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III Simpósio de Pós-Graduação em Relações Internacionais do Programa "San Tiago Dantas" (UNESP, UNICAMP e PUC/SP)
8 a 11 de Novembro de 2011 ISSN 1984-9265
Anais do III Simpósio de Pós-Graduação em Relações Internacionais do Programa “San Tiago Dantas” (UNESP, UNICAMP e PUC/SP)
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REGIMES DE DIREITOS DE PROPRIEDADE INTELECTUAL (DPI): A SITUAÇÃO
DOS PAÍSES EM DESENVOLVIMENTO E A HEGEMONIA ESTADUNIDENSE
GUIMARÃES, Samara Dantas Palmeira1 .
Mestranda em Relações Internacionais
pela Universidade Federal de Santa Catarina
Resumo: O presente artigo versará sobre os regimes de Direitos de Propriedade Intelectual
(DPI) e a atual hegemonia dos Estados Unidos em relação a estes regimes, assim como a
situação dos países em desenvolvimento que tem ampliado a cooperação em propriedade
intelectual com países centrais e assumido compromissos perante a OMC que também
restringem seu espaço de manobra para definição de políticas econômicas e não são capazes
de competir ainda plenamente com o protecionismo dos países centrais, ressaltando as
assimetrias entre os países centrais e os países em desenvolvimento em relação às patentes,
modelos de utilidade, marcas e direitos autorais em geral. Nos países centrais os DPI fazem
parte da infra-estrutura institucional incentivando os investimentos privados em Pesquisa &
Desenvolvimento, mas podem dificultar a evolução dos países em desenvolvimento devido
ao protecionismo envolvido e os diferentes níveis de avanço em pesquisa.
Palavras-chave: Regimes, Propriedade, Hegemonia.
1. Considerações iniciais
A teoria da interdependência de Robert e Keohane e Jospeh Nye abre caminho para o
estudo de regimes internacionais nas Relações Internacionais, no sentido de que os países
passam a estabelecer estratégias de cooperação para lidar com interações cada vez mais
complexas. Os autores também defendiam a ideia de que cada vez mais acontecimentos
ocorridos em determinado país passam a ter efeito concreto em outros países que não tinham
necessariamente o controle sobre estes efeitos.
Desta maneira, o grau de interdependência entre os Estados faz com que estes
procurem mecanismos para administrar os conflitos ocasionados por estas interações em um
sistema internacional complexo que apresenta um feroz aumento da velocidade de circulação
da mercadoria e de pessoas, engloba culturas heterogêneas e valores que assemelham-se e
1Bacharel em Relações Internacionais pela Universidade Estadual da Paraíba. Integrante do Grupo de Pesquisa
Relações Internacionais, Direito e Desenvolvimento. Contato: [email protected]
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distanciam-se sob diferentes aspectos.
Um dos pontos discutidos no livro de Robert Keohane After Hegemony Cooperation
and Discord in the World Political Economy é que os maiores perigos para a Economia
Política Internacional tem sua origem nos conflitos políticos entre as nações, pois a política
parece mais sombria enquanto a economia parece mais otimista, de acordo com o autor.
Porém, há convergência internacional em diversos temas, como os acordos liberais
internacionais para comércio e finanças como uma resposta a necessidade de coordenação
política em ambiente de cooperação e discórdia como é o ambiente internacional.
Afetando as estruturas de cooperação emergentes no sistema internacional estão as
instituições, que de acordo com Keohane oferecem arranjos, pacotes e acordos que regulam o
sistema, num momento de combinação de força coercitiva e persuasão capitalista. A partir do
estudo sobre os regimes de Direitos de Propriedade Intelectual (DPI), o objetivo do artigo é
trazer uma reflexão sobre o posicionamento dos países em desenvolvimento em relação a
estes regimes e a influência dos Estados Unidos através de instituições no Sistema
Internacional e a partir de patentes que mantém caráter hegemônico em um sistema que vem
se configurando de maneira mais complexa e pós-hegemônica a cada dia.
2. Regimes Internacionais e hegemonia
De acordo com Keohane, a cooperação tem sido organizada na economia política
mundial quando interesses comuns existem, e neste sentido as instituições afetam as
estruturas de cooperação emergentes, reduzindo incertezas e custos de transações.
(KEOHANE, 1984, p.6).
Para o autor, os regimes são valiosos para o governo porque permitem que governos se
comprometam em realizar acordos mutuamente beneficiosos, ampliando o poder de ação para
o Estado de uma racionalidade construída. De acordo com Keohane, a criação dos regimes
internacionais é resultado da distribuição de poder, interesses compartilhados e o predomínio
de certas práticas e expectativas. (KEOHANE, 1984, p. 28)
Para Keohane as instituições não são neutras e há mudança de influências no nível
externo a partir da intensificação do fluxo comercial, da mudança de imagens coletivas e
percepções sobre o mundo, adensamento das redes, maior complexidade contratual, alteração
no custo das transações e cálculos econômicos.
Para o autor essa mudanças também representam a perda de percepções e referências
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acerca do mundo, o aumento do oportunismo e desenvolvimento de uma perspectiva míope, e
estas características potencializam o conflito em um ambiente internacional em que o
hegemon declina, o que nos remete à teoria da estabilidade hegemônica, que pressupõe que
quando há concentração do poder em um Estado dominante o desenvolvimento de regimes
fortes é facilitado. Porém, Keohane afirma que é possível que estas características não
desemboquem necessariamente na guerra, pois os regimes internacionais são suficientemente
sólidos e capazes de enxergar o futuro, evitando uma miopia perigosa.
Entretanto, autores como Stein não concordam que em condições de um hegemon em
declínio há enfraquecimento de regimes, mas que quando estados pequenos percebem que
não há o oligopólio de um hegemon, eles podem se tornar clientes mais ativos, fortalecendo
regimes. (KRASNER, 1982, p. 15)
A definição de Stephen D. Krasner de regime internacional foi a principal definição
para o estudo, em que regime internacional é um “conjunto de princípios, normas, regras e
procedimentos de tomada de decisões em torno dos quais convergem as expectativas dos
atores em uma área específica”. (KRASNER, 1982, p. 185)
Para o autor os princípios são crenças de fato, normas são padrões de comportamento
definidos em termos de direitos e obrigações, enquanto regras são prescrições específicas para
ação; e os procedimentos de tomada de decisão são práticas prevalecentes para a
implementação da escolha coletiva, pois o propósito dos regimes é facilitar acordos, e os
princípios e normas proveem as características definidoras de um regime.
Na minha opinião, a definição de Oran R. Young de regimes como “instituições sociais
que governam as ações daqueles interessados em atividades específicas” (KRASNER, 1982,
p. 93) é interessante pois o autor se encaixa numa perspectiva teórica dos regimes
internacionais baseada no comportamento, uma perspectiva cognitiva da teoria de regimes de
orientação grotiana, apresentada por Hasenclever, Mayer e Rittberger no livro Theories of
International Regimes, publicado em 1997, que foca na origem dos interesses e na visão do
Estado como um jogador no sistema internacional. (KRASNER, 1982, p. 5)
Tal perspectiva enfoca os regimes como artefatos humanos, que não tem significado
se analisados separadamente do comportamento humano.
¨While the modified structural approach does not view the
perfect market as a regime, because action there is based
purely upon individual calculation without regard to the
behavior of others, the third orientation does regard the market
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as a regime. Patterns of behavior that persist over extended
periods are infused with normative significance. A market
cannot be sustained by calculations of self-interest alone. It
must be, in Ruggie´s terms, embedded in a broader social
environment that nurtures and sustains the conditions
necessary for its functioning. Even the balance of power,
regarded by conventional structural realist analysts as a purely
conflictual situation, can be treated as a regime.¨2 (KRASNER,
1982, p. 9)
Em um mundo de estados soberanos, de acordo com Krasner, a função básica dos
regimes é coordenar o comportamento estatal para que estes estados alcancem resultados
desejados em questões particulares. (KRASNER, 1982, p. 7) Ainda sobre Oran Young,
Krasner discorre que o autor desenvolveu a noção de regimes impostos, em que atores
dominantes podem usam uma combinação de sanções e incentivos para compelir outros atores
a agir em conformidade com um particular conjunto de práticas, normas, regras e
procedimentos de tomada de decisão. (KRASNER, 1982, p. 16)
Desta maneira, atores mais fracos veem-se compelidos a comportarem-se de uma
maneira desejada por outros, pois as escolhas no sistema internacional podem ser
constrangidas de modo a dar maior peso às preferências de atores poderosos.
Neste sentido, Krasner traz um exemplo de Benjamin J. Cohen, ¨que as regras
específicas e os arranjos institucionais das instituições de Bretton Woods refletiam as
preferências dos Estados Unidos muito mais dos que os interesses da Grã Bretanha¨.
(KRASNER, 1982, p. 16)
Neste caso parece que os estados mais fracos tinham pouca opção além de seguir a
balança do regime de poder criado por estados mais poderosos a fim de servir os propósitos
particulares dos últimos.
2 ¨Enquanto a modificada abordagem estrutural não vê o mercado como um regime perfeito, porque a
ação aqui não é baseada puramente em cálculo individual se levar em conta o comportamento dos outros, a
terceira orientação considera o mercado como um regime. Padrões de comportamento que persistem por longos
períodos são infundidos com significados normativos. Um mercado não pode ser sustentados por cálculos de
seu próprio interesse. Deve ser, nos termos de Ruggie, incorporado em um mais amplo ambiente social que
sustente as condições necessárias para seu funcionamento. Mesmo o equilíbrio de poder, considerado pelos
analistas do realismo convencional estrutural como uma situação puramente conflituosa, pode ser tratado como
regime.¨ (KRASNER, 1982, p. 9.) Tradução livre da autora.
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3. Regimes de Direitos de Propriedade Intelectual (DPI) e assimetrias entre países
centrais e em desenvolvimento
A propriedade intelectual consolida-se como monopólio concedido pelo estado,
despontando como preocupação com os direitos de autores de obras intelectuais, soma dos
direitos relativos de diversas obras em diversos domínios da atividade humana e descobertas
científicas.
Um dos argumentos principais de Robert Gilpin no livro War and Change in World
Politics é que o sistema internacional é estabelecido pela mesma razão que qualquer sistema
social ou político é criado, onde atores buscam relações sociais e criam estruturas sociais de
acordo com seus interesses. O sistema internacional possibilitaria, assim, a obtenção de
benefícios, e os atores tentariam mudar o sistema para garantir seus próprios interesses.
O regime de propriedade intelectual desponta como central para o crescimento
econômico dos países, instigando o desenvolvimento dos países e a produção de tecnologia
está diretamente associada à produtividade da economia. Os países que demoraram mais a se
desenvolverem costumaram a apropriar as tecnologias dos países desenvolvidos.
No artigo titulado ¨Introdução aos Direitos de Propriedade Intelectual nas Relações
Internacionais¨ de Elói Martins Senhoras, o autor afirma que a prática da pirataria e
falsificações de produtos intensivos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) tem reduzido a
possibilidade das empresas e indivíduos inovadores de aproveitarem por mais tempo os
resultados dos processos de desenvolvimento atrelados a seus produtos, e
¨(...) Por isso fez-se necessário criar leis jurídicas através de
patentes, marcas e designs comerciais, direitos de autor
(copyrights), e até sobre segredos industriais para tentar conter
essa prática que tem se tornado cada vez mais usual no mundo de
hoje. Esse é um tema bastante polêmico que tem gerado grande
discussão dentro da Organização Mundial do Comércio (OMC),
principalmente quando se leva em consideração os pontos de vista
dos países desenvolvidos e dos países em desenvolvimento e seus
consequentes conflitos de interesse comercial. ¨ (SENHORAS,
Elói, 2007, p. 2)
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Os Direitos de Propriedade Intelectual (DPI) fazem parte da infra-estrutura
institucional nos países desenvolvidos, incentivando os investimentos privados em Pesquisa
& Desenvolvimento, servindo como mecanismo que incentiva a inovação.
Fundamentais à efetividade global do sistema internacional de propriedade intelectual
estão as instituições, de acordo com o Elói Senhoras, que administram instrumentos da
propriedade intelectual como as patentes, marcas comerciais, designs industriais e copyrights.
A instituição que tem destaque na administração de tratados e convenções para
promoção de cooperação entre estados na proteção de propriedade intelectual é a Organização
Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI). Com a instituição da Organização Mundial do
Comércio (OMC) foi ampliada a atuação do regime internacional de propriedade intelectual
além da OMPI, quando foi a esfera de atuação foi definida comercialmente pela OMC a partir
de três aspectos principais: padrão mínimo de proteção, delineamento de medidas coercitivas
a serem adotadas nas legislações nacionais para que titulares de direitos de propriedade
intelectual imponham o exercício dos seus direitos, um sistema de solução de conflitos rígido
proporcionado pela OMC. (SENHORAS, 2007, p. 5-6)
De acordo com o autor, a busca por poder pela OMC em relação à OMPI na
normatização do regime internacional de propriedade intelectual demonstra a capacidade de
enforcement dos países desenvolvidos em negociações internacionais.
Os sistemas de Direito de Propriedade Intelectual variam de acordo com o país, e é
considerado que os Estados Unidos tem um dos regimes de DPI mais fortes no mundo,
pressionando a inclusão de assuntos de DPI relacionados ao comércio a partir de negociações
no GATT. Em países em desenvolvimento os padrões de proteção englobam alguns poucos
tipos de propriedade intelectual com mecanismos limitados embasados pela ideia de que estes
países tiveram habilidade limitada para criar propriedade intelectual, aos poucos adotando
padrões mais altos de proteção. (SENHORAS, 2007, p. 8)
Os direitos de propriedade intelectual também buscam a proteção contra concorrência
desleal e todos os outros direitos inerentes à atividade intelectual em diversos domínios.
Entretanto, os Estados Unidos tem os mais altos níveis de proteção, e as pressões de países
industriais para o fortalecimento da proteção expandiram-se, acarretando disputas
internacionais constantes sobre os DPI. Ao assinarem o acordo de TRIPS (Trade-Related
Aspects of Intellectual Property Rights) nos marcos da OMC, os países em desenvolvimento
tinham obrigações maiores que os desenvolvidos no sistema multilateral, além de estes serem
os responsáveis pela administração e decisões no âmbito da OMC.
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“As dificuldades enfrentadas para finalizar as negociações
multilaterais refletem a magnitude dos interesses em jogo, e os
resultados obtidos aprofundam ainda mais as assimetrias entre os
países do Norte e os do Sul. As regras aprovadas limitam cada vez
mais a autonomia dos países periféricos para a adoção de políticas
nacionais ativas de fomento às exportações e de apoio à
especialização produtiva, bem como os incentivos ao investimento
e ao desenvolvimento tecnológico.” (MACADAR, 1996, p. 238)
Desta maneira, os compromissos assumidos pelos países em desenvolvimento na
OMC parecem restringir o espaço de manobra destas nações na definição de políticas
econômicas que afetam o comércio ao limitarem as salvaguardas de discrição, o que tende a
beneficiar muitas vezes mais os países centrais do que os periféricos.
Apesar disso, os países em desenvolvimento passam a barganhar equilíbrio e colocam
novas questões em pauta na rodada de negociações em Doha, buscando maior poder de
manobra e ajuda para o desenvolvimento de suas políticas.
Nos países centrais também a taxa de investimento em P&D é maior e fortemente
realizado pelo setor privado diretamente vinculado às demandas de mercado, e nos países em
desenvolvimento é menor e concentrada no setor público através de universidades, por
exemplo.
Os Estados Unidos de maneira especial beneficiam-se fortemente dos Direitos de
Propriedade Intelectual pois seus serviços são mais dinâmicos no comércio mundial,
incluindo softwares e serviços de informação, royalties e remuneração de licenças. Os EUA
são o maior exportador de direitos de propriedade, sendo logicamente o maior receptor de
royalties e remunerações de licença. Os EUA também beneficiam-se pois a maioria de suas
exportações em propriedade intelectual são entre as matrizes estadunidenses para suas filiais
no estrangeiro.
O número de litígios sobre propriedade intelectual bate recordes nos Estados Unidos, e
as retaliações contra os países em desenvolvimento por não protegerem adequadamente a
propriedade intelectual deles são comuns. No caso do Brasil, os Estados Unidos adotaram
medidas unilaterais de retaliação contra o país, relacionadas à lei de informática. Em artigo
sobre a relação entre Brasil e Estados Unidos acerca da propriedade intelectual, Luiz Carlos
Bresser-Pereira afirma que as patentes são uma necessidade mas também um monopólio, e o
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Brasil não deve aceitar as imposições estadunidenses neste campo. (PEREIRA, 1993, p. 1)
¨Nas relações entre o Brasil e os Estados Unidos os brasileiros
jamais deveriam esquecer que o grande país do norte é o berço do
pragmatismo e da democracia. Este fato sempre permitiu que seus
governantes vissem os problemas de uma maneira prática e mesmo
dialética. Nada mais longe do pensamento americano do que as
idéias absolutas e o idealismo, que sempre perseguiram os
europeus. Conforme afirmava o Economist, em um recente
editorial "os Estados Unidos sempre alimentaram sua política
externa com um sentido de obrigação moral e de auto-interesse"
(PEREIRA, 1993, p. 1)
Em julho de 2011 foi publicado no jornal virtual Consultor Jurídico que nos Estados
Unidos houve quebra de recorde do número de litígios envolvendo disputa de propriedade
intelectual por companhias multinacionais. De acordo com informações da Comissão de
Comércio Internacional dos Estados Unidos (ITC, sigla de International Trade Comission),
agência federal que julga casos de embate comercial entre empresas dos EUA e do exterior, o
número de ações ajuizadas na Comissão nos seis primeiros meses do ano, é 50% maior do que
no primeiro semestre do ano passado, o que indica o aumento do número de ações envolvendo
patentes de tecnologias.3
O Brasil tomou posicionamento corajoso ao tomar uma medida temporária em 2010
que previa suspensão de patentes e outras retaliações envolvendo propriedade intelectual,
suspendendo o pagamento de royalyties, o que poderia prejudicar o ambiente de
investimentos no Brasil. Entretanto, esse posicionamento brasileiro demonstra a crescente
autonomia da política externa brasileira no cenário internacional.
¨Por um lado, os países em desenvolvimento podem aumentar os
benefícios de reformas incentivadas pelo TRIPS construindo
consensos nacionais sobre o desejo de proteção de DPIs e
estabelecendo instituições eficientes e acreditáveis para
administrar e obrigar os DPIs. Por outro lado, as reformas
unilaterais em países em desenvolvimento correm o risco de
ampliarem a capacidade de negociação em propriedade intelectual
3 Fonte: http://www.conjur.com.br/2011-jul-03/numero-litigios-propriedade-intelectual-eua-bate-recordes
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dos países centrais e simultaneamente restringirem o raio de
manobra dos países periféricos, o que corrobora para a
compreensão que a desigual distribuição do conhecimento cria e
aprofunda as desigualdades econômicas e tecnológicas entre os
países desenvolvidos e os em desenvolvimento .¨ (SENHORAS,
2007, p. 24)
Neste sentido, o contencioso do algodão na Organização Mundial do Comércio
também demonstrou que a instituição a OMC também é capaz de tomar decisões favoráveis
aos países em desenvolvimento, pois o Brasil teve decisão favorável no painel da OMC.
Neste caso, os produtores de algodão brasileiro competiam com o algodão
estadunidense há décadas, onde o hegemon, acentuando as sucessões de hegemonias trazidas
por Robert Gilpin buscando o crescimento, expansão, liderança econômica e tecnológica,
estabilidade além da redução de custos para favorecer seus interesses, busca mudar o sistema
para alcançar seus interesses e manter o status quo.
Sobre o contencioso, o algodão estadunidense conta com subsídios do governo desde
1934, recebendo estímulos adicionais e proteção envolvendo grandes corporações do
agronegócio. Com consequentes prejuízos para o setor brasileiro no mercado internacional, o
Brasil iniciou um contencioso contra os Estados Unidos para que o país eliminasse os
subsídios à exportação e também pediu retaliação nas áreas de propriedade intelectual e
venceu, definindo valores para a retaliação.
4. Considerações finais
As tecnologias de informação e comunicação aproximaram os países na atualidade,
formando uma rede estratégica global de plantas produtivas especializadas e diversificadas.
(SENHORAS, 2007, p. 15). As instituições facilitam a cooperação através da redução da
incerteza, são úteis para o governo facilitando acordos. Porém, não aumentam
necessariamente o bem-estar social, pois nem todos os regimes potencialmente valiosos serão
instituídos. Além disso, as instituições são difíceis de criar e mais fáceis de manter, podendo
auxiliar os Estados a lidar com os problemas apresentados. Neste caso, a OMC é uma
organização que tem auxiliado os Estados a lidarem com problemas relacionados a comércio e
proteção.
O caso brasileiro do contencioso do algodão em relação aos Estados Unidos
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demonstrou que os países em desenvolvimento podem defender suas vantagens comparativas
no comércio mundial e aproveitarem as instâncias de resolução de litígios da OMC, pois
mesmo não sendo fácil, não é impossível vencer.
Nos anos 80 a hegemonia americana era baseada em três pilares: sistema monetário
estável, mercados abertos para mercadorias e acesso ao petróleo a preços estáveis.
Atualmente, o sistema monetário passa por um período de instabilidade, após mudança de um
regime de ortodoxia liberal para um regime de liberalismo mitigado após a Segunda Guerra
Mundial.
De acordo com Krasner, as mudanças nas regras e nos procedimentos de tomada de
decisão são mudanças dentro dos regimes, princípios e normas ficariam inalterados, e as
mudanças nas normas e nos princípios são mudanças de regimes. As variáveis básicas causais
dão origem aos regimes, que influenciam nos resultados e comportamento relacionado dos
autores. (KRASNER, 1982, p. 23)
Para o autor, os regimes são um fenômeno difuso em todos os sistemas políticos, em
que padrões de comportamento inevitavelmente geram expectativas convergentes. Os direitos
de propriedade intelectual formam um regime pois os padrões de comportamento que existem,
nos caso relacionados à proteção, ganharam significância normativa.
Um quadro de referências compartilhadas representa a tradição grotiana de que
mesmo com a existência da soberania, há possibilidade do espaço internacional ser
relativamente harmonioso.
No artigo titulado ¨Structural causes and regime consequences: regimes as intervening
variables¨ de Stephen D. Krasner, o autor afirma que as variáveis causais básicas dos regimes
são as interações entre regimes e padrões de comportamento, que há o auto-interesse egoísta,
e regimes são variáveis dependentes intervenientes, e o desenvolvimento dos regimes é
causado pelas variáveis causais básicas.
Neste sentido, faz-se interessante compreender o poder político envolvido na
construção de regimes, pois o poder a serviços de interesses particulares pode levar os atores a
abandonar decisões conjuntas a favor de decisões independentes ou usar o poder a serviço do
bem comum, por exemplo, proteger a economia da força.
Um aspecto interessante observado por Krasner sobre regimes é em relação ao
conhecimento, de que os regimes vão se adaptando com a evolução do conhecimento
científico, num processos de evolucionismo cognitivo, e que regimes e comportamento são
intrinsecamente conectados. (KRASNER, 1982, p.1)
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No caso do regime de DPI, pode-se afirmar que o regime vai se adaptando pois as
rodadas da Organização Mundial de Comércio vão incorporando novas demandas como a
proteção de copyrights na área de informação digital com a expansão da Internet e o
surgimento de novas licenças relacionadas às franquias, uso autorizado de ativos intangíveis,
entre outros. Desta maneira, o comportamento dos atores também é influenciado pelos
princípios e normas relacionados ao regime de DPI, pois, como já foi colocado anteriormente,
os países em desenvolvimento passam a alterar seus padrões de comércio além de proteger
suas criações intelectuais.
Uma alternativa para os regimes de propriedade intelectual no campo da informática é
o software livre, que iniciou como uma cruzada contra os acordos de sigilo assinados com as
grandes corporações de software, que recusavam o compartilhamento de conhecimento e
travavam as pesquisas. O software livre vai contra a apropriação individual ou empresarial de
porções significativas do conhecimento disponível, incentiva o compartilhamento dos
softwares e dos códigos dos programas e o aprimoramento individual dos desenvolvedores.
Richard Stallman, fundador da Free Software Foundation, criou uma licença que inverte os
termos do copyright, o copyleft4, de maneira que autorizasse a exploração pública dos
softwares.
4 ¨A economia de software livre foi constituída com base na licença de software livre GPL (licença
pública geral), popularmente conhecida como copyleft, cujos termos estabelecem que o software deve ser livre e
aberto para o estudo, modificação, compartilhamento, desde que o resultado do trabalho derivado carregue
consigo as mesmas liberdades e a mesma abertura.¨ Fonte: http://softwarelivre.org/portal/geral/software-livre-
como-alternativa-ao-regime-de-propriedade-intelectual. Acesso em Julho/2011.
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