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Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

May 12, 2023

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Khang Minh
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Page 1: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro de 4887

13oletim mensal, litterario, artístico e noticioso, dedicado aos srs. assignantes

do Gabinete de Leitura Popular e ás casas editoras de Portugal.

REDACTORES :— ÃLPE1500 LIOS CAMPOS, 115nuermmo PINTO, PREnsmeo LOPES, Joio Josi1 D'AculAn E JOSE MARIA LEITE PACHECO.

COLLABOR A DOR ES : — ÂNTOXIO GAMOW) Mounkro, ANTONIO C. VIDICA, FRANCISCO P. Momz CARRETO, JosL A. DA SILVA SAMPAIO,

Jos/: CAETANO DE LACERDA, Josi, 111. Momz D'OHIVEIRA, Josi 5. DE ema° DO CAETO, JULIO ANGELO BonoEs CABRAL,

Luzz »Á COSTA, MAEUEL CAETANO, ETC.

SUMATARIO

Apresentação :—A escola e as creanças, por F. Lo-

pes ;—Doidos ou criminosos? por J. J. A. ;—Camillo

&muno Branco, por C. Vieira ;—Conciliabulo, Uma

boa creada, por Catulle Mendes, traducção de F. Lo-

pes ;—Chronica, por A. ;—.9 sorvedouro, por M. Cae-

tano ;—Um brado de compaixão. por A. Campos; —

lia tantas assim! por C. ;—Per viam Mica, soneto por

Francisco Bastos ; Charadas, por C. Vieira.

.APRESENTAÇÃO

A litteratura de um cyclo historico é corno que um

espelho reflectindo as ideas sociaes, as ideas politicas,

as ideas religiosas, as instituições, os costumes emílm,

tudo quanto dimanou da força potente do espirito do

povo que a produziu. -

Do estylo, do sabor proprio, do lavor da linguagem,

da predilecção por um genero litterario, do caracter

dos personagens, real ou phantasioso, do desenvolvi-

mento da acção, do thema e do fim moral da obra,

resulta nitido, brilhante, o ideal de uma raça ou de

uma geração.

Um producto da Arte é uma encarnação do espirito.

Tanto pode sei-o o portico de uma cathedral corno a

pagina de um livro. O marmore e a palavra dão a for-

ma sensivel, material, á idea.

Saber apreciar a curva graciosa de urna estatua de

Venus, o lavor de um relevo architectonico, o rendi-

lhado da phrase conceituoso na obra litteraria; é deli-

ciar-se no goso da Arte á luz abençoada do espírito.

E tudo isto á ler--ler no marmore; ler no livro.

Mas a architectura recueu perante a imprensa.—

Isto matou aquillo — disse Vietor Hugo, o genio do

seculo.

O livro é pois a grande manifestação, a manifesta-

ção multip/a da Arte ; a leitura boa e sã o maior goso

do espirito.

Despertar e mesmo crear o gosto pela leitura das

obras modernas dos grandes eseriptores impessoaes,

que seguem o grande mestre da escola realista, Zola,

eis um dos fins do Atheneu.

Dando noticia extensa de alguns livros já publicados

e d'aquelles que forem apparecendo ; extrabindo d'el-

les alguns trechos escolhidos que dêem uma idea apro-

ximada do todo; e acompanhando estas noticias de

uma analyse sob o ponto de vista artistico e moral; e

tudo isto sem pretenções de critico, o Atheneu alcan-

çará por certo o seu fim.

Está feita a apresentação do Atheneu. Não vem com

arreganhos de critico ; mas como simples dileetanti que

adora os productos do pensamento humano perpertua-

dos na plirase escripta.

SCIENCIAS E FACTOS

A ESCOLA E AS CREANÇAS

Para uns é assurnpto esgotado a escola : para outros

é descurado e menos estudado. A escola não é só a

cartilha, não deve sel-o: seja tombem um compendio

de moral e gymnastica.

Educação intellectual, phisica e moral —eis o gran-

de, o verdadeiro objectivo. Da falta (Vestes tres ele-

mentos resulta a ignorancia, o crime e o definhamen-

to das raças.

A idea predomina, como a virtude, tomo o musculo.

A luz soe do cerebro, a moral do coração, o trabalho

do musculo. Illumine-se, moralise-sei robusteça-se:

somma—eduque-se. •

A mãe gera e cria, raras vezes educa. Não sabe:

educae-a na creança, que será mti Amanhã.

Não façamos só figurinos, não ensinemos só o frau-

eez ; façamos mães:Não façamos só homens, façamos

tainhem cidadãos.

Fazer um homem é simples e rapido: fazer um ci-

dadão é demorado e complexo. O homem é a mataria

prima, o cidadão é o artefacto : o artifice será primei-

ro o mestre, depois, a mãe.

A mãe é d'hontem, é d'ha .muito: a creança deve

ser d'hoje e do futuro.

A escola deve ser o laboratorio onde se purifiquem

esses crystaes—as creanças. Se o chimico for habil o

crystal sairá puro.

O meio tem uma influencia importantissima sobre o

individuo, a °reouça molda-se quasi como a cêra ás

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2 O ATIIENEU

forças que actuando sobre dia lhe formam o caracter.

Modificar a acção d'essas forças, attenual-as, inutili-

sal-as quando seja possivel, é um dever, é uma neces-

sidade, que é mais.

Se a creança vem do lodo, não sirva este facto se-

não como indicador das impurezas que arrasta, senão

como motivo de mais cuidado e dedicação. Depois de

educada é um cidadão util ou uma mãe modelo. Que

importa d'onde veio?

Veio da miseria, da opulencia, da fome, da abun-

dancia, da pureza, da corrupção, da honradez, da in-

fainia ? Que importa vir chim palacio ou de uma ta-

verna? Venha donde vier pôde estar contaminada. A

origem nada tem com o fim : não deve tel-o.

O cidadão honesto, trabalhador, sabio, é um pro-

dueto : pouco importa que viesse d'um berço rico ou

miseravel: fizeram-no utide bom, é-o. Nem sempre do

ouro sue o bem, nem sempre da fome sae o crime: ha o

ido &grado e rico, ha a virtude analphabeta e po-

bre. lia a prostituição vestida de seda, ha a honesti-

dade vestida de farrapos. lia o trabalho com fome e

honra, ha a ociosidade com dinheiro e vícios.

A origem, repita-se sempre, pouco importa. Nin-

girem pergunta ao ambar que rios perfuma se veio da

dejecção d'um cetaceo, nem ao cholera que nos mata

se veio da dejecção d'um rei. As hervas que nós gosta-

mos nos banquetes alimenta-as o estrume, que e a

podridão: os vícios que corroem a sociedade alimen-

ta-os o dinheiro, que é a riqueza. As pedras que bri-

lham no peito dos argentarios arrojou-as talvez o rio

á praia entre os lodos: o pária que não tem nome foi

talvez arrojado á roda por ;nãos que calçavam luvas.

Arranca° pois as ereanças á ignorancia, ao crime,

anemia. Venham (ronde vierem, educae-as: só assim

serão uteis. Vem do prostibulo? Nada imporia: a flor

não recusa a gota do orvalho que a vivifica e refresca

SC 3 nuvem a foi beber charco.

Fazei como o nuvem : ide beber as ereanças aos

charcos e aos pantanos e depurai-as pela educação :

serão como essa gota—no charco podia matar, na flor

brilha como uma perola.

A escola ensina a ler: deve educar tombem. Educar

é bem construir, bem edificar: ler é bem iIluminar o

',inflei°. Ler ê muito, ler e ser bem educado é tudo.

Eillicae as creanças! Desenvolvei-lhes as faculdades,

instrui-as, dae-Ilies lições de moral e civismo, alimen-

tar-lhes o amor ao trabalho, recompensae-lhes o bem:

pegae-lhes nos braçinlios e, ensinando-lhes a encarar a

luz. e o, futuro , dizei-lhes—eaminhae, caminha° sem-

As creanças são o legado que deixamos ao futuro:

que o nosso testamento seja generoso e saldo.

F. Lopes.

DOIDOS OU CRIMINOSOS ?

A recente theoria de duas capacidades medicas,

apresentada por °ocasião do exame ao alferes Atari-

nbo da Cruz, assassino d'um seu condiscípulo, deman-

da um profundo estudo para se averiguar por um mo-

do inconcusso e positivo, se tal theoria assenta em

principies racionaes e aceitaveis, ou se não passou

d'um mero expediente para pôr o assassino ao abrigo

do rigor das leis penaes.

A theoria foi produzida por dois allicnistas distinctos,

os drs. SCI13.3 e Mattos, pie de certo não quereriam

sacrificar a sua reputação em favor d'um criminoso

consciente. Além disso a respeitabilidade do seu ca-

racter, os credites de que gosam no campo da scien-

cia, tudo leva a crer que a opinião (restes sabios se

baseia num profundo estudo e em grandes investiga-

ções scientificas.

O que é certo é que esta opinião determinou o pri-

meiro conselho de guerra a absolver o alferes Marinho

da Cruz, tornando-o irresponsavel pelo crime que com-

mettera, o qual foi apenas o producto d'um estado

morbido, que a sciencia classifica de epilepsia larvada.

Aceite, como foi, a theoria por aquelle tribunal, é

possivel que no segundo conselho de guerlia, a mie de

novo vae ser submettido Marinho da Cruz, em virtude

da decisão do tribunal superior de guerra e marinha,

que amiullou a sentença do primeiro conselho, conti-

nue a prevalecer a opinião da sciencia, ante a qual

deve vacillar a consciencia dos novos juizes. E de fei-

to, se o diagnostico feito ao reu, tem perante a scien-

cia fundamentos solidos, isto é, se Marinho da Cruz foi

levado por um estado inorbido, de que não é culpado,

a praticar uru crime, a sociedade será iniqua condem-

niiiido-o e tornando-o responsavel por um lacto que

elle seria incapaz de commetter no seu estado normal.

Se é um doido, ou um criminoso consciente, é o que

convem averiguar, e a essa COM3CÇrlo só se poderá

chegar pelo exame d'outros especialistas, ou pela sua

opinião consignada n'uma consulta competentemente

formulada.

, Desejariamos que, a este respeito, se debatessem em

conferencias, dentro ou fura do paiz, os homens mais

notaveis c competentes na especialidade, pois é possí-

vel que todos os condemnados que pejam as cadeias e

os carceres soffrain de epilepsia larvada e n'esse caso

-devam ser irresponsaveis pelos crimes que inconscien-

tes commetteram. A solução (Veste problema social em

favor da nova theoria, ê urna questão d'interesse ge-

ral da humanidade, que lia de determinar uma reforma

profunda no direito criminal e levar a sociedade a

.converter as penitenciarias em hospitaes, a supprimir

a guilhotina e o fusilamento e a demolir as forcas.

E tão deficiente a nossa legislação penal; estão Eio

mal organisados os nossos tribunaes que ao passo que

atiram para urna enxovia com o soldado Antonio Coe-

lho, corno um grande faccinora, quando poderia ser

um infeliz epileptico larvado, submettem ao exame dos

primeiros alienistas do paiz o alferes Marinho da Cruz,

que o não declaram criminoso, mas simplesmente um

epileplieo larvado? Falta de justice ou excesso deipro-

tecção e favoritismo! E apregoam-nos egualdade de

todos os cidadãos perante •a leil

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O ATilENEli 3

Quizeramos, ao menos, que todos os reos, que tecm

de ser subinettidos a julgamento, passassem primeiro

por um exame, a Ilm de se averiguar se o crime de

que são accusados é simplesmente o producto de um

estado morbido, ou a consequencia d'instinctos perver-

sos e ferozes.

Porque não hão de eles soffrer, como Marinho da

Cruz, de epilepsia larvada? S6 a sciencia o pôde di-

zer. Pois consulte-se a sciencia antes do teredieturn

dos juizes. É possivel que muitos sejam confiados aos

hospitaes cru vez de serem lançados, como feras, nas

masmorras.

A despeito da nossa incornpetencia no assumpto,

para nós de fé que nenhum homem attenta contra a

vida do seu similhante, ou contra a sua propria, sem que

se dê um estado morbido, uma nevrose qualquer nas

suas faculdades mentaes.

Só accidentes anormaes podem fazer do homem uma

fera, pois não é crivei que o Creador dotasse entes da

mesma especie com instinctos e sentimentos diversos,

dos que são inatos nas suas creaturas.

Subsequentemente veremos se o suicida, que a egreja

fulmina com penas, comi) se um cadaver se podesse

corrigir, e digno d'essas penas, ou um doido merece-

dor de compaixão.

J. J. A.

LETTRAS E ARTES

CAMILLO CASTELLO BRANCO

Este nome, aureolado pelos fulgores d'orn espirito

uberrirno, desperta em todos os que presam as cele-

bridades da 'nesb littera troa moderna, o mais profun-

do respeito e a mais siinpathica veneração.

Na individualidade que elle representa reflectem.

brilhantemente os explendores dum verdadeiro genio,

aliado a uma intelligencia elevadissima, como o pro-

vam esses tão apreciados monumentos litterarios que

lhe devem a existencia.

Os romances de Camilo Castelo Branco, glorioso

mestre das letras putrias, são admirados de con-

thmo por portuguezes e estrangeiros, porque ninguem

melhor do que ele sabe exprimir os diversos senti-

mentos da alma em linguagem tão encantadora, subli-

me e correcta.

O espirito humano ala-se em contemplações produ-

ctivas, quando se inspira n'esse primoroso estylo que

seduz, captiva e impressiona.

A fecundidade e engenho dos seus primores littera-

rios são dum vivo interesse para os admiradores d'es-

se grandioso talento, verdadeira gloria do paiz que o

viu nascer.

Dotado (um imaginoso espirito, que consubstancia

em si todos os predicados d'uma perfeita notabilidade

nas letras, o seu nome ficará para sempre gravado,

em caracteres indestructiveis, na historia da nossa lit-

teratura.

A reimpressão de todas as obras de Camilo Cas-

telo Branco, a que agora se está procedendo, será o

valiosissimo padrão, que constantemente relembrará

posteridade esse vulto admira!el, que no seculo xix

tanto honrou a patria de Camões.

C. Vieira.

CONCILIABULO

(De Catelle Mendes)

16 e Lo, e a sua amiga 76, falam juntas, muito se-

riamente, com a fronte pensativa que poderiam ter

tres pequenos ouististes senadores da republica dos

macacos, sentados sobre a cauda e a cabeça apoiada

nas mãos, tratando as mais graves questões do estado.

E com effeito a questão é grave !

Trata-se de decidir qual seria para uma rapariga a

melhor resolução a tomar, se um desconhecido, bem

apessoado, entrasse repentinamente no quarto da toil-

lette no momento em que tivesse deixado cair a ultima

das mais intimas roupagens.

—Eu, diz Jo que se enche por vezes d'urn pudor

feroz, não hesitaria. Cobria-me o mais depressa pos-

sivel com um penteador, um tapète, uma cortina, uma

saia, qualquer coisa, e depois com altivez, com gesto

digno d'uma imperatriz ofendida, eu indicaria a porta

ao imprudente intruso. ,

—Eu, diz por sua vez Lá. que por cousa alguma

quer parecer menos terrivelmente virtuosa que a sua

amiga, não hesitaria tombem! Faria o que tu acabas

de dizer : somente, antes que o importuno se afastasse,

atirava-lhe á cabeça a caixa de velowine ou a minha

bacia da Bohemia, para lhe ensinar a respeitar o mais

doce e sagrado dos mysterios.

76 não tinha falado ainda.

—E tu? perguntou Jo.

—Eu, pelo contrario, hesitaria : com certeza hesi-

taria.

—E depois?

—E depois ?

—Depois ficaria n'isso, porque, emrma, em quanto

eu hesitasse, passar-se-lia certamente alguma cousa

que me dispensaria de tomar uma resolução qualquer.

UMA BOA CRÈADA •

Elles estavam no primeiro beijo—o primeiro d'a-

quella noute—quando a creada entra exclamando af-

flieta :

—Estamos perdidas! O senhor vem ahi já do circo.

Sobe agora a escada. Então ? Ouviram?

E rapidamente, assustada, voe juntando a roupa es-

palhada pela cama, pela mesa, pelas cadeiras.

O unico meio de salvação era a fuga d'elle pela es-

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4 O ATHENEU

cada do serviço. Mas estaria elle já vestido, em estado

de sair, antes da chegada do importuno, cujos passos,

cada vez mais proximos, soavam já nos corredores?

—Luiza ?...

—Senhora ?...

—Vae para a ante-camara e a todo o custo retem

ahi meu marido.

—A todo o custo?

—Assim é preciso.

—Bem, minha senhora, respondeu a dedicada meada.

E a toda a pressa foi despindo o vestido, as saias,

o espartilho. Era branca, rosada, cheia: os seios de-

senhavam-se nitidamente no tino linho da camisa.

—Tu estás doida! que vaes fazer?

Luiza entreabindo a camisa, deixou ver a graciosa

• curva d'um seio de neve : depois sahiu rapidamente

dizendo :

—Agora não se apressem que eu respondo por

tudo!

(Traducção). F. Lopes.

GAMBIARRA

CHRONICA

A nossa chronica é lugubre como cyprestes que se

debruçam sobre as sepulturas.

Confundem-se rosas, em botão, com os goivos e as

saudades.

Grinaldas de flor de larangeira, como chlamydes al-

vas de virgens, rivalisam com os crepes.

• Lagrimas de pacs estremecidos, soluços de mães

carinhosas, prantos d'irmansinbas em corações juvenis,

onde a dor teve pela vez primeira accesso, compõem,

com os canticos dos anjos, no paraizo, n'essa mansão

d'eterna bemaventurança, um hymno, de. jubilo que

contrasta com a dõi. que cá ficou na terra.

Duas familias choram a perda de dois entes que

lhes eram caros. Duas creanças — uma de 18 annos,

outra que só viu raiar o sol de 14 primavéras, sucum-

biram n'estes ultimes dias, corno a flor que se des-

prendeu da haste, sacudida violentamente pelo tufão.

José Maria Leite Pacheco, um coração lavado por

todos Os sentimentos nobres, um talento peregrino, um

espirito esclarecido, abi esta alquebrado pela mais di-

lacerante &ir. Nem os desvalies da esposa, nem o con-

forto dos amigos, nem os risos innocentes da filhinha

que sobrmive, são capazes de fazer volver á antiga

jovialidade aquelle homem forte, que caldo como o ro-

ble que o vendaval prostrou, deixando de pé o flexi-

vel canavial. Como o infortunio tem o magico poder de

aniquillar o mais forte temperamento !

Joio 1gnacio da Silva, um trabalhador indefesso, que

na felicidade do lar fazia consistir toda a sua ventura,

amenisando-lhe a vida, gasta nos rudes labores do tra-

balho, quatro interessantes meninas, fructo de segundas

nupcias, buliçosas como borboletas alegres cm uma

manhã d'abril, é tombem ferido pela mão desapiedada

da morte, que lhe arrebata uma filhinha.

Vimol-a no seu atinado com vestido alvo de neve,

manto azul e os louros e annellados cabellos ebroados

com uma grinalda flor de larangeira, orvalhadas pelas

lagrimas do pae e irmãsinhas, que na hora do sahi-

mento, ao dar-lhe o derradeiro adeus estancaram de

subito como uma caudalosa corrente derivada do seu

curso normal. Fugiram dos olhos para se concentrarem

nos corações onde a dói' se foi cravar como agudas

setas !

Oh! como este mundo é um valle de lagrimas!

A.

SORVEDOURO

lia na freguezia dos Biscoutos entre as asperezas dos

rochedos que orlam a costa, junto ao porto, um sorve-

douro cavado na rocha, em forma circular, que attra-

he a Atenção dos visitantes, pela sua singularidade.

Este grande poço ou voragem communica com o

mar a uma profundidade de muitos metros por baixo

da rocha, e por via de um canal por onde as vagas

dirigem uma parte das suas aguas, que faz levantar a

superficie das do sorvedouro ate transbordarem, depois

do que descem com uma rapidez espantosa até quasí

desapparecer nossa vista, para (Fali a instante torna-

rem a subir, descerem depois e assim continuamente

sem jamais terminar.

Aquelle subir e descer constante torna-se tanto mais

pronunciado quanto mais agitadas estiverem as aguas

mrioa roéc.e ano, influindo Lambem para isso o estado da

O curioso'que ali chega pela primeira vez não pode

deixar de olhar com espanto para aquella massa liqui-

da, correndo ora á soperficie ora ás profundezas com

a velocidade do raio, no meio d'um ruído quasi sinis-

tro, lugubre, pavoroso.

Sente-se a gente mal junto d'aquelle • abysmo, que

parece querer engolir a propria rocha que o circula.

Qualquer objecto que se lhe lanCe dentro desapa-

rece para não mais se ver, esmigalhado de encontro

ás paredes do canal que põe o mar em communicação

directa com aquella garganta do inferno.

Apoiar do pavor que nos causa, d'um mal "estar

que sentimos junto d'elle, vale comtudo a pena ver-se,

e ninguem que visite a freguezia deveria deixar de ir

observar de perto aquele prodigio de terror.

Nas occasiões de mar bravo sente-se a grande dis-

tancia um rugido enorme que parece vir das entranhas

da terra—é o sorvedouro que se anuuncia medonho

sendo muito capaz de devorar tudo quanto d'elle se

acerque.

51. Caetano.

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O ATHENEli 5

UM BRADO DE COMPAIXÃO

É uma verdade incontestavel, que a eivilisação e a

educação d'um povo afere-se Lambem pelo bom ou

mau tratamento dado aos animaes.

Ao animal homem, ser racional, cumpre dispensar

toda a protecção aos animaes, seres irraeionaes, não

só pela superioridade que entre uns e outros existe,

mos ainda mais por um principio civifisador, moral e

ma nita rio.

Os maus tratos, a perseguição, o assassinato trai-

çoeiro e repugnante dado a innoffensivos, quanto uteis

e prestimosos, animaes domesticos, só os justifica a

falta de sentimentos caritativos e humanitarios, a CO-

rencia de illustração e educacão, a quasi selvageria de

quem os pratica.

Os actos de malvadez e barbarismos que diariamen-

te vemos praticar pelos carreiros, carroceiros e arriei-

ros, quando os pobres animaes, que de tanta utilidade

lhes servem., não podem conduzir ds enormes pezos

com que os carregam, envergonham-nos aos nossos

olhos e aos de extranhos.

Somos civilisados, proclama-se por toda a parte, e

consentimos e applaudimos, com o nosso silencio, os

espancamentos dos animaes; assistimos indiflerentes

aos castigos brutaes, que lhes dão, espicaçando-os de-

sapiedadamente.

Não se trata de educar e instruir as creanças, con-

correndo assim para o engrandecimento e progresso

futuro da patria, mas em substituição dá-se exemplos

de barbaridade, encaminham-se para a posse de maus

instinctos, ensinando-lhes a maltratar animaes, offere-

cendo-thes á custa d'elles divertimentos barbaros, e,

para remate, para corôo de tanta malvadez, manda-se

que os mantenedores da, segurança publica, os poli-

cias, se arvorem em matadores de cães pelo envenena-

mento !

E elles em vez de repellirem essa ordem barbara e

cruel, que não é, nem pode, nem deve ser das suas

'Micções, esquecem-se da sua dignidade de homens, dos

seus sentimentos huntanitarios, e eil-os, servos submis-

sos, percorrendo as ruas com os bolsos repletos de bo-

las municipaes, distribuindo traiçoeiramente, covarde-

mente, a morte aos cães, vadios ou não, offerecendo ao

publico o expectaculo aterrador da agonia lenta, do sof-

frimento cruel de innoffensivos animaes.

O cão é bom, doeu l e submisso ; é o fiel companhei-

ro do homem, e a sua utilidade e lealdade são sobe-

jarhente reconhecidas. Para que destruir? Para que

roubar-lhe a existencia, que não prejudica, pelo con-

trario pode ser de- vantagem, e quasi sempre é, para

o dono? Para que matar, como ultimamente aconteceu,

cães de gado, que talvez uni dia defendessem ou sal-

vassem a vida dos pastores? Para que assassinar um

cão que conduz a sesta com o almoço, ou o jantar do

pobre op erario, ou do infeliz jornaleiro, que sob um

trabalho, talvez rude, violento, perigoso, esta ganhan-

do o sustento para si e soa ? Para que envene-

nar o cão ffagua pie não hesitaria, vendo qualquer

ser humano correndo perigo de se afogar, cru lançar-

se as ondas, por mais medonhas que fossem, e salval-o

ou perecer com elle? Pois é aceitavel e justo, que os

sentimentos humanos sejam inferiores aos dos animaes

irracionaes?

Além d'isso que direito ha em destruir, aniquillar,

assassinar, envenenar, matar emfim o que é proprie-

dade alheia ?

De certo que nenhum.

Pois bem, em nome da moral, e em nome da civi-

lisação, em nome da humanidade, livrem-nos d'esses

espectaculos de selvageria, que se tem praticado.

Tenham compaixão pelos animes!

Ufanamos-nos de ser um povo ordeiro, bom e

generoso, mas não o sejamos só para os nossos simi-

lhantes, devemos lambem sei-o para todos os animaes

em geral e em especial, actualmente, para os inoffen-

sivos cães.

Lemos, ha tempos, no Zoophilo, orgão das sociedades

protectoras dos animaes de Lisboa e Porto, a seguinte

verdade com que concluímos:

«Se o homem ingrato morde a mão do bemfeitor

que o soccorre, o cão fiel, pelo contrario, lambe a

mão do seu proprio algoz. Esta anthitese é uma elo-

quente lição para a humanidade».

A. Campos.

HA TANTAS ASSIM!

Desabrocha a flor mimosa

Da madrugada ao- arrebol ;

Seu perfume offrece ás auras,

Mas fenece ao pôr do sol.

A borboleta dourada,

Infiel por condição,

Vive dos beijos das flores, .

Mas só dura uma Estação.

O baixel que denodado

Navega com todo o mar, -

Nãima sorte aventurosa -

Acaba por naufragar.

Assim a mulher formosa.

Que em praça- põe seu amor,

Perde o viço e o perfume,

Emurchesse como a flor.

Inspirada da lisonja,

Lindo ouropel que a seduz,

Gira corno a borboleta,

Que se vae queimar na luz.

E se pra ter mil amantes

Um só amor despresou,

baixel presa das ondas

Que lira sempre se afundou.

C.

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O ATDENEU

PER VIAM VIVE

De quando em quando rasga-me um espinho

e contrae-se de dôr a minha face...

Vão-me faltando as forças e definho...

Se eu podasse parar! se eu descançasse !

Tenho ainda o seio quente corno um ninho,

d'onde uma ave, de subito, voasse;

mas já me volto, ás vezes, no caminho,

como se alguem distante me chamasse.

E, então, invade-me um desgosto fundo,

que nem o olhar de certa di‘indade,

cheio d'amor e supplicas, me arrasta

(Vossa tristeza immensa em que me afundo.

Tão longe me parece a mocidade!

e tão depressa um coração se gasta!

Coimbra, 86. Francisco Bastos,

CHARADA

Ao ex.m° sr. José da Costa e Silva, distincio

charadista açoriano

Um insecto, bem pequeno, _9

—Á aranha similhante— I -

Procurando no moinho

Encontra-se n'um instante.

Não é meia,

Não é teia,

Não é veia,

Mas e—peia.

a.

CHARADA movissimA

Um escolho na musica 6 fragmento-2--l.

C. Vieira.

EXPEDIENTE

O ATHENEU

Boi,elim Lomat, literario, anistio e noticioso do

Gabinete de Leitura Popular

rnuço DA ASSIDriNAJELTDA

Por grelaste°, pago adiantado 200 reis

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Peta da ilha aceresce o porte do correio

Aos assignantes do gabinete de leitura, distribuição

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diante um exemplar.

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este jornal o especial obsequio da troca.

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Page 7: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

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pinguei João de Deus e seguimse-hão:— Theophilo

Braga. Guerra Junqueiro, Bandim Ortigão, Luiz Gui-

marães, Pinheiro Chagas, Jose Luciano de Castro, Ba-

tote! Duarte d'Almenht, Itintz Ribeiro, Anthero do Qin-

lal, Castello Branco, etc.

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Page 8: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

8 O ATIIENEU

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bell, e traduzida e precedida de uni estudo critico sobre

Victor Hugo e a sua obra por Teixeira Rastos.

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Imprensa da Junta Geral

Page 9: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

74

Anuo 1.°—N,° 2 Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Oulubro de 1887

Boletim mensal, litterario, artístico o noticioso dedicado aos srs. assignantes

. do Gabinete de Leitura Popular e as casas editoras de Portugal.

REPACJORES :— ALFREDO Lin% CAMPOS, FELICIANO PINTO, FEEDERIÚ0 LoPriO, Joh JosS o'Aoureit E .10S M ARIA LEITE PACHECO.

COLLABOR ADORES :— ANTONIO CAZ [MIRO M OURATO. ikNrONIO C. V IEIRA, FRaCl2C0 P, MONIZ BARRETO, Joe": A. DA SILVA SAmpAzo

J(.0,51, CAETAKO DE LACERDA, JOSi, NI, Moam D'OLIvEin, .106.4: S. DE CASTRO DO CANTO, loiro A NGELO BoRGEs CAmukt,

LUIZ DA COSTA, M ANEEI, CAETANO, ETC.

SUMMARIO

As nossas escolas, por F. Lopes ; fundi ficativos,

por L. P.—Doidos ou criminosos? por J. J. Aguiar;

—Antonio Augusto d'Aguiar, por F. Pinto ;—Viagens

no Chiado;— Versos da mocidade, apreciação por Gil-

berto ;—Uma historia antiga, por F. Lopes;—Afecro-

logia, por A. ;—Ao Açoriano t—Logogripho, por C.

Vieira ;—Expediente ;—Paulo de Kock—Eugenio Sue,

recommendação;—Annuncios de ',diversas publicações.

SCIENCIAS E FACTOS

AS NOSSAS ESCOLAS

A finalidade educativa é fornecer

ao individuo os meios indispensaveis

pesa preparar e melhorar a propria

oicisMncia rio seio da natureza, da

familia e da sociedade.

ANGIULLI.

Os trabalhos que teem por fim melhorar as condi-

ções sociaes, resolver os problemas de todos os dias,

demandam muita paciencia e estudo, e os resultados

não sendo immediatamente apreciados e colhidos pelos

que para isso trabalharam, succede que a actividade

individual quosi exclusivamente se applica á escolha

do melhor meio, mais rapido e !bei', de satisfazer as

necessidades proprias, d'occasião, necessidades creadaS

pelo ocio, pelo habito do luxo e do superfino.

Esta sitde ardente de gosos e prazeres que se apos-

sou da nossa sociedade, este egoismo crescente que a

avassala e lhe guia os passos, fazem com que as ques-

tões largas e momentosas, que importam maior gravi-

dade porque importam ás gerações futuras, percam to-

do o interesse, e bom é quando o ingenuo sonhador

preocupado (relias não as vê despertando sorrisos de

desdem ou a gargalhada boçal.

Essa fé viva, essa crença ardente, forte, inabalavel,

que na idade dos sonhos luminosos e das santas uto-

pias julgavamos eXistir na consciencia humana illumi-

nando-a, como uma lampada a bnixolear ''um templo,

como uma aurora a rasgar o espaço, parece ir extin-

guindo-se, e o crente, como um oasis "um Saarab,

vê-se açoutado pelo estiolador e calido simnun das

desillusões.

A formula e a rotina predominam e governam. A

franqueza é ineonveniencia ou atrevimento, a lacta um

crime, a dedicação um ridiculo, a hypochrisia uma vir-

tude, a lisonja um merito, o servilismo um degrào: E

nós todos conhecendo o mal não procuramos impedir

o seu progresso, não deligenciamos cural-o.

O desalento tolhe-nos os membros e vamo-nos dei-

xando seguir na corrente perigosa, cujo curso é já in-

certo, se porventura não podemos affirmal-o fatal.

Dae-me a educação, dizia Leibnitz, que eu muda-

rei a face da Europa em menos d'um seculo. O arrojo

da phrase iião destroe a verdade da afiirinutiva. SÓ a

educação moldada na sciencia pode 5alvar-iios, só ella

pode operar a portentosa transformação social. Mas

para isso é preciso reformar a escola.

Reformar? Não, troar; o que ald temos não são

escolas, são inquisições para creanças.

O livro, o melhodo, as casas foram escolhidas adre-

de para definhamento e martyrio das creanças.

Alem d'isto, o professor ê um sabio, salvo raras ex-'

cepções, que percebe um ordenado para passar fome

e dar palmatoadas.

O livro é um primor de sciencia, arranjado expres-

samente para as creanças não o perceberem e fica-

rem mais embrutecidas do que antes de os ler.

O methodo é uma maravilha d'engenho com o fim

exclusivo de as desenvolver no minium e castigar no

maximo.

As ligabitações destinadas a escolas teem sido edi-

ficadas de modo 9 faltar cautelosa e prudentemen-

te a todas as regras da hygiene escolar.

O assim a escola oficial, principalmente, iesta ilha,

e dizemos assim por (relia termos um conhecimento mais

perfeito, e sabermos que entre outras as escolas de Lis-

boa toem sido aperfeiçoadas cuidadosamente pelo mil-

piei no, honra lhe seja feita.

. O nosso professor é essencialmente ignorante, e o

que não o é, não tem nem estimulo, nem recompensa

nem meios de melhor cumprir a sua espinhosa e difli-

cultosissima missão : foçamos justiça.

N'esta abentoada terra das touradas e milho tor-

rado toda a gente se julga habilitada a ensinar nas

Page 10: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

10 O ATI1ENEU

escolas, o que é o signal mats claro e evidente da sua

incompetencia. Mio admira porém que haja quem

queira ganhar o ordenado, o que tem jus á admiração

universal, desde a Patagonia até à Hottentocia, é que

pinguem se preocupe com o preenchimento de Laos

legares por ignorantes das cousas mais comesirihas e

rudimentares.

Entrega-se as creanças ás escolas com a mesma

deshumanidade com que se tira os ordenados aos pro-

fessores.

As nossas escolas para evidenciar a mais elevada

comprehensão do seu fim preparam meninos para o

exame e para o oleo de figados de bacalhau.

O exame é para a ladainha cadenciada e rvIlimica

d'um alluvião de definições encaixotadas no ce.rebro a

palmatoria, e o oleo de bacallifiu para lhe curar a

anernia, a chlerose, a escrophirla, uns rudimentos de

tuberculose obtidos de parceria com os rudimentos da

grammatica, tudo cuidadosa e vantajosamente cultivado

nas escolas.

O professor ignora a orlado em que a creança deve

principiar os seus trabalhos escolares, e que a duração

do trabalho deve ser proporcional á eclode e ao desen-

volvimento physico e intellectual. Desconhece o seu

imperioso dever de reenviar aos paes as creanças,

quando enes, com a selvageria propria da ignorancia,

Fias enviam tendo apenas cilas 3 ou 4 armos de

edade.

Ignoram que a myopia e o rachitismo são as mais

vulgares doenças adquiridas nas escolas, onde os pre-

ceitos scientificos são desprezados ou ignora'dos.

Ignoram que a ma distribuição de luz ou falta Wenn,

as disposições de nexos e bairros, e a exigua capaci-

dade da sala, são as origens mais proximas d'aquellas

doenças.

A falta de luz ou a sua má distribuição obriga a

' creança a um esforço grande para poder vêt distincta-

mente as lepras, opproximando muito os olhos do pa-

pel : a creança contra° assim o habito terrivel de ler

com os olhos muito proximos do papel, favorecendo

assim o desenvolvimento da myopia.

Os bancos e as mem não devem ter unia altura

fixa para todas as crenças, o que dá togar a que as

mais altas se curvem muito e as mais baixas se esfor-

cem por chegar á meia, o que, unia e outro cousa, é

excessivamente prejudicial á sande, por as fazer tomar

posições contrafeitas, dando logar a perturbações

daquelles organismos que ainda não attingiram o seu

completo desenvolvimento.

b bordo anterior do banco e o posterior da meza

deveu, estar na mesma linha de prumo, a fim de que

o tronco da creança fique na posição vertical: a ;nen

deve ter uma inclinação tal que o papel seja cortado

perpenaicularmente pelo raio visual. O papel deve

lambem ter uma cOr amarcllada, porque a côr branca

'e prejudicial á vista.

Quando a luz entre por jancllas latteraes devem

colocar-se para escrever os alunmos de modo que os

raios luminosos incidam sobre o lado esquerdo, porque

sobre o direito projectariam unia sombra sobre o pa-

pel, que convem muito evitar. São preferiveis os lados

norte e oeste para a entrada da luz, porque de leste

e sul os raios solares são demasiado vivos e variaveis.

egualmente conveniente o uso de transparentes ou

persianas nas janellas para regular a intensidade da luz.

A edade regular para começar os exercicios escola-

res é a de 6 antros: antes (festa edade é prejudicar

muito o desenvolvimento pbysico e intellectual das

creanças. Alguns exemplos temos já observado. Cre—

onças robustas, vivas, prespicazes, ao entrar para a

escola com 3 para 4 orinos d'edade, tornaram-se tem-

pos depois pallirhis, franzinas, tristes, molles, devido

certamente á incuria e iudifferença dos paes pelo seu

futuro, sacrificando-lhes a sande pelo vão e illusorio

prazer de as vêr ler em tão tenra edade. Esperta

creança diz a mamã lisongeada : pobre inartyr ! di-

zemos ruís entristecidos.

Na opinião (le Chadwike é apenas de 15 a 20 mi-

nutos seguidos o espaço de tempo de leitura que até

aos 7 antros, pôde uma creança aturar, prestando at-

tenção ; dos 7 aos 10 bastam 20 minutos, e (rabi em

diante vae successivamenle auginentando até aos 16

Os intervallos das lições e estudo irira desenriço (le-

varão ser regulados de modo que o trabalho lia rio

seja de 2 e meia a 3 Pioras liara as creanças de 7 Mi-

nes, de 3 a 3 C meia horas para as de 10, e 4 horas

para as de 12: dos 19 antros em diante o trabalho

dia rio Ode elevar-se a 8 ou 9 horas.

O trabalho muito prolongado e sem interrupções,

óleo, de (Incultar e prejudicar o desenvolvimento phy-

sico e intellectual das creanças, faz lambem com que

elas criem aversão e aborreçam o estudo.

O estudo C O recreio alternados são o melhor meio

de as desenvolver tanto physica como intellectual-

mente.

As creanças precisam de ar, luz e movimento: roo-

bar-lhes estes Ires elementos de vida é sacrifico-as, é

estragar-lhes a sande.

N'estas épocas que vão correndo, em que a lucta

pela existencia mais vigor exige aos nossos musculos,

em que para uma nação adquirir predorninio, força

e riqueza, é necessario que cada cidadão seja sobre-

tudo um bom animal, tornam-se indisperisaveis todos

os esforços para que nos tornemos fortes e vigorosos.

É para a creança que devem incidir principalmente

todos os cuidados para obstarmos ao' seu definhamen-

to. Protecção ás creanças, mais uma vez, e sempre.

Se temos a machina a vapôr, precisamos com tudo

de um braço musculoso para lhe construirmos as peças.

E. Lopes.

MUNDIFICATIVOS

Longe de querer impõr as minhas convicções—ex-

pondo-as—são• filhas de meia duzia de principios an-

thropologicos, de preferencia applicados ao lado moral

Page 11: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

O ATHENEU II

da seductora metade do genero humano.— Tambem

são fructo amargoso de decepções colhidas na socie-

dade, algumas na intimidade, não poucas ainda viço-

sos, a respingar seiva que se converte em baba peço-

nhenta.

Não á um systema, podem ser rudimentos para elle;

concerte-os, junte-os, augmente-os, agglomere-os, me-

dite e classifique-os quem poder c quizer e terá o

systema ; quem não guizo'', podendo, á porque não

pode admittil-os, combata-os e pulverize-os. A mani-

kstação morphologica modifica-se mas a essencia ato-

mica transubstanciar-se-ha ?— Não sei. Platão, d'llol-

bach e Descartes deixaram de bom, tudo, ainda mes-

mo tudo gualdo era mão ; este depura-se.

Nemo') e Copernico valem tanto nas soluções ma-

thematicas dos problemas astronomicos, como nas

potheses engenhosas dos systemas planetarios.

Jeremias chorando, Lamartine fazendo chorar teem

a sublime ideia de castigar a alma pela sentimenta-

lidade.

Os prineipios concatenados formam as doutrinas e

estas coordenadas dão aos systemas a faculdade de

correr inundo.

O systema das penitenciarias para atrophiarem o

corpo, carece de uma obra complementar: as peni-

tenciarias do espirito ; estas, na propria habitação dos

delinquentes, como a agua bu o gaz, deveriam ter os

seus effeitos e registros.

Onde a corrupção, a infamia e a maledicencia la-

vram intensivamente, é ahi que urge purificar, lavar o

pés das ulceras e cauterizal-as.

É, principalmente, no grande mundo, na tal elite

social, nos salões dourados, nos toucadores embalsa-

mados de perfumes orientnes, nos aposentos luxuosos

de leitos de ébano e marfim, de brocados de seda e

oiro em que a ociosidade feminil estende os enervados

membros, esperguiçando blasphemias, conspurcando

honras, instillando gótas de subtil peçonha nas alheias

vidas; é por ali que as chagas são maiores e mais as-

querosas,—para ah d os mundificativos do espirito:

illustraçào, educação—trabalho.

Não especialiso, o mal á geral; grande aqui, álem

maior, por toda a parte assolador

Ver-se-ha o que dizem os factos.

L. P.

DOIDOS OU CRIMINOSOS

Vimos no nosso anterior artigo que, a prevalecer a

opinião dos mais distinctos alienistas de Portugal—

de que todos os criminosos são epilepticos larvados—

ha na nossa legislação criminal uma notavel lacuna,

pois que ao passo que um conselho de guerra atirou

paro lima enxovia o assassino Antonio Coelho, como

um grande criminoso, que pode ser um infeliz epi/e-

ptico larvado, outro conselho de guerra absolveu o

assassino Marinho da Cruz, não o declarando crimino-

so, mas soffrendo de epilepsia larvada

Promettemos Lambem dizer alguma cousa com res-

peito aos suicidas.

Estes é que nos não parecem criminosos, pois que

julgamos o producto d'unia nevrose qualquer a resolu-

ção que os determina a pôr termo á existencia.

A sociedade umas vezes considera o suicidio como

virtude e heroismo, outras como crime. O juizo dos

homens, n'este caso, como em muitos outros, determi-

na-se por diversas eircumstancias, filhas umas vezes

da sympathia, outras do odio, ou da malquerença.

Pela nossa parte discordamos. Ou o suicidio 6 sem-

pre 11111 crime, sejam quaes forem os motivos que o

determinem, ou sempre uma virtude.

Chamar umas vezes virtude e heroismo a esse acto

de loucura, que os factos e as apparencias, em deter-

minadas circumstancias, parecem desculpar, e outras

vezes crime, ignorando-se as razões que o determina-

ram e que podem ser desgostos profundos, causas que

prendam com a honra e caiu o bom nome do indivíduo,

é um erro, uma dessas aberrações socíaes, que sellãO

explicam.

Catão e Cassio não seriam maiores no exílio, no

carcere, ou no patibulo, do que suicidando-se?

Os mesmos que admiram a heroicidade de Catão e

de Cassio, são os que glorificam a resignação de Na-

poleão, e, se ele tivesse morrido quando a aguia fran-

ceia abateu o vôo e caldo, talvez que a sociedade o

considerasse criminoso e recusasse juntar mais um lou-

ro á corôa de gloria do Immo" d'Austerlitz.

Catão é um heroe por saber morrer pela liberdade

da patria, Napoleão teria sido criminoso, se tivesse

posto termo h existencia, como por Ires vezes tentara,

mas é heroica a sua resignação! Notavel contradicção

esta!

Muitos publicistas distinctos consideram sempre cri-

me o suicidio, quaesquer que sejam as circumstan-

cias que o determinem, porque a vida vem ao homem

de Deus e não é sua, sendo elle apenas um deposita-

rio d'ella.

Sociedades lia em que se estabeleceram grandes pe-

nas e enrilhemos para os suicidas, como se um cada-

ver se podesse corrigir!

O catholicismo chega a ter a intolerancia de negar

sete pahnos de terra sombra da cruz, corno se esse

emblema sacrosanto da redempção não tivesse os bra-

ços bastante grandes para abrigar toda a humanidade !

A egreja, que glorifica o suicidio de Razias, Eleazar

Sansão, deve comprazer-se em perdoar, lembrando-

se que o homem, só porque é homem, deixa-se arras-

tar por uma paixão violenta. Cego, absorto, com uma

ideia fixa, Ioda muitas vezes com as vagas da vida e

com os baldões da sorte, até que succumbe, dominado

por um sentimento que o devora.

Não defendemos o suicidio, lamentamos a intole-

ronda e a contradicção d'esses mestres da 'moral, que

75

Page 12: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

12 O ATHENEU

com os seus anathemas e penas não tem conseguido

obstar a esse desvairamento.

Porque é que Lucrecia ha-de ser uma hei-bina ?Não

podia ela sanclificar-se e lavar a mancha por um ar-

rependimento perpetuo, como Magdalena?

proprio da natureza humana puear e, senão tos-

se a fragilidade nauta no homem, a sociedade não te-

ria tanto suicidio a deplorar.

Mas o homem ementará conscientemente contra

propria existencia, quando tombem lhe é inflete o ins-

finei.° da conservação ?

Parece-nos que não. É este um dos casos em que

o crime é a producção de unia nevrose qualquer.

E, sendo assim, serão justos os amalhemos e as pe-

nas inflingidas ao suicida ?

Castigar um doido, e quando elle já é cadaver, ê,

a nosso ver, uni crime monstruoso, maior que o crime

que elle commetterit.

Para o suicida só ternos lagrimas de commiseroção,

e um sentimento de dor pela intolerancia com o seu

cadaver.

J. J. Aguiar.

ANTONIO AUGUSTO D'AGUIAR

Afastados da metropole por mintas legues de Mardi-

.co, não conhecemos de perto os grandes homens que

sacrificam toda a sua vida ao bem da patria ; não te-

mos a noção complexa do seu caracter, que abrange

a sua vida publico e particular; não indagamos dos pra-

menores do tracto social, dos seus boletos, da sim ma-

neira de trajar, das suas excentricidades e predilecções,

vemol-os simplesmente, a distancia, como homens pu-

blicos que põem o seu talento ao serviço do seu pais.

Adminunos e applaudimos de longe o trabalho inces-

sante, inteligente, energico, que eles, os que têm a

faisca do gemo, produzem nas agras do progresso. •

E somos com elles, espiritualmente, na vida e na

morte. Na vida, applaudiudo enthusiasticamente os se-

ti actos ; na morte, honrando e conservando a sim o-

bra, que é honrar e perpetuar a sua inemorift.

E á bem vasta e preciosa a obra que lega ao seu pais

e A humanidade o morto illiistre que oro pranteamos.

Antonio Augusto dc Aguiar, falecido em 4 de se-

tembro, era uru desses homens que possuem, a par

de um coração d'oiro, uma energia ¡lidou-lavei.

A sua actividade era enorme.

°linde°, professor na escola polytechnica, tinha

uma reputação europêa. Pertencia ás sociedades chi-

micos de Paris e Berlim, e deixa, na sua especialida-

de, largos estudos e descobertas valiosas para as sei-

encias &para as artes.

Os seus trabalhos sobre a fabricação dos vinhos,

que elle estudou nos países vinhateiros da Europa é

as conferencias publicas, feitas posteriormente, nas

quaes demonstrou scien tificamen te a necessidade de ado-

pção de novos methodos para restaurar este ramo de

ommereio já decadente, tornaram-no celebre.

Analysta distinctissimo, não se limitou a :e'Xplana-

ções theoricas, ensinou os methodos mais praticos,

simples e perfeitos, chegando mesmo a inventar um

processo de vinificação conhecido pelo nome de Balas

densant es, de extrema simplicidade e bardteza, co-

mo afirma o primoroso escriptor João de, Leyde

d'onde colhemos estes dados.

Tendo ido á exposição de vinhos abmita em • Lon-

dres cru 1874 na qualidade de commissafio regie, con-

seguiu ali ó custa de enormes ,diliculdades' sustentar

a fama dos vinhos portugueses.- -

Ministro das obras publicas, i anifestou a sua inici-

ativa fundando as escolas industriaes e fazendo todos

os esforços por encetar as obras do porto de Lisboa.

Foi A Ilidia, A França, á Belgica, á Inglaierea e á

?Iolanda no desempenho de importantes commissões

scientificos e economicas; grangeando Sempre novos.

louros para o nome !mitigues.

Fundador do Instituto Industrial de Lisboa, onde

era professor, ['residente da Sociedade de Geographia

e de outras associações promotoras do engrandecimen-

to da nação, vogal do conselho geral das alfandegos e

Tribunal superior do commencio, ministro de estado

honorario, condecorado com a Grau-Cruz de S. Thiago,

Grão Mestre da maçonaria portugueza, Antonio Augus-

to de Aguiar, filho do povo chegou im fastigio do po-

der e da gloria sem se deslumbiar todavia com as

honras que adquriu por meio do seu grande %talento e

•do seu trabalho aturado. Coinprazia-se e In recordar

.que vinha do Povo e em trabalhar para elle.

Morto, os proletarios que vivem da industrio, que

ele animava, não o esqueceram. Á beira do tumido

entre os representantes da familia ical, associações

a que pertencia, e de um concurso enorme de todas

as classes soe ia es. o pittil d ente da associação industrial

portuguesa, falando em nome de todos os °permitis e

.industriaes da nação, interpretava os sentimentos da

grande massa mionyma que abençoava um irmão ilus-

tre que nunca a esquecera.

Neste facto reside a.maior gloria de Antonio Au-

gusto d'Aguiar e a sua Uninortalidade.

., A inemoria d'eme grandioso operario será eterna-

mente recordada, porque a sua historia está gravada

no granitico livro dos tempos—que ê a alma do povo.

• 9•0

F. Pinto.

LETTRAS E ARTES

Viagens no Chiado,tipbritamentos de jornada de um

lisboeta atreves de Lisboa, por Beldemonio. (Ed.. de

Barros Lobo.)—Barrosj &J;Filhh; editores — Porto-

1877. j

Fomos mimoseados•com um exemplar d'este excei-

lente livro de Barros Lobo. . . ,

•-• Não necessita o festejado e bem conhecido auctor

-das Viagens no chiado que lhe encomiemos Jo Lraba-

Page 13: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

O ATHENEU 13

lho, e exalcemos o talento. Conhece-o o publico ha

muito, o publico que o lê .e admira.

«A physiologia de Lisboa é uni trabalho que ainda

está por fazer». O -livro de Barros Lobo O um rico

subsidio para esse trabalho, é um amontoado de es-

plendidas notas, tiradas rapidamente, mas levando o

cunho d'aquelle espirito profundamente observador e

critico, e burilhado n'aquelle estylo rico, elegante, por-

tuguez puro, que faz as delicias do leitor e o desespe-

ro dos litteratos pelintras e ridiculos que só julgam es-

crever bem pedindo emprestado ás outras linguas por

desconhecerem o muito que ha de bom na sua propria.

A belleza da forma não é inferior á. profundeza do

conceito. O artista e o philosopho revelam-se e com-

pletam-se.

No texto que transcrevemos, ao acaso, melhor apre-

ciará o leitor o alto merecimento do novo livro de Bel-

demonio. •

«0 amor é sobretudo um sentimento antes do ma-

trimonio á sobretudo uma funcção, depois. Em theolo-

gia, o amor pôde ser definido: a forma ideologica da

selecção. Em moral, o amor é a fusão de duas almas.

Parece pois que não ha accordo possivel ; na realida-

de, esse mordo estabelece-se quando o amor-sen-

timento continua vivendo no amor-funcção. Trata-se

apenas .d'obter esse resultado ; não se obtem quasi nun-

ca nas sociedades de urna educação deficiente, por-

que falta o tacto necessario para idealisar o convivia

conjugal atravez das realidades frequentemente rudes

da vida.

«Isto e uma verdade que ninguem contesta. Temos o

exemplo d'ella demite dos olhos; se considerarmos a mar-

clia do amor,- separadamente em cada uma das tres clas-

ses que podemos distinguir na massa da nossa soci-

edade. Em qualquer d'ellas, o amor principia sempre

identicamente, num idylio cuja forma varia, sem nun-

ca variar o fundo. E sempre a mesma excitação en-

cantadora, o mesmo arreei° purissimo d'ideal. Mos após

o casamento, estabelecem-se differenciações profundas.

Na classe inferiorT—população agricola, proletariado—

a mulher tornou-se logo a escrava do marido, uma es;

pecie Wobjecto com varios prestimos; ',iço tem peso na

vida do homem, senão pelo que lhe pode custarem ali-

mento. Elle bate-lhe, com a mesma tranquilidade de

consciencia com que bateria 'rum Cão; considera-a

pouco menos que uma cousa e pouco mais que um ani-

mal domestico. Na classe media—pequena burgriefla

—a mulher é ainda um objecto, mas objecto d'esti-

mação. O marido respeita-a. simplesmente porque es-

se respeito destingirá sobre elle. No fundo despre-

sa-a ; os dois vivem emparedados na existencia, arrepe-

lados pelo desejo de se mandarem mutuamente ao di-

abo, e ,pela necessidade de guardareni as convenien-

cias. Na classe superior, einfirn--alta burguezia, aris-

tocracia—a vida amenisa-se, torna-se doce e fui'. So-

brevoem mil diversões á inonoldnid do tête-A-tête quo-

tidiano. É vulgarissima r"essa classe a pieguice de na-

morado presistindo.110'easamento, as _pequeninas sen-

Timentalidades, as superstições tão_ pueris e tão vitaes

do beijo trocado sempre que o marido sae de casa ou

se recolhe. Como se vê, o amor seguiu uma progres-

são bem nitida de classe para classe, á medida que o

nivel d'educação subia. É inutil insistir n'este ponto a

que apenas se torna necessario fazer uma annotação.

Aquelle resultado apoia-se tombem, em grande par-

te, na somma de facilidades que dá a fortuna. O amor

que resiste á miseria, 6 miseria absoluta ou relativa,

com todas as suas consequencias, é. uma innovação de

poetas, boa apenas para fazer negocie com os edite-

res. A velha formula idyllica, O teu amor e uma ca-

bana, é limo simples parlapatice litteraria, para recitar

ao piano. Nunca teve valor critico, e nem sequer já

tem merecimento artistica.»

,-Versos da mocidade, 1883 a 1887, por Antonio

Fogaça—Coimbra.

Acaba de-ser publicado este novo livro de versos do

já notavel poeta Antonio Fogaça.

Fogaça pertence a essa geração de poetas, que Co-

imbra de tempos a tempos nos offerece.

Desde João de Deus, Anthero do Quental, Guerra

Junqueira Joio Penha, Gonçalves Crespo, que Coim-

bra vae enriquecendo a litteratura portugueza com os

esplendidos versos (Testes brilhantes poetas que são

uma gloria nacional.

Antonto Fogaça é dos modernos, é dos iniciados

d'hontem, mas já se nos revela um robusto talento, e

com Francisco Bastos; Silvestre Falcão, João do Me-

nezes e muitos outros, forma a nova e promettedora

geração que continuará mantendo a gloriosa tradicção

da poesia coimbrã.

Em seguida publicamos alguns versos, respigados

dos Versos da mocidade, onde mais se admirara o po-

deroso estro do novel poeta.

- Felicitamos do coração Antonio Fogaça pela sua

brilhante estreia, e no abraço ao amigo animamos

mais urna vez a nossa admiração ao poeta.

Cuidei que a minha sombra era a que vinha

depois do nosso adeus junto a meus passos;

porém—notei que havia n'esses traços ...

linhas suaves que eu em mim .nr11) tinha.

Vê como o teu amor se me insinua

e vives no meu ser. Não era a minha.sombra era a tua.

Hei de dar-te um palacio com mil portas,

que encerre tudo quanto phantasiarmos

—rosas, volupia, musica, afeições ...

A porta mais pequena ê para entrarmos

e são as outras para as illusões.

Eu perguntei á minha namorada

Onde é que as minhas cartas escondia,

sendo dla tanto e tanto vigiada ...

Deu-me o ceu nium sorriso d'alegria,

é e então, olhando a poda do visinho,

e vendo que ninguem apparecia

75

Page 14: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

14 O ATHENEU

que nos pudesse ver sobre o caminho,

fitando-me, córou, ulmo vão receio,

mas em seguida disse-me baixinho :

«Eu não sei o que sinto quando as leio,

e para que ninguem mais as possua,

escondo-as aqui dentro...» E abriu-me o seio ...

Não é mais doce a pallidez da lua!

Gilberto.

NOTICIAS DIVERSAS

UMA HISTORIA ANTIGA

(ÁS MÃES)

Sabeis a historia: é velha como a humanidade e

principiou com o primeiro homem que teve fome.

Conheceis a historia da miseria ? Certamente.

A scena repete-se, na sua immutabilidade commo-

vente e terrivel não apresenta uma phase nova que

prenda a vista, a divirta, fazendo de cada indifferente

um philantropo.

Sempre a mesma physionomia cavada e roxa, o

olhar brilhante e febril, a mesma phrase—Uma esmola

pelo amor de Deus !—A fome, como vêdes, iiáo muda

de gesto nem d'estylo; é enfadonha corno uma boa di-

gestão.

A fome d'hoje, d'hontem, de seculos, tem sempre o

mesmo aspecto que repugna, a mesma lingua pie en-

fada. Foi, é e será sempre uma importuna que pertur-

ba as horas molles e preguiçosamente gastas da bur-

guezia de ventre repleto.

E agora alii ternos em S. Sebastião um novo capi-

tulo da velha historia, igual a todos os outros.

Sabeis?... É como sempre: o pac, a mãe, doen-

tes, sem poderem trabalhar, com muitos filhos que lhe

pedem pão, sem elie lho poderem dar. A narração do

costume...

Ainda se °quites importunos descobrissem uma no-

va fome !...

Mas vós, senhoras, que sois mães, que amaes os

vossos filhos, deveis achar nova e sempre triste a ve-

lha historia.

Em nome dos vossos filhos, senhoras, um sorriso dos

vossos labios para a desgraça, um lençol do vosso lei-

to para a nudez, um pão da vossa meza para a mizeria!

F. Lopes.

NECROLOGIA

Entre a publicação do 1.0 numero do Atheneu e a

do presente occorreram quatro obitos, que muito im-

pressionaram a cidade toda.

Depois de prolongado soffrimento sucumbuiu o sr.

Gregorio C. Sanches Franco, honrado e intelligente

negociante d'esta cidade.

Trabalhador indefesso, espirito recto e esclarecido,

a sua falta é bastante sensivel, assim para a familia,

como para a sociedade e especialmente para a classe

cominercial.

Questões difficeis, que fosse chamado a decidir,

eram sempre resolvidas com superior critcrio. Quem

as confiasse, como perito ou como louvado, á sua cons-

ciencia sã e sua intelligencia, podia contar com a sua

justiça.

Foi um cidadão prestante que a morte roubou no

vigor da vida.

A lei natural que tão cedo o fez resvalar para a

sepultura estendeu-se depois ao sr. José Francisco

Maya, antigo professor do lyeen.

Sobre a sepultura do mestre seja licito ao discipulo

verter uma lagrima de saudade e enviar d'aqiii a roca-

sagem da sua condolencia á consternada familia.

Morrer é o destino de tudo que tern vida, mas quan-

do a thezoura que essa Parca cruel empunha na descar-

nada m5o corta o fio da vida a uma esposa joven e

idolatrada, abrindo fundo golpe no coração do esposo,

já ferido por identico infortunio, contrista-se-nos o co-

roça°, e chegamos a querer desadorar essa lei fatal.

Foi o que nos sucedeu quando nos fulminou a no-

ticia do fenecimento da sr.° D. Maria da Conceição Ma-

chado Sarmento Borges Cabral, esposa do sr. tenente

Julio Borges Cabral.

Que o nosso amigo se resigne com o rude golpe que

inesperadamente o feriu.

Por ultimo o nosso registo mortuario tem a consi-

gnar o falleciinento de uma interessante menina, filha

do nosso amigo o sr. José Sebastião de Castro do Canto.

Flor que pendeu da haste açoutada pelo vendaval,

só foi aquecida pelo sol de II rimaveras ! Fanou-a

o tufão rijo do outomno, deixando inconsolavel seu

saudozo pae

Transplantada o melhor jardim, voe ornar o timo-

no do Altissimo, e ali já não será a rosa,•que cahiu

ainda em botão, será a perpetua sempre viçosa e lou-

çã, n'essas regiões de bemaventurança eterna!

Era do Cêo que a chamou a si. antes de conhecer

os espinhos d'este vette de lagrimas:Feliz, mil vezes

feliz!

Teria de ser muito longo o nosso registo se elle

houvesse de referir-se a todos os fallecirnentos occor-

ridos n'este periodo em que as febres typhoides e' a

variola tem estado a victimar as povoac5cs.

Terminamos, pois, com uma prece por alma d'esses

todos que desapparecerain (Ventre nós.

A.

AO AÇORIANO

Ficámos surprehendidos lendo no Açoriano de 4 de

setembro uma local Acerca da phylloxera na ilha Ter-

Page 15: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

77 O ATHENE11 15

ceira, em que se diz que o pratico vindo de Lisboa é

de opinião que a natureza do terreno não é muito fa-

voravel ao desenvolvimento do insecto, havendo todas

as esperanças de o extinguir completamente. — Não

sabíamos d'isso e estamos cá ; e o que é mais celebre

é que o homem nunca disse semelhante cousa, pelo

contrario, acha o bichinho muito abundante, muito gordo

e anafado e tem bem fracas esperanças de o exterminar.

Mas é sobre tudo notavel, que o noticiarista saben-

do que reside oficialmente n'esta ilha o agronomo

chefe da 12.a região, a quem cabe a responsabilidade

das opiniões sobre assumptos de agricultura oficial,

nem sequer tratou de indagar e noticiar a opinião (Ves-

te, que em taes questões é unia authoridade. Foi uma

desconsideraçãosita immerecida, que não produz lá

muito bom elTeito no espirito de quem ler com atten-

ção a local.

A iIlustração e proficiencia em conhecimentos timo-

ricos e praticos do distincto agronomo chefe foram já,

e primeiro do que aqui, avaliadas pelos srs. fayalen-

ses. Não precisamos dizer mais.

Consta-nos que no Fayal foram descobertas pelo

digno agronomo subalterno algumas nodoas phylloxe-

ricas e que o sr.'agronomo chefe requisitou immme-

dia temente do governo os meios de extinguir °gudes.

focos, communicando tombem ao ex.' governador ci-

vil da Horta a parte oficial que a tal respeito teve do

seu subordinado.

muito judiciosa a consideração do noticiarista

acerca da propagação da phylloxera às vinhas da ilha

do Pico, julgamos porém que já não e tempo de pare-

cer, mas sim de pôr com todo o rigor em execução o

que dispõe a organisação dos serviços anti-phylloxeri-

cos approvada por decreto de 9 de dezembro ultimo

na parte que se refere á circulação de plantas.

Dando publicidade a estas linhas sobre assumpto

que directamente prende com os mais vitaes interes-

ses d'este archipelago, não ê intento nosso estabelecer

polemica ; se tivemos em vista restabelecer a verdade,

um pouco desfigurada pela alludida local.

J. P. R.

LOGOGRIPHO

Ao ex." sr. Henrique Carlos da Sibeira 31artins.

E' forte a embarcação-3-2-7-1

feita com esta madeira.-5-3-2-7-1-4

Em remate--é I-5-6-7--8

o sumo (ruma palmeira-4-3-2-1

Para decifração rapida,

um conceito vos é dado.

—Na antiguidade pagã

foi ministro respeitado.

C. Vieira.

Decifrações do numero anterior

Cabramo —Parcella.

EXPEDIENTE

Agradecendo a todos os nossos illustres collegas,

que se dignaram honrar-nos com a sua vizita fazendo

troca com o nosso jornal, bem assim ás casas editoras

que nos remmetteram fasciculos d'algumas obras, que

na secção competente noticiamos, e que recommenda-

mos, pedimos desculpa de as não especialisarmos n'es-

ta occasião, como era da nossa vontade e dever, mas

a falta d'espaço nos obriga a incorrer n'esta falta. No

proximo numero daremos noticia minuciosa a tal res-

peito.

PAULO DE KOCK

A empresa editora. das puhlienesses illustradas voe

reeditar todas as obras do distincto eseriptor franca

Paulo de Kock, principiando pelo romance Gustavo, o

estroina, primorosamente traduzido por Gervasio Lo-

bato e illustrada com 10 magnificas gravuras.

EUGENIO SUE

A mesma empreza vae lambem editar Os sete recea-

dos mortaes obra do eminente escriptor francez Euge-

nio Sue, traducção do nosso talentoso e illustrado es-

criptor.Manuel Pinheiro Chagas. Esta importante pu-

blicação ê dividida em sete romances illustrados com

185 primorosas gravuras.

Não sendo possível publicar n'este numero, o que

faremos no proximo, os respectivos annuncios, d'estas

excellentes obras, desde já as recommendamos aos

nossos leitores e os avisamos de que se recebem assi-

gnaturas na Papelaria e Livraria popular—rua Di-

reita 105-107,

O ATHENEU

Boletim mensal, litterario, artistico e noticioso do

Gabinete de Leitura Popular

PIZt ÇO DA ASSIGNAMUIZA

Por semestre, pafigo adiantado 300 reis

Avulso 80 tt

Pára da ilha acerem a porte do correio.

Aos assignantes do gabinete de leitura, distribuição

gratuita.

Annunciam-se todas as publicações lucrarias, me-

diante um exemplar.

Pede-se a todos os nossos collegas a quem enviamos

este jornal o especial obsequio da troca.

Assigna-se na Papelaria e Liwaria Popular.

Ar

10s5—BAJA. E.11=TA-14Y7

Page 16: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

16 O ATHENEU'

GABINETE DE LEITERIA POPULAR

PROPRIETARIO

ALFREDO LUIZ CARPOS

105—RUA DIREITA-107

Assignatnra mensal 300 réis

Não por assignatura, diario 20 »

'A todos os assignantes é olièrtado

mensalmente o numero do jornal litte-

rario o ATI-IlCNUU.

PUBLICAÇÕES

Assignain-se actualmente, na papelaria e livraria

popular de Alfredo Luiz Campos, rua Direita n." 105

e 407, as seguintes:

CAMPOS & Y - EDITORES

0.1311AS DE

Camilo Castello Branco Alsconde de Correia Botelho

ndição definitiva,

revista e corrigida pelo ~ator.

ILLII~ES DE

E. CONDE1XA, HEITOR & LALLEHANT

Serão publicadas em volumes sucessivos de proxi-

mamente 500 paginas.

O primeiro a publicar é o romance em um volume

O RETRATO DE RICARDINA

Com este volume, alem da gravura, uni retrato do

ander aos 55 anos.

A edição ó luxuosa; em bom papel assetinado, .ty-

pus elzevires, Unpressão cuidada e nítida.

A publicação far-se-ba em fascículos de 36 part°irás,

ou 2Fpaginas e uma gravura, pelo preço de 60 róis

semanaes.

DAVID BORRAM EDITOR

.A_S F'A_RP.A.S

O lPAIZ It A SOCIlMDATM

I'012/191:Gr1LTIZA

Reedição do antigo texto das Farpas e larga am-

pliação com mais do dobro dos artigos primitivos,

comprebendendo todos os principaes aspectos da so-

ciedade e da civilisação portugueza durante os annos

de 1870 a 1885 pelo sr. Ramalluo Ortigão.

A collaboração do sr. Eça de Queiroz na primeira

serie das Farpas fará o objecto d'um volume especial.

Cada fasciculo quinzenal de 40 paginas 100 reis.

OS ANTROS DE PARIS

A MAIS ItncioNirE PrzonucçÃo

DE

XAVIER DE MONTEPIN

Grande romance da actualidade, ifiustrado com 1'4

chromo-litbographias.-1.• parte, O .mercador de dia-

mantes.-2." parte, Uma [omitia parisiense.-3.° par-

te, O garotinho de Noniemarire.

Cada faselculo 120 réis.

LEN & -EDITORES

HISTORBA D'INGLATERRA

POR

G-T.TIZOT

Recolhida por sua filho Madame Witt. Traducção

de Maximiano Lemos Junior, iIlustrada com perto de

200 gravuras.

Cada faseiculo quinzenal 110 reis.

BARROS ft FILITAEDITORES

VIAGENS NO CHIADO

POR

BELDDIONIO (Barros Lobo)

Descripção pittoresca e faiscante da alta vida lisbo-

eta nas suas relaçóes externas ; scenas de costumes,

retratos litterarios de personagens em evidencia, etc.:

1 volume 700' reis ; pelo correio, 740; livraria de Bar-

ros & Filha, editores; rua do Almada, 104 a 114,

Porto.

Imprensa da Junta Geral 1

Page 17: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

Anuo 2 Migra do Heroismo, Ilha Tfilteiffi, Açores Oitiobro de 1888

I3oletiM mensal, litterario, artístico e noticioso, dedicado aos srs. assinmantes

do Gabinete de Leitura Popular o as casas editoras de Portugal

REDACFORES:— ALFREDO LIME CAMPOS, FELECIANO PINTO, FREDERICO LOPES, J. José &AGUIAR E José: M. LEITE PACHECO

CO LLABORADORES:,— ANTONIO °AMIMO MounKro, ANTONIO C. VIEIRA, lia. AncEu C. BRANCO. ACRE MOIGNINO. AuousTo

RIBEIRO, ALFREDO li:SLEUITA, FRANCISCO M. SU PRO, P. FRANCISCO DOS S. IzEIXOTO, FRANCISCO MONIZ BARRETO,

DR. JACINT110 C. DA SRAR, .100 II C. d'Amn OMITE, José A. DA S. SAMPAIO, loní O. DE LACERDA, JOSE M. M. I )'0,aveiRA,

JosÉ S. DE CASTRO DO CANTO, JULIO ANGELO BORGES CADRAL, DR. LOURENÇO DIA:DM:DO, LUIZ DA COSTA, MANUEL CAETANO, ETC.

EXPEDI ENTE

Glos srs. assignantes do « inheneu » pede-se descul-

pa da demora que houve na publicação &este nume-

ro, o nine r devido a vaias inconvenientesmotiva-

dos pela montagem da nova typographia que esta

empre7a adquiriu.

Como se Perd pelo presente numero, o material é

considonwelmente superior e a escolha do pessoal nos

dão seguras garantias de que &hoje em diante o

«ciltheneu » sairá regularmente no fim de cada meq.

redaccdo em em sen poder alguns manuscri-

pios de notarei valor; a que dal .á em breve publicidade,

devidos a pennas muito conhecidas nos c/Içares.

SUIUMA1U0

Trinns, pnr Joio II. C. d'Anicrante;-0 Momo, por Demo-

d'Ouro, por Gatune Mcnds, traduccão de

./o•(7-0/m7//0; Allaint de Cosnmies Portuguees;—.Augusto

beira, por 041fredo Aiesquita;—Mortosi—Conheeimeidos fieis;

--Puhl:caciiú

EZZLE E AMES

ia" Rflitto

E este o titulo dum bello volume de fio paginas,

nitidamente impresso, no qual a sr." D. Alice Mo •

demo condensou e nos permitte admirar as mais lie-

Gentes scintillações do seu talento genialmente p00-

tico.

Ainda não ha dois annos que a mesma auctora deu

â luz os seus primeiros versos em um livro de maior

volume, com o modesto titulo de Aspiracges, e no

qual já bem se reconhecia que tinha todo o direito

de vir a ser uma muito distincta poetiza.

E evidente que desde entgo a Sr.' D. Alice não

descorou a cultura do seu brilhante espirito e que

por effeito delia, mais fecundos se tornaram os pri-

• mores do seu estro, tão geralmente apreciados e que

já lhe dão honroso Jogar entre os verdadeiros cul-

tores da poesia portuguesa, independentemente do

que ainda se deve esperar do seu robusto talento,

sempre abrasado no fogo da poesia e sempre bafe-

jado pelas inspirações da sua musa propicia.

Tinha nascido para ser poetisa e não podia subtra-

ir-se a sua predestinação! Era ainda poncirmais de

uma creança, ainda residia n'esta cidade de Angra,

quando já me MOStim'a venos seus e pedia a tninha

pouco auctorisada opinião a respeito delles, ao

que certamente era levada por lhe terem dito que

nos meus bons tempos tombem velisejei. A minha

opinião era sempre favoravel Cs suas produccões,

porque ali se deixava vê]. a existencia dium genio

verdadeiramente pelico; mas, :pesar disso, eu

nunca a aconselhava a proseguir n'aquelk gene tu

de litteratura.

Antes pelo contrario lhe disse mais (nina vez:

Deixe-se, minha menina, cie fazer versos ré= pai?. e

'fuma quc nunca d to fortuna e a bem pou-

cos tem dado inato rtall dad e. Veja como o nosso Ca-

mões morreu pobre, quasi na miscria, isto pelo la-

do da fortuna; e quanto á immonalidade, embora

já a tivesse conseguido no seu poema, só ires seco-

los depois do seu fallecimento. é que Portugal, des-

pertando divina condemnavel somnolenci a consagrou

uma verdadeira apotheoSe á immort alidade da sua

memori a; e a este acontecimento, ainda que tardio,

fervetiosamente se associim a nififiio inteira e tudo

quanto era pOrtugnez. Antes disso até se ignorava

onde paravam n as cinzas do grande épico, que depois

se julgaram encontradas e sabe Deus se houve ii isso

verdade; mas tambem se foi mentira é diiquellas

que a ninguem prejudica e antes occulton o que se-

na um desdouro e quasi um opprobio para a indole

desta nação.

Mas Camões concebeu e realisou o vasto plano da

sua Epopga, onde em versos altisonantes de uma

eloquencia peregrina fez vibrar a protentosa fibra do

patriotismo nacional, relatando os IR:M ICOS feitos,

lusitanos nas suas navegações e conquistas, ainda

que exagerando o heroismo d'estas.

Quanto Csnavegações, houve com cffeito um grande

arrojo da nossa parte em desprezar os visionados pre-

conceito d'esse tempo em que se suppunha serem

os desertos do oceano habitados por monstros furi-

bundos e indomaveis, embora a estreiteza do territorio

que possuimos no continente europeu nos fizesse,

por assim dizer, transbordar para o litoral da Africa,

e nos levasse assim a contornar a sua costa até

parte oriental, onde defrontamos com o caminho

em que mais tarde deveriamos proseguir até ao ex-

tremo oriente da Asia.

Page 18: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

9

34 O ATHENEU

Quanto porem ás conquistas, não fôram dias tão

heroicas como o grande poeta pomposamente as des-

creve; pois não fizémos mais do que invadir territo-

rios habitados por povos quasi inermes, muito menos

conhecedores dos mortiferos instrumentos de que

dispunhamos, para assim os subjugarmos e espoliar-

mos, tyrannisarmos e até escravisarmos,para depois i mercadejar com elles, como se fossem rracionaes.

Segundo alguns críticos, essas conquistas tão de-

cantadas tomaram depois o triste caracter de verda-

deiras piratarias; e nem sequer as soubémos digna e

proficuamente conservar, porque fômos para com

cilas monstruosamente interesseiros, muito menos

caridosos do que deveríamos ter sido; e nisso nos

excedemos até ao 'ponto que muitos desses povos, que

tínhamos por baráaros nos julgaram humanitaria-

mente ainda abaixo d'eLs! Finalmente a ambição de

conquistas e o sordido interesse que d'ellas resultava

contribuiram muito para perverter os costumes da

nação conquistadora, tornando-a pobre d'espirito e

ainda mais de sentimentos nobres, sobresaindo uni-

camente o espirito guerreiro e sanguinario, que eram

as grandes qualidades d'aquelle tempo, como de tu-

do isto nos dão provas vanos escriptores e chronis-

tas, que foram quasi contemporaneos d'aquellas

épôcas.

E por isso que sempre nos pareceu que os ver-

sos mais sublimes, mais propheticameme inspirados

e por conseguinte os mais verdadeiros do nosso epico,

são aquelles que na sua bella ficção faz bradar pela

voz do velho na praia do Restello, quando via partir

a expedicão de Vasco da Gama.

Mas dilatar os seus dominios tem sempre sido o

desejo dos soberanos; -e no tempo em que o rei era

a nação, a vontade d'aquelle era tambem o movei

de toda a acção dum povo inteiro, tal era ainda o

estado do mundo n'aquelle tempo e do qual ainda

se reseme a actualidade!

Onde vim eu parar, quando só intentei dizer al-

guma cousa acerca da ultima publicação da Sr.a D.

Alice?! Mas o que tive de accrescentar nesta digres-

são tem tanta analogia com o que disse algumas

vezes á joven poetiza, que chame desculpará este ad-

ditamento, que tombem serve para demonstrar ,que

ha tendencias indebellaveis, quando são irresistiveis

nas pessoas em quem as queremos combater, e por

isso a sr.a D. Alice não deixou de ouvir as inspira-

ções da sua musa, não obstante eu lhe ter aconse-

lhado que d'ella se divorciasse.

Fez muito bem não attendendo aos nossos con-

selhos de pessimista, pois se os tivesse seguido era

uma perda pa'ra a litteratura lyrica em Portugal e

tinha-nos privado de nos deliciarmos com a leitura

das beijas producções do seu luminoso talento, tão

flexivel e tão ductil, que se presta a muitos generos

de poesia, como os seus Trülas mais uma vez vieram

afirmar.

Ha ali, como não podia deixar de haver, versos

cujo assumpto principal é o puro amor, e d'esses

logo se nos deparam muito beijos no seu Preludio.

Tombem os ha d'uma fecunda phantasia como são

os das Insoinnias e dos Enlevos. Satyricos como os que

vem sob o titulo Lyrio no pantano. Ha lindissimos

sonetos em vamos generos, e, entre cites sobresae o

que tem por titulo clbnegago, no qual referindo-se

a poetiza á triste sorte que teria se visse o ente seu

querido e muito amado derramar uma lagrima ver-

tida pela dôr, termina esse soneto com este lindis-

simo verso, scintillante como um embotido de crys-

tal: Como é grande o poder d'uma gottinha d'agua!

pois ha n'estas palavras tão simplices e usuaes o

summario`d'um grande conceito poetico.

Ha versos tristes, dolentes e quasi gemebundos co-

mo as vibrações melancholicas d'uma harpa dedilha-

da por um cego de nascença e ha outros alegres, riso-

nhos, estridentes como symphonias d'Offenbach exe-

cutadas por uma orchestra festival.

Finalmente, até ha versos philosophicos, e que ver-

dadeiramente o são. como os que dedica ao Dr. José

Pereira Botelho, por onde se vê que a mimosa poe-

tiza já se libertou do véo d'um certo mysticismo con-

vencional, que muitas vezes subjuga o espirito e faz

obscurecer os lampejos mais lucidos da livre inspira-

ção.

Ha n'esses versos acima mencionados o que em

oratoria se chama uma enumeração tão logica e bem

desenvolvida, onde a poetiza faz pôr em maior relevo

a sua idéaprincipal, que bem se pode dizer que ha n'a-

quelle trecho um verdadeiro primor d'eloquencia, e

tão mascula que não parece ser d'uma Sr.a em tão

juvenil eclode!

Nos versos ao Dr. Botelho fala-se tanto de Victor

Hugo, que parece ter a distincta poetiza reconhecido

os muitos pontos de contacto que se dão entre os dois

homens; pois se ha um açoriano, que, guardadas cer-

tas proporções, mais se possa comparar ao grande

poeta francez, o Dr. Botelho certamente é esse ho-

mem, pela hombridade do seu caracter, pela firme-

za dos seus principios, pela lucidez do seu previle-

giado intellecto, pela sua variada erudição, pelo seu

altruismo tantas vezes comprovado na sua impolluta

reputação de medico e de prestante cidadão.

Não podia por conseguinte ser mais apropriado o

paralello que houve na intenção bem manifesta da

joven poetiza; pois ainda que o dr. Botelho pouco

se tenha abalisado em producções poeticas, tem mui-

tas que nunca foram publicadas, por onde se pode-

rá ver que poucos serão mais poetas no verdadeiro

estro e que ainda menos o sejam tanto no coração.

O que é indubitavel é que os Trigos no seu todo

são por tal forma bellos, que não deixam margem

para menções especiaes relativamente á sua qualida-

de; e só nos limitámos a fazer algumas com relação

aos diversos generos, que são multo variados.

Parabens á já distincta poetiza que em tão breve

tempo tantos louros tem colhido, até que d'elles

lhe entreteçam uma verdadeira coroa, o que é facil

de prever n'um futuro que pouco se fará esperar, e

que o Sr.a D. Alice ha de necessariamente possuir,

se o verdadeiro merito fõr devidamente premiado;

ainda que nem sempre assim tem acontecido, mas

acreditamos que o sympathico estro da mimoza

poetiza vencerá todas as resistencias que se possa

fazer á justiça que lhe é devida, e de que ainda

mais virá a ser credora.

Esperando que o nosso vaticinio se ha de reali-

sar, desde já damos á Sr.a D. Alice os nossos mui-

to cordeaes e sinceros parabens pelo excellente cxito

Page 19: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

¡ O A'I'J!L\EU

da sua ultima publicação, prestando-lhe tambcm tun

.voto da nossa perpetua gratidão pelo exemplar com

que teve a generosa delicadeza de nos mimosear, e

onde tarnbent se lê sob o titulo Esquisse seis bellas

estrophes em vinte e quatro alexandrinos dum francez

muito correcto, vendo-sé assim o perfeito conhecimen-

to que a Sr.a D. Alice possue da lingua de Voltaire.

Angra do Heroismo—Agosto de £88.

João Herméto Coelho d'Amarante,

0' (0..1kél,0

Quin.tenal litterario e noticioso—Director, Ma-

noel Soares Pereira—Ilha de S. Miguel.

Veio-me parar á mão o n.° deste novo jornal.

Um pequenino quinzenal litterario, de 8 paginas,

impressas em bom papel e ... tvpo novo. Um quin-

zenal que alem de ser litterario ã¡ainda ... noticioso !

Imagina-se que quantidade de litteratura e que abun-

dancia de noticias este ef/tomo pode, cada quinzena,

offerecer aos seus amaveis leitores...

Em tempo o sr. Mariano Pina, director da Ilus-

tração, chronista da ///usiMçiiio, collaborador da

Ilustração; o iIlustre sr. Mariano Pina que occu-

pa tres lugares tão distinctos n'uma só Ilustração

verdadeira, consagrou uma das suas chronicas á mo-

derna litteratura, ou antes, aos litteratos modernos

—,os que comecam. Nessa chronica lamentava-se el-

le da aluvião de artigos em prosa e verso, de con-

tos, de criticas, de philosophias, de poesias, etc.,

que eram enviadas a elM, sr. Pina, para serem pu-

blicadas na Ilustração. Lamentava-se, e criticava

os auctores para elle desconhecidos, com uma cri-

tica austera, sem se lembrar do tempo mediocre

das suas mediocridades litterarias, quando escrevia

para o Piano da Manhã', uns semsaborães folhe-

tins.

O sr. Pina fallava aos litteratos modernos, que

tinham tido a petulancia de lhe enviar as suas pro-

duções, com os ares auctoritarios d'um mestre-es-

cola reprehendendo meninos. Ora eu não quero, n'es-

tas modestas linhas, tornar os ares do sr. Pina :

tomarei simplesmente os acanhados e submissos ares

dum dos meninos reprehendidos, visto pertencer

tambem a classe dos que começam. Por'ora não fal-

lo as turbas do alto d'uma chronica escripta em Pa-

ris —Paris, a capital do mundo 1—, como dizia o

Alexandre Freire duma comedia em que nos mos-

trava o dobro das suas pernas e a metade do seu

talento,—fallo do fundo d'uma columna d'um jornal

litterario, de que sou obscuro collaborador...

Aquelles, que não encontram nas columnas da

Ilustração publicidade para os seus artigos, para

as suas criticas, para as suas prosas e para as suas

poesias, veem cá para fóra espirrando odio, en-

tram numa iypographia, entregam ao compositor

os originaes das suas originalidades, e dão as me-

didas para uni jornal litterario, um quinzenal noti-

cioso... Chegada a occasiao da paginação vê-se que

a composição não chega para encher o numero de-

terminado de paginas, e então, corno não ha mais

original, vae-se a um almanach e tira-se urna ane•

docta; abre-se um livro de versos e transcreve-se

um soneto; busca-se um volume de prosa e extra-

he-se um capitulo qualquer! Grande sciencia a de

fazer jornaes l•engracada mania esta de fazer litte-

ratura já feita!

Este A101120 ê um d'esses ¡omites. E é pois muito

provavel que este sr. Pereira, seu director, seja tant-

bem uns dos lues que começam. e que para praticar

vão mandando versos ao sr. Mariano Pina....

O numero que. aqui tenho, vem adoravel de lit-

teratura e...de noticias! Vejamos o que contens...

Chroniea, por Lao-Pan. Curvemo-nos perante o

genio! Apresentemos pennas! Como em todas as elmo-

nicas d'agora o auctor dirige-se a uma leitora amiga,

uma leitora d'olhos de deidade, de rosto feito de pe-

talas de rosa (!) possuidora d'uma macia e alva mão-

sinha, feita de nacar e cssencia de rosa ( ai!

que bom 1 ), mãosinha que, segundo o que elle ima-

gina e nos diz, ella estenderá para receber da mão

do Couto, o carteiro, (quem será este maganão d'es-

te Couto, que só entrega a correspondencta em mão

propria ? ) o Atomo, ex."'" senhoral...

Eu em tempo já tinha lido esta chronica—ou pelo

menos, se a memoria me não falha, vi urna chronica

identica no 'Domingo, de Feliciano Pinto. O ambi-

ent e tepido do teu gabinete (da leitora), de que Lão-Pan

nos falia, parece-me ser aquellc mesmo ambiente

tepido de que nos fallou Feliciano. E se eu me tiver

enganado, queira desculpar, cx.'"" senhor

A' chronica segue-se um soneto de Coelho de Car-

valho, —A Velhinha. Urna franzina creatura cansa-

da e tremula, que depois de ter sido uni temo ideal de

formosura, fia agora á porta. Em tempos mais feli-

zes, alguns moços esbeltos apertaram-a ao peito, e

beijaram-lhe com ternura a ... tranca perfumada 1

Veja o sr. Carvalho que cuidadosa revisão lhe fize-

ram ao seu soneto. Agora não lhe hão-de faltar car-

tas anonymas e bilhetes posities indagando que tranca

perfumada era aquella que a sua velhinha dava a

beijar.

Um outro soneto, posthumo, de Eduardo Coim-

bra, o ;oveis e talentoso poeta que tão poucos versos

nos deu A ler.

Secção de Sciencias e teltras. Faz um elogio á

BIbliotheca do Povo e das Escolas, tratando de glo-

riosos, os nomes de David Corazzi e dr. Xavier da

Cunha. Falta d'original e vontade de apanhar alguns

volumesinhos de graça.

No ̀ Desterro, outro soneto d'um tal sf. Luiz Cal-

lado, que talvez fizesse melhor em não fallar.

Contos immoraes. Secção de contos sem moral, mas

tambem sem immoralidade alguma. Antes assim.

O d'este numero, intitula-se cA Louca, e da-nos a

triste historia d'uma rapariguinha que depois de se

divertir nove mexes a fio, Nosso Senhor deparou-lhe

um bebe, para citar, mas dla, acha aquillo desnec-

cessario, e atfoga-se duma poça, etc. Este continuo

é assignado por um ‘Deogenes que, infelizmente, á

bem pouco philosopho.-..

Depois, seguem-se duas perolas transcripms.

79

Page 20: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

36 O ATHENEU

Um soneto de Joaquim Lima— Conchita,— e um

fragmento de João de Deus. O Momo devia limitar-

se a estas tres columnas.

Isto parece incrivel mas é um facto. Ainda mais

um soneto, do sr. S. Pereira, que não é outro senão o

sr. Soares, director, em que manda cantar tudo,

n'uma alegria sem limites, simplesmente porque uma

Leonor sua conhecida, completa quinze annos. Pa-

rabens.

Risos—secção d'anedoctas para fazer rir Calinos.

Noticias. Se o tempo permittisse devia fazer-se uma

procissão, acompanhada pela banda da localidade—

Emulatão Popular.

Etc.

Muito interessante este Atomo. .

Demo-Nico.

CONTOS

O ATXXXZTZ » ,OUR

DE CATULLE natbnots

Não pode restar duvida alguma de que esta his-

toria nada tem de imaginario, e effectivamente

succedeu ha duas semanas; foi precisamente da

narração d'esta aventura que tanto se .riu

Opera, quarta-feira ultima, nos dois camarotes

onde dia SerVill de therna.

No entanto, por receio do eseatidalo e do pro-

cesso de separação que poderia bem ter togar, os

indiscretos procuram desvanecer os effeitos das

suas primeiras tagarelices.

Os amigos do conde encolhem os hombros di-

zendo :—“Pôde lá acredittar-se unia tal extrava-

g,ancia? Estivemos cm casa do general, n'essa j imi-

te, e nada vimos.»

As amigas da condessa, escondendo sob o leque

a mentirinha cõr de rosa, corri gestos d'espanto:

—«Quem terá imaginado uma tal enormidadeP

Um alfinete d'ouro é quasi um estylete. Embora

brazileira, a condessa é uma verdadeira parisien-

se, e absolutamente incapaz d'um melodrama.»

Melodramatica ou não, a historia é verdadeira!

E sendo, digain, copio se explicará o facto—hicon-

testavel, penso—de, no dia seguinte, no ultimo

baile da embaixada ingleza, madame de Moncalvo,

que deve certamente gostar de mostrar a sua bel-

la carne de 'namore vivo, levar, contra a lettra

expressa da etiqueta, um vestido de faille espêsso

ligeiramente decotado? Mas é tempo de cómar a

aventura, segundo confidencias que nunca me hão

mentido.

Dansava-se com enthusiasmo no hotel Meille-

raye, ha quinze dias, cérea da meia noute.

-Um baile de despedida: o general ia partir para

a Touraine; mas um adeus que dansa e ri:

Mad. de Portalégre, mad. de Soinoff, mad. .de

Cervenolles, as mais formosas, 15 estavam ao des-

pedir da estaçrto: o inverno e a primavera: ainda

toilletes de seda, mas já flores naturaes: uma sem-

cerimonia de parque ou castello, affugentando a

etiqueta de salão: o prologo d'um idyllio no quin-

to adto d'uma comedia.

Mas a mais adoravel. era a condessa de Marci-

acl Ignora-se o que faz esta feia para ser tão bo-

nita. Quasi trigueira—nasceu no Rio de Janeiro—

e pequena, magra, chata, com' angulos bruscos,

bocca grande, olhos pequeninos, cabellos muito

pretos, curtos, frisados, em tuffos, parecendo sein

pre em desalinho, ella chega força d'imprevist

no gesto, e graça desastrada na anil ode, de riso nos

1:Mios e modo endiabrado no todo, a ser realmente

seductora, estonteadora! Se se adorai') os deuses

no paiz dos macacos, á evidentemente sola a forma

(Puni rapaz semelhante a dia que se deve repre-

sentar o Amor!

Depois, a proposito de tudo, uma extravaga»-

eia louca, pueril, cheia de palavrah incompreen-

siveis e plirases rido exploradas, gracejadora, pal-

radora, mordaz tambern—o g,orgeio (Fuma M-

inn-gra, a eloquencia (rum papagaio que improvi-

sasse. Que diz ella ? Sabe - o alguem? Sabe - o

ella propria? A sua voz não é falia, é um ruido

vivo, pequeno, °rindo, que corre, vae, vem, saltita

e estala, e nos sóbe até ao ouvido como peque-

nos pés de passams ao longo de um ramo.

Apesar d'isso—pOr causa d'isso—é ,idoravel,

aflianço! Tem um deleit o apenas—ama o marido,

abertamente, com a candura simploria (1 unia bur-

guezin ha recen t eme til e casada. Porque O esposou

ella millionaria, elle irruinado? Porque o achou

encantador, e é artista, ainda que da alta socie-

dade. Alto, gordo, branco, girado—com a sande

d'inn bello alleinão — abrindo os seus grandes

olhos azoes, acariciando fleugmaticamente a bar-

ba loura e comprida, quando o vê, extasia-se evi-

dentemente, sente desejos de lhe saltar ao pescoço

diante de toda a gente, beijar-lhe os olhos, punhal.-

lhe os cabellos da barba: e mais d'um a tem visto

chorar de felicidade quando o conde de Marciac

tentado ao piano, canta com a sua voz de ha rytono

tdo syntpathica, as suas novas composições melo-

diosas, de que as mais engenhosas lembram Ia dona

é mobile quando se nao parecem com uma quadrilha

de lanceiros. Será tola a condessa? Não importa,

porque é excentrica. E nunca o tinha sido mais do

que Mesta nome, rindo, gracejando, gritando, com

os olhos mais vivos, a boeca mais aberta, e o ca-

Page 21: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

O • ATHENEU 37

bello mais desgrenhado—um pouco excitada talvez

pelo champagne—andando de grupo em grupo,

com repentes de criança que salta n' um pé só e a

sua extravagancia exotica, a que nada é defezo.

Silenciosa! repentinamente. Crispando os labi-

os, olhava com olhar irado—com ar de cão enrai-

vecido que vae morder—mad. de Moncalvo semi)

os raios luminosos do lustro, gorda e muito bran-

ca em plena luz!

Era uma estrangeira, uma italiana, que appare-

cia pela primeira vez: mas a generala, que lhe tes-

timunhava particular estima, tinha dado algumas

informações ás suas intimas: mnad. de Moncalvo

chegara de Florença, na vespera: viuva, de boa

familia;.e rica, podia ser recebida, sem contestação.

Ikea notavelmente bella, d' urna belleza possan-

te e- soberba; a neve quente do rosto—onde os

olhos tem por vezes um ar sinistrobrilhava sob

os cabellos sombrios, abundantes e grossos; e junto

do corpete de setim preto, muito decotado, se de-

senvolvia opulentamente, semelhantes ao busto

d'umna estatua, o esplendor do largo peito, gros-

sas espaduas e bellos braços bem carnudos.

Um pouco negrinha, muito delgada, a condessa

de Marcia° estaria despeitada com aquellas opu-

lentas brancuras? Não.

Se as via com olhar duro e lixo, onde havia

odio—efla, ha pouco tão risonha—é porque sur-

prelmendera um olhar do marido obstinadamente,

apaixonadamente fixo, do extremo menos claro

da salla sobre aquelle opulento cofio, sobre aguei les

formosos braços tão gordinhos! E aquelle olhar

cada vez mais ardente—que ella nunca tinha

visto nos olhos de 31. de Marciac!—se encarni-

çava ainda, e 'sempre,' na carne triumphante da

italiana!

Então a condessa sentiu-se preza d'uma forja in-

tensa e corno doida, a pequena selvagem tirou rapi-

damente do cabello—Com o movimento brusco d'

UM macaco que coça a cabeça—um grande alfi

mete (Fomo, com uma borboleta de saphyras d'

azas abertas e encaminhou-se para mad. de Mon-

calvo, admiravel seda o feixe de luz, e d' um gesto,

enterrou-lhe o pequeno estylete na polpa carnuda

e branca do braço esquerdo! A borbuleta,az.n1 os-

cillou sobre a carne tremula e viva.

De todos os pontos da sala partiram gritos, pre-

cipitaram-se sobre as duas mulheres, num grande

borburinho de sêdas. A condessa debatia-se no ta-

pete cora uma crise nervosa. Mas mad. de Moncalvo

estava de pé, grave, impassivel, apenas os olhos

inflamados. Tinha arranCado o alfinete e, a cabeça

inclinada, via tranquillamente sair da pelle uma

gotta de sangue, como um rubi chorado pela neve.

I I

No dia seguinte, no batido& onde a condessa

de Marciac estava deitada, chorosa e maguada,

sobre uma chaise-iongue, chegaram ao mesmo tem-

po mad. de Portalég,re, Soinoff, a generala e outras.

Adivinha-se facilmente o que diziam. Era ella

effectivamente excentrica? Uma brazileira bar-

bara como os 3Iundurucos e os botocudos? Porque

emtim o que ella fez é abominavel. E porquê?..

Porque o marido se interessava pelos braços de

uma mulher bonita—a condessa tinha-o confessa-

do na vespera, soluçando—porque tinha visto com

prazer um peito formozo? Ah! se se devesse re-

correr aos alfinetes todas as vezes que um lw-

mem cazado, no baile ou no theatro, nos admira

a pelle!

Este ciume era tanto mais absurdo porquanto M.

de Marciac via pela primeira vez mad. de Moncalvo,

pois que chegara de Florença onde elle nunca tinha

ido, e estava em Paris havia apenas vinte e quatro

horas.

—Doida varrida, minha querida! Agora era Mn:

dispensavel que reconhecesse o seu erro, que se

humil [lasse, que pedisse perd ao á sua victima... [II-

d ispensavel e prudente .. os italianos, ningmwm

o ignora, são vingativos. Não era de crê,: que mad.de

Moncalvo ferida, ficando talvez com um signal no '

braço, para sempre—é triste para se decotar!—

não procuraria vingar-se?

—Não era de bom agouro a calma que mostrara.

As colem-as frias são as peores; e quanto dura: a

o desmaio da condessa, a estrangeira tinha billado

em. voz baixa a M. de Marejai:: nau, ralment e

ameaçou-o!

—Creio que é d'origem corsa, insimm ou a gene-

rala. Tudo era para receiar, mesmo urna punha-

lada. Tornava-se indispensavel ir immediatamen-

te a casa de mad. de Moncalvo.

—Vamos! vamos! depressa, vista:se ; emq imanto

se demorar com» ella, nós esperaremos na canoa-

gemo á porta .

Atormentaram tanto a pobre condessinha, des-

fallecida, um pouco penalisada por ter sido Chnti-

nosa que se resignou a obedecee-lhes. Quereria

antes ver seu marido, primeiramente: devia estar

zangado; durante a noute não tinha ido vil-a e

esta manhã não apparecera ainda.

-Não, não, vel-o-ha á volta, quando estiver

tudo arranjado. E elas a vestimm, a levaram,

resistindo ainda, porque lhe custava esta visita.

E' humilhante, quando se é magra, ir pedir perdão

a uma mulher que possue tão bellas espaduas.

80

Page 22: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

:38 O ATIIE.NEu

III

Mad. de Moncalvo foi correcta. Apenas soube

que a condessa entrava, saltou do leito, vestiu o imu-

pão, mil int, na sala, correu sollicita para a visita

toda córada, e tomou-lhe as mãos corno a unia

amiga.

—Mo (liga tuna palavra! Mio se desculpe! ex-

clamou, graciosa; com uni beijo sorriso nos lalilos.

Nada quero, nada!

Tanta indulgencia duplicou a confusão da con-

dessinha .

—Oh! fui bem culpada! Deixe que me desculpe.

—Não, não fidlernos mais n' isso. Mo valeu nada.

Esta nome mesmo se curou e desapparceeu.

A condessa nao compreendia.

—É verdade minha querida, continuou a

italiana cada vez mais risonha. Não advinha quem

foi o operador? Oh! posso bem dizei-o! foi o seu

marido, minha boa condessa.

—Meu marido?...

—Sim, louca, teu marido! gritou Mal de Mon-

calvo, que já tinha deixado de sorrir..

Arregaçou a manga de renda ;Ltd ao grosso cio

braço, e a condessa de Marciac, assombrada,

no kgar onde deveria existir o signa! ou a ferida

do alfinete, viu o traço curvo, ainda recente, hgci-

Ia rosco e azulado, (rum beijo longo, de' no-

judo

prra,fir,:550).

Fru Ditritilo.

.LiStrWr,

3)ZI: CS -TUIVIZS r-VRTiiertrZZXS

O sr. l)avid Corazzi acaba de distribuir os primeiros fasciculos

<Fuma nova e attrahente publicacâo que brevemente será apre-

sentada ao publico. intitula &libam de costumes portmmeaes

e a sua collaboração está entregue a artistas e escriptmes de

reconhecido merito e de incontestavel talento, como Alfredo

Roque Gameiro, Columbano Bordallo Pinheiro, Condeixa,

Mulluía, Manoel de Macédo, Raphael Bordallo Pinheiro, cujos

lapis já bastante laureados, foram escolhidos para o desenho

dos explendidos chromos que iIlustram o novo Album, e Fi-

alho d Almeida, Julio Cesar achado. Pinheiro Chagas Rama-

lho Ortigão e Xavier da Cunha, os finos planejadores das finas

pennas, que expalharào uns brilhantes rales de alegre verve

pelos artigos descriptivos dos nossos mais sympathicos e

conhecidos costumes.

Temos aqui sobre a meza, ao lado do tinteiro, entre duas

rosas polidas murchando n'urna floreira de louça e os galhos

irregulares d'um veado de bronze, onde descançam do traba-

lho algumas canetas de paia, um Album vaecimen da nova obra

que o sr. Corazzi já começou a editar. Neste album,ha já al-

guns chromos e alguns artigos

A primeira pagina, d'unla artistica disposição typographica,

entre uma vinheta colorida que a rodeia, traz a historia do

antigo tropeiro de Lisboa esse tvpo que, embora não perten-

cendo já á actualidade, sUbstitoido boje pelo reporter do jor-

na), como nol' o diz Ramalho Ortigão, que é quem firma es-

te explendido artigo, por esse reporter que vau agora pela via

du alcofa no broco e gancho em punho, remexendo o lixo da

cidade, para negociar a apanha a tanto por linha ou a tanto

por IlitZ , recorda alinda a todo o fiel hsbonens,, que. ao abrir

pela manhã a,janella do seu quarto, dava com elo â esquina,

procurando n algurn monturo, entre cães uivando, trapos sujos

e papeis velhos. Segue-se em segunda pagina o chrorno respe-

ctivo, de Manoel de Macêdo, que é um primor de cores e

um grande trabalho de talento.

Depois, deparamos com uma creancinha singela e friorenta,

vestida mal e olhando azuladamente para alguem que passa,

atravez da neve que cae e do frio que faz, vendendo palitos e

apregoando rocas. Columbano desenhou, Julio Gesar Machado

descreve. E tanto o artigo como o desenho, estam feitos de tal

maneira, que a gente fica a olhar para um e a ler o outro duas,

ires vezes, Intimamente satisfeitos de ver n'aquelle pequeinto

louro, tanto espirito e tanta arte portugueza

Mais adiante, a penna de Fialho d'Almeda enche n'uns pe-

ríodos campactos, d'alto a baixo, uma outra pagina, pondo

os leitores do Milbum dos costumes portuguefes ao facto do

que é o capur, traje do Faval, e do papel importante que elle

desempenha na burgueza vida das fayalenses. E agora que

chegamos á ultima linha creste artigo, está-nos a lembrar urna

coisa: corno ficarieis vós alegre, querida leitora, se alguma

pagina do novo Álbum e algum dos seus vivos chromos. fossem

destinados a reproduzir aos olhos curiosos de mil leitores, o

vosso manto de merino preto, esse exquisito traje em que ides

embuçada ouvir beatamente os sermões da Quaresma, escon-

dendo sob o grande papelão que vos envolve a loura cabeça,

os ‘ossos cabellos douro e os vossos labios de ginja!

MOMO: WIDOZ

4,Va:usyó ZJBZXRO

Bordallo Pinheiro um dia, vendo atravessar o

Chiado sobre as suas pernas collossaes o illustre

jornalista acoriano, trepou-se a um gancho de ferro

que ainda hoje suspende á porta d'unta uvaria ele-

gante uma grande luva de zinco encarnado, e d'

ahi, assestando-lhe o monoculo, tnonoculisou-o fixa-

mente, d'alto a baixo. Na quinta-feira adiante' o

ednlonio afaria offerecia em folhetim aos seus lei-

tores, a mais perfeita caricatura do si'. Augusto Ri-

beiro, começando no rodapé da primeira pagina,

pelos pés e por urna pequenina parte das gambias,

pela canella apenas, e seguindo assim até a ultima,

onde, já extenuado, inteiramente despojado de for-

ças, Bordallo Pinheiro, agarrado ao seu explendido

crayon lhe collocava 'finalmente a cabeça, com

aquelle esguio chapeu alto branco, de fita preta, e

um resto do pescoço, cujo osso saliente tomava só

a penultinta pagina.

Lisboa, que até então se punha baixinho, de co-

coras, quando pretendia ver de perto o microscopi-

co General Macedo, depois de alguma desordem

em que a guarda municipal tivesse entrado, para

manter á torça de catana o rigorismo das leis, co-

meçou a erguer o pescoço, a estender o bico, a

equilibrar-se nas pontinhas dos pés, para examinar

vontade, o novo redactor do Comi:creio de Por-

tugal. Data d'ahi o começo da sua gloria. O si'.

Augusto Ribeiro, que, como redactor da Ideia No-

va, soubera attrallir a attenção do archipelago, at-

trahia agora a atteneão da capital. Tornou-se mai-

or, elle, que já tão grande era. O alcance dos se-

us artigos, e as rajadas eloquentes da sua penna,

fizeram-o um grande homem depois d'elle ser um

homem comprido.

Hoje, em Lisboa, quando alguem se quer referir

a uma cousa de excessiva extensão, ¡á não a com-

para com a legua da Povoa; ou a COMrara ao com-

Page 23: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

kjti`9.741"

O'ATHENEU 39

primemo da eloquencia do sensato orador, ou ao

tanianho das ceroulas do illustre jornalista. O, Es-

trangeiro, tem sabido fazer-lhe justiça, offerecendo-

lhe algumas commendas. Isto entre nós, de com-

mendas, não quer dizer cousa alguma. Portugal dá-

as a toda a gente, mas o Estrageiro não as dá a to-

dos. Se, porem, essas offertas ao distincto escriptor

açoriano, continuarem a ser feitas com a rapidez

com que até aqui o tem sido, poder-se-ha em pou-

co tempo dizer d'elle, o que o antigo crIllnon das

glorias disse do já fallecido Duque d'Avila:— E'

um calrario de condecorações.

(Dos edçorionos d'agora) -

eillfredo Wesquita

MOMOS

maxxx. nann1r;co

O homem que teve nas lettras açorianas o no-

me illustre de Antonio Moniz Barreto Corte-Re-

ai, pertence á posteridade desde as 7 horas da ma-

nhã do dia 23 de setembro de 1888.

Os Açores perderam no Dr. Moniz Barreto um

dos vultos mais importantes e mais dignos de

respeito que teem n'estes uhimos tempos, da-

do maior desenvolvimento ás !curas patrias.

9 • O nome glorioso creste morto, acha-se collo-

' cádo, pelo seu grandioso e bem reconhecido me-

recimento, entre os nomes d'aquelles que, tio

nosso archipelago, mais teem pugnado pela ins-

• trucção popular.

Escriptor muito habil, deixou-nos nos seus li-

vros e em todos os seus escriptos, innutneras pro-

vas do seu possante talento.

As Bellezas de Coimbra são as melhores pagi-

nas da sua vida; 'são as recordações gratas dos

seus tempos de estudante, passados nesse es-

plendido pedaço de terra, por onde corre o Mon-

dego.Quem os lê julgaprofundar a alma do gran-

de escriptor e comprehender os seus sentimen-

tos mais intimos. Tal a maneira porque o Dr.

Moniz Barreto sabia manejar a sua valiosa penna,

reproduzindo no papel sensações que nos seusi-

blisam molhem.

, —

,o,,x,rnruco x,,o7:»z's

Acompanhámos até ao cerniterio, o cadaver

d'este infeliz amigõ, irmão do nosso collega des-

ta redacção, Frederico Lopes.

Alfredo Lopes deixou de existir, precisamente

na occasião em que se preparava para a vida-c-mo,r-

reu aos dezoito annos. E desta idade (pie inais

illusões nos atravessam o espirito, que as mais

extraordinarias ideias nos circulam na imagina-

ção ; e tudo isto se passavc ~bem no seu bem

organisado cerebro de rapaz—as alusões d'um

futuro bom, que havia de ser o premio das suas

boas ideias de trabalho.

A morte roubou-lhe tudo.

rritmxna ç.,o,xnwrsto) r

Xilçlr"%,;(05

As doenças' que corroiam a ambos, declara-

ram-se-lhes quasi ao mesmo tempo e mataram-os

no IIICS1110 dia.

O numeroso acompanhamento dos dois enter-

ros, demonstrou perfeitamente que eram bastan-

tes os seus amigos, e grandes as sympathias de

que os dois finados gosavain desta cidade.

Ás familias dos quatro mortos, cuja falta aca-

bamos de registrar, envimnos os nossos sentidos

pezames.

CONELCUIIEG: UM:

UNIA EXPERIENCIA D'OSNIOSE

Tomam-se dois ovos proximamente do mesmo tamanho :

mergulha:se um em acido chlorhvdrico diluido, até á dissolu-

ção do carbonato de cal da casca"; em seguida metteudo-o em

agua pura vê-se o ovo augmemar de volume, quasi o duplo,

no espaço de vime e quatro horas. O segundo ovo serve para.

constatar a'differenea de volume.

AMMONIAGO NOS ALCOOLS

Resulta das analyses de M. Lindes que os alcools do com-

morei° encerram constantemente bases ammoniacaes. O

cognac de boa qualidade dá 1, 29 gram por litro. Na aguar-

dente de cidra a proporção é de 1,35; no 1-hum de 3,07.

NOVA DOENÇA

O dr. lobert está estudando uma nova doença dos porcos,

proveniente da alimentação d'estes animaes dos residuos da

distillação do milho,

MEIO DE GARANTIR DA FERRUGEM

O FERRO E O AÇO

Banha • 250 gram.

Camphora em pó s

Funda-se a b-m. Apenas terminada a snlucflo, retire o

vaso do banho junte plombagina em quantidade suficiente

para dar á ban1;? a côr do ferro. lintli-se com esta pomada,

cm quanto quente, os objectos que se quer privar da fer-

rugem. Instantes depois esfrega-se com uni palmo. Assim pre-

parados ficam inalteráveis.

PÓS D'ARR07.

Torna-se um pote de barro e deita-se-lhe:

Agua 6 Iiiros.

Arroz de boa qualidade kg.

Deixe em contacto 24 horas, depois decante. Reno\ e a o

ração durante tres dias. Deite o arroz n'um tamis de cri

feito isto, exponha ao ar sobre unia toalha. msto que O arroz

si

Page 24: Mino 1.°—IV.° I Angra do Heroismo, Ilha Terceira, Açores Setembro ...

40 O ATIIENED

enxugue, pise n'um almofariz o arroz até obter pó fino,

e passe-o em seguida atreves d'um panno fino, ligado á

boca do pote, para não perder pó.

TINTA PARA TORNAR A MADEIRA INCO3IBESTIVEL

PRIVAL-A DOS INSECTOS

Alumen

Sulfato de ferro

Acido borico

Gelatina

Gomma de trigo

Agua

fio gram.

50 «

30 «

«

6 r

1:000

Colore á vontade.

RECEITA PARA IMPEDIR QUE O LEITE AZEDE

Meuein-se algumas folhais de abano selvagem no vaso do

leite, e elle conservará a sua doçura durante muitos dias.

LIMPESA MARMORE

Empreg,a-se a agua chlorada (6o gr. de chloreto de cal

para uni litro d'agua). Fricciona-se o marmore enodoado com

uma esponja embebida Mesta agua, e deixa-se enxugar 20 ar.

Ao fim de duas horas, lava-se com agua pura.

Se esta primeira operação não bastar, recomeça-se de novo

mas termina-se passando o marmore com oleo de linhaça,

ou melhor,cara virgem dissolvida em essencia de tercbenthina.

r:ZLSC/t2 IMEZAIIM

Xdi IS TO >I X A; Z),?5,25 R 024'4

VICTOR DURUY

Edicao illustrada com 800 magnificas gravu-

ras traduzidas por á!. Pinheiro Chagas.

O limai:ais() succeso que obteve em Portugal

a traí-Ima:fio da //i.ilorift de "'rança de Henri

álartin, revelou-nos o enthusiasum que o publico

está mosiramlo pelas grandes obras historicas,

por aquellas que lie dão o conhecimento da vida

dos povos, mais dramatica muitas \ eZes do que o

romance de toais agitadas peripecias.iVunia obra

hisiorica, traçada por polia iimri,il, [em o leitor, a

par da satisfaça() do seu espirfio pie deseja ins-

truir-se, o deleite que a todos causa uma narra-

tiva cheia de vida e de paixão. As magnificas

gravuras estrangeiras, que esta empreza leio ob-

tido, e que dao a historia por dias inusitadas unia

nova attracçâo, completam o encanto e a milidae

de d.estes livros, porque o ensino da historia pe-

los olhos não é menos profícuo do que o 9115. pe-

netra no nosso espirito pela leitura.

A HISTORIA DE R0álA será publicada em

magnifico papel, typo novo, muito legível, e il-

lustrada com 309 'PRIMOROSAS GRAVURAS

sendo ninhos de pagina inteira, devidas aos

meiros desenhadores e gravadores de lia! ia, Ero'i-

ça e Inglaterra.

A obra completa não excederá o. preço de

5:000 reis e ficara terminada em dez ou doze

meses.

CONDIÇÕES DA ASSIGNATURA :

A HISTORIA DE ItOMA sabirá em caderne

Ias in-t,' grande, a 2 continuas de 26 paginas e

aos fascicidos de 32 paginas com capa.

Custo de cada caderneta em Lisboa 60 reis,

pago no acto da entrega.

Custo de cada raticieulo nas provindas 120

reis, franco dr parte, pagos adiantadamente.

Todo a correspowlencia deve ser dirigida a

Rodrigo dr "IML Carneira Zagailo, escripeoha da

Emprez-a, travessa da Queimada, 86, Lisboa.

• cot wzdsyndetT-sidifIlt•IlOtZnIdWillElillSO

Nova riroducção de XAVIER DE MONTEPIN,

roinance de sensação illustrado emn 15 chromo

lithographias, aguara/nadas por 'Manuel de Ma-

cedo.

A C111111>CZa &Perece os seguintes valiosos brin-

des a todos os Srs. assignantes: Um almanach

Mostrado para 1889 contendo muitas gravuras,

cbromos, artigos bumoristicos, enigmas, poesias,

iincedotas, charadas, [ancilas de utilidade geral,

annuncios, et c.

E pelo insignificante preço de 10 reis cada

unia enrolou magadicas de desenho e côres finís-

simos, cujo valor, leal é nove ou dez vezes suiw-

rior ao preço lair que são ofierecidas los srs. as-

signantes, ofi.crece Cunhem gratuitamente a todos

os srs. iissignantes, uma capa para brochura do

1." volume eon: (lidem-entes cAres eido belloeffei-

rto.

(et Si/Ol-l:t ,2?lIQ

Chronica Semanal de costumes, ca3osTpolitica; artes e ler.

tras. Diraceão literaria de Maseellino Marmita, illustrações de

Julião ,tachado.

A COMEDIA PORTLIGUEZA constando de oito paginas de

texto. uma capa illustrada com3annuncios, publicar-se-ha ia-

va naXe/mente aos sabbados, nitidamente impressa-em papel

aguai ao d'este prospecto com a collaboração dos seguintes

distinctos eseriptores : Barros Lobo, Fialho Freitas

e Costa, Gomes da Silva, João de Deus, Jayme Victor, José

Antonio de Freitas, Julio Cesar Machado, Manoel Pinheiro

Chagas, Moura Cabral, Silva Lisboa, Silva Pimo,_15rbano , de

Castro, etc.

CONDICÇÕES DE ASSIGNATIIRA

LISBOA—anno; tedeStdoo :Semestre, 13,P3oo; Trimestre,

65o.

POVINCIAS E ILIAS—Anno, an600; Sensesue, ii'liksoo ;

Trimestre,s7oo.

II5SPANIIA E ÁFRICA Occidental e oriental—Anno,

33k000 • Semestre, ilt500-

T01;OS OS RAIZES DA UNIÃO POSTAL—Anno, fr. 17,

ou E o. 118, ou mk. 13,6o. Semestre, fr, 8,6o, E 0.6i isk ou

nik. 6,8o—firazik (moeda brazilheira) anuo, 63lS000. Semestre,

Angra—lfypographia do Athênen, de (888.