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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS FREQUÊNCIA DE OCLUSIVAS, FRICATIVAS E NASAIS EM TRÊS REFRÃOS DE CHICO BUARQUE FONÉTICA E FONOLOGIA DO PORTUGUÊS (FLC0275-04) LUCAS RIELLO DE ALMEIDA Nº USP 7193854
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Frequência de oclusivas, fricativas e nasais em três refrãos de Chico Buarque

Mar 24, 2016

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Lucas Riello

Trabalho de Fonética e Fonologia do Português - USP
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Page 1: Frequência de oclusivas, fricativas e nasais em três refrãos de Chico Buarque

Universidade de são PaUlo

FacUldade de FilosoFia, letras

e ciências HUmanas

FreqUência de oclUsivas,Fricativas e nasais em três

reFrãos de cHico bUarqUe

Fonética e Fonologia do PortUgUês (Flc0275-04)

lUcas riello de almeida

nº UsP 7193854

Page 2: Frequência de oclusivas, fricativas e nasais em três refrãos de Chico Buarque

O SOM DO CHICO

INTRODUÇÃO

Esse trabalho tem como objeto de estudo três canções de Chico Buarque, “A Ban-da”, “Pedro Pedreiro” e “Meu Refrão”, to-das do álbum Chico Buarque de Hollan-da, de 1966. O trabalho pretende analisar a produção de sons consonantais oclusivos, fricativos e nasais nos refrãos de ambas as músicas. A atenção à sonoridade dessas can-ções foi originada a partir do seguinte tre-cho de uma análise de Celso Loureiro Cha-ves a respeito da obra de Chico Buarque:

“Assim como as letras têm espesso signi-ficado semântico, mas guardam sempre os limites da compreensibilidade, assim as melodias são imediatamente “can-táveis”, sem que se percebam suas sofis-ticações. Este modelo da canção urbana brasileira vem de longe, no tempo. É ur-bana porque é nos centros urbanos que se concretiza. É brasileira porque seu alcance é nacional, com pouquíssimas barreiras regionais. Não é canção “popular” porque nem suas origens e nem seus receptores se particularizam neste ou naquele segmento social. Suas origens são socialmente mais disseminadas, seus receptores são muito mais difusos do que os quereriam os teóri-cos. A unanimidade em torno de Chico Bu-arque vem daí, deste modelo quase atávico de canção que nos remete à década de 1920 e a Noel Rosa, mas que ultrapassa o mode-lo original ao depurar seus componentes estruturais, letra e música, seus conte-údos semântico e sônico1.” (grifos meus)

1.(CHAVES, Celso L. Chico Buarque das Canções)

Após o levantamento de dados, haverá uma sessão de análise dos dados, em que se tentará mostrar que, como diz o trecho citado, o pla-no da expressão colabora muito, como se es-pera, com a elaboração de sentido no plano do conteúdo. Essa contribuição, suponho, está li-gada fortemente à sonoridade da letra que con-tribuem ritma e semanticamente com a letra.

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LEVANTAMENTO DE DADOS

Primeiramente, tomarei o refrão da canção “A ban-da”, de Chico Buarque. O refrão, que também cons-titui as 2 primeiras estrofes da letra, possui 58 síla-bas. De todos os sons consonantais, destaquei os 3 principais, que, como será visto, representam quase a totalidade encontrada. Segue uma representação da estrofe, dividida em suas sílabas poéticas, com os sons consonantais destacados por cores diferentes.

Es / ta / va à / to /a /na / vi /daO /meu / a /mor / me /cha /mou

Pra /ver / a /ban /da / pa /ssarCan /tan /do / coi /sas / de a /mor

A / mi /nha / gen /te / so /fri /daDes /pe /diu- /se / da / dor

Pra / ver / a /ban /da /pa /ssarCan /tan /do / coi /sas / de a /mor

Oclusivas = 28Fricativas = 17Nasais = 15

•Total de sons consonantais no refrão, con-siderando os que não foram marcados: 71

Percebe-se uma predominância das oclusivas ao longo de todo o trecho, quase 50% de todas as produções consonantais, seguido pelas fricativas e nasais, respectivamente. Além, a quantidade de oclusivas aumenta ao longo dos versos, subindo de três para 5 recorrências em um mesmo verso, enquanto há uma redução das outras consoantes

A BANDA

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PEDRO PEDREIRO

O refrão possui 38 sílabas. Percebe-se, nova-mente, uma predominância das oclusivas ao longo de todo o trecho, da mesma forma que na canção anterior. O último verso é total-mente marcado pela presença de oclusivas (10), além de uma forte presença de nasais (8).

Pe / dro / pe / drei / ro / pen / sei / ro es / pe / ran / do o / trem

(12 sílabas)

Ma / nhã / pa / re / ce, / ca / re / ce / de es / pe / rar / tam / bém

(13 sílabas)

Pa / ra o / bem / de / quem / tem / bem / de / quem / não / tem / vin / tém

(13 sílabas)

Oclusivas = 24Fricativas = 6Nasais = 16

•Total de sons consonantais no refrão, con-siderando os que não foram marcados: 63

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Por fim, na canção “Meu refrão” há uma mudança na distribuição sonora, pois os sons consonantais predominantes são nasais, apesar de os oclusivos totalizarem um número relativamente próximo.

Quem / can / ta / co / mi / go, / can / ta o / meu / re / frão

Meu / me / lhor / a / mi / go é / meu / vi /o / lão

Meu / me / lhor / a / mi / go é / meu / vi /o / lão

MEU REFRÃO

Nasais = 13Oclusivas = 9Fricativas = 3

•Total de sons consonantais no refrão, con-siderando os que não foram marcados: 32

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SISTEMATIZAÇÃO DOS DADOS

Considerando o levantamento de sons consonantais realizado acima, é pos-sível elaborar os seguintes gráficos:oclusivos, fricativos e nasais por música:

TOTAL DE SONS OCLUSIVOS, FRICATIVOS E NASAIS POR

MÚSICA:

SOMATÓRIO DOS TIPOS DE SONS DAS 3 CANÇÕES:

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CONCLUSÃO

Como dito na introdução, nota-se uma predomi-nância sonora nesses 3 refrãos. Se o escopo do tra-balho fosse maior, poderia ser realizada uma análi-se rítmica de todos os versos, e se constataria que a métrica empregada é regular e apresenta certos padrões de pés (dáctilos, troqueus, iambos). To-memos, por exemplo, a canção “Pedro Pedreiro”. A imagem do trem perpassa todas as estrofes e ao longo delas vai adquirindo novas conotações. Essa acumulação imagética pode ser associada à acele-ração do trem. Da mesma forma, no refrão há um movimento de acumulação das oclusivas que cul-mina no terceiro verso, predominantemente oclu-sivo (Pa / ra o / bem / de / quem / tem / bem / de / quem / não / tem / vin / tém). Também os metros dessa estrofe se tornam mais rápidos, pois os dois primeiros versos iniciam com dois dáctilos, mais lentos, e o terceiro verso é só composto por troqueus, pés bem mais rápidos. Ou seja, semân-tica, métrica e sonoramente o refrão se acelera.

No refrão de “A Banda” ocorre o mesmo fe-nômeno: os últimos versos de cada estrofe possuem mais consoantes oclusivas. Entendo que as consoantes oclusivas possuem uma ca-racterística percussiva, sendo possível emular instrumentos de percussão (como pandeiro e tamborim) apenas usando esses sons conso-nantais. Dado isso, esses refrãos possuem uma qualidade rítmica muito intensa, pois a inter-pretação que Chico Buarque dá a essas palavras faz com que soem quase como um instrumento musical à parte. De qualquer maneira, nota-se uma preferência, ao menos nessas três músi-cas, por refrãos com tais características. Isso talvez reflita a poética de composição da épo-ca, um tanto voltada para a inserção de músi-cas em festivais. Os compositores queriam di-vulgar o máximo possível suas obras e talvez tenham construído a sonoridade das composi-ções voltada para uma fruição mais suave, fá-cil de ser escutada, mas não menos complexa.

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