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1A GNESE FORMAL E SIMBLICA DO RETBULO
DE N. SR. DO BONFIM DA BAHIA E SEUS DERIVADOS
Luiz Alberto Ribeiro Freire
Doutor em Histria da Arte UP Portugal Professor de Histria da
Arte Brasileira
da Escola de Belas Artes da UFBA. Email: [email protected]
H muito que os historiadores da arte vm descobrindo nas gravuras
avul-sas e nos tratados arquitetnicos publicados a partir do sculo
dezesseis, uma verdadeira fonte de inspirao para os motivos
pinta-dos leo sobre tela ou madeira, nos azule-jos, na ourivesaria
e na talha1.
Em Portugal e na rea de sua influncia, estas gravuras serviram
de fonte principal de atualizao estilstica, pois pro-vinham dos
grandes centros europeus de inveno e edio como Itlia, Frana,
Ho-landa e Alemanha e eram to necessrias aos mestres, oficiais e
aprendizes das vrias es-pecializaes artsticas, quanto os pincis,
tintas, madeiras e formes.
Estes meios no s serviam pa-ra atualizar os estilos, mas
sobretudo, in-formar as composies e as figuras no caso das cenas
narrativas figuradas na pintura e na azulejaria, o que garantia a
permanncia de gravuras mais antigas, do sculo dezes-seis, por
exemplo, na oficina dos artistas, continuando a informar as
composies do sculo dezessete, dezoito e at dezenove, aspecto que
muitas vezes determinava os arcasmos ocorrentes.
O uso destas fontes iconogrfi-cas, no implicava necessariamente
em c-pias servis dos modelos e solues, mas freqentemente forneciam
o sustentculo inspirativo para os elementos compositivos,
arquitetnicos e decorativos, do retbulo [ou das demais peas de
talha]. Contudo, no h uma normatividade; na manipulao destes
elementos o artista joga com a sua
1 O presente artigo foi extrado do V Captulo-(Origem e Evoluo
dos Modelos) da tese de doutorado em Histria da Arte, de minha
autoria intitulada A Talha Neoclssica na Bahia, defen-dida em junho
de 2001 na Faculdade de Letras da Universidade do Porto Portugal.
Aqui atua-lizamos o captulo acrescendo e retificando aspectos do
contedo.
experincia e criatividade, conferindo s obras uma
individualidade2.
Acerca da circulao destas i-magens e do seu poder difusor de
estilos e modelos Marie-Thrse Mandroux-Frana concluiu haver uma
defasagem entre a po-ca de criao de um estilo e aquela da sua
difuso atravs das estampas, e comprovou o poder miditico destas
gravuras na difu-so do rococ em Portugal3.
No Brasil a circulao destas gravuras tm pouqussima comprovao,
registra-se um caso em Minas Gerais em que o pintor de Mariana, Joo
Nepomuceno Corra e Castro deixou para os seus apren-dizes, em
testamento datado de 18 de de-zembro de 1794, todas as suas
estampas, riscos e debuxos4. Na Bahia no temos documentos sobre
tais legados, mas preser-varam-se desenhos no Arquivo Histrico
Ultramarino de Lisboa que comprovam que os discpulos da Aula
Militar da Bahia5
2 EUSBIO, Maria de Ftima dos Prazeres. Re-tbul os j oanin os n o
c o n c e lh o d e Viseu. V. 1 Dissertao d e Mestrad o e m Hist ria
da Arte e m Portugal apresentada Faculdade d e Letras da
Universidade d o Port o. Orientao : Pro f es-sora Dout ora Natlia
Marinh o Ferreira-Alves, 1998. 166 p. p. 39.
3 MANDROUX-FRANA, Marie-Thrse. In-f or mati on artistique et
mass-m e dia au XVIII e si c l e: La di fusi o n d e l ornem e nt
grav r o c o-c o au Portugal. In Bracara Augusta Actas d o Con
gress o A Arte e m Portu gal, s c. XVIII, Andr Soares, Revista
cultural da cmara Mu-ni c ipal d e Braga. II t o m o, v. XXVII,
1973, n 64(76). p. 412 - 432.
4 BOSCHI, Caio Cezar. O barro c o min eir o: artes e trabalh o.
So Paul o: Brasiliense, 1988. p. 34 (Col e o tud o hist ria).
5 Arquiv o Hist ri c o Ultramarin o. BAHIA - AULA MILITAR - 1778
- 1779 - DESENHOS PENA. Quarenta desenh os p ena s obr e pa-p el D
& C Blauw. Medind o 0,330 x 0,217. AHU - 1o. Album - Capilha n.
990 / 1028 - Cdi c e n 1512;
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2tinham contato com tratados de arquitetura e geometria,
principalmente franceses, do sculo dezoito e os copiavam com
perfeio.
Os tratados deveriam constar nas bibliotecas dos maiores
conventos, co-mo o de Nossa Senhora do Carmo e de So Francisco,
infelizmente dilapidadas. A bi-blioteca dos Jesutas contava em
1694, de 3000 volumes6. provvel que houvesse a um bom ncleo destes
tratados, e no s, mas outros livros cujas ilustraes servissem para
informar os artistas, tais como livros sacros, de filosofia,
teologia, histria e his-tria sagrada. Do acervo desta biblioteca no
possumos inventrio capaz de revelar com preciso o seu contedo,
.
A Biblioteca Pblica da Bahia instituda em 1811, no governo do
Conde dos Arcos, teve o seu acervo constitudo por doaes de
particulares. Em 1819, sabemos constar de cinco mil volumes,
jornais em vrias lnguas e panfletos em ingls. Em 1863, o suo Tshudi
estimou o seu acervo em dezesseis mil volumes e especificou que
eram quase todos escritos em lngua estran-geira, principalmente
francs. Um invent-rio de 1887 conta vinte mil volumes, inclu-sive
mapas7. Por faltar uma relao dos ttulos existentes no sculo
dezenove, e por no ter se conservado o acervo original, vitimado em
1912, por um incndio decor-rente do bombardeio cidade, seguido de
pilhagem, que resultou na perda de mais de noventa e nove porcento
de seu acervo8, completamente impossvel avaliarmos a literatura
artstica, se que existia, a reco-lhida.
BAHIA. Aula Militar. 1779. Desenh os pena sobre papel D & C
BLAUW. De aut oria de Manuel Antoni o Ribeir o, Furriel d o
Regimen-t o da Artilharia dis c pul o da Aula Militar da Bahia.
Cpia de tratad os arquitet ni c os que tratam das ord ens d e
arquitetura e seus orna-t os. A . H. U. Conselh o Ultramarin o, c
di c e n 1513.
6 GROVER, Mark L. "The b o o k and th e Con-quest: Jesuit
Libraries in Col o nial Brazil", Li-braries and Culture, Austin, 28
(3): 271-273, 1993.
7 MATTOSO, Katia M. de Que irs. Bahia, s cu-l o XIX, uma pr ovn
c ia n o imp ri o. Rio d e Ja-n eir o: Nova Front eira, 1992. p.
206. 747 p.
8 Cli o - Assess oria em Pesquisa d o Estad o da Bahia (www.magi
c lin ck.c o m.br/cli o/bibli oarquiv o.html)
Outro lugar que deve ter reu-nido um acervo especfico de
tcnicas, arte e indstria, fora a biblioteca do Liceu de Ar-tes e
Ofcios, primeira instituio complexa e programtica de ensino das
artes e ofcios criada, em 1872, por membros da sociedade baiana,
inclusive mestres de pintura, escul-tura e talha, oficiais e
mestres formados pela tradio oficinal, que devem ter contribudo
doando suas gravuras biblioteca, ou pelo menos levando-as como
material didtico para as suas aulas. No contamos mais com este
acervo, queimado no sinistro que afetou todas as instalaes do Liceu
em 1968, inclusive a biblioteca, no havendo tambm qualquer listagem
ou inventrio dos livros que l constavam.
Atravs de fotografias que do-cumentaram o interior das instalaes
do Liceu de Artes e Ofcios, apresentadas no livro A arte de ter um
ofcio9, possvel ver grande quantidade de modelos em gesso de
esculturas gregas, romanas e do barroco italiano, assim como uma
fotografia aps o incndio mostra-nos o que restou da
biblio-teca.
Finalmente, preservou-se na bi-blioteca do Mosteiro de So Bento,
o se-gundo volume do tratado Perspecttiva pictorum et architectorum
de Andrea Poz-zo, o que pode confirmar a longevidade da influncia
deste tratado na arte baiana10.Entretanto, as provas artsticas so
impor-tantes para a anlise da influncia das gra-vuras e tratados
arquitetnicos na talha baiana do sculo dezenove, o que mostra-remos
caso a caso.
Os vrios indcios j referidos nos levam a crer ter havido uma
veiculao das gravuras e mais ainda de riscos ou c-pias debuxadas
das gravuras avulsas ou de tratados, considerando-se que a aquisio
dos tratados era mais difcil e onerosa, tal-vez s possvel, para a
Companhia de Jesus,
9 LEAL, Maria das Graas de Andrade. op. c it.,
1996. p. 231, 274. 10 A existn c ia dest e tratad o na bibli ot
e ca d os
b eneditin os da Bahia f oi in f ormada p el o ar-quit et o
Eugni o Lins, p ois n o n os f oi p ossvel o ac ess o obra, dada a
di fi c uldade imp osta p el os m o n g es resp o nsveis, p o r
isso n o p o-d e m os f orn e c er mai ores in f orma es s obre a
data da edi o d o tratad o e a data de sua aqui-si o p el o m
osteir o.
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3s ordens primeiras e segundas e para os lentes da Aula Militar
da Bahia.
Acerca da origem e evoluo do modelo de retbulos arrematados por
cpula vazada sobre volutas
Um tipo de retbulo-mor, bal-daquino arrematado por uma cpula
oval vazada sobre seis volutas em esses, foi enta-lhado por Antnio
Joaquim dos Santos, entre 1813-181411, para a capela-mor da Igreja
de Nosso Senhor do Bonfim (Fig. 1).Aps esta experincia, o tipo
virar modelo, sendo adotado por vrias outras igrejas na cidade da
Bahia, gerando uma srie de in-terpretaes que por mais variadas que
se-jam, mantm a identidade estrutural de origem, produzindo uma
grande famlia de retbulos-mores, e por emulao, colaterais e
laterais, que marcaro a reforma da talha na cidade e na provncia,
sendo at exportado, para a provncia de So Paulo.
11 No tem os abs oluta c erteza de t er sid o este e ntalhad or
o aut or d o risc o, po is o t erm o d e c o ntrat o n o f oi
preservad o restand o apenas u m registr o d o pagament o d e
2:600$000 feit o ao artista, trans crit o p or Ott, n os se guintes
term os ao Entalhad or Ant onio J oaquim d os Santos p or c o nta d
o retbul o da Capela m or que ajustei p or 3:200$000 reis p el o
risc o que assignei (Ott, Carl os. Evoluo das artes pls-ti cas nas
igrejas d o Bon fim, Boqueiro e Sa-d e. Salvad or: Universidade
Federal da Bahi-a/Centr o d e Estud os Baian os, 1979. 393 p. il.
p. 144.). Contud o na Bahia do s cul o XIX a n or ma era o pr pri o
entalhador ris car a obra d e talha, s , muit o raramente, el e exe
cutava o risc o d e outrem.
Fig. 1 - Baldaquin o da igreja de N. Sr. d o Bon-fim, Salvad or
Bahia, Brasil -
Desenh o d e Elias Sant os
Contudo, a conformao pls-tica concebida para o retbulo-mor da
Igreja do Bonfim, deve muito a um tipo de balda-quino ideado por
artistas italianos, que por sua beleza, e sobretudo por sua carga
simb-lica, ganhar apreo e ser muitas vezes replicado e difundido em
Portugal e nas suas colnias.
A mais antiga fonte iconogrfi-ca a que podemos ter acesso e que
nos apre-senta a estrutura de um baldaquino arre-matado por uma
coroa real fechada sobre volutas em esses est na gravura de um
Teatro eretto nella chiesa del Giesu di Ro-ma nella quinquagesima
lanno santo M.D.C.L. gravada por Carlo Rainaldi (Roma, 1611-Roma,
1691)12 e intitulado de O Sacrifcio de Salomo13 (Fig. 2). Nela o
pequeno baldaquino contendo a representa-o do Santssimo Sacramento,
paira na altura do entablamento da colunata do interior do templo,
sobre nuvens e anjos com raios, enquanto Salomo acompanhado de
outras figuras, oferece o sacrifcio numa 12 Ency c l opaedia
Britanni ca Online. Carlo
Rainaldi disp onv el e m < www.britanni ca.c o m > acessad
o e m 01.12.2000.
13 Gravura avulsa publi cada p o r LEACH, Mark Carter et
Wallace, Richard W. The illustrated Bartsch 45 f ormerly v olu m e
20 (Part2) Ital-ian Masters o f th e sevente enth c entury. New
York: Abaris Bo oks, 1982. 304 p. il. p. 171.
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4pira. O surgimento desta idia d-se por-tanto em meados do sculo
dezessete, 1650, data da ereo deste teatro, mas a idia j
Fig. 2 - Gravura d o t eatro sacro eret o na igreja de Jesus, Ro
ma, em 1650 p or Carlo Rainaldi. .
vinha sendo maturada nos prprios balda-quinos realizados nas
Igrejas Italianas, sem contudo terem uma relao to direta com a
frmula baiana. Entre estas experincias est o baldaquino em bronze
da Baslica de So Pedro ereto por Gianlorenzo Bernini entre 1624
1635 (Fig. 4), divulgado por gravuras datadas de 176514 e
14 Faculdade d e Belas Artes da Universidade d o
Port o. Gravura avulsa Veduta del di dentr o di S. Pietr o, c o
m l o c c h iata dellint ern o d ella gran c upula s opra la Con f
essi on e d esenhada p or Franc es c o Panini e in c isa p or Do
meni c o Montag. Calc o grafia della Rev. Apost oli ca pr ess o la
Curia Inn o c e nziana, 1765. Cota: G-57.
Fig. 3 - Detalhe d o p equen o baldaquin o, Arquitetura e f mera
para expo si o
d o Santssim o Sacrament o.
176615, desenhadas por Francesco Panini e incisas por Domenico
Montag; o balda-quino da Baslica Liberiana de Santa Maria Maior
(Fig. 5), talvez obra do mesmo arqui-teto que reformou a igreja, o
florentino Ferdinando Fuga, divulgado por gravura de 177116,
desenhada por Francesco Panini e incisa por Francesco Barbazza.
No exemplar de Bernini, pri-meiro baldaquino barroco, no existe
coroa, mas quatro grandes volutas em esses orna-das com palmas, que
partem do cimo do entablamento convergindo para o centro onde
sustentam um pequeno entablamento cruciforme que serve de base s
quatro pe-quenas volutas em esses que sustentam uma bola onde est
erguida uma cruz latina. O conjunto completa-se ao nvel do remate
15 Faculdade d e Belas Artes da Universidade d o
Port o. Gravura avulsa Veduta del di dentr o di S. Pietr o in
Vatican o dagl ingressi prin cipali d ella med esima, desenhada por
Franc es c o Pa-nini e in cisa p or Do meni c o Mo ntaigu. Calc
o-grafia della Rev. Camera Aposto li ca press o la Curia Inn o c e
nziana, 1766. Co ta: G-71.
16 Faculdade d e Belas Artes da Universidade d o Port o. Gravura
avulsa Veduta interna della Basili ca Liberiana detta di Santa
Maria Maggi-or e fatta rim od ernare dalla gl o ri osa me m oria di
Papa Benedett o XIV co m la direzzion e d el Cavaliere Ferdinand o
Fuga Arc hit ett o Fioren-tin o desenhada p or Franc es c o Panini
e in cisa p or Franc es c o Barbazza. Calc o grafia della Rev.
Camera Apost oli ca press o la Curia Inn o c e nzi-ana, 1771. Cota:
G-51.
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5com a presena de quatro robustos anjos de corpo inteiro
segurando festes pendentes, cada um sobre um dos quatro ressaltos
do entablamento do baldaquino, frente das grandes volutas.
No segundo exemplo, o da I-greja Liberiana de Santa Maria Maior,
o baldaquino apresenta um remate em que, grandes anjos de corpo
inteiro sustentam dois pequenos anjos meninos que seguram uma coroa
radiada com palmas e uma cruz latina ao centro, no existindo
volutas. Esta tradio de baldaquinos berninianos, com quatro
colunas, arremate com lambrequins e volutas somente chegar Portugal
em me-ados do
Fig. 5 - Baldaquin o da Basil ca Liberiana de Santa Maria Mai
or, Itlia - re fo r mada pel o arquitet o Ferdinand o Fuga, parte
de gravu-ra de Franc es c o Panini, 1771. Faculdade d e Belas Artes
da Univ ersidade do Port o - Por-
tugal
sculo dezoito, quando ser feito o retbulo-mor da Igreja de So
Vicente de Fora em Lisboa (Fig. 6), que repercutiu no baldaqui-no
do santurio do Bom Jesus de Braga, Portugal (Fig. 7).
Fig. 6 - Baldaquin o da igreja do Mosteir o d e
Fig. 4 - Baldaquin o da Basli ca de S. Pedr o, Ro ma, obra d e
Gialorenz o Bernini, 1624-1635 - Gravura de Fran-c is c o Panini,
1766 - Acerv o da Facul-dade d e Belas Artes da Universi-dade d o
Port o - Portugal.
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6So Vicente d e Fora, Lisb oa, Portugal, c er ca.de m ead os d o
s cul o XVIII.
Se o baldaquino de Bernini um importante marco na interpretao
barroca desta estrutura, servindo de base para outras experincias
do gnero no mundo catlico, nele tambm reside o uso pioneiro do
arremate com volutas, que evo-lui no ambiente artstico
italiano.
Do teatro de Rainaldi, o arre-mate de cora real fechada sobre
volutas ser concretizado no altar
Fig. 7 - Baldaquin o da igreja do B o m Jesus d o Mont e, Braga,
Portugal - en talhad o n o
p er od o d e 1803-1813.
baldaquino de Carlo Fontana feito para a igreja de Santa Maria
em Traspontina, Ro-ma17 em 167418 (Fig. 8e9). Nele oito colunas
sustentam seces de entablamentos que
17 FEO, Vitt ori o De. Le cappelle e gli altari in
FEO, Vitt ori o De e Martinelli, Valentin o. An-drea Pozzo.
Milan o: Ele cta, 1996. p. 119-120. p. 114-143.
18 VALE, Teresa Leon or Magalhes d o. A imp or-tao d e es
cultura italiana n o c o nt exto das re-la es artsti c o- culturais
entre Portugal e Itlia n o s cul o XVII. V. I, Port o: Univ
ersidade d o Port o/Faculdade d e Letras/Departament o d e Cin c
ias e Tc ni cas d o Patrim ni o, 1999. 486p. p. 208. (Disserta o d
e Dout orament o e m Hist ria da Arte).
servem de base para quatro fragmentos de frontes curvos
terminados em volutas e quatro grandes anjos de corpo inteiro,
ajoe-lhados sobre os fragmentos seguram o bojo da coroa, pois sua
base assenta-se sobre o extremo dos fragmentos de frontes.
Fig. 8 - Gravura avulsa d o altar de Santa Maria, Trasp ontina,
Burg o Nov o, Roma - Itlia Carl o Fontana, 1674 - Propriedade d e
Luiz Freire.
O altar de Fontana foi divul-gado, provavelmente no sculo
dezoito, atravs de gravura avulsa com a inscrio MAGGIORE ALTARE
NELLA CHIESA DI SANTA MARIA TRANSPONTINA IN BORGO NUOVO Archit. Del
Cau.r
Carlo Fontana (P11d), que no sabemos ao certo sobre a poca de
sua produo, mas estimamos ser do sculo dezoito19.
19 Gravura avulsa d o altar de Santa Maria, Tras-p o ntina, Burg
o Nov o, Ro ma, Carl o Fontana. (pr opriedade d e Luiz Freire).
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7Fig. 9 - Altar da Cole giada de So Mi-guel Arcanj o, Luci g nan
o, Tos cana - It-
lia -Andrea Pozzo, 1702 e 1704.
Posteriormente ereo do al-tar de Traspontina, Andrea Pozzo
publicou no segundo volume do seu tratado Pers-pecttiva pictorum et
architectorum a fanta-sia da figura 75, que intitulou altare
ca-priccioso (Fig. 10), idealizado depois de saber que em uma
igreja principal de Ro-ma tinha que ser feito um altar-mr, que
variasse dos muitos outros20. Embora De Feo identifique o remate
desta proposta de altar como sendo uma coroa afiada, j no
exatamente uma coroa, mas um bulbo vazado feito de volutas em
esses, suportado por anjos de corpo inteiro, no de p, como no
exemplo de Fontana, mas deitados sobre os fragmentos de
frontes.
La corona sostenuta da angeli dellaltare capriccioso an-cora una
constante pozziana. Riap-pare in una delle proposte per laltare di
SantIgnazio, diventa grandiosa a Vienna nella Univer-sittskirche,
trova una compiuta es-
20 FEO, Vitt ori o De. op. c it. p. 118.
pressione nellaltare maggiore della collegiata di San Michele
Arcangelo a Lucignano.21
Fig. 10 - Altare capri c c i os o f igura 75 d o 2 v olu m e d o
tratad o d e Andrea Pozzo, 1693. Acerv o da Bibli ot e ca Pbli ca
do Port o, Portugal
A soluo deste altar-mor da Colegiada de So Miguel Arcanjo em
Lu-cignano, na Toscana, realizada entre 1702 e 1704 (Fig. 9),
aproxima-se muito da experi-ncia de Fontana em Traspontina,
ganhan-do em monumentalidade e diferenciando-se nos elementos de
suporte da coroa, consti-tudos de volutas encadeadas com anjos
meninos sentados sobre as volutas inferio-res, sustentando as
volutas superiores, o bordo da coroa, que tm a forma clssica da
coroa real fechada. Os fragmentos de fron-tes aparecem livres da
funo de suportar os anjos, enquadrando o frontispcio do
baldaquino.
Esta soluo plstica de Pozzo foi muitas vezes replicada; sendo
cpias na escala reduzida, o altar-mor de Santa Maria delle Grazie",
em Casteldelpiano" e o de So Joo Baptista, em Chianciano22.
21 FEO, Vitt ori o De. Op. cit. p. 119. 22 FEO, Vitt ori o De.
Op. cit. p. 121.
-
8O modelo foi sendo maturado pela via de Andrea Pozzo e Carlo
Fontana (Bruciato, prximo a Como, 1634 Roma, 1714)23, sendo este
ltimo o responsvel pela introduo da frmula em Portugal atravs do
catafalco que projetou para as pompas fnebres de D. Pedro II em
170724 (Fig. 11),erguido na igreja de Santo Antnio dos Portugueses
em Roma e divulgado em gra-vura. Neste catafalco Fontana repete o
arremate j utilizado no altar de Trasponti-na, uma expressiva coroa
com lambrequins e vieiras paira sobre a ea, sem colunas e repleta
de cortinas pendentes e recolhidas por anjos25.
23 New Advent. Partners with sin g le Cath oli cs Online. The
Cath oli c Ency c o p edia. Carl o Fontana disp onv el em .
Acessa-d o e m 03.12.2000.
24 LIMA, Maria Lusa Gon alves Reis. A ren ova- o est ti ca da
igreja d o Bo m Jesus d o m o nt e na p o ca c o nt e mp ornea.
Porto: Faculdade d e Letras da Univ ersidade d o Port o, 1996. 2v.,
v. 1, p. 96. (Poligrafia)
25 FREIRE, Luiz Albert o Ribeiro. Tradi o e m o d ernidade n os
retbul os-mor es das igrejas sot er op o litanas. In PORTUGAL, Co
misso Naci o nal para as Co m e m ora es d os Des c o-briment os
Portugueses. Portugal/Brasil-Brasil/Portugal: duas fac es d e u ma
realidade artsti ca. Lisb oa: Co misso Naci onal para as Co m e m
ora es d os Desc obrim e nt os Portugue-ses, 2000. 432 p. il. p.
326.
Fig. 11 - Catafalc o para as p om pas fnebres d e D. Pedr o II,
rei de Portugal, erguid o na igreja de Sant o Ant ni o d os
portugueses, Ro ma Carlo Fontana, 1707
A lio foi bem assimilada pelo arquiteto portugus Manuel
Rodrigues dos Santos no catafalco que ergueu na mesma igreja romana
para as pompas fnebres de D. Joo V (Fig. 12), tambm divulgado em
gravura Castrum Doloris erectum in Tem-plo S. Antonii Nationis
Lusitanicae in fune-re Joanni V. Regii fidelissimi Anno 1751,
Emmanuel Rodrigues de Santis Inv. Et De-lin, Ioseph Vasi
Corleonensis Sculp. Romae Sup. Perm 1751. Neste catafalco Manuel
dos Santos aprimorou a soluo anterior de Fontana por ter dado um
carter mais ar-quitetnico, incluindo embasamento com plintos,
colunas e entablamento com plintos sobre as cornijas, onde
assentam-se anjos com trombetas numa mo, segurando a outra, a base
da grande coroa real fechada com cortinas pendentes, encimada por
uma cruz latina sobre bola.
-
9Fig. 12 - Catafalc o para as p om pas fnebres de D. Joo V,
erguid o na Igreja de Sant o Ant ni o
d os p ortugu eses em Ro ma obra de Manuel Rodri gues d os Sant
os, 1751.
Estas relaes artsticas no se fazem por acaso, mas pelo fato de
ter o arquiteto Manuel Rodrigues dos Santos trabalhado na oficina
de Carlo Fontana na companhia de Filippo Juvarra, sendo este ltimo
amigo de Annes de S (Marqus de Fontes), embaixador portugus e
animador das relaes artsticas entre os dois pases26.Por outro lado,
Fontana estudou com Gia-lorenzo Bernini, um dos mais profcuos
arquitetos e escultores do barroco italiano e mundial27,
colaborando mais tarde com
26 QUIETO, Pier Paol o. Rela e s artsti c o-
c ulturais entre Lisb oa e Ro ma, in IPPAR. A pintura em
Portugal ao te mp o de D. Joo V. 1706-1750; Joanni V Magn fi c o,
1994, 457 p. il., p.65-66.
27 New Advent. Partners with sin g le Cath oli cs Online. The
Cath oli c Ency c o p edia. Gialorenz o
Carlo Rainaldi, Os caminhos e as influn-cias se encontram e se
bifurcam numa di-nmica expansionista.
Remonta a 1700 as relaes de Carlo Fontana com a comunidade
portu-guesa em Roma e sua igreja de Santo An-tnio, quando parece
ter realizado um se-pulcro de quinta-feira santa, para o ano santo
de 1700. Teresa do Vale chega mesmo a supor (baseando-se na prtica
romana do arquiteto contratado para a obra de uma igreja, continuar
responsvel por sua manu-teno, redecorao, restauro e ornamenta-es
efmeras), que o arquiteto trabalhou na reedificao da citada igreja
dos portu-gueses, recebendo de D. Pedro II o ttulo de cavaleiro da
ordem de Cristo e sendo con-tratado por D. Joo V. e pela comunidade
portuguesa de Roma para conceber o apara-to fnebre em honra de D.
Pedro II (Fig. 11), cujas solenidades culminaram no dia 13 de
Setembro de 170728.
Os catafalcos erguidos em hon-ra de D. Joo V, e no somente eles,
foram os responsveis pela divulgao da idia do remate no mundo
portugus e sem dvidas influenciaram os retbulos baldaquinos,
influncia j apontada por Maria Lusa Lima para o caso
bracarense29.
Dos catafalcos erigidos em por-tugal e suas colnias, restaram
alguns proje-tos, entre os quais um merece ateno pelo arremate de
coroa real fechada sobre volu-tas, trata-se daquele desenhado pelo
sobri-nho de Santos Pacheco para a S da cidade de So Paulo de
Luanda em 1751 (Fig. 13 e 14). Este carpinteiro de nome ainda
desco-nhecido, foi degredado para Angola durante o governo de D.
Antnio Soares Portugal, Conde do Lavradio, que dirigiu as
ex-quias30.
Bernini. Disp onv el e m . Acessa-d o e m 03.12.2000.
28 VALE, Teresa Leon or Magalhes d o. op. c it., 1999. p.
203.
29 LIMA, Maria Lusa Reis. op. c it., 1996. 2v., v. 1, p. 96.
30 SIMTH, Robert C. Os mausolus d e D. Joo V nas quatr o partes
d o mund o. Lisb oa: Faculda-d e d e Letras da Univ ersidade d e
Lisb oa, 1955. 38 p. il. p.22-24. Sant os Pach e c o entalh ou o
retbul o-m or da S d o Port o en c o m endad o e m 1726 e o d e So
Miguel da Alfama em 1728.
-
10
Fig. 13 - Catafalc o das p o m pas fnebres de D. Joo V, erguid o
na S da cidade De So Paul o d e Luanda, pr ojet o d o s obrinh o d
e Sant os Pach e c o.
Arquiv o Hist ri c o Ultramarin o - Lisb oa
No catafalco da S de Luanda uma pequena coroa real fechada sobre
seis volutas arrematam, juntamente com dois anjos sobre os
ressaltos fronteiros do enta-blamento, o baldaquino, que tm como
elementos de sustentao, oito colunas co-rntias de fustes lisos com
o tero inferior destacado com estrias helicoidais, sendo o seu
limite cingido por pontas de folhas. No centro do entablamento fica
a segunda co-roa real fechada de onde pendem cortinas delgadas,
sustentada por anjos esvoaantes, ficando a terceira coroa real
sobre almofada por cima da ea. O caractere desta soluo que mais diz
respeito ao modelo do altar do Senhor do Bonfim da Bahia so as
volutas que evoluem em curvas e contracurvas, em trs seces, alm das
oito colunas.
Fig. 14 - Planta baixa d o catafalc o da S de Luanda - Arquiv o
Hist ri c o
Ultramarin o - Lisb oa
A conformao do catafalco de Luanda deve muito ao desenho de
altar elaborado por G. M. Oppenord (Paris1672-1742)31 e publicado
atravs da gravura n-mero cinco, constante no seu livro DAutels et
Tombeaux32 (Fig. 15). Neste altar concebido para um ambiente
domsti-co palaciano, quatro colunas compsitas de fustes lisos
sustentam um entablamento arrematado por quatro volutas que
susten-tam uma pequena coroa real fechada que tem por baixo dois
querubins. As volutas deste baldaquino so sinuosas ou ondeadas,
podendo ter influenciado o formato das volutas do catafalco de
Luanda, que entre-
31 "...Un des plus c harmants d c orateurs du
XVIIIe si c l e. Il bn fi c ia d'un e p ensi o n et durant huit
ans alla travailleur Ro m e, o il subit l'influen c e d e Bernini
et d e Borr o mini. Il f ournit n otam ment les dessins p our le
matre-autel de Saint-Germain d es Prs et de Saint-Sulpi c e, mais
on estim e surt out ses m o d les de d c orati ons, d o nt un e
partie fut grave par Hecquier, Qui assura s on o euvre un e large
vul garisati on. ... (BNZIT, E. Dicti o nnaire critique et d o c um
e ntire d es pe-intres, sculpteurs, dessinateurs et graveurs d e t
ous les temps et de t ous les pays par un gr oup e d' crivains sp
cialistes franais et -trang ers. Paris: Libraire Grnd, 1966. 8 t.
il. T. 6 p. 434
32 Bibli ot e ca da Faculdade d e Belas Artes da Universidade d
o Port o. Livre Dautels et t o mb eaux inv. G. M. Oppenn ord e s
cul. Huquier. Grav. n 5, Cota: N-38.
-
11
tanto, tm formato mais expressivo e mo-vimentado.
Fig. 15 - Prop osta para altar do m sti c o, gra-vura n5, d o
Livr o d e altares e tmul os d e G. M. Oppen ord. Faculdade d e
Belas Artes
da UP Portugal.
O tema da coroa real fechada sobre volutas chegou cedo cidade da
Bahi-a, j na primeira metade do sculo dezoito, entre 1729 e 1748,
ele foi adotado nos dois altares do topo do transepto da Igreja
con-ventual de So Francisco, dedicados, o do lado do evangelho,
Nossa Senhora da Glria33 (Fig. 16) e o do lado da epstola, So Lus,
Rei de Frana, substitudo pelo Sagrado Corao de Jesus. Estas duas
m-quinas monumentais, embora no sejam baldaquinos, tm o seu remate
constitudo de quatro enormes volutas em C, em dois planos, com
quatro anjos de corpo inteiro sentados no extremo superior das
volutas, segurando os fronteiros uma proporcional coroa real
fechada com a pomba do Divino Esprito Santo por baixo.
33 Arquiv o d e Arte da Funda o Cal oustre Gul-b enquian. Fot o
grafia de Robert Chester Smith.
Fig. 16 - Retbul o d o t op o d o transept o da Ig. d o Conv ent
o d e So Francisc o Salvad or
Bahia. Talha de 1729-1748. O d o lad o d o evang elh o d ed icad
o a
N. Sra. da Ggl ria e o da epsto la a So Lus, Rei da Frana. Fot o
grafia Srgio Benutti.
Se o tema da coroa real fecha-da foi introduzido na primeira
metade do sculo dezoito na arte retablistica baiana, o formato de
baldaquino parece ser de mea-dos do sculo. O mais antigo que foi
pre-servado da avalanche reformadora da talha no sculo dezenove,
foi o retbulo-mor da Igreja do Convento das franciscanas capu-chas
de Nossa Senhora da Lapa, entalhado pelo mestre entalhador Antnio
Mendes da Silva em 175534 (Fig. 17). Nele vemos o baldaquino com o
excesso de colunas, neste caso dez, que caiu no gosto dos baianos a
ponto de permanecer em voga por todo o sculo dezenove.
34 ALVES, Marieta. Conv ent o da Lapa, Salvad or. Salvad or: Pre
f eitura d o Salvador, 1953. 26 p. il. p. 10. (Pequen o guia das
igrejas da Bahia).
-
12
Fig. 17 - Retbul o-m or da Igreja d o Conv ent o d e N. Sra. da
Con c ei o da Lapa Salvad or Bahia Talha de Ant ni o Mend es da
Silva, realizada em 1755. Fot o grafia Srgi o Benutti
Neste percurso formal a trans-formao da coroa em cpula d-se em
cerca de 179835, no projeto para o baldaqui-no do Santurio do Bom
Jesus de Braga, desenhado pelo arquiteto bracarense Carlos Amarante
(Fig. 7). A a transformao foi radical, pois a cpula projetada
distancia-se em demasia da coroa real fechada, pois tm formato de
tronco de cone fechado, orlada de lambrequins, encimado por uma
escultu-ra de um pelicano com os filhotes, e uma base levemente
ovalada, repousa sobre qua-tro volutas, que assentam-se sobre
quatro colunas. As volutas so em esses, sendo o enrolamento de
baixo, contnuo e o superi-or em faces retas, os anjos assentam-se
sobre o enrolamento inferior e portam as armas de Cristo (Fig.
19).
O retbulo do Bom Jesus de Braga teve o seu entalhamento iniciado
em 1802 pelo entalhador Manuel Jos Correia36,e concludo, depois de
acrscimos, por volta de 181337. No mesmo ano, o retbulo de Nosso
Senhor do Bonfim da Bahia comea-va a ser feito. Se o primeiro
serviu de mo-delo para o segundo, isso se deu apenas ao nvel do
princpio empregado no arremate, o de 'cpula sobre volutas', dos
capitis compsitos, da marcao do tero inferior 35 LIMA, Maria Lusa
Reis. op. c it., 1996, p. 93. 36 LIMA, Maria Lusa Reis. op. c it.,
1996, p. 112. 37 LIMA, Maria Lusa Reis. Op. c it. p. 118.
(embora o tipo de marcao das colunas do baldaquino do Senhor do
Bonfim seja bem diferente) e na disposio em diagonal dos plintos e
entablamentos fronteiros, no mais o baldaquino da Bahia
diferencia-se radi-calmente do de Braga.
Fig. 18 - Cpula vazada d o retbul o-m or d o Conv ent o d e N.
Sra. da Con c e i o da Lapa.
Fot o grafia Luiz Freire
Fig. 19 - Cpula d o retbul o-m or da Ig. d o Bo m Jesus d o Mont
e Braga Portugal.
Fig. 20 - Cpula da Igreja de N. Sr. d o Bon f im Salvad or
Bahia. Fot o grafia Luiz Freire
As principais diferenas entre o
baldaquino da Igreja do Nosso Senhor do Bonfim e o do Bom Jesus
de Braga (Fig. 19 e 20), apontam para a idia de ter sido o
pri-meiro, fruto de experimentao formal e
-
13
estilstica, marcando no ambiente baiano, a transformao da
simblica coroa real fe-chada em cpula oval vazada , pois ele traz
para o sculo dezenove a tradio dos bal-daquinos setecentistas
baianos superpovoa-dos de colunas dispostas em rotunda (Fig 21), no
seu caso, oito e demonstra um vacilo estilstico prprio de um
entalhador com formao ou informao flagrantemente barroca e
rococ.
Fig. 21 - Coluna d o baldaquino s et e c entista da Igreja d o
Conv e nt o da Lapa Salvad or Bahi-
a. talha de 1755. Fot o grafia Luiz Freire As volutas dos dois
baldaqui-
nos tambm diferem, embora sejam em esses, a volta inferior das
volutas do Bonfim so de faces sinuosas, enquanto as do Bom Jesus de
Braga so contnuas; a volta superi-or do Bonfim menor e contnua,
enquan-to a de Braga de faces retas. Do mesmo modo a forma do esse
diferencia-se, no Bonfim as volutas so em esses propriamen-te dito,
ou seja, com enrolamentos contr-rios, enquanto as do Bom Jesus de
Braga, os enrolamentos esto no mesmo sentido, para dentro. No
Bonfim o corpo do esse faz uma ponta no centro, que acentuada por
um acanto, enquanto no Bom Jesus ele cont-nuo.
Finalmente, na cpula vazada
constituda de aros que convergem para o centro encimado por uma
glria de nuvens e querubins que sustenta uma cruz latina, que
percebemos o quo ligada forma da antiga coroa esta soluo est. como
se esta frmula ficasse no meio do caminho entre a soluo barroca de
coroa real sobre volutas e a soluo mais contida, neoclssi-ca, da
cpula em tronco de cone fechado do baldaquino do Bom Jesus de
Braga.
Contudo no est descartada a hiptese de uma influncia direta do
balda-
quino bracarense, no baldaquino baiano, influncia que seria
aclarada se consegus-semos encontrar documentos que provassem a
ligao do entalhador do altar baiano fbrica do Bom Jesus do Monte38,
ou not-cias sobre o trfico de riscos. Se esta influ-ncia existiu, o
modelo de Braga foi radi-calmente modificado no retbulo de N. Sr.
do Bonfim. H tambm uma hiptese de que o baldaquino do Senhor do
Bonfim da Bahia tenha derivado do baldaquino anteri-or realizado em
meados do sculo dezoito, pois o seu construtor deixou um exemplar
na Igreja do Convento da Lapa, em que demonstra ser conhecedor de
um tipo de baldaquino bastante evoludo (Fig. 17, 18 e 21). Contudo,
esta hiptese no pode ser comprovada, j que no temos registro,
narrado ou desenhado, do retbulo setecen-tista deste santurio.
As razes simblicas para o ar-remate dos altares em coroa real
fechada encontra base nos textos sagrados que do significado Cristo
e sua me. Os signifi-cados gerais da coroa j nos indicam as relaes
cristolgicas, pois ela
sinal de glria, honra e alegria. Mencionam-se em particular
coroas de homenagem, coroas de vitrias, coroas de noivas, coroas de
lou-vor[...], coroas do templo (como de-corao arquitectnica) e ...
coroas de flores dos gozadores da vida. No
38 No s cul o XIX foi editad o um "souv enir" d o
Santurio d o Bo m Jesus d o Mo nt e, Braga, Por-tugal c o m
muitas ilustra es, entre elas, uma d o retbul o-m or. Tal publi cao
n o t e m data, mas a que adquirim os n o al farrabista, p ossui u
ma dedi cat ria datada de 29 d e Junh o d e 1891. De qualquer
maneira, esta publi cao n o p o d e t er ante c e did o bn o d o n
ov o templ o, o retbul o s f oi c o n c lud o e m 1813, n est e mes
m o an o o da Igreja de N. Sr. d o Bon-fim c o m e ava a ser f eit
o. No n os pare c e que esta publi ca o t enha in f or mad o o m od
el o d o N. Sr. d o Bon f im, se h ouv e in flun c ia, ela s p o d
e t er o c orrid o atravs de risc os ou da mi-grao d e algu m
entalhad or bracarense ou que trabalh ou na fbri ca d o Bo m Jesus
d o Mont e. ( Rec orda o d o Real Sanctuari o d o Bo m Jesus d o
Mont e Braga - livret o c o m 18 imagens a-c o m panhadas de l e g
endas que identi fi cam o l o cal - pr opriedade d e Luiz
Freire).
-
14
Novo Testamento, compara-se a luta da f com os jogos
olmpicos39.
A vida e morte de Cristo nos ensina o seu sacrifcio para a
salvao da humanidade, sua ressurreio o triunfo sobre a morte e o
pecado; a glria, assim como o para os eleitos que herdaro o reino
celeste. A missa um sacrifcio onde o ato sacrifical de Jesus
recordado. O pr-prio retbulo-mor sintetiza e materializa esta idia,
pois a mesa representa o tmulo e o Santssimo Sacramento entronizado
o Cristo triunfante sobre a morte e o pecado. Para completar a
simbologia do altar, o baldaqui-no confere destaque, nobreza e
sacralidade ao conjunto e imagens guardadas e expostas.
A apario da coroa nos cata-falcos tambm no por acaso, pois
apare-cem... com muita freqencia coroas da vit-ria em lajes
sepulcrais, sarcfagos...40, iden-tificando-se tambm na linguagem
bblica [...] e no horizonte da arte crist primitiva e medieval
[...] com a simbologia da coro-a/ornamento rgio41.
O ltimo significado fica mais esclarecido se pensarmos que do
sculo dezesseis ao sculo dezenove prevaleceu o regalismo portugus
em que Igreja e Estado estavam muito prximos, juntos na ao de
propagar a f e explorar as riquezas das terras conquistadas. A
coroa o nico smbolo da unio destes dois poderes e no a toa que na
Bahia do sculo dezoito, a coroa real fechada aparece nos arremates
de arco cruzeiro coroando escudos com armas da coroa portuguesa e
da ordem franciscana, ou ainda as armas de Cristo, ou somente as
armas reais, passando no sculo XIX, s armas imperiais do
Brasil.
A coroa real como arremate de arco cruzeiro chega ao sculo
dezenove, onde num s arremate entalhado, o do arco cruzeiro da
Igreja de Nossa Senhora da Conceio do Boqueiro, a coroa encima uma
composio simblica que alude Cristo e sua me (Fig. 22).
H uma segunda explicao que elucida o sentido da coroa como
realeza terrena e realeza divina, ela um
adorno que faz parecer mais alta a ca-bea daquele que a usa e o
eleva de ma-
39 Heinz-Mohr, Gerd. Dici o nrio d os smb ol os...,
1994. 393 p. il. p. 111-112. (Dic i o nri os EP). 40 Ide m.
Ibide m. p. 112. 41 Ide m. p. 112.
neira ornamental acima dos outros, legi-timando sua supremacia e
sua relao com um mundo superior [...] A estrutu-ra circular assume
o contedo simblico do crculo infinito, pedras preciosas acrescem de
uma expresso simblica especial a qualidade do objeto. As
ex-tremidades em forma de raios lembram os raios do Sol, e em geral
os soberanos coroados so considerados representan-tes de uma
concepo patriarcal-solar. Por esse motivo, as coroas do rei so
confeccionadas no metal solar, em ou-ro42.
O mesmo Hans Biedermann com-plementa Na iconografia crist, a
coroa no indica apenas a Maiestas Domini, mas tambm o mais eleva-do
grau atingvel da existncia, como na coroao de Maria [...] ou na
re-presentao dos mrtires43.
Para Jean Chevalier e Alain Gheer-brant
O simbolismo da coroa fica a depen-
der de trs fatores principais. Sua colo-cao no alto da cabea lhe
confere um significado supereminente: ela participa no s dos
valores da cabea, cimo do corpo humano, mas dos valores do que
sobrepuja a prpria cabea, um dom vindo de cima; ela assinala o
carter transcendente de uma realizao qual-quer bem-sucedida. Sua
forma circular indica a perfeio e a participao da natureza celeste,
de que o crculo o smbolo. Ela une, na pessoa do coroa-do, o que est
abaixo dele e o que est acima, mas fixando os limites que, em tudo
que no ele, separam o terrestre do celestial, o humano do
divino44.
Resta-nos agora entendermos a coroa na simbologia mariana, na
qual o seu sentido est ligado paixo de Jesus, pois o
42 BIEDERMANN, Hans. Dici o nri o ilustrad o
d e smb ol os. Trad. Glria Pasc h oal de Camar-g o. So Paul o:
Co mpanhia Melh orament os, 1993. 481 p. il. p. 109.
43 Ide m. Ibide m. p. 109. 44 CHEVALIER, Jean et Gheerbrant,
Alain. Di-
c i o nri o d e smb ol os: (mit os, so nh os, c ostu-m es, gest
os, f ormas, fi guras, c o res, n mer os). Co ord. Carl os
Sussekind; trad. Vera da Costa e Silva ... [et al]. 6 ed. Rio d e
Jan eir o: Jos Oly mpi o, 1992. 996 p. il. p. 289.
-
15
padecimento do filho fez tambm sofrer a sua me, por isso
transformada na Rainha dos Mrtires, conforme nos explica
Croiset:
Santa Virgem padeceo interiormente durante o curso da Paixo de
J. C., que elles chamo a paixo, e o martrio da Santa Virgem, d
muito bem a conhecer a venerao, e a devoo singular que os Fieis
tivero em todos os tempos para com as amarguras desta divina Mi
af-flicta, as quaes lhe fizero dar pela Igreja o glorioso titulo de
Rainha dos Mart-yres: Regina Martyrum. ... Tendo-a o Padre Eterno
escolhido para Mi de seu Filho, tinha-lhe dado sobre aquelle Filho
todos os direitos que pde ter sobre seu filho huma mi. Foi preciso
pois que el-la consentisse na sua morte, e no seu sa-crificio, pela
salvao dos homens; este he o sacrificio que ella fez deste caro
Fi-lho quando foi ella mesma offerec-lo no Templo, onde o Profeta
Simeo lhe predisse que a paixo do Filho seria ao mesmo tempo a
paixo da Mi. Ecce positus est in signum cui contradicetur: 45
A Virgem Maria tambm ven-ceu o pecado, tambm ela triunfou sobre
a morte ressurgindo em glria.
Fig. 22 - Arremate simb li c o d o arc o c ruzeir o da Igreja de
N. Sra. da Con c ei o d o Boqueiro, Salvad or Bahia.
45 CROISET, Pe. Anno Christo , ou Exerci c i os d e piedade para
t od os os d o min g os, e f estas m udaveis d o ann o; c o nt end
o o que h de mais instructiv o, e mais interessante nest es dias, c
o m re fl exes s obre a epist ola, hu ma medita- o s obre o evang
elh o da missa, e algu mas pra-ti cas de piedade pr oprias para t
oda a qualidade d e p ess oas. Trad p ortuguesa. Lisb oa: Typ o
gra-phia Rollandiana, 1849, T 3. p. 88-89
O arremate simblico do arco cruzei-ro da Ig, da Conceio do
Boqueiro (Fig. 22)Nesta alegoria que era encimada por uma coroa,
hoje desaparecida, fica claro a posi-o de Maria como Rainha dos
Mrtires, pois o pssaro com dois papos e duas cabe-as representa, o
que est bicando o papo o pelicano que simboliza o sacrifcio de
Cris-to para a salvao da humanidade e o pes-coo levantado sobre uma
flor, outrora coroado, representa N. Sra. que alcanara a glria
vencendo o pecado e sofrendo as dores do sacrifcio do seu
filho.
Aps esta abordagem do con-tedo simblico da coroa na cultura
crist catlica, analisaremos outras vertentes de influncias quanto
aos arremates de retbu-los desenvolvidos na Europa e no Brasil.
Na Bahia do sculo dezoito tambm verificamos a propagao de um
arremate que, como bem observou Germain Bazin, constituiu-se num
verdadeiro em-blema da talha baiana deste sculo, o dossel bulboso
em gomos ou no, apelidado pelo referido historiador como sendo
'dossel piriforme'46 e que pode, pelo menos no sentido simblico,
advir da coroa, embora as origens dele, tambm sejam encontradas em
outras solues italianas independentes.
Das invenes italianas onde o bulbo aparece, que foram propagadas
desta-camos a do tratado de Andrea Pozzo, o j referido 'altar
caprichoso' (P11f), e ainda, bem anterior a de Pozzo, a gravura
avulsa n 647, em que apresenta trs propostas para aparatos de
exposio do Santssimo Sacra-mento, desenhados por Philippus
Passarinus (Roma, 1638-1698)48 (Fig. 23), onde encon-tramos tambm
um antecedente da cpula vazada do baldaquino do Bonfim, e no s, em
vrias propostas de aparatos deste artis-ta, divulgadas por gravuras
avulsas de n 2 e 449 (Fig. 27), encontramos cpulas vazadas em aros
avolutados.
Embora a inveno de Passari-nus seja a mais antiga que podemos
apurar,
46 BAZIN, Germain. A Arquitetura religi osa
Barro ca n o Brasil, estud o hist ri c o e m or f ol -gi c o. Ri
o d e Janeir o: Rec ord, 1956. v. I p. 304.
47 BFBA-UP. Cole o d e gravuras avulsas de Philippus
Passarinus.
48 BNZIT, E. op. c it., 1966. 8 t. il. t. 6, p. 539. 49 Bibli ot
e ca da Faculdade d e Belas Artes da
Universidade d o Port o-BFBA-UP. Cole o d e gravuras avulsas de
Philippus Passarinus
-
16
pois certamente foi concebida no sculo dezessete, momento do
pice da esttica barroca na Europa. Bulbos desta espcie encontram-se
ainda na gravura avulsa n 36 (Fig. 24 e 25), que apresenta um
cenrio de jardim com trs baldaquinos (coretos) de cpula bulbosa,
inventada e desenhada por Joseph Galli Bibiena e esculpida por J.
A. Pfeffel50.
Fig. 23 - Gravura n 6 Trs p rop ostas para aparatos d e exposi o
d o Santssim o Sacrament o
d e Phillippus Passarinus in. Sc.
Fig. 24 - Gravura de c enri o t eatral jardim c o m trs
baldaquin os inv entad o p or Joseph
Galli Bibiena e es culpid o p or J. A. Pfe f f el. Faculdade d e
Belas Artes UP- Portugal.
50 Bibli ot e ca da Faculdade d e Belas Artes da Universidade d
o Port o-BFBA-UP. Cole o d e gravuras avulsas de J oseph Galli
Bibiena.
Fig. 25 - Detalhe d o baldaquino da Gravura anteri or.
Fig. 27 Gravura n 4 de Phillippus Passari-nus c o m duas pr op
ostas, expo stas em c ort e, para altares c o m arremates vazados.
Faculda-d e d e Belas Artes UP Portugal.
No s as gravuras como o tra-
tado de J. G. Bibiena foram amplamente difundidos em Portugal
graas a atividade de um dos membros desta famlia de cen-grafos e
arquitetos teatrais, o primo de Giu-
Fig. 26 Deta-lhe da Fig. 23
-
17
seppe, Giovanni Carlo Sicino Bibiena51 que trabalhou para D. Jos
I, desde cerca de 1751 ou 1752 at a morte em 176052. Oprprio
Giovanni utiliza o bulbo para ar-rematar o coreto de um cenrio para
a pe-ra 'Alessandro nell India', que fora gravado em 1754 por Ioan
Berardi (Fig. 28) para ilustrar o libreto de 1755 da mencionada
pera, encenada em Lisboa53.
Considerando a fama que esta famlia de numerosos artistas gozava
na Europa, quase certo que as coletneas de gravuras e tambm as
gravuras avulsas de seu trabalho tenham chegado a Portugal e Bahia
antes da transferncia de Giovanni para Lisboa. Mas no temos dvidas
que a vinda deste Bibiena para a Corte Portuguesa tenha infludo
muito para a maior divulga-o das gravuras de seus ilustres
familiares no mundo portugus.
Fig. 28 - Cenri o da p era Alessandr o nell ndia, Giovanni
Bibiena de Ioan Berardi, 1754.
Estas tradies convergem para a plstica adotada no retbulo do
Senhor do Bonfim, do qual ressaltamos a sua cpula acentuadamente
oval, aberta e constituda de aros em volutas, conformao, que
en-contra antecedentes na cpula pintada por Andrea Pozzo para o
altar-mor em afresco 51 BIBIENA, Giuseppe Galli. Arc hit etture,
e
Prosp ettiv e d edi cate alla maest di Carlo Sest o Imperad or d
e Ro mani da Giuseppe Galli Bibi-ena, su o prim o ing e gn er t
eatrale, ed. Architet-t o, inv ent or e d elle med esime. Parisiis
apud Ba-san. 50 p. il.
52 PEREIRA, Jos Fernandes (Dir.) e Pereira, Paulo. (Co ord.).
Dici o nri o da arte barr o ca em Portugal 1989. p. 86.-88.
53 Bibli ot e ca Naci onal de Lisb oa. Cenri o da p era
Alessandr o nell India. In Libret o d e Pietr o Metastasi o. Lisb
oa: 1755. Inv. MM 7052
da igreja Jesuta de Frascatio realizado entre 1699 e 1701 e
publicado na figura 69 do seu tratado54.
Se verificamos uma relao es-treita entre as solues do Bonfim e a
de Pozzo, encontramos tambm outras experi-ncias do prprio Pozzo que
se inclui na cadeia formal desta cpula vazada, trata-se do remate
de volutas em C, duplas e enca-deadas, dispostas em sentido
contrrio, que conclui o altar-mor da casa professa de Vie-na Kirche
am Hof edificado por Pozzo em 1709, ano da sua morte, reproduzido
em desenho de S. Kleiner55 (Fig. 30).
Fig. 29 - Retbul o-m or afres cad o p or Andra Pozzo, na Igreja
jesuti ca de Frascati o.
54 Feo, Vitt ori o De. op. c it., p. 141-142. 55 Ide m, ibid e
m, p. 211-212.
-
18
Fig. 30 - altar-m or da casa pr o f essa de Vi-ena Kirch e am
Hof edi fi cado p or Poz-zo em 1709
Pozzo por sua vez deve ter co-
nhecido a gravura de aparato para as qua-renta
horas concebido por G. Amato em 168556 (Fig. 32).
56 Publi cad o p or MARTINS, Faust o Sanc h es. Tron o Eucarsti
c o d o retbul o barr o c o p ortu-gus: orig e m, fun o, f or ma e
simb o lism o. In Reit oria da Universidade d o Port o. "I Con
gres-so internaci o nal d o Barro c o, Actas", Port o, 1991, II v
olu m e, p. 37.
(P13j), pois as mesmas volutas duplas em C encadeadas, dispostas
em contrrio, aparecem. Embora estas experi-ncias estejam mais
distantes da cpula vazada do Bonfim, h sem dvidas influn-cias, que
percebemos inclusive, nos ornatos em folhas de acantos das volutas
presentes no aparato de G. Amato.
Fig. 32 - Aparato para as quarenta h oras G. Amato.
Pensamos que o gosto pelas es-truturas vazadas j se manifesta no
ambiente artstico baiano de meados para o final do setecentos,
basta lembrarmos da cpula vazada do retbulo-mor da igreja do
Con-vento de Nossa Senhora da Lapa (Fig. 18),assim como o arremate
vazado do retbulo-mor dos Terceiros de Nossa Senhora do Carmo
entalhado por Jos Nunes de Santa-na de 1801-180357 (Fig. 33 e 34).
Suspeitamos, entretanto que a cpula do retbulo de N. Sra. da
Conceio da Lapa foi introduzida no sculo dezenove, visto a oval
irregular, um
57 Ott, Carl os. Atividade artsti c a da Orde m 3 d o Carm o da
Cidade d o Salvad or e d e Cach o-eira. Salvad or: Secretaria da
cul tura e turism o, Fundao Cultural, EGBA, 1998. 252 p. il. p.
224. (Cole o Sel o Edit orial Letras da Bahia, 25).
Fig. 31 - Figura 69 d o 2 Volu-m e d o Tratad o d e Andra
Poz-zo.
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19
Fig. 33 - Cpula d o retbul o-m or da Ig. da Orde m 3 d o Carm o
Salvador Bahia.
Fig. 34 - Retbul o-m or da Ig. da Orde m 3 d e N. Sra. d o Carm
o Salvador Bahia
Talha de Jos Nunes de Santana, executada entre 1801 e 1803 Fot o
grafia
Luiz Freire tanto torta do seu aro e da limpeza orna-mental de
seus filamentos, mas esta suspeita no se confirma documentalmente.
De qualquer maneira devemos nos acautelarmos em relao a poca da
introduo dos arre-mates vazados nos retbulos baianos, mes-mo por
que a introduo de uma cpula no retbulo da Ig. de N. Sra. da Conceio
da Lapa demandava uma interveno radical que pensamos difcil de
execuo, mais va-lendo a substituio inteira do retbulo.
O certo que o entalhador do altar do Nosso Senhor do Bonfim
(Fig. 37) fez desta obra um laboratrio de experimen-tao formal,
onde influncias internas e externas se fazem notar. Ainda nas
contri-buies externas, notamos a grande seme-lhana entre o motivo
que orna os plintos onde esto assentadas as figuras de dois dos
evangelistas, So Joo e So Marcos, no plano lateral de fundo do
retbulo e as con-solas que aparecem no primeiro plano da gravura de
teatro sacro de de G. G. Bibiena
que traz uma cartela com a seguinte inscri-o bblica Susce perunt
autem Jesum et adduxerunt Joa Cap 19 v. 1658 (Fig. 35 e 36)..
Os feixes de plumas ou palmas so presos por duas fitas em 'X'
que cingem o centro de cada feixe, havendo uma grande semelhana
entre os motivos entalhados nos plintos da Igreja do Nosso Senhor
do Bon-fim e os que aparecem na gravura de Bibie-na, e vm comprovar
a multiplicidade de influncias que concorreram para a orna-mentao
desta Igreja.
Das influncias internas ainda podemos observar a frmula de
baldaquino com dez, oito colunas dispostas em rotun-da, que
diferencia-se dos baldaquinos berni-nianos que apenas possuam
quatro colunas dispostas em quadrado. Em Portugal so-mente o
retbulo-mor da Catedral da S do Porto, projetado por Santos
Pacheco, possui seis colunas e quatro meias-colunas, com disposio
diversa da tradio baiana.
58 Faculdade d e Belas Artes da Universidade d o Port o. Cole c
o d e gravuras avulsas de c enri os teatrais inv entadas e
desenhadas p or G. G. Bi-biena e es culpidas p or J. A. Pfe f f
el.
Fig. 35 e 36 - Solues seme-lhantes entre gravura de G. G.
Bibiena e msula fitomor-fa do pilar late-ral do retbulo do N. Sr.
do Bonfim.
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20
Fig. 37 - Retbul o-m or da Igreja de N. Sr. Bo m Jesus d o Bon f
im Salvad or Bahia Fot o grafia de Srgi o Benutti
Os baldaquinos superpovoados de colunas com cpula vazada devem
ter sido abundantes na Bahia do sculo dezoito, pois o entalhador
responsvel pelo nico exemplar que restou, Antnio Mendes da Silva59,
foi muito operoso e fez alguns ret-bulos-mores para as igrejas de
Salvador, entre eles, o primeiro retbulo da Igreja de Nosso Senhor
Bom Jesus do Bonfim ergui-do em 1752 e o da igreja dos terceiros
do-minicanos60, retbulos estes, que a reforma neoclssica fez
desaparecer.
Antnio Mendes da Silva (? 20.08.1763) era familiar do Santo
Ofcio, mestre entalhador e morador na cidade da Bahia61. Comea a
aparecer em documen-tos a partir de 1735, quando revestiu de talha
o zimbrio e as paredes da capela-mor, do arco cruzeiro para dentro,
da Igreja da Santa Casa de Misericrdia da Bahia, fazen-do ainda
duas credncias para a mesma capela62; entre 1745 e 1748 fez o
retbulo e toda a talha da capela-mor da Igreja de So Domingos de
Gusmo, em 176263. Um ano antes da sua morte, fez um retbulo para a
capela do Sr. Bom Jesus da Saubara, no recncavo baiano e
propriedade da Irman-
59 ALVES, Marieta. Dici o nri o d e artistas e art-
fi c es na Bahia., 1976. 210 p. p. 167. 60 Ide m, ibid e m. p.
167. 61 Ide m. p. 167. 62 Ide m, ibid e m. 63 Ide m., Ibide m.
dade da St. Casa de Misericrdia da Cidade do Salvador64.
H, portanto, uma grande pos-sibilidade de ter sido um baldaquino
de muitas colunas, o primeiro retbulo da Igreja de Nosso Senhor do
Bonfim, hiptese j levantada por Carlos Ott65, pois foi enta-lhado
pelo mesmo Mendes da Silva em 175266, podendo a frmula deste
retbulo barroco, que desconhecemos a plstica, ter influenciado no
modelo plasmado no incio do sculo dezenove.
O baldaquino oitocentista da Igreja do Bonfim (Fig. 37)
impressionou tanto os entalhadores e mesrios das Irman-dades e
Ordens Terceiras de Salvador que a frmula foi repetida pelo
entalhador Joa-quim Francisco de Matos Roseira no altar-mor da
Igreja do Santssimo Sacramento e N. Sra. do Pilar iniciado em 1829
e conclu-do em 183367 (Fig. 38).
Fig. 38 - Retbul o-m or da Igreja de N. Sra. d o Pilar Fot o
grafia Luiz Freire
Na verso do Pilar, algumas
modificaes aprimoraram a linguagem neoclssica do prottipo, a
proporo das
64 OTT, Carlos. Hist ria das Artes Plsti cas na
Bahia ( 1550-1900 )., 1992. v. II Escultura. p. 13.
65 OTT, Carlos. Evolu o das artes plsti cas nas igrejas d o Bon
fim, Boqueiro e Sade. p. 33. 66 ALVES, Marieta. op. c it. p. 167.
67 RUY, Afons o. op. c it. 1951, p. 8.
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partes se equilibram produzindo um todo harmnico; o embasamento
ganha mais uma ordem de plintos, as colunas em n-mero de oito tm os
fustes canelados e rece-bem marcao sutil no tero inferior,
cons-tituda de anel no limite superior e fio de prolas, no interior
de caneluras que se intercalam entre lisas e ornadas, o
entabla-mento despe-se do excesso de ornatos do Bonfim, a cpula
passa a forma circular, as esculturas alegricas da F e da Razo so
postas ao nvel da segunda ordem de plintos ficando mais visveis, e
a estrutura arquite-tnica se aclara com a perfeita dosagem entre
dourados e branco. Este exemplar , de toda a srie, o de elaborao
mais cuida-dosa.
Este entalhador ainda res-ponsvel pela segunda verso datada do
modelo, o retbulo-mor da Ig. do SS. Sa-cramento da Rua do Passo,
iniciado em 1848 e concludo em 185068 (Fig. 39). A, a simplificao
que o conduziu na experincia anterior ficou mais aguada e muito
menos monumental, as duas ordens de plintos receberam ornatos de
fio de louros decres-centes enquadrados em molduras retangula-res,
os fustes canelados tem o tero inferior apenas marcado por um anel
de moldura, o trono ganha perfis retos contrapondo-se aos curvos do
Pilar, a cpula vazada circular diminui de tamanho, e as volutas
ficam mais achatadas, desaparecem as figuras ale-gricas e o nicho
(j que neste caso o orago nico o Santssimo Sacramento que ocupa o
trono), o nmero de colunas permanece e sobre as impostas que
ladeiam as volutas dianteiras, dois vasos como no do Pilar.
A sobriedade estrutural e or-namental aumenta com o cromatismo
que reserva os dourados para as partes sensveis da arquitetura e o
branco para os fundos planos e/ou reentrantes. O douramento neste
caso no s impe um ritmo na viso das partes nos seus limites, como
revela pormenores que ficariam imperceptveis distncia; a mesa do
altar mantm a forma trapezoidal com ornatos mais simples.
Temos neste exemplo uma ten-dncia que vai predominar nos demais
e-xemplares filiados ao modelo: a diminuio e arredondamento da
cpula numa reapro-ximao do arqutipo da coroa.
68 ALVES, Marieta. op. c it.1974, p. 129.
Fig. 39 - Retbul o-m or da Ig. do Santssim o Sacrament o da Rua
d o Passo. Fot o grafia de Herald o Alvim
O vigor desta famlia no aca-ba nestes exemplos, ele constatado
em vrios outros que no puderam ser datados ou que possuem datao
atribuda, e so igualmente desconhecidos os seus autores. So
eles:
O retbulo-mor da Igreja do Convento de N. Sra. da Palma datado
por Maria Jos de Freitas como sendo de 180369 (Fig. 40).
Esta verso demonstra uma lin-guagem depurada na evoluo
neoclssica deste modelo, o que nos faz duvidar desta datao. Como no
retbulo do Bonfim a base constituda de uma ordem de pilares
retangulares, com unidades ornamentais simples emolduradas por
filetes tambm retangulares, a mesa do altar mantm a forma
trapezoidal e exibe ornato de rosas centradas em ramicelos e
folhas.
69 FREITAS, Maria Jos Rabel o. o p. c it., 1964, p.
16. No c o n f iam os nesta datao, p o is a aut ora n o
ap onta os marc os cr o n o l g i c o s, ne m os d o c u-m e nt
os que basearam esta afirma o. Caso ve-nha a ser c o n f irmada a
re f erida data, a cadeia ev olutiva d o m od el o altera-se radi
calment e, p o is este exemplar passa a ser o primeir o da srie,
assumind o o lugar d o altar-m or da Igreja d e N. Sr. d o Bon f
im.
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As oito colunas distribuem-se quatro de cada lado, em trs planos
diferen-tes,
Fig. 40 - Retbul o-m or da Ig. do Conv ent o da Palma. Fot o
grafia de Srgi o Benutti
os fustes canelados possuem o tero inferior marcado por um anel
de moldura, os capi-tis continuam compsitos o entablamento simples
com friso canelado e cornijamento sem ornatos, a cpula vazada
arredondada sustenta-se em seis volutas, mantm os fes-tes entre as
volutas e as bordas da cpula e apresenta um elemento decorativo
novo, pequenos tringulos rendados entre os aros; nas impostas dos
extremos fronteiros, figu-ras alegricas da 'f catlica' e a
'esperana' no lugar dos vasos dos exemplares anterio-res. Os perfis
dos degraus do trono so retilneos com modilhes nos vrtices.
Uma inovao se introduz e que pode ter sido posterior fatura do
ret-bulo, duas msulas so colocadas na altura do limite do tero
inferior para suportarem as imagens de dois santos bispos. sem
dvidas o exemplar desta famlia que me-lhor soluciona a colocao das
esculturas alegricas.
No que concerne a apresenta-o das alegorias esta, vai atingir o
seu mai-or grau de amadurecimento no exemplar da Capela do Asilo D.
Pedro II (Fig. 41), sem autor ainda conhecido e provavelmente
edificado em cerca de 1887, ano da inaugu-rao do Asilo. Nesse
retbulo o programa iconogrfico das virtudes teologais est
completo e disposto na parte principal do retbulo em propores
harmnicas e enf-ticas. Dessa maneira a Caridade se apresenta no
cimo da cpula vazada, a F Catlica direita do retbulo e a Esperana
esquerda do retbulo.
Fig. 41 - Retbul o-m or da cape la d o Asil o D. Pedr o II. Fot
o grafia de Srgi o Benutti
O retbulo mor da Igreja da Irmandade de N. Sr. dos Aflitos e Boa
Sen-tena (Fig. 42) similar ao da Igreja do Smo. Sacramento da Rua
do Passo. Igual nmero de plintos, com diferentes ornatos, mesa do
mesmo formato, igual nmero de colunas, mesma marcao do tero
inferior, remate semelhante com diferenas nas volutas que so mais
delgadas e no formato dos vasos, o trono possui degraus
retangulares e so ornados por finos festes.
O ltimo retbulo-mor que na capital se inscreve nesta tradio e
que po-demos datar com alguma segurana a partir da fotografia de
uma placa de mrmore fixada no arco cruzeiro onde consta: Foi
concluda a reedificao desta capella mr [...] anno de 1870 [...] o
do altar da antiga S (Fig. 43) e que se assemelha com os da
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23
Rua do Passo e dos Aflitos, com pequenas alteraes.
Fig. 43 - Retbul o-m or da antiga S de Salvad or.
Ainda temos um altar lateral
da Igreja de S. Sebastio do Mosteiro de So Bento, tratado como
se fosse altar mor, o
altar de N. Sra. das Angstias (Fig. 44), que pode ser lavra da
dcada de setenta do scu-lo dezenove, tendo em vista a data de 1877
marcada em cartelas de dois altares vizi-nhos, de Sta. Luzia e Sto.
Antnio e de So Caetano e S. Brs.
O derradeiro caso, trata-se do pequeno altar da capela que ocupa
o ltimo andar do Instituto Feminino na Bahia (Fig. 45), um exemplar
nico de adaptao do modelo as propores quase de um nicho. Neste
retabulinho70, so quatro as colunas, quatro as volutas achatadas; a
pequena c-pula rematada por uma cruz, fica mais pa-recida com a
antiga coroa e no lugar do trono, um grande nicho envidraado
eleva-se at a altura das cornijas, os plintos desa-parecem e no seu
lugar apenas a mesa de altar trapezoidal.
Fig. 44 - Altar de N. Sra. das Angstias Ig. de So Sebastio d o
Mosteir o d e So Bent o Salvad or Ba. Fot o grafia de Srgi o
Benutti
Como inteno de repetir o
modelo temos a 'maquete'71 (Fig. 46) da or- 70 Este era o t erm
o que, na Bahia d o s c ul o XIX,
se e mpre gava para designar pequen os retbu-l os.
71 Esta miniatura da casa d os sant os est exposta p ermanente m
ente na exposi o que os ter c ei-r os fran cis can os d e Salvad or
mant m n o pa-viment o superi or, c orred or d o lad o d o evang
e-lh o, lateral as tribunas da cape la-mor. Quant o as ini c iais
"J.P.F." c o nstante ne sta 'maquete', p ensam os ser a d o aut or
da 'maquete', o enta-lhad or que se resp onsabilizou p ela talha
da
Fig. 42 - Retbulo-mor da Igreja dos Aflitos. Fotografia Srgio
Benutti
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namentao da Casa dos Santos da Ordem Terceira de So Francisco
feita por "J. P. F.", iniciais ainda no identficadas, onde o
altar-mor, de Nossa Senhora das Dores reproduz em pequenas dimenses
a soluo da cpula vazada sobre volutas, o que ficou na minia-tura,
pois o entalhador que foi contratado em 11 de Junho de 1845 para a
obra, Joa-quim Francisco de Matos Roseira72 alterou o projeto.
Fig. 45 - Altar d o p ensi o nat o S. Jos d o Institut o Feminin
o da Bahia. Fot o grafia Srgi o Benutti
Casa d os Sant os, cuj o n o m e d e v eria ser J oa-quim
Pereira Francisc o d e Matos (Roseira), c o n f or m e o cruzament
o d e dad os das obras de Manuel Querin o, Marieta Alves e d o c u
m ent os da Orde m Terc eira de So Fran c is c o.
72 ALVES, Marieta. op. c it., 1948, p. 105.
Fig. 46 - Maquete da Casa d os Santos da Igreja da Orde m 3 de
So Francisc o Fot o grafia Luiz Freire
importante assinalar que esta linhagem de retbulos se
popularizou dimenso do culto do Senhor do Bonfim, o que gerou pea
importante para a difuso do modelo, um cone do seu altar
litografa-do na Bahia, datado de 186073 (Fig. 47), ven-dido ou
doado pela irmandade aos que acorriam ao santurio.
73 O ni c o exemplar desta lit o grafia feita na Bahia ainda
preservad o, j um p ou c o d et eri o-rad o, en c o ntra-se na
Igreja d o Rosri o d os Pre-t os-Pel ourinh o, est em oldurad o e p
endurad o na pared e d o c orred or que d acess o as tribu-nas da
esquerda d o altar m or. (Igreja da Ir-mandade d e N. Sra. d o
Rosrio d os Pret os das Portas d o Carm o, Lit o gravura d o altar
de N. Sr. d o Bon fi m, 1860.).
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Fig. 47 - Lito grafia d o retbul o -mor da Ig. d e N. Sr. d o
Bon f im 1860 - Acerv o da
Ig. de N. Sra. d o Rosri o d os Pret os. O culto do Senhor Bom
Jesus
do Bonfim ganhou grandes propores j na sua introduo em meados do
sculo dezoito, da at o sculo vinte, tem mantido seu vigor graas a
uma unanimidade religio-sa que encontra adeptos em todas as classes
sociais, e principalmente pelo fato de en-contrar paralelismos nas
religies afro-baianas, cultivadas nos inmeros terreiros de
candombl, onde Oxal o deus supre-mo, princpio criador, com
prerrogativas e sentido semelhantes as do Senhor do Bon-fim. por
isso que o santurio do Senhor do Bonfim enche-se de fiis vestidos
de branco, cor de oxal, todas as sextas-feiras, sendo a festa deste
Senhor a maior festa religiosa feita na Bahia desde a instituio do
culto.
A difuso do modelo retabils-tico do Bonfim demonstra a fora da
msti-ca religiosa dos baianos, pois estando o templo na periferia
geogrfica da cidade, ocupou e ocupa, do ponto de vista artstico e
cultural, o centro simblico irradiador, como bem exemplifica a
difuso do seu modelo retabilstico.
Fora da cidade de Salvador, no recncavo da antiga provncia, hoje
estado da federao brasileira, identificamos, sem fazermos recolha
exaustiva, um retbulo-mor como membro desta famlia o da Igreja de
Nossa Senhora do Rosrio da ci-
dade de Cachoeira (Fig. 48), onde o balda-quino transforma-se em
retbulo parietal, e o remate adapta-se ao formato de meia cpula
sobre seis volutas em esses com os arranques das voltas inferiores
pontiagudas sustentadas por seis colunas compsitas. Contudo o
baldaquino pode ter influencia-do na provncia mais do que apuramos
e do que imaginamos.
Fora da antiga provncia da Bahia, temos como certo um
empreendi-mento que levou a tradio do retbulo do Bonfim para o
sudoeste do Brasil, o retbu-lo-mor da S de Campinas (Fig. 49), no
estado de So Paulo , feito pela oficina do entalhador Vitoriano dos
Anjos Figueiroa. Este artista aparece na Bahia fazendo quatro
nichos para os altares da nave da Igreja de Nosso Senhor do Bonfim
entre 1818 e 182074. De 1853 1864 trabalhou com outros entalhadores
que leva da Bahia, in-clusive seu filho, na talha da Catedral de
Campinas, So Paulo75, onde reinterpreta o
74 OTT, Carlos. Evolu o das artes plsti cas nas
igrejas d o Bon fim, Boqueiro e Sade., 1979. p. 148; MARTINS,
Judith. Dic i o nri o d e artis-tas e art fi c es da Bahia, s cul
os XVI-XIX; Enta-lhad or es., p. 1 (texto datil o grafad o, ori
ginais para a publi ca o). (No p o d em os rev er o d o-c u m ent o
e m virtude d o d esapare c iment o d o re f erid o livr o d o
arquiv o da Irmandade).
75 BRITTO, Jalum. Hist ria da catedral. In Dirio d o Pov o,
Campinas, Sbad o 1o de ju-nh o 1974. Cap. XIV, p. 117-118. (Bibli
ot e ca Publi ca Muni cipal Pro f. E. M. Zink Campi-nas Docu m
entri o d e Campinas )
Fig. 48 - Retbul o-m or da Igreja Matriz de N. Sra. d o Rosri o
d e Cach o-eira Bahia.
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baldaquino do Bonfim dando-lhe outra conformao.
No altar de Campinas, compe-tente obra de talha, o entalhador
fez duas cpulas circulares, uma menor que a outra, a menor sobre a
maior, constitudas de aros em volutas na forma de esses, ornadas
com flores. Esta cpula de dois andares apoia-se em volutas em esses
ornadas com folhas e olivas, o bordo inferior da cpula repleto de
grinaldas de flores pendentes. Toda a estrutura do baldaquino
lembra a do Bon-fim, as colunas so em nmero de quatro, com capitis
corntios diferentes dos com-psitos do Bonfim, assim como diferente
a marcao das caneluras do tero inferior e dos limites dos trs
teros, a nica ordem de plintos concorda com a do modelo.
Vitoriano mantm a monumentalidade do modelo, mas resolve os
problemas de sobriedade e harmonia, mal solucionados no altar do
Senhor do Bonfim. No mais retornou Bahia, sua terra natal, mas
cer-tamente alguns dos oficiais da sua oficina voltaram, pois a
nova plstica concebida por Vitoriano na Catedral de Campinas
reaparece em plano mais modesto e com variao no formato da cpula
dupla, que passa a ser oval, no baldaquino da capela do Santssimo
Sacramento, do lado do evange-lho da Igreja de So Salvador (Fig.
50) da cidade baiana de Valena, do qual desco-nhecemos poca e autor
da manufatura.
Com este ltimo exemplo, conclumos a abordagem desta tradio que
se implantou na Bahia no sculo dezenove e que se enraizou num
desenrolar plstico dos mais variados e importantes, pois passa a
ser, no contexto complexo da talha oitocen-tista baiana, uma das
principais marcas da reforma retabular.
Fig. 49 - Retbul o-m or da S de Campinas So Paul o.
Fig. 50 - Retbul o da capela d o Santssim o da Igreja de So
Salvad or Valen a Bahia.