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INGRID GOMES AS TRÊS IMAGENS DE LULA - OS POSICIONAMENTOS DAS REVISTAS CARTACAPITAL, PRIMEIRA LEITURA E VEJA NAS ELEIÇÕES PARA PRESIDENTE EM 2002. UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2007
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Jul 22, 2020

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INGRID GOMES

AS TRÊS IMAGENS DE LULA - OS POSICIONAMENTOS DAS REVISTAS

CARTACAPITAL, PRIMEIRA LEITURA E VEJA NAS ELEIÇÕES PARA

PRESIDENTE EM 2002.

UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL

SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2007

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INGRID GOMES

AS TRÊS IMAGENS DE LULA - OS POSICIONAMENTOS DAS REVISTAS

CARTACAPITAL, PRIMEIRA LEITURA E VEJA NAS ELEIÇÕES PARA

PRESIDENTE EM 2002.

Dissertação apresentada em cumprimento parcial às exigências

do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da

UMESP – Universidade Metodista de São Paulo, para a

obtenção do grau de Mestre.

Orientador: Prof. Dr. Adolpho C. F. Queiroz

UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL

SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2007

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FOLHA DE APROVAÇÃO

A dissertação As três imagens de Lula - Os posicionamentos das revistas CartaCapital, Primeira Leitura e Veja nas eleições para presidente em 2002, elaborada por Ingrid Gomes, foi defendida no dia 26 de março de 2007, tendo sido: ( ) Reprovada ( ) Aprovada, mas deve incorporar nos exemplares definitivos modificações sugeridas pela banca examinadora, até 60 (sessenta) dias a contar da data da defesa. ( X ) Aprovada ( ) Aprovada com louvor Banca Examinadora: Profº. Drº Adolpho Queiroz Profª. Drª Maria Ignês Carlos Magno Profª. Drª Sandrão Reimão Área de concentração: Processos Comunicacionais Linha de pesquisa: Comunicação Massiva Projeto temático: Propaganda Política

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais, Carlos e Maria, que fazem

parte da conquista dos meus anseios

acadêmicos e profissionais.

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AGRADECIMENTOS

Ao meu maravilhoso Deus, pelos sentidos e habilidades perfeitos e pela alegria

de descobrir a cada dia a beleza de experimentar a vida.

Ao meu querido orientador e amigo Profº Dr. Adolpho Carlos Françoso Queiroz,

pelas inúmeras contribuições de ensino que me prestou durante os sete anos que nos

conhecemos, pela compreensão e ajuda nos momentos de dificuldades, pelo espelho de

mestre que é, pelo valor humano com que trabalha com seus orientandos, pelo respeito

com que me propôs a entrada na vida acadêmica e pela amizade que me concede.

Obrigada pela honra de ser sua orientanda.

Agradeço imensamente aos meus pais pela paciência, pelo apoio financeiro e

moral, pelo amor insubstituível que me concedem, pelas preocupações, pelos valores

éticos transmitidos e pela admiração as minhas conquistas. Sem vocês esta dissertação

não seria concluída. Agradeço ao meu irmão querido pela ajuda confortante e pelos

estímulos concedidos. A minha família, em especial as minhas tias Zeza e Idalina, pela

torcida e dedicação.

Aos amigos de sempre: Rodrigo, Bruna, Samuel, Kátia, Mirela e Mariela pelo

ânimo e apreciação aos meus estudos. Aos companheiros Victor e Milton pela ajuda,

atenção e experiência transmitida. A minha amiga Val pelas muitas horas de idas e

vindas a Piracicaba e pelo carinho incondicional prestado para concluir este trabalho.

Aos meus colegas de Mestrado: Roseane pelo apoio e companheirismo no

apartamento, Bruna pela enorme ajuda como amiga e parceria em artigos científicos e

viagens apertadas a Congressos, Moisés pela amizade e parceria em artigo científico,

Thaís e Flávio, pela sinceridade e pela gama de conhecimento associado, extra-

acadêmico. E pela ajuda da amiga Patrícia Paixão pelo trabalho memorável.

Aos meus professores de Mestrado, em especial a Profª Dra. Cicilia M. Krohling

Peruzzo e o Profº José Salvador Faro, pelo aprendizado recebido e pelo apoio e carinho

dedicados.

Aos professores e amigos da pós-graduação na Fundação Escola de Sociologia e

Política de São Paulo, em especial a Profª Dra. Maria Ignês e ao Profº Ms. Aldo, pela

evolução nas reflexões extra-comunicação e as amigas maravilhosas Marina, Melissa e

Ritas, pelo incentivo nos cafés e almoços de sábado.

Ao apoio da CAPES pela bolsa de pesquisa nos dois anos de estudo.

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SUMÁRIO

Introdução ...................................................................................................................... 9

Capítulo I – COMUNICAÇÃO, HISTÓRIA E POLÍTICA

1.1 Comunicação e seus desdobramentos históricos ............................................... 15

1.2 A luta da imprensa pela independência ............................................................. 21

1.2.1 Mudança da visibilidade política pela mídia ..................................................... 22

1.3 A ideologia presente no cenário midiático ........................................................ 24

1.3.1 Produção da mídia – formação dos filtros no jornalismo/parcialidade ............. 29

1.4 A reafirmação do jornalismo como atividade política ........................................37

Capítulo II – LULA: DAS ORIGENS DO SERTÃO À ELEIÇÃO VENCIDA DE

2002 ............................................................................................................................... 41

2.1 Resgate histórico da política nas eleições de 2002 .................................................. 61

Capítulo III – A MARCA TUCANA (GOVERNISTA) NAS PÁGINAS DA

PRIMEIRA LEITURA

3.1 Histórico da revista Primeira Leitura .................................................................... 73

3.2 A imagem de Lula pelas entrelinhas da Primeira Leitura: análise qualitativa .......77

3.3 A construção do fantoche Lula: análise quantitativa da revista Primeira Leitura 90

Capítulo IV – CARTACAPITAL VOTA LULA EM PROL DE INTERESSES

NACIONALISTAS

4.1 Histórico da revista CartaCapital ........................................................................ 100

4.2 Somos Lula: análise qualitativa da revista CartaCapital.......................................103

4.3 Lula como preparado e capaz de administrar o país: análise quantitativa da revista

CartaCapital ................................................................................................................123

Capítulo V – O VERMELHO-VIVO DE LULA NO FOCO DA VEJA

5.1 Histórico da revista Veja ...................................................................................... 135

5.2 Velhos preconceitos e novos medos: análise qualitativa da revista Veja ..............140

5.3 Afirmamos o voto contra Lula: análise quantitativa da revista Veja .....................168

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Conclusões .................................................................................................................. 179

Referências Bibliográficas ........................................................................................ 189

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Resumo

As três imagens de Lula - Os posicionamentos das revistas CartaCapital, Primeira Leitura e Veja nas eleições para presidente em 2002.

O tema proposto por este projeto de mestrado é selecionado pela sua relevância social: uma reflexão sobre o papel da imprensa na democracia através de análises de revistas no período que antecedeu as últimas eleições para presidente em 2002. Os objetos de análise são periódicos que atingem segmentos importantes da sociedade brasileira: as revistas CartaCapital (de setembro a novembro), Primeira Leitura (de agosto a novembro) e Veja (de setembro a novembro). O assunto definido para a análise é a construção da imagem apresentada do candidato Luís Inácio Lula da Silva, ou seja, de que maneira essas revistas trataram – em suas linhas editoriais – da figura do presidenciável em questão.

Palavras-chave: Imagem de Lula, CartaCapital, Primeira Leitura, Veja e parcialidade.

Abstract

The three images of LULA The positions of the magazines Carta Capital, Primeira Leitura and Veja in the elections for the

president in 2002.

The proposal theme for this project of master is selected for its social relevance. A reflection about the role of the printing in the democracy through the analysis of magazines in the period that preceded the last elections for president in 2002. The objects of the analysis are periodics that affect important segments of brazilian society; the magazines CartaCapital (from September up to November), Primeira Leitura (from August up to November) and Veja (from September up to November). The politics subject is determined in the construction of the image presented of the candidate Luis Inácio Lula da Silva, which way these magazines treated – in its editorial lines – about the candidate.

Key words: Of the image Lula, CartaCapital, Primeira Leitura, Veja and biased.

Resumen

Las tres imagines de Lula Los posicionamientos de las revistas CartaCapital, Primeira Leitura y Veja en las elecciones

para presidente en 2002. El tema propuesto en este proyecto de maestría es seleccionado por su relevancia social: una reflexión sobre el papel de imprenta en la democracia a través del análisis de las revistas en el periodo en que antecedió en las ultimas elecciones para presidente en 2002. Los objetos de análisis son periódicos que influencian segmentos importantes de la populación brasileña: las revistas CartaCapital (de septiembre hasta noviembre), Primeira Leitura (de agosto hasta noviembre) y Veja (de septiembre hasta noviembre). La temática política es determinada en la construcción de la imagen presentada del candidato Luís Inácio Lula da Silva, de que manera estas revistas trataran – en sus líneas editoriales – a respecto del presidenciable. Palabras-clave: De la imagen, CartaCapital, Primeira Leitura, Veja y parcialidad.

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INTRODUÇÃO

“Não há fatos eternos,

como não há verdades absolutas.”

Friedrich Nietzsche

A construção da imagem de um personagem público na vida real, explorando seus

elementos físicos, morais, sociais, entre outros itens, constitui um importante processo

do pensamento idealizado pelos jornalistas, editores e pelo meio que representam.

Nessa linha de compreensão, os veículos de comunicação têm sido, mais

especificamente no século XXI, órgãos essenciais de influências que desenvolvem os

mais variados posicionamentos segundo interesses de ordem social, coletiva,

empresarial, mercadológica, política e outros.

Para tanto, a emergência de veículos especializados em atender estratos de

diferentes classes sociais está em acordo com os novos nichos heterogêneos formados

na conjuntura brasileira. Nesse sentido, as revistas semanais e mensais apresentam

linhas editoriais complacentes ao pensamento de seu público leitor, e a sinergia entre

ambos é o sucesso e permanência das assinaturas e periódicos nas bancas.

Esta pesquisa procura analisar o posicionamento político das três revistas

selecionadas (CartaCapital, Primeira Leitura e Veja), a formação da imagem do

presidenciável Luís Inácio Lula da Silva e quais foram os critérios de qualificação

utilizados nessa construção.

A amostra selecionada contempla os fatos que antecederam as eleições

presidenciais de 2002 a partir do conteúdo publicado pelos periódicos CartaCapital,

Primeira Leitura e Veja.

Entretanto, os fatos mencionados serão analisados nas possíveis construções da

imagem do presidenciável Luís Inácio Lula da Silva, seja nas seções direcionadas à

política ou em outras seções de assuntos diversos. Logo, se as revistas analisadas

abordarem seu posicionamento em relação a esse recorte da imagem de Lula será

indiferente a disposição de editorias e gêneros jornalísticos que as utilizarem, pois a

análise contemplará todas as menções do recorte do objeto.

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A metodologia necessária para averiguar em profundidade e neutralidade do

pesquisador sobre o recorte considerado da pesquisa é a análise de conteúdo1. Nesse

sentido é válido destacar que esse é um importante método para análise de periódicos

semanais e mensais, em razão do seu teor de classificação através da categorização e da

comparação dos resultados, em se tratando de mais de uma revista para a composição da

amostragem da pesquisa. Assim, os dados coletados são colocados na mesma “balança”

para comparação e validação dos resultados após a análise qualitativa.

Contudo, a grande questão que o projeto de pesquisa aborda é se, através do

posicionamento ideológico das revistas, por suas linhas editoriais, identificam-se

elementos contributivos a uma imagem positiva do candidato Lula perante os leitores

ou, pelo contrário, se tais posicionamentos levaram à construção de um candidato

menor, de certa maneira enfraquecendo-o junto à opinião pública.

A partir dessa análise, vislumbraram-se quais os elementos que compunham a

pauta política de relevância para as revistas em época eleitoral.

E por estar diante de objetos de estudo que demandam análises exploratórias,

identificando seu conteúdo a partir de metodologias qualitativa e quantitativa, as

descobertas de como foi construída a imagem do presidenciável Lula acontecerão após

as análises. No entanto, a hipótese previamente considerada é que as três revistas

(CartaCapital, Primeira Leitura e Veja) tiveram um posicionamento opinativo, parcial,

diante da construção da imagem do candidato.

Antes de começar literalmente as análises das revistas, será descrito um breve

histórico das mesmas, bem como a apresentação do perfil do público leitor.

Num segundo momento, será explorado o método qualitativo. Como afirma

RICHARDSON (1989, p.39), o método qualitativo analisa a interação de certas

variáveis com a função de “compreender e classificar processos dinâmicos vividos por

grupos sociais, contribuir no processo de mudança de determinado grupo e possibilitar

em maior nível de profundidade, o entendimento das particularidades do

comportamento dos indivíduos”.

1 Foi em razão de diagnosticar os problemas que iam sendo acentuados e, mesmo levantados, durante a Segunda Guerra Mundial, que a análise de conteúdo foi apropriada para a investigação de ordem política, com a intenção de desvendar propagandas subversivas, principalmente nazi e comunistas, já que quem as patrocinavam e incentivavam eram os Estados Unidos (BARDIN, 1977, p.16).

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Nesse sentido, o método qualitativo poderá dar maior visibilidade para as questões

essenciais que os textos e materiais editados pelas revistas apontam, contextualizando

suas posições numa conjuntura mais abrangente.

O número de edições selecionadas para análise e posterior comparação é

pertinente para identificar o padrão desenvolvido pela linha editorial dos periódicos.

Exemplares selecionados: CartaCapital - setembro, outubro e novembro (período até o

segundo turno) de 2002. Primeira Leitura – julho, agosto, setembro, outubro e o

suplemento de outubro (referente aos antecedentes do segundo turno das eleições) de

2002. A análise dessa revista começará pelo mês de julho em decorrência de ela ser

mensal e ter menos exemplares que as revistas semanais selecionadas para estudo. Veja

– setembro, outubro e novembro (período até o segundo turno) de 2002.

As revistas semanais trarão 08 edições2 cada e a mensal Primeira Leitura, 04

edições. Entretanto, o material que esta desenvolve é igual em números de reportagens,

artigos e resenhas sobre o foco de análise.

Na complementaridade do método qualitativo, o método quantitativo ajudará na

descrição, na descoberta e classificação da relação entre variáveis (investigando as

possíveis relações de causalidade entre fenômenos). Nesse sentido, Richardson (1989)

coloca que o estudo descritivo representa também a identificação das características dos

fenômenos, possibilitando a ordenação e a classificação destes.

No processo desse tipo de análise, o primeiro passo consiste em identificar as

variáveis específicas que pareçam ser importantes para explicar complexas

características de um problema ou comportamento. Portanto, é importante demarcar as

categorias de análises para que, após o levantamento delas em dados representativos, a

inferência de significações e posteriores comparações entre os objetos de pesquisa, no

caso, as revistas, possam se desmembrar com maior facilidade e maior garantia de

validação.

Seguem abaixo as categorias da análise de conteúdo:

1 - Perfil delineado do presidenciável Lula pela revista;

1.1 Qualidades e deturpações ressaltadas do candidato:

(sim, não e sem posicionamento)

• Popular

2 Entretanto a Revis ta CartaCapital nas duas primeiras edições de setembro, 04 e 11, não trouxeram textos ligados a figura do candidato Lula, portanto acabaram não entrando na análise.

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• Controlado pelo marketing político

• Experiência profissional

• Ruim a formação escolar em curso técnico

• Capaz de administrar o governo

• Honesto

2 - Fontes selecionadas para entrevistas ou opiniões;

2.1 Especialistas nas áreas (quem e respectiva representação):

• Economista

• Cientista político

• Político partidário

• Psicólogo

• Filósofo

• Pesquisa (Bibliográfica e de Instituições de Pesquisa)

• Meios de Comunicação (assessorias e órgão de imprensa)

• Empresário

3 – Partidos políticos utilizados como fonte para o material informativo;

• PDT

• PSDB

• PFL

• PPS

• PMDB

• PL

• PT

• PPB

• PSB

• PTB

A seleção das categorias acima ordenadas está intrinsecamente ligada à

relevância de sua freqüência. Segundo suas aparições, o sentido que o material coletado

aborda tomará um rumo significativo para o andamento da pesquisa.

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Relevância Social

As revistas semanais e mensais emergem como importantes instrumentos

ideológicos de concepções de mundo e de formulação de juízos de valores das minorias

que detêm maior renda no Brasil. Nesse panorama da mídia atual, com a influência que

essas revistas selecionadas refletem na sociedade e mesmo na maioria da população

(mesmo que de formas indiretas), surge uma discussão relevante e de interesse público:

a disciplina de ser claro aos seus leitores e o estilo de delineamento que as revistas

utilizam para provocar a sua exploração ideológica.

Logo, compreender o discurso e realizar uma análise minuciosa acerca das

exposições das revistas selecionadas sobre a candidatura de Lula é tentar colocar em

pauta as ideologias formadoras de opinião que esses meios exercem sobre seus leitores.

A relevância tem o reforço quando se pensa nas conseqüências desse processo

persuasivo, que é justamente o resultado das eleições para a presidência do Brasil.

Verificar se as revistas seguem o padrão de desenvolvimento de reportagens que o

segmento do jornalismo propõe como pano de fundo para esse gênero jornalístico é

estar dando abertura à possibilidade de averiguar o estilo de jornalismo que essas

revistas aplicam. E, a partir disso, clarear suas desenvolturas como papéis de mídias

impressas.

Sendo assim, no primeiro capítulo faz-se necessário explorar os principais

conceitos da comunicação utilizados para comprovar sua interface com outros

elementos sociais. Por meio de uma breve explicação histórica sobre a origem da

imprensa e sua utilidade como instrumento de comunicação, surgiam os primeiros

poderes de influência: a Igreja e os representantes políticos – na figura do Estado – que

a partir da imprensa (com o livro e depois com panfletos e jornais) utilizaram-na como

recurso para incutir os valores e comportamentos sociais que desejavam da sociedade.

No decorrer do capítulo, será encontrado um diálogo sobre a produção midiática

no cenário moderno e como neste novo momento histórico os poderes determinantes na

linha editorial dos meios preexistem à instituição empresarial que os veículos de

comunicação representam, ressaltando a comunicação como elo permanente entre

elementos socioculturais da sociedade, valores dominantes e instituição jornalística.

No segundo capítulo, resgatou-se a conjuntura política das eleições de 2002,

relatando-se os principais fatos e acontecimentos que nortearam a cena política nesse

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ano. E para reconstruir o perfil real e histórico do cerne do objeto de estudo, Luiz Inácio

Lula da Silva, foi necessário contextualizá- lo no capítulo, por meio de referências

importantes da história brasileira, como Denise Paraná e Paulo Markun.

Nas comprovações nos posteriores três capítulos, sobre as análises das revistas,

encontraram-se que estas aplicaram uma linha editorial particularista, sendo ou não

claras ao leitor sobre sua postura. A Primeira Leitura, Capítulo III, tendeu a

desenvolver idéias de prospecção sobre a candidatura Lula, sendo opinativa e usando de

vozes de economistas e articulistas do próprio periódico. Já a revista CartaCapital,

Capítulo IV, se manteve claramente pró candidatura Lula, em contraposição à revista

Veja, Capítulo V, que se posicionou contra essa candidatura, desnorteando o uso correto

das técnicas jornalísticas informativas.

Em decorrência desses direcionamentos, constatou-se nas conclusões que os

apoios (CartaCapital) ou resistências (Primeira Leitura e Veja) colaboraram na

formação positiva ou negativa da imagem do candidato Lula nas eleições de 2002.

As revistas selecionadas remetem a públicos particulares da sociedade brasileira,

como as elites que mantém suas rendas familiares superiores ao piso comum da maior

parte das classes sociais. Esse mesmo público, de renda superior à maioria, exerce

referências diretas ou indiretas para formar opiniões e representam forte peso ideológico

quando o assunto é eleição e direcionamento de voto.

Contudo, o trabalho de pesquisa se propôs a estudar pelo método citado uma

comparação da construção da imagem do candidato Lula em 2002. Portanto, o

desenrolar da história política após a eleição e posterior vitória de Lula no segundo

turno não faz parte do tempo histórico do recorte deste trabalho.

Assim, os objetivos exemplificados no começo da introdução foram alcançados

com base na descrição estatística das categorias para a formulação conclusiva de cada

análise de revista, bem como no plano de comparação entre os três periódicos.

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CAPÍTULO I

COMUNICAÇÃO, HISTÓRIA E POLÍTICA

1.1 COMUNICAÇÃO E SEUS DESDOBRAMENTOS HISTÓRICOS

“(...) a arte da impressão disseminará tanto conhecimento

que as pessoas comuns, sabedoras de seus direitos e liberdades,

não serão governadas de forma opressora”.

Samuel Hartlib

O ato de se comunicar é uma constatação primária do ser humano como ser

comunicativo e pensante. A comunicação começou a ser utilizada, na Grécia Antiga,

como instrumento emancipador de informações, relevantes à hegemonia política, do

grupo que detinha alguns elementos para essa manipulação do saber. Esse grupo

praticava a política recorrendo ao poder da argumentação3, que foi conceituada pelos

sofistas, dentre eles Górgias de Leontini, como retórica4.

Logo, o processo comunicativo desdobra-se como meio instrumental no começo

da fomentação política5, na Grécia Clássica, mais precisamente em Atenas, no século 5

a.C. Naquela época, a política cultural era essencialmente oral e visual. Para expor

temas relevantes, usavam a praça; ou um outro lugar público que fosse mais comum às

comunidades locais, isso já nos séculos XIII, XIV e XV.

No decorrer dos tempos, com a complexidade da estrutura organizacional da

vida cotidiana, foi inventada em 14506, por Johann Gutenberg de Mainz, a prensa

gráfica, que tensionou o período em questão com o debate acerca de sua utilidade. Antes

de ser utilizada como órgão publicitário, no sentido abrangente que o termo abriga, pela

Igreja Católica, os livros impressos, na maioria, no final do século XV e começo do

3 A vantagem de se argumentar bem e coerente com a idéia que se quer apoiar, ou até mesmo, na época, sobrepor, era conquistada pelo conhecimento em leituras clássicas e indispensáveis para a fluência em suas opiniões. A questão da boa oratória é relevante, mas não principal. 4 A retórica surge como procedimento de convencimento através de mecanismos discursivos (bem elaborados e articulados). 5 O conceito de política deriva do adjetivo politikós, que foi originado de polis e se consolida na Política, de Aristóteles. (RUBIM, 2000, p.18). 6 Segundo outros levantamentos históricos, foi na China que se originou a impressão, aproximadamente no século VIII, a qual imprimia em bloco. Usava-se madeira entalhada para imprimir uma página de texto específico.

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XVI, eram de pouca diversidade, falavam da vida dos santos (biblioteca azul) e de

romances de cavalaria: “Levando alguns historiadores à conclusão de que a literatura

era escapista, ou mesmo uma forma de anestesia, além de representar um modo de

difundir entre as camadas mais baixas de artesãos e camponeses os modelos culturais

criados por e para o clero e a nobreza”, afirma Peter Burke e Asa Briggs em Uma

História Social da Mídia (2004, p.31).

Com isso, a afirmação de Armand e Michéle Mattelart (2000, p.17) de que o

centro pode propagar sua influência por meio da imprensa à periferia, irradiando seus

valores, idéias tradicionais de manutenção do status quo e, principalmente,

naturalizando a idéia de progresso como evolução bem sucedida, definindo-se como

gerenciadora do novo meio de concentração de poder e saber faz todo sentido.

É nesse cenário inquietante da Revolução da Prensa Gráfica que o poder

político, na representação do Clero – a maior parte membros do alto escalão da

hierarquia da Igreja Católica – e da nobreza se destacavam como agentes opinativos dos

comportamentos e ideais de pensamento, que a sociedade no geral deveria saber e

compreender como únicos, e colocá- los em prática diariamente. Logo, a imprensa, no

formato de livros- literários servia como extensão das oratórias difundidas nos púlpitos

da Igreja. Entretanto, foi nesse mesmo momento histórico que a organização do

comércio crescia por meio das viagens marítimas (transatlânticas). Com isso, as notícias

de como era a vida em territórios distantes, as várias formas de culturas de outros

lugares, as histórias contadas pelos viajantes, juntaram-se com a invenção da imprensa e

o resultado foi a constatação de panfletos desenvolvidos pelas pessoas interessadas em

novas óticas de ver e analisar a vida, com patrocínio do comércio emergente.

A resposta da Igreja7 veio em seguida, intitulando muitos livros e panfletos de

errôneos e mentirosos, realizando a censura dos mesmos através de uma lista que foi

denominada de Índex (os livros proibidos).

Mas, com o surgimento das teses de contraposição8 aos ensinamentos que a

Igreja Católica pregava no século XIV, Lutero, um ex-monge, firmou uma postura

alternativa à Igreja Católica, fundando a Igreja Protestante, fator histórico que mudou

significativamente o rumo da história das publicações. Primeiro porque Lutero escrevia

7 A Igreja Católica começou a sentir que a imprensa poderia acabar com seu poder sobre o povo, ou que pelo menos era algum risco a sua hegemonia e o papado criou o Índex com o fim de resolver a proliferação dos livros e panfletos que os ameaçassem. 8 Uma das descobertas de Lutero era que, para se conseguir o amor de Deus, os devotos não precisavam castigar-se ao pedir perdão. Era necessário apenas ter fé em Deus e conciliar-se com ele.

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a língua das pessoas comuns, na maior parte delas camponeses. Com isso, ele unificou a

língua da região (alemã) que se difundia com uma certa facilidade9. No começo, as

poucas pessoas que eram letradas liam coletivamente os escritos de Lutero. Depois, o

alemão foi assimilado num processo gradua l de aprendizagem e as pessoas começaram

a conhecer o mundo de maneira diferente das pregações do discurso cristão da época

aproximada de 1517.

As conseqüências do aumento do letramento e sua penetração na vida diária foram muitas e variadas. Cresceu o número de pessoas em ocupações ligadas à escrita: empregados de escritório, contadores, escrivãos, notários, escritores públicos e carteiros. Alguns desses cargos possuíam status social relativamente alto. (BRIGGS e BURKE, 2004, p.43).

Paralelo ao evangelho segundo Jesus Cristo, do qual Lutero reescreveu boa

parte, havia outros ensinamentos da nova Igreja Protestante.

As imagens impressas cresciam juntamente com os textos, livros – obras

religiosas, romances – e demais informativos. As notícias já eram vistas como

mercadorias no século XV e os editores de livros e produtores de panfletos comerciais

ou mesmo literários se envolviam cada vez mais em outras formas de publicidade. Com

isso, a inscrição da prática da leitura na vida cotidiana ficava mais comum.

Entretanto, a importância que a sociedade dava à instrução moral se revelava

intensa pelo número de sermões que apareceram impressos e também “(...) pelos

tratados sobre virtudes necessárias aos principais comportamentos na sociedade (nobre,

esposa, comerciante, etc)” (BRIGGS e BURKE, 2004, p.74). Foi só muito lentamente

que o livro – como entretenimento – foi orientado para a diversão e admitido como de

uso legítimo para o leitor.

Certamente a Imprensa facilitou a acumulação do conhecimento, por difundir as

descobertas mais amplamente e por fazer com que fosse mais difícil perder a

informação e deixar de compreender algo novo ou sistematizar temáticas latentes.

Porém, para martírio do poder da Igreja Católica, a Revolução da Prensa desestabilizou

o conhecimento, ou o que era entendido como tal, ao tornar os leitores mais conscientes

da existência de histórias e interpretações conflitantes.

Concomitantemente com esse processo de emancipação de livros, panfletos,

cartazes e jornais, a monarquia vigente utilizava o jornal oficial para retransmitir as

9 Com o apoio das Universidades que emergiam na época, dando poder de leitura aos povos através de debates formais e palestras, entre outros meios de aprendizagem.

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informações que lhes eram pertinentes. Entretanto, foi a imprensa periódica de jornais

não oficiais que transformaram a esfera pública temporária inicial em uma instituição

permanente, tornando a política parte da vida diária de considerável proporção da

população, especialmente em Londres, segundo Briggs e Burke (2000, p.102).

Na França, em 1789, na época da Revolução Francesa, os jornais davam

embasamento histórico para os governantes resgatarem as matérias anteriores para

afirmar que, com a prática revolucionária, o ambiente cotidiano iria ser outro. Ou seja,

os jornais eram utilizados como documento comprobatório.

Nessa dinâmica RUBIM (2000, p.19) aponta que,

(...) tanto os jornais que proliferaram em torno da Revolução Francesa e de suas lideranças, quanto os pasquins políticos do século 19 no Brasil, por exemplo, atuavam como meros amplificadores das opiniões e idéias políticas e não como meios submetidos a alguma lógica oriunda da comunicação, a não ser aquela elementar que garantia a comunicabilidade. A rigor, tais publicações caracterizam-se, antes de tudo, como extensões da (dinâmica) política e somente nessa operação (instrumentalizada) podem ser analiticamente elucidadas.

Logo, a imprensa era utilizada para fins de interesses particulares, ou melhor, na

maioria das vezes como órgão multiplicador de opiniões de grupos sociais em certa

hierarquia social de destaque, pois detinham os meios de produção e os discursos

sociais estabelecidos.

Nesse sentido, é interessante repensar de que maneira a imprensa já se

apropriava de valores latentes para reafirmá- los socialmente e mantê- los como única

via, imperando intelectual e moralmente na vida das sociedades, o que supõe sempre e

simultaneamente “argumentos, emoções, sentimentos, preconceitos, interesses, etc.,

todos eles indissociáveis e inerentes ao relacionamento social e humano. A hegemonia

intelectual e moral opera neste nível de pregnância e complexidade, emaranhando

consciente e inconsciente”. (RUBIM, 2000, p.23).

A impressão gráfica colaborava, em contrapartida a essa apropriação pública de

valores, com o surgimento da leitura crítica em decorrência do aumento das

oportunidades de se comparar opiniões diversas em livros, panfletos e jornais diferentes

sobre o mesmo assunto. Os primeiros jornais da Europa do século XVIII enfrentavam

os governos locais e encorajaram o público leitor a refletir sobre a política estabelecida.

O amadurecimento da imprensa gráfica ocorreu com o desenvolvimento e

engrandecimento do comércio mundial, que começara a acrescentar a propaganda nos

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jornais como forma de mantê-los em circulação. “Em Londres, por volta de 1650, um

jornal teria em média seis anúncios; cem anos depois, 50”. (BRIGGS e BURKE, 2004,

p.64).

Os jornais eram publicações vantajosas para os produtores, bem como uma

mercadoria bem aceita pela sociedade européia. No início do século XVII, a cidade de

Amsterdã era o maior centro de jornais e maior pólo industrial e financeiro europeu.

BRIGGS e BURKE (2004, p.67) comentam que entre os jornais – que saíam

uma, duas ou três vezes por semana em latim, francês, inglês e também em holandês –

estavam os primeiros impressos em inglês e francês, The Corrant out of Italy, Germany

e o Courant d’Italie, que começaram a ser publicados em 1620. “A partir de 1662, um

jornal semanal em francês, a Gazette d’Amsterdam, oferecia não somente informação

sobre negócios europeus, mas também críticas sobre a Igreja Católica e às políticas do

governo francês”. (BRIGGS e BURKE, 2004, p.67).

Uma questão que ainda não foi ressaltada sobre as conseqüências da invenção da

prensa gráfica foi envolver empreendedores mais intimamente no processo de difundir

conhecimento. “O uso do novo meio estimulou cada vez mais a consciência da

importância da publicidade, tanto econômica (‘anúncios’) quanto política (que

chamamos de ‘propaganda’, termo que começou a ser usado no fim do século XVIII)”.

(BRIGGS e BURKE, 2004, p.77).

Esse novo meio de informação foi bem utilizado para engrandecer a imagem de

Luís XIV durante seu reinado; centenas de retratos gravados do monarca foram postos

em circulação.

O jornal também incluía relatos, em geral elogiosos, das ações de Luís XIV e das vitórias de seu exército, uma forma de propaganda pela qual o editor recebia polpuda pensão do governo (BRIGGS e BURKE, 2004, p.78). Poetas oficiais louvavam em impressos os feitos de Luís XIV – e de outros monarcas da época – , e historiadores oficiais publicavam relatos de suas maravilhosas realizações para os contemporâneos e para a posteridade. Os principais festivais da corte, caros e efêmeros, eram fixados na memória em descrições impressas e ilustradas. (BRIGGS e BURKE, 2004, p.77).

Luís XIV foi um dos primeiros governantes a fazer uso da invenção da prensa

gráfica com bastante liberdade e periodicidade. Não é por pouco que é um dos mais

conhecidos monarcas da Europa e mesmo do mundo.

No final do século XVIII, segundo Briggs e Burke (2004, p.78), somente na Grã-

Bretanha estima-se que 15 milhões de jornais foram vendidos durante o ano de 1792.

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Nessa mesma época, os jornais diários, semanais ou bissemanais eram complementados

por publicações mensais ou trimestrais, chamadas posteriormente “periódicos” ou

“revistas”. Essa foi a primeira inserção da revista como órgão impresso, que era

resultado de assuntos aprofundados que os jornais não conseguiam esclarecer. Por isso,

lançavam os periódicos temáticos de acordo com sua situação econômica e demanda

social.

Havia também outro tipo de jornal que se assemelhava mais ao caráter de

periódico: eram os jornais acadêmicos, como The Transactions of the Royal Society of

London (1665) ou News of the Republic of Letters (1684), que difundiam informações

sobre novas descobertas, óbitos de acadêmicos e também livros novos.

Conclusões

A comunicação sempre se posicionou como um instrumento fundamental para a

manutenção do diálogo social. Desde antes da invenção da Prensa Gráfica, a

comunicação oral, gestual, argumentativa e da própria retórica utilizada pelos gregos

anos antes de Cristo já se definia como meio de crescimento intelectual e evolutivo do

homem.

No desenrolar das invenções e dos “progressos” tecnológicos, os grupos sociais

que se destacavam economicamente mantiveram-se orientando o crescimento desse

meio, seja mantendo-o financeiramente (o comércio europeu), seja utilizando-o para a

propaganda pessoal (os monarcas), ou ainda trabalhando esse instrumento como

enraizador dos comportamentos sociais que lhes eram apropriados (a Igreja Católica).

Nesse sentido, a comunicação, e posterior imprensa, foi utilizada para fins de

interesse individual ou de grupos específicos com a intenção de gerar ou manter algum

tipo de poder e hegemonia social.

Entretanto, a imprensa também servia para difundir informações relevantes e de

aprimoramento intelectual, como foi o caso da unificação dos vernáculos europeus em

línguas mães como a inglesa, a alemã, a holandesa e a francesa, por exemplo. A

satisfação de conhecer outras culturas, outras formas de viver e também de sentir-se

inserido socialmente por meio da identificação com os livros e depois com os jornais foi

um importante desenvolvimento humano que a Imprensa realizou.

Um exemplo dessa independência jornalística foi o jornal inglês The Spectator,

que tinha, entre seus objetivos, enfatizar “(...) sua independência em relação a partidos

políticos e mostrar que os editores pretendiam observar os debates, em vez de se juntar a

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eles. O jornal cobria desde questões morais e estéticas até a última moda em luvas”.

(BRIGGS e BURKE, 2004, p.79).

1.2 A LUTA DA IMPRENSA PELA INDEPENDÊNCIA

“O poder não é um objeto natural, uma coisa;

é uma prática social e, como tal,

constituída historicamente”.

Michel Foucault

Como foi visto, o desenvolvimento das primeiras máquinas impressoras

significaram um forte aumento da economia capitalista do fim da Idade Média e início

da Idade Moderna na Europa. A imprensa se tornou a nova base de poder simbólico que

tanto poderia ser usada para o engrandecimento das instituições políticas dos Estados

emergentes quanto, por outro lado, poderia ser aplicada como forma de reivindicação de

autoridade por instituições religiosas que perdiam cada vez mais seus postos

hierárquicos no exercício do poder simbólico.

Segundo THOMPSON (2005, p.54), “O advento da indústria gráfica representou

o surgimento de novos centros e redes de poder simbólico que geralmente escapavam ao

controle da Igreja e do Estado, mas que a Igreja e o Estado procuraram usar em

benefício próprio e, de tempos a tempos, suprimir”.

Essa indústria gráfica era formada por organizações tipográficas e editoras que

se caracterizaram como instituições culturais e econômicas. O duplo caráter marcava

esses lugares como algo mais do que centros de comércio, pois nestes se reuniam

freqüentemente clérigos, eruditos e intelectuais e essa miscelânea de opiniões e

interesses demarcavam as dificuldades que os impressores e editores tinham com as

autoridades religiosas, os políticos e outros segmentos sociais.

Contudo,

Tanto a Igreja quanto o Estado procuravam usar esta indústria nascente para finalidades próprias, encomendando documentos oficias, comunicações impressas e normas, como também trabalhos dos mais diversos tipos. Mas toda tentativa de controlar a produção impressa e os novos centros de poder simbólico foi sempre muito limitada de muitos modos. (THOMPSON, 2005, p.57).

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Os poderes antes estipulados pela Igreja Católica e pela representação política

emergente, antes pelo monarca, não representavam apenas seus posicionamentos para a

sociedade, estabeleciam regras de comportamento. Entretanto, havia agora o interesse

em conhecer modos de vida distantes por parte da sociedade civil. Foi criada no leitor a

percepção de visitar/conhecer um mundo de acontecimentos muito distantes do

ambiente imediato a que estava acostumado. Nesse processo de experiência, vislumbrar

o novo tinha relevância potencial para suas vidas.

A prova disso era que na Inglaterra,

Entre novembro e dezembro de 1641, três semanários domésticos apareceram, cada um deles fornecendo sumários das atividades do Parlamento; e nos primeiros três meses de 1642 outros oito periódicos apareceram, embora alguns não tenham durado muito. (...) Durante muitas semanas de 1645, 14 periódicos foram vendidos nas ruas de Londres, bem como um grande número de panfletos e opúsculos de caráter político. (THOMPSON, 2005, p.66).

A proliferação de periódicos e jornais fez com que as autoridades políticas se

interessassem em cobrar maiores taxas com fim de restringir a produção, forçar os

periódicos marginais a saírem de circulação e, ao mesmo tempo, aumentar a receita da

Coroa. Os decretos intensificando esse posicionamento cresceram, mas a luta pela

liberdade de imprensa também. A partir de 1830, os impostos diminuíram e, na década

seguinte, foram abolidos.

A sociedade, na época, via na liberdade de expressão, por meio de uma imprensa

independente, uma salvaguarda vital contra o uso despótico do poder do Estado.

Garantias legais de liberdade de expressão foram sendo adotadas por vários governos europeus, de tal maneira que pelo fim do século XIX a liberdade da imprensa tinha se tornado uma questão constitucional em muitos estados ocidentais. (THOMPSON, 2005, p.67).

1.2.1 A MUDANÇA DA VISIBILIDADE POLÍTICA PELA MÍDIA

“A comunicação constitui uma combinação

de dois elementos: símbolos e sinais.

Os símbolos são significados;

os sinais são dispositivos físicos

empregados na disseminação do significado”.

Harold Lasswell

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A imprensa exerceu-se como um forte embrião de mudança do caráter restrito de

muitos assuntos políticos, religiosos e sociais que antes eram mantidos em sigilo ou

partilhados para um número reduzido de pessoas que viviam na corte. Por exemplo,

antes do desenvolvimento da imprensa, a visibilidade requeria co-presença10, por isso,

de certa maneira, para os governantes políticos era mais fácil manterem-se controlando

tudo o que era programado nas suas exposições, sejam públicas ou de caráter mais

privado, em eventos na corte. O distanciamento da grande maioria da população

representava um atestado sagrado do poder que, com o advento da imprensa, fez que

saísse de cena esse misticismo criado em torno dos governantes. A própria necessidade

de co-presença caiu em desuso.

Diante da nova realidade, os governantes políticos tiveram que lidar com o

cenário virtual para projetar sua imagem pessoal e com isso se preocupar cada vez mais

com sua apresentação diante de receptores que não estavam fisicamente presentes. Os

governantes políticos que, além de utilizarem a imprensa como veículo para

promulgarem decretos oficiais, utilizaram-na para a projeção da imagem pessoal, para

atingir públicos distantes, tiveram sua herança de feitos marcada pela história, como foi

o caso de Luís XIV. Entretanto, ao mesmo tempo em que os governantes políticos

trabalhavam com a imprensa para seu engrandecimento e fortalecimento monárquico, a

imprensa também colaborou com aqueles que queriam difamá-los.

No desenrolar das invenções na área da comunicação, especialmente depois da

TV, a problemática de administrar a visibilidade dos líderes políticos por meio da

imprensa e pela mídia no geral tornou-se mais difícil, mas ao mesmo tempo ainda mais

importante.

THOMPSON (2005, p.123) aponta que há algumas semelhanças das estratégias

empregadas pelos governantes como Luís XIV com as técnicas utilizadas no século

XXI, mas as condições sociopolíticas da administração da visibilidade mudaram

significativamente. Nesse sentido, ele aponta três grandes diferenças:

1 – A audiência das mensagens mediadas aumentaram, o que,

conseqüentemente, fez com que os interessados no controle da visibilidade trabalhassem

com públicos maiores, tanto o número do alcance geográfico como no que se refere à

quantidade de receptores e suas diversidades de pensamento.

10 O termo co-presença significa que só se podia ser visível entre pessoas e grupos que partilhassem o mesmo ambiente de espaço e tempo.

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2 – O desenvolvimento da televisão reenfatizou a importância da visibilidade no

sentido “estreito de visão (isto é, capacidade de ser visto com os olhos)”, embora a

visibilidade esteja agora separada do compartilhamento de um lugar comum. Com isso,

a aparência pessoal, nos trajes, a maneira de falar, de se comportar ganharam peso ainda

maior na visibilidade positiva dos líderes políticos, o que aumentou a vigilância e

controle nesses aspectos.

3 – Nas sociedades ocidentais, os partidos políticos cada vez mais se aproximam

do programa de propostas da democracia liberal, que os coloca constantemente em

competição para a angariação de votos. E essa arena de competição ocorre, hoje,

principalmente no cenário midiático, que se naturalizou como meio público dessa

visibilidade. Logo, o ser privado só existe hoje se estiver visível na mídia como público.

E as lideranças políticas, diante dos novos aparatos midiáticos, tiveram que se enquadrar

e se submeter à “lei da visibilidade compulsória” para se candidatar e tentar cargos

políticos, pois sem a passagem de sua visibilidade pela mídia de maneira positiva e de

projeção, suas candidaturas ficaram comprometidas, com exceção dos lugares distantes

em que a mídia ainda perde na competição pelo voto cabresto ou pela troca por

necessidades primárias do seu humano.

Com isso, a administração da visibilidade através da mídia é uma atividade

perseguida não somente nos períodos intensos de campanhas eleitorais: ela faz parte

também da própria “arte” de governar. A condução de um governo exige um contínuo

processo de tomada de decisões sobre o que, a quem e como se pode tornar público.

Portanto, antes da imprensa e do acompanhamento midiático sobre a visibilidade

política dos líderes representativos, quem estipulava as regras para conduzir essa

visibilidade era o poder hegemônico na figura de grupos sociais, líderes políticos ou

instituições religiosas. Mas, com a entrada dos instrumentos midiáticos nesse cenário,

quem passou a operar nessa conduta foi a própria mídia e suas formas de causar

significado.

1.3 A IDEOLOGIA PRESENTE NO CENÁRIO MIDIÁTICO

“Comunicar é sempre uma certa maneira de

agir sobre o outro ou sobre os outros”.

Michel Foucault

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O amadurecimento da mídia como um conjunto de meios de comunicação

operante no seio social fez a própria convivência interpessoal sofrer mudanças drásticas

no cotidiano. Entretanto, muitas dessas mudanças não são sentidas ou percebidas como

influentes ao contexto e ao comportamento diário, mas são ricas de significado para

quem produz esse novo arsenal comunicativo.

Para Ciro Marcondes Filho,

A penetração da comunicação na informação, ou seja, os procedimentos de promoção direta de produtos no corpo da própria mensagem jornalística, as estratégias de fazer passar inconscientemente uma propaganda como se fosse notícia de interesse público, que os americanos chamam de merchandising e os franceses de “comunicação”, foram originalmente apresentados por Hans Magnus Enzensberger como “indústria da consciência”, novo estágio, mais avançado e mais sofisticado, da indústria cultural. (2002, p.29).

Nesse sentido, a imprensa como meio de comunicação está inclusa numa lógica

própria de instituições modernas voltadas para a inclusão do mercado, como empresas

que vendem seus produtos a clientes. Só que nesse circuito de produção de informação a

mercadoria é a notícia.

Segundo Marcondes (2002, p.32), o fato de esse cenário do jornalismo

representar hoje a “indústria da consciência” tem seu histórico marcado por dois fatores

centrais. O primeiro diz respeito à criação da rotativa, a partir de meados de 1850, que

deu início ao processo de produção de jornais em massa. Portanto, com essa mudança,

houve um aumento significativo na produção, o que gerou uma total reorientação da

indústria jornalística, no sentido de render lucros e se tornar economicamente auto-

sustentável.

Com essa nova problemática de produção em massa, o jornalismo deixou de ser

tão livre, descomprometido e passou a liberar espaço a toda e qualquer manifestação de

grupos sociais, tornando-se produto pré-concebido, voltado às leis do mercado mundial,

e também dependente dos anseios e interesses de uma ampla massa de consumidores.

Com isso, a criatividade e a audácia jornalística perdem ambiente para a repetição

mercadológica e ao próprio conformismo.

O segundo fator corresponde ao acelerado desenvolvimento das tecnologias de

comunicação e informação, invadindo as áreas do conhecimento como, por exemplo, a

biologia, a economia, a sociologia e mesmo a astrofísica. A decorrência da entrada da

comunicação em terrenos da vida do homem de meados de 1970 fez surgir várias

tecnologias relativas à comunicação e sua melhor aplicabilidade no mundo

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contemporâneo. Para Marcondes (2002, p.33), um primeiro desdobramento desse

processo é técnico, o hardware, e o segundo é sua tradução no campo do conhecimento

e da cultura.

São os conteúdos – de dois tipos – promovidos por essa revolução. Um conteúdo “oficial”, que são os programas, os noticiários, o entretenimento veiculado nas redes de computadores, e um “conteúdo implícito”, que é o componente ideológico das novas tecnologias, aquilo que não se fala mas que “se passa” através do uso das técnicas. (MARCONDES, 2002, p.33).

Para Marcondes, o uso dessa nova técnica no jornalismo não se restringe apenas

ao equipamento e suas implicações na vida das redações, ilhas de edição, entre outros

ambientes que circundam a vida profissional do jornalista. A problemática maior é na

concepção e criação dos conteúdos do jornalismo que essas técnicas possibilitam.

Entretanto, para esse comunicólogo, a utilização indevida da prática jornalística

acontece com freqüência na contemporaneidade. Para ele, “os jornalistas dão sua

contribuição à desinformação quando se usam de termos indevidos, tendenciosamente

minimizadores dos problemas ou exageradores de sua periculosidade”. (2002, p.113).

Um apontamento levantado por Marcondes e que também é estudado por outros

pesquisadores da área, como Bernardo Kucinski e Noam Chomsky, é sobre a repetição

de pautas e/ou grandes espaços liberados para o mesmo furo jornalístico, que outros

veículos de comunicação problematizam em suas páginas de jornais, revistas, notícias

televisivas e sonoras. E na repetição de pautas e notícias, a constatação a que se chega é

de que elas se tornam naturalizadas no seio social de tal maneira que as fazem parecer,

quando não comprovadas, verdadeiras perante o imaginário social.

Há outras formas de realizar o exercício da profissão jornalística de maneira

tendenciosa. O estilo da contrapropaganda conceituado por Nelson Jahr Garcia (1990,

p.60) esclarece que esse formato de difusão ideológica é realizado para despertar

desprezo pelos grupos sociais que sejam de opinião contrária aos interesses de quem

produz as mensagens, ou melhor, para quem (ou para qual organização ou grupo) está

por trás do desenvolvimento desse tipo de jornalismo parcial e ideológico, que para isso

lançam idéias que estão associadas a situações contrárias aos princípios e valores

respeitados pelos receptores.

Como GARCIA afirma,

Os veículos de comunicação, constantemente, difundem charges, apelidos e sátiras que desmoralizam e desfiguram dirigentes e líderes políticos,

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tornando-os engraçados ou mesmo ridículos. Quebram, assim, a imagem de respeito que estes pretendam impor e afetam o conteúdo de suas afirmações. (1990, p. 63 e 64).

Portanto, o estilo de contrapropaganda é um recurso utilizado de maneira regular

pelos veículos de comunicação, em especial no Brasil, onde a maioria dos jornais e

revistas (semanais e mensais que são direcionadas à política, à economia e à parte

social) direcionam suas mensagens de acordo com seus interesses ideológicos.

Uma outra maneira em que o jornalismo se compõe é utilizando a técnica de

controle ideológico (GARCIA, 1990, p. 59) que procura impedir que o público receptor

das mensagens adquira conhecimento e consciência de suas condições de vida,

distraindo sua atenção para outras informações de entretenimento. Por meio dos meios

de comunicação, bombardeia-se a sociedade com notícias sobre fatos suficientemente

atrativos para que os indivíduos tenham sua atenção desviada dos problemas

econômicos e sociais. Isso é ancorado no fato de que as pessoas têm um limite de

percepção e atenção e que, saturadas por um certo número de informações que estejam

ligadas às emoções e aos sentimentos, não lhes sobra espaço nem mesmo tempo durante

o dia para perceberem que existem outras idéias e acontecimentos mais relevantes

socialmente e que, de uma certa maneira, esses últimos representam algo importante no

cenário político e social que os remetem como envolvidos.

Nesse mesmo sentido, MARCONDES (2002, p.113) completa que esse tipo de

controle ideológico é uma maneira de desinformação, através do excesso de notícias

sem filtros de relevância social. Para ele, o volume exemplifica-se no sentido “(...) que

os gregos davam à palavra phámacon, que é tanto o de preparar remédios como o de

produzir venenos ou encantos. Em doses pequenas, salva; em doses grandes, mata. O

bombardeio informativo narcotiza o receptor, para torná- lo indiferente à própria

notícia”.

Ou seja, com a imensidão de notícias desenfreadas passadas ao público, fica

difícil por parte do último compreender os acontecimentos e a forma como são

realizados de maneira profunda ou mesmo completa e corre-se o risco de, no outro dia,

após a leitura ou a imagem do noticiário, não se lembrar do fato por inteiro.

Portanto, pensar na ideologia no cenário midiático envolve algumas questões

importantes. Além das idéias já mencionadas, restam as problemáticas que envolvem a

ideologia na forma de produção de conteúdo, especificamente.

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A discussão da ideologia no cenário jornalístico é muito complexa quando este é

visualizado em seu espaço mais amplo, que passa pela seleção da pauta e da sua

relevância como interesse público, da escolha de fontes condizentes com o fato, do

repertório do jornalista, do posicionamento do profissional na elaboração da notícia, que

poderá ser complacente com a linha editorial do veículo, da aprovação dos editores,

chefes e outros cargos “superiores” na hierarquia empresarial e do espaço necessário no

veículo para publicação, dependendo dos anúncios publicitários, além do item que

merece destaque, que se baseia na formulação de pautas condizentes com a agenda

nacional de discussão11.

Segundo o comunicólogo Bernardo Kucinski (1998, p.23), “o processo midiático

de produção do consenso tem início na definição da agenda nacional de discussões”,

pois é mediante a inclusão ou exclusão de itens na agenda, ou dos enfoques adotados,

que se inicia a construção do consenso.

A produção do consenso para essa linha de pensamento crítico ao jornalismo

ideológico verifica a disseminação de interesse dos veículos através da linha editorial

adotada que, por conseguinte, desenvolve uma repetição de pautas, notícias e matérias

centradas na discussão da agenda nacional, utilizada como base de pautas para muitos

outros veículos que se inserem nessa produção do consenso, fabricando em conjunto as

“verdades” que são atribuídas aos fatos. Nesse sentido, há o exemplo bem claro e

bastante discutido em 1997, quando o governo do então presidente Fernando Henrique

Cardoso tentou fazer dos esporádicos atos de violência dos sem-terra o tema central da

agenda de discussão, mas de maneira que desqualificasse o movimento, uma iniciativa

que foi apreendida e disseminada pela grande maioria dos veículos de comunicação.

Nesse caso verificou-se que havia o medo enraizado na sociedade e a mídia,

nesse sentido, vem reforçando que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra

(MST) é o “mal”, composto de desordeiros, “vagabundos” e demais adjetivos negativos,

que invade terras produtivas de pessoas justas e trabalhadoras, omitindo ao público

receptor dessa mensagem a questão essencial que envolve essa problemática, a Reforma

11 A agenda nacional de discussão é uma terminologia utilizada por alguns teóricos críticos da área da comunicação que são contra a veiculação dos interesses dos veículos de comunicação nas mensagens jornalísticas. A agenda se baseia num compartilhamento de notícias, que circulam mundialmente nos veículos de comunicação, excluindo possíveis matérias que sejam de interesse público, bem como podem utilizar-se de algum fato jornalístico da agenda nacional como forma de menosprezar outra notícia que possivelmente seria de maior necessidade social, política e econômica, mas que por ser danosa aos interesses desses veículos, é colocada a escanteio.

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Agrária. A mídia, nesse fato, segundo Kucinski (1998, p.23) “operou principalmente

reforçando crenças previamente existentes”.

O governo, então, desvia-se da questão central, que é a necessidade de se

realizar a Reforma Agrária, utilizando o expediente de explorar “sentimentos latentes

contra a violência” (KUCINSKI, 1998, p.24).

A mídia aproveita do enraizamento cultural, sem nenhum compromisso com a

complexidade das situações e conjunturas, para lançar novas idéias com fins privados

ou mesmo reforçar as já impostas, também como finalidade de apoiar as perspectivas e

as projeções da elite brasileira, como é o caso da última citação de Kucinski.

1.3.1 PRODUÇÃO DA MÍDIA – FORMAÇÃO DOS FILTROS DO

JORNALISMO/PARCIALIDADE

“E é tanto mais fácil dominar, quando o dominado

permanece inconsciente. Daí a importância da

persuasão clandestina e da propaganda secreta, pois, a

longo prazo, para todo império que deseja durar, a

grande aposta consiste em domesticar as almas, torná-

las dóceis e depois subjugá-las”

Ignácio Ramonet

Na mesma linha crítica da produção do consenso e da agenda nacional de

discussão, Noam Chomsky e Edward Herman (2003, p.61) afirmam que a mídia de

massa,

(...) serve como um sistema para comunicar mensagens e símbolos à produção em geral. A função dessas mensagens e símbolos é divertir, entreter, informar e incutir nas pessoas os valores, credos e códigos de comportamento que as integrarão às estruturas institucionais da sociedade maior. O cumprimento desse papel, em um mundo de má distribuição de renda e de importantes conflitos de interesse de classes, requer uma propaganda sistemática.

Portanto, a mídia mobiliza os interesses ideológicos dos que dominam o Estado

e a atividade privada por meio do que os autores chamam de “filtros”. Eles citam cinco:

(1) o porte, a concentração da propriedade, a fortuna dos proprietários e a orientação para o lucro das empresas que dominam a mídia de massa; (2) a propaganda como principal fonte de recursos da mídia de massa; (3) a

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dependência da mídia de informações fornecidas pelo governo, por empresas e por ‘especialistas’ financiados e aprovados por essas fontes primárias e agentes do poder; (4) a bateria e reações negativas (em inglês, flak ) como forma de disciplinar a mídia, e (5) o ‘anticomunismo’ como religião nacional e mecanismo de controle. Esses elementos interagem entre si e se reforçam mutuamente. (CHOMSKY e HERMAN, 2003, p.62).

No primeiro filtro, os comunicólogos desenvolvem a idéia central de que as

mídias dominantes são grandes empresas controladas por poderosos e abastados ou por

gerentes que estão sujeitos a intervenções dos patrões ou de forças voltadas para o

mercado e o lucro; e estão solidamente unidas por interesses em comum com outras

grandes corporações, bancos e investidores. Nesse sentido, eles ainda afirmam que

muitas empresas de mídia estão totalmente integradas ao mercado, e, assim, como para

as outras, as pressões de acionistas, diretores e banqueiros para se focarem em lucros

são muito fortes. “Essas pressões intensificaram-se nos últimos anos à medida que as

ações das empresas de mídia se tornaram favoritas do mercado (...)”, descobrindo com

isso que é possível “(...) capitalizar maiores audiências e receitas de propaganda em

valores multiplicados das franquias de mídia – e grandes fortunas”. (CHOMSKY e

HERMAN, 2003, p.66).

Antes de entrar na importância do segundo filtro que diz respeito à “licença

da propaganda para fazer negócios”, é necessário abrir uma explicação que antes de a

propaganda se tornar proeminente, o preço de um jornal teria que cobrir os custos do

negócio, a empresa jornalística. Entretanto, com o crescimento e uso da propaganda, os

jornais e veículos de comunicação que atraíam anúncios puderam se permitir a vender

seu produto mais abaixo do preço que custava a produção. O que ocorreu depois, na

conseqüência, não fica difícil de imaginar. Os jornais que não tinham anúncios ficaram

em grave desvantagem, sendo vendidos pelo preço maior que aqueles com anúncios,

prejudicando as vendas e tendo menos condições de investir na melhoria estrutural do

jornal ou outro veículo. Por essa razão, um meio com base na propaganda tenderá, pela

lógica do mercado, a eliminar a existência ou levar à marginalidade as empresas de

comunicação e os tipos de mídia que dependem unicamente das receitas de vendas.

Por esse respaldo, os autores dos filtros esclarecem que,

As mídias baseadas em anúncios recebem um subsídio da propaganda que lhes dá vantagens de preço, marketing e qualidade, que lhes permite abusar de seus rivais que não utilizam propaganda (ou que ficam em desvantagem) e enfraquecê-los ainda mais. (CHOMSKY e HERMAN, 2003, p.73).

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Com isso, pode-se afirmar na constatação de CHOMSKY (2003, p.73) que os

anunciantes escolhem criteriosamente os meios de comunicação e mesmo os programas

e demais formatos jornalísticos (revistas, jornais, programas de rádio e TV), tomando

por base seus princípios, e evitam programas que possam interferir no “poder de

compra” dos consumidores. Assim, muitas vezes, programas com conteúdos educativos

são excluídos da programação com facilidade.

Portanto, no outro sentido, o elo entre produção jornalística e propaganda

resultou num fator relevante: a produção do conteúdo jornalístico ficou comprometida.

Para o comunicólogo MARCONDES (2002, p.117) existe uma linha tênue

entre a economia interna da empresa e seus anunciantes, pois, com a entrada e

hegemonia da propaganda na manutenção dos meios de comunicação, o poder do

jornalismo perdeu seu caráter independente, “(...) a produção de notícias perde o que a

caracterizou e deu força em todo o seu ‘período áureo’, aquilo que Albert Londres

chamava de ‘pôr a pena na ferida’” (MARCONDES, 2002, p.117).

No terceiro filtro “buscando fontes de notícias de mídia de massa”, os mídia

necessitam de notícias diárias, cumprem horários apertados e dificilmente têm

jornalistas em diversos lugares onde fatos importantes podem acontecer. Percebendo

isso, fontes do governo e das corporações se “esforçam” para tornar as coisas mais

fáceis para a mídia, enviando discursos adiantados de conferências e reuniões, releases e

pronunciamentos de acordo com o horário de fechamento dos jornais. Isso facilita a

atividade da mídia e, em troca, as grandes entidades e o governo obtêm acesso especial

na mesma.

Com isso, a mídia de massa é levada a um relacionamento simbiótico com as

poderosas fontes de informação pela necessidade econômica das empresas jornalísticas

e pela reciprocidade de interesse do governo (tanto local como prefeituras como outros

departamentos federais) e também de corporações de negócios e outros grupos

comerciais que são considerados por essa mídia confiáveis e tidos com o mérito de

serem fornecedores regulares. Portanto, estabelece-se nessa lógica um fluxo

programado de matérias pautadas por essas organizações de notícias.

Segundo Chomsky e Herman (2003, p.78), as “(...) fontes governamentais e

corporativas também têm seu grande mérito de ser reconhecíveis e confiáveis por seu

status e prestígio (...)”.

Seguindo essa linha de pensamento, Chomsky e Herman apontam uma outra

razão para o alto prestígio concedido a fontes oficiais: é que a mídia afirma produzir

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notícias de caráter objetivo, com a finalidade primeira de manter sua imagem de mídia

objetiva e depois se proteger de críticas quanto a tendenciosidades e de possíveis

ameaças de ações cíveis, já que é necessário que ela tenha, entre seu hall de matérias,

notícias que lhes dê base de precisão. Para os autores,

Trata-se em parte de uma questão de custo: tomar a informação de fontes que podem ser presumivelmente confiáveis reduz as despesas de investigação, ao passo que o material de fontes que a uma vista não são confiáveis, ou que darão margem a críticas e ameaças, exige uma cuidadosa verificação e uma pesquisa dispendiosa. (CHOMSKY e HERMAN, 2003, p.78).

No quarto filtro, “a bateria de reações negativas e os fiscais de cumprimento”,

os autores usam do termo bateria de reações negativas para se referir às respostas

negativas dadas a um programa ou declaração da mídia que têm a finalidade de

regulamentar, ameaçando e “corrigindo” a mídia, tentando conter qualquer desvio da

linha estabelecida. O noticiário, em si, está projetado para produzir essa reação. Nesse

sentido, os geradores de reações negativas somam suas forças e reforçam o comando da

autoridade política em suas atividades de gerenciamento de notícias. Segundo Chomsky

e Herman (2003, p.87), o governo é o principal produtor de reações negativas, atacando

a mídia.

O quinto e último filtro ressalta a presença da ideologia do anticomunismo na

produção do material veiculado pelos meios de comunicação de massa. O

“anticomunismo como mecanismo de controle” é utilizado pela mídia como forma de

manipulação da classe dominante, tornando-se um “sistema de mercado guiado” por

governos, líderes de comunidades e acionistas destas mídias.

Isso ocorre com freqüência em razão de o conceito do comunismo ainda ser

obscuro no mundo contemporâneo. Portanto, o comunismo em seu sentido pejorativo12

é utilizado, pela mídia de massa, contra qualquer um que defenda políticas que

ameacem os interesses de proprietários ou apóie países comunistas.

Esse último filtro aparece nas mais comuns das matérias veiculadas pelos

meios de comunicação de massa criminalizando os movimentos sociais, e outros que

estejam a favor de causas sociais que remetam a estudos das raízes dos problemas

sociais, como o exemplo do MST.

12 No sentido que aterroriza os proprietários de imóveis e ameaça a raiz de sua posição de classe e de status superior.

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Portanto, pode-se afirmar que o mecanismo do controle anticomunista

difunde-se pelo sistema para exercer profunda influência sobre a mídia e, para Chomsky

e Herman (2003, p.89),

Em tempos normais, assim como em períodos de Pânico Vermelho, as questões tendem a ser enquadradas em termos de um mundo dicotomizado entre forças comunistas e anticomunistas, com ganhos e perdas distribuídos aos lados em disputa, e a torcida pelo ‘lado norte-americano’ considerada como uma prática jornalística inteiramente legitimada.

Nesse sentido, a legitimidade da opinião anticomunista na mídia de massa

conserva traços conservadores de sua história e faz florescer idéias dos novos anseios

neoliberais, voltados à política realizada e desenvolvida principalmente nos Estados

Unidos. Todavia, é importante ressaltar, sem se deter em maior profundidade, que o

neoliberalismo e suas verdades autoproclamadas, têm um forte poder ideológico hoje na

maioria das democracias liberais e, segundo Kucinski (1998, p.19) funcionam como um

substituto do conhecimento e da discussão racional num espaço público. Com isso,

pode-se chegar a uma conclusão de que se, na maioria das vezes, o público consome a

discussão que a mídia oferece, em muitos momentos se comportando como elemento

acrítico diante do que lhe é apresentado e ainda incorporando comportamentos ou

simplesmente aceitando atribuições de algo que é uma mera simulação do real, deixa de

contemplar as dimensões da complexidade do fato e suas possíveis outras verdades, ou

simplesmente as verdades.

Portanto, na apresentação dos conceitos de cada filtro, vê-se que a matéria-prima

das notícias, produzidas pela mídia de massa, deve passar através de sucessivos

bloqueios, na representação dos filtros, resultando no produto adequado e enviesado

para divulgação. Chomsky e Herman (2003, p.62) concluem que “tais elementos

estabelecem as premissas do discurso e da interpretação e explicam a base e as

operações daquilo que as campanhas de propaganda significam”.

A exploração dos cinco filtros permite compreender a existência de um

caminho estreito que a variedade de notícias tem que percorrer para se chegar nas

páginas dos veículos de comunicação. Também é possível detectar que nesse percurso a

ideologia reina nos diversos componentes tendenciosos que os filtros acomodam. Com

isso, é possível e inquietante diagnosticar que a abordagem da propaganda à cobertura

da mídia sugere uma clara dicotomização sistemática e altamente política na cobertura

de notícias com base em sua utilidade para os importantes interesses do poder. Essa

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constatação é verificável nas escolhas dualistas de matérias e no volume e qualidade da

cobertura.

A análise dos filtros que Chomsky e Herman apresentam também sugere que

existe uma certa dominação da mídia pelas classes mais elevadas socialmente (elite) e

que, por meio da marginalização dos ideais sociais dos dissidentes, resultante da

operação dos filtros, é fácil para os profissionais do jornalismo acharem e se

convencerem de que realizam um jornalismo de caráter objetivo e que esteja de acordo

com as vontades sociais, já que as restrições dos filtros são tão marcantes e poderosas

que agem de maneira que incutem os valores e regras sociais, estipuladas pela elite, o

que muito dificilmente esses profissionais irão vislumbrar outras opções de notícias que

sejam alternativas às advindas da filtragem.

Nesse sentido, os teóricos Herman e Chomsky observam as formas coercitivas

de ação no processo de produção da notícia, bem como diagnosticam a representação

histórica da dominação da ideologia da elite e os formatos desse pensamento ideológico

incutido na veia da sociedade, nas mais variadas formas de representação cultural.

Na complementaridade do tema, o jornalista Perseu Abramo (2003) foi outro

teórico que desenvolveu estudos sobre padrões de manipulação, identificando

características da mídia brasileira que são significativas para o entendimento pontuado

das formas coercitivas, mencionadas por Herman e Chomsky, Abramo (2003, p.24-36))

conceitua quatro padrões de manipulação. O primeiro refere-se ao “padrão de

ocultação”, que diz respeito à ausência e à presença dos fatos reais na produção da

imprensa, ou seja, é o “(...) padrão que opera nos antecedentes, nas preliminares da

busca da informação, isto é, no ‘momento’ das decisões de planejamento da edição, da

programação ou da matéria particular (...)”. Entende-se que para se tornar real, a priori

deve-se existir como fato jornalístico. O que acontece nesse padrão é a inclusão de um

dado, de uma informação, ou a não seleção desse dado, dessa informação como

membros do fato jornalístico. Abramo adverte que o fato real ausente deixa,

simplesmente, de ser real para se transformar em imaginário e o fato presente (real ou

ficcional) passa a tomar o lugar do fato real. Ambas as ocultações induzem o leitor à

conotação de uma realidade diferente da real, algo criado, portanto artificial.

Um segundo item desenvolvido pelo autor é o padrão de fragmentação. Nele,

parte-se de uma construção que seja estilhaçada, fragmentada em vários fatos

particularizados, desconectados entre si,

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(...) despojados de seus vínculos com o geral, desligados de seus antecedentes e de seus conseqüentes no processo em que ocorrem, ou reconectados e revinculados de forma arbitrária e que não corresponde aos vínculos reais, mas a outros ficcionais e artificialmente inventados" (ABRAMO, 2003, p.27).

Esse padrão acarreta dois procedimentos: a seleção de aspectos, ou

particularidades, do fato e a descontextualização. No primeiro, os fatos são decompostos

em aspectos, e a imprensa seleciona os que apresentarão ou não ao público. O segundo é

uma decorrência da seleção de aspectos, porque isolados como partes de um fato, a

informação, o dado, perdem a essência do seu significado verdadeiro, original, e

recebem outro significado, diferente, que pode ser até antagônico ao significado real.

O terceiro padrão mais utilizado é o da inversão. Ele opera tanto no

planejamento como na coleta e na transcrição das informações, “mas que tem seu

reinado por excelência no momento da preparação e da apresentação final, ou da edição,

de cada matéria ou conjunto de matérias.” (ABRAMO, 2003, p.28-29). Visualizam-se

quatro tipos mais empregados pela grande mídia: inversão da relevância dos aspectos,

inversão da forma pelo conteúdo, inversão da versão pelo fato e inversão da opinião

pela informação (ABRAMO, 2003, p.28-32).

Detalhar-se-á cada um deles:

Inversão da relevância dos aspectos – nesse padrão, ocorre a troca da informação

principal pela secundária, com o objetivo de diminuir o entendimento, ou anular a

compreensão sobre o que seria essencial no fato, ou dado.

Inversão da forma pelo conteúdo – nesse padrão, o formato que o texto toma se

torna mais importante do que o que ele reproduz, ou seja, a palavra, a frase, se

desenrolam principais nas matérias jornalísticas, muitas vezes, impedindo a clareza da

explicação para que justamente seja impedido o real na informação.

Inversão da versão pelo fato – nesse padrão, visualiza-se no texto jornalístico a

versão do fato que o órgão de imprensa quer apresentar, negligenciando a observação e

a exposição dos fatos originais, que existem no mundo natural e social.

Inversão da opinião pela informação – esse último padrão de inversão ocorre

com maior freqüência no cenário do jornalismo informativo. Nele, substitui-se, inteira

ou parcialmente, a informação pela opinião que se quer enraizar sobre a informação

real. Os três padrões de inversão acima expostos levam quase inevitavelmente ao padrão

de inversão da opinião pela informação.

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Todos esses padrões colocados pontualmente por Abramo (2003) conduzem ao

padrão de indução, que retira do receptor da informação jornalística a realidade original

do dado, do fato e cria uma outra realidade que não é verdadeira, mas se passa por tal.

Entretanto, ela foi artificialmente criada, induzindo o receptor a uma compreensão

equivocada da realidade original.

Com isso, avança-se na discussão de que existe uma complementaridade entre a

forma de controle social e o formato de produção de notícias. Para dissecar esses

conceitos, MOTTA (2002, p.126-131) propõe explicação em separado.

As formas coercitivas de controle, que podem variar desde controles políticos e

econômicos realizados pelos diretores, chefes de redação, donos dos veículos de

comunicação, de forma direta, ou ainda fora do ambiente dos mídia, exercem poder

coercitivo de maneira indireta como empresários, grupos de opinião, executivos entre

outros, sobre as atividades profissionais do jornalista. É no tratamento ao exercício da

profissão do jornalista que o poder coercitivo dessas pessoas se reproduz, levando em

consideração seus interesses por fontes, pautas, condução da matéria, ausência de foto,

enfim, um complexo arsenal de dispositivos que coloca ao leitor, ouvinte ou

telespectador da mídia a lógica desse jornalismo que sofreu fortes formas de controle

social.

Pelo segundo conceito (produção da notícia) que o pesquisador Gonzaga Motta

explicita, existe uma visão mais crítica desse processo coercitivo. Menciona-se: “(...) as

distorções não intencionais internalizadas nos procedimentos profissionais que inclinam

as instituições midiáticas a favor do status quo”. (MOTTA, 2002, p.131). Contudo,

verifica-se que há na não intencionalidade um elemento fomentador da manutenção da

estabilidade social. Com isso, pode-se afirmar ainda que a produção de notícias de

forma consensual está localizada no embrião da sociedade humana em suas formas de

viver, agir, comportar-se, interagir, entre outras maneiras de representar-se

culturalmente. Entretanto, o que não se pode negar é que a mídia reforça essa produção

consensuada de ver a vida, até mesmo porque esta é historicamente gerenciada pela

classe dominante, que tem seus interesses em manter sua ideologia imperando.

Os próprios filtros do Controle da Notícia (o modelo de propaganda comentado

por Herman e Chomsky) são formas naturalizadas que se configuram numa lógica em

que o poder dos mídia se entrelaça com a cultura política, conceituada de manutenção

do status quo.

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Nessa via, Nilson LAGE (2001, p.49 e 50) fala que o modo de produção da

notícia é nada mais que crenças e perspectivas produzidas pela coletividade e não mais

apenas do indivíduo (na figura do jornalista), cujas tensões refletem contradições de

classe ou de cultura.

Um outro fator a que se deve ater sobre a explanação da produção da notícia é o

valor ideológico que a mídia ocupa como instituição e não mais como mero instrumento

de informação, como o era na sua origem. Um segundo elemento, não menos

importante nessa inferência sobre produção de notícia é a explícita representação de

mundo da ideologia dominante que se verifica na reprodução das notícias pela mídia.

Para comprovar essa afirmação, MOTTA (2003, p.144) coloca que,

A ideologia dominante é um sistema de poder constantemente reproduzido pelas instituições ideológicas como a Igreja, o sistema jurídico, a escola e, cada vez mais de forma mais abrangente, pela rede global de meios de comunicação de massas, o principal aparelho ideológico da sociedade mercantil mundializada.

Dessa maneira, é possível vislumbrar com maior profundidade as várias

especificidades que o processo de produção de notícias e de reprodução ideológica

contemplam e permeiam. Portanto, deve-se analisar o produto final do jornalismo em

sua forma complexa, com seus detalhes que representam significados, mas sem se

esquecer da importância do processo de produção em que sistemas de regras operam

previamente para neutralizar esses produtos finais.

1.4 A REAFIRMAÇÃO DO JORNALISMO COMO ATIVIDADE POLÍTICA

“Atacar um jornal na justiça cada vez que

suas informações são parciais,

e portanto incompletas,

levaria a que se silenciasse sobre todos os assuntos”.

Yves Mamou

Seguindo a linha de pensamento dos autores em destaque até então, em especial

de Herman, Chomsky, Marcondes, Lage, Garcia e Gonzaga Motta, a comunicação se

estendeu historicamente como o resultado da própria necessidade da sociedade de

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constituir a publicidade civil, ou seja, uma esfera voltada para a discussão pública de

vários assuntos, entre esses da política, sendo realizada fora do espectro da política

restrita – aquela mantida no cenário político governamental – entretanto, como agente

essencial do universo político conduzido na esfera pública contemporânea.

Nesse sentido, é importante demarcar três elementos vitais no desenvolvimento

da profissão jornalística para se chegar ao exercício da atividade do jornalismo a partir

de pressupostos políticos, como ocorre atualmente.

Esses três elementos históricos vitais são diagnosticados por Wilson Gomes

(2004, p.46-60) em Transformações da Política na era da comunicação de massa. O

autor desenvolve três modelos históricos que marcaram a formação das diferentes

posturas jornalísticas. A primeira denota a sua origem, quando a imprensa produz um

arsenal de conteúdo opinativo, que era realizado pela classe burguesa, no interior da

esfera civil, para defender os seus interesses, os quais eram de oposição e, portanto,

hostis à esfera política restrita. A imprensa era um espaço de discussão e polêmica

contra o Estado aristocrático dos séculos XVII e XVIII, dependendo da localização

geográfica.

No decorrer dos desdobramentos históricos, essa mesma classe burguesa que

outrora lutara por meio da imprensa contra o Estado, consegue se impor como poder

supremo na época, ou seja, conquista o Estado e, portanto, as esferas de decisão política.

Com isso, como todo poder de classe (partidário), a classe burguesa se divide em grupos

no governo e na oposição e os órgãos de imprensa acompanham os grupos e partidos

emergentes e de situação. É nessa primeira passagem histórica que a imprensa se

consolida como “imprensa livre”, principalmente como garantia da existência de

diversidade partidária, da contraposição legítima entre oposição e governo, da liberdade

dos partidos.

No segundo momento, a imprensa já recebe outros meios de comunicação, como

rádio, TV e internet no cenário midiático. Nesse contexto, a comunicação é estabelecida

como negócio, nos seus primeiros passos, quando a percepção geral é de que os

dispositivos técnicos reconhecidos para a comunicação de massa funcionam como

fantásticos meios de separar gostos, opiniões de públicos diversos, inclusive a própria

identificação e em especial as tomadas de decisões (pelo público) de questões de

natureza política.

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O terceiro e último momento que predomina até hoje foi quando os meios de

comunicação foram incorporados a um setor industrial forte e competitivo ligado à

cultura e ao entretenimento para consumo em larga escala.

A indústria da informação surge quando o mundo dos negócios se dá conta de que a informação pode se transformar num negócio cujas transações se realizam não mais com corporações e partidos mantenedores mas com duas categorias novas, os consumidores de informação e os anunciantes. (GOMES, 2004, p.50).

No decorrer dessa última prática13, o jornalismo se reveste do poder da

credibilidade, que se conquista por meio da honestidade, verdade, imparcialidade,

rapidez para atualizar o conteúdo, objetividade, entre outras qualidades que se

naturalizaram no conceito de profissional em jornalismo, com a intenção de criar status

social perante os consumidores e anunciantes.

Contudo, é nesse último cenário midiático que as formas de produção se

desenvolvem com possibilidades de servirem como meios parciais. O interessante é

problematizar nisso quais são os motivos não explícitos de essas mídias se comportarem

como porta-vozes de grupos e interesses privados com a equivocada bandeira de

isenção.

A própria lógica da produção da notícia em tempos tecnológicos permite ao

público criticar a forma de processamento, pois a dinâmica desse sistema impossibilita a

afirmação de imparcialidade ou qualquer tipo de neutralidade. Para começar pelas

fontes que são pessoas e, como tais, têm interesses a defender, a informação é um dos

instrumentos que lhes permite alcançar seus fins. Conclui-se que é na relação com as

fontes que nasce a informação, ou a desinformação, ou ainda a mentira.

A pesquisadora Sylvia MORETZSOHN (2002, p.201) criou uma interessante

idéia nesse sentido de o profissional agir de maneira subjetiva em detrimento da tão

pregada objetividade da profissão, “(...) a subjetividade presente no processo de

apreensão dos fatos indica que o jornalismo não é o discurso da realidade (que diz ser),

mas um discurso sobre a realidade”.

Portanto, os meios noticiosos atuam como instrumentos de legitimação social de

determinados setores da sociedade, já que seus procedimentos e concepções não são

13 Essa prática que se diagnostica nos dias atuais, vem ganhando cada vez mais formas industriais e, como em toda indústria, os seus dispositivos foram incluídos em um sistema e controlados por ela.

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neutros, pois impõem ao jornalista a identificar como fatos, interpretações produzidas

por determinadas fontes, e não por outras.

Uma temática que tem uma forte interface no jornalismo é a política. Para

Afonso de ALBUQUERQUE (1998, p.09), a parcialidade é marca da cobertura política

realizada pelos meios de comunicação. Para ele, ocorre nessa cobertura uma

manipulação editorial da notícia, na qual se preservam os interesses políticos e

econômicos dos donos das empresas jornalísticas ou, em termos mais amplos, como

menciona, das elites do país.

Nesse sentido, propõe-se a pensar se em tempos do terceiro momento de vida

dos meios de comunicação (GOMES, 2002, p.50), em que predominam o caráter de

nichos de públicos e diversidade de produções para suprir a demanda, também se vê

presente a problemática do jornalismo ser caracterizado como partidário.

A cobertura jornalística da política tem se caracterizado por uma reiterada parcialidade em favor de determinados partidos e causas e em prejuízo de outros. Quanto ao valor da “independência”, boa parte das organizações noticiosas brasileiras pertence ou é estreitamente vinculada a políticos e destina-se a fornecer aos seus proprietários “capital político” antes de retorno financeiro. (ALBUQUERQUE, 1998, p.21).

Essa consciência é imprescindível para se diagnosticar quais são os motivos que

levam os donos e proprietários das empresas jornalísticas a se atrelarem a determinado

segmento social, quais os interesses das empresas jornalísticas na manipulação da

notícia e de que modo estes se refletem em uma cobertura parcial acerca da política, e

ainda, que relações de poder e de dependência se estabelecem entre as empresas

jornalísticas e outras instituições políticas e sociais.

Creio que o mais sensato seja caracterizar o jornalismo como um fenômeno cujo

significado é constantemente reformulado na prática profissional dos jornalistas e nas

relações que eles mantêm com outros setores da sociedade.

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CAPÍTULO II

LULA: DAS ORIGENS DO SERTÃO À ELEIÇÃO VENCIDA DE

2002

“Percorrendo uma trajetória comum de migrantes, anônimo

excluído social, Luiz Inácio Lula da Silva transformou-se num dos

maiores líderes de massa do país, escrevendo seu nome para

sempre na história mundial”.

Denise Paraná (2002, p.21).

De muitas histórias marcantes da literatura brasileira sobre os migrantes

nordestinos às capitais mais próximas do “Grande sertão: veredas”, como prefere

chamar Guimarães Rosa, ou simplesmente de “Os sertões” de Euclides da Cunha, Luiz

Inácio Lula da Silva é o destaque da contemporaneidade. Ele não só fez o caminho que

marca a saga das famílias da seca que procuram um lugar mais digno de sobrevivência,

como também foi eleito com o recorde em eleição no país com 52,79 milhões de votos,

alcançando em 2002 o topo máximo da hierarquia política de um país democrático, a

cadeira de presidente da república.

Nascido numa época em que ainda se tinha o problema do atraso no registro de

natalidade brasileira, o livro Lula: o filho do Brasil, trabalho biográfico realizado pela

psicóloga Denise Paraná (2003, p.45), ressalta que seu pai, Aristides Inácio da Silva, o

registrou com a data do dia 06 de outubro de 1945, mas que na realidade ele teria

nascido no dia 27 desse mês e ano. Esse fato era bastante comum nas cidades

interioranas, não só na parte nordestina, mas também nas localidades pouco ou quase

nada urbanizadas do país. Logo que nasceu, seu pai deixou-o com o restante de sua

família, mãe e demais seis irmãos, aos cuidados do seu padrinho para tentar ganhar

algum dinheiro em São Paulo.

Eurídice Ferreira de Melo, apelidada de dona Lindu pela família Silva, criava

seus seis filhos em Garanhuns, interior de Pernambuco, numa casa simples, quarto, sala,

cozinha.

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Os móveis eram poucos: mesa de comer ladeada por banco e tambonetes de madeira, várias redes e uma cama de casal (...) o sítio não tinha luz elétrica. O fogão era a lenha, e a água – amarela, escassa, salobra e cheia de sapinhos (...) Lavar roupa, só no riacho Fundo, distante quase duas horas a pé. Banho, um por semana (MARKUN, 2002, p.19).

A ida do seu pai para a capital paulista é lembrada pelo irmão mais velho de

Lula, José Inácio, mais conhecido como Zé Cuíca: ele comenta que o pai vendera dois

cavalos velhos para comprar a passagem no pau-de-arara (MARKUN, 2002, p.20).

Só que a família de Lula, deixada pelo pai para que ele fosse a São Paulo em

busca de emprego e melhorias financeiras, não sabia que seu Aristides apanharia a

prima de dona Lindu, Valdomira Ferreira de Góis, de 16 anos, mais conhecida por dona

Mocinha, para o acompanhar.

Um dia eu voltava da escola e uma mulher me perguntou se eu não queria ir embora com ele. Eu pensei que era para trabalhar, não que era para virar mulher. Ele me pegou de noite e viemos embora. (...) Ele foi preso no Recife e depois no Rio, porque eu era de menor. Falava que eu era irmã, mas o documento não marcava. Depois fomos para São Paulo. Eu já não tinha mais valor no Norte, então fiquei mais ele (BRUM apud MARKUN, 2002, p.20).

Dona Lindu cuidava dos filhos na medida em que conseguia, diante da estrutura

que o sítio da família lhe propunha. Enquanto os irmãos mais velhos de Lula, Zé Inácio,

Jaime, Marinete, Genival (ou Vavá), Frei Chico e Maria brincavam de caçar preá, Lula

crescia.

Quem cuidava de Lula enquanto dona Lindu trabalhava na roça junto com seus

dois filhos mais velhos era Marinete. Ela comenta que, quando ele tinha três anos,

escapou da morte: ao se encantar com um potro recém-nascido, num sítio próximo ao da

família, tentou agradar com carícias o bicho, “a égua mordeu-o na barriga e sacudiu-o

brutalmente, até o dono dar um golpe de facão no pescoço do animal” (MARKUN,

2002, p.21).

Passados cinco anos, Aristides voltou para Garanhuns, trouxe sua nova família,

dona Mocinha, e mais os dois novos filhos, deixando-os numa pensão na cidade

enquanto visitava a família de Lula. Acabou engravidando dona Lindu da menina que

nasceria e permaneceria a irmã caçula de Lula, Tiana.

Depois, Aristides voltou para Santos, litoral de São Paulo, levando o irmão mais

velho de Lula, Jaime, de 13 anos, juntamente com a outra família formada com dona

Mocinha. Ao chegar a Santos, o pai de Lula pediu para Jaime escrever para a família.

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Aproveitando o analfabetismo do pai, ele desenvolveu na carta um pedido para que a

família viesse de Garanhuns encontrá- los em Santos (MARKUN, 2002, 23).

Passados dois anos, dona Lindu resolveu atender ao pedido do filho mais velho,

que para ela era um pedido do marido. O atendimento não veio apenas do desejo de

estar com seu Aristides e com Jaime, pois nessa época a família Silva, em Garanhuns,

sofreu uma terrível seca, que acabou com a plantação, então sustento de Lula e seus

irmãos.

Decidida, dona Lindu vendeu o sítio e os poucos móveis e bens que tinham

como: relógio, santinhos e um jumento. A dificuldade da viagem, que se estenderia por

13 dias, começou com atraso de dois dias do pau-de-arara, fazendo-os esperar num

quartinho, estilo depósito cedido pelo dono, Toninho da bodega. Ao todo eram 12

pessoas no cômodo. (PARANÁ, 2003, p.47).

Ao chegar a Santos, dona Lindu percebeu que teria que dividir seu marido com

sua prima, e seus dois filhos, que já tinham entre 6 e 7 anos. Aristides separou as

famílias. A de dona Lindu, na casa em que estava morando, e a de dona Mocinha, numa

nova casa no final do bairro em que residiam.

Meu pai ficou mantendo as duas casas (...) Minha mãe se queixava muito de que ele tratava a outra mulher melhor do que ela, que as frutas que iam para a outra eram melhores, que a despesa para a casa era maior. Minha mãe se queixava muito disso. Eu não tenho muita recordação disso para saber se era verdade. Nessa época eu devia ter já 7 anos de idade, eu não tenho muita recordação. Mas eu sei que meu pai mantinha sem constrangimento as duas famílias. Ele ficava dois dias numa casa com a minha mãe, dois dias com a outra. Um dia com uma, um dia com a outra. Sabe, ele se virava (...) Carregava café e sustentava as duas famílias (LULA apud PARANÁ, 2003, p.49-50).

Entretanto, Lula confessa que sentia mágoa do seu pai e o considerava muito

ignorante. “Meu pai era um poço de ignorância” (LULA apud PARANÁ, 2003, p.50).

Essa mágoa só veio a se enraizar no seio familiar ao se passarem dos anos, em território

santista. Aristides não deixou o compromisso de fornecer o feijão, o arroz, o pão e o lar,

mas no resto não cumpria. Como marido, era péssimo. “Ele brigava muito. Invocava

muito com minhas irmãs, com todo mundo. Tanto é que o coitado morreu indigente.

Meu pai morreu em 1978 como indigente.” (LULA apud PARANÁ, 2003, p.55).

Aproximadamente vinte e cinco anos antes do falecimento do pai de Lula, dona

Lindu decidiu se separar dele, mudando-se para um barraco alugado perto de sua antiga

moradia. Aristides tentou por várias vezes reatar o casamento com dona Lindu, que

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negou todos os pedidos do antigo companheiro afetivo, permanecendo em liberdade

para suas atividades com os filhos, sem a censura e bloqueio violento do ex-marido.

A jornada de Lula sem as proibições do pai começara. Mudaram-se para São

Paulo em busca de empregos melhores, em 1956. Já tinha entrado na escola em Santos

e, quando foi para a capital, retomou os estudos.

Lula lembra que, diferente da geração atual dos filhos dele, ele adorava brincar

na rua, que não tinha asfalto. Brincava de jogar peão, empinar pipa, jogar bola, de fazer

guerra de mamona.

Era guerra, mas guerra de verdade, de nego sair machucado. Eu subia numa árvore com estilingue. A gente ficava atacando os outros. Se o adversário te descobrisse na árvore, vinham seis, sete tacar mamona em você com estilingue. Aí você estava perdido. E isso dói, a gente tinha que prevenir o rosto e deixar. Quando a gente pedia para parar estava derrotado. Era jogo pesado. A gente jogava vila contra vila no futebol. Saía pau. Começava o jogo e dentro de dez minutos saía pau. A gente brigava com pedra. Era pedra mesmo, cada time de um lado do campo, um jogando no outro, nego com a cabeça machucada (...) É um tipo de coisa que hoje a molecada não tem, ela é meio robotizada (LULA apud PARANÁ, 2003, p.65).

Mas a adolescência de Lula também foi marcada por ritmos de trabalho

diferentes. Passou um período como engraxate, tintureiro, atendente num escritório

(Armazéns Gerais Columbia) e ajudante na Fábrica de Parafusos Marte (PARANÁ,

2003, p.64).

Quando entrou para esse último trabalho, já cursava tornearia mecânica no

Senai, tinha 15 anos. Lá realizou cinco meses de aula, um mês de férias e seis meses na

fábrica, como estágio obrigatório.

Depois foi trabalhar na Fábrica Independência, quando tinha entre 17 e 18 anos,

em que cumpria o período noturno.

Um dia quebrou o parafuso do estampo e largou o braço da prensa. A prensa fechou e esmagou o meu dedo. Eu fiquei esperando horas de madrugada, até chegar as 6 horas da manhã, para o dono chegar e me levar no médico. Chegando no hospital o médico olhou o meu dedo e cortou o resto. Eu fiquei preocupado com minha mão. Passei meses e até alguns anos com complexo por estar sem dedo (...) Mas isso era comum entre os metalúrgicos, muita gente ficava sem dedo ou sem pedaço de dedo (LULA apud PARANÁ, 2003, p.76).

O acidente de trabalho ocorreu numa época em que quase não havia segurança

para trabalhar em indústrias e demais ambientes onde haveria a aproximação com

maquinários em que o homem os gerenciasse. Com isso, as indústrias e fábricas

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envolvidas com esses acidentes eram obrigadas a indenizar o funcionário mutilado ou

sacrificado em decorrência de problemas com o cenário estrutural do trabalho. “Com

esse acidente, eu ganhei uma indenização. Foram 350 mil cruzeiros na época. Com esse

dinheiro deu para eu comprar móveis para a minha mãe e comprar um terreninho”

(LULA apud PARANÁ, 2003, p.76).

Após esse transtorno na indústria Independência, Lula foi trabalhar na

Frismolducar, em que ficou pouco tempo em razão de ter que trabalhar aos sábados

(PARANÁ, 2003, p.76).

Em 1964, quando ocorreu o marco social no Brasil, da tomada do golpe militar,

Lula estava ainda distante do cenário político. Entretanto, o seu irmão, Frei Chico, já

dava entrada na vida sindical e, por conseqüência, na área de política, ou melhor, de

protestos contra o regime e outros abusos sociais que faziam parte da lista de

irregularidades políticas que o projeto do Partido Comunista Brasileiro (PCB) na época

reividicava, no qual Frei Chico14 se incorporou.

Frei Chico era politizado, já era militante do Sindicato de São Paulo, já falava de golpe militar. E a gente não, na fábrica, a gente ouvia o pessoal falar bem do Exército. Mas nesse tempo eu não queria saber de política. Meu negócio era ler o Diário da Noite porque tinha a coluna que falava de futebol e eu queria ler tudo que falava do Corinthians, era isso. Não tinha cabeça para outra coisa (LULA apud MARKUN, 2002, 53-54).

Mas essa visão reduzida da arte de fazer política logo foi ultrapassada. Em 1968

Lula, influenciado pelo seu irmão Frei Chico, assinou a ficha de inscrição no Sindicato

dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo. Lula, nessa época, trabalhava na empresa

Villares, como operário metalúrgico. Isso só ocorreu depois de mais de um ano à

procura de emprego desde quando saiu da Frismolducar.

Empregado na Villares e sindicalizado no Sindicato dos Metalúrgicos, Lula

começa a participar mais das reuniões do órgão e também a se interessar pela questão

sindical, lendo os boletins e afins. Em 24 de abril de 1969, Lula toma posse como

suplente do Sindicato e a partir daí começa a vida prática e ativa do sindicalista Lula

(MARKUN, 2002, 77).

14 Desde 1961, Frei Chico tinha contato com o PCB. Quando a empresa em que trabalhava mudou o sistema de turnos, obrigou os funcionários a alternar o horário de trabalho, ele foi reclamar no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. A partir de então começou a freqüentar as assembléias e interessar-se pela luta sindical, mas só se filiaria no PCB em 1971 (MARKUN, 2002, 54).

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Paralelamente à entrada dele na vida sindical, havia também a descoberta do seu

primeiro romance, que lhe acarretaria seu primeiro casamento com sua vizinha, a tecelã

Maria de Lourdes Ribeiro, em 25 de maio de 1969.

Lula era muito amigo dos irmãos de Lourdes, como era mais conhecida. Em seus

22 anos já a conhecia “havia uns dez anos” (PARANÁ, 2003, p.90).

Ela era muito minha amiga, nós vivíamos juntos, eu namorava com outras meninas, nós íamos juntos para bailes. Um belo dia, nós estávamos num baile e eu decidi falar com ela. Eu não estava apaixonado ainda. Não sei o que aconteceu, eu fiquei olhando para ela e achei que a gente deveria começar a namorar (PARANÁ, 2003, p.90).

Depois de casados, Lula e Lourdes compraram uma casa no Parque Bristol e

tinham uma certa estabilidade (PARANÁ, 2003, p.91). Mas foi nessa mesma casa que

Lula ficou viúvo depois de quase dois anos de casado. Sua esposa ficou grávida, teve

complicações na gravidez e um grave problema de saúde.

Foi só no sétimo mês que Lourdes passou a ter mal-estar: vomitava e os médicos

recomendaram caminhada e ingestão de gelatina, explicando a Lula que era normal o

estado de saúde da esposa. Mas no dia 3 de junho de 1971, Lourdes foi internada no

Hospital Modelo, em São Paulo, com graves complicações do parto e de sua saúde

(MARKUN, 2002, 81). “Eu fui no hospital e a vi. Ela gritava, ela gritava. Não tinha um

médico para atender, não tinha ninguém. Ela estava numa situação deplorável, com um

monte de gente no quarto” (MARKUN, 2002, 81).

Quatro dias depois, ela faleceu. O atestado de óbito indicava que Maria de

Lourdes da Silva morrera de coma hepático, provavelmente hepatite. Lula não permitiu

a necropsia15. “Ninguém vai retalhar a minha mulher! (LULA apud MARKUN, 2002,

77)”.

Com o falecimento da esposa, Lula resolveu sair de sua casa para não ter

lembranças que o fizessem lamentar a morte de Lourdes. Então ele vendeu a casa e

alugou uma quitinete – quarto-e-sala – onde passou a morar com sua mãe e sua irmã

Tiana, no mesmo Parque Bristol. “Durante seis meses, manteve total distância das

mulheres. Depois radicalizou e saía cada vez com uma moça diferente (MARKUN,

2002, 81)”.

15 Lula ficou deprimido e nem saia de casa – e mesmo passados 30 anos da tragédia, ele continuaria indo às lágrimas toda vez que falava sobre o assunto do falecimento trágico de sua primeira esposa. “Todos os domingos, ia ao cemitério colocar flores no túmulo da mulher (MARKUN, 2002, 81)”.

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Depois que eu fiquei viúvo eu passei três anos sem namorar. Depois disso eu fiquei muito namorador, eu fiquei querendo namorar, eu fiquei querendo namorar com todo mundo. Eu queria namorar todo dia e de preferência namorar com pessoas diferentes. Então fiquei assim meio (...) muito namorador (PARANÁ, 2003, p.95).

Mas esse clima de namorador estava com os dias contados após conhecer e se

apaixonar pela inspetora de ensino Marisa Letícia Casa.

Certa vez Lula, ao utilizar o serviço de táxi, conheceu “seu Cândido”, um taxista

que havia perdido seu filho num assalto na praça de São Bernardo do Campo. Cândido,

que começou a levar Lula, eventualmente, contara a sua história ao sindicalista e

comentara também que seu filho, ao falecer, deixara a viúva, Marisa, uma mulher linda,

e seu neto.

Marisa, semanas depois, precisou ir ao sindicato, buscar um atestado de

invalidez para o irmão com problemas mentais. “Como responsável pela Previdência

Social, Lula atendia aposentados, doentes e viúvas, e estabeleceu uma regra não escrita

para seus auxiliares: chamarem por ele, caso surgisse uma viúva ajeitada (MARKUN,

2002, 82)”.

Nessa brecha de amigos, Lula conheceu Marisa e soube agir rápido para

conquistar sua futura esposa. Pediu o telefone dela, pois disse que precisaria estudar o

caso, já que a lei havia mudado.

Na realidade, a lei havia mudado, mas o sindicato já tinha em mãos como

resolver esse problema sem maiores complicações. Lula soube associar a situação à

nora do seu Cândido, a viúva Marisa, que precisava resolver a questão privado do

irmão.

Com o telefone em mãos, Lula partiu para a conquista, foi até a casa dela, onde

vivia com a mãe. Marisa, ao receber Lula, foi explicando que estava namorando e que

seu namorado estaria chegando a qualquer momento. Mas Lula, já estava convencido de

sua decisão de querer conhecê- la melhor e começar a namorar, argumentou: “Olha, não

tem essa de ‘meu namorado vai vir’. Ele vai vir e você vai ter que dispensar ele, porque

eu vou ficar aqui. Eu vim aqui para a gente começar a namorar” (LULA apud

MARKUN, 2002, 83).

Deu certo. Eles começaram a namorar e, depois de sete meses juntos, se casaram

numa singela comemoração, com um almoço entre os padrinhos, os noivos e dona

Lindu. A discreta cerimônia no civil foi realizada em 1974.

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“Lula assumiu Marcos, seu enteado de três anos, como se fosse seu filho

legítimo. Marisa continuou trabalhando na secretaria da escola e, nove meses após a

cerimônia, nasceu Fábio Luiz, o primeiro filho do casal (MARKUN, 2002, p.84).”

Paralelamente à vida de noivos do casal, durante o namoro entre Lula e Marisa,

acontecia o nascimento da primeira filha de Lula, com uma ex-namorada, Miriam

Cordeiro.

A filha de Lula nasceu às sete da manhã do dia 08 de março de 1974. Junto com sua irmã Maria, ele foi ao hospital, pagou as despesas do parto e depois registrou a criança com o nome escolhido pela mãe – Lurian, mescla de Lula e Miriam. Segundo Maria, o irmão quis pagar inclusive pensão para Miriam, que não aceitou e acabou impedindo o contato de Lula com Lurian, assim que a criança completou seis meses (MARKUN, 2002, p.84).

Antes de Lula ganhar as eleições do sindicato em 1975, como presidente, já

havia passado por outros setores nos anos anteriores, amadurecendo o entendimento

sobre as funções reais do sindicato e originando novos ideais de sindicalismo, que

marcaram os anos setenta.

Em abril de 1972, Lula deixou a produção da fábrica Villares para assumir a

diretoria 16 do sindicato, como diretor17. Ele cuidava da parte da Previdência Social, do

Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), orientando os funcionários que

tinham dúvidas sobre as questões relacionadas a esses assuntos.

Em 1974, Lula ajudou a realizar o primeiro Congresso dos Metalúrgicos, e

comenta que foi uma época muito delicada, porque havia interferência do DOPS18,

havia ingerência do delegado regional do trabalho, pois, para se discutirem os

problemas da categoria, a ditadura militar realizava a ronda sobre os assuntos a debater

e demais decisões a serem aprovadas no debate sindical (PARANÁ, 2003, p.98-99).

Com a entrada da nova equipe na diretoria do sindicato, em 1975, deu-se a

marca do chamado “novo sindicalismo brasileiro”, desenraizando a questão mais

16 A diretoria do sindicato, na época dos anos setenta, era dividida em 24 diretores, sete efetivos, três do Conselho Fiscal e o restante eram suplentes. Entre 1968 a 1972, Lula ficou como suplente, portanto trabalhava normalmente na produção e ajudava nas assembléias e discussões sobre o sindicato. 17 Lula começou a trabalhar no departamento jurídico, teve que realizar cursinhos de aperfeiçoamento sobre “previdência”, “fundo de garantia” e “sindicalismo”. 18 DOPS – Delegacia de Ordem Política e Social, instituição idealizada pelo Regime Militar Brasileiro (1965-1985) para fins de fiscalizar as oposições políticas ao regime. Teve origem no Estado Novo, em que passou a cuidar da repressão política, veio das ramificações do Deops – Departamento Estadual de Ordem Política e Social, criado pela Lei nº 2.034 de 30 de dezembro de 1924, que era encarregado de cuida da segurança do Estado, mais especificamente sobre as questões ligadas ao sindicato, ao realizar um boletim impresso, em 1970, com reportagens e matérias dizendo que era preciso jogar duro com a classe patronal, já era razão para que no dia seguinte o DOPS interrogasse a diretoria do sindicato. “Uma vez o DOPS queria caçar a diretoria do sindicato porque a gente queria fazer uma noite de vigília (...) (LULA apud PARANÁ, 2003, p.103)”.

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voltada ao assistencialismo dos operários para um sindicato formador de direitos

inerentes às profissões.

Começamos a abrir o sindicato para debates que até então não havia. Aí já tinha uma escola funcionando, já formava mais peão. Os caras iam amadurecendo. A gente ia muito na porta de fábrica, aí os caras já vinham conversar aos sábados, nos dias de semana à noite. Nós começamos a criar uma dinâmica na categoria de forma que o sindicato fosse um instrumento do trabalhador mesmo. Foi um momento muito rico (LULA apud PARANÁ, 2003, p.102).

Na posse do sindicato como presidente, em 197519, Lula pegou o microfone pela

primeira vez. O discurso que realizou foi escrito pelo doutor Maurício, amigo e

“orientador” de Lula. “Aquele discurso que li (...) fazia a crítica do capitalismo e fazia

crítica ao socialismo também, sem a noção que a gente tem hoje dos efeitos danosos de

qualquer que seja o regime que não tenha liberdade (LULA apud PARANÁ, 2003,

p.102).”

Nessa primeira vez, portar o microfone foi difícil para Lula, ele comenta que

tremia muito e quase não conseguia ler na íntegra o discurso (PARANÁ, 2003, p.102).

Esse estado de nervosismo esteve com ele também na primeira vez em que foi dar

entrevista para a TV20. Tremia, suas pernas tremiam muito, e foi obrigado a pedir para

permanecer sentado enquanto a entrevista decorresse.

Ao realizar modificações na presidência, entre 1975 e 1978, Lula se situou na

arena sindical como um marco nas gestões sindicais e, em fevereiro de 1978, reelegeu-

se sua chapa, só que nessa gestão ele colocou outros membros mais ligados às funções

que exerceriam e deixou de lado 14 membros-diretores que não fizeram, na gestão

anterior, o possível para o crescimento do novo sindicalismo brasileiro (MARKUN,

2002, p.119). A vitória teve 25 mil votos, ou seja, 97,3% do total de votantes.

Na gestão de 1978, o sindicato começaria a tomar partido mais firmemente em

relação a candidatos ao Senado Brasileiro. Nas eleições de 1978, Lula escolheu seu

primeiro candidato, em um apoio formal, Fernando Henrique Cardoso – FHC.

19 Cerca de dez mil pessoas compareceram à cerimônia de posse de Lula na presidência do Sindicato dos Metalúrgicos, entre elas autoridades públicas, como o comandante do II Exército, e representantes dos governos federal, estadual e municipal. Também compareceram sua mãe e sua esposa. 20 A primeira entrevista de Lula para um canal de TV foi para a Vox Populi, da TV Cultura de Jornalismo, em 1978.

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A escolha não foi automática21, visto que o resultado se deu do empenho do

sociólogo Francisco de Oliveira22, que foi até São Bernardo pedir o apoio do sindicalista

e de sua categoria, para seu ex-aluno e amigo FHC (MARKUN, 2002, p.121).

Nessa época, o sindicato estava com muita visibilidade midiática e também

passava por um momento de fortalecimento e independência. Mesmo com o

crescimento sindical, Lula continuou morando na pequena casa no Jardim Lavínia, em

São Bernardo do Campo, comprada em 1976, com financiamento do BNH.

O endereço estava na agenda de todas as redações: seu mutuário era a grande novidade no mundo sindical, até então dividido entre a turma do Partidão, que pregava a unidade sindical e o trabalho nas entidades existentes, e os católicos e marxistas independentes, que batalhavam para criar sindicatos livres a partir de comissões de fábricas (MARKUN, 2002, p.131).

Em julho de 1978, nasceu seu segundo filho com Marisa, Sandro Luiz. E em

outubro aconteceu o 3º Congresso dos Metalúrgicos de São Bernardo, marcando um

momento histórico importante das conquistas sindicais. Foi nesse encontro que se

reuniram dirigentes de vários setores, bem como integrantes das oposições sindicais. No

final do congresso, todos aprovaram a idéia de criar uma Central Única dos

Trabalhadores (MARKUN, 2002, p.131).

Depois do momento de auge na vida de Lula na área sindical, em 1979, estavam

por vir momentos de dificuldade em negociações com o governo e com os empresários

no ramo metalúrgico. Nesse ano, ocorreu a maior paralisação de operários vista em

greve no Brasil. Foram cerca de 350 mil metalúrgicos, 29 sindicatos, inclusive o de São

Paulo (MARKUN, 2002, p.135).

Entretanto, o Brasil ainda passava pelo árduo período do Regime Militar. O

governo e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Fiesp, não acatando a

proposta da diretoria do sindicato e da greve dos metalúrgicos, ocasionaram a detenção

de mais de 170 trabalhadores. O sindicato dos metalúrgicos recebeu intervenção do

regime e teve que encerrar o trabalho sindical, por saírem da legalização de não

terminarem com a greve.

21 Lula, em conversa com FHC, propôs diretrizes para seu programa, como o direito de greve, a liberdade de organização sindical e a definição de que os salários não causavam inflação, como havia rumores. Eles também combinaram que o advogado do sindicato, Maurício Soares, seria o suplente de FHC. E como resultado deste “acordo”, FHC encaminhou à direção do MDB (único partido político de oposição ao do regime militar – Arena) uma proposta de emenda constitucional restabelecendo o direito de greve. 22 Professor de sociologia aposentado da USP, que foi um dos mentores na formação do Partido dos Trabalhadores - PT.

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Entretanto, a mídia já havia descoberto Lula, como ícone da força sindical, bem

como outros setores de influência política, tais como líderes estudantis, professores

politizados, líderes religiosos da Igreja Católica, artistas e intelectuais.

A greve de 1979 teve tamanha repercussão que muitos setores da nação

aproveitaram o cenário de mobilização, em que os metalúrgicos emergiam em São

Paulo, para protestarem contra o regime e pedirem a volta da democracia.

No dia em que foram detidos os 170 trabalhadores, no final da tarde, cerca de

cinco mil pessoas se reuniram num ato de protesto no vão livre do prédio da Câmara

Municipal de São Paulo.

Não havia sistema de som e pouca gente escutava os oradores, mas os manifestantes de dividiram em dois grupos. Os mais exaltados queriam levar o povo no grito até as ruas e derrubar a ditadura. Estudantes da PUC e da Fundação Getúlio Vargas declararam greve em sinal de protesto. Outros, mais prudentes, defendiam que a mobilização começasse nas entidades (MARKUN, 2002, p.147).

Portanto, as greves haviam ultrapassado o campo dos metalúrgicos:

Há duas semanas, os funcionários municipais de São Paulo estavam parados e, em Brasília, mesmo com o sindicato sob intervenção, 11 mil professores não davam aulas. No dia seguinte, motoristas e cobradores dos ônibus da Companhia Municipal de Transportes Coletivos de São Paulo literalmente paralisaram a cidade (MARKUN, 2002, p.151).

Com isso, no final da semana, sob rojões e batucada como trilha sonora, o

interventor Guaracy Horta devolveu as chaves e os papéis do sindicato.

Entretanto, nesse mesmo ano, houve outras greves, as quais eram vistas pelo

regime como posturas ilegais do sindicato e dos operários.

No ano de 1979, Lula teve contato com intelectuais, pessoas ligadas a

comunidades eclesiais de base (da Igreja Católica) e outras lideranças políticas que

almejavam fundar um partido exclusivo dos trabalhadores. Lula, ao conhecer essa

proposta, começou a levá-la adiante, propondo reuniões, jantares, encontros para que

esse partido saísse do papel. Em 10 de maio foi divulgada a “Carta de Princípios” que,

dentre outros elementos, retratava de maneira denunciatória a pobreza e afirmava que

ela não seria resolvida sem o concurso decisivo e organizado dos trabalhadores. O

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primeiro comício do partido recém-criado – Partido dos Trabalhadores (PT),23

aconteceu no dia 07 de outubro de 1979, em Feira de Santana, na Bahia.

Mas em 1980 a situação é outra para Lula. Todos os passos que ele dava eram

bem observados e detalhados pelo regime militar, até ele ser cassado e preso, como

afirma a esposa, Marisa,

a prisão de Lula foi assim: já havia vários dias, várias semanas, que a casa estava sendo vigiada por policiais. A gente sabia disso. Na frente da minha casa tinha um morro. Eles ficavam muito em cima daquele morro com um binóculo olhando minha casa, vendo quem entrava e quem saía. Depois de um tempo eles já tinham o esqueminha deles montado, com nossos horários, sabiam como a casa funcionava. Começaram a se aproximar. Ficaram a três, quatro casas acima da minha. Então de lá eles também ficavam olhando. Vinham naquela Veraneio deles, ficavam quatro ou cinco dentro daquela veraneio o dia inteiro. Só se revezavam para comer. Era uma tortura, um carro parado perto, com gente sempre olhando o que você fazia, onde você ia (MARISA apud PARANÁ, 2003, p.345).

A prisão de Lula aconteceu na manhã de sábado, dia 19 de abril, de 1980. Uma

camionete C-14 estacionou diante do sobrado em reformas, que era a casa dele.

Desceram oito homens de blusão de couro do carro, dizendo que procuravam o senhor

Luiz Inácio, e afirmando que tinham um mandado de Lei de Segurança Nacional.

Lula ficou preso até o dia 20 de maio daquele ano. Saiu no dia 12 de maio, por

pedido de sua esposa ao chefe de polícia, para acompanhar o enterro de sua mãe e

voltou à prisão após o enterro. Ao completar 31 dias de cadeia, ele saiu e a primeira

atitude que tomou ao chegar a sua casa foi soltar os passarinhos que mantinha

engaiolados (MARKUN, 2002, p.170).

Logo quando saiu da prisão, Lula assumiu o comando da Executiva Nacional do

PT, em 26 de maio de 1980.

Para criar um partido, Lula sabia que teria que “(...) organizar comissões em pelo

menos 20% dos municípios de nove estados, condição mínima para obter o registro

provisório. Foi esse desafio que ele encarou, percorrendo o país de norte a sul

(MARKUN, 2002, p.189)”.

E, no escasso tempo livre, ele continuava a liderar o sindicato de São Bernardo,

junto com a diretoria cassada. O Ministro do Trabalho acabou escolhendo, para

23 O PT foi o partido pelo qual Lula candidatou-se à Presidência em 1989, 1994, 1998 e 2002, quando se elegeu. Ele permanece no partido, mesmo com passagens turbulentas nos anos 2004-2006, bem como

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substituir a diretoria cassada, um ex-sindicalista, da época em que Lula estava

começando no sindicato, amigo do seu irmão Frei Chico. O nome indicado e que

assumiu a junta governista foi Afonso Monteiro da Cruz. Portanto, com esse velho

parceiro influindo no sindicato, Lula ficou mais tranqüilo na “aventura partidária” sem

perder suas raízes originais, o sindicalismo e a vida operária (MARKUN, 2002, p.189).

Na primeira convenção oficial do PT24 em Brasília, no dia 27 de setembro de

1981, Lula leu o seguinte discurso, que definia os objetivos de seu partido:

“– Os trabalhadores são os maiores explorados da sociedade atual. Por isso sentimos na própria carne, e queremos, com todas as forças, uma sociedade que, como diz o nosso programa, terá que ser uma sociedade sem explorados e exploradores. Que sociedade é esta senão uma sociedade socialista? Preocupa-nos, entretanto, se um militante veste, por baixo de nossa camisa, outra camisa. Nunca pedimos, nem pediremos atestado ideológico a ninguém. Interessa-nos que companheiros não queiram fazer de nosso partido massa de manobra de suas propostas. Não aceitamos jamais que os interesses dessas tendências se sobreponham, dentro do PT, aos interesses do partido (LULA apud MARKUN, 2002, p.191).”

Em 1982, haveria eleições diretas para vereadores, deputados estaduais e

federais, senadores, governadores e prefeitos (salvo os das capitais e áreas de

segurança), e o PT concorreria às suas primeiras eleições. O nome de Lula encabeçava

as quatro chapas na pré-convenção do partido. Logo foi aclamado como candidato a

governador por São Paulo.

O principal slogan de Lula era: vote três, o resto é burguês!25 (MARKUN, 2002,

p.195).

Lula ficou em quarto lugar nas eleições26, com cerca de 1.144.648 votos, mas o

PT conseguiu sua entrada no congresso nacional. Ele elegeu oito deputados federais:

seis por São Paulo, um pelo Rio e outro pelo Acre, conquistou duas prefeituras –

Diadema, no ABC, e Santa Quitéria, no Maranhão (MARKUN, 2002, p.195).

A partir daí, Lula começou a ter visibilidade de que o processo político é lento

em se tratando de opinião pública e teve sua primeira vivência de que seria preciso

demarcar seu território como notável no campo político, aumentando a legenda do

depois do “racha” que levou alguns membros mais esquerdistas do PT a saírem e formarem um novo partido, o PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) em meados de 2003. 24 O PT já havia se instalado em 16 estados. 25 Três era o número do PT naquela época. 26 O governador do Estado de São Paulo, Montoro (MDB), se elegeu com 5.209.952 votos como slogan: “o senador dos trabalhadores”. Em segundo ficou Reynaldo de Barros, do PDS, com 2.728.732 votos. O terceiro foi Jânio Quadros, que obteve 300 mil votos a mais que Lula. Rogê Ferreira ficou em quinto e último lugar com cerca de 100 mil votos.

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Partido, e se aperfeiçoando no tratamento com a mídia, principalmente no que se referia

à publicidade de sua imagem.

Lula acompanhou de perto e apoiou, com o PT, a campanha das “diretas-já”,27

que objetivava buscar entendimento junto à opinião pública da necessidade de se

realizarem as eleições diretas em todos os níveis, principalmente para pressionar o

regime com o maior número de pessoas conscientes do ato.

Nessa época, Lula conheceu José Dirceu, que mantinha um movimento

intitulado Articulação. No final de abril de 1983, José Dirceu entrou para o Partido dos

Trabalhadores e trouxe consigo membros do seu movimento, demarcando um

fortalecimento da esquerda no PT (MARKUN, 2002, p.200).

A campanha das “diretas-já” teve um importante respaldo na sociedade, levando

mais de 30 mil pessoas às ruas em Curitiba, no dia 12 de janeiro de 1984, 250 mil

pessoas em São Paulo, na praça da Sé, no dia 25 de janeiro, aniversário da cidade. Mas

a votação no congresso não foi favorável, faltaram 22 votos, daqueles 112

parlamentares que não compareceram à votação da Constituinte28 (MARKUN, 2002,

p.203).

Nas eleições de 1986, Lula venceu como o deputado federal mais votado em

todo o país, com 651.763 votos.

Eleito líder da bancada, não teve uma participação relevante nem na Câmara, nem na Constituinte. Esteve presente em 95% das votações. Votou a favor da limitação do direito de propriedade privada, da legalização do aborto, da estabilidade no emprego, da jornada semanal de 40 horas, do voto aos 16 anos, da limitação dos juros em 12% ao ano, da anistia a micro e pequeno empresários, da legalização do jogo do bicho e da desapropriação de áreas produtivas (MARKUN, 2002, p.215).

Lula não gostou de ser mais um parlamentar entre os 500 no Congresso e, em

outubro de 1986, tentou renunciar ao mandato, mas desistiu, “(...) diante do argumento

de que isso o prejudicaria diante de seus adversários na disputa presidencial, já que

27 O recém-eleito deputado mato-grossense Dante de Oliveira, de 32 anos, do PMDB, apresentou, em fevereiro de 1983, no início da sessão legislativa, uma emenda constitucional que restabelecia as eleições diretas, e teria fixada a data de 15 de novembro de 1984 para a escolha do primeiro presidente eleito pelo voto popular, em 25 anos. Em abril do mesmo ano, o diretório nacional do PMDB resolveu lançar uma campanha pelas eleições diretas, chamando-a de “diretas-já”. 28 O senador Fernando Henrique Cardoso, três dias após a derrota das “diretas-já”, incentivou os parlamentares, lembrando que a mudança para votos populares deveria então ocorrer pelo único método restante: através do colégio eleitoral, apoiando um nome, com o maior número de alianças possíveis. O nome que ele sugeriu foi Tancredo Neves, que foi eleito com 480 votos, na terça-feira, 15 de janeiro de 1985, e de vice José Sarney, que acabou assumindo a presidência em decorrência da morte de Tancredo, no dia 21 de abril.

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Ulysses, Covas, Guilherme Afif Domingos e Roberto Freire eram parlamentares e

candidatos a presidente (MARKUN, 2002, p.216)”.

Em 1989, Lula se candidatou para a Presidência da República pela primeira vez.

Aproveitou, nos dois anos anteriores, as vitórias de algumas prefeituras do PT para

alavancar sua marca de campanha eleitoral, com o slogan nos outdoors junto aos

prefeitos vitoriosos: “O Brasil vai mudar de cara, Lula presidente”.

“No início de 1989, Lula fez duas viagens e percorreu 11 países em três

continentes. Passou quase 30 dias na Europa, acompanhado por Weffort, que era

secretário-geral do PT, Aluísio Mercadante e Marco Aurélio Garcia (MARKUN, 2002,

p.223)”.

Lula, nessas viagens, manteve contato com partidos de esquerda, com

sindicalistas e setores articulados da Igreja Católica. Junto com o militante Genoino e

outros petistas, esteve em Cuba, no Chile e na Nicarágua.

A derrota anunciada dos sandistas, que buscavam se manter no poder pelo voto, e a miséria reinante impactaram os petistas, a ponto de Genoino comentar: “Precisamos repensar essa história de socialismo, Lula. Aqui não tem nem o que dividir. Para chegar ao socialismo, a gente tem de passar antes pelo capitalismo” (MARKUN, 2002, p.223).

As primeiras mudanças consideráveis na manutenção do partido foram no

sentido de reunir uma aliança de esquerda, e centro-esquerda, com o PSB (Partido

Socialista Brasileiro) e o PC do B (Partido Comunista do Brasil). Portanto, para vice.

Lula convidou o senador José Paulo Bisol, do PSDB, que conhecera durante a

Constituinte. Para aceitar o convite de Lula, Bisol (advogado gaúcho de 40 anos) teve

que deixar o partido tucano e se filiar ao PSB. Deu certo.

O jingle de Lula, composto por Hilton Acioly (ex-parceiro de Geraldo Vandré),

nessa eleição era: “Lula lá, brilha uma estrela. Lula lá, cresce a esperança!”. A equipe

de televisão era comandada pelo publicitário Paulo Tarso Santos, filho do ex-ministro

da Educação no Governo Jango, “(...) que abandonara o emprego na agência Denison

para pilotar uma estrutura precária”.

No dia 15 de novembro de 1989, Lula teve 17,2% dos votos, ganhando por 500

mil votos do terceiro colocado, Brizola, do Partido Democrata Trabalhista (PDT).

Fernando Collor de Mello, do desconhecido Partido da Renovação Nacional (PRN)

obteve 30,5% dos votos, indo para o segundo turno com Lula.

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Para a batalha do segundo turno, Lula foi em busca de apoio de Brizola e de

Covas, o qual representava a cúpula tucana. Depois de muitos desacertos e reuniões

entre os partidos, eles (PDT e PSDB) aceitaram apoiar o PT.

Mas o cenário em prol de Collor era bem maior. Começando com o material que

foi ao ar sobre o desleixo de Lula em relação a sua primeira filha, Lurian, com a

enfermeira Mirian. O Jornal do Brasil realizou uma reportagem com tom de

denuncismo, de que Lula não assumiu sua filha e de que nunca falara dela para a

imprensa. A partir desse depoimento de Miriam ao jornal, a equipe29 do concorrente de

Lula comprou as quatro fitas VHS do jornal e editaram o material para ir ao ar no

horário eleitoral gratuito. “O efeito foi devastador, embora Lula faça questão de dizer

que ele mesmo pouco se abalou e nem viu a gravação”. (MARKUN, 2002, p.232).

Entretanto, essa não foi a única apelação publicitária que Collor explorou contra

a imagem de Lula. Segundo Markun,

Houve um comercial em que a bandeira brasileira trocava o verde e o amarelo pelo vermelho e, no programa de TV do jornalista Ferreira Neto, no SBT, o candidato do PRN afirmou que o PT pretendia confiscar as cadernetas de poupança e expropriar quartos nas casas da classe média (2002, p.233).

Moralmente desgastado, Lula, ainda tinha, nas pesquisas de opinião de voto,

cerca de 46% a 45%, e Collor com uma vantagem de dois pontos percentuais. Logo, a

decisão ficaria em torno da televisão e das possibilidades de construção de novos

escândalos envolvendo os candidatos.

No primeiro debate da TV Bandeirantes, no dia 03 de novembro, referente ao

primeiro turno, Lula saiu vencedor, diante dos concorrentes, mas no segundo debate, no

dia 22 de novembro, na mesma emissora, Lula não teve uma visibilidade tão positiva

como a de Collor. Uma pesquisa do Instituto Gallup mostrou que 41,9% dos

telespectadores haviam gostado mais do desempenho de Collor e 38,8%, do de Lula

(MARKUN, 2002, p.234).

O jornalismo da TV Globo preferiu editar os melhores trechos do debate que

dava três minutos para cada um dos candidatos, no Jornal Hoje. Mas o Jornal Nacional

29 O material foi editado pelo jornalista e marqueteiro Chico Santa Rita, segundo a jornalista Maria Helena Amaral, que pediu demissão da campanha logo após que a edição foi ao ar no programa de Collor, o irmão do candidato, Leopoldo, havia comprado a fita por 200 mil cruzados novos, o equivalente a 123 mil dólares (MARKUN, 2002, p.233).

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exibiu nova versão do material30, complicando a imagem de Lula. “Collor falava um

minuto e 12 segundos a mais que Lula e de modo mais enfático e preciso (MARKUN,

2002, p.234)”.

No sábado da véspera, quase em ritmo de votação do segundo turno, a polícia

paulista conseguiu acabar com o seqüestro do empresário Abílio Diniz, dono do grupo

Pão de Açúcar.

Alguns policiais afirmaram ter encontrado material do PT com os seqüestradores31. Várias emissoras de rádio colocaram a notícia no ar e o secretário de Segurança de São Paulo, Luiz Antonio Fleury Filho, procurou a direção de jornalismo da TV Globo dizendo que havia fortes indícios de que aquela turma tinha ligações com o PT, e perguntou em seguida se a emissora ia divulgar a informação. João Roberto Marinho, filho do dono da TV Globo, determinou que só dariam a notícia se alguma autoridade assumisse a responsabilidade pela acusação. Fleury recusou-se a falar. Houve pressão do comitê de Collor, mas a Globo não deu nada sobre o caso (MARKUN, 2002, p.234).

Já segundo Bernardo Kucinski (1998, p.112), os seqüestradores foram obrigados

a vestir camisetas do PT, para serem fotografados com as mesmas, o que teve a imagem

associada ao Partido dos Trabalhadores e ao próprio Lula, no dia das eleições, pois foi

publicado nos principais veículos de comunicação impressos, com manchetes. O jornal

O Rio Branco, do Acre, anunciou na primeira página: “PT seqüestrou Abílio Diniz”, e o

Estado de São Paulo publicou uma reportagem, também na primeira página, dizendo

que um padre simpatizante do PT fora o avalista da casa alugada pelos seqüestradores

de Diniz (MARKUN, 2002, p.235).

O cenário eleitoral de Lula estava tenso e sua imagem estava associada a

baderneiros e criminosos pelos meios de comunicação, em geral. O resultado foi a

vitória de Fernando Collor de Mello por 42,75% contra 37,86% de Lula.

Lula não desistiu do sonho de se tornar presidente do país. Nas eleições de 1994,

ele candidatou-se novamente, com um PT mais maduro e um Lula menos radical sobre

o projeto do partido.

30 Na época, o produtor do vídeo era Francisco Vianey Pinheiro, que reclamou dessa edição do debate para o Jornal Nacional e acabou sendo demitido pela emissora. A edição desse debate gera ainda muita polêmica entre a classe jornalística, sobre a postura ética de edição e a questão da parcialidade jornalística em prol de interesses privados e/ou políticos. 31 Os seqüestradores eram chilenos, argentinos e um brasileiro com passagem por grupos de esquerda. Eles já tinham passagem pela polícia por ações do gênero, com o pretexto de financiar a guerrilha da Nicarágua.

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Lula começa as eleições de 94 com patamar de 30% de intenções de voto32,

mesmo antes do início da campanha oficial (KUCINSKI, 1998, p.116), sem concorrente

aparente.

Entretanto, as grandes centrais do empresariado, como Febraban (dos bancos) e

FIESP (da indústria), estão abalados com a experiência frustrante de Collor e

resolveram traçar um perfil33 de um anti-Lula ideal para convencer a grande mídia e a

população. Esse anti-Lula seria honesto, competente, sem vínculos com os esquemas

PC e com o escândalo do Orçamento (KUCINSKI, 1998, p.117). E que resolveria o

problema imediato da inflação e da estabilidade econômica.

No mesmo ano de 1994, Itamar Franco, que assumiu a presidência como vice de

Collor, após o impeachment em 1992, convidou Fernando Henrique Cardoso para

assumir o Ministério da Fazenda. FHC estipulou planos e metas para estabilizar a

moeda e, logo no começo de 94, lançou o Plano Real I, que a curto prazo resolveu o

problema inflacionário, dos juros altos e da instabilidade monetária. Com isso, nascia

em 1994 o concorrente intelectualizado, o “anti-Lula ideal” que faria competição com

os 30% de Lula.

Lula manteve Bisol como vice, que o acompanhara na eleição anterior. E

também repetiu o nome da coligação “Frente Brasil Popular”.

A candidatura Lula, nessa eleição, foi abalada em especial por três incidentes. O

primeiro foi a questão do conforto que o Plano Real possibilitou, tendo congelado a

inflação e aumentado o poder de compra. O segundo, não menos importante, foi a

desonestidade e a corrupção associadas à imagem do vice de Lula, José Paulo Bisol.

Segundo Kucinski, ele cometeu um erro concreto, assinou um pedido de verbas para

uma ponte no mesmo município em que tem uma fazenda. E a Folha de São Paulo

“montou uma acusação contra Bisol, destruindo sua reputação e provocando grande

dano à candidatura Lula (KUCINSKI, 1998, p.123)”.

O terceiro episódio marcante foram os boatos de que o PT iria confiscar a

poupança (tal como Collor fizera em seu governo), implantados na mídia de massa.

32 O campo político era bastante propício ao crescimento da imagem positiva do PT, em razão de este ter sido o grande partido de oposição do governo Collor e de tê-lo denunciado por improbidade administrativa, conduzindo à Comissão Parlamentar de Inquérito do Orçamento. 33 Das eleições de 1994 em diante, aderiu-se, no campo de assessoria política, ao método do trimming, pelo qual o candidato é construído pelo marketing político (fala o que a pesquisa diz que o eleitor quer ouvir), técnicas modernas de persuasão advindas das práticas das campanhas estadunidenses.

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O Diretor do Banco Central, Gustavo Franco, dissemina, por meio da agência tucana Free Press, que o “PT vai confiscar a poupança”. Tucanos, entre os quais Alain Tourraine e Hélio Jaguaribe, disseminaram a tese de que uma vitória do PT levaria o país ao caos e, numa extrapolação deste raciocínio, começa a desenhar o quadro de que FHC é o bem e Lula o mal. É a demonização de Lula (KUCINSKI, 1998, p.128).

Em contraponto a esses três momentos marcantes na desestabilização da

campanha petista à presidência, ocorreu um fato favorável a Lula, mas que acabou não o

ajudando nas pesquisas de intenção de voto.

No dia 1º de setembro, o Ministro da Fazenda do governo Itamar, que entrou no

lugar de FHC para que este pudesse concorrer à eleição, Rubens Ricupero, foi dar uma

entrevista ao vivo para o Jornal Nacional, da Rede Globo. A entrevista aconteceu

normalmente e Ricupero ficou no estúdio após a gravação para conversar com o

repórter Carlos Monforte, que o entrevistou e é seu contraparente. Nessa conversa

informal, Ricupero comentou que não havia escrúpulo, “o que é bom a gente fatura, o

que é ruim a gente esconde”, sobre o índice elevado de preços que media a inflação. Já

não bastando, ele comentou que suas aparições na mídia serviam de propaganda

subliminar para o candidato governista (MARKUN, 2002, p.257).

O que nem Ricupero nem Monforte sabiam é que o bate-papo estava sendo

exibido pelo sinal da antena parabólica para quem estava sintonizado na Globo e

conseguia captar o sinal, pois a conversa estava sendo gravada por descuido do técnico.

Entretanto, a única forte repercussão foi o afastamento, por renúncia, de

Ricupero do governo Itamar e nada mais. O tema foi logo esvaziado e o escândalo

deixado a escanteio pela mesma mídia que massacrara Lula.

Lula perdeu a eleição de 1994, no primeiro turno, por 27 milhões de votos contra

54,3 do tucano (MARKUN, 2002, p.259).

Em 1998, o quadro eleitoral não foi diferente para Lula. Ele perdeu no primeiro

turno com 21 milhões de votos (quatro milhões a mais que 1994), contra 35 milhões de

votos de FHC.

Em uma conversa com os amigos e militantes, Genoino, Eduardo Suplicy,

Mercadante, Tarso Genro e José Dirceu, Genoino comentou a mensagem final das três

últimas eleições:

O PT e o Lula têm algo inédito na história dos partidos de esquerda no mundo: a maior liderança popular com 30% dos votos e uma barreira para crescer. É uma força brutal de arrancada com uma laje impedindo a passagem. Temos que saber quebrar essa laje ou pensar em outro projeto. (GENOINO apud MARKUN, 2002, p.294).

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O que Genoino não afirmou literalmente é que a laje dos 30% é o preconceito

enraizado da mídia tradicional.

A partir dessa constatação, o PT mudou em relação ao cuidado com sua imagem,

em especial à de Lula, bem como com alguns projetos econômicos e sociais que

dificultavam sua aceitação por grupos de empresários ligados a grandes investidores

nacionais e internacionais. Para começar a mudança, a equipe de Lula contratou o

publicitário Duda Mendonça, que já tinha larga experiência no marketing político

brasileiro, realizando campanhas de Maluf entre outros vários nomes políticos34.

O segundo passo foi alavancar alianças com partidos de oposição, esvaziando as

possibilidades de que ocorressem incidentes iguais aos das eleições anteriores.

Lula convidou José Alencar, do PL (Partido Liberal)35, para ser seu vice. Ele

aceitou.

No primeiro turno das eleições de 2002, Lula dormiu mal. Frei Betto, que esteve

com ele o tempo todo, comentou que,

Foi uma noite mal dormida a de 5 para 6 de outubro. Por causa daquela ansiedade que toma conta de quem participa de uma grande disputa, como estudantes à espera do resultado do vestibular. De manhã, após receber o telefonema de Cristovam Buarque comunicando que vencera o pleito entre os brasileiros radicados na Nova Zelândia, Lula pediu a um amigo massagista para aliviar-lhe a tensão. Saiu para votar e retornou ao seu apartamento (BETTO apud MARKUN, 2002, p.345).

Lula conseguiu chegar ao ponto máximo da política nacional. Havia quebrado a

tal laje dos 30%, recebeu 39.443.765, ou 46,44% dos votos. Resultado, segundo turno

(MARKUN, 2002, p.346).

No último programa eleitoral de Lula, antes do segundo turno, os concorrentes

do primeiro turno, Ciro e Garotinho, expressaram seu apoio ao candidato. Duda

Mendonça encerrou esse último programa com ilustres participações, de artistas, dos

34 Uma leitura abrangente e envolvente sobre a formação do marketing político de Lula por Duda Mendonça é a dissertação: MARCOS, Patrícia Sheila Monteiro Paixão. As estratégias do Marketing de Lula de 2002, na cobertura realizada pela Folha de São Paulo: 2006. 196 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) – Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, colabora para o entendimento das diversas fases desse processo do marketing político no Brasil. 35 O Partido Liberal foi criado em 1985 por Álvaro Valle, um ex-udenista que voltara ao parlamento pela Arena e morreu em 2000. Depois disso, sob o comando de Valdemar Costa Neto, outro ex-arenista, que renunciou em 2005 ao cargo de deputado e foi acusado de formação de quadrilha e corrupção, o PL tornou-se reduto dos bispos e pastores da Igreja Universal do Reúno de Deus.

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antigos concorrentes e de líderes petistas acenando lenços brancos ao som da música

“está chegando a hora”.

Lula venceu o segundo turno das eleições de 2002, com 61,27% dos votos

(52.793.264), contra 38,73% de Serra (33.370.739) (MARKUN, 2002, p.348).

Lula era o novo Presidente da República brasileira em janeiro de 2003.

2.1 RESGATE HISTÓRICO DA POLÍTICA NAS ELEIÇÕES DE 2002

"O mundo é um lugar perigoso de se viver,

não por causa daqueles que fazem o mal,

mas sim por causa daqueles que observam e

deixam o mal acontecer".

Albert Einstein

O ano de 2002 começa com o Ministro da Saúde José Serra anunciando a sua

candidatura, em janeiro, pelo PSDB, após vários adiamentos e num cenário em que a

epidemia da dengue atingia o seu ápice no país, o que lhe provocava várias críticas, ao

mesmo tempo em que recebia elogios por suas outras ações enquanto à frente do

ministério, avaliada como positiva na maioria das vezes em que citada.

No final de fevereiro, Serra deixou o cargo de Ministro da Saúde ao seu assessor

Barjas Negri, e reassumiu a cadeira de Senador, para poder concorrer à Presidência.

Esses adiamentos aconteceram devido a uma rede de intrigas interna – em dezembro de

2001, Tasso Jereissati desistiu de sua candidatura, acabando com a disputa interna no

PSDB (Dissidência interna, 25 de fev. 2001, versão on- line), aos baixos índices de

popularidade e aos altos índices de Roseana Sarney nas pesquisas. A candidatura tucana

correu o risco de nem mesmo sair.

O candidato petista Luiz Inácio Lula da Silva oficializou sua campanha à

imprensa em outubro de 2001, mas desde a derrota de 1998 já buscava se manter como

próximo candidato à Presidência pelo Partido dos Trabalhadores. Em entrevista ao

jornalista Ricardo Kotscho (Folha de São Paulo, 17 de jun. 2001, versão on- line), Lula

lembrou que,

(...) o PT ficou sempre em segundo lugar, lutando contra as maiores alianças políticas de direita já feitas no Brasil. E, de 1989 para cá, com tudo o que eles fizeram de alianças políticas e de acertos, individualmente não tem nenhum

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candidato mais forte do que o candidato do PT. A diferença fundamental é que, desta vez, o PT é a bola da vez. Nunca as chances de ganhar uma eleição estiveram tão fortes como agora.

Definido como o único candidato do PT que teria alguma chance de chegar ao

poder, Lula impôs várias condições ao assumir a candidatura: dessa vez ele queria que a

campanha fizesse jus a sua imagem, ele queria um PT diferente daquele que existia até

então, afinal, para ele, essa seria a quarta e última tentativa de ganhar as eleições

presidenciais. Foi sob o comando do publicitário Duda Mendonça que as mudanças

começaram, tanto para o partido, como para o candidato e os militantes do PT.

O discurso foi bastante modificado. Foram apagadas referências que ligavam o

partido às suas raízes socialistas, empresários – que eram tidos como adversários –

começaram a ser procurados para a formação de parcerias, o plano de governo previa

medidas que teriam efeito imediato na população e as declarações nos discursos não

eram tão radicais quanto aos cenários político e econômico atuais do país. Lula

justificou à mídia nacional que esse efeito “calmatório” nas atitudes do partido se devia

ao amadurecimento pelo qual todos haviam passado. Nas mãos de Duda Mendonça, a

campanha mostrava um Lula muito diferente daquele que disputou as últimas três

eleições. Dono de sua campanha, ele mesmo escolheu toda a equipe, seu discurso ficou

moderado e parecido em algumas partes com os pronunciados por José Serra e por Ciro

Gomes, e a imagem passada era a de que Lula era um estadista, como os outros

candidatos.

A candidatura de Roseana Sarney foi fruto das divisões na base governamental e

nasceu para o público na televisão em 2001. Entre outubro de 2001 e janeiro de 2002, a

publicidade do PFL a apresentou como a mulher que superou os preconceitos de uma

sociedade machista para liderar a reforma de um estado pobre e carente de mudanças

sociais. Seu tema foi o combate às desigualdades e, desde o início de sua campanha, ela

só fazia subir nas pesquisas de intenção de voto.

Outro candidato à eleição para a Presidência em 2002 foi Anthony Garotinho, do

PSB, que começou a subir nas pesquisas quando apareceu na TV no horário eleitoral

com sua esposa e seus nove filhos, apostando na bandeira de diminuição da violência.

Desde o começo, Garotinho tinha uma base forte entre os evangélicos – que

representam 20% do eleitorado brasileiro – e quase metade das intenções de voto no Rio

de Janeiro – terceiro maior colégio eleitoral do país, como afirma o TSE. Em abril de

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2002, Garotinho deixou o governo do estado do Rio para sua vice, Benedita da Silva,

para poder dedicar-se ao fortalecimento de sua campanha.

O candidato Ciro Gomes conseguiu manter as alianças da Frente Trabalhista,

formada por PPS, PTB e PDT, conquistando uma candidatura de maior força.

Entre as “brigas presidenciais”, a população brasileira teve ao menos uma boa

notícia: o racionamento de energia que perdurava havia nove meses, fora suspenso pelo

governo a partir de 1º de março de 2002. Fernando Henrique fez questão de dizer que a

decisão não era uma resolução eleitoreira, mas técnica.

Uma recente pesquisa mostrou que quase 80% das pessoas pretendem manter ou mesmo aumentar a economia de energia elétrica. Refleti muito sobre o tema e me perguntei: se o povo se dispõe a manter voluntariamente a economia de energia, por que deveria o governo obrigá-lo a fazer isso? Por isso, decidi terminar o racionamento obrigatório a partir de 1º de março, eliminando também as sobretarifas. Sairemos do racionamento obrigatório para a economia voluntária. E tenho certeza de que não veremos sinais de esbanjamento de energia. Todo esse episódio mostrou que a transparência, a confiança no povo e a coragem de enfrentar os problemas sempre foram instrumentos de ação política do meu governo. (FOLHA DE SÃO PAULO, 20 de fev.2002, versão on-line).

Decisão estratégica ou não, fato é que as campanhas presidenciais foram

produzidas com a ajuda de vários publicitários, entre eles, Duda Mendonça, que cuidou

da campanha do PT, e Nizan Guanaes, primeiro pelo PFL de Roseana Sarney e depois,

a partir de meados de 2002, de José Serra, do PSDB. Mas apesar dos fortes ataques e

contra-ataques dos marqueteiros e demais chefes de campanhas, a primeira candidatura

a ser seriamente abalada foi a de Roseana Sarney, segunda colocada nas pesquisas.

Em 2001, cumprindo um mandado de busca e apreensão em um escritório que

trabalhava para Jorge Murad, marido de Roseana, a Polícia Federal encontrou vários

documentos que detalhavam a criação de seis empresas instituídas em 1999 no paraíso

fiscal das Ilhas Virgens Britânicas. O Ministério Público suspeitava que elas serviam

para um esquema de lavagem de dinheiro. A partir desses indícios, a PF começou a

investigar os negócios de Murad.

O Ministério Público descobriu que Murad já estava envolvido em outros

inquéritos, que investigavam desvios de milhões de reais, entre eles, um desvio de R$

44, 5 milhões, destinados a financiar uma indústria de auto peças do estado, a Usimar.

Esse financiamento foi autorizado em uma reunião do Conselho Deliberativo da Sudam,

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em dezembro de 1999, sob a presidência de Roseana. A governadora, seu marido e

outras 40 pessoas que estavam presentes nessa reunião foram denunciados por

improbidade administrativa pelo Ministério Público Federal em dezembro de 2001

(MEIRELES, Andrei; FILHO, Expedito; FURTADO, Bernardinho, 2002, p.30-31).

Em março de 2002, após um ano de investigações, a PF obteve outro mandado e

vasculhou o escritório-sede de empresas como a Lunus Participações, pertencente a

Jorge Murad e Roseana Sarney. No escritório em São Luís, além de documentos, foram

encontrados R$ 1,3 milhões, em dinheiro vivo, guardados no cofre do escritório. Toda a

quantia estava em notas de R$ 50,00.

Roseana afirmou que toda a ação não tinha como alvo arruinar o seu marido, e

sim prejudicar a sua candidatura e ajudar a de José Serra, acusando o candidato do

PSDB de ser o mandante da ação policial. Em uma conversa que teve com um alto

membro do PFL, Roseana disse que não havia possibilidade de tal ação ter acontecido

sem o consentimento do então Ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, que era

aliado de Serra (MEIRELES, Andrei; FILHO, Expedito; FURTADO, Bernardinho,

2002, p.30-31).

Após o escândalo, Roseana começou a amargar quedas constantes nos números

das pesquisas de intenção de voto, e o PFL anunciou que estava “em guerra” contra o

senador José Serra, que era o segundo nas pesquisas e que herdaria os votos de Roseana.

A legenda fez várias ameaças de deixar de apoiar o governo FHC. O que a imprensa

mostrava era uma suspeita de que a operação na empresa de Murad e Roseana foi

precedida por grampos telefônicos. Entre os pefelistas, o argumento para tal suspeita era

o de que a polícia apareceu justamente no dia em que havia R$ 1,3 milhões no cofre da

Lunus, o que significava que os policiais só apareceram porque sabiam o que iriam

encontrar naquele dia.

Ainda no mesmo mês, Murad convocou a imprensa para ir até a varanda do

Palácio dos Leões, sede do governo do Maranhão, onde faria a leitura de uma nota

oficial sobre o escândalo. Na nota, ele comunicou a sua saída da Secretaria Estadual do

Planejamento e garantiu que o dinheiro encontrado em seu escritório vinha de

arrecadações colhidas por ele para financiar a campanha de sua esposa à Presidência.

Ele também afirmou que Roseana não sabia de nada (SÁ, Xico, 11 de nov.2001, versão

on- line).

Poucos dias depois de o escândalo ter sido descoberto pela imprensa, Roseana

ameaçou deixar a sua candidatura caso o PFL não rompesse as alianças com Fernando

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Henrique. No mesmo dia, os três últimos ministros do PFL comunicaram sua saída a

FHC. Em março de 2002, consolidou-se o fim da aliança PSDB-PFL.

As investigações contra a Lunus ficaram paradas por 40 dias, até que, em abril,

Roseana perdeu o foro privilegiado ao renunciar ao governo do Maranhão e o STJ

autorizou que as investigações fossem retomadas pelos procuradores. As buscas e

apreensões executadas no escritório de Murad foram consideradas legais e as suspeitas

sobre o montante de dinheiro encontrado eram de superfaturamento de obras no

Maranhão (SÁ, Xico, 11 de nov.2001, versão on- line).

Ao final de abril, Roseana, que havia caído 13% nas pesquisas, segundo o

Datafolha, e que não havia conseguido explicar de onde teria surgido tamanha quantia

em dinheiro vivo, renunciou a sua candidatura à Presidência da República. Com isso, o

PFL começou a buscar alternativas de alianças. Por repúdio a Serra, a maioria da cúpula

preferiu apoiar Ciro Gomes.

Porém, Ciro enfrentava problemas na aliança entre PPS, PTB e PDT, por causa

da sua estagnação em quarto lugar nas pesquisas eleitorais, mas recebia apoio

incondicional de sua esposa, a atriz Patrícia Pillar, que havia recentemente voltado à

mídia para contar o seu drama de passar por um câncer de mama. Patrícia acompanhou

Ciro em palestras pelos Estados Unidos, debates em vários estados e ajudava a

organizar encontros. Ela disse que entrou na campanha para ser uma parceira de Ciro,

mas especialistas apontaram que a simples presença de uma pessoa com a notoriedade e

a história de vida de Patrícia só traria benefícios ao candidato.

Ainda no final de abril, a Bolsa de Valores de São Paulo sofreu a maior queda do

ano, de 4,18%. Para se proteger da oscilação do mercado, investidores compraram

dólares, e o Real terminou a semana com a mais baixa cotação em três meses. A

Petrobras adiou a emissão de US$ 500 milhões em títulos no mercado externo, tentando

evitar perdas com a desconfiança internacional sobre o Brasil (RAGAZZI, Ana Paula,

03 de maio de 2002, versão on- line).

Os números apresentados pelas pesquisas de intenção de voto causavam

interferências no mercado financeiro nacional. Conforme Lula subia nas pesquisas,

subia com ele o Risco Brasil – índice que mede os riscos para os investimentos no país.

Grandes bancos americanos apostavam suas fichas na vitória de José Serra (RAGAZZI,

Ana Paula, 03 de maio de 2002, versão on- line).

Havia problemas com os vices. Paulo da Costa Leite, vice-candidato de Anthony

Garotinho, foi forçado a renunciar depois que se revelou que ele manteve em segredo

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seu passado como instrutor do Serviço Nacional de Informações – SNI – do regime

militar. Costa Leite permaneceu no SNI por onze anos, saindo somente em 1984, ano

das Diretas-Já (MELO, Murilo Fiuza de, 11 de maio de 2002, versão on- line).

Mas José Serra também enfrentava problemas com denúncias contra seu ex-

tesoureiro, Ricardo Sérgio de Oliveira, de que ele havia cobrado propinas relativas às

privatizações do governo FHC. Rumores de que essas denúncias haviam afetado o

desempenho de Serra, colocando-o em quarto lugar nas pesquisas, fizeram o dólar

atingir a maior cotação do ano até então, fazendo a Bolsa de Valores despencar e o

Risco Brasil subir (RAGAZZI, Ana Paula, 07 de maio de 2002, versão on-line).

Mas depois, em pesquisa encomendada pelo PSDB, mostrou-se que nada havia

mudado: Lula continuava em primeiro, com Serra em segundo, seguido de Garotinho

em terceiro e Ciro na última colocação. Faltando cinco meses para as eleições, a ordem

era esperar que a poeira baixasse e retomar a subida nas pesquisas, sendo que agora a

campanha de Serra estava sob o comando de Nizan Guanaes, que havia feito a imagem

de Roseana Sarney subir, mas que após sua renúncia, não trabalhava para nenhum

candidato.

Nesse ponto das eleições, as pesquisas mostravam que Lula estava perto de

vencer ainda no primeiro turno, e os outros candidatos continuavam tentando

desmoralizar a campanha petista. Serra associava a candidatura do PT ao risco de

argentinização do país (RAGAZZI, Ana Paula, 07 de maio de 2002, versão on-line),

enquanto Ciro apostava no discurso de falta de preparo de Lula para a Presidência.

Incomodado com a possibilidade da vitória de Lula, o mercado financeiro

estremeceu. Os indicadores de risco e o dólar se movimentavam conforme o

comportamento dos números referentes ao petista e, quando Serra não crescia nas

pesquisas, o mercado reagia mal. No prazo de uma semana, o Risco Brasil subiu 19%, o

dólar valorizou-se 4,8% e o Ibovespa registrou baixa de 4,3%. O mercado temia a

descontinuidade econômica, mas o nervosismo passaria assim que ficasse claro que o

próximo Presidente manteria as medidas (RAGAZZI, Ana Paula, 07 de maio de 2002,

versão on- line).

Porém, em maio, mesmo sem ter um partido forte, Garotinho subia nas pesquisas

fazendo promessas como aumentar o salário mínimo para R$ 280,00 em maio de 2003 e

no ano seguinte para R$ 400,00, além de prometer derrubar os juros, ampliar acesso ao

crédito e diminuir impostos. Seu carisma conquistava os eleitores durante os programas

de TV. Apesar de ter perdido o monopólio dos eleitores evangélicos depois que a

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Assembléia de Deus sugeriu o voto em Serra e parte da Igreja Universal decidiu apoiar

Lula, Garotinho conquistava o voto das classes mais baixas por saber como se

comunicar com os mais pobres, devido aos seus programas na rádio e ao fato de ser

pastor (MELO, Murilo Fiuza de, 11 de maio de 2002, versão on- line).

Em junho, as negociações entre PSDB e PMDB indicavam a nomeação da

deputada do Espírito Santo, Rita Camata, como vice-candidata de José Serra. Ela era a

candidata favorita de Serra à posição desde que o governador de Pernambuco, Jarbas

Vasconcelos, desistiu de compor a chapa. Enquanto isso, Lula tentava aliança com o ex-

governador de São Paulo, Orestes Quércia, e outros dissidentes do PMDB, apesar de

todas as acusações entre ambas as partes no passado. A estratégia visava a atrapalhar as

negociações dos tucanos com Camata, do PMDB.

Mas, apesar da ligeira queda nas pesquisas e das denúncias, Rita Camata foi

confirmada vice-candidata tucana no final de junho, dando uma nova guinada na

candidatura do PSDB. Sua chegada trouxe a possibilidade de conquista de uma fatia de

23% do voto feminino que ainda não tinha candidato definido. Por sua beleza e por ser

mulher, Camata poderia arrebatar preciosos votos.

Garotinho fica estagnado na terceira posição das pesquisas e, mesmo aparecendo

na TV, não consegue subir devido às várias denúncias e acusações feitas contra ele

sobre fatos ocorridos em seu passado, quando ainda era prefeito da cidade de Campos,

no Rio de Janeiro. Garotinho foi acusado de comandar esquemas de corrupção e de ter

negócios ilícitos. As denúncias deixaram os membros do PSB constrangidos, e uma

parte expressiva do partido quis apoiar Lula, enquanto outros preferiram ficar sem

candidato (MELO, Murilo Fiuza de, 11 de maio de 2002, versão on- line).

No meio de junho, as pesquisas mostram consolidados Lula em primeiro lugar e

Serra em segundo, cuja subida nos índices se deviam à Rita Camata e às aparições do

candidato na TV. A estratégia tucana era travar um embate entre Serra e Lula, por isso o

discurso do PSDB continuava associando seu candidato ao governo e atacando o petista,

associando-o ao perigo das instabilidades econômicas.

No PPS, a novidade era a oficialização de Paulo Pereira da Silva, o Paulinho,

presidente da Força Sindical, como vice-candidato de Ciro Gomes, mas isso não

significou um apoio incondicional de toda a base da Força – que foi criada em 1991, no

governo Collor, com o apoio de Fernando Henrique Cardoso, para fazer contraponto

conservador com a Central Única dos Trabalhadores – CUT – ligada ao PT.

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Ao final de junho, o que se previa aconteceu: houve a polarização da disputa

entre Lula e Serra, ao mesmo tempo em que a candidatura de Garotinho sofreu um revés

com o anúncio da aliança entre PT e PL – partido que habitualmente se alia a forças

como PFL, PPB e PSDB –, pois o candidato do PSB contava com os votos dos

evangélicos da Igreja Universal do Reino de Deus, do PL (VAZ, Lucio; DANTAS, Iuri.

24 de jun.2002, versão on- line).

Com a aliança entre PT e PL, Lula conseguiu o vice a que visava naquele

momento, José Alencar, pois com isso o partido fincaria bases em Minas Gerais, o

segundo maior colégio eleitoral do país, e também teria o apoio do ex-presidente e

governador mineiro, Itamar Franco (VAZ, Lucio; DANTAS, Iuri. 24 de jun.2002,

versão on- line).

Serra formalizou a aliança com o PMDB e ficou com o maior tempo de

propaganda na TV – vinte minutos, contra dez de Lula.

Até o final do mês de junho, apenas Garotinho ainda não tinha um vice-

candidato. Ele já havia convidado um desembargador, dois deputados federais, um

deputado estadual e um economista, mas nenhum deles havia aceitado a proposta.

Outro fato importante foi a desistência do eterno presidenciável e figurinha

carimbada das eleições nacionais, Enéas Carneiro. Apesar de deixar de concorrer, Enéas

prometeu voltar a concorrer em 2006 (Enéas desiste de sair candidato a presidente, 20

de jun.2002, versão on- line).

A reviravolta nos números das pesquisas aconteceu no começo de julho. Com o

final da Copa do Mundo de Futebol, os olhos do país se voltaram às eleições. Foi

quando Ciro Gomes apareceu pela primeira vez em segundo lugar, tecnicamente

empatado com José Serra. Pesquisas mostravam Lula com 39%, Ciro com 18%, Serra

com 17% e Garotinho estagnado em quarto lugar, com 12%.

Os candidatos subiam nas pesquisas conforme apareciam na TV. Ciro usou 82

minutos – somatória dos tempos a que tinham direito os partidos da aliança PPS, PTB e

PDT – e sua mulher, Patrícia Pillar, fazia comerciais para sua candidatura. Patrícia era

considerada o cabo eleitoral principal de Ciro. A idéia de colocá- la no programa de TV,

em junho, foi do responsável pela campanha do candidato, Einhart Jácome da Paz, seu

cunhado.

Ciro quebrou a polarização entre Lula e Serra, que perdurava havia duas

semanas e parecia estar consolidada. Essa subida colocou em alerta o candidato tucano,

que redirecionou seus ataques a Ciro, quando antes eram concentrados em Lula. O

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maior desafio de Ciro no momento era o de se manter dessa maneira até agosto, quando

recomeçariam as propagandas políticas na TV.

Na terceira semana de julho, Serra caiu pela segunda vez consecutiva nas

pesquisas e a tensão no partido governista era de que, se isso acontecesse uma terceira

vez, talvez o candidato não chegasse ao segundo turno, já que Ciro continuava subindo

em segundo lugar. Em uma reunião com o núcleo político de Serra, ficou resolvido que

era hora de o candidato começar a crescer para cima de Ciro ou então poderia se

despedir das eleições. O momento era decisivo para o PSDB, mas na semana seguinte a

situação piorou quando Serra empatou tecnicamente com Garotinho na terceira

colocação.

No começo de agosto, o país enfrentava uma situação bastante crítica tanto na

política como na economia. Em apenas cinco dias, a moeda nacional chegou a perder

até 20% de seu valor, o crédito internacional para empresas nacionais foi racionado e a

inflação ameaçava voltar (COSTA, Raymundo; ULHÔA, Raquel, 11 de agosto de 2002,

versão on- line). Durante a semana, o Real havia chegado a valer US$ 3,61 e o modelo

de estabilização e abertura econômico criado em 1994 ameaçava chegar ao fracasso

total. A saída era confirmar a ajuda financeira vinda do Fundo Monetário Internacional

– FMI –, que estava em negociações. O acordo com o FMI previa a ajuda dividida em

duas parcelas, e serviria para atravessar os últimos dias do governo regente até que o

próximo se iniciasse. O acordo foi firmado: o FMI enviou US$ 6 bilhões naquele ano e

deixou US$ 24 bilhões reservados para serem emitidos em 2003, já sob a presidência de

um novo nome (COSTA, Raymundo; ULHÔA, Raquel, 11 de agosto de 2002, versão

on- line).

Nas pesquisas, os índices mostravam que José Serra havia caído para o terceiro

lugar e perigava cair para quarto, já que Anthony Garotinho estava na mesma quarta

colocação havia três rodadas (COSTA, Raymundo; ULHÔA, Raquel, 11 de agosto de

2002, versão on- line). A meta fixada pelo partido de Serra era ficar em segundo lugar e

ir para o segundo turno. O que poderia fazer com que Ciro Gomes perdesse votos eram

as investigações referentes ao seu vice, Paulinho, que foi acusado de compra

superfaturada de uma fazenda no interior de São Paulo, feita com verba federal, e ainda

enfrentava problemas na Força Sindical, acusada de uso irregular de verbas do Fundo de

Amparo ao Trabalhador, o FAT (FERNANDES, Kamila, 29 de jul.2002, versão on-

line).

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Prestes a recomeçar o horário político no rádio e na TV, em agosto, os índices

mostravam Lula com 35%, Ciro com 24%, Serra com 14%, Garotinho com 10% e os

indecisos somando 11%. Ciro caiu três pontos e dados mais completos mostravam que

ele havia perdido mais intenções de voto entre os eleitores residentes nas capitais do

país, mais ricos e escolarizados, que influenciam as camadas de baixo, repassando as

suas convicções. As acusações contra seu vice, Paulinho, também contaram para a perda

de intenções de votos (FERNANDES, Kamila, 29 de jul.2002, versão on- line).

Nos bastidores das propagandas, a elite empresarial do país – fatia fiel ao

presidente Fernando Henrique Cardoso – aguardava que setembro chegasse – prazo para

a decisão sobre apoiar o candidato do governo José Serra, caso ele subisse nas

pesquisas, ou partir para candidatos de oposição, Lula ou Ciro. Os empresários estavam

cautelosos, pois queriam as melhores apostas para seus negócios, por isso apoiariam o

novo Presidente, seja ele quem fosse (DO ENVIADO ESPECIAL A WASHINGTON.

Chance de calote brasileiro por ora é baixa, diz diretor da Merrill Lynch, 30 de set.2002,

versão on- line).

No meio de agosto, a ex-candidata à Presidência, Roseana Sarney, voltou a ser

notícia. Ela foi excluída do processo em que era acusada, junto do seu marido, Jorge

Murad, de desvio de dinheiro da Sudam através da empresa fictícia Usimar. Murad foi

indiciado por corrupção e teve que responder por formação de quadrilha, estelionato,

peculato e falsidade ideológica.

Na propaganda da TV, Serra aproveitou para atacar Ciro, numa estratégia criada

pelos publicitários Nelson Biondi e Nizan Guanaes, mostrando fotos do concorrente

junto de atuais aliados, mas associando frases antigas, em que o candidato os atacava.

Também mostrou uma fita em que Ciro respondia agressivamente a um ouvinte de

rádio, chamando-o de “burro”. Foi um fato muito comentado, e fez o PPS correr para

mudar sua propaganda e tentar conter os estragos. Serra continuava próximo dos índices

de Garotinho, mas tinha mais que o dobro de tempo na TV que os outros candidatos e

poderia conseguir uma virada.

Após a primeira semana de propaganda política na TV, três diferentes institutos

de pesquisa mostravam queda de Ciro Gomes e subida de José Serra. A dúvida era se

esses números iriam ser os mesmos após mais uma semana ou se haveria novas

mudanças. Disputando um lugar no segundo turno, a estratégia dos tucanos era

continuar a atacar Ciro. Os planos do PPS visavam a associar Serra aos aspectos

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negativos do governo FHC. Quem mais se beneficiou com os ataques foi o candidato

petista, que esperava ficar com votos dos eleitores dissidentes de Serra e Ciro.

Em setembro, sob o comando de Nizan Guanaes, a propaganda televisiva do

PSDB atacou o PT reproduzindo imagens antigas e impactantes dos candidatos

adversários e investindo nas contradições do discurso de Lula. Esses ataques diretos ao

petista eram inéditos em 2002, pois até então ele era tratado pelos outros concorrentes

como o candidato menos desgastado para a disputa do segundo turno. O PT respondeu

aos ataques tucanos acusando Serra de baixaria e vinculando o aumento do desemprego

ao candidato enquanto Ministro do Planejamento.

O partido petista usava as acusações de corrupção ocorridas no governo de

Fernando Henrique Cardoso contra os tucanos, enquanto estes insistiam nas

contradições do PT e em acusações de inexperiência e ineficiência do candidato da

oposição (CATANHÊDE, Eliane, 30 de set.2002, versão on- line). Ciro Gomes não

resistiu a duas semanas de constantes ataques contra sua candidatura, e caiu para a

terceira colocação nas pesquisas, tecnicamente empatado com Garotinho.

Na última semana antes do dia da votação, o cenário político ainda estava

bastante indefinido. Lula seguia na frente e poderia sair eleito ainda no primeiro turno.

Garotinho havia subido e disputava o segundo lugar com Serra, mas o candidato tucano

dispunha de maior tempo na TV, o que poderia ser decisivo a seu favor, já que a

audiência do horário político havia voltado a subir.

Serra e Garotinho atacavam-se mutuamente na tentativa de garantir o segundo

lugar, mas não poderiam se esquecer de Lula, que tinha chances de conseguir os votos

dos indecisos e acabar com a chance de haver um segundo turno. Ciro já estava

desenganado em quarto lugar, esperando por um milagre que o fizesse subir para a

segunda colocação. O primeiro turno das eleições inéditas de 2002 estava relativamente

indefinido e poderia trazer muitas surpresas (VIEIRA, Fabrício, 26 de out.2002, versão

on- line).

“A uma semana da eleição, o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, atingiu

49% dos votos válidos e ficou a um ponto percentual da possibilidade de vencer a

disputa presidencial no primeiro turno, revela pesquisa Datafolha”, (FRAGA, Plínio, 29

de set.2002, versão on-line).

No primeiro turno das eleições, que aconteceu no dia 06 de outubro de 2002,

Lula teve 39.443.765 votos contra 19.700.395 de Serra. Os dois candidatos travaram a

batalha do segundo turno, no dia 27 de outubro, dando o resultado favorável a Lula, que

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marcou como o primeiro operário a chegar no posto político mais almejado do país,

com cerca de 61,7%, uma conquista histórica na política democrática nacional até 2002.

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CAPÍTULO III - A MARCA TUCANA (GOVERNISTA) NAS PÁGINAS

DA PRIMEIRA LEITURA

3.1 HISTÓRICO DA REVISTA PRIMEIRA LEITURA

“Não se vincular a interesses particulares e estar livre de um viés ideológico particular não faz do

site e da revista, no entanto, veículos anódinos, sem opinião.” (LINHA EDITORIAL, 03 de

out.2003, versão on-line)

A revista Primeira Leitura é uma publicação mensal da Editora Primeira

Leitura, surgida em março de 200236, fruto da reformulação da antiga revista República,

originalmente publicada pela Editora Dávila. A base de sua redação foi montada a partir

do site de mesmo nome, cujo endereço eletrônico era www.primeiraleitura.com.br. A

revista era comandada pelo diretor de redação Reinaldo Azevedo e apadrinhada pelo

publisher Mendonça de Barros.

Reinaldo Azevedo é formado em Letras pela Universidade de São Paulo e em

Jornalismo pela Universidade Metodista de São Bernardo. Foi editor-adjunto de política

da Folha de S. Paulo, coordenador de política da sucursal de Brasília do mesmo jornal e

redator-chefe das revistas República e Bravo!. Foi professor de literatura e redação dos

colégios Quarup, Singular e do curso Anglo.

Luiz Carlos Mendonça de Barros era sócio do site Primeira Leitura e da revista

Primeira Leitura. É graduado em Engenharia de Produção pela Universidade de São

Paulo e doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas. Sua carreira

profissional teve início em 1967 como analista financeiro do Investbanco. Em 1972,

com três sócios, fundou a corretora Patente, que operava na Bolsa de Valores de São

Paulo. Onze anos depois, desligou-se da Patente para criar, associado a quatro

companhias – Bardella, Brasmotor, Pão de Açúcar e Votorantim –, a empresa que veio a

se transformar no Banco de Investimento Planibanc. Sua carreira no Governo Federal

começou na década de 80, quando foi diretor do Banco Central entre julho de 1985 e

março de 1987, gerenciando a área de Mercado de Capitais. Em 1993, junto com outros

36 A revista Primeira Leitura fechou em agosto de 2005. Como ela já tinha sido selecionada e justificada como um dos objetos de estudo nesta pesquisa acadêmica, foi mantida. Hoje há as orientações sobre política no blog do ex-diretor de redação da revista, Reinaldo Azevedo.

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sócios, fundou o Banco de Investimentos Matrix, do qual era diretor. Dois anos depois,

se desligou dessa instituição e, no final de 1995, tornou-se presidente do Banco

Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em abril de 1998, foi

nomeado pelo então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, Ministro das

Comunicações, sucedendo a Sérgio Motta e permanecendo no cargo de abril a

dezembro daquele ano. Em janeiro de 2000, em sociedade com José Roberto Mendonça

de Barros, Lídia Goldeinstein e a Radium Systems, fundou a MBG, especializada na

produção e distribuição de cursos profissionalizantes a distância. Em abril, juntamente

com Luiz Felipe D'Avila, criou a editora Primeira Leitura, responsável pelo site de

mesmo nome, com análises políticas e econômicas, e pela publicação da revista mensal

Primeira Leitura.

O terreno mais debatido e retratado pela revista são os setores economicos e

políticos, segundo o que informa sua linha editorial, disponível no site, diz que ela

“existe porque considera importante qualificar as discussões nas áreas de economia e

política segundo alguns princípios que servem de guia: defesa intransigente da

democracia, da pluralidade política e da economia de mercado (LINHA EDITORIAL,

03 de out.2003, versão on- line)”.

A revista também afirma que não tem nenhuma “vinculação partidária ou

preconceito ideológico, não está a serviço de grupos econômicos nem cede à pressão

das versões influentes em sua área de abordagem: a economia e a política (LINHA

EDITORIAL, 03 de out.2003, versão on- line)”.

Até 2005, a tiragem da revista era de 25 mil exemplares, em sua maioria

distribuídos entre as principais bancas do país. Desse total, cerca de 10% eram

destinados a assinantes do Brasil no exterior.

Na parte editorial, a revista tratava basicamente de economia e política, do Brasil

e do mundo. Traz também resenhas, colunas assinadas e papers tratando de assuntos

como história, filosofia, relações internacionais, entre outros.

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75

Perfil do público leitor 37

37 Dados fornecidos pelo atendimento da revista Primeira Leitura , data: 05 de 2003.

60%

40%

Homens Mulheres

Idade do Público Leitor

7% 9%

52%

21%

11%

De 15 a 18 anos De 19 a 25 anos De 26 a 45 anos

De 46 a 60 anos Acima de 60 anos

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76

Escolaridade Público Leitor

2% 5% 12%

81%

1º Grau 2º Grau

Universitário incompleto Universitário completo

Renda do Público Leitor

3% 9%

13%

29%

35%

11%

Renda até R$ 1000,00

Renda de R$ 1000,00 a R$ 3000,00

Renda de R$ 3001,00 a R$ 5000,00

Renda de R$ 5001,00 a R$ 10.000,00

Renda de R$ 10.001,00 a R$20.000,00

Renda acima de R$ 20.000,00

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3.2 A IMAGEM DE LULA PELAS ENTRELINHAS DA PRIMEIRA LEITURA: ANÁLISE

QUALITATIVA

Nas análises da edição de julho de 2002, a Primeira Leitura coloca a partir da

reportagem “Depois do vendaval: o Brasil em 2003” (anexo PL-1), escrita por Liliana

Pinheiro, um Lula como representante da perigosa vulnerabilidade econômica que o

Brasil poderia sofrer, caso esse candidato ganhasse as eleições para a presidência, pois

no olhar de Liliana, visiona ao leitor que os investidores estão preocupados com essa

possível vitória, acreditam que, se com o governo Fernando Henrique Cardoso, as

contas públicas já vão mal, com uma gestão Lula, voltada à área social, esse contexto

poderia piorar. Liliana, desde o olho da reportagem, enfatizou que o eleitorado percebeu

que o país precisa das reformas sociais discursadas no projeto de governo do petista

Luiz Inácio Lula da Silva, bem como esse mesmo eleitorado conseguiu visualizar que

essa necessidade é um perigo no olhar dos investidores, “os eleitores já perceberam que

o ‘eixo social’ do PT, tão necessário para o país, preocupa os investidores”.

Para contemplar esse argumento, que uma possível vitória petista abortaria uma

desconfiança no mercado interno e em possíveis investidores estrangeiros no país,

abriu-se ainda uma nova frente crítica com o pensamento da fonte Raul Velloso,

especialista em contas públicas, que o mercado conclui que na gestão Lula os gastos da

máquina pública podem explodir, pois ele não é capaz de manter a dívida como ela se

apresenta. “O mercado pensa assim: sem o PT, o sistema já produziu muito aumento de

gasto social, via Previdência, aumento do salário mínimo e políticas de assistência

social; com o PT, esse gasto vai explodir”. A questão é: como se chega a essa

conclusão? Se Raul é um especialista em contas públicas, por que a pergunta não

poderia ser feita no sentido de questionar a razão do buraco em que se encontram os

gastos públicos? Por que em oito anos de um governo de direita, já que ele atrela um

enrosco nos escombros púb licos numa possível guinada petista, o problema das dívidas

públicas não foi solucionado? Esse sentido em que Liliana conduz a reportagem

enfraquece seu leque de leituras sobre o problema que realmente deveria ser lançado: a

situação e o porquê da lástima da dívida pública brasileira. Com isso, a autora da

reportagem problematiza uma versão do fato, que o “eixo social” do PT causaria receio

ao olhar dos investidores e empresários, em relação ao problema real, a dívida pública

estabelecida e aumentada no mandato FHC. Portanto, Liliana inverte a versão que a

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Primeira Leitura coloca sobre o fato, pelo fato original. A “inversão da versão pelo

fato” é um padrão de manipulação, retratado pelo jornalista Perseu Abramo (2003,

p.29).

Liliana vai ainda mais longe, com a finalidade de aniquilar a governabilidade do

Partido dos Trabalhadores, “as contas, com o programa do PT em prática, sugerem

prejuízo”. Nessa frase ela argumentou por si mesma, sem especialistas, fato que numa

reportagem é tido como opinião, colocando a matéria no patamar de artigo camuflado

de “imparcialidade”, em formato reportagem.

Logo, com essa opinião, fica nítida sua postura anti-Lula e pró-Serra, que é a

base governista que tanto menciona na fala de Raul Velloso.

Liliana também recordou algumas estatísticas na voz do presidente da Sociedade

Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização, Antônio Corrêa

de Lacerda: “a carga tributária era de 26% do PIB em 1994; hoje, corresponde a 35%.

Além desse percentual, ninguém suporta, pessoa física ou setor produtivo”. Entretanto,

ela não salientou que esse desfecho perplexo para os contribuintes foi realizado durante

a gestão FHC, nem ao menos é tentada a mencionar. Portanto, percebe-se um outro

padrão de manipulação, agora: o de ocultação por ausência (2003, p.26), por não

apresentar os protagonistas políticos que permitiram a situação desastrosa da conjuntura

econômica na qual o Brasil se encontra. Isentando Fernando Henrique da associação do

desastre econômico, em especial da carga tributária, Liliana colabora para a

neutralidade do presidente diante do caos econômico.

A repórter finalizou a “reportagem” sem concluí- la, em razão de não apresentar

argumentos sobre a tal “preocupação dos investidores” com uma possível liderança

presidencial petista. Pois na fala que segue, no encerramento do economista Vladimir

Caramaschi, não há essa proposta de conclusão: “são tamanhos os desafios do Brasil em

2003 que a dívida externa em si, que tanto preocupa os investidores internacionais,

tornou-se, na opinião deles, o menor dos problemas. O que cabe ao setor público na

dívida externa corresponde a apenas 10% do PIB, o que é absolutamente manejável”.

No desenrolar da reportagem toda não se vê falar em programa social, ou

qualquer “eixo social”, como temática prometida por Liliana no olho da matéria com a

frase “os eleitores já perceberam que o ‘eixo social’ do PT, tão necessário para o país,

preocupa os investidores”. Logo, essa é uma reportagem que fica no vazio de

argumentos, que compromete a credibilidade da informação. Com a finalidade única de

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jogar possibilidades em 2003, baseada em alguns momentos nas vozes de economistas e

outras vezes responde por si própria, como visto.

Contudo, a reportagem “Depois do vendaval: o Brasil em 2003”, induz o leitor a

ver e compreender uma outra realidade, que é de ordem artificial, pois a informação real

foi excluída do leitor, e a visão que ele tem sobre todos os elementos que circundam o

fato trabalhado na reportagem são trazidos de maneira induzida como a revista quer que

ele veja. Esse padrão de manipulação é conceituado por ABRAMO (2003, p.33) como

padrão de indução.

Nesse caminho, o colunista e um dos proprietários da revista, Mendonça de

Barros, no artigo “Eleições e incertezas” (anexo PL-2), profetizou que é bem possível

ocorrer uma polarização das eleições entre Lula e Serra e, nesse caso, o eleitor deveria

dar o voto a Serra, pois este saberia encaminhar a situação da crise, porque

simplesmente consegue percebê- la:

(...) todos acreditam, como eu, que o candidato do governo percebe a situação e teria, portanto, uma boa chance de encaminhar a questão de nossa fragilidade fiscal e externa”. Enquanto o outro candidato, novamente, representa um perigo para a economia brasileira “é razoável esperar que o PT dificilmente terá um programa consistente e forte o suficiente para lidar com a urgência da situação.

Nessa análise, há uma cobrança diferenciada de Mendonça, pois na medida que

exige um “programa consistente” de Lula, apenas menciona que de Serra será preciso

enxergar o problema, meramente porque ele “percebe a situação”, deve ser em razão de

ele ser da própria situação, o que provavelmente dará continuidade com a emblemática

que seu antecessor deixará para seu legado. O fato de o candidato tucano ser da

situação, do governo FHC, não o possibilita encaminhar a crise econômica com menos

“perigo” que Lula. Segundo ABRAMO (2003, p.27) “(...) o fato presente na produção

jornalística, real ou ficcional, passa a tomar o lugar do fato real e a compor, assim, uma

realidade diferente da real, artificial, criada pela imprensa”. Portanto, percebe-se que

Mendonça de Barros, ao julgar Lula como incapaz de administrar a crise econômica,

coloca Serra como capaz de administrá-la, mas para que esse último possa ser citado na

comparação, foi preciso achar argumento para colocá-lo como “Salvador da economia

do país”, e a menção encontrada foi dizer que Serra consegue ver o problema

econômico. Entretanto, ver, todos vêem, principalmente quem já está no governo,

administrando esse setor há mais de um mandato, como é o caso do antecessor de Serra,

FHC. Mas Mendonça opta por citar Serra, independente de que o argumento para que

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seja citado esteja vazio de conteúdo e de lógica informativa, porque, ao passo que

menciona Lula, desqua lificando-o, deve “por presença” (ABRAMO, 2003, p.26) citar

Serra, dando- lhe o altar da qualificação.

Ainda na mesma edição, Vera Magalhães em “Conversão dos duros e puros”

(anexo PL-3) desenvolve o que seria, a princípio, um artigo que, ao longo das páginas,

se desenrola em estilo reportagem, com utilização de fontes. Para chegar ao conteúdo

sobre a conversão do PT esquerda ao PT mais próximo da direita, a repórter mostra

alguns fatos que, pela lógica que formula, demonstra o PT seguindo para sua conversão.

Um PT que:

não só estréia sua nova política de alianças tendo por vice um empresário do grande capital, membro de um partido de direita, como também é alvo de uma investigação conduzida pelo Ministério Público, sobre o suposto propinoduto ligando a Prefeitura de Santo André, governada pelo PT, à alta direção do partido.

A partir dessa idéia de conversão do PT na escolha do “establishment”, como

prefere descrever Vera, e também de indícios de ligação com o “propinoduto”, em

detrimento do “puritanismo” e “radicalismo” partidário em alianças para a candidatura,

a repórter faz uma analogia do caso com a passagem bíblica de conversão do judeu

Saulo em apóstolo Paulo (1º Coríntios). Nessa linha de conduzir a reportagem, Vera

traçou em plano de desenvolvimento da história do PT, fragmentando-a em fases mais

radicais (vermelha); em direção à direita (rosa) e no centro da direita com a coligação

com o Senador José Alencar, do PL-MG (verde).

Ao realizar a associação entre Lula “modificado” como o Saulo que virou Paulo,

após a aparição de Jesus Cristo, a autora, Vera Magalhães, se utiliza da passagem

bíblica comum entre os cristãos para desenvolver as idéias de um Lula e um PT

repaginados e, para isso, faz menção da codificação (GARCIA, 1990, 46-47), que

apresenta idéias novas com embasamento na retórica social, que já estejam diluídos no

seio da sociedade moderna. Como acontece com Paulo, em 1º Coríntios, já comum entre

a sociedade cristã brasileira, Vera codifica essa passagem para desenvolver outros

pensamentos vo ltados à deturpação da “pureza do esquerdismo” de Lula aos leitores.

Portanto, Vera funde a idéia “(...) a ser propagada com as concepções já existentes,

solução que inclusive facilita a aceitação das mensagens, porque baseadas em idéias já

aceitas como verdadeiras (GARCIA, 1990, 50)”.

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Além disso, a reportagem explorou a fala do prefeito tucano de Vitória-ES, Luiz

Paulo Vellozo Lucas (um dos estrategistas políticos da campanha de José Serra) que

mencionou: “PSDB está mais próximo do PT em termos ideológicos do que o José

Alencar, o PL e os bispos da Igreja Universal (...)”. Mais adiante, Vera concede espaço

para Vellozo Lucas continuar:

O PT e o Lula estão passando por uma transformação extraordinária, mas ainda não é suficiente para fazer deles a melhor opção de projeto político para o país. É preciso ter vocação hegemônica, que o PSDB já demonstrou ter. O PT está demonstrando que quer ter vocação hegemônica. Mas, para isso precisa primeiro ajudar o Brasil, o que não fez na anistia, no colégio Eleitoral e na estabilização da economia.

Com isso, Vera descreveu a opinião de um membro do PSDB sobre a

“conversão do PT”, sem precisar remeter a ela esse pensamento. Entretanto, ela assumiu

essa postura de pensamento na reportagem, pois com a afirmação de Vellozo Lucas, ela

não interferiu, como é o caso da intervenção na fala de Maria Victoria Benevides,

cientista política da USP e uma das fundadoras do PT,

O partido tinha de se afirmar com toda a sua radicalidade de esquerda. Havia uma fragmentação partidária muito grande, e a via institucional não era prioridade. A prioridade era a luta social, o movimento sindical. Com isso, o PT rompia o paradigma do populismo de esquerda do Partido Comunista e do populismo trabalhista de Getúlio.

Sobre essa discussão, Vera, como representante da linha ideológica da Primeira

Leitura, no parágrafo seguinte à fala da cientista, demonstra sua postura contrária à

idéia de Maria Victória:

A fala de Maria Victória deixa entrever a avaliação de que o germe desse PT institucional contido naquele partido de 1980. Será? Lula só admitiu m 2002 que o partido errou naquele longínquo 1994, ao opor-se ao Plano Real. Antes que o partido percebesse o medo objetivo que desperta nos tais mercados, e antes de se dar conta de que uma especulação nascida em Nova York tem poder de quebrar o país, abusou quanto pôde de sua retórica ambígua (...).

Nesse sentido, além de deixar clara sua postura como anticandidatura de Lula,

faz menção de caracterizá- lo como inconsciente do poder do investidor externo (em

itálico), e de portador de um discurso contraditório pela sua “retórica ambígua”. Com

isso, encerra a reportagem demarcando que “vencedor ou vencido, o PT terá dito adeus

irremediavelmente à dureza e à pureza”.

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Na edição do mês de setembro, Betina Bernardes e Reinaldo Azevedo

entrevistaram Fernando Meirelles, diretor do filme “Cidade de Deus” (anexo PL-4). A

maioria das informações foi a respeito da produção do filme, mas a última pergunta foi

sobre o voto do eleitor Fernando Meirelles, que em sua resposta define a opinião do

encaminhamento da revista sobre as eleições de 2002: “No primeiro turno, voto no

Serra. Quero fazer de tudo para evitar o risco Ciro Gomes. Se o Serra não for para o

segundo turno, voto no Lula”.

A reportagem toda, com exceção do último parágrafo, concentrou-se na

produção do filme de Fernando e, apenas no final, na parte da entrevista pingue-pongue

(páginas 45 e 47) que os repórteres perguntaram sobre qual seria o voto do diretor.

Logo, encontra-se, nas entrelinhas de uma entrevista voltada à área cultural, uma brecha

informativa sobre o olhar do protagonista da reportagem, Fernando Meirelles, sobre as

eleições presidenciais de 2002. Isso define a “pergunta e a resposta na questão do voto”

como um padrão de manipulação, de “ocultação por presença” (ABRAMO, 2003, p.26-

27). Nele encontra-se a chance de tornar de conhecimento do leitor a existência de uma

informação importante, para a linha da revista, sobre a construção de uma realidade que

deveria ser eliminada, visto que o gancho jornalístico e mesmo o fato de sua produção

não condiziam com a problemática da eleição presidencial. E o candidato que se

sobressaí com esse padrão de manipulação é o tucano Serra.

Na mesma edição, a reportagem “o enterro da última quimera”, de Milton

Gamez, (anexo PL-5) trabalha um retrato da área econômica, instigando o leitor a

interpretar que o atual sistema econômico implantado pelo ministro da Fazendo, Pedro

Malan, e por Fernando Henrique Cardoso, não está mais contemplando as necessidades

econômicas brasileiras. E sugere que o novo governo vá além de adotar o modelo do

governo de Fernando Henrique. “Reduzindo juros e melhorar a qualidade da

arrecadação tributária, passos fundamentais para alavancar as exportações, substituir as

exportações e eliminar a perigosa dependência dos capitais estrangeiros, marca

registrada da era FHC”. E esse apontamento de mudança e aperfeiçoamento do modelo

econômico foi indicado por Lula, no primeiro programa eleitoral, como aponta o

repórter no começo da reportagem, que traz vozes de renomados economistas para

pensar sobre o assunto.

Novamente faz-se uso do padrão de manipulação de “ocultação por presença”

(ABRAMO, 2003, p.26-27), em que, diferente do anterior, a figura do candidato Lula é

lembrada como o candidato que havia levantado a questão da necessidade de

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implementar o sistema econômico de FHC, no primeiro programa do horário eleitoral

político. O autor, Milton Gamez, faz essa utilização para desenvolver as argumentações

de que o sistema econômico deve ser debatido e modificado, em prol de uma postura

econômica mais justa para a sociedade no geral38.

Na edição do mês de outubro a coluna “caso com o acaso” com o título “O acaso

e o PT” (anexo PL-6), Mendonça de Barros – já visionando uma futura vitória de Lula –

o coloca como candidato imprevisível no que se refere aos projetos de governabilidade.

Segundo o autor da coluna opinativa, o Brasil estava passando por uma transição

delicada na economia política e Lula poderia significar um risco à não manipulação

desse momento “delicado”, por não tratá- lo como prioridade em detrimento da

concretização de suas promessas na área social:

Lula precisará convencer seus companheiros no partido e no Executivo de que o adiamento da implementação de suas principais promessas eleitorais será uma questão de sobrevivência de seu governo (...) no outro cenário, a percepção da gravidade da crise atual é menos clara, e o governo não elege de maneira inequívoca a prioridade desse ajuste em detrimento das ações na área social.

Portanto, Mendonça se refere a Lula de maneira negativa, associando-o a dois

cenários futuros complicados, que ele teria dificuldades de saber administrar. O

primeiro seria o cenário de convencimento dos “companheiros” sobre as resoluções do

momento “delicado” economicamente e o segundo cenário é ceder essa prioridade

econômica em perda dos projetos voltados à área social. Com isso, Mendonça de Barros

utiliza-se da contrapropaganda (GARCIA, 1990, p.61) para sugestionar ao leitor-eleitor

que um governo Lula não teria capacidade de aniquilar os problemas da área

econômica, no Brasil. Logo, se a edição já cobre o período antecessor ao segundo turno

das eleições, a postura de contrapropaganda apóia Serra em prejuízo de Lula, ao

submetê- lo à ineficiência governamental. Segundo Garcia (1990, p.61), “a apresentação

de fatos que estejam em contradição com as mensagens adversárias, sugerindo sua

falsidade, irrealidade ou absurdo, é realizada com o intuito de despertar dúvida em

relação a elas”, é o que Mendonça de Barros externou sobre Serra contra Lula, nesse

artigo.

No outro artigo. “A nova arbitragem e o sonho”, da coluna de Reinaldo Azevedo

“O avesso do avesso” (anexo PL-7), o autor explorou a idéia clara de vincular o

38 O repórter Milton Gamez aparece apenas nesta reportagem: “o enterro da última quimera” e em nenhuma edição posterior ou anterior das analisadas.

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candidato Lula à imagem do Partido dos Trabalhadores (PT), sem separar projeto

partidário do presidenciável, com a história do PT. Reinaldo comparou Lula a um

candidato produzido pela sedução da propaganda política: “Os muito pobres, a classe

média desiludida e setores consideráveis do empresariado se viram tentados a testar a

fórmula vendida na propaganda do PT”. Não bastando, o autor do artigo chamou a

atenção do leitor para o fato de que o PT, por escolher um candidato que se constitui

como uma “fórmula vendida na propaganda” do partido, seduz o eleitorado como

convertido ao mercado: “o PT que seduz não é aquele da retórica socialista, mas esse

convertido ao mercado”. Ou seja, o PT tendo Lula como “garoto-propaganda” foi

“convertido”, usando a expressão de Reinaldo, pelas propostas estabelecidas pela lei do

mercado.

Reforçou ainda a idéia de um Lula “milagroso” formado por uma propaganda

enganosa: “Lula conseguir, ter-se-á operado no país um milagre político e econômico,

um case fora de toda evidência sociológica. O mais provável, no entanto, é que não

consiga. Dados os ingredientes, não há o ambicionado ‘final feliz’ nessa história”.

O julgamento de Reinaldo Azevedo, colocando Lula como réu, atribuindo- lhe a

desqualificação de ser uma criação sedutora da propaganda política, desenvolvida por

Duda Mendonça, envolve o conceito de contrapropaganda (GARCIA, 1990, p.61-62),

visto que o cenário político está dividido entre Lula e Serra, para a eleição do segundo

turno. Ao comparar Lula a “garoto-propaganda” preestabelece ao seu adversário, Serra,

uma postura neutra e, portanto, no momento político polarizado, pró- Serra.

No artigo-ensaio de Reinaldo Azevedo, do caderno Bolsa de futuros – Rumo a

2003 com o título “Mentalidades – a hora do surrealismo” (anexo PL-8), o editor da

revista colocou Lula como um esquerdista pragmático e mencionou que esse adjetivo é

parecido com um direitista de princípios, posição a que Lula sempre se opôs, “(...) nada

é mais parecido com um direitista de princípios do que um esquerdista pragmático”.

Nesse sentido, no mesmo artigo o autor problematizou a “virada” ideológica que Lula

faz com o Saulo da passagem bíblica. Para Reinaldo, Lula. por ter tido o passado do PT

ultra-radical como base, sempre perseguindo, denunciando os erros do capitalismo, foi

apresentado pela mídia, depois de contratar Duda Mendonça, como o novo convertido.

Na história bíblica, Saulo perseguia os cristãos, mas, a caminho de Damasco, um anjo

apareceu. Com sua luz, cegou os olhos de Saulo, que depois de recuperar a visão, se

converteu, passando a se chamar Paulo e a pregar o cristianismo. Nisso, Azevedo

associa Lula a Saulo, “(...) o outro parecia Saulo a caminho de Damasco, a receber um

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raio de luz de um anjo marqueteiro, o que o levaria, cego de tanta luz, a pregar aos

gentios o capitalismo paz-e-amor recém-aprendido”. Na coluna “O Estado das coisas” de título “A miséria e a política” (anexo PL-9)

o autor João Carlos de Oliveira comparou o candidato Lula ao ideal de acabar com a

miséria, “Luiz Inácio Lula da Silva não é apenas sensível às demandas sociais: é a

demanda social em pessoa”. João Carlos avançou na argumentação de que um

presidente coerente para amenizar a situação político-econômica atual precisaria muito

mais que vontade, lembrando a idéia da vontade de Lula para resolver a miséria

brasileira. Logo, o autor colocou Lula como um herói, na aparência do discurso, mas

que, na prática presidencial, não funcionaria, “Deste país e de sua miséria imensa não se

escapa com atos de vontade, com heroísmo”, atribuindo- lhe a desqualificação de

equivocado enquanto candidato à presidência, por agir com tamanho heroísmo para uma

prática política inviável, no país.

No último artigo dessa edição de outubro, chamado “Ainda que vitorioso, Lula

não terá ganhado” (anexo PL-10), na coluna “Encrenca”, o autor Mario Vitor Santos

começou desqualificando as vantagens e “qualidades” do presidenciável Lula, “A

surpreendente montanha de votos que vai consagrar Lula no primeiro turno representa, é

óbvio, uma consagração e um reconhecimento, por parte dos eleitores, de qualidades do

candidato, por sinal, declinantes”. Vitor Santos retrata Lula com descrença a respeito de

uma futura vitória petista à presidência. O autor também mencionou que uma futura vitória de Lula não dependeria só

dele ou de sua equipe política, mas que é o resultado do próprio esgarçamento da

política implantada pelos anos FHC, “O desempenho eleitoral de Lula é mais obra da

profunda crise política nas bases de sustentação do governo”. Portanto, Vitor Santos

retira 100% de empenho, de mérito da campanha de Lula, para culpar em partes o

esvaziamento político dos anos FHC. A Primeira Leitura, na edição de outubro, publicou também o suplemento

especial sobre as eleições presidenciais de 2002, porém falando apenas do PT de Lula e

do PSDB de Serra.

Em um dos textos desse suplemento, “especial Rumo a 2003”, no caderno “Boa

Governança”, Vera Magalhães em “Texto de poeta, muque de peão” (anexo PL-11)

conservou a linha editorial da revista como foi analisada, reforçando a afirmação de que

Lula, este atual de 2002, criado como líder mais humanizado deveria ser esquecido seu

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passado, em razão da preferência do candidato em adotar uma blindagem ao que já

representou na história do PT, com apoio do marqueteiro Duda, que:

[...] não foi simplesmente vestir o candidato com ternos caros e tornar doce a fala antes rascante do líder operário Lula. O que ele fez – e é por isso que, indiscutivelmente, é o melhor numa área tão concorrida – foi embalar num discurso emocional um sentimento de mudança antes difuso no eleitorado e canalizá-lo para a figura de um Lula humanizado, que chorava, que falava diretamente às mulheres, que aparecia abraçado a uma estrela e que queria apenas paz e amor, enquanto os outros, veja só, queriam falar do passado e fazer “terrorismo”. Duda criou uma blindagem em torno de Lula e tornou-o um pop star, um líder carismático como não havia sido nas campanhas anteriores.

Nesse sentido, a reportagem não trouxe nenhuma fonte compatível com as

afirmações realizadas de um Lula produzido pelo marketing político. Nem a opinião de

Duda Mendonça, nem de outro especialista em marketing político, para dar maior

credibilidade e profundidade na argumentação e desenvolvimento de idéias expostas,

demarcando assim a opinião pura da repórter. O que ela trouxe foi um dado do livro

“Casos & Coisas”, de Duda Mendonça, de 2001, que antecipava a estratégia de colocar

um Lula mais voltado à aparência de paz e tranqüilidade.

Para Vera Magalhães, esse novo Lula teve outro forte apoio para se constituir, o

deputado José Dirceu. Logo, fica claro que, nessa reportagem, a autora esclarece que

Lula é produto constituído por uma boa imagem realizada por Duda e por uma

articulada aliança, trabalho desempenhado por Dirceu:

[...] mais do que discutir o que veio antes, importa reconhecer que a dupla Duda-Dirceu mudou para sempre o PT e o Lula tal qual o Brasil o conheceu. Tamanha transformação cobrará sua conta, e não será nenhum dos dois que vai receber a fatura. Será o “Lulinha Paz e Amor”, que até se parece com o Lula que disputou as outras três eleições, mas é outro. Ganhe ou perca as eleições, o sapo barbudo foi beijado pelo realismo e se transformou no Lula amoroso, um príncipe saudado até pela elite de banqueiros e empresários. É difícil que volte a ser sapo, ainda que quisesse. Obra de Duda e de Dirceu.

Em palavras mais críticas nesse texto de Vera, Lula representaria um fantoche

criado por Duda e Dirceu.

A essência da reportagem seria desenvolver um olhar crítico diante da produção

do marketing político, realizado por Duda Mendonça e sua equipe, e a presença política

de José Dirceu com os apoios políticos. Entretanto, o texto todo, de quatro páginas,

aborda uma visão simplista dessa essência, martelando sobre o assunto, tornando-o, na

linguagem e no discurso, espetacular. Segundo Perseu Abramo (2003, p.29) isso se

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refere à “inversão da forma pelo conteúdo”, ou seja, “o texto passa a ser mais

importante que o fato que ele reproduz; a palavra, a frase, no lugar da informação (...)”.

Vera Magalhães elabora mais um texto, com caráter de ensaio acadêmico, sem

referência para isso, mas com formato de reportagem. Utiliza-se de três fontes, o

secretário geral do PT, Luiz Dulci, e de declarações de José Dirceu do ano anterior,

quando concedeu uma entrevista à Primeira Leitura, bem como da citação do livro de

Duda Mendonça, como colocado.

As quatro páginas são concentradas no desenvolvimento do mesmo assunto, de

caracterizar Lula como construção do marketing vitorioso, realizado por Duda

Mendonça e do sustentado apoio que José Dirceu realizou nas alianças políticas com

outros partidos e frentes. E nessa construção, ela se utiliza do padrão de manipulação de

inverter a importância do conteúdo informativo, que nesse caso é opinativo, pela forma

das frases e colocações sobre as afirmações que constrói como realidade, o que Abramo

(2003, p.29) coloca como “(...) o visual harmônico sobre a veracidade ou a fidelidade; o

ficcional espetaculoso sobre a realidade”.

Na outra reportagem desse especial, “O socialismo é só um pôster na parede”

(anexo PL-12), os autores Reinaldo Azevedo e Vera Magalhães apontam, a partir do

título e subtítulo, que o PT, na representação com Lula, ao ser o novo poder em 2002

nas eleições presidenciais, traz também um aporte conservador, como partido mais ao

centro, “O socialismo é só um pôster na parede – mudança da agenda mundial, ação

institucional de FHC e derrotas sucessivas empurrando o partido para o centro. O

socialismo não passa de um preciosismo retórico. O poder vem junto com a guinada

conservadora”.

No argumento concedido ao filósofo Roberto Romano, da Universidade de

Campinas, a reportagem segue desenvolvendo o problema de que Lula, eleito, não

ganharia a batalha de ouvir e atender todas as ramificações que o PT contempla em sua

base partidária, em razão dessa nova criação das alianças de Lula:

O PT continua sendo uma federação de tendências. Essa diversidade interna impõe sérias dificuldades ao governo Lula. Estar no governo não significa necessariamente estar no poder, como diz um princípio básico da sociologia e da ciência política. Esses setores vão mobilizar suas forças conforme suas expectativas sejam atendidas ou não. Há o MST, a CUT, a Igreja Católica e as evangélicas, que são uma força crescente que o PT buscou atrair. Não será algo automático, caso chegue ao poder, organizar essas forças de modo que não crie um imenso mar de águas turvas.

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Problemática que é reforçada nos parágrafos seguintes: “O problema central não

está em Lula; está no partido. Se não havia história de uma agremiação tão grande, num

regime democrático, que conservasse esse perfil de movimento social e partido ao

mesmo tempo, também nunca se assistiu a uma legenda em tal e tão gigantesca

conversão”. Esse último argumento também traz a afirmação, ao leitor, de que o

presidenciável Lula usa de uma falsa impressão, como se camuflasse sua verdadeira

identidade, pois há antagonismos no seu perfil de candidato à presidência, já que, ao

passo que se une a uma linha conservadora, também promete a realização de projetos a

movimentos sociais que não correspondem a esse conservadorismo, ma is voltado à

direita.

Nesse sentido, os autores da reportagem afirmam que Lula está mais sensível à

direita por parecer, em seus interesses políticos, igual a Serra, “(...) quem apontar uma

diferença relevante – do ponto de vista político – entre Lula e Serra ganha o Troféu

Clarividência. Não há”.

Encerrando, Reinaldo Azevedo e Vera Magalhães mencionam que Lula é

praticamente o oposto do que era em anos anteriores, pois tinha a finalidade de angariar

a elite ao seu eleitorado e por isso se utilizou da estratégia de “mudança”, “A elite

queria um anti-Lula. E Lula resolveu ser o antípoda de si mesmo, um mito de duas

faces: o João ferrador do passado torna-se o Lula só rosas e furtivas lágrimas do

presente (...)”.

Com a intenção de mostrar ao leitor da Primeira Leitura que Lula seria uma

grande frustração por representar, na opinião dos autores, um candidato meramente

guinado por atitudes de adesão quando necessário, o que eles caracterizam de

personalismo excessivo:

Que a campanha petista se tenha perdido nos desvãos de personalismo excessivo, tornando o que é político mera adesão a um comportamento, a uma ‘atitude’ (‘no fundo, você é um pouco PT´), não parece ser bom nem para o país nem para o partido. Esse tipo de adesão perde-se tão rápido quanto de conquista. O que se paga pela frustração do eleitorado não vale o benefício da conquista temporária.

Utilizou-se apenas de uma fonte, de filosofia, sendo que o assunto é mais

voltado à política e ao período eleitoral, e o mais sustentável seria uma fonte com

repertório da ciência política. Houve o padrão de manipulação da “inversão da versão

pelo fato”, (ABRAMO, 2003, p.29), ou seja,

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não é o fato em si que passa a importar, mas a versão que dele tem o órgão de imprensa (...). O órgão de imprensa praticamente renuncia a observar e expor os fatos mais triviais do mundo natural ou social e prefere, em lugar dessa simples operação, apresentar as declarações, suas ou alheias, sobre esses fatos.

Logo, a reportagem formula uma opinião do Partido dos Trabalhadores, ou

melhor, a versão que a linha editorial da revista declara sobre a imagem do PT e de

Lula, deteriorando o passado de luta sindical e demais propostas mais radicais que o

partido tinha em outros momentos históricos anteriores. Com isso, os repórteres

condicionam a reportagem numa retórica versão, opinião, sobre essa história do PT,

atribuindo- lhe os deslizes e “pecados” que eles acham importantes e essenciais para o

desenvolvimento da matéria.

O outro padrão de manipulação existente nessa abordagem dos repórteres é a

“descontextualização” (ABRAMO, 2003, p.28) do fato original que é decorrido o

material informativo. Selecionam-se aspectos do fato, por exemplo, o fato original seria

a mudança de frente política que o PT tomou para a eleição de 2002. Com isso, a

reportagem fragmentou esse fato em versões sobre ele, descontextualizando-as segundo

o interesse da linha editorial da revista. Uma dessas descontextualizações, que

estampam essa postura, é referente a uma resposta de Lula sobre a pergunta, em 1982,

de Rogê Ferreira, um postulante do PDT, perguntado se ele (Lula) era comunista,

socialista, ou o quê? E Lula respondera que era torneiro mecânico. A partir desse novo

rumo desconecto da introdução, a reportagem segue ridicularizando Lula sob a

justificativa de que o PT tem postura dual, em se achar socialista e realizar aliança com

o PL.

E, realizando essa descontextualização, a reportagem constrói uma outra

realidade sobre o fato, atribuindo a Lula a postura de um presidenciável contraditório,

incapaz de assumir um mandato a Presidente, por agora estar “sensível à direita” e por

“não ser político”, não deixando claro o que seria “político” na reportagem.

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90

3.3 A CONSTRUÇÃO DO FANTOCHE LULA: ANÁLISE QUANTITATIVA DA

REVISTA PRIMEIRA LEITURA

Na primeira parte da análise quantitativa, traça-se uma visão panorâmica da

imagem construída, pela Primeira Leitura, do candidato Lula, para depois visualizar em

profundidade as fontes utilizadas e a que partidos estão ligadas.

Das 12 unidades de análise vistas no item 3.3 das edições de julho, agosto39,

setembro e outubro40 foram contabilizados um total de 6 reportagens, e 6 artigos, como

pode ser observado no gráfico 1, abaixo:

Gráfico IESPAÇO RECEBIDO POR CADA GÊNERO JORNALÍSTICO

(INFORMATIVO E OPINATIVO) NA COBERTURA DA CAMPANHA DE LULA PELA PRIMEIRA LEITURA

Informativo50%

Opinativo50%

De todo conteúdo informativo, do gênero reportagem, 50% (6 reportagens),

divulgado sobre a candidatura Lula nesta análise, 86% teve tratamento negativo e 14%

39 Na edição N°. 06, de agosto de 2002, não foi encontrado nenhum material a respeito do presidenciável Lula, portanto não houve material para ser incorporado como unidade de análise. 40 A edição N°. 08, de outubro de 2002, obteve além da revista de circulação tradicional, um suplemento de 32 páginas destinado ao segundo turno das eleições de 2002, e consta como parte integrante da edição N°. 08. Portanto, entrou como unidade de análise. A edição N°. 09 trouxe informações do resultado das eleições, contudo, optou-se por não incluí-la como unidade de análise.

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recebeu conotação positiva, e nenhum teve posicionamento neutro, como o esperado

para o gênero em questão, que prima pela neutralidade e objetividade jornalísticas.

Gráfico 2

CONOTAÇÃO DADA AO MATERIAL INFORMATIVO SOBRE A CANDIDATURA LULA NA PRIMEIRA

LEITURA

Negativo86%

Positivo14%

De todo conteúdo opinativo (gênero opinião) retratado sobre a candidatura Lula,

o total de 50% (6 artigos), em 100% foi atribuído um tratamento negativo ao candidato

petista.

Análise das Categorias:

Seguindo as categorias de análise sobre a construção da imagem, que a revista

Primeira Leitura traçou do presidenciável Lula, obedecendo aos seguintes itens:

1 - Perfil delineado do presidenciável Lula pela revista;

1.1 Qualidades e deturpações ressaltadas do candidato:

(sim, não e sem posicionamento)

• Popular

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92

• Controlado pelo marketing político

• Experiência profissional

• Ruim a formação escolar em curso técnico

• Capaz de administrar o governo

• Honesto

2 - Fontes selecionadas para entrevistas ou opiniões;

2.1 Especialistas nas áreas (quem e respectiva representação):

• Economista

• Cientista político

• Político partidário

• Psicólogo

• Filósofo

• Pesquisa (Bibliográfica e de Instituições de Pesquisa)

• Meios de Comunicação (assessorias e órgão de imprensa)

• Empresário

3 – Partidos políticos utilizados como fonte para o material informativo;

• PDT

• PSDB

• PFL

• PPS

• PMDB

• PL

• PT

• PPB

• PSB

• PTB

Primeiro será retratada a análise do material informativo (50%), separando essa

análise do material opinativo (50%).

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93

Partiu-se da hipótese de que a revista Primeira Leitura desenvolveu uma postura

parcial diante das informações sobre as eleições 2002, em específico do presidenciável

Lula. Para tanto, as categorias de análise traçaram um posicionamento mais claro nos

seus itens, já demarcando possíveis visões construídas de Lula. Com isso, selecionaram-

se cinco itens, na primeira categoria, diretamente ligados ao perfil traçado sobre Lula,

pela revista, que são: popular, controlado pelo marketing político, ruim a formação

escolar em curso técnico, capaz de administrar o governo e honesto. O eixo analítico

para separação desses cinco itens foi: sim, não e sem posicionamento.

Das seis reportagens (50% do material analisado), três atrelaram Lula a uma

imagem popular, enquanto as outras três reportagens não tiveram posicionamento no

quesito “popular”. Cinco reportagens disseram que Lula é controlado pelo marketing

político e apenas uma não se posicionou quanto à questão do marketing. As seis

reportagens não se posicionaram quanto à formação escolar de Lula ser de nível técnico,

ou seja, essa questão não teve posicionamento preconceituoso, ou qualquer outra

desqualificação pela revista. No item sobre se Lula é capaz de administrar o governo,

verificaram-se cinco reportagens apontando Lula como inapto à governança da

república brasileira, enquanto a reportagem restante se posicionou de maneira favorável

à mesma. E no último item, sobre a honestidade de Lula, constataram-se três

reportagens sem posicionamento sobre o adjetivo honesto e outras três associando-o a

desonesto. Averigua-se no Gráfico 3, na página seguinte:

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Gráfico 3

PERFIL DAS QUALIDADES E DETURPAÇÕES DA IMAGEM DO CANDIDATO LULA PELO MATERIAL INFORMATIVO DA REVISTA

PRIMEIRA LEITURA

0

1

2

3

4

5

6

7

Popular Controlado peloMKT. Pol.

Ruim aformação

escolar em cursotécnico

Capaz deadministrar o

governo

Honesto

sim sem posicionamento não

Na segunda categoria de análise específica para o material informativo, seis

reportagens (50% do material informativo analisado), foi quantificada as

especializações das fontes utilizadas para compor as reportagens. Entretanto, é

importante, nesta apreciação dos resultados, ressaltar que, das seis reportagens, uma não

entrou na composição. Da reportagem “o diabo na terra do sol”, da edição n.07 (p. 42-

49) foi retirado apenas um parágrafo, cujo conteúdo era direcionado ao voto do

entrevistado, o diretor Fernando Meirelles, como mostrou a análise da reportagem no

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item “3.2 A imagem de Lula pelas entrelinhas da Primeira Leitura: Análise

qualitativa”, na página 81. Portanto, não seria justificável a inclusão dessa reportagem

nas duas categorias que seguem esta análise.

A categoria de análise separou o eixo de itens que corresponde às fontes

utilizadas em: político partidário, psicólogo, empresário, pesquisa, filósofo, cientista

político, economista e meios de comunicação41.

Constataram-se 30 fontes utilizadas em cinco reportagens, das quais a maioria,

doze fontes, foram economistas. Nesse item “economista”, apurou-se que eles, além da

função de economistas, também exercem uma especialidade dentro da área econômica

bem detalhada, e foram trazidos nas reportagens por ordem de credibilidade e de

autoridade sobre os assuntos debatidos no campo que atuam. São eles: Raul Velloso

(especialista em contas públicas), Antonio Corrêa de Lacerda (da Sobeet – Sociedade

Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização), José Roberto

Mendonça de Barros (consultor da MB Associados)42, Vladimir Caramaschi (da

corretora Fator Doria Atherino), Richard Haass (diretor de política e planejamento do

Departamento de Estudos dos EUA), Luiz Gonzaga Belluzo (professor da Unicamp e

ex-secretário de Política e Economia do Ministério da Fazenda), Guido Mantega

(professor da FGV-SP e coordenador do programa econômico de Lula), Tito Ryff

(assessor econômico de Garotinho), Carlos Kawall (chefe do Citibank), Octávio de

Barros (chefe do BBV Banco), Luciano Coutinho (professor titular da Unicamp) e

Fabio Giamiagi (do BNDES).

O outro item, que também foi bastante referenciado pelas reportagens, foi o

“político partidário”43, que obteve dez fontes. Seguindo, houve duas fontes dos

seguintes itens: “filósofo”, Roberto Romano (Unicamp) e José Arthur Giannotti (USP);

“cientista político”, Maria Victoria Benevides (USP e membro da equipe de programa

de governo do PT) e Gildo Marçal Brandão (USP); e “pesquisa bibliográfica” que

utilizou a referência dos livros: Utopia de Thomas Morus e Casos & Coisas de Duda

Mendonça. E com um item consultado ficou “psicólogo”, Leon Festinger (americano) e

“empresário”, Ricardo Guedes, (proprietário do Instituto de pesquisas Sensus de Belo

41 Não houve fontes de meios de comunicação. 42 José Roberto Mendonça de Barros escreve, como convidado, esporadicamente na coluna “Encrenca” da revista Primeira Leitura . 43 Esse item “político partidário” será diluído, na próxima categoria, em quais foram os partidos políticos ligados às fontes.

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Horizonte). O item de “assessoria” não foi consultado pelas reportagens da Primeira

Leitura, portanto nem teve presença no Gráfico abaixo. Averigua-se no Gráfico 4:

Gráfico 4

Fontes utilizadas pela Primeira Leitura para a produção do Material Informativo

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28

Economista

Cientista Político

Filósofo

PesquisaBibliográfica

Empresário

Psicólogo

Político Partidário

Número de freqüência das fontes

O item “político partidário” foi mantido isolado e analisa os partidos que as

fontes representam, para compreender pontualmente quais os partidos e frentes políticas

que apóiam. Foi separado em dez partidos mais comuns do país 44, PDT, PSDB, PFL,

PPS, PMDB, PL, PT, PPB, PSB e PTB.

O PDT foi utilizado uma vez nas reportagens como fonte. O postulante do PDT,

Rogê Ferreira, foi citado como referência sobre a história e deslizes do PT. Com apenas

uma citação, o PPS foi referenciado nas idéias de Roberto Freire. A outra fonte

44 Não houve fontes ligadas aos partidos: PTB, PSB e PPB.

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partidária que também só foi citada uma vez foi o prefeito tucano de Vitória-ES, Luiz

Paulo Vellozo Lucas.

O partido líder de fontes foi o PT, com sete nomes, João Paulo Cunha (líder do

PT na Câmara), Heloísa Helena (senadora), Cristovam Buarque (senador), José Dirceu

(deputado), Luiz Dulci (secretário-geral do PT e presidente da Fundação Perseu

Abramo), Jorge Viana (governador reeleito do Acre) e o próprio Lula. Averigua-se no

Gráfico 5:

Gráfico 5

Freqüência dos Partidos Políticos como fontes de consulta para o desenvolvimento do Material Informativo

0 2 4 6 8 10

PT

PSDB

PL

PMDB

PPS

PFL

PDT

Número de freqüência das fontes

Nesse último detalhamento da análise quantitativa serão apresentados os dados

referentes ao material opinativo (50%), no total de seis artigos.

Cinco itens foram selecionados, na categoria que traça o perfil do candidato Lula

exposto nas entrelinhas e posicionamentos mais nítidos dos seis artigos retratados. Esses

cinco itens foram mantidos a partir do material informativo (50%), que são: popular,

controlado pelo marketing político, ruim a formação escolar em curso técnico, capaz de

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administrar o governo e honesto. O eixo analítico para separação desses cinco itens foi:

sim, não e sem posicionamento.

Dos seis artigos (50% do material analisado), três atrelaram Lula a uma imagem

popular, enquanto dois não se posicionaram e apenas um associou Lula a uma figura

não popular. Dois artigos disseram que Lula é controlado pelo marketing político e

quatro não se posicionaram quanto à questão do marketing. Cinco artigos não se

posicionaram quanto à formação escolar de Lula ser de nível técnico, e apenas um acha

ruim essa formação de Lula. No item sobre se Lula é capaz de administrar o governo,

verificou-se que os seis artigos analisados apontam Lula como incapaz de administrar a

Presidência da República, ou seja, todos os articulistas se posicionaram contra a

viabilidade de Lula como Presidente. E no último item sobre a honestidade de Lula,

constataram-se cinco artigos não se posicionando sobre a honestidade de Lula e apenas

um associando-o a desonesto. Averigua-se no Gráfico 6, na página seguinte:

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Gráfico 6

PERFIL DAS QUALIDADES E DETURPAÇÕES DA IMAGEM DO CANDIDATO LULA PELO MATERIAL OPINATIVO DA REVISTA

PRIMEIRA LEITURA

0

1

2

3

4

5

6

7

Popular Controlado peloMKT. Pol.

Ruim aformação

escolar emcurso técnico

Capaz deadministrar o

governo

Honesto

sim sem posicionamento não

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100

CAPÍTULO IV

CARTACAPITAL VOTA LULA EM PROL DE INTERESSES

NACIONALISTAS

“O aparecimento de qualquer sistema

de conhecimento está sempre relacionado

com uma modificação no poder”.

Michel Foucault

4.1. HISTÓRICO DA CARTACAPITAL

A revista CartaCapital surgiu como uma publicação mensal em agosto de 1994,

criada por Mino Carta, o atual diretor de redação. A revista tornou-se quinzenal em

1996 e passou a ser semanal em 2001 e editada pela editora Confiança.

Desde seu lançamento, CartaCapital se baseia, segundo o atendimento da

revista, em quatro princípios básicos que definem sua postura e compromisso com os

leitores: independência, coragem, espírito investigativo e confiabilidade. Mino Carta,

cujo nome de pia é Demétrio Carta, natural de Gênova, Itália, começou a dirigir a

primeira redação aos 25 anos, na revista Quatro Rodas. Quatro anos mais tarde, foi

chamado pelo jornal O Estado de S. Paulo para fazer uma edição de esportes que

circulava às segundas-feiras, e em 1966 deu origem ao Jornal da Tarde. No começo de

1968, Mino inicia seus trabalhos como jornalista, na Editora Abril, criando a revista

Veja, lançada em setembro do mesmo ano. Em fevereiro de 1976, começou a enfrentar

problemas com a censura e, a pedido do então Ministro da Justiça, Armando Falcão –

um dos responsáveis pela censura – em 1976, Mino deixou oficialmente Veja. No

mesmo ano, criou a revista IstoÉ e o Jornal da República. Saiu da IstoÉ em agosto de

1993 e, em agosto de 1994, criou a CartaCapital. (VASCONCELOS, Frédi &

DOMZETTI, Paulo & NOVAI, Renato, 26 de out. 2003, versão on- line).

De acordo com dados concedidos pelo departamento de Marketing Publicitário

da revista CartaCapital,

Nossa proposta – informar com consistência, profundidade e análise de conteúdo – já aprovada pelos formadores/multiplicadores de opinião, passa a

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atrair o interesse de um público mais jovem, que pretende entender melhor os assuntos ligados à política, economia e cultura.

O departamento acima também comenta que os leitores de CartaCapital são, em

sua maioria, executivos e empresários das classes A e B, “personalidades influentes nos

meios empresarial e político, e profissionais liberais, que procuram um tratamento mais

profundo no que diz respeito às notícias. São, sobretudo, formadores e multiplicadores

de opinião”.

Perfil do público leitor

Idade do público leitor

2% 14%

44% 16%

12%

12% Entre 10 e 14 anos

Entre 15 e 19 anos

Entre 20 e 29 anos

Entre 30 e 39 anos

Entre 40 e 49 anos

Acima de 50 anos

55%

45% Homens

Mulheres

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Tiragem por edição

8.000

13.000

18.000

23.000

28.000

33.000

38.000

43.000

48.000

53.000

58.000

Tiragem Circulação Nacional

Tiragem: 58.000 exemplares

Circulação Nacional: 45.980 exemplares

Separação por Classe Social

38%

54%

5% 3% A

B

C

D

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103

4.2 SOMOS LULA: ANÁLISE QUALITATIVA DA REVISTA CARTACAPITAL

Nas duas primeiras edições de setembro (ed. nº 205, do dia 04, e ed. nº 206, do

dia 11) não houve matérias relevantes relativas ao candidato Luis Inácio Lula da Silva, e

a construção de sua imagem, em especial.

Logo, as análises são retomadas na ed. nº 207 referente à semana 18 de

setembro. O primeiro e único texto sobre Lula é a reportagem “E a máquina avança”

(anexo CC - 01) do repórter Bob Fernandes, ocupando quatro páginas, na seção “Seu

País – Sucessão”.

Nessa reportagem, Bob desenvolve uma postura crítica diante do governo FHC e

da mídia, em defesa da imagem positiva de Lula. Logo na linha fina, já problematiza a

questão que desenrola no texto, num cenário opinativo e diferenciado que constitui a

reportagem: “As ações e reações de Fernando Henrique, Nelson Jobim... e, mais uma

vez, o embarque da mídia numa candidatura oficial”. A reportagem traz acusações

contra o então presidente Fernando Henrique Cardoso, seu sucessor, o presidenciável

José Serra, o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, e também traz

vários exemplos estruturados por Bob de como a mídia em massa apóia e apoiava o

candidato do governo e tenta e tentava “desmontar” os outros candidatos, em especial

Lula.

A primeira página da reportagem escrita por Bob Fernandes é composta de

acusações contra FHC, José Serra e Nelson Jobim, e logo no primeiro argumento, ele

mostra como o Presidente fazia o seu jogo em cima da mídia para conduzir as ações e

reações referentes a seu candidato: “O Presidente da República, Fernando Henrique

Cardoso, telefona para o dono de um jornal. Apela para que não publique uma notícia

sobre o candidato do governo, José Serra, e acrescenta: ‘Isso seria muito ruim para o

Serra nessa hora’ ”.

Bob Fernandes comenta que prefere o anonimato do jornal para manter a fonte

que lhe passou o fato. Com isso, ele direciona a reportagem à primeira problemática

jornalística, a ausência de fontes para interagir com os fatos. Como o assunto que Bob

começa propondo na reportagem é uma denúncia, o repórter teria que trazer com

cuidado a informação, embasando-a com fontes credenciadas sobre o assunto,

principalmente em época eleitoral, em que denúncias políticas afetam imagens de

candidatos com facilidade e ganham amparo na mídia com rapidez. Por isso se afirma

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104

que há a presença da “difusão” (GARCIA, 1990, p.77), a possibilidade de o fato

apresentado advir de bases insustentáveis, ou seja, ser apenas rumores, pois estes se

caracterizam pelo anonimato. A grande problemática desse tipo de propaganda

exemplificada por GARCIA é o público extenso que pode atingir.

A próxima acusação é referente a Jobim, que desde o começo do governo FHC

até abril de 1997, foi Ministro da Justiça, mas que “depois, por indicação do Presidente

da República, tornou-se Ministro do Supremo Tribunal Federal”. Bob enfatiza que os

laços não são apenas políticos: Serra foi padrinho de casamento de Jobim com Adrienne

Senna, que “no Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) é detentora do

poder de puxar – ou não puxar – o fio do fluxo e contrafluxo financeiro, em especial o

ilegal, que circula, entra e sai do país”. O jornalista ainda problematiza que, anos atrás,

Serra e Jobim dividiram um apartamento em Brasília e que, em setembro de 2002,

Jobim presidia o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o processo eleitoral, isto é, ele

poderia tranqüilamente controlar os processos de acordo com seus interesses.

Continuando com as acusações, mas agora citando artigo escrito por Luís Nassif,

da Folha de S. Paulo, a matéria mostra uma tentativa de aproximação entre o governo

FHC e o governo de George W. Bush, nos Estados Unidos, através de Nelson Jobim –

interlocutor de Fernando Henrique – e o empresário Mario Garnero. “Nunca iria

imaginar um ministro da mais alta corte do país a cumprir uma missão em nome do

Estado do qual deve, constitucionalmente, independer”. Bob comenta que confirmou

com o autor do artigo que sua publicação não rendeu nenhuma contestação por parte do

governo ou de qualquer um dos envolvidos, o que prova, segundo Bob, que por meio

desse silêncio as informações divulgadas eram verdadeiras.

O repórter, dessa maneira, induz o leitor a formar o pensamento interligando os

personagens políticos citados com referências pejorativas como, por exemplo,

corrupção e desonestidade parlamentar. Além disso, Bob desenvolve junto com isso a

“codificação” (GARCIA, 1990, p.48), “as idéias tornam-se mais acessíveis quando

associadas a outras mais simples”, portando a denúncia, sem fontes, é estruturada e

discorrida por afirmações pelo repórter, que estejam numa cronologia simples, por meio

de uma história, interligando os personagens, para a apresentação de um novo gancho,

que será confirmado nas análises abaixo. Portanto, por meio da simplificação da

codificação, em história (por não trazer fontes e apresentar uma linguagem desenvolta),

Bob narra, ou melhor, induz o leitor aos fatos essenciais que quer ressaltar mais no

meio-fim da reportagem.

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105

Reafirmando essa percepção da “codificação” (GARCIA, 1990, p.48) o

jornalista faz uma “inversão nos fatos”, imaginando que os acontecimentos citados até

então tivessem acontecido com outros personagens, em especial, com Lula na

presidência. E Bob pergunta a cada cenário criado: “o que não diria a mídia?”, numa

clara afirmação de que se tudo isso tivesse acontecido com o PT, a mídia não teria

deixado passar em branco como ocorreu. Bob mantém a defesa particular de seu

candidato Lula à presidência.

Para tanto, utilizou-se da codificação para remeter a Lula um condicionamento

vitimizado, em que a mídia o enquadra como perdedor, sempre, nunca o apoiando,

como acontece com FHC e seus sucessores, segundo Bob. Fica nítido o posicionamento

de defesa da CartaCapital a Lula. Não há simplesmente a “inversão da versão pelo

fato” (ABRAMO, 2003, p.29), porque Bob propõe, a partir do título “denunciar”, o

“esquema FHC e a mídia”, e para isso ele processa a defesa de Lula por meio de

elementos da propaganda que lhe garantem comparar os candidatos à presidência sem

precisar remeter a Lula uma construção positiva, da maneira tradicional de manipulação

da informação, pois construindo um cenário, em formato de história, igualou-o à vítima

da “história”, portanto o “mocinho”, em contraponto do vilão. Segundo Perseu Abramo

(2003, p. 35) divide-se em “realidade do campo do Bem e realidade do campo do Mal, e

o leitor/espectador é induzido a acreditar não só que seja assim, mas que assim será

eternamente, sem possibilidade de mudança”.

A defesa de Lula é vista com clareza na valorização da fonte, assessoria do

candidato Lula, para “evidenciar” o levantamento negativo dos jornais da imagem de

Lula pela “pesquisa” que a assessoria expos sobre o assunto.

Exposição nos jornais O Estado de São Paulo, Folha de São Paulo, Jornal do Brasil e O Globo entre os dias 31 de agosto e 6 de setembro. Notícias negativas sobre Ciro Gomes: 106. Notícias negativas sobre Lula: 90. Notícias negativas sobre José Serra: 43. Notícias positivas sobre Ciro Gomes: 42. Notícias positivas sobre José Serra: 71.

Prosseguindo com suas críticas, o jornalista mostra sua consternação frente aos

fatos, utilizando-se de opinião clara, mas com base em possíveis verificações do

noticiário impresso:

A mídia, no mundo de Fernando Henrique, José Serra e Nelson Jobim, tirante a Folha no domingo 8, o UOL News no dia seguinte e o Correio Braziliense, mal registrou. E ponto. Seqüência do caso? Investigações?

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Nadinha. É absorvente, extenuante, a tarefa de liquidar Ciro Gomes e mirar em Lula.

Bob prevê que, a partir daí, aquele que seria “o maior bombardeio de que já se

teve notícia num ano eleitoral” estava prestes a ter início. E seria contra Lula.

Mostra que vários “ilustres personagens” escreveram sobre o descarado apoio da

mídia ao candidato governista, entre eles, os escritores Luis Fernando Verís simo, Jânio

de Freitas e o ombudsman da Folha de S. Paulo, Bernardo Ajzenberg, e mais uma vez

mostra a sua indignação, com opinião, contra a mídia:

Escasso é o poder real da patuléia das redações. Quem, redações Brasil afora, der sinais de que não tem bom faro para o rumo dos ventos estará condenado ao degredo. Como está, de resto, quem ouse dizer aquilo que qualquer foca sabe, mas não pode – e nem há espaço para – ser dito.

Para justificar seu pensamento, Bob discorre em um longo discurso que, segundo

ele, “desvenda” as mazelas da mídia “vendida”, e que merece ser reproduzido na íntegra

por mostrar que o texto não contém fontes, nem mesmo de especialista na área de crítica

de mídia, que poderia agregar valor à informação. Mas se optou em trazer as

informações sem fonte que, ao serem criadas pelo autor, sustentam objetivos próprios

sobre o fato que está desenvolvendo na reportagem:

De um lado, visceralmente identificados, estão os interesses dos dirigentes das empresas, dos seus porta-vozes numa redação. De outro, os interesses de quem tenha, ou busque, um espaço privilegiado. A moeda do, ou da, escriba, na boa hipótese, costuma ser a informação. Aposta-se sempre em que está, ou estará no poder. É garantia segura de, acredita quem assim age, boa informação. Quando, já no poder, alguém dá mostras de estar em queda, ou liquidado, prepara-se rapidamente o grande salto em direção ao futuro; sempre haverá espaço para a meia -trava e a recueta; quem está no poder assimila, só chegou lá porque sabe como é esse jogo. É da boa prática também a defesa prévia com ataques. Tome-se o caso da sucessão presidencial em curso. Desmonta-se quem aparecer pela frente da candidatura oficial e, depois, antes do desmonte seguinte, busca-se colar um rótulo em quem resista. Quem resista, seja lá por qual motivo for: princípios, mero impulso, ou mesmo as ânsias que o espetáculo costuma provocar. A tática foi empregada pelo Chefe, Fernando Henrique Cardoso, quando do primeiro mandato em busca do segundo. Quem não se recorda dos seus adjetivos, repetidos ad infinitum pelos porta-vozes do governo em emissoras de televisão, rádio, jornais e revistas? Pessimistas, catastrofistas, primários, caipiras, radicais, atrasados, neobobos, nhenhenhém...

Ao continuar com a linha da reportagem de manter-se na defesa de Lula,

culpando a mídia e o poder de governo de FHC, Bob elabora, na terceira página de

reportagem, a afirmação de que pelo fator de a imagem do governo estar gasto, a única

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saída que FHC e Serra têm é atacar Lula e o PT. Bob identifica com sarcasmo, sem

utilização de qualquer fonte para isto:

Nesta segunda semana de setembro, o cardápio do prato seguinte, Lula, já estava nas páginas: MST, muito MST, Santo André, Olívio Dutra, Zeca do PT... Para ser servido fartamente. Eis que reaparece a reencarnação do inominável: José Rainha! Amigas, amigos, por onde andava José Rainha? Por que só agora, como se viu também às vésperas da reeleição em 98, José Rainha reaparece nas páginas, nos telejornais? Por que, ao comando vocal de José Serra, manchetes buscam, cobram, apontam, ligações entre o PT e o MST? Por que, enquanto se demonizava Ciro Gomes, desapareceram Rainha, o MST? Porque, ali, a hora era de matar Ciro.

Bob segue com sua crítica e defesa ao PT, citando agora o jornalista Ricardo

Noblat do Correio Braziliense, que escreveu na Carta ao Leitor de seu jornal:

“A maioria dos donos de veículos de comunicação quer a vitória de Serra. A maioria dos jornalistas se divide entre Lula e Serra. Ciro virou um incômodo para Lula, Serra, donos de mídia e jornalistas. O modo como trata os jornalistas piora o tratamento que recebe deles. Uma eventual vitória de Ciro obrigaria os jornalistas a renovarem suas agendas de fontes de informação e a voltarem a cultivar fontes que já tinham descartado, como o ex-senador Antônio Carlos Magalhães...”.

Bob recai contra a mídia, culpando-a, de trabalhar desenvolvendo pautas

menosprezando Lula, se posicionando de maneira negativa ao candidato.

É do bom jornalismo investigar, repisar, mais uma vez, as ligações do PT com o MST, mas e as imbricadas ligações entre o mundo da política e o processo de privatizações no Brasil, onde andam? Por que o lado obscuro das privatizações sumiu das páginas, das manchetes, dos telejornais? Se tudo aquilo era ficção, por que um dia foi notícia? Se não era, por que não é mais notícia, enquanto Santo André, o Zé Rainha e o Olívio voltam às manchetes? Qual foi, como se deu, a ascensão econômico-financeira de cada um dos candidatos? Como ganharam a vida, em que instante deram o salto – se é que deram? O que dizem, disseram, seus pares ao longo da caminhada na vida pública?

Para encerrar sua matéria defendendo a integridade de Lula à mídia, Bob recorda

de duas edições de duas revistas que mostraram um Fernando Henrique poderoso e

capaz, e um Lula que poderia acabar com o país e trazer o caos, tentando comprovar que

o “terrorismo” criado contra Lula não é fato recente.

Setembro de 1994, edição 567, a revista Exame, em 14 páginas, faz uma reportagem e entrevista Fernando Henrique Cardoso. Título da reportagem: “Nunca foi tão fácil fazer a opção certa”. Capa da revista com o rosto do

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candidato e a manchete, garrafal: “Por que Fernando Henrique é melhor”. Cinco anos antes, novembro de 1989, a três semanas do 17 de dezembro, data do segundo turno entre Fernando Collor de Mello e Lula. A revista Veja, em sua matéria de capa, traz Lula e o capitalismo. À página 53, em matéria de sete páginas, caracteriza-se o PT: “(...) se abrigam sindicalistas com variados graus de agressividade, líderes grevistas e seitas esquerdistas que adoram fazer elogios ao sandinismo da Nicarágua, ao comunismo cubano de Fidel Castro e à luta de classes”. Ao lado de Collor havia de tudo um pouco, inclusive um bando que iria assaltar os cofres públicos, mas aquilo não era importante naquele momento decisivo. Segue a matéria, aterrorizadora: “Aquela fatia da população que é dona do seu próprio negócio tem a impressão de que vai ficar muito mais difícil trabalhar, investir e ganhar dinheiro caso a hipótese Lula se transforme no presidente Lula”. Não era o suficiente. Havia mais: “As pessoas que conseguiram formar um pequeno patrimônio ao fim de uma vida de trabalho, mesmo que seja uma casa posta para alugar, perguntam-se o que pode lhes acontecer. Há advogados querendo saber se sua clientela terá dinheiro no bolso para pagar seus honorários. Profissionais bem-sucedidos alimentam dúvidas sobre a possibilidade de ficar sem as promoções que esperam, sobre as nuvens que passam a cercar suas carreiras ou mesmo sobre as chances de perder o emprego...”. Quarenta e cinco dias depois, Collor e os seus assaltavam a poupança de um país inteiro. O que se vê e o que se verá daqui por diante, embora mais sutil, mais sofisticado pelas experiências anteriores, é mais do mesmo. Em quantidade amazônica.

Ao recorrer à lembrança dos posicionamentos parciais das duas revistas, visto

acima, o repórter se utiliza da estratégia de retomar antigos enraizamentos sociais em

prol da afirmação de uma “mídia que encurrala Lula”, novamente codificando

(GARCIA, 1990, p.50) a mensagem de um Lula vítima da situação, colaborando para a

aceitação da mensagem com maior facilidade, visto que a existência do fato já

aconteceu e a probabilidade de estar acontecendo novamente, por meio do resgate do

Lula “vítima-mocinho”, é definida como verdadeira (GARCIA, 1990, p.50).

Na edição nº 208, referente à semana 25 de setembro, o artigo “Machado

também não era ‘preparado’” (anexo CC – 02), o articulista e proprietário da revista,

Mino Carta, aproveita a notícia do escritor Raymundo Faoro ter assumido a cadeira nº

06 da Academia Brasileira de Letras, no dia 17/9/02, para criticar o candidato tucano e

qualificar Lula.

Mino Carta ressalta no artigo que Faoro lembrou, no discurso de posse, que

Machado de Assis não tinha sequer o curso primário e foi o fundador da Academia

Brasileira de Letras.

Fica claro o posicionamento da revista, que tenta demonstrar nesse artigo que o

adjetivo “preparado”, para os candidatos à presidência é relativo. Mino Carta comenta

esse episódio, iniciando com a seguinte frase: “Preparado, jamais esta palavra foi

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pronunciada com igual freqüência. É senha. O qualificativo-chave (...)”, e ataca a mídia

e os tucanos que se referem à Lula como um despreparado.

Mino Carta propõe no presente artigo a reflexão de que o candidato Lula tem

experiência política, mesmo não tendo curso superior, e que para “administrar” o Brasil

isso é suficiente. Com isso, deixa nítida sua postura em relação à eleição, quer Lula para

Presidente. Compara também o “nacionalismo” presente no discurso de Faoro aos

projetos de mudança que Lula apresenta ao Brasil. A estratégia procura demonstrar o

candidato petista como uma alternativa viável e uma chance de revitalização ao país,

atrelando Lula à possibilidade de resgatar o nacionalismo, em detrimento do

“neoliberalismo globalizante”, como coloca Carta.

Na mesma edição, na reportagem “Vade-Retro” (anexo CC – 03), na seção “Seu

País – Sucessão”, de páginas 26 a 31, o repórter Bob Fernandes desenvolve a idéia de

que o candidato Serra, para chegar ao segundo turno das eleições de 2002, parte para o

período das “invenções”, demonizando a figura de Lula e para isso Serra utilizaria dos

meios de comunicação.

A notícia que desencadearia essa suposta demonização de Lula é que, ao

discursar a 160 oficiais, na sexta-feira 13, Lula criticou a adesão do Brasil ao Tratado de

Não-Proliferação Nuclear. E, segundo Bob, Serra, com base nesse recorte da fala de

Lula, anunciou para “60 atônitos militares – da ativa e da reserva” que Lula é a favor

“em última instância, da bomba atômica”.

E com base na idéia de “demonização de Lula pela mídia” e “por Serra, junto

com a mídia”, que Bob ironiza mais a situação criada, remetendo à possibilidade de a

mídia inventar que quem está fabricando a bomba atômica é o “MST dirigido pelo José

Rainha”.

Há a “dicotomização” (CHOMSKY e HERMAN, 2003, p.90) do fato original,

em apoio à figura do candidato petista. Segundo Chomsky e Herman “(...) a abordagem

da propaganda à cobertura da mídia sugere uma clara dicotomização sistemática e

altamente política na cobertura de notícias com base em sua utilidade para os

importantes interesses do poder”. Com o cenário construído por Bob, acima, verifica-se

que a vítima da história é Lula, e, portanto, o vilão é Serra. Na construção, pelo fato de

Serra ter “jogado baixo” em conotar a Lula os sinônimos do dito “demônio”, Bob separa

o bom do mal, o que é correto, do que é incorreto, do que inventa situações para sair em

vantagem na batalha eleitoral, do que é transparente e, por isso, é “bombardeado” com

associações pejorativas e agressivas, como “demônio”.

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A criação da “dicotomização” favorece um lado, visto que o fato é dividido em

duas partes. Mas a problemática maior é que, na maioria dos fatos originais, não se

encontra essa dualidade. O fato real, nesse caso, são as possíveis interpretações

construídas pela mídia do discurso sobre o Tratado de Não-Proliferação Nuclear por

Lula e a deturpação, ou mesmo, a gafe política, de Serra sobre a má interpretação do

discurso do concorrente. E para isso, Bob poderia trazer evidências sobre as “falhas

interpretações” da mídia, mostrando manchetes, e respectivos órgãos de imprensa, sem

precisar dicotomizar o fato.

Com essa abordagem, Bob se posiciona em defesa do candidato Lula, operando

como seu intercessor a possíveis aparecimentos deturpadores de sua imagem.

Esse posicionamento pró-Lula recebe outro indicativo na segunda página da

reportagem, em que se monta um comparativo de “relações”, para provar que MST e

Lula têm ligações distantes com a Farc.

O Pelé, por exemplo, a Gisele Bündchen ou um esquimó no Alasca. Vocês talvez não os conheçam, mas alguém conhecerá alguém que conhece alguém que conhece quem os conheça. Donde, o senhor, a senhora, você, caro estudante, tem a sua ponte com o Pelé, com a Gisele e com o esquimó. Da mesma forma, com o PT tem suas relações com o MST que, por sua vez, conhece alguém das Farc, o Lula é íntimo das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. Simples como se vê.

A defesa, na reportagem, a favor de Lula continua, agora Bob ressalta que o PT

tem uma “carta na manga”, com um “cutucão”, quando Serra vier com a história do

candidato “preparado” atacando Lula.

A lista de abuses do PT – à espera de comando – também é pesada. Passa pelos 84 mortos na epidemia de dengue do último verão, quando Serra era Ministro da Saúde, e lembra que está próximo outro verão, época em que o Aedes aegypti deixará seus casulos e voltará a denguear.

E lembra que “o PT tem ainda guardada a história da omissão em declarações de

bens de José Serra à Justiça Eleitoral nas campanhas de 1994, 1996 e nesta de 2002”.

Ambas as acusações contra Serra não trouxeram comprovações, marginalizando

a informação ao nível de descrédito, por não apresentar valor real enquanto informação

verídica.

Para fechar a reportagem, Bob traz ao leitor a reprodução de um texto que roda a

internet, por e-mail, que desqualifica o candidato Lula. Bob, em última defesa na

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reportagem, chama o texto de “pedestre” e identifica que quem o enviou foi Silvana

Tinelli, esposa do publicitário Nelson Biondi, da equipe de campanha de Serra.

Com essa ligação, associou Serra à culpa da mensagem. Novamente Bob

caracteriza-se por achar “os culpados” e “heroicizar a vítima”.

Na próxima edição, nº 209, referente à semana do dia 02 de outubro, na seção

“A Semana”, Mino Carta afirma que a revista “CartaCapital escolhe Lula” (anexo CC –

04).

Apesar de diversos indícios esclarecendo a escolha da revista pelo candidato

Lula, nessa edição o editor decidiu “escancarar” seu posicionamento. O momento

parece estratégico, já que a data dessa edição é apenas quatro dias antes do primeiro

turno das eleições. Mino Carta ressalta que, diferentemente das escolhas editoriais das

outras revistas, CartaCapital se colocou como produto alternativo nesse segmento,

optando por Lula abertamente.

“CartaCapital manda às favas a tradição verde-amarela e declara sua escolha

pela candidatura Lula. E explica que enxerga em Lula a liderança mais adequada ao

momento.” Ainda, Mino o coloca como representante do trabalho, ou seja, símbolo do

povo, “(...) pela primeira vez, um representante do trabalho”. Além de qualificá- lo como

grande negociador e administrador,

Ele representa a chance de mudar a política econômica que nos conduziu ao desastre. Tem autoridade para gerir tensões sociais crescentes. É negociador adequado nas cortes internacionais, onde goza de maior prestígio do que gostaria quem o ataca e o denigre.

Para justificar a escolha, o autor utiliza como um dos argumentos o papel da

mídia nas eleições. Mino Carta afirma que a imparcialidade e objetividade no

jornalismo são utópicos e acusa de hipócritas os meios de comunicação (com exceção

de O Estado de São Paulo) que evitam declarar abertamente que apóiam o candidato do

governo, apesar de o fazerem de forma subjetiva.

Na mesma edição, o repórter Sérgio Lírio em “Empresários paz e amor” (anexo

CC – 05), da página 26 a 28, na seção “Seu País” mostra o candidato petista como

negociador, como representante ideal para defender os interesses do empresariado, sem

se esquecer da classe menos privilegiada.

A reportagem traz depoimentos de nove renomados empresários que vão votar

em Lula, dizendo o porquê do voto e principais diretrizes que um possível governo

petista traria de favorável à nação brasileira. A reportagem transmite a idéia de um

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partido que dialoga, que procura a melhor decisão buscando a ajuda de todos. Sérgio

utiliza da fala do acionista dos laboratórios Aché, maior indústria farmacêutica de

capital nacional, Victor Siaulys. Nisso, Lírio conduz o posicionamento pró-Lula por

meio de declarações de fontes, se ausentando da fórmula opinativa declarada.

Mas essa postura jornalístico- informativa não se estende pela reportagem inteira.

Sérgio ressalta: “cristaliza-se em alguns setores a impressão de que Lula e o PT reúnem

as melhores condições de implantar um projeto nacional, cujos alicerces estariam na

redução da desigualdade social e no incentivo ao mercado consumidor interno”.

Durante a reportagem, houve dois trechos em que fontes “entrevistadas” não

foram identificadas.

“‘Em 40 anos, foi a primeira vez que um candidato nos procurou para

conversar’, disse um diretor da entidade a uma agência de notícias internacionais. A

frase não foi publicada” e “A campanha petista tem recebido vários recados de grandes

empresários, alguns deles ligados a Serra, interessados em embarcar discretamente na

canoa de Lula”.

A entidade do primeiro trecho diz respeito à Federação Brasileira dos Bancos

(Febraban).

O repórter Sérgio Lírio utiliza-se do “padrão de ocultação por presença”

(ABRAMO, 2003, p.26) em ambos os trechos citados acima, em que o veículo de

comunicação, ou mesmo o repórter, menciona um dado que passa a existir

jornalisticamente e “toma o lugar do fato real”, criando uma realidade diferente da real

que é criada pela imprensa. A presença da possível fonte da Febraban remete à ligação

da entidade com o voto em Lula, bem como o itálico do segundo trecho, em que

concede existência a essa realidade do aumento do empresariado votar em Lula e apóia-

lo. Contudo, verifica-se, ao passo que não tem sustentáculo, a generalização das fontes

nos trechos citados há também a manipulação por indução (ABRAMO, 2003, p.33), em

acreditar no que elas disseram, simplesmente, por elas existirem na reportagem.

Na próxima reportagem, “O Brasil vai bem...mas...” (anexo CC – 06), escrita por

Bob Fernandes, na seção “Seu País”, o repórter descreve o cenário da festa Louis

Vuitton, no Museu Brasileiro de Escultura, em São Paulo. Bob aproveita a reportagem

descritiva do evento para demonstrar as preferências políticas das pessoas presentes no

local.

Bob elabora a reportagem descrevendo e intercalando com enquetes dos ricos e

famosos comentando em quem votam. Esse é um padrão de “inversão da versão pelo

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fato”, por meio do “frasismo” (ABRAMO, 2003, p.29-30) em que se utiliza de abuso

em mencionar “frases ou pedaços de frases sobre uma realidade para substituir a própria

realidade”. Com isso, cria-se a realidade dos “ricos fúteis votando em Serra”, por meio

da construção de seus próprios depoimentos.

Bob identifica que Silvio Balbino, um dos seguranças, vai votar em Lula. Outro

momento que menciona Lula é quando o cirurgião plástico dos famosos, Pedro

Albuquerque, comenta numa conversa informal “Meu conterrâneo Ciro falou demais ...

já gastei muito voto no Maluf, agora vou votar no Lula. Não tenho medo nenhum do

Lula”. Do restante, alguns votam em Serra, e outros preferem não mencionar em quem

votar para não influenciar seus fãs. Bob coloca que os manobristas, em sua maioria,

votam Lula.

O repórter retrata ricos e famosos, no meio de tanto desperdício, e menciona que

geralmente eles votam em Serra, já os manobristas, seguranças e outros “baixos

salários” que trabalharam na festa, votam em Lula. A reportagem mostra com muita

ironia, as futilidades da elite associando-a ao preconceito social, à falta de

argumentação, de conteúdo sustentado, ou seja, ao realizar a ligação dessa elite fútil à

categoria do eleitorado de Serra, Bob associa Lula aos que trabalham e têm opinião.

Na página 47 encontram-se duas notas pequenas sobre a situação do mercado e o

candidato Lula, na seção “O Bolso e a Cabeça”, de título “Alta do dólar vs. efeito Lula

I” e “Alta do dólar vs. efeito Lula II” (anexo CC – 07), escrito por Francisco Petros.

Na primeira nota, Petros contextualiza algumas funções da autoridade monetária,

o Banco Central (BC), dentre elas a que retornará na nota posterior, sobre a função de

minimizar riscos macroeconômicos e do mercado financeiro. Petros pontualiza essas

duas funções do BC para na segunda nota “Alta do dólar vs. Efeito Lula II” indagar

sobre o desvio dessa função pelo Banco Central no período eleitoral, perguntando: “por

que o BC encurtou os prazos de vencimentos exatamente para um período no qual se

sabia que as tensões eleitorais seriam maiores?”. Portanto Petros identifica, sem

utilização de fontes, possíveis distúrbios econômicos que sofriam na passagem das

eleições de 2002, por equívocos do BC e da gestão FHC, como afirma no final da nota

sobre economia:

Logicamente, a eleição de um presidente oposicionista gera tensões. No Brasil ou em qualquer país do mundo. Porém, não é razoável atribuir, de forma quase única, a “culpa” a Lula. A essência do problema está ligada à situação delicada em que FHC deixa o país e a uma gestão questionável do BC no que tange ao endividamento em dólares do Brasil.

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Com essa explanação, Petros reitera a postura de defesa da campanha do

candidato Lula. De maneira sutil, em tom de proteção a Lula.

Na edição nº 21045, referente à semana do dia 09 de outubro, a reportagem “Óleo

na máquina” (anexo CC – 08), produzida pelos repórteres Bob Fernandes e Sérgio Lírio,

que ocupa as páginas 18 a 26, na seção “Eleições 2º Turno”, retrata a Medida Provisória

(MP) nº 70 assinada pelo presidente FHC, “alguns dias antes” do pleito do primeiro

turno.

Os repórteres atribuem a MP como uma solução para pressionar a mídia a

manter-se do lado do sucessor do presidente, Serra. “O governo cujo candidato é Serra,

discretamente, em meio à algaravia eleitoral, anuncia que a salvação para as empresas

de comunicação está próxima. Isso, claro, se depender deste governo e do seu sucessor

– desde que alinhado”.

Nesse posicionamento de ataque a Serra, chegam ao candidato Lula, alertando o

leitor ao possível risco que Lula corre com essa questão da aprovação da MP, antes do

segundo turno das eleições. “O que está posto para os meios de comunicação agora, no

segundo turno, é o seguinte: com Serra os senhores terão, pelo menos, o já anunciado.

Com Lula, chi lo sa?”. E a partir daí, defende o posicionamento do PT a um possível

ataque da mídia em consenso com Serra. Para isso argumenta, aparentemente sem

consultar a assessoria do PT, a posição de Lula, como se fosse sua assessoria, já que não

consta nenhuma fonte consultada para a afirmação a seguir:

A posição do PT em relação ao tema, antes discordante, tornou-se mais ou menos essa mesma no final do outono, mas com uma diferença fundamental: o acordo feito para que então se pudesse votar o ingresso do capital estrangeiro previa que o assunto seria tema de uma lei ordinária a ser negociada e votada no Congresso. Nada, entendeu-se, que viesse antes de finda a sucessão.

E continua salientando que a CartaCapital advertiu, nos últimos anos, que uma

possível vitória do PT desencadearia o governo e os grandes grupos de mídia a

resolverem, a priori, suas pendências.

45 Nessa edição a diagramação da revista sofre modificações, as seções mudam de nome, na área política se acrescenta a seção “ELEIÇÕES 2º turno”, e o editorial se apresenta, como editorial mesmo (ao contrário de “a semana”), e no meio da chamada de capa, na página 21, entre essa reportagem em análise de Bob Fernandes e Sérgio Lírio.

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A partir desse momento na reportagem, os repórteres descontextualizam a

temática central para diferenciar o candidato Lula do seu concorrente “desonesto”, que

se utiliza de uma MP para gerar aglutinações de votos para o segundo turno.

Na página 22, depois do editorial “escolhemos Lula há muito tempo” separando

a reportagem que vai até a página 26, começam a retratar as qualidades do ex-líder

sindical, “(...) alguém que empolgou o país a ponto de, surpreendentemente, quase levar

a eleição no primeiro turno”, e um Lula que tem “(...) claramente muito mais condições

políticas de se tornar um aglutinador, de voltar a exercitar o papel que viveu no passado,

apesar da aura de extremista: o de um negociador”, bem como o associam a hábil

negociador por fundar o PT, a CUT, sem deixar “cacos pelo caminho” e finaliza as

qualificações de Lula prospectando um governo “(...) que se propõe a construir ‘um

novo contrato social’”.

Enumeram as benesses do candidato Lula até encerrarem a reportagem, com a

afirmação de que o PT está ainda mais animado, em razão dos novos aliados do PMDB,

“desembarcarem da canoa tucana em busca de melhores ventos”, no PT.

Essa reportagem sofre do padrão de fragmentação (ABRAMO, 2003, p.27-28)

em que o fato original é estilhaçado em vários fragmentos e que na reportagem se

encontram descontextualizados, como se fossem independentes, perdendo o sentido real

do fato original.

A questão principal que a reportagem levanta, desenvolvida no começo, que

retrata a MP e suas possíveis mazelas de influência no segundo turno das eleições

presidenciais, é fragmentado em outras temáticas que sugerem os repórteres, como a

que ressalta as qualidades de Lula à governabilidade do país. Portanto, ocorre a

“descontextualização” dos fatos em semi-aspectos do fato original. Segundo Abramo “a

fragmentação da realidade em aspectos particularizados, a eliminação de uns e a

manutenção de outros e a descontextualização dos que permanecem são essenciais.

Assim, à distorção da realidade e à criação artificial de uma outra realidade”.

A criação da “outra realidade” que Abramo sugere está, na reportagem

desenvolvida por Sérgio e Bob, induzindo o leitor a criar o cenário de um candidato

petista preparado para governar o Brasil em 2003.

O editorial, da página 21, escrito por Mino Carta, “Escolhemos Lula há muito

tempo (anexo CC – 09), afirma a postura pró-Lula da linha editorial da revista: “não

faltarão vozes isoladas a favor de Lula. Entre elas, CartaCapital. A escolha é coerente:

Lula é a chance de mudança”.

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Mino Carta traz vários momentos de sua vida no jornalismo, e os associa ao

apoio concedido a Lula, sempre, desde que trabalhava na revista Isto é. Coloca que

nunca se filiou ao PT e afirma não ser petista, mas que tem “admiração, respeito e

amizade por Lula, além da convicção de que um forte e maduro partido de esquerda, em

um país como o Brasil, é fator de progresso. A história prova que os príncipes não

recuam se a pressão é ineficaz”. E já contempla Lula como o príncipe perto da vitória

no seu reinado.

A próxima reportagem, “Um pouco mais à esquerda” (anexo CC – 10), de José

Roberto de Toledo e Ricardo Meirelles, da seção “Balanço”, ocupa as páginas 27 a 30, e

informa que a Câmara vai ficar mais à esquerda, depois do primeiro turno das eleições

de 2002, em que o PT “deve ser o partido que mais vai crescer”.

Os repórteres retratam um Lula mais maduro politicamente, em razão da escolha

de seu vice ser de um partido de direita, e atrelam a guinada de Lula dos 21,5 milhões

de votos em 1998 para mais de 35 milhões no primeiro turno de 2002 a essa conversão

ao centro.

No decorrer da reportagem, os repórteres justificam “à esquerda da Câmara”

com dados sobre os deputados e governadores que assumiram os postos na eleição, e os

possíveis que entrarão no segundo turno.

Finaliza a reportagem comentando que Genoino atribuiu seu desempenho ao

“efeito Lula”, que seriam os vários votos angariados com a associação de candidatos

petistas à imagem de Lula.

A reportagem teve quatro páginas de conteúdo e, sobre a candidatura Lula em

especial, foi pouco discutida. O essencial foram os dados dos políticos e partidos que

entraram no primeiro turno. E os repórteres aproveitam do tema para salientar a

importância que esse novo PT “maduro” terá na Câmara.

O posicionamento de qualificar o “novo PT” como mais maduro, preparado, é

uma opinião e, portanto, utilizou-se do padrão de “inversão da opinião pela informação”

(ABRAMO, 2003, p.31) em que, “além da informação, o órgão de imprensa apresenta

também a opinião, o que seria justo, louvável e desejável, mas sim que o órgão de

imprensa apresenta a opinião no lugar da informação, e com o agravante de fazer passar

a opinião pela informação”.

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Na seção “opiniões”46 CartaCapital traz três entrevistas que opinam sobre a

governabilidade de Lula em sua “quase certa vitória” no segundo turno.

A primeira, Marco Político (anexo CC – 11), realizada por Gianni Carta, traz a

opinião do expert de América Latina da London School of Economics, Francesco

Panizza.

Nessa entrevista, Panizza salienta que a possibilidade de Lula ganhar no segundo

turno tem um significado muito importante, mais no sentido político do que econômico,

porque, segundo ele, isso representa “(...) o final da dominação de uma elite política

brasileira” e economicamente não sofre mudança significativa.

Em resposta à pergunta: “a eleição de Lula significa a solidificação de uma

democracia?” e Panizza responde que “não há dúvida”, porque agora, segundo ele, o

candidato favorito veio do povo. E finaliza a entrevista dizendo que o povo brasileiro

tem sofrido e que Lula vai mudar esse sentimento.

A associação do candidato Lula à chegada da consolidação do processo

democrático é mais ressaltada, atrelando-o à sua hora de chegar à governabilidade do

país, realizando o marco democrático esperado pelo sistema político implantado nos

paises desenvolvidos.

A segunda, “No mesmo tom” (anexo CC – 12), realizada por Sérgio Lírio,

acompanha o raciocínio anterior, com a reflexão do brasilianista Kenneth Serbin,

professor associado da Universidade da Califórnia.

Serbin identifica Lula como o “único candidato capaz de estabelecer um diálogo

mais soberano com os EUA”, bem como negociando a ALCA, retomando o Mercosul,

“de forma mais vantajosa para o país”.

Seguindo essa postura de benesses de Lula, Serbin desmistifica antigos

preconceitos sobre posicionamentos radicais do candidato sobre apoios com Venezuela

e Cuba, e propaga a inexistência de qualquer nacionalismo exacerbado, e, do eixo

antiamericano formado por esses países latinos.

E finaliza a entrevista respondendo a questão sobre a pressão do “preparo” de

Lula, na vida política. Ele comenta que Lula é muito experiente:

Há um preconceito social, um elitismo muito grande no Brasil. Nos Estados Unidos, um intelectual é um funcionário e não um agente político importante como acontece em toda a América Latina. Aqui somos pragmáticos, o que

46 Nessa edição, com as mudanças já citadas em nota anterior, a seção “ELEIÇÕES Opiniões” traz três entrevistas em formato de opinião à candidatura Lula, abertamente.

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importa é ver os resultados. O Brasil tem atualmente o presidente, do ponto de vista de formação intelectual, mais preparado de sua história. Talvez o governante mais preparado de todo o planeta. Mas pergunto: ele conseguiu mudar muito as coisas? Não.

A terceira, “A city resignada” (anexo CC – 13), realizada por Gianni Carta, traz

a opinião do Embaixador do Brasil em Londres, Celso Amorim. Ele inova nas

justificativas sobre a economia brasileira, remetendo à “aversão do risco” pelos

investidores, em época eleitoral, tem mais a ver com “os mercados do que com a própria

situação brasileira”, retirando o peso do “sobe-desce do risco país” a uma possível

governança petista.

Na questão: “Conversei com banqueiros ingleses dispostos a dizer claramente

que preferem Serra a Lula”, Amorim responde: “O importante é pensar no eleitor

brasileiro. É ele quem tem de escolher o melhor candidato”.

Na edição nº 211, da semana do dia 16 de outubro, o editorial volta a chamar-se

“A Semana”, de título “As demandas dos abastados”47 (anexo CC – 14), por Mino

Carta. A única menção a Lula, nesse editorial, é sobre a prova que, segundo Carta, Lula

dará à sociedade brasileira, de que ele “demonstrará ser reformista em lugar de

revolucionário”, quebrando o estigma de “velho sindicalista radical” associado à

imagem de Lula.

A seção “Fichas na mesa” (anexo CC – 15) por Sérgio Lírio, ocupa as páginas

26 a 21 e reporta, no início, a vantagem que o candidato Lula tem com os novos apoios

estaduais e ressalta que Serra, por apelo, tenta pressionar seu rival para os debates na

TV, por não ter palanque dos seus apoios, que são bem menores que os de Lula.

O adjetivo de diplomacia política a que Sérgio se refere diz respeito à

neutralidade em que Lula se portou diante do “terrorismo econômico” que o presidente

do Banco Central (BC), Arminio Fraga, afirmou à platéia de jornalistas, que remetia

culpa a disparada da moeda americana às incertezas eleitorais. Dias depois, segundo

Sérgio, Lula comentou em discurso que, se eleito, “a partir de 1º de janeiro não haverá

tempo para ficar chorando leite derramado, procurando coisas do passado. Vou olhar

para o futuro”. O repórter comenta que, nas entrelinhas do discurso, fica clara a idéia

“diplomática” que o candidato utilizou e que, segundo Sérgio, isso é algo que na

diplomacia política se define como reciprocidade. Dando a Lula a qualidade de não se

47 No editorial, Mino Carta responde a uma correspondência “carta ao leitor” de uma senhora que se identifica como Lygia de Carvalho, que reclama da parcialidade descontrolada de CartaCapital em apoio à candidatura Lula.

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importar a quem o fere, pois é verdadeiramente diplomata e um candidato maduro

politicamente.

Dando continuidade à análise, Sérgio qualifica novamente Lula, agora

colocando-o como “conciliador” e “popular”, como se vê nos itálicos: “recebido com

festa em Minas, em meio a declarações de apoio do PDT, PSB e PMDB locais, Lula fez

um discurso conciliador e acenou em direção ao governador Aécio Neves, do PSDB”.

Na quarta página da reportagem, Sérgio identifica uma estratégia petista da

campanha de Lula, sem citar a fonte do dado, fazendo assim inclusão do repórter na

informação transmitida. Pois como a linha da reportagem assume o viés a Lula, Sérgio

evidencia os dados, que apenas a equipe de campanha de Lula teria como permitir,

como se fossem dados da CartaCapital, como se percebe no trecho:

Para tentar neutralizar o crescimento do candidato do governo, o PT irá dedicar especial atenção ao Estado. Além de Lula, os senadores Aloizio Mercadante e Eduardo Suplicy irão visitar o Rio Grande do Sul nas próximas semanas. O objetivo é manter, no mínimo, os 43% de votos obtidos pelo petista no primeiro turno.

Com essa mesma problemática, o trecho na última página também ressalta a

inclusão de Sérgio como fonte das estratégias de campanha do PT:

Nas próximas semanas, a estratégia de campanha petista é cobrir o maior número possíveis de estados. Pessoalmente, Lula espera visitar 13 unidades federais. José Alencar fará, sozinho, cerca de cinco viagens. Marta Suplicy deverá visitar Recife e Porto Alegre, mas concentrará seu esforço na cidade de São Paulo. Mercadante visitará o Rio de Janeiro, além de Porto Alegre. Suplicy percorrerá os três estados do Sul.

Na seqüência, o repórter não passa credibilidade na informação, por dizer que a

fonte que a transmitiu é a coordenação de campanha petista: “a coordenação de

campanha petista espera, com a adesão do ex-governador, ultrapassar a casa dos 50% na

reta final”. Ou seja, as equipes de uma coordenação de campanha à presidência são

diversificadas, bem como o número de membros delas.

O descrédito em relação às fontes em benefício de ressaltar as estratégias de

campanha de Lula segue as duas páginas finais da reportagem. Na primeira destas, traz

os números de votos que Serra e Lula receberam no Ceará “(...) o governista recebeu

apenas 8,5 dos votos válidos contra 39,4% de Lula (...)”, sem citar a instituição de

divulgação de pesquisa, dificultando, assim, a credibilidade da informação transmitida,

visto que os dados são muito discrepantes.

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E, para encerrar a reportagem, Sérgio opina, remetendo a Serra o desespero de

não ter palanques, como Lula, e por isso chama o concorrente petista para a “briga” na

TV, em debates. Em afirmativa, o repórter comenta que a “noção de debate de Serra é

algo a ser entendido”. Também identifica que o candidato tucano voltará a associar Lula

a antigos fantasmas como: MST e ligações de lideranças petistas com as Farc

colombianas.

Nesse sentido, Sérgio Lírio usa do padrão da “inversão da opinião pela

informação”, que concede aos dados opinativos do parágrafo acima foro de informação.

O juízo de valor é inescrupulosamente utilizado como se fosse um juízo de realidade, quando não como se fosse a própria mera exposição narrativa-descritiva da realidade. O leitor-espectador já não tem mais diante de si a coisa tal como existe ou acontece, mas sim uma determinada valorização que o órgão quer que ele tenha de uma coisa que ele desconhece, porque o seu conhecimento lhe foi oculto, negado e escamoteado pelo órgão (ABRAMO, 2003, p.31).

Na edição nº 213, referente à semana do dia 23 de outubro, o editorial “A

Semana” (anexo CC – 16), escrito por Mino Carta, de título “O bom cabrito começa a

berrar”, se coloca como porta-voz de Lula, defendendo-o por não querer aceitar os

debates para que Serra o chama. Carta coloca que Lula “(...) não carrega maiores

motivos para topar a parada a esta altura do campeonato. Além do mais, tem a agenda

sobrecarregada, inclusive porque lhe cabe subir no palanque dos petistas envolvidos no

segundo turno para as governanças estaduais”.

Ainda nesse editorial, Carta comenta que Serra foi convidado a ser entrevistado

pela CartaCapital, mas que não retornou o contato e que, portanto, o candidato Lula

falará sozinho.

Numa outra página, com a seção “A Semana” ainda, mas sem estar assinada por

Mino Carta como por nenhum outro jornalista, lê-se no título “A águia da guerra e a

pomba da paz” (anexo CC – 17). O texto segue num formato comentário, mas sem

assinatura.

Nele, há contida uma crítica sobre o confronto das atrizes Regina Duarte e

Paloma Duarte se posicionando respectivamente na defesa do marketing político de

Serra e Lula. O comentário desenvolve a defesa de Lula. Primeiro cita que Lula,

“segundo as pesquisas de opinião, está a um passo de ganhar a eleição presidencial”, a

pergunta é: que pesquisa?, do ibope? da CartaCapital? de quando? de hoje?, a ausência

de fonte de pesquisa para a atribuição desse dado torna a informação falível. Na

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seqüência, julgou a atitude de Regina Duarte, que foi mensageira da campanha

publicitária de Serra na TV, no horário eleitoral gratuito, como símbolo “da busca da

vitória a qualquer preço”.

A partir daí, CartaCapital parte para a desqualificação da atriz em ressalva,

colocando-a como “analista improvisada e não como uma dona de casa que, por ser

atriz bem paga, nunca viu faltar pão à mesa. O brioche, se gostar deles como gostava,

por exemplo, Maria Antonieta”, e a associa a um “engajamento equivocado”.

Em contraponto à figura de Paloma Duarte, que em resposta a Regina, vai à TV,

falar por Lula, coloca-o como “pomba”, adjetivando o lado que ela está representando

na disputa eleitoral em debate no comentário, Lula.

No artigo “Lula, o mercado e a urna” (anexo CC – 18), da coluna “Sextante”, de

Antonio Delfim Netto, há uma afirmação de que o candidato Lula reafirmou a aceitação

dos mecanismos de mercado para a administração econômica e, com isso, o articulista

ressalta que nas eleições de 2002 oferece definitivamente a incorporação do PT ao

“corpo político nacional”. E atrela o candidato petista à possibilidade de “dar maior

peso à voz dos que não foram atendidos de forma razoável nos últimos anos”.

Continuando na linha de contextualizar Lula como o candidato mais adequado a 2002,

Delfim Netto esclarece que a “possível vitória de Lula nas eleições é a superação do

obstáculo final para a consolidação dos objetivos de uma sociedade mais ‘justa’”. E

declara, ao encontro do favoritismo de Lula que espera “que a alternância natural nunca

mais tenha o terrorismo econômico imposto pelo poder incumbente, como ao que

estamos assistindo”, bem como finaliza o artigo declarando o voto em Lula, não

precisando ser do PT para isso: “(...) é com essa esperança que votarei em Lula sem ter

me convertido ao petismo”.

A entrevista “Às urnas, sem medo” (anexo CC – 19), realizada por Bob

Fernandes, ocupa seis páginas de pergunta-resposta de Lula, ao repórter. Das fotos

trabalhadas na entrevista, em apenas duas estão presentes a figura de Lula: numa ele se

apresenta tirando o chapéu, em cumprimento ao povo, que não aparece, pelo foco no

candidato. Na outra, Lula aparece com o coordenador da campanha petista, Palocci. O

restante das fotos, que somam cinco, trazem o vice de Lula, José Alencar, José Serra,

FHC, Zoellick e Maria Vitória Benevides. As fotos destes não se apresentam vinculadas

às perguntas diretamente.

As questões feitas por Bob a Lula seguem uma seqüência de defesa. A primeira

e inquietante pergunta é sobre a “idéia de debate” de Serra. Nela, Lula comenta que

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Serra chama-o para o debate porque se encontra “numa situação extremamente

delicada” e afirma que Serra não tem estados para fazer campanha, não tem aliados para

o segundo turno e por isso tem muito tempo disponível e quer preencher esse tempo

realizando debate. Afirma, ainda, em sua própria defesa e mérito, que participou de 40

debates no primeiro turno: “tenho mais coisas para fazer: tenho uma multidão Brasil

afora para ouvir, para conversar, debater olho no olho”. Mais uma outra questão já

debatida nessa edição, o fato polêmico de as atrizes globais posicionarem-se em defesa

dos seus candidatos políticos, Lula afirma que Regina Duarte “poderia participar do

programa do Serra para falar bem dele”. Até o momento normal, mas ficou indignado

com as falas de “terrorismo” contra ele: “acho que não contribui em nada para a

sociedade uma artista da estatura dela vender o medo para a população”.

E já finalizando a entrevista, Lula coloca-se prospectando na campanha eleitoral

que pretende, no domingo dia 20, antes de eleito, lançar a idéia da criação de um

Conselho de Desenvolvimento Social, “para que a gente possa começar a discutir os

grandes temas brasileiros, possa otimizar os recursos da União, dos estados e dos

municípios destinados às políticas públicas. Hoje tem muito dinheiro superposto. Temos

de gastar menos e atender a mais gente”.

Na entrevista, foi claro o posicionamento de um Lula que dialoga, sem receios e

medos. Defende-se das inquietações políticas vindas da semana, propaga aberturas na

área social e esclarece como fará isso. A uma semana das eleições, o candidato à

presidência de CartaCapital conversa com o repórter, num diálogo aberto, sem meias-

respostas ou perguntas não respondidas.

Na última reportagem da edição, “Missão quase impossível” (anexo CC – 20),

da seção “Seu País – ELEIÇÕES”, realizada por José Roberto de Toledo, constrói um

Lula experiente (expert em política) e vencedor. Roberto de Toledo esclarece que há

três tempos no processo do segundo turno, e afirma que Lula, na primeira etapa,

“ganhou de goleada”, por ter conseguido “amarrar os apoios de Ciro Gomes (PPS) e

Anthony Garotinho (PSB), além de aparecer apenas ao lado de vencedores”, mas não

cita quais são os vencedores. E termina a reportagem com o dado do Ibope de que três,

de quatro eleitores, acreditam que Lula será o próximo Presidente da República.

No último texto da análise, “Mudar para ganhar” (anexo CC – 21), escrito por

Amália Safatle e por Paula Pacheco, encontra-se depoimentos de tesoureiros, gestores

de carteira e economistas sobre os conselhos que dariam ao próximo presidente. Mas os

depoimentos não trazem a declaração do voto deles. O que há de parcialidade no texto

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que segue em seis páginas é na sua introdução, realizada pelos repórteres, comentando

que os entrevistados não vêem incompatibilidade entre os interesses do mercado

financeiro e os direitos sociais e citam como justificativa a esse argumento apenas o

depoimento do tesoureiro que não quer se identificar “há n exemplos de governos

trabalhistas que conviveram bem com o mercado. São os que conseguiram fazer os

melhores governos”. Associando “governos trabalhistas” à campanha de Lula, também

o atrela à possibilidade de cumprir o “melhor governo”.

4.3 LULA COMO PREPARADO E CAPAZ DE ADMINISTRAR O PAÍS: ANÁLISE QUANTITATIVA DA REVISTA CARTACAPITAL

Na primeira parte da análise quantitativa, traça-se uma visão panorâmica da

imagem construída pela CartaCapital do candidato Lula, para depois visualizar em

profundidade as fontes utilizadas e a que partidos estão ligadas.

Das 19 unidades de análise vistas no item 4.2 das edições de 18 e 25 de

setembro48 e 2, 9, 16 e 23 de outubro, foram contabilizados um total de 08 reportagens,

e 04 editoriais, 01 nota, 03 artigos e 03 entrevistas opinativas49, como pode ser

observado no Gráfico 1, na página seguinte:

48 Nas duas primeiras edições de setembro não foi encontrado material a respeito do presidenciável Lula, portanto não houve material para ser incorporado como unidade de anális e. 49 Das cinco entrevistas citadas e analisadas no item 4.2, serão incorporadas ao material opinativo apenas três, em justificativa são apresentados pela revista CartaCapital como materiais opinativos, nas seções em que se encontram, bem como pelo conteúdo apresentado ser do gênero opinativo. A última entrevista foi um pingue-pongue com vários profissionais, sobre projetos políticos no geral e, portanto, foi apenas analisado no item 4.2 deste capítulo. A entrevista com o candidato Lula também entrou apenas no item 4.2 deste capítulo. Optou-se por não quantificarem as entrevistas, a inclusão das três que entraram no item 4.3 justificou-se ao seu grau opinativo e, portanto, necessário à análise.

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Gráfico IESPAÇO RECEBIDO POR CADA GÊNERO JORNALÍSTICO

(INFORMATIVO E OPINATIVO) NA COBERTURA DA CAMPANHA DE LULA PELA CARTACAPITAL

Informativo42%

Opinativo58%

De todo conteúdo informativo, do gênero reportagem, 42% (8 reportagens),

divulgado sobre a candidatura Lula nesta análise, 100% teve tratamento positivo, e

nenhum teve posicionamento neutro, como o esperado para o gênero em questão, que

prima pela neutralidade e objetividade jornalísticas, como mostra o Gráfico 2.

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Gráfico 2 CONOTAÇÃO DADA AO MATERIAL INFORMATIVO

SOBRE A CANDIDATURA LULA NA CARTACAPITAL

Positivo

De todo conteúdo opinativo (gênero opinião) retratado sobre a candidatura Lula,

o total de 58% (04 editoriais, 03 artigos, 01 nota e 03 entrevistas opinativas), em 100%

foi atribuído um tratamento positivo ao candidato petista.

Análise das Categorias:

Seguindo as categorias de análise sobre a construção da imagem, que a revista

CartaCapital traçou do presidenciável Lula, obedecendo aos seguintes itens:

1 - Perfil delineado do presidenciável Lula pela revista;

1.1 Qualidades e deturpações ressaltadas do candidato:

(sim, não e sem posicionamento)

• Popular

• Controlado pelo marketing político

• Experiência profissional

• Ruim a formação escolar em curso técnico

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• Capaz de administrar o governo

• Honesto

2 - Fontes selecionadas para entrevistas ou opiniões;

2.1 Especialistas nas áreas (quem e respectiva representação):

• Economista

• Cientista político

• Político partidário

• Psicólogo

• Filósofo

• Pesquisa (Bibliográfica e de Instituições de Pesquisa)

• Meios de comunicação (assessorias e órgão de imprensa)

• Empresário

3 – Partidos políticos utilizados como fonte para o material informativo;

• PDT

• PSDB

• PFL

• PPS

• PMDB

• PL

• PT

• PPB

• PSB

• PTB

Primeiro será retratada a análise do material informativo (42%), em separata do

material opinativo (58%).

Partiu-se da hipótese de que a revista CartaCapital desenvolveu uma postura

parcial diante das informações sobre as eleições 2002, em específico do presidenciável

Lula. Para tanto, as categorias de análise traçaram um posicionamento mais claro nos

seus itens, já demarcando possíveis visões construídas de Lula. Com isso, selecionaram-

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se cinco itens, na primeira categoria, diretamente ligados com o perfil construído sobre

Lula, pela revista, que são: popular, controlado pelo marketing político, ruim a

formação escolar em curso técnico, capaz de administrar o governo e honesto. O eixo

analítico para separação desses cinco itens foi: sim, não e sem posicionamento.

Das oito reportagens (42% do material analisado), seis atrelaram Lula a uma

imagem popular, enquanto as outras duas reportagens não tiveram posicionamento no

quesito “popular”. Uma reportagem disse que Lula não é controlado pelo marketing

político e sete reportagens não se posicionaram quanto à questão do marketing. Cinco

reportagens não se posicionaram quanto à formação escolar de Lula ser de nível técnico

e três reportagens defenderam a figura de Lula, mencionando que não se importavam

com o grau de escolaridade para afirmarem que o acham preparado politicamente. No

item sobre se Lula é capaz de administrar o governo, verificaram-se quatro reportagens

não se posicionando e as outras quatro restantes se posicionaram de maneira favorável à

mesma. E no último item, sobre a honestidade de Lula, constataram-se quatro

reportagens sem posicionamento sobre o adjetivo honesto e outras quatro associando-o

a ser um candidato honesto. Averigua-se no Gráfico 3, na página seguinte:

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Gráfico 3

PERFIL DAS QUALIDADES E DETURPAÇÕES DA IMAGEM DO CANDIDATO LULA PELO MATERIAL INFORMATIVO DA REVISTA

CARTACAPITAL

0

1

2

3

4

5

6

7

8

Popular Controlado peloMKT. Pol.

Ruim a formaçãoescolar em curso

técnico

Capaz deadministrar o

governo

Honesto

sim sem posicionamento não

Na segunda categoria de análise específica para o material informativo, oito

reportagens (42% do material informativo analisado), foram quantificadas as

especializações das fontes utilizadas para compor as reportagens. A categoria de análise

separou o eixo de itens que corresponde às fontes utilizadas em: político partidário,

psicólogo, empresário, pesquisa (bibliográfica e de instituições de pesquisa), filósofo,

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cientista político, economista e meios de comunicação (assessorias de comunicação e

órgãos de imprensa).

Constataram-se 31 fontes50 utilizadas em oito reportagens, das quais a maioria,

dezoito fontes, foram políticos partidários. Nesse item “político partidário” apurou-se

que eles são citados, com depoimentos ou falas reduzidas, isso quando suas falas não

eram apenas mencionadas a partir de outro órgão de imprensa. São eles: Lula, José

Dirceu, Clésio Andrade – PFL (vice de Aécio Neves), Alberto Goldman – integrante do

comando de campanha do PSDB, Senador Tasso Jereissati – PSDB, Antonio Carlos

Magalhães, José Sarney, Roberto Requião – PMDB, Delfim Netto – Deputado Federal

PPB51, Anthony Garotinho, Maguito Vilela – PMDB de Goiás, Álvaro Dias – PDT,

Serra, Juarez Quadros – Ministro das Comunicações, Walter Pinheiro – líder do PT na

Câmara, José Carlos de Almeida – coordenador do comitê petista, Flávio Bierrenbach –

Ministro do Superior Tribunal e José Alencar.

O outro item, que também foi referenciado pelas reportagens, foi o

“empresário”, que obteve seis fontes, trazendo a opinião da categoria dos empresários

para o desenvolvimento das reportagens, foram os seguintes: Victor Siaulys – acionista

dos Laboratórios Aché, Eugênio Staub – presidente da Gradiente, Sérgio Haberfeld –

presidente do Conselho de Administração da Dixie Toga, Paulo Skaf – presidente da

Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Elói Pietá – administrador da Aché em

Guarulhos e Oded Grajew – presidente do Instituto Ethos.

Seguindo, houve uma fonte do item: “economista”, Luís Paulo Rosenberg, três

fontes de “pesquisa”, Ibope, Vox Populi e Mauro Paulino – diretor do DataFolha e duas

fontes “meios de comunicação”, Bernardo Ajzenberg – ombudsman da Folha de São

Paulo e e-mail repassado de Silvana Tinelli.

Além dos itens preestabelecidos, houve um consultor, Antoninho Marmo

Trevisan52 cuja área de trabalho não foi citada, seu depoimento foi da área econômica,

mas sem a clareza de sua especialização, optou-se por não incluí- la no item

“economista”. Também houve treze pessoas no evento da Louis Vuitton, quando foram

interrogados por Bob Fernandes sobre em quem votariam para a presidência, são: Pedro

Albuquerque – cirurgião plástico, Hiram Maisonnave – vice-presidente do Paribas

50 Foram identificadas 31 fontes, mas as que se encaixavam nos itens da análise foram 30 fontes. 51 Antonio Delfim Netto mantém uma coluna sobre política e economia, “Sextante” na revista CartaCapital. 52 Antoninho Marmo Trevisan é proprietário da Trevisan & Associados, uma empresa voltada para pesquisa de auditoria econômica.

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(Banco de Paris e dos Paises Baixos), Alicinha Cavalcanti, Dayse Gasparin, Silvio

Balbino – segurança, Nélia Longobard, Helô, Roberto Gasparin, Cládia Liz, Hortência,

Eliana, Juliani e Venâncio – DJs.

Os itens de “filosofo” “cientista político” e “psicólogo” não foram consultados

pelas reportagens da CartaCapital, portanto não tiveram presença no Gráfico abaixo.

Averigua-se no Gráfico 4:

Gráfico 4

Fontes utilizadas pela CartaCapital para a produção do Material Informativo

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28

Economista

Meios deComunicação

Pesquisa

Empresário

Político Partidário

Número de freqüência das fontes

O item “político partidário” foi mantido isolado e analisa os partidos que as

fontes representam, para compreender pontualmente quais os partidos e frentes políticas

que apóiam. Foi separado em nove partidos mais comuns do país, PDT, PFL, PPS53,

53 Não houve fontes do PPS e do PTB.

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PMDB, PL, PPB, PSDB, PSB, PTB e PT. Identificaram-se dezoito fontes “político

partidário”.

O PDT foi utilizado uma vez nas reportagens como fonte, com o Senador Álvaro

Dias. Com apenas uma citação, o PSB e PPB foram referenciados respectivamente por

Anthony Garotinho e Delfim Netto.

O partido líder de fontes foi o PSDB com seis nomes, Alberto Goldman –

integrante do comando de campanha do PSDB, Senador Tasso Jereissati – PSDB,

Juarez Quadros – Ministro das Comunicações, Flávio Bierrenbach – Ministro do

Superior Tribunal e Serra. O PT teve quatro fontes citadas: Lula, José Dirceu, Walter

Pinheiro – líder do PT na Câmara e José Carlos de Almeida – coordenador do comitê

petista.

José Alencar foi a fonte utilizada do PL, e José Sarney e Antonio Carlos

Magalhães foram as fontes do PFL.

As duas fontes do PMDB foram Roberto Requião – PMDB e Maguito Vilela –

PMDB de Goiás. Averigua-se no Gráfico 5, na página seguinte:

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132

Gráfico 5

Freqüência dos Partidos Políticos como fontes de consulta para o desenvolvimento do Material Informativo

0 2 4 6 8 10

PT

PSDB

PL

PMDB

PFL

PDT

PPB

PSB

Número de freqüência das fontes

Neste último detalhamento da análise quantitativa, serão apresentados os dados

referentes ao material opinativo (58%), no total de três artigos, quatro editoriais, uma

nota e três entrevistas opinativas.

Cinco itens foram selecionados, na categoria que traça o perfil do candidato

Lula, exposto nas entrelinhas e posicionamentos mais nítidos do material opinativo.

Esses cinco itens foram mantidos do material informativo (42%), que são: popular,

controlado pelo marketing político, ruim a formação escolar em curso técnico, capaz de

administrar o governo e honesto. O eixo analítico para separação desses cinco itens foi:

sim, não e sem posicionamento.

Dos 58% do material opinativo analisado, 11 unidades de análise, nove

atrelaram Lula a uma imagem popular, enquanto duas não se posicionaram. Duas

unidades disseram que Lula não é controlado pelo marketing político e dez não se

posicionaram quanto à questão do marketing. Sete unidades não se posicionaram quanto

à formação escolar de Lula ser de nível técnico, e quatro não acharam ruim essa

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formação de Lula. No item sobre se Lula é capaz de administrar o governo, verificou-se

que todas as onze unidades analisadas apontam Lula como capaz de administrar a

Presidência da República, ou seja, todos os articulistas se posicionaram a favor da

viabilidade de Lula como Presidente. E no último item, sobre a honestidade de Lula,

constataram-se três unidades de análise não se posicionando sobre a honestidade de

Lula e oito associando-o a uma figura honesta. Averigua-se no Gráfico 6, na página

seguinte:

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134

Gráfico 6

PERFIL DAS QUALIDADES E DETURPAÇÕES DA IMAGEM DO CANDIDATO LULA PELO MATERIAL OPINATIVO DA REVISTA

CARTACAPITAL

0

2

4

6

8

10

12

Popular Controlado peloMKT. Pol.

Ruim aformação

escolar emcurso técnico

Capaz deadministrar o

governo

Honesto

sim sem posicionamento não

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135

CAPÍTULO V

O VERMELHO -VIVO DE LULA NO FOCO DA VEJA

“Cada sociedade possui o seu regime de verdade,

sua ‘política geral’ de verdade: ou seja,

os tipos de discurso que aceita e faz funcionar como verdade”.

Michel Foucault

5.1 HISTÓRICO DA REVISTA VEJA

A revista Veja é uma das várias publicações da Editora Abril e tem como

fundador Victor Civita e editor Roberto Civita. O atual diretor de redação é Eurípedes

Alcântara, cargo era ocupado pelo jornalista Tales Alvarenga em 2002.

A primeira edição da Veja foi lançada em 11 de setembro de 1968 e seu título

era: Veja e Leia54. Já pertencia à Editora Abril com todos os direitos registrados. Com o

tempo, a expressão e LEIA desapareceu. Ficou apenas Veja. Hoje ela é a maior revista

brasileira e a quarta maior revista semanal de informação do mundo, com 1.250.000

exemplares semanais, atrás apenas das americanas Time, Newsweek,U.S.News e World

Report.

Segundo a assessoria da revista, ela segue princípios estabelecidos na “missão”

da empresa Abril S/A:

A Abril está empenhada em contribuir para a difusão da informação, cultura e entretenimento, para o progresso da educação e melhoria da qualidade de vida, o desenvolvimento da livre iniciativa e o fortalecimento das instituições democráticas no país.

A revista afirma que tem como modelo de inspiração a americana Time, criada

em 1922 por Henry Luce. É a primeira no gênero lançada no Brasil, onde imperavam no

mercado editorial as revistas semanais ilustradas, com grandes fotos e textos curtos.

54 Os fundadores da revista temiam que o título fosse dar a impressão de que se tratava de mais uma revista semanal ilustrada, como era tradição no mercado editorial brasileiro (Fon Fon, O Cruzeiro , Fatos & Fotos, Manchete etc). Mas Victor Civita, fundador da editora, gostou do nome e ponderou que no Brasil as pessoas usavam muito a expressão: “veja só...; veja, se fizermos dessa forma” etc. Com isso, o título ganhou força e já na primeira edição a revista foi editada como VEJA (em letras grandes) e LEIA (em letras bem menores).

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136

A Veja sinaliza em suas editorias:

Brasil, que faz basicamente a cobertura das atividades políticas; Internacional, que trata de assuntos referentes à política mundial e a assuntos internos de outros países; Economia e Negócios; Artes e Espetáculos, que cobre cinema, televisão, literatura, teatro, exposições etc; Geral, que trata de Ciência e Tecnologia, Medicina, Esportes, Educação, Saúde, Estilo, Moda, Comportamento etc. Há seções, como Radar, com notas exclusivas, Veja essa, onde figuram as frases mais marcantes e inusitadas da semana; Gente, com notas sobre personalidades. Há ainda outras seções de notas, como Holofote e Contexto e a seção Guia, de reportagens curtas de serviços.

A revista conta com a colaboração de alguns articulistas fixos. O economista

Claudio de Moura Castro, o administrador Stephen Kanitz, e a escritora Lya Luft se

revezam na coluna Ponto de Vista. André Petry, chefe da sucursal de Brasília, e Diogo

Mainardi têm colunas semanais. A coluna Ensaio encerra a revista e é assinada pelo

jornalista Roberto Pompeu de Toledo, editor especial de Veja.

0

1.250.000

2.500.000

3.750.000

5.000.000

TiragemSemanal

Leitoresestimados*

Carteira deAssinantes

Tiragem, Leitores estimados e Assinantes da Revista Veja

* A assessoria de comunicação da Veja estima que, a cada exemplar, quatro pessoas a leiam.

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137

Separação pelo Gênero do Público da Revista Veja

Masculino48%Feminimo

52%

Separação por Classe Social do Público da Revista Veja

Classe social A e B68%

Classe social C e D32%

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138

Idade do Público Leitor da Revista Veja

Restante53%

Leitores entre 20 e 39 anos

47%

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139

0% 20% 40% 60% 80%

Nível Superior

Casa Própria

Automóvel

TV a Cabo

Costumam correrou andar

Número de Leitores por Escolaridade, Propriedade, Entretenimento e Atividade

esportiva

Leitores de Veja 55% 80% 80% 51% 28%

Nível Superior

Casa Própria

Automóvel TV a CaboCostumam correr ou

andar

Fonte: números de outubro/2002 - Fontes: Estudos Marplan

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140

5.2 VELHOS PRECONCEITOS E NOVOS MEDOS - ANÁLISE QUALITATIVA

DA REVISTA VEJA

Na primeira edição de setembro, ed. nº 1767, da semana do dia 04, a reportagem

“Lula a mil por hora” (anexo Veja – 01), apresenta quatro páginas, duas direcionadas

para texto e outras duas para fotos e dois quadros, um de pesquisa e o outro sobre a

mudança de visual da esposa do presidenciável Lula.

Na primeira parte da matéria, os repórteres João Gabriel de Lima e Thais Oyama

desenvolvem no texto informações referentes ao candidato José Serra, mais

especificamente ao crescimento dele junto às pesquisas, saltando de 11 pontos, ficando

apenas quatro pontos atrás de Ciro.

No desenvolvimento da reportagem, eles também comentam que por

conseqüência da subida de Serra, a campanha de Ciro começa a mexer nas estratégias

de marketing político.

Nesse primeiro momento, identifica-se o uso do “padrão de manipulação por

fragmentação” (ABRAMO, 2003, p.27-28), o qual esclarece que,

O todo real é estilhaçado, despedaçado, fragmentado em milhões de minúsculos fatos particularizados, na maior parte dos casos desconectados entre si, despojados de seus vínculos com o geral, desligados de seus antecedentes e de seus conseqüentes no processo em que ocorrem, ou reconectados e revinculados de forma arbitrária e que não corresponde aos vínculos reais, mas a outros ficcionais e artificialmente inventados.

A partir desse conceito, verifica-se que os repórteres desvencilharam o tema

proposto em outros subtemas que, sobrepostos, descontextualizaram-se da essência do

fato real. Ao começarem a reportagem com a proposta de título: “Lula a mil por hora”,

espera-se a abordagem aprofundada sobre o ritmo de campanha do candidato Lula, mas,

no decorrer do texto, outros assuntos, referentes à situação eleitoral dos demais

candidatos, em especial de Serra, tornam-se a principal temática explorada.

Somente no final do desenvolvimento e conclusão da reportagem é que Lima e

Oyama mencionam o presidenciável Lula, temática central a que se propuseram por

meio do título da reportagem “Lula a mil por hora”.

Os repórteres enfatizam, na entrada do assunto sobre Lula, que o mesmo está

tentando proteger suas fragilidades políticas enquanto Ciro e Serra se engalfinham. E a

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primeira fragilidade que apontam, sem comentário de fonte ou outra prova-declaração, é

sobre a falta de apoio político para a governabilidade.

As pesquisas qualitativas de Ciro Gomes mostram que ele tem de pular no pescoço de José Serra num primeiro momento. As de Serra evidenciam que ele deve continuar batendo em Ciro, como tem feito até agora. O próximo passo de ambos será cravar as mandíbulas na carne de Lula. O petista, assim, vive atualmente uma fase de ‘vamos passear na floresta enquanto seu lobo não vem’. A coordenação de sua campanha aproveita o tempo de calmaria para criar uma rede de proteção contra as fragilidades do candidato. Uma delas, já histórica, é que o candidato do PT não terá condições de governar por falta de apoio político.

Nesse sentido, eles problematizam que Lula é frágil no que se refere aos apoios

políticos, mas também o colocam como candidato à procura de outros apoios para

governar. Nessa comprovação de opinião na reportagem, os repórteres afirmam que

Lula está se mostrando aberto para mudanças, isso se confirma com o aceite de apoio do

ex-presidente José Sarney.

Reafirmando essa opinião de que Lula está aberto a novos apoios à candidatura,

Veja coloca no parágrafo posterior:

Vários compromissos de Lula nos últ imos tempos tiveram propósito semelhante: o de reforçar a imagem de um homem aberto ao debate. Na última terça-feira, em Brasília, o candidato se encontrou com diplomatas estrangeiros. Numa reunião com representantes do Uruguai, Argentina, Paraguai, Bolívia e Chile, o candidato falou que iria promover o Mercosul. Chegou a apresentar um projeto para a entidade, a ‘soberania alimentar’, uma espécie de acordo através do qual os países fariam intercâmbio de produtos agrícolas.

Para finalizar a reportagem, os repórteres comentam que Lula passa por uma

fase muito boa, e por isso pode até comentar sobre “aquilo que os adversários apontam

como falhas em sua formação”, a ausência de diploma; tratando-se de dois comentários

de Lula, um colocado num encontro com artistas, intelectuais e cientistas que apóiam o

presidenciável “Vocês representam os diplomas que eu não tive oportunidade de

conseguir, e por isso não tenho o direito de decepcioná- los”, e em outra passagem usou

a expressão latina sine qua non, comentando em seguida que “nada mau para alguém

que, em 1989, falava ‘menas laranjas’”, tirando aplausos dos presentes no encontro.

Com essa finalização, o posicionamento da Veja é declarado, voltando a lembrar

ao leitor que Lula não tem diploma universitário, sem citar qual adversário em especial

aponta as “falhas em sua formação”, conduzindo então a opinião da revista, que não

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menciona quais são essas fontes adversárias de Lula numa reportagem gênero

informativo.

Esse posicionamento é reeditado no outro momento da reportagem, em especial

no quadro de título: “Olha só quem também está de cara nova”. Esse quadro apresenta

duas fotos de Marisa, esposa de Lula, uma de cinco meses antes e outra atual (2002).

Essas imagens de Marisa são para mostrar o antes e o depois das cirurgias plásticas e do

visual novo (roupa e corte de cabelo).

Entretanto, o texto que segue ao lado das imagens, dentro do quadro, extrapola a

comparação de mudança desses ícones estéticos mencionados e fáceis de perceber pelas

fotos. O texto coloca que Marisa entrou na campanha política “de cabeça”, passou a

cortar e pintar o cabelo no salão do cabeleireiro Wanderley Nunes, um dos mais chiques

de São Paulo. Essa colocação sobre o novo visual de Marisa é um pretexto para

mencionar que, ao passo que Lula mudou seu estilo de vestir, a sua esposa também

seguia a nova conduta. Entretanto, Veja coloca em seguida, no quadro, termos que

conotam preconceito na figura antiga da esposa de Lula.

Com as unhas pintadas de vermelho vivo, em lugar do antigo ‘rosinha dona-de-casa’, e roupas mais alinhadas, Marisa faz par à altura com o marido repaginado. Continua avessa a declarações públicas, mas a imagem fala por si: quem pode continuar a ter medo de petista que faz plástica e freqüenta o Studio W?

Portanto, a figura de Marisa, que pintava as unhas com cor “rosinha dona-de-

casa”, na concepção da revista, norteia para a comparação com o presidenciável Lula,

de acordo com a afirmação que segue “(...) quem pode continuar a ter medo de petista

que faz plástica e freqüenta o Studio W?”. Ou seja, para os repórteres, Lula mudou sua

postura estética com anseios políticos de sair do cenário rústico do “rosinha dona-de-

casa” para incluir-se no visual da elite, o Studio W.

Dentre as fotos colocadas na reportagem, aquela em que Lula está

cumprimentando a embaixadora americana, averigua-se: “Lula elogiou até o regime

militar”, na outra, de Serra, em que este está acenando num comício, vê-se: “Serra em

sua melhor semana: assessoria de Lula com medo de um ‘efeito trator’”.

Verifica-se na reportagem, quando se identifica a entrada da figura de Lula como

assunto em questão, a problemática já detectada do padrão de manipulação por

descontextualização (ABRAMO, 2003, p.28), pois, na reportagem, retrataram-se pontos

isolados da figura de Lula, como sua possível aliança com antigos adversários políticos,

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como sua debilidade acadêmica, e principalmente sobre com o fato de a mudança de sua

esposa ser um reflexo da sua própria mudança. Além da questão desses fatos estarem

dêsconectados na reportagem, há a evidência de eles não corresponderem à temática

proposta no início do texto, demarcando a indução da reportagem a menções

descontextualizadas sobre a construção da imagem de Lula, diminuindo-o enquanto

candidato ao governo brasileiro.

Na segunda edição de setembro, ed. nº 1768, da semana do dia 11 de setembro, a

reportagem “O mundo nunca mais foi o mesmo – Lula lá no primeiro turno?” (anexo

Veja – o2), sem repórter responsável, “Lula lá no primeiro turno?”, Veja sugere que o

texto desenvolverá argumentações a respeito da possibilidade real de o candidato Lula

ganhar a eleição para presidente no primeiro turno. Entretanto, o espaço concedido ao

texto ocupa uma página e 1/7, e nele se fala menos da temática proposta pelo título e

mais sobre a descida de Ciro e a conseqüente guinada de Serra.

No início da reportagem, informou-se o começo do processo de participação de

Lula em eleições para presidente. A partir disso, usa adjetivos nada imparciais para

informar a hipótese “apenas improvável” de o candidato ganhar no primeiro turno.

Dentre os adjetivos de maior peso persuasivo, destaca-se “triturado”. Segundo a

reportagem, Lula chegou ao segundo turno em 1989 com dificuldade, o que nas eleições

seguintes não conseguiu, com isso comenta que Lula foi “triturado” logo no primeiro

turno na disputa com Fernando Henrique Cardoso.

Aproveitando o gancho de permanecer sempre em segundo na disputa à eleição,

Veja abre espaço para acrescentar que diante dos 35% de intenção de voto de Lula pelo

Ibope “Ele jamais chegou tão longe na condição de líder”. Na seqüência, coloca que em

1994 Lula manteve o 1º lugar por alguns meses, mas que Fernando Henrique Cardoso

“atropelou-o em agosto”.

Veja utiliza-se do elemento padrão de manipulação “inversão da versão pelo

fato” (ABRAMO, 2003, p.29), em que o órgão de imprensa “(...) praticamente renuncia

a observar e expor os fatos mais triviais do mundo natural ou social e prefere, em lugar

dessa simples operação, apresentar as declarações, suas ou alheias, sobre esses fatos”.

Percebe-se, com isso, a não materialização dessa simples operação, em itálico, para

fomentar a versão do fato que seria a pequena probabilidade de Lula ganhar no primeiro

turno, e para induzir a esse entendimento organizaram-se trechos que mencionam as

eleições à presidência em que Lula saiu perdedor.

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Para finalizar, o desfecho de adjetivos negativos sobre o crescimento de Lula nas

pesquisas de opinião e sua pequena probabilidade de ganhar no 1º turno, usa a frase

“(...) a chance de isso acontecer parecia tão pequena que a alternativa era classificada

como impossível. Agora, fala-se que ela é apenas improvável”.

No segundo momento da reportagem, que dá destaque para a possibilidade

“quase nula” da vitória no 1º turno, Veja coloca que vence logo no 1º turno quem

ultrapassar a marca de 40% dos votos, e ressalta novamente que Lula ainda só tem 35%.

Nessa linha de pensamento, demarca ainda mais sua opinião contrária à candidatura

Lula, visualizada no começo da reportagem pela entrada diminutiva de Lula e também

pelo uso de adjetivos, incomum em se tratando de reportagem.

A revista faz isso sensibilizando o leitor a refletir que Lula transmitirá

instabilidade para o público empresarial se chegar aos 40%, “No meio empresarial, a

possibilidade é tratada como um mero temor estatístico”. Em seguida, sugere que

especialistas e “místicos” pensam nessa hipótese, mesmo que improvável. Entretanto,

faz isso por meio de opinião, sem mencionar realmente as fontes de pesquisa,

dificultando a credibilidade na informação passada, até mesmo porque usa da palavra

“bruxos”, para designar as pessoas que estão incluindo essa hipótese do 1º turno, ou

seja, Veja deixa claro que é contra a hipótese de Lula ganhar no 1º turno, simplesmente

pelo fato de colocar tal termo, “bruxo”, significativo no consciente coletivo, que é visto

como negativo, que faz bruxaria, e deseja o “mal”, visiona cenários maléficos para e

sobre as pessoas. Ou seja, se tal pessoa mística inclui a vitória de Lula no 1º turno como

uma possibilidade entre várias outras existentes no cenário eleitoral, significa afirmar

para o leitor que o futuro político do Brasil está em situação ruim, visto que Lula pode

ser o presidente do país logo no 1º turno. Segundo Veja, então: “Bruxos e marqueteiros

de todas as campanhas preferem incluir essa possibilidade, ainda que remotamente”.

Na reportagem, Veja se utiliza do recurso da codificação (GARCIA, 1999, p.49-

50), em que se ampara em conceitos já enraizados no seio social, ou melhor, no

consciente coletivo, para disseminar os objetivos almejados, no caso, a associação de

bruxos a “pessoas” que vêem a possibilidade de Lula ganhar no 1º turno demarca o uso

da opinião, desmoralizando a “vitória de Lula” sem fontes legítimas e, pior, parte-se de

pré-conceitos sociais para reafirmar posturas parciais da revista.

Depois afirma que hoje existe a volatilidade do voto e com isso reafirma a

opinião da fonte tucana, Nelson Biondi, um dos chefes da candidatura de Serra, “Não

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acredito que essa hipótese vá se confirmar, mas só um maluco descartaria alternativas

nesta altura do campeonato”.

E para não deixar de citar fontes do PT, visto que colocou acima uma do PSDB,

Veja afirma que as preocupações do PT são de outra ordem,

(...) pois a assessoria de Lula tem interpretado as pesquisas de forma mais conservadora. De acordo com um integrante do comitê petista , num momento em que Serra e Ciro se estapeiam diariamente, seria desejável que Lula conseguisse subir um pouco mais nas pesquisas. Mas não é isso que vem ocorrendo.

Logo, problematiza que o PT esteja pensando em crescer, ao passo que Ciro e

Serra lutam para sair do desempate, situações lógicas, mas que não acrescentam como

sendo informações de confiança, visto que não cita nome do integrante do comitê

petista, novamente colocando a informação como sem credibilidade. Em conformidade

com isso, Veja deixa nítido, numa frase de convencimento, pura opinião, que a

candidatura Lula está vaticinada ao caos, pois os ataques e críticas ainda não

começaram.

Além de lançar tal opinião, referiu-se a ela como “dúvida petista”, se isentando

da parcialidade. “A dúvida petista é a seguinte: se Lula está com 35% numa fase em que

é poupado de qualquer crítica, o que acontecerá a partir de agora, em que deve se

transformar em alvo preferencial dos ataques?”. A outra parte da reportagem, que segue

mais da metade do texto escrito, com mais de meia página, é ocupada para informar a

arrancada de Serra nas pesquisas e esse reflexo imediato nas alianças com empresários

que migraram de Ciro para o PSDB.

Na análise da legenda sobre Lula, verifica-se que a foto de maior tamanho foi do

candidato Lula falando num comício. Na legenda “Lula: preocupação com o ritmo de

crescimento nas pesquisas, que é lento”.

Na edição nº 1769, da semana do dia 18 de setembro, a reportagem “o tucano de

asa nova” (anexo Veja – 03), escrita pelo repórter Felipe Patury, há logo nas ilustrações

dois elementos que identificam a linha editorial tendenciosa à candidatura Serra. Esse

presidenciável, dentre outras candidaturas, está em destaque positivo por estar

representado com asas bem maiores que a dos concorrentes, mesmo estando na segunda

colocação, com 19% dos votos, enquanto Lula apresenta 39% dos votos. Na mesma asa

de Serra, além do destaque do tamanho maior, há também o diferencial da cor da asa do

presidenciável. A de Serra apresenta cor gelo para branco enquanto a de Lula, Ciro e

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Garotinho apresentam asas menores, desproporcionais à porcentagem de votos e com

cor bege.

Um outro elemento na ilustração que dê certa maneira diminui ou, pelo menos,

tenta deturpar a imagem de Lula seria o formato do corpo dos candidatos. Veja, na

reportagem em questão, coloca Lula com a gravata de lado, dando aparência de

estabanado, e suas pernas prontas para um pouso, com a intenção de não se machucar

quando cair, em relação ao impacto ao chão que irá sofrer. Ou seja, mesmo na pesquisa

do Ibope, na reportagem, apontar que Lula só cresceria nas intenções de voto, optou-se

por caracterizá- lo como um candidato estabanado e que vai cair mais cedo ou mais

tarde.

Enquanto Serra, além das asas cor de gelo, que dão a imagem de anjos, na

enraizada cultura cristã, tem seu terno impecável e com inclinação de quem está voando

para cima, como um super-herói.

Na legenda do quadro da pesquisa, Felipe Patury marca mais uma vez a simpatia

da linha editorial da reportagem a candidatura Serra. “Depois do empate, Serra se livra

de Ciro Gomes”. Nessa afirmação prospectiva, Felipe expõe que Serra, além de passar

Ciro Gomes na pesquisa, após o empate técnico, certamente se livraria do mesmo na

concorrência da eleição. Entretanto, uma característica que se destaca na frase e que

merece análise é o uso do verbo livrar para se referir a passar, deixou para trás. As

pessoas não se livram de outras pessoas, elas se livram de coisas. A reportagem declara

com a admissão do “livrar” uma postura preconceituosa com o candidato Ciro, por

colocá- lo como coisa e com isso enaltecer a figura de Serra como candidato que se

livrou de coisas sem importância na eleição.

Portanto, identifica-se na análise a “inversão da opinião pela informação”, que

apresenta como maior problemática o “agravante de fazer passar a opinião pela

informação” (ABRAMO, 2003, p.31). Mesmo na identificação de que Lula cresce na

pesquisa de opinião e permanece no topo dela, a revista prospecta, em opinião, a queda

dele, desenvolvendo para isso gravuras e ilustrações que comprometem a informação,

acrescentando detalhes que as tornam opinativas na construção da imagem de Lula,

atrelando-o a desqualificações e quedas do ranking eleitoral.

O artigo, “Candidato, mostre sua cara” (anexo Veja – 04) da mesma edição, por

Sérgio Abranches, sugere, no começo e no desenvolvimento do texto, que os candidatos

para a eleição de 2002 à presidência ainda não mostraram sua cara, no sentido de terem,

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ou melhor, apresentarem, projetos de governo muito parecidos e de certa maneira

convergentes.

Entretanto, na parte final do artigo, Abranches começa a citar nomes e indicar as

problemáticas desses candidatos de manterem-se comuns em torno da agenda da

opinião pública.

O cientista político Sérgio Abranches começa atacando Ciro Gomes, colocando-

o como um antidemocrata em razão das mais recentes alianças do candidato, “(...) os

ataques recentes de aliados de Ciro Gomes à democracia desrespeitam o sacrifício

republicano de várias gerações de brasileiros para que reconquistássemos as liberdades

cívicas”.

Num próximo ataque, o alvo de destruição é o cand idato Lula que, para Sérgio,

está ligado ao pensamento de governo dos anteriores generais que governaram na época

da ditadura, por se apresentar como presidente inato, disposto a assumir a presidência a

qualquer custo, mesmo que para isso se iguale a antigos projetos de governo, como o

atual de 2002, escondendo sua cara verdadeira. E, para essa afirmação, o cientista

político demarca que Lula deveria olhar para os mesmos generais com desprezo pelo

que realizaram pela política de privilégios à indústria nacional, “Lula deveria lembrar-se

mais dos generais-presidentes como usurpadores da cadeira presidencial pela qual ele

tanto anseia e não tanto pela política de privilégios à indústria nacional que

implantaram”.

Sérgio Abranches utiliza-se da “codificação” (GARCIA, 1999, p.50) para atrelar

Lula a antigas lembranças negativas e nebulosas da política implantada pelo período da

ditadura militar brasileira. Associando a figura de Lula à incompetência política e ao

autoritarismo ditatorial do regime em questão.

Nesse sentido, ainda sobre Lula, Sérgio coloca que, para um país democrático

como o Brasil, os candidatos, em especial, Lula, não têm o direito de se apresentarem

insolentemente à população como representantes da presidência, como afirma a frase:

“(...) é só porque temos democracia que todos podem apresentar-se desabridamente ao

povo como postulantes à Presidência”. Em seguida, ele afirma no artigo de quem é seu

voto e da intenção real do artigo: “Serra deveria abrigar melhor em sua propaganda as

conquistas recentes e defendê-las da desvalorização em campanha”. Com isso, deixa

claro que é a favor da candidatura Serra e contra a de Lula, por colocá- lo, na próxima

declaração, como “aquele que sempre foi contra tudo isso que está aí”, as conquistas

recentes do governo FHC. Portanto, define Lula como opositor do governo e feitos de

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148

FHC, defendido por Serra, e portanto opositor de um governo que deu certo e que, pelo

menos, o autor acredita que está dando certo. Tanto isso é fato para o autor que ele

confirma na declaração final: “é natural que a oposição desvalorize o que já foi

alcançado. Mas, se nada valeu, não há por que eleger aquele que sempre foi contra tudo

isso que está aí”, ou seja, Lula. E, para encerrar o artigo, ele emenda, com base na

afirmação anterio r, que o eleitor brasileiro está esperando que os candidatos mostrem

sua cara para que eles se definam.

Na edição 1770, referente à semana de 25 de setembro, a revista Veja traz logo

na capa uma interrogação sobre a eficiência política de Lula (anexo Veja - 05), a

temática estará retratada na reportagem principal, ainda sobre a capa. Veja lança dúvida

do preparo do partido de Lula para assumir a governabilidade do país, com a estrela do

PT no centro e a faixa presidencial nele, há a frase interrogativa abaixo da ilustração da

estrela: “O PT está preparado para a presidência?”. A pergunta tem um tom de dúvida e

ironia e, acima, no topo da capa, há uma chamada que esclarece a postura da Veja

anticandidatura Lula, “José Dirceu, homem que faz a cabeça de Lula”. Como visto, a

revista Veja associa, pela primeira vez nestas análises, o candidato Lula a um candidato

inapto a tomar decisões sozinho, atrelando ao deputado, um dos coordenadores da

equipe de campanha de Lula, José Dirceu, o mandato de orientar e gerenciar as idéias de

Lula.

Na primeira reportagem da edição “Tudo pelo segundo turno” (anexo Veja - 06),

sem assinatura de repórter, explora a situação da corrida eleitoral dos candidatos para

permanecerem na disputa no segundo turno. Sobre o candidato Lula, a reportagem, sem

fonte sobre o argumento citado, menciona que Serra sugeriu na TV que Lula apresenta

semelhanças com o político Paulo Maluf e desenvolve a idéia da associação: porque nas

eleições municipais de 1988 Maluf, que era candidato a prefeito de São Paulo, colocou

no seu programa a proposta de adotar as farmácias populares, tal como em Pernambuco,

e Lula fez o mesmo no decorrer da semana anterior. O candidato Lula tem como

publicitário, líder de sua campanha, Duda Mendonça, o mesmo que realizou a

campanha de Maluf, em 1988. A revista Veja faz brotar uma dúvida no leitor,

mencionando: “O problema é que, se isso iguala Maluf e Lula, muita gente pode

entender que ambos se preocupam em vender remédios a preços mais modestos”.

Indiferente ao fato de Lula ou Maluf almejarem com a proposta “vender produtos

farmacêuticos mais baratos”, Veja sentencia em itálico que há desconfiança na atitude

de ambos, o que pode ser um ou o outro, ou, ainda, os dois. Encontra-se nesse trecho da

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reportagem o padrão de ocultação por presença (ABRAMO, 2003, p.27), pois incluindo

a associação da campanha de Maluf e Lula, Veja opta por trazer como dado jornalístico

uma desqualificação de Lula, contida na associação deste com Maluf, vista no possível

programa do candidato Serra.

Na reportagem “Cristãos-Novos do Capitalismo” (anexo Veja - 07), sem

assinatura, visualiza-se a total dêsconfiguração da figura do candidato Lula. Ela ocupa

as páginas 38 a 45. Entre as páginas, há uma grande foto de Lula no primeiro plano e,

atrás, em nível secundário, uma asa dourada enorme. Lula traz na mão uma rosa

amarela e porta um olhar cansado e centrado num foco, não disponível na fotografia.

Veja, nessa foto, permite uma visão do candidato como a esperança, mas num olhar

visivelmente sofrido, de quem “guerrilhou” muito para chegar com a intenção de voto

que lhe confere. A postura de candidato-esperança verifica-se na legenda da foto “Paz e

amor: Lula fala aos militares no Rio de Janeiro: ninguém duvida da vocação

democrática do candidato do PT”. Entretanto, o olhar de esperança para Veja simboliza

o slogan “paz e amor” que ela associa à “mudança do PT radical para o centro”, no

pontual título da reportagem “cristãos-novos do capitalismo”, e em “vocação

democrática” encontra-se um certo ar de deboche, pois, ao julgar Lula como portador de

uma vocação democrática, sugere que ele tenha o “dom do povo”, ainda mais popular

revestido da capa cristã que representa a pureza dos anjos, na representação da asa

dourada.

Na seqüência da reportagem, Veja age insinuando, sem opinião de fonte, que os

que não votam em Lula e os indecisos estão “se perguntando se o PT está preparado

para governar o Brasil” e comenta, igual à reportagem anterior, que “José Serra, para

quem o Lula sorridente e flexível da televisão não passa de uma invenção de

marketing”. Ou seja, se utiliza novamente do padrão de ocultação por presença

(ABRAMO, 2003, p.27) em que propõe a idéia de Serra, como se estivesse tomando

partido dele, acreditando na sua suposta fala de Lula, construindo a declaração como

realidade, mesmo que ficcional, mas agora, contida na reportagem, torna-se real. A

partir disso, desenrola várias ironias a respeito da “conversão de Lula” para concluir que

o acha ambíguo e, portanto, inapto à governabilidade brasileira, como se verifica em

itálico no texto reproduzido.

É cada vez menor o número de pessoas que duvidam dos compromissos democráticos do PT e de seu candidato à Presidência. A maneira inequívoca com que Lula se comprometeu durante a campanha a manter intocados os

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fundamentos da estabilidade econômica também convenceu boa parte do eleitorado, conforme mostram as pesquisas de intenção de voto. Lula é aplaudido nos encontros com banqueiros, empresários e pecuaristas, mas as ambigüidades em torno dele ainda não se dissiparam.

No decorrer do texto, Veja se agarra em desenvolver argumentos que ela própria

entende e quer expor sobre o PT e sobre Lula. Começa, a partir daí, a conduzir o leitor a

sua visão deles, utilizando fontes de economistas e dela mesma.

Antes de detalhar os passos dessa construção da realidade, é essencial demarcar

que ela faz uso do padrão de inversão da versão pelo fato (ABRAMO, 2003, p.29), pois

ela cria uma outra versão de mudança que é originada pelas intenções da revista sobre o

candidato, como deixou claro no começo da reportagem. E para isso permite intercalar

fontes alheias com opiniões próprias, criando sua própria versão do fato jornalístico, ou

seja, criando sua própria realidade sobre o fato, que se tornou forjado.

Veja destrincha esse padrão de manipulação interrogando os economistas sobre

suas visões da possível governabilidade de Lula, como seria e se teria solidez. Carlos

Langoni, diretor do Centro de Economia Mundial da Fundação Getúlio Vargas,

compromete uma possível estabilidade do governo Lula dizendo que “as expectativas

negativas que se criaram em torno do partido são uma ameaça no curto prazo. A taxa de

risco pode disparar. Lula precisaria agir rápido, construindo uma ponte de credibilidade

que o ajudasse a superar os problemas dos primeiros meses”. Em seguida, concorda

com o problema colocado por Langoni e menciona uma segunda questão: problematiza

que, se Lula se eleger, será complicado atender as expectativas de seu eleitorado.

Os funcionários públicos, que são a base mais forte do partido desde que se tornaram mais numerosos que os operários na relação de filiados da agremiação, aguardam uma compensação pela política salarial rígida em que vêm sendo mantidos pelo governo FHC. Como poderá cortar despesas um partido submetido a esse tipo de pressões?

Veja vai expondo sua versão sobre a tal “desestabilidade” que um governo Lula

desenvolveria junto à sociedade brasileira. Nesse sentido, confirma que o rumo dessa

desestabilidade econômica começaria com as pressões internas de seu eleitorado.

Primeiro ela não cita a fonte em que sugere que os funcionários públicos são maioria na

base do eleitorado petista, bem como adverte que o PT no governo não conseguirá

cortar gastos públicos em razão dessa pressão do suposto eleitorado em massa dos

funcionários públicos. São apresentadas duas idéias ligadas ao programa neoliberal para

finalizar o parágrafo com o desfecho de criar a figura de um governo petista incapaz, ou

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melhor, insolvente ao tratar da base eleitoral (funcionários públicos), colocada em

itálico na frase: “Dificilmente tomará um caminho tão traumático para suas tradições”.

Essa desenvoltura é confirmada na legenda da foto, que traz uma multidão de petistas,

provavelmente em comício, e afirma: “Militantes – o comportamento dos radicais do PT

num eventual governo de Lula ainda é uma incógnita”.

Agora, voltando-se para argumentar a “ambigüidade de Lula”, resgata que Lula

acusava seu adversário FHC, em 1994 e 1998, de ser apoiado pela Febraban (entidade

que representa os banqueiros) e que, atualmente, reuniu-se com a entidade e a elogiou,

ao passo que também foi elogiado. A marca da ambigüidade estaria em que, para a

revista, Lula conceituava a entidade como um dos “setores mais retrógrados da

sociedade brasileira”.

Ainda na continuidade da fundamentação da versão de Veja sobre a ambigüidade

da campanha de Lula, foi explorado o padrão de inversão da forma pelo conteúdo

(ABRAMO, 2003, p.29), em que Veja adjetiva uma administração Lula por uma

“administração barbuda”, ou seja, usa-se o ficcional espetaculoso de “barbuda” sobre a

realidade, induzindo à desqualificação da administração do governo e do candidato.

Nas páginas seguintes, a versão da admissão por hipótese da conversão do

“cristão-novo do capitalismo” Veja resgata a história do PT contada por ela. No resgate,

comenta que a “migração do PT de Lula para a raia central da piscina ideológica

começou em 1995”, e quando Dirceu ganhou as eleições internas do partido e partiu

para dar uma nova roupagem mais moderada, mas de maneira gradual para não

desestimular os “radicais do partido”, segundo a história de Veja,

a idéia era tornar Lula um candidato capaz de atrair mais que os 30% de fiéis seguidores que ele sempre consegue nas eleições – um patamar bom para passar no primeiro turno, mas insuficiente para vencer o pleito. Só com uma roupagem moderada, calculava Dirceu, Lula poderia se vender fora dos bolsões sinceros mas radicais do esquerdismo.

O trecho em itálico clareia a fomentação que Veja objetiva construir na indução

do candidato Lula, com sua versão, a figura de um candidato moldado pelos projetos

políticos de José Dirceu associado com a “nova roupagem” moderada produzida pelo

marketing político. A própria revista, nesse processo de expor sua versão sobre a

“conversão de Lula”, propõe o cálculo para Dirceu, sem ao menos ele ter afirmado isso

à revista.

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Nessa linha de afirmar pela fonte que não é ouvida, um depoimento de Lula é o

próximo a ser citado. Nele, Lula falara que se Dirceu não tivesse assumido a presidência

do PT, certamente o partido teria se tornado insignificante, “avaliou Lula recentemente

a um grupo de amigos” e continua agora afirmando por Dirceu “com pequenas

variações semânticas, sabe-se que Dirceu assina embaixo dessa avaliação”.

Desenvolvendo sua versão sobre a história do PT “convertido”, Veja indaga que

o MST e a CUT optaram por manterem-se calados durante o ano de 2002 para não

serem associados ao PT e causarem desvio na manobra estratégica de Dirceu sobre a

roupagem da “conversão”.

Isso explica em boa parte o sumiço do MST, embora os latifúndios continuem do mesmo tamanho e a injustiça no campo seja a mesma do ano passado. E explica o silêncio da CUT mesmo diante da maior taxa de desemprego da história recente do Brasil. (...) As passeatas barulhentas e as espetaculosas invasões de terra estão em estado de hibernação. Se o petista ganhar a Presidência, esse bloco vai se mover novamente em busca de uma fatia de poder no novo arranjo governamental.

Em itálico, Veja inculcou, por sua versão do fato, o medo no leitor e “garante” a

ele que Lula fará isso sim, “Numa reunião recente com representantes do MST, Lula

pediu que entendessem a atual moderação de seu discurso como necessidade de

campanha. O negócio, avisou, é ganhar a eleição”.

Para sacramentar a idéia de inaptidão à governabilidade petista, Veja sugere que

Lula é um produto criado: “em campanhas, o ajuste do candidato ao gosto do eleitor é

uma manobra clássica. Está nos manuais”.

E finaliza a reportagem solicitando ao leitor-eleitor que leve a história contada a

sério e se pergunte, antes de votar, se Lula tem “expressado confiança” para que votem

nele.

A próxima reportagem, “O homem que faz a cabeça de Lula” (anexo Veja - 08),

traça uma pequena biografia do deputado José Dirceu, contendo até depoimento de sua

primeira esposa, Clara Becker, que ficou sabendo da identidade verdadeira de Dirceu

depois de quatro anos de casamento, quando se encerrou a anistia pelo regime militar.

Os repórteres, João Gabriel de Lima e Thaís Oyama, ao traçarem um resgate da

vida de Dirceu, incluem atrelamentos a Lula. O primeiro é ao remeter José Dirceu como

o político que retirou a “pecha” do PT para viabilizar a eleição de Lula em 2002, reforça

a idéia da reportagem anterior de colocar Lula como um fantoche moldado pelo Dirceu.

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“Na campanha petista à Presidência não se toma uma decisão sem o aval de José

Dirceu, que controla tudo com mão de ferro”.

Primeiro ocorre o padrão de ocultação por presença (ABRAMO, 2003, p.25) que

pauta a matéria de “contar” a história de Dirceu atrelando sua imagem, de autoritário e

capaz de tudo para chegar ao poder, à Lula, e depois, verifica-se o uso do padrão da

inversão da opinião pela informação (ABRAMO, 2003, p.31) quando se assume a rédea

da reportagem sem utilização de fontes e retomando pontos históricos que precisariam

de citações de pesquisas de crédito. Um exemplo desse padrão: “No movimento

estudantil, José Dirceu era conhecido pela capacidade de organização e pela obsessão

em controlar tudo. No PT essas características persistem, segundo seus correligionários

atuais”.

Na entrevista realizada com Lula, dê título: “Eu mudei, o Brasil também” (anexo

Veja – 09), Veja questiona o candidato, em todas as perguntas, voltando-se para as

dúvidas da “conversão” de Lula para o centro, da “incoerência” de o PT ter de 30 a 20%

de radicais dentro do partido que discordam da mudança de Lula, da “problemática” de

ele não falar outra língua a não ser o português, da “hibernação” dos movimentos

realizados pelo MST e pela CUT, se estão fazendo isso para não atrapalhar a campanha,

e a revista também o questiona sobre a “roupagem” produzida pelo marqueteiro Duda

Mendonça. Portanto, visualiza-se o padrão de ocultação por presença (ABRAMO, 2003,

p.26-27) em que a revista só apresenta dados e questões que denigrem a imagem de

Lula, ou seja, optaram por apresentar tais questionamentos, tornando-os reais ao leitor.

O artigo “No deserto do Senai” (anexo Veja – 10), do colunista Diogo Mainardi,

desenvolve um olhar sarcástico diante da formação escolar do candidato Lula. Nela,

Diogo comenta que por Lula desprezar o ambiente universitário, propõe a ele que, ao

comandar o país, exclua de suas influências os catedráticos, como Marilena Chauí,

Antonio Candido e Alfredo Bosi. Nessa abordagem, Diogo ironiza a situação de ter um

presidenciável que tem apenas formação de curso técnico Senai e fica recebendo

comando dos professores universitários citados acima.

Na edição nº 1771, da semana do dia 02 de outubro, Veja traz um especial sobre

“mentira”, a chamada da capa: “Por que os políticos exageram seus poderes e fazem

promessas que não irão cumprir”. A partir disso, a seção “Carta ao leitor”, que é o

editorial da revista, comenta “O teste da realidade” (anexo Veja – 11), que o marketing

eleitoral “prestou um grande serviço aos eleitores brasileiros” mostrando rigorosamente

aquilo que os candidatos à presidência são no plano pessoal. Entretanto, afirma que

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apenas no caso Lula, a “questão continua um mistério”, completando que Lula era

“radical no passado e reapareceu conciliador e moderado”.

Nesse sentido, Veja deixa claro, na afirmação, que Lula não se comporta

“verdadeiro” no espaço do marketing eleitoral tal como Serra, Garotinho e Ciro.

No segundo parágrafo da “carta ao leitor”, Veja já coloca que se tratando de

programas de governo, o marketing eleitoral só serviu para escamotear o significado

real, dizendo que os candidatos prometeram uma conjuntura que não podem cumprir,

começando pela promessa de criação de empregos com números inatingíveis (17

milhões de postos de trabalho), segundo a revista.

A partir desse levantamento, Veja antecipa a temática principal da edição

“mentira”. E coloca que os políticos têm a necessidade de “dourar a pílula” para o

eleitor. Com isso, a revista finaliza comentando que a reportagem de capa vai mostrar

para os leitores “(...) quais são as razões que levam as pessoas comuns a evitar a

verdade nua e crua em seus relacionamentos, sob a pena de viver num inferno de atritos

com seus semelhantes”, ou seja, já sugere na carta ao leitor que ele itores são

complacentes com as mentiras dos políticos por, supostamente, evitarem as frustrações

da realidade crua. E por mencionar políticos, a única candidatura à presidência que, para

Veja, não é verdadeira em sua projeção pessoal é a do candidato Lula, como citado

acima. Portanto, vê-se a tendência contra a imagem de Lula que a edição de Veja tende

a seguir.

A primeira reportagem da edição “Eles lularam na reta final” (anexo Veja – 12),

sem repórter responsável, inicia-se o texto desenvolvendo a opinião ao leitor, ocupando

duas páginas de fotos e duas de texto.

Após a leitura da linha fina “A poucos dias da eleição, empresários descobrem

uma súbita afinidade com o PT”, a intenção do título fica mais clara, destacado por

meio da expressão “súbita afinidade” de que a reportagem da Veja, em questão, tende a

problematizar a “‘mudança’ do apoio do empresariado à candidatura petista”, Lula, em

detrimento a Serra. Entretanto, logo, pela expressão supracitada, vê-se a postura

opinativa de Veja, ironizando por meio da palavra “súbita” a expressividade dos

empresários apoiando Lula.

No decorrer da matéria, essa linha editorial continua em vigor. Segundo a

revista, que não cita a fonte de pesquisa, “Até julho passado, cerca de 100 empresários

haviam declarado apoio público à candidatura do petista”. Na semana passada, a lista já

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registrava 500, incluindo pesos-pesados como o Eugênio Itaub e Roberto Jeha, vice-

presidente da Fiesp, entidade que reúne a elite industrial de São Paulo.

Entretanto, observa-se que, em quatro meses, dos 100 empresários que Veja cita

aumentou-se para 500. Esse dado é importante e significativo, mas sua fonte precisaria

ser informada, para que este pudesse ser comprado como verossímil. Há um link

opinativo que Veja coloca no parágrafo, e que se confirma no próximo, que é

novamente a ironia de esses empresários estarem ligados só agora “na reta final” ao PT

e a Lula. “Faltando poucos dias para a eleição, todos eles descobriram uma súbita

afinidade com o ideário petista”.

Uma segunda interrogação é a relevância na visibilidade desses empresários pela

revista. Novamente, na próxima parte da reportagem, Veja explora boatos políticos para

tentar colocar o presidenciável Lula na postura de traidor dos seus “antigos princípios

políticos”, “(...) a simpatia cada vez mais desinibida de aliados do ex-senador Antonio

Carlos Magalhães. (...)”. Com base nessa frase, percebe-se que Veja, novamente sem

citar fontes, coloca a informação de que agora Lula está fazendo alianças com aliados

de Antonio Carlos Magalhães. Primeiro, a informação sem fonte perde a credibilidade e

faz perder a confiança no dado como verdadeiro. Segundo, ao falar que Lula faz hoje

aliança de forma desinibida com aliados de ACM, deixa a entender tanto que

anteriormente fazia-se aliança com os mesmos, mas de forma secreta, como também os

aliados de ACM são vistos pela Veja como más influências governamentais, bem como

fala dos aliados, mas não se informa precisamente por meio de fontes quem são elas,

generalizando a expressão “aliados do ex-senador do PFL de ACM”, para aquém do

partido do PFL de ACM, ficando fácil existir realmente essa possibilidade de

aproximação, visto que Lula fez alianças com partidos além de PT e PL, tornando a

expressão possível, mas não com a credibilidade necessária para o gênero jornalístico

informativo.

Verifica-se a estratégia de generalizar para não mentir, como recurso para não

utilização de fontes comprometidas com o fato/ informação.

Na seqüência da reportagem, o foco dos “empresários lularam na reta final”

muda de rumo e começa-se a problematizar a questão Lula & Economia.

Veja coloca que “Lula tem evitado agredir qualquer setor da economia”,

comentando que durante sua entrevista ao Jornal Nacional “(...) reassumiu seu atual

momento ‘paz e amor’ ao responder se era ou não favorável à bomba atômica brasileira.

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Declarou-se favorável a uma bomba que, ao explodir, jogue pétalas de rosas para todos

os lados (...)”.

Por meio da análise da frase acima, percebe-se que Veja explora o significado

que a economia tem na atual conjuntura brasileira (e diga-se mundial) nos antecedentes

das eleições para captar a atenção do leitor para o que Lula tem dito, ou não, sobre a

temática. E, segundo Veja, “Lula tenta fugir”, “tem evitado AGREDIR” a economia,

apenas porque respondeu ao Jornal Nacional, ao ser interrogado sobre sua postura em

relação à “bomba atômica brasileira”, que é favorável a bombas de paz que ao

explodirem joguem pétalas de rosas.

No mesmo parágrafo, Veja proclama que, se Lula continuar nesta “marcha”,

chegará ao último debate, a ser realizado pela Rede Globo no dia 03 de outubro, com a

caricatura de Silvio Santos. Nesse sentido, pode-se afirmar que Veja coloca a imagem

de Lula de forma pejorativa, ou seja, opina, ao invés de informar, utilizando a “inversão

da opinião pela informação” (ABRAMO, 2003, p.31).

Ainda nessa reportagem, a revista se ancora em outro boato- informação

generalizando o(a) informante como um dirigente do comitê petista, sem mencioná- lo

ou o porquê de o mesmo não querer ser reconhecido, logo a dúvida sobre a credibilidade

da informação passada fica desacreditada como verdade.

O ambiente no comitê petista anda tão festivo que na semana passada um dirigente do partido propunha em tom de brincadeiras que Lula telefonasse para Serra e oferecesse a ele uma troca de números, Lula ficaria com registro do PSDB 45, e Serra, do PT que é 13. Apenas para ser mais condizente do patamar de cada candidato nas pesquisas, diz o dirigente.

A colocação de que seria mais “condizente com o patamar de cada candidato nas

pesquisas” tem a cotação de que 45, por ser maior que 13, deveria ser colocado a Lula

por estar liderando as pesquisas com vantagens sobre o 2° colocado. Entretanto,

levantando a hipótese de que a informação acima seja verossímil e que ocorreu o

depoimento do dirigente à Veja, é uma informação irrelevante a temática que sugere o

título, bem como ao próprio leitor em pensar que está se falando do último mês

antecedente às eleições, pela questão de sugerir uma brincadeira.

Mas, talvez, para a “reportagem”, o irrelevante ao público seja o link para se

abordar outro gancho na “reportagem” que segue falando sobre os “números” e do

comitê de Serra. “(...) A equipe de campanha tucana faz as contas para verificar se Lula

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está ou não crescendo nas intenções de voto e, ao mesmo tempo, monitora o

desempenho de Anthony Garotinho”.

A última reportagem da edição, que retrata sobre o assunto da capa, “Exageros,

promessas e mentiras – No calor da disputa, os candidatos douram seu passado,

inflacionam o poder da Presidência e prometem demais” (anexo Veja – 13), ocupa uma

folha de reportagem e 1/3 de texto e o restante de foto e ilustração sobre os candidatos à

presidência.

Na reportagem em questão, seguem mais direcionadas as falsas promessas sobre

pontos econômicos e sociais que os presidenciáveis afirmam no processo eleitoral, em

especial para o de 2002.

Nesta perspectiva, Veja traz, anterior a essa reportagem, um especial sobre

mentira, na voz de especialistas e antropólogos e, depois, nessa reportagem “exageros,

promessas e mentiras”, aprofunda a questão das mentiras que os presidenciáveis lançam

à população como utopias fáceis de serem compradas pelos eleitores.

Com isso, Veja sugere no começo sobre o comportamento de Lula entrar com

representação no TSE discordando da comparação que Serra lhe atribuiu “(...) um lobo

em pele de cordeiro”. Nesse sentido, Veja se coloca a favor da comparação que Serra

fez de Lula, pois, logo depois dessa frase, aponta “(...) por defender posições moderadas

em política e economia durante a campanha, em franca discordância com o que pregou

durante toda a sua carreira política. O TSE ainda não esclareceu se, em sua opinião, a

acusação de Serra constitui mesmo uma ofensa de fundo inverídico contra o candidato

do PT”.

Por meio dessa última abordagem sobre Lula, verifica-se a conduta manipulada

do “"padrão de ocultação por presença” (ABRAMO, 2003, p. 25) em que a revista Veja

opta por colocar o dado sobre a desqualificação de Lula, pelo seu concorrente Serra, que

está em processo no TSE. Ou seja, houve a ocultação por presença, em que o dado

citado torna-se testemunho do que se quer comprovar com seu comparecimento na

reportagem. Abramo esclarece que o “fato presente na produção jornalística, real, ou

ficcional, passa a tomar o lugar do fato real e a compor, assim, uma realidade diferente

da real, artificial, criada pela imprensa”.

Na edição 1772, referente à semana de 09 de outubro, a revista Veja trouxe na

reportagem “A rota de Lula para o poder” (anexo Veja – 14 ), desenvolvida por João

Gabriel de Lima e Thais Oyama, um texto que começa na página 56 e finaliza na página

62. No início, os repórteres partem para uma comparação de presidentes eleitos,

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nacionais e americanos, que se deixaram ser influenciados por “amigos” e outros setores

de seus partidos de origem. A partir daí, questionam que, se Lula chegar ao Palácio do

Planalto, “o Brasil terá talvez um dos mais acessíveis presidentes de sua história. Chefes

do Executivo com prontidão para o diálogo atraem simpatia e riscos na mesma

proporção” e continuam no final do parágrafo, após a exposição de outros líderes

políticos que não foram felizes ao realizar a abertura as suas influências, “Lula tem sido

alertado para o risco que corre prometendo dialogar com todo mundo, compor os

contrários, ser um algodão entre os cristais de interesses conflitantes”. Nesse sentido,

Lima e Oyama já delineiam a linha editorial que desenvolveram durante o texto todo,

com vários objetivos de construção de uma imagem de Lula insustentável e muito

perigosa para o futuro do país.

A reportagem começa então a utilizar o padrão de inversão da versão pelo fato

(ABRAMO, 2003, p.29), com base nos objetivos que a Veja tem desenvolvido da

imagem de Lula, os repórteres fazem uso dessa versão para reafirmá- los. Comenta que

Lula tem mantido conversas com banqueiros, empresários, mas que “Só falta agora

combinar com os bolsões de radicalismo que se aninham dentro do PT e estão

caladinhos à espera da vitória”, e completa: “os militantes revolucionários dessas

facções instaladas dentro da máquina do PT têm alto potencial de estrago. Se

contrariados, poderão sair às ruas e fazer um barulho ensurdecedor”. Portanto, a figura

de Lula ainda é anexada aos “tais militantes revolucionários”, pelos quais Veja opta para

amedrontar o leitor-eleitor dos seus poderes enquanto radicais e ensurdecedores.

Os repórteres exploram, ainda se utilizando da versão do fato, fases do candidato

Lula e problematizam que na fase “pré-Duda” Lula simpatizava com o regime socialista

implantado por Fidel Castro em Cuba, pelo venezuelano Hugo Chávez e que há

militantes petistas que “endeusam as Farc”, grupo guerrilheiro da Colômbia, “braço

armado do narcotráfico”. E enfatizam que essas ligações de Lula não são “indicações

animadoras a respeito das simpatias recentes do candidato e seu partido, quando se sabe

que ao Presidente eleito caberá aprofundar o diálogo com os EUA”. Por meio desse

menosprezo e desqualificação da então fase “pré-Duda”, os repórteres se utilizam do

quinto filtro de Herman e Chomsky (2003, p.88), sobre o anticomunismo como

mecanismo de controle, que bloqueia a idéia real do fato ou dado jornalístico com o

expediente de remetê-la a associações comunistas, socialistas, que são enraizadas na

sociedade como “más posturas” que trariam apenas frustração e insustentabilidade

governamental, e outros pejorativos, que perduram por décadas após o fim do

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socialismo soviético. Com isso, eles atrelam a imagem de Lula a um “poder comunista”

e, portanto, intolerável à “governança democrática”, que afligiria os interesses de outros

paises importantes, como os Estados Unidos.

No decorrer da reportagem, os repórteres julgam que numa possível presidência,

em 2003, Lula exerceria uma maneira de governar “bem ao seu modo”, reproduzindo o

aprendizado da vida sindical, porque “afinal, o filho de Eurídice e Aristides, migrantes

pobres do interior de Pernambuco, venceu na vida em São Paulo ouvindo os outros”.

Esse julgamento dá início a outros parágrafos que denigrem a postura do candidato.

Lima e Oyama retratam a escolaridade de Lula como precária e questionam que esse

tema foi sempre um “tabu para o partido”. As duas opiniões lançadas pelos repórteres

são declarações deles, sem utilização de fontes alheias, ocorrem nesse momento da

reportagem ao julgarem e danificarem a imagem de Lula, o padrão de inversão da

opinião pela informação (ABRAMO, 2003, p.31), induzindo a uma outra realidade com

juízo de valor da linha editorial da revista.

No desenvolvimento da reportagem, os repórteres expõem duas falas que

denigrem a imagem de Lula, na voz de “muitos analistas” e de “um banqueiro”:

Para muitos analistas, Lula não é o governante ideal para o atual momento da economia brasileira e mundial. (...) Precisamos de um peixe, e Lula é apenas um homem que, segundo garante, aprendeu a nadar, diz um banqueiro.

E, segundo Abramo (2003, p.31), “o juízo de valor é inescrupulosamente

utilizado como se fosse um juízo de realidade, quando não como se fosse a própria mera

exposição narrativa/descritiva da realidade”, pois, nesse sentido, quem garante que os

depoimentos das supostas fontes em itálico foram ouvidos ou existem enquanto fonte?

Principalmente depois da exposição que diminui a imagem do candidato Lula durante a

reportagem inteira.

Agora a reportagem busca atrelar Lula a um candidato construído pelo

marketing político desenvolvido pelo publicitário Duda Mendonça “nos últimos dias da

campanha, o candidato parecia acometido de uma crise de fadiga em relação ao estilo

sorridente e apaziguador que o publicitário Duda poliu para os programas de televisão

do líder petista”. E Lima e Oyama enfatizam que de repente “aqui e ali, surgia o velho

Lula durão, o radical de Vila Euclides, o ‘sapo barbudo’”, para afirmar mais adiante que

o candidato reapareceu com um discurso não tão moderado para não deixar os

militantes radicais magoados e traz, no desfecho dessa versão, padrão de inversão da

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versão pelo fato (ABRAMO, 2003, 29), o depoimento de um cacique do PT para

afirmar a sua versão:

“Há um certo temor entre alguns de nós de que o discurso de Lula tenha ido muito para o centro durante a campanha e isso pode tirar a gana dos militantes na hora da eleição. Por isso ele tem dado umas estocadas”, diz um cacique do PT.

Na finalização da reportagem, expõe a supremacia de decisão do dirigente do

PT, José Dirceu, frente à de Lula, se utilizando da comparação dos amigos Che Guevara

e Fidel Castro,

Fidel ganhou, mas Che o deixou ganhar. Lula é o comandante supremo do PT. José Dirceu sabe disso melhor do que ninguém. Mas se alguém é capaz de influenciar uma decisão de Lula e até de invertê-la totalmente em sua essência essa pessoa é Dirceu. Ou seja, quando Dirceu ganha uma parada, diz-se que Lula o deixou ganhar.

Os repórteres finalizaram a reportagem colocando Lula como o seguidor das

manobras e estratégias de Dirceu, ou seja, um candidato sem voz firme diante de planos

e metas de governança, um candidato influenciado.

O artigo “Lula e ‘as elite’” (anexo Veja – 15), por Diogo Mainardi, comenta

ironicamante os xingamentos que Lula expõe sobre “as elite” e aponta a contradição de

que Lula “conta com mais votos entre eleitores da elite do que entre os pobres”, e

persegue na proposta de atrelá- lo a um candidato ambíguo. Enfatiza que a “maior

bronca de Lula é que, em 500 anos de história, a elite conservadora nunca cedeu o poder

‘a um representante do povo’, bem como aponta que Lula, em tempos atuais, elogiou o

líder popular que ‘combateu o autoritarismo das elites’, Hugo Chávez e também

problematiza a fala de Lula em defini- lo (Hugo Chávez) como ‘um homem culto’ e

lembra, menosprezando Lula satiricamente, que é “curioso ver Lula distribuir atestados

de cultura mundo afora”.

E chega ao final igualando Lula à elite que ele tanto diminui e coloca essa elite

como se preparada “para reverenciar o novo imperador Lula”.

O último artigo da edição, “Lula, no dia seguinte: três dúvidas” (anexo Veja –

16), elaborado pelo articulista Roberto Pompeu de Toledo, desenvolve seis construções,

dividido em três cenários, no caso de Lula vencer as eleições.

O primeiro cenário é a dúvida sobre como Lula se portará quanto à sua

roupagem estética. A primeira versão remete Lula como um anti-Armani, pisoteando as

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roupas utilizadas na campanha de 2002, pegando uma calça jeans e uma camiseta

vermelha e dizendo a sua esposa que “se me chatearem, visto a camiseta com a estampa

do Guevara”, e na outra versão sobre a roupagem traz um Lula se apreciando no espelho

com o terno Armani e solicitando a sua esposa que encomende mais cinqüenta iguais.

O segundo cenário é a dúvida do slogan “paz e amor”. Segundo a primeira

versão, Lula agiria com radicalismo, colocando Pedro Stedile e Zé Maria em ministérios

essenciais, e a outra versão sobre o slogan de campanha é a de que Lula colocaria nos

ministérios seus inimigos políticos, como Mario Amato, Pedro Malan.

O terceiro cenário é a dúvida sobre o futuro político sem Duda Mendonça. A

primeira versão remete Lula resgatando o antigo projeto de campanha do PT, e a

segunda versão é um Lula diplomático com a mídia e com representantes do FMI.

O articulista deixa clara sua postura de definir Lula como um candidato

ambíguo, não confiável e, portanto, problemático enquanto candidato à presidência do

país.

Na edição 1773, referente à semana de 16 de outubro, a revista Veja trouxe logo

na carta ao leitor (editorial) “Aos debates, companheiros” (anexo Veja – 17), uma

postura de pressionar o candidato Lula a aceitar o pedido de quatro debates a que o

candidato Serra o convida, mas desenvolve nessa postura uma defesa à Serra e enfatiza

que Lula “não deveria se furtar à exposição dos debates televisionados”.

Nesse editorial, Veja opera na defesa aos tucanos explicando que Lula, por ter

conseguido uma votação recorde no primeiro turno, acha que ganhou o “direito de

participar de apenas um debate, que seria feito em rede nacional de televisão” e afirma

que, para a sociedade brasileira, o ideal é “não apenas uma, como querem os petistas,

mas quatro vezes, como estava previsto”, e chama Lula para o debate, por pedido de

Serra, “aos debates, companheiros”.

A reportagem “O jogo das alianças” (anexo Veja – 18), sem assinatura de

repórter, comenta a busca por alianças dos candidatos Serra e Lula e quais os acertos

que já foram firmados. O único ponto do texto que parcializa a imagem de Lula refere-

se, novamente, ao posicionamento de preferência ao candidato tucano, José Serra. No

final da reportagem, Veja comenta que o PFL, especialmente a ala de Jorge Bornhausen,

firmou o apoio no segundo turno por Serra, e que esse apoio foi o encerramento “com

chave de ouro” a sua “errática participação nesta campanha presidenc ial”. Ou seja, Veja

faz uso do padrão de inversão da informação pela opinião (ABRAMO, 2003, p.31) ao

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declarar que o PFL fez a melhor opção no apoio presidencial, rumo ao segundo turno,

preferindo Serra a Lula.

Na edição 1774, referente à semana de 23 de outubro, a revista Veja trouxe logo

na capa (anexo Veja – 19) uma ilustração de um centauro de três cabeças, as quais são

identificadas pela descrição de correntes nos pescoços, Marx, Lenin e Trotsky. Essas

três figuras são expostas na capa como demônios, pois no rabo do centauro há um

identificativo do símbolo demoníaco, vermelho. As cabeças de Marx, Lenin e Trotsky

trazem expressões de raiva e impressionam o observador com uma mensagem de

angústia e indignação violenta, o último chega até a babar, demarcando um certo grau

de loucura e desequilíbrio. Esse centauro de Marx, Lenin e Trotsky, além de demoníaco,

traz outra identificação, o símbolo do Partido dos Trabalhadores, a sigla PT, na coleira,

a qual oferece indícios de ser bem resistente e por ter também estruturas de metal que

avançam lateralmente semelhante às coleiras utilizadas por cachorros de grande porte

que não são sociáveis com qualquer pessoa. Portanto, a capa de Veja associa os teóricos

Marx, Lenin e Trotsky ao PT e ao demônio, além de destacar que a representação

inspira medo, pânico, desse PT, que baba e se prostra com violência ao ponto de

precisar estar na coleira. Essa constatação é confirmada na chamada de capa, que é

colocada logo abaixo da ilustração, “O que querem os radicais do PT: entre os petistas,

30% são de alas revolucionárias. Ficaram silenciosos durante a campanha. Se Lula

ganhar, vão cobrar a fatura. O PT diz que não paga”. Por meio dessa chamada,

visualiza-se que Marx, Lenin e Trotsky representam as tais alas revolucionárias, que

representam 30% do PT, segundo a Veja, e que eles representam o temor, numa possível

vitória do PT à presidência, pois para a Veja eles vão “cobrar a fatura” e causar dano à

estabilidade e ao equilíbrio do país.

Acima, no topo da capa, do lado esquerdo, visualiza-se: “Brasil: o riso de um

calote na dívida”. Essa chamada secundária é associada à ilustração e à chamada

principal, primeiro pelo fato de o fundo dela ser “vermelho”, da cor do símbolo do PT, e

principalmente por não ter outro assunto tratado na capa, apenas “o medo da fatura dos

radicais do PT”, o que indica que os mesmos radicais objetivam implantar o calote na

dívida externa, tal como sugere a Veja na associação.

Contudo, pode-se definir que, nessa capa, Veja faz uso do padrão de inversão da

versão pelo fato (ABRAMO, 2003, p.29) em que se utiliza do fato de existir uma ala no

PT, que esteja mais ligada a princípios esquerdistas do partido, para torná- lo uma

criação à parte, que resgata desqualificações como: radicais, demônio, alas

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revolucionárias, e mais as percepções negativas e temerosas que a figura do centauro

representa. Com isso, ela cria uma realidade paralela do fato original, segundo seus

interesses em criar o estigma e mantê- lo na versão desenvolvida.

Na seção “Carta ao leitor” (anexo Veja – 20), a revista induz, seguindo a

intenção da capa, a idéia de atrelar à ala mais à esquerda do PT, como “minoria de

radicais incendiários” e problematiza a presença deles no PT afirmando que a revista

trará na reportagem de capa “os custos que essa opção pode vir a trazer para Lula caso

ele seja eleito”, como se portando a defender, alertar Lula, mas também demarca que

esse mesmo “alerta” pode servir-se como outro alerta aos leitores-eleitores: a ameaça

que uma possível vitória de Lula acarretaria à nação.

Na reportagem “Transição na crise” (anexo Veja – 21), há uma foto ocupando

uma página e 1/4 de outra. Ao lado dela, vê-se Lula, quase de corpo todo, vestindo um

terno cinza-escuro e uma gravata vermelha brilhante, com um olhar fixo, mas que não

demonstra segurança, e com a mão direita inclinada para a frente. No segundo foco, há a

bandeira do Brasil, ou melhor, uma parte dela, pois Lula corta a continuação da palavra

“progresso”. Nessa foto montada, o candidato Lula é posto como o presidenciáve l que

impede o progresso do país, bem como o coloca em associação a outros líderes

populares, tais como Hitler, pois a maneira com que inclina o braço em direção para a

frente lembra o mesmo ato, muito mais famoso e histórico, do ditador alemão, Hitler.

Há também o detalhe de lembrar os leitores observadores que Lula é um ex-

metalúrgico, na ausência do dedo mindinho, na foto em que a mão inclinada é a direita,

a mesma com que Hitler acenava à multidão e a própria em que Lula não tem o dedo

mindinho. Na legenda da foto, o tom de sarcasmo permanece, dizendo que mesmo Lula

tendo uma larga vantagem nas pesquisas, continua cometendo erros. Afirma-se isso na

frase “e declarações polêmicas”.

No texto da reportagem, escrita por Eurípedes Alcântara, problematiza-se no

final do primeiro parágrafo o começo do padrão de inversão da versão pelo fato

(ABRAMO, 2003, p.29), o qual seguirá no desenrolar da reportagem. O repórter atribui

às eleições de domingo como “componente histórico inédito, mas de natureza perversa”,

por considerar o momento econômico delicado e remeter a uma possível vitória de Lula,

um risco ainda maior nesse momento, “a faixa presidencial estará trocando de dono em

meio a uma crise financeira sem precedentes na história recente do Brasil. Cada passo

da transição estará sendo vigiado pela implacável disciplina do mercado”.

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Por meio dessa versão em atrelar a possível vitória de Lula a um risco maior na

transferência presidencial, na área econômica, Veja incorpora o padrão de inversão da

opinião pela informação (ABRAMO, 2003, p.31), nela declara-se, na voz do

Subsecretário do Tesouro dos Estados Unidos, Kenneth Dam, que o governo americano

estaria elaborando um plano de emergência caso o Brasil declare uma moratória e em

seguida o repórter opina:

A instabilidade que se observa no Brasil foi provocada pela combinação de muitos fatores de risco. Entre eles, figura o temor de um governo Lula. Esse não foi o mais forte dos fatores. Teve, no entanto, poder suficiente para transformar risco em incerteza e potencializou a crise.

A opinião em itálico, no trecho selecionado, demarca claramente a opinião do

repórter e a da revista, em reafirmar que a possibilidade de o próximo governo ser de

Lula potencializou a crise econômica e financeira que atingia o país. Segundo Abramo

(2003, p.31), “o juízo de valor é inescrupulosamente utilizado como se fosse um juízo

de realidade”, induzindo o leitor a denotar a informação como verdadeira.

Seguindo a linha da indução, o repórter sugere que há ainda a desconfiança dos

“radicais do PT”, “(...) e mais a desconfiança da pauta radical histórica do PT – ajudou a

armar a tempestade financeira sobre o Brasil”.

Na próxima opinião lançada, (ABRAMO, 2003, p.31) Alcântara parte para a

desqualificação de Lula, comentando que, na semana anterior, ele havia, ao falar de

improviso, realizado uma declaração desastrosa, sobre as taxas de juros altas no Brasil,

bem como depois de adjetivar a “declaração” diminuindo a fala do candidato Lula

defende a equipe do concorrente, Serra, numa outra reprodução de depoimento do

ministro Malan. Após a fala em que Malan defende as ações de juros implantadas pelo

governo FHC, o repórter opina declarando que “Lula cometeu uma injustiça com a

equipe econômica do atual governo e deu explicação emocional para uma questão

complexa como os juros”. Essa postura se declara contra Lula e a favor de Serra.

Nesse sentido de formular opinião ao invés de informação na reportagem,

Alcântara expõe:

O mercado acionário sempre foi visto pelo PT como uma espécie de cassino, em que espertalhões nacionais e estrangeiros especulam para ver quem fica com a maior parte do pobre dinheiro do trabalhador. O próprio Mercadante já se referiu ao capital estrangeiro em bolsa como “dólar de motel”, dinheiro que dorme uma noite no Brasil e vai embora no dia seguinte.

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Depois, o repórter cita um documento realizado pela ala mais voltada ao centro,

a cúpula do PT, que funcionaria como um tranqüilizante ao mercado, a ser entregue aos

dirigentes da Fiesp. E, logo após o apontamento desse documento como positivo, o

repórter afirma que para a ala mais à esquerda, que define como “facções radicais e

revolucionárias”, que apresentam “idéias ainda que se alimentam de utopias pré-queda

do Muro de Berlim”, esse documento causou “estupefação”. E alerta que eles podem

“atrapalhar muito um eventual governo de Lula”. Dentre os objetivos dessa ala, a

esquerda do PT, o repórter levanta o seguinte, sem menção de fontes: “São pessoas que

defendem a ‘expropriação do patrimônio da grande burguesia’, a reestatização das

empresas privatizadas e a censura à imprensa – medidas que, na visão deles, levariam

em sua etapa final à abolição do capitalismo”.

Por meio da demonstração de supostos objetivos da suposta “facção

revolucionária”, Alcântara faz uso do padrão de ocultação por presença (ABRAMO,

2003, p.26) em que torna real ou existente à leitura um indicativo significativo, quanto

ao que representa a setores ligados a classes sociais A e B. Além desse padrão,

encontra-se também o uso do quinto filtro de Herman e Chomsky (2003, p.89) o

anticomunismo como mecanismo de controle, em que se utiliza do medo enraizado

sobre antecedentes pejorativos do comunismo na sociedade para descaracterizar o

significado original da informação e submetê-la ao significado de maligna, em que se

deve repugnar, sem antes compreender, originando assim uma outra realidade à

informação, que não é a original, mas que se tornou real mesmo sendo ficcional.

Rumo ao final da reportagem, Alcântara cita uma fonte que não apresenta valor

como tal: “dirigentes do PT acreditam que os radicais podem ser um problema para o

partido, ‘mas não serão para o governo’”.

Finalizando, opina em dois trechos. O primeiro está sendo colocado, pelo

cientista político Jaime Nicolau, que afirma que a cúpula dos partidos políticos de

esquerda, no mundo inteiro, está à direita dos militantes, e que com o PT não seria

diferente. Em seguida, o repórter opina: “Espera-se que não seja mesmo”. Ainda

utilizando o padrão de inversão da opinião pela informação (ABRAMO, 2003, p.31), o

repórter menciona “que a paixão ideológica pode causar estragos”, sobre a mesma ala

esquerda do partido. E para versar uma prospecção, sem fonte: “Um radical ensandecido

no Incra, por exemplo, poderia incentivar invasões em vez de coibi- las”, finaliza.

Na reportagem “Vai ser preciso segurar” (anexo Veja – 22), o repórter Carlos

Graieb retoma a ilustração do centauro, com Lula o segurando, nas duas primeiras

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páginas. A linha final, “Marxistas, leninistas e trotskistas que compõem o coração

radical do PT se preparam para cobrar sua fatura caso Lula seja eleito”, menciona

claramente o rumo que o texto dissertativo-opinativo desenvolverá. A princípio da

análise da reportagem, é importante definir que a reportagem a priori usa do padrão de

ocultação por presença (ABRAMO, 2003, p.26) por selecionar a temática “da influência

da facção radical no PT” na edição que antecipa, a uma semana, o pleito eleitoral do

segundo turno, causando um forte impacto nos leitores e posteriormente tentando

influenciar no voto os leitores-eleitores.

Prospectando, Graieb inicia “é muito provável que rachaduras comecem a

aparecer”, sobre o período pós-eleição com vitória de Lula, adicionando a linha “do

temor” na possibilidade de vitória do PT à presidência. No segundo parágrafo, separam-

se 70% da ala Majoritária do PT, mencionado que seriam os moderados, e os 30% de

“radicais”. Entretanto, o repórter não demonstra a fonte que consultou para realizar tal

afirmação sobre a qual discorre a reportagem inteira.

Seguindo a análise, Graieb cita as defesas da “ala radical”:

(...) expropriação do patrimônio da grande burguesia”, a reestatização das empresas privatizadas, o amordaçamento da imprensa (sob o eufemismo de “controle social dos meios de comunicação”), a abolição final do mercado. Em outras palavras, querem que sejam impostas ao país medidas anacrônicas e tão factíveis quanto convencer o ditador cubano Fidel Castro a cortar sua barba. A recente conversão de Lula às regras do capitalismo soa como heresia imperdoável a esses apóstolos do socialismo.

Além de listar os objetivos da “ala radical” sem citar a fonte de acesso, também

avança em afirmar o desconforto que a tal ala sente na “mudança” de Lula, como se

observa em itálico, na utilização do termo “heresia imperdoável”. No mesmo trecho em

itálico, em especial no termo “apóstolos do socialismo”, o repórter adiciona a temida

palavra que já se enraizou no consciente coletivo como maligna, socialismo. Nesse

sentido, utilizou-se o anticomunismo como mecanismo de controle (CHOMSKY &

HERMAN, 2003, p.89) para associar a “ala radical” ao pejorativo sentido que se

incorporou, no decorrer dos anos no país, o socialismo, com a finalidade maior de

lembrar o leitor de que esse mesmo socialismo era pregado por Lula. Com a intenção de

amedrontar, Graieb incentiva com mais medo: “Eles (os radicais) esperam,

sinceramente, que tudo não tenha passado de teatrinho eleitoral. Caso contrário se

preparam para cobrar sua fatura do companheiro presidente”. Ou seja, o repórter cria

uma versão da realidade (ABRAMO, 2003, p. 31) opinando sobre o que eles pensam

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“eles esperam, sinceramente, que tudo não tenha passado de teatrinho eleitoral”, para

insinuar que o governo Lula corre perigo, pois eles virão cobrar a fatura do

companheiro.

Para dar apoio à construção da versão do fato (ABRAMO, 2003, p. 29) que o

repórter está construindo, sobre a problemática de um governo petista com a “ala

radical” o cobrando, ele lança duas insinuações opinativas: “A maneira como foi

encaminhada a campanha de Lula criou muitos ressentimentos nessas alas

revolucionárias”, e, “A ‘flagrante quebra de coerência ideológica’ deixou a ala vermelha

tiririca”. Outros termos opinativos para definir a “ala radical” aumentam: “xiitas”,

“vermelho-vivo” e, para mencionar uma questão econômica que a tal “ala radical”

menciona, sem fonte, em modificar é a dívida externa, o repórter adjetiva “outro cavalo

de batalha dos radicais é a dívida externa”.

Na mesma reportagem, averigua-se um box que usa quase uma página inteira.

Nele, foram expostas as tendências do PT, o nome das “facções”, o tamanho, a origem

ideológica, as lideranças e as principais concepções. Entretanto, nesse box não foi

incluída nenhuma fonte de pesquisa, para certificar ao leitor sua origem real. Na mesma

espacialidade das páginas (40-41) há uma foto de militantes do MST erguendo a

bandeira do movimento: no lado direito da foto há uma foto menor do presidente do

movimento, João Pedro Stedile e abaixo dele um trecho da música “burgueses não

pegam na enxada”. Do outro lado da foto do MST há a legenda: “manifestações do

MST e o líder João Pedro Stedile: com o apoio das alas xiitas do PT”. Tanto a foto do

MST quanto a legenda, como a outra foto de Stedile e a música demarcam a utilização

do padrão de ocultação por presença (ABRAMO, 2003, p.27), pois, ao colocar todos

esses dados, fotos, legenda e música, associa-os “à ala radical”, mesmo não sendo todas

as segmentações mais à esquerda do PT que apóiem o MST, mas ao se referir ao

movimento na reportagem marca a existência deles enquanto significados associativos

ao que se reporta, originando a composição de uma nova realidade em que se unem

MST e “alas radicais”.

Essa postura de amedrontar pela opinião afirma-se no trecho em que Alcântara

opina: “A menos de uma semana do primeiro turno, começou a circular a notícia de que

o PT vermelho-vivo poderia receber até mesmo um ministério”, novamente sem

credibilidade de fonte.

Na reportagem, quando Alcântara segue a linha de criar a versão do fato, ele

implementa a versão com opinião, como visto, como também com elementos de

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ocultação por presença. Entre esses, coloca-se uma minientrevista pingue-pongue com a

senadora Heloísa Helena, que responde a perguntas somente direcionadas à tal cobrança

que as “alas radicais” farão, o box com a minientrevista intensifica os argumentos de

Graieb na construção da versão da realidade que torna a “ala radical” o maior dos

problemas que Lula encontrará, não tendo condições partidárias de governar o país.

Para finalizar a reportagem, na última página, há uma foto dos guerrilheiros

colombianos das Farc, remetendo na legenda que os “radicais” do PT os colocam como

“vítimas do imperialismo”, ou seja, além do MST, agora o repórter optou por adicionar

a associação às Farc.

A reportagem “Nem todos que lulam são PT” (anexo Veja – 23), elaborada por

João Gabriel de Lima, desenvolve o crescimento do eleitorado de Lula e, nessa

perspectiva, indaga que as mulheres não aceitam o candidato com facilidade por elas

associarem “o PT à baderna e à desordem”. Essa frase é uma opinião, não é trazida por

nenhuma pesquisa, além de ser tratada com adjetivos pejorativos a respeito da

credibilidade do PT.

Um outro problema de fonte está na generalização de “os especialistas”: “os

especialistas explicam o fenômeno pela aceitação de Lula por parte de quem o achava

simpático, mas despreparado e pela guinada do candidato rumo ao centro”, demarcando

a opinião da revista, pois, ao passo em que não se cita pontualmente quem são esses

especialistas, fica notório o descaso com a informação, sugerindo a descrença pelo seu

conteúdo.

No artigo “Queremos jogo sujo” (anexo Veja – 24), o articulista Diogo Mainardi

declara que Lula se coloca como uma pessoa vitimizada, o que impede o ataque da

imprensa, e o coloca também como um poderoso e por isso sente medo do que ele pode

realizar se eleito, por considerá- lo despreparado e um candidato de baixo nível, como

afirma no artigo.

5.3 AFIRMAMOS O VOTO CONTRA LULA – ANÁLISE QUANTITATIVA DA REVISTA VEJA

Na primeira parte da análise quantitativa, traça-se uma visão panorâmica da

imagem construída pela Veja do candidato Lula, para depois visualizar em profundidade

as fontes utilizadas e a que partidos estão ligadas.

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Das 22 unidades de análise vistas no item 5.2 das edições de 04, 11, 18 e 25 de

setembro e 02, 09, 16 e 23 outubro foram contabilizados um total de 13 reportagens, e

03 editoriais, 05 artigos e 01 entrevista com o candidato Lula55, como pode ser

observado no Gráfico 1, abaixo:

Gráfico IESPAÇO RECEBIDO POR CADA GÊNERO JORNALÍSTICO

(INFORMATIVO E OPINATIVO) NA COBERTURA DA CAMPANHA DE LULA PELA VEJA

Informativo62%

Opinativo38%

De todo conteúdo informativo, do gênero reportagem, 62% (13 reportagens),

divulgado sobre a candidatura Lula nesta análise, 92% (12 reportagens) teve tratamento

negativo e apenas 8% (1 reportagem) apresentou posicionamento neutro, como o

esperado para o gênero em questão, que prima pela neutralidade e objetividade

jornalísticas, como mostra o Gráfico 2, na página seguinte.

55 A entrevista com o candidato Lula, da edição 1770, 25 de set. 2002, não entrará na análise quantitativa, mas está inclusa na análise qualitativa, no item 5.2 deste capítulo.

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Gráfico 2 CONOTAÇÃO DADA AO MATERIAL INFORMATIVO

SOBRE A CANDIDATURA LULA NA VEJA

Negativo92%

Neutro8%

De todo conteúdo opinativo (gênero opinião) retratado sobre a candidatura Lula,

o total de 38% (05 artigos e 03 editoriais), em 100% foi atribuído um tratamento

negativo ao candidato petista.

Análise das Categorias:

Seguindo as categorias de análise sobre a construção da imagem, que a revista

Veja traçou do presidenciável Lula, obedecendo aos seguintes itens:

1 - Perfil delineado do presidenciável Lula pela revista;

1.1 Qualidades e deturpações ressaltadas do candidato:

(sim, não e sem posicionamento)

• Popular

• Controlado pelo marketing político

• Ruim a formação escolar em curso técnico

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• Capaz de administrar o governo

• Honesto

2 - Fontes selecionadas para entrevistas ou opiniões;

2.1 Especialistas nas áreas (quem e respectiva representação):

• Economista

• Cientista político

• Político partidário

• Filósofo

• Psicólogo

• Pesquisa (Bibliográfica e de Instituições de Pesquisa)

• Meios de comunicação

• Empresário

3 – Partidos políticos utilizados como fonte para o material informativo;

• PDT

• PSDB

• PFL

• PPS

• PMDB

• PL

• PT

• PPB

• PSB

• PTB

Primeiro será retratada a análise do material informativo (62%), em separata do

material opinativo (38%).

Partiu-se da hipótese de que a revista Veja desenvolveu uma postura parcial

diante das informações sobre as eleições 2002, em específico do presidenciável Lula.

Para tanto, as categorias de análise traçaram um posicionamento mais claro nos seus

itens, já demarcando possíveis visões construídas de Lula. Com isso, selecionaram-se

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cinco itens, na primeira categoria, diretamente ligados ao perfil construído sobre Lula,

pela revista, que são: popular, controlado pelo marketing político, ruim a formação

escolar em curso técnico, capaz de administrar o governo e honesto. O eixo analítico

para separação desses cinco itens foi: sim, não e sem posicionamento.

Das treze reportagens (62% do material analisado), seis atrelaram Lula a uma

imagem popular, enquanto as outras sete reportagens não tiveram posicionamento no

quesito “popular”. Seis reportagens afirmaram que Lula é controlado pelo marketing

político e sete reportagens não se posicionaram quanto à questão do marketing. Onze

reportagens não se posicionaram quanto à formação escolar de Lula ser de nível técnico

e duas reportagens disseram que é ruim a formação escolar do candidato Lula. No item

sobre se Lula é capaz de administrar o governo, verificaram-se sete reportagens não se

posicionando e as outras seis restantes se posicionaram de maneira negativa à mesma,

colocando-o como inapto à governança. E no último item, sobre a honestidade de Lula,

constataram-se oito reportagens sem posicionamento sobre o adjetivo honesto e outras

cinco associando-o a ser um candidato desonesto. Averigua-se no Gráfico 3, na página

seguinte:

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Gráfico 3

PERFIL DAS QUALIDADES E DETURPAÇÕES DA IMAGEM DO CANDIDATO LULA PELO MATERIAL INFORMATIVO DA REVISTA VEJA

0

2

4

6

8

10

12

Popular Controlado peloMKT. Pol.

Ruim aformação

escolar emcurso técnico

Capaz deadministrar o

governo

Honesto

sim sem posicionamento não

Na segunda categoria de análise específica para o material informativo, em treze

reportagens (62% do material informativo analisado), foram quantificadas as

especializações das fontes utilizadas para compor as mesmas. A categoria de análise

separou o eixo de itens que corresponde às fontes utilizadas em: político partidário

psicólogo, empresário, pesquisa (bibliográfica e de instituições de pesquisa), filósofo,

cientista político, economista e meios de comunicação (assessorias de comunicação e

órgãos de imprensa).

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Constataram-se 51 fontes56 utilizadas em treze reportagens, das quais a maioria,

dezessete fontes, foram políticos partidários. Dentre esse item “político partidário”

apurou-se que eles são citados, com depoimentos ou falas reduzidas, isso quando suas

falas eram apenas mencionadas a partir de discursos que haviam realizado. São eles:

Lula, José Dirceu, Senador Tasso Jereissati – PSDB, José Serra, Walter Pinheiro – líder

do PT na Câmara, Deputado do PMDB Geddel Vieira Lima, Ciro Gomes – PTB, José

Genoino – PT, Fernando Henrique Cardoso – PSDB, José Carlos Martinez – PTB,

Pedro Malan – PSDB, Aloísio Mercadante – PT, Heloísa Helena – PT, Ivan Valente –

PT, Luciana Genro – PT, Markus Sokol – PT, Raul Pont – PT.

O outro item que também foi referenciado pelas reportagens foi o “economista”,

que obteve nove fontes: Consuela de Tarso Venceslau, Sérgio Werlang, Carlos Langoni,

Raul Velloso, Paulo Guedes, Luciano Coutinho, Mailson da Nobrega, Kenneth Dam,

Guido Mantega.

Depois, com sete citações, ficaram os “meios de comunicação”: Marcus Flora –

responsável pelas análises de pesquisa do PT, Nelson Biondi – publicitário de Serra,

Dick Morris – marqueteiro dos EUA (do Bill Cliton e de Ciro), Reinaldo Polito –

especialista em ensinar políticos e executivos a criar sua imagem pública, Jornal

Nacional, Ricardo Kotscho – jornalista e assessor de Lula, Nizan Guanaes –

marqueteiro de Serra.

Seguindo, houve seis fontes do item: “pesquisa”, sendo que três foram pesquisas

consultadas do Ibope, do DataFolha e do Vox Populi, e as outras três pesquisas foram

de material bibliográfico: consulta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), trecho do

escritor George Orwell, tese apresentada em conjunto pelas tendências “Articulação de

Esquerda”; “Força Socialista”. Identificou-se três fontes de “cientistas políticos”: Jairo

Nicolau – cientista político do Instituto Universitário do Rio de Janeiro, Fernando

56 Foram identificadas 51 fontes, mas que se encaixavam nos itens da análise foram 44 fontes, as quais entrarão na análise quantitativa, as outras sete fontes foram distribuídas em três advogados: Percival Maricato e Marcio Thomaz Bastos amigos de José Dirceu e Ivo Sooma, um estrategista-chefe para a América Latina do Banco Americano JP Morgan Graham Stock, a primeira esposa de José Dirceu Clara Becker, o ex-comandante militar da Ação Libertadora Nacional Carlos Eugênio Paz e o antropólogo Roberto da Matta. Além dessas sete fontes que foram citadas houve também onze fontes que não foram identificadas, não depositando assim credibilidade de suas existências: cúpula da campanha serrista, comentário por assessores diretos do comitê tucano, assessor direto de Serra, comitê tucano, um integrante do comitê petista estrategistas do PT, empresários neopetistas, dirigentes do PT, muitos analistas, um banqueiro e um cacique do PT. .

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Abrucio – cientista político FGV, José Augusto Guilhon Albuquerque – cientista

político da USP.

Foram encontradas duas fontes do item “empresário”: Roberto Jeha – vice-

presidente da FIESP e Eugênio Staub.

Os itens de “filosofo” e “psicólogo” não foram consultados pelas reportagens da

Veja, portanto não tiveram presença no Gráfico abaixo. Averigua-se no Gráfico 4:

Gráfico 4

Fontes utilizadas pela CartaCapital para a produção do Material Informativo

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28

Economista

Meios deComunicação

Pesquisa

Empresário

Cientista Político

Político Partidário

Número de freqüência das fontes

O item “político partidário” foi mantido isolado e analisa os partidos que as

fontes representam, para compreender pontualmente quais os partidos e frentes políticas

que apóiam. Foi separado em dez partidos57 mais comuns do país, PDT, PFL, PPS,

57 Não houve fontes dos partidos: PDT, PFL, PPS, PL, PPB e PSB.

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PMDB, PL, PPB, PSDB, PSB, PTB e PT. Identificaram-se dezessete fontes “político

partidário”.

O PTB foi utilizado duas vezes nas reportagens como fonte, com o José Carlos

Martinez e Ciro Gomes. O partido do PSDB teve quatro nomes, Fernando Henrique

Cardoso, Pedro Malan, Tasso Jereissate e Serra. O PT foi o líder “político partidário”

com dez fontes citadas: Lula, José Dirceu, Walter Pinheiro – líder do PT na Câmara,

José Genoino, Aloísio Mercadante, Heloísa Helena, Ivan Valente, Luciana Genro,

Markus Sokol e Raul Pont. A única fonte do PMDB foi o Deputado Geddel Vieira.

Averigua-se no Gráfico 5:

Gráfico 5

Freqüência dos Partidos Políticos como fontes de consulta para o desenvolvimento do Material Informativo

0 2 4 6 8 10

PT

PSDB

PTB

PMDB

Número de freqüência das fontes

Neste último detalhamento da análise quantitativa serão apresentados os dados

referentes ao material opinativo (38%), no total de cinco artigos e três editoriais.

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Cinco itens foram selecionados, na categoria que traça o perfil do candidato Lula

exposto nas entrelinhas e posicionamentos mais nítidos do material opinativo. Esses

cinco itens foram mantidos do material informativo (62%), que são: popular, controlado

pelo marketing político, ruim a formação escolar em curso técnico, capaz de administrar

o governo e honesto. O eixo analítico para separação destes cinco itens foi: sim, não e

sem posicionamento.

Dos 38% do material opinativo analisado, 08 unidades de análise, três atrelaram

Lula a uma imagem popular, enquanto cinco não se posicionaram. Quatro unidades

disseram que Lula é controlado pelo marketing político e quatro não se posicionaram

quanto à questão do marketing. Cinco unidades não se posicionaram quanto à formação

escolar de Lula ser de nível técnico, e três acharam ruim essa formação de Lula. No

item sobre se Lula é capaz de administrar o governo, verificou-se que duas unidades não

se posicionaram enquanto a maioria, cinco, aponta Lula como incapaz de administrar a

Presidência da República. E no último item, sobre a honestidade de Lula, constatou-se

uma unidade de análise não se posicionando sobre a honestidade de Lula e as outras sete

associando-o a uma figura desonesta. Averigua-se no Gráfico 6, na página seguinte:

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Gráfico 6

PERFIL DAS QUALIDADES E DETURPAÇÕES DA IMAGEM DO CANDIDATO LULA PELO MATERIAL OPINATIVO DA REVISTA VEJA

0

1

2

3

4

5

6

7

8

Popular Controlado peloMKT. Pol.

Ruim aformação

escolar emcurso técnico

Capaz deadministrar o

governo

Honesto

sim sem posicionamento não

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CONCLUSÕES

“De todos os círculos, de todos os esplendores do espírito humano, o mais largo é a imprensa; seu diâmetro é o próprio diâmetro da civilização. Nada resiste à imprensa. A imprensa é a força? Por quê? Porque é a inteligência.

É o charme, toca a alvorada, anuncia em voz alta o reinado do direito, não conta com a noite senão para, ao fim dela, saudar a aurora e

iluminar o mundo. Sem a imprensa tudo é noite profunda.” Victor Hugo

O que seria do vasto público que lê e se guia pela imprensa se ela deixasse

simplesmente de existir? Qual seria o local, em termos existenciais, de enriquecimento

extra-educação formal em que as pessoas buscariam ser representadas? Em contraponto

a essas questões são necessárias outras indagações: o papel de informar o leitor, pela

essência do verbo é identificado hoje na cultura pós- industrial em que a imprensa se

situa? A imprensa, em especial as revistas de cunho customizado semanal e mensal,

pode agir livremente enquanto linhas editoria is de interesses privados e/ou partidários?

A imprensa é o espaço de diálogo com a sociedade civil, desenvolve o elo entre

a informação e o leitor interessado em adquirir conhecimento e manter-se atualizado

com relação a fatos cotidianos. Porém, na via de estar em contato com esse

conhecimento, há uma questão de ordem econômica, a vendagem, que deve ser incluída

nas considerações sobre a representatividade da imprensa, bem como por que ela

direciona a outras problemáticas fundamentais para entender o papel social da imprensa

no mundo moderno.

Os produtos que os veículos de comunicação produzem, no caso, as revistas

Veja, CartaCapital e Primeira Leitura, são vendidos por preços compatíveis ao

mercado jornalístico impresso, portanto requerem ser compreendidas incluindo essa

conjuntura de ordem econômica no cenário de posicionamento enquanto papel de

caracterização social. A seguir, a partir dessas considerações a priori, permite-se

repensar o velho cenário de esfera pública burguesa58 (mencionado no capítulo I, em

específico no item 1.4 Reafirmação do Jornalismo como Atividade Política) a que a

58 Os estudos e definições do filósofo Habermas, com relação à esfera pública burguesa, em específico na obra: Mudança estrutural da esfera pública, conceituou essa esfera como espaço público para debater política, normas civis e condução do Estado, com respaldo dos objetivos do que a sociedade mercantil em ascensão almejava discutir e teorizar para a vida prática. É válido lembrar que esse espaço era freqüentado por homens que detinham uma renda econômica alta (a burguesia e a nobreza), ou seja, um ambiente privado e elitizado, além de ser freqüentado apenas pelo gênero masculino.

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mídia e, em partes, a imprensa é atrelada. Pois, ao passo em que a imprensa permite se

colocar como mural informativo dos fatos jornalísticos de interesse público, ela limita a

exploração real desses “fatos jornalísticos”, do que é “interesse público” e

principalmente do que entende por “informação”, mais especificamente do “gênero

informativo”. Nesse sentido, se demarca que as revistas supracitadas se ancoram em

particularidades econômicas que subsidiam a margem dessa limitação.

Uma das hipóteses levantadas para o estudo desta dissertação se baseou em

remeter ao papel das revistas como meios que desenvolvem linhas parcializadas sobre a

imagem do candidato Luiz Inácio Lula da Silva, desrespeitando as normas do gênero

informativo, e do descaso com o rigor das fontes depoentes59. Ela foi confirmada. A

densidade da confirmação pôde expor de maneira aprofundada nos capítulos III, IV e V,

de quê maneira o enviesamento foi realizado, quais recursos utilizados como padrões de

manipulação que as revistas tiveram como fundamento ideológico e principalmente qual

foi o resultado, em termos de qualificações e desqualificações que elas demarcaram

sobre o candidato em destaque. Averiguou-se, contudo, as seguintes parcializações das

revistas semanais CartaCapital e Veja, e da mensal Primeira Leitura sobre a imagem

construída do candidato do PT, Lula.

Primeira Leitura:

A revista Primeira Leitura, em suas primeiras edições, trabalha sua linha

editorial a respeito das eleições para a presidência de 2002 associando o candidato Luiz

Inácio Lula da Silva a um risco para o sistema econômico implantado nos últimos anos

de democracia brasileira. Isso fica claro na edição de julho, nas análises a partir da

matéria de Liliana Pinheiro, “Depois do Vendaval: o Brasil em 2003”, em que Lula

começou a ser caracterizado como uma ameaça ao mercado e como um candidato que

desprezaria a classe dos investidores externos, colocando o Brasil numa crise econômica

e política. Seguindo essas associações à construção da imagem de Lula, a Primeira

Leitura continua a se posicionar contra esse candidato, entretanto sem dados

consistentes em sua argumentação, como na coluna de Mendonça de Barros (artigo

59 No presente projeto de pesquisa foi assumido, nas análises que seguem os Capítulos III, IV e V, o posicionamento da autora a respeito do descaso nas citações de fontes nas reportagens de cunho informativo. Significativos depoimentos foram trazidos no corpo das reportagens sem referências pontuais de quem seriam essas fontes, subjugando-as a falta de credibilidade e, mesmo, comprometendo a veracidade dos argumentos desenvolvidos a partir do que essas fontes levantavam sobre a temática informada.

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“Eleições e Incertezas”) que coloca Lula como um candidato que não saberia sair da

crise simplesmente porque nem consegue percebê- la, um incapaz de administrar o

governo, incluindo os setores econômicos e financeiros deste.

Nessa mesma postura de construção de um candidato inapto à governança do

Brasil, Vera Magalhães em “Conversão dos duros e puros”, mostra um Lula em

processo de transformação, caminhando junto com o PT para um contexto incerto.

Entretanto, a autora afirma e caracteriza o candidato como inconsciente do poder do

investidor, reforçando a postura das outras matérias. Nesse sentido dos seis artigos

analisados, todos desenvolvem a postura contrária à governabilidade de Lula,

remetendo-o à incapacidade de governar o Brasil. E cinco das seis reportagens reforçam

o argumento dessa ineficiência governamental de Lula. Mas essas reportagens,

diferentemente dos artigos, utilizam-se do foro da objetividade para somar credibilidade

à sua posição, usando, portanto, o “padrão da inversão da opinião pela informação”

(ABRAMO, 2003, p.31).

Na edição do mês de outubro, a linha editorial da revista se mantém: Lula é

definido como candidato imprevisível no que se refere aos projetos de governabilidade.

Para a revista ele poderia significar um risco à não manipulação do momento “delicado”

que o Brasil estava passando, pois não daria prioridade à economia para correr em busca

das concretizações de suas promessas na área social, como afirma Mendonça de Barros

em “caso com o acaso”.

Uma outra construção de Lula é mostrá- lo como um novo sedutor, produto do

marketing político de Duda Mendonça, visto no artigo “A nova arbitragem e o sonho”,

da coluna de Reinaldo Azevedo “O avesso do avesso” e na coluna “O Estado das

coisas” de título “A miséria e a política” pelo autor João Carlos de Oliveira.

Reinaldo Azevedo também caracteriza Lula como um esquerdista pragmático e

menciona que esse adjetivo é parecido com um direitista de princípios, posição a que

Lula sempre se opôs, no artigo-ensaio “Mentalidades – a hora do surrealismo” do

caderno Bolsa de futuros – Rumo a 2003.

Ao se referir a adjetivos e juízos de valores sobre a candidatura Lula, houve três

reportagens colocando Lula como um candidato popular entre os eleitores, mas sem

nenhum dado comprovando, ou mesmo alguma pesquisa de opinião, bem como

encontrou-se em três reportagens o posicionamento da revista sobre a honestidade de

Lula, associando o candidato a uma pessoa não honesta. Verificou-se também uma

reportagem em que Lula era citado como capaz de administrar o governo. Essas

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posturas opinativas foram encontradas no gênero jornalístico informativo, que cumpre

determinações segundo Perseu Abramo (2002, p.41),

É fundamental separar e distinguir informação de opinião, indicar a diferença de conteúdo e forma dos gêneros jornalísticos, e apresentar toda a produção jornalística ao leitor/telespectador de forma que ele perceba imediatamente o que é exposição da realidade e o que é ajuizamento de valor.

Nas duas últimas reportagens, a primeira de Vera Magalhães “Texto de poeta,

muque de peão”, a autora deixa clara a postura da revista em colocar o candidato Lula,

às vésperas das eleições, como um produto construído pelo marqueteiro Duda e pelo

amigo do candidato Dirceu, que ficou com a parte das alianças do partido. E na outra “O

socialismo é só um pôster na parede”, os autores Reinaldo Azevedo e Vera Magalhães,

mostram Lula como convertido, que se fez um novo, um anti-Lula para ampliar seu

eleitorado.

Na análise quantitativa, verificou-se que, das seis reportagens, cinco

demarcaram a imagem do político Lula como controlada pelo marketing político, e

apenas dois artigos posicionaram-se a favor dessa afirmação.

Das 30 fontes utilizadas para a produção da reportagem, dez são políticos

partidários, sete são do PT e, dos especialistas, onze são economistas, ou seja, mais da

metade das referências utilizadas estão centradas em economistas e políticos partidários,

não abrindo espaço para o pluralismo de fontes que é responsável pelo enriquecimento

das reportagens e incluí- las com maior credibilidade jornalística.

Uma postura da Primeira Leitura de se manter opositora ao candidato Lula no

começo das análises toma outro rumo no desenrolar das edições e acontecimentos

políticos no contexto das eleições em 2002. O periódico, depois, a partir de setembro,

mostra Lula como um resultado da sinergia entre marketing político e alianças

partidárias, ou seja, um produto criado, e também frágil para o comando da nação

brasileira, pois não tem sustentáculo político.

Logo a revista Primeira Leitura manteve-se contra um eventual governo de Lula

e associou a figura do candidato a várias desqualificações, tais como: v Lula representa o risco para o sistema econômico implantado nos últimos anos

de democracia brasileira.

v Candidato que despreza a classe dos investidores externos, e que colocaria o

Brasil numa crise econômica e política.

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v Incapaz de administrar o governo.

v Candidato imprevisível no que se refere aos projetos de governabilidade. Porque

ele poderia significar um risco à não manipulação do momento “delicado” pelo

qual o Brasil está passando, pois não daria prioridade à economia para correr em

busca das concretizações de suas promessas na área social.

v Representa um candidato desonesto.

v Produto construído pelo marqueteiro Duda e pelo amigo do candidato, Dirceu,

que ficou com a parte das alianças do partido.

v Lula como convertido que se fez um novo, um anti-Lula para ampliar seu

eleitorado.

v Candidato que não apresenta sustentáculo político.

CartaCapital:

A revista CartaCapital construiu a imagem de Lula como um candidato

preparado, maduro, experiente, ao mesmo tempo que negociador, conciliador, capaz de

administrar o país se utilizando de bases mais justas para com as classes sociais

inferiores economicamente.

Nesse sentido, induziu o leitor da revista criando a imagem de Lula de acordo

com seu ponto de vista sobre política e economia brasileira. Desde as primeiras edições,

analisadas do mês de setembro, fica demonstrado o posicionamento de CartaCapital

alinhado com Lula na presidência.

A opção de CartaCapital pela parcialidade, em favorecer Lula, claramente,

comprometeu princípios jornalísticos, dentre eles o principal: a objetividade com o fato

real. Com isso, percebe-se o descaso com a presença de fontes para trazer opiniões aos

leitores: a própria CartaCapital opinou. E, em todos os textos estilo reportagem, 42%

do material analisado, foram utilizadas opinião em favorecimento do cand idato Lula.

A estratégia utilizada pela revista no apoio a Lula foi defendendo o candidato

das acusações de Serra e de outros meios de comunicação. E, para isso, ela cria as

reportagens dividindo o fato e mesmo o mundo das idéias, em duas vertentes

antagônicas. O mundo do Bem e o mundo do Mal. Lula representa a vítima, e portanto o

mocinho do bem dessa criação, e Serra o inimigo, o vilão. O desenvolvimento dessa

ação é visto nas reportagens: “E a máquina avança” (anexo CC - 01), “Vade-Retro”

(anexo CC – 03) e “Óleo da máquina” (anexo CC – 08).

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As acusações a Serra não trouxeram comprovações, marginalizando a

informação ao nível de descrédito, por não apresentarem valor real enquanto informação

verídica.

Na defesa de Lula, obteve-se uma reportagem que o defendia, afirmando que sua

imagem não foi controlada pelo marketing político, enquanto as outras sete não se

posicionaram sobre esse fator.

E para equiparar Lula a um candidato preparado e capaz de administrar o país, o

editor-chefe e proprietário de CartaCapital propõe a comparação entre Machado de

Assis e Lula, remetendo ao primeiro a questão de não ter formação escolar tradicional e

de Lula como seu seguidor. Também associa Lula ao defensor do nacionalismo e das

idéias de privilégio nacional em detrimento da linha econômica neoliberal adquirida no

Brasil na gestão Collor e, em maior fomentação, nos anos FHC.

Das oito reportagens, três defenderam a figura de Lula, mencionando que não se

importavam com o grau de escolaridade para afirmarem que o acham preparado

politicamente para assumir o posto de Presidente. Bem como houve quatro reportagens

dizendo que Lula é capaz de administrar o governo e ser um político honesto.

Do material opinativo, verificou-se que todas as onze unidades analisadas

apontam Lula como capaz de administrar a Presidência da República. E dessas onze

unidades, quatro associaram Lula a ser honesto.

No andamento dessa idéia de Lula defensor do país, frente à pressão

internacional, o repórter Sérgio Lírio opina na reportagem “Empresários Paz e amor”

(anexo CC – 05), “cristaliza-se em alguns setores a impressão de que Lula e o PT

reúnem as melhores condições de implantar um projeto nacional, cujos alicerces

estariam na redução da desigualdade social e no incentivo ao mercado consumidor

interno”.

Mino Carta também coloca Lula como representante do trabalho, ou seja,

símbolo do povo, como se vê no editorial “CartaCapital escolhe Lula”, (anexo CC –

04), “(...) pela primeira vez, um representante do trabalho”. Além de qualificá- lo como

grande negociador e administrador,

Ele representa a chance de mudar a política econômica que nos conduziu ao desastre. Tem autoridade para gerir tensões sociais crescentes. É negociador adequado nas cortes internacionais, onde goza de maior prestígio do que gostaria quem o ataca e o denigre.

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Na semana de 09 de outubro, a reportagem “Óleo na máquina” (anexo CC – 08),

recomenda o voto em Lula, e o qualifica como um aglutinador. Lula, que tem “(...)

claramente muito mais condições políticas de se tornar um aglutinador, de voltar a

exercitar o papel que viveu no passado, apesar da aura de extremista: o de um

negociador”, bem como o associa a hábil negociador por fundar o PT, a CUT, sem

deixar “cacos pelo caminho”. A mesma reportagem reporta um governo Lula “(...) que

se propõe a construir ‘um novo contrato social’”, no país.

Nesse sentido, identificou-se que, das oito reportagens analisadas, seis atrelaram

Lula a uma imagem popular, reforçando as pontuações averiguadas na análise

qualitativa. E do material opinativo, nove unidades de análises o colocaram como

popular.

A revista CartaCapital manteve-se favorável a um eventual governo de Lula e

associou a figura do candidato a várias qualificações, tais como: v Definiu a imagem de Lula como um candidato preparado, maduro, experiente,

ao mesmo tempo que negociador, conciliador, capaz de administrar o país,

utilizando-se de bases mais justas para com as classes sociais inferiores

economicamente.

v Lula como o candidato que precisa ser defendido do “mal” que o assola, sempre

é a vítima e mocinho da história.

v Associação de Lula com Machado de Assis, remetendo a este a questão de não

ter formação escolar tradicional e de Lula como seu seguidor.

v Compara Lula como o defensor do nacionalismo e das idéias de privilégio

nacional em detrimento da linha econômica neoliberal adquirida no Brasil na

gestão Collor e, em maior fomentação, nos anos FHC.

v Lula é capaz de administrar o governo.

v Lula é honesto.

v Lula e o PT reúnem as melhores condições de implantar um projeto nacional,

cujos alicerces estariam na redução da desigualdade social e no incentivo ao

mercado consumidor interno.

v Lula como representante do trabalho, ou seja, símbolo do povo e popular.

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Veja: No começo das edições de setembro, em específico nas três primeiras, a revista

Veja opta por se manter contra a candidatura Lula de maneira mais tímida, comparando

com as espetaculosas versões criadas, denegrindo sua imagem, no mês de outubro.

Veja utiliza, nas primeiras edições de setembro, o padrão de manipulação por

fragmentação (ABRAMO, 2003, p.28) em que trazia na proposta das temáticas

principais “o crescimento de Lula nas pesquisas”, mas ao invés de aprofundar neste

temas, como o prometido, em título, linha fina, propõe nas reportagens outro rumo, em

direção à reafirmação de Serra como o candidato ideal. E, ao falar de Lula nessas

reportagens descontextualiza-o da idéia primária, problematizando a estrutura da

“profundidade” prometida.

Para iniciar a crítica ao candidato Lula, compara-o a um candidato com

fragilidade política, e em argumento a essa opinião declara que ele está tendo

dificuldades em encontrar apoios firmes, sólidos, e faz isso sem sugerir fontes de

pesquisa ou depoimentos de cientistas políticos entre outros especialistas na área

política-aliança.

Depois aponta, opinando, que Lula tem falhas em sua formação, que não é um

político preparado e, portanto, não pode ser eleito presidente do país.

Duas reportagens e três artigos disseram que é ruim a formação escolar do

candidato Lula.

Um outro indicativo que colabora para o desgaste da imagem de Lula é Veja

associar a esposa de Lula, Marisa, a uma antiga dona-de-casa, de maneira

preconceituosa e diminutiva, comparando a “nova roupagem” dela com a do marido,

desenvolvendo nisso a figura de um Lula ambíguo e desonesto. Nesse sentido, foram

computadas cinco reportagens que atrelaram Lula a uma figura desonesta e sete

unidades de análise opinativa afirmando o mesmo.

Uma problemática que é marcante nas reportagens da revista é que muitas delas

não apresentam autoria demarcada, sugerindo o descaso com a informação transmitida.

O segundo descaso, não menos grave, são as utilizações de fontes “não existentes”,

enquanto fonte jornalística, tais como “um cacique do PT”, “muitos dirigentes”,

“coordenadores do comitê petista”, dentre outros, demarcando a descrença do material

transmitido, enquanto informações válidas.

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Já no final de setembro e começo de outubro, Veja saí da timidez e começa a

desenvolver os insultos sobre o candidato Lula. E, para isso, se utiliza de comparações

místicas, como a palavra “bruxo”, para definir as pessoas que acham que Lula pode

vencer as eleições logo no primeiro turno.

Nas primeiras semanas de outubro, Veja associa uma possível vitória de Lula no

segundo turno ao medo do mercado e à crise econômica vigente no país, externando

medo aos eleitores com as versões que cria.

Outros elementos opinativos e ricos de significados deturpadores da imagem de

Lula são as ilustrações e fotos trazidas por Veja, nas capas e no acompanhamento das

reportagens internas. As fotos e ilustrações criam um Lula autoritário, em associação a

Hitler, um candidato despreparado e que demonstra insegurança para governar o país,

na inclusão dele segurando a “ala radical do PT”, no centauro.

Transfere a Lula a definição de candidato despreparado que é comandado pelos

pensamentos do deputado José Dirceu, impressionando o leitor, com argumentos que

identificam Dirceu como autoritário e capaz de tudo para chegar ao poder, de quem

Lula seria a escada.

Na análise quantitativa, averiguou-se, no item sobre se Lula é capaz de

administrar o governo, que seis reportagens se posicionaram de maneira negativa à

mesma, colocando-o como inapto à governança, e cinco unidades de análise opinativa

afirmaram que Lula não é capaz de administrar o país.

Também coloca Lula como uma criação do marketing político desenvolvido

pelo publicitário Duda Mendonça. Seis reportagens afirmaram que Lula é controlado

pelo marketing político.

Nas edições de final de outubro, Lula é atrelado ao MST, à CUT, às Farcs e

principalmente à influência da “ala radical do PT” que chega a chamá-la de os “xiitas

brasileiros” prospectando, e amedrontando, que eles irão cobrar a fatia de poder num

eventual governo Lula.

Logo a revista Veja manteve-se contra um eventual governo de Lula e associou a

figura do candidato a várias desqualificações, tais como:

v Padrão de manipulação por fragmentação em que trazia na proposta das

temáticas principais “o crescimento de Lula nas pesquisas”, mas ao invés de

aprofundar esse tema, como o prometido, em título e linha fina, desenvolve nas

reportagens outro rumo, em direção à reafirmação de Serra como o candidato

ideal.

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v Composição do candidato como frágil em relação a alianças políticas.

v Aponta Lula como candidato que possui falhas em sua formação escolar.

v Político despreparado e não pode ser eleito presidente do país.

v Candidato ambíguo e o atrela a uma pessoa desonesta, principalmente, em razão

da sua “nova roupagem” estética.

v O candidato que amedronta o mercado.

v Associa o candidato como autoritário.

v Afirma que a voz ativa nas decisões do candidato é José Dirceu.

v Coloca o candidato como perturbador às manutenções governamentais vigentes

em razão da pressão que irá sofrer da “ala radical”.

Uma conexão interessante do velho espaço público burguês, de troca de informação

e “avanço” de práticas políticas socializadas, seja na figura do Estado Moderno, seja no

comportamento coletivo das várias faixas econômicas constituídas, com a imprensa

atual, é que se potencializando o poder da imprensa, o espaço público de outrora,

legitima os interesses privados nela presentes.

Ao passo em que há público consumidor das idéias entendidas e disseminadas pelas

revistas, há o incentivo do alargamento da esfera privada nelas constituído (no

enriquecimento de anúncios e na credibilidade que este agrega ao veículo na sociedade

moderna), surgindo assim a complementaridade entre imprensa e esfera privada.

Quando Victor Hugo menciona que a noite seria profunda sem a imprensa, hoje, a

influência da comunicação na mente da sociedade é muito mais profunda. Com sua

ausência, ocorreria fatalmente um apagão no trâmite comunicacional, em razão de ela

ser o motor que impulsiona os comportamentos, idéias, pensamentos e, mais, delimita

os desejos e os sonhos da humanidade, além de servir-se particularmente a almejos

políticos, ao ponto de indicar ou não um candidato ao cargo da Presidência aos leitores,

como vislumbrado na dissertação.

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