INSTITUTO MATERNO-INFANTIL DE PERNAMBUCO (IMIP) PROGRAMA DE MESTRADO EM SAÚDE MATERNO-INFANTIL USO DA ELETROESTIMULAÇÃO TRANSCUTÂNEA PARA ALÍVIO DA DOR DURANTE O TRABALHO DE PARTO EM UMA MATERNIDADE-ESCOLA – ENSAIO CLÍNICO RANDOMIZADO FLÁVIA AUGUSTA DE ORANGE RECIFE – 2003
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INSTITUTO MATERNO-INFANTIL DE PERNAMBUCO (IMIP) PROGRAMA DE MESTRADO EM SAÚDE MATERNO-INFANTIL
USO DA ELETROESTIMULAÇÃO TRANSCUTÂNEA PARA ALÍVIO
DA DOR DURANTE O TRABALHO DE PARTO EM UMA
MATERNIDADE-ESCOLA – ENSAIO CLÍNICO RANDOMIZADO
FLÁVIA AUGUSTA DE ORANGE
RECIFE – 2003
DISSERTAÇÃO APRESENTADA AO COLEGIADO DO CURSO DE MESTRADO EM
SAÚDE MATERNO-INFANTIL DO INSTITUTO MATERNO INFANTIL DE
PERNAMBUCO PARA SER SUBMETIDA À BANCA EXAMINADORA, COMO
PARTE DOS REQUISITOS PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM SAÚDE
MATERNO-INFANTIL
USO DA ELETROESTIMULAÇÃO TRANSCUTÂNEA PARA ALÍVIO
DA DOR DURANTE O TRABALHO DE PARTO EM UMA
MATERNIDADE-ESCOLA - ENSAIO CLÍNICO RANDOMIZADO
AUTORA: FLÁVIA AUGUSTA DE ORANGE
ORIENTADORA: MELANIA AMORIM
CO-ORIENTADORA: LUCIANA LIMA
ESTA DISSERTAÇÃO É DEDICADA...
Ao meu filho, Gabriel,
que, com seu nascimento, me fez admirar a beleza da vida.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer a todos aqueles que, de alguma maneira, ajudaram na realização
dessa dissertação, em especial a:
Paulo, marido e amigo, pelo companheirismo, cumplicidade e incentivo de sempre.
Délio Mendes, meu pai, que com sua sabedoria se tornou um exemplo de vida acadêmica.
Fátima, amiga, que com amor e carinho esteve sempre disposta a ajudar nesta caminhada.
Zilda, minha mãe, por ter me educado de forma carinhosa e simples.
Melania Amorim, orientadora e amiga, que com competência e desprendimento soube
transmitir todas as informações necessárias à concretização deste trabalho e com carinho
soube compreender as minhas dificuldades. A ti dedico esta frase: “ Um guerreiro da luz
compartilha com os outros o que sabe do caminho. Quem ajuda sempre é ajudado, e precisa
ensinar o que aprendeu” . (Paulo Coelho )
Luciana Lima, preceptora de residência médica, co-orientadora e amiga, pelo incentivo
ainda como residente, e por acreditar em mim como profissional e pessoa. Agradeço
sobretudo pela tua amizade.
Todos os professores do Mestrado, pelas lições que recebi.
Dra. Ana Caetano, chefe da Residência de Anestesiologia do IMIP, pelo seu apoio na coleta
dos dados.
Dr. Antônio Monteiro, chefe do serviço de Anestesiologia do IMIP, pelo seu apoio na
captação de recursos para a realização deste trabalho, sem o qual inviabilizaria o projeto.
Sylvia Vilela, amiga, que esteve sempre presente nos momentos de dificuldades.
Adriana Scavuzzi, amiga do Mestrado, pela troca de conhecimentos e pelas risadas nos
momentos mais complicados.
Carminha e Serginho, companheiros de plantão, que estavam sempre dispostos a me ajudar
na realização das analgesias de parto.
Flávia Gusmão, obstetra, pelos partos que se prontificou a realizar comigo.
Os residentes de Anestesiologia: Flávia, Suzane e Guacira, pela ajuda na coleta de dados.
Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos LTDA, por ter fornecido as drogas necessárias
à boa realização da analgesia de parto.
Becton Dickinson Indústrias Cirúrgicas LTDA, por ter fornecido o material para a
realização da anestesia combinada.
SUMÁRIO
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS
LISTA DE FIGURAS
LISTA DAS ABREVIATURAS E SIGLAS
RESUMO
ABSTRACT
I. INTRODUÇÃO 1
II. OBJETIVOS 19
III. HIPÓTESES 20
IV. MÉTODOS 21
4.1. Local do Estudo 21
4.2. Desenho e populaçãp do Estudo 21
4.3. Tamanho da Amostra 22
4.4. Duração do Estudo 22
4.5. Critérios para seleção das participantes 22
4.6. Procedimentos para seleção e randomização das participantes 23
4.7.Caracterização Amostral 25
4.8. Procedimentos para avaliação das participantes, aplicação da EET e
realização da anestesia combinada (raquianestesia e peridural contínua)
26
4.9. Acompanhamento das pacientes 31
4.10. Critérios para indicação da cesariana 31
4.11. Variáveis pesquisadas 32
4.12. Critérios para descontinuação do estudo 32
4.13. Definição de termos e variáveis 33
4.14. Procedimento para a coleta dos dados 37
4.15. Processamento e análise dos dados 38
4.16. Aspectos éticos 40
V. RESULTADOS 42
VI. DISCUSSÃO 48
VII. CONCLUSÕES 64
VIII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 65
ANEXOS
1. FORMULÁRIO
2. CONSENTIMENTO PÓS-INFORMAÇÃO
3. FLUXOGRAMA
LISTA DE TABELAS
Página
Tabela 4.1.Características gerais das gestantes em trabalho de parto de acordo
com a aplicação ou não da EET. Recife, 2002.
25
Tabela 5.1. Tempo transcorrido entre a aplicação ou não da EET e a instituição
da anestesia combinada para a analgesia de parto em parturientes internadas na
maternidade do IMIP, entre maio e outubro de 2002.
42
Tabela 5.2. Duração do trabalho de parto de acordo com a aplicação ou não da
EET e a instituição da anestesia combinada para a analgesia de parto em
parturientes internadas na maternidade do IMIP, entre maio e outubro de 2002.
44
Tabela 5.3. Tipo de parto de acordo com a aplicação ou não da EET e a
instituição da anestesia combinada para a analgesia de parto em parturientes
internadas na maternidade do IMIP, entre maio e outubro de 2002.
45
Tabela 5.4. Freqüência de parto instrumental (fórceps) de acordo com a aplicação
ou não da EET e a instituição da anestesia combinada para a analgesia de parto
em parturientes internadas na maternidade do IMIP, entre maio e outubro de
2002.
46
Tabela 5.5.Escores de APGAR no quinto minuto de acordo com a aplicação ou
não da EET e a instituição da anestesia combinada para a analgesia de parto em
parturientes internadas na maternidade do IMIP, entre maio e outubro de 2002.
47
LISTA DE FIGURAS
Página
Figura 1 – Escala Analógica Visual da dor. Lado utilizado para que a paciente
quantifique sua dor através da movimentação do bastão
27
Figura 2– Escala Analógica Visual da dor. Lado utilizado para que a dor da
paciente seja quantificada pelo examinador, de acordo com a posição do bastão
colocada pela paciente.
27
Figura 3– Aparelho de EET, modelo 804S III
29
Figura 4– Valores da mediana da Escala Analógica Visual a cada trinta minutos
de acordo com a aplicação ou não da EET e a instituição da anestesia combinada
para analgesia de parto em parturientes internadas na maternidade do IMIP, entre
maio e outubro de 2002.
43
LISTA DAS ABREVIATURAS E SIGLAS
IMIP Instituto Materno-Infantil de Pernambuco
CAM Centro de Atenção à Mulher
EAV Escala Analógica Visual da dor
EET Estimulação Elétrica Transcutânea
VAS Visual Analog Scale
CSE Combined Spinal Epidural thechnique
TENS Transcutaneous Electrical Nerve Stimulation
mA miliampère
mg miligrama
Hz Hertz
mcg micrograma
ml mililitros
cm centímetro
Uso da eletroestimulação transcutânea para alívio da dor durante o trabalho
de parto em uma Maternidade-escola: ensaio clínico controlado
RESUMO
CENÁRIO: a estimulação Elétrica Transcutânea (EET) promove a modulação do processo
doloroso. Este controle da dor parece ocorrer através da teoria do portão proposta por
Melzack e Wall. A EET é disponível para analgesia de parto, porém só é utilizada em uma
pequena minoria dos partos. Estudos randomizados devem ser conduzidos para comprovar
sua efetividade e segurança.
OBJETIVOS: comparar os efeitos da aplicação ou não de Estimulação Elétrica
Transcutânea (EET) antes da instalação da técnica combinada (raquianestesia e peridural)
no alívio da dor do trabalho de parto.
MÉTODOS: realizou-se um ensaio clínico, randomizado, aberto, envolvendo 22
parturientes, com gestação a termo e feto único em apresentação cefálica, atendidas na
Maternidade do IMIP, hospital escola de nível terciário em Recife, Brasil. Estas pacientes
foram randomizadas para receber ou não EET antes da instalação da anestesia combinada
(raquianestesia + anestesia peridural) para analgesia de parto. Avaliou-se a intensidade da
dor através da Escala Analógica Visual (EAV), o tempo transcorrido entre a avaliação
inicial e a necessidade de instalação da anestesia combinada, a duração do trabalho de
parto, freqüência de cesariana e parto instrumental, escores de Apgar e freqüência de
hipóxia neonatal. Para análise estatística, utilizaram-se os testes de Mann-Whitney e exato
de Fisher, considerando-se o nível de significância de 5%.
RESULTADOS: o tempo decorrido entre a avaliação da dor da parturiente e a necessidade
de instalação da técnica combinada foi significativamente maior no grupo da EET (mediana
de 90 minutos) quando comparado ao grupo controle (mediana de 30 minutos). A duração
do trabalho de parto foi similar nos dois grupos (em torno de seis horas). Não houve
diferença na evolução dos escores de EAV durante o trabalho de parto. A freqüência de
cesariana foi de 18,2% nos dois grupos. Apenas um parto foi ultimado a fórceps, no grupo
controle. A mediana do escore de Apgar no quinto minuto foi 10, não se encontrando
nenhum caso de hipóxia neonatal.
CONCLUSÕES: a aplicação de EET foi efetiva em retardar a instalação da anestesia
combinada para manter analgesia satisfatória durante o trabalho de parto, porém não
apresentou efeito significativo sobre a intensidade da dor e a duração do trabalho de parto.
Não houve efeitos deletérios maternos e neonatais.
Uso da eletroestimulação transcutânea para alívio da dor durante o trabalho de parto em uma maternidade-escola : ensaio clínico randomizado / Flávia Augusta de Orange. – Recife : O Autor, 2003.
77 folhas : il., fig., tab.
Dissertação (mestrado) – Instituto Materno-Infantil de Pernambuco. Saúde Materno-Infantil, 2003.
Inclui bibliografia e anexos.
1. Parto – Analgesia. 2. Dor (Parto) – Eletroestimulação. 3. Anestesia – Delivramento. I. Título.
618.438 CDU (2.ed.) UFPE 618.4 CDD (21.ed.) BC2003-004
1
I - INTRODUÇÃO
O nascimento do concepto constitui um momento de grande alegria para aqueles
que participam do parto, porém pode acarretar excessivo sofrimento para a gestante.
Paradoxalmente, um processo fisiológico e natural associa-se com dor aguda (LOWE,
2002). Não se pode ignorar a relação entre a dor do parto e o grau de satisfação com o
nascimento do concepto (HODNETT, 2002). Existem muitas ilustrações antigas que
retratam o momento do parto, quase sempre o interpretando como um castigo ou
maldição divina e, muito raramente, como um fato feliz (OJUGAS, 1999).
A experiência da dor durante o trabalho de parto resulta da interação complexa
entre múltiplos fatores fisiológicos, psico-sociais e culturais, afetando a interpretação
individual dos estímulos nociceptivos da parturição (LOWE, 2002). Esta experiência
pode ser bastante desagradável. Mesmo levando em consideração as diferenças culturais
e sócio-econômicas na percepção do processo doloroso, MELZACK (1984) considerou
a intensidade da dor do trabalho de parto semelhante à da amputação de um dedo.
Curiosamente, alguns adeptos do parto natural acreditam que a dor do trabalho de
parto e suas respostas endócrinas e metabólicas sejam extremamente importantes para a
adaptação do concepto à vida extra-uterina (SCHINEDER et al., 1993). Entretanto,
apesar de este processo ser importante para a adequada integração de mãe e filho, não só
a dor do parto é um processo marcadamente desagradável para mãe, como também
desencadeia uma série de respostas fisiológicas que podem ser extremamente danosas ao
binômio materno-fetal (BASTOS et al, 2001). Estas alterações e o benefício de tratá-las
devem ser especificados:
2
1.1. A DOR DO TRABALHO DE PARTO E SUAS ALTERAÇÕES
1.1.1. ALTERAÇÕES DA VENTILAÇÃO E OXIGENAÇÃO
A dor induzida pelo trabalho de parto provoca aumento da ventilação alveolar
que pode passar de 9l/min para 20-25 l/min, acarretando hipocarbia e alcalose
respiratória maternas significativas (MATHIAS & TORRES, 2000). Esta alcalose,
associada ao maior esforço ventilatório realizado pela gestante durante as contrações
uterinas, gera maior consumo de oxigênio, além de provocar redução do fluxo sanguíneo
útero-placentário e desvio da curva de dissociação da hemoglobina para a esquerda,
resultando em diminuição das trocas materno-fetais (BASTOS et al, 2001).
A analgesia de parto mantém um padrão de ventilação e oxigenação homogêneo
durante todo o parto, evitando os danos referidos acima (MATHIAS & TORRES, 2000).
1.1.2. RESPOSTA ENDÓCRINO-METABÓLICA
A dor e o estresse do trabalho de parto resultam em alterações metabólicas e
humorais semelhantes ao trauma cirúrgico. Assim, provocam a liberação de uma série de
hormônios, incluindo endorfinas, ácidos graxos livres, lactado e catecolaminas, que
quando liberadas em excesso provocam diminuição do fluxo útero-placentário e
contrações uterinas incoordenadas (RIZZO et al, 1999).
Embora estes efeitos possam ser relativamente inócuos durante a evolução de um
trabalho de parto rápido e não-complicado (BROWNRIDGE, 1995), não se pode afastar
a possibilidade de influência negativa sobre o curso do trabalho de parto, acarretando
distocia, acidemia materna e acidose fetal (LOWE, 2002).
3
A instituição da analgesia de parto, principalmente a analgesia regional, restaura
a valores normais o fluxo sanguíneo uterino, assim como torna as contrações uterinas
mais rítmicas (MATHIAS, TORRES, 2000; RIZZO et al, 1999).
1.2. FISIOPATOLOGIA DA DOR DO TRABALHO DE PARTO
É de suma importância a compreensão dos mecanismos da dor durante a
parturição, para que se possam compreender e estabelecer as estratégias de alívio deste
processo. Embora o mecanismo da dor do trabalho de parto ainda não se encontre
totalmente esclarecido, algumas hipóteses têm sido formuladas. Durante a parturição, a
distensão uterina, a distensão de tecidos perineais e principalmente a dilatação cervical
estimulam pressorreceptores sensíveis a estímulos nocivos de fibras Aδ e C (fibras de
pequeno diâmetro).
Estas fibras conduzem os estímulos até a coluna dorsal da medula, onde
estabelecem sinapses com neurônios que prosseguirão para centros superiores e ainda
com neurônios envolvidos em arcos-reflexos em nível medular (ANDRADE, 2000).
Neste ponto, sofrem a modulação de impulsos provenientes de centros superiores,
resultando no quadro final de resposta da paciente ao fenômeno doloroso (BASTOS et
al, 2001; MATHIAS & TORRES, 2000).
Cabe ressaltar que a inervação uterina e anexial é autonômica, simpática e
parassimpática. Na primeira fase do trabalho de parto o principal papel é do sistema
nervoso simpático, que conduz estímulos dolorosos de características viscerais com
aferência ao nível de T10-T11-T12-L1 (RICHARDSON, 2000). No segundo estágio do
4
trabalho de parto, a dor assume características somáticas com aferência ao nível de S2-
S3-S4 (HAWKINS et al, 2002).
A percepção individual do processo doloroso depende da intensidade e duração
das contrações uterinas, da condição física da gestante e de uma série de fatores,
psicológicos, culturais, educacionais e religiosos, bem como da experiência prévia e das
expectativas da mulher (HARRISON et al, 1986). Fatores preditivos de aumento da
percepção dolorosa durante o trabalho de parto incluem a nuliparidade, o uso de
ocitócitos, parturientes muito jovens e história de dismenorréia (STEPHENS, 2000).
1.3. TÉCNICAS DE ALÍVIO DA DOR DO TRABALHO DE PARTO
A preocupação com o alívio da dor durante o trabalho de parto surgiu juntamente
com a própria Obstetrícia. Em uma prática tão antiga como o partejamento, é fácil
dimensionar o grande avanço tecnológico que se incorporou a esta arte.
As referências orientam para a data de 1847, com a primeira analgesia obstétrica,
realizada por Simpson, utilizando o clorofórmio como agente (MATHIAS & TORRES,
2000). Este método, porém, se consagrou em 1853 quando foi utilizado no parto do
oitavo filho da rainha Vitória, escandalizando a opinião pública, porque muitos
clamavam contra este ato que acreditavam transgredir as palavras bíblicas: “Parirás com
dor”. Simpson, entretanto, apresentou razões científicas e humanitárias a favor deste
método, citando que, como consta no Gênesis, Deus havia utilizado o sono profundo
para promover analgesia e extrair a costela de Adão (OJUGAS, 1999). Desde então, têm
sido testadas diversas drogas e técnicas para controle da dor do trabalho de parto
(QUADRO 1).
5
QUADRO 1. AVANÇOS HISTÓRICOS DA ANALGESIA EM OBSTETRÍCIA
ANO AVANÇO
1846 Primeiro uso de éter para alívio da dor do parto
1847 Primeiro uso do clorofórmio para alívio da dor do parto
1853 Jonh Snow usou o clorofórmio para alívio da dor durante o parto da rainha Vitória, que deu à luz ao príncipe Leopoldo
1880 Introdução da analgesia inalatória com óxido nitroso
1898 August Bier introduziu a cocaína no espaço subaracnóideo
1900 Kreiss publicou “Regarding medullary narcosis in parturientes”. Este foi o primeiro relato do uso de agentes narcóticos para analgesia de parto
1901 Sicard e Cathlein introduziram a técnica caudal para acesso ao espaço peridural
1902 Primeiro bloqueio espinhal para cesariana
1902 Von Steinbuchel, na Alemanha, e Gray, na Áustria, usaram a combinação de morfina e escopolamina para promover analgesia durante o parto
1908 Primeiro uso de anestésicos locais para analgesia perineal durante o delivramento
1909 Introdução do bloqueio caudal
1921 Page introduziu a técnica lombar de acesso ao espaço peridural
1921 Kreiss utilizou a analgesia espinhal para parto transpelviano
1925 Introdução do bloqueio paracervical
1926 Introdução do bloqueio paravertebral
1928 Introduziu-se o bloqueio em sela, usando novocaína hiperbárica para bloqueio da cérvice e períneo
1935 Odom introduziu a técnica para analgesia lombar contínua
1938 Descrição da perda da resistência
1940 Analgesia caudal contínua foi usada para parto transpelviano
1949 Introdução da técnica usando duplo cateter para acesso intratecal e peridural
(STEPHENS et al., 2000)
6
Não obstante todos os avanços, ainda hoje se encontra muita resistência ao uso
rotineiro da analgesia de parto, sob o pretexto de que dificultaria a descida e rotação do
pólo fetal, perpetuando o trabalho de parto e alterando negativamente os resultados
perinatais. Todavia, à luz dos conhecimentos atuais, é evidente que utilizando as técnicas
anestésicas atualmente disponíveis, esta preocupação tornou-se infundada
(SCHWEITZER et al., 2000).
Além disso, estudos recentes não evidenciaram influência negativa da analgesia
no trabalho de parto como, por exemplo, maior incidência de apresentações cefálicas
anômalas, sobretudo se realizada de forma adequada, utilizando as doses recomendadas
(YANCEY, 1999).
Atualmente, várias técnicas estão disponíveis para controle da dor do trabalho de
parto, como descreveremos a seguir.
1.3.1. MÉTODOS FARMACOLÓGICOS
Analgesia Sistêmica
Apesar da diminuição de sua popularidade, os analgésicos sistêmicos e
antiespasmódicos ainda são utilizados na dor do trabalho em suas fases iniciais
(MATHIAS & TORRES, 2000).
A droga mais utilizada é a meperidina, usualmente administrada por via
intramuscular na dose de 50-150mg. Entretanto, é necessário respeitar um intervalo entre
a administração na mãe e o nascimento do concepto, uma vez que a droga atravessa a
barreira placentária e provoca depressão respiratória neonatal. Com isto, só pode ser
7
utilizada se o parto se consumar antes de 30 minutos de sua administração ou após duas
horas (FINDLEY &CHAMBERLAIN, 1999).
Analgesia Inalatória
A mistura de óxido nitroso e oxigênio em partes iguais encontra-se praticamente
abandonada no Brasil (MATHIAS & TORRES, 2000). Esta mistura é administrada pela
própria paciente nas fases finais do trabalho de parto e apresenta eficácia variável, pois
quanto melhor a qualidade da analgesia, maior o risco de perda da consciência e de
perda dos reflexos protetores da via aérea, com aumento do risco de aspiração do
conteúdo gástrico (FINDLEY & CHAMBERLAIN, 1999).
Analgesia Peridural
Até recentemente era a técnica mais utilizada, embora atualmente venha sendo
substituída pela técnica combinada, raquianestesia e peridural (FINDLEY &
CHAMBERLAIN, 1999). Esta forma de analgesia é realizada através da introdução de
um cateter dentro do espaço peridural, para administração de anestésico local, associado
ou não a opióides (MATHIAS & TORRES, 2000).
Quando realizada corretamente, utilizando-se anestésico local em baixas
concentrações associado a opióides como sufentanil ou fentanil, promove analgesia de
boa qualidade, sem bloqueio motor e resultados perinatais favoráveis (GOMAR &
FERNANDEZ, 2000).
A analgesia peridural pode ser utilizada em dose única, doses intermitentes ou
infusão contínua, dependendo da fase do parto em que for instalada, devendo-se, porém,
8
ressaltar que, se instalada em estágios avançados do trabalho de parto, quando estruturas
perineais já estão sendo solicitadas, sua prática pode ser inadequada (MATHIAS &
TORRES, 2000).
Uma discussão importante é o medo expressado por muitos obstetras de que esta
analgesia promova bloqueio motor, interferindo negativamente no andamento do
trabalho de parto (MACARIO et al, 2000). Entretanto, alguns estudos têm demonstrado
que a anestesia peridural pode prolongar o primeiro e o segundo estágio do trabalho de
parto, assim como aumentar a taxa de parto instrumental (fórceps), mas não interfere nos
resultados perinatais nem aumenta a incidência de cesariana (AVELINE & BONNET,
2001; YANCEY, 1999).
Esta técnica apresenta algumas desvantagens, pois a dura-máter pode ser
acidentalmente puncionada, o que acontece em menos de 1% dos casos, produzindo
intensa cefaléia em 80% destes (FINDLEY & CHAMBERLAIN, 1999). Entretanto, o
emprego racional da técnica, associado à vigilância adequada, é de forma geral bastante
seguro para o binômio materno-fetal.
Analgesia Combinada (Raquianestesia-Peridural)
Consiste na combinação da anestesia raquidiana e peridural contínua para
analgesia de parto, tendendo a ser preferida às outras técnicas anestésicas, devido ao
rápido início de ação, melhor qualidade de analgesia e menor bloqueio motor (LO et al.,
1999).
Esta técnica pode ser realizada através de duas punções espinhais: na primeira se
localiza o espaço peridural, introduzindo-se o cateter e, em seguida, realiza-se a punção
9
subaracnóidea em outro espaço (MATHIAS & TORRES, 2000). Existem ainda aqueles
que preferem fazer inicialmente a punção do espaço subaracnóideo, introduzir a mistura
de anestésico local associado a opióides e, então, cessada a dor da parturiente, faz-se a
punção do espaço peridural no mesmo ou em outro espaço (MATHIAS & TORRES,
2000).
Estão disponíveis atualmente conjuntos de agulhas que permitem a punção do
espaço peridural com agulha de Tuohy ou Weiss adequada, a qual já apresenta orifício
para se introduzir no seu interior uma agulha de Whitacre calibre 27G e, com isto,
realizar a punção subaracnóidea, sem necessitar de uma nova punção (TSEN et al,
2000).
Este tipo de analgesia parece ser de melhor qualidade quando comparada à
peridural isolada, porque pode ser utilizada em qualquer fase do trabalho de parto, sendo
particularmente útil nas fases iniciais do trabalho de parto e no período expulsivo,
quando já existe distensão das estruturas perineais, posto que nesta situação a peridural
isolada seria ineficaz em controlar o processo doloroso adequadamente (ROUX et al.,
1999; RAWAL et al.,2000). Além do mais, evidências recentes sugerem que a analgesia
combinada promove uma mais rápida dilatação cervical do que a peridural isolada,
abreviando o primeiro estágio do trabalho de parto (TSEN et al., 2000).
A analgesia é realizada empregando-se a associação de anestésico local em dose
baixa (como a bupivacaína na dose de 2,5mg) com sufentanil na dose de 5-10mcg ou
fentanil na dose de 20mcg no espaço subaracnóideo, seguida de administração contínua
ou intermitente desta associação através do cateter de peridural (CAMANN et al., 1992;
LO et al., 1999;).
10
Esta associação de anestésico e opióide promove analgesia de melhor qualidade,
quando comparada com a utilização apenas do anestésico local (PRATICE
GUIDELINES FOR OBSTETRICAL ANESTHESIA: A REPORTE BY THE
SOCIETY OF ANESTHESIOLOGISTS TASK FORCE ON OBSTETRICAL
ANESTHESIA, 1999).
GOMAR E FERNANDES (2000) reportaram sua experiência com o uso de
ropivacaína na dose de 3mg, associado ou não a sufentanil, encontrando analgesia de
boa qualidade, com segurança para mãe e o feto (LEIGHTON & HALPEN, 2002). É
importante destacar que gestantes que não podem fazer uso de anestésico local podem se
beneficiar do uso isolado de opíóide no espaço subaracnóideo (SERBACHER &
MALASSIRRÉ, 1999).
A grande preocupação com a administração intratecal de opióides diz respeito
aos efeitos para o concepto, pois já foram reportados casos de bradicardia fetal após a
administração desta droga (CATON, 2000). Entretanto, este efeito não foi observado
com 5mcg de sufentanil e, mesmo com doses maiores, como 10mcg, este efeito foi
transitório (COHEN et al., 1993).
A analgesia conseguida com esta técnica é de excelente qualidade, início rápido e
sem qualquer bloqueio motor, permitindo inclusive a deambulação da paciente
(BASTOS et al., 2001). Entretanto, apesar de segura, a técnica pode ser acompanhada de
alguns efeitos adversos, que apesar de facilmente contornáveis, podem incomodar a
paciente. Os mais freqüentes são prurido e hipotensão; os mais raros, porém, de maior
gravidade, são basicamente a difusão subaracnóidea das doses peridurais, depressão
respiratória materna, migração subaracnóidea do cateter e cefaléia pós-punção de dura-
máter (THALLON & SHENNAN, 2001).
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Bloqueios Regionais Alternativos
Compreendem o bloqueio paracervical e o bloqueio do nervo pudendo, associado
à anestesia infiltrativa do períneo.
O bloqueio paracervical é eficaz no primeiro estágio do trabalho de parto e
consiste na injeção de 5 a 10ml de solução anestésica na mucosa que circunda o colo
cervical nas posições de 3 e 9 horas (BASTOS et al., 2001). Se este bloqueio for
realizado corretamente, não causa distúrbio na contratilidade, porém a técnica foi
praticamente abandonada na analgesia de parto, devido à associação com elevadas
concentrações séricas do anestésico local no feto, além do aumento da incidência de
bradicardia fetal, em relação aos outros bloqueios (BASTOS et al., 2001; MATHIAS &
TORRES, 2000). Segundo vários estudos, a bradicardia fetal é o efeito colateral mais
importante do bloqueio paracervical e parece ter uma incidência em torno de 15%
(ROSEN, 2002).
O bloqueio do nervo pudendo só é efetivo no segundo estágio do trabalho de
parto, podendo ser utilizado para a aplicação de fórceps e vácuo-extrator (FINDLEY &
CHAMBERLAIN, 1999). A técnica transvaginal é simples e confortável para a paciente
e consiste na injeção de 10 a 20 ml de solução anestésica nas proximidades do nervo
pudendo, situado atrás da espinha isquiática (BASTOS et al., 2001).
1.3. 2. MÉTODOS NÃO FARMACOLÓGICOS
Sabe-se que aspectos psicológicos, culturais e a própria preparação para o parto
podem influenciar a percepção da dor por parte da gestante no momento do nascimento
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do concepto (HARRISON et al, 1986). Com isto, mais recentemente tem sido dada
ênfase às formas psicológicas e alternativas de analgesia, na tentativa de aliviar a dor da
paciente sem a utilização de drogas e métodos invasivos (SIMKIN & O’ HARA, 2002).
Medicina alternativa pode ser definida como “os sistemas médicos, profissões,
práticas, intervenções, modalidades, terapias, aplicações, teorias ou afirmações que não
constituem, na atualidade, parte do sistema médico dominante ou convencional”
(NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 1994). Não é incomum que, ao longo do
tempo, um tratamento alternativo seja reclassificado como uma prática da Medicina
convencional, à medida que evidências científicas passam a corroborar sua utilização.
De uma forma geral, as terapias alternativas são bastante populares, uma vez que
enfatizam a abordagem holística do indivíduo, privilegiando a interação entre corpo,
mente, espírito e o ambiente.
Segundo ASTIN (1998), as pacientes que escolhem terapias alternativas não
estão necessariamente insatisfeitas com a Medicina convencional. Estas terapias, porém,
podem ser bastante atraentes para os indivíduos que querem estar mais envolvidos com
seu próprio cuidado, preocupam-se com os efeitos colaterais dos tratamentos
convencionais ou sentem que técnicas alternativas são mais compatíveis com sua
filosofia individual (MCGREGOR & PEAY, 1996).
No caso específico da analgesia de parto, acresce-se que a procura por métodos
não farmacológicos também está baseada no fato de que, nas fases iniciais do trabalho
de parto, muitas mulheres poderiam ter sua dor aliviada por estes métodos, reservando as
técnicas mais invasivas para estágios avançados (CATON et al., 2002).
A grande vantagem seria a redução do tempo de exposição aos fármacos, com
conseqüente redução da possibilidade do aparecimento de efeitos indesejáveis como, por
13
exemplo, interferência no bom andamento do parto e sofrimento fetal (CATON et al.,
2002). Por outro lado, a necessidade de técnicas farmacológicas poderia ser reduzida,
porquanto algumas mulheres podem perfeitamente dispensá-las.
Algumas técnicas não farmacológicas têm sido utilizadas em analgesia de parto,
com resultados variados. Embora a eficácia de algumas opções não tenha ainda sido
comprovada, existem evidências confiáveis da segurança e efetividade de várias
técnicas, que podem ser utilizadas durante o trabalho de parto, aumentando o conforto da
parturiente e auxiliando outras técnicas de analgesia (SIMKIN & O’HARA, 2002).
Dentre estas técnicas, podem ser citados o relaxamento, as massagens,
acupuntura, a hipnose, as técnicas psicológicas e a estimulação elétrica transcutânea
(EET). Incluem-se ainda como terapias alternativas para dor a deambulação e mudanças
de posição durante o trabalho de parto, a presença do acompanhante e o apoio constante
ou intermitente, bem como a hidroterapia, todas consideradas em uma recente revisão
sistemática (SIMKIN & O’HARA, 2002).
As massagens e o relaxamento são normalmente realizados desde o pré-natal e
agem, deixando a parturiente mais tranqüila e preparada para as alterações durante o
parto. Apresentam efetividade variável e dependem muito das características
psicológicas da parturiente e do estágio do trabalho de parto (FINDLEY &
CHAMBERLAIN, 1999). Um ensaio clínico randomizado mais recente concluiu que
massagens durante o trabalho de parto proporcionavam significativo alívio emocional e
físico, tanto referido pela parturiente como pelo parceiro ou por um observador cego
(FIELD et al., 1997).
A acupuntura tem sido usada há muitos anos na China como terapia dos estados
álgicos, porém sua utilização para analgesia de parto é ainda bastante controversa. São
14
muitos raros os ensaios clínicos controlados e os resultados dos estudos são conflitantes
(BEAL, 1992). Em uma revisão recente, GENTZ (2001) recomenda que sejam
realizados novos estudos, com maior adequação metodológica.
O uso da hipnose não está ainda disseminado, pois apresenta eficácia variável e
riscos de efeitos colaterais, se não for realizado por médico experiente com a técnica.
Alguns autores sugerem que a hipnoanalgesia em obstetrícia está contra-indicada em
pacientes extremamente ansiosas e com história de psicose e reações histéricas
psiconeuróticas (WAHL, 1975)
A psicoprofilaxia é um método desenvolvido por Lamaze, que combina
condicionamento positivo da mãe e educação acerca do processo do nascimento
(SCOTT & ROSE, 1978). Este método baseia-se na crença de que a dor do parto pode
ser suprimida pela reorganização da atividade do córtex cerebral, a partir da criação de
um reflexo condicionado positivo (SCOTT & ROSE, 1978). A mulher é orientada para
manter um determinado padrão respiratório durante as contrações uterinas, o que lhe
exige uma grande concentração nesta atividade, distraindo-a da dor provocada pela
contração uterina (SCOTT & ROSE, 1978). Esta técnica age durante todo o parto e
parece ser importante tanto para adiar a necessidade de métodos farmacológicos, quanto
para preparar as pacientes para as técnicas regionais (MATHIAS & TORRES, 2000).
Dentre as técnicas não farmacológicas, a estimulação elétrica transcutânea
merece atenção especial, pois vem se tornando bastante popular como técnica isolada ou
associada para o controle da dor do parto, como discutiremos a seguir.
15
1.4. ESTIMULAÇÃO ELÉTRICA TRANSCUTÂNEA
A teoria do portão, proposta por MELZACK & WALL (1965), é de importância
histórica na explicação da fisiologia do efeito analgésico da EET, pois foi a primeira a
propor a existência de mecanismos supressores endógenos que bloqueariam a passagem
de estímulos dolorosos provenientes da periferia, atribuindo ao próprio organismo a
capacidade de modular a dor.
De acordo com esta teoria, a modulação da percepção dolorosa é atribuída ao
recrutamento de fibras aferentes Aβ de largo diâmetro no corno espinhal da coluna
dorsal, que impediria ou dificultaria a ativação de fibras finas, que conduzem a dor,
fechando o portão e não permitindo a ascensão do estímulo doloroso originado na
periferia para níveis superiores do sistema nervoso central (MELZACK & WALL, 1965;
WHITE & CHIU, 2001).
O mecanismo exato da analgesia promovida pela EET ainda não se encontra bem
esclarecido. Acredita-se, porém, que esta age exatamente ativando as fibras grossas,
impedindo a ativação das fibras responsáveis pela dor (fibras finas) e promovendo a
modulação da dor como acima exposto (RUSHTON, 2002; SJÖLUND et al., 1990).
Mecanismos alternativos têm sido propostos, entre os quais a ativação das vias
descendentes de inibição da dor, liberação de substâncias anti-álgicas endógenas,
inibição dos eferentes simpáticos, bloqueio tônico e condução antidrômica (SLEEKA et
al., 1999; VAN DER SPANK et al., 2000; WHITE & CHIU, 2001). Alguns autores
acreditam ainda que a EET promove alteração da habilidade do corpo de perceber ou
receber sinais dolorosos, sem efeito algum na contração uterina, o que explicaria a
segurança e eficácia desta técnica (CHIA et al., 1990).
16
Tem sido bem estabelecido, na história clínica da dor, que procedimentos como
massagens e vibração podem ser úteis na modulação do processo doloroso, sendo
classificados como moduladores secundários da dor (COATES, 1998). A EET é também
uma forma de modulação secundária da dor em que se utiliza a corrente elétrica para
produzir alívio da dor.
1.4.1. TÉCNICA
O equipamento necessário consiste em uma caixa com circuito elétrico e uma
fonte de energia, que na maioria das vezes é uma bateria convencional, associada a dois
ou mais eletrodos, que devem ser colocados sobre a pele, com um número
correspondente de cabos que se conectam ao eletrodo de estimulação. É um aparelho
simples, de fácil manuseio e extremamente barato. Emite correntes elétricas que
apresentam voltagem variando de 0-90 volts (0-60 mA), freqüência de 0-100 Hertz e
amplitude de pulso de 10 a 100 microssegundos (CHIA et al.,1990;COATES, 1998).
1.4.2. CLASSIFICAÇÃO
A EET pode ser classificada em (VAN DER SPANK et al., 2000):
1) Convencional – baixa intensidade (1-2mA) e alta freqüência (50-100Hz);
2) Acupuntura-símile – alta intensidade (15-20 mA) e baixa freqüência (1-5Hz).
Até bem pouco tempo atrás, a mais comum indicação para a EET vinha sendo o
alívio da dor pós-operatória. A EET convencional demonstrou ser efetiva no alívio da
dor pós-operatória de uma série de procedimentos cirúrgicos, reduzindo
significativamente a necessidade de narcóticos (HAMZA et al., 1999). Entretanto, com o
melhor entendimento da fisiologia da EET, seu aperfeiçoamento e comprovação de sua
17
inocuidade, a indicação desta técnica se estendeu para o tratamento das síndromes
dolorosas crônicas e também para analgesia de trabalho de parto (BERTOTI, 2000).
Para analgesia de parto, a EET tem sido utilizada na grande maioria das vezes na
forma convencional, consistindo na aplicação de corrente elétrica na freqüência de
90Hz, amplitude de pulso de 90 microssegundos e intensidade de corrente entre 1 e 4,
ajustada de acordo com cada paciente (VAN DER PLOEG et al., 1996).
Com os parâmetros ajustados de forma correta não haverá queixas de dor, e
mesmo que estes parâmetros não estejam bem ajustados, não serão verificados efeitos
adversos (COATES, 1998). Por tratar-se de um instrumento de fácil manuseio e isento
de efeitos deletérios, pode ser manuseado pelo próprio paciente.
Recentemente, alguns estudos randomizados têm sido realizados com EET na
analgesia de parto, com resultados conflitantes. Diversos estudos controlados
encontraram resultados positivos da EET para alívio da dor do parto e do delivramento
(GRIM & MOREY, 1985; KEENAN et al., 1985; VAN DER SPANK et al., 2000). Por
outro lado, uma revisão sistemática incluindo 10 ensaios clínicos e um total de 877
mulheres mostrou que, apesar de as parturientes terem referido melhora da dor após a
aplicação da EET, isto não interferiu na necessidade de intervenções analgésicas
adicionais (CARROL et al., 1997).
Uma dúvida que persiste, ainda hoje, sobre o efeito da EET no alívio da dor do
trabalho, é se a técnica seria capaz de diminuir a sensação dolorosa nas fases iniciais do
trabalho de parto, retardando a necessidade da utilização de métodos farmacológicos. O
benefício decorrente seria o menor tempo de exposição da mãe e feto aos fármacos
utilizado para alívio da dor, o que diminuiria a incidência de efeitos indesejáveis como
parada da progressão do parto e depressão fetal (LEE et al., 1990).
18
Apesar de existirem muitos estudos na literatura com EET para alívio da dor do
parto, relativamente poucos trabalhos foram conduzidos para verificar a influência da
EET na incidência de requerimento de outra forma de analgesia, como a anestesia
peridural ou a técnica combinada (VAN DER SPANK et al., 2000). Assim, seriam
necessários outros estudos para verificar se a utilização da EET nas fases iniciais do
trabalho de parto promove melhora do processo doloroso, no sentido de retardar a
necessidade de métodos farmacológicos, que seriam adiados para estágios mais
avançados.
Vale ainda ressaltar que a EET se trata de um procedimento não invasivo, seguro,
fácil de aplicar e remover, sem efeitos colaterais, e que não interfere na consciência da
gestante, mantendo-a participativa durante o parto, além de não interferir na mobilidade
materna e no bem estar materno-fetal, quando comparada a outras formas muito
utilizadas de analgesia convencional (VAN DER SPANK et al., 2000).
Em suma, considerando que a literatura é conflitante em relação aos resultados
obtidos pela EET para alívio da dor do trabalho de parto, e que esta representa uma
técnica comprovadamente segura, isenta de efeitos colaterais para o binômio materno
fetal, realizou-se o presente estudo com o objetivo de comparar os efeitos da aplicação
ou não da EET antes da instalação da técnica combinada para alívio da dor do trabalho
de parto.
19
II- OBJETIVOS
3.1. GERAL:
Comparar os efeitos da aplicação ou não de Estimulação Elétrica Transcutânea
(EET) antes da instalação da técnica combinada (raquianestesia + peridural) para
alívio da dor do trabalho de parto em parturientes atendidas na Maternidade do
Centro de Atenção à Mulher do Instituto Materno Infantil de Pernambuco.
3.2. ESPECÍFICOS:
Verificar os efeitos da aplicação ou não de EET antes da realização da técnica
combinada para analgesia de parto, com relação aos seguintes resultados:
1. Tempo transcorrido entre a avaliação da dor da paciente pela escala analógica visual
e o requerimento da realização da anestesia combinada para analgesia pela paciente.
2. Valores da Escala Analógica Visual (EAV) da dor antes e depois da instalação da
anestesia combinada.
3. Duração do trabalho de parto.
4. Freqüência de cesariana e parto instrumental.
5. Escores de Apgar e freqüência de hipóxia neonatal.
20
III. HIPÓTESES
1. A aplicação de EET nas fases iniciais do trabalho de parto retarda a necessidade de
utilização de anestesia regional.
2. A aplicação da EET diminui os valores da escala visual analógica da dor.
3. A aplicação de EET não interfere na duração do trabalho de parto.
4. Não há diferença na freqüência de cesariana e parto instrumental em pacientes
submetidas ou não à aplicação de EET.
5. Não há diferença nos escores de Apgar e na freqüência de hipóxia neonatal de
acordo com a aplicação ou não de EET.
.
21
IV. MÉTODOS
4.1. LOCAL DO ESTUDO
O estudo foi desenvolvido no setor de pré-parto do Centro de Atenção à Mulher
(CAM) do Instituto Materno-Infantil de Pernambuco (IMIP), instituição filantrópica, sem
fins lucrativos, voltada para a saúde da mulher e da criança.
Hospital-escola, oferece atividades de graduação (estágios curriculares para os
diversos cursos da área de saúde) e cursos de pós-graduação, tanto strictu sensu (Mestrado
em Saúde Materno-Infantil) como latu sensu. Tem programas de Residência Médica e de
Enfermagem em Tocoginecologia e Pediatria, e Residência Médica em Anestesiologia,
Cirurgia Pediátrica e Cirurgia Plástica. É conveniado ao SUS e às duas universidades locais
(Universidade de Pernambuco e Universidade Federal de Pernambuco).
Na Maternidade do CAM-IMIP são assistidos cerca de 5.000 partos/ano, dos quais
aproximadamente 70% ocorrem por via transpelviana. O setor de pré-parto localiza-se no
terceiro andar do IMIP e conta com 13 leitos. O centro obstétrico é assistido por um
anestesiologista e um residente de Anestesiologia em regime de plantão, que realizam cerca
de 360 procedimentos por mês, incluindo anestesia para cesarianas, curetagens e analgesia
de parto.
4.2. DESENHO E POPULAÇÃO DO ESTUDO
Realizou-se um ensaio clínico randomizado aberto, incluindo 22 (vinte e duas)
gestantes em trabalho de parto assistidas na Maternidade do IMIP, das quais 11 (onze)
receberam EET e 11 (onze) não receberam EET.
22
4.3.TAMANHO DA AMOSTRA
O cálculo do tamanho da amostra foi realizado pela própria pesquisadora, baseando-
se em dados de literatura pertinentes (TSEN, 2000). Considerou-se a média de tempo
decorrido entre a aplicação ou não da EETe a necessidade da realização da técnica
combinada para alívio da dor do trabalho de parto e seus respectivos desvios-padrão,
aceitando-se como significativa uma diferença de tempo de 40 (quarenta) minutos entre os
grupos e um nível de significância de 5%.
Utilizou-se a seguinte fórmula (FRIEDMAN et al, 1996): 2n = (Zα+Zβ)2 x (σ21+σ2
2) (μ1-μ2)2
Logo, para um nível de significância de 5%, Zα = 1,96, e para um poder de 80% Zβ
= 0,84, sendo s1(=33) e s2 (=28) os respectivos desvios padrão, encontramos um n estimado
de 10 pacientes em cada grupo, que foi ampliado para 11 (margem de 10%), prevendo-se
eventuais perdas por exclusão pós-randomização.
4.4. DURAÇÃO DO ESTUDO
A coleta de dados foi desenvolvida no período de agosto a outubro de 2002.
4.5. CRITÉRIOS PARA SELEÇÃO DAS PARTICIPANTES
4.5.1. Critérios de Inclusão
− Gestação única
− Idade gestacional a partir de 37 semanas
− Feto vivo com vitalidade satisfatória (na admissão)
23
− Apresentação cefálica de vértice
− Pacientes com diagnóstico de trabalho de parto
− Dilatação cervical entre 2-5 cm
− Consentimento livre e esclarecido para participação no estudo
4.5.2. Critérios de Exclusão
− Síndromes hemorrágicas da gravidez (placenta prévia, DPPNI)
− Pré-eclâmpsia grave/ Eclâmpsia
− Cesárea anterior
− Indicação imediata de cesariana (desproporção céfalo-pélvica, sofrimento fetal agudo,
oligo-hidrâmnio grave e feto macrossômico)
− Contra-indicações absolutas para a realização da anestesia combinada (coagulopatia,
hipovolemia)
− Gestante sem condições de decidir sobre a participação no estudo (inconsciente,
confusa, coma, retardo mental)
4.6. PROCEDIMENTOS PARA SELEÇÃO E RANDOMIZAÇÃO DAS
PARTICIPANTES
4.6.1. Seleção dos grupos
As pacientes foram recrutadas durante os plantões de Obstetrícia na Maternidade do
IMIP, freqüentados regularmente (um plantão por semana, alternando-se os dias da
semana) pela pesquisadora, durante o período do estudo.
24
Após avaliação de cada parturiente pelo médico-obstetra e depois de preenchidos os
critérios de inclusão e exclusão da pesquisa, a paciente era informada pelo pesquisador
principal sobre os procedimentos que seriam realizados e as possíveis conseqüências de sua
participação na pesquisa.
Somente após assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, o
pesquisador realizou a alocação da paciente em um dos dois grupos, após abertura de
envelope lacrado que continha o grupo selecionado para aquela participante. Esses
envelopes foram previamente preparados por uma pessoa alheia à pesquisa.
Portanto, o pesquisador não tinha conhecimento prévio do grupo selecionado para a
participante no momento da solicitação do consentimento, nem tampouco do grupo da
gestante seguinte, de forma a garantir a ocultação da alocação.
Durante o período estudado, foram assistidos no IMIP 1722 partos, dos quais 1100
por via transpelviana. A pesquisadora freqüentou 16 plantões (12 horas, cada), com uma
média de sete partos por plantão e um total de 84 partos. Vinte e duas pacientes deste total
atenderam aos critérios de inclusão e exclusão e todas concordaram em participar do
estudo.
4.6.2. Randomização das participantes
A randomização para aplicação ou não da EET foi realizada de acordo com uma
tabela de números randômicos previamente gerada em computador (EPITABLE do
software Epi-info 6.04b) e apresentada no ANEXO 1. Esta tabela foi preparada por um
estatístico e serviu de base para a confecção dos envelopes lacrados contendo a seqüência
da randomização.
25
4.7. CARACTERIZAÇÃO AMOSTRAL
Foram admitidas no estudo 22 gestantes, das quais 11 receberam e 11 não receberam
a EET, precedendo a anestesia combinada. Com o objetivo de testar o processo de
randomização e a comparabilidade entre os grupos, analisamos diversas características, de
acordo com o grupo (aplicação ou não de EET).
Não houve diferenças significativas entre os dois grupos quanto à idade, paridade,
idade gestacional e EAV à admissão (Tabela 4.1.). Todas as gestantes incluídas no estudo
receberam ocitocina para condução do trabalho de parto, uma vez instalada a analgesia
combinada, não existindo diferença entre os grupos.
TABELA 4.1.
Características gerais das gestantes em trabalho de parto de acordo com a aplicação
ou não de EET. IMIP - Recife, 2002.
CARACTERÍSTICAS CONTROLE EET p
Idade em anos (mediana)
23 21 0,13
Idade gestacional em semanas (mediana)
39,1 40 0,13
Paridade (mediana)
0 0 1
Percentual de primíparas 81,8% 81,8% 0,3 EAV inicial (mediana)
5 5 0,86
Fonte: Pesquisa IMIP
26
4.8. PROCEDIMENTOS PARA A AVALIAÇÃO DAS PARTICIPANTES, APLICAÇÃO
DA EET E REALIZAÇÃO DA ANESTESIA COMBINADA (RAQUIANESTESIA
E PERIDURAL CONTÍNUA):
4.8.1. Avaliação das participantes:
Após randomização e alocação e antes da aplicação da EET, a dor das participantes
era mensurada, utilizando-se a escala analógica visual da dor (EAV). Esta escala consiste
de uma régua com uma linha horizontal ou vertical de 10cm que une dois pontos, um
correspondendo a nenhuma dor e o outro ponto à pior dor que um indivíduo pode sentir.
A gestante era requerida a colocar a marca no ponto da linha que correspondia ao
nível da intensidade da dor que apresentava naquele momento (Figura 1). Na outra face da
régua, esta marca representava um índice numérico de gravidade da dor, que varia de 0 a 10
VAN DER SPANK, JT; CAMBIER, DC; DE PAEPE, HM; DANNELS, LA;
WITVROUW, EE; BEERENS, L. Pain relief in labour by transcutaneous electrical
nerve stimulation (TENS). Archives of Gynecology and Obstetrics, v.264, n.3, p.131-6,
2000.
WAHL, CW. Contraindications and limitations of hypnosis in obstetric analgesia.
American Journal of Obstetrics and Gynecology, v.84, p.1869-1872, 1962.
WHITE, PF; LI, S; CHIU, JW. Electroanalgesia: its role in acute and cronic pain
management. Anesthesia and Analgesia, v.92, n.2, p.505-13, 2001.
77
YANCEY, MK. Observations on labor epidural analgesia and operative delivery rates.
American Journal of Obstetrics and Gynecology, v.180, n.2, p.353-9, 1999.
ZHANG, J; YANCEY, MK; KLEBANOFF, MA; SCHAWRZ, J; SCHWEITZER, D.
Does epidural analgesia prolong labor and increase risk of cesarean delivery? A natural
experiment. American Journal of Obstetrics and Gynecology, v.185, n.1, p.128-34,
2001.
.
ANEXO I O USO DA ESTIMULAÇÃO TRANSCUTÂNEA PARA ALÍVIO DA DOR DURANTE O TRABALHO DE PARTO EM UMA MATERNIDADE ESCOLA : ENSAIO CLÍNICO RANDOMIZADO GRUPO_________________
FORMULÁRIO Nº
DATA / /
Característica da gestante
Nome :.............................................................................................
EAVinicial EAV 30min Hora de ínicio da técnica combinada : Tempo entre a a avaliação da dor da parturiente e a anestesia combinada:
Número de doses suplementares de anestésicos locais Hora do parto :
Tempo entre a avaliação da dor da parturiente e o parto: Tipo de Parto :.Transpelviano Cesariano Fórceps SIM NÃO Efeitos perinatais: Apgar do 1º min : Apgar do 5 ºmin :
TABELA DE NÚMERO RANDÔMICOS GRUPO EET 2, 4, 6, 10, 11, 12, 13, 15, 17, 18, 21. GRUPO CONTROLE 1, 3, 5, 7, 8, 9, 14, 16, 19, 20, 22.
CONSENTIMENTO PÓS-INFORMAÇÃO
(De acordo com os critérios da resolução 196/96 do Conselho Nacional de Pesquisa)
Eu, __________________________________________, paciente matriculada no IMIP
com o registro , declaro que fui devidamente informada pelo Dr.
________________________________ sobre as finalidades da pesquisa “O USO DA
ELETROESTIMULAÇÃO TRANSCUTÂNEA PARA ALÍVIO DA DOR DO
TRABALHO DE PARTO EM UMA MATERNIDADE ESCOLA: ENSAIO CLÍNICO
RANDOMIZADO” e que estou perfeitamente consciente de que:
1. Concordei em participar da pesquisa sem que recebesse nenhuma pressão dos
médicos que participam do projeto.
2. Continuarei sendo atendida no IMIP e dispondo de toda a atenção devida no pré-
parto, independente de minha participação na pesquisa.
3. Tanto EET quanto a anestesia combinada (raquianestesia combinada com peridural
contínua) é técnica segura que já vem sendo ultilizada para anlgesia em obstetrícia.
4. Em estudo anterior, não foram verificados efeitos colaterais ou complicações com
esta técnica para analgesia de trabalho de parto.
5. Participando do estudo, serei submetida a procedimento para aplicação da EET,
além de raquianestesia e alocação do cateter de peridural que permanecerá até o
nascimento do concepto, ultilizando-o inclusive para adiministração do anestésico
para estabelecimento de anestesia para cesariana se necessário.
6. A estimulação elétrica transcutânea é técnica simples, segura e isenta de efeitos
prejuduciais para mim e para meu filho.
7. Apesar de não existirem relatos de complicações com as doses de anestésicos que
serão ultilizadas, poderá ocorrer acidente de punção com a técnica de peridural, com
ANEXO II
provável aparecimento de cefaléia pós-punção de duramater. Entretanto ficou
garantido pela equipe, total apoio clínico e tratamento desta complicação.
8. Poderei abandonar a qualquer momento a pesquisa caso não me sinta satisfeita, sem
que isso venha a prejudicar meu atendimento no IMIP.