Louise Carolyn Sinclair Hooton outubro de 2015 Caracterização do conteúdo em NPN (Azoto Não-Proteico) no leite e estudo do seu impacto nos rendimentos de transformação de leite em queijo Universidade do Minho Escola de Engenharia Trabalho efetuado sob a orientação do Professor Doutor António Augusto Martins de Oliveira Soares Vicente e do Engenheiro Arlindo Augusto Pinho dos Reis Dissertação de Mestrado Mestrado Integrado em Engenharia Biológica Ramo de Tecnologia Química e Alimentar
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Louise Carolyn Sinclair Hooton
outubro de 2015
Caracterização do conteúdo em NPN (Azoto Não-Proteico) no leite e estudo do seu impacto nos rendimentos de transformação de leite em queijo
Universidade do MinhoEscola de Engenharia
Trabalho efetuado sob a orientação do Professor Doutor António Augusto Martins de Oliveira Soares Vicente e do Engenheiro Arlindo Augusto Pinho dos Reis
Dissertação de Mestrado Mestrado Integrado em Engenharia Biológica Ramo de Tecnologia Química e Alimentar
iii
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador acadêmico, o Professor António Vicente, pela ajuda e disponibilidade ao longo do
desenvolvimento desta dissertação e ao meu orientador da empresa, o Engenheiro Arlindo Reis, pelo
constante apoio, dedicação, orientação e exigência, fundamentais para a evolução e o aperfeiçoamento
deste projeto.
Ao Engenheiro Rui Batista, pela oportunidade de realizar este estágio curricular na empresa Bel Portugal.
À equipa de receção de leite, em especial ao Engenheiro Jorge Ferreira pela prontidão e por todos
conhecimentos partilhados, e à Helena Pinto pela ajuda indispensável para a realização deste trabalho.
À equipa de laboratório, pela simpatia, total disponibilidade e ajuda prestada diariamente na realização
de determinadas tarefas.
Ao professor Fernando Pereira pela orientação e disponibilidade nas análises estatísticas no SPSS
Statistics 23.0® e à professora Maria José Xavier por todos os conhecimentos transmitidos.
Ao pessoal da empresa, que me acolheu com tanta simpatia e me acompanhou todos os dias com uma
boa disposição contagiante.
A todos os meus amigos, em especial à Adriana, Cátia, Joana, Liliana, Margaria e Sara pela amizade
verdadeira e por todos os momentos incríveis que passamos juntas.
Ao João por estar sempre presente nos melhores e nos piores momentos, por toda a força e paciência,
mas acima de tudo pelo apoio, carinho e dedicação.
À minha mãe e ao meu irmão pelo incentivo, por acreditarem em mim e, principalmente, pelo apoio
incondicional.
v
RESUMO
No fabrico de queijo, a proteína é a fração do leite mais importante, em termos tecnológicos e
económicos. As principais frações azotadas no leite são as caseínas, as proteínas séricas (PT) e o azoto
não-proteico (NPN), que compõem a proteína bruta (PB). A fração de NPN, é a diferença entre a PB e a
PT, por unidade de PB, que perfaz cerca de 3 % - 6 % da PB do leite. Em Portugal a valorização do teor
proteico do leite é definida de acordo com a PB. Visto que o NPN não é retido no queijo e é a caseína
que determina o rendimento de produção de queijo, prevê-se que é possível alcançar um controlo mais
preciso do processo pela padronização do leite pela PT ao invés da PB, eliminando a entropia do NPN.
Os objetivos deste trabalho foram a caracterização das frações azotadas do leite dos produtores e do
leite padronizado para produção de queijo, investigar os fatores que contribuem para a variação do NPN
no leite recebido, comparar o rigor da padronização de leite para a produção de queijo, através da PB e
da PT, e estudar o impacto do NPN no rendimento de produção de queijo e na sua qualidade sensorial.
A metodologia usada foi a criação do canal de leitura da PT, no equipamento MilkoScan FT 120, para a
determinação do NPN; analisar diariamente amostras de leite de produtores e das cubas de produção.
Foram construídos modelos para análise dos resultados das amostras de leite dos produtores, e das
cubas de produção, tendo por base a informação nos mapas de gestão de produção da empresa, de
forma a incorporar a informação da PT e do NPN. Efetuou-se a análise de inquéritos entregues aos
produtores, referentes às técnicas de maneiro e nutrição no Software SPSS Statistics 23.0®.
A análise do leite dos produtores mostrou que o conteúdo de PB varia no intervalo de 3,03 % até 3,62
%, a PT varia de 2,94 % até 3,43 %, o teor de NPN na PB varia de 2,90 % até 5,75 % e a de ureia varia
de 0,0078 g/dL até 0,0335 g/dL. Observou-se uma relação positiva ente o conteúdo de PB e o
percentual de NPN na PB (R²=0,6286), indicando que o aumento da PB resulta em aumentos mais que
proporcionais do teor de NPN na PB, e na diminuição da percentagem de PT na PB. As variações destes
parâmetros podem estar associadas ao tamanho e dimensão de produção das explorações, à estação
do ano, mas em particular à alimentação. As técnicas de maneio e nutrição que mostraram ter um maior
impacto no NPN e na ureia foram o Unifeed, Mix, silagem de milho e erva em trincheira. A padronização
do leite através do uso da PT em vez da PB não apresentou diferenças na precisão. Em relação à
produção de queijo o NPN mostrou diminuir o seu rendimento e o incremento de 1 % de NPN no leite
resulta na perda de 11,39 €, 26,69 € e 29 € por tonelada de queijo produzidos, para 3 dos queijos mais
produzidos na empresa. Os resultados da análise sensorial indicaram que a ureia origina sabores
When producing cheese, in technical and economic terms, protein is the most important nitrogen fraction
of milk. The main nitrogen fractions in milk are caseins, whey proteins (TP) and non-protein nitrogen
(NPN), which make up the crude protein fraction (CP). The NPN fraction, consisting of several compounds
such as urea, is the difference between PB and PT, per PB unit, which amounts to approximately 3% - 6%
of the CP in milk. In Portugal the valuation of the protein content of milk is set according to CP. Given
that NPN is not retained in cheese and it is the casein that determines the yield of cheese production, it
is expected that a more precise control of the process will be achieved by the standardization of milk with
TP instead of CP, eliminating the entropy of NPN.
The aims of this study were to characterize the nitrogen fractions of milk from the producers and the milk
standardized for cheese production, to explore the causes that contribute to the variability of the NPN in
the received milk, to compare the accuracy of standardizing milk for cheese production by using CP or
TP, to study the impact of NPN on the yield of cheese production and on its sensory quality.
The methodology followed was the creation of a calibration channel on the MilkoScan FT 120 to read the
TP and to calculate NPN; daily analysis of milk samples from the producers and of production vats.
Models were created to analyze the results of the samples from the milk producers, and samples of the
production vats, based on existing information within the company’s production management maps, with
the aim of incorporating TP and NPN information. Surveys delivered to milk producers, referring to
management and nutrition techniques were analyzed on SPSS Statistics Software 23.0®.
The analysis of the producers’ milk showed that CB content varies in the range of 3.03 % to 3.62 %, TP
from 2.94 % to 3.43 %, the NPN content in CP from 2.90% up to 5.75%, and urea from 0.0078 g/dL to
0.0335 g/dL. There is a positive relation between the contents of the CP and the NPN percentage in CP
(R² = 0.6286), showing that the increase of CP results in more than proportional increases of the NPN
content in CP, and the decrease in the percentage of TP in the protein fraction. Variations of these
parameters can be associated with the size and scale of production of farms, the season, but mainly with
nutrition. The techniques of management and nutrition that were shown to have a greater impact on NPN
and urea were the Unifeed, Mix, corn silage and grass in trenches. The standardization of milk by the use
of TP instead of CP showed no differences in accuracy. In the production of cheese the NPN proved to
lower the production yield and an increase of 1% of NPN in milk results in a loss of 11,39 €, 26,69 €
and 29 € per ton of produced cheese, in the case of three of the cheeses produced in the company. The
results of sensory analysis indicated that the urea causes bitter flavors and salty cheese.
KEYWORDS: NPN, urea, protein, milk, cheese.
ix
ÍNDICE
Agradecimentos .................................................................................................................................. iii
Resumo............................................................................................................................................... v
Abstract............................................................................................................................................. vii
Lista de Figuras ................................................................................................................................ xiii
Lista de Tabelas ................................................................................................................................ xv
Lista de Abreviaturas, Siglas e Acrónimos ......................................................................................... xvii
Figura 13. Variação da proteína bruta (PB), proteína verdadeira (PT) (a) do azoto não-proteico (NPN) e
ureia (b) ao longo dos quatro meses de estudo e respetiva temperatura média (T)............................. 41
Figura 14. Rácio matéria gorda por proteína (RG/P) em função da gordura no extrato seco (GS) do queijo.
Linha de ajuste linear para RPB e RPT e respetivos coeficientes de correlação (R2). ................................ 50
Figura 15. Rendimento de produção de queijo (kg queijo/100 L leite) em função do azoto não-proteico
(NPN) para quatro tecnologias de queijo. Linha de ajuste linear e respetivas equações. a) Tecnologia A;
b) Tecnologia B; c) Tecnologia C; d) Tecnologia D. ............................................................................ 52
Figura 16. Modelo representativo da variação espectável das utilizações (U) de matéria gorda (MG) e
proteína bruta (PB), por kg de queijo produzido, em função do percentual de azoto não-proteico (NPN)
no leite. ............................................................................................................................................ 54
xiv
Figura 17. Utilizações (U) de matéria gorda (MG) e proteína bruta (PB), por kg de queijo produzido, em
função do percentual de azoto não-proteico (NPN) no leite, para as quatro tecnologias analisadas. a)
Tecnologia A; b) Tecnologia B; c) Tecnologia C d) Tecnologia D. ........................................................ 55
Figura I. Coeficiente de variação (CV) obtido no teste de repetibilidade de 5 variedades de leite nas 4
Como se pode observar na Tabela 3, o leite recebido na empresa é proveniente de diversas localizações,
constatando-se que cada uma apresenta tendências diferentes a nível da composição das frações
azotadas do leite. Pela análise da Tabela 3, pode-se notar que Arouca, do distrito de Aveiro, origina leite
com o teor em NPN mais baixa, com uma média de 3,9 % e o teor mais elevado de NPN, de 5,06 %, é
Resultados e Discussão de Resultados
34
proveniente de Barcelos e Famalicão, em Braga. De uma forma geral, em termos distritais, pode-se
averiguar que a percentagem de NPN no leite tem uma tendência crescente de sul para norte, sendo
que a média mais baixa é em Coimbra e a mais alta em Braga.
De forma a perceber qual a relação entre os principais componentes azotados do leite, foram estudadas
as correlações entre a PB e PT, NPN e PB, NPN e ureia. Estes resultados são referentes à média global
de todas as amostras de leite recolhidas, de cada produtor, no período estudado.
Na Figura 6 está apresentada a relação da PB com a PT do leite, de cada um dos produtores.
Figura 6. Relação da proteína bruta (PB) com a proteína verdadeira (PT) do leite.
Pela análise da Figura 6, pode-se evidenciar uma relação forte e positiva ente a PB e a PT, apresentando
um coeficiente de correlação de R2=0,9881. Este resultado indica que maiores teores de PT resultam
tendencialmente num maior teor de PB no leite.
Na Figura 7 está apresentada o comportamento do NPN e da PT na fração de PB, em função do aumento
da PB do leite.
R² = 0,9881
2,80
2,90
3,00
3,10
3,20
3,30
3,40
3,50
3,00 3,10 3,20 3,30 3,40 3,50 3,60 3,70
PT
(%m
/V)
PB (%m/V)
PB vs PT Linear (PB vs PT)
Resultados e Discussão de Resultados
35
Figura 7. Resposta do teor de azoto não-proteico (NPN/PB) e da proteína total na proteina bruta (PT/PB) em função do aumento da proteina bruta no leite.
Analisando a Figura 7, constata-se que há uma relação positiva, com alguma significância, ente a PB e
o percentual de NPN na sua fração (R²=0,6286), indicando que o incremento do conteúdo de PB no leite
está associado a percentagens mais elevadas de NPN. Este resultado é indicativo que o aumento da PB
resulta quase inevitavelmente em aumentos mais que proporcionais do teor de NPN na PB, e
consequentemente na diminuição da percentagem de PT na PB. Este é o principal problema que se
pretende compreender, uma vez que se espera que seja possível ter um teor de PB elevado sem provocar
aumentos no teor de NPN.
Na Figura 8 está representada a relação entre o conteúdo de ureia e NPN do leite.
R² = 0,6314
R² = 0,6286
2,5%
3,0%
3,5%
4,0%
4,5%
5,0%
5,5%
6,0%
94,0%
94,5%
95,0%
95,5%
96,0%
96,5%
97,0%
97,5%
2,9 3 3,1 3,2 3,3 3,4 3,5 3,6 3,7
NP
N/P
B (
%)
PT/
PB
(%
)
PB (%m/V)
PT/PB (%)
NPN/PB (%)
Polinomial (PT/PB (%))
Polinomial (NPN/PB (%))
Resultados e Discussão de Resultados
36
Figura 8. a) Relação da ureia com o azoto não-proteico (NPN) no leite e b) relação da ureia com a percentagem da ureia no azoto não-proteico (NPN).
No que se refere à quantidade de ureia no leite, pode-se observar pela Figura 8 a) que há uma relação
positiva entre a ureia e o NPN, embora fraca (R2=0,1632). Uma justificação para esta fraca correlação
poderá ser a instabilidade da ureia do leite, que pode estar a ser influenciada por um conjunto de fatores
como a fase de lactação e número de lactações do animal, como também outros fatores que foram
R² = 0,1632
0,05
0,1
0,15
0,2
0,25
0,3
0,35
0,80 1,00 1,20 1,40 1,60 1,80 2,00
Ure
ia (
g/L)
NPN (g/L)
NPN vs Ureia Linear (NPN vs Ureia)
R² = 0,7105
3
8
13
18
23
28
0,05 0,10 0,15 0,20 0,25 0,30 0,35
Ure
ia/N
PN
(%
)
Ureia (g/L)
Ureia vs %Ureia/NPN Linear (Ureia vs %Ureia/NPN)
a)
b)
Resultados e Discussão de Resultados
37
analisados nesse projeto. Apesar dos resultados sugerirem que, tendencialmente, incrementos no
conteúdo em ureia estão associados a teores mais elevados de NPN no leite, seria esperada uma relação
mais forte entre estes dois componentes, uma vez que na literatura relatam que a ureia é a maior fração
do NPN, embora não seja consensual qual seja a sua percentagem. Na literatura, os autores Roseler et
al. (1993) relatam que a fração de ureia no NPN varia entre 30 % e 50 %, Kaufmann e Hagemeister
(1982) afirmam que varia entre 20 % e 75 % e Roy et al. (2011) indicam uma variação de 30 % a 35 %.
Porém, como se pode observar pela Figura 8 b), a percentagem de ureia no NPN varia entre 5,25 % e
26,54 %. Este resultado indica que à medida que aumenta a ureia em quantidade, aumenta também o
seu peso no NPN, isto é, o aumento do NPN é principalmente devido ao aumento da ureia no leite. É
também sugestivo que há outros compostos azotados como aminoácidos, creatinina, ácido úrico e
amónia a representar frações significativas do conteúdo de NPN do leite.
4.2 Investigação dos fatores que contribuem para a variabilidade do NPN e
ureia no leite
4.2.1 Estudo da dimensão da exploração e intensidade de produção
Nos gráficos da Figura 9, estão representadas a relação entre o volume total de leite produzido ao longo
de 4 meses, e o teor de NPN e ureia médio, de cada um dos 74 produtores.
R² = 0,1766
2,5%
3,0%
3,5%
4,0%
4,5%
5,0%
5,5%
6,0%
0
200.000
400.000
600.000
800.000
1.000.000
1.200.000
1.400.000
1 23 49 44 7 47 19 71 13 37 62 66 3 28 32
NP
N (
%)
V (
L)
Produtor
Litros NPN Linear (Litros)
a)
Resultados e Discussão de Resultados
38
Figura 9. Relação entre o volume total de leite produzido ao longo de 4 meses (V) com a) o teor de azoto não-proteico (NPN) do leite b) e de ureia do leite, de cada um dos 74 produtores.
Como se pode observar na Figura 9, há uma grande diversificação relativamente ao nível de produção
das explorações, variando entre 43 623 L até aos 1 351 519 L. Esta variação é indicadora das diferenças
existentes nos diferentes produtores de leite, em termos de tamanho e exploração do efetivo. Pode-se
notar que a percentagem de NPN no leite tende a aumentar nas explorações de maior produção, embora
a correlação seja relativamente baixa (R²=0,17669). Este resultado sugere que um alto nível de produção
não é um indicador de se produzir leite com um elevado teor de NPN, sendo então possível produzir
muito em volume e pouco em NPN. No que toca à ureia, o aumento do seu conteúdo no leite mostra
uma tendência ligeiramente crescente à medida que aumenta o volume de leite produzido, apresentando
correlação de R2=0,4529. Apesar da correlação ser mais significativa, é evidência que há explorações
que fogem à normalidade, sendo possível atingir uma alta produção de leite com os níveis de ureia
baixos.
Estes resultados são a ideia chave para uma fase futura do trabalho, para compreender quais as
características das explorações que conseguem produzir volumes elevados de leite e ao mesmo tempo
manter os níveis de NPN e ureia no leite baixos.
No seguinte gráfico, da Figura 10, estão apresentados os resultados do volume diário produzido em
média por vaca, em função da percentagem de NPN e do conteúdo em ureia do leite, para cada uma
das explorações.
R² = 0,4529
0,000
0,005
0,010
0,015
0,020
0,025
0,030
0,035
0,040
0
200.000
400.000
600.000
800.000
1.000.000
1.200.000
1.400.000
29 36 51 2 11 23 64 71 48 22 67 56 59 40 68
Ure
ia (
g/d
L)
V (
L)
Produtor
Litros Ureia Linear (Litros)
b)
Resultados e Discussão de Resultados
39
Figura 10. Representação da relação da percentagem de azoto não-proteico (NPN) do leite em relação aos litros diários produzidos em média por vaca (V).
Embora a relação não seja significativa, tanto a Figura 9 como a Figura 10 apontam para uma tendência
ligeiramente crescente de NPN e ureia à medida que aumenta o volume de produção. Estas correlações
são relativamente baixas provavelmente porque há um conjunto de outros fatores que estão na origem
da instabilidade destes componentes do leite, como por exemplo a fase de lactação e o número de
lactações dos animais. Pode-se notar que o NPN tem um comportamento semelhante em ambos os
gráficos, da Figura 9 a) e da Figura 10, ou seja, correlacionado com o volume de produção total e com
a exploração diária do efetivo, apresenta um R² semelhante (R²=0,1766 e R²=0,1625, respetivamente).
Porém, este comportamento não é observado no caso da ureia, uma vez que apresenta uma correlação
muito mais significante (R²=0,4529) para o volume da produção total do que na produção média diária
por vaca (R²=0,152). Este resultado indica que para além do nível de exploração diária do efetivo, poderá
haver outros elementos característicos de explorações de grande produção que estão a influenciar o
conteúdo de ureia no leite, que poderão ser indicadores de oportunidades de melhoria destes
parâmetros.
Na bibliografia não há estudos que analisem o efeito que o nível exploração e a dimensão do efetivo têm
nas percentagens de NPN do leite produzido. Porém, há vários trabalhos que estudam esta correlação
no que diz respeito aos níveis de ureia no leite. Godden et al. (2001) relataram correlações positivas
entre a ureia e a produção de leite, embora esta associação tenha sido não linear. Meyer et al. (2006)
constataram que o fator que teve mais influência sobre a concentração de ureia foi a produção média
diária de leite, apresentando um coeficiente de determinação de R²=0,6502. Os autores consideram que
R² = 0,1625
R² = 0,152
0,000
0,010
0,020
0,030
0,040
0,050
0,060
0,00%
1,00%
2,00%
3,00%
4,00%
5,00%
6,00%
5,00 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00 35,00
Ure
ia (
g/d
L)
NP
N (
%)
V (L/vaca/dia)NPN Ureia
Linear (NPN) Linear (Ureia)
Resultados e Discussão de Resultados
40
uma justificação possível para este comportamento seja o fornecimento de dietas compostas por um
elevado teor proteico, destinada a vacas de alta produção, que provoca um aumento na produção de
leite mas pode resultar numa descompensação em termos energéticos. Por outro lado, alguns autores
não encontraram relações entre o nível de produção de leite e a ureia no leite (Gustafsson & Carlsson,
1993).
4.2.2 Estudo da Sazonalidade
O período de estudo deste trabalho foi de Março até Julho, representando os meses de primavera e o
início de verão. Neste período é previsível a observação de um comportamento diferente das frações
azotadas do leite. Na Figura 11 está apresentada a média do conteúdo em NPN e ureia do leite recolhido
diariamente, ao longo do período de estudo. Para tal efeito, foi feita uma média aritmética das amostras
de leite dos produtores analisados, para cada dia.
Figura 11. Variação do teor de azoto não-proteico (NPN) e da ureia ao longo do período de estudo.
Pela análise da Figura 11, os resultados sugerem que tendencialmente há um incremento na
percentagem de NPN e conteúdo de ureia no leite ao longo do tempo. Comprovada pelo R² =0,2222
para o NPN, e R²=0,4502 para a ureia, que embora não sejam fortes, são sugestivas do comportamento
crescente destes componentes.
R² = 0,2222
R² = 0,4502
0,018
0,02
0,022
0,024
0,026
0,028
0,03
0,032
0,034
0,036
0,03
0,035
0,04
0,045
0,05
0,055
0,06
19-03-2015 19-04-2015 19-05-2015 19-06-2015
Ure
ia (
g/d
L)
NP
N (
%)
NPN Ureia Linear (NPN) Linear (Ureia)
Resultados e Discussão de Resultados
41
Na Figura 12 estão apresentadas as variações da PT, PB ao longo do período de estudo.
Figura 12. Variação da composição de proteína bruta (PB) e proteína total (PT) ao longo do período de estudo.
Como se pode observar na Figura 12, para além da subida de NPN e ureia ao longo do tempo, já
demonstrada na Figura 11, também é evidente uma diminuição da PB e PT, ao longo do estudo.
Na Figura 13 seguinte está representada uma análise mais global, das médias mensais da PB, PT e NPN
do leite, de todas as amostras de leite recolhidas nesse período, em função da temperatura média
registada em cada mês.
0,02
0,021
0,022
0,023
0,024
0,025
0,026
0,027
3,8%
4,0%
4,2%
4,4%
4,6%
4,8%
5,0%
Março12,4 °C
Abril15,8 °C
Maio17,9 °C
Junho20,2 °C
Meses e T (ºC)
Ure
ia (
g/d
L)
NP
N (
%)
NPN Ureia
3,1
3,15
3,2
3,25
3,3
3,35
3,4
Março12,4 °C
Abril15,8 °C
Maio17,9 °C
Junho20,2 °C
Fraç
ão P
rote
ica
(%m
/V)
Meses e T (ºC)PB PT
Figura 13. Variação da proteína bruta (PB), proteína verdadeira (PT) (a) do azoto não-proteico (NPN) e ureia (b) ao longo dos quatro meses de estudo e respetiva temperatura média (T).
a) b)
R² = 0,6341
R² = 0,5626
3,00
3,05
3,10
3,15
3,20
3,25
3,30
3,35
3,40
3,45
3,50
19-03-2015 19-04-2015 19-05-2015 19-06-2015
Fraç
ão P
rote
ica
(%m
/V)
PT PB Linear (PT) Linear (PB)
Resultados e Discussão de Resultados
42
Na Figura 13, observa-se, então, que há uma clara descida das frações proteicas (PB e PT) e subida das
não proteicas (NPN e ureia), ao longo dos meses de estudo e à medida que aumenta a temperatura
média. É possível observar que os valores mais altos da PB e PT foram atingidos em Março, mostrando
uma tendência decrescente nos meses seguintes. Estes resultados estão em concordância com os
conseguidos por Lacroix (1996) e Bernabucci et al. (2002), que também observaram valores máximos
de PB e PT no inverno e uma redução dos teores de PB e PT nos meses de verão. Bernabucci et al.(2002)
atribui a descida dos compostos proteicos nos meses de verão, ao calor que provoca desconforto no
animal, reduzindo o seu consumo de matéria seca o que resulta num declínio dos componentes do leite.
Relativamente ao NPN e ureia, é evidente uma subida das concentrações ao longo dos meses da
primavera, embora se observe um pequeno decréscimo do NPN na média mensal de Junho. Estes
resultados vão de encontro com o estudo de Lacroix (1996), que relatou um comportamento estável do
NPN de Janeiro até Abril e uma subida constante até ao mês de Setembro. Constatou também um
comportamento inverso do NPN e da ureia, relativamente à PT e PB, ou seja, à medida que o NPN e a
ureia aumentam ao longo dos meses de verão, a PT e a PB diminuem.
Por outro lado, há autores que defendem que o efeito que a época do ano aparenta ter nas frações dos
componentes do leite, pode estar a ser confundido com as diferenças nutricionais associadas a diferentes
estações do ano. Moller et al.(1993) atribuíram as variações dos compostos do leite ao efeito que as
mudanças sazonais têm no conteúdo proteico e energético das forragens utilizadas. As forragens usadas
na primavera, principalmente erva verde, apresentam conteúdos de proteína superiores, porém inferiores
em fibra, criando uma alta relação proteína/energia. Esta descompensação pode ser a causa dos
incrementos observados no teor de ureia do leite e consequentemente de NPN, uma vez que o estudo
decorreu no período do ano associado à utilização de forragens verdes.
4.2.3 Estudo dos fatores relacionados com a alimentação
Através da análise de inquéritos realizados aos 74 produtores que fornecem leite à empresa, foi realizado
um estudo estatístico recorrendo ao programa informático SPSS Statistics 23.0®, de forma a determinar
quais os principais fatores que contribuem para a variabilidade do NPN e da ureia do leite. O inquérito
abrangeu questões relativos à caracterização da exploração, no que refere às dimensões, ao tipo de
regime e às práticas de ensilagem das forragens. Quanto à composição da dieta, foi caracterizada em
termos do tipo de concentrado, forragens e dos suplementos fornecidos aos animais.
Resultados e Discussão de Resultados
43
Na Tabela 4 estão apontadas os parâmetros estudados e o nível de significância que cada um deles,
quando correlacionados com as duas variáveis dependentes deste estudo, o NPN e a Ureia.
Tabela 4. Nível de significância de cada parâmetro estudado, relativamente à sua influência sobre a variação de NPN e Ureia no leite dos produtores
Parâmetros NPN Ureia
Tipo ração 0,137 0,324
Ração (Sim/Não) 0,07 0,234
Tipo de Aditivos 0,339 0,725
Aditivos (Sim/Não) 0,228 0,499
Tipo Cereais 0,379 0,652
Cereais (Sim/Não) 0,192 0,852
Tipo Mix 0,141 0,346
Mix (Sim/Não) 0,01 0,028
Silagem Milho Monte Plástico (Sim/Não) 0,396 0,165
Na Tabela 8 está representado o modelo que melhor se ajustou, que representa 39 % da variação da
ureia, sendo o tipo de ração, os aditivos, a silagem de milho em silo trincheira, a erva em silo trincheira,
Resultados e Discussão de Resultados
47
erva em monte cimento e os tipos de suplementos, as principais variáveis independestes a provocar
alterações na ureia, embora esta ultima variável esteja no limite da significância. Relativamente às rações,
com significância de 0,025, as diferentes marcas do concentrado resultam numa diferença considerável
na composição em ureia do leite. A utilização dos aditivos, que consistem em, produtos como bagaço de
colza, bagaço de soja, cal, entre outros, diminui o conteúdo de ureia do leite em 0,005 g/dL, com uma
significância de 0,025. A silagem de milho em trincheira está associada a um incremento da ureia de
0,005 g/dL, com um nível de significância de 0,002. A erva em silo trincheira está associada a um
incremento de ureia na ordem das 0,004 unidades, com uma significância de 0,014. A erva conservada
em monte em cima de cimento é indicativa de um incremento da ureia em 0,008 g/dL, também com
0,014 de significância.
Cruzando os resultados das regressões múltiplas com os testes de significância univarietal, apontados
na Tabela 4, foi possível identificar quais os coeficientes da regressão que podem ser excluídas do
modelo, por não serem contributos significativos, garantido assim que o modelo tenha uma maior
simplicidade e seja mais eficaz. Assim, pode-se concluir que as variáveis independentes que tem um
maior efeito sobre o NPN e a ureia são o Mix, a silagem de milho em silo trincheira, a erva em silo
trincheira e o Unifeed.
Alguns destes resultados parecem ser controversos, uma vez que os parâmetros que mostram estar a
provocar um incremento na percentagem do NPN e da ureia no leite são práticas bastante apreciados e
usuais nas explorações desenvolvidas, e consequentemente são associados a uma produção de melhor
qualidade.
Em relação ao Unifeed, o semirreboque misturador e distribuidor de ração, do ponto de vista nutricional,
apresenta várias vantagens como a possibilidade de misturar alimentos forrageiros com concentrados
energéticos e/ou proteicos. Tem a capacidade de reduzir a capacidade de seleção dos alimentos pelos
animais, estimula a ingestão de maiores níveis de matéria seca e estabiliza o ph do rúmen, devido ao
fornecimento simultâneo de alimentos de diferente natureza (Amaral-Phillips et al., 2014).
O Mix é um concentrado proteico na forma farinada, uma mistura personalizada às necessidades
individuais de cada exploração, composta por todos os nutrientes essenciais, incluindo minerais,
vitaminas e aditivos. É usado no Unifeed juntamente com as forragens. Porém, uma desvantagem em
usar o concentrado na forma farinada é o risco dos componentes da dieta não serem uniformemente
misturados devido à separação tendencial dos ingredientes em função da sua densidade e tamanho da
partícula. Estes erros de mistura no Unifeed e na preparação da composição final, podem resultar na
Resultados e Discussão de Resultados
48
ingestão desequilibrada de nutrientes essenciais para a obtenção de leite com a qualidade desejada
(Fernández, 2013).
A silagem feita em silo trincheira é o método mais comum devido à sua facilidade de maneio e o baixo
custo de produção. No entanto, tem a desvantagem de ter um maior risco de perdas de silagem devido
à maior superfície de exposição e aos riscos de infiltração de ar e água, principalmente quando não são
revestidos. O método de ensilagem tende a aumentar a proporção de NPN e PB das forragens, sendo
que em média 10% a 15% do azoto presente nas forragens frescas é NPN, e em silagens pode chegar
aos 50% (Stanton & Whittier, 2006). Uma vez que as forragens geralmente apresentam um conteúdo de
NPN superior aos restantes componentes, este pode ser o motivo pela qual as silagem de milho e erva
mostram estar a contribuir para o aumento do NPN e da ureia do leite, pois quanto maior for o teor de
NPN na dieta, maior será o seu percentual no leite. O silo em trincheira pode mostrar ter um peso mais
forte no modelo, uma vez que é das técnica mais usualmente utilizadas, significando que, possivelmente,
pode não ser a técnica propriamente dita a ter um efeito sobre o NPN e a ureia do leite, mas a silagem
de milho e a erva em si.
Estas variáveis, o Unifeed, Mix, silagem de milho e erva em silo de trincheira, por serem as mais
comummente usadas e, em princípio, mais eficientes, podem estar associadas às explorações de maior
dimensão, com regime produtivo mais intenso. Nestas explorações o propósito das técnicas
implementadas é provocar o incremento da percentagem da PB do leite, uma vez que é este o parâmetro
principal que é baseado o pagamento do leite. Estas práticas podem, consequentemente, estar a
aumentar não só a PB do leite, como também a teor de NPN, pois como já foi demonstrado anteriormente
na Figura 7, o aumento da PB no leite está associado a uma tendência mais que proporcional do teor
de NPN no leite.
De forma a testar se estas variáveis estão associadas a percentagens superiores de PB do leite, foram
analisadas no SPSS Statistics 23.0® as relações destes parâmetros com a PB e com a intensidade
produtiva das explorações, ao nível do volume médio produzido diariamente por vaca e da dimensão da
exploração, caracterizada pelo volume de leite produzido no período de quatro meses.
Pela análise da Tabela II, Tabela III, Tabela VI e Tabela VII, simuladas pelo SPSS Statistics 23.0® e
apresentadas no Anexo IV, pode-se concluir que a utilização do equipamento Unifeed e o Mix tem um
efeito semelhante sobre as variáveis em estudo, uma vez que esta forma de concentrado é por prática
utilizada na formulação das rações misturadas no Unifeed. Nota-se então que efetivamente estas práticas
estão associadas a uma média de PB no leite superior à das explorações que não recorrem a estas
Resultados e Discussão de Resultados
49
práticas, e tal como era esperado, estão fortemente correlacionados com a quantidade total de litros
produzidos durante 4 meses, e com o volume médio produzido por vaca diariamente.
Relativamente à silagem de milho e à erva conservada em silo trincheira, pode-se observar pela Tabela
IV, Tabela V, Tabela VIII e Tabela IX do Anexo IV que estas técnicas não mostram ter nenhuma relação
significativa com a PB do leite. Porém estão ambas fortemente relacionadas com o volume total
produzido no período de 4 meses, sendo as explorações de maior produção que usam este método de
ensilagem. Apenas a silagem de milho em silo trincheira está associada a explorações com o maior
volume de leite produzido diariamente por vaca.
Assim, pode se concluir que os resultados vão de encontro ao esperado. O Unifeed e o Mix podem então
estar relacionados com teores de Ureia e NPN mais elevados, uma vez que são implementados em
exploração grandes, de regime intensivo, que têm como objetivo aumentarem o teor de PB, podendo ter,
consequentemente, efeitos negativos nos teores de NPN. A técnica de ensilagem de milho e erva em
trincheira está associada às explorações de maior dimensão e com regime mais intensivo, que tem como
objetivo maximizar o volume de leite produzido, que pode resultar num aumento da percentagem de
NPN no leite.
Esta teoria é confirmada pelo estudo de Block (2000) que aponta para o facto de aumentos da proteína
do leite, podem ser devido a estratégias nutricionais que tem como objetivo aumentar PB e
consequentemente aumenta o teor de NPN. Estas estratégias não apresentam benefícios no que toca a
rendimentos industriais de queijo, uma vez que a sua produção depende da caseína do leite. Emery
(1978) relata que cada aumento de 1 unidade percentual de PB da dieta, entre 9 % a 17 % resulta num
aumento de 0,02 unidades percentuais em PB do leite. Porém, como os autores não analisaram os
teores de proteína verdadeira no leite, os aumentos da proteína leite observados, podem ter sido em
NPN, e não de PT.
4.3 Comparação da fiabilidade da padronização de leite para produção de
queijo, através da proteína bruta (PB) e da proteína verdadeira (PT)
Na empresa Bel Portugal, a valorização da fração proteica do leite é definida de acordo com o percentual
de PB, como também todos os processos de padronização de leite e determinação do rendimento de
transformação de leite em queijo.
O equipamento de análise de leite FOSS MilkoScan FT120, previamente à realização deste trabalho,
estava apenas calibrado em função da PB. Desta forma não era possível prever qual a verdadeira
Resultados e Discussão de Resultados
50
quantidade de proteína presente no leite e, uma vez que o teor de NPN no leite também não é constante,
não era possível detetar a sua variação. Com o objetivo de contornar este problema, foi criado um canal
de leitura da PT no equipamento.
Prevê-se que medir a PT em vez da PB, como base de calibração, seja uma forma mais fiável de
padronizar o leite para produção e queijo, reduzindo a dispersão da gordura no queijo, e determinar o
rendimento da transformação de leite em queijo, refletindo uma melhoria tecnológica.
De forma a testar se medir a PT é mais fiável que a PB no processo de padronização do leite, foram
analisados os rácios de matéria gorda por proteína bruta (G/PB) e matéria gorda por proteína verdadeira
(G/PT), do leite das cubas, e a gordura no extrato seco (GS) do queijo, para todos os dias de produção
de Março até Julho. Foram estes os parâmetros usados para testar a hipótese, uma vez que a GS é um
dos principais padrões usados na normalização da composição do queijo e, o seu valor alvo é usado
para fazer uma primeira estimativa do rácio G/P do leite, de forma a obter o teor de gordura desejado
no queijo (Fox et al., 2000). Os resultados da análise da GS do queijo em função dos rácios G/PB e
G/PT do leite usado para a produção desse queijo, estão apresentados na Figura 14.
Figura 14. Rácio matéria gorda por proteína (RG/P) em função da gordura no extrato seco (GS) do queijo. Linha de ajuste
linear para RPB e RPT e respetivos coeficientes de correlação (R2).
No processo de transformação de leite em queijo, quanto maior a relação de matéria gorda com a matéria
proteica, maior será a quantidade de gordura transferida para o queijo, por unidade de extrato seco.
Deste modo, analisando o rácio G/P em função da gordura no extrato seco, é esperado obter uma
regressão linear, com uma correlação forte e positiva. Isto porque, quanto maior for a fração de matéria
R² = 0,9939
R² = 0,9921
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
1,4
1,6
20 25 30 35 40 45 50 55 60
R G/P
GS (%)
R PB R PT Linear (R PB) Linear (R PT)
Resultados e Discussão de Resultados
51
gorda no leite, por unidade de proteína, maior é o rácio G/P e maior é a quantidade de gordura transferida
para o queijo, por unidade de extrato seco. O conteúdo de gordura no queijo depende então da
quantidade de proteína no leite, pois é a caseína que retém a gordura na rede complexa de coalhada
formada. Quanto maior for a percentagem de proteína no leite, maior será o rendimento de
transformação de leite em queijo e, consequentemente, maior é o volume de queijo produzido. Isto
significa que a mesma quantidade de gordura é distribuída pelo queijo, resultando numa GS inferior (M.
et al., 2013).
Quando a PB é utilizada para padronização do leite é incerto que parte dessa fração é proteína verdadeira
e qual a quantidade de NPN presente. Ou seja, para valores iguais de PB, o conteúdo de PT pode ser
diferente, condicionando a precisão da padronização. Então, quando o rácio G/P é feito com a PT, como
referência, é espectável haver uma maior fiabilidade uma vez que, assim, é determinada qual a
quantidade exata de proteína presente no leite e usada para a produção de queijo, eliminando a entropia
do NPN (Ruska & Jonkus, 2014).
Porém, pela análise da regressão dos rácios RPB e do RPT em função da GS, na Figura 14, observa-se que
ambos apresentam uma correlação alta, de aproximadamente 0,99, sugerindo que os métodos são
idênticos. Este resultado vai contra o pressuposto que o método de padronização de leite para produção
de queijo, recorrendo à PT, fosse mais preciso que usar a PB e que, desse modo, houvesse uma diferença
significativa na comparação das regressões.
Espera-se que a razão por, atualmente, não haver diferenças significativas na utilização do parâmetro PT
ao invés da PB, para a padronização de leite, resida na calibração do equipamento FOSS MilkoScan FT
120. O canal de leitura do leite tem uma maturidade maior para o parâmetro da PB, com uma base de
amostras bastante extensa, 116 amostras, e acumulada ao longo de um vasto período de tempo. Por
outro lado, a PT por ser um parâmetro novo, tem um canal de leitura jovem, com relativamente poucas
amostras, apenas 35, apresentando uma gama de leitura mais reduzida, que gradualmente está a ser
afinada. É então espectável que, com o aumento da robustez da amostragem, aumentando a gama de
calibração e consequentemente o rigor de leitura, que seja evidente o aumento da fiabilidade da
padronização do leite para a produção de queijo, a partir PT.
Resultados e Discussão de Resultados
52
4.4 Impacto da composição do leite em NPN no rendimento de
transformação de leite em queijo
Os custos da matéria-prima, o leite, representam uma porção significativa dos custos de produção de
queijo, sendo crucial controlar a composição do leite e a quantidade de queijo que se produz com um
determinado volume de leite. Assim, a definição do rendimento do queijo é importante para medir a
eficiência do processo de produção. Na empresa Bel Portugal, uma das formas utilizadas para medir o
rendimento de transformação de leite em queijo é expressa pela Equação 2.
Usando a Equação 2, foi analisado o impacto que o teor de NPN no leite tem no rendimento de produção
de queijo. Recorrendo à informação recolhida, referente à quantidade e qualidade do leite utilizado e o
proveito em quilogramas de queijo, procedeu-se à análise do rendimento em função da percentagem de
NPN no leite. Os gráficos que se seguem, da Figura 15, referem-se a quatro das receitas de queijo mais
produzidas na empresa.
Figura 15. Rendimento de produção de queijo (kg queijo/100 L leite) em função do azoto não-proteico (NPN) para quatro tecnologias de queijo. Linha de ajuste linear e respetivas equações. a) Tecnologia A; b) Tecnologia B; c) Tecnologia C; d) Tecnologia D.
y = -0,8097x + 9,1055
7,0
7,5
8,0
8,5
9,0
9,5
3,00% 8,00% 13,00%
kg q
ue
ijo/1
00
L le
ite
NPN (%)
Y kgs queijo/100 L leite
Linear (Y kgs queijo/100 L leite)
c)
y = -11,64x + 12,709
7,5
8,5
9,5
10,5
11,5
12,5
13,5
3,00% 5,00% 7,00%
kg q
ue
ijo/1
00
L le
ite
NPN (%)
Y kgs queijo/100 L leite
Linear (Y kgs queijo/100 L leite)
d)
y = -2,4857x + 12,312
10,5
11,0
11,5
12,0
12,5
13,0
13,5
3,00% 4,00% 5,00% 6,00% 7,00%
kg q
ue
ijo/1
00
L le
ite
NPN (%)
Y kgs queijo/100 L leiteLinear (Y kgs queijo/100 L leite)
b)y = -1,4368x + 11,847
10,5
11,0
11,5
12,0
12,5
13,0
13,5
2,00% 4,00% 6,00% 8,00%
kg q
ue
ijo/1
00
L le
ite
NPN (%)
Y kgs queijo/100 L leiteLinear (Y kgs queijo/100 L leite)
a)
Resultados e Discussão de Resultados
53
Pela análise das quatro tecnologias de queijo representadas na Figura 15 , nota-se que o incremento do
conteúdo em NPN no leite sugere uma tendência de redução do rendimento de produção, isto é, da
quantidade de queijo obtido de 100 L de leite. A inclinação da negativa da linha de ajuste linear aos
valores obtidos para cada uma das tecnologias, indicam que o incremento de 1 % de NPN no leite, resulta
numa perda de 14,37 g de queijo por 100 L de leite para a tecnologia A, 24,86 g de queijo por 100 L
de leite para a tecnologia B, 8,097 g de queijo por 100 L de leite para a tecnologia C e por fim, 116,4 g
de queijo por 100 L de leite para a tecnologia D.
Estes resultados são apoiados por Ferreira et al. (2006), que afirmam que o aumento nas concentrações
de NPN no leite determinam um menor rendimento industrial para produção de queijo. Isto porque parte
da proteína verdadeira, que contribui para a fração PB, é substituída por NPN, não contribuindo para a
transformação de leite em queijo. Diversos autores, como Martin et al. (1997) explicam que o
agravamento da qualidade do leite, com aumento do teor de ureia, pode ter efeitos negativos no processo
produtivo, podendo resultar num maior tempo de coagulação do leite, no desenvolvimento de coalhadas
mais frágeis e menos estruturadas, em fermentações irregulares e numa proteólise mais intensa. No
entanto estes parâmetros não foram estudados nesta fase de trabalho.
Para compreender o impacto financeiro que o conteúdo de NPN do leite pode estar a ter na produção
de queijo, foi criado um modelo para avaliar o efeito no preço final do produto. Uma vez que o sistema
pagamento do leite, atualmente utilizado, valoriza a fração proteica do leite em função do teor em PB,
foi estudada a utilização necessária de PB na produção de queijo padronizado (equação 4). Dado que o
percentual de gordura também entra na fórmula de pagamento de leite, a sua utilização também foi
Na Figura 16 está representado o modelo criado representativo da variação espectável que o NPN no
leite provoca na utilização de proteína e gordura (U), para a produção de um queijo padrão.
Resultados e Discussão de Resultados
54
Figura 16. Modelo representativo da variação espectável das utilizações (U) de matéria gorda (MG) e proteína bruta (PB), por kg de queijo produzido, em função do percentual de azoto não-proteico (NPN) no leite.
Espera-se que o incremento de NPN no leite resulte num aumento de PB necessária para produzir uma
unidade de queijo. Isto porque, para o mesmo valor de PB no leite, uma maior porção é representada
por NPN, que não tem qualquer contributo para a produção de queijo. Assim, será necessário incorporar
uma maior porção de proteína bruta para produzir queijo na quantidade e com os padrões desejados.
Em relação à utilização de matéria gorda, não é esperado que esta seja alterada pela presença de NPN
no leite.
Esta variação na utilização de PB e MG terão naturalmente um efeito no custo final do queijo. Admitindo
que o valor monetário da matéria gorda e da matéria proteica são os representados na Tabela 9, é
possível determinar qual o custo acrescentado resultante do aumento percentual de NPN no leite.
Tabela 9. Valorização monetária da matéria gorda (MG) e proteína bruta (PB) no leite
Componente €/kg
MG 3,487
PB 6,804
Assim, através da inclinação da linha de ajuste aos valores referentes à utilização de PB e MG em função
do NPN do leite, pode-se retirar qual a relação entre estes parâmetros. Isto é, uma vez que a inclinação
da reta que caracteriza a MP é 276,52, pode se concluir que o aumento de uma unidade percentual de
NPN resulta na utilização adicional de 2,765 g de MP por cada quilo de queijo produzido, equivalente a
y = 276,52x + 275,98
270
275
280
285
290
295
300
0,0% 1,0% 2,0% 3,0% 4,0% 5,0% 6,0% 7,0% 8,0%
U (
g/kg
qu
eijo
)
NPN (%)
Ut MG ut PB Linear (Ut MG) Linear (ut PB)
Resultados e Discussão de Resultados
55
um prejuízo de 18,81 € por tonelada de queijo produzido. Neste modelo, como a MG não sofre alterações
não há nenhuma consequência monetária em relação a este componente.
Os gráficos da Figura 17 que se seguem estão representados o perfil de utilização de PB e MG na
produção de queijo (U), em função do NPN do leite, para quatro tipos de queijo diferente, produzidos na
empresa ao longo do período de estudo.
Figura 17. Utilizações (U) de matéria gorda (MG) e proteína bruta (PB), por kg de queijo produzido, em função do percentual de azoto não-proteico (NPN) no leite, para as quatro tecnologias analisadas. a) Tecnologia A; b) Tecnologia B; c) Tecnologia C d) Tecnologia D.
Pela análise dos gráficos da Figura 17 confirma-se um comportamento semelhante ao esperado, nas
tecnologias A, B e D. Isto é, quanto maior o teor em NPN no leite, menos PT estará disponível, logo será
necessário uma maior a quantidade de PB no leite para obter a quantidade de PT necessária para a
produção de um quilograma de queijo. No entanto, não se observou o mesmo comportamento para o
caso do queijo C que, pelo contrário, mostrou que incrementos em NPN resultam numa utilização menor
de gordura e proteína.
y = 42,609x + 302,22
y = 145,48x + 273,72
250
260
270
280
290
300
310
320
330
340
2,0% 3,0% 4,0% 5,0% 6,0% 7,0%
U (
g/kg
qu
eijo
)
NPN (%)
g MG/Kg g PB/Kg
Linear (g MG/Kg) Linear (g PB/Kg)
y = 199,19x + 289,99
y = 291,63x + 256,18250
260
270
280
290
300
310
320
330
340
4,0% 5,0% 6,0% 7,0%
U (
g/kg
qu
eijo
)
NPN (%)
g MG/Kg g PB/Kg
Linear (g MG/Kg) Linear (g PB/Kg)
y = -33,9x + 134,48
y = -71,568x + 365,43
100
150
200
250
300
350
400
2,0% 4,0% 6,0% 8,0% 10,0% 12,0%
U (
g/ k
g q
ue
ijo)
NPN (%)g MG/Kg g PB/Kg
Linear (g MG/Kg) Linear (g PB/Kg)
c)y = 285,62x + 337,33
y = 279,76x + 266,53250
270
290
310
330
350
370
390
2,0% 4,0% 6,0% 8,0%
U (
g/ k
g q
ue
ijo)
NPN (%)
g MG/Kg g PB/Kg
Linear (g MG/Kg) Linear (g PB/Kg)
a)
b)
d)
b)
Resultados e Discussão de Resultados
56
No que toca ao queijo C, que se refere a um queijo magro com teor de gordura reduzido, observa-se um
comportamento diferente das restantes tecnologias. Os resultados observados poderão estar fora do
expectável pelo facto de esta tecnologia ser muito diferente às restantes, respetivamente ao teor em
gordura, que é 50 % inferior às restantes receitas. O facto do novo canal de calibração para a PT ser um
canal com pouca maturidade, e as calibrações serem essencialmente focadas em leite com teores em
gordura mais elevados, poderá ser a explicação para esta irregularidade.
Na Tabela 10 estão representados o resumo dos resultados da análise económica. As utilizações
adicionais de MG e PB necessárias para a produção de 1 kg de queijo, resultantes do incremento de 1
% de NPN no leite, foram calculados através da inclinação da regressão linear, para cada uma das
tecnologias de queijo produzidos ao longo do período de estudo, apresentadas na Figura 17. Tendo em
conta o valor monetário destes dois componentes, Tabela 9, foi possível estimar as perdas que o
incremento de 1 % em NPN provoca, por cada tonelada de queijo produzido.
Tabela 10. Utilizações necessárias de MG e PB para a produção de 1 kg de queijo resultante do incremento de 1 % do NPN do leite, as respetivas perdas por tonelada de queijo produzido e o valor total das perdas para cada uma das tecnologias em análise
Tecnologia U MG (g/kg) U PB (g/kg) Perda MG
(€/t)
Perdas PB
(€/t)
Total de Perdas (€/t)
A 0,426 1,455 1,49 9,9 11,39
B 1,992 2,916 6,95 19,84 26,79
C -0,339 -0,716 -1,18 -4,87 -6,05
D 2,856 2,798 9,96 19,04 29
Tal como se pode ver na Tabela 10, o aumento de uma unidade percentual de NPN resultou num
aumento de 1,455 g de PB necessários para produzir um quilograma de queijo, equivalente a uma perda
de 9,90 € por tonelada de queijo A. As perdas de PB referentes ao queijo B e D foram mais acentuadas,
2,916 g e 2,798 g de PB por kg de queijo, representando respetivamente 19,84 € e 19,04 € por tonelada
de queijo. Relativamente ao queijo C, o queijo magro, mostra haver ganhos nas utilizações e
consequentemente em termos monetários.
Como o principal âmbito do trabalho residiu no estudo do comportamento das utilizações de proteína
em resposta ao aumento de NPN no leite, inicialmente não era previsto que o NPN tivesse um efeito
sobre a matéria gorda do leite, tal como mostrado no modelo teórico apresentado na Figura 16. Assim,
a constatação de que o NPN afinal tem um efeito sobre os rendimentos de utilização da matéria gorda é
Resultados e Discussão de Resultados
57
uma revelação, sendo que numa próxima fase do trabalho esta situação deverá ser estudada mais
aprofundadamente.
Desta forma, a necessidade de aumentar a utilização destes componentes, fulcrais para a produção de
queijo, resulta em perdas equivalentes a 11,39 €, 26,69 € e 29 € por tonelada de queijo A, B e D
produzidos.
4.5 Impacto da composição do leite em NPN na qualidade organolética do
queijo
Com o objetivo de determinar se o NPN, mais especificamente a ureia, tem algum impacto na qualidade
organolética no queijo foi realizada uma prova de queijos produzidos com leites que apresentavam teores
de ureia diferentes, com um painel composto por oito provadores. As características sensoriais avaliadas
foram a acidez, o amargor, o teor em sal e a textura do queijo. Para além destas características, foi
também determinado analiticamente o pH e a humidade dos queijos.
Na Tabela 11 estão representados os resultados de duas tecnologias de queijo distintas, cada uma com
um queijo produzido a partir de leite contendo alto teor em ureia e outro com baixo teor em ureia. A
acidez, o amargor e o sal do queijo foram avaliados numa escala de 1 a 5, onde 1 refere-se a pouco e 5
a muito. A textura do queijo também foi avaliada na mesma escala, onde 1 refere-se a uma textura macia
e 5 a uma textura seca.
Tabela 11. Resultados da análise sensorial à acidez, amargor, sal e textura do queijo; resultados da análise analítica ao pH e humidade do queijo para quatro queijos produzidos com leite com teores de ureia diferentes
Tecnologia 1
Amostra a) b)
NPN (%) 4,99 5,51
Ureia (g/dL) 0,029 0,032
Ph 5 5,21
Humidade (%) 46,26 46,02
Acidez 3,00 ± 0,78 2,81 ± 0,73
Amargor 2,00 ± 0,87 2,69 ± 0,9
Sal 3,63 ± 0,7 4,00 ± 0,25
Textura 2,63 ± 0,48 3,13 ± 0,54
Resultados e Discussão de Resultados
58
Tecnologia 2
Amostra a) b)
NPN (%) 4,60 4,88
Ureia (g/dL) 0,024 0,028
Ph 5,23 5,14
Humidade (%) 44,96 46,15
Acidez 2,43 ± 0,7 2,57 ± 0,49
Amargor 2,43 ± 1,05 2,71 ± 0,45
Sal 2,43 ± 0,9 3 ± 0,53
Textura 3,14 ± 0,64 2,29 ± 0,7
Na Tabela 11 é possível observar que tanto na tecnologia 1 como na tecnologia 2 há diferenças
reveladoras no amargor, sal e textura do queijo entre as amostras. No caso do sal e do amargor, nota-
se que ambos os queijos produzidos com leite com maior percentagem de ureia mostraram ser mais
amargos e salgados nos testes sensoriais. Este resultado vai de encontro com o estudo de Martin et al.
(1997), que constatou que o queijo com o teor superior de ureia apresentava sabores mais amargos.
Estes resultados são sugestivos que teores superiores de ureia agravam a qualidade organolética do
queijo, por proporcionar sabores de amargor e salgado.
No que toca à textura, os resultados obtidos foram opostos. Os resultados sensoriais e analíticos
mostraram que, no caso da tecnologia 1, o leite com maior teor de ureia originou um queijo com uma
textura mais seca, enquanto para a tecnologia 2, o leite com maior teor em ureia resultou num queijo
com uma textura mais macia e húmida. Assim, apenas os resultados da tecnologia 2 são concordantes
com os resultados de Martin et al. (1997), que concluiu que o principal efeito de altas concentrações de
ureia no leite é um queijo mais húmido, mais cremoso e menos rijo. Estes resultados confirmaram os
de Ali et al. (1980) que demonstraram que a adição de ureia no leite resulta em queijos menos secos.
Acredita-se que uma explicação para este comportamento seja a fraca capacidade de drenagem de leites
com valores elevados de ureia, devido à sua baixa taxa de acidificação durante a moldagem do queijo
(Millet, 1990).
Relativamente à acidez, os resultados também mostraram ser contraditórios, tanto comprovados pelos
resultados analíticos como sensoriais. No caso da tecnologia 1, o leite com maior teor de ureia originou
um queijo menos ácido, enquanto para a tecnologia 2, resultou num queijo mais ácido. No entanto as
diferenças não são consideráveis, não podendo ser retiradas conclusões relativamente a este parâmetro.
Estudos na literatura relatam que a ureia no leite parece retardar a acidificação, estando assim
diretamente envolvida na cinética da acidificação e nas diferenças de textura do queijo (Millet, 1990).
Resultados e Discussão de Resultados
59
Martin et al. (1997) constatou que o queijo com o teor superior de ureia apresentava sabores menos
ácidos.
Todavia, estes resultados podem não ser comparáveis, uma vez que a quantidade de ureia adicionada
ao leite no estudo de Millet (1990) (0,1 g/dL) e de Martin et al. (1997) (0,025 g/dL), até perfazer
0,049g/dL foram superiores ao teor de ureia presente no leite usado neste estudo. Para além disso, a
dimensão da prova foi pequena, sendo que os resultados podem não ser representativos da realidade.
Conclusões
61
5. CONCLUSÕES
Na caracterização do leite de origem, constatou-se que o conteúdo de PB varia no intervalo de 3,03 %
até 3,62 %, o conteúdo de PT varia de 2,94 % até 3,43 %, o teor de NPN na PB varia de 2,90 % até 5,75
% e a composição de ureia varia de 0,0078 g/dL até 0,0335 g/dL. Estes resultados indicaram que há
diferenças significativas no leite dos produtores, mostrando que há um intervalo considerável de variação
destes parâmetros.
Relativamente aos principais componentes azotados do leite, verificou-se que há uma relação positiva
entre o conteúdo de PB e o percentual de NPN, indicando que o aumento da PB resulta quase
inevitavelmente em aumentos mais que proporcionais do teor de NPN na PB, e consequentemente na
diminuição da percentagem de PT na fração proteica. Este foi o principal problema que se pretendeu
compreender, uma vez que se espera que seja possível um teor de PB elevado sem provocar aumentos
no teor de NPN do leite. Observou-se que há uma relação positiva mas fraca da ureia com o NPN, e que
a percentagem de ureia no NPN tem elevada amplitude de variação, entre 5,25 % e 26,54 %.
Na investigação dos fatores que poderiam estar na origem da variação dos compostos azotados do leite,
observou-se que há uma grande diversificação em termos do nível de produção das explorações,
indicadora das diferenças que existem, relativamente à dimensão e exploração do efetivo. Notou-se que
a percentagem de NPN e ureia no leite tem uma tendência apenas ligeiramente crescente nas
explorações de maior produção, como também quando aumenta o volume médio diário de produção por
vaca. Apesar desta tendência, estes resultados são sugestivos que um alto nível de produção não é
indicador de se produzir leite com um elevado teor de NPN e ureia, sendo possível produzir muito em
volume e pouco em NPN e ureia. Estes resultados são a ideia chave para uma fase futura do trabalho,
para compreender quais são as características das explorações que conseguem produzir volumes altos
de leite e ao mesmo tempo mantendo níveis baixos de NPN e ureia no leite.
No estudo da sazonalidade, os resultados sugerem que tendencialmente há um incremento na
percentagem de NPN e ureia ao longo do tempo e uma diminuição da PB e PT, isto é, na medida que
decorrem os meses de primavera e começa o verão. No entanto, este comportamento pode não ser
devido ao calor associado a estes meses, mas às diferenças nutricionais associadas às diferentes
estações do ano.
Relativamente às técnicas de maneio e nutrição, que contribuem para a variabilidade do NPN e ureia do
leite, pode-se concluir que as variáveis que tem um maior efeito sobre o NPN e a ureia são o Mix, a
Conclusões
62
silagem de milho em trincheira, a erva em trincheira e o Unifeed. Por estas técnicas serem as mais
comummente usadas e, em princípio, mais eficientes, concluiu-se que estão associados às explorações
de maior dimensão, com regime mais intenso, onde o propósito das técnicas implementadas é maximizar
não só o volume de leite produzido como também o conteúdo de PB no leite. Assim, é expectável que
estas técnicas tenham mostrado estar associadas a valores superiores de NPN, e consequentemente de
ureia, porque incrementos de PB resultam num aumento da percentagem de NPN no leite.
Relativamente ao processo de padronização de leite para produção de queijo, analisou-se a regressão do
RPB e do RPT em função da GS, e concluiu-se que os métodos são idênticos. É previsto que a explicação
resida na calibração do FOSS MilkoScan FT 120, uma vez que o canal de leitura da PT é novo, com
relativamente poucas amostras, comparativamente à PB. Espera-se que com a maturação da calibração,
que seja evidente o aumento do rigor de padronização do leite a partir da PT.
No estudo da relação do NPN no leite com o rendimento da sua transformação em queijo, notou-se que
o incremento de 1 % de NPN no leite é sugestivo de uma perda de 14,37 g de queijo por 100 L de leite
para a tecnologia A, 24,86 g /100 L de leite para a tecnologia B, 8,097 g / 100 L de leite para a
tecnologia C e por fim, 116,4 g/100 L para a tecnologia D.
Analisando o impacto financeiro que o NPN do leite tem na produção de queijo, observou-se que o
aumento de 1 % de NPN resultou num aumento de 1,455 g de PB no leite necessários para produzir 1
kg de queijo, equivalente a uma perda de 9,90 € por tonelada de queijo A, as perdas de PB referentes
ao queijo B e D foram mais acentuadas, 2,916 g e 2,798 g de PB no leite por kg de queijo, representando
respetivamente 19,84 € e 19,04 € por tonelada de queijo. Relativamente ao queijo C, este aparenta ter
ganhos monetários com o aumento do NPN no leite e suspeita-se que o principal motivo seja a calibração
do canal de leitura da PT. Concluindo, a necessidade de aumentar a utilização destes componentes,
fulcrais para a produção de queijo, resulta em perdas equivalentes a 11,39 €, 26,69 € e 29 € por
tonelada de queijo A, B e D produzidos.
No estudo do impacto do NPN e da ureia na qualidade organolética no queijo, em relação à acidez e
textura, os resultados foram contraditórias. Os queijos produzidos com leite com maior percentagem de
ureia mostraram ser mais amargos e salgados, podendo-se concluir que teores superiores de ureia
resultam num declínio da qualidade do queijo.
Como corolário do trabalho, pode-se averiguar que há uma margem de melhoria que pode ser trabalhada,
na tentativa de conseguir leite tecnologicamente mais apto para a produção de queijo, com alta
Conclusões
63
percentagem de PB e com o menor teor possível de NPN e ureia. Este facto é confirmado pelas diferenças
significativas observadas no leite dos produtores, havendo um intervalo considerável de variação das
frações azotadas do leite. Se considerarmos que a margem de melhoria é equivalente a uma variação
do NPN no leite dos produtores, por exemplo, entre o valor máximo de NPN registado e a média do NPN,
pode-se estabelecer que a margem de melhoria é de 1,14 % do percentual de NPN na fração de PB do
leite. Sabe-se que a manipulação do conteúdo de NPN do leite é possível, graças ao estudo estatístico
realizado às técnicas de maneio e nutrição, que mostram que o Mix está associado a um aumento do
NPN em 0,4 %, a silagem de milho em trincheira em 0,3 % e o Unifeed de 0,5 %. O estudo destes fatores
de forma a reduzir os teores de NPN, mesmo que apenas em 1 %, irá resultar numa melhoria tecnológica
da produção de queijo, originando consequentemente ganhos monetários.
Recomendações
65
6. RECOMENDAÇÕES
Na revisão bibliográfica, tem-se como certo que a alimentação é o principal fator a influenciar a
composição do leite. Os resultados da análise estatística realizada a partir da informação conhecida,
referente às técnicas de maneio e nutrição das explorações de leite, vão de encontro com esta
constatação, pois conclui-se que o principal fator a influenciar o conteúdo de NPN e de ureia no leite é o
tipo de concentrados, mais especificamente o Mix, o método de ensilagem das forragens, e o Unifeed.
Uma vez que o Unifeed não é um componente da dieta, mas sim um sistema de arraçoamento e
distribuição de alimentos, como proposta de estudo posterior sugere-se uma análise dos elementos
ligados à alimentação que são mais comumente usados em combinação com o Unifeed, de forma a
determinar quais são os parâmetros da dieta associados à sua utilização e que estão a contribuir para o
incremento do NPN e da ureia na dieta.
Relativamente aos concentrados e às forragens, estes dois componentes da dieta são os que mais
determinam os níveis de produção e a composição do leite, uma vez que são as principais fontes de
proteína e energia da dieta. As interações entre a proteína e energia da dieta e a quantidade de proteína
utilizada pela vaca são complexas e têm consequências importantes na eficiência global da utilização de
azoto. Partindo deste princípio, iniciou-se um estudo preliminar, como proposta para uma próxima fase
do projeto, dos fatores mais importantes que deverão ser investigados para uma melhor compreensão
do comportamento das frações proteicas do leite. No anexo V está apresentado o inquérito formulado
com o fim de caraterizar, da forma mais completa possível, as técnicas de maneiro, e a composição da
dieta, a nível do tipo de alimentos, da sua composição proteica e energética, como também da
quantidade fornecida diariamente. Sugere-se que o inquérito seja distribuído por todos os produtores, de
maneira a construir uma base de dados mais sofisticada que possa ser analisada com recurso a
programas estatísticos como o SPSS Statistics 23.0®.
De forma a fornecer apoio na normalização das frações azotadas de todas as explorações, recomenda-
se o fornecimento de uma alimentação equilibrada que satisfaça todas as necessidades químicas e
físicas do efetivo, a realização de análises regulares às forragens e às silagens, em termos energéticos,
proteicos e minerais, como também ao tamanho da partícula. É também importante realizar análises
regulares à mistura feita no Unifeed e aos concentrados usados, para certificar que estão a atender às
exigências do rebanho que, juntamente com o recurso a registos de produção e do peso corporal do
animal, são práticas úteis para avaliar o sucesso dos programas nutricionais.
Recomendações
66
Para uma próxima fase do estudo, sugere-se também a análise da eficiência das técnicas que mostraram
estar a impactar os teores de NPN e ureia no leite (Unifeed, Mix, silagem de milho em silo trincheira e
erva em silo trincheira) e a determinação da sua correta implementação, de forma a reduzir o teor de
NPN no leite. Recomenda-se um estudo mais aprofundado das explorações que mostraram produzir leite
com os conteúdos baixos de NPN como também a um nível constante, com poucas oscilações, de
maneira a determinar o que os diferencia dos restantes produtores. Também será fundamental uma
investigação mais detalhada das características das explorações que conseguem produzir volumes altos
de leite e ao mesmo tempo manter os níveis de NPN e ureia no leite baixos. Por fim, recomenda-se a
continuação do trabalho durante o período de um ano de maneira a caracterizar, de uma forma mais
eficaz, a resposta das frações azotadas do leite, em especial o NPN, e as consequências que tem na
transformação de leite em queijo, às variações ambientais e às alterações a nível nutricional associados
às diferentes estações do ano.
Bibliografia
67
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