FUNDAMENTOS DE GEOMORFOLOGIA ILUSTRADOS COM PAISAGENS DO RIO GRANDE DO SUL. Capítulo I – Introdução à Geomorfologia. 1. Conceituação e campos da Geomorfologia. 2. Desenvolvimento histórico dos conceitos centrais. 3. Direções futuras. 4. História da Geomorfologia no Brasil. 5. História da Geomorfologia no Rio Grande do Sul. 6. O Rio Grande do Sul na América do Sul. 7. Escalas Espaço – Tempo e ramos da Geomorfologia
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FUNDAMENTOS DE GEOMORFOLOGIA ILUSTRADOS COM … · paisagens e os processos associados às diferentes zonas climáticas do Planeta; ... atuam desde a origem do Planeta. É nas ...
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FUNDAMENTOS DE GEOMORFOLOGIA ILUSTRADOS COM PAISAGENS
DO RIO GRANDE DO SUL.
Capítulo I – Introdução à Geomorfologia.
1. Conceituação e campos da Geomorfologia.
2. Desenvolvimento histórico dos conceitos centrais.
3. Direções futuras.
4. História da Geomorfologia no Brasil.
5. História da Geomorfologia no Rio Grande do Sul.
6. O Rio Grande do Sul na América do Sul.
7. Escalas Espaço – Tempo e ramos da Geomorfologia
Capítulo I Introdução à Geomorfologia
1. Conceituação e Campos da Geomorfologia
A geomorfologia é a ciência que estuda as paisagens dos continentes, as rochas e os
processos que as formaram. Alguns autores também incluem feições submarinas e
planetárias.
Muitas paisagens não podem ser explicadas pelos processos hoje atuantes, torna-se
então necessário relacioná-las com processos do passado, através da Geomorfologia
Histórica.
Os principais campos da geomorfologia são: Geomorfologia Climática, estuda as
paisagens e os processos associados às diferentes zonas climáticas do Planeta;
Geomorfologia Quantitativa, quantifica os processos formadores das paisagens
(Geomorfometria), Geomorfologia Estrutural, estuda as paisagens determinadas por
diferentes tipos de rochas e estruturas que ocorrem na superfície da Terra;
Geomorfologia Global estuda as paisagens relacionadas à Tectônica de Placas;
Geomorfologia Histórica ou Geomorfogênese, estuda as paisagens determinadas por
processos do passado, procura estabelecer a cronologia denudacional das paisagens;
Geomorfologia Planetária, estuda as paisagens dos planetas e satélites do sistema
solar, bem com as produzidas por impacto de bólidos na superfície , em diferentes
épocas da história da Terra; Geomorfologia Aplicada, estuda as paisagens direcionadas
para auxiliar a resolução de problemas específicos, tais como mapeamento geológico,
mapeamento de solos, ocupação do solo, etc.
2. Desenvolvimento histórico dos conceitos centrais
Para não se correr o risco de assumir uma posição unilateral na análise e interpretação
das paisagens, é essencial o conhecimento do desenvolvimento histórico dos principais
conceitos e ramos da Geomorfologia.
Tales, filósofo pré socrático, observou o material detrítico depositado pelos rios e
concluiu que as rochas e as paisagens se originavam da água. Foi o precursor do
modo Neptunista de pensar.
Aristóteles, Heródoto, Sêneca e Strabo , entre outros filósofos gregos e romanos,
escreveram sobre fenômenos tais como a origem dos vales dos rios, deltas, as relações
entre os terremotos e as deformações da superfície da terra. Sêneca foi o primeiro a
afirmar que os rios eram capazes de abrir os seus vales. Leonardo da Vinci retomou esta
idéia no século dezessete, mas este evento fundamental em geomorfologia foi realmente
esmiuçado no século dezoito.
O termo geomorfologia foi introduzido em 1880, quando se deu atenção às paisagens
especulando-se sobre as forças e mecanismos que as criaram.
Em 1785, James Hutton argüiu que as paisagens foram modeladas pela lenta e contínua
ação erosiva da água, antes que por eventos catastróficos evocados pela Bíblia. Surgiu
então a escola Fluvialista ou Atualística em geomorfologia, cuja premissa fundamental
de pesquisa, válida até hoje é: As energias naturais gravitacional, magnética , solar, e
térmica interna da Terra, atuam desde a origem do Planeta. É nas ações da energia que
se deve procurar as causas dos processos que modelam as paisagens. Este é o princípio
do atualismo que, em síntese afirma – As leis da natureza hoje atuantes são as
mesmas que modelaram as paisagens do passado.
Contraposta à escola atualística surgiu a escola catastrofista, que atribui grande
significado a eventos raros, de grande magnitude (catástrofes) na gênese das
paisagens.
Todas estas idéias e conceitos foram desenvolvidos no velho mundo.
Do novo mundo, através dos geólogos americanos John Wesley Powels, e Groove Karl
Gilbert, que trabalharam no Oeste semi árido americano surgiu a observação da
estreita relação entre rochas –estruturas com as paisagens. Esta observação foi
favorecida pela escassa cobertura vegetal da região estudada. Criou-se então o ramo da
Geomorfologia Estrutural. Powels estabeleceu a classificação genética e estrutural das
montanhas, bem como a dos vales e sistemas de drenagem. O conceito chave que ele
extraiu de suas observações foi o de nível de base – o limite inferior da paisagem,
representado pelo nível do mar, abaixo do qual, os rios não têm capacidade de
erodir.
Gilbert fez a primeira análise sistemática entre a as forças erosivas e as forças de
resistência representadas pelas rochas e depósitos superficiais, a qual resultou no seu
conceito de equilíbrio dinâmico. Este conceito enfatiza o ajustamento entre as
formas e os processos que as modelaram. William Morris Davis, no início do século XX fundou a escola de geomorfologia que se
baseia na progressão sistemática da mudança das formas através do tempo, as quais
ocorrem após rápido soerguimento da superfície da Terra. Seu conceito chave é o de
ciclo geomorfológico de erosão.
Voltando ao velho mundo, na Alemanha, Walter Penck, em meados do século XX,
rejeitou a idéia do soerguimento rápido, com grande estabilidade posterior e argüiu a
possibilidade que a paisagem depende principalmente da taxa de soerguimento que
pode ser crescente, decrescente ou constante. Seu conceito chave é o de
desenvolvimento não cíclico da paisagem. A corrente de pensamento geomorfológico que derivou para o estudo detalhado dos
processos que modelam as paisagens, estabeleceu os fundamentos da Geomorfologia
Climática e com ela, a Geomorfologia Quantitativa. O primeiro termo foi empregado
originalmente por Emmanuel de Martonne em 1913. O conceito chave é o de Sistema
Morfoclimático, ou seja, as zonas bioclimáticas têm grande importância na
explicação das paisagens.
A corrente que enveredou para a quantificação em geomorfologia criou a
Geomorfologia quantitativa. O conceito chave é a medida de parâmetros
geomorfológicos. Este ramo da geomorfologia teve como pioneiro Robert Horton que em 1945estudou o
desenvolvimento erosivo dos rios e de suas bacias de drenagem, através de hidrógrafos.
Na África do Sul, Alexandre Dutoit em 1927 e principalmente Lester C. King 1965,
foram os precursores da Geomorfologia Global, que associa as megaformas do relevo à
Tectônica Global, baseados na hipótese da Deriva dos Continentes de Wegner. O
conceito chave é que megaformas primitivas, por um lado, são criadas
principalmente pela ruptura dos continentes e, por outro, pelos processos
orogênicos modernos post ruptura. As formas primitivas são modeladas
principalmente pelo processo de recuo paralelo das escarpas nas suas bordas, onde
a erosão e os movimentos de massa são mais intensos. Nas margens de ruptura,
superfícies de erosão escalonadas acima das escarpas, denunciam o caráter cíclico
do desenvolvimento do relevo.
No fim do século XX em 1991 Michael Summerfield firmou este novo ramo da
geomorfologia, fundamentada na moderna Tectônica de Placas, cujos conceitos chave
são expansão do assoalho oceânico, ruptra continental, margens passivas
divergentes, transformantes, margens ativas e colisão de placas (Ciclo de Wilson).
A Geomorfologia Aplicada é o uso de todos os ramos da Geomorfologia na resolução
de problemas específicos da civilização.
3. Direções futuras
Embora o estudo detalhado dos processos de superfície tenha avançado bastante, estes
contribuem muito pouco para a compreensão de como extensas áreas da paisagem
mudam em grandes períodos de tempo.
Desde 1960, através de disciplinas aliadas à geomorfologia e pela aplicação de novas
técnicas, foi proporcionada a oportunidade de desenvolver uma perspectiva global em
geomorfologia, focando os processos geomorfológicos em grandes áreas e pequenas
escalas. Esta abordagem permite estabelecer um esquema tectônico para avaliar os
soerguimentos que acompanham o desenvolvimento das paisagens a longo prazo.
Avanços significativos das técnicas de datação permitem a estimativa de taxas de
soerguimento e denudação com relativa precisão. Um dos resultados desta aplicação é a
conclusão de que, em zonas relativamente estáveis, nas plataformas associadas aos
antigos Cratons, as paisagens podem sobreviver sem mudanças significativas pelos
processos erosivos, por muitas dezenas de milhões de anos.
O conhecimento de bacias de margens passivas através de perfurações e estudos
sísmicos para a localização de jazidas de petróleo produziram enorme quantidade de
dados sobre a espessura dos sedimentos depositados nestes ambientes em um período de
100 milhões de anos ou um pouco mais. Estas sequências sedimentares são um registro
inestimável para a avaliação das taxas de erosão que ocorreram nas áreas continentais
adjacentes.
O conhecimento de mudanças climáticas globais também são de grande valia para o
estabelecimento de modelos de desenvolvimento das paisagens a longo prazo.
As imagens orbitais planetárias e orbitais terrestres propiciaram o desenvolvimento da
Geomorfologia Planetária, com a identificação de feições geomorfológicas e o seu
significado, bem como o reconhecimento de feições da superfície associadas ao impacto
de bólidos extra terrestres que atingiram a Terra em diferentes épocas do registro
geológico. Atualmente são conhecidas 120 destas morfoestruturas (astroblemas).
4. A história da Geomorflogia no Brasil
A geomorfologia do Brasil desenvolveu-se a partir dos primeiros naturalistas viajantes,
participantes de viagens de exploração do território em vias de povoação.
Ab´ Saber (1958) distingue as seguintes fases de desenvolvimento: Período dos
predecessores, (1817 – 1910), período dos estudos pioneiros (1910 – 1940), período de
implementação de técnicas modernas (1940 –1949). A partir daí os estudos podem ser
enquadrados no período contemporâneo.
Período dos predecessores (1817 – 1910)
Grandes viajantes, em geral naturalistas que percorreram o Brasil na primeira metade do
século XIX e mais tarde os geólogos estrangeiros que dirigiram as primeiras comissões
geológicas oficiais criadas.
Destacam-se Charles Frederick Hartt, Orville Adalbert Derby e John Casper Branner.
Hartt , figura 1. 1, publicou a primeira Geologia e Geografia Física do Brasil, obra
baseada nas suas expedições de estudos no país, empregando conceitos de geologia e
geomorfogia vigentes na Europa e América do Norte, em torno da década de 1870. Os
conceitos chave que direcionam a sua obra são o princípio do atualismo, as relações
das rochas e estruturas com as paisagens e o conceito de nível de base.
Fig. 1. 1 – Charles Frederick Hartt
Orville A. Derby, figura 1. 2, foi o primeiro geólogo estrangeiro a fixar residência no
Brasil. Suas contribuições em geomorfologia também estão permeadas pela visão
atualista, pelas relações entre paisagens, rochas – estruturas e pelo conceito de nível de
base. Seus textos estão inseridos na Geographia do Império do Brasil de 1884.
Fig. 1. 2 – Orville A. Derby, ao lado vista panorâmica de front da Serra do Mar,
formada por inselbergues. Desenho do autor.
John C. Branner, figura 1. 3, publicou o primeiro compêndio de geologia destinado a
estudantes brasileiros, com muitas referências sobre a geologia do Brasil.
Fig. 1. 3 - John C. Branner, ao lado croquis modificado do autor, retrata paisagem típica
das escarpas litorâneas da Serra do Mar.
Período dos estudos pioneiros. (1910 – 1940).
Este segundo período se caracteriza pela geomorfologia permeada pelo conceito de
ciclo de erosão, concebido pelo geógrafo americano William Morris Davis.
Predominam pesquisadores estrangeiros, especialistas em geologia e geomorfologia,
mas já trabalhando com pesquisadores brasileiros.
Dentre outros estrangeiros cita-se Miguel Arrojado Lisboa, Preston James, Reinhard
Maak e Alexandre Du Toit.
De suma importância para o advento da moderna Tectônica de Placas e para os novos
conceitos de Geomorfologia Global, foi a estada no Brasil de Alexandre Du Toit,
pesquisador Sul Africano. Du Toit, figura 1. 4, baseado na então hipótese da deriva dos
continentes, proposta por Wegner em 1912, efetuou a pioneira comparação geológica e
geomorfológica entre as costas atlânticas do Brasil e da África, como prova da
existência do Continente Gondwana que se rompeu a 180 milhões de anos e originou o
Oceano Altântico, as atuais América do Sul e África.
Fig.1. 4 – Evidências geológicas à esquerda e geomorfológicas, à direita, da antiga
união de Brasil e África no antigo continente Gondwana. Modificado de Du Toit (1951)
e Wegener (1927). À direita, A. Wegener o precursor da Tectônica de Placas e da
Geomorfologia Global.
Os primeiros pesquisadores brasileiros.
Alberto Betim Paes Leme, tem como obra principal História Física da Terra, com mais
de mil páginas, muitos dados da geologia e geomorfologia do Brasil descritos conforme
os conceitos da época. Sofreu grande influência da escola francesa de geologia e
geomorfologia, pois lá teve a sua formação acadêmica.
Relativo às hipóteses de Wegner e Du Toit , mostrou-se contrário à deriva dos
continentes e a favor de “pontes continentais”, para explicar as semelhanças de paleo
floras e paleo faunas do Brasil e da África.
Alberto Ribeiro Lamego, figura 1. 5, com formação acadêmica no exterior,
Inglaterra,destacou-se no estudo da gênese das restingas do Estado do Rio de Janeiro.
Introduziu o uso de fotografias aéreas no Mapeamento Geológico e efetuou o
mapeamento geológico da Folha do Rio de Janeiro na escala 1:100 000. Foi pioneiro na
pesquisa de petróleo, chamou a atenção sobre a importância das bacias marginais, no
caso, a Bacia de Campos, como grandes reservatórios de Petróleo.
Fig. 1. 5 – Alberto Ribeiro Lamego, o maior expoente brasileiro da fase de estudos
pioneiros de geomorfologia no Brasil.
O terceiro período tem como marcos a criação das primeiras faculdades de filosofia no
Brasil e a fundação do Conselho Nacional de Geografia em 1937.
Os pesquisadores estrangeiros que mais marcaram esta fase foram Emmanuel
Demartonne e Francis Ruellan.
Demartonne publicou em 1940 “Os problemas morfológicos do Brasil tropical
atlântico” em que estabelece pioneiramente as principais superfícies de erosão da Serra
do Mar e sua cronologia de denudação, baseada no conceito de Davis do Ciclo de
Erosão.
Francis Ruellan, figura 1. 6 , geomorfólogo francês, à semelhança de Derby, fixou
residência no Brasil, foi professor da Universidade do Brasil e consultor do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), formou uma geração de geomorfólogos
brasileiros que atuaram principalmente no IBGE, em diversos campos da geografia
física. Seus trabalhos principais foram: Evolução geomorfológica da Baia da Guanabara
e Aplicações da fotogrametria em estudos geomorfológicos, esta incentivando o uso da
fotografia aérea em diversos estudos geomorfológicos.
Fig. 1. 6 – O professor Francis Ruellan introduziu no Brasil o uso rotineiro de
fotografias aéreas em pesquisas geomorfológicas.
O pesquisador brasileiro que mais se salientou nesta fase foi o geógrafo Aroldo de
Azevedo que publicou em 1949 “O Planalto Brasileiro e o problema da classificação de
suas formas do relevo.”
A realização do XVIII Congresso Internacional de Geografia realizado no Rio de
Janeiro em 1956 pode ser considerada como marco do início do período contemporâneo
de desenvolvimento da geomorfologia no Brasil, que coincidiu com a criação dos cursos
de geologia e expansão dos cursos de geografia no território brasileiro.Ampliou-se em
muito o número de pesquisadores na área de geomorfologia, as pesquisas passaram a
abordar áreas detalhadas e problemas específicos (oscilações paleoclimáticas,