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ResumoEste texto oferece uma apreciao crtica da literatura de
Estudos Policiais e propostas para romper com a chamada dinmica
do reincio, em que as questes referentes segurana pblica
encontram-se sempre por serem resolvidas, sem que
haja uma estratgia consistente para fundamentar e desenvolver a
rea. Para tanto, os autores descrevem os problemas
oriundos da falta de uma governana de polcia efetiva e sugerem o
uso das quatro instncias de controle da governana
policial propostas pelo jurista constitucional britnico
Lustgarten, como um caminho para que o governo no seja seduzido
falaciosamente pela governana policial e nem se perca na ausncia
de estratgias de conhecimento e controle sobre as
metas e modos de ao da polcia.
Palavras-ChavePolcia. Governana. Accountability. Segurana
pblica.
Da governana de polcia governana policial: controlar para saber;
saber para governar1
Revista Brasileira de Segurana Pblica | Ano 3 Edio 5 Ago/Set
2009
Domcio Proena Jnior Domcio Proena Jnior professor da Coppe/UFRJ
e coordenador do Grupo de Estudos Estratgicos.
[email protected]
Jacqueline Muniz Jacqueline Muniz professora do Mestrado em
Direito, da Universidade Cndido Mendes (RJ) e membro do Grupo de
Estudos
Estratgicos. [email protected]
Paula Poncioni Paula Poncioni professora da Escola de Servio
Social da UFRJ. [email protected]
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O problema a governana. Segurana s sintoma. Eis um incio que
suma-riza o que esse apresenta a seguir. Corresponde ao matrimnio
do que era sabido antes que o texto comeasse com o que se tem ao
final do processo de sua elaborao.
O que era conhecido: as diversas ques-tes diante da segurana
pblica, para reconhecer o termo constitucional brasileiro, no
representam impossibilidades do ponto de vista de um conhecimento
policial, ou de polticas pblicas. Quem estuda profissionalmente o
tema identifica um amplo acervo de conhecimentos, saberes,
ex-perincias; apreende o tanto que se pode fazer para controlar a
criminalidade, a desordem, e tudo o mais que se queira colocar na
conta da ampla rubrica da segurana pblica. E, ao faz-lo, compreende
como decomp-la analiticamente, reconhecendo que, com tudo o que a
segurana pblica pode conter, e contm, o centro da possibilidade de
seu encami-nhamento reside na ao da polcia: as disponibili-dades, a
orientao e os controles do que a polcia devia e podia fazer para
esta ou aquela finalidade, desta ou daquela forma; as expectativas
multis-setoriais de integrao no campo da segurana pblica,
qualificando os termos dos relacionamentos interagncia, desde e em
torno das agncias policiais. (...)
Convida-se leitura deste texto compar-tilhando, solidariamente,
algo da circuns-
tncia em que ele se apresenta. Reconhece-se a multiplicidade de
registros e interesses que convergem e se embaraam, configurando um
ambiente peculiar, imobilista, ao redor dos temas da segurana
pblica. Que, mais importante, deixa fora de seu lugar central a
polcia. Isso no acontece por acaso, mas de-pende da participao dos
diversos envolvi-dos: para alguns, convenincia; para outros,
conivncia; ainda para outros, inocncia, ou pacincia, ou
incompetncia. Diante de eventos, ou da irrupo de alguma percepo que
cumula eventos que passaram desper-cebidos at seu conjunto faz-los
ululantes ou politicamente (in)oportunos, reencenam-se
posicionamentos, posturas e pronuncia-mentos que j se fizeram
diversas vezes antes. Muito em momentos de maior desalento ou
decepo, pode se expressar em um ceticismo profundo, que se espera
passageiro, e dizer que tudo se passa como se fosse a primeira vez;
como se tudo o que foi pensado, discutido, fei-to, avaliado,
prognosticado no tivesse tido lu-gar, ou, pior, diante de tantas
tragdias, como se nada tivesse significado ou importncia, que no
fosse digno de lembrana.
Esta imposio de uma amnsia recorren-te produz uma forma de
imobilismo, sentido apesar do frenesi, da espetacularidade, da
es-tridncia, da retrica vazia de pronunciamen-tos, promessas,
gestos. Sua reprise episdica
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depende de que se possa faz-los desconsideran-do as respostas e
perguntas que j se produziram anteriormente. V-se mesmo a recusa,
ou o es-quecimento, de rumos que poderiam produzir solues,
exatamente porque poderiam produzir solues. este imobilismo que
sugere como caminhos a timidez que reluta em propor, ou o ceticismo
que no acredita em tentativas. A dis-cusso profissional de polcia,
o estudo cientfico, a perspectiva mais cidad da governana pblica,
que dependem de que o debate avance para vi-cejar, ficam
(es)premidas diante do imobilismo que a reprise produz. Mas esta
situao depende da renovao da sombra do esquecimento cada vez que a
discusso comece de novo. frgil luz que a desnude como a maior parte
do problema, que a decifre para que ela no devore.
Explicar como a governana de polcia se distingue da governana
policial. Desdobrar o que sejam uma e outra, como se relacionam.
Apreciar o cerne do profissionalismo policial, e como ele se insere
na governana democrtica. Articular como e o que seria indispensvel
para poder governar a polcia. Apontar como estes conhecimentos
empoderam o governo para que atenda s expectativas das garantias e
prerroga-tivas da vida social democrtica. Sugerir rumos para o
aperfeioamento da governana pblica. Estes contedos revelam como
este texto uma contribuio que nasce do que se pode fazer a partir
do estudo, do conhecimento cientfico. Este domiclio de origem fica
ainda mais expl-cito quanto se considera o subttulo: controlar para
saber; saber para governar, ecos da Scientia est Potentia, saber
poder, de Bacon.
Este texto relata, sucintamente, o resultado de uma apreciao
crtica da literatura de Es-
tudos Policiais, compartilhando determinados resultados que,
ainda que possam ser propositi-vos em si mesmos, com a certeza
qualificada que o estudo cientfico permite, remetem tanto s
perguntas quanto s respostas que puderam ser dadas nesta ocasio em
particular. So nas per-guntas realmente relevantes que se tm o rumo
do questionamento e, por sua vez, o horizonte do avano do saber.
Apresenta-se, assim, como uma salincia que resulta de estudo,
afrontan-do a timidez polida diante do imobilismo que aceita que
tudo seja sempre (re)admissvel to somente porque algum o afirma ou
deseja afirmar e contestando o ceticismo amargo por-que tem rumos a
propor com embasamento e justificativas, abertas crtica, para
refut-lo. Este rumo assumidamente imodesto porque expressa a
convico de que se pode saber mais do que se sabe antes, que se
aprende algo quan-do se considera o saber de outros, e que se sabe
melhor quando se lana mo do conhecimento e do mtodo cientfico.
oportuno lembrar ao menos dois limites que pertencem a qualquer
empreendimento intelectual que dependa do pensamento cr-tico, da
racionalidade diante da empiria, que aspire a dialogar com o acervo
de conhecimen-to cientfico. O primeiro que todo conheci-mento
cientfico , num sentido muito direto e sensvel, datado. Avanar a
qualidade consti-tutiva ou aplicada do conhecimento cientfico
depende do apoio que se pode encontrar, em termos amplos, a partir
de um determinado acervo de fontes. Sem fontes no se tem nem
comparabilidade de experincias, nem contras-te de entendimento do
que o conhecimento e, tambm, o conhecimento cientfico depen-dem.
Isto depende de temporalidades prprias.
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S se pode avanar depois que se teve o tempo para qualificar o
olhar que considera as fontes (e parece desnecessrio arguir em mais
detalhe pelo valor e pela temporalidade da educao). Custa tempo
considerar o que as fontes que podem ser encontradas, s quais se
tem acesso, tm a dizer. Existe ainda o tempo para amadu-recer o que
se venha a encontrar nas fontes e o que sejam as formas de uso e
expresso destes achados. A maioria das fontes disponveis re-sulta
deste mesmo processo.
Nem a busca, nem o uso, nem o que se possa produzir com o
conhecimento cientfico atende s expectativas de tempo real da mdia,
ou do governante, e muito menos da urgncia que to presente diante
do agir policial na maior parte das vezes (...). O segundo limite
que qualquer expresso do conhecimento cien-tfico se sabe, num
sentido muito essencial, imperene e qualificado quanto ao seu
alcance. Mais ainda, reconhece-se como potencialmen-te cambiante.
Assume-se como parte de um processo, sem ignorar que se pode, sim,
ofertar produtos. Qualquer conhecimento cientfico digno deste nome
se apresenta como um est-gio numa obra mais ampla. (...) Trata-se
muito simplesmente de se saber aberto ao questio-namento
substantivo e refutao emprica: pronto a se corrigir diante da
demonstrao de que seus dados so falsos ou incompletos; que sua
lgica tem falhas; que sua apreciao dos resultados da segunda sobre
os primeiros foi incompleta. (...)
Uma parte considervel do que se pensa-va, receava ou ambicionava
quando diversas das fontes consultadas foram escritas foi
pro-fundamente afetado pelos desdobramentos do
11 de Setembro. Seis ou sete anos no foram suficientes, em
termos de fontes e rigor, para que se tenham articulado estudos do
que isto pode, poderia, ou poder trazer. Os prazos de publicao que
permitem o acesso trazem ain-da outro tipo de temporalidade: a
passagem de manuscritos para livro, ou a aceitao de um artigo num
peridico, pode demorar muitos meses, alguns anos. O papel do Estado
nos arranjos de segurana, de segurana pblica e de polcias estatais
ficou inescapavelmente re-descoberto, se este mesmo o termo que
cabe usar, diante do terrorismo. Quem pode ousar seguir afirmando
que bombeiros, ou a polcia, devam ser uma agncia privada pautada
pelo lucro depois do que se viu nas Torres Gme-as? Que empresa
teria a temeridade poltica e moral para determinar ou proibir mais
uma subida, resgatando pessoas mesmo diante do desabamento
iminente? Que empresa mante-ria sua viabilidade financeira ou
aceitaria con-tinuar com seu contrato de servios, tendo que arcar
com os custos de centenas de policiais e bombeiros que, em um nico
dia, morreram tentando at o ltimo minuto resgatar mais algumas
vidas?
Tem-se, ainda, outra temporalidade que se confunde com as
anteriores: refere-se ao sig-nificado da crise financeira de 2008
para toda uma produo marcada por debates, projetos, agendas e
estudos que entendia o mundo pri-vado como capaz de plena
autossuficincia, e o mundo do Estado como um fssil arcaico e
dis-funcional de outras eras, que explicava a falncia e
incompetncia do Estado na administrao pblica (inclusive o
policiamento pblico) e vislumbrava e defendia o florescer da
plenitude dos arranjos que se intimava intrinsecamente
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superiores de redes e de mercados (inclusive de segurana). Tudo
isso sugere que alguns dos da-dos com que se partiu, que algumas
das lgicas utilizadas, que alguns resultados alcanados te-nham que
ser reconsiderados. (...)
O texto encontra-se dividido em estaes, por assim dizer, que
pontuam um determinado trajeto, partindo de uma viso mais ampla do
que seja governana, para progredir em direo ao que pode, ou deva,
ser uma governana de polcia e, diante desta, o que se pode
qualifi-car como a governana policial. Estas estaes constroem a
identificao dos efeitos que uma causa um fim desejado, como
governar a po-lcia determinam.
I
A ideia de governana no nova; existe em diversos idiomas pelo
menos desde a Renascen-a. O termo surge com maior proeminncia no
debate poltico e, como decorrncia, na pro-duo acadmica,
particularmente das cincias sociais, h aproximadamente uma dcada,
na Europa e em pases como EUA e Canad. possvel associ-lo s intensas
mudanas perce-bidas no papel e no modo de atuao do Esta-do
(especialmente, nas sociedades democrticas ocidentais), para
regulao da economia e da so-ciedade. Mais ainda, governana ganhou o
valor de uma divisa, de um smbolo, de uma determi-nada agenda
poltica, sendo objeto de diversas formas relativamente livres de
uso. (...)
Assim, tm-se tantas definies de gover-nana em circulao quanto as
prticas que es-tas mesmas definies visam dar conta. Pode-se dizer
que as diversas noes de governana
correspondem s descries dos eventos, situa-es ou interaes que
objetivam circunscre-ver. Como resultado, as noes de governan-a
compartilham uma frouxido, uma ampla latitude e adaptabilidade, que
autorizariam seu ajuste a toda sorte de prticas em que se reconhece
alguma dinmica de comando, con-duo, orientao ou direcionamento de
aes com objetivos ou de interesses coletivos. Go-vernana
apresentar-se-ia como pura instru-mentalidade, como aquilo que est
acontecen-do, o que seria de fato o abandono de qualquer ambio mais
conceitual e o retorno ao seu uso como no idioma, por exemplo, no
ingls. Trata-se, assim, de uma categoria que convida a adjetivaes
ou qualificativos que possam dar conta de um campo constitudo ou
pensado por experincias to singulares e especficas que sua
caracterizao requereria trazer para a definio traos ou aspectos do
sensvel, como velha ou nova governana, por exemplo.
O exame da literatura revela, primeiramente, que o termo
governana usado em diferentes campos: econmico, poltico, cultural,
isto , onde quer que se reconheam esferas de tomada de deciso e
articulao de interesses. So atri-budos a esse conceito mltiplos
significados e sentidos de acordo com os diferentes cenrios ou
unidades de anlise em foco: Estado, mercado, corporaes,
comunidades. Evidencia-se, ainda, que a discusso terica associa
governana a uma extensa multiplicidade de fenmenos e modali-dades
de ao situadas, usualmente, no espectro delineado por dois polos
opostos: o do mercado e o da hierarquia da burocracia estatal.
De modo geral, o termo governana vin-cula-se ao reconhecimento
de instncias de
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produo de governo por diferentes atores o Estado e suas
instituies, as organizaes pri-vadas, com e sem fins lucrativos, a
sociedade civil (atores coletivos e individuais) e em diversos
nveis de aplicaes: dentro e fora do Estado, transnacional,
internacional, nacional e localmente. (...)
Muitos trabalhos compartilham a preo-cupao diante do
relacionamento entre in-terveno estatal e autonomia da sociedade,
enfatizando, porm, diferentes facetas deste continuum
correspondendo s dimenses en-focadas. Por exemplo, a tentativa de
que ter-se-iam alternativas de governana, quase modula-res, em
termos de nveis de politics (poltica), polity (comunidade poltica)
e policy (polticas, usualmente pblicas, no sentido de diretrizes),
cuja composio matricial produziria uma ampla palheta de
possibilidades, de ambio exaustiva, para o enquadramento das
prticas da governana, no caso, da Unio Europeia (TREIB, BHR;
FALKNER, 2005).
Uma questo que emerge com destaque no debate est relacionada
capacidade, aos meios e ao desempenho do Estado contemporneo.
Questiona-se se ele capaz de formular e con-duzir com efetividade
metas balizadas por inte-resses coletivos, por meio das, e
sobretudo nas, polticas de regulao econmica e social.
Vrias crticas so feitas quanto ao entendi-mento do que vem a ser
uma incapacidade do Estado de cumprir seus compromissos,
des-tacando-se aquelas referentes a uma burocra-tizao excessiva dos
programas e centraliza-o demasiada dos processos decisrios. Estes
seriam os elementos principais que impedem
formas efetivamente democrticas de contro-le e participao nas
decises, produzindo ineficincia da gesto pblica de recursos e
gastos, o que leva ao progressivo aumento de interesses
corporativos na administrao esta-tal, de tal maneira a comprometer
o princpio do pluralismo. Somadas crescente interna-cionalizao da
economia, estas romperiam a cadeia do modelo tradicional de
governana centrada no Estado.
Certamente, a interveno do Estado vem sofrendo diversas mudanas
no provimento do bem-estar econmico e social, como tambm na
soberania e em quase todos os princpios que foram intrnsecos ao
estatal, ao longo da histria. Tem sido objeto de tentativas de
transformao de grande amplitude e inten-sidade nas ltimas trs
dcadas. O exerccio de governo assentado sobre um determinado
territrio desafiado pela enunciao de dis-positivos governamentais
translocais enti-dades associativas, tratados, marcos regulat-rios,
parlamentos, polcias transnacionais, etc. que indicariam tendncias
de uma perda de centralidade do Estado no mbito domstico ou
internacional. Acordos de livre comrcio e circulao de pessoas, a
Zona do Euro, apre-sentar-se-iam como evidncias de um Estado que,
deslocado do centro, livre do fardo da soberania, poderia melhor
explorar suas vo-caes liberais e empreendedoras, passando a ser um
ator desinteressado do jogo de poder. Emergiria como mero
regulador, ou indutor, ou articulador, ou certificador das regras
desses jogos, envolvendo-se em relacionamentos di-ferenciados com
os diversos atores, em tantas e distintas instncias de governana
quantas aconteam numa dinmica de redes.
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Nesta literatura, enfatiza-se o declnio da primazia do Estado
como a unidade central de anlise, reflexo de uma desejada perda de
seu protagonismo decisrio da iniciativa eco-nmica, social e poltica
da vida nacional e in-ternacional. Ressalta-se, assim, a emergncia
de mltiplos modelos alternativos de gesto de atividades estatais em
diferentes setores da vida econmica, social e poltica. D-se um
realce especial ao enfraquecimento da autori-dade estatal diante
das foras do mercado, das organizaes internacionais e dos atores
trans-nacionais (ONGs, redes, comunidades) em questes polticas e
econmicas, em mbito tanto nacional quanto internacional. Assim, um
grande nmero de trabalhos identifica ou busca antecipar a emergncia
de um novo esti-lo de governana: em que novas foras sociais e
mentalidades, particularmente a chamada administrao dos riscos,
consubstanciariam diversas experincias, parcerias e modalidades de
ao no setor pblico. (...)
Apesar da inexistncia de um corpo terico coerente sobre o que ,
devesse ou pudesse ser, governana, pode-se afirmar que h um
rela-tivo consenso de que tal coisa estaria referida a algo mais
amplo que o governo, norteado pela imagem de uma gesto orientada
por princ-pios como transparncia, equidade, responsa-bilizao,
legalidade e o que quer que a agenda poltica do momento venha a
acrescentar.
Num plano ideal, governana caracterizar-se-ia pela articulao de
interesses e tomada de deciso entre os mltiplos atores que atuam em
cooperao, motivados pela expectativa de que essas aes conjuntas
resultem na so-luo mais eficaz para os problemas em foco.
Este modelo de gesto se distingue de outros, pois as
parcerias/associaes de cooperao so construdas horizontalmente e os
diferentes objetivos e critrios de deciso so acordados pela
negociao, pelo dilogo e pela confian-a, o que, supostamente, afiana
o equilbrio/simetria/equivalncia na participao dos pro-cessos
decisrios de todos os envolvidos. principalmente pela via da
negociao que se logra obter o consentimento necessrio para
implementar as decises tomadas sobre os problemas a serem
enfrentados. A premissa a de que a governana, fundada sobre a
par-ticipao (que implicitamente se presume ter lugar numa
realidade) democrtica, capaz de estimular a adeso e, com isso,
criar o consen-timento necessrio implementao das deci-ses que,
legitimadas no jogo (idem) democr-tico, tornar-se-iam estveis.
Desse modo, em-bora haja diferentes interesses e racionalidades de
ao, os distintos atores que participam da governana assim definida,
em funo das ex-pectativas de um resultado comum e premidos pela
cooperao que advm da complexidade do problema em questo,
estabelecem uma nova forma de estruturao, organizao e de-ciso em
questes polticas e econmicas na-cionais e internacionais
Assim, parece possvel afirmar que a atra-tividade da governana
reside na expectativa de que esta venha a oferecer respostas
concei-tuais e modos de ao para o desempenho das mltiplas tarefas
envolvidas no provimento do bem pblico.
Diante das expectativas de transformaes no papel e no modo de
atuao do Estado con-temporneo, de reconfigurao em um Estado
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regulador, fundamenta-se um arranjo, alterna-tivo ou
complementar, que privilegia a coope-rao em vez da hierarquia , as
instituies privadas e as formas descentralizadas de gesto. Isto tem
produzido efeitos profundos na ma-neira de se conceber o que seriam
o controle social e, por sua vez, os processos de preveno da
violncia e reduo da criminalidade, espe-cialmente nos pases de
democracia avanada.
Neste contexto, observam-se algumas ten-dncias no que diz
respeito reestruturao da prestao de servios de policiamento, com a
presena de atores pblicos e privados, associa-dos ou no, em
especial nas atividades relacio-nadas com a manuteno da ordem e da
segu-rana pblicas. Para Bayley e Shearing (2006), uma tendncia
contempornea importante nes-ta reestruturao refere-se alterao da
lgica de gesto presente nos assuntos relacionados aos
policiamentos, com claro predomnio da instn-cia privada em
detrimento da pblica. Em pases como EUA, Gr-Bretanha e Canad, esta
lgica tem acarretado intensas mudanas nos servios que provm a
segurana do pblico, rumando para uma public safety, mais ampla do
que a public security, porque considera riscos que no apenas
remetem a aes humanas, mas tambm incluem o ambiente e os acidentes.
Uma public safety mais abrangente, mais eficiente porque mais capaz
de atender s demandas do pblico a mais baixo custo.
Todavia, nas ltimas trs dcadas, na maior parte dos pases das
democracias ocidentais, assistiu-se ao aumento do crime violento,
bem como da sensao de medo e insegurana (ob-jetiva e subjetiva). As
instituies tradicionais de controle do crime (em especial a polcia)
te-
riam se mostrado ineficazes, ou de toda forma insatisfatrias,
para o enfrentamento da ques-to. Nesses pases, tem-se o
reconhecimento de que o crime extenso e complexo demais para ser
tratado apenas pela polcia estatal. Isto tem justificado a
proliferao de agncias privadas de policiamento e, ainda, a busca de
um papel que seria mais apropriado para a polcia estatal na reduo
da violncia e controle do crime.
Em parte por conta disso, assiste-se a um in-tenso debate sobre
polticas na rea de segurana, no qual a polcia torna-se cada vez
mais visvel, discutida e politizada em resposta s tenses e presses
para o provimento de servios de poli-ciamento. Sugerem-se mltiplas
iniciativas para a reforma da organizao policial, de maneira a
torn-la mais eficiente, eficaz, efetiva e respon-svel no desempenho
das aes para o controle do crime. Concomitantemente, ampliam-se a
quantidade e a autoridade de agncias privadas e comunitrias para
preveno do crime, dimi-nuio da criminalidade, captura dos fora da
lei, investigao dos ilcitos e resoluo de conflitos (BAYLEY;
SHEARING, 2006: 586).
Nesta perspectiva, como indicam Bayley e Shearing (2006, p.
592), o policiamento teria se tornado cada vez mais plural, cada
vez mais compartilhado entre agncias pblicas e priva-das
(comerciais ou comunitrias). Tal plurali-zao seria a evidncia do
enfraquecimento do monoplio estatal sobre o policiamento pbli-co e
indicativo de sua superao. Estas trans-formaes, e em especial as
mudanas efetua-das nas polticas dirigidas especificamente ao
controle do crime, tm ocasionado impactos significativos na
organizao, na filosofia, nos princpios, mtodos e estilos de
policiamen-
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to. Porm, mais do que isso, elas tm trazido importantes
consequncias para o acesso se-gurana como um bem pblico, em
diferentes esferas tais como equidade, direitos humanos e
accountability, sem os quais se podem produ-zir efeitos nocivos
prpria democracia.
Neste cenrio, visto como incerto, as frontei-ras entre os
setores pblico e privado ganham no-vos contornos. A compreenso
sobre governana, em particular sobre o que seria ou deveria ser a
governana da polcia pblica estatal, demanda um entendimento cada
vez mais consistente, ca-paz de dar conta dos processos polticos e
sociais, sendo que seus atores, responsveis pela emer-gncia de
questes e desafios, devem atentar para as condies em que so
formuladas e implemen-tadas as agendas e iniciativas para e no
setor.
Quando se associa esta ambio e alcances crescentes, de
complexidade cada vez mais de-safiante, com a fragilidade da
estrutura do en-tendimento do que seja a governana, chega-se a um
impasse. No oceano de alternativas pre-tensamente explicativas, por
vezes indissociveis de projetos polticos, mais ou menos explcitos,
tem-se um amplo rol de possibilidades at mes-mo inconciliveis. Tal
fato revela a dificuldade de se dar conta do grande nmero de
reconfigu-raes recentes do policiamento e do que seja a gesto da
segurana nas sociedades contempo-rneas, bem como dos seus efeitos,
alcances e limites, quando se busca faz-los instrumentos de uma
governana democrtica para a polcia. Isso impe e permite que se
arbitre um ponto de partida prprio, sobre o qual se possa edificar
algum rumo mais slido e, acima de tudo, mais claro para o que seja,
possa, ou deva ser tal go-vernana, qual governana de polcia.
II
preciso situar a questo da governana de polcia, delineando os
contornos gerais de um determinado entendimento de governan-a do
Executivo numa democracia (HELD, 2006). Estes contornos so a
constituio e o que sejam as demandas dos grupos sociais cujo
conjunto corresponde polity. De um lado, a anterioridade
constitucional das regras do jogo, traduzidas em dispositivos
legais ou normativos. De outro, os interesses presentes e mais ou
menos imediatos dos atores polticos, traduzidos em negociaes e
acordos. (...)
A governana d conta de distintas instncias de pactuao, com
diferentes temporalidades, lan-ando mo de instrumentalidades
diferenciadas. Lida com estes elementos e constrangimentos em cada
momento dado, considerando as ambies e possibilidades de governo
diante das premncias ou urgncias do presente. A governana se faz
nes-te emaranhado de possveis influncias, obrando simultaneamente
em diversas direes, instncias e contextos e chegando aos resultados
que se re-velam como possveis. Assim, uma traduo mais correta do
que se passa por governana pode ser mesmo um novo olhar sobre o
termo a arte da poltica. Uma e outra remetem mesma questo: no
governo, faz-se governana ou arte da polti-ca o que possvel
fazer.
Ao se enfocar o que seja a governana em rela-o polcia na
democracia, tem-se como expec-tativa necessria que as aes
governamentais se-guem orientadas e buscam permanecer contidas pela
legalidade e legitimidade emanadas do pacto poltico. Apreciar a
legalidade ou legitimidade desta ou daquela, ou de muitas das
decises para e da polcia o que estabelece a governana sobre
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ela. Aqui se tem a governana de polcia propria-mente dita, isto
, a arte da poltica no exerccio do governo pelo uso da polcia para
determinados fins, pautada pela produo autorizada e legal de
obedincia ao pacto poltico com determinados meios e de determinados
modos.
Isso d um contedo distintivo ao papel da democracia na discusso
de governana em re-lao polcia. A democracia anterioridade: a condio
de possibilidade para que se possa ter polcia como soluo para o
problema do enfor-cement consentido. Trata-se de uma forma para
assegurar que os fins pelos quais a polcia usa a fora no produzam
nem a tirania do governo, nem a opresso pelos policiais, nem ainda
a sua apropriao por interesses privados. A democra-cia tambm o
contexto em que se tem a deciso policial (que considera agir ou no
agir, e como agir), o ambiente em que se vivifica e atualiza o
contedo de seus fins, a prevalncia de seus meios, os limites de
seus modos. Trata-se de estar altura das expectativas e da confiana
do pblico, mais amplamente da polity, de que a polcia faz por
merecer o mandato que lhe foi concedido: a pro-duo de alternativas
de obedincia com respaldo da fora sob consentimento diante do
Imprio da Lei (MUNIZ; PROENA Jr., 2007a). A demo-cracia ainda a
ambio, o objetivo pelo qual se tem e se permite que exista polcia,
a razo pela qual se concede o mandato policial. Trata-se de dispor
da certeza de um enforcement que permita o prprio funcionamento
democrtico da polity, que sustente a paz social, as leis, os
direitos, as ga-rantias e tudo mais que corresponde aos termos
constitucionais pactuados.
Este entendimento da forma como a de-mocracia anterioridade,
contexto e ambio
de uma governana democrtica para a pol-cia tem um desdobramento
pouco evidente. Significa que a governana no redutvel ao
cumprimento de alguma lista de boas prticas ou procedimentos
(BAYLEY; SHEARING, 2001). Boas prticas e procedimentos tm seu papel
educando o juzo, facilitando a tomada de deciso. Informam, mas no
conformam e nem substituem a escolha poltica no exerccio de
governo. Em si mesmas, uma ou mais listas podem ser uma forma pela
qual uma polity, um governo, expressa o que deseja de sua polcia
num determinado momento. Para este fim, elas podem ser necessrias,
at convenientes, contu-do, no tm como ser suficientes. A deciso
po-ltica, o rumo da governana, no o resultado do somatrio
cumulativo da enunciao e nem mesmo da adeso ao que se apresentam
como boas prticas. Ao contrrio, a deciso poltica, a governana, que
decide apor, manter, ou re-tirar de uma prtica o qualificativo de
boa.
Dessa forma, o elemento mais capital na governana , ao mesmo
tempo, o mais amplo. Trata-se de apreender que a governana de
pol-cia como categoria geral incide simultanea-mente sobre as
finalidades, os meios e os modos do todo da polcia, fazendo uso (e
por isso inde-pende) da exemplaridade desta ou daquela parte do rol
de atividades de uma ou outra polcia. A questo central passa a ser
o quanto as prticas de agentes policiais, ou mesmo o contedo de
polticas pblicas que orientam a ao da polcia so, ou no so,
aderentes democracia.
III
Aqui se impe uma digresso quanto ao es-tado do campo em que este
texto encontra a
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questo, que serve de prembulo para a direo que se apresenta a
seguir. A forma pela qual se busca aferir a aderncia de uma polcia
demo-cracia est, em larga medida, refm da aprecia-o de instncias
particulares de violao. To-ma-se como implcito o contedo
substantivo, afirmativo, do que democrtico, e se perde como este
algo democrtico incide, incidiria, ou deveria incidir sobre a
polcia, fundindo indistino os aspectos de anterioridade, con-texto
ou ambio da democracia dos quais se podem extrair critrios
positivos.
Por um lado, tem-se a adeso democracia medida pela frequncia ou
volume de violaes, com distintas chaves interpretativas: quanto
mais violaes registradas, mais se evidencia-riam os elementos que
permitem fazer uma polcia mais democrtica; ou, quanto menos violaes
registradas, ficariam mais evidentes os elementos que possibilitam
reconhecer uma polcia mais democrtica; ou, ainda, o quanto de
violaes registradas no significaria nada em si mesmo, mas
dependeria de comparaes entre diferentes realidades que permitem
adju-dicar uma hierarquia de adeso democracia entre diferentes
polcias. A isso acrescentam-se diversos qualificativos, o mais
premente dos quais evidentemente que qualquer um destes critrios
depende fundamentalmente de contexto, de crtica do que sejam os
registros, de dinmicas societais (BAYLEY, 1983), pois, caso
contrrio, arriscam-se a ser pouco mais do que retricas mais, ou
menos, ideolgicas (MANNING 1992/1999) e insensveis para a questo da
governana (KLOCKARS, 1991). Nesta perspectiva, que tem sido, seno
predo-minante, certamente majoritria, reduz-se a questo da
governana de polcia a processos
de aperfeioamento ou de expurgo. Trata-se de uma lgica que perde
de vista a capacida-de de governo e que, conscientemente ou no,
abdica da perspectiva de controle (PUNCH, 1983).
Semeia-se desgovernana, colocando quem governa diante de prticas
estabelecidas, boas ou ms, para as quais no h explicao. O que a
polcia faz ou deixa de fazer aproxima-se de uma sucesso de fatos
consumados, que s admitem sua absoro, comemorao ou pe-sar. Tm-se
imagens, esperanas de que mais treinamento produz invariavelmente
maior adeso democracia, ou que a reproduo mi-mtica de boas prticas
provoca um profissio-nalismo democrtico, ou ainda que a excluso
exemplar ou peridica de um nmero restrito de mas podres asseguraria
a democratitude da polcia. (...)
IV
com o benefcio do quanto de anteriori-dade, contexto e ambio
democrticos incide sobre o todo da polcia que se tem governana de
polcia. Numa democracia, a governana de polcia pressupe a existncia
de instncias autorizativas e mecanismos de controle do go-verno
pela polity. Estas instncias e mecanis-mos configuram os espaos de
construo de legitimidade e da legitimao da ao de go-verno e,
portanto, da deciso policial. Cons-tituem arranjos diferenciados de
participao e de controle popular que se fazem presentes, em maior
ou menor grau, na pactuao consti-tucional, na dinmica contextual do
relaciona-mento com a polcia (ou seja, no cotidiano da fabricao da
ordem social) e na identificao
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e busca das ambies de cidadania. Trata-se de espaos de construo
e vivificao da credibi-lidade da polcia diante do pblico (MUNIZ;
PROENA Jr., 2007b).
Numa democracia, a governana de polcia pressupe uma
anterioridade constitucional e legal, isto , presume que existam
regras do jogo a serem objeto de enforcement, que so a condio de
possibilidade do policiamento p-blico estatal e, portanto, o
fundamento e a ra-zo de ser da polcia. Estas regras expressam as
distintas esferas de pactuao da polity, confor-mando a arena
poltica de definio, expresso e produo de legalidades, que so os
termos do policiamento pblico estatal e, desta forma, o anteparo e
a medida da polcia. Legitimida-de e legalidade, ainda que
distintas, so apenas duas faces de uma mesma moeda: a do
con-sentimento social para ser governado, para ser policiado. Os
termos gerais pelos quais se qua-lificam estas regras so to
fungveis ao modelo de democracia quanto qualquer outro aspecto da
vida social, admitindo variedade: o Rule of Law, ou a Queens Peace,
ou a Securit Interieur, ou o Estado Democrtico de Direito.
A preeminncia do consentimento na de-mocracia tem uma
consequncia suprema para o que a polcia , e para qualquer
perspectiva de sua governana. O consentimento afeta to-dos os
termos e elementos do mandato poli-cial e de seu exerccio. o
consentimento que qualifica as relaes de poder entre Estado e
sociedade, distinguindo a obedincia ao pacto democrtico da polity
da tirania, o arbtrio in-trnseco ao ato de governar da
arbitrariedade, o policiamento pblico de formas de proteo. o
consentimento que valida os rumos deri-
vados das ambies de cidadania que definem escolhas entre os fins
que a polcia usa, deixa de usar ou passa a usar. o consentimento
que explica e modifica as formas pelas quais meios e modos
policiais so preferidos, mantidos, preteridos. o consentimento que
articula e edifica o contedo, a vigncia, as formas de ser, de agir,
e o campo das escolhas legtimas e le-gais na prtica policial.
com estes elementos de fundo que se pode apreciar o valor da
contribuio inaugu-ral de Laurence Lustgarten, em seu The
gover-nance of the police (1986). O autor, um jurista
constitucional britnico, realizou a primeira apreciao do que seria,
do que deveria ser e do que era possvel ser a governana de polcia.
Distinguiu-se, assim, de uma forte tradio jurdica, de raiz
positivista, que toma o orde-namento jurdico como fundante da ordem
social, revelando que o mundo da lei no , nem pode ser, as leis do
mundo.
Lustgarten desnuda a natureza poltica das leis, esclarecendo que
elas resultam de acordos e negociaes. Ainda que idealmente mais
re-fletida, com horizontes mais amplos, uma lei de fato, uma
constituio a instrumenta-lidade de um acordo, uma instrumentalidade
da poltica. As leis podem e so mudadas em funo dos embates e
acordos polticos entre os interesses presentes numa polity. A
aplicao da lei, por sua vez, tem a inrcia interpretativa e a
resilincia diante da poltica que a prpria poltica lhe delegou. As
garantias fundamen-tais, quaisquer que sejam, refletem apenas os
termos de ambio mais longevos de um deter-minado pacto, numa
determinada polity num determinado momento. (...)
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De partida, fica simplesmente impossvel ambicionar que a lei e,
por extenso, a polcia estejam, ou possam estar, de alguma forma,
acima da poltica. Ou ainda, que sua mate-rialidade no seja, ela
mesma, expresso do re-sultado de uma determinada dinmica poltica. H
mais em jogo do que a adeso formalista ao que quer que seja o
contedo da lei, ou s inter-pretaes de sua inteno poltica. A
cidadania aspira a mais, de fato aspira a mais por meio da lei, no
fazer da poltica. Aspira a valores, a metas mais amplas, como a
liberdade ou a justia que sustenta a igualdade em direitos.
V
com esta perspectiva que podem ser con-templadas as formas pelas
quais se produz a go-vernana de polcia diante de sua razo primeira:
assegurar a adeso das prticas policiais deci-so poltica em termos,
formas, meios e modos democrticos. Isso diz respeito, sobretudo, s
prticas dos agentes policiais no contato direto com os cidados, que
so aqueles que autorizam a existncia da polcia e consentem suas
prticas. Mas alcana, necessariamente, o contedo de to-das as
decises e aes de governo que orientam a deciso, ou pautam a ao
policial. Neste sen-tido, a governana de polcia corresponde a uma
determinada esfera no exerccio de governo, que aprecia o mrito das
escolhas, resultados e conse-quncias das decises policiais.
O governo sobre a polcia (ou sobre qualquer outra agncia pblica)
pode ser tomado pelo que tem em comum com as outras esferas de ao
governamental, que por acaso tm como objeto a polcia. Isso admite
diversos recortes pautados pela perspectiva mais ampla do todo do
governo:
aquele que considera a forma de definio, execu-o e auditagem do
oramento; que privilegia os requisitos de transparncia; ou aquele
que busca erigir ferramentas de valor universal, capazes de lidar
com qualquer ao de governo, em prol da comparabilidade das
diferentes esferas.
Estes recortes transversais, pertinentes e teis como podem vir a
ser da perspectiva mais ampla do todo do governo, so quase
certamente insufi-cientes para produzir governo sobre a polcia (ou
qualquer outra agncia pblica), precisamente porque no esta a sua
finalidade. Cada um deles tem seus prprios objetivos e, portanto,
limites no que capaz de produzir. Com controle ora-mentrio sabe-se
principalmente, e muitas vezes apenas, o quanto e como se gasta.
Isto deixa de apreciar a qualidade decisria do que, ou em que,
gastar. (...)
Apenas a governana de polcia permite li-dar com o contedo do
exerccio do mandato policial articulando fins, meios e modos.
Am-biciona relacionar, como causa e efeito, ao governamental e os
resultados e consequncias policiais. Elege o que, no todo da
polcia, seria necessrio controlar para que se saiba o suficien-te
do contedo de sua prxis, de maneira a que se possa govern-la. E
isso corresponde a uma apreciao do que seja o mrito do exerccio do
mandato policial em seus termos concretos, considerando o contexto
de cada deciso poli-cial, o que significa que qualquer governana de
polcia expressa um juzo de razoabilidade sobre o que se pode saber
para que se possa governar, e o que se busca controlar para
saber.
retoricamente sedutor, e possvel mes-mo se deixar levar pelo
desfrute do querer, ou
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dizer que quer, saber tudo. Da, se anunciar, ou mesmo se
ambicionar, a meta de controlar tudo. Mas isso impossvel. Pode-se,
ainda, buscar o mximo de controle possvel. A trata-se de avaliar o
quanto custa este mximo de controle, tanto em termos dos recursos
neces-srios para produzi-lo, quanto no que se refere s consequncias
de sua tentativa, ponderando se estes custos so aceitveis ou
sustentveis. No caminho reverso, pode-se querer o contro-le que
corresponda ao menor custo, mas que pode acabar no sendo controle
algum.
A questo que o controle no est dado em si mesmo. necessrio
decidir o que e quanto controlar vista de determinados fins. Fica
explcito que o controle que se busca ter para governar resulta do
quanto se deseja sa-ber. Existe uma dinmica entre o quanto se busca
controlar e o quanto se consegue saber, mediada pelo rendimento do
que um dado controle permite saber luz do seu custo. Para o governo
de uma democracia, isso significa buscar e sustentar o
consentimento pblico, compondo com os elementos de legalidade e
legitimidade em termos do que se deseja, se pode e de fato se busca
controlar. Cada gover-no, em determinado momento, se confronta com
as demandas cambiantes e diferenciadas dos cidados com relao ao que
eles desejam e toleram que venha a ser controlado. Mas existe um
cerne inescapvel de controle que corresponde ao que permite que o
governo governe a polcia, que deriva de uma medida de
razoabilidade.
VI
(...)
VII
Lustgarten (1986) reconhece dois qualifi-cativos de partida para
a questo do governo da polcia, realizando uma necessria limpeza de
terreno para que se tenha uma perspecti-va razovel do que seja, do
que deva ser uma governana de polcia. O primeiro refere-se
compreenso do que essencial no traba-lho policial. Apoiando-se em
Bittner (1970, 1974), o autor menciona os dois atributos
distintivos do lugar de polcia: o poder coer- citivo e o uso
discricionrio deste poder (LUSTGARTEN, 1986, cap. 9, cap. 10). O
segundo diz respeito ao reconhecimento da natureza poltica da
atividade policial e do potencial emancipatrio deste como de
qualquer outro meio de fora. Sem embar-go das cautelas que protegem
a normalidade democrtica, isso se traduz em dinmicas co-tidianas de
usurpao de poderes por policiais ou por organizaes policiais
(LUSTGAR-TEN, 1986, cap. 10).
Que a legalidade tem um papel capital na condio de possibilidade
de uma governana de polcia evidente. O que no evidente so seus
limites; desde logo, a iluso que pode ser criada pela confiana cega
em controles legais. Exemplo disso a recorrncia da pseudosso-luo de
se subordinar a polcia ao Judicirio, como se tal afiliao pudesse
resolver a questo da governana de polcia. Tm-se aqui dois
re-gistros que afirmam um erro de partida quanto ao que seja, e o
que faz, uma polcia: a crena de que o verdadeiro trabalho da polcia
o respaldo da lei; e o desejo, esperana, de que esta tarefa seria
adequadamente priorizada e controlada se o comando da polcia fosse
do Judicirio.
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A confiana cega no regramento legal e a expectativa de que se
possa confinar a polcia ao respaldo da lei so simplesmente ingnuas
ou, mesmo, ignorantes em relao realidade do trabalho da polcia.
Esquecem a natureza in-trinsecamente post-facto de tudo o que se
pode querer ter como sendo Judicirio, bem como a natureza das
temporalidades concorrentes do antes, do durante e do depois, que
estabelece os termos de uso de um meio de fora, cuja razo de ser a
tempestividade, que produz, inescapa-velmente, um trabalho: o
trabalho policial, que exercita seletividade no agir, nas formas de
agir e, portanto, tambm no que registra nos relatos em que
apresenta, ou como explica, a sua dis-cricionariedade. Isso revela
que, no melhor dos casos, o que a lei pode produzir um tipo de
controle sobre determinados desvios. Cala, tem que calar, sobre
tudo o que diz respeito ao que a polcia realiza em ato ou potncia,
ou decide no realizar, diante do fato presente ou de sua
anterioridade: o uso do poder coercitivo para reprimir, dissuadir,
e o quanto a polcia possa contribuir para prevenir.
Para Lustgarten, todas as expectativas oti-mistas do quanto se
pode controlar com a lei e da suficincia de tais controles para uma
go-vernana democrtica da polcia naufragam no rochedo da caixa preta
da discricionariedade. O uso discricionrio do poder coercitivo vai
alm e fica aqum do mundo da lei. Assenta-se, antes e
necessariamente, no impositivo pragmtico de ao legtima diante das
leis do mundo, com tudo que estas tm de alegal, no-legal,
interle-gal e mesmo de tolerncia diante do ilegal.
Lustgarten afirma que preciso reconhecer a existncia da
discricionariedade e que ela revela o
limite intransponvel para qualquer tipo de con-trole legal. Mais
ainda, para o autor, a discricio-nariedade s poderia ser enquadrada
como uma caixa-preta. Ela se situa num determinado con-texto, as
condies de contorno dentro das quais se tem a polcia como soluo de
enforcement numa polity. Nestes termos, s se pode realmente
controlar o que entra e sai da caixa preta, e no como ela lida com
o que entra ou produz o que sai. Assim, s seria possvel apreciar
inputs (situa-es e prioridades diante do policial ou da polcia) e
outputs (resultados e consequncias da deciso policial de agir ou no
agir, e de como agir).
Toda questo passaria a ser a rentabilida-de poltica do que se
pode saber por meio de alternativas de controle que aceitam a caixa
preta. Estas concedem uma significativa me-dida de autonomia para a
polcia. Lustgarten reconhece, com bom humor, que isso conce-der, em
alguma medida, o status de um segredo inicitico ao que seja o
processo do fazer po-licial discricionrio. O autor lembra Bernard
Shaw, em que todo profissionalismo uma conspirao contra os leigos,
e acredita que possvel limitar a opacidade deste segredo
profissional, afirmando que a questo no sa-ber, ou no poder saber,
como se decide, mas sim apenas reconhecer que uma dada deciso assim
produzida no tem como ser avaliada e, portanto, no tem como ser
controlada em si mesma. Trata-se, para Lustgarten, de saber o
suficiente do como e do o que existe nesta esfe-ra de
discricionariedade aceita como irredu-tvel , para no ser enganado;
para saber o que conceder, e conceder conscientemente. (...)
Indo alm de Lustgarten, h que se reco-nhecer muito da seduo
enganosa que se
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encontra na confiana cega na lei quando se fala de
accountability. A questo perder de vista a instrumentalidade da
accountability para a governana, emancipando-a. Inverte-se o papel
de instrumento e finalidade, como se accountability bastasse, ou
pudesse existir, em si mesma, produzindo a governana de que ela
depende para ter sentido. o rumo que resulta de se tomar a
accountability como uma boa prtica autossuficiente, que pela sua
rotiniza-o produziria automaticamente governana (STONE; WARD, 2000;
BAYLEY 2001). Es-camoteia-se o quanto a accountability depende de
decises polticas (GOLDSTEIN, 1977) da polity sobre o que, e como,
deve ser objeto de accountability neste dado momento e nestas ou
naquelas circunstncias. Perde-se de vista que a accountability, em
si mesma, parte de um de-terminado processo que a demanda, e a usa,
e a configura, para determinados fins: o aperfei-oamento do mandato
policial e sua aderncia democracia. (...)
A questo no qual governana de po-lcia a accountability permite,
mas sim qual accountability se deve ter para que se possa ter
governana de polcia. Controlar para saber, saber para explicar
tanto o agir quanto o no agir, apreciando as alternativas de como,
luz do mrito dos porqus, se agiu desta ou da-quela maneira. desta
forma que se pode go-vernar a polcia para buscar a sua adeso
de-mocracia. Tem-se ento um possvel uso para a accountability como
uma ferramenta, entre outras.
possvel ir mais alm de Lustgarten e ar-guir que no necessrio
aceitar e conceder a caixa preta da discricionariedade policial.
Dito
de outra maneira, possvel penetrar o interior da caixa preta e
identificar o problema de seu controle; apreciar as possibilidades
de controle do trabalho, articulando alternativas em termos de
controles de primeira ordem (superviso di-reta), de segunda ordem
(normativa de resulta-dos) e de terceira ordem (adeso
profissional), utilizando a perspectiva sistmica das relaes de
trabalho (BERTALANFYY, 1976). Isto sig-nifica que necessrio ter um
esquema analtico que esgote o que seja o contedo do trabalho
policial, que revele todo o interior da caixa pre-ta, de maneira a
que se possa aferir o que seja a ordem de controle que possa ser
aplicada.
Bittner (1983) prope um esquema exausti-vo para o controle do
trabalho policial em ter-mos de sua legalidade e workmanship
(qualidade da deciso). Quanto ao controle da legalidade da ao, o
autor argumenta que a superviso re-gulatria (um controle de segunda
ordem) tem a questo resolvida e bem resolvida. Tudo que diz
respeito legalidade da deciso policial pode ser encaminhado e
resolvido a posteriori. Seu efeito sobre o trabalho policial se d
de forma indireta, ao configurar o que seja, passe ou deixe de ser
passvel de sano ou prmio. Resolve-se o controle da legalidade,
assim, com um sistema de incentivos, alimentado por
accountabilities, que se acionam diante de um desvio ou de-sempenho
diferenciados. Para Bittner, a maior parte do problema de lidar com
a workmanship no reside na prpria workmanship, mas sim na tentativa
de enquadr-la em alguma forma de superviso regulatria.
E isso, num paralelo preciso com Lustgar-ten (1986, que
desconhecia o texto de Bitt-ner, 1983), significa rejeitar a
perspectiva de
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que alguma superviso ou norma, que alguma accountability que
dependa de uma ou de outra possa dar conta da tarefa de controle.
Para Bit-tner (1983), evidente que na deciso policial,
discricionria, nem o exerccio do ouvido vo-cacional que decide se,
quando e como agir, nem do talento da construo contingencial de uma
soluo ad hoc de sua prpria lavra admitem antecipao. desta antecipao
do contedo da deciso diante da realidade que a norma ou a superviso
dependem. Isso condena superficialidade, mesmo falcia, qualquer
esforo de accountability que busque apoiar-se nelas.
Para Bittner, o risco ento se recusar a re-conhecer estes
limites e agir como se a norma ou a superviso fossem mais capazes
do que de fato so. Isso cria a iluso de que se controla tudo para
no controlar nada, assegurando, e mesmo alimentando, a autonomia
policial. Como no v alternativa proposta a esta pers-pectiva, o
autor aponta que tal apetite legalista e normativo est condenado ao
fracasso. (...)
Entretanto, Bittner (1990c) recusa-se a atribuir workmanship o
status de uma caixa preta e considera conhecidos dois elementos
constitutivos do uso discricionrio do poder coercitivo policial: o
ouvido vocacional e a construo contingencial ad hoc. Porm, o autor
no menciona se estes seriam, ou no, suficientes. Bittner (1990a, p.
249) delineia os termos que orientariam a afinao do ou-vido
vocacional: algo que est acontecendo, que no devia estar
acontecendo, e sobre o que algum devia fazer alguma coisa agora, um
re-sultado de enorme coerncia em que o meio de fora tempestivo seja
pautado pela exign-
cia, que no se adia, que no admite retardo, emenda ou recurso.
Que obriga quando no consegue persuadir. (...)
A questo, para Bittner (1983), qual con-trole pode servir para a
workmanship, nestes termos. O autor reconhece que apenas um
controle de terceira ordem, anlogo ao que se tem para padres,
professores ou mdicos, pode ter relevncia para o controle da
workmanship. Mas, segundo Bittner, tem-se aqui mais um horizonte de
investigao do que uma soluo. Para ele, fica como pergunta qual
seria o con-tedo para avaliar os termos profissionais de polcia,
capazes de instruir a adeso que expres-saria o cerne de um controle
de terceira ordem, pois, enquanto no se tivesse como avaliar a
workmanship, a rentabilidade do controle esta-ria sempre refm da
falcia.
possvel atualizar este resultado de duas maneiras. A primeira
perspectiva, francamente minoritria, que aceitou o desafio de
avaliar e, portanto, controlar a workmanship. Aqui uma das faces da
questo como romper com a superficialidade da conformao sumria, isto
, que reduz todo o processo de avaliao de uma dada deciso policial
a uma sentena cabal, compatvel ou incompatvel, omi-tindo o que quer
que a explique. Aqui tem-se viva a frente de luta entre a ambio de
gover-no da polcia e ambio de autonomia da po-lcia em termos de
dispositivos legais que au-torizam, e realidades factuais que
dificultam a avaliao do mrito da workmanship (WOOD; MACALLISTER,
2005). A outra face da ques-to como estabelecer, de partida, os
termos gerais pelos quais se enquadrar o desempenho policial na
workmanship. Aqui a questo bem
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outra: trata-se de alavancar o prprio conheci-mento policial em
termos de seu tratamento cientfico, definindo padres de medida
ca-pazes de mensurar e, portanto, avaliar o con-tedo especfico da
workmanship (MUNIZ; PROENA Jr., 2007b). A segunda perspecti-va,
largamente majoritria, a que assume um olhar gerencial, com maior
(MACDONALD, 2001) ou menor (KELLING, 1996) especi-ficidade
profissional para o trabalho policial. Aceita, implcita (REINER,
2002) ou explici-tamente (GOLDSTEIN, 1990), a caixa preta da
discricionariedade, tematizando a questo do poder coercitivo
exclusivamente em termos de output.
VIII
oportuno retomar as consideraes de Lustgarten (1986) que
permitem compreen-der o que esta perspectiva oferece em termos de
soluo e de limites e, acima de tudo, como reconhecer nesta gerncia
policial a gover-nana policial, contida e subordinada gover-nana de
polcia. O autor comea enxergando uma polaridade diante do
reconhecimento da especificidade do saber policial. Discute se
haveria algum contedo no saber discricion-rio da polcia, isto , se
existe realmente algo substantivo dentro da caixa preta. Isto
porque extremamente conveniente, para os interesses corporativos da
polcia, afirmar que existe sim um contedo profissional, to
especfico, qua-se idiossincrtico, na gesto de uma organiza-o
policial, que dependeria de uma passagem inicial pela caixa
preta.
Isso serve de diversas maneiras para que a polcia afirme sua
autonomia diante de tenta-
tivas de govern-la. Para Lustgarten, preciso considerar os
termos da armadilha que este en-tendimento de profissionalismo pode
produzir. Por um lado, ao validar uma autonomia cada vez mais ampla
da deciso policial, usurpam-se decises que pertencem, propriamente,
ao go-vernante. Por outro lado, no esforo de resistir a esta
usurpao, a esta pretenso corporativa por mais poder para a polcia,
pode se perder de vista que existiria, sim, um cerne de
profis-sionalismo, que o autor identifica como a caixa preta da
discricionariedade. Para ele, a soluo para esta polaridade entre um
profissionalismo que aspira autarquia e a presuno de que nada h
neste profissionalismo a no ser uma estratgia deliberada de
governar no lugar do governante reside em compreender a
especifi-cidade, a real dimenso e o efeito do uso dis-cricionrio da
coero para a configurao de uma governana de polcia razovel. S assim
se tem o antdoto para vencer esforos de se mascarar como rotina
profissional o que po-ltico sem jogar com a gua do banho o beb do
profissionalismo policial.
Como ponto de partida, tem-se o efeito da caixa preta para o
quanto se pode na opinio de Lustgarten, o quanto razovel em termos
de rendimento poltico conceder que o con-trole da gesto da
organizao policial seja feito to somente pela prpria polcia. A
hiptese de Lustgarten que a existncia da caixa preta as-sinala um
limite instransponvel, que identifica contornos do que razovel
querer controlar. Este limite corresponde s dinmicas gerenciais que
decorrem de consideraes sobre discri-cionariedade, sobre a prtica
de workmanship: o que sejam os mecanismos de controle, de
aperfeioamento, de adaptao diante do tra-
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balho policial. Como, para Lustgarten, s se pode saber que a
caixa preta existe e como ela funciona, mas no avaliar como ela
funcionou em qualquer caso especfico, precisamente em funo deste
limite que o autor sugere os termos do controle da gerncia
policial: quem exerce al-gum nvel de comando dentro da polcia deve
estar sujeito a informar sobre as condies de contorno, os inputs e
os outputs de suas decises, mas livre para produzir suas aes dentro
da cai-xa preta com estes limites.
Isso significa reconhecer, atualizando e expli-cando o que
Lustgarten apontou, que a gover-nana de polcia no corresponde
governana policial, da polcia pela polcia. A governana policial est
contida na governana de polcia, admitindo uma medida de autonomia.
Todo o ponto est em que se sabe que se ter que conce-der alguma
autonomia. E que se sabe que s se pode controlar esta autonomia por
sua exterio-ridade, j que no razovel para Lustgarten, no possvel
querer control-la diretamente. A questo passa a ser como controlar
a medi-da desta autonomia, de maneira que ela opere
satisfatoriamente no uso da discricionariedade, contendo sua
tendncia natural de afirmar-se usurpando decises polticas.
Construir delibe-radamente os termos e controles da autonomia
policial, para que o profissionalismo policial possa exercer-se
destas determinadas formas ade-rentes democracia, para que se possa
confiar e depender, e se confie e dependa, da qualidade da deciso
profissional de polcia em relao a quando, porque e como ela escolhe
exercer sua discricionariedade coercitiva. (...)
um erro fazer da gesto policial, que tem seus prprios interesses
e problemas, a materia-
lidade da governana de polcia. Primeiro, por-que isso apenas
cria mais um espao em que se pode alargar a autonomia policial, que
o que ocorre quando se concede que a prpria pol-cia que define as
metas a serem cumpridas, ou estabelece a forma pela qual estas
metas seriam avaliadas, ou define os termos da poltica p-blica que
deveria govern-la. Segundo, porque isso de fato uma renncia
existncia de uma governana de polcia cuja primeira lealdade, cuja
razo de ser, permitir ao governo gover-nar a polcia e controlar sua
autonomia, aferir sua adeso democracia em termos de finali-dades,
meios e modos. Isso permite desdobrar, de maneira qualificada, o
elemento diferencial que explica porque a governana de polcia no se
confunde, ao contrrio, contm e subordina a governana policial.
IX
O propsito da governana de polcia governar a polcia assegurando
sua aderncia democracia como anterioridade, contexto e ambio.
Incorpora a governana policial, con-cedendo conscientemente a
medida de auto-nomia que se considere adequada para a gesto de sua
organizao. A governana de polcia articula objetos, mecanismos e
controles que instrumentalizam as finalidades, alternativas, modos
e meios da polcia para um determina-do projeto poltico. Busca
aproximar as metas e determinar as formas de busca de metas
ex-pressas em polticas pblicas. Isso corresponde a dois grandes
rumos. (...)
Lustgarten prope uma estrutura que am-biciona generalidade, por
um lado, e que lhe parece razovel, por outro. Esta a contribui-
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o mais ambiciosa de seu texto: o que seria suficiente para se
ter uma governana de po-lcia. Isso corresponde a quatro instncias
de controle, que admitem uma hierarquia de su-bordinao. A primeira
delas, que conforma e pauta o contedo das demais, diz respeito ao
norte qualitativo para a ao policial em ter-mos de universalidade e
imparcialidade. Em seguida, o autor identifica trs instncias em que
se teriam acesso e soluo para a dinmica de poder que ope a pretenso
de governar a polcia com sua ambio de governar-se: de-finio de
estrutura e capacitaes da organi-zao policial; alocaes e
prioridades no uso dos recursos policiais; e prticas estabelecidas
de enforcement seletivo. Em cada uma delas apontado como a
governana de polcia se im-pe, ou defere, diante da governana
policial que instrumentaliza, direta ou indiretamente em
workmanship, a execuo do trabalho poli-cial e seus
desdobramentos.
Universalidade e imparcialidadeA presuno de Lustgarten sobre a
suficin-
cia de universalidade e imparcialidade baseia-se numa
perspectiva em que estas remetem condio de possibilidade para que a
polcia possa ser o meio de fora coercitivo capaz de sustentar
democraticamente a ordem poltica pactuada. So determinantes para
que se im-pea que a polcia se emancipe, ela mesma, num instrumento
de opresso, buscando seus prprios fins, ou seja, instrumentalizada
para os fins do governante produzindo tirania, vio-lando o
consentimento da polity.
A perspectiva de universalidade tem dois lados, igualmente
importantes. O primeiro o que determina que a polcia um bem co-
mum e um servio pblico, acessvel a todos e a qualquer um. Esta
universalidade garanti-da pela sua natureza estatal: o provimento
de enforcement consentido, de policiamentos p-blicos estatais
(BRAITHWAITE, 2000; SHE-ARING, 2001). A polcia estatal, por ser um
recurso universalmente disponvel, serve para impedir que grupos
usem meios de fora para fins privados, impondo formas de proteo e,
portanto, de opresso. O segundo o que determina que ningum est
acima das regras do jogo, alm do alcance da ao estatal da polcia.
Estes dois lados da universalidade da polcia espelham a ambio de
inclusividade e subordinao de todos ao pacto poltico mais amplo a
que consentem, fora do alcance de quaisquer arranjos de
policiamentos privados ou de dinmicas particularistas de
vigilncia.
Desmascara-se o contedo pseudode-mocrtico que resulta da adeso
acrtica, ou apenas irrefletida, a uma retrica econmica que
reduziria o cidado a consumidor (MAN-NING, 1999) e que faria do
Estado apenas um concorrente a mais na prestao de servios de
segurana, presumindo que os termos contra-tuais e a lgica do
mercado seriam uma solu-o superior, e mais desejvel, do que o
mo-noplio da polcia estatal para o provimento de enforcement.
(...)
A perspectiva de imparcialidade tem um significado particular
para Lustgarten, que reconhece o carter discricionrio da deciso
policial e presume que se ter uma forma de enforcement seletivo que
no tem como ser imparcial. Trata-se de reconhecer a
impossi-bilidade de que se tenha plena imparcialida-de, por motivos
anlogos de porque no se
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pode ter enforcement pleno da lei em todos os momentos e
lugares. A questo, portanto, passa a ser a de uma imparcialidade
diante da realidade do uso da discricionariedade, isto , a de como
garantir que a seletividade do enforce-ment seletivo na deciso
policial seja imparcial diante do pacto. O impositivo de
imparcialida-de qualificado. Sabe-se que sua materialidade ser a de
uma imparcialidade em termos da consistncia de como se decide ser
parcial no exerccio do mandato. Trata-se de reconhecer, e limitar,
a autonomia da workmanship. Nesta expresso de imparcialidade,
tem-se uma fron-teira poltica viva, capital na democracia, entre a
discricionariedade que produz seletividade e o seu abuso em termos
de alguma forma de discriminao e desigualdade.
Quando se considera a possibilidade de se abrir a caixa preta da
discricionariedade no exerccio do mandato policial e no uso do
po-der coercitivo, pode-se ir mais alm na questo da imparcialidade.
Ao se compreender que o agente policial exercita sua
discricionariedade em termos de um ouvido vocacional e na pro-duo
ad hoc de uma soluo contingencial, privilegia-se o contexto de sua
deciso. Assim, a imparcialidade remete, simultaneamente, no
presente estendido, ao pacto poltico mais am-plo e s pactuaes no
cotidiano da poltica, expressas em termos de legitimidades e
legali-dades em negociao.
neste sentido que se pode lanar um novo olhar para a formulao de
Peel, em seus Princpios do policiamento, que talvez no seja mais do
que apenas reconhecer o seu con-tedo original e desvelar como erros
interpre-taes mais contemporneas. Que a polcia
seja o pblico, e o pblico a polcia deixa de ser um equvoco que
presume uma sime-tria ou igualdade de poder entre estes atores
(BAYLEY, 1985), ou uma manobra estatizante que mascara uma suposta
natureza privada do policiamento em prol da legitimao da pol-cia
estatal (SHEARING, 1995). Ao contrrio, expressa uma compreenso
profunda de que o exerccio da discricionariedade se funda e
reco-nhece a assimetria entre polcia e cidado. Por conta desta
assimetria, a polcia, que mais forte, tem que se mostrar aderente
aos termos do mandato consentido que a fez mais forte. Isto
significa dizer que o elemento legitimante da deciso discricionria,
isto , o termo inicial de avaliao da workmanship em termos
polti-cos, a convergncia moral entre a deciso dis-cricionria da
polcia e o que o pblico reco-nhece, de bom ou malgrado, como
razovel.
Com isso, pode-se apreciar o significado de um grafismo: que o
norte diretivo fundante da governana de polcia seja Universalidade
& Imparcialidade, porque uma ou outra, sozi-nhas, pode levar a
violaes do pacto. Pode-se ser universalmente discriminatrio;
pode-se ser imparcialmente excludente.
De outro ponto de vista, o que Lustgarten prope, nesta forma
grfica de Universalida-de & Imparcialidade, corresponde a um
topo hierrquico, uma anterioridade constitucional, em termos de
conformao da governana de polcia. Nesse sentido, alguns dos
aspectos de aspirao, mesmo de um tipo de dever-ser, poderiam se
expressar com a denominao de princpios fundamentais para a aderncia
de-mocrtica da polcia, os termos positivos de uma agenda
afirmativa. Tudo o que se segue a
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eles corresponde a escolhas e formas de como operacionaliz-los.
(...)
Mas fica evidente que Lustgarten presume que tudo isso ocorre, e
que a questo no termi-na na emanao, divulgao, de uma expresso
declaratria do que seja o resultado deste proces-so. A governana
atravessada por este processo para se realizar no fazer-se da
poltica pblica, na busca do que ela tenha elegido como meta, da
forma como ela tenha escolhido fazer-se como mtodo, atenta a todas
as salvaguardas que uma expresso declaratria de poltica pblica pode
ter para que possa vir a pblico.
Assim, para Lustgarten, o que resta, conscien-te desta dinmica
mais ampla, identificar as trs instncias nas quais se tem, de fato,
o espao mais razovel, neste sentido, mais rentvel para o exer-ccio
da governana de polcia, que afirma serem suficientes para produzir
controle. A proposta de Lustgarten que, para governar o todo da
pol-cia, no necessrio controlar tudo na polcia. razovel controlar
estrutura e capacitaes, aloca-es e prioridades no uso de recursos,
e prticas estabelecidas de seletividade no enforcement.
Estrutura e capacitaesA estrutura e as capacitaes da polcia
so
questes de governana de polcia. Do que a agncia policial e os
agentes policiais so capazes pertence esfera de deciso de quem
governa. Estrutura e capacitaes definem e conformam o que , para
que , e quais so as alternativas de que a polcia pode dispor para o
exerccio do seu mandato.
A definio e finalidades de determinada es-trutura e capacitaes
tm que permanecer alm
da esfera decisria das organizaes policiais para que se possa
govern-las, para poder dotar as polticas pblicas dos meios e mtodos
que lhes permitam perseguir suas metas. Isso no se confunde com a
oportunidade do subsdio tc-nico destas organizaes para tomada de
deciso de quem governa. Mas a deciso sobre a defi-nio da estrutura
e das capacitaes da polcia est na raiz da possibilidade de se
governar a po-lcia, porque s desta forma possvel controlar o que
seja a sua capacidade de agir.
Governar a polcia comea, ento, por de-cidir o que a polcia pode
e no pode ser capaz de fazer, o que s possvel quando se controla e
decide qual a sua capacidade. Assim, tudo que estabelece e autoriza
as alternativas de ao de que uma polcia capaz efetivo da polcia,
sua estrutura organizacional no espao, dese-nho, dimenso e
subordinao entre suas es-pecialidades ou reparties funcionais de
suas atividades, seus equipamentos, procedimentos tem que decorrer
de decises polticas e no da prpria polcia.
Estas decises podem ser tomadas muito antes que as capacidades
que elas autorizam ve-nham a ser necessrias, ou mesmo percebidas.
Da a delicadeza da questo: ou bem se gover-na a capacidade da
polcia continuadamente, ou pode-se ser confrontado com uma usurpa-o
mais ou menos gradual do ato de governar, ora porque foi a polcia
quem escolheu suas capacidades e, portanto, s permite escolher
entre as alternativas que ela mesma definiu (e estas podem no ser
as que se deseja, ou ser as que somente a polcia deseja), ora
porque a definio das capacidades da polcia resultou de processos
inerciais e acrticos, idiossincrti-
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cos, incidentais. Pode-se no ter a capacidade de que se
necessita, nem quaisquer alternativas de resposta diante dos fatos,
ou pode-se acabar tendo capacidades que existem em si mesmas e cuja
posse pode ser difcil de explicar.
Isso revela que a determinao de estrutura e capacitaes a
primeira linha de controle para que polcia no se emancipe diante do
governo, e mesmo diante da polity. Coeren-temente, para Lustgarten,
este controle de capacidade remete diretamente ao contro-le da
autonomia policial que ele assume ter que ser concedida. Controla a
autonomia da discricionariedade, ao decidir por uma deter-minada
palheta de alternativas. Prefere umas, aceita outras, mas
principalmente exclui aque-las consideradas incompatveis com o que
se deseja da polcia, por exemplo, com os termos da expresso
declaratria da poltica pblica. Aceita, mas limita, o que a
discricionariedade pode fazer, conformando o campo de
possibili-dades da workmanship. Isso alcana o cerne de
discricionariedade que justifica uma dada me-dida de autonomia
policial e tudo o que dela decorre. Controla a autonomia da
governana policial, ao configurar o que ela tem para ge-rir. desta
forma que a governana de polcia estabelece os objetos, as condies
e, ainda, os parmetros da capacidade cuja gesto corres-ponde
precisamente governana policial.
Alocao e prioridadesA alocao e as prioridades no uso dos re-
cursos policiais que determinadas estrutura e capacitaes
disponibilizam uma questo de governana de polcia em que a
contribuio da governana policial se apresenta como ne-cessria,
sendo que a iniciativa e autonomia
policiais tornam-se relevantes para a prpria governana de
polcia. A forma como a agn-cia policial e os agentes policiais
distribuem os recursos e priorizam o seu emprego e como utilizam
estes recursos na execuo de suas aes faz convergir as esferas de
deciso de quem governa com a gesto policial. Alocao e prioridades
expressam escolhas que ponde-ram alternativas polticas e policiais
de como a polcia utiliza sua capacidade no exerccio do seu
mandato.
Nesta articulao entre quem governa e os diferentes nveis de
gesto da agncia policial, tem-se que reconhecer a superioridade
deci-sria do primeiro, a palavra final, para que se possa governar
a polcia, dentro dos limites da lei e dos termos da poltica pblica.
Isso cor-responde a dinmicas nas quais a polcia, ou quem governa,
toma a iniciativa na alocao ou priorizao no uso de recursos,
buscando determinados resultados e apreciando certas consequncias
destes resultados. Aqui a ques-to no mais de subsdio de parte da
polcia, mas sim de sua participao na gesto politi-camente orientada
dos recursos policiais, em que a deciso final corresponde ponderao,
por quem governa, dos saldos policiais e po-lticos desta deciso. O
que se considera na alocao e prioridades de emprego dos recur-sos
policiais a aplicao da capacidade da polcia em ato. Dito de outra
maneira, tem-se a contraparte organizacional e poltica da
seletividade policial. Isso corresponde a uma maior relevncia da
governana policial na to-mada de deciso, expressa numa determinada
distribuio dos recursos policiais no espao, no tempo, ou em uma
atividade considerada prioritria. (...)
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A proposta de usos especficos para recursos policiais tambm pode
partir de que quem go-verna, seja em antecipao, ou imediatamente
diante de uma determinada questo, seja na preferncia por uma
determinada maneira de uso destes recursos. Pode ainda distinguir
cer-tas atividades e usos, seja de maneira episdi-ca, seja
determinando sua presena no prprio processo de elaborao de proposta
profissio-nal de uso dos recursos policiais. Pode tambm intervir no
momento em que uma dada situa-o se apresenta, trazendo o foco da
autoridade e a capacidade de aportar recursos adicionais, e no
apenas policiais, de quem governa. Pode participar no processo de
tomada de deciso policial diante do reconhecimento de uma
circunstncia, de um acontecimento, que de-manda prioridade poltica
em tempo real.
Num e noutro caso, o que venha a ser a deciso de uso dos
recursos policiais torna-se objeto de uma apreciao de quem governa
lado a lado com quem detm o comando num dado nvel hierrquico (ou no
que seja o arran-jo entre governo e agncia policial que quem
governa considere adequado). Esta apreciao considera o juzo de
mrito das alternativas profissionais de alocao de recursos e
priori-dades, construindo uma deciso que pondera resultados e
consequncias do uso de recursos policiais diante dos termos da
poltica pblica. Tem-se, assim, o exerccio da governana de polcia
por sobre e da governana policial, ar-ticulando as formas pelas
quais se usa do con-tedo profissional da segunda para permitir o
pleno exerccio da primeira. (...)
O ajuste poltico de planejamentos e ini-ciativas policiais, de
alocao e prioridade no
uso dos recursos policiais, uma das formas mais diretas em que
se tm a governana de polcia e a governana policial articuladas no
provimento do servio policial. Quando se re-conhece um padro de
alocao ou de priori-dade que o justifique, isto pode se tornar uma
questo que leva a mudanas na estrutura ou nas capacitaes da agncia
policial ou nos ru-mos da poltica pblica. Esta vivificao da
po-ltica pblica, da estrutura e das capacitaes policiais um dos
mais importantes efeitos da governana de polcia sobre a alocao e
prio-ridade no uso dos recursos policiais.
Mas h limites para o que se pode deman-dar da polcia, por parte
de quem governa, dependendo do que sejam os termos da legali-dade
de uma determinada polity e da dinmica poltica que constri a
legitimidade em certo momento. Pode no ser legal, ou ter um cus-to
inaceitvel em termos de legitimidade, que quem governe interfira
numa deciso policial, seja em termos da deciso policial de agir ou
no, seja no que se refere forma como a po-lcia decide agir.
O impositivo de Universalidade & Im-parcialidade constrange
quem governa de arbitrar quem deve ser vigiado, investigado, ou
preso, ou no, por exemplo. Da mesma for-ma, o que a poltica pblica
ou a governana policial tenham estabelecido como os termos formais
dentro dos quais se pratica a work-manship impe limites ao que quem
governa pode demandar que a polcia faa ou deixe de fazer na
realizao de seu trabalho. O reco-nhecimento do que seja a autonomia
diante da workmanship impede que quem governa arbi-tre o que um
policial