e elas não têm esse tempo, devido ao grande
número de alunos na sala de aula. O professor itinerante, de acordo com as
orientações do Instituto Helena Antipoff (IHA)5, tem o objetivo de “prestar
assessoria às escolas regulares que possuem alunos com necessidades
especiais incluídos (...), [tendo] como atribuição a produção de materiais
pedagógicos necessários ao trabalho com estes alunos” .
Diante de todo esse processo de inclusão, percebeu-se que a escola e os
docentes precisam estar preparados para serem capazes de trabalhar com os
alunos que chegam até eles, independentemente de suas diferenças ou
características individuais, pois cada aluno requer estratégias e materiais
específicos e diversificados, e que cada um aprende de uma forma e um ritmo
próprio. Portanto precisamos dar oportunidades para todos aprenderem os
mesmos conteúdos, fazendo as adaptações necessárias.
4.2.2 E nos centros especializados
Foram observados dois centros especializados: uma escola especial e um
núcleo de apoio pedagógico. Nos centros especializados, os alunos recebem
toda uma educação voltada para cada necessidade. Para os estudos dos
cálculos como é o nosso caso, os alunos são orientados através do soroban,
do material dourado, etc.
Os profissionais do Núcleo trabalham com todos os alunos individualizados, ou
seja, cada um tem seu horário programado. Neste estabelecimento são
atendidos um aluno da 1ª série do ensino fundamental e um que não freqüenta
a escola regular. Nas observações foram trabalhados os seguintes conteúdos
matemáticos: números ordinais; números pares e ímpares; unidade, dezena e
centena; adição e subtração, etc.
4.2.2.1 Trabalhando com números pares e ímpares
5 Órgão da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro responsável pelas ações desenvolvidas na área de Educação Especial.
No caso dos números pares e ímpares, conforme observado, o processo
tradicional de introdução a esses conceitos inclui, no tato ativo, seu sentido de
percepção. Através do contato com o corpo, a construção do conceito de
número par é iniciada pelo professor através de indagações: “Quantos olhos
você tem? Quantas mãos? E orelhas? Esses são números pares”. O conceito
de número ímpar é construído analogamente através de indagações sobre o
número de narizes, número de dedos em uma mão, etc. Esse processo de
construção através do tato e do corpo é fundamental para a criança deficiente
visual, visto que o conhecimento de seu próprio corpo é comprometido pela
falta da visão. Não podemos deixar de relacionar os conceitos escolares ao
corpo e à vida, principalmente neste caso. Sobre o uso do corpo na aquisição
de conhecimentos, Brandão (2006, p.14) destaca que “a matemática foi sendo
desenvolvida em função das necessidades sociais. O uso do próprio corpo,
como os dedos das mãos, era a maneira mais natural de contagem”.
Nas aulas usuais, posteriores, os alunos trabalharam com material concreto,
como o material dourado, por exemplo, e foram convidados a agrupar uma
quantidade de pequeninos blocos de madeira, fornecida pelo professor em
pares, para que, dessa forma, pudessem compreender o que são quantidades
correspondentes a um número par ou a um número ímpar. Então eles iam
contando-as e logo após respondia a questão. Depois de realizar esse
processo com o material concreto e também com os próprios dedos do aluno, o
profissional passava as questões enviadas pelo professor da escola regular e
os discentes liam em braille e depois respondia-as. Mas foi percebido que a
grande dificuldade dos alunos deficientes visuais é dar a resposta sem utilizar o
material concreto. Quando a professora perguntou se o número 7 era par ou
ímpar, o aluno sentiu muita dificuldade, tentou responder, mas não conseguiu.
Mas com ajuda do material, ele ia juntando de dois em dois, após a contagem
dava a resposta para a professora. Portanto, a utilização de recursos
metodológicos adequados às necessidades do aluno deficiente visual implica
em melhor rendimento no aprendizado, ou seja, os alunos demonstram
compreender melhor a matemática a partir da “sensação tátil”.
4.2.2.2 Trabalhando com adição e subtração
Em relação a estes conteúdos, pudemos observar um aluno resolvendo uma
situação-problema sugerida pela professora. Ao resolver o problema, Paulo6
realizou um cálculo mental e conseguiu dar o resultado aproximado, o que
instigou a profissional a compreender o seu processo de raciocínio. Assim ela
estabeleceu uma conversa para poder entrar com a questão central do
problema, e logo após utilizou o material dourado na busca de traçar a resposta
correta. Vejamos o extrato abaixo:
Profª.: Carlos e Roberto participaram de uma competição. O desafio era
colocar o maior número possível de fichas na caixa. Carlos conseguiu colocar
315 e Roberto 98. Quem colocou o maior número de fichas?
Paulo: Carlos
Profª.: Então, foi ele que conseguiu colocar o maior número de fichas possível?
Paulo: Hum. Não foi professora?
Profª.: Agora, eu queria saber quantas fichas Carlos tem a mais que Roberto?
Neste momento, Paulo parou como se estivesse realizando um calculo mental.
Paulo: Ele tem 115 a mais.
Profª.: Como é que você está chegando a esse cálculo?
Paulo: Ah! Eu tô chutando...
Profª.: Bom, e se fosse dinheiro?(...)315 reais em vez de fichas, tá!
Paulo: 200. Ah! Se ele tem 98 e outro tem 315. (...) então ele tem 215 a mais.
Pode-se observar que Paulo ainda desenvolve este processo mentalmente.
Depois de todas as indagações, a professora sugeriu utilizar o material dourado
para que o aluno pudesse realizar o seu raciocínio. O aluno pegou as barras e
colocou na mesa as quantidades correspondentes.
Profª.: E você vai fazer o que agora?
Paulo: Tirar 98
Profª.: Como você fará isso?
Paulo: Ah! Eu tiro um. Pra ficar 90(estava considerando as nove dezenas de
sua mão)
6 Nome fictício
Profª.: Hum! E dá para tirar 8 de lá agora?
Paulo: Não. Tem que trocar 10 por 1
Neste momento, Paulo entregou uma barra que retirou da ordem das dezenas.
Ao receber as dez unidades, conta-as.
Profª.: Então e essas ai? Você já tirou oito?
Paulo: Conta oito unidades e segura duas.
Neste momento, Paulo colocou na ordem das unidades. E logo após deu a
resposta correta.
Paulo: 217 reais
Observamos a compreensão matemática estabelecida por Paulo durante esta
situação-problema. Quando o aluno estava respondendo o problema das
fichas, ele apenas respondia aleatoriamente sem ter compromisso, mas ao
mudar os elementos da situação foi despertado o interesse do discente, faço
uso do que Brosseau (apud PAIS, 2002, p.81) identifica como ruptura do
contrato didático, o que levou Paulo a desejar a resposta certa. Com o material
dourado notou-se que a situação ficou mais fácil de responder. As relações
numéricas abstratas passaram a ter uma “imagem” concreta facilitando a
compreensão, ou seja, obtém-se um notável desenvolvimento do raciocínio e
um aprendizado bem mais agradável.
4.3 Analisando e interpretando o parecer dos professores
Entrevistamos três professores em sala de aula que convencionou-se em
denominar de P1, P2 e P3, vale ressaltar que as entrevistas foram realizadas
nas escolas, num horário previamente agendado entre as docentes e a
pesquisadora, nos dias treze de agosto, quatro e dez de setembro de dois mil
e oito. Foram elaboradas seis perguntas com o objetivo de identificar as
metodologias utilizadas por eles nas aulas de matemática e também para saber
se os docentes acreditavam no processo de inclusão. Com isso segue a
transcrição da entrevista feita com os professores com suas respectivas
análises.
Com a primeira pergunta, pretendíamos saber se os professores acreditavam
no processo de inclusão. E o que poderia ser feito para que o processo de
inclusão funcionasse de maneira eficaz.
Pergunta 1: Você acredita no processo de inclusão dos alunos com
necessidade educacionais especiais? E no seu ponto de vista o que realmente
falta para que a proposta de inclusão funcione de maneira eficaz?
P1: “Teoricamente sim, mas na prática precisa que os profissionais se
estruturem e se conscientizem da real necessidade da inclusão”.
P2: “Sim. Pois a priori acreditamos que as pessoas com deficiência estão
buscando cada vez mais o seu espaço. E a sociedade tem percebido as suas
potencialidades. Além disto, a Instituição tem como objetivo defender e garantir
a efetivação dos Direitos Humanos através da inclusão. Ao longo desses nove
anos percebemos que tem faltado o envolvimento e o compromisso por parte
da comunidade escolar (gestores, professores, alunos e família)”.
P3: “Sim, mas precisa de muitas mudanças nas escolas, e também dos
profissionais (mais cursos), etc.”.
As respostas dadas pelos entrevistados P1 e P3, revelam-nos que eles ainda
acreditam no processo de inclusão teoricamente, que na prática precisa mudar
muito a estrutura dos espaços educacionais, e também dos profissionais. E que
a inclusão não é apenas integrar alunos portadores de necessidades especiais
em uma sala regular para socializar com os demais. Sobre o processo de
inclusão Glat e Nogueira (2003, p.139) dizem:
“A inclusão de indivíduos portadores de necessidades educacionais
especiais na rede regular de ensino não consiste apenas na
permanência junto aos demais alunos, nem na negação dos serviços
especializados àqueles que necessitam. Ao contrário, implica numa
reorganização do sistema educacional, o que acarreta a revisão de
antigas concepções e paradigmas educacionais na busca de se
possibilitar o desenvolvimento cognitivo, cultural e social desses
alunos, respeitando suas diferenças e atendendo às suas
necessidades”.
Podemos também perceber que os professores receiam atender em suas aulas
alunos portadores de necessidades especiais por não se sentirem preparados.
Chaves (2002), verificando o sentimento dos professores frente à possibilidade
de receberem alunos especiais, chega à conclusão que os docentes sentem-se
despreparados para trabalhar com estes alunos, percebem que não terão apoio
teórico nem prático e que a inclusão, nestas condições, tende a se tornar
exclusão. Ressalta ainda “que as escolas não dispõem de estruturas físicas e
equipamentos para incluir e integrar o aluno portador de deficiência” (CHAVES,
2002, p.94).
Diante da resposta dada pelo entrevistado P2, percebe-se que ele acredita na
inclusão dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais nas
salas de aulas, de ensino regular, pois como cidadãs que são, devem ter seus
direitos assegurados e serem tratadas com dignidade, tendo entrada e
participação garantidas em todos os espaços físicos e em todas as atividades
possíveis. Mas ressalta que ainda restam algumas ações a serem
concretizadas para que a inclusão dê certo como a parceria da família com a
escola; envolvimento de todos os segmentos da escola e do poder público não
apenas "determinando" a inclusão, mas oferecendo estrutura adequada para
que se realize a contento.
“(...) a inclusão não se limita ao atendimento aos indivíduos que
apresentam necessidades educacionais especiais, mas demonstra
apoio a todos que fazem parte da escola: professores, alunos e
pessoal administrativo”. (STAINBACK, 1999, p.20).
Portanto não podemos julgar que a inclusão é um processo fácil, este
movimento exige uma radical transformação da escola, pois caberá a ela
adaptar-se às condições dos alunos, ao contrário do que acontece hoje,
quando os alunos é quem têm que se adaptar à escola. A escola precisa estar
preparada para ser capaz de trabalhar com os alunos que chegam até ela,
independentemente de suas diferenças ou características individuais. A
sociedade e a própria família também precisa acabar com o preconceito que
ainda existe em relação à pessoa que tem algum tipo de deficiência, para que
aconteça a efetivação de uma prática educacional inclusiva. Outro fator que
dificulta a inclusão é o fato dos professores das classes regulares, na sua
maioria, não possuírem cursos específicos na área de educação especial. Este
é um fato que dificulta profundamente a educação do aluno especial na classe
regular determinando assim, a falta de integração e interação entre os
mesmos.
A segunda pergunta tinha por objetivo identificar o relacionamento existente
entre os alunos deficientes com os alunos “normais”.
Pergunta 2: Como se processa a relação do aluno com necessidades especiais
com outro aluno considerado “normal”?
P1, P2 e P3: “A relação entre os alunos com ou sem deficiência acontece
naturalmente”.
Com as respostas a essa pergunta conseguimos atingir o nosso objetivo, pois
fica clara que o relacionamento entre os alunos com ou sem deficiência ocorre
naturalmente. Nos primeiros contatos com o aluno com necessidades
especiais, os outros discentes ficam meio distantes, mas com o tempo, eles
percebem que todos podem se relacionar naturalmente, e acabam ajudando
uns aos outros.
Fernandes (1999) salienta que:
“Um dos princípios fundamentais das escolas inclusivas é de que
todos os alunos possam aprender juntos, devendo se adaptar aos
diferentes estilos de aprendizagem, necessitando então de currículos
adequados e de estratégias pedagógicas de cooperação entre
comunidades”. (p.5)
Gil (2000) complementa que: “(...) os resultados têm sido muito positivos:
crianças que convivem com a diversidade desde pequenas tendem a crescer
com menor carga de preconceitos e a aceitar com naturalidade as diferenças”.
Isso pode ser explicado pelo fato de que quando a escola desenvolve um
processo de sensibilização, todos se beneficiam, uma vez que os alunos com
necessidades educativas especiais aprendem a exercer a solidariedade e a
conviver com a diferença.
O questionamento abaixo foi elaborado com o intuito de saber como o aluno
com necessidades especiais se comporta em um trabalho realizado em grupo.
Pergunta 3: Quando há necessidade de fazer um trabalho em grupo, como o
aluno especial se comporta?
Todos os entrevistados responderam que o comportamento dos alunos é igual,
os alunos sempre tentam ajudar o colega que apresenta necessidades
especiais. O P2 ainda acrescenta sobre a importância do trabalho em grupo:
“O trabalho em grupo é o melhor momento, é onde se dá de maneira mais
visível a inclusão, pois os alunos trabalham em conjunto um aproveitando do
outro as suas potencialidades. Cabendo aos professores estarem atentos a
algum tipo de discriminação que venha ocorrer”.
As respostas dadas pelos entrevistados nos mostram que a convivência dos
alunos é harmoniosa, ou seja, eles estão sempre ajudando os colegas com
necessidades educativas especiais. E que é importante se trabalhar em grupo,
pois quanto maior for o nível de integração e de cooperação entre os alunos e
o professor melhor será a autonomia e aprendizagem dos mesmos.
A quarta questão foi formulada para verificar as dificuldades encontradas pelos
docentes ao ensinar os alunos, apesar de suas diferenças.
Pergunta 4: Que dificuldades no ensino sentem os professores ao ensinar
todos os alunos de uma mesma turma, apesar de suas diferenças?
P1: “Em relação ao deficiente visual, o maior problema está no material, pois a
escola não tem material adequado a suas necessidades”.
P2: “Acredito que a maior dificuldade do professor está em montar e colocar
em prática um plano de aula em que todos os alunos possam está
contemplado”.
P3: “A dificuldade está nos recursos pedagógicos, pois a escola não tem”.
Percebe-se que de acordo com as respostas do P1 e P3, a dificuldade
enfrentada por eles está em relação ao material didático, pois a escola não tem
material adequado, que no caso dos deficientes visuais, são os livros em
braille, o uso do soroban7 dentre outros. Mas nota-se que o processo de
inclusão é, sem dúvida, um grande passo positivo, quanto à possibilidade de
socialização do indivíduo deficiente. No entanto, percebe-se ainda, que na
questão educacional, ela ainda caminha a passos lentos e curtos, pois verifica-
se nas classes regulares, professores mal ou não preparados para atuar com o
aluno com deficiência e observa-se também a falta de recursos didáticos
adequados e necessários em sala de aula normal que abriga esses alunos.
Segundo Masini (1994, p. 144):
“Para que o deficiente visual possa organizar o mundo ao seu redor e
nele se situar precisa dispor de condições para explorá-lo. As
situações educacionais necessitariam estar organizadas de maneira
que os deficientes visuais utilizassem suas possibilidades (táteis,
térmicas, olfativas, auditivas, cinestésicas) e deveriam estar
adequadas as suas experiências perceptivas”.
Logo trabalhar matemática com alunos deficientes visuais parece ser uma
tarefa não muito fácil, desse modo, ao professor cabe a responsabilidade de
estar buscando estratégias concretas que possibilitem a compreensão de todos
os alunos.
7Soroban é o nome dado ao ábaco japonês, que consiste em um instrumento usado para fazer cálculos matemáticos. No Brasil ele foi adaptado em 1949 para o uso de alunos cegos, sendo que hoje é adotado em todo o país.
Com a quinta questão pretendíamos identificar quais as metodologias utilizadas
pelos professores no ensino de matemática para seus alunos deficientes
visuais.
Pergunta 5: Em relação à matemática: como se processa o ensino de
matemática para deficientes visuais?
P1: “O trabalho é feito através do soroban e com materiais concretos”.
P2: “O ensino da matemática para pessoas com deficiência visual é feita a
partir das adequações do conteúdo a ser trabalhado em sala de aula,
produzidos através do sistema braille, o mesmo programa e o mesmo conteúdo
dos alunos não deficientes visual. Não se trata de um novo currículo e sim, de
adequar o já existente as necessidades desses alunos”.
P3: “Com materiais concretos...”.
Nota-se que de acordo com P1 e P3, para o deficiente visual a utilização de
materiais concretos se torna imprescindível, haja vista que tem no concreto, no
palpável, seu ponto de apoio para as abstrações. Ele tem no tato seu sentido
mais precioso, pois é através da exploração tátil que lhe chega a maior parte
das informações. É através dela que ele tem a possibilidade de discernir
objetos e organizar idéias. Dessa forma o professor pode se esforçar no
sentido de trabalhar concretamente os conteúdos, para que os resultados finais
sejam maximizados. E trabalhar de forma concreta com deficientes visuais
implica materiais que eles possam tocar, pois é com as mãos que eles têm a
possibilidade de enxergar. “O conhecimento (...) é o resultado das relações que
podem existir entre o homem e o meio, sendo facilitado quando as mesmas
são mediadas por instrumentos concretos”. (ROSA, 1998).
Já o P2 preferiu falar sobre a prática pedagógica do docente, para ele, o
professor precisa saber trabalhar com a diferença a ponto de contribuir com a
formação de todos os seus alunos, quaisquer que sejam. Ele precisa examinar
a sua prática pedagógica sob a ótica da remoção das barreiras à aprendizagem
de qualquer criança, uma vez que todas elas, em determinados momentos da
escolarização, podem apresentar debilidades e potencialidades. “Todos os
alunos devem ter acesso a um currículo básico rico em conteúdos, embora as
estratégias específicas para facilitar a aprendizagem precisem ser baseados
em estilos de aprendizagem individuais” (Stainback, 1999, p.144). No Brasil, as
adaptações curriculares estão respaldadas na atual LDB8, em seu capítulo V,
artigo 59, onde assegura aos alunos currículos adaptados às suas
necessidades e às suas potencialidades. Para tanto, os professores precisam
ser criativos e convictos de que a aprendizagem é possível para todos os
alunos e de que ninguém pode estabelecer os limites do outro.
A próxima questão foi formulada com o intuito de identificar quais as
dificuldades enfrentadas pelos alunos com deficiência visual em relação ao
ensino de matemática.
Pergunta 6: Quais as dificuldades das pessoas com deficiência visual em
relação aos conteúdos matemáticos?
P2: “As principais dificuldades dos alunos com deficiência visual são a falta de
material adequado às pessoas com D.V.”.
P3: “Sente dificuldade em conteúdos que fazem relação com gráficos”.
Nessas respostas o que chama a atenção é que a maior dificuldade está
relacionada à falta de material adequado e a conteúdos que exigem a
visualização aliada à imaginação. Porém, a sua visualização, em grande parte,
se dá através do contato direto, o que nem sempre é possível. Nota-se também
que quando o conteúdo é teórico, abstrato, o deficiente visual não tem tantos
problemas quanto à compreensão, pois como não têm a possibilidade de
anotar tudo, precisam prestar bastante atenção e procurar apreender o que
conseguirem na memória. E quando o aluno entende o que está sendo dito,
tem a possibilidade de fazer as abstrações de maneira mais efetiva,
8 LDB, nº. 9.394 de 20 de dezembro de 1996.
principalmente o deficiente visual que, privado da visão, recorre à relação
ouvido–mão para fazer as associações.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As mudanças sócio-culturais numa sociedade de transformação exigem cada
vez mais que seus participantes estejam sempre mais envolvidos e
relacionando-se entre si. A Era da comunicação e da informação levam-nos à
necessidade de interação uns com os outros. Dessa forma não é possível,
numa sociedade abrangente, o atendimento somente de uma parcela
privilegiada da sociedade. Ela precisa antes de tudo, atender todos aqueles
que dela fazem parte. A pessoa com necessidades especiais não pode ser
mantida fora desse convívio. A inclusão, portanto, é a única forma de atender
ao indivíduo, transformando-o e tornando-o cidadão em pleno gozo de suas
capacidades, com autonomia e capaz de interagir com a cultura em sociedade.
Nesta perspectiva, através dessa pesquisa, analisamos as metodologias
utilizadas pelos professores na abordagem dos conceitos matemáticos com
alunos deficientes visuais, observando de que forma ocorre o processo ensino-
aprendizagem da matemática com esses alunos, possibilitando-lhes assim uma
aprendizagem mais significativa e mais inclusiva.
De acordo com os dados coletados pode-se notar que de fato, como foi
mencionado na problematização deste trabalho, os alunos com deficiência
visual enfrentam várias barreiras no acesso às ferramentas culturais da
matemática e à sua participação em cenários de educação regular, pois as
escolas não dispõem de materiais adaptados às suas necessidades e há falta
de métodos adequados, impossibilitando assim, maior interação no processo
ensino-aprendizagem. Notou-se que quando o professor utilizou os
instrumentos concretos (material dourado e o soroban), por serem recursos
pedagógicos que possibilitavam a percepção tátil, o estudante conseguiu
perceber o sentido das operações matemáticas, ou seja, o contato com esses
tipos de materiais facilitou o entendimento da construção de fórmulas
matemáticas. Percebemos que o concreto auxilia o processo ensino-
aprendizagem, motivando ou mesmo possibilitando a formação de conceitos.
Também observamos que os deficientes visuais incluídos nas escolas
pesquisadas estão à margem do processo ensino-aprendizagem e que os
professores ainda estão se “familiarizando” com a idéia de tê-los em suas salas
de aulas regulares.
Apesar de toda essa problemática, verificamos que a dificuldade dos alunos
com deficiência visual na disciplina matemática diminui quando há recursos
didáticos adequados à sua especificidade. Então é preciso, segundo Barbosa
(2003), que o professor busque recursos mais adequados para trabalhar com
esses alunos, lembrando que há peculiaridades no desenvolvimento de todas
as crianças, tendo elas deficiência ou não. A criatividade foi e continua sendo
um elemento indispensável para o homem superar problemas e desafios
gerados pelo seu ambiente físico e social.
Portanto, a utilização de recursos metodológicos adequados às necessidades
do aluno deficiente visual implica em melhor rendimento no aprendizado, ou
seja, os alunos demonstraram compreender melhor a matemática a partir da
“sensação tátil”. Neste sentido, entendemos que o objetivo estabelecido no
início desse trabalho foi plenamente alcançado.
Enquanto professores e membros da sociedade que nos rodeia, temos o dever
de garantir o acesso de todos os alunos a experiências de aprendizagem ricas
e diversificadas, que contribuam para a construção do sucesso escolar. Assim,
devemos proporcionar, tanto a alunos cegos como a alunos videntes,
experiências de aprendizagem que promovam o desenvolvimento de
competências matemáticas e sociais.
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ANEXO – ROTEIRO DA ENTREVISTA
ROTEIRO DA ENTREVISTA
1. Você acredita no processo de inclusão dos alunos com necessidade educacionais especiais? No seu ponto de vista o que realmente falta para que a proposta de inclusão funcione de maneira eficaz? 2. Como se processa a relação do aluno com necessidades especiais com outro não portador de necessidades especiais? 3. Quando há necessidade de fazer um trabalho em grupo, como o aluno especial se comporta? E o discente considerado “normal” como reage nesse mesmo trabalho? 4. Que dificuldades no ensino sentem os professores ao ensinar todos os alunos de uma mesma turma, atingindo a todos, apesar de suas diferenças? 5. Em relação à matemática: como se processa o ensino de matemática para deficientes visuais? 6. Quais as dificuldades dos portadores de deficiência visual em relação aos conteúdos de matemática?