ANLISE DE DISCURSO
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PCHEUX
IDEOLOGIA - APRISIONAMENTO OU CAMPO PARADOXAL?)Quando se procura
pensar hoje em dia sobre a questo da Ideologia (sobre os processos,
as relaes de fora, a luta de c lasses na ideologia etc...), est
excluda a possibilidade que seja procurado apoio, pacificamente, em
qualquer "teoria marxista". Submeter-se ao marxismo s teria o
efeito de liquidar qualquer ligao com um possvel pensar
crtico-marxista. Portanto, o ponto de partida, com o qual todo
pensamento de tradio marxista hoje est confrontado, a necessidade
de no se fixar em uma possvel "deficincia terica", "priso no
passado", ou "desvios". proposta seria a de trabalhar com uma
questo histrica conneta, colocada por meio das formas de existncia
e de funo do "socialismo real", que se funda na teoria marxista e
que, a partir da, se torna um novo tipo de religio de Estado.
Afirmar ljue a "verdadeira" teoria marxista no tem nada a ver com
essa realidade uma fuga terica sem grande importncia. Eu me
proponho a reAetir a respeito da forma pela qual o "socialismo
existente" inscreve sua relao na histria do desenvolvimento do
capitalismo. 1. Em primeiro lugar, um fato histrico trivial mas
indispensvel: as revolues anti-capitalistas, que tiveram sua
origemConferncia pronunciada no encontro "Problemas das pesquisas
em ideologia" do projeto Ideologia-Teoria, ocorrido em fevereiro de
1982 (compare com a apresentao de Sven-Eric Liedman, em Das
Argument 133. As comunicaes esto em Re-thinking Ideology,
Argument-Sonderblatt 84, Berlin/W. 1983) Traduo para o alemo de
W.F. Haug, revista pelo autor.
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mais ou menos diretamente em Outubro de 1917, no se originaram
do ncleo do sistema capitalista, mas, sim, de algumas partes da
periferia desse sistema (em regies ricas, protetorados ou
coloniais, que estavam subordinadas ao processo geral do
desenvolvimento capitalista)". 2_ Essa diviso entre ncleo/periferia
remete a uma fenda bsica entre (a) um campo central, no qual o
capitalismo se desenvolveu "em sua prpria base", por meio da
expanso industrial da pequena produo independente, da explorao "de
baixo para cima" da crescente diviso do trabalho assalariado dos
meios de produo, e (b) campos perifricos, nos quais a forma de
produo capitalista (FPC) foi introduzida "de cima para baixo", na
medida em que os aparelhos de Estado pr-capitalistas (as
fortificaes feudo-absolutistas) foram introduzidos, para impor, por
meio de uma srie de presses "alm da economia", a incorporao e
extorso capitalista da maioria'.
no-codificado de tipo anglo-americano/direito regimental
codificado, por exemplo, de tipo europeu etc.) e nas formas
ideolgicas da submisso dos indivduos", corresponde a essa diviso
estrutural no interior da histria da FPC - entre um percurso de
desenvolvimento por meio da luta contra o absolutismo autoritrio e
um percurso de um desenvolvimento por meio da fuso com esse
absolutismo.
3- Uma sene de divises nas formas poltico-jurdicas (E sta d o
"m1l11mO d ernocrauco E sta d o "C" rorte com uma " sociedade
burguesa" (socit civile), direito processual jurdicoI " I /
2
3
Em "Dlimirations ..." (1982) eu fiz uma tentativa de traar a
diferena entre as figuras estratgicas da revoluo Francesa (a troca
para um mundo novo, deixar o sistema feudal) e aquelas das
perspectivas revoluciponrias no-realizadas dos socialistas do sc.
XIX (modificar o mundo capitalista, na medida que a revoluo
burguesa levada a termo) e aquelas das revolues
camponesas-proletrias do sc. XX (Construo de um outro mundo,
enclave no velho). Essa oposio de dois "percursos" de
desenvolvimento da FPC Foi apontada por Marx (MEW 25, capo 20:
"Histrico sobre o capital do negociame" e incorporada em forma
modificada por Lenin (Oposio entre o "percurso americano" e o
"percurso prussiano" , em : "O programa da democracia socialista na
primeira revoluo russa de 1905-1907", LW 13,213-4370. Essa oposio
foi objeto de debate imenso entre historiadores nos anos 50
(impresso em Sweezyentre Outros). B. Moore aborda a questo a partir
de outro recorre, ao trazer uma srie de anlises concretas para a
contradio do "percurso democrtico" e "revoluo a partir de cima" .
Compare tambm Robin/Grenon 1976. - A Frana ofereceu um exemplo de
duas oscilaes entre esses dois percursos: a controvrsia entre os
historiadores sobre o significado e "o que" (enjcu) da Revoluo
Francesa eles ainda atestam.
4. Essa diviso nas formas de submisso decisiva para meu incio:
ela se deixa apresentar esquematicamente por meio de uma srie de
oposies no que diz respeito s diferenas prticas na relao dos
sujeitos com seu corpo, sua lngua, seu pensamento. Por um lado
possvel observar uma relao entre as formas polticojurdicas tanto da
liberdade individual como das prticas escolares do "auto-governo" e
da discusso; uma grande multiplicidade de prticas religiosas, que
no so submissas a nenhum ritual unificador e que incorporam a
represso de pulses na forma invisvel da moral; um conceito
especfico de esclarecimento como expresso de experincias
individuais: a abrangncia cotidiana dos fatos da vida, da lngua e
do pensamento como construo de regras prticas, formas de
comportamento, que se adaptam aos acontecimentos. Por outro lado
observamos uma constante dependncia de administraes e burocracias,
respeito a ordens, hierarquias e barreiras, que funcionam
visivelmente como instncias de opresso. Observamos tambm o costume
obedincia e ao adestramento; invocao religiosa como comportamento
ritualizado (com as prticas de doutrinao, da censura e da
confisso); a preferncia pelo santificado e pela encenao ( com os
segredos e promessas como sua consequncia): e a tendncia de ver
tudo como um acontecimento do Estado, que tem relao com a gramtica
(como metafsica da compreenso do homem saudvel) e da retrica (como
arte da fala verdadeira).4 Para a relao desse ponto com a questo da
lingufstica, veja Gadet/Pcheux
1981.
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Essa sequncia de diferenas forma apenas um esquema muito
fragmentado; as especificaes concretas mais complexas, nas quais os
dois "percursos" se combinaram historicamente de forma diferenciada
no so possveis de serem observadas sob esse ngulo. Entretanto me
parece que esse esquema permite colocar em questo a pretenso de
teorizar genericamente sobre a "ideologia dominante da FPC",
considerando-a um mero efeito de superestrutura da base
capitalista, com abstrao dos "fatos nacionais" e de seus
dercrrninantes histricos pr-capitalistas.
5. Essa "teoria dos dois percursos" permite que a Segunda Guerra
Mundial (e seus resultados de Ialta) seja abordada de maneira
diferente do que uma mera perda de rumo em direo a uma "patologia"
das contradies intrnsecas ao capitalismo. O Nazismo no pode mais
ser explicado, portanto, como uma regresso a simbolizaes pr-lgicas,
como loucura mortal, ou como "Totalitarismo": poderia ser dito que
a Segunda Guerra Mundial forma um processo de concentrao da diviso
entre os dois percursos da FPC na figura de sua luta "de vida e
morte"?
fortalece, tanto interna como externamente, a maioria moral,
principalmente por meio do subterfgio do neoliberalismo econmico
anti-keynesiano Ia Reagan. Tambm ficam fortalecidos o autoritarismo
poltico do "Estado mnimo" de tipo anglo-saxo e o totalitarismo
sutil de uma ordem (dispositivo) panptica sem patres visveis. Essa
vitria mascara ainda a praticidade do andar conjunto dos dois
percursos na periferia capitalista (sobre prticas da herana do
perodo colonial at operaes militares do tipo do Vietnam ou operaes
como as do Chile), bem como a igualdade, a nvel mundial, do emprego
de tecnologias de opresso cada vez mais refinadas. Finalmente, e
acima de tudo, a vitria permite retirar uma vantagem mxima da
situao atual do "socialismo existente": a partir do fato de que os
movimentos revolucionrios anti-capital istas (at hoje) fracassaram
em atingir o capitalismo no seu centro. Isso tem por consequncia o
fato que o "socialismo existente" se constitui de uma srie histrica
de inverses/subverso polticas, mais ou menos violentas, na margem
perifrica do sistema, nos pontos fracos do percurso capitalista de
tipo "prussiano". O "socialismo existente" no independente de um
mundo simtrico do capitalismo, mas, sim, uma sequncia de
incrustaes, que surgiram uma aps a outra no interior de seu
desenvolvimento geralG
6. O malogro histrico do hitlerismo deslocou o "percurso
americano" permanentemente em direo a uma posio de liderana no
desenvolvimento capitalista. Essa vitria, sancionada por meio da
hegemonia do imperialismo estadunidense, forma, simultaneamente, h
40 anos, um recurso monstruoso para todo o ncleo da FPC. Essa
vitria contribui para mascarar a submisso moderna (a explorao -
opresso intrnseca da massa de trabalhadores" ocidentais excludos do
poder poltico). Alm disso, tambm contribui para mascarar a maneira
pela qual a tendncia para a "Germanizao" (Chomsky) desse ncleo5 Na
medida que o capital substitui o trabalhador especializado pelo
"Gastarbeiter" sem qualificao, no-organizado, recm-chegado, ele
modifica para seu benefcio - e por um perodo longo - o Estado geral
das relaes de classe" (Corar, 1979:14)
7. Essa situao de enclave assirntrica do "Segundo Mundo" com
pedaos rompidos do "Terceiro Mundo" refere-se ao fato de que o
"socialismo existente" no se formou a partir dos planos dos
marxistas eruditos. Ele se formou a partir de inverses/subverses de
aparelhos de Estado do caminho "prussiano",
6
A diferena no interior do "mundo socialista" entre os povos,
que, como a URSS, Ch ina ou Cuba, empreenderam a construo do novo
mundo com sua prpria fora; povos que, como o caso da Europa
oriental, receberam o socialismo importado por meios militares,
importante historicamente para diferenciao das caractersticas
desses pases. Mas essa importncia secundria considerando a posio
estrutural do enclave, da "incluso", do encravamento no mundo
capitalista.
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de seus dispositivos estratgicos e de suas prxis? ideolgicas e
discursivas, ou seja, se formou com tudo aquilo que contm a
contra-identificao simetrificante do adversrio vencido. Seno de
onde viria a tendncia do "socialismo existente" de produzir e
reproduzir Estados do tipo de "fortificao ocupada" ? Estados que
renegam suas contradies internas com uma lgica militar das
fronteiras, que funcionam em Estado de Emergncia, em nome do povo,
de partidos do Estado, que pretendem reorganizar todo o
comportamento da comunidade por meio de uma religio poltica do
Estado? A partir desse ponto de vista, a ideologia stalinista no um
desvio casual, como muitos lutadores revolucionrios na Europa dos
anos] 960-1975 quiseram crer, mas, sim, uma forma duradoura do
populisrno do Estado ("O Estado de rodo o povo"), cuja defesa, bem
como do campol bloco, que, em caso de dvida ocorre por meio da
interveno armada, como ltima forma do "Estado de Emergncia". A
prxis de declarar Estado de Emergncia tambm ideolgica, que se apoia
em ltima instncia no imperativo da sobrevivncia (fome e medo), com
o qual tudo se justifica. 8. A frase "no existe um caminho militar
para o socialismo'", oferece um bom exemplo para a funo da
ambiguidade no discurso poltico. Essa frase tem relao tanto com o
fato histrico, que - substancialmente e at hoje - existiram apenas
caminhos militares "para o socialismo" , e com o fato poltico que
esses7 Esse pargrafo foi marcado por lima relativa heterogeneidadc
das linhas polticas e ideolgicas do "socialismo existente" na poca
(China, Cuba, Victnarn ... em relao URSS). Essa hcterogeneidade
abriu um Campo para movimentos de tipo radical (para um "outro
socialismo"), na medida que ela mobilizou tanto para uma base
anriimpcrialisra como para uma base concretamente alternativa, em
relao forma de Estado sovitica. Por meio de sua grande
multiplicidade, esses movimentos correspondiarn a uma luta de
classes na ideologia sobre a questo da tendncia para um no-Estado
no socialismo. A rehomogeinizao sovitica do "mundo socialista" (alm
da tenso geopoltica China/URSS) varreu tudo isso desde ento.
Explicao do lder comunista italiano, Perro lngrao, por ocasio da
violncia na Polnia em 1981.
caminhos militares no levam ao socialismo. Sob esse ponto de
vista - e qualquer que seja a sada do Estado - fica a questo
levantada pelo movimento de massa polons, que coloca em todos os
nveis da sociedade o pedido por liberdades democrticas como sendo o
problema principal do socialismo "existente". Esse problema
inseparvel de sua questo histrica decisiva, que trata de um possvel
caminho a rupturas anticapitalistas no interior do ncleo
capitalista, que poderia ser acolhido com a sua lgica, sem se
deixar colher por elas (como parece ser o caso nas diversas -
atualmente em crise - democracias sociais europias e como j foi o
caso dos movimentos socialistas do sculo 19.). Sob essa
perspectiva, os frgeis processos de mudana iniciados na Frana desde
maio de 1981 formam uma experincia nica, cujo destino est atrelado
a sua capacidade de se associar s pretenses existentes na Europa e
no Terceiro Mundo de se soltar e libertar da lgica dos Blocos". Em
consequncia disso, o Ocidente ainda exerce um poder sobre o Norte
(como espao das tecnologias e das democracias parlamentaristas),
enquanto que o Oriente no interrompe o processo de aproximao com o
Sul ( considerando-as regies com recursos de matria prima e de
energia, que em Estado de Emergncia - alimentar e militar - so
administrados sob natureza poltica muito diferenciados).
9. A tentativa de analisar esses processos de modificao no nvel
das formas discursivas e ideolgicas, colocadas em cena, requer uma
verificao do grau de dificuldade de privar-se, na reflexo
(principalmente marxista), da parcialidade histrica das categorias,
padro de pensamento, etc... ,que est atrelada ao segundo caminho
"perifrico" sobre a problemtica perifrica da conquista, da inverso,
e da derrubada das diversas "fortifi9 Nessa lgica dos Blocos, a
Unio Sovitica ainda trabalha como garantia, certificado e condio da
"Passagem para o Socialismo". O Partido Comunista italiano rompeu
claramente com essa represso histrica, quando foi dito: "A
influncia do Outubro 1917 est terminada".
8
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caes". Assim que for o caso de se avanar para o ncleo (do
primeiro caminho), o ponto decisivo do carter mistificador de cada
problemtica de derrubada parece ser: o primeiro caminho no se
deixaria "derrubar" (no sentido da tentativa de derrubar a construo
de um aparelho, para transform-Io por motivos simetricamente
opostos), porque a funo ideologicamente caracterstica para o
caminho 1 no aquela de uma lgica de objetos estveis com fronteiras
fixas'o: ela no constri uma fortificao, mas sim, um campo paradoxal
de contraposio s formas explicitamente metafsicas do realismo do
caminho 2; o caminho 1 funciona mais sutilmente, como um campo
metafsico paradoxal. Ele tambm est preso em um processo de
esclarecimento de sentidos (empricos e pragmticos) "lgicos", que o
mesmo que uma nova metafsica da compreenso humana saudvel (vide
Pcheux 1975, principalmente cap.I, 2), mas tambm se ocupa, com a
desconstruo da metafsica, da ambiguidade de uma srie de Jogos
(Wirrgenstein) refinados e bem sucedidos. Nesse campo, a expresso"
luta de deslocamento ideolgica" 11 - contra as lgicas inseri tas na
forma estvel da fortificao - poderia descrever os tipos de choque
de deslocamentos, que no colocam em oposio classes, " interesses",
ou determinadas posies prvias, mas que tratem da reproduo/10 Seria
um esforo perdido colocar em movimento as formas poltico-ideolgicas
da fortificao - e que isso seja feito por meio de todas as
dialticas possveis-. chega-se figura clssica do cavalo de tria, que
razoavelmente eficiente no campo do Caminho 2. Entretanto, no campo
do Caminho I, ele se torna uma lastimvel Fortificaro sobre Rodas,
cujo manejo a mobilidade hbil ("como peixe na :\gua") das foras que
se encontram em seu elemento s pode arrematar timidamente (por meio
de astcia, exemplo, e segrdos de estado maior). - Esse pensamento
tambm coloca em questo: a representao metafsica das classes como
campos opostos; o domnio ideolgico-poltico das formas de partido; e
a Praxis responsabilidade/competncia de delegar por muito tempo (a
porta-vozes/ Intrpretes / Funcionrios das Massas). A expresso
refere-se ao par colocao/movimento, tal qual Gramsci o introduziu
na sua Moderna, embora trate-se de retrabalhar aquilo que na
expresso "Guerra de movimento" adere lgica dos objetos em
fronteiras fixas (a forma militar do ataque a um acampamento
entrincheirado).
transformao das relaes de classe. Trata-se, portanto, de uma
srie de choques, que questionam a definio e fronteira do "discurso
poltico", na medida em que elas se baseiam nos processos, atravs
dos quais o domnio / explorao (no campo da sexualidade, da vida
privada, do ambiente, da educao, etc. ..) capitalista se reproduz,
na medida em que ela se adapta, transforma, reorganiza. Pois
"reproduo" nunca significou "repetio do mesmo". As proposies de
Althusser sobre os Aparelhos Ideolgicos do Estado!", que procuram
dar continuidade a determinadas colocaes de Gramsci a respeito do
conceito de hegemonia e da proximidade invisvel do Estado no
cotidiano, formam uma ajuda valiosa nessa direo, se ela for
interpretada de tal forma que os processos de reproduo ideolgicos
tambm sejam abordados como local de resistncia mltipla. Um local no
qual surge o imprevisvel contnuo, porque cada ritual ideolgico
continuamente se depara com rejeies e atos falhos de todos os
tipos, que interrompem a perpetuao das reprodues. A singularidade
dessas lutas de deslocamento ideolgicas, que ocorrem nos mais
diversos movimentos populares, insiste na repreenso de objetos
(constantemente contraditrios e ambguos) paradoxais, que so,
simultaneamente, idnticos consigo mesmos e se comportam
antagonicamente consigo mesmos. como na histria dos dois prncipes
italianos, que haviam jurado perante Deus: "Eu quero o mesmo que
meu irmo" ("estou totalmente de acordo com ele"), e murmuraram para
o Lado:"Eu quero conquistar Turim". Esses objetos (sob o nome de
Povo, direito, trabalho, gnero, vida, cincia, natureza, paz,
liberdade ...) paradoxais funcionam12 Confira Althusscr, 1979.-
Certamente Alrhusser no props uma "Teoria da ideologia" impossvel,
como muitos lhe atriburam, em parte para extingui-Ia, em pane para
transform-Ia em um sistema cientfico fechado. Mas um dos resultados
incontornveis de seu trabalho reside no fato de que ele tocou o
narcisisrno poltico das Organisaes dos Movimentos Trabalhistas em
seu ponto mais sensvel: na crena metafsica em um objetivo/fim (da
luta de classes, da histria e da ideologia).
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em relaes de fora mveis, em mudanas confusas, que levam a
concordncias e oposies extremamente instveis':'. O termo "luta de
deslocamento ideolgica" pode ser chocante ou incompreensvel para os
representantes da metafsica marxista ortodoxa do realismo de
classe, que subordina uma identidade estvel (com fronteiras
definidas) s ideologias e principalmente s ideologias polticas. Mas
essa metafsica, que nunca arrisca nada, sempre significou um perigo
para os movimentos populares e de trabalhadores: o papel ideolgico
nunca explicado do "populisrno" foi tratado no mbito dessa
metafsica. Esse populismo condenou a esquerda europeia dos anos 30
impotncia, em vista da mudana das foras 14 polticoideolgicas
"livres", que acabou por recair nos movimentos dos trabalhadores.
Em contrapartida, o mesmo marxismo ortodoxo se mostra incapaz, hoje
em dia, de pensar, em seu prprio espao do "socialismo existente",
os efeitos de uma luta de classes, cujos atores lhe ficam
invisveis. Enquanto isso, se reproduzem as condies de um sistema de
explorao original sem "capitalistas", principalmente por meio da
diviso tcnico-social-poltica do trabalho, garantida por um
populismo de Estado 15, com efeitos retroativos imprevisveis.13 14
Um exemplo concreto da Anlise de Discurso desse tipo de
deslocamento de sentidos encontra-se em Pchcux, 1978. Essa
"Liberdade" de deixar a movimentao das massas, do povo agir por
conta prpria - isto , deixar todas as tentativas s comunidades,
cujos mecanismos paradoxais Faye analisou - no foi fomentada pela
eliminao histrica de determinadas correnres (p. ex: o anarqusmo) da
orientao estratgica da movimentao dos trabalhadores? Os ganhos
posteriores histricos do Anarquismo por meio da forma poltica do
populismo de estado pode ser bem observado no perodo de Vargas, no
Brasil. Nesse perodo a posio do pai (Provedor e educador) fica
relacionada ao maior benfeitor da nao e povo. (Aqui eu me apoio nos
trabalhos de M.E. Torres-Lima). O populismo de estado do tipo
stalinista ("Pai do Povo" , "Estado de todo o Povo" < etc.)
surge, nessa perspectiva, como resultado de uma transformao do
populisrno russo de base camponesa em decorrncia do fracasso da
tentativa de Lnin de construir uma aliana entre o proletariado
urbano com o carnpesinato. - Compare Gadet/Pcheux 1981 (Cap. I,
para. 9-15); trata-se dos confrontos ideolgicos a respeito da
questo da Lngua e da poltica na lngua, que acompanharam essa
transformao.
- Finalmente, esta metafsica marxista, que continua considerando
a classe trabalhadora um objeto, cega para sua decomposio social,
que a afeta principalmente nos pases ocidentais, por meio de um
processo combinado de fragilizao do indivduo (experincia de perder
as razes, da solido, do vazio interior) e do Estado cuidando de seu
bem-estar". Sob esse ponto de vista, a crise interna do capitalismo
tambm estabelece um jogo (cruel) sobre o tema liberdade: as novas
estratgias do FPC "libertam" os indivduos de suas necessidades de
vida, de suas defesas e certezas, que foram trazidas de geraes
inteiras. Isso ocorre, na medida que sua existncia fica reduzida a
suas bases bio-psicolgicas momentneas, sem uma memria histrica.
Como resultado, cruzam-se, de maneira contraditria, uma tendncia
neolibertria para o No-Estado e uma tendncia neoconservativa para a
"dominao das iluses polticas" em direo a uma "verdade" biolgica
cnica da histria. Nesse sentido, poderia ser dito, que o complexo
isolamento-fragilizaoproteo-Estado da emergncia-terror forma hoje o
ponto de contato invisvel entre os "dois caminhos" do FPC, o ponto
nodal de sua unidade dividida. Esse ponto nodal baseado nos novos
populismos de nossa poca, que balanam de um lado para o outro,
formando um movimento pendular entre, por um lado, um amor
interessado pelo Estado (que no , de forma alguma, o mesmo que a
preocupao pelos assuntos pblicos) e, por outro, o dio fbico pelo
Estado. Este movimento no tem lugar nas categorias marxistas
ortodoxas, talvez por estarem imbudos demais desse movimento
pendular'".16 Esse cuidado divide a classe trabalhadora em uma
parte protegida, qualificada, integrada e em uma parte daqueles que
so explorados, desempregados e que so tratados como trabalhadores
em movimento, em trnsito, sem qualificao. Essa oscilao poderia ser
a forma atravs da qual a atual relao tensa e ambgua com o estado se
tornasse mais densa, que seria o que os movimentos populares e dos
trabalhadores sempre (no passado, presente, futuro) pediram do
Estado. As expresses "Rcforrnisrno', "Anarquisrno" colocam, nesse
sentido, regulamentos enganadores: eles colocam uma Natureza
verdadeira ("revolucionria"?) e objetivam descrever o par gmeo dos
"desvios" dessa Natureza. Mas poderia ser alguma
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1 O. Em oposio a essa verdade histrica multiforme e teoricamente
no-transparente, vale a pena refletir sobre esses processos
ideologicamente heterogneos, contraditrios, assimtricos e
deslocadores, considerando-os relacionados a transformaes prticas,
que aparecem perante os nossos olhos nas formas scio-histricas da
subjetividade, nos mtodos organizacionais das lutas, na percepo dos
acontecimentos e nos registros da discursividade. Essas reflexes
precisam ter coragem de assumir riscos no que diz respeito
metafsica. H necessidade de discutir a mudana pela forma como - de
Nietzsche at Freud, de Wittgenstein at Foucault - as estruturas
ideolgicas da racionalidade comearam. Deve-se questionar essa
fragilidade do pensamento, que no vem "de cima", na conscincia das"
elites intelectuais" , que acredita se dirigir ao privilgio das
proposies (conceituais, claras e distintas), mas sim, "de baixo" de
atos incontveis, contraditrios, que encontram sua via (voie) e sua
voz (voix) nos campos intermedirios ... Uma roda de diferentes
matrias brutas ideolgicas do cotidiano, que podem trazer tona
diferentes acontecimentos, movimentos e intervenes de massa, mas
que sempre fazem fronteiras provisrias, sem garantias, e sem
demarcaes a priori. Isso tambm pressupe que se dialogue com a
Verdade, que todo o mundo denomina "lngua", e com o que descrito
por alguns (principalmente a respeito da reconstruo lacaniana da
psicanlise) como a Ordem do Significante, o registro do simblico,
que aponta para a perpetuao do inconsciente, no significado
freudiano da palavra. Verificar como eles atravessam paradoxalmente
a nossa histria, sem nenhum "futuro brilhante" no horizonte.
Aceitar todas essas questes como srias, e no como folclricas ou
como "anexos da literatura", significa no tratar a lngua como um
mero Meio, que permite descrever esses processos (um espelhamento
desses processos), mas sim, como um campo de foras constitutivo
desses processos, por meio dos "jogos de linguagem", do trilhar
metafrico dos sentidos e dos paradoxos de enunciao, que as
discursividades trabalham na e contra os "corpos "d e regras d e ca
d a I' ll1gua. As ordens do discurso (dispositivos) polticas
estavam marcadas pelos campos feudo-absolutistas por meio de
fronteiras da linguagem visveis no campo da diferena material entre
as lnguas e da separao do cdigo, que os sujeitos distriburam a
partir da ordenao de lugares pr-estabelecidos. Os campos
discursivos do capitalismo desenvolvido, por outro lado,
principalmente aqueles que se desdobraram no mbito de seu ncleo,
"des-locaram" o discurso poltico: trabalha-se aqui sem fronteiras
pr-estabelecidas, uma vez que esse trabalho diz respeito s
fronteiras da prpria lngua, do significado dos enunciados, e da
posio do sujeito, que se deixam inscrever aqui: esses campos "onde
o mesmo est inscrito no outro" removem ininterruptamente os pontos
discursivos de submisso/assujeitamento ideolgicos e os locais, a
partir dos quais possvel enunciar oposio, sem que a lgica dessa
remoo jamais pudesse ser descrita em um sistema fechado ... No
existe um "Jogo de todos os jogos". Traduo: Carmen Zink
coisa completamente diferente. Por exemplo para formar o jogo
contraditrio das duas nicas tendncias histricas estveis que do
substncia aos movimentos dos trabalhadores e populares: as revolues
so acontecimentos, no substncias.
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