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INTERCEPTAO TELEFNICA E SUA INTERPRETAO JURISPRUDENCIAL1
Cynthia Brodt Martins2
Resumo: O presente trabalho tem por objetivo principal fazer uma
anlise dos critrios preponderantes utilizados pelo Supremo Tribunal
Federal e pelo Superior Tribunal de Justia para decidir acerca da
(in) validade da interceptao telefnica como meio de prova no
processo penal. Para atingir o referido objetivo, utilizou-se como
embasamento terico o estudo relativo ao direito prova no processo
penal; s provas proibidas e interceptao telefnica. Na pesquisa
foram analisados oito acrdos, podendo se verificar que os critrios
mais aplicados pelos tribunais superiores foram: o princpio da
proporcionalidade, da vedao de provas ilcitas, da convalidao, da
motivao das decises judiciais, da ausncia de prejuzo ao ru, da
inexistncia de cerceamento de defesa e dos critrios legais
constantes na Lei 9.296/96.
Palavras-chaves: Interceptao Telefnica. Provas Ilcitas. Direito
intimidade. Lei 9.296/96. Princpio da Proporcionalidade. STJ.
STF.
INTRODUO
A interceptao telefnica um tema de extrema relevncia para a
sociedade, por ser importante meio posto disposio do Estado para as
investigaes de maior complexidade, envolvendo organizaes
criminosas, com a finalidade de elucidao de fatos e de obteno de
prova. medida cautelar admitida apenas em carter excepcional pela
Constituio Federal, para a investigao de crimes punidos com
recluso, em funo de ser instrumento que viola o direito intimidade
no apenas do investigado, como de terceiros envolvidos na comunicao
telefnica.
Dessa forma, o Estado buscando limitar o uso indiscriminado
deste instrumento, a fim de proteger garantias individuais,
regulamentou o art. 5, XII, da Constituio Federal, estabelecendo
requisitos para a autorizao da interceptao telefnica, por meio da
edio da
1Artigo extrado do Trabalho de Concluso de Curso apresentado
como requisito parcial obteno do grau Bacharel em Cincias Jurdicas
e Sociais pela Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul
e aprovado, em grau mximo, pela banca examinadora composta pelo
Orientador Prof. Marcelo Guazzelli Peruchin, Prof. Nereu Giacomolli
e Prof. Mario Rocha, em 12 de novembro de 2010. 2 Bacharel em
Cincias Jurdicas e Sociais pela PUCRS. E-mail:
[email protected].
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Lei 9.296/96. Sendo assim, deve-se observar o procedimento
previsto na referida Lei para que seja reconhecida a validade da
interceptao telefnica, sob pena da prova dela resultante ser
considerada ilcita e inadmitida no processo penal, conforme previso
constante no art. 5, inciso LVI, da Constituio Federal.
O presente trabalho tem por objetivo principal fazer uma anlise
dos critrios preponderantes utilizados pelo Supremo Tribunal
Federal e pelo Superior Tribunal de Justia para decidir acerca da
(in)validade da interceptao telefnica como meio de prova no
processo penal.
Este artigo est estruturado da seguinte forma: na seo 1
apresentado o direito prova, na seo 2 provas proibidas, na seo 3
interceptao telefnica, na seo 4 anlise jurisprudencial das
interceptaes telefnicas e na ltima seo as consideraes finais.
1 DIREITO PROVA
1.1 CONCEITO E FINALIDADE
Conforme CASTRO3 o objetivo do processo penal reconhecer a
existncia de uma verdade jurdica, sendo tal fim alcanado pelas
provas que se assumem e valoram segundo as normas prescritas pela
lei de procedimento.
NUCCI4 destaca que:
o termo prova origina-se do latim - probatio- que significa
ensaio, verificao, inspeo, exame, argumento, razo, aprovao ou
confirmao. Dele deriva o verbo provar probare -, significando
ensaiar, verificar, examinar, reconhecer por experincia, aprovar,
estar satisfeito com algo, persuadir algum a alguma coisa ou
demonstrar.
Entretanto, conforme BONFIM5 no plano jurdico o termo prova
apresenta diversos sentidos podendo ser entendido como: a)
atividade exercida, em regra, pelas partes no processo penal,
visando demonstrar a veracidade de suas alegaes; b) meios ou
instrumentos empregados na demonstrao de uma afirmao; e c)
resultado da atividade probatria, isto , a certeza ou convico que
surge no esprito de seu destinatrio.
3 CASTRO, R. A. de. Provas ilcitas e o sigilo das comunicaes
telefnicas. 2 ed. Curitiba: Juru, 2010, p. 43.
4 NUCCI, G. de S. Manual de processo penal e execuo penal. 5.
ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 388.
5 BONFIM, E. M. Curso de processo penal. 4. ed. So Paulo:
Saraiva, 2009, p. 303.
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Na definio de CAPEZ6 prova o conjunto de atos praticados pelas
partes, pelo juiz e por terceiros, destinados a levar ao magistrado
a convico acerca da existncia ou inexistncia de um fato, da
falsidade ou veracidade de uma afirmao, ou seja, todo e qualquer
meio utilizado pelo homem com o intuito de comprovar a verdade de
uma alegao.
Neste sentido, CARVALHO7 explica que a prova judiciria visa
reconstruo dos fatos investigados na instruo criminal, objetivando
fornecer ao julgador uma verdade judicial, seno absoluta, mas apta
a fundamentar uma deciso final.
1.2 NUS DA PROVA
A prova, sem dvida, nus processual no nosso sistema brasileiro.
A doutrina quanto s provas mostra-se dividida no tocante distribuio
do nus processual da existncia do delito s partes ou atribuio do
mesmo exclusivamente ao rgo acusador.
A palavra nus possui origem latina (onus), significando fardo,
carga, peso, imposio etc. Sendo assim, nus processual um encargo
que as partes possuem de provar, pelos meios admissveis, a verdade
dos fatos, conforme a distribuio de tal imposio (ARANHA)8.
importante fazer-se a diferenciao entre nus e obrigao. Segundo
CAPEZ9 a principal diferena entre a obrigao e o nus consiste na
obrigatoriedade, tendo a parte no primeiro caso o dever de praticar
o ato, sob pena de violar a lei, enquanto que no segundo caso, o
adimplemento facultativo.
A lei processual penal partiu de um princpio previsto no caput
do art. 156 do CPP: A prova da alegao incumbir a quem a fizer
[...]. Conforme MIRABETE10 o princpio decorre no s de uma razo de
oportunidade e na regra de experincia fundada no interesse afirmao,
mas na equidade, paridade de tratamento entre as partes.
Entretanto, verifica-se que a citada disposio processual
relativa incumbncia do nus da prova pertencer a quem alega no
absoluta, uma vez que, o art. 156, II do CPP, faculta ao juiz de
ofcio, no curso da instruo, ou antes, de proferir a sentena,
determinar a realizao de diligncias para dirimir dvida sobre ponto
relevante (CAPEZ)11.
6 CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p. 297.
7 CARVALHO, W.C. de. As provas ilcitas no atual ordenamento
processual penal brasileiro. Revista do
Tribunal Regional Federal da 1 Regio, v. 21, n. 6/7, jun./jul.
2009. 8 ARANHA. A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7.
ed. So Paulo: Saraiva, 2008, p. 7.
9 CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p. 332.
10 MIRABETE, J. F. Processo penal. 18. ed. So Paulo: Atlas,
2008, p. 258.
11 CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p. 333.
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Comentando essa previso legal de produo de prova ex ofcio pelo
juiz TASSE, MILO e PIASECKI12:
A produo de provas pelo juiz deve ser vista, assim, como exceo,
pois, muito embora o magistrado no seja um espectador inerte quando
da produo das provas, no pode ele substituir as partes em seu nus
de provar o que alegam. O juiz deve ser visto e atuar de maneira
imparcial, para que no contamine o processo por falta de iseno. Por
isso, as excees eleitas devem ser vistas fique claro de maneira
restritiva e excepcional.
Sobre distribuio do nus da prova destaca CAPEZ13:
Cabe ao Ministrio Pblico provar a existncia do fato criminoso,
da sua realizao pelo acusado e tambm a prova dos elementos
subjetivos do crime (dolo e culpa); em contrapartida, cabe ao
acusado provar as causas excludentes de antijuricidade, da
culpabilidade e da punibilidade, bem como circunstncias atenuantes
da pena ou concesso de benefcios legais.
Neste sentido, SOUZA14 sustenta que no momento em que o ru alega
em sua autodefesa a existncia de algum fato impeditivo (causas
excludentes de ilicitude e de culpabilidade), modificativo ou
extintivo (causas de extino de punibilidade), h uma transferncia do
nus da prova de tais fatos ou circunstncias defesa, sendo tarefa
desta demonstrar, pelo menos dentro de um nvel de probabilidade
suficiente para gerar a dvida razovel no julgador, a veracidade da
alegao.
Entendimento contrrio diviso do nus entre a acusao e defesa,
LOPES JUNIOR15 defende a inexistncia de distribuio de cargas
probatrias no processo penal, ou seja, que o nus da prova da
existncia do delito incumbe exclusivamente ao rgo acusador, em razo
de que a primeira afirmao feita por ele na pea acusatria (denncia
ou queixa); bem como pelo fato do ru possuir em seu favor a presuno
de inocncia.
LOPES JUNIOR16 complementa que no h carga probatria para defesa
em funo de no lhe ser atribuvel um prejuzo imediato e tampouco o
dever de liberao, advertindo que a questo se desloca para a
distribuio do risco pela perda de uma chance de obter a
12
TASSE, A. E; MILO, E. Z; PIASECKI, P. R. O novo sistema de
provas no processo penal: comentrios Lei 11.690/08. Curitiba: Juru,
2009, p. 41.
13 CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p. 333.
14 SOUZA, S. R. Manual da prova penal constitucional: ps reforma
de 2008. Curitiba:Juru, 2008, p. 97.
15 LOPES JUNIOR. A. Direito processual penal e sua conformidade
constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, v. 1, p.
502.
16 LOPES JNIOR. A. Direito processual penal e sua conformidade
constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2008, v. 1, p. 503.
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captura psquica do juiz, exemplificando que o ru que no exerce o
ser direito de defesa, assume o risco de perder uma chance de obter
o convencimento do juiz acerca da veracidade de sua tese.
1.3 SISTEMAS DE APRECIAO DE PROVAS
Com o encerramento da fase de instruo processual, o julgador far
uma anlise e avaliao acerca das provas apresentadas nos autos para
que formada a sua convico, possa aplicar o direito no caso
concreto.
A avaliao de provas ato eminentente pessoal do juiz, por meio do
qual, examinando, pesando e estimando os elementos oferecidos pelas
partes no processo penal (razes, debates), chega a uma concluso
sobre o alegado17 (ARANHA).
Sendo assim na apreciao judicial torna-se natural estimar-se um
valor a cada uma das provas apresentadas, de forma a sopesar as
mais importantes em detrimento das menos relevantes. A ponderao
deste sopeso por parte do juiz far-se- por meio de mecanismos
totalmente flexveis, parcialmente vinculados e completamente
adstritos (NUCCI)18.
Exatamente pela importncia que a prova apresenta no mbito
processual que a MENDES19 aponta os trs sistemas estabelecidos pela
doutrina como critrios para avaliao judicial dessas provas: a) o
sistema de prova legal ou tarifado; b) o da livre convico; e c) o
da persuaso racional ou livre convencimento motivado.
No sistema de prova legal ou tarifado cada prova produzida no
processo tem um valor preestabelecido em lei, inaltervel, de forma
que o juiz no tem liberdade na sua atividade de julgar, estando
adstrito ao critrio fixado pelo legislador. chamado de tarifado,
ento, em razo de que as provas tm uma tabela de valorao da qual o
juiz no pode se opor (ARANHA)20.
Diferentemente, no sistema da livre convico, no h previso legal
acerca do valor das provas e a deciso funda-se exclusivamente na
certeza moral do juiz, que de acordo com a sua livre convico decide
sobre a admissibilidade, avaliao e carreamentos das provas para
17
ARANHA. A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7. ed. So
Paulo: Saraiva, 2008, p. 78. 18
NUCCI, G. de S. Manual de processo penal e execuo penal. 5. ed.
So Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 17.
19 MENDES, M. G. de. Direito intimidade e interceptaes
telefnicas. Belo Horizonte: Mandamentos, 1999, p. 91.
20 ARANHA. A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7. ed.
So Paulo: Saraiva, 2008, p. 79.
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os autos, no sendo necessria a motivao para as decises21
(MIRABETE). O autor refere que este sistema o que prevalece no
Tribunal do Jri, visto que os jurados no motivam seus votos.
J no sistema de persuaso racional, o juiz livre na formao de seu
convencimento, no estando comprometido por qualquer critrio de
valorao prvio da prova, porm dever expor as razes que fizerem com
que ele optasse por tal prova, fazendo-o com base em argumentao
racional a fim de que as partes por ventura insatisfeitas possam
confrontar a deciso nas mesmas bases argumentativas
(OLIVEIRA)22.
Este sistema da persuaso racional o adotado pelo processo penal
brasileiro, na literalidade do caput do art. 155: O juiz formar sua
convico pela livre apreciao da prova [...], que encontra fundamento
no art. 93, IX da Constituio Federal.
A expresso livre convencimento criticada por transmitir a idia
de perfeio, de liberdade absoluta e ilimitada acerca da prova,
incompatvel com a realidade, visto que o convencimento est limitado
pelo contedo ftico dos autos, pelo valorar e motivar, pelas regras
da legislao ordinria e constitucional e pelos princpios humanitrios
(GIACOMOLLI)23.
Sendo assim, claro que o juiz ficar adstrito s provas carreadas
nos autos, no podendo fundamentar sua deciso em elementos estranhos
a ele, tendo em vista que o que no est nos autos no est no mundo
(MIRABETE)24.
2 PROVAS PROIBIDAS
2.1 DISTINES ENTRE PROVA ILCITA, ILEGTIMA E PROIBIDA
Primeiramente, so apresentadas as antigas distines terminolgicas
adotadas pela Constituio Federal de 1988 e acolhidas pela doutrina
entre provas ilcitas e ilegtimas, sendo essas as espcies do gnero
prova proibida25. Para tanto, parte-se da previso constante no art.
5, LVI, da atual Constituio Federal: so inadmissveis, no processo,
as provas obtidas por meios ilcitos.
21
MIRABETE, J. F. Processo penal. 18. ed. So Paulo: Atlas, 2008,
p. 260. 22
OLIVEIRA, E. P. Curso de processo penal. 11. ed. Rio de Janeiro:
Lmen Jris, 2009, p. 299. 23
GIACOMOLLI, N. J. Reformas (?) do processo penal. Rio de
Janeiro: Lmen Jris, 2008, p. 26. 24
MIRABETE, J. F. Processo penal. 18. ed. So Paulo: Atlas, 2008,
p. 260. 25
A doutrina utiliza como principais sinnimos de prova proibida:
prova vedada e prova ilegal.
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Na definio de ARANHA26:
Prova proibida, conceito genrico, toda aquela que defesa,
impedida mediante uma sano, impedida que se faa pelo Direito. A que
deve ser conservada distncia pelo ordenamento jurdico. Por ser
proibida, ofende, molesta, ope-se ao direito.
Segundo CERVI27 a distino entre prova ilcita e ilegtima se faz
em dois planos, sendo o primeiro referente natureza da norma
violada e o segundo ao momento de transgresso. No que tange ao
primeiro plano, enquanto que a prova ilegtima viola normas de
Direito Processual, diferentemente, a prova ilcita fere princpios
de Direito material, sobretudo o Direito Constitucional.
Com relao distino relativa ao momento da transgresso, enquanto
na prova ilegtima a ilegalidade ocorre no momento de sua produo no
processo, na prova ilcita, a violao ocorre no momento da colheita
da prova, podendo ser anterior ou concomitantemente ao processo,
mas externamente a este (AVOLIO)28.
Entretanto, a mencionada distino doutrinria apresentada
anteriormente foi extinta no processo penal pela nova redao do art.
157 do CPP, introduzida pela Lei n 11.690, de nove de junho de
2008, que alterou dispositivos referentes prova. Dessa forma,
segundo o referido dispositivo, ambas as provas - com denominao de
ilegtimas e ilcitas -, so apenas ilcitas e inadmissveis.
Dessa forma, verifica-se que a reforma processual solucionou
questo relevante no
tocante hermenutica do art. 5, LVI, da CF, isto porque alguns
doutrinadores defendiam uma interpretao restritiva do dispositivo,
sustentando que a vedao constante no diploma constitucional
abarcaria apenas as provas ilcitas, entendidas como violadoras do
direito material, excluindo as provas ilegtimas, entendidas como
violadores de direito processual, para as quais se aplicaria o
sistema de nulidades (CARVALHO)29.
Nesse contexto, MENDONA30 ressalta que apenas quando forem
desrespeitadas as disposies processuais que possam refletir no
devido processo legal que se poder
26
ARANHA. A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7. ed. So
Paulo: Saraiva, 2008, p. 50. 27
CERVI, M. L. Provas ilcitas e a interceptao telefnica no direito
brasileiro. Canoas: Ed. ULBRA, 2003, p. 19.
28 AVOLIO, L. F. T. Provas ilcitas: interceptaes telefnicas,
ambientais e gravaes clandestinas. 4. ed. So
Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 51. 29
CARVALHO, W. C. As provas ilcitas no atual ordenamento
processual brasileiro. Revista do Tribunal Regional Federal da 1
Regio, v. 21, n. 6/7, p. 50, jun.-jul. 2009.
30 MENDONA, A. B. de. Nova reforma do Cdigo de Processo Penal.
So Paulo: Mtodo, 2008, p. 171.
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considerar a inadmissibilidade da prova. Por exemplo, uma prova
testemunhal obtida em juzo sem a presena do defensor dever ser
considerada inadmissvel (ilcita), por violao da ampla defesa e,
portanto, ao devido processo legal.
MENDONA31 refere que havendo desrespeito a uma disposio de
carter nitidamente procedimental, que no interfira em qualquer
garantia relacionada ao devido processo legal, no pode ser admitida
como ilcita e, portanto, inadmissvel (por exemplo, uma testemunha
inquirida pelo sistema presidencialista e no diretamente pelas
partes). Dessa forma, o autor conclui que para as violaes em que no
houver leso ao princpio do devido processo legal, o sistema deve
continuar a ser o das nulidades.
Sendo assim, o novo conceito de prova ilcita vai bem mais alm,
pois tais provas podem desrespeitar tanto direitos como garantias
constitucionais, como normas de direito material ou processual
previstas em leis infraconstitucionais (BARROS)32.
2.2 PRINCIPAIS CORRENTES DOUTRINRIAS ACERCA DA
(IN)ADMISSIBILIDADE DE PROVAS OBTIDAS POR MEIOS ILCITOS
2.2.1 Admissibilidade das provas ilcitas
Para essa corrente, os princpios do livre convencimento e da
verdade real fazem com que uma ponderao de interesses em jogo penda
sempre em favor do princpio da investigao da verdade, ainda que
baseada em meios ilcitos (COSTA)33. Ela coloca a reconstruo da
verdade como o principal norteador do processo, sustentando que
prescindir uma prova formalmente correta em razo de ter sido obtida
mediante fraude, seria abdicar de elementos de convico importantes
para o resultado do processo (AVOLIO)34.
Sustenta essa parcela minoritria da doutrina, a possibilidade de
admisso da prova ilcita, contanto que no existisse vedao pelo
ordenamento jurdico, no interessando a violao de direito material
(LOPES JUNIOR)35. O autor acrescenta que o responsvel pela
31
MENDONA, A. B. de. Nova reforma do Cdigo de Processo Penal. So
Paulo: Mtodo, 2008, p. 171. 32
BARROS, F. de M. (Re)forma do processo penal: comentrios crticos
dos artigos modificados pelas Leis n 11.690/2008 e n 11.729/2008.
Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 35.
33 COSTA, S. H. Os poderes do juiz na admissibilidade das provas
ilcitas. Revista do Processo, ano 31, v. 133, p. 87,
mar. 2006. 34
AVOLIO, L. F. T. Provas ilcitas: interceptaes telefnicas,
ambientais e gravaes clandestinas. 4. ed. So Paulo: Revista dos
Tribunais, 2010, p. 53.
35 LOPES JUNIOR. A. Direito processual penal e sua conformidade
constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2008, v. 1, p. 548.
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9
prova possua a faculdade de utiliz-la no processo, respondendo
pela eventual violao da norma de direito material (que poderia
constituir um delito ou mesmo ilcito civil).
Segundo ARANHA36 os defensores da admissibilidade da prova
ilcita partem do princpio que apenas podem ser rejeitadas no
processo as provas violadoras das normas instrumentais, em razo de
que apenas estas dispem de sano de natureza especificamente
processual. Dessa forma, a prova ilcita permanece processualmente
vlida, sendo seu valor problema de avaliao, portanto, subjetivo,
punindo-se o violador do direito material com a sano
correspondente.
2.2.2 Inadmissibilidade das provas ilcitas
Por outro lado, h autores que defendem a leitura literal do
dispositivo do art. 5, LVI, da CF, onde h previso de vedao de
provas ilcitas no processo. Essa corrente doutrinria no admite
exceo proibio constitucional.
Essa corrente da inadmissibilidade da utilizao de provas obtidas
ilicitamente possui como motivao o controle da regularidade da
atividade estatal persecutria, a fim de evitar a adoo de prticas
ilegais por aqueles responsveis pela sua produo (CARVALHO)37.
De acordo com MENDES, COELHO E BRANCO38 essa corrente entende
que o interesse de investigar a verdade coexiste com outros
interesses que, em certas situaes, demonstram ser de superior
valor, revelando-se impedimento busca absoluta da verdade.
Nesse contexto, CARVALHO39 ressalta que a busca pela verdade
real para formao do convencimento do juiz, encontra limitaes
constitucionais e legais, as quais buscam concretizar valores
nsitos dignidade da pessoa humana, cuja manifestao se expressa nas
inmeras garantias dos direitos fundamentais previstos pela
Constituio Federal.
Assim, verifica-se que so vrios os autores que sustentam a
inadmissibilidade das provas ilcitas, figurando a unidade do
ordenamento jurdico, a ofensa Constituio e a moralidade dos atos
praticados pelo Estado como os principais fundamentos desse
posicionamento (ARANHA)40. 36
ARANHA. A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7. ed. So
Paulo: Saraiva, 2008, p. 63. 37
CARVALHO, W. C. As provas ilcitas no atual ordenamento
processual brasileiro. Revista do Tribunal Regional Federal da 1
Regio, v. 21, n. 6/7, p. 50, jun.-jul. 2009.
38 MENDES, G. F, COELHO, I. M; e BRANCO, P. G. G. Curso de
direito constitucional. 4. ed. So Paulo:
Saraiva, 2009, p. 106. 39
CARVALHO, W. C. As provas ilcitas no atual ordenamento
processual brasileiro. Revista do Tribunal Regional Federal da 1
Regio, v. 21, n. 6/7, p. 47, jun.-jul. 2009.
40 ARANHA. A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7. ed.
So Paulo: Saraiva, 2008, p. 64.
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10
Segundo COSTA41 alguns autores defendem a inadmissibilidade das
provas ilcitas sob o fundamento da viso unitria do ordenamento
jurdico. Dessa forma, no seria possvel admitir no processo ato
ilcito, seja por ofensa norma de direito material, seja por ofensa
norma de direito processual, em razo de que isso atentaria contra o
sistema como um todo.
No mesmo sentido, ARANHA42 refere que o direito um todo unitrio,
sendo assim, a prova ilcita afronta o direito em seu universo, razo
pela qual inadmissvel no processo, ainda que ausente violao norma
instrumental. Ento, o reconhecimento de um ilcito contamina todo o
direito e no apenas partes separadas.
Entretanto, parte da doutrina sustenta a inadmissibilidade de
provas ilcitas por ofensa Constituio. Ela parte do princpio de que
toda prova ilcita ofende a carta constitucional, por ferir direitos
e garantias fundamentais do indivduo. Sendo assim, a prova obtida
fica fulminada pela inconstitucionalidade, no podendo prevalecer em
qualquer campo do direito.
Nas palavras de COSTA43: quando uma prova colhida infringindo-se
direitos fundamentais do indivduo, ocorre uma
inconstitucionalidade, que contamina a prova e a torna
absolutamente inadmissvel no processo.
Por fim, existe a corrente que defende a inadmissibilidade da
prova ilcita amparada no princpio da moralidade dos atos praticados
pelo Estado. Conforme ARANHA44 o Estado de Direito tem a obrigao de
combater a criminalidade, devendo utilizar-se para tanto, de atos e
princpios moralmente inatacveis. O autor adverte que em razo de
militar em favor do Estado uma presuno de legalidade e moralidade
de todos os atos por ele praticados, inadmissvel que seus agentes
recorram a meios condenveis.
2.2.3 Admissibilidade da prova ilcita em casos excepcionais
Em que pese o Brasil tenha adotado expressamente o sistema de
inadmissibilidade de prova ilcita no processo no art. 5, inciso
LVI, da CF, e art. 157, caput, do CPP, grande parte da doutrina
como bem salienta CARVALHO45, posiciona-se no sentido de que a
referida
41
COSTA, S. H. da. Os poderes do juiz na admissibilidade das
provas ilcitas. Revista do Processo, ano 31, v. 133, p. 87, mar.
2006.
42 ARANHA. A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7. ed.
So Paulo: Saraiva, 2008, p. 64.
43 COSTA, S. H. da. Os poderes do juiz na admissibilidade das
provas ilcitas. Revista do Processo, ano 31, v.
133, p. 87, mar. 2006. 44
ARANHA. A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7. ed. So
Paulo: Saraiva, 2008, p. 65. 45
CARVALHO, W. C. As provas ilcitas no atual ordenamento
processual brasileiro. Revista do Tribunal Regional Federal da 1
Regio, v. 21, n. 6/7, p. 49, jun.-jul. 2009.
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11
disposio, como todo e qualquer preceito fundamental, no pode ser
interpretada de forma absoluta.
Isto porque, deve-se possibilitar moderna hermenutica
constitucional a ponderao da aplicabilidade do citado preceito
fundamental em face de outros valores da mesma forma prestigiados
pelo ordenamento. Essa ponderao de interesses constitucionais,
segundo a doutrina, far-se- por meio do princpio denominado de
proporcionalidade (CARVALHO)46.
Sendo assim, para essa corrente intermediria admitida a prova
ilcita, em casos excepcionais, quando, no caso visava-se tutelar
valores mais relevantes do que aqueles violados na colheita da
prova e tambm constitucionalmente protegidos.
2.2.3.1 Admissibilidade da prova ilcita pro reo
de aceitao pacfica pela doutrina e jurisprudncia a aplicao do
princpio da proporcionalidade para o aproveitamento da prova ilcita
quando esta for para beneficiar o ru.
LACHI47 exemplifica o caso de uma pessoa acusada injustamente
pela prtica de homicdio gravar clandestinamente uma conversa
telefnica na qual uma terceira pessoa confessa a execuo do referido
delito. O autor refere que diante dessa prova em tese ilcita,
percebe-se uma coliso de direitos fundamentais em razo de que a
prova ao mesmo tempo em que fere a inviolabilidade das comunicaes
telefnicas e o direito intimidade, est de acordo com a ampla
defesa, liberdade e presuno de inocncia.
Dessa forma, RANGEL48 argumenta que se utilizando o princpio da
proporcionalidade, verifica-se que a liberdade de locomoo tem um
peso maior diante do sigilo das comunicaes telefnicas e, portanto,
razovel que se possa quebr-lo com o escopo de resguardar a
liberdade de locomoo do ru.
Diante de uma situao como a referida, FERNANDES49 sustenta no
ser possvel justificar a condenao, at mesmo a pena elevada, de uma
pessoa quando presente nos autos prova de sua inocncia, ainda que
obtida por meios ilcitos.
46
CARVALHO, W. C. As provas ilcitas no atual ordenamento
processual brasileiro. Revista do Tribunal Regional Federal da 1
Regio, v. 21, n. 6/7, p. 49, jun.-jul. 2009.
47 LACHI, R. Excees inadmissibilidade das provas ilcitas no
processo penal brasileiro. Revista Jurdica
Unigran, Dourados, MS, v. 11, n. 22, p. 91, nov. 2008. 48
RANGEL, P. Direito processual penal. 11. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2006, p. 396. 49
FERNANDES, A. S. Processo penal constitucional. 5. ed. So Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007, p. 93..
-
12
Nesse contexto, GOMES FILHO50 salienta que no confronto entre
uma proibio de prova, mesmo que baseada no interesse de proteo a um
direito fundamental, e o direito prova da inocncia, este segundo
deve prevalecer em razo de que a liberdade e a dignidade da pessoa
humana constituem valores insuperveis, na tica da sociedade
democrtica; bem como porque ao prprio Estado no interessa a punio
de um inocente, por significar a impunidade do verdadeiro
culpado.
CAPEZ51 menciona que na admissibilidade da prova em favor do ru
os direitos que prevalecem so aqueles que protegem o indivduo
contra o arbtrio estatal (liberdade, devido processo legal, com seu
desdobramento da ampla defesa, e presuno da inocncia).
LOPES JUNIOR52 defende que o ru quando da obteno (ilcita) da
prova, dependendo do caso concreto, estaria acobertado pelas
excludentes de legtima defesa ou do estado de necessidade. O autor
sustenta, ainda, a possibilidade de invocar a tese da
inexigibilidade de conduta diversa (excluindo a culpabilidade).
Sendo assim, as referidas excludentes afastariam a ilicitude da
conduta do ru e da prpria prova, legitimando seu uso no
processo.
Nesse sentido, RANGEL53 mostra-se favorvel denominada teoria da
excluso da ilicitude, que defende que a conduta do acusado na
obteno da prova ilcita encontra-se amparada pelo direito
(excludente de ilicitude), no sendo assim possvel ser chamada de
ilcita. Dessa forma, por exemplo, o ru que realiza interceptao de
ligao telefnica, sem ordem judicial, com o objetivo de demonstrar
sua inocncia, estaria agindo de acordo com o direito, em verdadeiro
estado de necessidade justificante.
Sendo assim, OLIVEIRA54 defende que o aproveitamento da prova
ilcita em favor da defesa constitui-se em critrio objetivo de
aplicao da proporcionalidade em razo de que: a) a violao de
direitos na busca da prova da inocncia poder ser levada a conta do
estado de necessidade, excludente de ilicitude; b) o princpio da
inadmissibilidade da prova ilcita constitui-se em garantia
individual expressa, no podendo ser utilizado contra quem o seu
primitivo e originrio titular.
50
GOMES FILHO apud ASSIS, D. C. de. Provas ilcitas no processo
penal vedao constitucional e o direito de defesa. Revista Juridica
Unijus, Uberaba-MG, v. 12, n. 16, p. 180, maio 2009.
51 CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p. 306.
52 LOPES JNIOR. A. Direito processual penal e sua conformidade
constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2008, v. 1, p. 552. 53
RANGEL, P. Direito processual penal. 11. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2006, p. 397. 54
RANGEL, P. Direito processual penal. 11. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2006, p. 330.
-
13
2.2.3.2 Admissibilidade da prova ilcita pro societate
Em que pese ser questo pacfica na doutrina e jurisprudncia a
admissibilidade da prova ilcita em favor do ru, o mesmo no ocorre
quando em favor da sociedade.
LACHI55 sustenta a existncia de coliso entre direitos
fundamentais no tocante questo do aproveitamento da prova ilcita em
favor da sociedade. O autor refere que se por um lado a
admissibilidade de uma prova ilcita em favor da sociedade
acarretaria a restrio pelo Estado dos direitos fundamentais do ru
(alm da prpria vedao, do devido processo legal e da presuno de
inocncia); por outro, a possvel retirada dos autos de uma prova
importante em funo de ter sido obtida por meio ilcito impediria a
condenao de um indivduo que, de fato, tenha praticado o crime que
lhe imputado. E sendo assim, a hipottica absolvio nessas condies
ignoraria o direito propriedade (em alguns casos) e segurana do
restante da sociedade, contrariando o ordenamento jurdico.
Neste cenrio MORAES56 sustenta que as liberdades pblicas no
podem ser usadas como um verdadeiro escudo protetivo da realizao de
atividades ilcitas, tampouco como justificativa para a supresso da
responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de
ferir o Estado de Direito. Com efeito, o autor argumenta que os
responsveis pela prtica de atos ilcitos violadores de liberdades de
terceiros e da prpria sociedade, desrespeitando a dignidade da
pessoa humana, no tero o direito de invocar, posteriormente, a
ilicitude de determinadas provas a fim de afastarem suas
responsabilidades perante o Estado.
Entretanto, CAPEZ57 defende que a admissibilidade da prova
ilcita em favor da sociedade est limitada prtica de tortura, que em
razo de violar normas de direito natural, anteriores e superiores s
prprias Constituies, jamais pode ser admitida.
Com a exposio dos argumentos supra mencionados, verifica-se,
portanto que a corrente que defende a admissibilidade da prova
ilcita em casos excepcionais funda-se na aplicao do princpio da
proporcionalidade em situaes de existncia de conflito entre
direitos fundamentais. Sendo assim, em resumo, a regra que a prova
ilcita em favor da sociedade permanea vedada, mas a
proporcionalidade permita sua admisso
55
LACHI, R. Excees inadmissibilidade das provas ilcitas no
processo penal brasileiro. Revista Jurdica Unigran, Dourados, MS,
v. 11, n. 22, p. 92, nov. 2008.
56 MORAES, A. de. Direito constitucional. So Paulo: Atlas, 2006,
p. 100.
57 CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p. 308.
-
14
excepcionalmente, enquanto que no caso de existncia de prova
ilcita em favor do ru, esta deva ser admitida em regra
(LACHI)58.
2.3 PROVA ILCITA POR DERIVAO
Segundo AVOLIO59 as provas ilcitas por derivao60 so aquelas que
so provas lcitas, mas que por serem oriundas de informao extrada de
uma prova obtida por meio ilcito, no so admissveis no processo. o
denominado efeito expansivo da ilicitude ou prova reflexa. A prova
aparentemente lcita, mas derivou-se de uma ilicitude. Os frutos da
rvore so aparentemente sadios, mas a rvore est contaminada (the
fruits of the poissonous tree61) (GIACOMOLLI)62.
ARANHA63 cita como exemplo de uma prova ilcita por derivao uma
busca e apreenso obtida com a devida autorizao judicial, porm
gerada por uma escuta telefnica ilegalmente realizada. A busca e
apreenso autorizada seria uma prova lcita, porm em razo de ser
fruto de informaes obtidas por meio de uma prova ilcita
(interceptao telefnica ilegal), esta viciou a primeira prova
revestindo-a de ilicitude.
BONFIM64 menciona que a referida doutrina sustenta-se em um
argumento relacional, isto , para que uma determinada prova seja
enquadrada como fruto de uma rvore envenenada, deve-se estabelecer
uma conexo entre ambos os extremos da cadeia lgica; sendo assim,
necessita-se esclarecer quando a primeira ilegalidade condio sine
qua non e motor da obteno das provas derivadas, que no teriam sido
obtidas caso inexistisse a citada ilegalidade originria.
Com a promulgao da Lei 11.690/08, a teoria dos frutos da rvore
envenenada passou a integrar o ordenamento jurdico de forma
expressa. Conforme a redao do art. 157 1 do CPP: So tambm
inadmissveis as provas derivadas das ilcitas, salvo quando no
58
LACHI, R. Excees inadmissibilidade das provas ilcitas no
processo penal brasileiro. Revista Jurdica Unigran, Dourados, MS,
v. 11, n. 22, p. 96, nov. 2008.
59 AVOLIO, L. F. T. Provas ilcitas: interceptaes telefnicas,
ambientais e gravaes clandestinas. 4. ed. So
Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 114. 60
A Constituio Federal deixou em aberto a questo da
admissibilidade das provas ilcitas por derivao. 61
Segundo ASSIS a teoria do fruits of the poisonous tree ou Frutos
da rvore envenenada diz respeito ao conjunto de regras
jurisprudenciais nascidas na Suprema Corte norte-americana; sendo
adotada com o objetivo de reafirmar os fundamentos ticos e
dissuasivos da ilegalidade estatal em que se baseia. (ASSIS, D. C.
de. Provas ilcitas no processo penal vedao constitucional e o
direito de defesa. Revista Jurdica Unijus, Uberaba-MG, v. 12, n.
16, p. 176, maio 2009).
62 GIACOMOLLI, N.J. Reformas (?) do processo penal. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 39.
63 ARANHA. A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7. ed.
So Paulo: Saraiva, 2008, p. 68.
64 BOMFIM, E. M. Curso de processo penal. 4. ed. So Paulo:
Saraiva, 2009, p. 313.
-
15
evidenciado o nexo de causalidade de umas e outras, ou quando as
derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das
primeiras.
Com o referido dispositivo percebe-se que nem todas as provas
derivadas das ilcitas so inadmissveis no sistema jurdico
brasileiro. Segundo GIACOMOLLI65 em duas hipteses so admissveis as
provas derivadas das ilcitas: a) inexistncia da conexo entre a
ilicitude e a licitude (independent source) e, derivadas desta
regra geral; e b) reconhecimento da descoberta inevitvel da prova
(inevitable Discovery ou a hipothetical independent source
rule).
No que tange a exceo de inexistncia de conexo, ela ocorrer
quando ficar demonstrada a inexistncia de relao de causalidade
entre a prova lcita e ilcita, ou seja, a ilicitude da prova
restaria afastada caso haja a comprovao de que a prova no decorre
da prova ilcita originria, mas sim de fonte independente
(CARVALHO)66. Esta a exceo ento prevista no 1 do art. 157 do
CPP.
Com relao exceo da descoberta inevitvel, segundo CARVALHO67 esta
dever ser aplicvel quando ficar demonstrado que a prova seria
produzida de qualquer forma, independentemente da prova ilcita
originria. Sendo assim, a indesejvel contaminao da prova ilcita
originria ser afastada toda vez que os prprios trmites da
investigao ou da instruo criminal forem capazes de conduzir ao
fato, objeto da prova, por meio legtimo, independentemente daquele
outro viciado. Alguns doutrinadores defendem que essa hiptese foi a
disciplinada pelo 2 do art. 157 do CPP, embora o legislador tenha
demonstrado a sua pretenso de descrever a fonte independente68.
GIACOMOLLI69 destaca as distines acerca das referidas excees da
inadmissibilidade das provas derivadas das ilcitas:
Na realidade, quando se afasta o nexo causal, se est falando de
fonte independente, de uma origem lcita e diferenciada, mas quando
se fala em descoberta inevitvel, se est mantendo a derivao, a
ilicitude anterior contaminante da prova. Esta admitida pelo CPP
porque, atravs de outros meios lcitos, se chegaria ao mesmo
resultado, de forma inevitvel. Ento, quando se fala em descoberta
inevitvel, no h prova produzida por fonte independente, mas a ela
seria possvel chegar, hipoteticamente, atravs da fonte independente
(curso causal hipottico).
65
GIACOMOLLI, N.J. Reformas (?) do processo penal. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2008, p. 41. 66
CARVALHO, W.C. de. As provas ilcitas no atual ordenamento
processual penal brasileiro. Revista do Tribunal Regional Federal
da 1 Regio, v. 21, n. 6/7, p. 51, jun./.jul. 2009.
67 CARVALHO, W.C. de. As provas ilcitas no atual ordenamento
processual penal brasileiro. Revista do
Tribunal Regional Federal da 1 Regio, v. 21, n. 6/7, p. 51,
jun./.jul. 2009. 68 Art. 157 2 do CPP: Considera-se fonte
independente aquela que por si s, seguindo os trmites tpicos e
de
praxe, prprios da investigao ou instruo criminal, seria capaz de
conduzir ao fato objeto da prova. 69
GIACOMOLLI, N.J. Reformas (?) do processo penal. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2008, p. 46.
-
16
LACHI70 tece crticas a respeito da abrangncia das referidas
excees legais, argumentando que poderia esvaziar uma garantia
constitucional, que a vedao da utilizao da prova ilcita. O autor
refere a dificuldade de se imaginar situaes em que se possa
descartar at as mais remotas possibilidades de a autoridade
policial descobrir a prova por meio de suas atividades
investigativas; sendo assim, subsiste o risco de praticamente toda
prova possa ser considerada descoberta inevitvel e excepcione a
vedao.
3 INTERCEPTAO TELEFNICA
3.1 CONCEITO DE INTERCEPTAO TELEFNICA
Segundo CAPEZ71 interceptao provm de interceptar intrometer,
interromper, interferir, colocar-se entre duas pessoas, alcanando a
conduta de terceiro que, estranho conversa, se intromete a toma
conhecimento do assunto tratado entre os interlocutores.
Sendo assim, no aspecto jurdico PRADO72 refere que a interceptao
o ato de interferir nas comunicaes telefnicas, de modo a impedi-las
ou de forma a ter acesso ao seu contedo.
Segundo AVOLIO73 o que se mostra essencial para a noo de
interceptao o fato de a operao telefnica ter sido efetuada por uma
pessoa estranha conversa, e que esse terceiro estivesse investido
do intuito de tomar conhecimento de circunstncias, que, de outra
forma, lhe permaneceriam desconhecidas.
Desta forma, a interceptao telefnica em sentido estrito a captao
de conversa telefnica por um terceiro sem conhecimento dos
interlocutores. GRINOVER74 et. al. acrescenta que aquela que se
efetiva pelo grampeamento, isto , pelo ato de interferir numa
central telefnica, nas ligaes da linha do telefone que se quer
controlar, a fim de ouvir e/ou gravar conversaes.
70
LACHI, R. Excees inadmissibilidade das provas ilcitas no
processo penal brasileiro. Revista Jurdica Unigran, Dourados, MS,
v. 11, n. 22, p. 89, nov. 2008.
71 CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p. 315.
72 PRADO, L. C. Provas ilcitas: teoria e a interpretao dos
tribunais superiores. So Paulo: Impetus, 2009, p. 23.
73 AVOLIO, L. F. T. Provas ilcitas: interceptaes telefnicas,
ambientais e gravaes clandestinas. 4. ed. So
Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 118. 74
GRINOVER, A. P et. al. As nulidades no processo penal. 8. ed. So
Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 207.
-
17
3.2 DIFERENAS ENTRE INTERCEPTAO TELEFNICA, GRAVAO CLANDESTINA E
ESCUTA TELEFNICA
Distines entre intercepo telefnica, gravao clandestina e escuta
telefnica so importantes para a determinao da aplicao da Lei
9.296/96; bem como para o fim de incidncia do tipo penal previsto
no art. 10 do referido diploma, que incidir no caso de interceptao
telefnica75.
Segundo GOMES e CERVINI76 existem trs tipos de gravao telefnica:
a) a interceptao telefnica, em que a gravao da conversa entre os
interlocutores concretiza-se sem o conhecimento dos mesmos - a
denominada interceptao telefnica em sentido estrito; b) gravao
clandestina, quando um dos interlocutores realiza a gravao da
conversa, sem conhecimento do outro e; c) escuta telefnica77, em
que terceiro realiza a captao da conversa com a anuncia de um dos
interlocutores.
AVOLIO78 apresenta os conceitos de interceptao ambiental, escuta
ambiental e gravao ambiental: a) interceptao ambiental ou
interceptao entre presentes a captao sub-reptcia da conversa entre
presentes, realizada por terceiro, no ambiente em que se encontram
os interlocutores, com o desconhecimento destes; b) escuta
ambiental quando a interceptao de conversa entre presentes, por
terceiro, efetiva-se com o conhecimento de um dos interlocutores; e
c) a gravao ambiental consiste no registro da conversa entre
presentes por um dos participantes, com o desconhecimento do
outro.
3.3 NATUREZA JURDICA DA INTERCEPTAO TELEFNICA
Segundo GRINOVER et. al., o provimento judicial que autoriza a
execuo das interceptaes telefnicas tem natureza cautelar, tendo por
objetivo assegurar as provas por meio da fixao dos fatos da forma
como se apresentam no momento da conversa. Conforme
75
Art. 10 da Lei 9.296. Constitui crime realizar interceptao de
comunicaes telefnicas, de informtica ou telemtica, ou quebrar
segredo da Justia, sem autorizao judicial ou com objetivos no
autorizados em lei. Pena: recluso, de dois a quatro anos, e
multa.
76 GOMES, L. F; CERVINI, R. Interceptao telefnica. So Paulo: RT,
1997, p. 65.
77 A escuta telefnica chamada pela doutrina de interceptao
telefnica lato sensu, pois em que pese um dos interlocutores tenha
conhecimento da conversa, realizada por terceiro.
78 AVOLIO, L. F. T. Provas ilcitas: interceptaes telefnicas,
ambientais e gravaes clandestinas. 4. ed. So
Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 122.
-
18
nomenclatura utilizada por MENDES79, a interceptao medida
cautelar preparatria quando realizada na fase policial, e
incidental quando realizada na Justia durante instruo.
AVOLIO80 acrescenta que a medida cautelar visa evitar a
modificao da situao existente ao tempo do crime durante a tramitao
do processo principal. A tutela cautelar torna-se necessria diante
da impossibilidade de se fazer com rapidez e segurana jurdica o
processo de conhecimento condenatrio.
Diante do mencionado, verifica-se que a natureza acauteladora da
interceptao telefnica reclama o desconhecimento por parte do seu
sujeito passivo, sob pena de frustrar o sucesso da efetivao da
medida. Conforme lio de MENDES81:
O deferimento da medida inaudita altera pars, no tendo o
investigado conhecimento de que sua conversa est sendo captada,
mas, ao se conclurem as diligncias, ser levantado o sigilo, podendo
o investigado valer-se de habeas corpus para impugnar a medida se
tiver havido nulidade. Entende Gomes que se o pedido for indeferido
o Ministrio Pblico pode ingressar com mandado de segurana. (grifo
do autor)
Ensina GRINOVER82 et. al. que para a concesso da interceptao
telefnica exige-se a presena dos dois requisitos que justificam as
medidas cautelares: o fumus boni juris e o periculum in mora. A
apreciao acerca da existncia do primeiro requisito pelo juiz questo
complexa, em razo de que o mesmo deve dispor de elementos seguros
da existncia de crime, de extrema gravidade, capazes de justificar
o sacrifcio da privacy. No que tange ao segundo requisito, deve ser
analisado o risco ou prejuzo que a no concesso da medida cautelar
possa resultar para investigao ou instruo processual
(AVOLIO)83.
Para ser caracterizada a existncia de fumus boni iuris (aparncia
de bom direito) no processo penal, se faz necessria a concorrncia
de duas exigncias: a probabilidade de autoria ou participao numa
infrao penal-relacionada ao agente; e 2) a probabilidade de
79
MENDES, M. G. de. Direito intimidade e interceptaes telefnicas.
Belo Horizonte: Mandamentos, 1999, p.178.
80 AVOLIO, L. F. T. Provas ilcitas: interceptaes telefnicas,
ambientais e gravaes clandestinas. 4. ed. So
Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p.120. 81
MENDES, M. G. de. Direito intimidade e interceptaes telefnicas.
Belo Horizonte: Mandamentos, 1999, p. 182.
82 GRINOVER, A. P et. al. As nulidades no processo penal. 8. ed.
So Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p.209.
83 AVOLIO, L. F. T. Provas ilcitas: interceptaes telefnicas,
ambientais e gravaes clandestinas. 4. ed. So
Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p.120.
-
19
existncia de uma infrao penal-relacionada infrao propriamente
dita, sua materialidade (GOMES e CERVINI)84.
3.4 REQUISITOS PARA A INTERCEPTAO TELEFNICA
A Lei 9.296/96 no define as hipteses de cabimento da interceptao
telefnica, mas os casos em que excluda a possibilidade de decretao
da medida85, tratando-se assim de requisitos negativos. BADAR86
defende que se a regra a liberdade de comunicao, o legislador
deveria ter previsto estrita e expressamente as hipteses em que
seria cabvel o afastamento do sigilo telefnico, a fim de evitar
que, fora o campo de excluso, em todas as demais hipteses seja
cabvel a interpretao, com um alargamento da exceo.
Neste contexto, CAPEZ87 destaca os principais requisitos legais
para o deferimento da interceptao telefnica so: a) Ordem do juiz
competente para o julgamento da ao principal; b) Indcios razoveis
de autoria ou participao em infrao penal; c) Que a infrao penal
seja crime punido com recluso; d) Que no exista outro meio de se
produzir a prova; e) Que tenha por finalidade instruir investigao
policial ou processo criminal.
a) Ordem do juiz competente para o julgamento da ao
principal88
Segundo CAPEZ89 apenas o juiz competente para o julgamento da ao
principal poder determinar o afastamento do sigilo telefnico,
excluindo assim, o Promotor de Justia e o Delegado de Polcia.
Conforme STRECK90 juiz competente significa que, na hiptese de o
investigado ter prerrogativa de foro, a autorizao da interceptao
telefnica apenas pode ser concedida pelo seu juiz natural. O autor
exemplifica que no caso do investigado ser juiz, apenas o
Presidente do Tribunal que pode autorizar a medida cautelar,
ocorrendo a mesma situao nos casos de membros do Ministrio Pblico e
deputados federais; j na hiptese de ser o investigado
84
GOMES, L. F.; CERVINI, R. Interceptao telefnica. So Paulo: RT,
1997, p.67. 85
Art. 2 da Lei 9.296/96. 86
BADAR, G. H. R. I. Direito processual penal. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2008, p.287. 87
CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p.321. 88
Art. 1 da Lei 9.296/96: A interceptao de comunicaes telefnicas,
de qualquer natureza, para prova em investigao criminal e em
instruo processual penal, observar o disposto nesta Lei e depender
de ordem do juiz competente da ao principal, sob segredo de
justia.
89 CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p.321.
90 STRECK, L. L. As interceptaes telefnicas e os direitos
fundamentais. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2001, p.42.
-
20
governador de Estado, quem pode autorizar a interceptao
telefnica o Presidente do Superior Tribunal de Justia.
MENDES, COELHO e BRANCO91 sustentam que a verificao a posteriori
de que se trata de crime para o qual o juiz seria incompetente, no
deve ensejar a nulidade da prova colhida, em razo de que sendo o
procedimento cautelar, basta que exista, ab initio, o fumus boni
iuris.
b) Indcios razoveis de autoria ou participao em infrao penal
GOMES e CERVINI92 afirmam que a medida cautelar ser executada
quando houver indcios razoveis de autoria ou participao em infrao
penal93, ressaltando a inadmissibilidade pela lei de medida de
prospeco- se determinada pessoa estaria ou no envolvida em algum
crime- tampouco de medida que se possa solicitar na fase
pr-delitual, ou seja, preventiva. Os autores sustentam a
necessidade da existncia concretamente de um fato que v alm de mera
suspeita.
c) Que a infrao penal seja crime punido com recluso94
O afastamento de sigilo telefnico ser admissvel apenas quando o
fato investigado constituir infrao penal punida com recluso,
excluindo assim os crimes punidos com deteno e as contravenes
penais (CAPEZ)95.
CAPEZ96 critica a extenso do critrio legal, sustentando que ao
elencar genericamente todas as infraes penais apenas com recluso
como objeto da interceptao estendeu demasiadamente o rol dos crimes
passveis de serem investigados por meio do afastamento do sigilo
telefnico, crimes que muitas vezes, no apresentam maior gravidade,
no justificando o sacrifcio de um direito fundamental como o sigilo
das comunicaes telefnicas.
91
MENDES, G. F.; COELHO, I. M.; BRANCO, P. G. G. Curso de direito
constitucional. 4. ed. So Paulo: Saraiva, 2009, p. 694.
92 GOMES, L. F.; CERVINI, R. Interceptao telefnica. So Paulo:
RT, 1997, p.54.
93 Art. 2, I, da Lei 9.296. No ser admitida a interceptao de
comunicaes telefnicas quando ocorrer qualquer das seguintes
hipteses: I-No houver indcios razoveis da autoria ou participao em
infrao penal;
94 Art. 2, III, da Lei 9.296/96: No ser admitida a interceptao
de comunicaes telefnicas quando ocorrer qualquer das seguintes
hipteses: [...] III - o fato investigado constituir infrao penal
punida, no mximo, com pena de deteno.
95 CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p.323.
96 CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p.323.
-
21
CAPEZ97 defende neste caso a necessidade de incidncia da
proporcionalidade dos bens jurdicos envolvidos, afastando o
sacrifcio do sigilo telefnico em prol de um bem de menor valor.
Por outro lado, BADAR98 ressalta que o critrio legal restrito
demais ao considerar apenas a gravidade do crime, argumentando que
h infraes penais que embora no sejam graves, em funo de
particularidades da forma de seu conhecimento, apenas podem ser
apuradas por meio de interceptao telefnica, como por exemplo, o
crime de ameaa.
Entretanto, NUCCI99 afirma que a jurisprudncia tem admitido que
as infraes apenadas com deteno comportem interceptao telefnica
desde que sejam conexas aos crimes cuja pena seja de recluso.
d) Que no exista outro meio de se produzir a prova100
Conforme BADAR101 para que possa ser autorizada a interceptao
telefnica deve haver a demonstrao da impossibilidade de que a
investigao seja feita por diferentes meios disponveis como, por
exemplo, a busca e apreenso, o reconhecimento pessoal, as provas
testemunhais. necessria a indicao concreta de que a reconstruo dos
fatos impossvel sem a interceptao telefnica.
No mesmo sentido, FERNANDES102 ressalta que s ser admitida a
interceptao telefnica se este for o nico meio capaz de evidenciar a
autoria e a materialidade do crime, sob pena de no ser colhido
importante elemento de prova.
e) Que tenha por finalidade instruir investigao policial ou
processo criminal
Segundo CAPEZ103 no se admite o afastamento do sigilo telefnico
com a finalidade de instruir processo cvel, como por exemplo, em ao
de separao por adultrio, em que comum detetives grampeando o
telefone do cnjuge suspeito, j que a autorizao s cabvel em matria
criminal.
97
CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p.323. 98
BADAR, G. H. R. I. Direito processual penal. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2008, p.288. 99 NUCCI, G.de S. Leis penais e processuais
penais comentadas. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. 100 Art.
2, II, da Lei 9.296/96: No ser admitida a interceptao de comunicaes
telefnicas quando ocorrer
qualquer das seguintes hipteses: [...] II - a prova puder ser
feita por outros meios disponveis; 101
BADAR, G. H. R. I. Direito processual penal. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2008, p.287. 102
FERNANDES, A. S. Processo penal constitucional. 5. ed. So Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007, p. 107. 103
CAPEZ, F. Curso de processo penal. 16. ed. So Paulo: Saraiva,
2009, p. 323.
-
22
Sendo assim, a interceptao telefnica s possvel no mbito penal,
conforme previso do art. 1 da Lei 9.296/96, nos casos de investigao
criminal e instruo processual.
ARANHA104 refere que para a validade do procedimento de
interceptao telefnica, h necessidade da observncia tambm dos
seguintes aspectos previstos na Lei 9.296/96:
a) O pedido dever ser formulado pela autoridade policial ou
representante do Ministrio Pblico, fundamentado com descrio sobre o
que incidir a investigao e por que se deduz sobre a autoria;
b) O pedido fundamentado dever ser acompanhado dos meios
investigatrios a serem utilizados;
c) Formulado o pedido, com ou sem manifestao do Ministrio
Pblico, o juiz decidir tambm fundamentadamente;
d) O prazo da diligncia de 15 dias, com possibilidade de renovao
por igual perodo, caso seja comprovada a necessidade;
e) A interceptao deve ser gravada e uma vez feita ser procedida
a transcrio, conhecida como degravao. Se necessria, a prova
pericial poder examinar e concluir sobre a autenticidade ou no da
voz, por meios tcnicos.
f) Realizada a diligncia a autoridade requerente e autorizada
far um auto com resumo do que foi obtido, remetendo ao juzo a fita
com a gravao que interesse e sua respectiva transcrio;
g) Em juzo ser determinado o apensamento aos autos, com a
determinao de serem destrudas as partes que no forem de interesse
ao processo.
Em sntese, portanto, verifica-se que para ser vlido o
procedimento de interceptaes telefnicas e conseqentemente para que
a prova possa ser admitida no processo, devem ser observados os
referidos requisitos constantes da Lei 9.296/96.
4 ANLISE JURISPRUDENCIAL DAS INTERCEPTAES TELEFNICAS
4.1 INTERCEPTAES TELEFNICAS E A POSIO DO STJ
1. Deciso proferida pela 5 Turma do Superior Tribunal de Justia,
no Habeas corpus 143.697-PR (paciente Osni Muccelin Arruda),
publicada em 13/10/09,
104
ARANHA, A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7. ed. So
Paulo: Saraiva, 2008, p. 288.
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23
tendo por Relator o Ministro Napoleo Nunes Maia Filho, em que
era impugnado acrdo do Tribunal Regional Federal da 4 Regio.
No Habeas corpus em questo, o paciente denunciado pela prtica de
supostos crimes de descaminho, falsificao de documento particular,
falsidade ideolgica, uso de documento falso e formao de quadrilha,
pugnou pela total excluso do processo de provas fruto de
interceptaes telefnicas. No obstante o reconhecimento da ilicitude
das referidas provas pelo Tribunal a quo (autoridade coatora),
estas no foram desentranhadas dos autos do processo penal, sob o
fundamento de que os efeitos da ilicitude deveriam ser dosados na
pertinente sentena e apelao amparado no princpio da
razoabilidade.
No acrdo impugnado foi reconhecida a invalidade da interceptao
telefnica como meio de prova, visto que ausente a justificativa
relativa indispensabilidade da medida que sofreu prorrogao por
quase um ano (16 decises), acarretando a violao do disposto no art.
5 da Lei 9.296/96. Isto porque, a prpria autoridade policial
reconheceu em seus relatrios que alguns dos nmeros no tiveram
maiores relaes com o delito em questo, bem como em razo de que o
referido Tribunal no reconheceu fundamentao genrica do juiz de 1
grau ao longo das prorrogaes em que apenas remeteu-se aos mesmos
fundamentos no momento da primeira autorizao da execuo da
medida.
Com efeito, o Superior Tribunal de Justia decidiu que uma vez
reconhecida a ilicitude da interceptao telefnica como meio de
prova, o resultado desta deve ser desconsiderado pelo Juzo e
desentranhado do processo, visto no ser admitido no processo a
utilizao de provas obtidas por meios ilcitos para embasar a
persecuo penal ou eventual condenao. Diante disso, o Superior
Tribunal concedeu a ordem para determinar a excluso do processo das
provas ilcitas, com desentranhamento dos autos.
O critrio de deciso utilizado pelo Superior Tribunal de Justia
no caso em tela foi o de proteo do princpio da vedao das provas
ilcitas no processo penal, garantido pela Constituio Federal no seu
art. 5, LVI. Sendo assim, o referido tribunal aplicou a determinao
legal prevista no art. 157 do CPP de desentranhamento do processo
das provas obtidas por meios ilcitos.
A soluo do Tribunal Superior mostra-se adequada, visto que a
deciso da autoridade impetrada de reconhecimento de prova ilcita no
processo incua se desacompanhada do desentranhamento da prova dos
autos.
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24
2. Deciso proferida pela 6 Turma do Superior Tribunal de Justia,
no Recurso em Habeas corpus 20.472-DF (paciente Hermes Batista
Tosta), publicada em 9/11/09, tendo por Relatora a Ministra Maria
Thereza de Assis Moura, em que era impugnado acrdo do Tribunal de
Justia do Distrito Federal e dos Territrios.
No Recurso em habeas corpus em anlise, o recorrente denunciado
pela prtica de eventuais crimes previstos nos arts. 12 e 14 da Lei
6.368/76105 pleiteou a anulao de ao penal no Superior Tribunal de
Justia, sustentando que o recorrido no momento de apreciao de
habeas corpus no apurou a violao da garantia da ampla defesa
supostamente sofrida em virtude de ausncia de juntada aos autos de
degravao anteriormente audincia de instruo, circunstncia que
acarretou a denegao da ordem.
No acrdo impugnado o Tribunal de Justia do Distrito Federal no
reconheceu o sofrimento por parte do ora recorrente de violao de
seu direito ao contraditrio, tampouco cerceamento de defesa, em
razo de que foi constada nos autos a presena dos CDs oriundos das
interceptaes telefnicas efetuadas, os quais foram disponibilizados
Defesa dois dias antes da audincia de instruo. Sendo assim, o
referido Tribunal decidiu no sentido de que a ausncia da juntada
das degravaes das interceptaes telefnicas efetuadas no acarretou
prejuzo Defesa do recorrente.
O Superior Tribunal de Justia decidiu no mesmo sentido do
recorrido, que no caso concreto no foi detectado prejuzo para o ru,
j que em que pese o juzo de primeiro grau no tenha acolhido o
pleito de degravao das conversas captadas em interceptaes
telefnicas, houve a disponibilizao da mdia com as referidas
gravaes, no restando configurada a agresso ao direito ampla
defesa.
O critrio de deciso utilizado pelo Superior Tribunal de Justia
neste caso foi o da ausncia de prejuzo ao ru. Por este princpio no
h nulidade se no houver prejuzo parte conforme dispe o art. 563 do
CPP106.
3. Deciso proferida pela 5 Turma do Superior Tribunal de Justia,
no Habeas corpus 128.087-SP (paciente Luiz Augusto de Medeiros
Monteiro de Barros e outros), publicada em 14/12/09, tendo por
Relator o Ministro Jorge Mussi, em que era impugnado acrdo do
Tribunal Regional Federal da 3 Regio.
105
Revogada pela Lei 11.343/06 (Lei dos txicos). 106
Redao do art. 563 do CPP: Nenhum ato ser declarado nulo, se da
nulidade no resultar prejuzo para a acusao ou defesa.
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25
No Habeas corpus em questo, os investigados pela prtica de
supostos crimes de apropriao indbita e sonegao fiscal, pugnaram
pelo reconhecimento da ilegalidade da autorizao judicial que deu
origem ao procedimento de interceptaes telefnicas em sede de
inqurito policial, sustentando a inexistncia de indcios acerca da
autoria ou participao em infrao penal, bem como de demonstrao de
inviabilidade de produo da prova por outros meios que no o do
afastamento do sigilo telefnico.
No acrdo impugnado o Tribunal Regional Federal da 3 Regio
denegou a ordem de habeas corpus, argumentando que a autorizao das
interceptaes telefnicas apresentava fundamentao e estava amparada
em elementos de prova colhidos no mbito administrativo. Alm disso,
mencionou que no processo administrativo-fiscal houve lanamento de
crdito, havendo indcios de extensa atividade ilcita de sonegao
fiscal e dissimulao pela distribuio da gerncia a terceiros no
beneficiados pelo ilcito.
O Superior Tribunal de Justia decidiu pelo reconhecimento da
ilicitude das interceptaes telefnicas, em virtude de que no foram
respeitados os requisitos para a autorizao das interceptaes
telefnicas. Consta nos autos que a representao policial pela execuo
da medida no foi instruda com um mnimo de indcios capazes de
atribuir a autoria de tais fatos s pessoas detentoras dos terminais
telefnicos objeto das interceptaes. Isto porque poderiam ter sido
colhidos depoimentos dos scios da empresa investigada antes da
autorizao judicial em questo, ato que inmeras vezes foi postergado,
tendo sido realizado apenas posteriormente ao deferimento da medida
cautelar. Alm disso, a deciso judicial deixou de apontar as
atividades exercidas na empresa investigada pelas pessoas que
tiveram seus sigilos telefnicos flexibilizados.
Outrossim, o Superior Tribunal reconheceu a ilegalidade do
afastamento de sigilo telefnico para a colheita de provas visando a
apurao de eventual crime de sonegao fiscal, em razo de que
jurisprudncia consolidada naquela Corte a vedao de qualquer
procedimento investigatrio do referido crime, sem que tenha havido
a constituio do crdito tributrio supostamente sonegado.
O critrio de deciso utilizado pelo Superior Tribunal de Justia
no presente caso foi o critrio legal de inadmisso do procedimento
de interceptao telefnica quando no for demonstrada a existncia de
indcios de autoria em infrao penal, assim como a
imprescindibilidade a justificar a medida. Dessa forma, verifica-se
a constatao de violao aos requisitos necessrios para a autorizao da
medida cautelar, previstos no art. 2, incisos I e II da Lei
9.296/96.
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26
4. Deciso proferida pela 5 Turma do Superior Tribunal de Justia,
no Habeas corpus 138.933 - MS (paciente Mrcio Kanomata), publicada
em 21/08/06, tendo por Relator o Ministro Napoleo Nunes Maia Filho,
em que era impugnado acrdo do Tribunal Regional Federal da 3
Regio.
No presente Habeas corpus substitutivo, o paciente acusado pela
prtica de supostos crimes de contrabando, trfico de drogas e
lavagem de dinheiro, pleiteou a declarao de ilegalidade e
inconstitucionalidade de prova decorrente de procedimento de
interceptaes telefnicas, sob o fundamento de que a autorizao das
mesmas se deu pelo prazo de 30 dias, diferentemente do previsto em
Lei, em que mencionado que a medida no pode exceder 15 dias,
renovvel por igual perodo. Sustentou ainda, a ausncia de
fundamentao da deciso que autorizou a cautelar, razo pela qual
busca o desentranhamento dos autos das referidas provas.
No acrdo impugnado o Tribunal Regional Federal da 3 Regio
reconheceu a impossibilidade do juzo de inovar em matria
legislativa, privativa do Congresso Nacional, ao deferir o
monitoramento telefnico por 30 dias, quando a lei prev um prazo de
15 dias, prorrogvel por igual perodo. Contudo, ressaltou que a
convico do magistrado a respeito do envolvimento dos investigados
somada a extrema complexidade da organizao criminosa so argumentos
aptos a justificar, neste caso excepcional, a fixao de prazo de
interceptao telefnica superior ao patamar legal.
O Superior Tribunal de Justia no reconheceu a nulidade da deciso
que autorizou a interceptao telefnica pelo prazo de 30 dias
consecutivos, sustentando que as circunstncias do caso concreto,
tais como a quantidade de pessoas envolvidas e complexidade da
organizao criminosa justificam o deferimento do referido prazo
inicial, assim como sua prorrogao. Da mesma forma afastou a ausncia
de fundamentao para o deferimento da medida cautelar.
O critrio de deciso utilizado pelo Superior Tribunal de Justia
neste caso foi o princpio da proporcionalidade. Como se observa em
que pese tenha havido clara violao ao dispositivo do art. 5 da Lei
9.296/96, que prev a no possibilidade de a autorizao de
monitoramento telefnico por prazo que no exceda 15 dias, renovvel
por igual perodo se comprovada a necessidade, o Superior Tribunal
ponderou como valor superior defesa da Lei, a gravidade do
delito.
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27
4.2 INTERCEPTAES TELEFNICAS E A POSIO DO STF
1. Deciso proferida pela 1 Turma do Supremo Tribunal Federal, no
Habeas corpus 87859-8-DF (paciente Cludio Alves Ribeiro), publicada
em 14/09/07, tendo por Relator o Ministro Marco Aurlio, em que era
impugnado acrdo do Superior Tribunal de Justia.
No Habeas corpus em questo, o ru denunciado pela prtica de crime
de trfico de entorpecentes, pugnou pelo reconhecimento da ilicitude
de interceptaes telefnicas, sustentando a contaminao do processo,
em funo de que o resultado da interceptao telefnica foi encaminhado
ao Ministrio Pblico, quando deveria ter sido remetido ao juzo.
Acrescentou ainda que o referido resultado no estava acompanhado de
auto circunstanciado, sendo que o laudo elaborado mostrou-se
deficiente, dele no constando referncia s datas em que procedidas
as interceptaes telefnicas.
No acrdo impugnado o Superior Tribunal de Justia decidiu que o
fato das degravaes e as fitas obtidas por meio de interceptaes
telefnicas terem sido encaminhadas ao Ministrio Pblico e no ao
juzo, configura mera irregularidade, a qual se mostrou sanada no
momento em que o parquet reconhecendo a incorreo encaminhou o
referido material ao juzo. Alm disso, pronunciou-se no sentido que
o auto circunstanciado no elemento essencial para a validade da
prova, sendo incapaz de macular a interceptao telefnica. Por fim,
ressaltou que restou operada a precluso quanto validade do
procedimento, em razo de que a Defesa mostrou-se inerte ao longo do
processo.
O Superior Tribunal de Federal posicionou-se no sentido de que o
auto circunstanciado elemento essencial validade da medida
cautelar, conforme previsto no 2 do art. 6 da Lei 9.296/96. Por
fim, no reconheceu a nulidade do procedimento de interceptaes
telefnicas, amparado no argumento de que possvel vcio no restou
apontado pela Defesa na oportunidade prpria, ou seja, foi
configurada precluso conforme dispe o art. 572 do CPP.
O critrio de deciso utilizado pelo Supremo Tribunal Federal no
caso concreto foi o princpio da convalidao, em razo da Defesa no
ter impugnado em nenhum momento ao longo do processo a validade do
procedimento das interceptaes telefnicas. Ou seja, a ausncia de
argio de nulidade relativa em tempo oportuno, sana o vcio
processual.
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28
2. Deciso proferida pela 2 Turma do Supremo Tribunal Federal, no
Recurso em Habeas corpus 85.575-0-SP (recorrente Jorge Luiz Bezerra
da Silva), publicada em 16/03/07, tendo por Relator o Ministro
Joaquim Barbosa, em que era impugnado acrdo do Superior Tribunal de
Justia.
No Recurso ordinrio em habeas corpus, o ru denunciado pela
prtica de formao de quadrilha, pleiteou o reconhecimento da
ilegalidade e invalidade das interceptaes telefnicas, alegando que
o prazo de monitoramento ultrapassou 30 dias, excedendo, portanto,
o prazo disposto no art. 5 da lei 9.296/96.
No acrdo impugnado o Superior Tribunal de Justia denegou a
ordem, pronunciando-se no sentido de que as interceptaes
telefnicas, autorizadas judicialmente, perduraram por perodo
necessrio elucidao dos fatos delituosos, revestidos de complexidade
e envolvendo organizao criminosa, razo pela qual sustentou a no
ocorrncia de violao Lei 9.296/96.
O Supremo Tribunal Federal posicionou-se no sentido de que
estando as prorrogaes de interceptao telefnica devidamente
fundamentadas pelo juiz, no h obstculo para a renovao, nem ficam
maculadas como ilcitas as provas derivadas da interceptao. O
Relator do recurso ressaltou que a restrio do prazo em 30 dias em
deciso judicial, comprometeria a eficcia da medida cautelar, visto
que o caso concreto envolvia organizao criminosa complexa formada
por magistrados e policiais federais.
O critrio de deciso utilizado pelo Supremo Tribunal Federal no
caso em tela foi o princpio da proporcionalidade. Como se percebe o
referido tribunal pondera a necessidade de apurao de ilcitos de
grande complexidade como valor superior limitao legal da prorrogao,
tendo por base a finalidade da Lei.
3. Deciso proferida pela 2 Turma do Supremo Tribunal Federal, no
Recurso em Habeas corpus 83.859-6-SP (recorrente Heitor Borges da
Silva Filho), publicada em 30/04/04, tendo por Relatora a Ministra
Ellen Gracie, em que era impugnado acrdo do Superior Tribunal de
Justia.
No Recurso ordinrio em habeas corpus em questo, o ru denunciado
pela prtica de trfico de entorpecentes, pleiteou o reconhecimento
da ilicitude das interceptaes telefnicas, argumentando que as
decises que autorizaram a medida cautelar careceriam de
fundamentao.
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29
No acrdo impugnado foi afastada a alegao de ausncia de
fundamentao das decises que deferiram os pedidos de interceptao
telefnica.
O Supremo Tribunal Federal negou provimento ao recurso,
sustentando que o pedido de interceptao telefnica realizado no caso
concreto estava fundamentado, razo pela qual se conclui que o
deferimento da solicitao pelo juiz significa que ele,
implicitamente, endossou a fundamentao da autoridade policial.
O critrio de deciso utilizado pelo Supremo Tribunal Federal
neste caso foi o da observncia ao princpio da motivao das decises
judiciais. O referido tribunal concluiu que a motivao se fez
presente nas decises judiciais que autorizaram as interceptaes
telefnicas, por meio do entendimento de que se a autoridade
judicial aceitou o pedido motivado, o acolheu pelos seus prprios
fundamentos. Dessa forma no sendo constatada a violao ao art. 5 da
Lei 9.296/96 e ao art. 93, IX, da Constituio Federal.
4. Deciso proferida pela 1 Turma do Supremo Tribunal Federal, no
Recurso em Habeas corpus 92.488-3-RJ (recorrente Ricardo Dantas
Valente), publicada em 12/12/08, tendo por Relator o Ministro Marco
Aurlio, em que era impugnado acrdo do Superior Tribunal de
Justia.
No Recurso ordinrio em habeas corpus, o ru denunciado pela
prtica de trfico internacional de entorpecentes, pleiteou o
reconhecimento da nulidade do processo, em razo do juzo ter
indeferido a percia e a anlise comparativa de voz em trechos de
degravaes no reconhecidos por ele, os quais teriam servido de
fundamento para a sentena condenatria, visto que no foi determinado
judicialmente o desentranhamento do respectivo udio dos autos. O
recorrente frisa que o indeferimento da citada diligncia requerida
pela defesa violou o princpio do devido processo legal, da no
culpabilidade, do contraditrio e da ampla defesa.
No acrdo impugnado o Superior Tribunal de Justia denegou a ordem
de habeas corpus, pronunciando-se no sentido de que embora o juzo
tenha indeferido a percia de voz requerida pelo ru, consignou
expressamente que os dilogos, cuja autenticidade foi impugnada pelo
ru, no seriam utilizados isoladamente como prova na ao penal, no
subsistindo constrangimento ilegal e prejuzo ao ru.
O Supremo Tribunal Federal posicionou-se no sentido de que o
juiz ao indeferir a diligncia relativa realizao da prova pericial,
registrou na sentena proferida, que os trechos resultantes da
interceptao telefnica cuja autoria foi negada pela defesa seriam
desconsiderados para o fim de fundamentao da condenao. O relator do
recurso ressaltou
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30
que consta nos autos que o convencimento do magistrado sobre a
culpabilidade do ru estava amparado na confisso do mesmo em sede
policial, bem como em depoimentos colhidos em juzo, tendo sido
desconsiderados os trechos da interceptao telefnica impugnados.
O critrio de deciso utilizado pelo Supremo Tribunal Federal no
caso em questo foi a inexistncia de cerceamento de defesa, em funo
de ter sido concludo que o decreto condenatrio no estava amparado
em trechos de conversas telefnicas impugnadas pela Defesa aos quais
se buscaram a prova pericial, denegada pelo juzo.
CONSIDERAES FINAIS
A interceptao telefnica tem sido objeto de diversas pesquisas e
discusses no mundo jurdico, em funo de sua importncia significativa
enquanto instrumento de investigao criminal e meio de prova cada
vez mais utilizado no processo penal brasileiro; bem como por
constituir-se poderoso mecanismo de ingerncia no direito intimidade
dos indivduos, direito fundamental assegurado
constitucionalmente.
A interceptao telefnica est disciplinada pela Lei 9.296/96, a
qual regulamentou o art. 5, XII, da Constitucional Federal
Brasileira, dispositivo que admite a exceo quebra do sigilo das
comunicaes telefnicas, mediante autorizao judicial, nos casos de
investigao e instruo processual.
Na prtica forense, depara-se com diversos excessos e
irregularidades nos procedimentos de interceptaes telefnicas, dos
quais seu resultado demanda um exame pormenorizado de
admissibilidade como meio de prova no processo penal pelos juzes e
tribunais, visto que nossa Carta Constitucional prev, em seu art.
5, LVI, a vedao do uso de provas obtidas ilicitamente.
Nesse contexto, o presente trabalho realizou uma anlise dos
critrios preponderantes utilizados pelo Superior Tribunal de Justia
e pelo Supremo Tribunal Federal em seus acrdos para decidir sobre a
(in) validade da interceptao telefnica como meio de prova no
processo penal. Para tanto, foram selecionados oito julgados dos
referidos tribunais, em razo da importncia que os mesmos apresentam
no sistema jurdico brasileiro, como ltimas instncias competentes
para dizer o Direito, pela autoridade de seus argumentos.
O estudo do direito prova no processo penal, das provas
proibidas e da interceptao telefnica foi muito importante como
embasamento terico para a realizao das anlises das decises
propostas neste trabalho. Isto porque o direito prova assegura s
partes a
-
31
possibilidade de utilizao, em regra, de qualquer meio de prova,
inclusive a interceptao telefnica. Contudo, esta deve respeitar o
procedimento disposto na Lei 9.296/96, sob pena de ser considerada
prova ilcita por violao s normas legais ou constitucionais e
inadmitida no processo. Entretanto, diante de alguma ilegalidade no
referido procedimento, excepcionalmente, a interceptao telefnica
poder ser admitida no processo, quando for para beneficiar o ru.
Neste caso ser aplicado o princpio da proporcionalidade, em que
sopesando os bens jurdicos, o direito liberdade por ser o de maior
valor ser garantido em detrimento do direito intimidade.
A anlise dos oito julgados no propicia que se faam generalizaes
dos resultados do trabalho. Contudo, possvel concluir que os
critrios mais aplicados pelos Tribunais Superiores para decidir
acerca da (in) validade da prova de interceptao telefnica foram: o
princpio da vedao das provas ilcitas no processo penal, ausncia de
prejuzo ao ru, critrio legal de inadmisso do procedimento de
interceptao telefnica quando no demonstrada a existncia de indcios
de autoria em infrao penal, assim como imprescindibilidade da
medida cautelar, princpio da proporcionalidade, princpio da
convalidao, princpio da motivao das decises judiciais e princpio da
inexistncia de cerceamento de defesa.
O princpio da proporcionalidade foi o critrio mais utilizado
pelos tribunais. Observou-se no exame do HC 138.933-MS, em que STJ
no reconheceu a nulidade da deciso que autorizou a medida cautelar
por prazo inicial de 30 dias; e no exame do HC 87859-8-DF, em que
STF tampouco reconheceu a ilicitude das decises que prorrogavam a
medida por prazo superior a 30 dias, uma flexibilizao relativa
regra constante no art. 5 da Lei 9.296/96. Ambos os tribunais
reconheceram que no obstante o prazo de execuo da medida seja de 15
dias, renovvel por igual perodo, quando comprovada a sua
indispensabilidade; as circunstncias do caso concreto como
complexidade dos delitos e organizaes criminosas envolvidas devem
prevalecer sobre a formalidade legal, sob pena de frustrar a prpria
finalidade da Lei, a investigao criminal.
Os critrios de proteo ao princpio da vedao das provas ilcitas e
de proteo Lei tambm foram identificados nos julgados. No HC
143.697-PR foi confirmada a invalidade das provas de interceptao
telefnica, e determinado o desentranhamento das mesmas, negado pela
autoridade coatora, sob o argumento de que deveriam os efeitos da
ilicitude ser dosados na sentena. O STJ assim procedendo preservou
o princpio constitucional da vedao de provas ilcitas no processo,
posicionamento distinto faria com que o referido
-
32
reconhecimento se tornasse incuo, em razo de que no seria
possvel garantir a iseno do juiz, caso as provas permanecessem nos
autos. No HC 128.087-SP foi garantida a proteo lei com o
reconhecimento da inadmisso de procedimento que desrespeitou dois
requisitos da interceptao: existncia de indcios de autoria e
imprescindibilidade a justificar a medida. Nestes casos, portanto,
percebe-se que foram preservadas as garantias fundamentais dos
indivduos contra arbitrariedades do Estado.
Outros critrios que figuraram nas anlises foram os princpios da
ausncia de prejuzo e o da inexistncia de cerceamento de defesa. No
HC 20.472-DF no foi reconhecida a violao ao direito do contraditrio
e da ampla defesa que supostamente o ru teria sofrido com a ausncia
de juntada aos autos de degravao das interceptaes telefnicas,
anteriormente audincia de instruo, pois foi constatada a
disponibilizao pelo juzo dos respectivos udios, dois dias antes da
referida audincia, no subsistindo prejuzo a Defesa. Entretanto,
parece difcil definir se os dois dias de disponibilizao de mdias
antes de audincia foi tempo razovel para garantia da defesa. Da
mesma forma, o STF no HC 92.488-3-RJ afastou a alegao de
cerceamento de defesa supostamente sofrido, em razo de o juiz ter
indeferido diligncia relativa prova pericial, solicitada pela
Defesa, devido a presena nos autos de trechos da interceptao cuja
autenticidade da voz foi negada pelo ru, com fundamento no fato do
decreto condenatrio estar amparado em outras provas que no s
relativas ao referido trecho impugnado.
No HC 87.859-6-SP no foi reconhecida a nulidade do procedimento
de interceptaes telefnicas sob o fundamento de ter operado a
convalidao, em razo de no sido apontado pela Defesa, na
oportunidade prpria, eventuais vcios relativos ao erro de
encaminhamento do resultado do procedimento ao Ministrio pblico,
quando deveria ser remetido ao Juzo; bem como ausncia de auto
circunstanciado. J no HC 83.859-6-SP, o STF reconheceu que se o
pedido da autoridade policial estava fundamentado, e o juiz aceitou
o pedido motivado, significava que teria o acolhido pelos seus
prprios fundamentos, razo pela qual o tribunal concluiu que foi
respeitado o princpio da motivao das decises judiciais.
REFERNCIAS
ARANHA. A. J. Q. T. de C. Da prova no processo penal. 7. ed. So
Paulo: Saraiva, 2008.
AVOLIO, L. F. T. Provas ilcitas: interceptaes telefnicas,
ambientais e gravaes clandestinas. 4. ed. So Paulo: Revista dos
Tribunais, 2010.
-
33
ASSIS, D. C. de. Provas ilcitas no processo penal vedao
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