Jacqueline HermannReligio e politica no alvorecer da Repblica:
os movimentos de Juazeiro, Canudos e Contestado.
A IGREJA DEPOIS DA REPUBLICA
O fim do padroado e do regalismo imposto pela Repblica foi
recebido com um duplo sentimento da Igreja Catlica no Brasil: alvio
e apreenso.
Alivio porque os novos tempos permitiam liberdade de ao.
Apreenso porque o novo projeto da constituio do governo
provisrio em 22 de junho de 1890 apresentava proposta de limitao da
esfera da igreja e de religiosos,
Reconhecimento e obrigatoriedade do casamento civil, laicizao do
ensino pblico, secularizao dos cemitrios, proibio de subvenes
oficiais e qualquer culto religioso, impedimento de novas
comunidades religiosas.
O episcopado j havia declarado seu desacordo pela Pastoral
Coletiva, de 19 de maro de 1890, aps a publicao do decreto 119-A.
no qual o governo abolira o padroado.
Apos a reclamao, autora do arcebispo D. Antnio Macedo (Bahia) o
estado no poderia progredir sem a proteo da religio.
O texto traz de forma sinttica os principais aspectos envolvidos
com o aparecimento dos movimentos religiosos populares no inicio da
repblica, principalmente nas regies interioranas afastadas do
controle institucional do novo governo. As repercusses desses
movimentos esto diretamente correlacionadas com o processo de
transio entre o imprio e a repblica, porm inegvel que outras
evidncias iro impulsionar o desenvolvimento de tais fenmenos, como
por exemplo; a existncia do catolicismo popular que fundia
elementos de vrias culturas originrias na colonizao com as
doutrinas crists, dando certo carter mstico e profano na propagao
desta religio no Brasil.
Analise da autora embasa tais movimentos no s de forma
descritiva, pois tambm abordar as principais concepes e teorias que
foram desenvolvidas por socilogos, historiadores e antroplogos como
possveis explicaes e interpretaes para tais movimentos, enfatizando
esta explanao nas figuras de padre Ccero, Antonio Conselheiro e Jos
Maria.
Entretanto antes de qualquer analise sobre os tais movimentos
necessrio entender os impactos sofridos pela igreja catlica nesta
transio poltica institucional entre imprio e repblica. O surgimento
da repblica representou o fim do padroado e do regalismo no
catolicismo do Brasil, dando certa liberdade de ao para igreja
independente do estado, atendendo assim os desejos das lideranas
eclesisticas, mas ligada a Roma, porm esta transio tambm se
configurou por certa perda de ao, pois limitava a esfera de atuao
desta igreja atravs de algumas medidas adotadas no projeto de
elaborao da constituio republicana em 1890, como por exemplo; o
reconhecimento e obrigatoriedade do casamento civil, registro civil
dos batismos, secularizao dos cemitrios, alienao dos bens da igreja
e o impedimento de formao de novas comunidades religiosas,
especialmente as companhias de Jesus.
Essa perda de autonomia e poder da igreja catlica, advindo pelo
surgimento da repblica e a elaborao da constituio criou um
movimento de reao por parte da Santa F e das autoridades
eclesisticas brasileiras, que se organizando em corporaes agiram de
forma poltica para tentar amenizar os impactos dessa secularizao
idealizada pelos princpios liberais e federalistas que envolviam os
constitucionistas da poca.
Essa contra-reao por parte da igreja para manter certos poderes
obtive xito em alguns aspectos, pois os bens da igreja foram salvos
de apropriao alm do mais pode garantir as congregaes e as ordens
religiosas liberadas sem reservas. Entretanto o que representou uma
vitria para os eclesisticos na promulgao da constituio de 1891, no
se configurou para boa parte da populao que via essa secularizao de
casamentos, batismos e cemitrios uma ao de imposio do estado, mais
especificamente, uma ofensa a religiosidade desse povo. Portanto
partindo dessa relao, poltica-religio, no alvorecer da repblica,
que a autora aborda as implicaes polticas da repblica sobre a
igreja e a religiosidade de sua populao, e como isso implicou num
corrente contraria de reao atravs dos movimentos religiosos
populares
Inicialmente o texto traa um pequeno esboo terico com as
concepes dos principais pensadores e as interpretaes que estes
atriburam a esses movimentos, a primeira a ser analisada Queiroz. A
abordagem de Queiroz enfatiza a formao de uma cultura rstica no
Brasil advindo desde do perodo colonial, esta cultura assim
denominada pela autora, seria o resultado do ajustamento da cultura
do colonizadores com as culturas dos nativos e escravos, sendo uma
vertente autnoma e independente das duas que lhe formaram. Essa
cultura estaria mais presente na fuso da relao campo-cidade e no
ajustamento que o colonizador teve de fazer para adaptar-se ao novo
mundo.
Entretanto para Queiroz o surgimento dos tais movimentos que
classifica como messinicos, tratou-se de certa anomalia presente no
inicio da repblica pela falta de organizao desta cultura rstica,
pois a ausncia de lei presente principalmente nas regies onde o
mandonismo local na figura dos coronis no conseguia estabelecer
laos de compromissos e dependncias com a populao faziam surgir tais
movimentos messinicos que por ora eram reformadoras, ora erma
restauradores, portanto o aspecto religioso desses movimentos seria
uma funo secundarias desses levantes, tendo a questo sociopoltica o
principal motivo propulsor de propagao.
A segunda abordagem demonstrada pela autora de Rui Fac, assim
como Queiroz tambm caracteriza esse movimento como uma ao
sociopoltica, mais especificamente uma reao do povo sertanejo a
desigualdade e a misria que se encontrava a regio nordestina na
poca, porm no ir se fundamentar nas implicaes da ausncia de lei ou
de possveis falhas das relaes de compromissos e laos que se
configurava o poder dos coronis, mais exalta monoplio da terra na
formao do Brasil, no qual por muito tempo criou-se uma camada
excludente e marginalizado na sociedade, encontrando no crime, (na
figura dos cangaceiros) ou atravs dos movimentos religiosos um
mecanismo de expresso e luta social. Assim, portanto o monoplio da
terra, a pobreza e misria da populao sertaneja seriam a face
material da natureza destes movimentos e a religiosidade apenas um
pano de fundo, um instrumento para consolidao desses levantes.
A terceira Abordagem explanada por Hermann expe o pensamento de
Monteiro, Este, assim como Queiroz, tambm credita certa importncia
para a formao de uma cultura rstica no Brasil, como tambm nas
questes de mandonismo local, ausncia de lei e falhas das relaes de
compromissos e laos do coronelismo, porm se especifica mais em sua
analise na construo de um catolicismo rstico ou popular no Brasil,
aonde os elementos distintos de outras culturas foram
incorporadores sobre o catolicismo tradicional (romanizado).
Contudo o que diferencia Monteiro de Queiroz e Fac que
diferentemente dos dois ltimos, este enaltecer a importncia desta
caracterstica tpica desse catolicismo rstico, como uma forte
influncia para formao desses movimentos religiosos populares.
Monteiro explana que este catolicismo popular dava a essa populao
uma identidade prpria que era marginal devida a influncia da Santa
F de romanizar este igreja aps o fim do padroado, e ao mesmo tempo
autnomo, diferente do catolicismo tradicional (romano) ganhando
assim base para seu fortalecimento.
Histria de Padre Ccero
Padre Cceronasceu em Crato, uma cidadezinha no estado do Cear. A
data de nascimento foi dia 24 de maro de 1844. Filho de Joaquim
Batista e Joaquina Romana, que era conhecida por todos como Dona
Quin. Em seu sexto aniversrio, Ccero comeou a estudar. J com 12
anos, fez voto de castidade, influenciado pela leitura da vida deSo
Francisco de Sales.
Em 1860, aos 16 anos, Ccero foi estudar em Cajazeiras, Paraba,
onde ficou apenas dois anos, pois seu pai faleceu em 1862. Isso o
obrigou a parar de estudar e voltar para ajudar sua me e suas duas
irms solteiras. A perda do pai trouxe graves problemas financeiros
famlia. Em 1865, aos 21 anos, entrou no seminrio em Fortaleza.
Padre Ccero foi ordenado no dia 30 de novembro de 1870, com 26
anos. Voltou para Crato, espera de uma parquia para liderar. Nesse
tempo, lecionou Latim no Colgio local.
A mudana de Padre Ccero para Juazeiro
No Natal de 1871, aos 28 anos, Padre Ccero conheceu o povoado de
Juazeiro. Ele gostou tanto do povo de l que dali a alguns meses, em
11 de abril de 1872, ele voltou para ficar, acompanhado de sua
famlia.
Vrios bigrafos afirmam que Padre Ccero mudou-se para Juazeiro
por causa de um sonho onde viuJesus Cristo e os doze apstolos. De
repente, uma multido de pessoas carregando seus pobres pertences
invadiu o local. Ento, Jesus virou-se e disse: E voc, Padre Ccero,
tome conta deles! Pe. Ccero obedeceu sem pestanejar.
Apostolado
O lugarejo tinha umas poucas casas de taipa e uma capelinha
deNossa Senhora das Dores, Padroeira de Juazeiro. Padre Ccero
reformou a capela e depois, comeou um intenso e trabalho pastoral
atravs da pregao, do aconselhamento, das confisses e das visitas
domiciliares. Por isso, ele logo ganhou a simpatia do povo,
tornando-se uma grande liderana na comunidade.
Padre Ccero moralizou os costumes do povo, acabou com os
excessos de bebedeira e a prostituio que havia em Juazeiro. O
trabalho cresceu. Por isso, Ccero recrutou mulheres solteiras e
vivas e organizou uma irmandade leiga, formada por beatas, sob sua
inteira autoridade, para auxili-lo no trabalho pastoral,
Padre Ccero milagreiro
No dia 1 de maro de 1889, um fato mudaria a vida de Padre Ccero
para sempre, bem como a rotina de Juazeiro. Naquele dia, quando a
beata Maria de Arajo recebeu a comunho das mos do Padre Ccero, a
hstia consagrada se transformou em sangue na boca da beata. O
fenmeno aconteceu outras vezes. Por isso, o povo entendeu que se
tratava de um novo derramamento do sangue de Jesus Cristo.
Diferentes vises Igreja
Prudente, Padre Ccero pediu que dois mdicos e um farmacutico
estudassem o caso. Estes acompanharam o fenmeno, estudaram,
analisaram e assinaram atestados afirmando que o fato era
inexplicvel luz da cincia.
O atestado reforou a f no milagre. Comearam, ento, as
peregrinaes para Juazeiro. O povo queria ver a beata e adorar os
panos manchados de sangue. O bispo de Fortaleza chamou Padre Ccero
para esclarecimentos. Depois mandou que os fatos fossem
investigados oficialmente.
A Comisso nomeada pelo bispo foi a Juazeiro, assistiu s
transformaes, examinou a beata, ouviu testemunhas e concluiu que o
fato era realmente de origem divina. Mas o bispo, influenciado por
clrigos que rejeitavam a ideia de milagre, nomeou outra Comisso,
que foi a Juazeiro, convocou a beata, deu a comunho a ela e nada de
extraordinrio aconteceu. Ento, foi concludo que no houve
milagre.
O Padre Ccero, o povo e todos os padres que acreditavam no
milagre protestaram. Isso foi visto como desobedincia ao bispo. O
bispo enviou um relatrio Santa Se esta confirmou a deciso do bispo
contrria ao milagre. Os padres foram obrigados a se retratarem e
Padre Ccero foi suspenso de ordem, acusado de manipulao da f.
Durante toda a vida Padre Ccero tentou revogar essa pena, mas no
conseguiu. Ele at conseguiu uma vitria em Roma, quando l esteve em
1898. Mas, o bispo no voltou atrs.
A vida poltica de Padre Ccero
Proibido de celebrar Missas, Padre Ccero entrou na vida poltica
atender aos apelos dos amigos, quando Juazeiro comeou a lutar por
emancipao poltica, o que ocorreu em 22 de julho de 1911. Padre
Ccero foi nomeado Prefeito do novo municpio. Alm de Prefeito, tambm
foi nomeado Vice-Governador do Cear, mas nunca ocupou o cargo.
Era muito grande o volume de correspondncias que Padre Ccero
recebia e mandava. No deixava nenhuma carta, mesmo pequenos
bilhetes, sem resposta, e de tudo guardava cpia.
Encontro com Lampio
Padre Ccero encontrou-se com Lampio em 1926. Aconselhou-o a
deixar o cangao, e nunca lhe deu a patente de Capito, como foi dito
em alguns livros.
Importncia de Padre Ccero para a f de Juazeiro
Padre Ccero o maior benfeitor e a figura mais importante de
Juazeiro. Ele a fez crescer transformando-a na mais importante do
interior do Cear. Os bens que ele recebeu em vida foram doados para
a Igreja, principalmente para os salesianos que ele prprio levou
para Juazeiro.
Devoo a Padre Ccero
Padre Ccero faleceu no dia 20 de julho de 1934, aos 90 anos.
Depois disso, Juazeiro prosperou e a devoo a ele s cresceu. At
hoje, todo ano, no Dia de Finados, uma grande multido de romeiros,
vinda dos mais distantes lugares do Nordeste, vai a Juazeiro para
uma visita ao seu tmulo, naCapela do Socorro.
Padre Ccero uma das figuras mais biografadas do mundo. Sobre
ele, existem mais de duzentos livros. Ultimamente sua vida vem
sendo estudada por cientistas sociais do Brasil e do Exterior. No
foi canonizado pela Igreja, porm tido como santo por sua imensa
legio de fiis espalhados pelo Brasil.
O binmio, orao e trabalho era o seu lema. E Juazeiro o seu
grande e incontestvel milagre. Em maro de 2001, Padre Ccero foi
escolhidoO CEARENSE DO SCULO.
ANTONIO CONSELHEIRO E CANUDOS
No dia 13 de maro de 1.830, nasce, no serto do Cear, na Vila do
Campo Maior, Antonio Vicente Mendes Maciel, filho do comerciante
Vicente Mendes Maciel e de Maria Joaquina de Jesus. Mais tarde
viria a ter o apelido de Antnio Conselheiro. Desde sua juventude
sentiu e percebeu as injustias praticadas contra o povo pobre do
serto (composto por ex-escravos, indgenas mestios) e cresceu nele o
desejo de libertar este povo das pssimas condies em que viviam.
Tornou-se educador e missioneiro laico e, durante suas pregaes
pelo serto, durante mais de 20 anos, foi deixando por onde passava
as marcas de sua f e do seu compromisso social, construindo,
mediante trabalho comunitrio, pequenas represas, capelas,
cemitrios, etc.
Conselheiro casa-se com Brasilina Laurentina de Lima, sua prima,
aos 27 anos. Quatro anos depois, Conselheiro flagra sua esposa
traindo-o com um sargento em sua prpria casa. Abandona o lar e vai
para o Cariri.
Depois de vinte anos de peregrinao pelo nordeste ( ele
perambulou pelo Cear, Sergipe, Pernambuco e Bahia), amado pelo povo
e visto como um messias ou um profeta por alguns, imcompreendido e
perseguido pelas autoridades, Conselheiro observou de perto o
atraso em que o povo se encontrava e o descontentamento que eles
sentiam. Assim, resolveu, na ltima dcada do sculo XIX, pr em prtica
seu objetivo de formar uma comunidade igualitria: Belo Monte
(Canudos, no interior da Bahia). Rapidamente, a comunidade cresceu
e tornou-se uma das maiores cidades do nordeste, com 25.000
habitantes. Organizada, religiosa, produtiva e comunitria.
A reao das pessoas de posses, dos polticos e de alguns setores
da igreja, deu incio Guerra dos Canudos, que teve seu incio em
1.896, a maior guerra campesina do sculo XIX. As trs primeiras
expedies militares foram derrotadas pelos sertanejos. A quarta
expedio da polcia e do exrcito, formada por milhares de homens,
potentes canhes e liderada por Artur Oscar, conseguiu, no dia 5 de
outubro de 1.897, tomar a cidade de Canudos.
Todos os habitantes foram mortos (nem as crianas foram
poupadas). Canudos virou cinzas, mas tambm tornou-se, por seu sonho
e resistncia, smbolo de luta e esperana de um outro Brasil.
Vtima de ferimentos causados pela exploso de uma granada,
Antonio Conselheiro morre em 22 de setembro de 1.897.
Guerra do Contestado
Conflito que surgiu entre 1912 e 1916, em uma rea povoada por
sertanejos, entre as fronteiras do Paran e Santa Catarina. Eram
pessoas muito pobres, oprimidas, que no possuam terras e tambm
padeciam com a escassez de alimentos. Subsistiam sob a opresso dos
grandes fazendeiros e de duas empreendedoras americanas que
operavam ali a Brazil Railway, responsvel pela implantao da via
ferroviria que uniu o Rio Grande a So Paulo, e uma madeireira.
A Brazil Railway obteve do governo, como forma de remunerao
pelos servios prestados, o equivalente a 15 mil metros de terras,
uma em cada margem da estrada de ferro, as quais tinham que ser
obrigatoriamente povoadas por estrangeiros. Porm, o que a Brazil
Railway mais queria era tirar proveito da riqueza da floresta
nativa ali existente, que ostentava sua erva-mate, seus pinheiros e
imbuias. As empresas empregaram os imigrantes nos trabalhos com a
estrada de ferro e na explorao de madeira. Deram incio ento
retirada forada dos nativos, que ocupavam ilegalmente um pedao de
terra, na qual trabalhavam para que se tornasse frtil.
Essa atitude revoltou os sertanejos e foi o estopim para o
conflito, que se destacou por sua caracterstica scio-poltica. A
Guerra do Contestado colocou os nativos contra o governo, as
multinacionais e as oligarquias. Os sertanejos encontraram o apoio
que precisavam nos monges religiosos que peregrinavam pelo serto
pregando a palavra de Deus , figuras muito respeitadas por esse
povo. No ano de 1912, um monge, conhecido como Jos Maria,une-se aos
sertanejos revoltados, institui vrios povoados com autoridade
prpria e igualdade social, ignorando a partir de ento qualquer
mandado vindo da parte de alguma autoridade da Repblica Velha.
Esses povoados ficaram conhecidos como Contestado e o conflito
ganhou feio messinica, sendo conhecido tambm como Guerra Santa. Jos
Maria era estimado pelos seus seguidores - pessoas socialmente
desprovidas de tudo - como uma alma boa que surgira para
restabelecer a sade dos adoentados e desprovidos. O costume do
monge, de anotar as qualidades curativas das plantas que achava nas
redondezas, o ajudou a construir no lote de um dos administradores
uma botica, para melhorar a assistncia de quem o procurasse.
O governo federal no viu com bons olhos o trabalho de Jos Maria,
que passou a representar um risco para a ordem e segurana da regio.
Ele e seus seguidores foram severamente reprimidos pelas
multinacionais e pela guarda armada do governo federal. Eles
pretendiam dar fim aos povoados sertanejos e obrig-los a sair por
bem ou por mal dos territrios dos quais haviam tomado posse. No ms
de novembro de 1912 ocorreu a batalha de Irani, o qual marcou este
conflito e desencadeou na morte do monge Jos Maria. Os sertanejos,
inconformados com a morte de seu lder, partem para o extremo, dando
incio a uma guerra civil. Novas sedes foram constitudas por seus
sectrios, que at este momento no pensavam em se render, mas sim em
continuar lutando, desgostando o governo federal que, vido por
acabar definitivamente com esta guerra, resolve usar todo seu
poderio militar e abater as ltimas fortificaes resistentes,
utilizando para este fim um grande contingente de soldados
equipados com fuzis, canhes, metralhadoras e avies, nunca antes
usados em uma ao blica desta magnitude.
A Guerra do Contestado acabou com a capitulao dos revoltosos e
muitas mortes, pois os mesmos resistiram bravamente antes de se dar
por vencidos.
CONSIDERAES FINAIS
Tido como rebeldias fanticas e irracionais, os movimentos
religiosos, sobretudo esses trs exemplos, entenderam esses episdios
como produto de um quadro de crise que inclua mudanas estruturais
decorrentes da acomodao da economia nacional s transformaes
internacionais.
Fim da escravido, alterao do regime de governo, transformaes nas
formas do poder politico local (coronelismo, mandonismo,
clientelismo) desestabilizao dos sistemas de referencia cultural e
religioso (fim do padroado).Lutas de classes, ou ainda luta pela
terra, conferindo o aspecto religioso em um papel secundrio.
Padre Cicro considerado um guia para os seus fiis.
Conselheiro a despeito de interpretaes contrrias jamais se
considerou um messias ou ainda se investiu de papis
sacerdotais.
O Monge Maria, por sua vez de manifestava como Salvador,
faltando saber a hora de sua chegada, caracteristicamente messinico
e milenarista.
BATALHA, Cludio H. M. BatalhaFORMAO DA CLASSE OPERRIA E PROJETOS
DE IDENTIDADE COLETIVA
Em seu artigo A historiografia da classe operria no Brasil:
Trajetrias e tendncias (BATALHA in: FREITAS, 2000) o historiador
Cludio H. M. Batalha, da Unicamp, toma como objetivo analisar a
produo escrita sobre esta temtica partindo de momentos anteriores a
uma produo realizada por acadmicos profissionais at a situao atual.
Sua anlise muito rica e merece discusso aprofundada, propiciando
inclusive um debate sobre a produo do prprio autor. Cabem antes de
continuar, entretanto, algumas ressalvas, apontadas pelo prprio
Batalha no comeo de seu texto e que perpassam no s este material
como tambm o outro artigo que ser resenhado, intitulado Formao da
classe operria e projetos de identidade coletiva (BATALHA in:
FERREIRA; DELGADO, 2003).
Em primeiro lugar, nota-se na escrita do autor uma preocupao em
no analisar as produes historiogrficas isolando-as umas das outras,
mas compreendendo-as dentro de contextos mais amplos. As
transformaes polticas, sociais e econmicas que ocorrem no Brasil e
no mundo durante o sculo XX esto intimamente relacionadas s
tendncias interpretativas daquilo produzida sobre determinado tema
ou perodo. Ao mesmo tempo, Batalha no rejeita a importncia das
significativas mudanas de paradigma terico-metodolgicos ocorridas
nas academias pelo mundo durante o mesmo perodo, e tampouco a
influncia que estas tiveram sobre os intelectuais brasileiros. por
meio deste movimento duplo de influncias, presente em todo o texto,
que o autor elabora sua anlise.
Outra questo de extrema importncia que achamos importante
destacar a distino que o autor faz entre o que seria a histria dos
movimentos operrios e a histria da classe operria propriamente
dita, estando esta confuso intimamente relacionada apropriao que
foi feita da temtica por parte da esquerda brasileira (seguindo uma
tendncia mundial, vale ressaltar). Esta relao possui vital
importncia para a discusso do autor e para a compreenso do
desenvolvimento da escrita sobre o assunto no Brasil, desde os seus
primrdios.
justamente por est via que surgem os primeiros trabalhos sobre a
classe operria no Brasil at os anos 50, produzidos principalmente
fora da academia e seguindo abertamente a lgica da guerra de
opinio. Era comum no perodo a generalizao das lutas e conquistas
dos movimentos operrios e do Partido Comunista como sendo aquelas
de todos os trabalhadores, independente de qualquer heterogeneidade
de opinies que estes viessem a possuir. Esta tendncia, que o autor
chama de militante, possuiria principalmente uma funo de legitimao,
seja das polticas e opinies do prprio partido, ou mesmo de
indivduos ligados a esquerda. Em obras como A formao do PCB
(PEREIRA, 1962) j se via a idia, recorrente no perodo, de que fora
apenas a partir da fundao do Partido Comunista em 1922 que se
poderia falar de histria dos trabalhadores. Este recorte, que toma
como centro de gravitao as dcadas de 20 e 30, exercer grande
influncia at os anos 80.
A partir dos anos 60, contudo, que trabalhos acadmicos
propriamente ditos passam a ser produzidos lidando com a temtica da
classe operria. sob a gide destas obras que, de acordo com Batalha,
se cristalizam diversas noes sobre o tema, como a origem
estrangeira da mo de obra e a importncia desta na introduo das
idias anarquistas e socialistas entre o operariado brasileiro
durante a Primeira Repblica.
Deste perodo, destacam-se o trabalho de socilogos como Juarez
Brando Lopes e Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, que
ambicionavam em seus trabalhos elaborar grandes snteses
explicativas para a situao do Brasil e do operariado brasileiro.
Uma caracterstica marcante aqui era o uso ainda tmido das fontes,
principalmente no que diz respeito diversidade destas. Esta
limitao, entretanto, no impede estes pensadores de elaborar grandes
teorias para explicar a situao dos trabalhadores da poca em
comparao quilo que era visto em outros pases.
J nos anos 70, sob a represso da ditadura militar, as maiores
contribuies para o tema provm dos brasilianistas (ainda que estes
no focalizassem seus esforos especificamente na histria do
trabalho, como o caso de Michael Hall), cuja influncia se mostraria
bastante duradoura. Rejeitando os grandes esquemas propostos pelos
socilogos paulistas, os pesquisadores estrangeiros buscam
diversificar as fontes utilizadas e reduzir as escala de suas
pesquisas, tanto temporal como espacialmente. A reviso crtica da
idia dos imigrantes como uma coletividade que desembarcava no
Brasil j na condio de operariado experiente, devidamente armado
ideologicamente para um novo tipo de confronto de classe, foi de
fundamental importncia posterior ao demonstrar que ainda restavam
muitas questes abertas, aguardando apenas um olhar mais
elaborado.
As crticas feitas pelos brasilianistas aos trabalhos anteriores
realizados no Brasil, notadamente a falta de rigorosidade e
diversidade na utilizao das fontes, ter dentro da academia
brasileira um efeito provocador, impulsionando novas pesquisas mais
situadas na realidade acadmica da poca ao encorajar o uso de
procedimentos que apesar de serem considerados de praxe, vinham
sendo pouco seguidos pelos historiadores e socilogos
brasileiros.
Neste mesmo momento ocorre uma sensvel diminuio da represso dos
militares dentro das universidades, e Batalha associa a crescente
produo de dissertaes sobre a temtica a esta sucesso de eventos
poltico-sociais. nesse contexto de efervescncia, no nvel acadmico
sob a influncia dos brasilianistas, e no nvel poltico-social com o
aumento da liberdade para a crtica contra o regime (que
possibilitar a abertura do arquivo Edgar Leuenroth na Unicamp, por
exemplo), que Batalha insere o trabalho de Boris Fausto (FAUSTO,
1976), assim como as dissertaes de SILVA (1977), MAGNANI (1978) e
FERREIRA (1978).
Observa-se ento que o final dos anos 1970 havia presenciado um
aumento considervel no interesse pela histria do trabalho e dos
trabalhadores, sendo, entretanto apenas com a chegada da dcada de
1980 que esta temtica alcanar seu apogeu, tanto em termos de produo
como de recepo do pblico leitor.
O contexto de contestao do regime militar, com a greve dos
metalrgicos da ABC sugerindo a necessidade de se compreender melhor
o passado da classe trabalhadora em uma tentativa de se encontrar
explicaes mais condizentes com a realidade vivida no perodo. Alm
deste importante momento de lenta redemocratizao na histria do
Brasil, no mundo acadmico a historiografia marxista inglesa
produzia trabalhos de flego notvel do ponto de vista
terico-metodolgico, expandindo ainda mais as possibilidades
proporcionadas pelas fontes. deste perodo A formao da classe
operria inglesa de Edward Thomson (THOMSON, 1987), que pode ser
citado como um trabalho cuja influncia ainda est por se dissipar,
mais de 20 anos aps sua publicao. Tambm em outros pases a histria
da classe operria se expandia, abarcando novas temticas e enfoques.
No Brasil a prpria cronologia sobre o tema, antes restrita ao sculo
XX, empurrada at 1880, propiciando novas reflexes crticas em torno
de conceitos tidos quase como dogmas. Erguendo-se sobre uma nova
forma de se pensar os processos histricos, o estudo da classe
operria passa a se desprender progressivamente da tremenda fora
gravitacional exercida pela histria dos movimentos e partidos
operrios, que dominavam at ento a historiografia sobre o tema.
Ao longo dos anos 1980, ento, a produo sobre o tema floresce de
forma rpida. Seus frutos, entretanto, passam a cair cada vez mais
longe da rvore que os originou. A fragmentao do campo de estudos
produz trabalhos que se detm em espaos cada vez menores, tanto
cronologicamente como espacialmente. A prpria dinmica da academia
no Brasil, com suas novas exigncias metodolgicas, contribua
decisivamente para esta situao. A temtica da histria dos
trabalhadores, antes bem definida como tal, passa a se confundir
com estudos sobre urbanismo, cidadania e poltica, por exemplo.
Buscando alm do contexto da prpria academia, Batalha observa ser
o final dos anos 80 um momento de profunda crise da esquerda,
momento onde praticamente se extingue o socialismo real como
ideologia de peso no cenrio geopoltico internacional. A relao dos
pensadores de esquerda com os estudos sobre o operariado evidente
para o autor, como j mencionamos no comeo, e a desiluso dos destes
possui relao direta com a diminuio (mas no desmantelamento,
ressalta Batalha) dos trabalhos sobre a temtica.
Dos anos 90 at o presente essa crise no parece ainda ter sido
superada. At mesmo as suas razes ainda no foram devidamente
identificadas, sendo mencionada a idia de Emilia Viotti da Costa
(COSTA, 1990), para quem os motivos que levaram aos impasses atuais
se devem a um embate entre duas vertentes, uma de cunho
estruturalista e outra culturalista.
Em meio a esta situao, entretanto, continuam surgindo novas
perspectivas para os estudos sobre a classe trabalhadora, esboadas
desde os anos 80, mas ainda no devidamente exploradas. A crescente
diversificao das fontes utilizadas, por exemplo, ainda no alcanou
seu potencial pleno, ao mesmo tempo em que novas leituras tanto das
antigas fontes tradicionais como das mais recentes sob a luz de
reflexes mais atuais respeito do fazer historiogrfico se fazem
necessrias, e abrem um grande horizonte para os interessados no
tema.
O outro artigo de Batalha que nos propomos a discutir neste
espao, intitulado Formao da classe operria e projetos de identidade
coletiva (BATALHA in FERREIRA; DELGADO, 2003), se insere neste
horizonte de possibilidades, apesar de possuir ambies que
certamente no se refletem em outros trabalhos mais especficos do
autor. A prpria ausncia de uma exposio de objetivos no incio do
artigo atesta para o seu carter de discusso introdutria. Se A
historiografia da classe operria (BATALHA in FREITAS, 2000) busca
apresentar os caminhos percorridos pela escrita sobre esta temtica
ao longo da segunda metade do sculo XX, nesta Formao da classe
operria Batalha expe diversos problemas e temticas de grande
interesse para o historiador contemporneo, preservando o carter de
debate historiogrfico do primeiro artigo em boa parte do texto ao
mesmo tempo em que lida diretamente com a temtica em si, ainda que
dentro de em um grande recorte espao-temporal, caracterstico de
manuais de histria como este O Brasil Republicano (FERREIRA;
DELGADO, 2003) onde o artigo se insere.
Dito isso, o texto de Batalha possui grandes qualidades. O misto
de revisionismo historiogrfico e personalismo mostra-se eficaz para
o tipo de introduo pretendida. As idias apresentadas no longo
debate descrito pelo autor no artigo que viemos de discutir so
testadas diante das perspectivas do prprio Batalha, ativo ainda
hoje como pesquisador da temtica. Ele se sente confortvel, por
exemplo, em rejeitar o automatismo que associa o surto de
industrializao dos anos 1880 com o surgimento da classe operria,
considerando que a formao da idia de classe se manifesta atravs de
concepes, aes e instituies que so percebidos em longos perodos
.
Um dos argumentos mais fortes utilizados pelo autor em defesa
desta idia justamente o tamanho das mobilizaes que ocorrem ao longo
das duas primeiras dcadas do sculo XX. Estes movimentos, por
envolverem muito mais pessoas do que o nmero restrito de
trabalhadores, testemunham a favor de algum tipo de experincia
coletiva que surgia ento. Se uma das grandes crticas feitas pela
historiografia recente aos trabalhos anteriores era que estes
misturavam de forma insensvel a histria do movimento operrio com a
histria da classe trabalhadora como um todo, momentos como este so
particularmente significativos. Afinal, sabe-se hoje que durante
muito tempo os movimentos sindicais em si foram dominados por uma
minoria de trabalhadores qualificados. Se, ainda assim, grandes
massas de pessoas se mobilizam por identificao com as causas e
reivindicaes do que consideravam ser seu grupo comum, justamente a
classe trabalhadora, isto um indcio da existncia desta classe como
uma realidade histrica que a parteira de seus prprios significados.
Isto significa rejeitar totalmente seu surgimento e organizao como
resultado mecnico, mero axioma do desenvolvimento da indstria e do
fim da escravido, mas sim como um processo de construo de uma
identidade coletiva marcada por constantes resignificaes do que
significa ser parte de uma coletividade, para alm dos rtulos
deterministas que so impingidos posteriormente a indivduos que
durante tempo demais tiveram negado o direito autoria de sua prpria
histria.
Outro aspecto muito interessante da anlise empreendida por
Batalha sua tentativa constante de se equilibrar entre
radicalismos, talvez aquilo que Emlia Viotti da Costa (COSTA, 1990)
teria descrito como vertentes estruturalistas e culturalistas. Um
dos momentos em que isto fica evidente no debate sobre a influncia
dos imigrantes na elaborao dos movimentos operrios, tanto em termos
de participao efetiva como de inspirao ideolgica. Enquanto uma
corrente anterior, herdada dos socilogos dos anos 60 baseados na
USP, tendia a atribuir grande papel aos europeus que aqui aportavam
na gnese destas organizaes coletivas, convencionou-se nas dcadas
seguintes, dentro da historiografia, a adoo de uma postura critica
diante destas afirmaes, onde se procurou ressaltar a origem rural
do imigrante, sua inexperincia poltica e suas prprias divises
internas como fatores que mais teriam dificultado que ajudado na
formao dos movimentos sociais pelos trabalhadores. Batalha, por sua
vez, no abraa nenhuma das explicaes, afirmando antes ser importante
a rejeio de qualquer anlise fundada em determinaes estruturais.
Trata-se de uma bela provocao, que parece evocar a necessidade de
esforos micro-histricos como uma forma mais capaz de compreender a
complexidade das relaes envolvidas entre brasileiros e os
estrangeiros que aqui chegavam.
Na metade do texto, entretanto, Batalha parece abandonar
progressivamente o que consideramos os aspectos mais interessantes
de sua anlise. Se por um lado um grande trunfo deste momento de sua
exposio mostrar as diversas divises existentes dentro dos
movimentos operrios, quando diversas correntes se digladiavam pela
voz mais forte dentro das associaes e partidos, a proposta inicial
de discutir a classe operria como algo que se manifestaria para
muito alm dos crculos dos movimentos vai sendo deixada de lado na
medida em que o texto avana. Pouco dito sobre o quotidiano do
operariado, por exemplo, e as fontes trabalhadas so todas
relacionadas a jornais e decretos dos prprios movimentos.
No se discute a riqueza deste material, mas sim a abordagem
empreendida. A recepo que os trabalhadores no-participantes dos
movimentos faziam destes textos no nos parece bvia, e deveria ser
objetivo de mais investigaes se a instigante idia inicial de
alcanar alm daquilo que se manifestava de forma mais polmica dentro
da sociedade fosse seguida at suas ltimas conseqncias.
Semelhante problema surgiria se se tentasse fazer uma histria
dos estudantes da UFPE com base nos jornais e decretos produzidos
pelos diversos movimentos estudantis existentes dentro da
universidade. A relao que se estabelece entre os estudantes e este
material poderia render ricas discusses sem dvida, mas deve-se
admitir que a forma como este contedo recepcionado pelos discentes
est longe de ser algo dado, automtico. Seguindo este raciocnio,
pensamos que no foi saciado nosso interesse em compreender melhor a
sociedade dos trabalhadores para alm dos movimentos, pelo menos no
neste trabalho especfico de Batalha.
Com relao ao primeiro artigo, podemos fazer algumas reflexes que
dizem respeito ao tratamento dado pelo autor as diversas correntes
ou tendncias da produo escrita sobre o tema ao longo do sculo XX. A
maior riqueza do panorama desenhado por Batalha encontra-se
justamente na sua capacidade didtica, um esforo pragmtico muito
capaz sem dvida, sendo de fato uma bela introduo ao tema. Por outro
lado, vemos na discusso elaborada por Batalha a respeito do estudo
da classe operria uma tentativa enriquecedora e muito vlida de
rejeitar estruturalismos e associaes fceis entre as conjunturas
polticas, sociais e econmicas e os prprios trabalhadores. O estudo
da participao dos imigrantes, para citar um exemplo j discutido
nesta resenha, mostra como as excees enriquecem os debates e podem
lanar nova luz em explicaes antes totalizantes.
Sendo assim, no fica claro para ns os motivos pelos quais essa
generosidade no estendida prpria produo historiogrfica. Batalha
enquadra os trabalhos escritos sobre o tema em categorias um tanto
arbitrrias, e toma pouco cuidado ao associar os intelectuais e suas
influncias aos contextos de poca em suas formas mais
generalizantes, como a ditadura, as greves do fim dos anos 70, a
redemocratizao, a queda do comunismo, as influncias acadmicas
vindas de fora, entre outros.
Da mesma forma que a reduo da classe trabalhadora como um todo
em movimento operrio uma ao que para ns (e para Batalha) parece
pouco produtiva, a associao imediata de contextos to gerais s idias
produzidas por indivduos que neles se encontravam inseridos nos
pareceu uma soluo um tanto determinista, possivelmente necessria se
levarmos em considerao o curto espao e os amplos objetivos do
texto.
SEVCENKO. Nicolau. "Introduo: O preldio republicano, Astcias da
ordem e iluses do progresso." In. Histria da Vida Privada no
Brasil, vol 3, Repblica: da Belle poque Era do Rdio. P. 7-48.
Companhia das Letras, So Paulo, 1998
Parte inferior do formulrioA Histria Contempornea foi feita com
mudanas constantes de governo, sabores, experimentos; ritmos
acelerados de vitrias e derrotas, transformao contnua de conceitos
e idias. Tudo isso veio a tona juntamente com outra - globalizao -.
Alis tudo isso s foi possvel com a economia capitalista, essa
resultante de mltiplos desdobramentos que foram surgindo depois da
revoluo industrial, principalmente a partir da segunda revoluo,
tambm chamada de cientfica-tecnolgica.
Seu local de origem, a Europa, centro propagador e os Estados
Unidos, Japo tambm fizeram parte deste contexto. Mas, para que suas
economias continuassem a crescer. Eles precisaram e fizeram com que
as sociedades tradicionais, perdessem sua cultura, histria, vida em
favor desse processo. Somente assim h sobreviventes, somente
destruindo o outro para que eles pudessem ter mercado, somente
destruindo as relaes pessoais e estabelecendo outras eles poderiam
seguir com seu intento.
Assim muitas dessas sociedades, dessas pessoas, que no fizeram
parte das classes dominantes das sociedades tradicionais dominadas
pelo colonialismo, se sentiram totalmente destrudos em todos os
sentidos, somente as classes mais baixas da populao no viram essa
transformao com bons olhos. Os seus governantes porm percebiam que
ali poderia existir uma forma de garantir-se cada vez mais, outros
buscaram meios de us-la para tomar o poder. E assim, grupos
inteiros se viram como marionetes nas mos de pessoas que decidiam
por elas. O que deveriam comer, vestir, fazer, trabalhar, divertir.
Como at hoje assim. Essas pessoas se sentiram pressionadas de certa
maneira que fizeram revoltas, levantes e guerras regionais, contra
o invasor europeu, contra a ordem estabelecida, contra aquilo que
estava sendo proposto. O mundo sofreu um choque extremo com esse
impacto fatal que mudou completamente os modos de pensar de milhes
de pessoas. A vida no seria mais a mesma. Isso foi ruim? Acredito
que no. Foi necessrio? Talvez. O que falta? Conscincia de
coletividade scio-ambiental. As respostas mudam com o tempo. Mas no
devemos deixar de sempre atualiz-las.
No Brasil esse ar de modernidade foi chegando por volta do
Imprio, mas na Repblica podemos senti-la com muito mais fervor. Os
processos no so muito diferentes quanto ao resto do globo. A mudana
da sociedade, da economia, da cultura fatal. Uma nova elite foi
formada com uma proposta to ativa para a sociedade. Mudanas estavam
por vir e devemos aproveit-la para fazer do Brasil um pas de
primeiro mundo.
nesse processo de promoo da modernidade que se dar a exploso da
Revolta de Canudos, na Bahia que com um modo um tanto quanto
destruidor,fez com que o exrcitodizimasse aquela populao;e da
Ravolta da Vacina, no Rio de Janeiro num processo muito mais
afastador, levando a morte e a priso de muitas pessoas. Esses
movimentos sociais contra a modernidade instaurada num Brasil um
tanto que rural, arcaico e ps-abolicionista foram alvos de mltiplas
crticas, que de certa forma deturparam o processo de explicao do
ocorrido. No caso carioca o processo se deua partir de trs pontos
chaves no processo modernizador da capital da
Repblica.RodriguesAlves, ento presidente da poca emquesto, nomeou
um conjunto de tcnicos responsveis pela da modernizao dos portos,
liderados pelo engenheiro Lauro Muller; o saneamento, pelo mdico
sanitarista Oswaldo Cruze a reforma urbana, pelo engenheiro
urbanista Pereira Passos, tudo isso para deixar a Capital
Brasileira, com um ar mais moderno.
Os atos cometidos pela elite naquele momento, desagradaram
profundamente a populao mais carente que no tinha como e nem
poderia agir contra, pois logo estariam sendo pr-julgados como
monarquistas, antirepublicanos. No tinha como no sentir medo, no
tinha como saber o que iria acontecer, por isso, era bem melhor
agir, antes de acontecer o pior. Mas no teve jeito, esse teve que
vir. Contudo, a jovem repblica percebeu que nem tudo era flores e
que para manter-se no poder,agiram de maneira energtica. O modelo
liberal ajudou na construo desse processo. A partir de ento
revoltas surgiriam e seriam abafadas em prol da repblica. Esta
manteve-se e a acelerao do processo modernizador pode enfim
fluir.
A populao mais pobre do pas, "comeu o po que o diabo amassou",
para que o Brasil pudesse estar a "altura" dos pases europeus,
principalmente ao pas que serviu de modelo terico, a Frana. Nas
palavras de Nicolau Sevcenko esse episdio pode ser descrito dessa
forma:
Em suma, nem lares, nem mbitos sagrados, nem corpos enem vidas,
do ponto de vista dos agentes da ordem, tinham garantias quando se
tratava de grupos populares. (Sevcenko, p. 30, Introduo: O preldio
republicano, astcias da ordem e iluses do progresso).
Somente poucos tinham privilgios naquele momento em que as
elites do pas atravessavam por um novo sentimento de mudana, em
conjunto com um sentimento, j antigo de desprezo por grupos
populares que na sua maioria era composta por negros, mostrando
interesse das elites inclusive de enbranquecer a sociedade
brasileira. Tudo isso, estava nos planos do Brasil Moderno.
nesse meio degrandes mutaes que a populao, principalmente a mais
carente, se fechar privativamente com medos internados, de serem
repreendidos pelo seu jeito de ser e agir, de crer e viver.
Enquanto isso, o Brasil reconfigurava-se politicamente, no
deixando de lado, certo conservadorismo. Alm, claro do entusiasmo
por ter, pelo menos em alguns locais do pas, dado um ar de
modernidade, principalmente, na regio sudeste, em que a economia
cafeeira, prevaleceu sobre as demais economias regionais, exemplo:
cacaueira, algodoeira. O caf era o produto agro-exportador
principal da cultura agrcola brasileira e os proprietrios dessas
terras prevaleceram-se sobre os demais, por certa proximidade do
Rio de Janeiro,capital do Imprio e da Repblicae pelas relaes, no s
econmicas, mas tambm polticas. Eles tinham a mquina do Estado no
poder, no queriam perder e fizeram de tudo para manter-se.
Assim, esse intenso processo de extremas mudanas foi
configurando um novo jeito de ser nos mais diversos grupos, a
violncia, no s fsica, como mental. Moldou uma sociedade quase que
nica, com os mesmos pensamentos, o mesmo jeito de vestir, com as
mesmas conversas. Os recursos audio visuais influenciaram e muito
para isso. A poltica dos governadores, a poltica do caf com leite,
o encilhamento (1891-1892) fez com que grupos mobilizassem um eito
de mudar aquela situao. No incio do sculo XX, o Brasil entrar numa
nova fase j esperada devido aos mltiplos processos de desvalorizao
dos grupos populares. O populismo varguista, ir conquistar esses
grupos, alm claro de outros que no estavam de acordo com o governo.
Essa forma de agir ser muito mais reacionria, muito mais radical,
tudo isso tendo como objeto mobilizador a figura de Getlio
Vargas.
Nomudar muito a exposio que essas pessoas tiveram com mudanas to
intensas e rpidas. Tudo isso ligado de um lado "as presses de um
mercado introsivo, de outro as influncias das elites dirigentes,
empenhadas em modelas as formas e expresses da vida social, as
pessoas e grupos se viram forados a mudar, ajustar e reajustar seus
modos de vida" (Sevcenko, p. 38, In: Introduo: O preldio
republicano, astcias da ordem e iluses do progresso).