1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA Relatório de Graduação (GLG0001) Matheus Lisboa Nobre da Silva GEODIVERSIDADE DA CIDADE DO NATAL(RN): VALORES, CLASSIFICAÇÕES E AMEAÇAS Orientador: Marcos Antonio Leite do Nascimento Monografia nº 426 Natal – RN Maio/2016
171
Embed
GEODIVERSIDADE DA CIDADE DO NATAL(RN): VALORES ... · geodiversidade da cidade do Natal que ocorre de forma natural, ... Figura 3.4 – Classificação dos valores da geodiversidade
This document is posted to help you gain knowledge. Please leave a comment to let me know what you think about it! Share it to your friends and learn new things together.
Transcript
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA
DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA
Relatório de Graduação
(GLG0001)
Matheus Lisboa Nobre da Silva
GEODIVERSIDADE DA CIDADE DO NATAL(RN):
VALORES, CLASSIFICAÇÕES E AMEAÇAS
Orientador:
Marcos Antonio Leite do Nascimento
Monografia nº 426
Natal – RN
Maio/2016
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA
DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA
Relatório de Graduação
(GLG0001)
Matheus Lisboa Nobre da Silva
GEODIVERSIDADE DA CIDADE DO NATAL(RN):
VALORES, CLASSIFICAÇÕES E AMEAÇAS
Banca Examinadora:
Prof. Dr. Marcos Antonio Leite do Nascimento
Prof. Dr. Vanildo Pereira da Fonseca
Prof. Dr. Paulo Cesar de Araújo
Natal – RN
Maio/2016
Catalogação da Publicação na Fonte. UFRN / SISBI / Biblioteca Setorial
Centro de Ciências Exatas e da Terra – CCET.
Silva, Matheus Lisboa Nobre da.
Geodiversidade da cidade do Natal (RN): valores, classificações e ameaças /
Figura 2.10 – Imagem de satélite com destaque para um dos depósitos de mangue na cidade do Natal. Fonte:
Google Earth ........................................................................................................................................ 40
Figura 2.11 – Fotografia mostrando um típico depósito eólico litorâneo vegetado na região da praia de
Figura 3.1 – Comparativo teórico da evolução da biodiversidade (linha vermelha) com a da geodiversidade
(linha azul). A rápida expansão da geodiversidade em 3 Ga está relacionada com o desenvolvimento da
crosta continental. Fonte: Modificado de Gray (2013) ......................................................................... 50
Figura 3.2 – Valores e subvalores da geodiversidade sensu Murray Gray. Fonte: Elaborado pelo autor a partir
de Gray (2004) ..................................................................................................................................... 52
Figura 3.3 – Espécime de cacto que utiliza o xisto como habitat, representando a importância da geodiversidade
como um serviço de suporte. Foto: Matheus Lisboa ............................................................................ 57
Figura 3.4 – Classificação dos valores da geodiversidade segundo os serviços ecossistêmicos. Fonte: Elaborado
pelo autor a partir de Gray (2013) ........................................................................................................ 63
Figura 3.5 – Esquema conceitual da classificação dos lugares de geodiversidade. Fonte: Brilha (2015) ....... 68
Figura 3.6 – Logomarca oficial da rede de Geoparques da UNESCO Fonte: unesco.org ............................... 72
Figura 3.7 – Mapa de localização das paradas sugeridas pelo roteiro geoturístico do centro histórico de São
Paulo. Fonte: Del Lama et al. (2014) ................................................................................................... 74
Figura 3.8 – Mapa de localização dos pontos que compõem o roteiro geoturístico do centro histórico de Natal.
Figura 4.5 – Imagem de satélite com destaque para o Litoral Central (praias do Forte, Meio e Artistas) Fonte:
Google Earth ........................................................................................................................................ 82
Figura 4.6 – Mapa de Johannes Vingboons, datado de 1665, mostrando o Fort Ceulen e os arenitos praiais da
região Litoral Central. Em holandês, está escrito steen clip genaemt riciff, cuja tradução é corpo de pedra
chamado recife. Fonte: http://www.robgomes.nl/ ................................................................................ 83
Figura 4.7 – Mapas da região Litoral Central de Natal, mostrando os corpos de arenitos praiais. Fontes: A –
Branner (1904); B – Oliveira (1978) .................................................................................................... 84
Figura 4.8 – Fotomicrografia de amostra de arenito praial da região Litoral Central mostrando grãos de
microclina (Mc), quartzo monocristalino (Qz) e cimento em mosaico (seta vermelha). ...................... 85
Figura 4.9 – Fotomicrografia de amostra de arenito praial mostrando cimento carbonático (seta vermelha) em
franja fibro-radial preenchendo porosidade primária (seta azul), além dos grãos quartzosos (Qz) do
Figura 4.10 – Imagem de satélite com destaque para a forma côncava da linha de costa na praia do Forte. Fonte:
Google Earth ........................................................................................................................................ 85
Figura 4.11 – Fotografia da praia do Forte, mostrando sua linha de costa curva e dunas frontais vegetadas. Foto:
Figura 4.35 – Foliã passando lama do mangue no corpo, este é o “abadá” do Bloco dos Cão na Redinha. Foto:
Alex Régis / Tribuna do Norte ........................................................................................................... 103
Figura 4.36 – A lama, que são as argilas dos depósitos flúvio-marinhos, é um recurso da geodiversidade. Foto:
Alex Régis / Tribuna do Norte ........................................................................................................... 103
Figura 4.37 – Imagem de satélite com destaque para parte do curso do rio Pitimbu na divisa dos municípios de
Natal e Parnamirim. Fonte: Google Earth .......................................................................................... 105
Figura 4.38 – Imagem de satélite com destaque para parte do curso do rio Doce. Fonte: Google Earth ...... 106
Figura 4.39 – Imagem de satélite com destaque para a desembocadura do rio Potengi no Oceano Atlântico.
Fonte: Google Earth ........................................................................................................................... 106
Figura 4.40 – Foto de 2012 mostrando jovem praticante do Remo no rio Potengi. Foto: Rodrigo Sena / Tribuna
do Norte.............................................................................................................................................. 107
Figura 4.41 – Imagem de satélite de 2014 mostrando um conjunto de lagoas no bairro de Ponta Negra. Fonte:
Google Earth ...................................................................................................................................... 110
Figura 4.42 – Imagem de satélite mostrando a lagoa Manoel Felipe. Fonte: Google Earth .......................... 110
Figura 4.43 – Foto mostrando passeio de pedalinho na lagoa Manoel Felipe. Fonte: Blog o Curiozzo ........ 110
Figura 4.44 – Bloco de arenito ferruginoso correlato ao Grupo Barreiras que serve como fundação para o pilar.
Figura 4.54 – Mapa de localização dos principais locais em que a geodiversidade in situ está presente na cidade do Natal agrupados pela classificação por extensão areal.
120
121
5. GEODIVERSIDADE EX SITU
A geodiversidade pode ser utilizada, por meio de seus diversos recursos (como
minerais, rochas e solos), em processos que são natos às cidades, a exemplo de construções
e arruamentos. Disto, tem-se que é possível analisar a geodiversidade de forma ex situ, ou
até mesmo com uma implicância cultural ao seu uso nas áreas compreendidas pela urbis.
Neste capítulo são investigados os principais locais em que algum recurso da
geodiversidade foi empregado em monumentos, edificações, ruas ou em qualquer outra
forma urbana na cidade do Natal. As classificações utilizadas para a geodiversidade in situ
também são aplicadas às descrições das ocorrências ex situ da geodiversidade na cidade.
Ao final do capítulo são apresentados um quadro síntese, constando dos valores para
os recursos da geodiversidade identificados, assim com as classificações de acordo com seus
valores e extensões, além de um mapa de localização dos locais.
5.1 FORTE DOS REIS MAGOS
Tida como a primeira edificação da cidade, o Forte dos Reis Magos está localizado
na desembocadura do Rio Potengi, sobre os corpos de arenitos praiais que são encontrados
na região, e que serviram de fundação sólida para a edificação. O início da construção se deu
no final do século XVI, mas a conclusão da estrutura hoje remanescente data de 1628 (Souza,
2008).
A região onde se encontra o Forte é compreendida pela Zona de Proteção Ambiental
ZPA – 07, tendo ainda inúmeras feições geológico-ambientais distintas tais como: arrecifes
(ou recifes de arenito, beachrocks), zona de praia (praia do Forte), cordões dunares, estuário,
vegetação de mangue entre outras (Natal, 2010).
Desde o início da colonização da cidade até os dias atuais, o Forte dos Reis Magos
sempre esteve presente na história de Natal. Inicialmente, como um ponto importante de
defesa da então terra portuguesa, hoje como um importante ícone e monumento potiguar.
Frans Post, em 1638, registrou a então relação do Forte com a paisagem natalense
(Figura 5.1), na qual se constituía como uma estrutura imponente. Nesta época, o
monumento recebeu o nome de Fort Ceulen, devido à ocupação holandesa no nordeste
brasileiro entre 1633 e 1654.
122
Figura 5.1 – Pintura “Fort Ceulen” (1638), de Frans Post, que mostra, ao fundo, o Forte dos Reis Magos, além dos
recifes de arenito em seu entorno e do povo Potiguara, que habitava a região. Campos de dunas são vistas ao
fundo.
Fonte: www.gallerix.ru
Ao longo de quatro séculos de existência, o Forte dos Reis Magos viu a cidade crescer
e mudar, foi abandonado e reformado também por diversas vezes. A geodiversidade local da
cidade emoldura seu entorno, com os recifes de arenito, as dunas e as praias natalense (Figura
5.2).
Figura 5.2 – Visão do Forte dos Reis Magos a partir da desembocadura do Rio Potengi, ano da foto: 1998.
Foto: Wolfgang Kaehler / Getty Images
O Forte foi construído com as rochas encontradas em seu entorno, que são arenitos
de cimentação carbonática e arenitos cimentados por óxido de ferro, correlatos ao Grupo
Barreiras. A granulometria varia de fina a média e são compostos de grãos angulosos a
subarredondados de quartzo, além de possuírem resquícios de bioclastos.
123
É possível verificar a existência de blocos de arenitos nas fundações e nos pórticos
do Forte, como mostram as figuras 5.3 a 5.5 que seguem. Disto, tem-se a utilização da
geodiversidade de forma ex situ na construção da edificação.
Figura 5.3 – Blocos de arenitos utilizados na base do Forte dos
Reis Magos.
Foto: Marcos Nascimento
Figura 5.4 – Destaque para a estratificação
cruzada em um bloco de arenito na base da
edificação
Foto: Marcos Nascimento
Figura 5.5 – Detalhe da porção superior de
um pórtico no Forte dos Reis Magos feito com
blocos de arenito.
Foto: Marcos Nascimento
Em relação aos valores ecossistêmicos da geodiversidade definidos por Gray (2013),
observa-se além do valor intrínseco, os serviços de provisão, evidenciado pelo uso dos
arenitos como material de construção por toda edificação em pórticos; e cultural, pois o
Forte possui um significado histórico importante, que embasou, por exemplo, os estudos
arqueológicos empreitados pelo IPHAN. Logo, para a classificação de Brilha (2015), as
rochas utilizadas neste monumento de Natal são identificadas como elementos de
geodiversidade.
Como a área total do Forte dos Reis Magos é de, aproximadamente, 2800m², é
classificado, de acordo com sua extensão (Fuertes-Gutiérrez e Fernández-Martínez, 2010)
como ponto.
124
5.2 CENTRO HISTÓRICO
O Centro Histórico de Natal compreende uma área de 28 hectares entre os bairros da
Cidade Alta, Ribeira e Rocas que foi tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN) em julho de 2014. Esta região, que até o começo do século XX
correspondia à área total da cidade do Natal, possui um amplo registro de uso de rochas na
pavimentação de ruas, construção e ornamentação de edifícios e monumentos.
Arenitos ferruginosos e arenitos calcíferos foram utilizados no Centro Histórico
desde o início da colonização da cidade, o uso de granitos começou no início do século XX
e, mais recentemente, ortognaisses, mármores, migmatitos, tonalitos e diabásios foram
empregados (Nascimento e Carvalho, 2013; Silva et al., 2015). O trabalho de Carvalho
(2010), pioneiro na área de geodiversidade em Natal, descreve detalhadamente 27
ocorrências de uso de rochas na região e a partir de 2015 o projeto “As Rochas Contam sua
História”, sob coordenação do professor Marcos Nascimento, tem focado estudos e
divulgação das rochas utilizadas desde a fundação da cidade até a década de 1920, os
primeiros resultados deste projeto foram apresentados por Silva et al. (2015).
Devido à complexidade e diversidade do uso de diferentes litologias no Centro
Histórico, aqui serão separados os locais de acordo com as rochas utilizadas, iniciando com
as aplicações mais antigas, da época da colônia portuguesa até as intervenções urbanísticas
mais recentes, já no final do século XX.
5.2.1 Arenitos Ferruginosos
Arenitos ferruginosos são compostas essencialmente de quartzo e minerais opacos,
cuja cimentação é feita pela precipitação de óxidos de ferro, o que dá à rocha uma tonalidade
avermelhada ou amarronzada. É facilmente encontrado nas praias de Natal e em base de
falésias. É uma litologia correlata ao Grupo Barreiras.
Este tipo de rocha foi o primeiro material utilizado nas construções na cidade, visto
que pode ser encontrado nos alicerces de construções como da Igreja de Nossa Senhora da
Apresentação (Figura 5.6), na qual também é possível encontrar os arenitos ferruginosos em
suas paredes internas.
Também são encontrados blocos de arenitos ferruginosos compondo edificações
como a casa do Padre João Maria, sede da Capitania das Artes, na Casa da Ribeira, na sede
125
da Escola de Dança do Theatro Alberto Maranhão e em alguns casarios coloniais no bairro
da Ribeira.
Figura 5.6 – Arenitos ferruginosos nas paredes internas da Igreja de Nossa Senhora da Apresentação. À
direita, ampliação do destaque.
Foto: Matheus Lisboa
No Centro Histórico de Natal esse tipo de rocha foi utilizado também nos primeiros
calçamentos, ainda no final do século XIX, cujo estilo de é conhecido como “pé-de-
moleque” (Nascimento et al., 2012). Este é o principal registro de uso de arenitos
ferruginosos na cidade, uma vez que por se apresentarem, naturalmente, como blocos
irregulares e de difícil manuseio em trabalhos de cantaria, ficou restrito a elementos
estruturais dos edifícios e arruamentos.
Ainda são encontrados resquícios deste tipo de calçamento nas ruas Voluntários da
Pátria, Quintino Bocaiúva, Coronel Lins Caldas e na Travessa Pax (Figura 5.7), aonde existe
o mais bem conservado exemplar do calçamento “pé-de-moleque” com arenitos ferruginosos
na cidade, ainda que esteja susceptível a constante degradação.
Figura 5.7 – Detalhe do calçamento “pé-de-moleque” com blocos de arenitos ferruginosos na Travessa Pax, bairro
da Cidade Alta.
Foto: Matheus Lisboa
126
5.2.2 Arenitos Calcíferos
Constituídos essencialmente por quartzo, assim como os arenitos ferruginosos,
diferem destes por precipitação de carbonato de cálcio na forma de cristais de calcita. São
encontrados, em Natal, principalmente nos recifes de arenito das praias do Forte, Meio e
Artistas.
No Centro Histórico de Natal, os arenitos calcíferos foram o principal material de
construção e, devido à sua facilidade de corte, tiveram diversas aplicações em soleiras,
pórticos, fachadas de prédios, além de ter um bloco constituindo o pelourinho da cidade.
Pode ser encontrado, por exemplo, em trabalhos de cantaria na Igreja de Nossa
Senhora da Apresentação (Igreja Matriz) e Igreja de Santo Antônio (Igreja do Galo), na qual
há registro de dois tipos de cantaria, sendo um mais desenvolvido e mais recente que o outro.
As figuras 5.8 a 5.11 mostram alguns dos registros de uso de arenitos calcíferos no Centro
Histórico de Natal.
Figura 5.8 – Igreja de Santo Antonio (Igreja do Galo),
com colunas externas feitas com blocos de arenitos
calcíferos.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.9 – Destaque para os trabalhos em cantaria
na base das colunas na Igreja do Galo, mostrando
claramente uma diferença de técnicas.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.10 – Fachada da Igreja Matriz com colunas e
pórticos feitos de arenitos calcíferos.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.11 – Destaque para o campanário esquerdo
da Igreja Matriz em que há bloco de arenito calcífero.
Foto: Matheus Lisboa
127
5.2.3 Granito
Já no século XX, uma terceira litologia começou a ser utilizada no Centro Histórico
de Natal: o granito. Seu uso inicial foi como base de monumentos e, em seguida, passou a
compor os modernos calçamentos da cidade, em substituição aos defasados calçamentos
“pé-de-moleque” com arenitos ferruginosos, nos quais o trânsito de pedestres e automóveis
era deficiente devido às irregularidades dos blocos de rocha.
As rochas utilizadas são, de forma geral, equigranulares, com granulometria média,
sendo compostos, essencialmente, por quartzo, feldspato potássio, plagioclásio, biotita e
anfibólio (Figura 5.12). Ocasionalmente, ocorrem epídoto e titanita. Os blocos utilizados no
Centro Histórico têm como origem pedreiras na cidade de Macaíba, aonde se encontra o
corpo do Granito Macaíba, uma suíte cálcio-alcalina equigranular de alto potássio
(Nascimento et al., 2015).
Figura 5.12 – Detalhe do granito utilizado no monumento à Independência, na praça 7 de setembro. Destaque
para o alinhamento dos cristais de anfibólio.
Foto: Matheus Lisboa
Cinco monumentos nos bairros históricos de Natal são constituídos por trabalhos em
cantaria em blocos do Granito Macaíba. O primeiro a ser implantado foi o monumento em
homenagem ao Padre João Maria, em 1909, seguido pelos monumentos a Augusto Severo e
Tavares de Lira, em 1913 e 1914, respectivamente. Ainda foram homenageados os mártires
da revolução de 1817 (Figura 5.13) e o centenário da independência do Brasil (Figura 5.14),
cujos monumentos foram inaugurados em 1917 e 1922.
128
Figura 5.13 – Monumento aos Mártires da Revolução
de 1817, localizado na Praça André de Albuquerque,
Cidade Alta.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.14 – Monumento em comemoração ao
centenário da Independência do Brasil, localizado na
Praça 7 de setembro, Cidade Alta.
Foto: Matheus Lisboa
O monumento a Augusto Severo, herói da aviação nacional, e que está localizado em
praça homônima no bairro da Ribeira teve sua base pintada pela Prefeitura Municipal do
Natal no final de 2015. Isto impossibilita descrições petrográficas e se constitui numa forma
de agressão ao patrimônio cultural da cidade e ao recurso da geodiversidade utilizado na
obra, uma vez que as características mineralógicas da rocha foram cobertas. Este assunto
será mais detalhado no capítulo seguinte, que trata das ameaças à geodiversidade, seja ela in
situ ou ex situ.
O mapa da figura 5.15 foi elaborado em conjunto pela equipe do projeto “As Rochas
Contam Sua História” e localiza os monumentos e edifícios que possuem alguma das três
litologias que foram mais utilizadas até o começo do século XX em Natal: arenitos
ferruginosos, arenitos calcíferos e granito Macaíba. Este mapa está restrito ao bairro da
Cidade Alta, o mapa do bairro da Ribeira estará finalizado até o final de 2016.
129
Figura 5.15 – Mapa geoturístico do bairro da Cidade Alta, com destaque para os monumentos e edifícios feitos com rochas até o começo do século XX.
Fonte: Projeto “As Rochas Contam Sua História”
130
5.2.4 Demais Rochas
A partir da segunda metade do século XX novas intervenções no Centro Histórico,
sobretudo nas edificações inseriram litologias não utilizadas anteriormente, a exemplo do
mosaico na calçada da Pinacoteca Potiguar, feito com ortognaisses, basaltos, calcários e
mármores (Figura 5.16), como mostra o trabalho de Carvalho (2010).
Os ortognaisses, de textura lepidonematoblástica, são compostos por biotita, quartzo,
feldspato, epidoto, hornblenda e titanita, além de alguns minerais acessórios. Mármores são
compostos essencialmente por calcita, sendo possível identificar, em microscópio ótico,
cristais de tremolita.
Figura 5.16 – Foto de calçada portuguesa da Pinacoteca potiguar, no detalhe os diferentes tipos de rocha
utilizados para compor os mosaicos.
Foto: Matheus Lisboa
Placas de albita granito, extraídas no Ceará, foram utilizados no revestimento da
fachada da sede da Assembleia Legislativa do estado. Outros tipos de granito, diabásio e
sienito foram usados em obras de restauração do Theatro Alberto Maranhão, da sede da
CBTU e da Igreja de Bom Jesus das Dores, no bairro da Ribeira.
Mármore correlacionado à Formação Jucurutu foi, por sua vez, utilizado como
revestimento na sede da Prefeitura Municipal, Palácio Felipe Camarão, assim como placas
de migmatito foram colocados no piso da edificação. Placas de mármore também revestem
as paredes da sede local Ministério da Fazenda.
Quartzito foi utilizado na Praça das Mães como revestimento de um muro. A rocha,
correlacionada à Formação Equador, possui textura granoblástica e é composta,
essencialmente, por quartzo, muscovita e biotita.
131
Em relação aos valores ecossistêmicos da geodiversidade (Gray, 2013) identificados
na região do Centro Histórico de Natal, observa-se, além do valor intrínseco, devido
simplesmente à existência das rochas nas construções, os serviços de suporte, provisão e
cultural.
O viés de suporte está no uso de alguns blocos de rocha, sobretudo de arenito
ferruginoso como estabelecimento de uma fundação para construções como a Igreja de
Nossa Senhora da Apresentação, em que se observa a plataforma da edificação composta
por arenitos.
O serviço de provisão é o mais claro e presente no Centro Histórico, visto que em
todos os casos descritos aqui, as rochas, sejam arenitos ferruginosos ou calcíticos, granitos
ou sienitos, mármores ou migmatitos, foram utilizadas como materiais de construção dos
monumentos, igrejas e edifícios em geral, seja como elemento estrutural ou na composição
de pórticos e fachadas.
Por último, o serviço cultural da geodiversidade é reconhecido pelo significado
histórico das construções em que as rochas foram utilizadas, que remontam ao início da
colonização da cidade e são retrato da época.
Como nenhum dos valores identificados possui um teor científico, as rochas
utilizadas de forma ex situ no Centro Histórico de Natal são classificadas, de acordo com
Brilha (2015), como elementos de geodiversidade.
A classificação de Fuertes-Gutiérrez e Fernández-Martínez (2010) para a região a
identifica como uma área, visto que em sua extensão ampla há uma concentração de, ao
menos, 27 locais em que algum recurso da geodiversidade foi empregado.
132
5.3 IGREJA DE PEDRA E CLUBE DA REDINHA
Quem cruza a ponte Newton Navarro vê à sua direita a praia da Redinha, única praia
na região norte da cidade do Natal. Ali, já estava estabelecida desde o início do século, uma
importante comunidade de pescadores que, em 1924, construíram uma capelinha dedicada à
Nossa Senhora dos Navegantes, sua protetora.
Com o aumento da presença de “veranistas” a partir da primeira metade do século
XX, a praia se tornou um dos principais locais de veraneio da população natalense. Esse
novo público da praia, na década de 1950, financiou a construção de uma nova igreja
dedicada à protetora dos navegantes e trabalhadores do mar, vista ao centro da Figura 5.17.
Até a década de 1980 a praia experimentou um constante movimento de veranistas (Figura
5.18) nos meses de dezembro e janeiro, sendo encerrado com a festa de Nossa Senhora dos
Navegantes, comemorada sempre no último domingo de janeiro de forma a marcar o período
de veraneio.
Figura 5.17 – Foto aérea da praia da Redinha na
década de 1950, época de construção da Igreja de
Pedras, localizada no centro da foto, em frente ao
Redinha Clube.
Fonte: http://blogdobarbosa.jor.br/
Figura 5.18 – A Praia da Redinha foi até a década de 1980
a mais importante praia de veraneio de Natal. Ainda hoje
há casas de veranistas que todos os meses de dezembro e
janeiro retornam à praia.
Foto: Acervo pessoal
A chamada “Igreja de Pedra” (Figura 5.19) foi erguida com as rochas encontradas na
região, tipicamente arenitos ferruginosos, semelhante com o que havia sido feito numa
reforma do clube local, o Redinha Clube (Figura 5.20), em 1940. As rochas utilizadas,
macroscopicamente, possuem cor escura (variando de preta a diferentes tons de marrom),
matriz fina e se apresenta fortemente cimentada por óxido de ferro. De forma geral, são
litologias correlatas ao Grupo Barreiras (Araújo et al., 2013).
Na rocha estão inseridos grãos subangulosos de quartzo que variam de 1 a 2 cm de
diâmetro (Figura 5.21). Nas diferentes construções foram priorizadas a colocação de blocos
133
de dimensões maiores, com até 30 cm de comprimento, na base e frações menores no topo,
como visto na torre da Igreja (Figura 5.22).
Figura 5.19 – Foto de julho de 2010 mostrando a Igreja
de Pedra da Redinha.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.20 – Pórtico de entrada do Redinha Clube,
construído com blocos de arenito ferruginoso.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.21 – Foto de detalhe das rochas utilizadas na
construção da Igreja de Pedra da Redinha. São
observados grãos subangulos de quartzo.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.22 – Foto da Torre da Igreja de Pedra da
Redinha na qual se observa a colocação de blocos
maiores na base da construção, com dimensões sendo
reduzidas até o topo.
Foto: Matheus Lisboa
Os blocos de arenitos podem ter sido retirados de corpos encontrados nas
proximidades das falésias distribuídas ao longo do litoral, especialmente os encontrados nas
praias de Areia Preta, Artistas e na Ponta do Morcego ou ainda podem ter sido retirados de
corpos com dimensões reduzidas próximas ao campo de dunas da Praia de Jenipabu, no
município de Extremoz (Araújo et al., 2013).
Em relação aos valores de Gray (2013) para a geodiversidade, além do valor
intrínseco, devido à existência única da utilização da geodiversidade na construção desses
dois marcos da praia, serviços ecossistêmicos podem ser identificados, como: suporte, as
rochas, sobretudo grandes blocos de arenitos ferruginosos, foram utilizados como
134
base/fundação, ou seja, foram plataformas para as construções; provisão, pois as rochas
também foram materiais para construção em ornamentação e para erguer as paredes da
estrutura principal e da torre; e cultural, uma vez que além de servirem de inspiração
artística para artistas locais que retratam as construções em suas telas e fotografias, há uma
identificação religiosa da comunidade local, sobretudo, com a Igreja de Pedras, aonde a
devoção à Nossa Senhora dos Navegantes ocorre durante todo o ano e chega em seu ápice
no último domingo do mês de janeiro, quando a festa da padroeira reúne centenas de pessoas.
Tais valores, uma vez que não possuem um teor científico, classificam as rochas
utilizadas nas construções da Igreja de Pedra e do Clube da Redinha como elementos de
geodiversidade, de acordo com a classificação de Brilha (2015), e devido às dimensões
reduzidas das duas construções erguidas com material pétreo, ambos são classificados como
pontos, pela classificação baseada em Fuertes-Gutiérrez e Fernández-Martínez (2010).
5.4 PRAÇA CÍVICA
De nome oficial Praça Pedro Velho, a Praça Cívica é uma homenagem ao líder do
movimento republicano no Rio Grande do Norte, Pedro Velho de Alburquerque Maranhão.
Até a década de 1920, conta Souza (2008), o espaço era utilizado para partidas de futebol
dos times locais. Com uma reforma empreendida pelo prefeito Gentil Ferreira, a praça
passou a contar com lagos, carrossel aberto para as crianças, além de corriqueiros eventos
culturais.
Entretanto, o busto que homenageia Pedro Velho era localizado em outra praça,
conhecida como Square Pedro Velho, na Cidade Alta, onde hoje se encontra a Praça das
Mães. Lá, o busto estava colocado sobre um pedestal de granito (Figura 5.23), material que
era utilizado na época para trabalhos em cantaria dos monumentos da cidade. Na década de
1950, o monumento, que é composto pelo busto e uma escultura de uma mulher entregando
um ramalhete de flores, foi movido para a Praça Cívica (Pinto, 1971). Atualmente, o
monumento está colocado sobre um pedestal de mármore (Figura 5.24) correlato à Formação
Jucurutu. Contudo, não foi possível precisar quando a troca das litologias do pedestal foi
feita.
135
Figura 5.23 – Fotografia do monumento a Pedro Velho no
Square Pedro Velho, atual Praça das Mães na Cidade
Alta.
Fonte: Natal, 2006.
Figura 5.24 – Atualmente, o monumento a Pedro
Velho se localiza na Praça Cívica, posto sobre um
pedestal de mármore.
Foto: Matheus Lisboa
No ano de 2016, durante a obra de reforma do Palácio dos Esporte, ginásio
poliesportivo também localizado na Praça Cívica e que foi inaugurado pelo prefeito Djalma
Maranhão em 1963, utilizou, como revestimento das paredes externas, placas de quartzito
(Figura 5.25), tipicamente encontrado nas proximidades das cidades de Parelhas e Equador,
região do Seridó potiguar, e que são rochas metamórficas compostos essencialmente por
quartzo e muscovita, correlatas à Formação Equador (Figura 5.26).
Figura 5.25 – Foto da lateral do Palácio dos Esportes
sendo revestido com placas de quartzito.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.26 – Detalhe de uma placa de quartzito,
mostrando essencialmente quartzo e muscovita.
Foto: Matheus Lisboa
No caso desta reforma, Nobre e Andrade (2016) mostram que a inserção do
revestimento com as placas de quartzito são elementos que colaboram para um aspecto
contemporâneo num monumento modernista da cidade. Logo, o recurso da geodiversidade
utilizado na edificação apresenta um desacordo com o estilo arquitetônico, o que diferencia
dos demais locais em que a geodiversidade ex situ é utilizada.
136
Este é o único caso registrado por este trabalho em que algum recurso da
geodiversidade é empregado em reforma num monumento ou edifício histórico da cidade de
forma incoerente com os materiais disponíveis na época da construção original,
representando, então, uma problemática na questão de gestão e conservação do patrimônio
cultural da cidade.
Em relação dos valores ecossistêmicos da geodiversidade (Gray, 2013), o
monumento a Pedro Velho e o Palácio dos Esportes apresentam um valor intrínseco devido
à utilização de rochas em sua constituição, além de as diferentes litologias terem sido
utilizadas como materiais de construção para as obras, o que caracteriza um serviço de
provisão da geodiversidade.
Disto, tem-se que as rochas utilizadas são classificadas como elementos de
geodiversidade, na classificação de Brilha (2015), e como pontos, na classificação de
Fuertes-Gutiérrez e Fernández-Martínez (2010), por serem ocorrências locais e restritas.
5.5 PRAÇA DOM PEDRO II
Localizada no bairro do Alecrim, a Praça Dom Pedro II foi inaugurada em 19 de abril
de 1941, entretanto, como aponta Souza (2008), a praça originalmente ficava na Cidade Alta,
tendo sido estabelecida por resolução do prefeito Omar O’Grady em 23 de junho de 1925.
Como homenagem ao último imperador do Brasil, na praça foi alocado um busto de Dom
Pedro II.
O busto hoje se encontra sobre um pedestal de granito, entretanto, não foi possível
determinar se este acompanha o busto desde a primeira praça ou se fora colocado apenas
com a mudança para o Alecrim.
Descrições mais detalhadas da mineralogia da rocha não foram possíveis porque no
final de 2015, semelhante com ações no Centro Histórico já relatadas, a Prefeitura Municipal
do Natal pintou a rocha com uma tinta que cobre todo o pedestal (Figura 5.27). Entretanto,
imagens obtidas a partir da ferramenta Google Street mostram que a litologia aparenta ser a
mesma dos monumentos da Cidade Alta e Ribeira: o Granito Macaíba (Figura 5.28).
137
Figura 5.27 – Estado atual do monumento a Dom
Pedro II, recentemente pintado, o que cobriu os
minerais da rocha, impossibilitando sua descrição.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.28 – Imagem do Google Street, datada de
agosto de 2015, que mostra o busto de Dom Pedro II,
na praça homônima, sob pedestal de granito
Fonte: Google Street View
De forma semelhante aos monumentos com base de rocha na cidade, só é possível
identificar, além do valor intrínseco, o serviço de provisão no monumento a Dom Pedro II.
Isto porque, pela classificação dos valores ecossistêmicos da geodiversidade de Gray (2013),
a rocha, no caso um granito, foi utilizada como material de construção para erguer a base
do busto.
Assim, pela classificação de Brilha (2015), a rocha utilizada pode ser classificada
como elemento de geodiversidade e, devido a sua extensão em área ser pontual, a
classificação de Fuertes-Gutiérrez e Fernández-Martínez (2010) determina um ponto para o
monumento.
5.6 COLÉGIO ATHENEU
Fundado em 1834 no bairro da Cidade Alta, o Colégio Atheneu Norte-Rio-Grandense
foi a primeira escola da cidade do Natal. Seu prédio atual, localizado na avenida Campos
Sales, bairro de Petrópolis, teve a sua construção iniciada em 1946, sendo concluída em 1954
(Souza, 2008).
138
Marco da história natalense, a sede do Colégio Atheneu abriga atualmente o busto
do professor João Tibúrcio, que desenvolveu importantes ações no ensino e na política local
no final do século XIX.
O busto está posto sobre um pedestal de granito com coloração acinzentada (figura
5.29) e cuja mineralogia compreende, essencialmente, cristais de quartzo, feldspato e
anfibólio. A rocha possui uma textura equigranular e é semelhante ao Granito Macaíba,
amplamente utilizado nos monumentos da cidade na primeira metade do século XX.
Figura 5.29 – Monumento ao Prof. João Tibúrcio, localizado no Colégio Atheneu, composto por um busto sobre
um bloco de granito.
Foto: Matheus Lisboa
Não foi possível precisar a data de aposição do monumento no colégio Atheneu, visto
que Pinto (1971) indica que tal monumento já havia sido transferido três vezes entre praças
de Natal até a década de 70.
Além do valor intrínseco, é possível identificar um serviço ecossistêmico de
provisão da geodiversidade, uma vez que o granito serviu como material de construção para
a base do busto, segundo a classificação de Gray (2013).
Desta valoração, tem-se que a rocha utilizada pode ser classificada como um
elemento de geodiversidade, segundo Brilha (2015). E, devido à sua extensão areal ser
restrita, o monumento é classificado como ponto, pela classificação de Fuertes-Gutiérrez e
Fernández-Martínez (2010).
139
5.7 CAMPUS CENTRAL DA UFRN
A Universidade Federal do Rio Grande do Norte foi criada como Universidade do
Rio Grande do Norte em 1958. Ocupava, inicialmente, diversos prédios no centro da cidade,
principalmente nos bairros da Ribeira e Tirol.
Com o aumento de sua estrutura física, administrativa e estudantil, foi iniciada a
construção, na década de 1970, de um novo complexo que pudesse comportar a maior parte
da comunidade universitária, que com a mudança do local do campus garantiu nova
movimentação ao bairro de Lagoa Nova (Souza, 2008).
As construções mais antigas, como os setores de aula, a Biblioteca Central Zila
Mamede (Figura 5.30), o Almoxarifado Central e os prédios da Editora Universitária e da
Divisão de Material e Patrimônio fazem uso de blocos de rochas para erguer e revestir
algumas paredes.
A rocha possui granulometria média, equigranular, sendo possível descrever,
macroscopicamente, minerais como quartzo, anfibólio e feldspatos (Figura 5.31).
Figura 5.30 – Foto do salão de estudos da Biblioteca
Central Zila Mamede, com parede construída por
blocos de granito.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.31 – Detalhe de um bloco de granito utilizado
na construção da BCZM, também empregado em
outros edifícios do campus central da UFRN.
Foto: Matheus Lisboa
Em relação aos valores de Gray (2013), pode-se observar, além do valor intrínseco,
apenas a presença de um serviço ecossistêmico de provisão, já que as rochas foram um dos
materiais de construção empregadas nos prédios do campus. Isto classifica estas rochas
utilizadas como elementos de geodiversidade, segundo a classificação de Brilha (2015).
Uma vez que o Campus Central da UFRN possui uma área total superior a 120
hectares com alguns prédios que utilizam as rochas em suas construções espalhados, a
classificação de Fuertes-Gutiérrez e Fernández-Martínez (2010) definem então uma área.
140
5.8 CALÇADÕES DE NATAL
Durante as décadas de 1990 e 2000 ocorreram processos de urbanização na cidade
do Natal que priorizaram calçamentos estilo “pedra portuguesa”. Este tipo clássico de
calçamento, que foi propagado a partir do século XIX em Portugal (Figura 5.32) e trazido
ao Brasil no começo do século XX, lança mão de pequenos blocos de calcários (calcíticos
ou dolomíticos) e basaltos para criar mosaicos perfeitos.
Figura 5.32 – Destaque para o calçamento em mosaico perfeito feito com calcários (branco) e basalto (preto) na
praça Dom Pedro IV, em Lisboa.
Foto: Matheus Lisboa
Em Natal, entretanto, as calçadas portuguesas que foram feitas utilizam uma
variedade maior de rochas, incluindo, além dos calcários e basaltos, arenitos, argilitos,
ardósias, mármores e ortognaisses.
Em obras recentes, ditas para a Copa do Mundo de Futebol de 2014, algumas dos
calçamentos portugueses das calçadas de Natal, principalmente na orla, foram substituídas
por blocos intertravados de concreto. No entanto, é possível ainda encontrar esse tipo de
calçada na região da Praia de Ponta Negra (Figura 5.33 e Figura 5.34), na Avenida Roberto
Freire e no Centro Histórico, como foi citado anteriormente.
141
Figura 5.33 – Foto de detalhe de calçadão em Ponta
Negra, os blocos pretos são basaltos e os brancos
calcários.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.34 – Foto de detalhe de calçadão em Ponta
Negra, os blocos brancos são calcários e os vermelhos
arenitos.
Foto: Matheus Lisboa
Em relação aos valores ecossistêmicos da geodiversidade (Gray, 2013) são
identificados, nas calçadas portuguesas de Natal, o valor intrínseco e o serviço de provisão,
que fica caro uma vez que diferentes tipos de rochas foram utilizados como o material de
construção fundamental para os mosaicos das calçadas.
Na classificação de Brilha (2015), as rochas utilizadas, uma vez que não possuem
valor científico associado, são caracterizadas como elementos de geodiversidade. Como os
mosaicos são desenvolvidos ao longo de linhas e muitos são elaborados paralelamente uns
aos outros, as calçadas passam a ser classificadas, de acordo com Fuertes-Gutiérrez e
Fernández-Martínez (2010), como faixas.
5.9 ENROCAMENTOS
A definição de enrocamentos mostra que eles são obras feitas com blocos maciços
de rochas com a finalidade principal de contenção de erosão e proteção de áreas à erosão.
Em Natal, pelo menos três áreas da orla tiveram obras deste tipo realizadas nos últimos 20
anos.
Na década de 1990 foi construído o enrocamento na Praia da Redinha, numa técnica
construtiva também conhecida como muro-guia de corrente, que também dispõe de um
passeio público (Figura 5.35). Esta obra foi construída para diminuir a constante erosão na
praia. Contemporaneamente, foram construídos enrocamentos na praia de Areia Preta
(Figura 5.36), também para diminuir a erosão na linha de costa.
142
Figura 5.35 – Foto do enrocamento na praia da Redinha,
sobre o qual há um passeio público.
Fonte: mochileiros.com
Figura 5.36 – Foto de um enrocamento na
praia de Areia Preta.
Foto: Matheus Lisboa
Mais recentemente, no ano de 2013, foi iniciado o projeto de enrocamento da Praia
de Ponta Negra (Figura 5.37 e Figura 5.38), aos moldes do que fora feito em Olinda e Recife,
no estado de Pernambuco. O projeto recebeu diversas críticas, especialmente devido ao
efeito sobre a dinâmica costeira na praia.
Figura 5.37 – Foto do enrocamento na praia de Ponta
Negra, paralelo à linha de costa.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 5.38 – Escadaria de acesso à praia sobre o
enrocamento na praia de Ponta Negra.
Foto: Matheus Lisboa
Estas três obras foram realizadas com blocos de granitos, possivelmente retirados em
pedreiras na região da cidade de Macaíba, cuja mineralogia apresenta, macroscopicamente,
feldspatos, quartzo, biotita e anfibólio. Alguns dos blocos são cortados por veios de quartzo.
Para a classificação de Gray (2013), as obras de enrocamento apresentam um valor
intrínseco, devido ao uso de rochas, assim como serviços ecossistêmicos de provisão, pois
as rochas são os materiais de construção utilizados, e de suporte, no caso específico da
Redinha, uma vez que as rochas funcionam também como plataforma para o passeio público.
Na classificação de acordo com os valores da geodiversidade (Brilha, 2015), as
rochas utilizadas nas obras de enrocamento em Natal são tidas como elementos de
143
geodiversidade. Já o desenvolvimento das obras em linhas paralelas entre si e
perpendiculares à linha de costa, no caso das praias da Redinha e Areia Preta, e
paralelamente à linha de costa, no caso da praia de Ponta Negra, classificam os enrocamentos
como faixas, na classificação de Fuertes-Gutiérrez e Fernández-Martínez (2010).
144
5.10 QUADRO SÍNTESE
A partir das análises apresentadas anteriormente neste capítulo, foi construída um
quadro síntese dos valores identificados, assim como as duas classificações empregadas
neste trabalho.
Quadro 5.1 – Quadro síntese dos valores e classificações da geodiversidade ex situ na cidade do Natal
Monumento/Construção Valores e Serviços1 Classificação por
Figura 5.39 – Mapa de localização dos principais locais em que a geodiversidade ex situ é utilizada na cidade do Natal agrupados pela classificação por extensão areal.
146
147
6. PANORAMA GERAL SOBRE A GEOCONSERVAÇÃO EM NATAL
Há consenso em todo o mundo sobre a importância de se proteger os, assim
chamados, patrimônios mundiais, sejam eles naturais ou culturais. O entendimento sobre a
proteção da geodiversidade do planeta segue os mesmos princípios, sendo parte deste
patrimônio natural, mas que também está intimamente associado ao patrimônio cultural das
sociedades.
Disto, surgiu a ideia de geoconservação. Apesar de ter sido desenvolvida com maior
impulso a partir de 2006 com a realização de uma conferência sobre o tema em Dudley
(Inglaterra), como indicam Burek e Prosser (2008), registros esporádicos de legislações
voltadas à conservação do meio abiótico são identificados desde a segunda metade do século
XX no Reino Unido.
Em relação à geodiversidade da cidade do Natal valorada neste trabalho, pode-se
observar que as duas vertentes presentes, in situ e ex situ, sofrem com ações que ameaçam o
patrimônio natural e cultural local.
A necessidade de conservação da geodiversidade de um lugar está no fato de que
muitos dos recursos existentes são esgotáveis e, ao mesmo tempo, únicos. É preciso,
portanto, haver uso sustentável da geodiversidade mundial, conservando sempre aqueles
locais que possuem um alto valor, seja ele científico, cultural ou simplesmente turístico
devido à seu aspecto visual. A avaliação destes locais passa por uma valoração qualitativa e
quantitativa, além de uma forte participação dos gestores e população em geral.
Ações de proteção ao meio abiótico in situ estão consagradas por meio do Programa
Global Geoparques da UNESCO, mas também devem ser desenvolvidas em localidades
menores como Natal, em que, apesar de muitos dos recursos da geodiversidade estarem
contidos em Zonas de Proteção Ambiental, ainda observa-se agressões que desmontam e
descaracterizam os ambientes naturais ou monumentos e edificações que fizeram uso de
rochas em suas construções.
A proteção das expressões ex situ da geodiversidade está muito ligada à gestão do
patrimônio cultural, que procura proteger os valores deste patrimônio, agregando e
expandindo benefícios sociais, econômicos e ambientais (UNESCO, 2016).
148
Neste capítulo serão apresentadas as principais ameaças à geodiversidade na cidade
do Natal, seja ela in situ ou ex situ, como forma de identificar os principais problemas à
geoconservação local.
Soluções para as problemáticas aqui observadas demandam legislações específicas,
assim como programas de educação que envolvam a temática da geodiversidade e o usufruto
sustentável, por meio da população em seu cotidiano, das paisagens, praias, monumentos e
toda e qualquer expressão que a geodiversidade possa ter.
6.1 AMEAÇAS À GEODIVERSIDADE IN SITU
Em relação à geodiversidade in situ, a maior problemática se dá pela poluição dos
ambientes abióticos. Casos explícitos em Natal são a quantidade de lixo jogada nos mangues
(figura 6.1), que acaba contaminando o substrato dos depósitos flúvio-marinhos,
prejudicando também a biodiversidade típica deste local. Na região da Via Costeira, canais
jogam efluentes na praia em direção ao mar (figura 6.2), provocando, além da poluição do
mar e da linha de costa, erosão regressiva nas dunas frontais.
Figura 6.1 – Lixo jogado no manguezal localizado
próximo à praia da Redinha.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 6.2 – Desembocadura de canal de escoamento
de efluentes na Via Costeira.
Foto: Matheus Lisboa
Como foi registrado ao longo deste trabalho, obras de enrocamento, sobretudo, nas
praias de Areia Preta e Ponta Negra (figura 6.3) modificaram a dinâmica natural nestas duas
áreas da costa natalense, alterando o fluxo de sedimentos e correntes. Há regiões hoje, no
litoral de Natal, em que há um balanço negativo no fluxo de sedimentos, provocado pelas
obras de enrocamento.
149
Logo, este tipo de obra pode ser caracterizada também como uma ameaça à
geodiversidade.
Figura 6.3 – Fotografia de parte do enrocamento na praia de Ponta Negra.
Foto: Matheus Lisboa
Outra ameaça à geodiversidade que tem sido evidente na cidade do Natal é a
ocupação de margens de rios e lagoas, de faixas de praia e de dunas de forma irregular. Ao
longo dos anos, observou-se forte especulação imobiliária em torno dessas áreas, tidas como
privilegiadas, o que demandou diversos protestos por pesquisadores de diversas áreas, além
de processos na justiça. Entretanto, muitas comunidades de baixa renda acabaram por se
estabelecer nestas áreas, como mostra a figura 6.4.
Figura 6.4 – Ocupações irregulares na margem do rio Doce, zona norte de Natal.
Foto: Matheus Lisboa
Entretanto, a maior ameaça à geodiversidade in situ na cidade do Natal corresponde
à especulação imobiliária. Ainda que diversas ações públicas de parte, por exemplo, do
150
Ministério Público tentem evitar grandes empreendimentos que possam representar
agressões consideráveis, sobretudo, às paisagens de Natal, observa-se que existem hoje
condomínios residenciais construídos sobre as dunas de algumas Zonas de Proteção
Ambiental e esta é apenas uma das formas que a indústria privada de venda de espaços
residenciais ou comerciais, que também ocorre pela ocupação das margens de rios, praias e
lagoas na cidade com o objetivo de uso desses locais como molduras para as construções
modernas de espigões ou condomínios residenciais.
O fato é que a beleza paisagística da cidade, que é constituída essencialmente de
elementos de natureza abiótica, que é a geodiversidade local, é atrativo primário para os
empreendimentos na cidade e representa também um atrativo econômico para as obras.
Trabalhos como os de Nobre (2001) e Bentes e Trindade (2008) versam sobre os aspectos
da especulação imobiliária que afetam o ambiente natural da cidade.
Disto posto, é preciso que haja um desenvolvimento e divulgação maiores do
entendimento da geodiversidade local da cidade do Natal de forma que essas ameaças sejam,
ao menos, mitigadas, embasando ações de proteção eficazes e que atitudes punitivas possam
ser implementadas na forma da legislação vigente, visando também a recuperação dos
ambientes afetados.
6.2 AMEAÇAS À GEODIVERSIDADE EX SITU
Quando se trata da geodiversidade ex situ, observa-se que ela pode ser encontrada
nos logradouros, monumentos e edificações que utilizem algum recurso da geodiversidade
em sua ornamentação ou construção. Assim, a ameaça a esses patrimônios culturais, que em
Natal datam desde o século XVII até reformas mais recentes, se caracterizam como ameaças
também à geodiversidade.
Disto, temos que pichações nos monumentos, como é identificado no monumento
aos mártires (figura 6.5), no Centro Histórico, e no monumento a Pedro Velho, na Praça
Cívica, são uma das principais ameaças ao patrimônio. Em relação à geodiversidade, a tinta
que é utilizada para realizar o ato infracional acaba cobrindo as rochas e seus minerais,
dificultado sua descrição e descaracterizando-a.
O tráfego de carros na Travessa Pax, maior registro de calçamento “pé-de-moleque”
feito com arenitos ferruginosos do Grupo Barreiras em Natal, acaba por retirar blocos da rua
151
(figura 6.6). Da travessa, que é tombada pela Fundação José Augusto desde 2007 (Decreto
Normativo 19.930/2007), é retirado, portanto, um recurso da geodiversidade de alto valor
histórico de seu local de uso original. Lixo nas ruas também são ameaças que afetam o
patrimônio cultural e os recursos abióticos utilizados.
Figura 6.5 – Detalhe de pichação feita no monumento
aos mártires, na praça André de Albuquerque.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 6.6 – Fotografia da Travessa Pax em outubro
2015, destaque para os blocos de arenito soltos.
Foto: Matheus Lisboa
Estes casos citados são, em geral, cometidos por algum individuo da comunidade,
que se aproveita da ineficácia do setor público no que se refere à fiscalização e manutenção
destes locais.
Entretanto, os próprios agentes públicos e privados que deveriam realizar a proteção
destes locais, por descuido, desinteresse ou desconhecimento da importância do recurso da
geodiversidade utilizado nos monumentos, acaba por desconsiderá-los em oportunidades de
reformas, como é o caso das Igrejas de Santo Antônio e de Nossa Senhora da Apresentação,
no bairro da Cidade Alta (figuras 6.7 e 6.8).
Durante obras de reparo nas duas construções, foi desconsiderado o fato do uso
histórico de blocos de arenito calcífero nas porteiras e fachadas, que remonta ao século
XVIII, e houve a colocação de concreto como forma de substituição da rocha
Sabe-se que há diversos corpos de recifes de arenito ao longo do litoral natalense, de
onde poderiam ter sido retirados pequenos blocos para serem trabalhados em cantaria de
152
forma a fazer a reposição correta do material utilizado. Esta substituição que ocorreu
caracteriza-se também como uma ameaça à geodiversidade, porque é perdido o registro de
seu uso em uma área de importância histórica para a cidade.
Figura 6.7 – Detalhe de coluna na Igreja de Santo
Antônio com base refeita em concreto.
Foto: Matheus Lisboa
Figura 6.8 – Porta lateral na Igreja de Nsa Sra da
Apresentação com colunas refeitas em concreto.
Foto: Matheus Lisboa
Ameaça maior ainda é o descuido por parte dos gestores principais do município, que
compõem a Prefeitura Municipal, em momento de intencional “limpeza” dos monumentos
a Augusto Severo, no bairro da Ribeira, e a Dom Pedro II, em praça homônima no bairro do
Alecrim.
A solução para pichações e sujeira nestes dois locais foi, em outubro de 2015, ter
sido feita a pintura completa dos monumentos com uma tinta que não apenas cobriu os dois
pedestais, mas cobriu as rochas utilizadas e seus minerais, registros não apenas da história
do homem e da cidade, mas também de milhões de anos do Planeta Terra.
A figuras 6.9 e 6.10 mostram um comparativo do pedestal de granito no monumento
a Augusto Severo, antes e depois de ter sido pintado. Após a pintura, o monumento perdeu,
de certa forma, sua beleza e se assemelhou muito a algo construído com concreto.
153
Figura 6.9 – Pedestal de granito com trabalho em
cantaria no monumento de Augusto Severo, em 2010.
Fonte: Carvalho (2010)
Figura 6.10 – Pedestal do monumento a Augusto
Severo após a pintura pela Prefeitura, em 2015.
Foto: Matheus Lisboa
Como se observa, todos os casos em que houve agressão ao patrimônio cultural local
que lança mão de algum recurso da geodiversidade em sua composição arquitetônica, parece
haver certo desconhecimento da importância daquele recurso.
Soluções seriam, possivelmente, o incentivo à educação ambiental com enfoque na
geodiversidade, além de promoção das geociências junto à sociedade.
155
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Natal é uma das cidades mais antigas do Brasil, sendo seu marco inaugural a
construção do Forte dos Reis Magos em 1599. Ao longo de mais de quatro séculos de
história, a cidade experimentou, inicialmente, um lento desenvolvimento, sendo este
impulsionado a partir do século XX.
Surgiram novos equipamentos urbanos, novas ruas, novos edifícios e novos bairros.
O que mudou também foi a relação da cidade com o ambiente em que ela foi construída,
sobretudo o meio abiótico, a geodiversidade, local.
No começo de sua história, e isto é mostrado pelos primeiros mapas feitos pelos
holandeses no século XVII, a cidade possuía uma vasta área de dunas vegetadas sem
intervenção antrópica. Os arenitos calcíferos, dos arrecifes, e ferruginosos, do Grupo
Barreiras, encontrados nas praias eram elementos de grande importância na representação
cartográfica da área e nas construções da época, o que caracteriza uma arquitetura
vernacular, em que os recursos locais são utilizados nas edificações.
Isto passa a ser modificado a partir dos anos de 1900, quando começa a ser feito uso
de pedras graníticas, extraídas na cidade vizinha de Macaíba, no pavimento de ruas e como
pedestais de monumentos inaugurados nas principais praças de Natal. Até o final do século
XX e começo do século XXI, observa-se que há um abandono do uso dos recursos abióticos
locais nas construções da cidade.
Hoje, a exemplo do que é visto em reformas em locais históricos da cidade, como o
Palácio dos Esportes, as rochas que são utilizadas para revestimento e em elementos
decorativos ou construtivos são extraídas no interior do Rio Grande do Norte ou,
principalmente, de outros estados.
Além dessa modificação da relação da cidade com a geodiversidade ex situ, também
foi modificada a forma de ocupação urbana sobre os recursos abióticos in situ. As praias
passaram a ocupar lugar de destaque no cotidiano da cidade a partir da década de 1920 e
hoje são algumas das áreas de ocupação mais valorizadas de Natal.
Os corpos dunares, de grande destaque nas paisagens locais, são entendidos hoje
como fundamentais para o aquífero Barreiras, que abastece a cidade, e, por isso, são, em sua
maioria, protegidos por legislação ambiental específica. Entretanto, muitas das dunas da
cidade foram arrasadas, ocupadas e impermeabilizadas ao longo dos séculos. Em muitos
156
casos, tiveram sua dinâmica natural cessada. Ainda hoje observa-se que este tipo de agressão
ao meio ambiente continua, sobretudo devido as ocupações irregulares e especulação
imobiliária.
Todas essas expressões da geodiversidade, in situ e ex situ, assim como seus recursos,
solos, minerais, rochas, paisagens, etc., podem ser valorados de acordo com os valores
ecossistêmicos, definidos inicialmente pela Millenium Ecosystem Assessment e adequados
por Gray (2013) para o meio abiótico.
Este trabalho focou em descrições sucintas dos recursos da geodiversidade,
embasando o processo de identificação, análise e classificação da geodiversidade de Natal,
relacionando, sempre que possível, com a comunidade local.
Dos 26 valores, bens e processos definidos pelos 5 serviços ecossistêmicos da
geodiversidade, apenas 7 não foram possíveis de serem identificados na cidade do Natal,
sendo a maioria relativa ao serviço de provisão, que tem um valor monetário por vezes
associado. Isso se deve a inexistência de exploração mineral regular e legal dentro dos limites
municipais da cidade, ocorrendo, entretanto, na Região Metropolitana onde há extração de
água mineral, areias, argilas e granito, este último ocorrendo apenas no município de
Macaíba.
Em relação às classificações dos locais em que ocorrem recursos abióticos in situ,
percebeu-se que a cidade do Natal possui 8 geossítios (Parque das Dunas, Parque da Cidade,
Campo de Dunas Sul, Rio Doce, Rio Pitimbu, Rio Potengi, Litoral Central e Litoral Sul) e 8
lugares de geodiversidade, seguindo as definições de Brilha (2015), contemplando também
todas as definições dos lugares de acordo com sua extensão, definidos por Fuertes-Gutiérrez
e Fernández-Martínez (2010), ou seja, Natal possui pontos, faixas, áreas e panoramas de
geodiversidade in situ.
A geodiversidade ex situ da capital potiguar, por outro lado, é composta por 10
elementos de geodiversidade, a partir de Brilha (2015), distribuídos entre pontos, faixas e
áreas de geodiversidade, segundo a definição de Fuertes-Gutiérrez e Fernández-Martínez
(2010).
Assim, observa-se que a geodiversidade de Natal é diversa e possível de ser
encontrada em todas as regiões da cidade. Entretanto, ela não está livre de ameaças e foi
muito modificada ao longo dos anos. As mais alarmantes ameaças e modificações são
advindas do desinteresse e desinformação da população, visitantes e gestores da cidade, que
157
acabam por marginalizar o meio abiótico local, sem entender que as paisagens que tanto são
apreciadas, as praias tão frequentadas, as trilhas dos parques realizadas, entre outros locais
que podem, simplesmente, servir de caminho no dia-a-dia, são produtos da geodiversidade.
Devido à sua extensão e variedade, a geodiversidade de Natal pode ser usada para
meios científicos, culturais, esportivos e turísticos, de forma a promover, em conjunto, a
divulgação das belezas naturais e culturais da cidade e das geociências, auxiliando o
processo de geoconservação.
158
159
A
Almeida, F. F. M.; Hasui, Y.; Brito Neves, B. B.; Fuck, R. A. 1977. Províncias Estruturais
Brasileiras. In: SBG, Simpósio de Geologia do Nordeste, Campina Grande, Anais,
vol. 8, p. 363-391.
Almeida, L. R.; Amaro, V. E.; Marcelino, A. M. T.; Scudelari, A. C. 2015. Avaliação do
Clima de Ondas da Praia de Ponta Negra (RN, Brasil) Através do Uso do SMC-
Brasil e sua Contribuição à Gestão Costeira. Revista de Gestão Costeira Integrada,
15(2): 135-151.
Amaral, R. F.; Diniz Filho, J. B.; Fonseca, V. P. 2005.. Degradação Ambiental na Cidade do
Natal: Aspectos Geomorfológicos e Hidrológicos. Estudos Geológicos, v. 15: 102-
113.
Angelim, L. A. A.; Nesi, J. R.; Torres, H. H. F.; Medeiros, V. C.; Santos, C. A.; Veiga Júnior,
J. P.; Mendes V. A. 2006. Geologia e Recursos Minerais do Estado do Rio Grande
do Norte – Escala 1:500.000. Texto explicativo dos mapas geológicos e de recursos
minerais do Estado do Rio Grande do Norte. Recife, CPRM – Serviço Geológico
do Brasil, 119p.
Araújo, A. J. D.; Silva, M. L. N.; Nascimento, M. A. L. 2013. A Presença da Geologia no
Cotidiano do Natalense: o Patrimônio da Praia da Redinha. In: XXV Simpósio de
Geologia do Nordeste, Gravatá/PE. Conferências e Resumos - Boletim 23. p. 21-
22.
Augusto, W. C. B.; Del Lama, E. A. 2011. Roteiro Geoturístico no Centro da Cidade de São
Paulo. Terrae Didatica, 7(1): 29-40.
B
Barbosa, J. A.; Lima Filho, M. 2005. Os Domínios da Bacia da Paraíba. In: III Congresso
Brasileiro de P&D em Petróleo e Gás, Anais em CD-ROM.
Barbosa, J. A.; Neumann, V. H.; Lima Filho, M.; Souza, E. M.; Moraes, M. A. 2007.
Estratigrafia da Faixa Costeira Recife-Natal (Bacia da Paraíba e Plataforma de
Natal), NE Brasil. Estudos Geológicos, 17(2): 3-30.
160
Barreto, A. M. F.; Suguio, K.; Bezerra, F. H. R.; Tatumi, S. H.; Yee, M.; Giannini, P. C. F.
2004. Geologia e Geomorfologia do Quaternário Costeiro do Estado do Rio Grande
do Norte. Geologia USP – Série Científica, 4(2): 1-12.
Bentes, D.; Trindade, M. A. S. F. 2008; Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS – e
Grandes Empreendimentos: resistência de territórios populares e elementos para
inclusão sócio-territorial no litoral potiguar. Revista da FARN, 7(2): 143-159.
Bezerra, F. H. R.; Amaro, V. E.; Vita-Finzi, C.; Saadi, A. 2001. Pliocene-Quaternary fault
control of sedimentation and coastal plain morphology in NE Brazil. Journal of
South American Earth Sciences, 14(1): 61-75.
Borba, A. W.; Ferreira, F. V.; Andrade, B. F.; Sell, J. C. A Geomemória das Construções
Históricas: Exemplos no Cone Sul Latino-Americano. Geonomos, 23(1): 1-9.
Branner, J. C.; Gilman, C. E. 1900. O Recife de Pedra na Foz do Rio Grande do Norte.
Revista do Rio Grande do Norte, 1(1): 37-41.
Branner, J. C. 1904. The Stone Reefs of Brazil, Their Geological and Geographical
Relations, with a Chapter on the Coral Reefs. Cambridge, John Wilson and Son,
285p.
Brilha, J. 2004. A Geologia, os Geólogos e o Manto da Invisibilidade. Comunicação e
Sociedade, 6(1): 257-265.
Brilha, J. 2005. Património Geológico e Geoconservação: a conservação da natureza na
sua vertente geológica. Braga, Palimage Editores, 183p.
Brilha, J. 2015. Inventory and Quantitative Assessment of Geosites and Geodiversity Sites:
a Review. Geoheritage.
Burek, C. V.; Prosser, C. D. 2008. The History of Geoconservation: an Introduction. In:
Burek, C. V.; Prosser, C. D. (eds.). The History of Geoconservation. London, The
Geological Society, p. 1-6.
C
Cabral Neto, I.; Córdoba, V. C.; Vital, H. Beachrocks do Rio Grande do Norte. Natal,
EDUFRN, 115p.
161
Calegari, E. B.; Fortes, E.; Freire, R. H. A.; Silva, V. R. 2011. Quantificação e Qualificação
Geoambiental da Paisagem, Geodiversidade e Potencial Turístico no Município de
Turvo – Paraná – Brasil. Revista Geográfica de América Central, Número Especial
EGAL.
Carvalhido, R. J.; Brilha, J. B.; Pereira, D. I. 2016. Designation of Natural Monuments by
the Local Administration: the Example of Viana do Castelo Municipality and its
Engagement with Geoconservation (NW Portugal). Geoheritage.
Carvalho, H. L. 2010. Patrimônio Geológico do Centro Histórico de Natal. Relatório de
Graduação, Departamento de Geologia, Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, Natal, 105p.
Cascudo, L. C. 1999. História da Cidade do Natal. 3ª edição, Natal, RN Econômico, 496p.
Cascudo, L. C. 2011. Crônicas de Origem: a Cidade de Natal nas Crônicas Cascudianas
dos anos 20. 2ª edição, Natal, EDUFRN, 117p.
Coratza, P.; De Waele, J. 2012. Geomorphosites and Natural Hazards: Teaching the
Importance of Geomorphology in Society. Geoheritage, 4: 195-203.
Córdoba, V. C.; Jardim de Sá, E. F.; Sousa, D. C.; Antunes, A. F. 2007. Bacia de
Pernambuco-Paraíba. Boletim de Geociências da Petrobras, 15(2): 391-403.
Costa Jr, I. F. 2005. Decodificando Significados dos "Índios Tapuias": festa, tradição e
ritual na Redinha. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em
Antropologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal.
Covello, C. 2011. A Paisagem de Itapema: Estudo da Geodiversidade para a Educação
Ambiental e o Geoturismo. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação
em Geografia, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 174p.
Cunha, E. M. S. 2004. Evolução atual do litoral de Natal-RN (Brasil) e suas aplicações a
gestão integrada. Tese de Doutorado, Programa de Doctorado de Ciencias del Mar,
Universitat de Barcelona, Barcelona, 393p.
162
D
Decreto Normativo Nº 19.930, de 25 de julho de 2007. Tomba a Travessa Pax localizado no
Bairro da Ribeira, localizada em Natal/RN. Diário Oficial do Estado, nº 11525, p.1.
Dantas, M. E.; Ferreiras, R. V. 2010. Relevo. In: Pfaltzgraff, P. A. S.; Torres, F. S. M.
Geodiversidade do Estado do Rio Grande do Norte. Recife, CPRM – Serviço
Geológico do Brasil, p. 77-92.
Del Lama, E. A.; Bacci, D. L. C.; Martins, L.; Garcia, M. G. M.; Dehira, L. K. 2014. Urban
Geoturism and the Old Centre of São Paulo City, Brazil. Geoheritage.
Dowling, R.; Newsome, D. 2011. Geoturism. Londres, Routledge, 260p.
E
Ellis, E. 2014. Ecosystem. The Encyclopedia of Earth. Disponível em:
http://www.eoearth.org/view/article/152248. Acesso em 25/01/2016.
F
Fisher, B.; Turner, R. K.; Morling, P. 2009. Defining and classifying ecossystem services
for decision making. Ecological Economics, 68(3): 643-653.
Fonseca, V. P.; Sousa, M. O. L.; Silva, F. O.; Bezerra, F. H. R.; Amaral, R. F.; Souza, Z. S.;
Ferreira, A. C.; Dutra, R. R. 2012. Carta Geológica – Folha Natal (SB-25-V-C-V),
escala 1:100.00. Natal, CPRM – Serviço Geológico do Brasil.
Fracasso, P. 2005. Sistema de Dunas do Parque das Dunas e Barreira do Inferno/Natal
(RN): levantamento geológico /geofísico, elaboração do modelo determinístico e
avaliação da vulnerabilidade/suscetibilidade frente às pressões antrópicas.
Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Geodinâmica e
Geofísica, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 184p.
Freitas, E. F.; Saraiva Jr, J. C. 2013. Geomorfologia do Parque das Dunas em Natal/RN e
Museu de Geologia do IFRN: Interações e Desafios. In: IX Congresso de Iniciação
Científica do IFRN, Anais, p. 1854-1860.
163
Fuertes-Gutiérrez, I.; Fernández-Martínez, E. 2010. Geosites Inventory in the Leon Province
(Northwestern Spain): A Tool to Introduce Geoheritage into Regional
Enviromental Management. Geoheritage, 2: 57-75.
G
Galopim de Carvalho, A. M. 2007. Como Bola Colorida, a Terra, Património da
Humanidade. Lisboa, Âncora Editora, 245p.
Gray, M. 2004. Geodiversity: valuing and conserving abiotic nature. 1ª edição. Chichester,
John Wiley & Sons, 434p.
Gray, M. 2013. Geodiversity: valuing and conserving abiotic nature. 2ª edição. Chichester,
John Wiley & Sons, 495p.
H
Hartt, C. F. 1870. Geology and Physical Geography of Brazil. Boston, Fields, Osgood & Co,
620p.
Hassan, R.; Scholes, R.; Ash, N. (eds.) 2005. Ecosystems and Human Well-Being: Current
State and Trends. Washington, Island Press, 838p.
Hjort, J.; Gordon, J. E.; Gray, M.; Hunter Jr., M. L. 2015. Why Geodiversity Matters in