Funções Reais: o Caminho Histórico e o Descaminho Didático Wanderley Moura Rezende e Andréa Thees Departamento de Matemática Aplicada Instituto de Matemática – UFF [email protected] , [email protected] , [email protected]
Jun 14, 2015
Funções Reais:o Caminho Histórico e o
Descaminho DidáticoWanderley Moura Rezende
e Andréa TheesDepartamento de Matemática Aplicada Instituto de Matemática – UFF
Introdução
Caraça (1989): o conceito de função se estabelece como uma ferramenta da matemática que ajuda o homem a entender os processos de fluência e de interdependência que são intrínsecos às coisas e aos seres do nosso Universo.
Rezende (2006): Saber que a variação de uma grandeza depende da variação da outra é um aspecto importante no estudo do conceito de função, mas que se torna incompleto do ponto de vista epistemológico, se não estudamos como ocorre esta variação, isto é, se não conseguimos dar qualidade e quantificar este processo de variação.
Reflexão sobre o ensino de funções reais na educação básica, tendo como referência o seu caminho histórico de construção e os descaminhos de natureza pedagógica e epistemológica - (Rezende, 2003b), Botelho (2005) e Souza Sá (2005).
A Origem Histórica
Conceito de função // conceito de variável
O uso de símbolos na matemática: álgebra desenvolvida na Grécia por Diofanto (200/214-
284/298); álgebra hindu.
Primeiro rompimento com o pensamento aristotélico: Roger Bacon (1214-1294) e Guilherme de Ockham (1300-
1349): ciência experimental - as verdades científicas deveriam, necessariamente, ser obtidas através da experiência.
Representação duplamente significativa: por um lado mostra duas grandezas relacionadas entre si,
variando ao mesmo tempo, e por outro lado ilustra esta variação através de um gráfico.
O conceito de função se estabelece, implicitamente, por meio da curva (uma reta) ...
Filósofos escolásticos - “matematização” do conceito de função
O rompimento definitivo Galileu (1564-1642)
(...) o espaço percorrido por um corpo em queda
livre é diretamente proporcional ao
quadrado do tempo levado para percorrer
este espaço.
S= 4,9Dt= 1,0
t s s s) 0 0,0
1,0 4,9 4,92,0 19,6 14,7 9,83,0 44,1 24,5 9,84,0 78,4 34,3 9,85,0 122,5 44,1 9,86,0 176,4 53,9 9,87,0 240,1 63,7 9,88,0 313,6 73,5 9,89,0 396,9 83,3 9,8
10,0 490,0 93,1 9,811,0 592,9 102,9 9,812,0 705,6 112,7 9,813,0 828,1 122,5 9,814,0 960,4 132,3 9,815,0 1102,5 142,1 9,816,0 1254,4 151,9 9,817,0 1416,1 161,7 9,818,0 1587,6 171,5 9,819,0 1768,9 181,3 9,820,0 1960,0 191,1 9,8
Viète (1540-1603) - fez uso, em seus trabalhos de “uma vogal, para representar uma quantidade suposta
desconhecida ou indeterminada e uma consoante para representar uma grandeza ou números supostos conhecidos ou dados”
surge então o conceito de variável
Descartes (1596-1650) e Fermat (1601-1665), e depois Newton (1642-1727) e Leibniz (1646-1716) estudo de curvas
O conceito de função “evoluiu” (...) sai, gradativamente, do âmbito do Cálculo, enquanto
relação entre quantidades variáveis, para o âmbito da Teoria dos Conjuntos, como uma operação especial entre conjuntos (início do século XX).
Descaminhos Pedagógicos:Alguns Indicadores
Sierpinska (1987), Cabral (1998) e Rezende (2003a) fontes de obstáculos epistemológicos para a aprendizagem
dos conceitos básicos do Cálculo.
Problemas de taxas relacionadas e de otimização.
Cabral (1998) quatro níveis de significação: o aritmético, o algébrico, o
funcional e o diferencial, identificando entre eles uma hierarquia de natureza epistemológica Os dois primeiros níveis de significação são os mais comuns “O difícil mesmo é encontrar a função” Relação intrínseca entre o terceiro e o quarto nível
Caminho natural para o estudo das funções reais seria caracterizá-las conforme a maneira que variam... Mas, será que este caminho é seguido na educação básica?
Botelho (2005) e Souza Sá (2005): Predominância da representação algébrica
injetividade/sobrejetividade x crescimento/decrescimento, ou quanto e como cresce/decresce
zeros da função x pontos críticos da função
Ausência de tópicos que analisem o comportamento da variabilidade e de exercícios de modelagem
Gráfico - “plotado” através de uma tabela de valores “notáveis” Correspondência estática entre os valores das variáveis “x” e “y”
1G - Bianchini
GRÁFICO NO PLANO CARTESIANO INEQUAÇÕESCRESCIMENTO E
DECRESCIMENTO
DEFINIÇÃO
ESTUDO DO SINAL
ZERO DA FUNÇÃOTABELA DE
VALORES
ÁLGEBRA
GEOMETRIA
CÁLCULO
1G – Dante
DEFI NI ÇÃO
FUNÇÃOLI NEAR
GRÁFI CO NOPLANO
CARTESI ANO
CRESCI MENTO EDECRESCI MENTO
POSI ÇÃO RELATI VAENTRE DUAS RETAS
I NEQUAÇÕES
ZERO DAFUNÇÃO
PROPORCI ONALI DADE
TAXA DEVARI AÇÃO
TABELA DEVALORES
EQUAÇÃO DO1° GRAU
ESTUDO DOSI NAL
ÁLGEBRA
GEOMETRIA
CÁLCULO
2G - Machado
DEFINIÇÃO
CONCAVIDADE
PONTO DEMÁXIMO EPONTO DE
MÍNIMO
GRÁFICO NOPLANO
CARTESIANO
IMAGEM
CRESCIMENTO EDECRESCIMENTO
TABELA DEVALORES
VÉRTICE
VALORMÁXIMOE VALORMINIMO
RAÍZES ESINAIS DAFUNÇÃO
INEQUAÇÕESEQUAÇÃO DO2° GRAU
DOMÍNIO
ÁLGEBRA
GEOMETRIA
CÁLCULO
2G - Dante
Equação do 2° grau
Imagem da Função
COORDENADAS DO Vértice
Valores Máximo e Mínimo
Inequações
Abertura da parábola
INCLINAÇÃO DA RETA TANGENTE
Tabela de valores
Taxa de variação
Gráfico no Plano
Cartesiano
Definição
Concavidade
EIXO DE SIMETRIA
SINAL DA FUNÇÃO
ÁLGEBRA
GEOMETRIA
CÁLCULO
EXP - Smole
SITUAÇÕES PROBLEMA DEFINIÇÃO
PROGRESSÃO GEOMÉTRICA
TABELA DE VALORES
GRÁFICO NO PLANO
CARTESIANO
FUNÇÃO CRESCENTE E DECRESCENTE
INEQUAÇÃO EXPONENCIAL
PROPRIEDADES DAS POTÊNCIAS
PROPRIEDADES DA FUNÇÃO
EXPONENCIAL
EQUAÇÃO EXPONENCIAL
ÁLGEBRA
GEOMETRIA
CÁLCULO
EXP - Dante
DEFINIÇÃO
TABELA DE VALORES
DOMÍNIO E IMAGEM
FUNÇÃO CRESCENTE E DECRESCENT
E
INEQUAÇÃO EXPONENCIAL
INJETIVIDADEEQUAÇÃO EXPONENCIAL
PROBLEMA INTRODUTÓRIO
PROPRIEDADES DA
POTÊNCIA
GRÁFICO NO PLANO
CARTESIANO
ÁLGEBRA
GEOMETRIA
CÁLCULO
LOG - Smole
OPERADOR LOGARITMO
PROPRIEDADES DOS
LOGARITMOS
GRÁFICO NO PLANO
CARTESIANO
FUNÇÃO CRESCENTE E DECRESCENT
E
INEQUAÇÃO LOGARÍTMICA
TABELA DE VALORES
FUNÇÃO INVERSA DA FUNÇÃO
EXPONENCIAL
EQUAÇÃO LOGARITMICA
EQUAÇÃO EXPONENCIAL
DEFINIÇÃO
ÁLGEBRA
GEOMETRIA
CÁLCULO
LOG - Iezzi
DEFINIÇÃOGRÁFICO NO
PLANO CARTESIANO
EQUAÇÃO LOGARÍTMICA
INEQUAÇÃO LOGARÍTMICA
PROPRIEDADES DOS LOGARITMOS
OPERADOR LOGARITMO
FUNÇÃO CRESCENTE E DECRESCENTE
PROPRIEDADES DA FUNÇÃO
LOGARÍTMICA
ÁLGEBRA
GEOMETRIA
CÁLCULO
Algumas Considerações
Qual o motivo desta omissão? Qual a dificuldade em se tratar, no ensino
médio, de assuntos como “variabilidade” ou “taxa de variação”?
Precisamos recuperar os “escolásticos”...
Atividades do Minicurso
Resolver as questões 1, 3, 4 e 5 Preencher o formulário Não é necessário identificação Duração: 30 minutos Quem terminar, pode resolver as
questões 2 e 6
Algumas Propriedades Preliminares
y = ax3 + bx2 + cx + d x y Δy Δ2y Δ3y Δ4y
0,00 0,00
a = 0 0,00 0,00 0,00
b = 0 0,00 0,00 0,00 0,00
c = 0 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
d = 0 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
dx = 0 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
Resolução Comentada
1) A tabela abaixo mostra a variação de posição de um trem que passava no quilômetro 40 de uma ferrovia quando o movimento começou a ser observado (t = 0). Depois de quanto tempo após o início da viagem, o trem passou pelo quilômetro 120 da ferrovia?
Tempo (horas)
0 1 2 3 4
Espaço (km)
40 70 100 130 160
dt = 1
t S(t) ΔS Δ2S0 401 702 1003 1304 160
dt = 1
t S(t) ΔS Δ2S0 401 70 302 100 30 03 130 30 04 160 30 0
s é uma função afim do tipos(t) = at +b
Substituindo, temos:40 = s(0) = a.0 + b = b → b = 4070 = s(1) = a.1 + b → a = 70 – b = 70 – 40 = 30
Logo, s(t) = 30t + 40
Como estamos procuramos s(120), basta substituir:120 = 30.t + 40 → t = 8/3
Ou seja, o trem passou pelo quilômetro 120 da ferrovia depois de 2h e 40min.
2) Um estudante anotou a posição de um móvel ao longo do tempo e obteve a seguinte tabela:
Tempo (s)
0 10 20 30 40 50
Posição (cm)
17 45 81 125 177 237
Calcular a posição do móvel nos instantes 5 s e 35 s.
dt = 10
t s(t) Δs Δ2s0 17
10 4520 8130 12540 17750 237
dt = 10
t s(t) Δs Δ2s0 17
10 45 2820 81 3630 125 4440 177 5250 237 60
dt = 10
t s(t) Δs Δ2s0 17
10 45 2820 81 36 830 125 44 840 177 52 850 237 60 8
s é uma função quadrática do tipo s(t) = at2 +bt + c
811720400
451710100
172040020.20.)20(81
171010010.10.)10(45
170.0.)0(17
2
2
2
ba
ba
bacbas
bacbas
cccbas
Substituindo, temos:
Resolvendo o sistema, temos:
5
12811720
25
1400
25
1
200
8
917200
811720400
903420200
bba
a
ba
ba
Logo, 175
12
5)(
2
ttts
Como queremos a posição do móvel nos instantes 5s e 35s, basta achar s(5) e s(35):
Ou seja, a posição do móvel no instante 5s era 30cm e no instante 35s era150cm.
150178449175
35.12
5
35)35(
3017121175
5.12
5
5)5(
2
2
s
s
3) Uma escala N de temperatura foi feita com base nas temperaturas máxima e mínima em Nova Iguaçu. A correspondência com a escala Celsius é a seguinte:
º C º N
18º 0º
43º 100º
Em que temperatura a água ferve na escala N?
dt = 25
t t(c) Δt Δ2t18 043 100 100
t é uma função afim do tipot(c) = ac +b
Como estamos procuramos t(c) quando c = 100º C, basta substituir:
Substituindo, temos:
7241002510043
018
43.100
18.0
.)(
baaba
ba
ba
ba
bcact
Logo, 724)( cct
3287240072100.4)( ct
Ou seja, na escala N, a água ferve a 328º.
4) Uma pessoa possui um gravador de vídeo dotado de um contador que registra o número de voltas dadas pelo carretel da direita. A fita, de seis horas de duração, está parcialmente gravada. O contador indica 1750 ao final do trecho gravado e 1900 ao final da fita. Medindo o tempo de gravação correspondente às primeiras 100, 200, 300 e 400 voltas, foram encontrados os dados ao lado:
Quanto tempo de gravação resta na fita?
Volta (n)
Tempo (t)
100 555
200 1176
300 1863
400 2616
dn = 100
n t(n) Δt Δ2t100 555200 1176300 1863400 2616
dn = 100
n t(n) Δt Δ2t100 555200 1176 621300 1863 687400 2616 753
dn = 100
n t(n) Δt Δ2t100 555200 1176 621300 1863 687 66400 2616 753 66
t é uma função quadrática do tipo t(n) = an2 +bn + c
186330090000
117620040000
55510010000
1863300.300.)300(
1176200.200.)200(
555100.100.)100(
2
2
2
cba
cba
cba
cbat
cbat
cbat
Substituindo, temos:
Resolvendo o sistema, temos:
65410040000
62110030000
130820080000
62110030000
18631001000055530090000
11761001000055520040000
: temos,(III) e (II) em dosubstituin ,
10010000555 ),(
186330090000
117620040000
55510010000
ba
ba
ba
ba
baba
baba
Logo
bacquetemosIde
IIIcba
IIcba
Icba
0100
522.100
10000
33.10000555
100
52299621100621100
10000
3330000.
10000
333310000
cc
bbbaa
Logo, nnnt 22,50033,0)( 2
Vamos encontrar agora o f(x) quando o contador marca o final do trecho gravado, ou seja:
25,241.19135.925,106.101750.22,51750.0033,0)1750( 2 t
O tempo de gravação que ainda resta na fita é a diferença entre o tempo total da fita (6h = 6h.60min = 360min = 360min.60s = 21.600s) e o tempo de gravação (19.241,25s):
21.600s - 19.241,25s = 2.358,75s ou seja, 39min e 31s
5) Um ônibus de 48 lugares foi alugado para uma excursão. O preço por passageiro é de R$ 30,00 reais acrescido de uma taxa de 1 real por lugar vazio no ônibus. Determinar uma função que relacione o número de lugares vazios com a rentabilidade do dono do Ônibus.
6) (UERJ-2002) O movimento uniformemente acelerado de um objeto pode ser representado pela seguinte progressão aritmética:
7 11 15 19 23 27...
Estes números representam os deslocamentos, em metros, realizados pelo objeto, a cada segundo. Determine a função horária que descreve a posição deste objeto. (adaptado)
Referências BOTELHO, L.M.L. (2005) Funções Polinomiais na Educação Básica: Uma
Proposta. Monografia de Pós-gradução. UFF, Niterói.
BOYER, C. B. História da Matemática. (1991) 2a edição. Edgard Blücher, São Paulo, tradução de Elza Gomide de título original, Edgard Blucher, S. Paulo, 1974.
BOYER, C. B. (1949) The History of the Calculus and its Conceptual Development. Dover Publications Inc., New York.
CABRAL, T. C. B. (1998) Contribuições da Psicanálise à Educação Matemática: A Lógica da Intervenção nos Processos de Aprendizagem. Tese de Doutorado. USP, São Paulo.
CARAÇA, B. de J. (1989) Conceitos Fundamentais da Matemática. 9a edição. Livraria Sá da Costa Editora, Lisboa.
LIMA, E.L., CARVALHO, P.C.P., WAGNER, E. & MORGADO, A.C. (2001) A Matemática do Ensino Médio. Coleção do Professor de Matemática. v. 1. Sociedade Brasileira de Matemática, Rio de Janeiro
KLINE, M. (1990) Mathematical Thought from Ancient to Modern Times, v.1. Oxford University Press, de Oxford, Inglaterra..
REZENDE, W. M. (2003a) O Ensino de Cálculo: Dificuldades de Natureza Epistemológica. Tese de Doutorado. USP, São Paulo.
REZENDE, W. M. (2003b) Uma Proposta Didática de Emersão das Idéias Fundamentais do Cálculo no Ensino Básico. Projeto de Pesquisa. UFF, Niterói.
RÜTHING, D. (1984) Some Definitions of The Concept of Function from Joh. Bernoulli to N. Bourbaki. The Mathematical Intelligencer, v. 6, (4), 72-77.
SIERPINSKA, A. (1987) Humanities Students and Epistemological Obstacles Related to Limits. Educational Studies in Mathematics, 18.
SOUZA SÁ, S. L. de (2005) Um Mapeamento do Ensino de Funções Exponenciais e Logarítmicas no Ensino Básico. Monografia de Pós-gradução. UFF, Niterói.
Cronograma do Minicurso
Recepção inscritos – 14:00h às 14:15h Apresentação – 14:15h às 14:45h Atividades propostas – 14:45h às 15:15h Modelagem – 15:15h às 16:15h Intervalo – 16:15h às 16:30h Resolução Comentada - 16:30h às 17:00h Opção extra – 17:00h às 17:15h Avaliação final – 17:15h às 17:30h