UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL GIULIA ANDREAZZA A INTERVENÇÃO URBANA COMO SUBSÍDIO DA PUBLICIDADE: PROJETO SOMOSINSTANTES Caxias do Sul 2015/4
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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
GIULIA ANDREAZZA
A INTERVENÇÃO URBANA COMO SUBSÍDIO DA PUBLICIDADE:
PROJETO SOMOSINSTANTES
Caxias do Sul
2015/4
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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
HABILITAÇÃO EM PUBLICIDADE E PROPAGANDA
GIULIA ANDREAZZA
A INTERVENÇÃO URBANA COMO SUBSÍDIO DA PUBLICIDADE:
PROJETO SOMOSINSTANTES:
Monografia do curso de Comunicação
Social, habilitação em Publicidade e
Propaganda da Universidade de Caxias
do Sul, apresentada como requisito para a
obtenção do título de bacharel.
Orientador: Prof. Me.Marcelo Wasserman.
Caxias do Sul
2015/4
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GIULIA ANDREAZZA
A INTERVENÇÃO URBANA COMO SUBSÍDIO DA PUBLICIDADE:
PROJETO SOMOSINSTANTES:
Monografia do curso de Comunicação
Social, habilitação em Publicidade e
Propaganda da Universidade de Caxias
do Sul, apresentada como requisito para a
obtenção do título de bacharel.
Aprovada em:
Banca Examinadora:
Prof. Me. Marcelo Wasserman
Universidade de Caxias do Sul – RS
Prof. Me. Ronei Teodoro da Silva
Universidade de Caxias do Sul - RS
Prof. Me. Isabel Almeida Marinho do Rêgo
Universidade de Caxias do Sul - RS
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos aqueles que, de uma forma ou de outra, contribuíram para
que este trabalho pudesse ser realizado. Em especial aos meus pais, Loirene e
Julio, por todo o apoio durante a caminhada universitária e por sempre derrubarem
barreiras para me proporcionar o melhor. Aos meus amigos, que
compreensivamente entenderam as minhas ausências durante esse período. Às
minhas amigas, melhores amigas, Betina e Bárbara, por terem abraçado a ideia do
projeto e junto a mim, terem transformado o Somosinstantes no grande case que é
hoje, sempre fazendo tudo com amor e por amor. Aos meus docentes, que sempre
me estimularam e deixaram claro suas expectativas comigo. Espero tê-las
alcançado. E ao meu professor, coordenador, orientador e amigo, Marcelo
Wasserman, por todo o suporte durante este percurso.
A todos esses, dedico essa monografia.
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RESUMO
Esta monografia trata sobre aspectos da arte urbana, abordando um de seus
desdobramentos: os cartazes de rua, conhecidos popularmente como lambe-lambe.
Também debate a origem histórica do cartaz, os seus diversos usos que foram
sendo remodelados com o passar do tempo e a sua relação com a Publicidade,
tendo como caso a ser estudado o projeto Somosinstantes. O principal objetivo do
trabalho, portanto, é analisar o impacto social da intervenção urbana realizada pelo
projeto Somosinstantes e dessa forma, buscar compreender como um projeto que
consiste em espalhar mensagens em cartazes lambe-lambe foi visto e interpretado,
a ponto de se tornar uma campanha publicitária. A pesquisa é conduzia por um
Estudo de Caso, tendo como referência o livro Planejamento e Métodos, de Robert
K. Yin (2005). O método Semiótico, de Umberto Eco, é a principal abordagem
utilizada para compreender alguns fenômenos que ocorreram no processo. O estudo
também conta com informações coletadas na Internet a partir da observação de
mensagens e rastros de informação deixados nas redes sociais por aqueles que se
envolveram e geraram mídia espontânea para o projeto. Também apresenta uma
reflexão acerca dos processos comunicativos presentes no espaço urbano, testando
hipóteses para comprovar que as intervenções urbanas são obras abertas e nos dão
a possibilidade de várias interpretações a partir do contexto cultural em que estão
inseridas.
Palavras-chave: arte urbana, lambe-lambe, Publicidade, projeto Somosinstantes.
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ABSTRACT
This monograph is about urban art, approaching one of its developments:
street posters, known as lambe-lambe. It also debates the historical origins of the
posters, their many usages that were remodeled along time and their relation with
Advertising, having as case of study the project Somosinstantes. The main purpose,
therefore, is to analyze the social impact of the urban intervention accomplished by
the project Somosinstantes and try to understand how a project, that is based on
spreading messages on lambe-lambe posters, was seen and interpreted to the point
of becoming an advertising campaign. The research is conducted by a Case Study,
having as reference the book Planejamento e Métodos, de Robert K. Yin (2005). The
Semiotic method, by Umberto Eco, it is the main approach used to understand some
phenomena that have occurred along the process. The study also relies on
information obtained from the internet, based on the observation of messages and
tracks of information left behind on social networks by those who became involved
and generated spontaneous media for the project. It also presents thoughts about the
communication process present in the urban space, testing hypothesis to prove that
the urban interventions are open pieces and allow us many different interpretations,
depending on the cultural scenario which they are inserted in.
Key words: urban art; lambe-lambe, Advertising, project Somosinstantes.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Marylin – Andy Warhol, 1967. .................................................................... 16
Figura 2: Sopa Campbell - Andy Warhol, 1962. ........................................................ 17
Figura 3: No Carro - Roy Lichenstein, 1963. ............................................................. 18
Figura 4: Mural na Houston Street – Keith Haring, 1982. .......................................... 19
Figura 5: Basquiat trabalhando em uma parede, 1983. ............................................ 21
Figura 6: Notary, Jean-Michel Basquiat, 1983. .......................................................... 22
Figura 7: Pintura rupestre em parede de caverna. .................................................... 24
Figura 8: Cartazes de filmes com estética urbana na Nouvelle Vague ..................... 25
Figura 9: Follow Your Dreams, Banksy, 2010. .......................................................... 32
Figura 10: Crono Festival – OSGEMEOS, Lisboa, 2010. .......................................... 33
Figura 11: Stickers do Toniolo colados nas calçadas de Porto Alegre. ..................... 34
Figura 12: Santa Cola em ação – Smile Again. ......................................................... 35
Figura 13: Cartaz de J. Chéret, 1895. ....................................................................... 50
Figura 14: Jules Chéret exibindo seu trabalho à Henri de Toulouse-Lautrec. ........... 51
Figura 15: Moulin Rouge, Henri de Toulouse-Lautrec, 1891. .................................... 52
Figura 16: Cartaz Russo - Rodchenko, 1927. ........................................................... 53
Figura 17: I Want You for U.S. Army , 1917 e "Ein Volk, Ein Reich, Ein Führer”, 1938.
.................................................................................................................................. 54
Figura 18: Lambe-lambes artísticos compondo o cenário urbano. ............................ 56
Figura 19: Lambe-lambes comunicando greve dos bancários. ................................. 57
Figura 20: Lambe-lambe vendendo planos de operadoras de celular, nas ruas de
Porto Alegre. ............................................................................................................. 58
Figura 21: Cartaz de divulgação do lançamento do filme “Ninguém ama ninguém por
mais de dois anos”. ................................................................................................... 59
Figura 22: Lambe-lambe como ferramenta publicitária na divulgação de shows. ..... 60
Figura 23: Lambe-lambe do Somosinstantes compondo as ruas. ............................. 64
Figura 24: Lambe-lambes de projetos nas ruas de Caxias do Sul. ........................... 65
Figura 25: Lambe-lambe do Somosinstantes inserido no contexto urbano. .............. 68
Figura 26: Depoimento de Jennifer sobre sua interação com os cartazes lambe-
lambe......................................................................................................................... 69
Figura 27: Mensagens do Somosinstantes nas bancas de revista de Porto Alegre. . 71
Figura 28: Comentário publicado na Fanpage do Somosinstantes. .......................... 72
8
Figura 29: Positividade nas ruas de Porto Alegre. .................................................... 74
Figura 30: Depoimento na fanpage do Somosinstantes após veiculação de
campanha com a Sinergy. ......................................................................................... 75
Figura 31: #sinergy sendo utilizada de maneira espontânea no Instagram. ............. 76
Figura 32: Gentileza pelas ruas de Porto Alegre. ...................................................... 77
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................11
2. POP E ARTE URBANA ........................................................................................ 15
2.1 Movimento Pop Art ........................................................................................... 15
2.2 Da margem à cena profissional ........................................................................ 19
2.3 A intervenção artística urbana e suas derivações ............................................ 22
2.4 De observadores para autores ......................................................................... 29
3. LAMBE-LAMBE COMO PRODUTOR DE SENTIDO ........................................... 37
3.1 Uso e interpretação .......................................................................................... 37
3.2 Lambe-lambe como obra aberta ...................................................................... 39
3.3 Subjetivação no/do espaço urbano .................................................................. 42
4. LAMBE-LAMBE COMO MÍDIA PUBLICITÁRIA .................................................. 48
4.1- Cartaz: conceito e história............................................................................... 48
4.2 - O uso histórico do cartaz como mídia ............................................................ 49
4.3 Lambe-lambe como ferramenta de comunicação ............................................ 54
5. ESTUDO DE CASO: PROJETO SOMOSINSTANTES ........................................ 63
5.1 – Caxias do Sul ................................................................................................ 63
5.2 – Porto Alegre .................................................................................................. 70
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 80
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 82
8. ANEXOS ............................................................................................................... 89
8.1 Projeto de Trabalho de Conclusão de Curso ...................................................91
8.2 Fragmento da Lei Cidade Limpa .................................................................... 105
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1. INTRODUÇÃO
A partir do século XX, novos movimentos artísticos surgiram com o intuito de
quebrar a separação que havia entre a arte e o mundo até então. Outras formas de
expressões artísticas, mais undergrounds1 e menos elitizadas começaram a surgir,
ultrapassando os limites do conceito de que arte só podia ser encontrada em
galerias e museus. Essas novas expressões artísticas que, por muitas vezes foram
vistas como marginais, nasceram a partir de outros conceitos de movimentos
artísticos já existentes. Assim, entende-se que a arte de rua nasceu nos últimos
suspiros da Pop Art, como uma maneira de diversificar e dar espaço para diferentes
tipos de artistas e trabalhos. Foi das ruas que surgiram grandes nomes da história
da arte contemporânea mundial, como Kaith Haring e Jean-Michel Basquiat.
Se considerarmos a arte como uma forma de comunicação visual, é possível
acompanhar suas várias etapas, da arte rupestre até a sua popularização nas ruas
das grandes metrópoles. No Brasil, a década de 1960 foi um período de grande
efervescência para variados tipos de arte, principalmente a chamada street art2. Por
aqui, a arte urbana surgiu como uma espécie de denúncia política e social,
manifestada através de pichações, grafite e cartazes. Foi nesse contexto local que
surgiram os cartazes de rua, carregando principalmente apelos ideológicos,
produzidos em quantidade e espalhados pelas cidades. Deste modo portanto, a arte
de rua foi por muito tempo interpretada como transgressão, mas aos poucos passou
a se transformar em um fenômeno compreendido e incorporado pelo pensamento e
gosto comum de uma parte significativa da população e da indústria cultural.
(SANTOS, 2010).
O homem urbano encontrou nas intervenções urbanas uma forma de ter voz,
de se destacar e se fazer presente dentro do contexto onde está inserido. Hoje,
encontramos as cidades tomadas por movimentos culturais, sejam graffitis,
pichações, adesivos, cartazes, intervenções, etc. A rua passou a ser entendida
como um espaço livre para o artista se expressar. Foi a partir dessa interpretação
que surgiram os interventores urbanos, pessoas que buscam deixar a sua marca na
cidade, provocando a subjetivação e a reflexão sobre o uso desse espaço. A arte de
rua parece atingir e inspirar o público, provocando surpresas, questionamentos e
1 Expressão usada para designar ambiente cultural que foge dos padrões comerciais, modismos e da mídia.
2 Em inglês, arte de rua.
12
reflexões. No campo da semiótica, toda intervenção passa a ser considerada um
signo, ou seja, aquilo que representa algo para alguém. Percebe-se que cada
pessoa interpreta um signo de uma maneira diferente, pois segundo Eco (2000),
todo signo é uma obra aberta que não possui somente uma interpretação.
Compreendemos portanto, o signo de acordo com nossa subjetividade e desse
modo, a arte urbana estabelece uma relação diretamente interligada com a
subjetivação da cidade. O modo como a arte solicita o espectador desdobra-se na
sua repercussão social, nos possíveis efeitos que ela venha a ter sobre a sociedade.
A subjetividade de cada indivíduo é replicada na significação do código que as
intervenções urbanas carregam.
Dentre as intervenções urbanas a qual nos referimos, destacamos os
cartazes de rua, conhecidos como lambe-lambe. Durante a história, o cartaz já teve
diferentes usos, mas foi a partir do surgimento da impressão litográfica que começou
a se fundar a história do cartaz moderno. Na era industrial, o cartaz representava
uma nova forma de comunicação, se apresentando na divulgação de shows em
cabarés na Paris dos anos 1800. Já na Segunda Guerra Mundial, o papel do cartaz
era a disseminação de mensagens político-ideológicas. A persuasão era um modo
muito utilizado nessas peças, que acabavam por ter uma função extremamente
propagandística. Hoje, os cartazes encontram concorrência com outros meios mais
modernos de comunicação, porém, ainda são utilizados na divulgação de eventos,
em pontos comerciais e para fins artísticos. Com o passar dos anos e com a
evolução da técnica, o cartaz se manteve cada vez mais ligado ao design gráfico. As
transformações desse meio de comunicação em alguns casos, em massa, refletem a
tecnologia, a estética e o pensamento de cada época.
Portanto, essa monografia explora o case Somosinstantes, um projeto de arte
urbana que espalha cartazes lambe-lambe com apelos sociais pelas cidades e que
veio a se tornar uma campanha publicitária. Nesse trabalho, procuramos analisar a
construção simbólica realizada pela população a partir do contato com os cartazes
lambe-lambe na cidade de Caxias do Sul, assim como dissertar sobre os subsídios
para mediação da intervenção urbana a fim de apreciar a linguagem visual como um
modo particular de ver, sentir e perceber o mundo. Outra intenção é identificar o que
foi atribuído como sentido e significado para causar o desdobramento do projeto de
intervenção urbana a uma campanha publicitária, podendo assim, analisar o
13
processo de atribuição de sentido em relação à intervenção urbana realizada com a
colagem de cartazes lambe-lambe do projeto Somosinstantes na cidade de Caxias
do Sul como subsídio para a realização de campanhas publicitárias.
O processo de estudo ocorrerá através da metodologia de estudo de caso,
tendo omo base o autor Robert K. Yin e o método semiótico, de Humberto Eco.
Dessa maneira, analisaremos a interpretação e atribuição de sentido da população
em relação aos cartazes de rua na cidade de Caxias do Sul e a visão da agência de
publicidade quanto a sua a propriação sobre o projeto de intervenção urbana na
cidade de Porto Alegre, buscando entender também como a publicidade pode
subsidiar de manifestações de arte urbana, propagando mensagens de fundo social
sem abrir mão da possibilidade de utilização comercial.
14
15
2. POP E ARTE URBANA
"Arte não é uma noção, mas uma ação. Não importa o que a arte é e sim o que a arte faz." Gilles Deleuze
2.1 Movimento Pop Art
Durante muito tempo, o mundo da arte foi pensado como fruto de uma
criatividade centrada na individualidade do artista. A partir do século XX, essa
separação entre a arte e o mundo foi perdendo força na medida em que movimentos
diversos buscaram quebrar esses limites.
O termo “Pop Art” foi utilizado, pela primeira vez pelo crítico inglês Lawrence
Alloway, para descrever as pinturas que celebravam o consumismo do pós-guerra,
desafiavam a psicologia do expressionismo abstrato e adoravam o materialismo.
(MOUTINHO, 2000). Ele se referia a um conjunto de imagens e representações
surgidas nos novos âmbitos da mídia de massa do cotidiano e da publicidade
daquela época. Foi em 1956 que tivemos os primeiros registros do surgimento do
movimento artístico Pop Art, tendo como cenário a Inglaterra. Tudo aconteceu em
um período histórico marcado pelo reerguimento das grandes sociedades industriais
que haviam sido afetadas pelos efeitos da Segunda Guerra Mundial, se espalhando
também para a América e lá alcançando seu ápice, nos Estados Unidos.
O movimento era formado por artistas que, após estudarem os símbolos e
projetos das propagandas americanas que representavam a cultura de massa e o
cotidiano, passaram a usá-los e transformá-los em tema de suas obras. Eles
representavam os componentes mais ostensivos da cultura popular, de poderosa
influência na vida cotidiana da segunda metade do século XX. Era a volta de uma
arte figurativa, em oposição ao expressionismo abstrato que dominava a cena
estética desde o final da Segunda Guerra (SCIENZA, et al, 2013).
O Pop Art foi a vez da cultura de massa, do culto às imagens televisivas, às
fotos, às histórias em quadrinhos, às cenas impressas nas telas dos cinemas, à
produção publicitária. Enquanto movimento, ele abraça as diversas manifestações
da cultura de massa, feita para as multidões e produzida pelos grandes veículos de
comunicação. O Pop Art expõe deste modo traços de uma sociedade marcada pela
industrialização, pela repetição e a criação de ícones instantâneos. Esse movimento
16
adotou os grandes centros urbanos norte-americanos e britânicos como o ambiente
para que seus primeiros representantes tivessem inspiração para criar as suas
obras. A influência do movimento pop permanece até hoje e reúne artistas de
interesse comum pelas artes gráficas, imagens comerciais, técnicas de reprodução e
de símbolos que representam a cultura de massa (REBELATO, et al, 2012).
Um dos principais representantes da Pop Art foi Andy Warhol, considerado o
maior astro da cultura pop. Antes de se destacar como artista era ilustrador e criava
anúncios publicitários. Assim, misturou arte e publicidade em muitas das suas obras,
retratando o consumismo de forma inovadora. Mostrou sua concepção da produção
mecânica da imagem em substituição ao trabalho manual numa série de retratos de
ídolos da música popular e do cinema (DE SÁ; SOCORRO, 2012). Um de seus
trabalhos mais conhecidos são as múltiplas versões coloridas de “Marilyn Monroe”,
produzida no ano de 1967.
Fonte: <http://www.tate.org.uk/>. Acesso em 17 set. 2015.
Figura 1: Marylin – Andy Warhol, 1967.
17
Usando a técnica de serigrafia, ele destacou a impessoalidade do objeto
produzido em massa para o consumo, como garrafas de Coca-Cola, as latas de
sopa Campbell, automóveis, crucifixos e dinheiro. (REBELATO et al, 2012). Sua
influência é sentida até hoje dentro da arte e principalmente da publicidade.
Fonte: <http://ultimosegundo.ig.com.br>. Acesso em 17 set. 2015.
Roy Lichenstein é outra figura da Pop Art que se destacou através da
linguagem dos quadrinhos. Uma de suas principais obras, “No Carro”, utiliza desse
meio para explorar situações urbanas. Ainda hoje, diversos artistas empregam as
referências da Pop Art para conceber quadros, esculturas e outras instalações.
Figura 2: Sopa Campbell - Andy Warhol, 1962.
18
Fonte:< http://www.lichtensteinfoundation.org>. Acesso em 17 set. 2015.
No Brasil, a Pop Art iniciou durante a década de 1960 (REBELATO, et al,
2012). Os artistas brasileiros também assimilaram os expedientes da Pop Art como o
uso das impressões em silkscreen3 e as referências aos “gibis”. Por aqui, seu
espírito foi subvertido, já que nosso pop usou da mesma linguagem, mas
transformou-a em instrumento de denúncia política e social.
Os artistas daqui não levavam totalmente em conta todos os aspectos do movimento norte-americano, mas sim a forma e a técnica utilizada, com os meios de reprodução em série. Para isso, costumavam imprimir sua personalidade e opinião crítica as obras - além de revelarem sua insatisfação com a censura dentro do regime militar. (DE SÁ; SOCORRO. 2012, p.4)
Assim surgiam os cartazes de rua com apelos ideológicos, produzidos em
massa e espalhados pela cidade. A década de 60 foi de grande exaltação para
vários tipos de arte no país, uma resposta artística da situação política da época.
3
Silk-screen: também conhecido como serigrafia, é um processo de impressão no qual a tinta é
vazada – pela pressão de um rodo ou puxador – através de uma tela preparada. Mesma técnica
utilizada para fazer estampas.
Figura 3: No Carro - Roy Lichenstein, 1963.
19
2.2 Da margem à cena profissional
A Pop Art foi um modo de diversificar e dar espaço para diferentes tipos de
artistas e trabalhos. Ao quebrar barreiras de arte individual, ajudou para que outros
trabalhos ganhassem visibilidade e reconhecimento.
Um exemplo disso é o do artista Keith Haring, que teve as ruas como local de
início de sua carreira e chegou a ser considerado um ícone da cultura underground
de Nova York. Haring encontrou um meio muito eficaz para se comunicar com o
público de massa: painéis publicitários que não estavam sendo utilizados nas
estações de metrô de Nova York. Esses painéis eram cobertos por um papel preto
fosco, ideal para que Haring começasse a espalhar a sua arte através de desenhos
com giz branco. Com a eficácia da ideia comprovada, passou a produzir centenas
destes desenhos nos espaços públicos. O fluxo contínuo de imagens se tornou
familiar para os frequentadores das estações de metrô de Nova York, que passaram
a serem admiradores desse trabalho4.
Segundo o próprio Haring, o metrô foi um laboratório para trabalhar suas
ideias e ter novas experiências. Pouco tempo depois, ele já estava participando de
bienais e pintando diversos muros pelo mundo todo, inclusive o Muro de Berlin.
Chegou a trabalhar com profissionais renomados, desenvolvendo campanhas
publicitárias para grandes marcas, como Absolut Vodka e Coca-Cola5.
Fonte: <www.haring.com>. Acesso em 17 set. 2015.
4 Fonte: <http://www.haring.com/!/about-haring/bio>
5 Esse texto e os demais são tradução da autora. http://www.haring.com/!/about-haring/bio
Figura 4: Mural na Houston Street – Keith Haring, 1982.
20
Ao sair da margem da arte de rua e alcançar sua ascensão no mundo
artístico, o artista resolveu empreender. Abriu o Haring Pop Shop, uma loja de varejo
no SoHo6 que vendia camisetas, brinquedos, cartazes, botões e ímãs com suas
imagens. Para Haring, a loja era uma extensão do seu trabalho. Essa sua iniciativa
foi muito criticada no mundo da arte, pois muitos viam o fato do artista colocar sua
arte ao alcance de um público mais amplo como estar denegrindo seu próprio
trabalho. Mesmo assim, Haring continuou comprometido com seu desejo de tornar
sua arte acessível para todos.
O uso de projetos comerciais permitiu-me chegar a milhões de pessoas a quem eu não teria atingido permanecendo um artista desconhecido. Eu assumi , afinal, que o ponto de fazer arte era comunicar e contribuir para a cultura. Se eu só expusesse minhas pinturas em uma galeria, provavelmente estaria frustrado (HARING, tradução do autor).
Esse seu projeto empreendedor recebeu apoio de amigos, fãs e mentores,
incluindo Andy Warhol. Haring esteve determinado a dedicar a sua carreira para a
criação de uma arte verdadeiramente pública (SANTOS, 2010).
Ainda compondo a cena, o brasileiro Romero Britto, artista plástico de grande
renome no âmbito mundial passa a ser outra figura que deixa as ruas e ingressa na
arte do período pós-moderno. Britto é mais um nome que surgiu das ruas e
encontrou através do movimento Pop Art espaço para deixar a margem e passar a
contribuir com a cena. Ele combinou influências do cubismo com pop para criar um
estilo icônico, vibrante e alegre, que fez com que sua obra tivesse forte ligação com
a publicidade. Romero Britto assinou trabalhos com Andy Warhol e Keith Haring, o
que fez com que sua carreira artística decolasse (SANTOS, 2010). Hoje, Britto
segue trabalhando com o mesmo conceito, tendo obras suas espalhadas por muitos
lugares do mundo inteiro.
Não podendo deixar de citar outro grande nome da arte pública, o
responsável pela ascensão e mercantilização da arte de rua moderna, Jean-Michel
Basquiat. Se o grafite aflorou em meio à cultura marginalizada e atingiu o status de
arte, deve-se grande parte disso à sua figura. Foi na década de 1970 que suas
obras, cheias de mensagens poéticas espalhadas pelos prédios abandonados em
Manhanttan, atraíram a atenção da imprensa (BARDARI, 2010). As pinturas
6 South of Houston, distrito de entretenimento de Londres.
21
presentes em lugares inusitados logo causaram forte impacto na mídia e na
população.
Fonte: <www.theguardian.com>. Acesso em 18 set. 2015.
Basquiat foi um dos pioneiros da chamada street art e, certamente, o mais
célebre grafiteiro de todos os tempos. Tornou-se lenda ao cruzar o cenário artístico
de Nova York e revolucionar o modo de ver a pintura nos Estados. O artista foi
apadrinhado por Andy Warhol, o que ajudou com o desenvolvimento de sua carreira.
Basquiat começou a pintar telas, e, de mero pichador, passou a ser considerado
representante privilegiado de uma escola que futuramente passaria a se chamar
neoexpressionista (BARDARI, 2010).
Foi com Basquiat que, o grafite, por muito tempo interpretado como
transgressão, passou a partir deste marco a se transformar em um fenômeno
compreendido e incorporado pelo pensamento e gosto comum da maioria da
população e da indústria cultural (CAIRRÃO, 2011).
Figura 5: Basquiat trabalhando em uma parede, 1983.
22
Assim, vamos acompanhando o processo de desmarginalização da arte
urbana em um período de pós-modernidade, que passa a modificar também a nossa
percepção de tempo e espaço.
2.3 A intervenção artística urbana e suas derivações
A cena urbana não é constituída apenas de prédios, casas, ruas e avenidas.
Ela é o resultado material e imaterial da concentração de seres humanos que, há
séculos, têm a cidade como seu habitat físico e simbólico. A cidade é o reflexo do
homem. Toda sua formação resigna de significações por ele criadas. Na busca de
se expressar livremente, o indivíduo encontra formas de deixar sua marca no
cenário e ressignificar o espaço.
Nesse trabalho, utilizaremos do termo arte urbana como todo e qualquer
movimento artístico e visual que está inserido em espaços públicos, mais
precisamente, na cena urbana.
A expressão artística e criativa, mal vista pela sociedade e perseguida por lei,
enquanto expressão cultural dos ambientes urbanos surgiu no fim do movimento
Figura 6: Notary, Jean-Michel Basquiat, 1983.
Fonte: <http://www.kellylogue12.wordpress.com>. Acesso em 18 set. 2015.
23
Pop Art. Desta forma, podemos definir intervenção urbana como movimentos
artísticos relacionados a intervenções visuais realizadas em espaços públicos. É um
movimento fora dos padrões comerciais que foi ganhando forma com o decorrer do
tempo e se estruturando, criando marcos espaciais e propondo ao público reflexões
críticas e sociais. As intervenções urbanas recriam ambientes e podem ser desde
pequenas inserções até grandes instalações.
O homem urbano encontrou nas intervenções urbanas uma forma de ter voz,
de se destacar e se fazer presente dentro do contexto onde está inserido, na qual
vários estímulos visuais almejam o tempo todo conquistar a atenção de quem por ali
passa. Jayme Paviani, em seu livro Estética Mínima, afirma que a arte simplesmente
intervém na realidade material com objetivo de se expressar. Realizada a tarefa, o
material volta à sua própria sorte, como acontece nos trabalhos realizados na rua.
(PAVIANI, 2003 p. 21).
Ruas, avenidas, praças, monumentos, edificações configuram-se como uma realidade sígnica que informa o seu próprio objeto: o contexto urbano. Nele se aglutinam, num único conjunto, várias outras linguagens: a urbanização, a arquitetura, o desenho industrial dos equipamentos, a publicidade, a programação visual, a tecnologia decorrente do processo de industrialização, os veículos de comunicação em massa. Entretanto, o elemento que aciona esse contexto é o usuário, e o uso é a sua fala, sua linguagem. A transformação da cidade é a história do uso urbano como significado da cidade. Sua vitalidade nos ensina o que o usuário pensa, deseja, despreza, revela suas escolhas, tendências e prazeres. (FERRARA, 1988, p.4)
Historicamente falando, o homem sempre buscou ter voz ativa. A intervenção
visual na sociedade teve início com o instinto primitivo dos povos de decorar seu
ambiente e de usar as superfícies das paredes para expressar ideias, emoções e
crenças (HONORATO, 2009). Estudiosos afirmam que as primeiras formas de
intervenção foram as pinturas rupestres. Elas tinham o propósito de demarcar
território (SOUZA, 2012).
24
Fonte: <www.lapaletadelartista.wordpress.com>. Acesso em 18 set. 2015.
Com a evolução do homem, foram criadas outras formas de se comunicar
com as pessoas e de interagir com o ambiente em que se está inserido. Assim, o
indivíduo foi se adaptando às transformações e encontrando brechas para se fazer
ser ouvido e visto.
Existem registros de arte de rua desde a década de 1900. Em 1922 ocorreu o
movimento muralista mexicano, onde a população clamava por novas políticas e
artistas locais viram no muralismo o melhor caminho para expor suas mensagens.
Uma figura dessa época é Diego Rivera, marido da pintora Frida Kahlo, que
dedicou-se à pintura mural. Rivera desenvolveu um trabalho grandioso e com
grande expressividade, tratando de ideias comunistas de uma forma idealista e
utópica. Porém, é na França dos anos de 1960, considerada por muitos autores o
berço das intervenções urbanas, que culturas jovens e populares começaram a
ocupar alguns espaços públicos na cidade de Paris (SOUZA, 2012). Lá, jovens
também passaram a se manifestar política e ideologicamente nas ruas, através dos
muros, reivindicando suas causas. Também vimos um reflexo dessa cultura na
Nouvelle Vague, onde os cartazes de filmes passam a ter uma estética urbana forte.
Figura 7: Pintura rupestre em parede de caverna.
25
Figura 8: Cartazes de filmes com estética urbana na Nouvelle Vague
.
Fonte: <http://movieposters.2038.net>. Acesso em 19 out. 2015.
Anos depois, o cenário das aparições de intervenções urbanas veio a ser os
Estados Unidos, mais precisamente a cidade de Nova York, palco da
multiculturalidade e da marginalização social, que passou a presenciar a invasão e
proliferação de frases, desenhos e caligrafias elaboradas.
Os jovens, principalmente homens, chamados de writers, passaram a assinar seus nomes ou apelidos com letras grandes e estilizadas, conhecidos como tags, nas laterais dos trens subterrâneos. Assim, surpreenderam a população da cidade e logo ícones e frases da cultura pop americana começaram a aparecer como conteúdo das inscrições. (SOUZA, 2012, p. 20).
A partir dessas aparições e intervenções que passaram a se integrar e fazer
parte do imaginário de cidade, a arte do grafite passou a inscrever-se nas
manifestações de arte contemporânea. Na América Latina, o processo não foi
diferente: com o mesmo princípio, as ruas foram tomadas por mensagens que
passaram a constituir e integrar o espaço urbano. Segundo Souza (2012), São Paulo
foi a primeira cidade do Brasil a registrar o grafite contemporâneo.
Esse foi um momento no qual os artistas buscavam romper com as
concepções monumentais clássicas e aproximaram-se dos espaços não
convencionais da arte, interagindo desta forma, diretamente, com o espaço urbano.
As ruas tornaram-se disseminadoras de ideais, fazendo com que seja cada vez mais
26
comum ter estampado em plena praça pública alguma forma de expressão, seja
política, cultural ou ideológica.
Passando por muitas etapas, desde os primórdios, através da arte rupestre
até sua disseminação da Europa para a América, percebemos que houveram
diferentes motivos pelos quais a sociedade escolheu recorrer à rua e não à tela para
se expressar. A intervenção artística urbana é um modo de arte que dialoga
diretamente com as pessoas, pois é criada e pensada para estar nas ruas. Segundo
Vera Pallamin (2000), a arte urbana, portanto, é vista como um trabalho social, um
ramo da produção da cidade, expondo e materializando suas conflitantes relações
sociais. Olívio Tavares Araújo (1985) também acrescenta que toda arte, em espaço
público ou não, e em qualquer momento da história da cultura, foi sempre um
fenômeno social. Basta pensarmos que ela é um fenômeno das relações entre seres
humanos, e que o artista, assim como qualquer outra pessoa, faz parte de uma
estrutura social.
Desse modo, Souza (2012) afirma que a intervenção urbana ocorre de
maneira espontânea, aleatória e inesperada na paisagem urbana, sem seguir
regras. As intervenções passam a fazer parte do tecido da cidade e a transforma de
forma contínua, fazendo parte do cenário urbano e se interligando com as ruas, os
prédios, as moradias, as praças, os muros e os monumentos. Elas se integram ao
cotidiano da cidade ao mesmo tempo em que conta a história de seus habitantes por
meio do poder simbólico da representação individual ou coletiva.
A demarcação do território, a liberdade de expressão, a crítica política e a
manifestação puramente artística – motivos que impulsionaram diferentes
movimentos em diferentes épocas – agora dividem o mesmo tempo e espaço e cada
qual se distinguem por possuir materiais, métodos e funcionalidades que lhe são
próprios (PALLAMIN, 2000).
Observando o ambiente, percebe-se que a intervenção urbana vem se
diversificando, incorporando novas técnicas ao processo de criação e produção.
Dentre elas, podemos citar como seus principais desdobramentos a pichação, o
grafite, o stencil, o sticker e o lambe-lambe. Alguns sendo reconhecidos como arte,
outros ainda beirando a margem, são trabalhos voltados para a experiência estética,
com a intenção de produzir outras maneiras do público perceber o cenário urbano.
27
A pichação é o ato de escrever em muros, paredes e postes, através de
palavras cifradas. Juntas, formam um alfabeto excêntrico e pouco legível. Em geral
evidenciam a habilidade em escrever esses símbolos, mas sem preocupação
plástica, cuja premissa é a divulgação através da repetição. Segundo Cartaxo “é
uma manifestação anônima, sem reflexão apriorística e informalismo técnico” (2009,
p. 8). Hoje, a pichação ainda está associada a vandalismo e marginalidade.
Da evolução dos pichos, podemos citar o grafite, inscrição caligrafada ou
desenho pintado ou gravado sobre um suporte que não é normalmente previsto para
esta finalidade. Normalmente privilegia a imagem. Segundo Silva (2014, p. 23), é o
ato de materializar através da escrita ou representações ocasionais, desejos e
frustrações de uma coletividade e exaltar formas que retomam ou questionam seus
territórios sociais. Contudo, tanto a pichação quanto o grafite partilham o mesmo
discurso transgressor e a inscrição no universo cultural da cidade.
A técnica do stencil utiliza moldes vazados em telas de papelão através das
quais o spray transfere para a superfície escolhida o desenho ali contido. Segundo
Queiroz (2010), essa técnica permite a reprodução rápida de imagens como
mecanismo de comunicação semelhante ao da publicidade.
Os stickers são etiquetas adesivas espalhadas pela cena urbana. Conforme
Oliveira (2006), são papéis adesivos produzidos em número suficiente para serem
espalhados pela cidade, criando percursos, apropriações territoriais e
reconhecimentos em áreas distintas. Esses adesivos são considerados vantajosos
por sua versatilidade e fácil aplicação.
Já o lambe-lambe é um cartaz com conteúdo artístico e/ou crítico fixado em
espaços públicos: paredes, postes, pisos, tetos e placas nas ruas. Já adquiriram o
status de manifestação estética e constituem uma das principais vertentes do pós-
grafite. Segundo Souza (2008), o propósito é constituir uma resposta à massificação
da propaganda, com a qual disputam espaço em meio à poluição visual da cidade.
Podem ser pintados individualmente com tinta látex, spray ou guache ou serem
feitos em série com reprodução através de copiadoras ou silk-screen. São fixados na
parede com o uso de cola, geralmente caseira.
Para outros autores, as intervenções urbanas têm caráter de reconstruir e
ressignificar o cenário da cidade:
28
Balões coloridos, tags ou assinaturas, estêncis, stickers ou selos, e cartazes são novas armas para assaltar os espaços urbanos. Da marca política passa-se à expressão artística. Essa invasão de personagens, gestos, sinais ambivalentes de todo o tipo toma paredes e muros, metrôs, outdoors, parques e cada canto onde seja possível fazer figuras. Os novos artistas urbanos recriam a cidade como se estivesse sempre em obras (SILVA, 2014, p.143).
Nas últimas décadas o grafite ganhou notoriedade, não sendo mais
considerado pela comunidade como um ato de vandalismo. Porém, isso ainda não
acontece com as outras formas de manifestações artísticas, como é caso do cartaz
lambe-lambe, muito comum em grandes metrópoles, porém, ainda não reconhecido
como arte em outras realidades.
Há a falta também de registros que valorizem o desdobramento da arte
urbana além da pichação e do grafite, ou seja, que aponte a mistura dessas duas
vertentes com o sticker, o stencil e o lambe-lambe.
Armando Silva (2014) afirma que estamos vivendo em uma época com menos
arte em seu sentido formal de obra reconhecida, porém com mais estética, no
sentido de maior uso de um efeito sensorial e de forma, e isso faz com que muitas
vezes, sem que percebamos, se estabeleçam imaginários estéticos que podem dar
testemunho do modo de vida urbano nos dias de hoje. Para ele, para a arte chegar
às ruas no sentido de arte pública, deve seguir quatro passos principais:
inicialmente, deve sair dos espaços tradicionais de exposição como galerias e
museus, que têm a necessidade de se transformar em espaços de cruzamento de
expressões. Deve desenvolver modos de se fazer ou de se mostrar sob perspectivas
contemporâneas, sendo intervenções, performances, instalações que reconstroem o
imaginário coletivo. Também devem produzir ações políticas dentro da vida
cotidiana, tomando a cultura como expressão do urbano e, por último, desenvolver
uma atitude que seja mais do que a arte em si, uma atitude de estética social do
cotidiano.
Os significados da arte urbana desdobram-se nos múltiplos papéis por ela exercidos, cujos valores são tecidos na sua relação com o público, nos seus modos de apropriação pela coletividade. Há uma construção temporal de seu sentido, afirmando-se ou infirmando-se. assim, tais práticas podem contribuir para a compreensão de alterações que ocorrem no urbano. (PALLAMIN, 2000, p.19)
29
Os gêneros urbanos de arte reivindicam mais do que um sentido artístico.
Eles buscam uma estética da vida social. Portanto, a arte pública deve ser
considerada além do ponto de vista espacial, de fato ela deve possuir uma relação
com o espaço urbano e com a comunidade na qual está inserida.
2.4 De observadores para autores
A arte realizada nos espaços públicos se torna uma estratégia de
aproximação do público com a realidade. Segundo Paviani (2003), a arte passa a
ser a manifestação de uma nova realidade, uma tentativa de buscar novamente o
verdadeiro, o permanente. A maioria das intervenções artísticas urbanas lida com o
conceito de site-specific7, que remonta às experiências de intervenção em espaços
urbanos dos anos 60 e 70, sendo obras que configuram uma situação espacial
específica, levando em conta as características do local, e que não podem ser
apreendidas senão ali. Segundo Cartaxo (2009), a adoção dos espaços públicos
imprime novas questões: a imperceptibilidade da obra como tal, o artista-anônimo, a
efemeridade da obra e a sua dissolução na estruturacidade.
Toda obra de site-specific constrói uma situação, isto é, estabelece uma relação dialógica e dialética com o espaço. Ao contrário da escultura modernista que manifestava indiferença pelo espaço ao manter-se sob um pedestal, revelando, assim, uma ausência de lugar ou de um lugar determinado, a obra de site-specific dá ênfase ao lugar ao incorporá-lo. Como realidade tangível, a arte site-specific considera os elementos constitutivos do lugar: as suas dimensões e condições físicas. Estas obras referem-se ao contexto ao qual se inserem oferecendo uma experiência fundada no ‘aqui-e-agora’, tendo em vista a participação do público (responsável pela conclusão das obras). O imediatismo sensorial (extensão espacial e duração temporal) revela a impossibilidade de separação entre a obra e o seu local de instalação. (CARTAXO, 2009, p.4)
Existem grupos de pessoas de se fazem presentes na urbe e que têm
iniciativas de ressignificá-la. São conhecidos como interventores urbanos, que
deixam sua marca na cena urbana com uma subjetivação e reflexão sobre o uso
desse espaço. Os interventores lançam seu olhar para o espaço urbano e
desenvolvem ali seus próprios projetos.
7 Trabalhos de site- specific em arte são aqueles que acontecem em determinados lugares e
momentos escolhidos pelo artista.
30
A cidade passa a ser um território fértil para as ações de intervenções
urbanas. Através delas, é possível estabelecer relações diretas com a cidade,
explorando o seu universo simbólico. As intervenções fogem do uso rotineiro do
espaço público, provocando reflexões por quem ali passa. As cidades podem ser
remodeladas, ressignificadas, transformadas. Vera Pallamin (2000) afirma que os
significados de um lugar se alteram em decorrência das ações sociais que sobre ele
se exercem.
As poéticas da arte nos espaços públicos permeiam, além das questões
físicas e culturais da cidade, outras fundadas numa dimensão filosófica, em que a
categoria estética do sublime ressurge no contexto contemporâneo (CARTAXO,
2009). A cidade se converte em um reflexo do mundo e o artista, que se mantém
atento às transformações, a utiliza como meio de reflexão das relações entre o
sujeito e a realidade.
Passar de observador para autor exige muita sensibilidade do indivíduo. É
preciso educar o olhar e os sentidos para aprender a ler imagens e vivenciar os
espaços criticamente. Paviani (2003) afirma que a nova arte, quando autêntica,
torna-se contínua na busca da sua função social, que por muitas vezes, é definida
como função crítica. Segundo os interventores Poro (2014), precisa-se ver e pensar
sobre o que acontece ao nosso redor.
Os espaços educam. Espaços criativos geram pessoas criativas. Nossa paisagem faz parte do que nós somos. A cidade construída a partir de uma lógica funcionalista mecaniza a vida, sem deixar espaço para a construção criativa de um imaginário livre. Por monumentos e espaços que sejam instigantes e que não representem a cultura da militarização e do poder. Por espaços que não oprimam, mas que libertem e estimulem a experiência e a experimentação. (PORO, 2014, p. 7)
O número de artistas independentes e coletivos que têm o propósito de
interferir e interagir com a cena urbana tem recebido uma maior visibilidade, da
mesma forma que o reconhecimento dos seus trabalhos dentro do conceito de
intervenção artística tem crescido na mesma proporção. É possível ver através da
arte de rua a necessidade das pessoas de ocuparem esses espaços. A rua nos dá
uma visão do coletivo social, e isso faz com que passemos a viver isso de forma
mais intensa, principalmente no momento em que o artista insere suas criações no
espaço. Assim, as intervenções são recortes de várias realidades que percebemos
ou criamos. Elas são essa ponte que pretende pontuar questões e tocar alguns
31
pontos de conflitos que existem em várias esferas. Segundo o artista Banksy (2012,
p. 29), “é preciso muita coragem para, numa democracia ocidental, se erguer
anonimamente e clamar por coisas que ninguém acredita - como paz, justiça e
liberdade”.
Os interventores vêm transformando os espaços urbanos através de ações
que, por mais que sejam efêmeras, recriam o ambiente durante o tempo de sua
existência. Um deles é o Poro, dupla de interventores que buscam manifestar suas
inquietações em relação aos processos urbanos contemporâneos e propor um modo
de fazer arte mais aberto e relacional através de diferentes tipos de ações
(CAMPBELL;TERÇA-NADA, 2011). Essas ações vão desde a colagem de cartazes
lambe-lambe até outras mais específicas, marcadas para acontecerem em
determinada hora e determinado local, visando atingir um público específico.
Com a era digital, percebemos que os interventores urbanos têm se
multiplicado, e é possível acompanhar seus trabalhos sem estar nas ruas. Com a
internet, a divulgação dos trabalhos por aqueles que o encontram inseridos na urbe,
o compartilhamento de ideias e a troca de experiências de quem faz arte urbana
vêm por ser um catalisador para aqueles que já cultivam uma vontade de passar a
integrar suas ideias no contexto público e compor o cenário urbano. Elemento
primordial da experiência humana, expressão e comunicação a um só tempo, a arte
e a dimensão estética podem ser um fator de equilíbrio pessoal e social
especialmente nos tempos de mudanças (PAVIANI, 2003). Assim, as cidades têm
sido repensadas e modificadas por grupos dispostos a ressignificar o espaço.
O mais famoso interventor urbano dos últimos anos é Banksy. Seu trabalho
mudou o olhar sobre a arte de rua. Com spray, faz críticas políticas, à sociedade e à
guerra, mas sempre com um humor sombrio e uma sacada. Nascido no interior da
Inglaterra, Banksy passou anos desenvolvendo sua técnica até se lançar em
trabalhos maiores e mais polêmicos - sem nunca revelar sua identidade. Trabalha
com arte de guerrilha que, de um dia para o outro, faz aparecer grafites, pinturas em
estêncil e outros tipos de intervenções nos cantos mais inusitados de cidades pelo
mundo. Banksy é hoje o artista de rua mais famoso do mundo e, ao mesmo tempo,
poucas pessoas conhecem sua identidade. O artista foi muito além de pintar figuras
irônicas e frases de efeito em paredes de prédios. Quando faz exposições, Banksy
32
coloca obras para vender. Quando faz um grafite na rua, não - o que não impede as
obras de serem vendidas (BANKSY, 2012). Quanto a isso, afirma que:
A arte não se parece com qualquer outra manifestação cultural, pois seu sucesso não é garantido pelo público. Todos os dias os espectadores enchem cinemas e salas de concertos, milhões de romances são lidos e bilhões de discos são comprados. Nós, as pessoas, influenciamos a produção e a qualidade da maior parte de nossa cultura, mas não de nossa arte. A arte que admiramos é feita por apenas poucos escolhidos. Um pequeno grupo cria, promove comercializa, exibe e decide seu sucesso. Apenas poucas centenas de pessoas em todo o mundo têm realmente a palavra. Quando se vai a uma galeria de Arte, você é apenas um turista olhando a sala de troféus de alguns milionários. (BANKSY, 2012, p. 170)
Essa é a justificatiba de Banksy não deixar de compor as ruas. Embora muito
valorizadas em museus e galeria,s seus trabalhos continuam aparecendo sem aviso
prévio pelos muros das cidades. "Não é sobre o hype, não é sobre o dinheiro",
afirma ele em seu documentário. Mas, mesmo idealista, anônimo e contra o sistema,
Banksy está inserido no mundo da arte (SCHNEEDORF, 2008). A arte de Banksy é
a essência da intervenção urbana. Não dá para ver sem se envolver, sem interagir,
sem refletir. O discurso contra o sistema tratado com humor e inteligência faz brotar
risos sinceros e espontâneos em quem tem contato com as obras de Banksy. Ele é
parte de uma geração que olhou para fora do sistema convencional de galerias, no
jeito de exibir uma obra. (PAVIANI, 2003).
Fonte: <http://www.saopaulotimes.r7.com>. Acesso em 2 out. 2015.
Figura 9: Follow Your Dreams, Banksy, 2010.
33
Podemos também destacar outros projetos independentes que seguem com a
mesma linguagem de arte pública e urbana: Os Gemeos8, famosa dupla de artistas
que iniciaram com o grafite na cidade de São Paulo e ultrapassaram as ruas, usando
linguagens visuais combinadas, improviso e o mundo lúdico para criar intuitivamente
uma variedade de projetos pelo mundo todo, ganhando admiração nacional e
internacional.
F
Fonte:< www.osgemeos.com.br>. Acesso em 2 out. 2015.
Beirando a marginalidade do assunto, outro interventor urbano muito
conhecido na região Sul do país é Sérgio Toniolo. Ex-policial civil, hoje é conhecido
como o maior pichador de Porto Alegre que há décadas protesta deixado sua marca
por onde passa. É conhecido por escrever Toniolo por toda a capital gaúcha desde
os anos 80. Dentre seus maiores atos, estão pichar o palácio Piratini (sede do
Governo do Estado do Rio Grande do Sul) com data e hora marcadas, além de uma
tentativa frustrada de pichar o palácio do planalto da mesma forma. Para Toniolo, os
principais lugares escolhidos para pichar são aqueles espaços visíveis e públicos.
(MESÍAS, 2011). O próprio pichador argumenta sobre o picho: “Esse é um grito
contra falta de liberdade que tem aqui, para que as pessoas se expressem. O muro
acho que é do povo, os muros são do povo, e é o único lugar que o povo tem para
8
Otávio e Gustavo Pandolfo
Figura 10: Crono Festival – OSGEMEOS, Lisboa, 2010.
34
se expressar”. Toniolo também é conhecido por seus stickers espalhados por todos
os cantos da capital Gaúcha.
F
Fonte: <http://www.subsoloart.com>. Acesso em 3 out. 2015.
Outro projeto independente é o Santa Cola, de Cícero Zart Enger. Conhecido
como Drao, é mais um apaixonado pela arte livre do grafite. Trabalha com
intervenção urbana desde os anos 90, utilizando principalmente da técnica do stencil
e do cartaz lambe-lambe. As obras do grafiteiro já ganharam ruas, avenidas e salas
de exposições até fora do Brasil e sua arte, “Smile Again” está colada em mais de 40
países (GASPAROTTO, 2014).
Figura 11: Stickers do Toniolo colados nas calçadas de Porto Alegre.
35
São muitos os interventores urbanos que compõe o cenário atual. A arte de
rua atinge e inspira o público, provocando surpresas, questionamentos e reflexões.
Figura 12: Santa Cola em ação – Smile Again.
Fonte:< https://www.flickr.com/photos/tags/santacoladrao>. Acesso em 3 out. 2015.
36
37
3. LAMBE-LAMBE COMO PRODUTOR DE SENTIDO
“O sucesso da obra do artista urbano
depende da recepção do observador.”
Zalinda Cartaxo
3.1 Uso e interpretação
Para compreender a carga simbólica de uma intervenção urbana como o
lambe-lambe, precisamos antes compreender sobre onde ele está inserido: a
cidade, em variáveis como território, bem cultural e cidadania. Ela é o nosso viver, é
o que somos, partindo tanto das experiências individuais quanto das coletivas.
Percebemos que ela não só se constrói através de formas materiais, mas é formada
também de significados. O artista urbano contemporâneo trabalha in situ, ou seja,
analisa meticulosamente as condições do lugar (a escala, o usuário e a
complexidade do contexto), visto que “o sucesso da obra depende da recepção do
observador”. (CARTAXO, 2006, p. 79).
Todo material artístico inserido no contexto urbano carece de, ao mínimo, um
pouco de observação e interpretação para ser compreendido. A intervenção inserida
na cena urbana passa a ter uma carga simbólica, podendo ser analisada
semioticamente. A semiótica é a ciência que se dedica a estudar a produção de
sentido, revelando as formas de como o indivíduo dá significado a tudo que o cerca.
Assim, as intervenções urbanas ganham significados. Desta forma, o cartaz lambe-
lambe, tema central da pesquisa, passa a ser um signo.
Umberto Eco (apud SANTOS, 2007), semioticista, afirma que as definições de
signo que circulam nos manuais de semiótica são diversas, mas não contraditórias e
muitas vezes podem se complementar. Assim, a partir de diversas definições,
podemos considerar signo tudo aquilo que representa alguma coisa para algo.
Eco, em seu livro Obra Aberta, trata da mensagem estética e da interpretação
sígnica. Em toda obra, seja ela artística, literária ou visual, existe uma relação entre
seu uso e sua interpretação. Segundo ele, uso é a maneira livre de se ler uma obra.
Já a interpretação exige sempre algum limite, já que “a noção de interpretação
sempre envolve uma dialética entre estratégia do autor e resposta do leitor-modelo”
(ECO apud SANTOS, 2007, p. 100).
38
Como abordagem, o autor trata do texto literário. Por muito tempo, todo texto
era visto como a expressão das ideias de seu autor. Para isso, estudar a obra de um
autor só teria sentido se sua biografia também fosse sabida. O leitor tinha um papel
passivo de interpretar aquilo que o autor queria dizer, tendo uma concepção fechada
do que aquilo significava, sem abrir a opção para outras interpretações. Seguindo o
caminho contrário, Eco passa a defender o conceito de obra aberta, que define toda
obra, seja textual, artística ou literária, como algo inacabado. Isso exige do receptor
uma participação mais ativa a fim de perceber essa obra como um objeto, um signo,
que é aberto para várias possibilidades de interpretação. Para isso, são atribuídas
significações diferentes pelos receptores, baseadas nos diferentes contextos
culturais, sociais e mercadológicos em que ele está inserido.
Eco defende que toda criação é ambígua e o receptor é o seu intérprete
supremo. Toda obra é vista como incompleta, tendo espaços em brancos que serão
preenchidos pelo seu receptor. Para ele, todo texto pressupõe sempre a
colaboração de um destinatário. Quem lê o texto recebe todas as múltiplas
interpretações que ele pode ter e o unifica, gerando o seu significado.
A unidade de um texto não pode estar em sua origem, mas em seu destino; porém este destino não pode mais ser pessoal: o leitor é um homem sem história, sem biografia, sem psicologia, ele é aquele que mantém juntos em um único espaço todos os caminhos que um texto se constitui. (BARTHES apud SANTOS, 2007, p.96).
Quando a mensagem é visual, ela passa a ser um código, cheio de espaços
prontos para serem decodificados e inteirados por quem o recebe e o interpreta. Eco
nos apresenta duas razões do texto ser incompleto: a primeira, é que o texto é um
mecanismo preguiçoso que depende da valorização do sentido que o destinatário
introduz, e a segunda é que, ao passar da função didática para a estética, o texto
deixa ao leitor a iniciativa da interpretação, embora “todo texto seja interpretado com
uma margem suficiente de univocidade”. (ECO apud SANTOS, 2007, p.98).
Assim, para a mensagem ser compreendida pelo destinatário, seja ela textual,
literária ou visual, ela a implica uma certa competência de quem a decodifica.
De um lado há que se considerar que a competência do destinatário não é necessariamente a do emitente, o que implica dizer que para decodificar uma mensagem verbal é preciso, “além da competência linguística, uma competência variadamente circunstancial, capacidade de pressupor, reprimir idiossincrasis, etc. (ECO apud SANTOS, 2007,p. 23)
39
Outro fato que deve ser levado em consideração ao tratar de interpretação de
signos, é que pelo fato do cartaz lambe-lambe não ser uma comunicação face a
face, faz com que a mensagem que ele carrega, tanto textual quanto simbólica, seja
um “produto cujo destino interpretativo deve fazer parte do próprio mecanismo
gerativo” (ECO, 1988 p. 39). Ou seja, Eco trata de um certo leitor-modelo capaz de
gerar significados específicos. Quando escrevemos um texto, já imaginamos quem
será o seu receptor a partir das escolhas que fazemos na sua construção. Elas
podem ser referentes à língua, ao gênero, ao espaço geográfico em que vai estar
inserido, entre outras inúmeras opções. É por essa linha de pensamento que Eco
afirma que de alguma forma, os textos preveem seus leitores-modelos. É como se
todo texto devesse se mover no sentido de construir esse leitor. Quando nos
questionamos sobre o que queremos fazer com esse texto, escolhemos quem é o
nosso leitor hipotético.
Portanto, ao introduzir uma mensagem, seja ela verbal ou não verbal em um
cartaz lambe-lambe que será inserido na cena urbana, em meio a barulho, “correria”
e grandes construções, definimos quem é o nosso leitor-modelo, quem será capaz
de decodificar a mensagem que permeia esse tipo de arte. Será o homem urbano,
alfabetizado e inserido em sua função social que percorre as ruas da cidade, corre
contra o tempo, mas que em momentos de devaneio encontra o seu olhar nos
cartazes que compõe a estética da urbe.
3.2 Lambe-lambe como obra aberta
A partir da metade do século XX foi possível verificar a efetiva participação do
receptor na construção da obra. Ao criar sua obra, o autor busca despertar no
utilizador sentimentos, sensações e efeitos, de modo que transmita a sua intenção,
sua mensagem. No entanto, toda a obra, considerada ou não artística, é passível de
vários entendimentos e vários julgamentos. Como afirma Eco (1988, p. 53), “toda a
obra de arte é aberta uma vez que não possui apenas uma interpretação".
Assim, desdobramos o conceito de obra aberta a partir das afirmações de
Umberto Eco, sendo aquela que não cria resistência contra a possibilidade de
aberturas em sua interpretação. A obra aberta não é uma categoria crítica, mas sim
um modelo teórico para tentar explicar a arte contemporânea. A obra de arte é agora
40
vista como um universo de sentidos. A intencionalidade é considerada um
pressuposto da obra aberta, pois além de possibilitar várias interpretações como
toda obra de arte, ela se apresenta de várias formas e cada uma delas se submete
ao julgamento do público. A obra aberta também é caracterizada pela incorporação
intencional da ambiguidade no processo de criação. Em contrapartida, a obra
fechada tem o seu sentido definido pelo autor a fim de evitar as suposições ou
interpretações erradas.
Nesse sentido, é importante ressaltar que para o autor, obras fechadas
definitivas também são obras abertas, pois cada interpretação, cada fruição é única
devido à comunicação e troca estética singular estabelecida com o indivíduo. Eco
(1988) afirma que quando uma obra de arte é produzida, seu autor organiza uma
seção de efeitos comunicativos de modo que cada possível fruidor possa
recompreender a mencionada obra da forma originária imaginada pelo seu criador.
Assim, o artista produz uma forma acabada em si, desejando que a forma em
questão seja compreendida e fruída da maneira como a produziu. Porém, no ato de
reação à teia dos estímulos e de compreensão de suas relações, cada fruidor traz
uma situação existencial concreta, uma sensibilidade particularmente condicionada,
uma determinada cultura, gostos, tendências, preconceitos pessoais, de modo que a
compreensão da forma originária é verificada conforme uma determinada
perspectiva individual. Neste sentido, podemos considerar que uma obra de arte,
acabada e fechada é também aberta, pois é passível de interpretações diferentes,
sem que isso redunde em alteração de sua irreproduzível singularidade. Assim
sendo, podemos entender que cada fruição é uma interpretação e uma execução,
pois em cada fruição a obra revive dentro de uma perspectiva original.
O limite da abertura da obra é dado pela necessidade de comunicação.
Apesar de haver uma liberdade do leitor para suposições infinitas sobre a intenção
do texto, uma teoria da interpretação “deve também assumir que é possível chegar a
um acordo, se não acerca dos significados que o texto encoraja, pelo menos acerca
daqueles que ele desencoraja” (ECO apud WIRTH, 2001).
Dessa forma, o texto como questão é a leitura como resposta. O modelo de
interpretação de Eco, embora reconheça haver uma abertura no texto, admite
também que o leitor buscará preenchê-la a partir da sua prática, dentro do seu
processo de semiose. A interpretação individual dependerá das experiências
41
vivenciadas pelo sujeito, das suas expectativas, dos seus interesses, da sua cultura,
do contexto, do seu mundo. As obras abertas sugerem e solicitam ao público, não só
envolvimento emotivo, mas também abertura intelectual para que este possa intervir
no seu processo de criação e recriação, ou interpretação e reinterpretação.
A semiose começa quando ultrapassamos o limiar das intenções meramente didáticas, entre causas mecânicas, acaso ou causas brutas e seus efeitos, para interações triádicas medias por uma mente no sentido mais vasto. Uma tríade semiótica é aquela na qual uma mente interpreta um estímulo significante no seu ambiente. Essa interação não requer nenhuma consciência nem intencionalidade, mas deve ser dirigida para um fim. (SANTOS, 2007, p.108)
A corrente de interpretações de uma obra pode ser infinita, mas o universo do
discurso intervém para limitar o seu formato. Assim, usar livremente um texto tem a
ver com a decisão de ampliar o universo do discurso.
Como vimos, todas as obras de arte contemporâneas, conforme Eco, são
essencialmente abertas, mas podemos tratar de um subgrupo dentro das obras
abertas chamado de “obras em movimento”. Essas são produzidas com base no seu
indeterminismo e casualidade do resultado. Seriam como obras inacabadas, em que
o autor desconhece o resultado final, pois “expõe e propõe um processo, tornando o
outro (um intérprete, um espectador, ou um grupo) o centro ativo que aplica sua
própria forma à obra”. (FURTADO, 2013 p. 17). Elas se caracterizam pela
capacidade de assumir diversas estruturas imprevistas, fisicamente irrealizadas. A
obra em movimento é aquela que deixa ao consumidor a possibilidade de escolher
dentre as sequências possíveis (RIBEIRO, 2013).
O artista possui uma proposta e considera suas diversas possibilidades de
encaminhamento, mas não pode prever as atitudes que o espectador toma ao
encontrá-la, principalmente nos casos que ele denomina de “obras em movimento”.
O caminho percorrido pelas intervenções urbanas, assim como por outros tipos de
arte, busca posicionar o espectador como seu elemento primordial. Em uma certa
etapa desse percurso conceitual da arte, a principal preocupação no
desenvolvimento criativo tornou-se o exato momento da presença do apreciador
diante da obra e como essa interação poderia ser estabelecida (FURTADO, 2013).
O cartaz lambe-lambe quando inserido no contexto urbano, além de ser considerado
uma obra aberta, é também uma obra em movimento. As intervenções urbanas
deixam esse espaço para o público interagir com elas. Paviani (2003) afirma que
42
não existe a arte em estado puro. Ela é onipresente nas ruas, nas praças, nos
museus, nas escolas, nos cartazes, nos comércios, e se confunde com aquilo que o
homem sente e pensa. Sua significação provém do contexto histórico em que se
realiza.
Também é recorrente a observação de intervenções na própria intervenção,
sejam elas rabiscos, pichações em resposta quanto a sobreposição em outras
intervenções de outros artistas que pertencem ao mesmo universo da obra inicial. As
pichações são respondidas com outras pichações, as colagens são cobertas por
outras colagens, gerando uma interação não só com o espectador que cruza o
caminho da obra e se depara com a mensagem, mas também com o outro artista
urbano que encontra naquela situação uma oportunidade de estampar sua opinião.
Umberto Eco (1988) afirma que a obra em movimento é a possibilidade de uma
multiplicidade de intervenções pessoais, mas não é um convite amorfo à intervenção
indiscriminada: é o convite não necessário nem unívoco à intervenção orientada, um
convite a nos inserirmos livremente num mundo que é aquele desejado pelo autor.
Contudo, os meios são oferecidos, mas os finais são uma incógnita. Essas
obras podem assumir estruturas que não foram imaginadas, tendo sua forma
constantemente modificada conforme a intervenção externa que é permitida e
incentivada.
Para Umberto Eco (SANTOS, 2007), quando a fonte física é substituída por
um ser humano, passa-se para o universo do sentido. Neste caso, o emissor é
capaz de atribuir significado aos significantes, que serão decodificados por
receptores também capazes de manter e modificar seus significados. A mensagem
está aberta para uma multiplicidade de códigos. Assim, o público estabelece o
contato entre a obra de arte e o mundo exterior, decifrando e interpretando suas
qualidades intrínsecas e acrescentando sua contribuição à criação.
3.3 Subjetivação no/do espaço urbano
Subjetividade é algo particular do ser consciente e individual. É o espaço
íntimo do indivíduo, ou seja, como ele instala a sua opinião ao que é dito (mundo
interno) com o qual ele se relaciona com o mundo social (mundo externo),
resultando tanto em marcas singulares na formação do indivíduo quanto na
43
construção de crenças e valores compartilhados na dimensão cultural que vão
constituir a experiência histórica e coletiva dos grupos e populações. (NOGUEIRA,
2013). Através da nossa subjetividade construímos um espaço relacional, ou seja,
nos relacionamos com o outro, seja o outro indivíduo ou espaço.
De acordo com Neto (2013), os processos psicológicos sempre foram
investigados à margem dos processos urbanos. A avaliação da relação entre
subjetividade e cidade se insere em um histórico debate entre o individual e social. O
senso comum acredita que o homem, sendo um ser social, vive em sociedade, e por
ela é influenciado. Essa formulação vê o indivíduo como um conjunto fechado em
interação e trocas com o ambiente social que lhe é externo. Wundt (apud NETO,
2004) compreendeu a consciência como um mundo interno ao qual se tem acesso
por meio da introspecção. A consciência compreendida como interioridade foi
influenciada pela assimilação da subjetividade à noção de interioridade, embora
ainda hoje a psicologia tome a consciência de modo desconectado em relação ao
espaço social.
Porém, a passagem pelo século XX trouxe a associação entre experiência
social e experiência subjetiva, demonstrando que entre a vida social e a vida
subjetiva existe uma relação fundamental. A nossa subjetividade é formada com
base nas influências sociais. Ela postula a existência de um espaço interior
influenciado ou formado pelo espaço social ou cultural. A subjetividade também
pode ser entendida como emergência histórica de processos não determinados pelo
social, mas em conexão com os processos sociais, culturais, econômicos,
tecnológicos, midiáticos, ecológicos, urbanos, que participam de sua constituição e
de seu funcionamento.
Focault fala de “desmultiplicação causal”, que consiste numa análise dos
acontecimentos, segundo os processos múltiplos que os constituem. (FOCAULT
apud NETO, 2004, p.4). A ideia de interioridade identitária cede lugar à de
processualidade em permanente transformação.
Desse modo, tratamos de uma subjetividade construída na relação com a
cidade, marcada pela exterioridade e distinta de nossa experiência de interioridade
psicológica. Temos no contemporâneo um modo de subjetivação dominante que
poderíamos chamar de modo individualizado, um conjunto identitário fechado,
interiorizado, construído, fundando-se em processos sociais e históricos desde os
44
gregos, passando pelo Cristianismo, até chegar à Modernidade.
Com Focault, aprendemos que não existe uma forma padrão da
subjetividade, mas ela é variável e emerge em conexão com processos históricos,
sociais, políticos, econômicos, urbanos num contínuo vir a ser marcado pela
contigência e nunca por um determinismo derradeiro. Mais do que isso, que nossa
presente individualidade identitária seja, talvez, um modo de subjetivação que não
responda às configurações do contemporâneo presente nos novos arranjos urbanos
e esteja em via de ser sucedida por novos modos se subjetivação (NETO, 2013).
Podemos caracterizar esses novos arranjos urbanos pela experiência da
velocidade dos deslocamentos na cidade que transforma o espaço urbano num meio
ambiente por mecanismos tecnológicos de controle e a midiatização do urbano pelos
novos meios de comunicação. As práticas cotidianas estão também conectadas ao
processo de segregação presente no modo de andar nas ruas, de fechar o vidro dos
carros, ou no olhar sempre desconfiado para os estranhos. Assim surgem novos
arranjos urbanos associados à segregação, que constituem, ao mesmo tempo,
novos modos de subjetivação. Medos, ódios, insensibilidades, indiferença. Novas
maneiras de viver, sentir, perceber e interpretar os encontros na cidade.
Tudo isso produz um processo de subjetivação coletivo e bipolar, centrado na
violência e insegurança retroalimentado por ambos os polos, reforçando a
desigualdade e o distanciamento. Cabe a nós, sufocados por esses fluxos de
opressão coletiva, a recusa desses processos hoje dominantes em nosso cenário
urbano. Podemos pensar e viver outras possibilidades de apropriação do espaço
urbano, fora da equação diferença/desigualdade/segregação. A construção
contemporânea de novos modos de subjetivação de caráter libertário passa,
necessariamente, pela articulação com práticas inseridas no espaço urbano (NETO,
2004).
O imaginário compartilhado na cidade é uma dimensão afetiva do mundo
constrói-se por sensações e sentimentos. Ele é feito dos diferentes usos do espaço
da cidade, a partir de nossas experiências, tecidas por nosso olhar e pelos
acontecimentos políticos que imprimem antagonismos nos encontros, ou seja, o
imaginário é também produzido pelo conteúdo político do espaço. A dimensão
imaginária e afetiva da cidade é também tecida de pluralidade. Seus usos, sua vida,
é que fazem do espaço objeto de interesse. A cidade é preenchida por um
45
imaginário produzido coletivamente. Esse imaginário é permeado pelos diversos
usos do espaço urbano. Ele não se decreta e não se constrói abruptamente, mas,
sim, pelos modos de olhar a cidade que vão se configurando ao longo dos tempos.
Se a cidade nos habita, ela é, ao mesmo tempo, produtora da vida, marcando cotidianamente suas possibilidades, seus trajetos e, ainda, os modos de subjetivação que aí se tecem. (NOGUEIRA, 2013, p.226)
Desse modo, a arte urbana estabelece uma relação diretamente interligada
com a subjetivação da urbe. O modo como a arte solicita o espectador desdobra-se
na sua repercussão social, nos possíveis efeitos que ela venha a ter sobre a
sociedade. A subjetividade de cada indivíduo é replicada na significação do código
que as intervenções urbanas carregam. Nesse sentido, não há limites para a
interpretação, pois vale a famosa máxima de Peirce “Não bloqueie o caminho da
investigação” (PEIRCE apud SANTOS, 2007, p.110).
Compartilhar o espaço físico com outros atores que realizam atividade similar
dá importância à ação, proporcionando a ação e também a interação. Quando uma
obra ganha espaço na cena urbana, ela atinge a subjetividade do sujeito. Seja um
aviso, um lembrete, um manifesto, vimos que as interpretações são geradas de
acordo com a bagagem cultural de cada indivíduo. A subjetivação da mensagem que
ele carrega é muito pessoal.
Retoricamente, se tratando do lambe-lambe como meio de comunicação, qual
o impacto do cartaz com o indivíduo, na relação objeto-sujeito? O que ele provoca?
O que esse encontro não premeditado passa a significar para o indivíduo que
percorre trajetos urbanos e cruza com formas de comunicação de massa? Isso afeta
sua individualidade, provoca questionamentos, traz lembranças ou impulsiona
ações? De que forma a cidade interfere na subjetividade individual? Osório (2011)
afirma que o encontro do indivíduo com a obra em espaço urbano causa um choque,
deslocando o observador da sua zona de conforto, fazendo-o questionar aquilo que
era apresentado, sua ideia e seu contexto. Esse estranhamento gera no espectador
uma autonomia “da experiência e não do objeto, e é isso que faz com que a forma
significante dada à percepção seja algo singular, que mobiliza a imaginação e o
pensamento a produzirem sentidos novos” (OSÓRIO, 2011, p.226).
É preciso construir várias entradas possíveis, com diversas linhas a serem
seguidas para a compreensão da relação espaço‐subjetividade no cenário
46
contemporâneo. As poéticas invisíveis que fomentam as experiências subjetivas
contemporâneas não são fixas. São vários os caminhos que percorrem tudo,
marcando o peso da relação espaço/subjetividade, um peso sustentado na leveza
da poesia literária e visual, nas artes e também no mais trivial, no cotidiano de quem
habita uma cidade (NOGUEIRA, 2013).
47
48
4. LAMBE-LAMBE COMO MÍDIA PUBLICITÁRIA
“Bons cartazes falam uma linguagem internacional."
Manfred Triesch
4.1- Cartaz: conceito e história
Tecnicamente falando, cartaz é uma das modalidades que representam os
gêneros textuais. Sua ocorrência se dá de forma diversificada, seja nas ruas ou em
instituições específicas, cuja finalidade pauta-se pela informação e persuasão, no
objetivo de convencer, conscientizar ou sensibilizar as pessoas acerca de um
determinado assunto. Um cartaz, considerado moderno, no sentido contemporâneo
da palavra, geralmente é formado por uma imagem principal, somada ou não a
outras imagens secundárias e de um texto conciso, claro e objetivo, redigido com
letras grandes e coloridas. É produzido para que seja fixado e exposto à altura dos
olhos do viandante (MOLES, 1987). O cartaz utiliza de um aspecto visual atraente
para despertar o interesse por parte das pessoas.
Segundo Abreu (2010), a história do cartaz foi marcada por momentos de
grande lirismo e expressão artística e pontuou momentos de mudança e inquietude
social. A capacidade do cartaz de comunicar imediatamente fez com que esse meio
fosse utilizado durante toda história, para os mais diversos objetivos.
A comunicação visual faz parte da história da humanidade há mais tempo que
as próprias palavras. Desde a época pré-histórica o homem já se comunicava com
símbolos, marcas e desenhos. A partir do surgimento da escrita, a imagem
desenvolveu-se rapidamente. Texto e imagem são formas naturais de comunicação
e a importância de ambos têm sido considerada uma forma essencial e completa de
transmitir informação (GONZALEZ, 2013). Os primeiros prospectos de cartazes
foram desenvolvidos ainda no século X por meio de xilogravuras, obtidas através da
impressão de matrizes de madeira pelos povos orientais. Com a invenção do papel e
a descoberta da impressão pelos chineses, o cartaz alcançou a portabilidade
definitiva. Somado a descoberta da prensa móvel feita por Johannes Gutenberg, foi
aberto o caminho da grande difusão de informações impressas na história da
humanidade (ABREU, 2010).
49
Cesar (2000, p. 52), afirma que “o primeiro cartaz conhecido é Saint-Flour, de
1454, feito em manuscrito, sem imagens. Não demorou para que esse novo meio de
comunicação se estendesse a todos os interessados em divulgar ideias,
acontecimentos ou vender produtos”. O exemplar de Saint-Flour já apresentava as
principais características que o cartaz registra hoje.
Com o surgimento da litografia, técnica de impressão criada por Aloys
Senefelder em 1796, começou a se fundar a história do cartaz moderno. Senefelder
era autor de peças de teatro, e através da litografia encontrou um meio de imprimir,
a baixo custo, as suas próprias partituras musicais. Esta descoberta permitiu,
décadas mais tarde, o desenvolvimento sem precedentes na história do cartaz. O
mais revolucionário de todos é o uso da cor, até então praticamente inexistente. A
litografia colorida tornou-se disponível no final deste século, descoberta por Jules
Chéret, possibilitando aos artistas da época trabalhar diretamente na pedra, sem as
restrições da impressão tipográfica. Este avanço tecnológico foi responsável pelo
florescimento e difusão dos cartazes impressos (ABREU, 2010).
Muitos pintores e ilustradores adotaram a técnica litográfica devido ao baixo
investimento necessário a sua implantação, dando-lhe grande importância por
permitir a reprodução e circulação massiva de imagens. A primeira empresa de
impressão litográfica foi aberta em Paris, em 1816. A partir de então, estavam
estabelecidas as condições para que o cartaz, tendo uso artístico ou comercial, se
desenvolvesse e atingisse o estatuto de grande e, muitas vezes, única mídia
existente (ABREU, 2010).
Na era industrial, o cartaz representava uma nova forma de comunicação.
Segundo Gonzales (2013, p. 8), “após a publicação de um livro sobre o assunto, Les
Affiches Illustrrées, em 1886, os cartazes adquiriram respeitabilidade cultural e
tornou-se moda colecioná-los”.
Com o passar dos anos e com a evolução da técnica, o cartaz se manteve
cada vez mais ligado ao design gráfico. As suas transformações refletem a
tecnologia, a estética e o pensamento de cada época.
4.2 - O uso histórico do cartaz como mídia
Sendo o cartaz um meio de comunicação visual, além da sua importância
como meio de publicidade e de informação, possui um valor histórico como meio de
50
divulgação em importantes movimentos de caráter político ou artístico. Conforme
Abreu (2010), somente no final do século XIX, conhecido como Belle Époque, que a
arte de reunir textos e ilustrações numa folha de papel alcançou maior projeção ao
ser propagada pelos mercadores europeus. Nessa mesma época, o cartaz passou a
ser uma peça que carregava um alto grau de sofisticação, ao ser feito pelas mãos de
artistas plásticos da época. No ano de 1860, foi o pintor francêss Jules Chéret, o
mesmo inventor da litografia em quatro cores, que iniciou a produção de cartazes
publicitários com estilo artístico.
Fonte:< http://historiadocartaz.weebly.com>. Acesso em 5 out. 2015.
Foi Chéret quem combinou imagem e texto permitindo ao público a leitura
rápida e a compreensão da mensagem. Hollis (2000, p. 06) conta que “o estilo de
Chéret amadureceu no final da década de 1880, sendo logo adotado e desenvolvido
por outros artistas, particularmente por Pierre Bonnard e pelo mais conhecido de
todos, Henri de Toulouse-Lautrec.” Os desenhos eram geralmente de cores
Figura 13: Cartaz de J. Chéret, 1895.
51
chapadas e não seguiam as regras da perspectiva e das técnicas tradicionais.
(GONZALES, 2013).
Outro nome conhecido na história do cartaz é Henri de Toulouse-Lautrec.
Lautrec ficou conhecido por retratar cenas da vida noturna e do submundo de Paris.
Assinou centenas de cartazes de divulgação de espetáculos de cabarés e teatros,
reproduzidos através da técnica litográfica. Foi nas mãos de Toulouse-Lautrec e do
seu toque impressionista que a arte publicitária alcançou popularidade. Ele
revolucionou o design gráfico dos cartazes publicitários, ajudando a definir o estilo
que seria posteriormente conhecido como Art Nouveau9. (ABREU, 2010). Sua obra
mais conhecida são os cartaz de divulgação do cabaré Moulin Rouge.
9 Movimento que surgiu na Europa, entre 1890 e 1910, essencialmente decorativo.
Figura 14: Jules Chéret exibindo seu trabalho à Henri de Toulouse-Lautrec.
Fonte: <http://historiadocartaz.weebly.com>. Acesso em 5 out. 2015.
52
Hollis (2000, p. 5) afirma que "nas ruas das crescentes cidades do final do
século XIX, os pôsteres eram uma expressão da vida econômica, social e cultural,
competindo entre si para atrair compradores para os produtos e público para os
entretenimentos".
Gonzales (2013) afirma que na época que precedia a Revolução Russa, a
presença do cartaz na difusão das ideias do novo governo foi extremamente
importante, devido ao envolvimento com as vanguardas artísticas e pelo alto grau
ideológico das mensagens transmitidas. Elas abordavam a exaltação do patriotismo,
o fortalecimento dos pensamentos de igualdade e da vitória, e seus layouts eram
influenciados por artistas ligados ao processo revolucionário. Dessa forma, o design
russo foi influente na evolução do cartaz europeu moderno e na estruturação dos
conceitos difundidos pela Bauhaus, escola de design alemã.
Figura 15: Moulin Rouge, Henri de Toulouse-
Lautrec, 1891.
Fonte: <http://historiadocartaz.weebly.com>.
Acesso em 5 out. 2015.
53
A propaganda no período da Segunda Guerra Mundial alcançou, o que pode
ser considerado, o seu mais alto patamar na história até então. Enquanto os
governos dos países envolvidos se preparavam para a guerra, era necessário criar
campanhas, com o objetivo de motivar as populações e possibilitar o aumento de
produção (ABREU, 2010). Assim, durante a Segunda Guerra Mundial, os cartazes
que anunciavam produtos deram lugar àqueles que ajudavam a promover os
esforços de guerra por meio do apelo ao recrutamento ou veiculação de
informações. Nesses cartazes podiam ser identificados diversas correntes artísticas,
tendo o construtivismo muito presente, mas também cartazes quase surreais ou
apenas ilustrativos e diretos (GONZALES, 2013). É nesse momento que publicitários
acabam aperfeiçoando técnicas e se consolidando aliados importantes no período
de guerra.
Dentre os mais conhecidos, podemos citar o cartaz “I Want You for U.S.
Army”, encomendado pelo governo americano para recrutar soldados para a guerra.
O governo Nazista de Hitler também utilizava a propaganda como forte meio de
persuasão. Os cartazes daquela época são reconhecidos até hoje. Gonzales (2013)
Figura 16: Cartaz Russo - Rodchenko,
1927.
Fonte: <http://historiadocartaz.weebly.com>. Acesso em 5 out. 2015.
54
também cita um outro exemplo de cartaz clássico do período de guerras:a peça
nazista "Ein Volk, Ein Reich, Ein Führer", que quer dizer: "Um povo, um Império, um
Líder". Essa peça de publicidade foi usada largamente em todas as terras
conquistadas pelos alemães, para inspirar lealdade e um orgulho feroz nos alemães
étnicos que viviam nesses lugares.
Fonte: <http://historiadocartaz.weebly.com>. Acesso em 5 out. 2015.
Já nos anos 70, a nova tecnologia deu aos designers maior liberdade através
do aumento do controle do tipo de letra e da reprodução da imagem. Hoje, o cartaz é
produzido através do computador. Os novos programas permitem a manipulação da
imagem, e criam combinações criativas entre fotografia, ilustração e trabalho
tipográfico. (ABREU, 2010).
Nos dias de hoje, o forte do cartaz é a sua utilização como meio publicitário,
tanto fixados em ruas e pontos de venda divulgando determinados produtos quanto
no meio político, divulgando ideologias e anunciando candidatos. Os cartazes atuais
abordam claramente informações com imagem, cores e título bem trabalhados, no
intuito de prender a atenção do público-alvo.
4.3 Lambe-lambe como ferramenta de comunicação
Figura 17: I Want You for U.S. Army , 1917 e "Ein Volk, Ein Reich, Ein Führer”,
1938.
55
Paviani (2003) relata que a arte e os meios de comunicação estabelecem
pontos de contato. Os meios de comunicação têm a possibilidade de assumirem as
características estéticas tradicionais. Assim, nem todo cartaz é tido como uma peça
comercial. Podemos também tratar do cartaz como facilitador da comunicação e
intervenção artística que compõe as ruas. A relação entre a produção artística e
certas formas de desenvolvimento social, como a arte e os conflitos sociais ou a arte
e os problemas existenciais é decisiva. A verdadeira arte subsiste como tal, na
medida em que nasce de sua integração na vida social, na proporção em que é uma
atividade natural e legítima como qualquer outra prática (PAVIANI, 2003).
Realizando uma análise ao conteúdo que compõe as ruas hoje, encontramos muitos
cartazes publicitários, mas também cartazes culturais que trazem movimentos e
expressões da cultura artística do país. Ambos se mostram ao receptor em
mensagens normalmente em papel fixada em lugares públicos, e tem como função,
divulgar, informar visualmente e também atrair o interesse do observador, muitas
vezes como uma peça de valor estético. Essa diferença em suas funções dá-se ao
fato da sociedade ter acesso à mídia não só como publicidade, mas também como
arte (GONZALES, 2013).
Assim, o lambe-lambe é encontrado colado em postes, muros, tapumes
espaços que constituem a cena urbana. Ao se encaixar no conceito de street art,
utiliza dos grafismos e textos para propagar ideias.
A lei que rege o uso do cartaz lambe-lambe como ferramenta de comunicação
é a Lei Cidade Limpa10, criada e aplicada primeiramente na cidade de São Paulo,
visando o combate à poluição visual. Hoje, outras cidades também adotam
legislação semelhante, tendo suas próprias limitações para definir regras e
penalidades relacionadas ao uso de comunicações impressas aplicadas no espaço
urbano. Porém, Apesar das leis serem restritivas, é possível utilizar legalmente
espaços como postes, pontes, lixeiras, paredes de locais abandonados e muito
degradados, como informa o site da Greenpeace11. Já nos espaços privados, como
muros e portões, é necessário pedir autorização ao dono ou responsável. É
importante deixar claro que todo cidadão tem o direito de se manifestar e protestar
10 Em anexo. 11
http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Documentos/Guia-pratico-de-como-fazer-lambe-lambes-em-
sua-cidade/
56
livremente. Além de ser um direito garantido pela Constituição Federal, colar lambe-
lambe é um jeito pacífico e poético de expressão.
Portanto, mesmo com a existência de legislação proibitiva, o cartaz lambe-
lambe continua em processo de, de forma a se moldar dentro dos padrões impostos
pela lei, compondo harmoniosamente o contexto urbano, tendo sempre em prática o
estudo que contempla o processo de criação das peças tanto como função de
anunciar, propagar informações e algumas vezes como arte (GONZALES, 2013).
O lambe-lambe ainda beira a margem e fora do contexto comercial,
dificilmente é visto como uma interferência poética, porém, sua disseminação tem
aumentando principalmente nas metrópoles e sua importância como ferramenta
social vem sendo reconhecida com o passar dos anos. Ele permite expressar aquilo
que se deseja a partir de procedimentos simples que não demandam muito tempo e
não requerem muito dinheiro, sendo considerado uma forma democrática de arte e,
também, uma das mais populares formas de expressão das ruas (CARTAXO, 2009).
Fonte: <http://olheosmuros.tumblr.com/>. Acesso em 5 out. 2015.
Figura 18: Lambe-lambes artísticos compondo o cenário urbano.
57
Conforme Queiroz (2010), consideramos o cartaz lambe-lambe como
ferramenta de comunicação por se integrar dentro do processo de comunicação.
Suas três etapas englobam emissor, transmissão de mensagem e receptor. O
lambe-lambe é considerado meio de comunicação por cumprir suas obrigações
como ferramenta: comunicar a mensagem de um emissor para um receptor,
podendo encontrar ruídos, deixando que seu código sofra diferentes interpretações.
Quando inserido em um ambiente, o lambe-lambe passa a assumir a posição de
atingir um público específico. “Cada forma, cada expressão simbólica é um desafio à
nossa capacidade interpretativa” (PAVIANI, 2003, p. 12). A mensagem contida no
lambe-lambe é direcionada e é capaz de modificar os espaços públicos pelas
apropriações inusitadas, alterando a carga simbólica do ambiente, retrabalhando os
vínculos históricos e ideológicos do seu público. Vera Pallamin (2000) conclui que os
espaços do cotidiano nos quais ocorrem essas intervenções artísticas são cheios de
articulações, segregações e rupturas. Assim, o significado de cada intervenção
sugere e solicita aproximações específicas.
Fonte: <http://jornalbomdiars.com.br>. Acesso em 5 out. 2015.
Desde os primeiros pôsteres anunciando peças de teatro locais até os dias
atuais, e nos comerciais mais repletos de efeitos especiais, a publicidade sempre
utilizou da arte como instrumento de persuasão. Desde então, arte e propaganda
Figura 19: Lambe-lambes comunicando greve dos bancários.
58
andam lado a lado (GONZALES, 2013). Pelas ruas de grandes cidades encontramos
diversos tipos de lambe-lambes. O novo contexto cultural vive sob o império da
economia de mercado e consumo. Sendo assim, vimos que a indústria cultural
infiltra-se cada vez mais em todos os setores de produção, assume as funções de
comando e controle do trabalho e da criatividade humana. Deste modo, a arte, como
outros fenômenos culturais e sociais é fortemente atingida em sua estrutura e função
(PAVIANI, 2003).
Da mesma forma, também encontramos cartazes voltados para a intenção de
intervenção artística, comunicando pensamentos, poesias, mensagens, e avisos. Em
pleno século XXI, com tantos avanços tecnológicos, percebemos que o lambe-lambe
é uma ferramenta que sobreviveu às mudanças e ainda é visto como uma
ferramenta de comunicação eficaz. É um meio que se insere e se integra no cenário
Figura 20: Lambe-lambe vendendo planos de operadoras de celular,
nas ruas de Porto Alegre.
Fonte: Arquivo pessoal.
59
urbano. Apesar dos muitos gastos em campanhas publicitárias pela televisão, a
mídia, o comércio e o governo não abriram mão da comunicação direta que o cartaz
proporciona. Uma prova disso é a notícia divulgada pelo site Inspirad12, onde
Marcello Serpa, um dos mais reconhecidos e premiados criativos da história da
publicidade que atuou por muito tempo no comando da agência AlmapBBDO, uma
das mais relevantes e consagradas agências de publicidade do mundo, lança mais
um trabalho do publicitário. Em outubro de 2015, Serpa assinou o layout do cartaz
que divulga o lançamento do longa-metragem “Ninguém ama ninguém por mais de
dois anos”, que está marcado para Novembro de 2015.
Fonte: <http://www.inspirad.com.br>. Acesso em 20 out. 2015.
12
http://inspirad.com.br/
Figura 21: Cartaz de divulgação do lançamento do filme
“Ninguém ama ninguém por mais de dois anos”.
60
Mais uma vez podemos perceber que o lambe-lambe não foi deixado de lado.
Hoje, também podemos encontrar facilmente cartazes deste tipo que, além de
venderem produtos, divulgam shows e eventos nas grandes cidades. Esses, muitas
vezes ficam acumulados, sobrepostos, disputando um espaço para chamar a
atenção dos cidadãos.
Hoje, os computadores e seus novos programas permitem a manipulação da
imagem em níveis nem sonhados anteriormente. Criam e recriam layouts, se
tornando cada vez mais importante no design de cartazes (ABREU, 2010). O
trabalho resultante pode mesclar qualquer combinação de fotografia, ilustração e
tipografia, fazendo com que o cartaz seja cada vez mais atrativo aos olhos do seu
público.
Gonzalez (2013) afirma que hoje, o cartaz lambe-lambe é considerado por
muitos publicitários como uma mídia de apoio paras as demais. Sua função é a
sustentação e complementação de campanhas junto à televisão, jornais, internet,
etc, tidos como meios com maior possibilidade de exploração. Se por um lado ele é
visto como meio de apoio, por outro lado, o veem como um dos principais veículos,
Figura 22: Lambe-lambe como ferramenta publicitária na divulgação de shows.
Fonte: <http://rosenbaumdesign.wordpress.com>. Acesso em 15 out. 2015.
61
pois está inserido num contexto em que a sociedade é massificada dentro do
sistema social, resultando muitas vezes em excesso de anúncios. Mais comumente
visto na forma impressa, o cartaz continua em processo de evolução, sendo
atualmente bastante beneficiado pelo desenvolvimento tecnológico, o que o torna
ainda mais interativo e persuasivo para o público alvo.
62
63
5. ESTUDO DE CASO: PROJETO SOMOSINSTANTES
O estudo de caso dessa pesquisa aborda o case do projeto Somosinstantes.
Conforme Yin (2005), o estudo de caso pode ser tratado como uma importante
estratégia metodológica para a pesquisa em ciências humanas, pois permite ao
investigador um aprofundamento em relação ao fenômeno estudado, revelando
nuances difíceis de serem enxergadas a olho nu. Além disso, o estudo de caso
favorece uma visão holística sobre os acontecimentos da vida real, destacando-se
seu caráter de investigação empírica de fenômenos contemporâneos.
5.1 – Caxias do Sul
O projeto Somosinstantes é formado por três jovens admiradoras de arte
urbana: Bárbara Lorenzi, 22 anos, professora de teatro; Betina Scholl, 21 anos,
estudante de Design de Moda e Giulia Andreazza, 21 anos, estudante de
Publicidade e Propaganda. As idealizadoras do projeto sempre estiveram envolvidas
com a área criativa, e juntando suas ideias, desenvolveram um projeto de arte
urbana na cidade de Caxias do Sul. O Somosinstantes surgiu em setembro de 2014,
inspirado em outros projetos de arte de rua já conhecidos, sendo o TXT Urbano13 a
sua maior referência. O projeto consiste em espalhar pela cidade lambe-lambes
contendo mensagens reflexivas e questionadoras, como uma forma de humanizar o
espaço urbano e chamar a atenção das pessoas a questões que acabam passando
por despercebido no ritmo do dia-a-dia, sendo assim mais um influenciado pelos
processos históricos da arte de rua, desde a Pop Art, que visava a reprodução em
quantidade das peças, passando pelos grandes nomes da história da arte urbana,
como Basquiat e Banksy, e chegando à era contemporânea. O que move as autoras
do projeto na criação e desenvolvimento desse projeto é o questionamento “o que
você pode fazer para mudar o seu mundo?”, já que conforme elas, nós não
podemos mudar o mundo inteiro, mas podemos mudar o mundo ao nosso redor.
As idealizadoras do projeto afirmam que escolheram o lambe-lambe por ser
um meio de comunicação massivo e de baixo custo, sendo uma expressão popular
13
Projeto de intervenção artística urbana colaborativo, onde mensagens são espalhadas pelas
cidades através de adesivos autocolantes (post-it).
64
das ruas, como afirma Cartaxo (2009). As mensagens que os cartazes carregam
são, em sua maioria, criadas por elas. Contam que inicialmente as frases surgiam a
partir de brainstom, técnica muito utilizada por criativos para gerar ideias. Com o
passar do tempo, os insights começaram a surgir de maneira mais espontânea,
conforme as situações que presenciavam no decorrer de suas rotinas. O projeto é
uma tentativa de, através da arte de rua, tornar o dia das pessoas mais leve e o
espaço urbano mais humanizado. Os lambe-lambes funcionam como lembretes,
para que a correria da vida contemporânea não nos deixe passar por cima das
coisas que realmente importam. O nome Somosinstantes, explica Betina, é uma
referência à efemeridade do lambe-lambe, que a partir do momento em que é
colocado nas ruas, não é possível prever quanto tempo vai durar fixado no local,
seja por condições climáticas ou vandalismo.
Fonte: Arquivo pessoal.
O Somosinstantes é um projeto independente e de cunho social, mantido
pelas idealizadoras e parcerias construídas pelo caminho. Isso faz com que o
conteúdo das mensagens não sigam nenhum viés político ou comercial, sendo
totalmente ideológico. As meninas afirmam que todo o trabalho que realizam é feito
Figura 23: Lambe-lambe do Somosinstantes compondo as ruas.
65
com amor e por amor e salientam que o realizam por acreditarem nas pessoas, na
força das palavras e dos pequenos gestos.
Os cartazes do projeto Somosinstantes são compostos de elementos simples,
mas que garantem uma identidade visual marcante e de fácil reconhecimento. Preto
e branco, com letras em caixa alta e elementos que asseguram sua personalidade, é
de fácil leitura e visualização e se destaca em meio tanta informação que temos
pelas ruas da cidade. Hoje o projeto conta com mais de vinte frases diferentes, que
são espalhadas periodicamente pelo cenário urbano. Dentre elas, podemos destacar
“Seja gentil, obrigado.”, “Calma! Ainda há tempo.” e “Pessoas de bem se
reencontram. Até breve.” O processo tradicional de impressão do lambe-lambe é
através da técnica silk-screen, porém, as interventoras afirmam que encontraram na
impressão digital uma forma de agilizar o trabalho e torná-lo mais econômico.
Fonte: Arquivo pessoal.
Analisando o cenário em que o projeto inicialmente se inseriu, temos a cidade
de Caxias do Sul. Com mais de 450 mil habitantes, segundo o IBGE (2014), sendo
um polo industrial colonizado por imigrantes italianos. A cultura da cidade segue as
Figura 24: Lambe-lambes de projetos nas ruas de Caxias do Sul.
66
tradições italianas até os dias atuais, valorizando muito o trabalho e o dinheiro. Os
movimentos culturais e artísticos encontram grandes barreiras para seu
desenvolvimento e reconhecimento nessa região, principalmente a arte de rua, que
acaba sendo por muitas vezes, confundida com vandalismo.
Os primeiros lambe-lambes do projeto ganharam às ruas em setembro de
2014. As frases “Calma! Ainda há tempo.”, “O que não te faz bem não te pertence.”
e “Sim! Porque eu tô afim.” foram as primeiras a estamparem as ruas de Caxias do
Sul. O momento da colagem dos cartazes pela cidade foi documentado para depois
ser divulgado nas redes sociais. Os cartazes foram espalhados na área mais central
da cidade, onde há muita circulação de pessoas. Nessa primeira experiência de sair
para colar lambe-lambe nas ruas, as idealizadoras contam que presenciaram
diferentes tipos de reações das pessoas que as viam praticando a ação. Foram
questionadas do propósito de colar os cartazes, confundidas com religiosas ou até
mesmo com disseminadoras de propaganda política. A cidade de Caxias do Sul não
tem a cultura da arte de rua. As ruas da cidade dificilmente contam com algum tipo
de intervenção artística, diferente do que vemos em outras cidades desenvolvidas
do país. Assim, o cartaz introduzido nessa urbe traz uma nova experiência para a
população, proporcionando pequenos instantes de reflexões nas pessoas que por
ele passam e se deixam ser tocadas pelo conteúdo.
Sempre que possível novas mensagens são criadas e novos cartazes são
desenvolvidos para serem espalhados pela cidade. Cada mensagem procura
conversar com o local em que está sendo inserida. Não acidentalmente, o tempo de
permanência dos cartazes em cada local varia muito com o público que o frequenta.
Quando fixados em zonas mais comerciais e residenciais, os cartazes têm uma
durabilidade maior, sendo extraviados por questões climáticas. Já, quando colados
em regiões da cidade em que há maior fluxo de pessoa pela noite, como no Largo
da Estação Férrea, região com concentração de bares e casas noturnas, os cartazes
são mais efêmeros. Alguns cartazes fixados nessa região sofreram até interferências
de segundos, que intervêm na intervenção incansavelmente, riscando, rasgando e
modificando as mensagens. Esse é um reflexo do contexto em que o cartaz é
inserido.
Certas obras ou intervenções artísticas instauradas no urbano recentemente são iniciativas de consequências e efeitos complexos. algumas se
67
presentificam em concordância com seu contexto, aflorando-lhe novas orientações, caracterizando-o diferencialmente em sua materialização espacial. há, porém, situações de confronto entre um e outro, ainda que não permanente, chegando-se a extremos de destruição da própria obra. (PALLAMIN, 2000, p. 17)
Desde que a primeira colagem de cartazes lambe-lambe pela cidade de
Caxias do Sul aconteceu, é possível identificar uma atribuição de sentido do fruidor
ao cartaz. Entende-se que o lambe-lambe inserido no contexto urbano, passa a ser
um signo, algo que significa algo, segundo a semiótica. Seu conteúdo é um código a
ser interpretado pelo receptor. Umberto Eco (1988) defende que toda obra é uma
obra aberta, ou seja, pode ter diferentes interpretações, dependendo do seu receptor
e de onde está inserida. Assim, o lambe-lambe passa a ser um código, que foi
entendido de diferentes formas ao passar a integrar a cena. Cada mensagem foi
criada com uma intenção, e ao atingir um público de massa, provocou uma
identificação de parte de seus receptores. Entende-se que o contato do indivíduo
com o cartaz lambe-lambe provocou uma subjetivação entre como ele entende a
mensagem que o lambe-lambe carrega dentro do contexto urbano com o modo que
isso faz ele se relacionar com o ambiente social, sendo esse o seu mundo interno.
Essa atribuição de sentido que ocorre no contato do receptor com a obra tem uma
ligação direta com nossos processos psicológicos.
O homem, sendo um ser social, é influenciado pela sociedade. Pequenos
pontos na cidade que, ao serem alterados pelas intervenções do projeto provocam
uma mudança de comportamento em algumas pessoas da sociedade, fazem com
que essa atitude multiplique-se, influenciando cada vez mais, de maneira positiva, as
pessoas ao seu redor. É como andar na rua e sorrir para alguém. Quando o sorriso
é retribuído, te incentiva a seguir sorrindo para as próximas pessoas que passarem.
Os lambe-lambes do Somosinstantes, sugerindo questionamentos e mudanças de
atitude funcionam dentro da mesma fórmula. Seja gentil, que a gentileza lhe
retornará. O Somosinstantes em Caxias do Sul é, portanto, um movimento cultural
de cunho social.
68
Fonte: <http://instagram.com/projetosomosinstantes>. Acesso em 04 nov. 2015.
A subjetividade da sociedade está ligada a nossa interioridade. O modo como
interpretamos as mensagens dos cartazes está relacionado com o que estamos
sentido naquele momento, com quais situações estamos vivenciando, quais
experiências estamos vivendo. Nossa forma de interpretação é única, pois a
subjetividade de cada pessoa é única também.
Um exemplo concreto foi a inserção de um cartaz lambe-lambe dizendo
“Calma! Ainda há tempo” em um poste, na entrada de uma faculdade. A intenção de
parte dos interventores era provocar um momento de pausa e entendimento de que
temos tempo para fazer as coisas que precisamos. O propósito era fazer entender
que não precisamos estar correndo o tempo todo, que apesar de nossas
responsabilidades, podemos respirar fundo, servindo como um conselho, um aviso
de que ainda daria tempo para realizarem todos seus deveres. Um dos retornos que
o projeto teve foi da estudante Jennifer Poletto, que entrou em contato através da
fanpage14 para relatar que o lambe-lambe "Calma! Ainda há tempo" se tornou papel
14
www.facebook.com/projetosomosinstantes
Figura 25: Lambe-lambe do Somosinstantes inserido no contexto
urbano.
69
de parede do seu celular e a mensagem a ajudou no trabalho de conclusão de
curso, o que comprova a eficiência da atribuição de sentido dos interventores com a
construção simbólica da população.
Como visto antes, Focault (apud NETO, 2004) afirma que não existe uma
forma padrão de subjetividade, mas sim que ela é variável e emerge em conexão
com processos históricos, sociais, políticos, econômicos, urbanos. Assim, entende-
se que a subjetividade pode estar em contínua transformação. As mensagens do
Somosinstantes são um meio de atingir e, por consequência, alterar a subjetividade
do indivíduo.
Percebe-se que as pessoas passaram a atribuir significados às mensagens
espalhadas pela cidade, fazendo com que tivessem significados relevantes em
ocasiões dos seus cotidianos. A manifestação cultural que acontecia na cidade
passou a chamar a atenção dos habitantes e da mídia. Desde a primeira colagem de
lambe-lambes na cidade, foi possível acompanhar a repercussão do projeto na
internet, através das redes sociais. O projeto teve muita adesão e logo fotos dos
cartazes passaram a ser compartilhados na rede, muitas vezes com a hashtag
#somosinstantes. Assim, foi possível acompanhar a disseminação do projeto de arte
urbana e o seu desenvolvimento. Com a repercussão da mídia, o Somosinstantes foi
ganhando força e espaço. Mais frases foram desenvolvidas, mais cartazes foram
colados e mais pessoas passaram a apoiar o projeto, a partir do momento que se
identificaram com a causa. A RBS TV Sul, em novembro de 2014, procurou as
Figura 26: Depoimento de Jennifer sobre sua interação com os cartazes lambe-lambe.
Fonte:< http://facebook.com/projetosomosinstantes>. Acesso em 04 nov. 2015.
70
idealizadoras que contaram sobre o trabalho em uma reportagem e mostraram todas
etapas do processo criativo e de colagem pelas ruas. Tendo sido veiculada a nível
regional no ano de 2014 e estadual no início de 2015, fez com que o projeto
alcançasse proporções maiores ao atingir públicos de outras cidades. Foi através
dessa oportunidade que uma nova porta se abriu para o projeto.
5.2 – Porto Alegre
Até então o projeto Somosinstantes era encontrado somente em Caxias do
Sul. Com a divulgação espontânea gerada pela mídia local e regional, diferentes
oportunidades surgiram para o crescimento e desenvolvimento do projeto de arte de
rua, sendo a maior delas situada na cidade de Porto Alegre, capital do estado. Porto
Alegre é uma cidade desenvolvida que engloba diferentes grupos e classes.
Andando pelas ruas, encontramos muitas manifestações artísticas e culturais, sejam
elas grafites, pichações, intervenções, stickers e muitos cartazes, que
frequentemente disputam espaço e visibilidade com mídias comerciais que compõe
o cenário da cidade.
Procurado pela Sinergy Novas Mídias, empresa de mídia externa que atua
em Porto Alegre e em Florianópolis, o Somosinstantes recebeu a proposta de
assinar uma parceria colaborativa com a agência. Durante o ano de 2014, a Sinergy
colocou nas ruas da capital gaúcha a sua campanha "Eu Olho POA", que exibia em
seu mobiliário urbano mensagens buscavam fortalecer o posicionamento ético e
sustentável, além de inspirar as pessoas a terem atitudes semelhantes, incentivando
o exercício da cidadania. Tendo conhecimento do projeto de arte urbana de Caxias
do sul, a empresa se interessou pela iniciativa do trio de amigas, e propôs uma
parceria para realizar a veiculação das mensagens do projeto de uma forma
diferente do seu convencional, agora em uma mídia de alta visibilidade, sendo
busdoor15 e traseiras e laterais de bancas de revistas que permeiam a cidade.
Conforme entrevista realizada pelo portal Coletiva Net com a Sinergy, a
parceria com o Somosinstantes dá sequência à sua campanha “Eu Olho POA”, que
15 Ferramenta de mídia composta pela aplicação de um adesivo no vidro traseiro de um
ônibus.
71
propunha ao porto-alegrense um olhar mais leve sobre a rotina. O CEO16 da
Sinergy, Eduardo Ferreira, explica:
A ideia é, mais uma vez, garantir leveza ao dia a dia do porto-alegrense. Todos andam correndo nas ruas, falam ao celular, não olham para os detalhes da cidade. Em 2014, nós fizemos uma campanha que propunha mais humor, mais sorrisos, mais pedaladas, entre outras coisas. Em 2015, decidimos abraçar o projeto Somosinstantes, porque entendemos que ações colaborativas e pequenas doses diárias gentileza podem mudar o cotidiano de uma cidade que está sempre correndo contra o tempo. (coletivanet, 2015)
A empresa percebeu a positiva aceitação das mensagens do Somosinstantes
pelos cidadãos e usou isso a seu favor. As mensagens do projeto foram adaptadas
para veicularem nas bancas de revistas e traseiras de ônibus, mantendo sua
identidade visual. Logo, a cidade de Porto Alegre se viu tomada por uma campanha
publicitária que provocava um grande impacto social, assinado pelo projeto em
parceria com a agência. Durante seis meses, as mensagens do Somosinstantes
veicularam no pontos que não estavam locados por clientes da empresa, havendo
rodízios de peças, fazendo com que a campanha circulasse por toda Porto Alegre.
16
Chief Executive Office, Diretor executivo em português.
Figura 27: Mensagens do Somosinstantes nas bancas de revista de
Porto Alegre.
Fonte: <www.coletiva.net>. Acesso em 04 nov. 2015.
72
Quem ainda não conhecia o Somosinstantes, passou a conhecer, reconhecer
e muitos a se identificar com o projeto. Mais uma vez, as diferentes mensagens
foram recebidas, interpretadas, compartilhadas pelas pessoas que circulavam pelas
ruas da capital, fosse a pé, de transporte público ou de carro. A visibilidade da
mensagem aplicada em uma mídia externa de grande alcance fez com que o
impacto fosse maior em comparação ao uso dos cartazes lambe-lambes como meio
de comunicação do projeto. Vera Pallamin (2000) defende que, em cada situação,
uma intervenção pode surtir um resultado diferente.
Contudo, assim como em Caxias do Sul, as pessoas seguiram atribuindo
significado às mensagens. A diferença é que passaram a relacionar o propósito com
a marca Sinergy, gerando um engajamento tanto com o projeto Somosinstantes
quanto com a empresa.
F
Fonte:< http://facebook.com/projetosomosinstantes>. Acesso em 04 nov 2015.
Figura 28: Comentário publicado na Fanpage do Somosinstantes.
73
O jornal Zero hora, maior portal de informações do estado do Rio Grande do
Sul produziu uma matéria em julho de 2015 sobre a campanha em questão.
Levando a repórter Lara Ely às ruas para questionar as pessoas sobre o que elas
entendiam ao se encontrar com as mensagens estampadas nos mobiliários urbanos.
Os depoimentos retirados da entrevista, que veiculou no portal online do jornal , nos
mostram uma boa aceitação da campanha nas ruas por parte da população.
Enquanto as grandes marcas utilizam esses espaços para impulsionar suas vendas,
o propósito da Sinergy, aos olhos da população, não era interpretado como algo
comercial.
Flavio Herter foi entrevistado enquanto estava parado no sinal de trânsito e
contou na reportagem que ao cruzar com a frase "Vai dar certo!" entendeu que ela
funcionava como um incentivo para fazermos aquilo que temos vontade. “Entendo
que aquilo que a gente tá pensando realmente vai dar certo”, afirmou ele. Outro
entrevistado foi Alexandre Guimarães, pedestre que caminhava por um dos pontos
em que a Sinergy veiculava as mensagens do projeto. Ele afirma que “a gente
escuta muitas palavras negativas e quando a gente se depara com uma coisa que
nos dá um estímulo, a gente pensa que 'hoje a coisa engrena'”. Para ele, a
campanha pode ser definida com uma palavra: motivação. Vacilani Medeiros, outra
entrevistada na reportagem, foi questionada sobre a sensação que a frase “Já falou
que ama alguém hoje?” lhe provocava, e sua constatação foi de que essa é uma
frase pouco usada hoje em dia, e na sua opinião, deveria ser colocada em prática
mais vezes, tanto nos momentos em família, quanto no dia-a-dia no trabalho. “É uma
frase que vai engrandecer muito o teu dia”, afirma Vacilani.
74
Fonte: <http://instagram.com/projetosomosinstantes>. Acesso em 04 nov. 2015.
Percebe-se que a população identificou a mídia externa como um signo,
dando-lhe significados baseados no seu contexto cultural. São depoimentos de
diferentes pessoas que nos relatam as suas próprias interpretações. Para alguns,
incentivo, para outros, lembretes. Dentro do pensamento de Osório (2011), podemos
observar na prática como o encontro do indivíduo com a mensagem em espaço
urbano causa um choque, deslocando o observador da sua zona de conforto,
fazendo-o questionar aquilo que era apresentado, sua ideia e seu contexto. Assim, é
possível constatar o que foi atribuído como sentido e significado pelas pessoas ao
cruzar com a campanha pelas ruas, sendo em sua maioria considerado como um
objetivo alcançado pelo Somosinstantes, ao conseguir ressignificar espaços e
proporcionar pequenas quebras de rotina e incentivos para os cidadãos tocados pela
campanha.
Figura 29: Positividade nas ruas de Porto Alegre.
75
A Sinergy Novas Mídias alavancou o projeto Somosinstantes ao propor a
parceria que gerou visibilidade e reconhecimento através da veiculação da sua
essência em mídias externas, mas ao mesmo tempo, a empresa também se
beneficiou com a ação colaborativa, embora muitos não percebessem o apelo
comercial da campanha realizada. Enquanto a intenção primária da campanha era
gerar mídia, a secundária era divulgar a marca Sinergy, reforçando a associação da
marca com questões sociais. Em uma realidade em que há tantas crises de valores
como a nossa, associar um nome a atitudes beneficentes, causas que envolvem
bem-estar, aceitação de diferenças, incentivos para a população, gera engajamento,
admiração e valor de marca. E foi isso que a Sinergy conseguiu durante os seis
meses de campanha.
Hoje, os olhos das pessoas estão saturados diante da mídia e de suas
repetitivas estratégias. Nem toda propaganda funciona de forma eficaz. Para
sobreviver e se desenvolver no mercado, as empresas têm a necessidade de
encontrar formas diferentes de vender suas marcas ou produtos, empresas têm
procurado atrelar a eles valores que são considerados importantes, embora muitas
vezes esquecidos, pela sociedade. Mesmo sem gerar lucro de maneira direta,
percebe-se que a parceria com o projeto gerou um grande retorno de mídia
espontânea para agência, que passou a ser citada nas publicações daqueles que
compartilhavam a ideia na web. As pessoas passaram a implementar em suas
postagens nas redes sociais a hashtag #sinergy, gerando um reconhecimento de
marca e mídia espontânea por parte da população.
Figura 30: Depoimento na fanpage do Somosinstantes após veiculação de campanha com a Sinergy.
Fonte: http://facebook.com/projetosomosinstantes. Acesso em 04 Nov 2015.
76
Fonte: <www.instagram.com>. Acesso em 04 nov 2015.
As mensagens do projeto Somosinstantes inseridas na urbe foram um modo
de dar novos significados para os espaços urbanos da cidade de Porto Alegre. A
leveza da mensagem visual modifica a relação espaço/subjetividade do indivíduo
que habita a cidade.
É a partir desse exemplo que é possível perceber que há uma tendência da
publicidade contemporânea ser inovadora. Hoje, para a publicidade ser eficaz, ela
deve ser acima de tudo relevante. Ela tem que nos tocar de alguma forma. Em pleno
século XXI, é possível observar alguns padrões de consumos sendo modificados. As
pessoas estão procurando consumir algo que transcenda o valor físico e tenha valor
agregado seja devido seu processo de produção, às preocupações da marca com
meio ambiente ou à importância em voltar a viver em um ritmo menos acelerado, por
exemplo. O consumidor quer saber quais são as preocupações da marca/empresa
com o lado humano, o lado social. Dessa forma, as empresas precisam encontrar
meios de chegar a esse novo tipo de público consumidor, que está exausto das
mesmas táticas de mercado e mesmas formas de persuasão de anos atrás. É
Figura 31: #sinergy sendo utilizada de maneira espontânea no Instagram.
77
preciso inovar, e mais do que isso, é preciso arriscar. O que ficou muito evidenciado
no case estudado. A Sinergy apostou em uma parceria colaborativa que embora não
lhe trouxesse retorno financeiro de maneira direta, lhe agregava pontos positivos em
questão de imagem de marca.
Juliana Dornelles, Executive Manager 17 da agência Sinergy Novas Mídias,
deu seu depoimento para a realização do estudo, e nos questiona sobre o que as
pessoas esperam de um outdoor. "Uma mensagem comercial. Um apelo de venda.
Um produto estampado. Mas por que não vendermos uma ideia? Por que não
usarmos esse espaço para propagar bons sentimentos, ações de gentilezas,
incentivo para os moradores dessa metrópole que corre sempre contra o tempo. A
publicidade por si só não vende. É preciso ter um apelo maior por trás disso, uma
causa, algo que nos toque de verdade. É assim que hoje a publicidade se torna
eficaz."
Fonte:< http://facebook.com/projetosomosinstantes>. Acesso em 04 nov. 2015.
17
Gerente Executiva, em inglês.
Figura 32: Gentileza pelas ruas de Porto Alegre.
78
A campanha publicitária produzida em parceria com o Projeto Somosinstantes
questionou os moradores da cidade de Porto Alegre, desafiou suas capacidades
interpretativas e provocou reflexões acerca de mudanças de atitude, realizando um
trabalho social ao mesmo tempo em que não perdia a sua presença comercial. Além
da ideia, a Sinergy agregou valor à sua marca, gerou mídia e divulgou seu serviço e
seus pontos de locação para veiculação de publicidades na cidade de Porto Alegre.
Assim, entende-se que uma maneira da publicidade atual ganhar destaque,
chamar a atenção e ser relevante para o público e mercado, que hoje se encontram
saturados de apelos diretamente comerciais que compõe e se integram a nossa
cena urbana, é arriscar procurando outras alternativas de se fazer ser visto. A
intenção da empresa de comunicação em abraçar causas colaborativas e subsidiar
projetos culturais que já existem e têm uma boa aceitação do público é uma forma
de vender sua marca/produto, carregando junto um apelo social que é bem visto e
aceito por grande parte da população.
79
80
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entende-se que desde o princípio, o homem tinha a necessidade de se
comunicar. A comunicação foi evoluindo com o tempo, e o homem foi encontrando
diferentes meios de ter voz. A arte urbana surgiu junto com a arte contemporânea,
tendo muitas referencias do Pop Art. Os cartazes de rua, que hoje conhecemos
como lambe-lambe, tiveram diversos usos conforme o contexto e tempo em que
foram inseridos. De divulgação de cabarés a manifestações artísticas, o lambe-
lambe sobreviveu ao tempo e é amplamente utilizado até os dias de hoje. Na
atualidade, o encontramos em generosas quantidades nas grandes cidades,
carregando diferentes tipos de mensagens. Essas, que podem ser interpretadas de
diversas formas, dependendo muito da subjetividade e do contexto em que o
receptor está inserido.
O projeto Somosinstantes encontrou através do uso do lambe-lambe um meio
de dar espaço para suas mensagens com cunho social no contexto urbano.
Constatamos que a intervenção urbana do projeto Somosinstantes é uma forma de
ressignifcar espaços urbanos, provocar quebras de rotina e levar mensagens
positivas para a população de Caxias do Sul que, ao ter contato com os cartazes do
projeto, passou a atribuir sentidos próprios às frases, fazendo com que o
Somosinstantes criasse um engajamento com o público. A aceitação de parte do
público foi tamanha, que chamou a atenção de grandes empresas.
Ao verificar esse fenômeno, a agência de Porto Alegre teve visão e propôs
uma campanha colaborativa ao entender que associar seu nome ao projeto lhe traria
benefícios como empresa/marca. Assim, entende-se que o projeto foi desdobrado
em uma campanha publicitária devido à oportunidade detectada pela empresa, que
enxergou a propagação de mensagens do projeto de arte de rua como uma boa
estratégia de marketing. A marca compreendeu que hoje o mercado está concorrido
e os clientes buscam por um diferencial. Ao associar a agência com um projeto
social que visa o bem, promove ações positivas e tem impacto na vida das pessoas,
a Sinergy trouxe apelo de marca para sua empresa. Constatamos que a
preocupação social por parte de marca/empresas cativa o público e que formas
diferentes de fazer publicidade ganham visibilidade e reconhecimento. A apropriação
por parte da empresa sobre o projeto mostrou sua preocupação com o lado humano
e ainda se vendeu para a população, que passou a reconhecer a empresa e criar
81
vínculos com a marca, nos mostrando também que projetos culturais independentes
têm potencial para serem subsídios da publicidade pois tratam de cultura e visam o
social.
O projeto de arte urbana se desdobrou em uma campanha publicitária na
cidade de Porto Alegre porque a empresa que propôs a parceria teve visão e
conseguiu perceber o que as pessoas realmente esperam da publicidade hoje em
dia: algo que vá além da sua função extremamente persuasiva e comercial. Ao
verificar que havia uma atribuição de sentido de parte da população sobre intenção
do projeto e que o impacto que o mesmo estava provocando em Caxias do Sul era
positivo, a Sinergy entendeu que podia explorar o trabalho do Somosinstantes a seu
favor. Ao propor uma parceria colaborativa, divulgou a marca, fortaleceu-a em meio
a questões sociais e deu destaque aos pontos de exibição que a agência tem na
cidade de Porto Alegre. Pontos que podem ser locados por outros anunciantes e que
ficaram marcados no imaginário urbano pelas mensagens que veicularam durante
os seis meses de parceria com o Somosinstantes, atrelando mais uma vez sua
marca a causas que ganharam a simpatia dos cidadãos.
Contudo, conclui-se que a publicidade, para ser eficaz, tem que nos tocar de
alguma forma.
82
83
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São Paulo: Perspectiva, 1988.
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The Keith Haring Fundation. Disponível em <http://www.haring.com/!/about-
haring/bio>. Acesso em: 11 out. 2015.
90
91
8. ANEXOS
1- Projeto de Trabalho de Conclusão de Curso.
2- Fragmento da Lei Cidade Limpa.
92
UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
GIULIA ANDREAZZA
A INTERVENÇÃO URBANA COMO SUBSÍDIO DA PUBLICIDADE:
PROJETO SOMOSINSTANTES
Caxias do Sul
2015/2
93
UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
HABILITAÇÃO EM PUBLICIDADE E PROPAGANDA
GIULIA ANDREAZZA
A INTERVENÇÃO URBANA COMO SUBSÍDIO DA PUBLICIDADE:
PROJETO SOMOSINSTANTES:
Projeto de Trabalho de Conclusão de
Curso apresentado como requisito para
aprovação na disciplina de Monografia I.
Orientador: Marcelo Wasserman.
Caxias do Sul
2015/2
94
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 4
1.1 Palavras Chave ……………………………………….......………………… 04
2 TEMA ................................................................................................................. 05
2.1 Delimitação do tema ............................................................................ 05
3 JUSTIFICATIVA .................................................................................................. 05
3.1 Pessoal …………………………………………………………..........………. 05
3.2 Acadêmica …………………………………………………………….…........ 06
3.3 Profissional …………………………………………....……………......….…. 06
3.4 Social ……………………………………………………………..……............ 07
4 QUESTÃO NORTEADORA ............................................................................... 07
5 OBJETIVOS ....................................................................................................... 07
5.1 Objetivo geral ......................................................................................... 07
5.2 Objetivos específicos ........................................................................... 08
6 METODOLOGIA ................................................................................................ 08
7 ROTEIRO DOS CAPÍTULOS ............................................................................. 09
8 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .............................................................................. 10
8.1 Arte Urbana ............................................................................................ 10
8.2 Lambe-lambe como produtor de sentido ............................................ 10
8.3 Lambe-lambe como mídia publicitária ................................................. 11
8.4 Análise do projeto Somosinstantes e sua apropriação pela
publicidade. .......................................................................................................... 11
9 CRONOGRAMA ................................................................................................ 12
10 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 12
95
1. INTRODUÇÃO
Este projeto de pesquisa é um estudo elaborado para ser a primeira parte do
trabalho de conclusão de curso de Comunicação Social, habilitação em Publicidade
e Propaganda, da Universidade de Caxias do Sul. O projeto tem como intuito
analisar e compreender como as intervenções urbanas podem ser percebidas como
subsídio para a publicidade. A proposta de trabalho é analisar o case
Somosinstantes, intervenção urbana que surgiu na cidade de Caxias do Sul e veio a
se tornar uma campanha publicitária na cidade de Porto Alegre. Para uma melhor
compreensão, arte urbana é a arte pública, que se faz no espaço público. É o gesto,
a intervenção, o evento, a instalação, tudo aquilo que exerce algum impacto sobre o
social.
Fazer urbanística significa contribuir para a transformação
qualitativa do urbano, alterando seus objetos, suas
capacidades, suas qualificações num trabalho que provoca e,
ao mesmo tempo exige, a compreensão dos seus códigos e a
interpretação de suas múltiplas significações. (PALLAMIN,
2000, p. 17)
A intervenção artística urbana é um modo de arte que dialoga diretamente
com as pessoas, pois é criada e pensada para estar nas ruas. É representada por
alguns elementos chaves e conhecidos pelos habitantes das grandes cidades como
o graffiti, a pichação, o stencil, porém aqui, trata-se dos cartazes lambe-lambe18.
O Somosinstantes é um projeto social que consiste em espalhar lambe-
lambes em alguns pontos do cenário urbano, carregando mensagens de reflexão
que provocam o questionamento naqueles que o percebem. O lambe-lambe contém
um tipo de texto que, para o semiólgo Umberto Eco, trata-se de um “texto aberto”, ou
seja, que se abre para inúmeras possibilidades interpretativas, sem criar resistência
contra a possibilidade de aberturas em sua interepretação, e podendo até assumí-
las, criando ambiguidades propositais.
18 Lambe-lambe: cartaz com conteúdo artístico e/ou crítico colado em espaços públicos.
96
1.1 Palavras chave – publicidade, arte urbana, lambe-lambe, projeto
Somosinstantes.
97
2. TEMA
A intervenção urbana como subsídio da publicidade: Projeto Somosinstantes.
2.1 Delimitação do tema
A colagem de cartazes lambe-lambe com frases motivadoras e
questionadoras pela cidade de Caxias do Sul a partir de uma proposta não comercial
que veio a se tornar uma campanha publicitária na cidade de Porto Alegre.
3. JUSTIFICATIVA
Esse estudo amplia o conceito de intervenção artística urbana, uma vez que a
população se expressa pelas ruas da cidade, dentro de um cenário público,
buscando reconhecimento e ignorando tanto as peculiaridades das várias
modalidades em que qualquer forma de arte se apresenta, passando a criar um
imaginário coletivo sobre a ação.
Essa proposta de pesquisa origina-se no momento em que deseja associar o
sentido à arte urbana e entender que a difusão de cultura que ocorre através desse
meio tem potencial para protagonizar grandes campanhas publicitárias,
estabelecendo relações de sujeitos reflexivos e críticos, provocando o
questionamento e trabalhando com a sensibilidade estética de quem acompanha
esse processo.
3.1 PESSOAL
Dentre as justificativas para a escolha do tema, está o fato do projeto
Somosinstantes ser uma idealização minha, junto de mais duas amigas. A arte
urbana sempre despertou nossa atenção. As pichações, os lambe-lambes, toda a
linguagem que provém da rua sempre foi um atrativo para nossos olhos. Inspiradas
em outros projetos que tratavam de arte urbana, decidimos deixar de ser meras
observadoras e passar a ser autoras desse tipo de intervenção. Através da produção
de cartazes lambe-lambe, mídia massiva e de baixo custo, passamos a espalhar
mensagens pelo cenário urbano, buscando fazer pequenas alterações no espaço
público com o intuito de provocar mudanças na cidade e na população.
98
3.2 ACADÊMICA
Durante a minha caminhada acadêmica, acumulei conhecimentos e
referências que foram capazes de dar embasamento para a criação de um projeto
publicitário diferente e um tanto quanto novo na cidade. Os estudos de teoria da
comunicação, que pesquisam os efeitos, origens e funcionamento do fenômeno da
comunicação social, trouxeram conhecimentos sobre os processos comunicativos,
trazendo teorias sobre a emissão até a recepção uma mensagem.
Segundo os semióticos, tudo aquilo que tem um significado, que produz
sentido, é considerado signo. O signo é um elemento de comunicação. O receptor
que atribui o sentido ao signo, interpretando de diferentes formas tudo aquilo que vê.
Algumas teorias mais tradicionais afirmavam que todo processo de
comunicação ocorria da mesma forma: o emissor enviava a mensagem, que era
interpretada da mesma forma por diferentes receptores, sem ruídos. No modelo
semiótico de Eco, tratando-se de uma obra aberta, toda mensagem enviada pode
ser interpretada de múltiplas maneiras. O Projeto Somosinstantes parte da
afirmação de Umberto Eco ao encaixar seu trabalho como uma obra aberta,
quebrando o conceito do processo tradicional de comunicação, e deixando o leitor
livre para interpretar o código transmitido pelos lambes-lambes.
3.3 PROFISSIONAL
O projeto Somosinstantes traz à tona outra maneira de se fazer publicidade
não comercial. A importância da experimentação do uso de novas formas
comunicacionais pelos profissionais do mercado publicitário faz com que a
observação da cena urbana venha a ser uma nova estratégia potencial para o
mercado.
A relevância deste trabalho se dá exatamente pelo experimento de utilização
de algo que está em contínuo desenvolvimento. As ruas falam. A cidade fala. Porém,
nem todos estão aptos para escutar. Hoje a comunicação se mostra de variadas
formas e o comunicador contemporâneo tem total capacidade de encontrar em toda
arte urbana o contexto e a ideia que certo grupo quer passar para a população, a
ponto de transformar intervenções urbanas com fins ideológicos em campanhas
publicitárias, saindo da marginalidade e transmitindo a ideia para todas as pessoas
do contexto urbano.
99
A busca da utilização dessa estratégia pelos futuros profissionais do mercado
publicitário permite que toda a forma de comunicação presente na cena urbana seja
observada de modo empírico e teórico, revelando seu potencial e suas
possibilidades de desdobramento dentro do contexto mercadológico.
3.4 SOCIAL
Ao situar a intervenção artística urbana no processo social, volta-se o olhar
para a oportunidade de se promover práticas de expressão cultural como forma de
provocar a reflexão à população.
O projeto visa impactar o público e provocar questionamentos que façam a
diferença na vida das pessoas. O uso de uma mídia não convencional, sendo o
lambe-lambe, cartaz de fácil produção e fixação pelas áreas da cidade foi uma
alternativa lançada ao público para provocar uma interiorização, causar expectativa
em torno de um conteúdo e gerar mídia gratuita nos demais meios de comunicação
massivos a respeito desse trabalho. O projeto Somosinstantes é importante para a
sociedade, pois humaniza o espaço urbano.
4. QUESTÃO NORTEADORA
Como a proposta de colagem de cartazes lambe-lambe na cidade de Caxias
do Sul se tornou significativa a ponto de se transformar em uma campanha
publicitária na cidade de Porto Alegre?
5. OBJETIVOS
5.1 Objetivo geral
Analisar o processo de atribuição de sentido em relação à intervenção urbana
realizada com a colagem de cartazes lambe-lambe do projeto Somosinstantes na
cidade de Caxias do Sul como subsídio para a realização de campanhas
publicitárias.
5.2 Objetivos específicos
100
Analisar a construção simbólica realizada pela população a partir do contato
com os cartazes lambe-lambe na cidade de Caxias do Sul.
Dissertar sobre os subsídios para mediação da intervenção urbana a fim de
apreciar a linguagem visual como um modo particular de ver, sentir e perceber o
mundo.
Identificar o que foi atribuído como sentido e significado para causar o
desdobramento do projeto de intervenção urbana a uma campanha publicitária.
6. METODOLOGIA
A seguinte monografia se desenvolve a partir de um estudo de caso
exploratório com uma abordagem semiótica.
O Estudo de caso, de Robert K. Yin, é uma “inquirição empírica que investiga
um fenômeno contemporâneo dentro de um contexto da vida real”, segundo o autor.
Ele afirma que esse estudo é a estratégia mais procurada quando é preciso
responder questões do tipo “como” e “por que”. Quando o pesquisador tem pouco
controle sobre os eventos e quando o foco se encontra em fenômenos
contemporâneos inseridos em algum contexto da vida real, o Estudo de Caso é
recomendado.
Yin relata três principais tipos de estudo de caso, mas o utilizado será o
exploratório, que é realizado em áreas em que existe pouco conhecimento
acumulado e sistematizado. É, portanto, adequado para o objetivo de aumentar o
número de conhecimentos sobre o assunto, ideal para a formulação de questões ou
de problemas de investigação. Esse método será utilizado na análise do projeto
Somosinstantes, desde seu surgimento e crescimento em Caxias do Sul até seus
desdobramentos na cidade de Porto Alegre.
Em conjunto, o método Semiótico com base nos estudos de Umberto Eco,
será aplicado nessa pesquisa para a análise do processo de atribuição de sentidos
ocorrida tanto na primeira fase do projeto em Caxias do Sul, como na segunda fase,
na cidade de Porto Alegre.
A Semiótica é a ciência que se dedica a estudar a produção de sentido,
revelando as formas de como o indivíduo dá significado a tudo que o cerca. A
semiótica busca analisar a mensagem não somente do ponto de vista de sua
101
formação, sendo o ponto de vista do emissor, mas também considerar o ponto de
vista do leitor, receptor da mensagem. Assim, o leitor passa a criar novas formas de
interpretar a mensagem a partir das suas próprias experiências. Umberto Eco, em
seu livro Obra Aberta, trata da mensagem estética e a interpretação sígnica. Eco
propõe o conceito de “obra aberta”, que define a obra de arte como algo inacabado
que exigiria do receptor, no ato da fruição, uma participação bastante ativa a fim de
perceber a obra como um objeto aberto a várias possibilidades interpretativas. Em
cada fase do projeto, foram atribuídas signifcações diferentes por seus receptores,
baseadas nos diferentes contextos culturais, sociais e mercadológicos em que o
projeto se desenvolve
7. ROTEIRO DOS CAPÍTULOS
A referente monografia se desenvolverá em 4 capítulos, além de introdução e
conclusão, sendo eles três capítulos teóricos e um capítulo analítico.
Capítulo 1: Introdução.
Capítulo 2: Arte Urbana – Vera Pallamin e Armando Silva.
2.1 A intervenção urbana e suas derivações
2.2 Lambe-lambe como ferramenta de comunicação
2.3 Da margem à cena profissional
2.4 Quando passam de observadores para autores
Capítulo 3: Lambe-lambe como produtor de sentido – Umberto Eco.
3.1 Uso e interpretação
3.2 Lambe-lambe como obra aberta
3.3 Subjetivação no/do espaço urbano
Capítulo 4: O lambe-lambe como mídia publicitária – Abraham Moles.
4.1 Cartaz: conceito e história
4.2 O uso histórico do cartaz como mídia
4.3 Lambe-lambes e o uso publicitário no século XXI
102
Capítulo 5: Análise do projeto Somosinstantes e sua apropriação pela
publicidade – Robert K. Yin.
5.1 O projeto Somosinstantes em Caxias do Sul
5.2 O projeto Somosinstantes em Porto Alegre
Capítulo 6: Considerações finais.
8. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Capítulo 2: Arte Urbana
Nesse capítulo, será utilizado como principais autores Vera Pallamin e
Armando Silva, pois ambos trazem a temática de arte urbana, conceito, construção e
visão da cultura urbana em suas obras.
Vera Pallamin, em seu livro Arte Urbana: São Paulo, Região Central, aborda a
conceituação sobre arte urbana e processos de estetização contemporâneos,
sintetizando uma reflexão sobre práticas artísticas e suas relações com as
transformações qualitativas dos espaços públicos.
Armando Silva, em sua obra Atmosferas Urbanas, discute as representações
visuais presentes nas cidades contemporâneas, com ênfase no grafite e seus
desdobramentos face à arte pública e aos nichos estéticos. Para Silva, os
pensamentos e desejos individuais formam redes que criam tramas em cenários
virtuais, expressão não só dos lugares geográficos, mas da atmosfera que envolve
os cidadãos, constituindo os imaginários coletivos e a cultura urbana.
Outros autores que abordam o contexto de arte urbana serão citados em seus
livros, artigos, e-books e outros materiais acadêmicos atuais para pesquisa.
Capítulo 3: Lambe-lambe Como Produtor de Sentido
No capítulo 3, Umberto Eco será utilizado como referências bibliográficas para
a construção do mesmo. Em seu livro, Obra Aberta, ele teoriza sobre a arte
contemporânea, analisando o conteúdo ambíguo das criações e a possibilidade do
público ser o seu intérprete suprema. Para ele, todo texto é incompleto, ou seja,
103
possui "espaços em branco" que serão preenchidos pelo leitor. Ele os separa em
textos fechados e abertos, sendo os fechados aqueles em que o autor fecha o
sentido de seus textos a fim de se evitar as suposições ou interpretações erradas e
os abertos sendo aqueles que não criarão resistência contra a possibilidade de
aberturas em sua interpretação.
Para Umberto Eco, quando a fonte física é substituída por um ser humano,
passa-se para o universo do sentido. Neste caso, o emissor é capaz de atribuir
significado aos significantes, que serão decodificados por receptores também
capazes de manter e modificar seus significados. A mensagem está aberta para
uma multiplicidade de códigos.
Capítulo 4: O lambe-lambe como mídia publicitária
No capítulo 4, Abraham Moles será utilizado como referência bibliográfica,
tendo como base a sua obra O Cartaz, que levanta tópicos importantes sobre o
papel do cartaz na construção do espaço urbano.
Junto a isso, a monografia da publicitária Daniela Rossi, sobre o tema
Cartazes do metrô de Londres: Arte, Design e Transporte Público no século XX
auxiliará na construção histórica do instrumento de comunicação.
O site http://historiadocartaz.weebly.com/origens.html também contribuirá com
referências sobre o uso do cartaz como mídia publicitária, abordando os conceitos
da Art Nouveau, desde sua utilização na divulgação de espetáculos de cabaré na
Europa introduzidos por Toulouse-Lautrec, que impulsionou a arte publicitária à
alcançar popularidade, até desdobramentos mais atuais do uso dos cartazes na
street art.
Capítulo 5: Análise do projeto Somosinstantes e sua apropriação pela
publicidade
No capítulo 5, utilizarei como complemento teórico e como referência para a
construção da análise do projeto Somosinstantes Robert K. Yin. Partindo do estudo
de caso exploratório, Yin afirma que o estudo de caso é um modo de se investigar
um tópico empírico seguindo um conjunto de procedimentos pré-especificados,
104
utilizado principalmente para explicar vínculos causais em intervenções da vida real
e descrever uma intervenção e o contexto da vida real em que ocorreu.
9. CRONOGRAMA
Julho Agosto Setembro Outubro Novembro
Pesquisa bibliográfica x x x x
Coleta e análise de dados de
pesquisa
x x x x
Desenvolvimento x x x
Revisão x x
Preparação para
apresentação
x x
Apresentação x
REFERÊNCIAS
DOS SANTOS, Gerson T. O leitor-modelo de Umberto Eco e o debate sobre os
limites da interpretação – São Paulo: Kalíope, 2007.
ECO, Umberto. Obra aberta: forma e indeterminação nas poéticas contemporâneas.
São Paulo: Perspectiva, 1968.
MOLES, Abraham A. O cartaz. Tradução de Miriam Garcia Mendes – São Paulo:
Perspectiva, 1987.
PALLAMIN, Vera. Arte urbana: São Paulo: região central (1945-1998); obras de
caráter temporário e permanente. São Paulo: Annablume, 2000.
SILVA, Armando. Atmosferas Urbanas – Grafite, Arte Pública, Nichos Estéticos –
Curitiba: Sesc, 2014.
105
YIN, R.K. Estudo de caso: planejamento e métodos – Porto Alegre: Bookman,
2005.
SITES CONSULTADOS:
História do Cartaz. Disponível em: <http://historiadocartaz.weebly.com> Acesso em:
14 mai. 2015.
Melodia Visual. Disponível em: <http://melodia-visual.blogspot.com.br> Acesso em:
25 mai. 2015.
O cluster. Disponível em: <http://www.ocluster.com.br> Acesso em: 02 mai. 2015.
106
LEI N.º 14.223 DE 26 DE SETEMBRO DE 2006
Dispõe sobre a ordenação dos elementos que compõem a paisagem urbana do
Município de São Paulo.
Gilberto Kassab, Prefeito do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe
são conferidas por lei, faz saber que a Câmara Municipal, em sessão de 26 de setembro de
2006, decretou e eu promulgo a seguinte lei:
Decreta:
CAPÍTULO I
DOS OBJETIVOS, DIRETRIZES, ESTRATÉGIAS E DEFINIÇÕES:
Art. 1º - Esta lei dispõe sobre a ordenação dos elementos que compõem a paisagem
urbana, visíveis a partir de logradouro público no território do Município de São Paulo.
Art. 2º - Para fins de aplicação desta lei, considera-se paisagem urbana o espaço aéreo e a
superfície externa de qualquer elemento natural ou construído, tais como água, fauna, flora,
construções, edifícios, anteparos, superfícies aparentes de equipamentos de infra-estrutura,
de segurança e de veículos automotores, anúncios de qualquer natureza, elementos de
sinalização urbana, equipamentos de informação e comodidade pública e logradouros
públicos, visíveis por qualquer observador situado em áreas de uso comum do povo.
Art. 3º - Constituem objetivos da ordenação da paisagem do Município de São Paulo o
atendimento ao interesse público em consonância com os direitos fundamentais da pessoa
humana e as necessidades de conforto ambiental, com a melhoria da qualidade de vida
urbana, assegurando, dentre outros, os seguintes:
I - o bem-estar estético, cultural e ambiental da população;
II - a segurança das edificações e da população;
III - a valorização do ambiente natural e construído;
IV - a segurança, a fluidez e o conforto nos deslocamentos de veículos e pedestres;
V - a percepção e a compreensão dos elementos referenciais da paisagem;
VI - a preservação da memória cultural;
VII - a preservação e a visualização das características peculiares dos logradouros e
das fachadas;
VIII - a preservação e a visualização dos elementos naturais tomados em seu
conjunto e em suas peculiaridades ambientais nativas
107
IX - o fácil acesso e utilização das funções e serviços de interesse coletivo nas vias e
logradouros;
X - o fácil e rápido acesso aos serviços de emergência, tais como bombeiros,
ambulâncias e polícia;
XI - o equilíbrio de interesses dos diversos agentes atuantes na cidade para a
promoção da melhoria da paisagem do Município.
Art. 4º - Constituem diretrizes a serem observadas na colocação dos elementos que
compõem a paisagem urbana:
I - o livre acesso de pessoas e bens à infra-estrutura urbana;
II - a priorização da sinalização de interesse público com vistas a não confundir
motoristas na condução de veículos e garantir a livre e segura locomoção de pedestres;
III - o combate à poluição visual bem como à degradação ambiental;
IV - a proteção, preservação e recuperação do patrimônio cultural, histórico, artístico,
paisagístico, de consagração popular, bem como do meio ambiente natural ou construído da
cidade;
V - a compatibilização das modalidades de anúncios com os locais onde possam ser
veiculados, nos termos desta lei;
VI - a implantação de sistema de fiscalização efetivo, ágil, moderno, planejado e
permanente.
Art. 5º - As estratégias para a implantação da política da paisagem urbana são as seguintes:
I - a elaboração de normas e programas específicos para os distintos setores da
Cidade, considerando a diversidade da paisagem nas várias regiões que a compõem;
II - o disciplinamento dos elementos presentes nas áreas públicas, considerando as
normas de ocupação das áreas privadas e a volumetria das edificações que, no conjunto,
são formadoras da paisagem urbana;
III - a criação de novos padrões, mais restritivos, de comunicação institucional,
informativa ou indicativa;
IV - a adoção de parâmetros de dimensões, posicionamento, quantidade e
interferência mais adequados à sinalização de trânsito, aos elementos construídos e à
vegetação, considerando a capacidade de suporte da região;
V - o estabelecimento de normas e diretrizes para a implantação dos elementos
componentes da paisagem urbana e a correspondente veiculação de publicidade;
VI - a criação de mecanismos eficazes de fiscalização sobre as diversas
intervenções na paisagem urbana.
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Art. 6º - Para os efeitos de aplicação desta lei, ficam estabelecidas as seguintes definições:
I - anúncio: qualquer veículo de comunicação visual presente na paisagem visível do
logradouro público, composto de área de exposição e estrutura, podendo ser:
a) anúncio indicativo: aquele que visa apenas identificar, no próprio local da
atividade, os estabelecimentos e/ou profissionais que dele fazem uso;
b) anúncio publicitário: aquele destinado à veiculação de publicidade,
instalado fora do local onde se exerce a atividade;
c) anúncio especial: aquele que possui características específicas, com
finalidade cultural, eleitoral, educativa ou imobiliária, nos termos do disposto no artigo
19 desta lei;
II - área de exposição do anúncio: a área que compõe cada face da mensagem do
anúncio, devendo, caso haja dificuldade de determinação da superfície de exposição, ser
considerada a área do menor quadrilátero regular que contenha o anúncio;
III - área livre de imóvel edificado: a área descoberta existente entre a edificação e
qualquer divisa do imóvel que a contém;
IV - área total do anúncio: a soma das áreas de todas as superfícies de exposição do
anúncio, expressa em metros quadrados;
V - bem de uso comum: aquele destinado à utilização do povo, tais como as áreas
verdes e institucionais, as vias e logradouros públicos, e outros;
VI - bem de valor cultural: aquele de interesse paisagístico, cultural, turístico,
arquitetônico, ambiental ou de consagração popular, público ou privado, composto pelas
áreas, edificações, monumentos, parques e bens tombados pela União, Estado e Município,
e suas áreas envoltórias;
VII - espaço de utilização pública: a parcela do espaço urbano passível de uso e
fruição pela população;
VIII – mobiliário urbano é o conjunto de elementos que podem ocupar o espaço
público, implantados, direta ou indiretamente, pela Administração Municipal, com as
seguintes funções urbanísticas:
a) circulação e transportes;
b) ornamentação da paisagem e ambientação urbana;
c) descanso e lazer;
d) serviços de utilidade pública;
e) comunicação e publicidade;
f) atividade comercial;
g) acessórios à infra-estrutura;
IX - fachada: qualquer das faces externas de uma edificação principal ou
complementar, tais como torres, caixas d’água, chaminés ou similares;
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X - imóvel: o lote, público ou privado, edificado ou não, assim definido:
a) imóvel edificado: aquele ocupado total ou parcialmente com edificação
permanente;
b) imóvel não-edificado: aquele não ocupado ou ocupado com edificação
transitória, em que não se exerçam atividades nos termos da legislação de uso e
ocupação do solo;
XI - lote: a parcela de terreno resultante de loteamento, desmembramento ou
desdobro, contida em uma quadra com, pelo menos, uma divisa lindeira a via de circulação
oficial;
XII - testada ou alinhamento: a linha divisória entre o imóvel de propriedade particular
ou pública e o logradouro ou via pública.
Art. 7º - Para os fins desta lei, não são considerados anúncios:
I - os nomes, símbolos, entalhes, relevos ou logotipos, incorporados à fachada por
meio de aberturas ou gravados nas paredes, sem aplicação ou afixação, integrantes de
projeto aprovado das edificações;
II - os logotipos ou logomarcas de postos de abastecimento e serviços, quando
veiculados nos equipamentos próprios do mobiliário obrigatório, como bombas, densímetros
e similares;
III - as denominações de prédios e condomínios;
IV - os que contenham referências que indiquem lotação, capacidade e os que
recomendem cautela ou indiquem perigo, desde que sem qualquer legenda, dístico ou
desenho de valor publicitário;
V - os que contenham mensagens obrigatórias por legislação federal, estadual ou
municipal;
VI - os que contenham mensagens indicativas de cooperação com o Poder Público
Municipal, Estadual ou Federal;
VII - os que contenham mensagens indicativas de órgãos da Administração Direta;
VIII - os que contenham indicação de monitoramento de empresas de segurança
com área máxima de 0,04m² (quatro decímetros quadrados);
IX - aqueles instalados em áreas de proteção ambiental que contenham mensagens
institucionais com patrocínio;
X - os que contenham as bandeiras dos cartões de crédito aceitos nos
estabelecimentos comerciais, desde que não ultrapassem a área total de 0,09m² (nove
decímetros quadrados);
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XI - os “banners” ou pôsteres indicativos dos eventos culturais que serão exibidos na
própria edificação, para museu ou teatro, desde que não ultrapassem 10% (dez por cento)
da área total de todas as fachadas;
XII - a denominação de hotéis ou a sua logomarca, quando inseridas ao longo da
fachada das edificações onde é exercida a atividade, devendo o projeto ser aprovado pela
Comissão de Proteção à Paisagem Urbana — C.P.P.U.;
XIII – a identificação das empresas nos veículos automotores utilizados para a
realização de seus serviços.