UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA ESTRUTURA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO PARA EFICÁCIA DA LEI MARIA DA PENHA Por: Sâmia Balreira Pontes Orientador Prof. Jean Alves Rio de Janeiro 2015 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
ESTRUTURA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO PARA
EFICÁCIA DA LEI MARIA DA PENHA
Por: Sâmia Balreira Pontes
Orientador
Prof. Jean Alves
Rio de Janeiro
2015
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
ESTRUTURA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO PARA
EFICÁCIA DA LEI MARIA DA PENHA
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Direito e Processo Penal.
Por: Sâmia Balreira Pontes
3
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, sempre
presente em minha vida, realizando
meus sonhos e iluminando todos os
meus caminhos.
Aos meus inesquecíveis avós maternos
(in memoriam) Eleonor e Ernesto, cuja
criação, educação, carinho e suporte
me transformaram na pessoa que sou.
A minha mãe Evanilza, minha melhor
amiga, que sempre está ao meu lado
me incentivando e acima de tudo por
todo o seu carinho e paciência com o
meu “mau humor”.
4
DEDICATÓRIA
Dedico a minha amiga Silvana Gondim
por sempre me apoiar, orientar e
incentivar nos estudos, no trabalho e
na vida.
5
RESUMO
Analisam-se as questões e conceitos relevantes envolvendo a violência
doméstica e familiar consonante à Lei 11.340/2006 também denominada Lei
Maria da Penha, a violência de gênero no casal heterossexual. Para melhor
compreensão do tema, a primeira parte volta-se à análise dos aspectos
conceituais da Lei em comento. Na segunda parte é estudado o histórico da Lei
11.340/2006, antecedentes que visavam à proteção da vítima de violência
doméstica, o âmbito de incidência da lei Maria da Penha, as inovações, a
política pública proposta e natureza da Ação penal. A terceira parte dedica-se a
pesquisa de políticas públicas de proteção à mulher vítima e órgãos/instituições
criadas para desenvolvê-las.
6
METODOLOGIA
A pesquisa parte do método bibliográfico analisando o conteúdo
legislativo e doutrinário sobre o tema. No aspecto legislativo, é estudada a
Constituição da República Federativa do Brasil/88 – CRFB/88 e a Lei Maria da
Penha – Lei 11.340/06. A pesquisa bibliográfica baseia-se em livros, revistas,
artigos jurídicos, documentos e impressos em geral, bem como textos da
internet.
Pela abordagem pretendida, não haverá pesquisa de campo através de
entrevistas.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - A Lei Maria da Penha 12
CAPÍTULO II - Políticas Públicas de proteção à mulher vítima 26
de violência doméstica no Estado do Rio de Janeiro
CAPÍTULO III – Medidas Protetivas da Lei 11.340/2006 45
CONCLUSÃO 54
BIBLIOGRAFIA 56
LEGISLAÇÃO 58
ANEXOS 59
ÍNDICE 76
8
INTRODUÇÃO
Pesquisando o significado de violência doméstica ou familiar na literatura
anterior à criação da Lei Maria da Penha, não foi encontrada definição clara
sobre quais situações constituíam e quais não constituíam violência doméstica
ou familiar contra a mulher. Esta categoria era muito mais intuitiva do que
formal.
“No âmbito das relações privadas, a violência contra a mulher é um aspecto central da cultura patriarcal. A violência doméstica é uma forma de violência física e/ou psíquica, exercida pelos homens contra as mulheres no âmbito das relações de intimidade e manifestando um poder de posse de caráter patriarcal. Podemos pensar na violência doméstica como uma espécie de castigo que objetiva condicionar o comportamento das mulheres e demonstrar que não possuem o domínio de suas próprias vidas.” 1
Mas após a lei 11.340/2006 a violência doméstica ou familiar pôde ser
definida segundo três variáveis: quem agride, onde agride e quem sofre a
agressão. Para que a violência doméstica sofrida por uma mulher esteja
enquadrada na categoria “doméstica ou familiar” amparada pela lei Maria da
Penha é necessário que os atos de agressão sejam motivados não apenas por
questões estritamente pessoais, mas expressem posições de dominação do
homem e subordinação da mulher.
O objetivo deste trabalho é elencar as políticas públicas direcionadas às
mulheres2 vítimas de violência no casal heterossexual3, no Estado do Rio de
1 SABADELL, Ana Lucia. Manual de Sociologia Jurídica: introdução a uma leitura externa do
Direito. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 235,236. 2 Aplicação analógica das medidas protetivas da lei Maria da Penha em favor do homem: as medidas protetivas desta lei poderiam ser aplicadas analogicamente em favor de outras pessoas desde que se constate alguma analogia fática. Por exemplo: violência doméstica contra o homem. Nesse caso, constatada que a violência está sendo utilizada pela mulher como uma forma de imposição, não há dúvida que todas as medidas protetivas da Lei 11.340/2006 podem favorecer o homem, impondo-se a analogia in bonam partem (TJMG, Apel. Crim. 1.0672.07.249317-0, rel. Judimar Biber, j. 06.11.07). Nesse mesmo sentido, decisão do juiz Mário R. Kono de Oliveira (Cuiabá-MT), que sublinhou: o homem que, em lugar de usar violência, busca a tutela judicial para sua situação de ameaça ou de violência praticada por mulher, merece atenção do Poder Judiciário. 3 A Justiça do Rio Grande do Sul tomou uma medida inédita em relação aos direitos dos homossexuais. Um juiz da comarca de Rio Pardo, a 150 quilômetros de Porto Alegre, decidiu
9 Janeiro. O objeto do mesmo não abrange todas as situações de violência
doméstica e de gênero, pois, a violência que será estudada é a violência no
casal heterossexual, seja ela física, psicológica, sexual, patrimonial e moral,
conceituadas no artigo 7º da lei 11.340/2006, Incisos I a V, e as medidas
protetivas direcionadas às mulheres vítimas de violência no casal
heterossexual.
Este estudo se limitará ao conceito de violência de gênero da Lei
11.340/2006, por se entender que violência de gênero, para os fins de
compreensão desta análise, é a relação violenta entre homens e mulheres que
se estabelece dependendo da proximidade afetiva dos envolvidos, pois em
sentido geral a violência de gênero pode ocorrer também entre pessoas que
mal se conhecem, mas que, por um motivo qualquer se encontram em situação
de interação. Como, por exemplo, entre colegas de trabalho, companheiros de
viagem etc. E esse tipo de violência de gênero não é amparado pela lei
11.340/2006, pois dependendo do crime, será processado em um Juizado
Criminal Comum, Vara Criminal ou Tribunal de Júri. E não em Juizado de
Violência Domestica e Familiar criado para este fim.
Sergio Ricardo de Souza 4 define violência de gênero como:
“A violência de gênero se apresenta como uma forma mais extensa e se generalizou como uma expressão utilizada para fazer referência aos diversos atos praticados contra mulheres como forma de submetê-las a sofrimento físico, sexual e
aplicar a Lei Maria da Penha a uma relação homossexual e concedeu medida de proteção a um homem que afirmou estar sendo ameaçado pelo ex-companheiro.A decisão do juiz Osmar de Aguiar Pacheco foi tomada em 25 de fevereiro de 2011 e anunciada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. A medida obriga o homem a manter uma distância de, no mínimo, 100 metros do ex-companheiro, sob pena de prisão.Para o magistrado, embora a Lei Maria da Penha tenha como objetivo a proteção das mulheres contra a violência doméstica, qualquer pessoa em situação vulnerável pode ser beneficiada pela lei. Ele citou a Constituição, segundo a qual todos são iguais perante a lei, sem discriminações de qualquer natureza. Mesmo sendo do sexo masculino, a vítima mereceria a proteção da lei em um caso de violência doméstica. E em 19 de abril de 2011 o Juiz da 11ª Vara criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro também aplicou a Lei Maria da Penha a um casal de homossexual, apesar da Lei Maria da Penha ser claramente destinada à violência doméstica contra mulheres. A decisão, divulgada pelo Tribunal de Justiça do Estado (TJ-RJ), condena o réu Renã Fernandes Silva a se manter a uma distância de 250 metros de seu companheiro, o cabeleireiro Adriano Cruz de Oliveira. O réu teve concedida a liberdade provisória, sem o pagamento de fiança. 4 SOUZA, Sérgio Ricardo. Comentários à lei de combate à violência contra a mulher. Curitiba: Juruá, 2009, p. 27.
10
psicológico, aí incluídas as diversas formas de ameaças, não só no âmbito intrafamiliar, mas também abrangendo a sua participação social em geral, com ênfase para as suas relações de trabalho, caracterizando-se principalmente pela imposição ou pretensão de imposição de uma subordinação e controle de gênero masculino sobre o feminino. A violência de gênero se apresenta, assim, como um ‘gênero’, do qual as demais, são espécies.”
A Lei Maria da Penha pode garantir proteção a quem sofre agressões
físicas, patrimoniais, sexuais ou morais em suas relações íntimas de afeto,
domésticas e familiares. E no artigo 7º, incisos I a V, configura cada uma das
violências e seu campo de abrangência, in verbis:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal. II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
A violência de gênero no casal heterossexual, na proposta deste trabalho,
é a que ocorre em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva
ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação, é um
11 conceito especifico do conceito mais amplo que é o de violência doméstica,
porque se restringe àqueles indivíduos que de alguma maneira tiveram ou tem
uma relação intima de afeto, com a ofendida, independentemente de
coabitação.
Entretanto o conceito de violência doméstica, por sua vez, está ligado ao
conceito de território, abrangendo aqueles casos em que os envolvidos
desfrutam de certa intimidade e convivência em um espaço que pode ser
concreto ou simbólico. Sabemos que a violência doméstica, de maneira geral,
não se restringe ao espaço territorial do domicilio ou da residência das partes,
contudo, essa distinção é feita apenas para diferenciá-la da violência familiar.
Porque se entende que o legislador não quis deixar impune aquele individuo
que é um familiar e não mora com a vítima, mas que a agrediu na rua, no
trabalho ou na escola, ou em outro lugar. Da mesma forma também protegeu
aquela mulher que não tem ligação familiar, nem afetiva, mas que convive no
contexto doméstico.
Embora a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) utilize a violência
doméstica para significar também os casos de violência no casal, optamos por
utilizar esse conceito somente para o objeto em estudo. Pois o campo proposto
pela Lei Maria da Penha é muito vasto, mesmo que a Lei Maria da Penha não
venha abranger toda e qualquer violência doméstica ou familiar contra a
mulher, mas apenas aquela que pode ser qualificada como violência de
gênero, isto é, atos de agressão motivados não apenas por questões
estritamente pessoais, mas expressando posições de dominação do homem e
subordinação da mulher, ela atinge um grande universo. E o nosso objetivo
principal é analisar a violência no casal heterossexual e as medidas protetivas
direcionadas às mulheres vítimas neste contexto.
12
CAPÍTULO I
A Lei Maria da Penha
1.1 Histórico da Lei
A Lei Maria da Penha, Lei n° 11340, foi promulgada em 07 de agosto de
2006, pelo presidente Lula.
A trajetória dessa lei começou em 1983 , quando o ex-marido da
farmacêutica Maria da Penha, o professor universitário e economista
colombiano Marco Antonio Heredia Viveros, tentou matá-la duas vezes. Na
primeira vez atirou contra ela, simulando um assalto, e na segunda tentou
eletrocutá-la. Por conta das agressões sofridas, Penha ficou paraplégica,
demonstrando que a violência contra a mulher não se limita às classes sociais
mais baixas, mas sim, é reflexo de uma cultura onde a mulher é encarada
como ser inferior que deve se subjugar às vontades muitas vezes cruéis de
seus parceiros.
Maria da Penha ergueu a voz, clamou por ajuda e, mesmo paraplégica,
foi buscar a proteção da Justiça. Em 20 de agosto de 1998, juntamente com
Centro pela Justiça e o Direito Internacional(CEJIL),5 através do Comitê Latino-
Americano e do Caribe para a defesa de Direitos da Mulher (CLADEM),6 Maria
da Penha formalizou uma denúncia contra o Brasil à Comissão Interamericana
dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). A ação
resultou no relatório nº 54 de 2001,7 que concluiu pela omissão do Brasil no
que se refere à problemática da violência contra a mulher, e recomendou a
adoção de medidas para simplificar o sistema jurídico brasileiro para, desta
5 O CEJIL, é uma ONG fundada em 1991 e existe no Brasil desde 1994, tendo por finalidade a proteção e promoção dos direitos humanos junto aos Estados-Membros da Organização dos Estados Americanos. Disponível em www.dhnet.org.br/direitos/sip/ongs/cejil/cejil.html .Acesso em janeiro de 2015. 6 O CLADEM é formado por um grupo que atua na defesa dos direitos das mulheres da América Latina e Caribe. Disponível em www.cladem.org/ .Acesso em janeiro de 2015. 7 Comissão Interamericana de Direitos Humanos: relatório 54/01 – Disponível em www.cidh.org/comissao.htm. Acesso em janeiro de 2015.
13 maneira, permitir uma concreta implementação dos direitos já reconhecidos
pela Convenção Americana e Convenção de Belém do Pará.
Após 9 (nove) anos de busca pela justiça, Maria da Penha pode ver seu
agressor condenado a dez anos e 6 seis meses de reclusão, mas Marco
Antônio recorreu da decisão, conseguindo êxito em sua pretensão, ficou preso
somente por 2 (dois) anos, podendo assim responder ao processo em
liberdade. A história de Maria da Penha representa um padrão sistemático de
violência, de impunidade, de ineficácia, de demora e de impossibilidade de
reparação.
1.2 Antecedentes que visavam à proteção da vítima de
violência doméstica
Um antecedente legislativo ocorreu em 2002, através da Lei nº 10.455/o2,
que acrescentou ao parágrafo único do art. 69 da Lei nº 9.099/958 a previsão
de uma medida cautelar, de natureza penal, consistente no afastamento do
agressor do lar conjugal na hipótese de violência doméstica, a ser decretada
pelo Juiz do Juizado Especial Criminal.
Outro antecedente ocorreu em 2004, com a Lei nº 10.886/04, que criou no
art. 129 do Código Penal, um subtipo de lesão corporal leve, decorrente de
violência doméstica, aumentando a pena mínima de 3 (três) para 6 (seis)
meses. Nenhum dos antecedentes empolgou. A violência doméstica,
infelizmente continuou acumulando estatísticas.
Veio, então, a lei nº 11.340/06 – a Lei Maria da Penha- cuja origem, não
se tem dúvidas em afirmar isto, está no fracasso da aplicação das alterações
feitas pelas leis anteriores.
8 Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários. Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima. (Redação dada pela Lei nº 10.455, de 13.5.2002))
A Lei 11.340/06 não criou novos tipos penais, mas trouxe em si
dispositivos complementares de tipos pré-estabelecidos, com caráter especial,
em referência aos quais exclui benefícios despenalizadores (art. 41), altera
penas (art. 44), estabelece nova majorante (art. 44) e agravante (art. 43),
engendra novas possibilidades de prisão preventiva (arts. 20 e 42), etc. A partir
de sua vigência, houve, por exemplo, versões especiais de lesões corporais
leves praticadas em situação de violência doméstica ou familiar contra a
mulher, do mesmo modo, ameaças, constrangimento ilegal, crime de
periclitação da vida e da saúde, exercício arbitrário das próprias razões, dano,
crimes contra a honra, todos em situações específicas que, como se sabe,
prevalecem sobre as formas gerais.
A Lei Maria da Penha criou mecanismos para coibir e prevenir a violência
doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da
Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas
de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir,
Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados
internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a
criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e
estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de
violência doméstica e familiar.
“Concebendo-se a norma não apenas como uma forma vazada em palavras solenes, mas como um texto que anseia por tornar-se substância, por ser eficaz, resulta impossível separar a norma e a realidade histórica em que se encontra contextualizada, pois é esta realidade o solo mesmo do vigor normativo ou do seu definhamento. Essa pretensão de eficácia da norma jurídica, para atingir sua meta, deve, portanto, levar em conta as condições técnicas, naturais, econômicas e sociais de uma realidade, bem como o substrato espiritual de cada sociedade, traduzido nas concepções sociais concretas e no arcabouço axiológico que permeia a comunidade. Não se trata de a norma submeter-se a esta realidade, aviltando-se à condição de seu mero reflexo, pois a pretensão de eficácia é um apanágio autônomo da norma constitucional [e de qualquer
15
norma legal] pelo qual esta procura imprimir ordem e conformação à realidade política e social.”9
Entretanto, não abrange toda e qualquer violência doméstica ou familiar
contra a mulher, mas apenas aquela que pode ser qualificada como violência
de gênero, isto é, atos de agressão motivados não apenas por questões
estritamente pessoais, mas expressando posições de dominação do homem e
subordinação da mulher. Conforme seu artigo 5º caput, in verbis:
Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
Com essa inovação tem-se a tipificação e definição da violência
doméstica e familiar contra a mulher. Determina ainda, punições mais graves,
criminalizando a agressão. Estabelece ainda no art.5º § único, as formas de
violência contra a mulher independente de sua orientação sexual, in verbis:
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de
orientação sexual.
Podemos verificar, portanto, que a intenção do legislador brasileiro foi a
de buscar coibir a prática de violência contra a mulher no âmbito doméstico e
familiar.
Desse modo, sob o aspecto objetivo ou físico-espacial, a lei em comento
é destinada a combater e punir os fatos no âmbito doméstico (familiar ou
intrafamiliar). Já no que se refere ao aspecto subjetivo, tem por objetivo tutelar
a mulher contra ato de violência que possa sofrer, tendo como agressor (
sujeito ativo) homem ou mulher com o qual tenha uma relação íntima,
independente da orientação sexual. São englobados, assim, casais de
mulheres que mantenham uma relação homoafetiva.
Podem também caracterizar-se como agressoras pessoas com as quais a
mulher conviva no âmbito domestico e familiar, como pai, irmão, cunhado etc.,
9 PORTO, Pedro Rui da Fontoura. Direitos Fundamentais Sociais – Considerações acerca da Legitimidade Política e Processual do Ministério Público e do Sistema de Justiça para sua Tutela. Porto Alegre – Ed. Livraria do Advogado, ano 2006, p. 74.
16 não exigindo em relação a tais pessoas a necessidade de que a violência tenha
ocorrido no espaço físico da convivência, podendo caracterizar-se ainda que
sua ocorrência se dê em qualquer outro lugar.
É importante frisar que as pessoas esporadicamente agregações ao
âmbito doméstico também podem ser sujeitos passivos, abrangendo, por
exemplo, as empregadas domésticas que venham a sofrer agressões
perpetradas por seus patrões.
1.4 Inovações na Lei Maria da Penha
De acordo com a lei a mulher somente poderá se retratar da
representação perante o juiz. É vedada a entrega da intimação pela mulher ao
agressor. O pagamento de multa ou cestas básicas ficam proibidas.
O Ministério Público apresentara denuncia ao juiz e poderá propor penas
de três meses a três anos de detenção.
O Juiz poderá conceder, no prazo de 48hs, medidas protetivas de
urgência, dependendo da situação. Como a suspensão do porte de armas do
agressor, afastamento do lar, distanciamento da vitima, entre outras.
A mulher deverá estar acompanhada de advogado (a) ou defensor (a) em
todos os atos processuais.
Determina a criação de juizados especiais de violência doméstica e
familiar contra a mulher com competência cível e criminal para abranger as
questões de família decorrentes da violência contra a mulher.
O crime não é mais considerado de baixo potencial ofensivo, a lei tem
caráter positivo, além de chamar a atenção do agressor, estimula a denúncia.
É importante salientar que as inovações da nova lei no tocante aos crimes
de ação penal privada, quando praticados em situação de violência doméstica
ou familiar contra a mulher, crimes de dano, exercício arbitrário das próprias
razões e crimes contra a honra. A nova lei apenas afastou a incidência da Lei
9.099/95, persistindo, porém, a regra da ação penal privada, com o que se
pode afirmar que legislador foi paradoxal, pois, novamente, a pretexto de
17 aumentar a repressão desses delitos, acabou colaborando, inadvertidamente,
para sua impunidade.
Com efeito, desde que entrou em vigor a Lei 9.099/95 sempre houve forte
tendência a se trazer para o âmbito dos Juizados Especiais Criminais os
termos circunstanciados envolvendo delitos contra a honra, antes mesmo do
ajuizamento das ações privadas, oportunizando-se, nessa quadra pré-
processual, a conciliação e a transação penal.
Era uma forma de alentar o acesso à justiça e prevenir delitos mais
graves pela via célere da justiça consensual. Além disso, sempre que
impossível a conciliação ou a transação, a ofendida era então instruída a
procurar um advogado ou os órgãos de assistência judiciária para propor a
queixa-crime.
Agora, afastada a Lei 9.099/95, a vítima de crime contra a honra terá de
contar com a boa vontade da polícia judiciária, já assoberbada de trabalho,
para a realização de um inquérito policial a ser concluído antes do prazo
decadencial e, depois, dispondo do inquérito, procurar serviço de assistência
judiciária gratuita com disponibilidade para a propositura da queixa-crime em
tempo hábil.
Não é preciso grande esforço para concluir que a nova lei jogou esta cifra
delitiva para debaixo do tapete, inviabilizando, por completo, em face da atual
realidade estrutural, o acesso à justiça destas espécies típicas.
E esta realidade se fez presente no relatório do Instituto de Segurança
Pública –ISP do Estado do Rio de Janeiro, não foi feito nenhum registro de
violência dos crimes de dano, exercício arbitrário das próprias razões e crimes
contra a honra.
1.5 A política pública proposta pela Lei Maria da Penha
Foi visto que, ao contrário do que parece ao senso comum, uma boa
parte das pessoas que vivem em situações de violência tentaram por diversas
vezes romper com a mesma. Mas muitas vezes tais pessoas não foram bem
18 sucedidas pelas fragilidades psicossociais, bem como pelas limitações das
instituições às quais recorreram.
As Políticas Públicas discutem as possibilidades de prevenir as diferentes
formas de violência a partir do campo da saúde pública.
O poder público brasileiro vem se alertando sobre os graves problemas
que a violência social significa para o setor saúde. Conclui-se que, trata de um
fenômeno histórico-cultural, construído em sociedade, portanto é passível de
desconstrução.
Dada a sua complexidade, qualquer processo de intervenção deverá
abranger questões macro-estruturais, conjunturais, culturais, de gênero,
relacionais e subjetivas, bem como focalizar a especificidade dos problemas,
de fatores de risco e das possibilidades de mudança.
As Políticas Públicas e serviços de atendimento às mulheres em situação
de violência começaram a ser implantados em decorrência das pressões
desenvolvidas pelos movimentos feministas no Brasil e no mundo a partir dos
anos 70.
Alguns promotores jurídicos enfatizam a falta de políticas públicas com
enfoque integral que visem o resgate das mulheres em situação de violência.
Juízes e Delegadas têm afirmado que as mulheres fazem a retratação da
representação para manterem ou voltarem à convivência com os agressores.
Para promotora de Justiça Jaqueline Martinelli desfazer um relacionamento
afetivo não é uma decisão fácil nem simples. São muitos os fatores envolvidos:
Portanto é necessário um atendimento que considere todas essas
questões. Para o judiciário, se não for acompanhamento global, o trabalho não
é eficaz e acaba por reforçar a discriminação contra a mulher.
A violência doméstica permeia por todas as classes sociais, algumas
procuram as delegacias, para fazerem as representações contra seus
agressores, e há aquelas mulheres que por “status” social ficam caladas.
10 Jaqueline Lorenzetti Martinelli - Promotora de justiça, integrante do MP- São Paulo
25/08/2007.
19 A lei Maria da Penha no seu art. 8º define como será feita a Política Pública
proposta:
Art. 8o A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes: I - a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação; II - a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e outras informações relevantes, com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia, concernentes às causas, às conseqüências e à freqüência da violência doméstica e familiar contra a mulher, para a sistematização de dados, a serem unificados nacionalmente, e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas; III - o respeito, nos meios de comunicação social, dos valores éticos e sociais da pessoa e da família, de forma a coibir os papéis estereotipados que legitimem ou exacerbem a violência doméstica e familiar, de acordo com o estabelecido no inciso III do art. 1o, no inciso IV do art. 3o e no inciso IV do art. 221 da Constituição Federal; IV - a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em particular nas Delegacias de Atendimento à Mulher; V - a promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres; VI - a celebração de convênios, protocolos, ajustes, termos ou outros instrumentos de promoção de parceria entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades não-governamentais, tendo por objetivo a implementação de programas de erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher; VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas enunciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia; VIII - a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia; IX - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, à eqüidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher.
A política pública apresentada pela lei Maria da Penha, vem ao encontro
do anseio social, pois a lei determina que o Estado forneça mecanismos de
prevenção e meios de sobrevivência às mulheres vítimas de violência
doméstica e familiar, que precisam de amparo e orientação para que possam
voltar a viver uma vida digna.
Art. 9o A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso. § 1o O juiz determinará, por prazo certo, a inclusão da mulher em situação de violência doméstica e familiar no cadastro de programas assistenciais governo federal, estadual e municipal. § 2o O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica: I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da administração direta ou indireta; II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. § 3o A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar compreenderá o acesso aos benefícios decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico, incluindo os serviços de contracepção de emergência, a profilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e outros procedimentos médicos necessários e cabíveis nos casos de violência sexual.
Para Helena Omena e Mônica Melo :11 a presente lei demonstra-se como
mais uma forma de implantação de ações afirmativas, de maneira a trazer a
observância do principio não só da igualdade material, mas acima de tudo, o da
dignidade a pessoa humana, de modo a igualar o status entre homens e
mulheres.
11 Série Estudo, Procuradoria Geral do Estado, São Paulo, nº 11. Outubro de 1988, p.381.
21 1.6 Natureza da Ação Penal
QUADRO SINÓPTICO
Delito Representação Conciliação Transação Susp. Cond do
Processo (SCP)
Art. 129, § 9º, CP
Lesão
Corporal*
Exigível: art. 16 Lei
11.340/06
Cabível em juízo como
condição da renúncia à
representação.
Afastada pelo art.
41 da Lei
11.340/06
Afastada pelo art. 41
da Lei 11.340/06
Art. 147 CP
Ameaça
Exigível: art. 147, §
único, CP
Cabível em juízo como
condição da renúncia à
representação.
Afastada pelo art.
41 da Lei
11.340/06
Afastada pelo art. 41
Lei 11.340/06
Arts. 138, 139 e
140 CP
Calúnia, Difamação
Injúria
Ação penal privada. Cabível em juízo como
condição da renúncia à
queixa-crime ou perdão
do ofendido.
Afastada pelo art.
41 da Lei
11.340/06
Afastada pelo art. 41
da Lei 11.340/06
Art. 150 e seu § 1º
do CP
Violação de
Domicilio
Ação penal pública
incondicionada
Incabível, por se tratar
de ação penal pública
incondicionada
Afastada pelo art.
41 da Lei
11.340/06
Afastada pelo art. 41
da Lei 11.340/06
Art. 163 caput e
par. único, IV, do
CP
Dano
Ação penal privada Cabível em juízo como
condição da renúncia à
queixa-crime ou perdão
do ofendido
Afastada pelo art.
41 da Lei
11.340/06
Afastada pelo art. 41
da Lei 11.340/06
Art. 163, parágrafo
único, I e II, do CP.
Dano
Ação penal pública
incondicionada
Incabível, por se tratar
de ação penal pública
incondicionada
Incabível porque a
pena máxima é
superior a 02 anos
Afastada pelo art. 41
da Lei 11.340/06
Arts. 217-A, caput,
e 213-CP
Ação penal pública
incondicionada ou
pública condicionada à
representação (art.
225, § único)
Cabível, somente na
ação condicionada a
representação.
Afastada pelo art.
41 da Lei
11.340/06
Afastada pelo art. 41
da Lei 11.340/06
Art. 21 da LCP Exigível por analogia
ao delito de lesões
corporais leves
Cabível, pois pode
condicionar a opção
pela representação.
Cabível, pois o art.
41 da Lei
11.340/06,
somente se refere
a crimes
Cabível, pois o art.
41 da Lei 11.340/06,
somente se refere a
crimes e não a
contravenções
22
* Nas hipóteses de crimes que decorram de violência doméstica e familiar
contra a mulher, o art. 16 da lei 11.340/2006 destaca que, nas ações penais
públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta lei, só
será admitida a retratação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o
Ministério Público.
Entretanto, deve-se verificar, no caso de lesão corporal leve no âmbito de
violência doméstica e familiar contra a mulher, não se trata mais de infração de
menor potencial ofensivo, tendo em vista a pena máxima de três anos prevista
no art. 129, § 9º, do código penal. Dessa forma, não teriam aplicação as
disposições da lei 9.099/95, notadamente o art. 88 da referida lei, que diz se a
ação pública condicionada à representação da ofendida.
Nesse sentido, o STJ destaca que: A lesão corporal praticada contra a
mulher no âmbito doméstico é qualificada por força do art. 129, §9º, do CP e se
disciplina segundo as diretrizes desse diploma legal, sendo a ação penal
pública incondicionada.12
Ainda a Quinta Turma segue decidido que a ação é pública
incondicionada, vejamos decisão abaixo:
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. LESÃO CORPORAL LEVE PRATICADA COM VIOLÊNCIA FAMILIAR CONTRA A MULHER. INAPLICABILIDADE DA LEI 9.099/95 E, COM ISSO, DE SEU ART. 88, QUE DISPÕE SER CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO O REFERIDO CRIME. AUSÊNCIA DE NULIDADE NA NÃO-DESIGNAÇÃO DA AUDIÊNCIA PREVISTA NO ART. 16 DA LEI MARIA DA PENHA, CUJO ÚNICO PROPÓSITO É A RETRATAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO. PARECER MINISTERIAL PELA CONCESSÃO DO WRIT. ORDEM DENEGADA. 1. Esta Corte, interpretando o art. 41 da Lei 11.340/06, que dispõe não serem aplicáveis aos crimes nela previstos a Lei dos Juizados Especiais, já resolveu que a averiguação da lesão corporal de natureza leve praticada com violência doméstica e familiar contra a mulher independe de
12STJ, HC nº 106.805/MS, Min. Jane Silva(desembargadora convocada do TJ/MG), Sexta
Turma, DJe 9/3/2009
23
representação. Para esse delito, a Ação Penal é incondicionada (REsp. 1.050.276/DF, Rel. Min. JANE SILVA, DJU 24.11.08). 2. Se está na Lei 9.099/90, que regula os Juizados Especiais, a previsão de que dependerá de representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais e lesões culposas (art. 88) e a Lei Maria da Penha afasta a incidência desse diploma despenalizante, inviável a pretensão de aplicação daquela regra aos crimes cometidos sob a égide desta Lei. 3. Ante a inexistência da representação como condição de procedibilidade da ação penal em que se apura lesão corporal de natureza leve, não há como cogitar qualquer nulidade decorrente da não realização da audiência prevista no art. 16 da Lei 11.340/06, cujo único propósito é a retratação.
4. Ordem denegada, em que pese o parecer ministerial em contrário. (HC 91.540/MS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 19/02/2009, DJe 13/04/2009)
O STJ passou a adotar entendimento contrário em 24/2/2010, tendo
noticiado que, por maioria, a terceira Seção do STJ entendeu ser necessária a
representação da vítima nos casos de lesões corporais de natureza leve,
decorrentes de violência doméstica, para a propositura da ação penal pelo
Ministério Público.
Vejamos:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PROCESSO PENAL. LEI MARIA DA PENHA. CRIME DE LESÃO CORPORAL LEVE. AÇÃO PENALPÚBLICA CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO DA VÍTIMA. IRRESIGNAÇÃOIMPROVIDA.LEI MARIA DA PENHA 1. A ação penal nos crimes de lesão corporal leve cometidos em detrimento da mulher, no âmbito doméstico e familiar, é pública condicionada à representação da vítima. 2. O disposto no art. 41 da Lei 11.340/2006, que veda a aplicação da Lei 9.099/95, restringe-se à exclusão do procedimento sumaríssimo e das medidas despenalizadoras. Art. 41 da lei 11.340 3. Nos termos do art. 16 da Lei Maria da Penha, a retratação da ofendida somente poderá ser realizada perante o magistrado, o qual terá condições de aferir a real
24
espontaneidade da manifestação apresentada. Art.16 da Lei Maria da Penha 4. Recurso especial improvido. (Resp.1097042 DF 2008/0227970-6, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 24/02/2010, S3 - TERCEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 21/05/2010)
No STF, diante das divergentes decisões judiciais e posicionamentos
doutrinários, o Procurador Geral da República, Roberto Monteiro Gurgel
Santos, ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn), onde
defendia que todos os atos de violência praticados contra a mulher no âmbito
familiar não seriam aplicáveis os dispositivos da Lei nº 9.099/95, ou seja, os
crimes de lesão corporal independente da gravidade deveriam ser de ação
pública incondicionada a representação.
Dentre seus argumentos, Gurgel 13alegou que,
“Após dez anos da aprovação da Lei nº 9.099/95, cerca de 70%
dos casos que chegavam aos Juizados Especiais envolviam
situações de violência doméstica contra mulheres. A lei
desestimulava a mulher a processar o marido ou companheiro
agressor e consequentemente reforçava a impunidade
presente na cultura e na prática patriarcal.”
A referida ação foi julgada no dia 09 de fevereiro de 2012 pelos ministros do
STF. A referida decisão julgou procedente a ação ajuizada pelo Procurador
Geral da República quanto aos arts. 12, inc. I, 16 e 41 da Lei Maria da Penha,
por maioria dos votos, vencido o Presidente, ministro Cezar Peluso, conforme
segue a decisão14:
13 PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MATO GROSSO. ADI sobre Lei Maria da Penha é julgada procedente pelo STF. Cuiabá, 2012. Disponível em http://www.prmt.mpf.gov.br/noticias/adi-sobre-lei-maria-da-penha-e-julgada-procedente-pelo-stf Acesso em janeiro de 2015.
14 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (Med. Liminar) - 4424. Brasília, 2012. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=maria%20da%20penha&processo=4424 . Acesso em janeiro de 2015.
28 para as mulheres a ele vinculado. Em 2007 foi criada a Superintendência de
Direitos da Mulher-SUDIM/RJ, dentro da estrutura da Secretaria Estadual de
Assistência Social e Direitos Humanos (SEASDH), passando a abrigar o
CEDIM em sua estrutura. Em fevereiro de 2013 a SUDIM deixa de existir, com
a criação da Subsecretaria de Políticas para as Mulheres, conferindo maior
agilidade administrativa ao organismo responsável por elaborar e executar as
políticas públicas para as mulheres, no estado do Rio de Janeiro. A
Subsecretaria de Políticas para as Mulheres – SPMulheres-RJ/SEASDH – foi
instituída por meio do Decreto 44.076 de 20/02/2013, mantidas as atribuições
da extinta Superintendência, a saber:
• Desenvolver políticas públicas para a eliminação de toda e qualquer
discriminação contra as mulheres que provoca desigualdade e
vulnerabilidade social que impeça o acesso destas ao pleno exercício de
sua cidadania.
• Articular com diferentes órgãos das três esferas de governo e entidades
da sociedade civil, com o objetivo de assegurar a implementação dos
planos de Políticas às mulheres.
• Promover a valorização e a difusão da produção das mulheres que, por
meio de diferentes expressões e linguagens, permite transformar a
cultura patriarcal, vindo a compor o patrimônio cultural das mulheres
fluminenses.
• Manter canais permanentes de contato e diálogo com os movimentos
feministas e de mulheres por meio do Conselho Estadual dos Direitos da
Mulher - CEDIM/RJ.
• Coordenar a formatação e articulação das Redes de Serviços de
Atendimento às mulheres em situação de violência nos dez pólos
regionais de Referência de Políticas par as Mulheres;
• Atender mulheres em situação de violência e discriminação através dos
Centros Integrados de atendimento à Mulher, CIAM Márcia Lyra(Rio de
Janeiro), CIAM Baixada (Nova Iguaçu) e a Casa da Mulher de
Manguinhos. Os atendimentos são realizados por equipes formadas por
assistentes sociais, advogados e psicologos, que atuam no
29
acompanhamento, apoio e orientação às usuárias. Os CIAM’S trabalham
em conjunto com as redes de atendimento locais(coordenadorias,
centros de referência, delegacias, defensoria pública, judiciário e
organizações da sociedade civil).
• Orientar mulheres em situação de violência e discriminação através do
DISQUE MULHER (21) 2332-8249.
• Participar da coordenação do Projeto Mulheres da Paz;
• Acolher, assistir e orientar as mulheres da comunidade de Maguinhos,
através da CASA DA MULHER DE MANGUINHOS, encaminhando-as
aos serviços especializados e à rede de atendimento.
2.1 Órgãos/Instituições criadas no Estado do Rio de Janeiro
para desenvolver as políticas públicas de proteção à mulher
vítima de violência doméstica, através dos serviços
especializados de atendimento à mulher.
2.1.1- Núcleo de Defesa dos Direitos da Mulher - NUDEM
A Defensora Pública Sula Caixeiro Omari coordenadora do Núcleo de
Defesa dos Direitos da Mulher Vítima de Violência (Nudem) aponta o silêncio
como um dos principais empecilhos para acabar com a violência doméstica e
familiar. A dependência econômica, a preocupação com os filhos e o
desconhecimento da rede de serviços para a proteção à mulher são outros
fatores apontados pelas vítimas.
No município do Rio de Janeiro, o Núcleo de Defesa dos Direitos da
Mulher Vítima de Violência - Nudem, situado na Rua do Ouvidor, 90- 4º andar,
Centro do Rio, tel 2332-6371, oferece assistência jurídica especial às mulheres.
Em todo o estado, o atendimento pode ser obtido nos núcleos de primeiro
atendimento da Defensoria Pública existentes nos bairros. E as vítimas
também poderão obter mais informações pelo telefone 0800-285-2279.
30 2.1.2- Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher - DEAM
No dia 18 de julho de 2011, a Delegacia Especializada de Atendimento a
Mulher (DEAM) completou 25 anos. Desde a inauguração da primeira unidade -
a DEAM–Rio, na Avenida Presidente Vargas, em 1986, atualmente na Rua
Visconde do Rio Branco, 12 Centro – mais 13 (treze) especializadas foram
construídas, além da Divisão de Polícia de Atendimento à Mulher (DPAM).
No dia 5 de setembro de 1985, a Defensora Pública Glauce Franco e um
grupo de estagiárias começaram a defender as mulheres vítimas de violência.
Elas prestavam assistência jurídica e classificaram essa iniciativa como “plano-
piloto” da delegacia feminina. Segundo a encarregada do Projeto da Delegacia
de Mulheres, Diva Mucio Teixeira, a violência contra as mulheres aumentava
cada vez mais. Só no ano de 1981, 800 homens mataram suas esposas ou
companheiras, alegando legítima defesa da honra.
Ainda naquele mês, o secretário de Justiça Vivaldo Barbosa começou a
examinar o projeto de lei da Delegacia de Defesa da Mulher, criado pelo
deputado Eurico Neves (PTB/RJ). O projeto foi inspirado na delegacia
especializada que existia em São Paulo. A criação da unidade tinha como
objetivo impedir que as mulheres continuassem se submetendo as situações
constrangedoras sempre que procuravam a polícia em busca de ajuda. De
acordo com o deputado, muitas vezes as mulheres ao serem atendidas por
homens não tinham suas queixas devidamente analisadas.
Em outubro daquele ano surge o plano de criação do precursor da DEAM
o Centro Policial de Atendimento a Mulher (CEPAM). O projeto tinha como
base atender a todas as mulheres, fazer uma avaliação de suas queixas e,
quando necessário, abrir inquérito. As escreventes, escrivães e assistentes
sociais dariam orientação às mulheres também em caso de desquite, divórcio,
direitos adquiridos e encaminhariam às Varas de Família.
A equipe do CEPAM foi chefiada pela delegada da Polícia Marly Preston,
única mulher no quadro de delegados da Polícia Civil naquela época.
Inaugurado em novembro de 1985, o centro era integrado por 15 mulheres,
sendo elas 13 policiais, uma assistente social e uma Defensora Pública.
31
Mesmo com o CEPAM, as mulheres continuaram reivindicando a criação
de uma delegacia especial de atendimento à mulher no Rio de Janeiro, o que
desencadeou na inauguração da primeira DEAM.16
O Estado do Rio de Janeiro após 25 anos de criação da primeira DEAM
tem 14 (quatorze) Delegacias de atendimento à Mulher, são as seguintes:
Deam em Cabo Frio, Deam em Belford Roxo, Deam em Campos dos
Goytacazes, Deam em Duque de Caxias, Deam Legal-Rio(Centro), Deam em
Jacarepaguá, Deam em Niterói, Deam em Nova Friburgo, Deam em Nova
Iguaçu, Deam em Campo Grande, Deam em São Gonçalo, Deam em São João
de Meriti, Deam em Vota Redonda e Deam em Angra dos Reis além da DPAM-
Divisão de Polícia de Atendimento à Mulher, no Centro do Rio.17
2.1.3- Juizados da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher no
Estado do Rio de Janeiro
A Lei 11.340/2006 – lei Maria da Penha - no art. 14 reza que: Os
Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça
Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no
Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o
julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência
doméstica e familiar contra a mulher.
No Estado do Rio de Janeiro a lei Estadual nº 5.337, de novembro de
2008, dispôs sobre os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher.
E no Estado já foram criados os seguintes Juizados : I,II,III,IV,V,VI e VII
na Capital, Rio de Janeiro, Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher -Duque de Caxias, Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher -Nova Iguaçu, Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a
16 www.policiacivil.rj.gov.br Acesso em fevereiro de 2015. 17 Folder do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro- Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher- Justiça pela Paz em casa. 2015
32 Mulher – Niterói, Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher -
São Gonçalo.18
Os Juizados da Violência doméstica e Familiar contra a Mulher, foram
criados com esse título violência doméstica e Familiar, porém os juizados não
são competentes para julgar todas as ações que tem como objeto a Violência
doméstica e Familiar19, conforme o art. 5º da lei 11.340/2006 “configura
violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão
baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou
psicológico e dano moral ou patrimonial.” Portanto os Juizados só serão
competentes para julgar as ações que configurem violência de gênero. Para
Luiz Regis Prado20 a violência de gênero existe como um fenômeno social, ou
seja, como um tipo específico de violência vinculado de modo direto ao sexo da
vítima – ao fato de ser mulher.
É importante destacar que a edição da lei 11.340/2006 demonstra a
necessidade de se realmente atentar para a diferença existente entre a
violência doméstica e a violência de gênero (art. 5º) por essência
discriminatória, da qual a mulher é principal vítima. Nesse sentido, pontifica-se
que a “violência contra as mulheres não é uma questão biológica, mas de
gênero. (...) é conseqüência de uma situação de discriminação que tem sua
origem em uma estrutura social de natureza patriarcal.” Afirma ainda Maqueda
Abreu 21, que o recurso à violência não é uma manifestação da agressividade
18 Folder do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro- Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher- Justiça pela Paz em casa. 2015 19 Ação Penal- procedimento Sumário – Lesão Corporal Decorrente de Violência Doméstica (art. 129, §9º e/ ou §11 –CP) N/F Violência Doméstica Contra a Mulher. Autor Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro- Autor do Fato: Valeria – Inquérito 3498/10 23ª Delegacia Policial. “Ressalte-se que o caso em questão não envolve violência Doméstica e familiar contra a mulher. Uma vez, apesar de a vítima ser mulher e haver relação de parentesco entre a vítima e a autora do fato(filha e mãe), de acordo com o dispositivo no caput do artigo 5º da Lei 11.340/06, para se configurar violência doméstica e familiar contra a mulher, a ação ou omissão deve ser baseada no gênero; sendo, portanto incompetente este Juízo para processar e julgar o presente feito. Isso Posto declino de Competência para uma das varas Criminais Competentes. Mirella Letizia Guimaraes Vizzini – Juiza em Exercício, Rio de Janeiro 17/03/2011. 20 PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 6ª edição revista, atualizada e ampliada. Vol.2. Parte especial. Barra Funda, São Paulo.RT,2007, p. 159 21 MAQUEDA ABREU, M.L. La Violência de gênero: entre El concepto jurídico Y La realidad social. Revista Eletrônica de Ciência penal y Criminologia, n. 08-02, 2006, p.2
33 ambiental dos conflitos típicos do casal, ou de fatores ocasionais, como a
ingestão de drogas ou álcool, pobreza, entre outros, tal como socialmente se
quer fazer crer, mas é um meio para garantir a relação de domínio por parte do
homem. Vale dizer: a violência tem aqui caráter instrumental para garantir a
submissão da mulher.
Portanto, as ações que configuram violência doméstica e familiar que não
estejam relacionadas com gênero, são julgadas por outras varas/juizados
competentes.
2.1.4- Casa Abrigo no estado do Rio de Janeiro
Assim afim de cumprir o previsto na Lei Maria da Penha, na Política e no
Pacto Nacional de Enfrentamento da Violência contra as Mulheres, na Política
Nacional de Abrigamento e nos relatórios produzidos nos seminários
promovidos pela SUDIM e realizados em 2008 e 2010, o Estado do Rio de
Janeiro, através da Comissão de Monitoramento da Casa Abrigo Lar da Mulher
– SUDIM/SEASDH, CEDIM, Riosolidário, CDDM/ALERJ e representação
governamental da Baixada Fluminense – elaborou a normatização técnica de
padronização de abrigamento de mulheres em situação de violência nas casas-
abrigo do estado.
O conceito de abrigamento diz respeito à gama de possibilidades,
(serviços, programas e benefícios) de acolhimento provisório destinados às
mulheres vítimas de violência doméstica e familiar que e encontrem sob
ameaça e necessitem de proteção em ambiente acolhedor e seguro.(política de
abrigamento – PNA)
A casa-abrigo é uma das formas de abrigamento de longa duração e faz
parte de uma das ações do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres e do
Pacto Nacional de Enfrentamento da Violência contra a Mulher, que têm como
prioridades a ampliação e o aperfeiçoamento da rede de atendimento às
mulheres em situação de violência.
Disponível em http://criminet.ugr.es/recpc/08/recpc08-02.pdf. Acesso em fevereiro de 2015, apud PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 6ª edição revista, atualizada e ampliada. Vol.2. Parte especial. Barra Funda, São Paulo.RT,2007, p. 159
A Casa Abrigo é um serviço (estadual ou municipal), de caráter sigiloso,
que atende a Mulheres Vítimas de Violência Doméstica e seus filhos, em
situação de risco iminente de morte. Um dos objetivos desta instituição é o
fortalecimento da auto-estima destas mulheres, bem como o resgate de sua
cidadania, através do acompanhamento da equipe técnica, composta por
Assistente Social, Psicóloga e Pedagoga.
O Termo de Referência para Implementação de Casas-Abrigo SPM/2005
define que: “As Casas-Abrigo são locais seguros que oferecem moradia
protegida e atendimento integral às mulheres em situação de risco de morte
iminente, em razão de violência doméstica. É um serviço de caráter sigiloso e
temporário, onde as usuárias poderão permanecer por um período
determinado, durante o qual deverão reunir condições necessárias para
retomar o curso de suas vidas. O atendimento deve pautar-se no
questionamento das relações de gênero enquanto construção histórica-cultural
dos papéis femininos e masculinos, que têm legitimado as desigualdades e a
violência contra as mulheres.”
Os Objetivos Específicos das Casas-Abrigo são:
• Promover atendimento integral e interdisciplinar às mulheres e
seus/suas filhos/as menores de idade que os/as estejam
acompanhando, em especial nas áreas psicológica, social e jurídica;
• Promover condições objetivas de inserção social da mulher, conjugando
as ações da casa-abrigo a programas de saúde, emprego e renda,
moradia, creches, profissionalização entre outros;
• Prover suporte informativo e acesso a serviços, instruindo as mulheres
para reconhecerem seus direitos como cidadãs e os meios para efetivá-
los;
• Proporcionar ambiente e atividades propícias para que as mulheres
possam exercitar sua autonomia e recuperar sua auto- estima.
• Proporcionar atividades para as crianças e adolescentes que
considerem o paradigma que os entende como ser em situação peculiar
de desenvolvimento estabelecido pela atual legislação – Estatuto da
35
Criança e do Adolescente, como também considerem as necessidades
características de sua faixa etária;
• Prover meios para o fortalecimento do vínculo mãe/filhos(as),
favorecendo modos de convivência não-violentos.
O Período de permanência nas casas-abrigo é de 4 meses, podendo ser
prorrogado por igual período conforme avaliação da equipe técnica da casa-
abrigo.
2.1.5- Centro de Referência e Atendimento à Mulher
Os Centros de Referência são espaços de acolhimento/atendimento
psicológico, social, orientação e encaminhamento jurídico à mulher em situação
de violência, que proporcione o atendimento e o acolhimento necessários à
superação da situação de violência ocorrida, contribuindo para o fortalecimento
da mulher e o resgate da sua cidadania.
Nessa perspectiva, os Centros de Referência de acolhimento/atendimento
devem exercer o papel de articulador das instituições e serviços
governamentais e não governamentais que integram a Rede de Atendimento,
sendo o acesso natural a esses serviços para as mulheres em situação de
vulnerabilidade, em função de qualquer tipo de violência, ocorrida por sua
condição de mulher.
Os Centros de Referência devem prestar acolhimento permanente às
mulheres que necessitem de atendimento, monitorando e acompanhando as
ações desenvolvidas pelas instituições que compõem a Rede, instituindo
procedimentos de referência.
O atendimento deve pautar-se no questionamento das relações de gênero
baseadas na dominação e opressão dos homens sobre as mulheres, que têm
legitimado e perpetuado, as desigualdades e a violência de gênero.
O objetivo primário da intervenção é cessar a situação de violência
vivenciada pela mulher atendida sem ferir o seu direito à autodeterminação,
mas promovendo meios para que ela fortaleça sua auto-estima e tome
decisões relativas à situação de violência por ela vivenciada.
36
Ressalta-se que o foco da intervenção do Centro de Referência deve ser
o de prevenir futuros atos de agressão e de promover a interrupção do ciclo de
violência.
Os serviços prestados pelos Centros de Referência devem seguir os
princípios de intervenção:
• Atender as necessidades da mulher em situação de violência, pois a
mulher em situação de violência é um sujeito de direitos, e é nesse
contexto que todo e qualquer serviço de atendimento deve ser a ela
oferecido, o que significa que o plano de intervenção deve ser elaborado
em conjunto com ela e suas escolhas devem ser respeitadas.
• O planejamento da intervenção deve integrar a Rede de Atendimento,
assegurando assim que as ações atendam as necessidades integrais da
mulher em situação de violência, como abrigo, serviços de saúde,
creche etc.
• A Defesa dos Direitos das Mulheres e Responsabilização do agressor e
dos serviços
• Agir contra a violência implica adotar uma posição clara de que não há
justificativa para a violência e condenar todos os tipos de violência
contra as mulheres, uma vez que adotar uma postura de neutralidade
perpetua a violência.
• Tratar as mulheres sem preconceito, mesmo que se a mulher não tenha
que provar a situação de violência a que foram submetidas. Os
profissionais devem ouvi-la, acreditar no seu relato e tratá-las sem
preconceito.
• Promover a responsabilização do agressor, por meio de
encaminhamento - e monitoramento - do caso para o sistema de
segurança pública e de justiça e acompanhamento da mulher em
situação de violência nos contatos com esses equipamentos.
• Reconhecer as Diversidades da Mulher, as ações de intervenção
devem considerar as necessidades de cada mulher em situação de
violência de forma individualizada, avaliando o impacto de cada ação de
37
acordo com as circunstancias da mulher atendida e do(a) agressor(a),
tais como: situação econômica, cultural, étnica, orientação sexual,
dentre outras.
• Diagnosticar o contexto onde o episódio de violência se insere, o
conceito de violência de gênero adotado para a definição de estratégias
de intervenção deverá ser o previsto na Convenção Interamericana da
OEA, realizada em Belém do Pará em 1994, e subscrita pelo Estado
brasileiro, resumida no seu “Art. 1º. Para os efeitos desta Convenção,
entender-se-á por violência contra a mulher qualquer ato ou conduta
baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual
ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera
privada”. A maioria dos episódios de violência integra um padrão
histórico de violência. O grau de risco deve ser diagnosticado e
considerado para determinar a intensidade da intervenção.
• Evitar ações de intervenção que possam causar maior risco à mulher em
situação de violência. O mais importante para as vítimas de violência é
estarem em segurança. Assim, as questões relativas à segurança
devem ser a principal prioridade, devendo a estratégia de intervenção
ser pautada pelo sigilo e pela busca do equilíbrio entre a intervenção
institucional padronizada e a necessidade de respostas individualizadas,
as quais consideram as possíveis conseqüências para a mulher no
confronto com o agressor(a), validam as informações e opções da
mulher e promovem sua autonomia.
• Articular com demais profissionais dos serviços da Rede, pois a
estratégia de intervenção deve ser elaborada de forma integrada,
fundamentada na cooperação, comunicação e procedimentos integrados
e articulados que assegurem consistência entre a intervenção de
natureza civil e a de natureza criminal.
• Ter uma Gestão Democrática. Envolvimento de mulheres no
monitoramento das ações.
38 O Centro de Referência deve promover o envolvimento de mulheres que já
estiveram em situação de violência na definição das estratégias adotadas e na
avaliação do serviço22.
2.1.6- Central Judicial de abrigamento provisório da Mulher Vítima de
Violência Doméstica –CEJUVIDA-
A CEJUVIDA foi criada pelo Ato Executivo nº 2610/2010 da Presidência
do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, e seu objetivo é prestar
apoio e auxílio necessários ao encaminhamento, seguro e célere, de mulheres
vítimas de violência doméstica e familiar, e de seus filhos menores, às casas-
abrigo, articulando a comunicação entre os Juízes e as Delegadas de Polícia e
as casas de acolhimento, e vice-versa.
Integrada ao Plantão Judiciário, foi concebida para servir como um núcleo
integrado de apoio ao Juiz competente e / ou a 1ª DEAM/ERJ , que fora do
horário forense, precisam garantir o encaminhamento emergencial de mulheres
vitimizadas e de seus filhos menores, às casas-abrigo.
Envolve todas as comarcas que distem, no máximo, 150 quilômetros da
sede do Plantão Judiciário da Comarca da Capital. Funciona diariamente de
18h de um dia às 11h do dia seguinte, em finais de semana ou feriados,
prestando inclusive o primeiro atendimento às mulheres vítimas de violência
doméstica e familiar, sempre que os serviços especializados dos centros de
referência não estiverem em funcionamento.
Conta com uma estrutura especial no plantão judiciário, uma sala privada;
uma equipe formada por 8 (oito) servidores especialmente selecionados e
capacitados, com formação em psicologia ou serviço social; duas viaturas
oficiais, para uso exclusivo, com motoristas munidos de radiotransmissor para
contato permanente com às Autoridades23
22 Norma Técnica de Uniformização-Centros de Referência de atendimento à mulher em Situação de Violência. Brasília: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres Presidência da República.2006 23 www.tjrj.jus.br . Acesso em fevereiro de 2015.
42 dos Panos Rio de Janeiro, Ipas Brasil Rio de Janeiro, Centro de Articulação
das Populações Marginalizadas Rio de Janeiro.
2.1.11- NIAM/NUAM - Núcleos (Integrados) de Atendimento à Mulher
Os Núcleos de Atendimento à Mulher prestam acolhida, apoio
psicossocial e orientação jurídica às mulheres em situação de violência.
Diferenciam-se dos Centros de Referência de Atendimento à Mulher pela sua
estrutura física e localização - em geral, funcionam em espaços menores que
os Centros de Referência de Atendimento à Mulher e em municípios de menor
porte.
No Estado do Rio de Janeiro existem os seguintes núcleos: Núcleo
Integrado de Atendimento à Mulher (NIAM) de Barra Mansa RJ, Núcleo de
Atendimento à Mulher (NUAM) do Rio de Janeiro, Coordenadoria Especial de
Promoção da Política para Igualdade de Gênero (CEPIG) Rio de Janeiro,
Núcleo de Atendimento à Mulher (NUAM) de Macaé, Núcleo Especial de
Atendimento à Mulher (NEAM) de Campos dos Goytacazes RJ, Núcleo de
Atendimento à Mulher São João de Mereti - 64ª DP, Núcleo Integrado de
Atendimento à Mulher (NIAM) - Coordenação dos Direitos das Mulheres
(CODIM) de Niterói, Núcleo Integrado de Atendimento à Mulher (NIAM) de
Campo dos Goytacazes, Núcleo Integrado de Atendimento à Mulher (NIAM) de
Resende RJ, Núcleo Integrado de Atendimento à Mulher (NIAM) de Três Rios
RJ, Núcleo Integrado de Atendimento à Mulher (NIAM) de Quissamã RJ 26
2.1.12- Centros de educação e de reabilitação para os agressores
A criação de centros ou de outros órgãos cuja atividade é voltada para a
educação e a reabilitação daquelas pessoas que tenham sido autores de
violência doméstica e familiar contra a mulher constitui providência
indispensável para evitar a reincidência, principalmente porque as penas
aplicáveis em relação à maioria dos crimes não importarão no efetivo
recolhimento carcerário do (a) agressor(a) e, à falta de uma reabilitação, ele(a)
será sério candidato à reincidência. Ademais, trata-se de uma experiência já 26 Folder da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos. Rio de Janeiro.2010
43 aplicada com sucesso em alguns países que se anteciparam na adoção de
práticas que visam à eliminação da causa da violência, e não só do tratamento
punitivo, até porque, em muitas situações, a pessoa agressora age em
decorrência da formação familiar e da bagagem cultural que recebeu, sendo
necessário reabilitar, aceitando novos conceitos e valores.
No Estado do Rio de Janeiro temos como exemplo de trabalho para
reabilitar homens agressores os Grupos Sócios-Educativos de Gênero em São
Gonçalo-RJ existentes deste 2002.27 No início do projeto foram encontradas
várias dificuldades como: Resistência inicial dos participantes; descrença na
efetividade de um programa educativo; entendimento de que a questão da
violência doméstica é da esfera do privado.
Porém o resultado do projeto foi satisfatório houve baixo índice de
reincidência no delito, mudança de âmbito sociocultural propiciando uma
prevenção a novos delitos, melhoria nas relações intrafamiliar dos atendidos.
Os grupos sócio-educativos de gênero é um trabalho desenvolvido na
Central de Penas e Medidas Alternativas à Prisão de Comarca de São
Gonçalo/RJ (CPMA-SG) com homens em situação de violência doméstica.
Desenvolvido nas instalações da própria CPMA-SG realizado pelos
profissionais componentes da equipe multiprofissional, assistente social e
psicólogo, e coordenado pelo Juiz Titular. Vale salientar que a referida proposta 27 O projeto Grupo Reflexivo surgiu em 1999. A princípio, houve uma parceria entre a ONG
NOOS e o CEOM(Centro Especial de Orientação à mulher) para montar o projeto piloto de
atendimento em grupo a homens autores de violência doméstica contra mulheres. Após este
passo, a equipe do CEOM elaborou a primeira metodologia, através de um grupo de trabalho
formado por assistentes sociais e psicólogos, sob a supervisão da então coordenadora Marisa
Gaspary. Duas participantes deste grupo foram designadas para integrar a equipe
CPMA(Central de Penas e Medidas Alternativas) de São Gonçalo, com o objetivo de enfrentar
no Judiciário a questão da violência doméstica. Na ocasião não existia nenhum trabalho como
este e foi um grande desafio abordar um tema tão polêmico. Em 2002 iniciou-se, com
metodologia própria, o desenvolvimento do grupo coordenado pelas duas assistentes sociais
oriundas da equipe do CEOM. Com o passar dos anos, com aumento da equipe técnica e com
acúmulo de experiência a referida metodologia foi sendo aprimorada, uma vez que está em
contínua construção, atendendo ao objetivo de favorecer o rompimento do ciclo de violência.
44 de intervenção tem como objetivo prevenir e estimular o rompimento do ciclo
da violência possibilitando a estruturação de um novo modelo de relação de
gênero, baseada no respeito e na equidade, trabalhando reflexivamente outras
formas de solucionar conflitos que não passem pela via da violência
contribuindo assim, para a construção de uma sociedade mais justa e
igualitária.
Para o Juiz Marcelo Castro Anátocles da Silva Ferreira28, o projeto de
grupo reflexivo de gênero desenvolvido na CPMA/SG, veio trazer à população
atendida, um espaço reflexivo, indo para além do fator punitivo. É uma
proposta de trabalho inovadora, uma medida de atendimento que acima de
tudo, busca prevenir novos delitos com uso da violência na relação conjugal.
Sendo uma alternativa bem sucedida na superação de conflitos de gênero e
também de novas possíveis demandas processuais. A prática desse trabalho
pode ser considerada um meio alternativo para resolução de conflitos e/ou
como democratiza o acesso à Justiça. Por se tratar de um espaço que
privilegia a reflexão e a mudança de comportamento buscando, assim vai para
além do fator punitivo já que trabalha numa perspectiva educativa. A principal
inovação dessa prática é a proposta de reinserção social que não passa pela
reclusão do indivíduo e investe na prevenção.
28 Instituto Innovare. Edição V. 2008
45
CAPÍTULO III
MEDIDAS PROTETIVAS DA LEI 11.340/2006
As medidas protetivas de urgências acham-se elencadas principalmente
nos arts. 22 (Medidas Protetivas de Urgência que obrigam o Agressor), 23 e 24
( Medidas protetivas de Urgência à ofendida) desta Lei, sendo aplicável, por
analogia, o poder geral de cautela previsto no art.798 do CPC, o qual dispõe
que, “além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código regula,
poderá o Juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando
houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause
ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação.
Essas medidas pode ser requeridas ao Poder Judiciário, valendo-se da
sistemática tradicional, onde a vitima, por si ou por seu representante
(capacidade jurídica e legitimidade), através de advogado(capacidade
postulatória) requer a medida compatível com a sua situação. Fora isso, prevê
a nova Lei a possibilidade de que a vítima elabore um ‘requerimento’, que será
enviado ao Judiciário da autoridade policial (Lei 11.340/2006, art.12, III)29.
Destaca Maria BereniceDias:30
“Uma das grandes novidades da Lei Maria da Penha é admitir
que medidas protetivas de urgência do âmbito do Direito de
Família sejam requeridas pelas vítimas perante a autoridade
policial. A vítima, ao registrar a ocorrência da prática de
violência doméstica, pode requerer separação de corpos,
alimentos, vedação ao agressor de aproximar-se da vítima e de
seus familiares ou que ele seja proibido de freqüentar
29Art. 12, inc. III da lei 11.340/2006. “Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal: III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência” 30DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça. RT, 2007.p.80 apud SOUZA, Sérgio Ricardo. Comentários à lei de combate à violência contra a mulher. Curitiba: Juruá, 2009, p. 80.
46
determinados lugares. Essas providências podem ser pedidas
pela parte pessoalmente na polícia”.
Da dicção deste inc. III, percebe-se que o Legislador disse menos do que
pretendia e mesmo do que se pode extrair de uma interpretação sistemática da
Lei em comento, isso porque, ao dispor que deverá a autoridade policial
“remeter”, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao Juiz
com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de
urgência” o dispositivo parece ter limitado a atuação da autoridade policial a
simplesmente encaminhar um “requerimento” feito pela vítima, quando, na
verdade, para ser coerente com o propósito desta lei, a vítima precisa apenas
apresentar um “requerimento” relatando a ocorrência e indicando as suas
necessidades, cabendo à autoridade policial, enquanto órgão de execução da
Polícia Judiciária e em particular da Delegacia de Atendimento à Mulher não
apenas “encaminhar” esse “requerimento”, mas também, quando necessário
for, “representar”, indicando as medidas de proteção necessárias naquele caso,
mormente aquelas de natureza processual penal, podendo todas essas
providências serem adotadas em um simples oficio ou formulário-padrão de
encaminhamento do requerimento da vítima e de representação pela aplicação
das medidas que a autoridade policial entender necessárias, sem maiores
formalidades.
O art. 18 da Lei 11.340/200631 se refere ao “expediente” previsto no art.
12, inc. III, o qual estabelece que a autoridade policial deverá “remeter”, no
prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido
da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência”. Esse
expediente deve conter o mínimo de formalidade, dele constando a autoridade
remetente e aquela à qual é endereçado, o propósito, a representação pela 31 Art. 18. Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz, no prazo de 48
(quarenta e oito) horas: I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas
protetivas de urgência; II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência
judiciária, quando for o caso; III - comunicar ao Ministério Público para que adote as
providências cabíveis.
47 imposição de possíveis medidas protetivas de natureza criminal que autoridade
entenda compatível e necessária, servindo principalmente para encaminhar o
boletim de ocorrência formulado pela vítima ou seu representante, poderá ter a
forma de “ofício” como é comum no serviço público, ou mesmo de um
documento de encaminhamento, pré-formulado.
As medidas protetivas de natureza cível devem ser requeridas pela
vítima, preferencialmente no “boletim de ocorrência” ou em requerimento
apartado, podendo a autoridade policial representar apenas no que tange às
medidas protetivas de natureza criminal, principalmente aquelas que dizem
respeito à segurança da vítima, à produção de provas e ao regular
desenvolvimento das investigações.
Recebendo o “expediente” enviado pela Polícia Civil, o Juiz analisará, de
pronto , se há necessidade de aplicar o disposto do § 1º do art. 19 (deferimento
de liminares Inaudita altera partes) e, não sendo o caso, abrirá vista ao
Ministério Público, para que este adote as medidas pertinentes ao caso, não só
as previstas nesta lei, mas, também, outras, que sejam cabíveis e constem do
ordenamento brasileiro. Caso seja aplicável o disposto no já mencionado §1º
do art. 19 desta lei, a vista ocorrerá imediatamente após serem adotadas as
providências cartorárias necessárias ao cumprimento da medida imposta
liminarmente.
Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser
concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a
pedido da ofendida.
§ 1o As medidas protetivas de urgência poderão ser
concedidas de imediato, independentemente de audiência das
partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este
ser prontamente comunicado.
§ 2o As medidas protetivas de urgência serão aplicadas
isolada ou cumulativamente, e poderão ser substituídas a
qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os
direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados.
§ 3o Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a
pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de
48
urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender
necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu
patrimônio, ouvido o Ministério Público.
O § 2º do dispositivo sob comento estabelece que as medidas protetivas
serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e não poderia ser diferente, haja
vista que em várias situações uma só medida ou mesmo duas, podem ser
insuficientes para a proteção integral que esta lei visa dispensar à vítima. Da
mesma forma, “a qualquer tempo” a alteração da situação fática poderá
recomendar a aplicação de outra medida protetiva, mais eficaz, sempre com
vistas à proteção dos bens jurídicos tutelados por esta norma. Essa adaptação
pode ser procedida ex Officio pelo Juiz, havendo urgência, ouvindo
posteriormente as partes.
3.1- As medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor
A lei Maria da Penha discrimina em seu artigo 22 as medidas protetivas
que obrigam o agressor.
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar
contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de
imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as
seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com
comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a
integridade física e psicológica da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes
menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou
serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.33
§ 1o As medidas referidas neste artigo não impedem a
aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre
que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem,
devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.
§ 2o Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o
agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art.
6o da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz
comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as
medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a
restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do
agressor responsável pelo cumprimento da determinação
judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de
desobediência, conforme o caso.
§ 3o Para garantir a efetividade das medidas protetivas de
urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio
da força policial.
§ 4o Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que
couber, o disposto no caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da Lei
no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo
Civil).34
33 Ementa: ALIMENTOS PROVISÓRIOS. LEI MARIA DA PENHA. MEDIDA DE PROTEÇÃO. NATUREZA PENAL. INCOMPETÊNCIA DA CÂMARA CÍVEL PARA APRECIAR A INTERLOCUTÓRIA QUE FIXOU A VERBA. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. Agravo de instrumento assestado contra decisão do juiz do III Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher que proibiu a aproximação e contato do Agravante com a vítima, bem como deferiu alimentos provisórios.No âmbito da Lei nº 11.340/2006, a fixação da verba alimentar provisória tem natureza penal por se tratar de mecanismo acessório destinado à proteção de vítima de violência doméstica. Esta Câmara Cível não tem competência para conhecer o recurso interposto. Conflito Negativo de Competência que se suscita.( Agravo de Instrumento nº DES.RICARDO RODRIGUES CARDOZO - Julgamento: 18/10/2011 - DECIMA QUINTA CAMARA CIVEL 0039050-38.2011.8.19.0000 34 Art. 22 da Lei 11.340/2006
BRASIL. Constituição (1988). Lex: Vade Mecum Universitário 2010, Saraiva,
Rio de Janeiro.
BRASIL. Lei Ordinária 11.340, 07 de agosto de 2006. Lex: Vade Mecum
Universitário, Saraiva, Rio de Janeiro.
BRASIL. Lei Ordinária. 5.869 de 11 de Janeiro de 1973. Lex: Vade Mecum
Universitário, Saraiva, Rio de Janeiro.
I. Lei Ordinária 11.340Saraiva, Rio de Janeiro.
Anexo I
LEI
O PRESIDENTE DA
e eu sanciono a seguinte
Art. 1o Esta Lei cria
familiar contra a mulher,
Convenção sobre a Elimi
Convenção Interamerican
Mulher e de outros trata
Brasil; dispõe sobre a cria
Mulher; e estabelece med
violência doméstica e fam
ANEXOS .340, 07 de agosto de 2006. Lex: Vade Meceiro.
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006.
Cria mecanismos para cdoméstica e familiar conttermos do § 8o do art. 226Federal, da Convenção sode Todas as Formas dcontra as Mulheres e Interamericana para PrErradicar a Violência cdispõe sobre a criação Violência Doméstica e FMulher; altera o CódigPenal, o Código Penal e aPenal; e dá outras providê
DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso
uinte Lei:
TÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
ei cria mecanismos para coibir e prevenir a violê
ulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constitu
Eliminação de Todas as Formas de Violência co
ericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Vi
tratados internacionais ratificados pela Repúbli
a criação dos Juizados de Violência Doméstica e
e medidas de assistência e proteção às mulhere
e familiar.
59
Mecum Universitário,
icos
ara coibir a violência r contra a mulher, nos rt. 226 da Constituição ção sobre a Eliminação
as de Discriminação s e da Convenção a Prevenir, Punir e cia contra a Mulher; ção dos Juizados de
a e Familiar contra a Código de Processo al e a Lei de Execução rovidências.