Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro de 4887
13oletim mensal, litterario, artístico e noticioso, dedicado aos srs. assignantes
do Gabinete de Leitura Popular e ás casas editoras de Portugal.
REDACTORES :— ÃLPE1500 LIOS CAMPOS, 115nuermmo PINTO, PREnsmeo LOPES, Joio Josi1 D'AculAn E JOSE MARIA LEITE PACHECO.
COLLABOR A DOR ES : — ÂNTOXIO GAMOW) Mounkro, ANTONIO C. VIDICA, FRANCISCO P. Momz CARRETO, JosL A. DA SILVA SAMPAIO,
Jos/: CAETANO DE LACERDA, Josi, 111. Momz D'OHIVEIRA, Josi 5. DE ema° DO CAETO, JULIO ANGELO BonoEs CABRAL,
Luzz »Á COSTA, MAEUEL CAETANO, ETC.
SUMATARIO
Apresentação :—A escola e as creanças, por F. Lo-
pes ;—Doidos ou criminosos? por J. J. A. ;—Camillo
&muno Branco, por C. Vieira ;—Conciliabulo, Uma
boa creada, por Catulle Mendes, traducção de F. Lo-
pes ;—Chronica, por A. ;—.9 sorvedouro, por M. Cae-
tano ;—Um brado de compaixão. por A. Campos; —
lia tantas assim! por C. ;—Per viam Mica, soneto por
Francisco Bastos ; Charadas, por C. Vieira.
.APRESENTAÇÃO
A litteratura de um cyclo historico é corno que um
espelho reflectindo as ideas sociaes, as ideas politicas,
as ideas religiosas, as instituições, os costumes emílm,
tudo quanto dimanou da força potente do espirito do
povo que a produziu. -
Do estylo, do sabor proprio, do lavor da linguagem,
da predilecção por um genero litterario, do caracter
dos personagens, real ou phantasioso, do desenvolvi-
mento da acção, do thema e do fim moral da obra,
resulta nitido, brilhante, o ideal de uma raça ou de
uma geração.
Um producto da Arte é uma encarnação do espirito.
Tanto pode sei-o o portico de uma cathedral corno a
pagina de um livro. O marmore e a palavra dão a for-
ma sensivel, material, á idea.
Saber apreciar a curva graciosa de urna estatua de
Venus, o lavor de um relevo architectonico, o rendi-
lhado da phrase conceituoso na obra litteraria; é deli-
ciar-se no goso da Arte á luz abençoada do espírito.
E tudo isto á ler--ler no marmore; ler no livro.
Mas a architectura recueu perante a imprensa.—
Isto matou aquillo — disse Vietor Hugo, o genio do
seculo.
O livro é pois a grande manifestação, a manifesta-
ção multip/a da Arte ; a leitura boa e sã o maior goso
do espirito.
Despertar e mesmo crear o gosto pela leitura das
obras modernas dos grandes eseriptores impessoaes,
que seguem o grande mestre da escola realista, Zola,
eis um dos fins do Atheneu.
Dando noticia extensa de alguns livros já publicados
e d'aquelles que forem apparecendo ; extrabindo d'el-
les alguns trechos escolhidos que dêem uma idea apro-
ximada do todo; e acompanhando estas noticias de
uma analyse sob o ponto de vista artistico e moral; e
tudo isto sem pretenções de critico, o Atheneu alcan-
çará por certo o seu fim.
Está feita a apresentação do Atheneu. Não vem com
arreganhos de critico ; mas como simples dileetanti que
adora os productos do pensamento humano perpertua-
dos na plirase escripta.
SCIENCIAS E FACTOS
A ESCOLA E AS CREANÇAS
Para uns é assurnpto esgotado a escola : para outros
é descurado e menos estudado. A escola não é só a
cartilha, não deve sel-o: seja tombem um compendio
de moral e gymnastica.
Educação intellectual, phisica e moral —eis o gran-
de, o verdadeiro objectivo. Da falta (Vestes tres ele-
mentos resulta a ignorancia, o crime e o definhamen-
to das raças.
A idea predomina, como a virtude, tomo o musculo.
A luz soe do cerebro, a moral do coração, o trabalho
do musculo. Illumine-se, moralise-sei robusteça-se:
somma—eduque-se. •
A mãe gera e cria, raras vezes educa. Não sabe:
educae-a na creança, que será mti Amanhã.
Não façamos só figurinos, não ensinemos só o frau-
eez ; façamos mães:Não façamos só homens, façamos
tainhem cidadãos.
Fazer um homem é simples e rapido: fazer um ci-
dadão é demorado e complexo. O homem é a mataria
prima, o cidadão é o artefacto : o artifice será primei-
ro o mestre, depois, a mãe.
A mãe é d'hontem, é d'ha .muito: a creança deve
ser d'hoje e do futuro.
A escola deve ser o laboratorio onde se purifiquem
esses crystaes—as creanças. Se o chimico for habil o
crystal sairá puro.
O meio tem uma influencia importantissima sobre o
individuo, a °reouça molda-se quasi como a cêra ás
2 O ATIIENEU
forças que actuando sobre dia lhe formam o caracter.
Modificar a acção d'essas forças, attenual-as, inutili-
sal-as quando seja possivel, é um dever, é uma neces-
sidade, que é mais.
Se a creança vem do lodo, não sirva este facto se-
não como indicador das impurezas que arrasta, senão
como motivo de mais cuidado e dedicação. Depois de
educada é um cidadão util ou uma mãe modelo. Que
importa d'onde veio?
Veio da miseria, da opulencia, da fome, da abun-
dancia, da pureza, da corrupção, da honradez, da in-
fainia ? Que importa vir chim palacio ou de uma ta-
verna? Venha donde vier pôde estar contaminada. A
origem nada tem com o fim : não deve tel-o.
O cidadão honesto, trabalhador, sabio, é um pro-
dueto : pouco importa que viesse d'um berço rico ou
miseravel: fizeram-no utide bom, é-o. Nem sempre do
ouro sue o bem, nem sempre da fome sae o crime: ha o
ido &grado e rico, ha a virtude analphabeta e po-
bre. lia a prostituição vestida de seda, ha a honesti-
dade vestida de farrapos. lia o trabalho com fome e
honra, ha a ociosidade com dinheiro e vícios.
A origem, repita-se sempre, pouco importa. Nin-
girem pergunta ao ambar que rios perfuma se veio da
dejecção d'um cetaceo, nem ao cholera que nos mata
se veio da dejecção d'um rei. As hervas que nós gosta-
mos nos banquetes alimenta-as o estrume, que e a
podridão: os vícios que corroem a sociedade alimen-
ta-os o dinheiro, que é a riqueza. As pedras que bri-
lham no peito dos argentarios arrojou-as talvez o rio
á praia entre os lodos: o pária que não tem nome foi
talvez arrojado á roda por ;nãos que calçavam luvas.
Arranca° pois as ereanças á ignorancia, ao crime,
anemia. Venham (ronde vierem, educae-as: só assim
serão uteis. Vem do prostibulo? Nada imporia: a flor
não recusa a gota do orvalho que a vivifica e refresca
SC 3 nuvem a foi beber charco.
Fazei como o nuvem : ide beber as ereanças aos
charcos e aos pantanos e depurai-as pela educação :
serão como essa gota—no charco podia matar, na flor
brilha como uma perola.
A escola ensina a ler: deve educar tombem. Educar
é bem construir, bem edificar: ler é bem iIluminar o
',inflei°. Ler ê muito, ler e ser bem educado é tudo.
Eillicae as creanças! Desenvolvei-lhes as faculdades,
instrui-as, dae-Ilies lições de moral e civismo, alimen-
tar-lhes o amor ao trabalho, recompensae-lhes o bem:
pegae-lhes nos braçinlios e, ensinando-lhes a encarar a
luz. e o, futuro , dizei-lhes—eaminhae, caminha° sem-
As creanças são o legado que deixamos ao futuro:
que o nosso testamento seja generoso e saldo.
F. Lopes.
DOIDOS OU CRIMINOSOS ?
A recente theoria de duas capacidades medicas,
apresentada por °ocasião do exame ao alferes Atari-
nbo da Cruz, assassino d'um seu condiscípulo, deman-
da um profundo estudo para se averiguar por um mo-
do inconcusso e positivo, se tal theoria assenta em
principies racionaes e aceitaveis, ou se não passou
d'um mero expediente para pôr o assassino ao abrigo
do rigor das leis penaes.
A theoria foi produzida por dois allicnistas distinctos,
os drs. SCI13.3 e Mattos, pie de certo não quereriam
sacrificar a sua reputação em favor d'um criminoso
consciente. Além disso a respeitabilidade do seu ca-
racter, os credites de que gosam no campo da scien-
cia, tudo leva a crer que a opinião (restes sabios se
baseia num profundo estudo e em grandes investiga-
ções scientificas.
O que é certo é que esta opinião determinou o pri-
meiro conselho de guerra a absolver o alferes Marinho
da Cruz, tornando-o irresponsavel pelo crime que com-
mettera, o qual foi apenas o producto d'um estado
morbido, que a sciencia classifica de epilepsia larvada.
Aceite, como foi, a theoria por aquelle tribunal, é
possivel que no segundo conselho de guerlia, a mie de
novo vae ser submettido Marinho da Cruz, em virtude
da decisão do tribunal superior de guerra e marinha,
que amiullou a sentença do primeiro conselho, conti-
nue a prevalecer a opinião da sciencia, ante a qual
deve vacillar a consciencia dos novos juizes. E de fei-
to, se o diagnostico feito ao reu, tem perante a scien-
cia fundamentos solidos, isto é, se Marinho da Cruz foi
levado por um estado inorbido, de que não é culpado,
a praticar uru crime, a sociedade será iniqua condem-
niiiido-o e tornando-o responsavel por um lacto que
elle seria incapaz de commetter no seu estado normal.
Se é um doido, ou um criminoso consciente, é o que
convem averiguar, e a essa COM3CÇrlo só se poderá
chegar pelo exame d'outros especialistas, ou pela sua
opinião consignada n'uma consulta competentemente
formulada.
, Desejariamos que, a este respeito, se debatessem em
conferencias, dentro ou fura do paiz, os homens mais
notaveis c competentes na especialidade, pois é possí-
vel que todos os condemnados que pejam as cadeias e
os carceres soffrain de epilepsia larvada e n'esse caso
-devam ser irresponsaveis pelos crimes que inconscien-
tes commetteram. A solução (Veste problema social em
favor da nova theoria, ê urna questão d'interesse ge-
ral da humanidade, que lia de determinar uma reforma
profunda no direito criminal e levar a sociedade a
.converter as penitenciarias em hospitaes, a supprimir
a guilhotina e o fusilamento e a demolir as forcas.
E tão deficiente a nossa legislação penal; estão Eio
mal organisados os nossos tribunaes que ao passo que
atiram para urna enxovia com o soldado Antonio Coe-
lho, corno um grande faccinora, quando poderia ser
um infeliz epileptico larvado, submettem ao exame dos
primeiros alienistas do paiz o alferes Marinho da Cruz,
que o não declaram criminoso, mas simplesmente um
epileplieo larvado? Falta de justice ou excesso deipro-
tecção e favoritismo! E apregoam-nos egualdade de
todos os cidadãos perante •a leil
O ATilENEli 3
Quizeramos, ao menos, que todos os reos, que tecm
de ser subinettidos a julgamento, passassem primeiro
por um exame, a Ilm de se averiguar se o crime de
que são accusados é simplesmente o producto de um
estado morbido, ou a consequencia d'instinctos perver-
sos e ferozes.
Porque não hão de eles soffrer, como Marinho da
Cruz, de epilepsia larvada? S6 a sciencia o pôde di-
zer. Pois consulte-se a sciencia antes do teredieturn
dos juizes. É possivel que muitos sejam confiados aos
hospitaes cru vez de serem lançados, como feras, nas
masmorras.
A despeito da nossa incornpetencia no assumpto,
para nós de fé que nenhum homem attenta contra a
vida do seu similhante, ou contra a sua propria, sem que
se dê um estado morbido, uma nevrose qualquer nas
suas faculdades mentaes.
Só accidentes anormaes podem fazer do homem uma
fera, pois não é crivei que o Creador dotasse entes da
mesma especie com instinctos e sentimentos diversos,
dos que são inatos nas suas creaturas.
Subsequentemente veremos se o suicida, que a egreja
fulmina com penas, comi) se um cadaver se podesse
corrigir, e digno d'essas penas, ou um doido merece-
dor de compaixão.
J. J. A.
LETTRAS E ARTES
CAMILLO CASTELLO BRANCO
Este nome, aureolado pelos fulgores d'orn espirito
uberrirno, desperta em todos os que presam as cele-
bridades da 'nesb littera troa moderna, o mais profun-
do respeito e a mais siinpathica veneração.
Na individualidade que elle representa reflectem.
brilhantemente os explendores dum verdadeiro genio,
aliado a uma intelligencia elevadissima, como o pro-
vam esses tão apreciados monumentos litterarios que
lhe devem a existencia.
Os romances de Camilo Castelo Branco, glorioso
mestre das letras putrias, são admirados de con-
thmo por portuguezes e estrangeiros, porque ninguem
melhor do que ele sabe exprimir os diversos senti-
mentos da alma em linguagem tão encantadora, subli-
me e correcta.
O espirito humano ala-se em contemplações produ-
ctivas, quando se inspira n'esse primoroso estylo que
seduz, captiva e impressiona.
A fecundidade e engenho dos seus primores littera-
rios são dum vivo interesse para os admiradores d'es-
se grandioso talento, verdadeira gloria do paiz que o
viu nascer.
Dotado (um imaginoso espirito, que consubstancia
em si todos os predicados d'uma perfeita notabilidade
nas letras, o seu nome ficará para sempre gravado,
em caracteres indestructiveis, na historia da nossa lit-
teratura.
A reimpressão de todas as obras de Camilo Cas-
telo Branco, a que agora se está procedendo, será o
valiosissimo padrão, que constantemente relembrará
posteridade esse vulto admira!el, que no seculo xix
tanto honrou a patria de Camões.
C. Vieira.
CONCILIABULO
(De Catelle Mendes)
16 e Lo, e a sua amiga 76, falam juntas, muito se-
riamente, com a fronte pensativa que poderiam ter
tres pequenos ouististes senadores da republica dos
macacos, sentados sobre a cauda e a cabeça apoiada
nas mãos, tratando as mais graves questões do estado.
E com effeito a questão é grave !
Trata-se de decidir qual seria para uma rapariga a
melhor resolução a tomar, se um desconhecido, bem
apessoado, entrasse repentinamente no quarto da toil-
lette no momento em que tivesse deixado cair a ultima
das mais intimas roupagens.
—Eu, diz Jo que se enche por vezes d'urn pudor
feroz, não hesitaria. Cobria-me o mais depressa pos-
sivel com um penteador, um tapète, uma cortina, uma
saia, qualquer coisa, e depois com altivez, com gesto
digno d'uma imperatriz ofendida, eu indicaria a porta
ao imprudente intruso. ,
—Eu, diz por sua vez Lá. que por cousa alguma
quer parecer menos terrivelmente virtuosa que a sua
amiga, não hesitaria tombem! Faria o que tu acabas
de dizer : somente, antes que o importuno se afastasse,
atirava-lhe á cabeça a caixa de velowine ou a minha
bacia da Bohemia, para lhe ensinar a respeitar o mais
doce e sagrado dos mysterios.
76 não tinha falado ainda.
—E tu? perguntou Jo.
—Eu, pelo contrario, hesitaria : com certeza hesi-
taria.
—E depois?
—E depois ?
—Depois ficaria n'isso, porque, emrma, em quanto
eu hesitasse, passar-se-lia certamente alguma cousa
que me dispensaria de tomar uma resolução qualquer.
UMA BOA CRÈADA •
Elles estavam no primeiro beijo—o primeiro d'a-
quella noute—quando a creada entra exclamando af-
flieta :
—Estamos perdidas! O senhor vem ahi já do circo.
Sobe agora a escada. Então ? Ouviram?
E rapidamente, assustada, voe juntando a roupa es-
palhada pela cama, pela mesa, pelas cadeiras.
O unico meio de salvação era a fuga d'elle pela es-
4 O ATHENEU
cada do serviço. Mas estaria elle já vestido, em estado
de sair, antes da chegada do importuno, cujos passos,
cada vez mais proximos, soavam já nos corredores?
—Luiza ?...
—Senhora ?...
—Vae para a ante-camara e a todo o custo retem
ahi meu marido.
—A todo o custo?
—Assim é preciso.
—Bem, minha senhora, respondeu a dedicada meada.
E a toda a pressa foi despindo o vestido, as saias,
o espartilho. Era branca, rosada, cheia: os seios de-
senhavam-se nitidamente no tino linho da camisa.
—Tu estás doida! que vaes fazer?
Luiza entreabindo a camisa, deixou ver a graciosa
• curva d'um seio de neve : depois sahiu rapidamente
dizendo :
—Agora não se apressem que eu respondo por
tudo!
(Traducção). F. Lopes.
GAMBIARRA
CHRONICA
A nossa chronica é lugubre como cyprestes que se
debruçam sobre as sepulturas.
Confundem-se rosas, em botão, com os goivos e as
saudades.
Grinaldas de flor de larangeira, como chlamydes al-
vas de virgens, rivalisam com os crepes.
• Lagrimas de pacs estremecidos, soluços de mães
carinhosas, prantos d'irmansinbas em corações juvenis,
onde a dor teve pela vez primeira accesso, compõem,
com os canticos dos anjos, no paraizo, n'essa mansão
d'eterna bemaventurança, um hymno, de. jubilo que
contrasta com a dõi. que cá ficou na terra.
Duas familias choram a perda de dois entes que
lhes eram caros. Duas creanças — uma de 18 annos,
outra que só viu raiar o sol de 14 primavéras, sucum-
biram n'estes ultimes dias, corno a flor que se des-
prendeu da haste, sacudida violentamente pelo tufão.
José Maria Leite Pacheco, um coração lavado por
todos Os sentimentos nobres, um talento peregrino, um
espirito esclarecido, abi esta alquebrado pela mais di-
lacerante &ir. Nem os desvalies da esposa, nem o con-
forto dos amigos, nem os risos innocentes da filhinha
que sobrmive, são capazes de fazer volver á antiga
jovialidade aquelle homem forte, que caldo como o ro-
ble que o vendaval prostrou, deixando de pé o flexi-
vel canavial. Como o infortunio tem o magico poder de
aniquillar o mais forte temperamento !
Joio 1gnacio da Silva, um trabalhador indefesso, que
na felicidade do lar fazia consistir toda a sua ventura,
amenisando-lhe a vida, gasta nos rudes labores do tra-
balho, quatro interessantes meninas, fructo de segundas
nupcias, buliçosas como borboletas alegres cm uma
manhã d'abril, é tombem ferido pela mão desapiedada
da morte, que lhe arrebata uma filhinha.
Vimol-a no seu atinado com vestido alvo de neve,
manto azul e os louros e annellados cabellos ebroados
com uma grinalda flor de larangeira, orvalhadas pelas
lagrimas do pae e irmãsinhas, que na hora do sahi-
mento, ao dar-lhe o derradeiro adeus estancaram de
subito como uma caudalosa corrente derivada do seu
curso normal. Fugiram dos olhos para se concentrarem
nos corações onde a dói' se foi cravar como agudas
setas !
Oh! como este mundo é um valle de lagrimas!
A.
SORVEDOURO
lia na freguezia dos Biscoutos entre as asperezas dos
rochedos que orlam a costa, junto ao porto, um sorve-
douro cavado na rocha, em forma circular, que attra-
he a Atenção dos visitantes, pela sua singularidade.
Este grande poço ou voragem communica com o
mar a uma profundidade de muitos metros por baixo
da rocha, e por via de um canal por onde as vagas
dirigem uma parte das suas aguas, que faz levantar a
superficie das do sorvedouro ate transbordarem, depois
do que descem com uma rapidez espantosa até quasí
desapparecer nossa vista, para (Fali a instante torna-
rem a subir, descerem depois e assim continuamente
sem jamais terminar.
Aquelle subir e descer constante torna-se tanto mais
pronunciado quanto mais agitadas estiverem as aguas
mrioa roéc.e ano, influindo Lambem para isso o estado da
O curioso'que ali chega pela primeira vez não pode
deixar de olhar com espanto para aquella massa liqui-
da, correndo ora á soperficie ora ás profundezas com
a velocidade do raio, no meio d'um ruído quasi sinis-
tro, lugubre, pavoroso.
Sente-se a gente mal junto d'aquelle • abysmo, que
parece querer engolir a propria rocha que o circula.
Qualquer objecto que se lhe lanCe dentro desapa-
rece para não mais se ver, esmigalhado de encontro
ás paredes do canal que põe o mar em communicação
directa com aquella garganta do inferno.
Apoiar do pavor que nos causa, d'um mal "estar
que sentimos junto d'elle, vale comtudo a pena ver-se,
e ninguem que visite a freguezia deveria deixar de ir
observar de perto aquele prodigio de terror.
Nas occasiões de mar bravo sente-se a grande dis-
tancia um rugido enorme que parece vir das entranhas
da terra—é o sorvedouro que se anuuncia medonho
sendo muito capaz de devorar tudo quanto d'elle se
acerque.
51. Caetano.
O ATHENEli 5
UM BRADO DE COMPAIXÃO
É uma verdade incontestavel, que a eivilisação e a
educação d'um povo afere-se Lambem pelo bom ou
mau tratamento dado aos animaes.
Ao animal homem, ser racional, cumpre dispensar
toda a protecção aos animaes, seres irraeionaes, não
só pela superioridade que entre uns e outros existe,
mos ainda mais por um principio civifisador, moral e
ma nita rio.
Os maus tratos, a perseguição, o assassinato trai-
çoeiro e repugnante dado a innoffensivos, quanto uteis
e prestimosos, animaes domesticos, só os justifica a
falta de sentimentos caritativos e humanitarios, a CO-
rencia de illustração e educacão, a quasi selvageria de
quem os pratica.
Os actos de malvadez e barbarismos que diariamen-
te vemos praticar pelos carreiros, carroceiros e arriei-
ros, quando os pobres animaes, que de tanta utilidade
lhes servem., não podem conduzir ds enormes pezos
com que os carregam, envergonham-nos aos nossos
olhos e aos de extranhos.
Somos civilisados, proclama-se por toda a parte, e
consentimos e applaudimos, com o nosso silencio, os
espancamentos dos animaes; assistimos indiflerentes
aos castigos brutaes, que lhes dão, espicaçando-os de-
sapiedadamente.
Não se trata de educar e instruir as creanças, con-
correndo assim para o engrandecimento e progresso
futuro da patria, mas em substituição dá-se exemplos
de barbaridade, encaminham-se para a posse de maus
instinctos, ensinando-lhes a maltratar animaes, offere-
cendo-thes á custa d'elles divertimentos barbaros, e,
para remate, para corôo de tanta malvadez, manda-se
que os mantenedores da, segurança publica, os poli-
cias, se arvorem em matadores de cães pelo envenena-
mento !
E elles em vez de repellirem essa ordem barbara e
cruel, que não é, nem pode, nem deve ser das suas
'Micções, esquecem-se da sua dignidade de homens, dos
seus sentimentos huntanitarios, e eil-os, servos submis-
sos, percorrendo as ruas com os bolsos repletos de bo-
las municipaes, distribuindo traiçoeiramente, covarde-
mente, a morte aos cães, vadios ou não, offerecendo ao
publico o expectaculo aterrador da agonia lenta, do sof-
frimento cruel de innoffensivos animaes.
O cão é bom, doeu l e submisso ; é o fiel companhei-
ro do homem, e a sua utilidade e lealdade são sobe-
jarhente reconhecidas. Para que destruir? Para que
roubar-lhe a existencia, que não prejudica, pelo con-
trario pode ser de- vantagem, e quasi sempre é, para
o dono? Para que matar, como ultimamente aconteceu,
cães de gado, que talvez uni dia defendessem ou sal-
vassem a vida dos pastores? Para que assassinar um
cão que conduz a sesta com o almoço, ou o jantar do
pobre op erario, ou do infeliz jornaleiro, que sob um
trabalho, talvez rude, violento, perigoso, esta ganhan-
do o sustento para si e soa ? Para que envene-
nar o cão ffagua pie não hesitaria, vendo qualquer
ser humano correndo perigo de se afogar, cru lançar-
se as ondas, por mais medonhas que fossem, e salval-o
ou perecer com elle? Pois é aceitavel e justo, que os
sentimentos humanos sejam inferiores aos dos animaes
irracionaes?
Além d'isso que direito ha em destruir, aniquillar,
assassinar, envenenar, matar emfim o que é proprie-
dade alheia ?
De certo que nenhum.
Pois bem, em nome da moral, e em nome da civi-
lisação, em nome da humanidade, livrem-nos d'esses
espectaculos de selvageria, que se tem praticado.
Tenham compaixão pelos animes!
Ufanamos-nos de ser um povo ordeiro, bom e
generoso, mas não o sejamos só para os nossos simi-
lhantes, devemos lambem sei-o para todos os animaes
em geral e em especial, actualmente, para os inoffen-
sivos cães.
Lemos, ha tempos, no Zoophilo, orgão das sociedades
protectoras dos animaes de Lisboa e Porto, a seguinte
verdade com que concluímos:
«Se o homem ingrato morde a mão do bemfeitor
que o soccorre, o cão fiel, pelo contrario, lambe a
mão do seu proprio algoz. Esta anthitese é uma elo-
quente lição para a humanidade».
A. Campos.
HA TANTAS ASSIM!
Desabrocha a flor mimosa
Da madrugada ao- arrebol ;
Seu perfume offrece ás auras,
Mas fenece ao pôr do sol.
A borboleta dourada,
Infiel por condição,
Vive dos beijos das flores, .
Mas só dura uma Estação.
O baixel que denodado
Navega com todo o mar, -
Nãima sorte aventurosa -
Acaba por naufragar.
Assim a mulher formosa.
Que em praça- põe seu amor,
Perde o viço e o perfume,
Emurchesse como a flor.
Inspirada da lisonja,
Lindo ouropel que a seduz,
Gira corno a borboleta,
Que se vae queimar na luz.
E se pra ter mil amantes
Um só amor despresou,
baixel presa das ondas
Que lira sempre se afundou.
C.
O ATDENEU
PER VIAM VIVE
De quando em quando rasga-me um espinho
e contrae-se de dôr a minha face...
Vão-me faltando as forças e definho...
Se eu podasse parar! se eu descançasse !
Tenho ainda o seio quente corno um ninho,
d'onde uma ave, de subito, voasse;
mas já me volto, ás vezes, no caminho,
como se alguem distante me chamasse.
E, então, invade-me um desgosto fundo,
que nem o olhar de certa di‘indade,
cheio d'amor e supplicas, me arrasta
(Vossa tristeza immensa em que me afundo.
Tão longe me parece a mocidade!
e tão depressa um coração se gasta!
Coimbra, 86. Francisco Bastos,
CHARADA
Ao ex.m° sr. José da Costa e Silva, distincio
charadista açoriano
Um insecto, bem pequeno, _9
—Á aranha similhante— I -
Procurando no moinho
Encontra-se n'um instante.
Não é meia,
Não é teia,
Não é veia,
Mas e—peia.
a.
CHARADA movissimA
Um escolho na musica 6 fragmento-2--l.
C. Vieira.
EXPEDIENTE
O ATHENEU
Boi,elim Lomat, literario, anistio e noticioso do
Gabinete de Leitura Popular
rnuço DA ASSIDriNAJELTDA
Por grelaste°, pago adiantado 200 reis
Aielso
Peta da ilha aceresce o porte do correio
Aos assignantes do gabinete de leitura, distribuição
80
Annunciam-se todas as publicações litterarias, me-
diante um exemplar.
Pede-se a todos os nossos collegas a quem enviamos
este jornal o especial obsequio da troca.
Assigna-se na Papelaria e Livraria Popular.
leirS—DUA 131DDITA-10:"
POPE%
• ALFREDO LUZ CAlli°05
105—BUA DIREITA-107
Assigmttura mensal nO0 réis
Não por assié-uatura., diario .t20 »
A todos os assignantes é olrertado
mensalmente o 111.1M01-0 cio jOrfliti
vario o A'.11`LIDNDILT.
PUBLICAÇÕES
Assignam-se actualmente. na papelaria e livraria
popular de Alfredo Luiz Campos, rua Direita n.°' 103
e 407, as seguintes:
CAMPOS & C." ErOMES
OBRAS DA:
Camilo Costeio Branco Visconde de Correia ;Wolk)
=cito definitiva,
revista e corrigida pelo ;motor.
ILLUSTRAÇaES DE
E. CONDEIXA, HEITOR & LALLEBANT
Serão publicadas em volumes sucecssivos de proxi-
'manente 300 paginas.
O primeiro a publicar é o romance em um volume
O RETRATO DE RICARDINA
Com este volume. além da gravura, um retrato do
motor aos 33 annos.
A edição é luxuosa ; em bom papel assetinado, ty-
pos elzevires, impressão cuidada e nitida.
A publicação for-se-ha oro fascículos de 36 paginas,
ou 2i- paginas e uma gravura, pelo preço de fit; reis
sem armes.
O ATIIENEU ré a 7
AJAM) ÁIRIIt & C.A-EDITORES EDUARDO Ili COSTA SANTOS-EDITOR
NOVIDADE LITTERARIA
PORTUGUEZES E BRAZILEIROS
' GALERIA 1110CRAPIIICA ILUSTRADA
À frente d'esta grande e fulgurante plialange das
prollegiados do talento, apparece o eminente lyrico
pinguei João de Deus e seguimse-hão:— Theophilo
Braga. Guerra Junqueiro, Bandim Ortigão, Luiz Gui-
marães, Pinheiro Chagas, Jose Luciano de Castro, Ba-
tote! Duarte d'Almenht, Itintz Ribeiro, Anthero do Qin-
lal, Castello Branco, etc.
Preço de cada, volume e00 réis.
A USA RO DEPARTAHENTO
POR
H. BALZAC
tRADuc4o DE
MARRO DE BARROS LODO (RELDE110A10)
Um volume de i2S0 paginas, f200 réis.
LOPES & C.A EDITORES
HISTORIA DA (IMIRJO PORTUGLEZA
DE 1820
JOSÉ D'ARRIAGA
Inudrado com os retratos dos patriotas mais ilus-
tres ;niquela época e ampliada com magnificos qua-
dros. representando os factos historicos mais notaveis,
descriptos na obra, compostos e desenhados pelos dis-
tinctos artistas nacionaes, J000 Marques da Silva Oli-
N eira, Caetano Moreira, Joaquim Victorino Ribeiro,
Columbano Bordado Pinheiro.
Cada faseieulo do leS paginas,
240 réis.
1VIA.RT—Sr1R.
POR
AUOLPII0
VERSÃO DE J0110 PINHEIRO CHAGAS
Celebre romance procurado com excepcional inte-
resse pelos leitores, publicado no Primeiro de Janeiro
e nos Dois Mundos, e de que foi extraindo o drama
levado á scena nos theatros, Baquet e D. Maria.
O maior SUCCeSSO litterario—edição illustrada ; cada
fascículo semanal de 10 folhas d'Unpressão de oito pa-
ginas cada uma, ou 9 e uma gravura 100 réis.
NOSSA SENHORA DE PARIZ
P"
VICTOR HUGO
Romance historie°, ilustrado com ROO gravuras no-
vas compradas ao editor pariziense Eugene Hugues.
Versão de João Pinheiro Chagas e Luiz Botelho.
obra constará de 1 volume ou 18 fasciculos em E°
Cada fascículo semanal de 32 paginas 100 reis.
LEAIOS &C." EDITORES
HISTORIA DINGLATERRA
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OT.TIZOT
Recolhida por sua filha Madame Witt. Tradocção
de Maximiano Lemos Junior, Ilustrada com perto de
200 gravuras.
Cada fascículo quinzenal 11,0 réis.
PAVIO CORRAILI-EDITOR
O PAIZ PI A socnonAut
POS.TTJOUlCZA
Reedição do antigo texto das Farpas e larga am-
pliação com mais do dobro dos artigos primitivos,
8 O ATIIENEU
comprebendendo todos os principaes aspectos da so-
ciedade e da civilisação portugueza durante os annos
de 1870 a 1883 pelo sr. Ramalho Ortiga°.
A collaboração do sr. Eca de Queiroz na primeira
serie das Farpas fará o objecto dum volume especial.
Cada fasciculo quinzenal de 40 paginas 100 reis.
OS ANTROS DE PARIS
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Grande romance da actualidade, Mostrado com 13
ebromo-lithograpbias.-1.° parte, O mercador de dia-
snantes.-2.° parte, Uma familia parisiense.-3." par-
te, O garotinho de Montemartre.
Cada fascículo 12-0 réis.
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O CARINHO DO RFA
POR
HENRIQUE PEREZ ESCRIEII
O Caminho do Bem é o titulo do ultimo romance
que acaba de sahir dos prelos bespanhoes e devido
maviosa penna do brilhante romancista Henrique Perez
Escrich, auctor de obras que boje mexo uma reputação
europeia como o Cura de Aldeia, OfSllartyr de Gol-
gotha, A Formosura d'Alma, O UlfiXno Beijo, A Fe-
"39
Cada fasciculo de 96 paginas e gravura 180
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HISTORIA DAS QUATRO IIIIAS, FAVAL, PICO, FLORES
E CORVO, que formam o districlo da flora,
desde o seu descobrimento
• até ao presente
POR
ANTONIO LOURENÇO DA SILVEIRA MACEDO
Professor vitalicio do lyceu nacional da lona.
2.• edição cornem e ampliada a 4 volumes, com
maior numero de documentos.
Fascículo mensal de 48 paginas, 120 reis.
LUREM NOITES ROMANTICAS
EDITOR
FRANCISCO NUNES COLLARES
HISTORIA DE VICTOR HUGO
POR
CIZISTC1341. CITIZAE•T
Obra eseripla em presença de todas as produmdes
h imortal poda Irancez e de innumei•os dados sobre
a sua xida e sua época, com um protege de Bozendo
Aras Arderia, e com grande numero de estampas e
gravuras magnificas intercaladas no texto, e devidas
aos celebres artistas : J. Carrasco, II. Pellicer, E Citai-
bell, e traduzida e precedida de uni estudo critico sobre
Victor Hugo e a sua obra por Teixeira Rastos.
Cada Fastiento de 32 paginas de S.° grande ou 24 e
uma estampa, impresso em excellente papel com novos
elegantes, typos etc.
po mexs
v DIPIIEZA EDITORA SERÕES ROMÂNTICOS
Releia & C.
IVI.A1RfIrs2art
ron
ya-nir..ao
1.2 parte, TREVAS. 2.a parle, LUZ. 3.a parle,
REDEMPCAO
EDIÇÃO ILUSTRADA COM MAGNIFICAS GRAVURAS E COM
EXCELLENTES CHROMOS A FINISSIMAS CORES
VERSÃO DE JULIO DE MAGALHÃES
Brinde a lodos os assignantes no fim da obra
Grandioso panorama de Lisboa, desde á estação do
caminho de ferro do norte aié á barra, 49 kilometros
de distancia, e juntamente outro panorama tirado de
S. Pedro d'Alcantara, que abrange a distancia desde
a Penitenciaria e Avenida até à margem sul do Tejo.
Preço do cada fascículo semanal
50 réis.
Imprensa da Junta Geral
74
Anuo 1.°—N,° 2 Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Oulubro de 1887
Boletim mensal, litterario, artístico o noticioso dedicado aos srs. assignantes
. do Gabinete de Leitura Popular e as casas editoras de Portugal.
REPACJORES :— ALFREDO Lin% CAMPOS, FELICIANO PINTO, FEEDERIÚ0 LoPriO, Joh JosS o'Aoureit E .10S M ARIA LEITE PACHECO.
COLLABOR ADORES :— ANTONIO CAZ [MIRO M OURATO. ikNrONIO C. V IEIRA, FRaCl2C0 P, MONIZ BARRETO, Joe": A. DA SILVA SAmpAzo
J(.0,51, CAETAKO DE LACERDA, JOSi, NI, Moam D'OLIvEin, .106.4: S. DE CASTRO DO CANTO, loiro A NGELO BoRGEs CAmukt,
LUIZ DA COSTA, M ANEEI, CAETANO, ETC.
SUMMARIO
As nossas escolas, por F. Lopes ; fundi ficativos,
por L. P.—Doidos ou criminosos? por J. J. Aguiar;
—Antonio Augusto d'Aguiar, por F. Pinto ;—Viagens
no Chiado;— Versos da mocidade, apreciação por Gil-
berto ;—Uma historia antiga, por F. Lopes;—Afecro-
logia, por A. ;—Ao Açoriano t—Logogripho, por C.
Vieira ;—Expediente ;—Paulo de Kock—Eugenio Sue,
recommendação;—Annuncios de ',diversas publicações.
SCIENCIAS E FACTOS
AS NOSSAS ESCOLAS
A finalidade educativa é fornecer
ao individuo os meios indispensaveis
pesa preparar e melhorar a propria
oicisMncia rio seio da natureza, da
familia e da sociedade.
ANGIULLI.
Os trabalhos que teem por fim melhorar as condi-
ções sociaes, resolver os problemas de todos os dias,
demandam muita paciencia e estudo, e os resultados
não sendo immediatamente apreciados e colhidos pelos
que para isso trabalharam, succede que a actividade
individual quosi exclusivamente se applica á escolha
do melhor meio, mais rapido e !bei', de satisfazer as
necessidades proprias, d'occasião, necessidades creadaS
pelo ocio, pelo habito do luxo e do superfino.
Esta sitde ardente de gosos e prazeres que se apos-
sou da nossa sociedade, este egoismo crescente que a
avassala e lhe guia os passos, fazem com que as ques-
tões largas e momentosas, que importam maior gravi-
dade porque importam ás gerações futuras, percam to-
do o interesse, e bom é quando o ingenuo sonhador
preocupado (relias não as vê despertando sorrisos de
desdem ou a gargalhada boçal.
Essa fé viva, essa crença ardente, forte, inabalavel,
que na idade dos sonhos luminosos e das santas uto-
pias julgavamos eXistir na consciencia humana illumi-
nando-a, como uma lampada a bnixolear ''um templo,
como uma aurora a rasgar o espaço, parece ir extin-
guindo-se, e o crente, como um oasis "um Saarab,
vê-se açoutado pelo estiolador e calido simnun das
desillusões.
A formula e a rotina predominam e governam. A
franqueza é ineonveniencia ou atrevimento, a lacta um
crime, a dedicação um ridiculo, a hypochrisia uma vir-
tude, a lisonja um merito, o servilismo um degrào: E
nós todos conhecendo o mal não procuramos impedir
o seu progresso, não deligenciamos cural-o.
O desalento tolhe-nos os membros e vamo-nos dei-
xando seguir na corrente perigosa, cujo curso é já in-
certo, se porventura não podemos affirmal-o fatal.
Dae-me a educação, dizia Leibnitz, que eu muda-
rei a face da Europa em menos d'um seculo. O arrojo
da phrase iião destroe a verdade da afiirinutiva. SÓ a
educação moldada na sciencia pode 5alvar-iios, só ella
pode operar a portentosa transformação social. Mas
para isso é preciso reformar a escola.
Reformar? Não, troar; o que ald temos não são
escolas, são inquisições para creanças.
O livro, o melhodo, as casas foram escolhidas adre-
de para definhamento e martyrio das creanças.
Alem d'isto, o professor ê um sabio, salvo raras ex-'
cepções, que percebe um ordenado para passar fome
e dar palmatoadas.
O livro é um primor de sciencia, arranjado expres-
samente para as creanças não o perceberem e fica-
rem mais embrutecidas do que antes de os ler.
O methodo é uma maravilha d'engenho com o fim
exclusivo de as desenvolver no minium e castigar no
maximo.
As ligabitações destinadas a escolas teem sido edi-
ficadas de modo 9 faltar cautelosa e prudentemen-
te a todas as regras da hygiene escolar.
O assim a escola oficial, principalmente, iesta ilha,
e dizemos assim por (relia termos um conhecimento mais
perfeito, e sabermos que entre outras as escolas de Lis-
boa toem sido aperfeiçoadas cuidadosamente pelo mil-
piei no, honra lhe seja feita.
. O nosso professor é essencialmente ignorante, e o
que não o é, não tem nem estimulo, nem recompensa
nem meios de melhor cumprir a sua espinhosa e difli-
cultosissima missão : foçamos justiça.
N'esta abentoada terra das touradas e milho tor-
rado toda a gente se julga habilitada a ensinar nas
10 O ATI1ENEU
escolas, o que é o signal mats claro e evidente da sua
incompetencia. Mio admira porém que haja quem
queira ganhar o ordenado, o que tem jus á admiração
universal, desde a Patagonia até à Hottentocia, é que
pinguem se preocupe com o preenchimento de Laos
legares por ignorantes das cousas mais comesirihas e
rudimentares.
Entrega-se as creanças ás escolas com a mesma
deshumanidade com que se tira os ordenados aos pro-
fessores.
As nossas escolas para evidenciar a mais elevada
comprehensão do seu fim preparam meninos para o
exame e para o oleo de figados de bacalhau.
O exame é para a ladainha cadenciada e rvIlimica
d'um alluvião de definições encaixotadas no ce.rebro a
palmatoria, e o oleo de bacallifiu para lhe curar a
anernia, a chlerose, a escrophirla, uns rudimentos de
tuberculose obtidos de parceria com os rudimentos da
grammatica, tudo cuidadosa e vantajosamente cultivado
nas escolas.
O professor ignora a orlado em que a creança deve
principiar os seus trabalhos escolares, e que a duração
do trabalho deve ser proporcional á eclode e ao desen-
volvimento physico e intellectual. Desconhece o seu
imperioso dever de reenviar aos paes as creanças,
quando enes, com a selvageria propria da ignorancia,
Fias enviam tendo apenas cilas 3 ou 4 armos de
edade.
Ignoram que a myopia e o rachitismo são as mais
vulgares doenças adquiridas nas escolas, onde os pre-
ceitos scientificos são desprezados ou ignora'dos.
Ignoram que a ma distribuição de luz ou falta Wenn,
as disposições de nexos e bairros, e a exigua capaci-
dade da sala, são as origens mais proximas d'aquellas
doenças.
A falta de luz ou a sua má distribuição obriga a
' creança a um esforço grande para poder vêt distincta-
mente as lepras, opproximando muito os olhos do pa-
pel : a creança contra° assim o habito terrivel de ler
com os olhos muito proximos do papel, favorecendo
assim o desenvolvimento da myopia.
Os bancos e as mem não devem ter unia altura
fixa para todas as crenças, o que dá togar a que as
mais altas se curvem muito e as mais baixas se esfor-
cem por chegar á meia, o que, unia e outro cousa, é
excessivamente prejudicial á sande, por as fazer tomar
posições contrafeitas, dando logar a perturbações
daquelles organismos que ainda não attingiram o seu
completo desenvolvimento.
b bordo anterior do banco e o posterior da meza
deveu, estar na mesma linha de prumo, a fim de que
o tronco da creança fique na posição vertical: a ;nen
deve ter uma inclinação tal que o papel seja cortado
perpenaicularmente pelo raio visual. O papel deve
lambem ter uma cOr amarcllada, porque a côr branca
'e prejudicial á vista.
Quando a luz entre por jancllas latteraes devem
colocar-se para escrever os alunmos de modo que os
raios luminosos incidam sobre o lado esquerdo, porque
sobre o direito projectariam unia sombra sobre o pa-
pel, que convem muito evitar. São preferiveis os lados
norte e oeste para a entrada da luz, porque de leste
e sul os raios solares são demasiado vivos e variaveis.
egualmente conveniente o uso de transparentes ou
persianas nas janellas para regular a intensidade da luz.
A edade regular para começar os exercicios escola-
res é a de 6 antros: antes (festa edade é prejudicar
muito o desenvolvimento pbysico e intellectual das
creanças. Alguns exemplos temos já observado. Cre—
onças robustas, vivas, prespicazes, ao entrar para a
escola com 3 para 4 orinos d'edade, tornaram-se tem-
pos depois pallirhis, franzinas, tristes, molles, devido
certamente á incuria e iudifferença dos paes pelo seu
futuro, sacrificando-lhes a sande pelo vão e illusorio
prazer de as vêr ler em tão tenra edade. Esperta
creança diz a mamã lisongeada : pobre inartyr ! di-
zemos ruís entristecidos.
Na opinião (le Chadwike é apenas de 15 a 20 mi-
nutos seguidos o espaço de tempo de leitura que até
aos 7 antros, pôde uma creança aturar, prestando at-
tenção ; dos 7 aos 10 bastam 20 minutos, e (rabi em
diante vae successivamenle auginentando até aos 16
Os intervallos das lições e estudo irira desenriço (le-
varão ser regulados de modo que o trabalho lia rio
seja de 2 e meia a 3 Pioras liara as creanças de 7 Mi-
nes, de 3 a 3 C meia horas para as de 10, e 4 horas
para as de 12: dos 19 antros em diante o trabalho
dia rio Ode elevar-se a 8 ou 9 horas.
O trabalho muito prolongado e sem interrupções,
óleo, de (Incultar e prejudicar o desenvolvimento phy-
sico e intellectual das creanças, faz lambem com que
elas criem aversão e aborreçam o estudo.
O estudo C O recreio alternados são o melhor meio
de as desenvolver tanto physica como intellectual-
mente.
As creanças precisam de ar, luz e movimento: roo-
bar-lhes estes Ires elementos de vida é sacrifico-as, é
estragar-lhes a sande.
N'estas épocas que vão correndo, em que a lucta
pela existencia mais vigor exige aos nossos musculos,
em que para uma nação adquirir predorninio, força
e riqueza, é necessario que cada cidadão seja sobre-
tudo um bom animal, tornam-se indisperisaveis todos
os esforços para que nos tornemos fortes e vigorosos.
É para a creança que devem incidir principalmente
todos os cuidados para obstarmos ao' seu definhamen-
to. Protecção ás creanças, mais uma vez, e sempre.
Se temos a machina a vapôr, precisamos com tudo
de um braço musculoso para lhe construirmos as peças.
E. Lopes.
MUNDIFICATIVOS
Longe de querer impõr as minhas convicções—ex-
pondo-as—são• filhas de meia duzia de principios an-
thropologicos, de preferencia applicados ao lado moral
O ATHENEU II
da seductora metade do genero humano.— Tambem
são fructo amargoso de decepções colhidas na socie-
dade, algumas na intimidade, não poucas ainda viço-
sos, a respingar seiva que se converte em baba peço-
nhenta.
Não á um systema, podem ser rudimentos para elle;
concerte-os, junte-os, augmente-os, agglomere-os, me-
dite e classifique-os quem poder c quizer e terá o
systema ; quem não guizo'', podendo, á porque não
pode admittil-os, combata-os e pulverize-os. A mani-
kstação morphologica modifica-se mas a essencia ato-
mica transubstanciar-se-ha ?— Não sei. Platão, d'llol-
bach e Descartes deixaram de bom, tudo, ainda mes-
mo tudo gualdo era mão ; este depura-se.
Nemo') e Copernico valem tanto nas soluções ma-
thematicas dos problemas astronomicos, como nas
potheses engenhosas dos systemas planetarios.
Jeremias chorando, Lamartine fazendo chorar teem
a sublime ideia de castigar a alma pela sentimenta-
lidade.
Os prineipios concatenados formam as doutrinas e
estas coordenadas dão aos systemas a faculdade de
correr inundo.
O systema das penitenciarias para atrophiarem o
corpo, carece de uma obra complementar: as peni-
tenciarias do espirito ; estas, na propria habitação dos
delinquentes, como a agua bu o gaz, deveriam ter os
seus effeitos e registros.
Onde a corrupção, a infamia e a maledicencia la-
vram intensivamente, é ahi que urge purificar, lavar o
pés das ulceras e cauterizal-as.
É, principalmente, no grande mundo, na tal elite
social, nos salões dourados, nos toucadores embalsa-
mados de perfumes orientnes, nos aposentos luxuosos
de leitos de ébano e marfim, de brocados de seda e
oiro em que a ociosidade feminil estende os enervados
membros, esperguiçando blasphemias, conspurcando
honras, instillando gótas de subtil peçonha nas alheias
vidas; é por ali que as chagas são maiores e mais as-
querosas,—para ah d os mundificativos do espirito:
illustraçào, educação—trabalho.
Não especialiso, o mal á geral; grande aqui, álem
maior, por toda a parte assolador
Ver-se-ha o que dizem os factos.
L. P.
DOIDOS OU CRIMINOSOS
Vimos no nosso anterior artigo que, a prevalecer a
opinião dos mais distinctos alienistas de Portugal—
de que todos os criminosos são epilepticos larvados—
ha na nossa legislação criminal uma notavel lacuna,
pois que ao passo que um conselho de guerra atirou
paro lima enxovia o assassino Antonio Coelho, como
um grande criminoso, que pode ser um infeliz epi/e-
ptico larvado, outro conselho de guerra absolveu o
assassino Marinho da Cruz, não o declarando crimino-
so, mas soffrendo de epilepsia larvada
Promettemos Lambem dizer alguma cousa com res-
peito aos suicidas.
Estes é que nos não parecem criminosos, pois que
julgamos o producto d'unia nevrose qualquer a resolu-
ção que os determina a pôr termo á existencia.
A sociedade umas vezes considera o suicidio como
virtude e heroismo, outras como crime. O juizo dos
homens, n'este caso, como em muitos outros, determi-
na-se por diversas eircumstancias, filhas umas vezes
da sympathia, outras do odio, ou da malquerença.
Pela nossa parte discordamos. Ou o suicidio 6 sem-
pre 11111 crime, sejam quaes forem os motivos que o
determinem, ou sempre uma virtude.
Chamar umas vezes virtude e heroismo a esse acto
de loucura, que os factos e as apparencias, em deter-
minadas circumstancias, parecem desculpar, e outras
vezes crime, ignorando-se as razões que o determina-
ram e que podem ser desgostos profundos, causas que
prendam com a honra e caiu o bom nome do indivíduo,
é um erro, uma dessas aberrações socíaes, que sellãO
explicam.
Catão e Cassio não seriam maiores no exílio, no
carcere, ou no patibulo, do que suicidando-se?
Os mesmos que admiram a heroicidade de Catão e
de Cassio, são os que glorificam a resignação de Na-
poleão, e, se ele tivesse morrido quando a aguia fran-
ceia abateu o vôo e caldo, talvez que a sociedade o
considerasse criminoso e recusasse juntar mais um lou-
ro á corôa de gloria do Immo" d'Austerlitz.
Catão é um heroe por saber morrer pela liberdade
da patria, Napoleão teria sido criminoso, se tivesse
posto termo h existencia, como por Ires vezes tentara,
mas é heroica a sua resignação! Notavel contradicção
esta!
Muitos publicistas distinctos consideram sempre cri-
me o suicidio, quaesquer que sejam as circumstan-
cias que o determinem, porque a vida vem ao homem
de Deus e não é sua, sendo elle apenas um deposita-
rio d'ella.
Sociedades lia em que se estabeleceram grandes pe-
nas e enrilhemos para os suicidas, como se um cada-
ver se podesse corrigir!
O catholicismo chega a ter a intolerancia de negar
sete pahnos de terra sombra da cruz, corno se esse
emblema sacrosanto da redempção não tivesse os bra-
ços bastante grandes para abrigar toda a humanidade !
A egreja, que glorifica o suicidio de Razias, Eleazar
Sansão, deve comprazer-se em perdoar, lembrando-
se que o homem, só porque é homem, deixa-se arras-
tar por uma paixão violenta. Cego, absorto, com uma
ideia fixa, Ioda muitas vezes com as vagas da vida e
com os baldões da sorte, até que succumbe, dominado
por um sentimento que o devora.
Não defendemos o suicidio, lamentamos a intole-
ronda e a contradicção d'esses mestres da 'moral, que
75
12 O ATHENEU
com os seus anathemas e penas não tem conseguido
obstar a esse desvairamento.
Porque é que Lucrecia ha-de ser uma hei-bina ?Não
podia ela sanclificar-se e lavar a mancha por um ar-
rependimento perpetuo, como Magdalena?
proprio da natureza humana puear e, senão tos-
se a fragilidade nauta no homem, a sociedade não te-
ria tanto suicidio a deplorar.
Mas o homem ementará conscientemente contra
propria existencia, quando tombem lhe é inflete o ins-
finei.° da conservação ?
Parece-nos que não. É este um dos casos em que
o crime é a producção de unia nevrose qualquer.
E, sendo assim, serão justos os amalhemos e as pe-
nas inflingidas ao suicida ?
Castigar um doido, e quando elle já é cadaver, ê,
a nosso ver, uni crime monstruoso, maior que o crime
que elle commetterit.
Para o suicida só ternos lagrimas de commiseroção,
e um sentimento de dor pela intolerancia com o seu
cadaver.
J. J. Aguiar.
ANTONIO AUGUSTO D'AGUIAR
Afastados da metropole por mintas legues de Mardi-
.co, não conhecemos de perto os grandes homens que
sacrificam toda a sua vida ao bem da patria ; não te-
mos a noção complexa do seu caracter, que abrange
a sua vida publico e particular; não indagamos dos pra-
menores do tracto social, dos seus boletos, da sim ma-
neira de trajar, das suas excentricidades e predilecções,
vemol-os simplesmente, a distancia, como homens pu-
blicos que põem o seu talento ao serviço do seu pais.
Adminunos e applaudimos de longe o trabalho inces-
sante, inteligente, energico, que eles, os que têm a
faisca do gemo, produzem nas agras do progresso. •
E somos com elles, espiritualmente, na vida e na
morte. Na vida, applaudiudo enthusiasticamente os se-
ti actos ; na morte, honrando e conservando a sim o-
bra, que é honrar e perpetuar a sua inemorift.
E á bem vasta e preciosa a obra que lega ao seu pais
e A humanidade o morto illiistre que oro pranteamos.
Antonio Augusto dc Aguiar, falecido em 4 de se-
tembro, era uru desses homens que possuem, a par
de um coração d'oiro, uma energia ¡lidou-lavei.
A sua actividade era enorme.
°linde°, professor na escola polytechnica, tinha
uma reputação europêa. Pertencia ás sociedades chi-
micos de Paris e Berlim, e deixa, na sua especialida-
de, largos estudos e descobertas valiosas para as sei-
encias ¶ as artes.
Os seus trabalhos sobre a fabricação dos vinhos,
que elle estudou nos países vinhateiros da Europa é
as conferencias publicas, feitas posteriormente, nas
quaes demonstrou scien tificamen te a necessidade de ado-
pção de novos methodos para restaurar este ramo de
ommereio já decadente, tornaram-no celebre.
Analysta distinctissimo, não se limitou a :e'Xplana-
ções theoricas, ensinou os methodos mais praticos,
simples e perfeitos, chegando mesmo a inventar um
processo de vinificação conhecido pelo nome de Balas
densant es, de extrema simplicidade e bardteza, co-
mo afirma o primoroso escriptor João de, Leyde
d'onde colhemos estes dados.
Tendo ido á exposição de vinhos abmita em • Lon-
dres cru 1874 na qualidade de commissafio regie, con-
seguiu ali ó custa de enormes ,diliculdades' sustentar
a fama dos vinhos portugueses.- -
Ministro das obras publicas, i anifestou a sua inici-
ativa fundando as escolas industriaes e fazendo todos
os esforços por encetar as obras do porto de Lisboa.
Foi A Ilidia, A França, á Belgica, á Inglaierea e á
?Iolanda no desempenho de importantes commissões
scientificos e economicas; grangeando Sempre novos.
louros para o nome !mitigues.
Fundador do Instituto Industrial de Lisboa, onde
era professor, ['residente da Sociedade de Geographia
e de outras associações promotoras do engrandecimen-
to da nação, vogal do conselho geral das alfandegos e
Tribunal superior do commencio, ministro de estado
honorario, condecorado com a Grau-Cruz de S. Thiago,
Grão Mestre da maçonaria portugueza, Antonio Augus-
to de Aguiar, filho do povo chegou im fastigio do po-
der e da gloria sem se deslumbiar todavia com as
honras que adquriu por meio do seu grande %talento e
•do seu trabalho aturado. Coinprazia-se e In recordar
.que vinha do Povo e em trabalhar para elle.
Morto, os proletarios que vivem da industrio, que
ele animava, não o esqueceram. Á beira do tumido
entre os representantes da familia ical, associações
a que pertencia, e de um concurso enorme de todas
as classes soe ia es. o pittil d ente da associação industrial
portuguesa, falando em nome de todos os °permitis e
.industriaes da nação, interpretava os sentimentos da
grande massa mionyma que abençoava um irmão ilus-
tre que nunca a esquecera.
Neste facto reside a.maior gloria de Antonio Au-
gusto d'Aguiar e a sua Uninortalidade.
., A inemoria d'eme grandioso operario será eterna-
mente recordada, porque a sua historia está gravada
no granitico livro dos tempos—que ê a alma do povo.
• 9•0
F. Pinto.
LETTRAS E ARTES
Viagens no Chiado,tipbritamentos de jornada de um
lisboeta atreves de Lisboa, por Beldemonio. (Ed.. de
Barros Lobo.)—Barrosj &J;Filhh; editores — Porto-
1877. j
Fomos mimoseados•com um exemplar d'este excei-
lente livro de Barros Lobo. . . ,
•-• Não necessita o festejado e bem conhecido auctor
-das Viagens no chiado que lhe encomiemos Jo Lraba-
O ATHENEU 13
lho, e exalcemos o talento. Conhece-o o publico ha
muito, o publico que o lê .e admira.
«A physiologia de Lisboa é uni trabalho que ainda
está por fazer». O -livro de Barros Lobo O um rico
subsidio para esse trabalho, é um amontoado de es-
plendidas notas, tiradas rapidamente, mas levando o
cunho d'aquelle espirito profundamente observador e
critico, e burilhado n'aquelle estylo rico, elegante, por-
tuguez puro, que faz as delicias do leitor e o desespe-
ro dos litteratos pelintras e ridiculos que só julgam es-
crever bem pedindo emprestado ás outras linguas por
desconhecerem o muito que ha de bom na sua propria.
A belleza da forma não é inferior á. profundeza do
conceito. O artista e o philosopho revelam-se e com-
pletam-se.
No texto que transcrevemos, ao acaso, melhor apre-
ciará o leitor o alto merecimento do novo livro de Bel-
demonio. •
«0 amor é sobretudo um sentimento antes do ma-
trimonio á sobretudo uma funcção, depois. Em theolo-
gia, o amor pôde ser definido: a forma ideologica da
selecção. Em moral, o amor é a fusão de duas almas.
Parece pois que não ha accordo possivel ; na realida-
de, esse mordo estabelece-se quando o amor-sen-
timento continua vivendo no amor-funcção. Trata-se
apenas .d'obter esse resultado ; não se obtem quasi nun-
ca nas sociedades de urna educação deficiente, por-
que falta o tacto necessario para idealisar o convivia
conjugal atravez das realidades frequentemente rudes
da vida.
«Isto e uma verdade que ninguem contesta. Temos o
exemplo d'ella demite dos olhos; se considerarmos a mar-
clia do amor,- separadamente em cada uma das tres clas-
ses que podemos distinguir na massa da nossa soci-
edade. Em qualquer d'ellas, o amor principia sempre
identicamente, num idylio cuja forma varia, sem nun-
ca variar o fundo. E sempre a mesma excitação en-
cantadora, o mesmo arreei° purissimo d'ideal. Mos após
o casamento, estabelecem-se differenciações profundas.
Na classe inferiorT—população agricola, proletariado—
a mulher tornou-se logo a escrava do marido, uma es;
pecie Wobjecto com varios prestimos; ',iço tem peso na
vida do homem, senão pelo que lhe pode custarem ali-
mento. Elle bate-lhe, com a mesma tranquilidade de
consciencia com que bateria 'rum Cão; considera-a
pouco menos que uma cousa e pouco mais que um ani-
mal domestico. Na classe media—pequena burgriefla
—a mulher é ainda um objecto, mas objecto d'esti-
mação. O marido respeita-a. simplesmente porque es-
se respeito destingirá sobre elle. No fundo despre-
sa-a ; os dois vivem emparedados na existencia, arrepe-
lados pelo desejo de se mandarem mutuamente ao di-
abo, e ,pela necessidade de guardareni as convenien-
cias. Na classe superior, einfirn--alta burguezia, aris-
tocracia—a vida amenisa-se, torna-se doce e fui'. So-
brevoem mil diversões á inonoldnid do tête-A-tête quo-
tidiano. É vulgarissima r"essa classe a pieguice de na-
morado presistindo.110'easamento, as _pequeninas sen-
Timentalidades, as superstições tão_ pueris e tão vitaes
do beijo trocado sempre que o marido sae de casa ou
se recolhe. Como se vê, o amor seguiu uma progres-
são bem nitida de classe para classe, á medida que o
nivel d'educação subia. É inutil insistir n'este ponto a
que apenas se torna necessario fazer uma annotação.
Aquelle resultado apoia-se tombem, em grande par-
te, na somma de facilidades que dá a fortuna. O amor
que resiste á miseria, 6 miseria absoluta ou relativa,
com todas as suas consequencias, é. uma innovação de
poetas, boa apenas para fazer negocie com os edite-
res. A velha formula idyllica, O teu amor e uma ca-
bana, é limo simples parlapatice litteraria, para recitar
ao piano. Nunca teve valor critico, e nem sequer já
tem merecimento artistica.»
,-Versos da mocidade, 1883 a 1887, por Antonio
Fogaça—Coimbra.
Acaba de-ser publicado este novo livro de versos do
já notavel poeta Antonio Fogaça.
Fogaça pertence a essa geração de poetas, que Co-
imbra de tempos a tempos nos offerece.
Desde João de Deus, Anthero do Quental, Guerra
Junqueira Joio Penha, Gonçalves Crespo, que Coim-
bra vae enriquecendo a litteratura portugueza com os
esplendidos versos (Testes brilhantes poetas que são
uma gloria nacional.
Antonto Fogaça é dos modernos, é dos iniciados
d'hontem, mas já se nos revela um robusto talento, e
com Francisco Bastos; Silvestre Falcão, João do Me-
nezes e muitos outros, forma a nova e promettedora
geração que continuará mantendo a gloriosa tradicção
da poesia coimbrã.
Em seguida publicamos alguns versos, respigados
dos Versos da mocidade, onde mais se admirara o po-
deroso estro do novel poeta.
- Felicitamos do coração Antonio Fogaça pela sua
brilhante estreia, e no abraço ao amigo animamos
mais urna vez a nossa admiração ao poeta.
Cuidei que a minha sombra era a que vinha
depois do nosso adeus junto a meus passos;
porém—notei que havia n'esses traços ...
linhas suaves que eu em mim .nr11) tinha.
Vê como o teu amor se me insinua
e vives no meu ser. Não era a minha.sombra era a tua.
Hei de dar-te um palacio com mil portas,
que encerre tudo quanto phantasiarmos
—rosas, volupia, musica, afeições ...
A porta mais pequena ê para entrarmos
e são as outras para as illusões.
Eu perguntei á minha namorada
Onde é que as minhas cartas escondia,
sendo dla tanto e tanto vigiada ...
Deu-me o ceu nium sorriso d'alegria,
é e então, olhando a poda do visinho,
e vendo que ninguem apparecia
75
14 O ATHENEU
que nos pudesse ver sobre o caminho,
fitando-me, córou, ulmo vão receio,
mas em seguida disse-me baixinho :
«Eu não sei o que sinto quando as leio,
e para que ninguem mais as possua,
escondo-as aqui dentro...» E abriu-me o seio ...
Não é mais doce a pallidez da lua!
Gilberto.
NOTICIAS DIVERSAS
UMA HISTORIA ANTIGA
(ÁS MÃES)
Sabeis a historia: é velha como a humanidade e
principiou com o primeiro homem que teve fome.
Conheceis a historia da miseria ? Certamente.
A scena repete-se, na sua immutabilidade commo-
vente e terrivel não apresenta uma phase nova que
prenda a vista, a divirta, fazendo de cada indifferente
um philantropo.
Sempre a mesma physionomia cavada e roxa, o
olhar brilhante e febril, a mesma phrase—Uma esmola
pelo amor de Deus !—A fome, como vêdes, iiáo muda
de gesto nem d'estylo; é enfadonha corno uma boa di-
gestão.
A fome d'hoje, d'hontem, de seculos, tem sempre o
mesmo aspecto que repugna, a mesma lingua pie en-
fada. Foi, é e será sempre uma importuna que pertur-
ba as horas molles e preguiçosamente gastas da bur-
guezia de ventre repleto.
E agora alii ternos em S. Sebastião um novo capi-
tulo da velha historia, igual a todos os outros.
Sabeis?... É como sempre: o pac, a mãe, doen-
tes, sem poderem trabalhar, com muitos filhos que lhe
pedem pão, sem elie lho poderem dar. A narração do
costume...
Ainda se °quites importunos descobrissem uma no-
va fome !...
Mas vós, senhoras, que sois mães, que amaes os
vossos filhos, deveis achar nova e sempre triste a ve-
lha historia.
Em nome dos vossos filhos, senhoras, um sorriso dos
vossos labios para a desgraça, um lençol do vosso lei-
to para a nudez, um pão da vossa meza para a mizeria!
F. Lopes.
NECROLOGIA
Entre a publicação do 1.0 numero do Atheneu e a
do presente occorreram quatro obitos, que muito im-
pressionaram a cidade toda.
Depois de prolongado soffrimento sucumbuiu o sr.
Gregorio C. Sanches Franco, honrado e intelligente
negociante d'esta cidade.
Trabalhador indefesso, espirito recto e esclarecido,
a sua falta é bastante sensivel, assim para a familia,
como para a sociedade e especialmente para a classe
cominercial.
Questões difficeis, que fosse chamado a decidir,
eram sempre resolvidas com superior critcrio. Quem
as confiasse, como perito ou como louvado, á sua cons-
ciencia sã e sua intelligencia, podia contar com a sua
justiça.
Foi um cidadão prestante que a morte roubou no
vigor da vida.
A lei natural que tão cedo o fez resvalar para a
sepultura estendeu-se depois ao sr. José Francisco
Maya, antigo professor do lyeen.
Sobre a sepultura do mestre seja licito ao discipulo
verter uma lagrima de saudade e enviar d'aqiii a roca-
sagem da sua condolencia á consternada familia.
Morrer é o destino de tudo que tern vida, mas quan-
do a thezoura que essa Parca cruel empunha na descar-
nada m5o corta o fio da vida a uma esposa joven e
idolatrada, abrindo fundo golpe no coração do esposo,
já ferido por identico infortunio, contrista-se-nos o co-
roça°, e chegamos a querer desadorar essa lei fatal.
Foi o que nos sucedeu quando nos fulminou a no-
ticia do fenecimento da sr.° D. Maria da Conceição Ma-
chado Sarmento Borges Cabral, esposa do sr. tenente
Julio Borges Cabral.
Que o nosso amigo se resigne com o rude golpe que
inesperadamente o feriu.
Por ultimo o nosso registo mortuario tem a consi-
gnar o falleciinento de uma interessante menina, filha
do nosso amigo o sr. José Sebastião de Castro do Canto.
Flor que pendeu da haste açoutada pelo vendaval,
só foi aquecida pelo sol de II rimaveras ! Fanou-a
o tufão rijo do outomno, deixando inconsolavel seu
saudozo pae
Transplantada o melhor jardim, voe ornar o timo-
no do Altissimo, e ali já não será a rosa,•que cahiu
ainda em botão, será a perpetua sempre viçosa e lou-
çã, n'essas regiões de bemaventurança eterna!
Era do Cêo que a chamou a si. antes de conhecer
os espinhos d'este vette de lagrimas:Feliz, mil vezes
feliz!
Teria de ser muito longo o nosso registo se elle
houvesse de referir-se a todos os fallecirnentos occor-
ridos n'este periodo em que as febres typhoides e' a
variola tem estado a victimar as povoac5cs.
Terminamos, pois, com uma prece por alma d'esses
todos que desapparecerain (Ventre nós.
A.
AO AÇORIANO
Ficámos surprehendidos lendo no Açoriano de 4 de
setembro uma local Acerca da phylloxera na ilha Ter-
77 O ATHENE11 15
ceira, em que se diz que o pratico vindo de Lisboa é
de opinião que a natureza do terreno não é muito fa-
voravel ao desenvolvimento do insecto, havendo todas
as esperanças de o extinguir completamente. — Não
sabíamos d'isso e estamos cá ; e o que é mais celebre
é que o homem nunca disse semelhante cousa, pelo
contrario, acha o bichinho muito abundante, muito gordo
e anafado e tem bem fracas esperanças de o exterminar.
Mas é sobre tudo notavel, que o noticiarista saben-
do que reside oficialmente n'esta ilha o agronomo
chefe da 12.a região, a quem cabe a responsabilidade
das opiniões sobre assumptos de agricultura oficial,
nem sequer tratou de indagar e noticiar a opinião (Ves-
te, que em taes questões é unia authoridade. Foi uma
desconsideraçãosita immerecida, que não produz lá
muito bom elTeito no espirito de quem ler com atten-
ção a local.
A iIlustração e proficiencia em conhecimentos timo-
ricos e praticos do distincto agronomo chefe foram já,
e primeiro do que aqui, avaliadas pelos srs. fayalen-
ses. Não precisamos dizer mais.
Consta-nos que no Fayal foram descobertas pelo
digno agronomo subalterno algumas nodoas phylloxe-
ricas e que o sr.'agronomo chefe requisitou immme-
dia temente do governo os meios de extinguir °gudes.
focos, communicando tombem ao ex.' governador ci-
vil da Horta a parte oficial que a tal respeito teve do
seu subordinado.
muito judiciosa a consideração do noticiarista
acerca da propagação da phylloxera às vinhas da ilha
do Pico, julgamos porém que já não e tempo de pare-
cer, mas sim de pôr com todo o rigor em execução o
que dispõe a organisação dos serviços anti-phylloxeri-
cos approvada por decreto de 9 de dezembro ultimo
na parte que se refere á circulação de plantas.
Dando publicidade a estas linhas sobre assumpto
que directamente prende com os mais vitaes interes-
ses d'este archipelago, não ê intento nosso estabelecer
polemica ; se tivemos em vista restabelecer a verdade,
um pouco desfigurada pela alludida local.
J. P. R.
LOGOGRIPHO
Ao ex." sr. Henrique Carlos da Sibeira 31artins.
E' forte a embarcação-3-2-7-1
feita com esta madeira.-5-3-2-7-1-4
Em remate--é I-5-6-7--8
o sumo (ruma palmeira-4-3-2-1
Para decifração rapida,
um conceito vos é dado.
—Na antiguidade pagã
foi ministro respeitado.
C. Vieira.
Decifrações do numero anterior
Cabramo —Parcella.
EXPEDIENTE
Agradecendo a todos os nossos illustres collegas,
que se dignaram honrar-nos com a sua vizita fazendo
troca com o nosso jornal, bem assim ás casas editoras
que nos remmetteram fasciculos d'algumas obras, que
na secção competente noticiamos, e que recommenda-
mos, pedimos desculpa de as não especialisarmos n'es-
ta occasião, como era da nossa vontade e dever, mas
a falta d'espaço nos obriga a incorrer n'esta falta. No
proximo numero daremos noticia minuciosa a tal res-
peito.
PAULO DE KOCK
A empresa editora. das puhlienesses illustradas voe
reeditar todas as obras do distincto eseriptor franca
Paulo de Kock, principiando pelo romance Gustavo, o
estroina, primorosamente traduzido por Gervasio Lo-
bato e illustrada com 10 magnificas gravuras.
EUGENIO SUE
A mesma empreza vae lambem editar Os sete recea-
dos mortaes obra do eminente escriptor francez Euge-
nio Sue, traducção do nosso talentoso e illustrado es-
criptor.Manuel Pinheiro Chagas. Esta importante pu-
blicação ê dividida em sete romances illustrados com
185 primorosas gravuras.
Não sendo possível publicar n'este numero, o que
faremos no proximo, os respectivos annuncios, d'estas
excellentes obras, desde já as recommendamos aos
nossos leitores e os avisamos de que se recebem assi-
gnaturas na Papelaria e Livraria popular—rua Di-
reita 105-107,
O ATHENEU
Boletim mensal, litterario, artistico e noticioso do
Gabinete de Leitura Popular
PIZt ÇO DA ASSIGNAMUIZA
Por semestre, pafigo adiantado 300 reis
Avulso 80 tt
Pára da ilha acerem a porte do correio.
Aos assignantes do gabinete de leitura, distribuição
gratuita.
Annunciam-se todas as publicações lucrarias, me-
diante um exemplar.
Pede-se a todos os nossos collegas a quem enviamos
este jornal o especial obsequio da troca.
Assigna-se na Papelaria e Liwaria Popular.
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16 O ATHENEU'
GABINETE DE LEITERIA POPULAR
PROPRIETARIO
ALFREDO LUIZ CARPOS
105—RUA DIREITA-107
Assignatnra mensal 300 réis
Não por assignatura, diario 20 »
'A todos os assignantes é olièrtado
mensalmente o numero do jornal litte-
rario o ATI-IlCNUU.
PUBLICAÇÕES
Assignain-se actualmente, na papelaria e livraria
popular de Alfredo Luiz Campos, rua Direita n." 105
e 407, as seguintes:
CAMPOS & Y - EDITORES
0.1311AS DE
Camilo Castello Branco Alsconde de Correia Botelho
ndição definitiva,
revista e corrigida pelo ~ator.
ILLII~ES DE
E. CONDE1XA, HEITOR & LALLEHANT
Serão publicadas em volumes sucessivos de proxi-
mamente 500 paginas.
O primeiro a publicar é o romance em um volume
O RETRATO DE RICARDINA
Com este volume, alem da gravura, uni retrato do
ander aos 55 anos.
A edição ó luxuosa; em bom papel assetinado, .ty-
pus elzevires, Unpressão cuidada e nítida.
A publicação far-se-ba em fascículos de 36 part°irás,
ou 2Fpaginas e uma gravura, pelo preço de 60 róis
semanaes.
DAVID BORRAM EDITOR
.A_S F'A_RP.A.S
O lPAIZ It A SOCIlMDATM
I'012/191:Gr1LTIZA
Reedição do antigo texto das Farpas e larga am-
pliação com mais do dobro dos artigos primitivos,
comprebendendo todos os principaes aspectos da so-
ciedade e da civilisação portugueza durante os annos
de 1870 a 1885 pelo sr. Ramalluo Ortigão.
A collaboração do sr. Eça de Queiroz na primeira
serie das Farpas fará o objecto d'um volume especial.
Cada fasciculo quinzenal de 40 paginas 100 reis.
OS ANTROS DE PARIS
A MAIS ItncioNirE PrzonucçÃo
DE
XAVIER DE MONTEPIN
Grande romance da actualidade, ifiustrado com 1'4
chromo-litbographias.-1.• parte, O .mercador de dia-
mantes.-2." parte, Uma [omitia parisiense.-3.° par-
te, O garotinho de Noniemarire.
Cada faselculo 120 réis.
LEN & -EDITORES
HISTORBA D'INGLATERRA
POR
G-T.TIZOT
Recolhida por sua filho Madame Witt. Traducção
de Maximiano Lemos Junior, iIlustrada com perto de
200 gravuras.
Cada faseiculo quinzenal 110 reis.
BARROS ft FILITAEDITORES
VIAGENS NO CHIADO
POR
BELDDIONIO (Barros Lobo)
Descripção pittoresca e faiscante da alta vida lisbo-
eta nas suas relaçóes externas ; scenas de costumes,
retratos litterarios de personagens em evidencia, etc.:
1 volume 700' reis ; pelo correio, 740; livraria de Bar-
ros & Filha, editores; rua do Almada, 104 a 114,
Porto.
Imprensa da Junta Geral 1
Anuo 2 Migra do Heroismo, Ilha Tfilteiffi, Açores Oitiobro de 1888
I3oletiM mensal, litterario, artístico e noticioso, dedicado aos srs. assinmantes
do Gabinete de Leitura Popular o as casas editoras de Portugal
REDACFORES:— ALFREDO LIME CAMPOS, FELECIANO PINTO, FREDERICO LOPES, J. José &AGUIAR E José: M. LEITE PACHECO
CO LLABORADORES:,— ANTONIO °AMIMO MounKro, ANTONIO C. VIEIRA, lia. AncEu C. BRANCO. ACRE MOIGNINO. AuousTo
RIBEIRO, ALFREDO li:SLEUITA, FRANCISCO M. SU PRO, P. FRANCISCO DOS S. IzEIXOTO, FRANCISCO MONIZ BARRETO,
DR. JACINT110 C. DA SRAR, .100 II C. d'Amn OMITE, José A. DA S. SAMPAIO, loní O. DE LACERDA, JOSE M. M. I )'0,aveiRA,
JosÉ S. DE CASTRO DO CANTO, JULIO ANGELO BORGES CADRAL, DR. LOURENÇO DIA:DM:DO, LUIZ DA COSTA, MANUEL CAETANO, ETC.
EXPEDI ENTE
Glos srs. assignantes do « inheneu » pede-se descul-
pa da demora que houve na publicação &este nume-
ro, o nine r devido a vaias inconvenientesmotiva-
dos pela montagem da nova typographia que esta
empre7a adquiriu.
Como se Perd pelo presente numero, o material é
considonwelmente superior e a escolha do pessoal nos
dão seguras garantias de que &hoje em diante o
«ciltheneu » sairá regularmente no fim de cada meq.
redaccdo em em sen poder alguns manuscri-
pios de notarei valor; a que dal .á em breve publicidade,
devidos a pennas muito conhecidas nos c/Içares.
SUIUMA1U0
Trinns, pnr Joio II. C. d'Anicrante;-0 Momo, por Demo-
d'Ouro, por Gatune Mcnds, traduccão de
./o•(7-0/m7//0; Allaint de Cosnmies Portuguees;—.Augusto
beira, por 041fredo Aiesquita;—Mortosi—Conheeimeidos fieis;
--Puhl:caciiú
EZZLE E AMES
ia" Rflitto
E este o titulo dum bello volume de fio paginas,
nitidamente impresso, no qual a sr." D. Alice Mo •
demo condensou e nos permitte admirar as mais lie-
Gentes scintillações do seu talento genialmente p00-
tico.
Ainda não ha dois annos que a mesma auctora deu
â luz os seus primeiros versos em um livro de maior
volume, com o modesto titulo de Aspiracges, e no
qual já bem se reconhecia que tinha todo o direito
de vir a ser uma muito distincta poetiza.
E evidente que desde entgo a Sr.' D. Alice não
descorou a cultura do seu brilhante espirito e que
por effeito delia, mais fecundos se tornaram os pri-
• mores do seu estro, tão geralmente apreciados e que
já lhe dão honroso Jogar entre os verdadeiros cul-
tores da poesia portuguesa, independentemente do
que ainda se deve esperar do seu robusto talento,
sempre abrasado no fogo da poesia e sempre bafe-
jado pelas inspirações da sua musa propicia.
Tinha nascido para ser poetisa e não podia subtra-
ir-se a sua predestinação! Era ainda poncirmais de
uma creança, ainda residia n'esta cidade de Angra,
quando já me MOStim'a venos seus e pedia a tninha
pouco auctorisada opinião a respeito delles, ao
que certamente era levada por lhe terem dito que
nos meus bons tempos tombem velisejei. A minha
opinião era sempre favoravel Cs suas produccões,
porque ali se deixava vê]. a existencia dium genio
verdadeiramente pelico; mas, :pesar disso, eu
nunca a aconselhava a proseguir n'aquelk gene tu
de litteratura.
Antes pelo contrario lhe disse mais (nina vez:
Deixe-se, minha menina, cie fazer versos ré= pai?. e
'fuma quc nunca d to fortuna e a bem pou-
cos tem dado inato rtall dad e. Veja como o nosso Ca-
mões morreu pobre, quasi na miscria, isto pelo la-
do da fortuna; e quanto á immonalidade, embora
já a tivesse conseguido no seu poema, só ires seco-
los depois do seu fallecimento. é que Portugal, des-
pertando divina condemnavel somnolenci a consagrou
uma verdadeira apotheoSe á immort alidade da sua
memori a; e a este acontecimento, ainda que tardio,
fervetiosamente se associim a nififiio inteira e tudo
quanto era pOrtugnez. Antes disso até se ignorava
onde paravam n as cinzas do grande épico, que depois
se julgaram encontradas e sabe Deus se houve ii isso
verdade; mas tambem se foi mentira é diiquellas
que a ninguem prejudica e antes occulton o que se-
na um desdouro e quasi um opprobio para a indole
desta nação.
Mas Camões concebeu e realisou o vasto plano da
sua Epopga, onde em versos altisonantes de uma
eloquencia peregrina fez vibrar a protentosa fibra do
patriotismo nacional, relatando os IR:M ICOS feitos,
lusitanos nas suas navegações e conquistas, ainda
que exagerando o heroismo d'estas.
Quanto Csnavegações, houve com cffeito um grande
arrojo da nossa parte em desprezar os visionados pre-
conceito d'esse tempo em que se suppunha serem
os desertos do oceano habitados por monstros furi-
bundos e indomaveis, embora a estreiteza do territorio
que possuimos no continente europeu nos fizesse,
por assim dizer, transbordar para o litoral da Africa,
e nos levasse assim a contornar a sua costa até
parte oriental, onde defrontamos com o caminho
em que mais tarde deveriamos proseguir até ao ex-
tremo oriente da Asia.
9
34 O ATHENEU
Quanto porem ás conquistas, não fôram dias tão
heroicas como o grande poeta pomposamente as des-
creve; pois não fizémos mais do que invadir territo-
rios habitados por povos quasi inermes, muito menos
conhecedores dos mortiferos instrumentos de que
dispunhamos, para assim os subjugarmos e espoliar-
mos, tyrannisarmos e até escravisarmos,para depois i mercadejar com elles, como se fossem rracionaes.
Segundo alguns críticos, essas conquistas tão de-
cantadas tomaram depois o triste caracter de verda-
deiras piratarias; e nem sequer as soubémos digna e
proficuamente conservar, porque fômos para com
cilas monstruosamente interesseiros, muito menos
caridosos do que deveríamos ter sido; e nisso nos
excedemos até ao 'ponto que muitos desses povos, que
tínhamos por baráaros nos julgaram humanitaria-
mente ainda abaixo d'eLs! Finalmente a ambição de
conquistas e o sordido interesse que d'ellas resultava
contribuiram muito para perverter os costumes da
nação conquistadora, tornando-a pobre d'espirito e
ainda mais de sentimentos nobres, sobresaindo uni-
camente o espirito guerreiro e sanguinario, que eram
as grandes qualidades d'aquelle tempo, como de tu-
do isto nos dão provas vanos escriptores e chronis-
tas, que foram quasi contemporaneos d'aquellas
épôcas.
E por isso que sempre nos pareceu que os ver-
sos mais sublimes, mais propheticameme inspirados
e por conseguinte os mais verdadeiros do nosso epico,
são aquelles que na sua bella ficção faz bradar pela
voz do velho na praia do Restello, quando via partir
a expedicão de Vasco da Gama.
Mas dilatar os seus dominios tem sempre sido o
desejo dos soberanos; -e no tempo em que o rei era
a nação, a vontade d'aquelle era tambem o movei
de toda a acção dum povo inteiro, tal era ainda o
estado do mundo n'aquelle tempo e do qual ainda
se reseme a actualidade!
Onde vim eu parar, quando só intentei dizer al-
guma cousa acerca da ultima publicação da Sr.a D.
Alice?! Mas o que tive de accrescentar nesta digres-
são tem tanta analogia com o que disse algumas
vezes á joven poetiza, que chame desculpará este ad-
ditamento, que tombem serve para demonstrar ,que
ha tendencias indebellaveis, quando são irresistiveis
nas pessoas em quem as queremos combater, e por
isso a sr.a D. Alice não deixou de ouvir as inspira-
ções da sua musa, não obstante eu lhe ter aconse-
lhado que d'ella se divorciasse.
Fez muito bem não attendendo aos nossos con-
selhos de pessimista, pois se os tivesse seguido era
uma perda pa'ra a litteratura lyrica em Portugal e
tinha-nos privado de nos deliciarmos com a leitura
das beijas producções do seu luminoso talento, tão
flexivel e tão ductil, que se presta a muitos generos
de poesia, como os seus Trülas mais uma vez vieram
afirmar.
Ha ali, como não podia deixar de haver, versos
cujo assumpto principal é o puro amor, e d'esses
logo se nos deparam muito beijos no seu Preludio.
Tombem os ha d'uma fecunda phantasia como são
os das Insoinnias e dos Enlevos. Satyricos como os que
vem sob o titulo Lyrio no pantano. Ha lindissimos
sonetos em vamos generos, e, entre cites sobresae o
que tem por titulo clbnegago, no qual referindo-se
a poetiza á triste sorte que teria se visse o ente seu
querido e muito amado derramar uma lagrima ver-
tida pela dôr, termina esse soneto com este lindis-
simo verso, scintillante como um embotido de crys-
tal: Como é grande o poder d'uma gottinha d'agua!
pois ha n'estas palavras tão simplices e usuaes o
summario`d'um grande conceito poetico.
Ha versos tristes, dolentes e quasi gemebundos co-
mo as vibrações melancholicas d'uma harpa dedilha-
da por um cego de nascença e ha outros alegres, riso-
nhos, estridentes como symphonias d'Offenbach exe-
cutadas por uma orchestra festival.
Finalmente, até ha versos philosophicos, e que ver-
dadeiramente o são. como os que dedica ao Dr. José
Pereira Botelho, por onde se vê que a mimosa poe-
tiza já se libertou do véo d'um certo mysticismo con-
vencional, que muitas vezes subjuga o espirito e faz
obscurecer os lampejos mais lucidos da livre inspira-
ção.
Ha n'esses versos acima mencionados o que em
oratoria se chama uma enumeração tão logica e bem
desenvolvida, onde a poetiza faz pôr em maior relevo
a sua idéaprincipal, que bem se pode dizer que ha n'a-
quelle trecho um verdadeiro primor d'eloquencia, e
tão mascula que não parece ser d'uma Sr.a em tão
juvenil eclode!
Nos versos ao Dr. Botelho fala-se tanto de Victor
Hugo, que parece ter a distincta poetiza reconhecido
os muitos pontos de contacto que se dão entre os dois
homens; pois se ha um açoriano, que, guardadas cer-
tas proporções, mais se possa comparar ao grande
poeta francez, o Dr. Botelho certamente é esse ho-
mem, pela hombridade do seu caracter, pela firme-
za dos seus principios, pela lucidez do seu previle-
giado intellecto, pela sua variada erudição, pelo seu
altruismo tantas vezes comprovado na sua impolluta
reputação de medico e de prestante cidadão.
Não podia por conseguinte ser mais apropriado o
paralello que houve na intenção bem manifesta da
joven poetiza; pois ainda que o dr. Botelho pouco
se tenha abalisado em producções poeticas, tem mui-
tas que nunca foram publicadas, por onde se pode-
rá ver que poucos serão mais poetas no verdadeiro
estro e que ainda menos o sejam tanto no coração.
O que é indubitavel é que os Trigos no seu todo
são por tal forma bellos, que não deixam margem
para menções especiaes relativamente á sua qualida-
de; e só nos limitámos a fazer algumas com relação
aos diversos generos, que são multo variados.
Parabens á já distincta poetiza que em tão breve
tempo tantos louros tem colhido, até que d'elles
lhe entreteçam uma verdadeira coroa, o que é facil
de prever n'um futuro que pouco se fará esperar, e
que o Sr.a D. Alice ha de necessariamente possuir,
se o verdadeiro merito fõr devidamente premiado;
ainda que nem sempre assim tem acontecido, mas
acreditamos que o sympathico estro da mimoza
poetiza vencerá todas as resistencias que se possa
fazer á justiça que lhe é devida, e de que ainda
mais virá a ser credora.
Esperando que o nosso vaticinio se ha de reali-
sar, desde já damos á Sr.a D. Alice os nossos mui-
to cordeaes e sinceros parabens pelo excellente cxito
¡ O A'I'J!L\EU
da sua ultima publicação, prestando-lhe tambcm tun
.voto da nossa perpetua gratidão pelo exemplar com
que teve a generosa delicadeza de nos mimosear, e
onde tarnbent se lê sob o titulo Esquisse seis bellas
estrophes em vinte e quatro alexandrinos dum francez
muito correcto, vendo-sé assim o perfeito conhecimen-
to que a Sr.a D. Alice possue da lingua de Voltaire.
Angra do Heroismo—Agosto de £88.
João Herméto Coelho d'Amarante,
0' (0..1kél,0
Quin.tenal litterario e noticioso—Director, Ma-
noel Soares Pereira—Ilha de S. Miguel.
Veio-me parar á mão o n.° deste novo jornal.
Um pequenino quinzenal litterario, de 8 paginas,
impressas em bom papel e ... tvpo novo. Um quin-
zenal que alem de ser litterario ã¡ainda ... noticioso !
Imagina-se que quantidade de litteratura e que abun-
dancia de noticias este ef/tomo pode, cada quinzena,
offerecer aos seus amaveis leitores...
Em tempo o sr. Mariano Pina, director da Ilus-
tração, chronista da ///usiMçiiio, collaborador da
Ilustração; o iIlustre sr. Mariano Pina que occu-
pa tres lugares tão distinctos n'uma só Ilustração
verdadeira, consagrou uma das suas chronicas á mo-
derna litteratura, ou antes, aos litteratos modernos
—,os que comecam. Nessa chronica lamentava-se el-
le da aluvião de artigos em prosa e verso, de con-
tos, de criticas, de philosophias, de poesias, etc.,
que eram enviadas a elM, sr. Pina, para serem pu-
blicadas na Ilustração. Lamentava-se, e criticava
os auctores para elle desconhecidos, com uma cri-
tica austera, sem se lembrar do tempo mediocre
das suas mediocridades litterarias, quando escrevia
para o Piano da Manhã', uns semsaborães folhe-
tins.
O sr. Pina fallava aos litteratos modernos, que
tinham tido a petulancia de lhe enviar as suas pro-
duções, com os ares auctoritarios d'um mestre-es-
cola reprehendendo meninos. Ora eu não quero, n'es-
tas modestas linhas, tornar os ares do sr. Pina :
tomarei simplesmente os acanhados e submissos ares
dum dos meninos reprehendidos, visto pertencer
tambem a classe dos que começam. Por'ora não fal-
lo as turbas do alto d'uma chronica escripta em Pa-
ris —Paris, a capital do mundo 1—, como dizia o
Alexandre Freire duma comedia em que nos mos-
trava o dobro das suas pernas e a metade do seu
talento,—fallo do fundo d'uma columna d'um jornal
litterario, de que sou obscuro collaborador...
Aquelles, que não encontram nas columnas da
Ilustração publicidade para os seus artigos, para
as suas criticas, para as suas prosas e para as suas
poesias, veem cá para fóra espirrando odio, en-
tram numa iypographia, entregam ao compositor
os originaes das suas originalidades, e dão as me-
didas para uni jornal litterario, um quinzenal noti-
cioso... Chegada a occasiao da paginação vê-se que
a composição não chega para encher o numero de-
terminado de paginas, e então, corno não ha mais
original, vae-se a um almanach e tira-se urna ane•
docta; abre-se um livro de versos e transcreve-se
um soneto; busca-se um volume de prosa e extra-
he-se um capitulo qualquer! Grande sciencia a de
fazer jornaes l•engracada mania esta de fazer litte-
ratura já feita!
Este A101120 ê um d'esses ¡omites. E é pois muito
provavel que este sr. Pereira, seu director, seja tant-
bem uns dos lues que começam. e que para praticar
vão mandando versos ao sr. Mariano Pina....
O numero que. aqui tenho, vem adoravel de lit-
teratura e...de noticias! Vejamos o que contens...
Chroniea, por Lao-Pan. Curvemo-nos perante o
genio! Apresentemos pennas! Como em todas as elmo-
nicas d'agora o auctor dirige-se a uma leitora amiga,
uma leitora d'olhos de deidade, de rosto feito de pe-
talas de rosa (!) possuidora d'uma macia e alva mão-
sinha, feita de nacar e cssencia de rosa ( ai!
que bom 1 ), mãosinha que, segundo o que elle ima-
gina e nos diz, ella estenderá para receber da mão
do Couto, o carteiro, (quem será este maganão d'es-
te Couto, que só entrega a correspondencta em mão
propria ? ) o Atomo, ex."'" senhoral...
Eu em tempo já tinha lido esta chronica—ou pelo
menos, se a memoria me não falha, vi urna chronica
identica no 'Domingo, de Feliciano Pinto. O ambi-
ent e tepido do teu gabinete (da leitora), de que Lão-Pan
nos falia, parece-me ser aquellc mesmo ambiente
tepido de que nos fallou Feliciano. E se eu me tiver
enganado, queira desculpar, cx.'"" senhor
A' chronica segue-se um soneto de Coelho de Car-
valho, —A Velhinha. Urna franzina creatura cansa-
da e tremula, que depois de ter sido uni temo ideal de
formosura, fia agora á porta. Em tempos mais feli-
zes, alguns moços esbeltos apertaram-a ao peito, e
beijaram-lhe com ternura a ... tranca perfumada 1
Veja o sr. Carvalho que cuidadosa revisão lhe fize-
ram ao seu soneto. Agora não lhe hão-de faltar car-
tas anonymas e bilhetes posities indagando que tranca
perfumada era aquella que a sua velhinha dava a
beijar.
Um outro soneto, posthumo, de Eduardo Coim-
bra, o ;oveis e talentoso poeta que tão poucos versos
nos deu A ler.
Secção de Sciencias e teltras. Faz um elogio á
BIbliotheca do Povo e das Escolas, tratando de glo-
riosos, os nomes de David Corazzi e dr. Xavier da
Cunha. Falta d'original e vontade de apanhar alguns
volumesinhos de graça.
No ̀ Desterro, outro soneto d'um tal sf. Luiz Cal-
lado, que talvez fizesse melhor em não fallar.
Contos immoraes. Secção de contos sem moral, mas
tambem sem immoralidade alguma. Antes assim.
O d'este numero, intitula-se cA Louca, e da-nos a
triste historia d'uma rapariguinha que depois de se
divertir nove mexes a fio, Nosso Senhor deparou-lhe
um bebe, para citar, mas dla, acha aquillo desnec-
cessario, e atfoga-se duma poça, etc. Este continuo
é assignado por um ‘Deogenes que, infelizmente, á
bem pouco philosopho.-..
Depois, seguem-se duas perolas transcripms.
79
36 O ATHENEU
Um soneto de Joaquim Lima— Conchita,— e um
fragmento de João de Deus. O Momo devia limitar-
se a estas tres columnas.
Isto parece incrivel mas é um facto. Ainda mais
um soneto, do sr. S. Pereira, que não é outro senão o
sr. Soares, director, em que manda cantar tudo,
n'uma alegria sem limites, simplesmente porque uma
Leonor sua conhecida, completa quinze annos. Pa-
rabens.
Risos—secção d'anedoctas para fazer rir Calinos.
Noticias. Se o tempo permittisse devia fazer-se uma
procissão, acompanhada pela banda da localidade—
Emulatão Popular.
Etc.
Muito interessante este Atomo. .
Demo-Nico.
CONTOS
O ATXXXZTZ » ,OUR
DE CATULLE natbnots
Não pode restar duvida alguma de que esta his-
toria nada tem de imaginario, e effectivamente
succedeu ha duas semanas; foi precisamente da
narração d'esta aventura que tanto se .riu
Opera, quarta-feira ultima, nos dois camarotes
onde dia SerVill de therna.
No entanto, por receio do eseatidalo e do pro-
cesso de separação que poderia bem ter togar, os
indiscretos procuram desvanecer os effeitos das
suas primeiras tagarelices.
Os amigos do conde encolhem os hombros di-
zendo :—“Pôde lá acredittar-se unia tal extrava-
g,ancia? Estivemos cm casa do general, n'essa j imi-
te, e nada vimos.»
As amigas da condessa, escondendo sob o leque
a mentirinha cõr de rosa, corri gestos d'espanto:
—«Quem terá imaginado uma tal enormidadeP
Um alfinete d'ouro é quasi um estylete. Embora
brazileira, a condessa é uma verdadeira parisien-
se, e absolutamente incapaz d'um melodrama.»
Melodramatica ou não, a historia é verdadeira!
E sendo, digain, copio se explicará o facto—hicon-
testavel, penso—de, no dia seguinte, no ultimo
baile da embaixada ingleza, madame de Moncalvo,
que deve certamente gostar de mostrar a sua bel-
la carne de 'namore vivo, levar, contra a lettra
expressa da etiqueta, um vestido de faille espêsso
ligeiramente decotado? Mas é tempo de cómar a
aventura, segundo confidencias que nunca me hão
mentido.
Dansava-se com enthusiasmo no hotel Meille-
raye, ha quinze dias, cérea da meia noute.
-Um baile de despedida: o general ia partir para
a Touraine; mas um adeus que dansa e ri:
Mad. de Portalégre, mad. de Soinoff, mad. .de
Cervenolles, as mais formosas, 15 estavam ao des-
pedir da estaçrto: o inverno e a primavera: ainda
toilletes de seda, mas já flores naturaes: uma sem-
cerimonia de parque ou castello, affugentando a
etiqueta de salão: o prologo d'um idyllio no quin-
to adto d'uma comedia.
Mas a mais adoravel. era a condessa de Marci-
acl Ignora-se o que faz esta feia para ser tão bo-
nita. Quasi trigueira—nasceu no Rio de Janeiro—
e pequena, magra, chata, com' angulos bruscos,
bocca grande, olhos pequeninos, cabellos muito
pretos, curtos, frisados, em tuffos, parecendo sein
pre em desalinho, ella chega força d'imprevist
no gesto, e graça desastrada na anil ode, de riso nos
1:Mios e modo endiabrado no todo, a ser realmente
seductora, estonteadora! Se se adorai') os deuses
no paiz dos macacos, á evidentemente sola a forma
(Puni rapaz semelhante a dia que se deve repre-
sentar o Amor!
Depois, a proposito de tudo, uma extravaga»-
eia louca, pueril, cheia de palavrah incompreen-
siveis e plirases rido exploradas, gracejadora, pal-
radora, mordaz tambern—o g,orgeio (Fuma M-
inn-gra, a eloquencia (rum papagaio que improvi-
sasse. Que diz ella ? Sabe - o alguem? Sabe - o
ella propria? A sua voz não é falia, é um ruido
vivo, pequeno, °rindo, que corre, vae, vem, saltita
e estala, e nos sóbe até ao ouvido como peque-
nos pés de passams ao longo de um ramo.
Apesar d'isso—pOr causa d'isso—é ,idoravel,
aflianço! Tem um deleit o apenas—ama o marido,
abertamente, com a candura simploria (1 unia bur-
guezin ha recen t eme til e casada. Porque O esposou
ella millionaria, elle irruinado? Porque o achou
encantador, e é artista, ainda que da alta socie-
dade. Alto, gordo, branco, girado—com a sande
d'inn bello alleinão — abrindo os seus grandes
olhos azoes, acariciando fleugmaticamente a bar-
ba loura e comprida, quando o vê, extasia-se evi-
dentemente, sente desejos de lhe saltar ao pescoço
diante de toda a gente, beijar-lhe os olhos, punhal.-
lhe os cabellos da barba: e mais d'um a tem visto
chorar de felicidade quando o conde de Marciac
tentado ao piano, canta com a sua voz de ha rytono
tdo syntpathica, as suas novas composições melo-
diosas, de que as mais engenhosas lembram Ia dona
é mobile quando se nao parecem com uma quadrilha
de lanceiros. Será tola a condessa? Não importa,
porque é excentrica. E nunca o tinha sido mais do
que Mesta nome, rindo, gracejando, gritando, com
os olhos mais vivos, a boeca mais aberta, e o ca-
O • ATHENEU 37
bello mais desgrenhado—um pouco excitada talvez
pelo champagne—andando de grupo em grupo,
com repentes de criança que salta n' um pé só e a
sua extravagancia exotica, a que nada é defezo.
Silenciosa! repentinamente. Crispando os labi-
os, olhava com olhar irado—com ar de cão enrai-
vecido que vae morder—mad. de Moncalvo semi)
os raios luminosos do lustro, gorda e muito bran-
ca em plena luz!
Era uma estrangeira, uma italiana, que appare-
cia pela primeira vez: mas a generala, que lhe tes-
timunhava particular estima, tinha dado algumas
informações ás suas intimas: mnad. de Moncalvo
chegara de Florença, na vespera: viuva, de boa
familia;.e rica, podia ser recebida, sem contestação.
Ikea notavelmente bella, d' urna belleza possan-
te e- soberba; a neve quente do rosto—onde os
olhos tem por vezes um ar sinistrobrilhava sob
os cabellos sombrios, abundantes e grossos; e junto
do corpete de setim preto, muito decotado, se de-
senvolvia opulentamente, semelhantes ao busto
d'umna estatua, o esplendor do largo peito, gros-
sas espaduas e bellos braços bem carnudos.
Um pouco negrinha, muito delgada, a condessa
de Marcia° estaria despeitada com aquellas opu-
lentas brancuras? Não.
Se as via com olhar duro e lixo, onde havia
odio—efla, ha pouco tão risonha—é porque sur-
prelmendera um olhar do marido obstinadamente,
apaixonadamente fixo, do extremo menos claro
da salla sobre aquelle opulento cofio, sobre aguei les
formosos braços tão gordinhos! E aquelle olhar
cada vez mais ardente—que ella nunca tinha
visto nos olhos de 31. de Marciac!—se encarni-
çava ainda, e 'sempre,' na carne triumphante da
italiana!
Então a condessa sentiu-se preza d'uma forja in-
tensa e corno doida, a pequena selvagem tirou rapi-
damente do cabello—Com o movimento brusco d'
UM macaco que coça a cabeça—um grande alfi
mete (Fomo, com uma borboleta de saphyras d'
azas abertas e encaminhou-se para mad. de Mon-
calvo, admiravel seda o feixe de luz, e d' um gesto,
enterrou-lhe o pequeno estylete na polpa carnuda
e branca do braço esquerdo! A borbuleta,az.n1 os-
cillou sobre a carne tremula e viva.
De todos os pontos da sala partiram gritos, pre-
cipitaram-se sobre as duas mulheres, num grande
borburinho de sêdas. A condessa debatia-se no ta-
pete cora uma crise nervosa. Mas mad. de Moncalvo
estava de pé, grave, impassivel, apenas os olhos
inflamados. Tinha arranCado o alfinete e, a cabeça
inclinada, via tranquillamente sair da pelle uma
gotta de sangue, como um rubi chorado pela neve.
I I
No dia seguinte, no batido& onde a condessa
de Marciac estava deitada, chorosa e maguada,
sobre uma chaise-iongue, chegaram ao mesmo tem-
po mad. de Portalég,re, Soinoff, a generala e outras.
Adivinha-se facilmente o que diziam. Era ella
effectivamente excentrica? Uma brazileira bar-
bara como os 3Iundurucos e os botocudos? Porque
emtim o que ella fez é abominavel. E porquê?..
Porque o marido se interessava pelos braços de
uma mulher bonita—a condessa tinha-o confessa-
do na vespera, soluçando—porque tinha visto com
prazer um peito formozo? Ah! se se devesse re-
correr aos alfinetes todas as vezes que um lw-
mem cazado, no baile ou no theatro, nos admira
a pelle!
Este ciume era tanto mais absurdo porquanto M.
de Marciac via pela primeira vez mad. de Moncalvo,
pois que chegara de Florença onde elle nunca tinha
ido, e estava em Paris havia apenas vinte e quatro
horas.
—Doida varrida, minha querida! Agora era Mn:
dispensavel que reconhecesse o seu erro, que se
humil [lasse, que pedisse perd ao á sua victima... [II-
d ispensavel e prudente .. os italianos, ningmwm
o ignora, são vingativos. Não era de crê,: que mad.de
Moncalvo ferida, ficando talvez com um signal no '
braço, para sempre—é triste para se decotar!—
não procuraria vingar-se?
—Não era de bom agouro a calma que mostrara.
As colem-as frias são as peores; e quanto dura: a
o desmaio da condessa, a estrangeira tinha billado
em. voz baixa a M. de Marejai:: nau, ralment e
ameaçou-o!
—Creio que é d'origem corsa, insimm ou a gene-
rala. Tudo era para receiar, mesmo urna punha-
lada. Tornava-se indispensavel ir immediatamen-
te a casa de mad. de Moncalvo.
—Vamos! vamos! depressa, vista:se ; emq imanto
se demorar com» ella, nós esperaremos na canoa-
gemo á porta .
Atormentaram tanto a pobre condessinha, des-
fallecida, um pouco penalisada por ter sido Chnti-
nosa que se resignou a obedecee-lhes. Quereria
antes ver seu marido, primeiramente: devia estar
zangado; durante a noute não tinha ido vil-a e
esta manhã não apparecera ainda.
-Não, não, vel-o-ha á volta, quando estiver
tudo arranjado. E elas a vestimm, a levaram,
resistindo ainda, porque lhe custava esta visita.
E' humilhante, quando se é magra, ir pedir perdão
a uma mulher que possue tão bellas espaduas.
80
:38 O ATIIE.NEu
III
Mad. de Moncalvo foi correcta. Apenas soube
que a condessa entrava, saltou do leito, vestiu o imu-
pão, mil int, na sala, correu sollicita para a visita
toda córada, e tomou-lhe as mãos corno a unia
amiga.
—Mo (liga tuna palavra! Mio se desculpe! ex-
clamou, graciosa; com uni beijo sorriso nos lalilos.
Nada quero, nada!
Tanta indulgencia duplicou a confusão da con-
dessinha .
—Oh! fui bem culpada! Deixe que me desculpe.
—Não, não fidlernos mais n' isso. Mo valeu nada.
Esta nome mesmo se curou e desapparceeu.
A condessa nao compreendia.
—É verdade minha querida, continuou a
italiana cada vez mais risonha. Não advinha quem
foi o operador? Oh! posso bem dizei-o! foi o seu
marido, minha boa condessa.
—Meu marido?...
—Sim, louca, teu marido! gritou Mal de Mon-
calvo, que já tinha deixado de sorrir..
Arregaçou a manga de renda ;Ltd ao grosso cio
braço, e a condessa de Marciac, assombrada,
no kgar onde deveria existir o signa! ou a ferida
do alfinete, viu o traço curvo, ainda recente, hgci-
Ia rosco e azulado, (rum beijo longo, de' no-
judo
prra,fir,:550).
Fru Ditritilo.
.LiStrWr,
3)ZI: CS -TUIVIZS r-VRTiiertrZZXS
O sr. l)avid Corazzi acaba de distribuir os primeiros fasciculos
<Fuma nova e attrahente publicacâo que brevemente será apre-
sentada ao publico. intitula &libam de costumes portmmeaes
e a sua collaboração está entregue a artistas e escriptmes de
reconhecido merito e de incontestavel talento, como Alfredo
Roque Gameiro, Columbano Bordallo Pinheiro, Condeixa,
Mulluía, Manoel de Macédo, Raphael Bordallo Pinheiro, cujos
lapis já bastante laureados, foram escolhidos para o desenho
dos explendidos chromos que iIlustram o novo Album, e Fi-
alho d Almeida, Julio Cesar achado. Pinheiro Chagas Rama-
lho Ortigão e Xavier da Cunha, os finos planejadores das finas
pennas, que expalharào uns brilhantes rales de alegre verve
pelos artigos descriptivos dos nossos mais sympathicos e
conhecidos costumes.
Temos aqui sobre a meza, ao lado do tinteiro, entre duas
rosas polidas murchando n'urna floreira de louça e os galhos
irregulares d'um veado de bronze, onde descançam do traba-
lho algumas canetas de paia, um Album vaecimen da nova obra
que o sr. Corazzi já começou a editar. Neste album,ha já al-
guns chromos e alguns artigos
A primeira pagina, d'unla artistica disposição typographica,
entre uma vinheta colorida que a rodeia, traz a historia do
antigo tropeiro de Lisboa esse tvpo que, embora não perten-
cendo já á actualidade, sUbstitoido boje pelo reporter do jor-
na), como nol' o diz Ramalho Ortigão, que é quem firma es-
te explendido artigo, por esse reporter que vau agora pela via
du alcofa no broco e gancho em punho, remexendo o lixo da
cidade, para negociar a apanha a tanto por linha ou a tanto
por IlitZ , recorda alinda a todo o fiel hsbonens,, que. ao abrir
pela manhã a,janella do seu quarto, dava com elo â esquina,
procurando n algurn monturo, entre cães uivando, trapos sujos
e papeis velhos. Segue-se em segunda pagina o chrorno respe-
ctivo, de Manoel de Macêdo, que é um primor de cores e
um grande trabalho de talento.
Depois, deparamos com uma creancinha singela e friorenta,
vestida mal e olhando azuladamente para alguem que passa,
atravez da neve que cae e do frio que faz, vendendo palitos e
apregoando rocas. Columbano desenhou, Julio Gesar Machado
descreve. E tanto o artigo como o desenho, estam feitos de tal
maneira, que a gente fica a olhar para um e a ler o outro duas,
ires vezes, Intimamente satisfeitos de ver n'aquelle pequeinto
louro, tanto espirito e tanta arte portugueza
Mais adiante, a penna de Fialho d'Almeda enche n'uns pe-
ríodos campactos, d'alto a baixo, uma outra pagina, pondo
os leitores do Milbum dos costumes portuguefes ao facto do
que é o capur, traje do Faval, e do papel importante que elle
desempenha na burgueza vida das fayalenses. E agora que
chegamos á ultima linha creste artigo, está-nos a lembrar urna
coisa: corno ficarieis vós alegre, querida leitora, se alguma
pagina do novo Álbum e algum dos seus vivos chromos. fossem
destinados a reproduzir aos olhos curiosos de mil leitores, o
vosso manto de merino preto, esse exquisito traje em que ides
embuçada ouvir beatamente os sermões da Quaresma, escon-
dendo sob o grande papelão que vos envolve a loura cabeça,
os ‘ossos cabellos douro e os vossos labios de ginja!
MOMO: WIDOZ
4,Va:usyó ZJBZXRO
Bordallo Pinheiro um dia, vendo atravessar o
Chiado sobre as suas pernas collossaes o illustre
jornalista acoriano, trepou-se a um gancho de ferro
que ainda hoje suspende á porta d'unta uvaria ele-
gante uma grande luva de zinco encarnado, e d'
ahi, assestando-lhe o monoculo, tnonoculisou-o fixa-
mente, d'alto a baixo. Na quinta-feira adiante' o
ednlonio afaria offerecia em folhetim aos seus lei-
tores, a mais perfeita caricatura do si'. Augusto Ri-
beiro, começando no rodapé da primeira pagina,
pelos pés e por urna pequenina parte das gambias,
pela canella apenas, e seguindo assim até a ultima,
onde, já extenuado, inteiramente despojado de for-
ças, Bordallo Pinheiro, agarrado ao seu explendido
crayon lhe collocava 'finalmente a cabeça, com
aquelle esguio chapeu alto branco, de fita preta, e
um resto do pescoço, cujo osso saliente tomava só
a penultinta pagina.
Lisboa, que até então se punha baixinho, de co-
coras, quando pretendia ver de perto o microscopi-
co General Macedo, depois de alguma desordem
em que a guarda municipal tivesse entrado, para
manter á torça de catana o rigorismo das leis, co-
meçou a erguer o pescoço, a estender o bico, a
equilibrar-se nas pontinhas dos pés, para examinar
vontade, o novo redactor do Comi:creio de Por-
tugal. Data d'ahi o começo da sua gloria. O si'.
Augusto Ribeiro, que, como redactor da Ideia No-
va, soubera attrallir a attenção do archipelago, at-
trahia agora a atteneão da capital. Tornou-se mai-
or, elle, que já tão grande era. O alcance dos se-
us artigos, e as rajadas eloquentes da sua penna,
fizeram-o um grande homem depois d'elle ser um
homem comprido.
Hoje, em Lisboa, quando alguem se quer referir
a uma cousa de excessiva extensão, ¡á não a com-
para com a legua da Povoa; ou a COMrara ao com-
kjti`9.741"
O'ATHENEU 39
primemo da eloquencia do sensato orador, ou ao
tanianho das ceroulas do illustre jornalista. O, Es-
trangeiro, tem sabido fazer-lhe justiça, offerecendo-
lhe algumas commendas. Isto entre nós, de com-
mendas, não quer dizer cousa alguma. Portugal dá-
as a toda a gente, mas o Estrageiro não as dá a to-
dos. Se, porem, essas offertas ao distincto escriptor
açoriano, continuarem a ser feitas com a rapidez
com que até aqui o tem sido, poder-se-ha em pou-
co tempo dizer d'elle, o que o antigo crIllnon das
glorias disse do já fallecido Duque d'Avila:— E'
um calrario de condecorações.
(Dos edçorionos d'agora) -
eillfredo Wesquita
MOMOS
maxxx. nann1r;co
O homem que teve nas lettras açorianas o no-
me illustre de Antonio Moniz Barreto Corte-Re-
ai, pertence á posteridade desde as 7 horas da ma-
nhã do dia 23 de setembro de 1888.
Os Açores perderam no Dr. Moniz Barreto um
dos vultos mais importantes e mais dignos de
respeito que teem n'estes uhimos tempos, da-
do maior desenvolvimento ás !curas patrias.
9 • O nome glorioso creste morto, acha-se collo-
' cádo, pelo seu grandioso e bem reconhecido me-
recimento, entre os nomes d'aquelles que, tio
nosso archipelago, mais teem pugnado pela ins-
• trucção popular.
Escriptor muito habil, deixou-nos nos seus li-
vros e em todos os seus escriptos, innutneras pro-
vas do seu possante talento.
As Bellezas de Coimbra são as melhores pagi-
nas da sua vida; 'são as recordações gratas dos
seus tempos de estudante, passados nesse es-
plendido pedaço de terra, por onde corre o Mon-
dego.Quem os lê julgaprofundar a alma do gran-
de escriptor e comprehender os seus sentimen-
tos mais intimos. Tal a maneira porque o Dr.
Moniz Barreto sabia manejar a sua valiosa penna,
reproduzindo no papel sensações que nos seusi-
blisam molhem.
, —
,o,,x,rnruco x,,o7:»z's
Acompanhámos até ao cerniterio, o cadaver
d'este infeliz amigõ, irmão do nosso collega des-
ta redacção, Frederico Lopes.
Alfredo Lopes deixou de existir, precisamente
na occasião em que se preparava para a vida-c-mo,r-
reu aos dezoito annos. E desta idade (pie inais
illusões nos atravessam o espirito, que as mais
extraordinarias ideias nos circulam na imagina-
ção ; e tudo isto se passavc ~bem no seu bem
organisado cerebro de rapaz—as alusões d'um
futuro bom, que havia de ser o premio das suas
boas ideias de trabalho.
A morte roubou-lhe tudo.
rritmxna ç.,o,xnwrsto) r
Xilçlr"%,;(05
As doenças' que corroiam a ambos, declara-
ram-se-lhes quasi ao mesmo tempo e mataram-os
no IIICS1110 dia.
O numeroso acompanhamento dos dois enter-
ros, demonstrou perfeitamente que eram bastan-
tes os seus amigos, e grandes as sympathias de
que os dois finados gosavain desta cidade.
Ás familias dos quatro mortos, cuja falta aca-
bamos de registrar, envimnos os nossos sentidos
pezames.
CONELCUIIEG: UM:
UNIA EXPERIENCIA D'OSNIOSE
Tomam-se dois ovos proximamente do mesmo tamanho :
mergulha:se um em acido chlorhvdrico diluido, até á dissolu-
ção do carbonato de cal da casca"; em seguida metteudo-o em
agua pura vê-se o ovo augmemar de volume, quasi o duplo,
no espaço de vime e quatro horas. O segundo ovo serve para.
constatar a'differenea de volume.
AMMONIAGO NOS ALCOOLS
Resulta das analyses de M. Lindes que os alcools do com-
morei° encerram constantemente bases ammoniacaes. O
cognac de boa qualidade dá 1, 29 gram por litro. Na aguar-
dente de cidra a proporção é de 1,35; no 1-hum de 3,07.
NOVA DOENÇA
O dr. lobert está estudando uma nova doença dos porcos,
proveniente da alimentação d'estes animaes dos residuos da
distillação do milho,
MEIO DE GARANTIR DA FERRUGEM
O FERRO E O AÇO
Banha • 250 gram.
Camphora em pó s
Funda-se a b-m. Apenas terminada a snlucflo, retire o
vaso do banho junte plombagina em quantidade suficiente
para dar á ban1;? a côr do ferro. lintli-se com esta pomada,
cm quanto quente, os objectos que se quer privar da fer-
rugem. Instantes depois esfrega-se com uni palmo. Assim pre-
parados ficam inalteráveis.
PÓS D'ARR07.
Torna-se um pote de barro e deita-se-lhe:
Agua 6 Iiiros.
Arroz de boa qualidade kg.
Deixe em contacto 24 horas, depois decante. Reno\ e a o
ração durante tres dias. Deite o arroz n'um tamis de cri
feito isto, exponha ao ar sobre unia toalha. msto que O arroz
si
40 O ATIIENED
enxugue, pise n'um almofariz o arroz até obter pó fino,
e passe-o em seguida atreves d'um panno fino, ligado á
boca do pote, para não perder pó.
TINTA PARA TORNAR A MADEIRA INCO3IBESTIVEL
PRIVAL-A DOS INSECTOS
Alumen
Sulfato de ferro
Acido borico
Gelatina
Gomma de trigo
Agua
fio gram.
50 «
30 «
«
6 r
1:000
Colore á vontade.
RECEITA PARA IMPEDIR QUE O LEITE AZEDE
Meuein-se algumas folhais de abano selvagem no vaso do
leite, e elle conservará a sua doçura durante muitos dias.
LIMPESA MARMORE
Empreg,a-se a agua chlorada (6o gr. de chloreto de cal
para uni litro d'agua). Fricciona-se o marmore enodoado com
uma esponja embebida Mesta agua, e deixa-se enxugar 20 ar.
Ao fim de duas horas, lava-se com agua pura.
Se esta primeira operação não bastar, recomeça-se de novo
mas termina-se passando o marmore com oleo de linhaça,
ou melhor,cara virgem dissolvida em essencia de tercbenthina.
r:ZLSC/t2 IMEZAIIM
Xdi IS TO >I X A; Z),?5,25 R 024'4
VICTOR DURUY
Edicao illustrada com 800 magnificas gravu-
ras traduzidas por á!. Pinheiro Chagas.
O limai:ais() succeso que obteve em Portugal
a traí-Ima:fio da //i.ilorift de "'rança de Henri
álartin, revelou-nos o enthusiasum que o publico
está mosiramlo pelas grandes obras historicas,
por aquellas que lie dão o conhecimento da vida
dos povos, mais dramatica muitas \ eZes do que o
romance de toais agitadas peripecias.iVunia obra
hisiorica, traçada por polia iimri,il, [em o leitor, a
par da satisfaça() do seu espirfio pie deseja ins-
truir-se, o deleite que a todos causa uma narra-
tiva cheia de vida e de paixão. As magnificas
gravuras estrangeiras, que esta empreza leio ob-
tido, e que dao a historia por dias inusitadas unia
nova attracçâo, completam o encanto e a milidae
de d.estes livros, porque o ensino da historia pe-
los olhos não é menos profícuo do que o 9115. pe-
netra no nosso espirito pela leitura.
A HISTORIA DE R0álA será publicada em
magnifico papel, typo novo, muito legível, e il-
lustrada com 309 'PRIMOROSAS GRAVURAS
sendo ninhos de pagina inteira, devidas aos
meiros desenhadores e gravadores de lia! ia, Ero'i-
ça e Inglaterra.
A obra completa não excederá o. preço de
5:000 reis e ficara terminada em dez ou doze
meses.
CONDIÇÕES DA ASSIGNATURA :
A HISTORIA DE ItOMA sabirá em caderne
Ias in-t,' grande, a 2 continuas de 26 paginas e
aos fascicidos de 32 paginas com capa.
Custo de cada caderneta em Lisboa 60 reis,
pago no acto da entrega.
Custo de cada raticieulo nas provindas 120
reis, franco dr parte, pagos adiantadamente.
Todo a correspowlencia deve ser dirigida a
Rodrigo dr "IML Carneira Zagailo, escripeoha da
Emprez-a, travessa da Queimada, 86, Lisboa.
• cot wzdsyndetT-sidifIlt•IlOtZnIdWillElillSO
Nova riroducção de XAVIER DE MONTEPIN,
roinance de sensação illustrado emn 15 chromo
lithographias, aguara/nadas por 'Manuel de Ma-
cedo.
A C111111>CZa &Perece os seguintes valiosos brin-
des a todos os Srs. assignantes: Um almanach
Mostrado para 1889 contendo muitas gravuras,
cbromos, artigos bumoristicos, enigmas, poesias,
iincedotas, charadas, [ancilas de utilidade geral,
annuncios, et c.
E pelo insignificante preço de 10 reis cada
unia enrolou magadicas de desenho e côres finís-
simos, cujo valor, leal é nove ou dez vezes suiw-
rior ao preço lair que são ofierecidas los srs. as-
signantes, ofi.crece Cunhem gratuitamente a todos
os srs. iissignantes, uma capa para brochura do
1." volume eon: (lidem-entes cAres eido belloeffei-
rto.
(et Si/Ol-l:t ,2?lIQ
Chronica Semanal de costumes, ca3osTpolitica; artes e ler.
tras. Diraceão literaria de Maseellino Marmita, illustrações de
Julião ,tachado.
A COMEDIA PORTLIGUEZA constando de oito paginas de
texto. uma capa illustrada com3annuncios, publicar-se-ha ia-
va naXe/mente aos sabbados, nitidamente impressa-em papel
aguai ao d'este prospecto com a collaboração dos seguintes
distinctos eseriptores : Barros Lobo, Fialho Freitas
e Costa, Gomes da Silva, João de Deus, Jayme Victor, José
Antonio de Freitas, Julio Cesar Machado, Manoel Pinheiro
Chagas, Moura Cabral, Silva Lisboa, Silva Pimo,_15rbano , de
Castro, etc.
CONDICÇÕES DE ASSIGNATIIRA
LISBOA—anno; tedeStdoo :Semestre, 13,P3oo; Trimestre,
65o.
POVINCIAS E ILIAS—Anno, an600; Sensesue, ii'liksoo ;
Trimestre,s7oo.
II5SPANIIA E ÁFRICA Occidental e oriental—Anno,
33k000 • Semestre, ilt500-
T01;OS OS RAIZES DA UNIÃO POSTAL—Anno, fr. 17,
ou E o. 118, ou mk. 13,6o. Semestre, fr, 8,6o, E 0.6i isk ou
nik. 6,8o—firazik (moeda brazilheira) anuo, 63lS000. Semestre,
Angra—lfypographia do Athênen, de (888.