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Luciana Del-BenUniversidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS)[email protected]
Desde a aprovao da Lei no 11.769, em 18 de agosto de 2008, tm
sido frequentes os debates em torno da definio de polticas,
estratgias, planos de ao e propostas pedaggicas tendo em vista a
implementao do ensino de msica nas escolas de educao bsica. Esses
debates se alimen-tam de experincias, concepes e perspectivas
diversas, o que, espera-se, se alimenta do corpo de conhecimentos
construdo pela educao musical como rea acadmico-cientfica. E
constituem, assim, oportunidade mpar para refletirmos no somente
sobre como implementar propostas de ensi-no de msica nas escolas,
mas, tambm, sobre os discursos cientficos que temos produzido sobre
educao musical escolar.
Vincular os discursos cientficos a esses debates no significa
esperar uma correspondncia direta entre o discurso sobre educao
musical escolar de pesquisadores e estudiosos e as prticas
educativo-musicais desenvolvidas ou a serem desenvolvidas nas
escolas, o que seria simplificar os processos de construo das
prticas escolares. Diversos estudos, como aqueles desenvolvidos na
rea das polticas educacio-
1 Parte dos resultados deste trabalho foram apresentados no XX
Congresso Nacional da ABEM e publicados nos anais do evento (XXX,
2011).
2 Trabalho desenvolvido com Bolsa de Produtividade em Pesquisa
do CNPq.
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nais (MAINARDES, 2006; SMIT, 2005; WEAVER-HIGHTOWER, 2008), da
sociologia do currculo (FORQUIN, 1993), dos saberes escolares
(SOARES, 1999) ou da histria da educao (FARIA FILHO, 2007; FARIA
FILHO et al., 2004), indicam que ideias e discursos pedaggicos,
mesmo aqueles que se pretendem mais prescritivos, no so,
necessariamente, traduzidos em prticas educativas escolares, j que
essas prticas no se constituem como mera transposio de saberes
cientficos ou de discursos pedaggicos.
Essa literatura, entretanto, ao mesmo tempo em que aponta para
uma relativa autonomia das escolas e que reconhece o papel ativo
dos sujeitos escolares, indica que esses sujeitos e as prticas,
rotinas, normas, valores, condutas, comportamentos e saberes por
eles construdos, em contextos particulares e concretos tambm so
influenciados por processos sociais mais amplos (ver tambm CARDOSO,
2008; CUNHA, 2007; PESSANHA et al., 2004; GIMENO SACRISTN, 1998).
Para a constituio das prticas escolares, tambm contribuem outras
prticas, saberes e discursos diversos, o que inclui os
investimentos de pesquisadores e estudiosos que, a partir de
diferentes perspectivas, vm construindo distintos modos de pensar a
escolarizao (ver OLIVEIRA, 2007) como forma especfica de socializao
de crianas e jovens.
A relao entre essas diferentes instncias pode ser, entre outras,
de apropriao, convergncia, reconhecimento ou recontextualizao ou,
tam-bm, de tenso. Consoante essa perspectiva, no se pode esperar
que os discursos, sejam polticos ou cientficos, por exemplo,
antecipem, definam ou prescrevam o que dever acontecer nas escolas.
Resta examinar como se caracterizam esses discursos e que
finalidades eles assumem para si na sua relao com as prticas
escolares.
Com base nesses pressupostos, o interesse deste trabalho foi
refletir sobre caractersticas ou propriedades dos discursos de
pesquisadores e estu-diosos do campo da educao musical quando tomam
a educao musical escolar como objeto de estudo e sobre as
finalidades que assumem em relao s prticas escolares em msica.
Ressalto que o presente trabalho no busca focalizar a to discutida
relao entre teoria e prtica no campo da educao musical ou, mais
especificamente, a relao entre discursos de pesquisadores e
estudiosos e prticas educativo-musicais desenvolvidas
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pelos sujeitos escolares. Objetiva, isto sim, examinar como se
configuram os modos de pensar a educao musical escolar construdos
por pesquisadores e estudiosos no campo da educao musical. Esse
objetivo foi desdobrado nas seguintes questes: quais so as dimenses
dos fenmenos educativo--musicais escolares representadas nesses
modos de pensar? Que finalidades so atribudas ao ensino e
aprendizagem de msica na escola? Que tipos de asseres ou proposies
caracterizam esses modos de pensar; que dados as apoiam; como so
fundamentadas ou justificadas (ver LIAKOPOULOS, 2002; CUNHA,
2007)?
Para a consecuo do objetivo geral da pesquisa, adotei como
estratgia a anlise de documentos (FLICK, 2009; BOGDAN; BIKLEN,
1994), tambm chamada de anlise textual (CHARMAZ, 2009). Como
esclarece Flick (2009), a anlise de documentos pode ser tanto uma
das estratgias a serem utilizadas na pesquisa, complementando, por
exem-plo, observaes e entrevistas, quanto um mtodo autnomo, como o
caso deste trabalho.
Charmaz (2009) identifica dois tipos de textos: os chamados
textos extrados, em que os dados so produzidos em resposta a uma
solici-tao do investigador, e os chamados textos existentes, que
consistem de documentos variados, cuja elaborao no [teve] a
participao do pesquisador (CHARMAZ, 2009, p. 58). Essa autora
salienta que os tex-tos, sendo extrados ou existentes, no existem
como fatos objetivos []. As pessoas constroem textos para atender a
objetivos especficos e o fazem dentro de contextos sociais,
econmicos, histricos, culturais e situacionais (p. 58).
De modo semelhante, Flick (2009, p. 232) adverte que os
documen-tos no so somente uma simples representao dos fatos ou da
realidade. Algum (ou uma instituio) os produz visando a algum
objetivo (prtico) e a algum tipo de uso (o que tambm inclui a
definio sobre a quem est destinado o acesso a esses dados). Embora
os textos ou documentos sejam produtos, h processos subjacentes a
eles, processos que podem
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ser ambguos, invisveis e, possivelmente, irreconhecveis
(CHARMAZ, 2009, p. 64).
Os textos escolhidos como dados empricos foram os trabalhos
publi-cados na Revista da ABEM (Associao Brasileira de Educao
Musical) nas categorias artigos de desenvolvimento terico,
trabalhos empricos e ensaios, conforme definidos pela linha
editorial.
A escolha de publicaes da ABEM se justifica porque essa
Associao, alm de congregar diferentes profissionais da rea, tem
sido a grande responsvel pela divulgao e circulao da produo
cientfica brasileira em educao musical, tanto por meio dos
encontros nacional e regionais onde pesquisadores, formadores,
professores e futuros professores de diversos lugares do pas podem
partilhar conhecimentos e experincias de ensino e pesquisa quanto
por suas publicaes. Desde a sua fundao, a ABEM tem se comprometido
com a difuso do conhecimento em educao musical por meio de
diferentes tipos de publicaes. O nmero de artigos publicados, alm
da representativi-dade nacional e institucional de seus autores,
sinalizam que, dentre os peridicos cientficos brasileiros na rea de
msica, a Revista da ABEM pode ser considerada o veculo privilegiado
de divulgao da produo cientfica em educao musical no nosso pas.
Ao final de 2010, quando foram selecionados os textos, a Revista
contava com 24 nmeros publicados. A seleo dos trabalhos tomou como
base os seguintes critrios: a) referncia escola de educao bsica, em
quaisquer de suas etapas, mas excluindo, por suas finalidades, a
educao profissional de nvel mdio; b) referncia escola brasileira; e
c) referncia escola contempornea ao trabalho. Os artigos
referen-tes ao ensino superior foram considerados somente nos casos
em que a relao com a escola foi explicitada (ver MARIN; BUENO;
SAMPAIO, 2005, p.176). Alm disso, considerando o volume de artigos,
na etapa de seleo dos trabalhos a serem analisados, foram
consideradas somente as informaes constantes nos elementos
pr-textuais dos artigos: ca-bealho (ttulo do artigo; nome e
instituio de vnculo do(s) autor(es)), resumo e palavras-chave. Como
os resumos so apresentados somente a partir da Revista n. 5, os
quatro primeiros nmeros do peridico no foram considerados.
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Com base nas questes que nortearam a pesquisa, inicialmente,
foram definidos os seguintes indicadores de contedo, referentes aos
sujeitos e dimenses dos fenmenos educativos escolares:
professor/docente; aluno (beb, criana, adolescente, jovem, adulto,
infncia, adolescncia, juventude); escola (escolar, escolarizao,
nveis e etapas de ensino); ensino (prtica de
ensino/escolar/educativa/educativo-musical, estgio, aula);
aprendizagem; e saberes (conhecimento, currculo, projeto
poltico--pedaggico, disciplina, componente curricular). Esses
indicadores foram buscados nos ttulos, resumos e palavras-chave3.
Inspirada pelo estudo de Marin, Bueno e Sampaio (2005),
posteriormente, como estratgia para dar inteligibilidade aos textos
como um conjunto, os indicadores foram agrupados em quatro campos
temticos: alunos, escola, professores e saberes escolares.
Selecionados os textos, constru um protocolo de leitura dos
elemen-tos pr-textuais, assim constitudo: ano de publicao, autor,
instituio de vnculo, campo temtico, tema principal, nvel de ensino,
metodologia (abordagem, estratgia principal, tcnica de coleta de
dados, fonte de dados) e referencial terico (ver MARIN; BUENO;
SAMPAIO, 2005).
Por fim, procedi leitura integral de cada artigo, orientada,
mais uma vez, pelas questes norteadoras da pesquisa. Considerando a
diversidade de formas de construir os textos, destaco, na anlise,
alguns aspectos dos modos de pensar a educao musical escolar que
atravessam a produo no seu conjunto, procurando identificar
tendncias e recorrncias.
A anlise dos elementos pr-textuais dos 217 artigos publicados
nos
vinte nmeros da Revista da ABEM entre 2000 e 2010, indica que 81
deles (37,3%) tomam a educao musical escolar como objeto de estudo,
de modo central ou perifrico. Conforme a Tabela 1, em 18 dos nmeros
analisados essa temtica foi contemplada, sendo que em 14 nmeros ela
representa pelo menos 30% dos artigos. A ausncia de artigos no
nmero 18 pode ser justificada por ser esse um nmero especial da
Revista, que publicou textos
3 As palavras-chave so informadas somente a partir da Revista n.
8, de maro de 2003.
Zak JamesHighlight
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dos convidados, a maioria estrangeiros, do XVII Encontro
Nacional da ABEM/Conferncia Regional da ISME na Amrica Latina.
Tabela 1 - Distribuio anual de artigos sobre educao musical
escolar.
Nmero da Revista
Ano de publicao
Total de artigos
Nmero de artigos sobre
educao musical escolar
Porcentagem de artigos
sobre educao
musical escolar5 2000 8 0 06 2001 9 3 33,37 2002 9 4 44,48 2003
18 4 22,29 2003 9 3 33,310 2004 13 8 61,511 2004 11 8 72,712 2005
13 7 53,813 2005 9 4 44,414 2006 13 2 15,415 2006 10 3 30,016 2007
11 5 45,517 2007 10 2 20,018 2007 8 0 019 2008 14 4 28,620 2008 9 4
44,421 2009 13 5 38,522 2009 9 3 33,323 2010 9 6 66,724 2010 12 6
50,0
TOTAL 217 81 37,3
Embora as porcentagens paream expressivas, preciso lembrar que
os nveis de ensino abrangidos pela educao bsica so os mais
represen-tativos de todo o sistema educacional, incluindo o perodo
de escolaridade obrigatria (MARIN; BUENO; SAMPAIO, 2005, p. 177). H
que se ressal-tar tambm que a produo sobre a educao musical escolar
diminui na segunda metade da dcada, perodo em que se intensificaram
os debates acerca da insero do ensino de msica na escola, que
culminaram com a
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aprovao da Lei no 11.769/2008: no perodo 2000-2005 essa produo
representa 41,4% do total de artigos, enquanto que no perodo
2006-2010, cai para 33,8%.
So 69 os autores responsveis pelo conjunto de artigos
analisados,
sendo que vinte contam com mais de um autor. O elevado nmero de
autores parece ser decorrncia da expanso da pesquisa no pas e do
aumento do nmero de mestres e doutores, j que so vrios os trabalhos
resultantes de dissertaes e teses. No entanto, a mdia de 1,17
artigos por autor sugere certa disperso da produo. Alm disso,
somente vinte dos 69 autores assinam mais de um artigo ao longo de
11 anos: 13 deles so responsveis por apenas dois artigos e os
demais so responsveis por, pelo menos, trs artigos. Esses so
aspectos que podem dificultar a continuidade e o consequente
aprofundamento das pesquisas sobre a temtica em anlise.
Quanto ao vnculo institucional, reduzida a participao de autores
vinculados escola, pois somente 13% deles indicam vnculo com
escolas de educao bsica, embora no de modo exclusivo. A maioria dos
autores est vinculada a instituies de ensino superior,
principalmente universidades pblicas. Ao menos na produo em anlise,
a educao musical escolar pensada principalmente por aqueles que
esto fora das escolas. A pesquisa feita por professores da educao
bsica parece algo ainda distante na rea de educao musical no
Brasil, como observam Werle e Bellochio (2009, p. 33) em um dos
artigos analisados na pesquisa: fala-se mais sobre o trabalho dos
docentes do que eles escrevem sobre o que fazem.
Com base na anlise dos elementos pr-textuais dos 81 artigos,
apre-sento, na Tabela 2, a distribuio anual dos artigos conforme os
campos temticos contemplados.
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Tabela 2 - Distribuio dos artigos conforme campos temticos.
Ano Campos temticos
Alunos Escola Professores Saberes escolares2000 0 0 0 02001 0 0
2 12002 0 0 3 22003 0 0 4 32004 3 0 8 102005 3 1 4 82000-2005 6 1
21 242006 0 0 3 22007 0 1 4 32008 1 1 0 82009 4 0 3 32010 4 1 5
52006-2010 9 3 15 21TOTAL 15 4 36 45
Os dados sinalizam que a educao musical escolar tem sido
inves-tigada principalmente a partir da perspectiva dos saberes
escolares e dos professores, campos que so abordados,
respectivamente, em 55,6% e 44,4% dos 81 artigos analisados. Os
campos alunos e escola correspondem, respectivamente, a somente
18,5% e 4,9%. A ordem de frequncia dos quatro campos a mesma nos
dois perodos, mas parece haver, ao longo da dcada, uma tendncia de
ampliar a compreenso da educao musical escolar a partir da
perspectiva da instituio e, principalmente, da dos alunos.
Em relao ao campo temtico alunos, a principal tendncia parece
ser a de investigar suas prticas musicais e suas relaes com msica,
tema cor-respondente a 60% do total de 15 trabalhos inseridos nesse
campo. Tambm foram identificados outros trs temas principais:
avaliao da aprendizagem/desenvolvimento musical, com 20% do total
de ocorrncias; processos de aprendizagem, com 13,3%; e motivao para
aprender, com 6,7%. Em relao ao campo temtico escola, dois foram os
temas encontrados: a implementao/insero do ensino de msica nas
escolas, presente em trs dos quatro artigos analisados, e a
contextualizao sociopoltica da escola, presente somente em um
trabalho. O reduzido nmero de trabalhos nesse campo temtico no
permite inferncias sobre tendncias da produo.
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No campo temtico professores os temas principais identificados
foram distribudos conforme tabela a seguir.
Tabela 3 - Distribuio dos artigos conforme temas principais no
campo temtico professores.
Tema principal Nmero de ocorrncias Porcentagem
Formao: Fundamentos/princpios orientadores 16 32,7Estratgias de
formao 7 14,3Anlise/descrio da formao de professores 6 12,2Polticas
de formao 3 6,1Anlise de currculos/projetos/propostas de formao 3
6,1Prticas docentes: modos de pensar e agir de professores 14
28,6
TOTAL 49* 100
*Total maior que o nmero de artigos no campo temtico porque um
mesmo artigo pode tratar de mais de um tema principal.
Trabalhos que discutem a formao de professores ainda so
predo-minantes, somando mais de 70% do total de artigos que tratam
do campo temtico professores. A maioria desses trabalhos se dedica
a discutir fun-damentos e princpios capazes de orientar os
processos formativos, o que, talvez, se justifique pelas reformas
educacionais levadas a cabo na primeira metade da dcada de 2000
(BRASIL, 2002; 2004), que demandaram a reformulao dos currculos das
licenciaturas, e, tambm, pela vinculao institucional dos autores,
antes mencionada. Muitos dos que estudam ou investigam a educao
musical escolar so formadores de professores. reduzida, no entanto,
a porcentagem de trabalhos que se propem a analisar currculos,
projetos e propostas de formao de professores. Alm disso,
comparativamente, as prticas docentes, isto , os modos de pensar e
agir dos prprios professores, ainda parecem despertar menor
interesse nos estudiosos da rea.
Por fim, no campo temtico saberes escolares seis foram os temas
principais identificados, como registrado na Tabela 4.
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Tabela 4 - Distribuio dos artigos conforme temas principais no
campo temtico saberes escolares.
Tema principal Nmero de ocorrncias Porcentagem
Presena/ausncia da msica nas escolas: 13 25 Estudos descritivos
8 15,4 Estudos de polticas, legislao e termos normativos 6
11,5Fundamentos para a organizao dos currculos/saberes escolares 13
25
Natureza, justificativas e finalidades da msica/educao musical
11 21,2
Apresentao de proposta curricular 10 19,2Anlise de diretrizes e
propostas curriculares 3 5,8Estudo de prticas escolares 2 3,8
TOTAL 52* 100*Total maior que o nmero de artigos no campo
temtico porque um mesmo artigo pode tratar de mais de um tema
principal.
Estudos sobre a presena/ausncia da msica nas escolas, seja no
sen-tido de descrever o que acontece nas escolas, seja no de
analisar aspectos legais e polticos, representam um quarto do total
de trabalhos nesse campo temtico. expressiva a porcentagem de
trabalhos que se dedicam a apre-sentar fundamentos para a organizao
curricular, de modo semelhante ao que foi observado em relao formao
de professores, ou a apresentar propostas a serem desenvolvidas nas
escolas. Tambm so frequentes os estudos que discutem o que se
poderia nomear como aspectos filosficos, como natureza,
justificativas e finalidades da msica e da educao musi-cal. Em
contraposio, as prticas escolares esto pouco representadas no
conjunto dos trabalhos do campo temtico em anlise.
Os dados acerca dos principais temas tratados na produo em
anlise nos campos temticos professores e saberes sinaliza o
predomnio de traba-lhos que buscam apresentar ou definir princpios
e fundamentos orientadores
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das prticas, sejam as de formao de professores, sejam aquelas
realizadas por professores nas escolas de educao bsica.
A inteno parece ser a de definir um ideal de formao e atuao,
que, algumas vezes, assume um carter prescritivo, definindo o que
deve ou precisa ser feito, verbos frequentes em vrios artigos. Esse
discurso ideal pode ser uma estratgia para superar problemas
identificados a partir da leitura integral dos artigos que so
retomados em textos de diferentes pe-rodos da produo analisada,
como a desvalorizao do ensino de msica nos contextos escolares,
decorrente da natureza da msica e dos usos e funes que lhe so
atribudos na escola, considerados limitados; vinculada a essa
desvalorizao, a ausncia de definies claras na legislao sobre a
participao da msica nos processos de escolarizao na educao bsica;
e, como decorrncia desse ltimo, a escassez de professores de msica
nas escolas, aliada presena pouco expressiva da msica como
componente especfico dos currculos escolares.
Alm disso, a definio de princpios e fundamentos, principalmente
no mbito da formao de professores, parece ser um caminho para que
escolas e professores sejam incitados (e orientados) a construir
outras prticas educativo-musicais, visando a superar o que alguns
autores definem como um abismo enorme entre o que ensinado na
escola e o que vivido fora dela (NUNES, 2003, p. 62) ou como uma
distncia infinita entre a msica da escola e a msica da vida (PENNA,
2003, p. 78).
Alguns textos, por meio das asseres apresentadas, auxiliam a
escla-recer que esse abismo ou distncia decorrente dos modos pelos
quais, de um lado, os alunos (principalmente adolescentes e jovens)
e, de outro, os professores se relacionam com msica. Como afirma
Oliveira (2006, p. 32), por exemplo, a escola s vezes esquece que o
jovem se articula na prpria cultura atravs das experincias que
vive. Para Souza (2004, p. 9), as escolas propiciam aos alunos uma
relao abstrata com a msica. Como consequncia, o currculo escolar no
amplia as questes relevantes da vida dos alunos para alm do espao
da escola (p. 10). Subtil (2005, p. 72) tambm critica a relao da
escola com as experincias dos alunos e prope o questionamento da
lgica escolar transmissora de conhecimen-tos que releva para
segundo plano a expresso dos sujeitos sobre o que e como
pensam.
Zak JamesHighlight
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O que chama a ateno, nesses casos, que a relao conflitante entre
escola e alunos parece ser tomada como premissa ou pressuposto, j
que so raros os trabalhos analisados que tratam das relaes dos
alunos com a educao musical escolar. As experincias de aprendizagem
de/com msica que a escola intencionalmente organiza para os
estudantes (ver MOREIRA; CANDAU, 2007) so tomadas, de modo geral,
como inadequadas ou pou-co significativas para os alunos, sem que
essas experincias sejam, de fato, analisadas.
As crticas tomam outras feies nos trabalhos que focalizam
concep-es e prticas educativo-musicais de professores nas escolas.
recorrente a ideia de que falta clareza sobre as funes, contedos e
prticas de ensino de arte [msica] nas escolas (PENNA, 2004, p. 12)
ou de que os professores tm vises equivocadas ou reducionistas
sobre a educao musical escolar (BELLOCHIO, 2002, p. 45; SOBREIRA,
2008, p. 49). O equvoco, nesses casos, no faz referncia distncia
entre as prticas escolares e as relaes dos alunos com msica fora da
escola, mas, principalmente, s chamadas finalidades extrnsecas
atribudas pelos professores educao musical escolar, sejam
professores unidocentes, sejam especialistas. Spanavello e
Bellochio (2005), por exemplo, criticam as professoras por elas
investigadas porque no consideram a msica pelas especificidades do
conhecimento musical, mas pela sua possibilidade de servir como
apoio metodolgico s demais reas do conhecimento (p. 94). Crticas
semelhantes so encon-tradas em outros trabalhos (por exemplo,
ANDRAUS, 2006; BEAUMONT; BAESSE; PATUSSI, 2006; CERESER, 2004; DEL
BEN; HENTSCHKE, 2002; DINIZ; DEL BEN, 2006; HUMMES, 2004).
As finalidades extrnsecas atribudas pelos professores educao
musical escolar vo de encontro s finalidades defendidas pelos
autores das investigaes. Bellochio (2001, p. 46), por exemplo,
sustenta, baseada em Paulo Freire, que uma das dimenses da msica na
escolarizao a Humanizao crtica dos sujeitos escolares, finalidade
que se aproxima da educao musical emancipatria proposta por Mller
(2004). Para Bellochio (2001, p. 46), a Humanizao est imbricada
concepo de Msica como campo do conhecimento especfico, como so
outras reas do saber. A autora, apoiando-se em Penna (1995, apud
BELLOCHIO, 2001, p. 46), prossegue e define como sentido da msica
na educao bsica o
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de ampliar o universo artstico cultural do aluno e realizar um
projeto de democratizao no acesso arte e cultura; ou, como prope
Penna (2003, p. 77), em um dos artigos analisados neste trabalho, a
expanso da experincia artstica e cultural dos alunos. A relao da
humanizao com a democratizao do acesso arte e cultura, no entanto,
no desenvolvida.
Essas ideias remontam s filosofias intrnsecas e extrnsecas da
educao musical identificadas por Temmerman (1991, apud FERNANDES,
2004), e apresentadas por Fernandes (2004). A primeira perspectiva
defende que os valores da educao musical esto contidos no valor da
prpria msi-ca; a finalidade da educao musical seria, assim, o
desenvolvimento da conscincia e da sensibilidade esttica
(FERNANDES, 2004, p. 83), o que inclui tratar a msica como um
significante modo simblico disponvel aos indivduos (TEMMERMAN,
1991, apud FERNANDES, 2004, p. 83). A perspectiva extrnseca
justifica a educao musical por seus chamados valores instrumentais
ou utilitrios, como desenvolvimento emocional, meio para a
comunicao social, valor espiritual, lazer e recreao, entendimento e
tolerncia cultural, entre outros (FERNANDES, 2004, p. 83).
O que se pode perceber um binarismo que atravessa os modos de
entender finalidades e prticas de educao musical escolar na
literatura analisada, o que pode dificultar a compreenso mais
aprofundada do que acontece nas escolas e porque acontece. Os
artigos de Duarte e Mazzotti (2002, 2006) parecem propor a superao
desse binarismo quando ques-tionam: a msica em si e por si? Em um
sentido , caso contrrio nem poderia ser objeto de conversa, pois no
teria qualquer limite. Em outro sentido no, pois ela uma atividade
humana e um produto humano, logo marcado pelo que no msica (DUARTE;
MAZZOTTI, 2002, p. 33).
As razes dos professores para atriburem as chamadas finalidades
extrnsecas educao musical escolar no so explicitadas, ao contrrio
do que recomendam Duarte e Mazzotti (2002); so apenas consideradas
um reducionismo, para cuja transformao a formao torna-se essencial,
como defende Penna (2007, p. 52):
So diversas as dificuldade que cercam a educao musical na
escolar regular, envolvendo tambm o contraste entre a cultura
escolar com suas caractersticas especficas, e o dinamismo das
experincias musicais cotidianas, como vem sendo
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apontado por diversos autores (cf. Arroyo, 2005). Sendo assim,
tais questes no se esgotam na discusso da formao do professor,
embora essa seja essencial, inclusive para o desenvolvimento da
capacidade de reflexo e crtica, indispen-sveis para a renovao da
prpria cultura escolar.
Mas onde est a cultura escolar na produo em anlise?
A pergunta acima pe em questionamento a relao dos artigos
analisados com as realidades escolares. Embora mais da metade dos
81 artigos (51%) seja resultante de pesquisas empricas, 38% dos
trabalhos apresentam um carter ensastico ou so estudos tericos e de
reviso bibliogrfica, sendo que os ensaios (ou trabalhos de carter
ensastico) somam 33% do total. Os 11% restantes so propostas de
ensino e relatos de experincias diversas.
Essas modalidades sinalizam que boa parte da produo analisada no
se constri a partir de dados sistematizados provenientes das
realidades escolares, seus sujeitos, concepes e prticas; no se
alimenta da empiria, mas sim, da prpria produo cientfica. Alm
disso, a discusso anterior sobre as prticas escolares e sobre as
finalidades atribudas por professores educao musical escolar sugere
que, nesses casos, o emprico tende a ser considerado menos
consistente que a prpria literatura sobre educao musical. Da a
necessidade, apontada em vrios trabalhos, de transformao do
emprico.
Em relao aos alunos, o olhar dos pesquisadores e estudiosos
parece mais generoso. Os artigos de Arroyo (2005), Lino (2010),
Ribas (2009), Sebben e Subtil (2010), Silva (2004), Souza (2004),
Subtil (2005), Wille (2005) e Wolffenbttel (2004) se propem a
compreender como crianas, adolescentes, jovens e adultos que
frequentam as escolas se relacionam com msica e os significados que
a ela atribuem, dentro e fora da escola. E ressaltam a potncia
contida nessas relaes e significados para pensar no s propostas de
educao musical (ver ARROYO, 2005), mas a prpria rea de educao
musical (ver SOUZA, 2004).
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Ainda sobre a relao dos textos com as realidades empricas, cabe
ressaltar que os trabalhos tendem a privilegiar dimenses ou
sujeitos espe-cficos, e no o ato pedaggico que envolve o aluno, o
saber, o professor, a situao institucional etc., no qual a anlise
do comportamento em situ-ao sobrepe-se anlise do comportamento em
si (PIMENTA, 1998, p. 46 grifos da autora). Os sujeitos escolares
parecem pensar e agir num espao abstrato, j que as escolas, como
instituio, assim como os sistemas educativos em que esto inseridas,
esto praticamente ausentes dos artigos analisados. As condies de
trabalho dos professores, a estrutura e a cultura organizacional
das escolas e dos sistemas de ensino raramente so tomadas como
categorias a serem analisadas.
As especificidades da escola parecem diludas nos trabalhos. H
traba-lhos que se referem simultaneamente escola e a outros espaos
educati-vos, como escolas de msica, projetos sociais e, de modo
mais indefinido, espaos fora da escola. A disperso da escola em
meio a outros espaos pode ter relao com o entendimento de que so
mltiplos os espaos de educao musical na sociedade (KRAEMER,
2000).
Outros trabalhos no especificam qualquer nvel de ensino,
apresentan-do termos como escola pblica, escola regular ou contexto
escolar. O ensino fundamental o nvel mencionado com maior
frequncia, principalmente os anos iniciais. A educao de jovens e
adultos foi mencionada somente em dois artigos. Esses dados parecem
sinalizar que as especificidades das diferentes etapas da
escolarizao na educao bsica no tm sido sufi-cientemente tematizadas
pela rea de educao musical.
Mesmo trabalhos que se propem a analisar prticas desenvolvidas
nas escolas e a apontar especificidades da escola como espao de
educa-o musical, como os de Beineke (2001), Bellochio (2002, 2003),
Del Ben e Hentschke (2002), Kleber e Cacione (2010), Mateiro
(2003), Mateiro e To (2003) e Targas e Joly (2009), no trazem a
escola para dentro de seus textos. A instituio escolar est l, mas
suas prticas, tradies, condies, contradies, caractersticas e
finalidades parecem no ser consideradas na anlise daquilo que nela
se pensa e se faz. Essa invisibilidade da escola nos artigos
analisados se contrape recorrente defesa da necessidade de
aproximao entre cursos de formao de professores e os contextos
reais de trabalho dos professores, como exemplifica a afirmao de
Beineke (2001,
-
p. 95): atravs do dilogo reflexivo com as prticas profissionais
que se formam profissionais mais comprometidos e conhecedores das
complexi-dades que caracterizam as dinmicas escolares.
Por outro lado, preciso considerar que pensar a educao musical
escolar no implica, necessariamente, tom-la como unidade emprica de
investigao, como esclarece Sposito (2003). Ao defender a relevncia
de os estudos no campo da sociologia adotarem uma perspectiva no
escolar no estudo da escola, Sposito (2003, p. 215) salienta a
neces-sidade de
considerar uma distino importante entre a categoria analtica
escola e a unidade emprica escola objeto de investigao. A relevncia
analtica da instituio escolar no implica necessariamente o seu
estudo emprico, sendo esse o primeiro aspecto da via no escolar no
estudo sociolgico da escola. O segundo reside na idia de que, mesmo
considerando-se a escola como unidade emprica de investigao,
preciso reconhecer que elementos no escolares pe-netram, conformam
e so criados no interior da instituio e merecem, por sua vez, tambm
ser investigados.
De modo semelhante, Zago (2004), na apresentao do dossi Estudos
sobre a escola em diferentes contextos sociais, da revista
Perspectiva, alerta que, nesses estudos,
a escola no tratada (...) no sentido redutor das suas fronteiras
fsicas e no se limita tambm aos fenmenos escolares circunscritos
sala de aula, s prticas pedaggicas ou relao professor-aluno, mas
designa uma construo inte-lectual em torno do objeto de estudo
escola (CANRIO, 1996), uma maneira de interrogar e problematizar
fenmenos escolares sob diferentes ngulos de anlise. (...) A segunda
idia no entendimento do recorte adotado de que uma anlise
sociolgica da escola integra necessariamente certos fenmenos que
ocorrem fora da escola, no contexto local ou em outras instncias de
so-cializao como a famlia. (DURUBELLAT; VAN ZANTEN, 1999, p. 8,
traduo nossa). (ZAGO, 2004, p. 13)
No se trata de defender a realizao de trabalhos com uma viso
reducionista, que entendam a educao musical escolar como estando
restrita ao que se pensa e se faz dentro dos limites fsicos da
instituio (ver SPOSITO, 2003, p. 217), j que a escola no se constri
sem estabe-lecer relaes com outros mbitos da sociedade. Mas pensar
a educao musical escolar demanda que sejam contemplados tambm os
processos
-
e prticas internos s instituies. Ela no pode ser pensada sem a
escola, como sinaliza Vago (2009, p. 25), no artigo em que prope
maneiras de pensar a Educao Fsica na escola. O autor toma como
princpio para suas reflexes o pertencimento da Educao Fsica ao
domnio da educao, o que lhe confere uma identidade fundamental como
prtica da escola, organizada por professores da escola para a
interveno na formao de crianas, de adolescentes, de jovens e de
adultos em sua histria escolar (Vago, 2009, p. 26). E a escola,
para Vago (2009), precisa ser compreendida como um lugar
singular:
O lugar a escola. Um lugar com uma identidade, uma
responsabilidade social, uma expectativa social.Escola no clube.
Escola no academia de ginstica. Escola no centro de treinamento
esportivo. A escola no a rua, ou a praa do bairro. Escola no tempo
nem equipamento de lazer. Embora possa estabelecer relaes com todos
esses lugares, a escola um tempo e um lugar singular, que no pode
ser nem confundido com (nem substitudo por) nenhum desses.
Fundamental pensar ento o que este lugar, a escola. (VAGO, 2009, p.
26)
Kraemer (2000) define o objeto de estudo da educao musical
como
campo de conhecimento nos seguintes termos:
A pedagogia da msica4 ocupa-se com as relaes entre as pessoa(s)
e a(s) msica(s) sob os aspectos de apropriao e de transmisso. Ao
seu campo de trabalho pertence toda a prtica msico-educacional que
realizada em aulas escolares e no escolares, assim como toda
cultura musical em processo de formao. (KRAEMER, 2000, p. 51)
Tomando Kraemer (2000) como base, possvel concluir que pensar a
educao musical escolar significa pensar as relaes que as pessoas
es-tabelecem com msica, sob os aspectos da transmisso e da
apropriao, ou do ensino e da aprendizagem, em (ou com referncia a)
um contexto especfico: a escola, instituio com uma histria, com
finalidades especfi-
4 Souza (2000) esclarece que o termo pedagogia musical
(Musikpdagogik) utilizado na literatura alem para designar a rea
como cincia, enquanto que o termo educao musical (Musiker-ziehung)
refere-se prtica da educao musical. Segundo a autora, esses termos
ainda no esto claramente definidos no Brasil.
-
cas, uma estrutura e uma cultura organizacional, modos prprios
de pensar e agir (ver SOARES, 1999), e que, como espao de educao
obrigatria, deve seguir regulamentaes e normatizaes especficas.
Como indicam as temticas identificadas nos trabalhos, boa parte
da produo analisada se constri a partir das relaes que os sujeitos
escolares, principalmente os professores, estabelecem com msica e,
mais especifica-mente, com o ensino e a aprendizagem de msica. As
relaes so descritas, mas, quando se trata de prticas escolares, de
modo geral, ou das concepes e prticas dos professores, nem sempre
so acolhidas. O campo emprico visto como equivocado, inconsistente,
em contraposio ao conhecimento cientfico ou ao conhecimento trazido
pela literatura da rea.
Alm disso, embora mais da metade dos artigos analisados se
caracte-rize como pesquisa emprica, que se aproxima dos sujeitos
escolares, eles parecem pensar e agir num lugar ainda pouco
estudado, j que as escolas, como instituio, assim como os sistemas
educativos em que esto inseridas, esto praticamente ausentes dos
artigos analisados. A educao musical escolar pensada sem considerar
as particularidades do lugar em que acontece ou em que se espera
que acontea. As particularidades existem, tanto que se argumenta
ser necessrio aproximar os cursos de formao e os futuros
professores dos contextos escolares, mas no so explicitadas ou
analisadas em profundidade; ou se diluem na multiplicidade de
espaos que caracteriza o campo da educao musical (KRAEMER, 2000). A
escola, embora sempre presente, um espao que parece invisvel na
produo analisada. Mesmo assim, precisa ser transformada.
Essa necessidade de transformao parece justificar o expressivo
nmero de trabalhos que se dedica a discutir fundamentos e princpios
capazes de orientar tanto os processos formativos quanto a
organizao dos currculos e prticas escolares. Esses trabalhos
definem um ideal de formao e atuao, que serviria para superar
problemas e construir outras prticas educativo-musicais, conforme
antes destacado, mas, como tambm j destacado, no h garantias de que
sero, necessariamente, traduzidos em prticas educativas
escolares.
Os resultados sugerem que boa parte da produo analisada no se
alimenta da empiria, mas sim, da prpria produo cientfica. So
discursos
-
construdos para as realidades escolares, mas, predominantemente,
no so construdos nas realidades ou a partir delas, o que pode
diminuir sua capa-cidade de fertilizar as prticas (PIMENTA, 1998) e
transformar as realidades. possvel, ainda, que os trabalhos
analisados no tratem especificamente das escolas porque, primeiro,
precisam tratar da educao musical: como se constitui, a que
finalidades serve ou deveria servir, como deve ser realizada,
independentemente do contexto em que acontece.
Concluindo, os resultados aqui apresentados constituem um modo
de pensar o modo como temos pensado a educao musical escolar. Como
tal, no esgotam as possibilidades de outras anlises, nem mesmo a
produo da rea de educao musical, j que este trabalho se centrou
sobre artigos publicados em um nico peridico cientfico ao longo de
uma nica dcada. Espero, no entanto, que, ao apresentar um breve
inventrio tanto daquilo que j foi investigado quanto de como foi
investigado, este trabalho possa contribuir para um mapeamento do
estado da arte do conhecimento produzido sobre a temtica em questo.
Espero, tambm, que ele nos incite a continuar refletindo tanto
sobre os conhecimentos que temos produzido sobre educao musical
escolar, e como os temos produzido, quanto so-bre nossa capacidade
no s de problematizar as realidades escolares (ver JURDANT, 2006),
mas tambm de fertiliz-las (ver PIMENTA, 1998) por meio de nossas
prprias produes.
Resumo. Este trabalho teve como objetivo investigar como se
configuram os modos de pensar a educao musical escolar construdos
por pesquisadores e estudiosos no campo da educao musical. Para a
realizao da pesquisa, esse objetivo foi desdobrado nas seguintes
questes: quais so as dimenses dos fenmenos educativo-musicais
escolares representadas nesses modos de pensar? Que finalidades so
atribudas ao ensino e aprendizagem de msica na escola? Que tipos de
asseres ou proposies caracterizam esses modos de pensar; que dados
as apoiam; como so fundamentadas ou justificadas? Adotando como
estratgia de pesquisa a anlise de documentos, foram tomados como
dados empricos os artigos publicados na Revista da ABEM, que foram
analisados quantitativa e qualitativamente, tomando como base as
ques-tes orientadoras da pesquisa. Os resultados indicam algumas
caractersticas do conhecimento produzido pela rea sobre educao
musical escolar, e permitem um breve inventrio tanto daquilo que j
foi investigado quanto de como foi investigado.
Palavras-chave: educao musical escolar, produo cientfica em
educao musical, Revista da ABEM.
-
Abstract. This paper aimed at to analyze the ways of thinking
about music education in schools elaborated by Brazilian
researchers in the field of music education. The following
questions guided the investigation: what are the dimensions of the
school music educational phenomena represented in these ways of
thinking? What purposes are allocated to music teaching and
learning in schools? What types of assertions or propositions
characterize these ways of thinking; which sort of data support
these assertions or propositions; how are they grounded or
justified? Adopting the analysis of documents as the research
strategy, papers published in the Revista da ABEM (Journal of the
Brazilian Association of Music Education) were quantitatively and
qualitatively analyzed, based on the guiding questions. The results
show some characteristics of the knowledge produced by the area
about music education in schools, and allow a brief inventory both
of what has already been investigated and how it was
investigated.
Keywords: school music education, scientific production in music
education, Revista da ABEM.
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Recebido em 10/05/2013Aprovado em 11/07/2013