B14 | Quarta-feira, 30 de janeiro de 2013 Agronegócios Bettina Barros De Ipeúna (SP) Resiliência na superação de crises é um entre os tantos dog- mas que a direção da Korin gos- ta de repetir. A empresa, criada por imigrantes japoneses liga- dos à Igreja Messiânica, sabe os desafios que tem pela frente pa- ra se consolidar como uma for- necedora nacional de alimentos saudáveis. O primeiro é aumen- tar a escala de produção. O se- gundo, consequência do primei- ro, é reduzir seus preços em gôn- dola para ganhar mercado. Há três décadas no país, a Korin (lê-se Kô-rin) ganhou autossufi- ciência econômica e atingiu a marca de R$ 60 milhões de fatura- mento em 2012. O portfólio de 60 produtos ainda registra um bura- co nas contas em praticamente todos os segmentos — de hortali- ças, verduras, legumes e frutas a mel, café, água e insumos para o solo. São as suas 9,2 mil toneladas de frango e 9,6 milhões de ovos por ano, os campeões em vendas, que carregam a Korin nas costas. “São os produtos mais conheci- dos”, diz Reginaldo Morikawa, di- retor da empresa. “Até 2007, era a Igreja que nos financiava. Em 2008, passou a ser o frango”. Toda a produção, livre dos ma- les associados à agricultura con- vencional, é realizada nos 172 hectares de área agrícola e indus- trial da Korin em Ipeúna, no inte- rior de São Paulo. As plantações não recebem agrotóxicos. As ga- linhas poedeiras comem ração 100% vegetal, descansam sob a sombra de árvores e em poleiros — para “expressar o seu compor- tamento natural”, como explica Juliana Pereira, coordenadora de produção de ovos. Os frangos de corte não recebem antibióticos ou promotores de crescimento. As aves são ventiladas automati- camente quando a temperatura bate nos 27 o C, e todas têm bicos — na produção em granjas con- vencionais, os bicos são cortados para que elas não se firam sob o estresse do confinamento. Talvez por essa razão a Korin tenha caído nas graças dos pe- diatras, que passaram a indicar a marca às mães que buscam uma alternativa de alimentação sau- dável para os filhos. “As pessoas que compram Korin sabem o que estão comprando, mesmo que não tenha nada escrito na caixi- nha”, afirma Morikawa, referin- do-se às três certificações que a empresa possui — a de alimentos orgânicos, livre de antibióticos (AF, na denominação internacio- nal) e a de bem-estar animal. Formado ministro pela Igreja Messiânica e a poucos anos de galgar a posição máxima de reve- rendo, o executivo explica que a filosofia que norteia as ações da Korin (anéis de luz, em japonês) está intrinsecamente ligada à dos messiânicos. Não à toa, seu rebanho de 1,5 milhão de devo- tos no país responde pela maior parte da clientela. E três dos sete diretores da Korin têm igual sta- tus religioso (embora pertencer à Igreja não seja uma condição sine qua non para trabalhar nela). Por filosofia, Morikawa diz res- peito à maneira de enxergar a agropecuária e o seu modo de produção. Solo sadio, diz ele, produz não só plantas e animais sadios, mas homens sadios. Além do bem-estar animal, a Korin também tem a tradição de orar por eles uma vez por ano, sempre no mês de agosto. “Pedimos a Deus que as aves que abatemos sejam salvas no mundo espiri- tual”, diz o executivo. O culto en- volve todos os funcionários que participam dos abates, além de membros da diretoria e convida- dos, e serve para zerar as dívidas espirituais geradas com a morte. O lucro também é tratado sob uma perspectiva mais próxima à de uma organização não gover- namental do que de uma em- presa convencional. “Não faze- mos o capitalismo clássico. Todo o nosso lucro é revertido para a companhia”, garante Morikawa, que, como os seus pares na em- presa, não recebe bônus. Segundo ele, o sucesso da mar- ca se deve ao apelo à saúde ali- mentar. A Korin não faz campa- nhas em mídia. Seus produtos, especialmente as carnes e ovos, vêm sendo disseminados pelo boca-a-boca e através das muitas palestras com consumidores, professores, nutricionistas e mé- dicos, todos compradores poten- ciais ou formadores de opinião. Calcados na tradição japonesa de agricultura, a Korin começou seu negócio no país nos anos 1970, com a produção de vegetais orgânicos. Mas o divisor de águas para o negócio veio só em 1994, época em que o frango tornou-se a bandeira de consumo do Plano Real, e a empresa vislumbrou a necessidade de atender esse mer- cado de forma sustentável. “A gente entrou na contramão, com um conceito de bem-estar animal contrário ao de criação em massa e ostensiva”, afirma Morikawa. A verticalização também teve pa- pel crucial na sua expansão. Com um investimento médio de R$ 1,7 milhão nos últimos anos — que ba- teu o recorde de R$ 2,8 milhões no ano passado —, a Korin planta parte do milho que utiliza como alimento das aves (o custo mais alto da empre- sa), passou a produzir sua própria ração vegetal e, de quebra, criou um insumo para o solo, usado para recu- perar as condições naturais da terra. A empresa afirma que as ini- ciativas surtiram efeito: a produ- ção de frangos de corte passou de 500 toneladas por dia, em 1994, para 16 mil toneladas em 2012 (episódios de gripe aviária e vaca louca no meio do cami- nho deram um empurrãozinho nesse desempenho). Às 20 mil galinhas poedeiras próprias e 17 mil de seu produtor parceiro se- rão acrescidas em março outras 40 mil, como forma de turbinar o setor de ovos, que em 2012 fe- chou no azul pela primeira vez. O desafio, porém, continua sendo ganhar escala nacional e reduzir os preços de seus produ- tos, ainda muito acima da capa- cidade de compra da maior par- te da população brasileira. Um frango orgânico Korin congela- do pode chegar a R$ 16 o quilo. Uma alternativa na qual a companhia aposta é investir em franquias de lojas. Além de elevar seus pontos de venda no país, a medida reduziria a dependência das grandes redes varejistas — com suas margens elevadas. Essa opção começou a sair do papel na semana passada, com a inauguração da primeira loja franqueada em Lauro de Freitas, a 15 quilômetros de Salvador. As próximas deverão ser no Rio de Janeiro e em São Paulo, onde a Korin já possui uma loja própria na Vila Mariana. “Uma das difi- culdades de vender orgânicos é a concentração da produção no Sul e Sudeste”, diz Morikawa. A empresa, que chegou a ex- portar em 2002/03 por três me- ses e desistiu diante do câmbio desfavorável, passou a olhar so- mente para o mercado interno. Para este ano, pretende colocar nas gôndolas sua primeira carne bovina AF, que será produzida em Mato Grosso do Sul em par- ceria com a Associação Brasileira de Pecuária Orgânica (ABPO). O segmento de legumes pré-lava- dos e embalados é outra aposta para os próximos anos, já que tem registrado bom desempe- nho nas operações da empresa. A julgar pela demanda por alimentos saudáveis, a Korin po- derá concretizar seu plano de se tornar uma empresa muito além da preferência das mães. Estratégia Empresa de alimentos saudáveis enfrenta desafio da escala ‘Queridinha das mães’, Korin ensaia voo mais alto CLAUDIO BELLI/VALOR De acordo com Juliana Pereira, coordenadora da produção de ovos, sistema da Korin visa permitir que aves ‘expressem seu comportamento natural’ CLAUDIO BELLI/VALOR Produção de vegetais em Ipeúna é 100% orgânica CLAUDIO BELLI/VALOR Galinhas comem ração 100% vegetal e descansam sob árvores e em poleiros CLAUDIO BELLI/VALOR Uma vez por ano, funcionários do abate oram pela alma dos animais mortos São Paulo Campinas Piracicaba SP PR MG RJ MS Fonte: Korin. * Mel, sopa instantânea, água mineral Aposta no bem-estar Perfil da empresa messiânica que ganhou fama com a alimentação saudável Polo agrícola e industrial Indicadores socioeconômicos Funcionários: 400 diretos e 150 terceirizados Área: 172 hectares Segmentos de atuação: 60 variedades de verduras e legumes, frutas, carnes, mel, café, água, ração e insumos para o solo Parceiros: 60 produtores rurais Pontos de venda: 1.500 em 23 Estados Produção: 9,2 mil toneladas de frango/ano, 880 mil ovos/mês e 200 toneladas/mês de FLV** Faturamento: R$ 60 milhões Participação no faturamento Por atividade, em 2012 Investimentos previstos Em 2013 - em R$ mil 6,20% Outros 85,16% Frangos 3,67% Hortaliças e frutas 0,15% Mercearia* 4,72% Ovos 0,10% Café Abatedouro de ave Fábrica de ração Produção agrícola Maquinário Outros setores 0 400 800 1.200 1.600 1.300 500 300 200 500 500 Ipeúna Oceano Atlântico ; ** Frutas, Legumes e Verduras Total R$ 2,8 milhões De lá para cá, a Korin passou a centrar seus esforços na criação de aves sem antibióticos, orgâni- cos e caipiras, variedades que res- pondem hoje por pouco mais de 85% do faturamento da empresa. Com os frangos, os mentores da ideia esperavam também esti- mular a cadeia produtiva de ali- mentos orgânicos no Brasil, já que as aves necessitam de milho e soja para a ração. “Isso fazia to- do o sentido para a filosofia mes- siânica da Korin”, diz Cecilia Ifuki Mendes, gerente da Qualidade e Desenvolvimento de Produtos. A entrada no segmento de car- nes resultou em uma rede de 25 produtores de frango de corte parceiros da Korin, um produtor de ovos e cinco de milho. O mo- delo de parcerias se estendeu também para as hortaliças e ou- tros produtos em que a empresa passou a atuar (veja gráfico abai- xo), agregando no entorno de Ipeúna mais 27 produtores ru- rais que seguem os preceitos de produção Korin para entrega. “ A gente entrou na contramão, com um conceito de bem-estar animal contrário ao de criação em massa e ostensiva ” CLAUDIO BELLI/VALOR Alimentos higienizados embalados é aposta da empresa CLAUDIO BELLI/VALOR Verticalização: Korin produz dos adubos e mudas a carnes