Mahamudra na Tradio Gelug-KagyuPublicado originalmente comoH. H.
the Dalai Lama e Berzin, Alexander.The Gelug/Kagy Tradition of
Mahamudra. Ithaca, Snow Lion, 1997Parte I: Introduo ao Mahamudra e
Sua Aplicao Prtica na VidaAlexander BerzinJulho de 19961 A
Estrutura BudistaEsboo Inicial do Tpico"Mahamudra" uma palavra
snscrita que significa "grande selo" e que se refere natureza de
todos os fenmenos. Tal como um selo de cera estampado em documentos
legais para autenticar a sua assinatura, do mesmo modo, a natureza
da realidade figurativamente estampada sobre tudo como uma garantia
de que nada existe de maneira fantasiada e impossvel. Assim, o fato
de que todas as coisas so vazias de existir em qualquer maneira
impossivel torna vlido que as coisas na verdade existem.Mahamudra
tambm se refere a sofisticados sistemas budistas de meditao e
prtica para compreender esta natureza grande-selo. A caracterstica
distintiva destes mtodos a de ver esta natureza focalizando na
prpria mente e descobrindo a relao entre a mente e a realidade.
Quando a nossa mente confunde a realidade com a fantasia,
produzimos problemas para ns. Alm disso, quando a nossa mente faz
surgir uma aparncia dos demais de tal maneira que no corresponde
sua realidade, somos incapazes de os conhecer corretamente, para
ser da melhor ajuda possivel. Portanto, compreender a relao ntima
entre mente e realidade essencial para se alcanar a liberao e a
iluminao, que o objetivo da prtica mahamudra.No budismo, a forma de
existncia impossivel e fantasiada mais frequentemente discutida
chamada literalmente de existncia verdadeira, ou seja, existncia
verdadeiramente independente de uma relao com a mente. Dado que
existncia verdadeira , paradoxicamente, existncia falsa,
referindo-se a uma forma de existncia que impossvel e que no , de
maneira alguma, real, podemos talvez evitar confuso usando, ao
invs, variaes do termo existncia slida.Podemos comear a apreciar a
complexa relao entre mente e realidade examinando-a de vrios pontos
de vista. Por exemplo, se abordarmos o tpico de maneira prtica e
com os ps na terra e chamarmos a maneira em que ns e o universo
existe realidade, ento ns vivemos na realidade. Com base na nossa
experincia quotidiana da realidade, podemos saber e talvez
compreend-la. Este processo s pode ocorrer atravs do meio da
mente.Se o conhecimento direto da realidade, e sua experiencia, no
suficiente para sermos capazes de entend-la claramente, assim que
precisamos tambm pensar sobre ela, s poderemos faz-lo atravs de um
esquema conceptual, que construdo pela mente. Alm disso, se
precisarmos formular e expressar, a ns prprios ou aos outros, o que
a realidade, s poderemos faz-lo atravs de palavras ou smbolos, que
tambm so construdos pela mente. A realidade existe, mas somente
fantasia imaginar que a podemos experienciar, entender, provar, ou
descrever independentemente da relao entre a realidade e a mente.
Usando um termo da filosofia ps-modernista, temos de desconstruir a
realidade como sendo uma coisa slida l fora.Se perguntarmos como
que os fenmenos existem, j envolvemos a mente meramente ao fazer a
pergunta. E mais, tambm s podemos responder a esta questo
envolvendo a mente. Suponhamos que respondemos: Sim, isso bvio, mas
a um nvel terico, as coisas no existem separadamente da mente?
Teramos de dizer que um nvel terico no existe por si mesmo,
independentemente de uma mente que o est formulando ou, pelo menos,
pensando nele. No podemos dizer mais nada sobre como um nvel terico
existe, porque dizer qualquer coisa envolve a linguagem, que
construda pela mente.Na verdade, mal levantamos a questo de como as
coisas existem, entramos no reino das descries, que s podem ser
feitas pela mente. Mas isso no quer dizer que tudo existe apenas na
mente e que a terra no existia antes de nela ter havido vida. Um
objeto no precisa de ser experienciado por uma certa mente neste
momento para que exista. Mas se formos falar sobre como as coisas
existem, ou tentar entender, provar e saber isso, s o poderemos
fazer em relao mente. Mahamudra comea nesta premissa.Podemos
formular a relao entre a mente e como as coisas existem de vrias
maneiras. H duas abordagens principais em mahamudra. Vamos
caracteriz-las em termos muito gerais. A primeira apresenta tudo o
que existe em termos dos fenomenos serem ou mente ou objetos da
mente por outras palavras, experincia ou os contedos da experincia.
Os fenomenos, inclundo as mentes, existem meramente por virtude do
fato que mente pode simplesmente fazer surgir uma aparncia ou
ocorrncia deles como um objeto de cognio. Podemos estabelecer que
os nossos filhos e o amor que temos por eles existe simplesmente
porque os podemos conhecer e experienciar. A outra abordagem
principal discute o que existe em termos de rotulamento mental, o
que significa que as coisas existem como aquilo que elas so
simplesmente em termos de palavras e daquilo a que as palavras
referem ou significam. Os fenomenos existem como so por virtude de
serem simplesmente o significado das palavras, rtulos mentais ou
formulaes conceptuais deles. Podemos estabelecer que os nossos
filhos e o nosso amor existem simplesmente porque lhes podemos dar
nomes que se referem a eles.Em nenhum dos casos estabelecida a
existncia dos fenomenos do seu prprio lado por virtude, por
exemplo, de uma auto-natureza encontrvel e inerente/intrnseca,
fazendo deles verdadeiramente o que so, independentemente de
qualquer relao com a mente. Os nossos filhos no existem como nossos
filhos porque tm, algures dentro deles, uma caracterstica
definidora, fazendo deles intrinsecamente nossos filhos, mesmo se
ns prprios nunca tivssemos existido. E o amor no existe por si
prprio, algures no cu, com uma fora interna definidora, dando poder
sua existncia. Estas so maneiras fantasiadas e impossveis de
existir, e todos os fenomenos so vazios de existir dessas maneiras.
A ausncia da existncia de maneiras impossveis de qualquer fenomeno
chamada o seu vazio ou vacuidade.Cada uma destas duas abordagens
envolve o seu prprio estilo caracterstico de meditao mahamudra
sobre a natureza da realidade. Com a primeira, focalizamos na mente
que apreende a vacuidade como seu objeto e vem a entender que todas
as aparncias so o brincar daquela mente. Com a ltima, focalizamos
na vacuidade como objeto de cognio, especificamente na vacuidade da
mente, e chegamos a entender que at a prpria mente existe meramente
por virtude do fato que ela pode ser simplesmente rotulada como
mente. Com a primeira, ento, focalizamos numa mente que apreende um
certo objeto, enquanto que com a ltima, num objeto apreendido por
uma certa mente.Cada uma das tradies tibetanas Kagyu, Sakya e Gelug
transmite linhagens de mahamudra apresentadas na sua prpria maneira
de explicao distintiva e com seu prprio estilo individual de
meditao. Todas derivam de fontes comuns da India, transmitidas ao
Tibete durante os incios do sculo XI. Kagyu e algumas escolas Sakya
apresentam mahamudra em termos da inseparabilidade da aparncia e da
mente. Gelug apresenta-a em termos de rotulamento mental, enquanto
que as outras escolas Sakya combinam os dois, vendo primeiro a
relao entre os objetos da mente e a prpria mente, e depois
entendendo a prpria natureza da mente em termos de rotulamento
mental. Kagyu e Gelug apresentam mtodos mahamudra envolvendo tanto
os nveis grosseiros da mente como os mais sutis, enquanto Sakya
aborda isto apenas do ponto de vista do nvel mais sutil. Kagyu
explica dois estilos de prtica mahamudra um para aqueles que
prosseguem atravs de etapas graduais e outro para aqueles a quem
tudo acontece de uma vez. Sakya e Gelug descrevem vias de prtica
apenas para os primeiros. Mahamudra, na tradio Gelug, conhecida
como Gelug-Kagyu porque usa mtodos para reconhecer a natureza
convencional da mente semelhantes aos Kagyu e depois usa mtodos
tipicamente Gelug para reconhecer a sua natureza mais profunda. No
fim, como o Primeiro Panchen Lama explica emUm Texto Raiz para a
Tradio Gelug-Kagyu de Mahamudra, cada abordagem atinge o mesmo
entendimento e resultado intencionados. Cada uma leva, com base na
prpria mente, eliminao de toda a confuso e realizao de todos os
potenciais de modo a que cada um de ns possamos ser do maior
benefcio aos demais.Os Quatro Verdadeiros Fatos da VidaDe modo a
compreender, apreciar e, se estivermos para isso inclinados,
finalmente praticar os mtodos mahamudra, precisamos de os ver
dentro do seu correto contexto. Comecemos por esboar este contexto
brevemente, em termos dos quatro verdadeiros fatos da vida que o
Buda compreendeu e ensinou, e que todos os aryas, ou seres
altamente realizados os nobres vem como verdade. Eles so geralmente
chamados as quatro verdades nobres.Vivendo na India h dois mil e
quinhentos anos atrs, Buda foi uma pessoa que se liberou de toda a
confuso e, assim, tornou-se capaz de usar todos os seus potenciais
para o benefcio dos outros. Basicamente, ele atingiu este estado de
iluminao entendendo a realidade, ou seja, o que verdade na vida.
Primeiro, ele viu a verdade do sofrimento. Porm, a forma usual de
expressar este primeiro verdadeiro fato, que a vida sofrimento, soa
um pouco ameaador e pessimista. No comunica muito bem a inteno. De
fato, ele viu que ningum que olhe verdadeiramente para a vida
poderia negar que ela difcil.Nada na vida fcil. No fcil viver em
sociedade, ganhar a vida ou suportar uma famlia. To rduo quanto
estes aspectos normais da vida possam ser, tendemos a torn-los
ainda mais difceis. Por exemplo, ficamos to nervosos, agitados e
preocupados acerca de tudo que no lidamos com as tribulaes da vida
to bem ou to graciosamente como poderamos. Sempre tensos,
tornamo-nos infelizes, no s a ns mas a toda a gente nossa
volta.Buda explicou que a causa mais profunda porque fazemos a vida
mais difcil do que necessrio a nossa falta de apercebimento, ou
ignorncia. Este o segundo verdadeiro fato da vida a verdadeira
causa do sofrimento. O no-apercebimento pode ser acerca da causa e
efeito comportamental ou da realidade, e podemos no nos aperceber
deles simplesmente no sabendo disso ou, adicionalmente,
percebendo-os de maneira incorreta. "Apreender", traduzido
geralmente como "agarrar", significa reconhecer um objeto de uma
certa maneira. Dado que apreender a realidade de uma maneira
incorreta a causa raiz das nossas dificuldades na vida, iremo-nos
referir ao no-apercebimento neste contexto como "a confuso sobre a
realidade".Estando confusos acerca da realidade, sentimo-nos
naturalmente inseguros e ficamos nervosos e tensos. Tendemos a
fazer grandes e pesadas provaes das coisas do dia a dia da nossa
vida, tal como dirigir para o trabalho ou pr os nossos filhos na
cama, que nos sentimos constantemente estressados. claro,
precisamos ocuparmo-nos com a vida e tomar conta das nossas
responsabilidades, mas nunca h necessidade alguma de nos
incapacitarmos com preocupaes compulsivas e ansiedade crnica. Isso
apenas nos impede de lidar efetivamente com a vida. Certamente no
conduzem felicidade e paz mental. Para parafrasear Shantideva,
mestre indiano do sculo VIII, Se h algo difcil na vida que podemos
mudar, para qu ficarmos perturbados? Mudemos simplesmente o que
precisa ser mudado. Mas se no podemos fazer nada, para qu ficar
perturbado? Isso no ajuda.Quando nos sentimos tensos acerca de uma
situao especfica, como um engarrafamento de trnsito, ou de maneira
no-bvia, como quando estamos de mau humor, tendemos a externalisar
a nossa tenso. Isto no acontece apenas no modo de comunicar e
talvez de transmitir isto aos outros. A um nvel mais profundo,
percebemos mal a nossa tenso, como sendo algo slido, e a projetamos
sobre todas as situaes em que nos encontramos. A nossa mente produz
uma aparncia do engarrafamento de trnsito, e at do fato que tivemos
que levantar-nos de manh, como se fossem umas provaes slidas e
monstruosas. Produz uma aparncia delas como se as suas prprias
naturezas as fizessem verdadeiramente e intrinsecamente
estressantes, independentemente de quem as possa experienciar. Alm
da nossa mente automtica e inconscientemente produzir aparncias das
coisas deste modo, tambm podemos remoer sobre estas aparncias com
pensamentos mrbidos incontrolavelmente recorrentes, reforando a
nossa crena de que estas aparncias so a verdadeira realidade.
Sentimo-nos to tensos e estressados com tudo que a vida aparece
como se fosse uma armadilha, algures l fora, sentindo-nos firme e
inexoravelmente amarrados no o seu cruel aperto.Buda explicou que
esta confuso acerca da realidade o nosso imaginar que todas as
coisas existem da maneira que as nossas mentes produzem a aparncia
delas a causa raiz dos nossos problemas. Deste modo, os aspectos
difceis da nossa vida se tornam ainda mais difceis para ns. No nos
parece que a tenso seja uma mera experincia de uma situao, mas que
verdadeira e intrinsecamente parte da prpria situao. Se a situao
fosse intrinsecamente produtora de estresse, no haveria maneira de
evitar ficarmos estressados por ela. Contudo, embora seja a
experincia pessoal de uma situao, o estresse surge dependendo de
muitos fatos pessoais e no inevitvel. A no ser que entendamos isto
bem, condenamo-nos a um estresse incessante. certo que difcil viver
numa cidade atolhada e se encontrar no meio do trnsito, barulho e
poluio todos os dias, sem falar ser-se vtima de possveis crimes.
Ningum pode negar isto. Mas quando construmos uma imagem mental
concreta e fixa da cidade como sendo um lugar tenso, horrvel,
temvel, l fora, impingindo como um monstro no coitadinho de mim, a
vtima, aqui dentro, tornamos a nossa vida ali ainda mais difcil. A
cidade dentro da nossa cabea, que ns projetamos sobre as ruas,
parece ainda mais slida e concreta do que a verdadeira cidade feita
de cimento. Deste modo, nossa crena que a imagem que temos a
verdadeira realidade gera toda a nossa tenso e estresse.
Infelizmente, muitas pessoas consideram no s aonde elas moram, mas
toda a vida, deste modo.Buda ensinou que no inevitvel que ns
experienciemos sndromes dolorosos como este. possvel que estes
sndromes e suas causas acabem, no s temporariamente mas de uma vez
por todas. O verdadeiro acabar, ou paragem, equivalente sua remoo
total, o terceiro verdadeiro fato da vida a verdadeira cessao do
sofrimento e das suas causas. Se eliminarmos a recorrncia das
causas do sofrimento, experienciaremos definitivamente a ausncia do
sofrimento que teria surgido como seu resultado. Sem uma causa, um
resultado no pode surgir. Alm disso, j que a causa principal da
recorrncia dos nossos problemas a confuso com a qual imaginamos que
as coisas existem realmente na maneira impossvel em que a nossa
mente confusa as faz enganosamente parecer existir, possvel
eliminar a recorrncia desta causa. Isto porque a confuso no pode
ser verificada. Baseada em fantasia em vez de fato, ela no tem uma
fundao firme e no resiste um exame detalhado. Portanto, verdadeiros
finais podem definitivamente ocorrer.Porm, a fim de realizarmos uma
verdadeira paragem dos nossos problemas e das suas causas, devemos
ativamente fazer algo por isso. Se no, devido ao forte hbito,
continuaremos infinitamente a tornar a nossa vida miservel por
exemplo gerando a tenso outra e outra vez. Dado que a causa raiz do
nosso sofrimento um estado mental confuso, precisamos de o
substituir permanentemente por um estado no-confuso de modo que
nunca mais vai surgir. Tais estados mentais no-confusos com os
quais vemos a realidade, so o quarto verdadeiro fato da vida
verdadeiros caminhos interiores da mente, ou verdadeiros
"caminhos". Contudo, no suficiente mascararmos meramente o problema
do estresse, por exemplo, tomando um tranquilizante ou uma bebida.
Temos de nos livrar, ou "abandonar", a confuso, com a qual
acreditamos, de algum modo, que a tenso existe "l fora". Temos de
substituir a confuso com a compreenso correta, por exemplo, com a
compreenso de que a tenso uma criao da mente.As nossas attitudes
mentais podem ser mudadas muito mais facilmente do que todo o resto
do mundo. Parafraseando Shantideva uma vez mais dentro do contexto
da sua discusso sobre a pacincia: " impossvel cobrir toda a
superfcie spera do mundo com couro. Mas, cobrindo a parte debaixo
dos nossos ps com couro, atingimos o mesmo fim". Portanto, para nos
libertarmos dos nossos problemas da vida e para sermos do melhor
benefcio aos outros, crucial compreendermos a natureza da realidade
das aparncias que experienciamos, e faz-lo em termos do seu
relacionamento com a nossa mente. Os ensinamentos de mahamudra
apresentam mtodos eficazes e sofisticados para se atingir este
fim.Levando a Srio a Ns e s Nossas VidasSe o primeiro fato
verdadeiro que a vida em geral no fcil, certamente no podemos
esperar que ver a natureza da nossa mente ser simples. A verdadeira
natureza da mente, a qualquer nvel, no muito bvia. At mesmo
identificar e reconhecer corretamente o que a mente extremamente
difcil. Mesmo para comearmos a tentar v-la, precisamos de uma forte
motivao. Precisamos estar claros sobre porqu gostaramos de ver a
natureza da nossa mente. Deixem-nos brevemente rever a apresentao
budista dos estgios graduais da motivao atravs dos quais
progredimos para obtermos o melhor sucesso neste empreendimento.A
fundao para qualquer nvel de motivao espiritual levarmo-nos, a ns
mesmos e qualidade da nossa vida, a srio. A maioria das pessoas
levanta-se de manh e tm de ir trabalhar ou ir para a escola, ou
ficar em casa e tomar conta da casa e dos filhos. Ao fim do dia,
elas esto cansadas e tentam relaxar talvez bebendo uma cerveja e
vendo televiso. Eventualmente vo dormir, e no dia seguinte
levantam-se e repetem a sequncia. Passam a sua vida inteira
tentando ganhar dinheiro, cuidando da famlia e tentando
experienciar qualquer divertimento e prazer que possam ter.Embora a
maioria das pessoas no possa alterar este formato da sua vida, elas
sentem que tambm no podem mudar a qualidade da sua experincia deste
formato. A vida tem os seus altos, mas tambm tem muitos baixos, e
isto tudo muito estressante. Sentem que so uma parte minscula de
uma estrutura mecnica, gigantesca e slida, acerca da qual no podem
fazer nada. Assim, vivem a vida de uma maneira mecnica, passiva,
como um passageiro numa montanha russa que corre sem parar, indo
para cima e para baixo e sempre s voltas, supondo que no s a
trilha, como tambm a tenso experienciada ao circundar nela so uma
parte inevitvel do passeio que deve sempre recorrer.Dado que tal
experincia da nossa vida, apesar dos seus prazeres, pode ser muito
deprimente, vitalmente essencial fazermos qualquer coisa acerca
disso. Apenas beber at esquecer todas as noites, ou procurando
divertimentos e distrao constantes como ter msica ou a televiso
ligada a toda a hora, ou incessantemente jogar jogos de computador
de modo a que nunca tenhamos de pensar sobre a nossa vida, no vai
eliminar o problema. Ns devemos levar-nos a srio. Isto significa
ter respeito por ns como um ser humano. Ns no somos apenas uma pea
de maquinaria ou um passageiro incapaz na trilha fixa da vida que s
vezes suave, mas frequentemente cheia de dificuldades. Precisamos,
por conseguinte, de olhar mais perto para o que ns estamos
experienciando cada dia. E se virmos que estamos estressados pela
tenso da nosso cidade, casa ou escritrio, no devemos aceitar isto
como sendo algo inevitvel.Os ambientes aonde vivemos, o trabalho e
nossa casa, incluindo as atitudes e o comportamento dos que estao
neles, fornecem meramente as circunstncias em que ns vivemos as
nossas vidas. Contudo, a qualidade da nossa vida o que ns prprios,
e no as outras pessoas, estamos experienciando agora mesmo o
resultado direto das nossas prprias atitudes e do comportamento que
elas geram, e no das outras pessoas. Isto fica claro pelo fato de
que nem todos no mesmo ambiente tem as mesmas
experiencias.Admite-se que alguns ambientes so mais difceis do que
outros, por exemplo viver-se numa zona de guerra, e ns devemos
estar sempre alertas para evitar perigos reais. Mas estarmos
alertas diferente da tenso, e esta no precisa necessariamente
acompanhar a anterior. Se, contudo, sentirmos que a nossa tenso
inescapvel, nem sequer tentaremos super-la. Condenamo-nos a uma
experincia extremamente desagradvel da vida. No tem que ser
assim.Se nos sentimos muito nervosos o tempo todo, ento o primeira
passo na direo de fazermos algo para remediar a situao levarmo-nos,
a ns e qualidade da nossa vida, a srio. Suponhamos que estamos
andando pela rua e pisamos num inseto, esmagando-o parcialmente mas
sem o matar totalmente. Se continuarmos a andar ignorando a
experincia do insecto, de ter a sua perna esmagada ou perdida,
fazemo-lo porque no levamos o insecto, nem a sua vida, a srio. No
temos nenhum respeito por ele. Se no nos tratarmos melhor do que a
um inseto, ignorando as nossas dores e angstias mais profundas,
isso realmente lastimvel.Levarmo-nos a srio significa vermos como
estamos realmente experienciando a nossa vida e, se vemos que
insatisfatria, admitir que assim. A nossa tenso e estresse no iro
embora se as negarmos ou se evitarmos olhar para elas com
honestidade. E admitir que algo est errado no o mesmo que
queixarmo-nos sobre isso e sentirmos pena de ns mesmos. Nem implica
que algo est fundamentalmente errado conosco e que somos uma m
pessoa porque estamos nervosos. Sermos objetivos, em vez de
melodramticos, e permanecendo neutros, sem julgar, essencial para
qualquer processo curativo e espiritual.Direo Segura e Natureza
BdicaQuando nos levamos, a ns e qualidade da nossa vida, a srio, e
admitimos as dificuldades que possamos estar experienciando, a
etapa seguinte termos a confiana de que (1) possvel super-las, (2)
h uma maneira de o fazer, e que (3) somos capazes de o conseguir.
Isto traz-nos aos tpicos do refgio e da natureza bdica.Tomar refgio
no um ato passivo de nos colocarmos nas mos de um poder superior
que far tudo por ns, como a palavra inglesa "refuge" possa
implicar. um processo ativo de pr uma direo segura, de confiana e
positiva na nossa vida. Essa direo indicada pelos Budas, pelo
Dharma e pela Sangha as Trs Jias Preciosas. So preciosas no sentido
que so raras e valiosas. Cada uma tem dois nveis de significado
interpretvel e definitivo e uma representao comum. O nvel
interpretvel conduz ao definitivo, enquanto que a representao serve
como foco para respeito sem fornecer uma direo segura real em si ou
por si.Os Budas so aqueles que eliminaram toda a sua confuso para
poderem usar os seus potenciais inteiramente para o beneficio dos
demais. Ao nvel definitivo, a direo segura dos Budas fornecida
pelos seus dharmakaya, ou corpos que tudo abrangem nomeadamente, a
sua conscincia onisciente e sua natureza, as quais tudo abrangem. O
rupakaya, ou o corpo de formas, que os Budas manifestam, serve como
o nvel interpretvel, enquanto que as esttuas e as pinturas de Buda
so a representao da primeira jia preciosa.Ao nvel definitivo, a
fonte de direo do Dharma refere-se remoo completa, ou ausncia total
de obstculos, e completa realizao de boas qualidades que os Budas
atingiram. Seu nvel interpretvel que eles indicam o que nos ajuda a
atingir o mesmo, a saber, as suas declaraes escriturais e
realizaes. Estas so representadas pelos textos de Dharma.O nvel
definitivo da fonte de direo da Sangha a comunidade interna, dentro
da mente, das remoes totais, ou "cessaes" dos obstculos, e das
realizaes de qualidades boas. Especificamente, a comunidade de
todos os aryas os que j conseguiram ver a realidade de maneira
direta e no-conceptual ao progredirem mais ao longo do caminho
espiritual. Seu nvel interpretvel a comunidade dos aryas, leiga e
monstica, com uma pequena parte destas verdadeiras remoes e
realizaes. A comunidade geral dos monsticos sua representao.Em
resumo, o nvel definitivo das Trs Jias Preciosas de Buda, Dharma e
Sangha, apresenta o objetivo que gostaramos de alcanar. O seu nvel
interpretativo indica aquilo que ns acreditamos, externamente, que
vai nos levar l. Mas tambm existem fatores internos em que
precisamos confiar. Estes referem-se nossa natureza bdica.Somos
capazes de eliminar os nossos problemas e de alcanar as Trs Jias
Preciosas definitivas porque todos temos a natureza bdica, ou seja,
os vrios fatores, ou materiais de trabalho, que tornam isso
possvel. De todos os nossos recursos naturais, o mais importante
mente. Todos temos uma mente que, por sua natureza, no impedida por
nada de experienciar o que quer que exista. No importa o que
acontea no obstante quo confusos, estressados ou infelizes possamos
estar experienciamos tudo isso. At a morte algo que experienciamos
quando ocorre. Por conseguinte, como temos uma mente que nos
permite experienciar o que quer que exista, temos o recurso bsico
que nos permite experienciar uma ausncia total de confuso e uma
utilizao de todas as boas qualidades possveis para ajudar os outros
contando que tal ausncia e utilizao totais realmente existam. Ou
seja, se pudermos estabelecer que possvel que estas duas coisas
existam e que no so apenas objetos de desejos agradveis porm meras
fantasias podemos estar confiantes que somos capazes de alcan-la,
simplesmente porque temos uma mente.Podemos experienciar as coisas
sem confuso e sem estarmos tensos. At a pessoa mais perturbada e
mais nervosa tem momentos de claridade e de serenidade mesmo se
apenas quando esteja dormindo em paz e sonhando sonhos agradveis ou
incuos. Isto demonstra que a confuso e a tenso no so partes
integrais da natureza da mente. Por isso, a confuso pode ser
removida. No s pode ser removida, mas dado que a confuso no pode
ser validada e pode ser totalmente substituda pela compreenso, que
pode ser verificada, a confuso pode ser eliminada para sempre.
Portanto possvel que uma ausncia total de confuso exista. Alm
disso, como a confuso limita a mente de usar os seus potenciais,
quando a confuso for eliminada, a utilizao de todos os potenciais
tambm pode existir. Por conseguinte, como todos ns temos uma mente,
e todas as mentes tm a mesma natureza de poder experienciar o que
quer que exista, todos ns podemos realizar e experienciar as Trs
Jias Preciosas definitivas.Assim, se o nosso objetivo for a remoo
da nossa confuso e a realizao dos nossos potenciais como indicado
pelos Budas, pelas suas realizao, seus ensinamentos, pelo que eles
acumularam ao longo do caminho e por aqueles que nele esto
progredindo, ns estaremos viajando atravs da vida com uma direo
segura, de confiana e positiva. A tomada de refgio, ento, significa
dar esta direo realstica e segura nossa vida. Sem ela, a nossa
prtica de mahamudra no teria direo alguma e no nos levaria a lado
nenhum, ou um teria uma direo doentia que nos levaria a mais
confuso e problemas. E mais, quanto mais longe viajarmos nesta
direo segura atravs dos mtodos mahamudra ou seja, quanto mais
entendermos a natureza da mente e a sua relao realidade mais
confiantes nos tornamos da sensatez desta direo e da nossa
capacidade de alcanar o seu objetivo. Quanto mais forte a nossa
confiana, mais progredimos ao longo do caminho.Causa e Efeito
ComportamentalPara prosseguirmos na direo segura de eliminar a
nossa confuso e de realizar os nossos potenciais da mesma maneira
que os Budas fizeram e que a comunidade altamente realizada est
fazendo, precisamos compreender que todas as experincias da vida
surgem atravs de um complexo processo de causa e efeito. O que
estamos experienciando neste momento resulta de causas e ir
produzir efeitos. Por exemplo, podemos ver que estamos
frequentemente infelizes e que temos pouca paz mental. Isto pode
ser porque, na maioria das vezes, sentimo-nos nervosos e
estressados, e isto porque andamos constantemente de um lado para o
outro sem nunca relaxar nem parar. Precisamos compreender que se
continuarmos a viver a nossa vida desta maneira iremos experienciar
o mesmo nvel, ou pior, de infelicidade e estresse no futuro.
Portanto, se quisermos evitar um esgotamento nervoso, tomamos a
responsabilidade de modificar o nosso comportamento. assim que
viajamos na vida com uma direo segura e positiva. Precisamos
prestar mais ateno ao nosso estado mental e tentar relaxar. Por
exemplo, tentando parar de correr constantemente e tirando uma hora
por dia para nos sentar num banho quente e acalmar-nos.Assim, neste
primeiro estgio do nosso desenvolvimento, o pavor que a nossa
situao se torne ainda pior motiva-nos a tentar compreender a
natureza da nossa mente. Levando-nos a srio, tentamos estar cada
vez mais cientes do nosso estado mental de modo a, quando
estivermos tensos, modificarmos o nosso comportamento a fim de
afetar o que sentimos. Fazemos isto por causa da nossa confiana nas
leis da causa e efeito comportamental. Para experienciar algo
melhor na vida, sabemos que temos de criar as causas para
isto.RennciaEmbora tomar um banho quente possa nos fazer sentir um
pouco melhor e fazer com que a nossa tenso subsida um pouco tambm,
isso na verdade no resolve o problema. No dia seguinte retornamos
ao mesmo ritmo frntico, e a nossa tenso e infelicidade retornam.
Precisamos progredir a um segundo nvel de motivao. Temos de
desenvolver a renncia.Como muitas pessoas pensam da renncia como
sendo uma coisa um pouco masoquista, como se significasse abandonar
todo o prazer e conforto na vida, importante compreend-la
corretamente. A renncia tem dois aspectos. O primeiro uma forte
determinao de nos livrarmos completamente dos nossos problemas e
das suas causas. importante salientar aqui que no desejamos
simplesmente que alguma outra pessoa nos livre, mas que estamos
determinados a livrar-nos por ns mesmos. Alm disso, estamos
determinados a livrarmo-nos no s dos nossos problemas, como tambm
das suas causas para que eles nunca mais retornem. Isso no
significa estar simplesmente dispostos a tomar alguma medida
superficial, como engolir um comprimido ou tomar um banho quente,
para obter um alvio provisrio. Estamos dispostos a sondar muito
profundamente para descobrir e desenraizar a causa mais profunda
das nossas dificuldades na vida.Investigar profundamente para
alcanar a verdadeira fonte dos nossos problemas requer uma enorme
coragem. Porm, a fora dessa coragem vem de estarmos completamente
fartos e enjoados da pobre qualidade do que estamos experienciando
na vida da nossa infelicidade e tenso constante, por exemplo. Com
renncia, decidimos que j nos fartamos disso, que temos
definitivamente de nos libertar do seu aperto.O segundo aspecto
corresponde mais noo ocidental de renncia. Estamos no s
determinados a nos libertar, mas, a fim de o fazer, estamos
dispostos a sacrificar algo. Isto no se refere a sacrificar algo
trivial, como ver televiso ou comer sorvetes, nem a desistir de
algo nada trivial, como fazer amor com a nossa esposa, ou at do
relaxamento e divertimento. Precisamos abandonar os nossos
problemas e todos os nveis das suas causas.Podemos estar dispostos
a abrir mo do problema, por exemplo, de ser infeliz, porque
doloroso. Mas abrir mo at dos primeiros nveis das causas dos nossos
problemas outra coisa. O primeiro nvel da causa dos nossos
problemas so os nossos traos auto-destrutivos da personalidade.
Temos de estar prontos a sacrific-los. Precisamos abdicar os nossos
apegos, raiva, egosmo e, neste caso, nosso nervosismo, tenso e
preocupao constante. Se no estivermos totalmente dispostos a
renunciar a estes fatores perturbadores que esto causando os nossos
problemas, nunca nos poderemos livrar da nossa infelicidade. muito
mais difcil deixarmos de nos preocupar do que deixarmos de fumar ou
de ver televiso. Mas nisto que focalizamos quando tentamos
desenvolver a renncia.Muitas pessoas que abordam a prtica do
budismo esto dispostas a sacrificar uma ou duas horas do seu dia a
fim de fazer alguma prtica ritual ou de meditar. O tempo
relativamente fcil de dar, mesmo que as suas vidas sejam muito
ocupadas. Mas no esto dispostas a mudar nada das suas
personalidades no esto dispostas a renunciar nada do seu carter
negativo. Com este tipo de abordagem ao budismo, no obstante quanta
meditao fizermos, a nossa prtica permanece um mero passatempo ou um
esporte. No toca nas nossas vidas. De modo a superarmos realmente
os nossos problemas, temos de estar dispostos a mudar ou seja, a
mudar a nossa personalidade. Precisamos renunciar e livrar-nos dos
seus aspectos negativos, que esto nos causando tantos
problemas.Isto requer ainda mais coragem uma tremenda quantidade de
coragem seguir em frente penetrando novo territrio na nossa vida.
Mas a obteno dessa coragem definitivamente possvel, mesmo que possa
ser um pouco assustadora no incio. Por exemplo, a gua numa piscina
pode estar muito fria. Mas se, no vero, estivermos com muito calor
e transpirando, ento, como estamos to fartos de nos sentirmos
incomodados, ganhamos a coragem de mergulhar na gua. Estamos
dispostos a desistir, renunciar, no s transpirao, como tambm causa
do disconforto, a saber, estarmos no sol quente e no na piscina.
Quando primeiro mergulhamos na piscina, claro que est fria. um
grande choque para o nosso sistema, mas depressa nos habituamos
gua. De fato, descobrimos que muito mais confortvel do estarmos ao
lado da piscina a transpirar. Assim, muito possvel obter-se esta
coragem, esta determinao de nos livrarmos das nossas qualidades
negativas e esta coragem de estarmos dispostos a desistir
delas.Tambm temos de ter a coragem de examinar ainda mais
aprofundadamente a fonte dos nossos problemas. Sermos nervosos,
tensos e preocupados, por exemplo, tanto uma causa da infelicidade
como tambm o resultado de algo mais profundo. Com o primeiro nvel
de motivao, modificamos o nosso comportamento a fim de evitar que o
nosso problema piore. Como medida inicial para reduzir e aliviar o
nosso estresse e tenso tentamos deixar de correr de um lado para o
outro o tempo todo e tentamos fazer algo para relaxar. Mas agora,
adicionalmente, temos de descobrir o processo interno que est por
trs da tenso.Quando investigamos mais profundamente, realizamos que
o correr de um lado para o outro o resultado da nossa tenso ou a
circunstncia em que a nossa tenso se est manifestando. Contudo, no
a causa real da nossa tenso. H algo acontecendo mais profundo que
responsvel por estado mental que temos ao correr de um lado para o
outro estamos constantemente preocupados, por exemplo. Mas temos
tambm de revolver ainda mais profundamente para descobrir porque
andamos to preocupados e ansiosos.Eliminando A ConfusoA natureza da
realidade que os contedos daquilo que experienciamos, tal como as
vises, sons, pensamentos e emoes, so todos objetos que surgem
dependendo de uma mente. Eles no existem independentemente "l
fora", separadamente do processo de uma mente que os est
experienciando. O trfego completamente diferente da viso de trfego
refletida na retina dos nossos olhos ligada cognio visual. O que
realmente experienciamos esta, a viso do trfego, enquanto que o
anterior, o proprio trfego, meramente o que chamamos, na anlise
budista, a condio focal ou objetiva para a experincia do trfego. o
que a experincia tem como objetivo, mas no o que aparece realmente
mente que o est experienciando. Alm disso, a nossa mente d
surgimento no s aparncia que constitui os contedos da nossa
experincia, mas tambm a uma aparncia de um modo de existncia destes
contedos que normalmente no correspondem realidade.Normalmente,
fixamos a ateno nos contedos da nossa experincia e imaginamos, ou
no compreendemos, que eles existem independentemente de serem
apenas o que uma mente faz surgir, de uma maneira ou outra, como
parte de uma experincia. Fixados nestes contedos e imaginando que
eles existem solidamente "l fora" como parecem existir tornamo-nos
nervosos e preocupados com eles, e isto a fonte da nossa tenso e,
assim, da nossa infelicidade; porque se ns acreditarmos que eles
esto realmente "l fora", no h praticamente nada que possamos fazer
acerca deles. Por isso sentimo-nos incapazes e desesperados.Com os
mtodos mahamudra, desviamos a nossa ateno dos contedos da nossa
experincia para o processo da prpria experincia e, desse ponto de
vista, compreendemos a relao entre a mente e a realidade que
experienciamos. Isto permite-nos desconstruir a nossa experincia e
os seus contedos de serem slidos e assustadores, a algo mais fluido
e administrvel. Fazer este desvio de perspectiva requer a forte
renncia da nossa fixao mrbida nos contedos da nossa experincia e da
maneira em que os imaginamos existir. Assim, no pode haver nenhuma
prtica de mahamudra sem o correto desenvolvimento da
renncia.Compaixo e um Corao Dedicado BodhicittaPara desenvolvermos
o nvel mais avanado de motivao, olhamos para o nosso nervosismo e
tenso e como afetam negativamente os outros, por exemplo, os nossos
filhos e amigos. O nosso estado mental perturbado no s nos impede
de os poder ajudar eficazmente, mas faz com que eles tambm se
sintam nervosos e tensos. S seremos capazes de os ajudar mais
eficazmente se superarmos toda a nossa confuso e realizarmos todos
os nossos potenciais. Ou seja, para ajuda-los completamente, ns
mesmos temos de nos transformar num Buda iluminado. Desta maneira,
atravs do nosso interesse pelos outros, desenvolvemos um corao
dedicado bodhichitta um corao que est determinado a atingir a
iluminao a fim de beneficiar a todos.A superao da confuso e a
realizao dos potenciais requerem a viso da natureza da mente. A
mente tanto a base para toda a confuso, como tambm a fundao para
todas as boas qualidades. Assim, com um corao dedicado bodhichitta
como motivao, o nosso interesse pelos outros faz-nos sentir que
temos mesmo de superar todos os nossos problemas e limitaes, por
exemplo, a preocupao e a tenso cronicas, e de realizar todos os
nossos potenciais por intermdio da viso da natureza da mente. No
temos outra alternativa. Precisamos fazer isto urgentemente porque,
se no, no aguentamos a nossa incapacidadede de ser de benefcio a
todos, incluindo a ns prprios.Bodhicitta no s a motivao mais forte
que fornece a maior fora para a prtica de mahamudra, mas
cultivando-a como nosso estado mental ajuda ainda de outras
maneiras a melhorar esta prtica. Tecnicamente, bodhichitta um corao
ou uma mente tomando a iluminao como seu objeto e acompanhada por
duas fortes intenes alcanar essa iluminao e beneficiar todos os
seres por meio dessa realizao. Porm, a menos que sejamos Budas, no
podemos possivelmente o que significa a iluminao de maneira direta
e no-conceptual. Podemos apenas focar na iluminao por meio de uma
ideia dela, ou de algo que a representa, tal como a imagem
visualizada de um Buda.Contudo, antes de ns prprios sermos um Buda,
podemos focalizar em, e conhecer diretamente e no-conceptualmente,
a nossa natureza bdica, a saber, os fatores que nos permitem
alcanar a iluminao especificamente, a natureza da nossa mente. A
natureza da mente no manchada por quaisquer emoes perturbadoras,
pela confuso ou at pelos seus instintos, e a fundao de todas as
boas qualidades para ajudar os outros, tal como a conscincia
oniscinte e o interesse total pelos outros. Assim, a natureza da
mente tambm pode servir como uma representao da iluminao para fins
meditativos.Ento, focalizando na natureza da nossa mente com a
forte inteno de a compreender e de beneficiar todos os seres atravs
dessa compreenso, pode servir como uma maneira de meditar sobre
bodhichitta. Tal prtica conhecida como o cultivo do ltimo, ou mais
profundo, nvel de bodhichitta, enquanto que a focalizao conceptual
na prpria iluminao atravs de qualquer outra imagem a prtica de
bodhichitta relativa ou convencional. Assim o nvel mais profundo da
prtica de bodhichitta , de fato, a prtica de mahamudra.O interesse
pela felicidade dos outros e a compaixo para que se livrem do seu
sofrimento so necessrias, no s como base da motivao bodhichitta
para a prtica de mahamudra, mas tambm para manter essa prtica no
curso correto para o seu pretendido objetivo. Quando tivermos
mudado o nosso foco na vida, dos contedos da nossa experincia para
o processo da experincia, h um grande perigo de ficarmos fixados na
prpria mente, porque a experincia direta da prpria mente totalmente
bem-aventurada no sentido de calma e serenidade e envolve uma
claridade e uma simplicidade extraordinrias. O interesse pelos
outros uma das foras mais fortes para nos trazer de volta para
terra depois de termos estado nas nuvens. Embora todas as aparncias
existam em funo da mente, os outros seres no existem apenas na
nossa cabea. O seu sofrimento real e di-lhes tanto quanto o nosso
nos di.Alm disso, termos interesse por algum no significa estarmos
descontroladamente preocupados com essa pessoa. Por exemplo, se
estivermos fixados nos problemas que o nosso filho tem na escola,
deixamos de ver que a aparncia dos problemas que a nossa mente faz
surgir uma funo da mente. Acreditando que a aparncia a realidade
slida " l fora", sentimos uma vez mais que no h nada a fazer e,
assim, tornamo-nos extremamente ansiosos e tensos. Preocupamo-nos
ao ponto de ficarmos doentes e reagimos demais ao nosso filho, o
que no ajuda. Se, em vez disso, focalizarmos no processo da mente
que causa a nossa percepo do problema como se existisse como um
monstro horrvel "l fora", no vamos eliminar o interesse pelo nosso
filho, mas apenas a nossa preocupao. Isto permite que tomemos
qualquer ao clara e calma necessria para aliviar o problema. Assim,
no s a compaixo necessria para a prtica bem sucedida de mahamudra,
mas a compreenso mahamudra necessria para a prtica bem sucedida da
compaixo.2 As Prticas PreliminaresReconhecendo os Nossos Bloqueios
MentaisOs ensinamentos mahamudra tambm salientam a importncia e a
necessidade de extensas prticas preliminares. O propsito de tais
prticas, de por exemplo fazer-se centenas de milhares de prostraes,
o de purificar os nveis mais grosseiros dos obstculos e acumular
fora positiva de modo a que a nossa meditao mahamudra seja mais
eficaz para nos levar iluminao. Neste contexto, "obstculos" no se
refere a problemas economicos, sociais ou outros problemas
externos, mas a dificuldades dentro de ns. A fora positiva,
traduzida geralmente como "potencial positivo" ou "mrito",
refere-se a um estado interno positivo que resulta de aes
construtivas, ou "virtuosas", do corpo, fala, mente e corao.Para
apreciar como este processo de purificao trabalha para podermos
empreend-lo da maneira mais eficaz, essencial compreender o que so
obstculos internos. Shantideva escreveu: "Sem estabelecer contato
com o objeto a ser refutado, voc no pode obter uma compreenso da
sua refutao". No possvel eliminarmos os obstculos mentais e
emocionais ao nosso sucesso espiritual a no ser que saibamos o que
eles so.Podemos compreender estes obstculos em muitos nveis. H
obstculos que impedem a liberao e outros que impedem a oniscincia.
Os primeiros referem-se s emoes e atitudes perturbadoras, s
"aflies", como o orgulho e a confuso teimosa, enquanto que os
ltimos referem-se aos instintos dessa confuso. As prticas
preliminares ajudam-nos a purificar os nveis mais grosseiros dos
obstculos que impedem a liberao. As prostraes, por exemplo, ajudam
a enfraquecer o nosso orgulho. Porm, dentro do contexto de
mahamudra, talvez possamos compreender melhor os obstculos como
sendo bloqueios mentais. Deixem-me desenvolver este tema examinando
uma vez mais o mecanismo da tenso.Se estivermos constantemente
tensos, um dos principais bloqueios mentais que causa isso a nossa
fixao nos contedos do que estamos atualmente experienciando. Por
exemplo, estamos preenchendo nosso formulrios para pagamento de
impostos uma tarefa que detestamos. Porque a detestamos tanto,
fixamo-nos morbidamente e ficamos obsecados em cada linha do
formulrio, sentindo-nos cada vez mais tensos e nervosos.
Mentalmente, comeamo a queixar-nos, a sentir pena de ns mesmos, a
duvidar da nossa capacidade de executar a tarefa, a preocupamo-nos
sobre se vamos ser capazes de terminar, desejando que no tivessemos
de fazer isto, e fantasiamos sobre nos divertir outra coisa em vez
disto. Distramo-nos com um cigarro, um snack ou uma chamada de
telefone. como se estes formulrios fossem um terreno de areia
movedia arrastando-nos para o fundo. Essa atitude impede-nos
severamente de terminar de preenche-los. Do mesmo modo nos
incapacitamos, atravs de um mecanismo semelhante, quando nos
fixamos morbidamente, com tenso e preocupao, nos contedos de uma
experincia ou de uma experincia futura que antecipemos com pavor.A
vida, contudo, um processo que continua de um momento ao seguinte
sem nunca fazer uma pausa. Cada momento da vida o momento seguinte
da experincia, e cada experincia tem os seus prprios contedos. H
sempre algo diferente que estamos experienciando a cada momento. A
vida sempre continua, embora, infelizmente, muitas vezes significa
ter que fazer coisas que ns no gostamos de fazer. O primeiro
verdadeiro fato, afinal, que a vida difcil.Contudo, quando estamos
tensos, ficamos parados no aspecto do contedo de um momento
particular da nossa experincia. como se tivssemos congelado um
momento de tempo e no consegussemos ir avante / sair dele. Estamos
encrencados no contedo do que estamos fazendo ou antecipando fazer,
em vez de simplesmente desempenharmos a tarefa e acabarmos com ela.
Esta fixao funciona como um severo bloqueio mental um obstculo que
nos impede de fazer eficazmente seja o que for, muito menos
libertarmo-nos de todo o sofrimento.A minha falecida me, Rose,
tinha um conselho muito sbio e til. Ela costumava sempre dizer:
"faz as coisas direitas, para cima e para baixo, e no para os
lados! O que quer que tenhas de fazer, faz e termina de fazer".
Assim, se tivermos de lavar os pratos ou lever o lixo para a rua,
faam o que tm a fazer direito, para cima e para baixo, e acabem a
tarefa. Se, na nossa mente, fizermos disso um grande drama, vamos
tambm experienci-lo como um grande drama.Ficarmos presos e grudados
nos contedos das experincias da nossa vida diria de tal modo que
nos sentimos tensos e queixamo-nos, alm de ficarmos irritados, um
bloqueio mental srio. um obstculo que nos impede de ver o contnuo
processo da natureza da nossa mente. Como essencial vermos esse
processo a fim de superarmos a confuso sobre a realidade que cria
os nossos problemas e nossa incapacidade de ajudar os outros
eficazmente, precisamos remover esses obstculos. As prticas
preliminares, tais como a repetio de cem mil ou mais prostraes, so
planejadas para enfraquecer e, assim, comear a eliminar estes
bloqueios.ProstraesFazer prostraes no uma punio ou arrependimento,
no nenhuma coisa horrvel que temos de fazer e acabar rapidamente de
modo a continuar indo para as partes boas. Buda no como um pai
dominador insistindo que temos de fazer os nossos deveres antes de
podermos jogar qualquer jogo. Ao invs, fazer prostraes ajuda-nos a
afrouxar o bloqueio mental de estarmos grudados nos contedos da
nossa experincia. Ns simplesmente fazemos as prostraes, "como deve
ser, para cima e para baixo", como Rose Berzin diria. Isto no
significa que as fazemos mecanicamente, mas sim, diretamente.
Fazemos o que temos a fazer, sem mais.Naturalmente, acompanhamos as
nossas prostraes com a motivao correta, visualizao e recitao de uma
das frmulas de refgio ou de um texto curto til para purificar, tal
comoA Admisso das Quedas. Fazendo assim deixa pouco espao na nossa
mente para queixas, sentir pena de ns mesmos ou preocuparmo-nos com
o fato de conseguir completar as cem mil. Mas at meramente fazer as
prostraes, por si, pode familiarizar-nos com a abordagem vida de
fazer as coisas diretamente, acima e abaixo, sem nos sentirmos
tensos. Isto ajuda-nos a purificar at um certo ponto, alguns dos
nossos bloqueios ou obstculos mentais e a acumular mais fora
positiva para sermos capazes de realmente ver diretamente a
natureza da mente.Prtica de VajrasattvaUma outra prtica preliminar
importante a recitao, cem mil vezes ou mais, do mantra de
cem-slabas de Vajrasattva, para a purificao da fora negativa que
acumulamos das aes destrutivas, ou "no-virtuosas" previamente
cometidas. Acompanhamos a nossa recitao com uma honesta admisso
destas aes negativas e o reconhecimento que t-las cometido foi um
erro. Sentimos remorso, mas no nos culpamos; oferecemos a nossa
promessa de tentar no comet-las de novo; reafirmamos a nossa direo
segura do refgio e o nosso compromisso de alcanar a iluminao para
podermos beneficiar a todos; e imaginamos graficamente uma
purificao ocorrendo com uma complexa visualizao enquanto repetimos
o mantra.O estado mental com que nos engajamos nesta preliminar,
ento, o mesmo com que fazemos as prostraes recitandoA Admisso das
Quedas. Desta maneira, a prtica de Vajrasattva purifica-nos das
foras negativas as quais, como obstculos crmicos, iriam amadurecer
na nossa experincia de infelicidade ou de situaes desagradveis que
impediriam, respectivamente, a nossa liberao ou capacidade total de
ajudar os outros. Porm, alm do seu benefcio usual, esta prtica
serve tambm como uma excelente preliminar especificamente para a
meditao mahamudra.Uma das maneiras em que experienciamos termos
acumulado fora negativa sentindo-nos culpados. Suponhamos que
tolamente dissmos palavras speras ao nosso chefe numa demonstrao de
irritao momentnea que fz com que perdssemos o nosso emprego e pode
causar-nos dificuldades de arranjar outro emprego no futuro. Se
ficarmos grudados nos contedos dessa experincia, ns solidificamos o
acontecimento na nossa mente. Ns o congelamos no tempo e, depois, o
recordamos o tempo todo, identificando-nos completamente com o que
fizemos nesse momento e julgando-nos como sendo estpidos, sem valor
e maus. Esta culpa clssica geralmente acompanhada por um sentimento
de estresse e ansiedade, e muita preocupao com o que fazer agora.
Enquanto no largarmos o nosso forte agarramento aos contedos dessa
experincia, seremos incapazes de agir claramente e com
auto-confiana para remediar a situao arranjando um novo emprego.A
visualizao, de forma grfica, das nossas negatividades nos deixando,
enquanto recitamos o mantra de cem-slabas de Vajrasattva com um
estado mental correto, ajuda-nos a largar a nossa fixao pelos
contedos da nossa experincia passada de termos agido
destrutivamente. Por conseguinte, ajuda-nos a abandonar a nossa
culpa. Isto ajuda a treinar-nos a abandonar a nossa fixao nos
contedos de cada momento da nossa experincia, que a essncia dos
nveis iniciais da prtica mahamudra. Desta maneira, Vajrasattva
serve como uma preliminar excelente para mahamudra.Guru-YogaOutra
preliminar sempre salientada como um mtodo para ganhar inspirao, ou
"benos", o guru-yoga. bem fcil praticar guru-yoga a um nvel
superficial. Visualizamos perante ns o nosso professor espiritual,
guru ou lama na aparncia do Buda Shakyamuni, ou de uma figura
bdica, tal como Avalokiteshvara, ou de um mestre da linhagem, tal
como Tsongkhapa ou Karmapa. Depois imaginamos luzes de trs cores
emanando desta figura para ns enquanto recitamos, cem mil vezes ou
mais, um mantra ou verso adequado, fazemos pedidos fervorosos para
inspirao para sermos capazes de ver a natureza da nossa mente. No
entanto, ao nvel mais profundo muito difcil de compreender o que
estamos realmente tentando fazer durante, e por meio de, tal
prtica. O que estamos tentando cultivar a um nvel psicolgico? A
resposta anda volta de um dos aspectos mais difceis dos
ensinamentos budistas a relao correta com um professor
espiritual.Em quase todos os textos mahamudra ns lemos algo do
estilo: "Como preliminar essencial para a prtica de mahamudra, faam
guru-yoga diligentemente. Imaginem que os vossos corpos, fala e
mente se tornam se um com os do vosso guru. Faam fervorosos pedidos
de inspirao para serem capazes de ver a natureza da vossa mente".
Na primeira leitura, quase que parece como se tudo que precisamos
fazer essa visualizao e esses pedidos, e depois viveremos felizes
para sempre, como num conto de fadas. Ns receberemos a inspirao
que, como mgica, agir como a nica causa para a nossa obtencao de
realizao, independentemente de termos de fazer qualquer outra
coisa. Mesmo na escola do budismo japons de Jodo Shinshu em que ns
confiamos unicamente no poder de Amitabha para alcanar a liberao e
a iluminao, ns compreendemos implicitamente desta formulao do
caminho espiritual que devemos parar todos os esforos baseados no
ego, o que depende de termos compreendido a natureza mais profunda
de "mim" e da mente. Assim, bvio que temos de ir alm do nvel
superficial de rezar ao nosso guru pedindo inspirao para vermos a
natureza da nossa mente, sem fazer mais nada, sentindo que se
tivermos bastante f e formos verdadeiramente sinceros, o nosso
desejo ser concedido. De repente, como se tivssemos sido tocados na
cabea com a varinha mgica de um mgico, ns veremos e reconheceremos
a natureza da nossa mente.A mente tem uma natureza com dois nveis.
Sua natureza convencional mera claridade e apercebimento. o que
permite o surgimento de qualquer coisa como um objeto de cognio e
que seja conhecido. Sua natureza mais profunda, ou "ltima", que
vazia de existir de maneiras fantasiadas e impossveis, como surgir
independentemente das aparncias que cria como sendo os objetos que
conhece. Guru-yoga uma ajuda profunda, embora no mstica, para ver
ambos. Deixem-nos examinar o mecanismo de cada um.Quando praticamos
guru-yoga, pedimos inspirao ao nosso guru, e depois dissolvemos uma
rplica do nosso guru para dentro de ns. Quanto mais forte e
fervorosa for a nossa considerao e respeito por ele ou ela, mais
experienciaremos um estado mental bem-aventurado e vibrante como
consequncia deste processo. Se a nossa f estiver misturada com
apego, o estado mental que obtemos um de mero excitao confundido,
distrado e no muito claro. Mas se a nossa fervorosa considerao e
respeito forem baseadas na razo, este estado mental bem-aventurado
e vibrante estar fundado numa crena confiante. Sendo emocionalmente
estvel, extremamente conducente a utilizar tanto a mente que v a
sua prpria natureza convencional como a mente que tem esta
natureza, sobre a qual focalizar.Para compreender como o processo
de guru-yoga e de pedir inspirao funciona para facilitar a nossa
viso da natureza mais profunda da mente, precisamos compreender
como a viso do nosso guru como um Buda encaixa dentro do contexto
dos ensinamentos sobre a vacuidade e o surgimento dependente.
Vacuidade significa uma ausncia uma ausncia de maneiras impossveis
de existir. Quando imaginamos que um guru existe por examplo, como
um Buda independentemente, do seu prprio lado, ns estamos
projetando uma maneira impossvel de existir nesse professor. Esse
modo de existncia no refere a qualquer coisa real, porque ningum
existe como "isto" ou "aquilo", ou como qualquer coisa, do seu
prprio lado. Algum existe como um mentor espiritual, um Buda, ou
ambos, somente em relao a um discpulo. Um "professor" surge
dependente no s de uma mente na qual algum aparece como um
professor e no s daquilo a que a palavra ou rtulo mental
"professor" se refere, como tambm da existncia de estudantes.O
papel de "professor" no pode existir independentemente da funo de
ensinar. definido, de fato, como algum que ensina. A funo de
ensinar no poderia possivelmente existir se a aprendizagem ou os
estudantes no existisse. Assim, ningum poderia ser um professor se
no houvessem estudantes. Ou seja, ningum nem mesmo o Buda
Shakyamuni, Tsongkhapa, Karmapa, e nem mesmo o nosso guru pessoal
poderia existir como mentor espiritual se no existisse tambm algum
como estudante. Mesmo se algum no estiver ensinando neste momento
nem tiver nenhum estudante agora mesmo, essa pessoa s poderia
existir como professor se ele ou ela tivesse feito o curso de
professor, o que poderia acontecer apenas se houvessem estudantes
no universo. Alm disso, algum est funcionando como professor apenas
quando est realmente ensinando, e isso s pode acontecer em relao a
um estudante.A mesma linha de raciocnio aplica-se existncia de
origem interdependente de Budas e dos seres sencientes. Seres
sencientes so aqueles com conscincia limitada, enquanto que os
Budas so aqueles com a maxima capacidade de ajuda-los. Ningum
poderia ser um Buda se os seres sencientes no existissem. por isto
que se diz que a bondade dos seres sencientes muitssimo maior do
que a bondade dos Budas em capacitar-nos de alcanar a iluminao.Dado
que os gurus e os Budas no existem independentemente dos discpulos
ou estudantes, segue-se que nem os professores nem os discpulos
existem como entidades totalmente independentes, como dois postos
slidos e concretos, cada um deles existindo por si prprio mesmo se
o outro nunca tivesse existido. Podemos por conseguinte logicamente
concluir que uma fantasia imaginar que um guru pode produzir um
efeito num discpulo como se fosse algum slido, "l fora",
transmitindo um efeito slido, como lanar uma bola, a algum slido "c
dentro", ou seja, "eu". Efeitos, tais como obter a compreenso da
natureza da mente, s podem surgir dependendo no s de um esforo
comum de um guia espiritual e de um discpulo, mas de muitos outros
fatores tambm. Como Buda explicou, "um balde no enchido com gua
pela primeira nem pela ltima gota de gua. enchido por uma coleo de
um nmero enorme de gotas".A compreenso da natureza convencional e
da natureza mais profunda da mente o resultado de um longo e rduo
processo, durante vidas incontveis, de acumulao e de limpeza
(colecionar e purificar). O primeiro refere-se a fortalecer as duas
redes construtoras de iluminao: de fora positiva (ou de potencial
positivo) e de conscincia profunda as "duas colees de mrito e
sabedoria"; enquanto que o ltimo significa purificarmo-nos da fora
negativa (ou do potencial negativo) e dos obstculos. Alm disso,
temos de ouvir ensinamentos corretos sobre os dois verdadeiros
nveis da natureza da mente convencional e mais profunda , refletir
neles at obtermos um nvel funcional bsico de compreenso, e depois
meditar neles correta e intensivamente. Praticando desta maneira,
acumulamos as causas para obtermos compreenso e realizaes. A
inspirao do nosso guru no pode substituir este processo.No entanto,
a inspirao que vem de um mentor espiritual o meio mais eficaz para
fazer com que as sementes do potencial para a compreenso,que
acumulamos atravs destes mtodos, amaduream mais depressa para
produzir os seus resultados mais rapidamente. A inspirao, embora
sendo uma circunstncia para o amadurecimento de causas, no pode
produzir quaisquer resultados por si, se no houverem causas ou se
estas forem insuficientes para que amaduream. A inspirao ou as
"benos" de um guru, de um fundador da linhagem, ou at do prprio
Shakyamuni, no podem funcionar magicamente para nos levar
compreenso e iluminao. Por conseguinte, no nos devemos iludir
pensando que podemos evitar o trabalho rduo de superar os nossos
problemas para sermos capazes de obter a profunda eterna felicidade
e a capacidade de sermos do maior benefcio aos outros. A inspirao
pode definitivamente ajudar-nos a alcanar mais rapidamente os
efeitos dos nossos esforos e extensamente elogiada como o meio mais
eficaz para isto mas nunca pode substituir o esforo sustentado,
sobre muitas vidas, para acumular as causas para esses efeitos.Em
resumo, para que um discpulo obtenha inspirao e depois realize a
natureza da mente, crucial que no s ele ou ela, mas tambm o
professor, compreendam como cada um deles existe e como o processo
de causa e efeito s pode funcionar com base na vacuidade a ausncia
de maneiras impossveis de existir. Se um deles ou ambos acreditarem
que ele ou ela e o outro existem independentemente e concretamente
como postes de cimento, que a inspirao e a compreenso existem como
uma bola dura, e que o processo de causa e efeito de obter inspirao
e compreenso trabalham como o lanamento dessa bola de um poste ao
outro, ento no importa quo hbil o mentor espiritual possa ser e quo
receptivo e sincero o discpulo possa ser, o efeito ser bloqueado.
Se acreditarmos que o que experienciamos em relao ao nosso guru,
mesmo como um Buda, existe algures concretamente "l fora" e no
surge dependendo de muitos fatores incluindo a nossa mente como
poderia ele ou ela transmitir-nos inspirao ou compreenso da
natureza da nossa mente, mesmo se pedssemos isso com total
sinceridade e motivao correta?O Relacionamento com um Professor
EspiritualPara compreendermos o guru-yoga mais claramente,
precisamos examinar mais profundamente o tpico da "devoo ao guru".
A fim de evitar uma possvel m interpretao, vamos traduzir o termo
tcnico como "um compromisso de todo corao a um professor
espiritual", ou seja, o compromisso de considerar esta pessoa como
um Buda. Fazer este compromisso no lidar com a questo de se o nosso
mentor espiritual existe "l fora" como um Buda ou no. Afinal, s
podemos falar do nosso professor em termos da nossa experincia dele
ou dela. A maneira em que um mentor espiritual existe s pode ser
formulada em termos da mente. Por conseguinte, estamos
cometendo-nos a considerar a nossaexperinciado nosso professor
comoa experinciade um Buda.Ento, este relacionamento com um
professor espiritual como sendo um Buda fundamentalmente um
contrato muito pessoal. Falando do ponto de vista de um discpulo, o
nosso contrato com essa pessoa seria: "No me interessa, durante
este estgio da minha prtica, como que voc gera e experiencia a sua
motivao para o que voc est fazendo. Eu quero ser capaz de ajudar os
outros to plenamente quanto possvel e alcanar o estado de um Buda
de modo a ter mais capacidade de produzir esse benefcio. Portanto,
tendo-nos examinado, a voc e a mim, com muito cuidado, e tendo
visto que ns dois estamos prontos para entrar neste tipo de
relacionamento, eu agora pretendo considerar a minha experincia do
que quer que voc diga ou faa como um ensinamento pessoal. Irei
experienciar as suas aes e palavras como motivadas unicamente pelo
desejo de me ajudar a desenvolver de modo a que eu possa superar os
meus problemas e falhas e ser de maior benefcio para os demais.
Cada pensamento, palavra e ao de um Buda beneficia os outros, ou
seja, algum que est sempre ensinando. Assim, vou considerar voc
como me ensinando o tempo todo."Nem o nosso relacionamento nem o
benefcio que eu posso derivar dele existem como algo vindo s do seu
lado ou como uma entidade slida, como uma corda amarrada entre ns.
O nosso relacionamento existe apenas em termos da sua experincia em
nossa mente, a qual dependente de ns dois. Como s posso
experienciar o nosso relacionamento da maneira em que eu o entendo
e percebo, vou experienci-lo de maneira a maximizar o benefcio que
possa receber. para este fim que vou considerar minha experincia de
voc como sendo minha experincia de um Buda. E, de fato, se a
considerar como tal,sera minha experincia de um Buda e funcionar
como tal. No auto-iluso feita para um propsito bom e digno".A
maneira principal que o nosso professor espiritual, ou qualquer
Buda, pode ajudar-nos a libertar dos nossos problemas e confuso e a
usar eficazmente todos os nossos potenciais para ajudarmos os
outros, treinando-nos a desenvolver a conscincia discernente, ou a
"sabedoria". Precisamos cultivar a mente que capaz de discernir
entre a realidade e a fantasia, e entre o que til e o que
prejudicial. Assim, nossa relao com o nosso guru no a mesma de um
soldado no exrcito com o seu general. Sempre que o general fala,
pmo-nos em posio, saudamos e gritamos "Sim, Senhor!", e obedecemos
sem questionar. No assim. Quando o nosso mentor espiritual fala, ns
somos, naturalmente, respeitosos, mas tambm usamos a situao como
uma oportunidade de desenvolver a nossa conscincia discernente.Alm
disso, se no exrcito obedecermos sempre e formos um bom soldado, o
nosso general pode-nos promover. Mas totalmente diferente com um
professor espiritual. Se ns obedecermos sempre ao nosso professor
sem questionar, isso no faz de ns um bom discpulo. E se ns pedirmos
sinceramente, o nosso guru no nos promover posio de algum que v a
natureza da mente. O surgimento da viso da natureza da nossa mente
depende diretamente do desenvolvimento da nossa conscincia
discernente. A maneira em que experienciamos o nosso professor
contribui para o nosso sucesso de uma maneira indireta,
ajudando-nos a cultivar esse discernimento.O exemplo clssico deste
processo vem de um relato de uma vida anterior de Buda. Uma vez,
numa vida passada, Buda teve um mentor espiritual que lhe disse, e
a todos os seus outros discpulos, para irem cidade e roubar coisas
para ele. Todos foram roubar exceto Buda, que permaneceu no seu
quarto. O guru foi ao quarto de Buda e gritou iradamente: "Por que
voc no foi roubar para mim? Voc no me quer agradar?" Buda respondeu
calmamente: "Como que roubar pode fazer algum feliz? O guru
respondeu: "Ah, voc nico que compreendeu a finalidade da
lio".Assim, se considerarmos e experienciarmos tudo que o nosso
mentor espiritual diz ou faz como um ensinamento, poderemos us-lo
para nos ajudar a desenvolver o nosso discernimento e sabedoria. No
importa o que seja que o nosso professor diga que faamos,
examinamos para ver se faz sentido. Se estiver de acordo com os
ensinamentos de Buda e formos capazes de faz-lo, ns o faremos "como
deve ser, para cima e para baixo", como a minha me diria. No
processo, o nosso professor ensinou-nos a pensar cuidadosamente
sobre as coisas antes de agir, e depois agir decididamente com
auto-confiana. E se ele ou ela nos pedsse para fazermos algo que
achamos totalmente incorreto, ns no o fazemos e educadamente
explicamos por qu. Uma vez mais, o nosso guia espiritual deu-nos
uma oportunidade para treinar e exercitar a sabedoria
discernente.Ento, o relacionamento mais benfico com um guru
certamente no anda volta de um culto de personalidade. Quando
consideramos o nosso professor como um cone de culto, estamos
presos e fixados nos contedos da nossa experincia. Ns exageramos e
solidificamos o objeto da nossa experincia, neste caso um guru, e
pomos-lhe num pedestal quase literalmente, como uma esttua de ouro
slida, sempre que vemos ou imaginamos esta pessoa num trono de
ensino. Com este estado mental, abnegamo-nos e adoramos os contedos
da nossa experincia, adicionando ttulo aps ttulo ao seu nome. No
estamos cientes da, nem concentrados na, natureza da prpria mente e
sua relao com a nossa experincia do nosso mentor espiritual. Com
uma atitude to confusa e ingnua, abrimo-nos a srio abuso.O outro
extremo em que poderamos cair quando ficamos presos no lado do
objeto da nossa experincia do professor criticar o guru com
hostilidade e, talvez, com profunda desiluso e desapontamento. Ele
ou ela eram supostamente perfeitos e ns vemos srias falhas ticas ou
de julgamento. Ou ficamos calados devido ao medo, pensando que se
dissermos que no ao nosso professor, estaremos a ser um mau
discpulo e seremos rejeitados. Ou pensamos que dizer que no
semelhante a admitir que fomos estpidos por termos escolhido essa
pessoa como nosso guia espiritual e, em vez de parecermos estpidos
a ns e aos outros, aceitamos cegamente e concordamos com tudo o que
o nosso mentor diz. Em todos estes casos, perdemos de vista o nosso
contrato de aprender a utilizar nossa conscincia discernente a
partir da nossa interao com o professor, no importa quais sejam os
contedos dessa interao. Obviamente, entrar em tal acordo requer no
s um mestre espiritual altamente qualificado, mas tambm um discpulo
altamente qualificado que seja emocionalmente maduro e no esteja
procurando um substituto de pai ou me para tomar todas as suas
decises.Por isso, quando praticamos guru-yoga, mesmo se ainda no
tivermos um mentor pessoal com quem temos esse contrato, tentamos
seguir as recomendaes sobre como obter o maior benefcio desse
relacionamento. Tentamos evitar ficar presos nos contedos das
visualizaes e ficarmos apaixonados com eles. No nos tornamos
extticos em quo maravilhoso o nosso guru ou Buda so ao emitir-nos
luzes extasiantes. Em vez disso, concentramo-nos no lado
experiencial do que est acontecendo na mente que est permitindo o
intercmbio de luzes e a inspirao que essas luzes simbolizam. Assim
como podemos desenvolver conscincia discernente do que correto ou
no experienciando cada ao do nosso guia espiritual como um
ensinamento, do mesmo modo tambm podemos desenvolver conscincia
discernente do surgimento dependente e da vacuidadente a partir da
prtica de guru-yoga.Quando fazemos pedidos ao guru, o que que
estamos fazendo? Quando pedimos fervorosamente "Que eu possa ser
capaz de ver a natureza da minha mente", estamos gerando um desejo
muito forte de ver e compreender a natureza da mente atravs de uma
interao correta com um professor espiritual. Assim como a tenso no
existe "l fora" mas pelo contrrio dependente da mente, do mesmo
modo, a compreenso estvel ou at um passageiro momento de insight
sobre a natureza da mente e da realidade, assim como a inspirao
para receber qualquer um deles, no so coisas "l fora" que algum nos
pode atirar como a uma bola. So coisas que surgem dependentemente,
com relao a uma mente, como resultado de um enorme complexo de
causas.A Inseparabilidade da Nossa Mente e do Nosso GuruGampopa, o
mestre tibetano do incio do sculo XII, disse: "Quando eu
experienciei a inseparabilidade da minha mente e meu guru, eu
percebi mahamudra." Podemos compreender a afirmao de recomendao de
Gampopa a vrios nveis, tais como dizendo respeito obteno de
inspirao mediante a constante lembrana do nosso professor; obteno
de um estado mental bem-aventurado e vibrante a partir da ferverosa
considerao e respeito por ele ou ela; e assim por diante. Mas ele
certamente no quiz dizer que quando teve uma unio mstica com o seu
guru, como com Deus ou com seu amor, ele viu mahamudra como um
presente enviado do cu. Pelo contrrio, ele viu que o relacionamento
com o seu mentor espiritual era uma experincia mental que envolvia
aprender de cada momento de encontro. Assim, o benefcio resultante
surgia em dependncia da mente e s podia existir dependendo da
mente. Neste sentido, ele compreendeu que o seu guru e a sua mente
eram inseparveis.A implicao da afirmao de Gampopa no que o
relacionamento com um mestre espiritual est apenas na nossa cabea
comodiscpulos. Isso to equivocado como dizer que tudo vem do lado
de um guru/Buda todo-poderoso. Uma relao entre um professor e um
discpulo surge dependendo no s das duas pessoas, como tambm de uma
mente que experiencia a interao de momento a momento. Quando
compreendemos isto, no ficamos presos nos contedos da experincia de
fixar no lado-do-objeto do "santo guru" ou no lado-do-sujeito do
"pobre de mim". Pelo contrrio, permanecemos concentrados na
experincia e na natureza mais profunda da mente e da realidade que
permite que o relacionamento de causa e efeito da inspirao e
benefcio ocorra entre as duas pessoas envolvidas. Isto simbolizado
por um fluir de luzes transparentes do guru ao discpulo, ambos os
quais ns visualizamos e, assim, experienciamos, como tambm sendo
feitos de luz clara. No h nenhum guru slido, concreto "l fora"
enviando luzes brilhantes slidas a um eu slido e concreto, sentado,
independentemente "aqui dentro", na minha cabea. Ento, tal prtica
de guru-yoga extremamente til para nos treinarmos a ns prprios a
concentrar, com conscincia discernente, na natureza mais profunda
da mente, em meditao mahamudra.Guru-MantraQuando praticamos
guru-yoga, acompanhamos a nossa visualizao com a repetida recitao
de um guru-mantra ou de um verso que inclua um pedido. Na tradio
Karma Kagyu, por exemplo, que se desenvolveu a partir de um dos
discpulos de Gampopa, o Primeiro Karmapa, ns recitamos o mantra,
"Karmapa kyenno," que significa, literalmente, "Karmapa, sabe
oniscientemente!" Na tradio Gelug-Kagyu de mahamudra, ns
substitumos a visualizao e mantra de Tsongkhapa pelos de Karmapa.
Exceto isto, o procedimento e o processo so exatamente os mesmos.Se
a nossa compreenso do guru for como send algum externo, ento a
recitao do mantra de Karmapa, por exemplo, se transforma apenas num
exerccio de devoo, e nada mais. Basicamente, recitamos o
equivalente de "Karmapa, escute e saiba dos meus problemas! S voc
sabe oniscientemente como remov-los". No melhor isto leva-nos a ver
Karmapa como um Buda indicando a direo segura do refgio que tomamos
na nossa vida. A um nvel menos timo, isto conduz ao sentimento que
s Karmapa nos pode salvar de todos os nossos problemas. Assim, os
nossos pedidos ao guru com o mantra de Karmapa transformam-se no
equivalente da recitao repetida de "Oh Deus, ajuda-me!"Mas quando
conhecemos a inseparabilidade da nossa mente e do nosso guru, ns
estamos de fato repetindo "Mente, sabe oniscientemente!" sempre que
recitamos "Karmapa kyenno". Ento, com os nossos pedidos fervorosos
ao guru, estamos dirigindo as nossas energias numa maneira forte
para a compreenso de mahamudra com base na confiana de que a nossa
mente, como a parte da nossa natureza bdica, tem os recursos para
ver a realidade. Mesmo se ns ainda no tivermos um guru pessoal para
agir como canal para a linhagem que vem das suas figuras
fundadoras, a nossa natureza bdica liga-nos linhagem e, assim, pode
funcionar como fonte de inspirao interior. Assim, no s confiamos em
gurus externos, temos tambm um guru interior a natureza da nossa
mente. Quando vemos a inseparabilidade da nossa mente e do nosso
guru neste sentido mais profundo, ns ganhamos o nvel mais profundo
de inspirao.O guru interno, ento, no uma figura existindo
independentemente na nossa cabea, de quem podemos receber mensagens
especiais que devemos definitivamente seguir. Quando pensamentos,
tais como ideias de fazer isto ou aquilo, ou at compreenses,
surgem, podem ser ideias boas ou tolas, compreenses corretas ou
falsas. Apenas porque algo novo e inesperado surge repentinamente
na nossa mente, isso no significa, de modo nenhum, que mesmo assim.
Sempre precisamos examinar a sua validez.Alm disso, no existe
nenhuma pequena pessoa na nossa cabea enviando-as para ns,
supostamente como uma mensagem. Os pensamentos e as compreenses,
tanto vlidos como invlidos, surgem atravs de um processo de causa e
efeito, como o amadurecimento de alguma semente ou potencial. As
sementes so plantadas pelas nossas aes habituais passadas, que
podem ser construtivas ou destrutivas, bem informadas ou iludidas.
Elas amadurecem quando as circunstncias corretas esto presentes. O
reconhecimento da natureza da nossa mente como natureza bdica e a
compreenso da inseparabilidade da nossa mente e nosso guru mais
precisamente, da nossa mente e nossa natureza bdica como nosso guru
interno agem como circunstncias para que as compreenses corretas
amaduream das sementes do potencial que acumulamos atravs das
nossas prticas anteriores de acumulao e purificao, assim como de
escuta, reflexo e meditao. Assim como crucial no romantizar
transformando o nosso guru externo num fazedor de mgica e de
milagres, o mesmo verdade do nosso guru interno.Investigando o
Significado de Cada Ensinamento muito importante, na prtica do
budismo, olharmos profundamente para todos os ensinamentos,
especialmente aqueles que repetem em quase todos os textos sobre um
tpico particular, tal como a afirmao que o guru-yoga e a splica ao
guru por inspirao so as preliminares mais importantes para a prtica
de mahamudra. Atisha, o mestre indiano do incio do sculo XI ,
disse, "Tomem tudo nos grandes textos como instrues de recomendaes
para a prtica pessoal". Contudo, isto no significa que ns os
consideremos simplesmente como ordens do nosso general que devemos
obedecer sem pensar. Precisamos investigar profundamente para
tentar compreender a significncia e o significado de cada
instruo.Os ensinamentos de Buda podem ser divididos em
interpretveis e definitivos literalmente, naqueles que pretendem
levar-nos mais fundo e naqueles sobre o significado mais profundo
ao qual somos levados. O ponto mais profundo ao qual todos os
ensinamentos de Buda conduzem a compreenso da vacuidade. Por
conseguinte, a fim de compreender, nas palavras de Atisha, como
"todos os ensinamentos encaixam sem contradio", ns temos de
encaixar as instrues sobre o que quer que estejamos praticando com
os ensinamentos sobre tudo o mais particularmente com os aqueles
sobre a vacuidade. O estudo do budismo como ser-nos dado peas de um
enorme puzzle. Cabe-nos a ns reunir todas as peas, tais como o
guru-yoga e a vacuidade, e encaix-las. At o processo de pensar
sobre como elas encaixam e tentar entender, e no apenas
intelectualmente, age como uma preliminar para eliminar obstculos e
fortalecer as redes construtoras de iluminao de fora positiva e
conscincia profunda.Assim, as prticas preliminares so um
pr-requisito essencial para conseguirmos atingir qualquer sucesso
com os mtodos mahamudra. Sem elas, podemo-nos sentar e fazer o que
pode parece ser meditao mahamudra. No difcil imaginar que
estamo-nos concentrando no estado natural da mente. Mas, de fato,
tudo que estamos fazendo estarmos ali sentados, sonhando acordados
ou, na melhor das hipteses, concentrando-nos em nada, completamente
"no espao", com a nossa cabea nas nuvens. Podemos ficar um pouco
mais relaxados no processo, mas basicamente a nossa meditao no vai
chegar a nenhum lado profundo.3 Evitar que as Prticas Preliminares
Fiquem sem EnergiaRazes que Fazem com que as Prticas Preliminares
Fiquem sem EnergiaAs pessoas engajadas nas prticas preliminares s
vezes reparam que elas se esto tornando frouxas, sem energia. O
erro principal est na nossa motivao. A medida principal para
impedir que isto acontea reafirmar continuamente as nossas razes
para fazermos as preliminares. Se, como ocidentais, ns as fizermos
como se fosse o nosso dever faz-las, como se estivssemos seguindo
ordens no exrcito, ento certamente que vo acabar sem nenhuma
energia. Ou se as fizermos apenas mecanicamente, sem nenhuma emoo
nem compreenso da razo porque as estamos fazendo, tambm acabaro sem
energia. Por outro lado, embora possam haver vrios nveis diferentes
de motivao espiritual, se tentarmos sinceramente desenvolver um
corao dedicado bodhichitta, permaneceremos sempre cientes das
dificuldades que os outros esto experienciando e sentiremos
profundamente o desejo de poder fazer algo construtivo para lhes
ajudar. Isto move-nos a agir para nos desenvolvermos inteiramente;
e a maneira de comear atravs das preliminares. Essa atitude, ento,
torna as nossas prticas preliminares cheias de vida e relevantes ao
nosso objetivo.No entanto, embora possamos ter uma motivao correta
e sincera, s vezes exageramos as preliminaries, solidificando-as na
nossa mente em algo monstruoso, "l fora". Podemos ento cair num de
dois extremos. O primeiro o de considerar as preliminares com uma
atitude distorcida e antagonsta, traduzida geralmente como uma
"viso errada". Ns as difamamos e tentamos ignor-las, julgando que
so um desperdcio de tempo. Julgamos que so apenas para
principiantes, no para ns, e que por isso devamos ir diretamente
para a prpria prtica mahamudra principal.O outro extremo o de
fazermos das preliminaries uma experincia penosa, como algo de um
mito grego Hrcules limpando os estbulos de Frgia de sculos de
estrume acumulado. Oprimidos pelo prospeto de limpar a nossa mente
de todo o lixo mental, sentimos que nunca chegaremos a lado nenhum.
Essa atitude transforma as preliminares num filme de horror, e
claro que acabam sem energia, pois ficamos imediatamente
desanimados, sentindo que nunca conseguiremos fazer progresso
algum.Ser-se Criativo com as Prticas PreliminaresH muitos tipos
diferentes de prticas preliminares mencionadas nos textos. Embora
hajam listas e instrues para quatro, cinco, oito ou nove prticas
padres, qualquer tipo de ao positiva repetitiva que possamos fazer
funciona como uma prtica preliminar se tivermos a motivao correta.
Por exemplo, uma vez Buda teve um discpulo que no era muito
inteligente e que era incapaz de compreender ou de se lembrar de
qualquer coisa que lhe tinha sido ensinado. Mas tinha um desejo
sincero de aprender e melhorar. O que que fez o Buda? Instruiu o
rapaz a varrer o templo, dia aps dia, repetindo: "Sujeira v embora;
sujeira v embora!" Alm disso, organizou de modo que o templo
estivsse sempre cheio de poeira. Essa era a prtica preliminar que
Buda especificou para este discpulo. Gradualmente, o rapaz pouco
inteligente foi capaz de compreender que a sujeira que estava
tentando varrer era, de fato, a confuso da sua prpria mente.
Depressa foi capaz de compreender tudo, e por fim transformou-se
num arhat um ser liberado.Por nove anos tive o privilgio de ser o
tradutor e secretrio para o meu falecido professor, Tsenzhab
Serkong Rinpoche. Eu gracejava frequentemente que a minha prtica
preliminar era escrever cem mil letras e fazer cem mil telefonemas
em nome dele, ajudando a organisar as suas turns de ensinamentos em
torno do mundo. Embora num certo sentido isto possa ter sido um
gracejo, eu tambm penso que noutro era totalmente verdade. Eu
realizei estas tarefas com entusiasmo, e traduzi para ele to bem
quanto podia porque vi que esta era a maneira mais eficaz em que eu
poderia ser de benefcio a outros, a saber, ajudando o meu guru a
ensin-los. Sem dvida que essa atitude fez daquelas inmeras cartas e
chamadas um mtodo para enfraquecer obstculos e acumular fora
positiva e potenciais para mais tarde eu prprio vir a ser um
professor.O importante nas preliminares no a forma que elas tomam,
mas o processo que estamos com elas tentando atravessar. No o
contedo ou a estrutura das prticas, mas o estado mental que
experienciamos antes, durante e depois delas que o fator mais
crucial. Em luz disto, at mudar as fraldas sujas do nosso beb cem
mil vezes pode ser transformado numa prtica preliminar muito
profunda. Temos de ser prticos e criativos. Nem todos temos tempo
para fazer cem mil prostraes e, sem dvida, ser me cuidando
responsavelmente do seu beb no tem de ser intrinsicamente um
obstculo impedindo a prtica e o progresso espiritual. Precisamos
compreender a essncia.Que estamos fazendo quando estamos
constantemente mudando as fraldas do beb? Se examinarmos isto do
ponto de vista de acumular e limpar um sinonimo tibetano para
prticas preliminares estamos limpando-nos de certas atitudes
negativas. Ou seja, estamos trabalhando para superar a preguia e o
egosmo que nos faz pensar: "No quero tocar na sujeira de outra
pessoa nem quero sujar as minhas mos". Reduzir essa atitude
ajuda-nos tambm a diminuir a fora do bloqueio mental com que no
queremos tocar nem nos envolver com os problemas pessoais das
outras pessoas porque, figurativamente, tambm no queremos sujar as
nossas mos. Alm disso, estamos acumulando fora positiva. No
processo de atender s necessidades do nosso beb, estamos acumulando
cada vez mais capacidade e vontade de cuidar dos outros no
futuro.Transformando Todas as Atividades num Caminho EspiritualA
prtica das preliminares no limitada meramente aos estgios iniciais
do nosso caminho espiritual e depois acabam. Temos de continuar
limpando-nos dos obstculos e a acumulando fora positiva ao longo de
todo o caminho. Continuamos o processo at alcanarmos o nosso
objetivo de nos tornarmos totalmente purificados e inteiramente
capazes de usar todos os nossos potenciais para sermos de benefcio
aos demais. Como isto um processo to central e a longo prazo,
importante entender que, com uma atitude e uma motivao corretas,
podemos transformar qualquer ato repetitivo positivo ou neutro que
fazemos na nossa casa ou escritrio numa preliminar eficaz para
diminuir os bloqueios mentais e acumular fora positiva.Lemos, em
muitos textos budistas comumente usados, como podemos transformar
at as atividades mais mundanas no caminho espiritual. Por exemplo,
quando entramos num quarto, podemos imaginar que estamos
liberando-nos do samsara, ou dos renascimentos incontrolavelmente
recorrentes, e entrando no nirvana, um estado de liberao e de
liberdade do sofrimento. Podemos tambm imaginar que estamos
trazendo todos conosco. Temos de ser criativos com os ensinamentos
de Dharma e aplicar este princpio s circunstncias da nossa vida
pessoal e transformar tudo que fazemos numa preliminar.Por exemplo,
suponhamos que estamos trabalhando num escritrio datilografando
documentos o dia inteiro. Se considerarmos isto simplesmente como o
nosso trabalho e o acharmos chato, sem sentido, e o detestarmos,
ganharemos pouco dele, com exceo de algum dinheiro, uma dor de
cabea e muita frustrao. O mesmo pode ser verdade com as repetidas
prostraes. No ganharemos muito delas se as considerarmos como um
desagradvel dever de trabalho que somos obrigados a fazer. Apenas
ficamos com uma dor de cabea e dinheiro nenhum! Mas se
considerarmos datilografar o dia inteiro com a atitude: "Estou
tornando as coisas claras para que algo possa ser comunicado
eficazmente a outra pessoa", descobrimos que no faz diferena
nenhuma quo trivial sejam os contedos do que estamos
datilografando. O processo que importante estamos tornando algo
claro e disponvel a ser comunicado a outros. Com esta atitude e
motivao, a nossa rotina diria no escritrio funciona eficazmente
como uma prtica preliminar.Para ser criativos com os ensinamentos
budistas, precisamos juntar tudo que aprendemos. Neste exemplo de
transformar o nosso trabalho no escritrio numa prtica preliminar,
estamos combinando os ensinamentos sobre acumular e limpar com a
recomendao mahamudra de no ficarmos presos nos contedos da nossa
experincia, mas simplesmente ficar com o processo. Depois estamos
encaixando isso com lojong os mtodos para limpar as nossas
atitudes, ou o "treinamento da mente", com os quais ns
transformamos situaes negativas em positivas conducentes prtica.
Quando encaixamos partes diferentes dos ensinamentos deste modo, ns
prprios podemos descobrir as respostas de como aplicar o Dharma
vida diria. assim que tornamos a nossa prtica budista animada e que
mantemos a energia do nosso interesse.Estabelecendo e Fortalecendo
as Duas Redes Construtoras de IluminaoOutra possvel razo porque a
nossa prtica das preliminares, e do Dharma em geral, carece de
energia, porque estamos abordando o estabelecimento e
fortalecimento das duas redes construtoras de iluminao, as de fora
positiva e conscincia profunda, como se estivssemos acumulando uma
coleo de selos verdes num supermercado americano. Com cada compra
que fazemos acumulamos mais e mais selos que colamos num livro e
guardamos numa gaveta. No fim, quando tivermos enchido suficientes
livros, podemos troc-los por um aparelho de cozinha. Assim, quando
usamos tempo e energia fazendo repetidas prostraes, julgamos que
como gastar dinheiro no supermercado para obter mais selos. Eles
agora no tm nenhum uso ou relevncia para a nossa vida, mas podem
mais tarde ser trocados, como nosso prmio, pela iluminao.Ns podemos
comer o que compramos na loja, mas com a atitude acima no vemos
nenhum efeito imediato das prostraes, exceto joelhos e costas
doloridas. Contudo, quando transformamos cada ao do nosso dia,
particularmente as repetitivas, numa prtica preliminar, tambm
teremos o benefcio imediato de cada momento do nosso dia se tornar
significativo. A qualidade da nossa vida melhora proporcionalmente
e tornamo-nos mais felizes, sentindo que nunca estamos desperdiando
o nosso tempo. Este sentimento positivo de auto-dignidade refora o
nosso entusiasmo pelas preliminares comuns, como fazer prostraes.
Desta maneira, encaixando todos os ensinamentos para aplic-los vida
diria, a nossa prtica das preliminares no fica frouxa.Encaixando os
Ensinamentos de Dharma um processo muito excitante e ambicioso
tentar encaixar tudo o que ns ouvimos do Dharma e descobrir
implicaes adicionais. Um dos maiores benefcios de ter-se ouvido,
lido e estudado extensamente os ensinamentos de Buda que obtemos
todas as peas do "quebra-cabea do Dharma". Agora podemos encaix-las
realisticamente. A beleza disto que as peas no se encaixam apenas
numa maneira esttica, como nos quebra-cabeas para crianas, mas cada
pea encaixa em todas as outras de inmeras maneiras. A interconexo
muito mais multi-dimensional e dinamicamente em expanso do que a
interconexo no world-wide web da internet.Os sutras do mahayana
do-nos bonitas imagens desta interconexo de todas as facetas do
Dharma. Descrevem cenas de bilhes de campos bdicos em bilhes de
universos bdicos, com cada campo interpenetrando todos os outros e
cada um contendo bilhes de Budas. Em cada um dos bilhes de poros de
cada um destes Budas h mais um bilho de campos bdicos, nos quais
cada um dos outros campos tambm so refletidos. Lemos isto e, se
formos budistas ocidentais, muitas vezes sentimo-nos desconfortveis
comestas sees floridas e aparentemente absurdas das escrituras.
Decidimos que no queremos ler mais nenhum sutra.Mas estes sutras
esto, de fato, apresentando uma imagem magnfica de como todos os
ensinamentos se encaixam e interpenetram uns nos outros. Em cada
ensinamento de cada aspecto do Dharma podemos ver refletidos todos
os outros aspectos dos ensinamentos. Tal como bilhes de universos
bdicos podem caber dentro de cada poro minsculo de um Buda, do
mesmo modo, bilhes de ensinamentos de Buda podem caber dentro de
cada palavra do Dharma. Tudo se interrelaciona e encaixa, como a
imagem da rede de Brahma na qual cada interseo de cordas contm um
espelho refletindo todos os outros espelhos da rede.Realmente no
podemos apreciar estas imagens simplesmente lendo-as. S as
poderemos apreciar se ns prprios encaixarmos todas as peas do
quebra-cabea do Dharma. Lentamente, a imagem comea a emergir
exatamente como descrita nos sutras do mahayana. Esta a maneira de
por mais energia nas nossas preliminares. Tentem ver cada aspecto
do Dharma refletido em cada minscula parte das preliminares, e ao
mesmo tempo transformem tudo na vida numa prtica preliminar.Se
sinceramente tomamos a nossa direo na vida do Dharma, estaremos
confiantes que tudo o que Buda ensinou faz sentido no
necessariamente a um nvel literal, mas conduzindo a um nvel de
significncia mais profundo e til para nos libertarmos do sofrimento
e nos dar a possibilidade de mais eficazmente ajudar os outros a
realizare