Top Banner
FOLHAS DE FLANDRES Maria Estela Guedes 2014 1
37

FOLHAS DE FLANDRES

Feb 22, 2023

Download

Documents

Welcome message from author
This document is posted to help you gain knowledge. Please leave a comment to let me know what you think about it! Share it to your friends and learn new things together.
Transcript
Page 1: FOLHAS DE FLANDRES

FOLHAS DE FLANDRESMaria Estela Guedes

2014

1

INDICE

I FOLHAS DE FLANDRESEscaldaGare du NordGare Lille FlandresCompanheiroHotel Pelican drsquoOrLa Maison BlancheTemple des Charbonniers Comboios que natildeo vatildeo para SingapuraHotel Bristol

II DESGARRADAS amp DIVERSAS FOLHASBarahona

O artista Antoacutenio BarrosMorna da Baiacutea das GatasUma cadela em casa de xisto

2

I FOLHAS DE FLANDRES

Escalda

A paisagem jaacute natildeo existe como NaturaFlui em figuras sabores e tamanhosArtificiosos Agrave maneira do EscautO que vive escalda

Em modificaccedilotildees de genesResultados bioquiacutemicosE intrusotildees mais ou menos agressivasNo organismo humanoO rio eacute vibraccedilatildeo ateia o olhar e potildee a crepitar A neblinaSobre as tonalidades de outono

Fluiram outrora de flama vestidas coloacutenias de incontaacuteveisFlamingos goacutetico oacutevulo Flamboyant

Sopra o carvatildeo C sopra-o Para que cintilem brasa e flama ndash azulNegro e vermelho ndash essecircncia da CarbonaacuteriaE ah ah ah tua machadinhaStellaMais uma pitada de accedilafratildeo e canelaBem satildeo quadrados verde-fuscos

Estes agrosQue vatildeo dar comida a tanta gente ndash couves nabosBeringelas e beterrabas suculentasEncostadas ao casario taciturno Que de Cesaacuterio Verde bem podia ter sidoReplicado

3

Nos seus adobes liacutevidos CinzentosAo longo de ruas paradasDesertas de catildees e gatosE de genteLadeiam quadriacuteculas de entediada verduraE ao fundo ereto aguardando a AlieniacutegenaDe chapeacuteu de aba larga como combinadoO B Pr Pierre arquiteto na retraiteDesenha a carvatildeo a silhueta Na tela bolorenta do ceacuteu Confundem-se Os BB PPr com os fantasmas de priacutencipes Perdidos Na floresta ndash Franccedilois IE cavaleiros monges que se fazem carvoeirosE daiacute sobem a santos ndash S Thibaud

Que S Teobaldo vele por noacutesAlongue sobre a tua grimpa a rama do carvalhoE a lacircmina da navalhaTodos na vida asneiras cometemosBoa PrimaDoloroso eacute envelhecer com elasPresentes sempreNos ramos da pensativa aacutervoreTodos recebemos feridasBoa PrimaPenoso eacute soletraacute-las continuamenteComo se nos amarasse a sombra De perpeacutetua batalha

Lobos maus anotildeezinhosLenhadores e carvoeirosRachadores e capuchinhos vermelhos Druidas Preparam o guiPara os senhores que coam memoacuterias No tamis

Que mo permitam os BB PPr de todos os BosquesMas tambeacutem peccedilo ao nosso Bom Primo Jesus CristoE ao nosso protetor S Teobaldo Que natildeo se esqueccedilam De IdeacutefixDe AsteacuterixDe ObeacutelixDe Panoramix e desseTatildeo dificilmente pronunciaacutevel

4

Or-dral-fa-beacute-tix

A matildee soletrou enquanto pocircdeE depois avisouVou ficar malucaPosto issoSentou-se com a proacutefuga cabeccedilaA viver em tempos passadosEi-la num depoacutesito social De corpos Azuis~~~ Tremulantes~~~ Descarnados~~~ Exangues~~~

Presa agrave cadeira de rodas Por uma cinta Cercada pela glossolalia do terccediloGravado em CDNatildeo liga natildeo rezaDeus em aparecircncia jaacute natildeo a trata por tuNem ela a Ele jaacute presta vassalagemUma barragem de gelo contra o divinoE a inexpressiva faceDe quem ao telefoneManda muitos cumprimentos para toda a famiacuteliaComo se natildeo fosse ela a tua famiacutelia todaComo se ouvisseComo se soubesse quem do outro lado do fioAlimenta uma conversaQue jaacute nem funccedilatildeo faacutetica Da linguagem Respeita O fio natildeo liga nada nem as falas uma agrave outraE nunca foram muitas as conversasCom quem da outra a essecircncia natildeo conheceNatildeo quis conhecerNa expectativaDe ter trazido ao mundo uma soacutesia dela

Mulheres abundantes em mamaDe casas Casinhas e casotas amantesGirando poderosas em torno das panelas

Fluida falavas com ela de comidaE pouco mais em comumHavia Entre esta pobre velha que ainda vive

5

E esta pobre filha Que usa folhas de flandresPara escrever agrave morte

Cumprimentos para toda a famiacutelia ndash repeteEcoa a mais estrangeira das matildeesSalve RainhaMatildee imaculada tronoDe misericoacuterdiaSalve ReginaMater misericordiaVita dulcedo et spes nostra salveTu que pedes perdatildeoPor ainda velares por noacutesMater DolorosaStabat Apesar de Jaacute natildeo posso fazer nadaAs grandes matildees que natildeo beijamNatildeo dizem Filho FilhaNatildeo se usava o sentimentoNa geraccedilatildeo delasAs Cibeles as GaiasHabituadas a parecer aacutelgidasBocados de geloRecusam gestos de afeto que Para elas natildeo valem nadaDepois da dececcedilatildeo tremenda

Eacute soacute mentiras ndash reclamaMatildees secas como gavetas de pinhoQue natildeo tocam natildeo falam de amor Que em vez disso datildeo de comer E em dar de comer eacute no que pensamE dizem Como ela se pocircs Soacute pensa em comerAs grandes Terras-MatildeesDe tanto filho da putaSumidaAd te suspiramos gementesParece uma anatildezinhaComo noacutes ficamos em velhosPassamos a caber numa noz

Do seu trono de rodas amarrada pela cinturaPara natildeo cair falaDeixa sair Esta gente toda

6

(Esta gente toda que jaacute natildeo ouve nem reza o terccedilo)E depois vai laacute dentro ao frigoriacuteficoAinda deve ter sobrado Alguma coisa do almoccediloPara comeres~~~

Salve ReginaIn hac lacrimarum valleO clemensO piaO dulce Virgo Preciosa

Gare du Nord

De novo a flamenga regiatildeoVai desfilar pelos vidros daCarruagem Lagos em que as lembranccedilasNavegamTendo no horizonteAacutefrica onde fundear acircncora Estas secas paisagens Apesar disso afundam-se Em cacircntarosDe aacutegua

Vais diante de mim sentadaOacute estrangeira Stella Carbono

Como no espelho a imagem mareadaNa expectativa de futuro medonho Gare du Nord ndash esta zona de Paris eis um Exemplo franceses natildeo exibeSim uma explosatildeo de indianos chinas e MuccedilulmanosDe cofioacute e belas djilabas esvoaccedilantesVindos do SenegalBateram-se em Tacircnger contra Cila e Cariacutebdis burocraacuteticosFiltros poliacuteticos da migraccedilatildeoAntes de o ferry os transportar para a utopiaEuropeia Outros por laacute ficaram Suspensos

7

Entre nenhures E parte algumaEm tracircnsito alfandegaacuterio intermitenteUm dia a invasatildeo haacute de ultrapassarOs limites do toleraacutevel E entatildeo vai Explodir Racista A bomba Xenoacutefoba em Peacutelagos de oacutedio

Na banda passadaFactos meio delidos ascendem HuacutemidosDo bauacute das memoacuteriasEacute a velha matildee ndash seca boca de taacutebuaNa sua saacutebia demecircnciaPosta de peacute num templo anteriorA gritar o que envergonha a ambasAgraves trecircsAgraves filhas todasAo governo agrave banca ao mundoA DeusNo seu trono flamejanteDe goacutetico gordoEste Deus que jaacute soacute servePara as velhas lhe darem de comer

Gare Lille Flandres

Tavernas onde barroca cervejaDourada RiE tambeacutem nadando em natas o rubicundo mexilhatildeo

Lembro lido em memoacuterias Ou roteiro flosoacutefico (sem erro ortograacutefico)De Joatildeo da Silva FeijoacuteA nota sobre os bandos de flamengos

8

Que estacionavam Sobre as roacuteseas salinas de Pedra LumeEm Cabo Verde Chega a inflamada sobremesaNeste famoso bar de nome Aux Trois BrasseursA fachada evocadoraDo goacutetico fotografasteDecerto para o facebook Flama devia ser o nuacutecleoEmbrionaacuterio desta famiacutelia que natildeo eacute soacuteDe aves em rubros bandos Natildeo concordas C Refiro-me ao flamejanteTambeacutem com a sua muacutesica Danccedilam saias de bolas e folhosE rapazes empertigados sobre saltos altosO drama em som e movimentoE o flamenco a preto e branco Tatildeo cheio deMachidade E empolgante Soacute o nosso fandango Mesmo sem etimologia Flama eacute o que na matriz danccedilaQueijo Rubens enfim o que eacute llamejanteO que eacute labaredaE chamativo o que eacute Espiacuterito Santo Em liacutenguas vermelhas

O que flui nos regos da escrita eacute sangue ndash rematarias tuHH Hans Memling ndash pintor flamenco (Na versatildeo espanhola da palavra)

Recebi um postal teu Herberto com uma imagem Dele ndash a SibilaSambetha uma que os versos te arrebateDo turbilhatildeo do segredo e abra em doisComo valvas de vieira de Santiago a concha PectenA pintura entreabre A porta a signos dourados asas em bardosDe flamingos vindos de umaEspetacular imagemNum filme cujo tiacutetuloNatildeo eacute Aacutefrica nossa apesar de o contraacuterioNos terem garantido

9

Cada um devia ter a suaBissau eacute dela Mindelo eacute teuE Angola eacute nossa

Aacutefrica Aacutefrica ndash na voz de Cesaacuteria Eacutevora ndash Aacutefrica Bbbbbbbbbbbbberccedilo di mundoAs belas dolicoceacutefalas cabeccedilasQue os faraoacutes e as cleoacutepatras imitaram~~~~Aacutefrica tua com o esplendor do poilatildeoE o pavor do Eacutebola

Ponto de fuga ndash refuacutegio ndash a velha matildee Que tambeacutem deacutecadas passou na GuineacuteNatildeo recorda o passado A sua maacutegoa eacute presenteViva flama rediviva Ela reside no passadoArde Ana Prima Ana Chama os bombeirosNatildeo recorda o teu pai natildeo se lembra de AacutefricaVive pela terceira e quarta vez cenas muito seletasNa panoacuteplia do que de mais infeliz lhe aconteceu ndashUma filha libertaacuteria sexualmente livre Natildeo sei como te tornaste tatildeo Rebelde Agrave tua matildeeA outra a roubar-lhe terra e terratenecircnciaCom abuso de confianccedila e burlaSofre pela segunda e terceira vezComo se fora agora ndash dor flamboyante Ascende No restaurantePelas colunas do ceacuteu inebriaCom o seu perfume accedilucaradoDe sobremesaOs olhos num ecircxtase de Aacutevila Santa Teresa as papilas Gustativas antecipando deliacuterios perfumadosDo que jaacute pouco existe ndash Bravos-de-esmolfoRainhas-claacuteudias ou cagoiccedilosFigos pingo-de-melNecircsperasUvas moscatel eMaccedilatildes camoesas

Foi para antes e para fora

10

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 2: FOLHAS DE FLANDRES

INDICE

I FOLHAS DE FLANDRESEscaldaGare du NordGare Lille FlandresCompanheiroHotel Pelican drsquoOrLa Maison BlancheTemple des Charbonniers Comboios que natildeo vatildeo para SingapuraHotel Bristol

II DESGARRADAS amp DIVERSAS FOLHASBarahona

O artista Antoacutenio BarrosMorna da Baiacutea das GatasUma cadela em casa de xisto

2

I FOLHAS DE FLANDRES

Escalda

A paisagem jaacute natildeo existe como NaturaFlui em figuras sabores e tamanhosArtificiosos Agrave maneira do EscautO que vive escalda

Em modificaccedilotildees de genesResultados bioquiacutemicosE intrusotildees mais ou menos agressivasNo organismo humanoO rio eacute vibraccedilatildeo ateia o olhar e potildee a crepitar A neblinaSobre as tonalidades de outono

Fluiram outrora de flama vestidas coloacutenias de incontaacuteveisFlamingos goacutetico oacutevulo Flamboyant

Sopra o carvatildeo C sopra-o Para que cintilem brasa e flama ndash azulNegro e vermelho ndash essecircncia da CarbonaacuteriaE ah ah ah tua machadinhaStellaMais uma pitada de accedilafratildeo e canelaBem satildeo quadrados verde-fuscos

Estes agrosQue vatildeo dar comida a tanta gente ndash couves nabosBeringelas e beterrabas suculentasEncostadas ao casario taciturno Que de Cesaacuterio Verde bem podia ter sidoReplicado

3

Nos seus adobes liacutevidos CinzentosAo longo de ruas paradasDesertas de catildees e gatosE de genteLadeiam quadriacuteculas de entediada verduraE ao fundo ereto aguardando a AlieniacutegenaDe chapeacuteu de aba larga como combinadoO B Pr Pierre arquiteto na retraiteDesenha a carvatildeo a silhueta Na tela bolorenta do ceacuteu Confundem-se Os BB PPr com os fantasmas de priacutencipes Perdidos Na floresta ndash Franccedilois IE cavaleiros monges que se fazem carvoeirosE daiacute sobem a santos ndash S Thibaud

Que S Teobaldo vele por noacutesAlongue sobre a tua grimpa a rama do carvalhoE a lacircmina da navalhaTodos na vida asneiras cometemosBoa PrimaDoloroso eacute envelhecer com elasPresentes sempreNos ramos da pensativa aacutervoreTodos recebemos feridasBoa PrimaPenoso eacute soletraacute-las continuamenteComo se nos amarasse a sombra De perpeacutetua batalha

Lobos maus anotildeezinhosLenhadores e carvoeirosRachadores e capuchinhos vermelhos Druidas Preparam o guiPara os senhores que coam memoacuterias No tamis

Que mo permitam os BB PPr de todos os BosquesMas tambeacutem peccedilo ao nosso Bom Primo Jesus CristoE ao nosso protetor S Teobaldo Que natildeo se esqueccedilam De IdeacutefixDe AsteacuterixDe ObeacutelixDe Panoramix e desseTatildeo dificilmente pronunciaacutevel

4

Or-dral-fa-beacute-tix

A matildee soletrou enquanto pocircdeE depois avisouVou ficar malucaPosto issoSentou-se com a proacutefuga cabeccedilaA viver em tempos passadosEi-la num depoacutesito social De corpos Azuis~~~ Tremulantes~~~ Descarnados~~~ Exangues~~~

Presa agrave cadeira de rodas Por uma cinta Cercada pela glossolalia do terccediloGravado em CDNatildeo liga natildeo rezaDeus em aparecircncia jaacute natildeo a trata por tuNem ela a Ele jaacute presta vassalagemUma barragem de gelo contra o divinoE a inexpressiva faceDe quem ao telefoneManda muitos cumprimentos para toda a famiacuteliaComo se natildeo fosse ela a tua famiacutelia todaComo se ouvisseComo se soubesse quem do outro lado do fioAlimenta uma conversaQue jaacute nem funccedilatildeo faacutetica Da linguagem Respeita O fio natildeo liga nada nem as falas uma agrave outraE nunca foram muitas as conversasCom quem da outra a essecircncia natildeo conheceNatildeo quis conhecerNa expectativaDe ter trazido ao mundo uma soacutesia dela

Mulheres abundantes em mamaDe casas Casinhas e casotas amantesGirando poderosas em torno das panelas

Fluida falavas com ela de comidaE pouco mais em comumHavia Entre esta pobre velha que ainda vive

5

E esta pobre filha Que usa folhas de flandresPara escrever agrave morte

Cumprimentos para toda a famiacutelia ndash repeteEcoa a mais estrangeira das matildeesSalve RainhaMatildee imaculada tronoDe misericoacuterdiaSalve ReginaMater misericordiaVita dulcedo et spes nostra salveTu que pedes perdatildeoPor ainda velares por noacutesMater DolorosaStabat Apesar de Jaacute natildeo posso fazer nadaAs grandes matildees que natildeo beijamNatildeo dizem Filho FilhaNatildeo se usava o sentimentoNa geraccedilatildeo delasAs Cibeles as GaiasHabituadas a parecer aacutelgidasBocados de geloRecusam gestos de afeto que Para elas natildeo valem nadaDepois da dececcedilatildeo tremenda

Eacute soacute mentiras ndash reclamaMatildees secas como gavetas de pinhoQue natildeo tocam natildeo falam de amor Que em vez disso datildeo de comer E em dar de comer eacute no que pensamE dizem Como ela se pocircs Soacute pensa em comerAs grandes Terras-MatildeesDe tanto filho da putaSumidaAd te suspiramos gementesParece uma anatildezinhaComo noacutes ficamos em velhosPassamos a caber numa noz

Do seu trono de rodas amarrada pela cinturaPara natildeo cair falaDeixa sair Esta gente toda

6

(Esta gente toda que jaacute natildeo ouve nem reza o terccedilo)E depois vai laacute dentro ao frigoriacuteficoAinda deve ter sobrado Alguma coisa do almoccediloPara comeres~~~

Salve ReginaIn hac lacrimarum valleO clemensO piaO dulce Virgo Preciosa

Gare du Nord

De novo a flamenga regiatildeoVai desfilar pelos vidros daCarruagem Lagos em que as lembranccedilasNavegamTendo no horizonteAacutefrica onde fundear acircncora Estas secas paisagens Apesar disso afundam-se Em cacircntarosDe aacutegua

Vais diante de mim sentadaOacute estrangeira Stella Carbono

Como no espelho a imagem mareadaNa expectativa de futuro medonho Gare du Nord ndash esta zona de Paris eis um Exemplo franceses natildeo exibeSim uma explosatildeo de indianos chinas e MuccedilulmanosDe cofioacute e belas djilabas esvoaccedilantesVindos do SenegalBateram-se em Tacircnger contra Cila e Cariacutebdis burocraacuteticosFiltros poliacuteticos da migraccedilatildeoAntes de o ferry os transportar para a utopiaEuropeia Outros por laacute ficaram Suspensos

7

Entre nenhures E parte algumaEm tracircnsito alfandegaacuterio intermitenteUm dia a invasatildeo haacute de ultrapassarOs limites do toleraacutevel E entatildeo vai Explodir Racista A bomba Xenoacutefoba em Peacutelagos de oacutedio

Na banda passadaFactos meio delidos ascendem HuacutemidosDo bauacute das memoacuteriasEacute a velha matildee ndash seca boca de taacutebuaNa sua saacutebia demecircnciaPosta de peacute num templo anteriorA gritar o que envergonha a ambasAgraves trecircsAgraves filhas todasAo governo agrave banca ao mundoA DeusNo seu trono flamejanteDe goacutetico gordoEste Deus que jaacute soacute servePara as velhas lhe darem de comer

Gare Lille Flandres

Tavernas onde barroca cervejaDourada RiE tambeacutem nadando em natas o rubicundo mexilhatildeo

Lembro lido em memoacuterias Ou roteiro flosoacutefico (sem erro ortograacutefico)De Joatildeo da Silva FeijoacuteA nota sobre os bandos de flamengos

8

Que estacionavam Sobre as roacuteseas salinas de Pedra LumeEm Cabo Verde Chega a inflamada sobremesaNeste famoso bar de nome Aux Trois BrasseursA fachada evocadoraDo goacutetico fotografasteDecerto para o facebook Flama devia ser o nuacutecleoEmbrionaacuterio desta famiacutelia que natildeo eacute soacuteDe aves em rubros bandos Natildeo concordas C Refiro-me ao flamejanteTambeacutem com a sua muacutesica Danccedilam saias de bolas e folhosE rapazes empertigados sobre saltos altosO drama em som e movimentoE o flamenco a preto e branco Tatildeo cheio deMachidade E empolgante Soacute o nosso fandango Mesmo sem etimologia Flama eacute o que na matriz danccedilaQueijo Rubens enfim o que eacute llamejanteO que eacute labaredaE chamativo o que eacute Espiacuterito Santo Em liacutenguas vermelhas

O que flui nos regos da escrita eacute sangue ndash rematarias tuHH Hans Memling ndash pintor flamenco (Na versatildeo espanhola da palavra)

Recebi um postal teu Herberto com uma imagem Dele ndash a SibilaSambetha uma que os versos te arrebateDo turbilhatildeo do segredo e abra em doisComo valvas de vieira de Santiago a concha PectenA pintura entreabre A porta a signos dourados asas em bardosDe flamingos vindos de umaEspetacular imagemNum filme cujo tiacutetuloNatildeo eacute Aacutefrica nossa apesar de o contraacuterioNos terem garantido

9

Cada um devia ter a suaBissau eacute dela Mindelo eacute teuE Angola eacute nossa

Aacutefrica Aacutefrica ndash na voz de Cesaacuteria Eacutevora ndash Aacutefrica Bbbbbbbbbbbbberccedilo di mundoAs belas dolicoceacutefalas cabeccedilasQue os faraoacutes e as cleoacutepatras imitaram~~~~Aacutefrica tua com o esplendor do poilatildeoE o pavor do Eacutebola

Ponto de fuga ndash refuacutegio ndash a velha matildee Que tambeacutem deacutecadas passou na GuineacuteNatildeo recorda o passado A sua maacutegoa eacute presenteViva flama rediviva Ela reside no passadoArde Ana Prima Ana Chama os bombeirosNatildeo recorda o teu pai natildeo se lembra de AacutefricaVive pela terceira e quarta vez cenas muito seletasNa panoacuteplia do que de mais infeliz lhe aconteceu ndashUma filha libertaacuteria sexualmente livre Natildeo sei como te tornaste tatildeo Rebelde Agrave tua matildeeA outra a roubar-lhe terra e terratenecircnciaCom abuso de confianccedila e burlaSofre pela segunda e terceira vezComo se fora agora ndash dor flamboyante Ascende No restaurantePelas colunas do ceacuteu inebriaCom o seu perfume accedilucaradoDe sobremesaOs olhos num ecircxtase de Aacutevila Santa Teresa as papilas Gustativas antecipando deliacuterios perfumadosDo que jaacute pouco existe ndash Bravos-de-esmolfoRainhas-claacuteudias ou cagoiccedilosFigos pingo-de-melNecircsperasUvas moscatel eMaccedilatildes camoesas

Foi para antes e para fora

10

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 3: FOLHAS DE FLANDRES

I FOLHAS DE FLANDRES

Escalda

A paisagem jaacute natildeo existe como NaturaFlui em figuras sabores e tamanhosArtificiosos Agrave maneira do EscautO que vive escalda

Em modificaccedilotildees de genesResultados bioquiacutemicosE intrusotildees mais ou menos agressivasNo organismo humanoO rio eacute vibraccedilatildeo ateia o olhar e potildee a crepitar A neblinaSobre as tonalidades de outono

Fluiram outrora de flama vestidas coloacutenias de incontaacuteveisFlamingos goacutetico oacutevulo Flamboyant

Sopra o carvatildeo C sopra-o Para que cintilem brasa e flama ndash azulNegro e vermelho ndash essecircncia da CarbonaacuteriaE ah ah ah tua machadinhaStellaMais uma pitada de accedilafratildeo e canelaBem satildeo quadrados verde-fuscos

Estes agrosQue vatildeo dar comida a tanta gente ndash couves nabosBeringelas e beterrabas suculentasEncostadas ao casario taciturno Que de Cesaacuterio Verde bem podia ter sidoReplicado

3

Nos seus adobes liacutevidos CinzentosAo longo de ruas paradasDesertas de catildees e gatosE de genteLadeiam quadriacuteculas de entediada verduraE ao fundo ereto aguardando a AlieniacutegenaDe chapeacuteu de aba larga como combinadoO B Pr Pierre arquiteto na retraiteDesenha a carvatildeo a silhueta Na tela bolorenta do ceacuteu Confundem-se Os BB PPr com os fantasmas de priacutencipes Perdidos Na floresta ndash Franccedilois IE cavaleiros monges que se fazem carvoeirosE daiacute sobem a santos ndash S Thibaud

Que S Teobaldo vele por noacutesAlongue sobre a tua grimpa a rama do carvalhoE a lacircmina da navalhaTodos na vida asneiras cometemosBoa PrimaDoloroso eacute envelhecer com elasPresentes sempreNos ramos da pensativa aacutervoreTodos recebemos feridasBoa PrimaPenoso eacute soletraacute-las continuamenteComo se nos amarasse a sombra De perpeacutetua batalha

Lobos maus anotildeezinhosLenhadores e carvoeirosRachadores e capuchinhos vermelhos Druidas Preparam o guiPara os senhores que coam memoacuterias No tamis

Que mo permitam os BB PPr de todos os BosquesMas tambeacutem peccedilo ao nosso Bom Primo Jesus CristoE ao nosso protetor S Teobaldo Que natildeo se esqueccedilam De IdeacutefixDe AsteacuterixDe ObeacutelixDe Panoramix e desseTatildeo dificilmente pronunciaacutevel

4

Or-dral-fa-beacute-tix

A matildee soletrou enquanto pocircdeE depois avisouVou ficar malucaPosto issoSentou-se com a proacutefuga cabeccedilaA viver em tempos passadosEi-la num depoacutesito social De corpos Azuis~~~ Tremulantes~~~ Descarnados~~~ Exangues~~~

Presa agrave cadeira de rodas Por uma cinta Cercada pela glossolalia do terccediloGravado em CDNatildeo liga natildeo rezaDeus em aparecircncia jaacute natildeo a trata por tuNem ela a Ele jaacute presta vassalagemUma barragem de gelo contra o divinoE a inexpressiva faceDe quem ao telefoneManda muitos cumprimentos para toda a famiacuteliaComo se natildeo fosse ela a tua famiacutelia todaComo se ouvisseComo se soubesse quem do outro lado do fioAlimenta uma conversaQue jaacute nem funccedilatildeo faacutetica Da linguagem Respeita O fio natildeo liga nada nem as falas uma agrave outraE nunca foram muitas as conversasCom quem da outra a essecircncia natildeo conheceNatildeo quis conhecerNa expectativaDe ter trazido ao mundo uma soacutesia dela

Mulheres abundantes em mamaDe casas Casinhas e casotas amantesGirando poderosas em torno das panelas

Fluida falavas com ela de comidaE pouco mais em comumHavia Entre esta pobre velha que ainda vive

5

E esta pobre filha Que usa folhas de flandresPara escrever agrave morte

Cumprimentos para toda a famiacutelia ndash repeteEcoa a mais estrangeira das matildeesSalve RainhaMatildee imaculada tronoDe misericoacuterdiaSalve ReginaMater misericordiaVita dulcedo et spes nostra salveTu que pedes perdatildeoPor ainda velares por noacutesMater DolorosaStabat Apesar de Jaacute natildeo posso fazer nadaAs grandes matildees que natildeo beijamNatildeo dizem Filho FilhaNatildeo se usava o sentimentoNa geraccedilatildeo delasAs Cibeles as GaiasHabituadas a parecer aacutelgidasBocados de geloRecusam gestos de afeto que Para elas natildeo valem nadaDepois da dececcedilatildeo tremenda

Eacute soacute mentiras ndash reclamaMatildees secas como gavetas de pinhoQue natildeo tocam natildeo falam de amor Que em vez disso datildeo de comer E em dar de comer eacute no que pensamE dizem Como ela se pocircs Soacute pensa em comerAs grandes Terras-MatildeesDe tanto filho da putaSumidaAd te suspiramos gementesParece uma anatildezinhaComo noacutes ficamos em velhosPassamos a caber numa noz

Do seu trono de rodas amarrada pela cinturaPara natildeo cair falaDeixa sair Esta gente toda

6

(Esta gente toda que jaacute natildeo ouve nem reza o terccedilo)E depois vai laacute dentro ao frigoriacuteficoAinda deve ter sobrado Alguma coisa do almoccediloPara comeres~~~

Salve ReginaIn hac lacrimarum valleO clemensO piaO dulce Virgo Preciosa

Gare du Nord

De novo a flamenga regiatildeoVai desfilar pelos vidros daCarruagem Lagos em que as lembranccedilasNavegamTendo no horizonteAacutefrica onde fundear acircncora Estas secas paisagens Apesar disso afundam-se Em cacircntarosDe aacutegua

Vais diante de mim sentadaOacute estrangeira Stella Carbono

Como no espelho a imagem mareadaNa expectativa de futuro medonho Gare du Nord ndash esta zona de Paris eis um Exemplo franceses natildeo exibeSim uma explosatildeo de indianos chinas e MuccedilulmanosDe cofioacute e belas djilabas esvoaccedilantesVindos do SenegalBateram-se em Tacircnger contra Cila e Cariacutebdis burocraacuteticosFiltros poliacuteticos da migraccedilatildeoAntes de o ferry os transportar para a utopiaEuropeia Outros por laacute ficaram Suspensos

7

Entre nenhures E parte algumaEm tracircnsito alfandegaacuterio intermitenteUm dia a invasatildeo haacute de ultrapassarOs limites do toleraacutevel E entatildeo vai Explodir Racista A bomba Xenoacutefoba em Peacutelagos de oacutedio

Na banda passadaFactos meio delidos ascendem HuacutemidosDo bauacute das memoacuteriasEacute a velha matildee ndash seca boca de taacutebuaNa sua saacutebia demecircnciaPosta de peacute num templo anteriorA gritar o que envergonha a ambasAgraves trecircsAgraves filhas todasAo governo agrave banca ao mundoA DeusNo seu trono flamejanteDe goacutetico gordoEste Deus que jaacute soacute servePara as velhas lhe darem de comer

Gare Lille Flandres

Tavernas onde barroca cervejaDourada RiE tambeacutem nadando em natas o rubicundo mexilhatildeo

Lembro lido em memoacuterias Ou roteiro flosoacutefico (sem erro ortograacutefico)De Joatildeo da Silva FeijoacuteA nota sobre os bandos de flamengos

8

Que estacionavam Sobre as roacuteseas salinas de Pedra LumeEm Cabo Verde Chega a inflamada sobremesaNeste famoso bar de nome Aux Trois BrasseursA fachada evocadoraDo goacutetico fotografasteDecerto para o facebook Flama devia ser o nuacutecleoEmbrionaacuterio desta famiacutelia que natildeo eacute soacuteDe aves em rubros bandos Natildeo concordas C Refiro-me ao flamejanteTambeacutem com a sua muacutesica Danccedilam saias de bolas e folhosE rapazes empertigados sobre saltos altosO drama em som e movimentoE o flamenco a preto e branco Tatildeo cheio deMachidade E empolgante Soacute o nosso fandango Mesmo sem etimologia Flama eacute o que na matriz danccedilaQueijo Rubens enfim o que eacute llamejanteO que eacute labaredaE chamativo o que eacute Espiacuterito Santo Em liacutenguas vermelhas

O que flui nos regos da escrita eacute sangue ndash rematarias tuHH Hans Memling ndash pintor flamenco (Na versatildeo espanhola da palavra)

Recebi um postal teu Herberto com uma imagem Dele ndash a SibilaSambetha uma que os versos te arrebateDo turbilhatildeo do segredo e abra em doisComo valvas de vieira de Santiago a concha PectenA pintura entreabre A porta a signos dourados asas em bardosDe flamingos vindos de umaEspetacular imagemNum filme cujo tiacutetuloNatildeo eacute Aacutefrica nossa apesar de o contraacuterioNos terem garantido

9

Cada um devia ter a suaBissau eacute dela Mindelo eacute teuE Angola eacute nossa

Aacutefrica Aacutefrica ndash na voz de Cesaacuteria Eacutevora ndash Aacutefrica Bbbbbbbbbbbbberccedilo di mundoAs belas dolicoceacutefalas cabeccedilasQue os faraoacutes e as cleoacutepatras imitaram~~~~Aacutefrica tua com o esplendor do poilatildeoE o pavor do Eacutebola

Ponto de fuga ndash refuacutegio ndash a velha matildee Que tambeacutem deacutecadas passou na GuineacuteNatildeo recorda o passado A sua maacutegoa eacute presenteViva flama rediviva Ela reside no passadoArde Ana Prima Ana Chama os bombeirosNatildeo recorda o teu pai natildeo se lembra de AacutefricaVive pela terceira e quarta vez cenas muito seletasNa panoacuteplia do que de mais infeliz lhe aconteceu ndashUma filha libertaacuteria sexualmente livre Natildeo sei como te tornaste tatildeo Rebelde Agrave tua matildeeA outra a roubar-lhe terra e terratenecircnciaCom abuso de confianccedila e burlaSofre pela segunda e terceira vezComo se fora agora ndash dor flamboyante Ascende No restaurantePelas colunas do ceacuteu inebriaCom o seu perfume accedilucaradoDe sobremesaOs olhos num ecircxtase de Aacutevila Santa Teresa as papilas Gustativas antecipando deliacuterios perfumadosDo que jaacute pouco existe ndash Bravos-de-esmolfoRainhas-claacuteudias ou cagoiccedilosFigos pingo-de-melNecircsperasUvas moscatel eMaccedilatildes camoesas

Foi para antes e para fora

10

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 4: FOLHAS DE FLANDRES

Nos seus adobes liacutevidos CinzentosAo longo de ruas paradasDesertas de catildees e gatosE de genteLadeiam quadriacuteculas de entediada verduraE ao fundo ereto aguardando a AlieniacutegenaDe chapeacuteu de aba larga como combinadoO B Pr Pierre arquiteto na retraiteDesenha a carvatildeo a silhueta Na tela bolorenta do ceacuteu Confundem-se Os BB PPr com os fantasmas de priacutencipes Perdidos Na floresta ndash Franccedilois IE cavaleiros monges que se fazem carvoeirosE daiacute sobem a santos ndash S Thibaud

Que S Teobaldo vele por noacutesAlongue sobre a tua grimpa a rama do carvalhoE a lacircmina da navalhaTodos na vida asneiras cometemosBoa PrimaDoloroso eacute envelhecer com elasPresentes sempreNos ramos da pensativa aacutervoreTodos recebemos feridasBoa PrimaPenoso eacute soletraacute-las continuamenteComo se nos amarasse a sombra De perpeacutetua batalha

Lobos maus anotildeezinhosLenhadores e carvoeirosRachadores e capuchinhos vermelhos Druidas Preparam o guiPara os senhores que coam memoacuterias No tamis

Que mo permitam os BB PPr de todos os BosquesMas tambeacutem peccedilo ao nosso Bom Primo Jesus CristoE ao nosso protetor S Teobaldo Que natildeo se esqueccedilam De IdeacutefixDe AsteacuterixDe ObeacutelixDe Panoramix e desseTatildeo dificilmente pronunciaacutevel

4

Or-dral-fa-beacute-tix

A matildee soletrou enquanto pocircdeE depois avisouVou ficar malucaPosto issoSentou-se com a proacutefuga cabeccedilaA viver em tempos passadosEi-la num depoacutesito social De corpos Azuis~~~ Tremulantes~~~ Descarnados~~~ Exangues~~~

Presa agrave cadeira de rodas Por uma cinta Cercada pela glossolalia do terccediloGravado em CDNatildeo liga natildeo rezaDeus em aparecircncia jaacute natildeo a trata por tuNem ela a Ele jaacute presta vassalagemUma barragem de gelo contra o divinoE a inexpressiva faceDe quem ao telefoneManda muitos cumprimentos para toda a famiacuteliaComo se natildeo fosse ela a tua famiacutelia todaComo se ouvisseComo se soubesse quem do outro lado do fioAlimenta uma conversaQue jaacute nem funccedilatildeo faacutetica Da linguagem Respeita O fio natildeo liga nada nem as falas uma agrave outraE nunca foram muitas as conversasCom quem da outra a essecircncia natildeo conheceNatildeo quis conhecerNa expectativaDe ter trazido ao mundo uma soacutesia dela

Mulheres abundantes em mamaDe casas Casinhas e casotas amantesGirando poderosas em torno das panelas

Fluida falavas com ela de comidaE pouco mais em comumHavia Entre esta pobre velha que ainda vive

5

E esta pobre filha Que usa folhas de flandresPara escrever agrave morte

Cumprimentos para toda a famiacutelia ndash repeteEcoa a mais estrangeira das matildeesSalve RainhaMatildee imaculada tronoDe misericoacuterdiaSalve ReginaMater misericordiaVita dulcedo et spes nostra salveTu que pedes perdatildeoPor ainda velares por noacutesMater DolorosaStabat Apesar de Jaacute natildeo posso fazer nadaAs grandes matildees que natildeo beijamNatildeo dizem Filho FilhaNatildeo se usava o sentimentoNa geraccedilatildeo delasAs Cibeles as GaiasHabituadas a parecer aacutelgidasBocados de geloRecusam gestos de afeto que Para elas natildeo valem nadaDepois da dececcedilatildeo tremenda

Eacute soacute mentiras ndash reclamaMatildees secas como gavetas de pinhoQue natildeo tocam natildeo falam de amor Que em vez disso datildeo de comer E em dar de comer eacute no que pensamE dizem Como ela se pocircs Soacute pensa em comerAs grandes Terras-MatildeesDe tanto filho da putaSumidaAd te suspiramos gementesParece uma anatildezinhaComo noacutes ficamos em velhosPassamos a caber numa noz

Do seu trono de rodas amarrada pela cinturaPara natildeo cair falaDeixa sair Esta gente toda

6

(Esta gente toda que jaacute natildeo ouve nem reza o terccedilo)E depois vai laacute dentro ao frigoriacuteficoAinda deve ter sobrado Alguma coisa do almoccediloPara comeres~~~

Salve ReginaIn hac lacrimarum valleO clemensO piaO dulce Virgo Preciosa

Gare du Nord

De novo a flamenga regiatildeoVai desfilar pelos vidros daCarruagem Lagos em que as lembranccedilasNavegamTendo no horizonteAacutefrica onde fundear acircncora Estas secas paisagens Apesar disso afundam-se Em cacircntarosDe aacutegua

Vais diante de mim sentadaOacute estrangeira Stella Carbono

Como no espelho a imagem mareadaNa expectativa de futuro medonho Gare du Nord ndash esta zona de Paris eis um Exemplo franceses natildeo exibeSim uma explosatildeo de indianos chinas e MuccedilulmanosDe cofioacute e belas djilabas esvoaccedilantesVindos do SenegalBateram-se em Tacircnger contra Cila e Cariacutebdis burocraacuteticosFiltros poliacuteticos da migraccedilatildeoAntes de o ferry os transportar para a utopiaEuropeia Outros por laacute ficaram Suspensos

7

Entre nenhures E parte algumaEm tracircnsito alfandegaacuterio intermitenteUm dia a invasatildeo haacute de ultrapassarOs limites do toleraacutevel E entatildeo vai Explodir Racista A bomba Xenoacutefoba em Peacutelagos de oacutedio

Na banda passadaFactos meio delidos ascendem HuacutemidosDo bauacute das memoacuteriasEacute a velha matildee ndash seca boca de taacutebuaNa sua saacutebia demecircnciaPosta de peacute num templo anteriorA gritar o que envergonha a ambasAgraves trecircsAgraves filhas todasAo governo agrave banca ao mundoA DeusNo seu trono flamejanteDe goacutetico gordoEste Deus que jaacute soacute servePara as velhas lhe darem de comer

Gare Lille Flandres

Tavernas onde barroca cervejaDourada RiE tambeacutem nadando em natas o rubicundo mexilhatildeo

Lembro lido em memoacuterias Ou roteiro flosoacutefico (sem erro ortograacutefico)De Joatildeo da Silva FeijoacuteA nota sobre os bandos de flamengos

8

Que estacionavam Sobre as roacuteseas salinas de Pedra LumeEm Cabo Verde Chega a inflamada sobremesaNeste famoso bar de nome Aux Trois BrasseursA fachada evocadoraDo goacutetico fotografasteDecerto para o facebook Flama devia ser o nuacutecleoEmbrionaacuterio desta famiacutelia que natildeo eacute soacuteDe aves em rubros bandos Natildeo concordas C Refiro-me ao flamejanteTambeacutem com a sua muacutesica Danccedilam saias de bolas e folhosE rapazes empertigados sobre saltos altosO drama em som e movimentoE o flamenco a preto e branco Tatildeo cheio deMachidade E empolgante Soacute o nosso fandango Mesmo sem etimologia Flama eacute o que na matriz danccedilaQueijo Rubens enfim o que eacute llamejanteO que eacute labaredaE chamativo o que eacute Espiacuterito Santo Em liacutenguas vermelhas

O que flui nos regos da escrita eacute sangue ndash rematarias tuHH Hans Memling ndash pintor flamenco (Na versatildeo espanhola da palavra)

Recebi um postal teu Herberto com uma imagem Dele ndash a SibilaSambetha uma que os versos te arrebateDo turbilhatildeo do segredo e abra em doisComo valvas de vieira de Santiago a concha PectenA pintura entreabre A porta a signos dourados asas em bardosDe flamingos vindos de umaEspetacular imagemNum filme cujo tiacutetuloNatildeo eacute Aacutefrica nossa apesar de o contraacuterioNos terem garantido

9

Cada um devia ter a suaBissau eacute dela Mindelo eacute teuE Angola eacute nossa

Aacutefrica Aacutefrica ndash na voz de Cesaacuteria Eacutevora ndash Aacutefrica Bbbbbbbbbbbbberccedilo di mundoAs belas dolicoceacutefalas cabeccedilasQue os faraoacutes e as cleoacutepatras imitaram~~~~Aacutefrica tua com o esplendor do poilatildeoE o pavor do Eacutebola

Ponto de fuga ndash refuacutegio ndash a velha matildee Que tambeacutem deacutecadas passou na GuineacuteNatildeo recorda o passado A sua maacutegoa eacute presenteViva flama rediviva Ela reside no passadoArde Ana Prima Ana Chama os bombeirosNatildeo recorda o teu pai natildeo se lembra de AacutefricaVive pela terceira e quarta vez cenas muito seletasNa panoacuteplia do que de mais infeliz lhe aconteceu ndashUma filha libertaacuteria sexualmente livre Natildeo sei como te tornaste tatildeo Rebelde Agrave tua matildeeA outra a roubar-lhe terra e terratenecircnciaCom abuso de confianccedila e burlaSofre pela segunda e terceira vezComo se fora agora ndash dor flamboyante Ascende No restaurantePelas colunas do ceacuteu inebriaCom o seu perfume accedilucaradoDe sobremesaOs olhos num ecircxtase de Aacutevila Santa Teresa as papilas Gustativas antecipando deliacuterios perfumadosDo que jaacute pouco existe ndash Bravos-de-esmolfoRainhas-claacuteudias ou cagoiccedilosFigos pingo-de-melNecircsperasUvas moscatel eMaccedilatildes camoesas

Foi para antes e para fora

10

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 5: FOLHAS DE FLANDRES

Or-dral-fa-beacute-tix

A matildee soletrou enquanto pocircdeE depois avisouVou ficar malucaPosto issoSentou-se com a proacutefuga cabeccedilaA viver em tempos passadosEi-la num depoacutesito social De corpos Azuis~~~ Tremulantes~~~ Descarnados~~~ Exangues~~~

Presa agrave cadeira de rodas Por uma cinta Cercada pela glossolalia do terccediloGravado em CDNatildeo liga natildeo rezaDeus em aparecircncia jaacute natildeo a trata por tuNem ela a Ele jaacute presta vassalagemUma barragem de gelo contra o divinoE a inexpressiva faceDe quem ao telefoneManda muitos cumprimentos para toda a famiacuteliaComo se natildeo fosse ela a tua famiacutelia todaComo se ouvisseComo se soubesse quem do outro lado do fioAlimenta uma conversaQue jaacute nem funccedilatildeo faacutetica Da linguagem Respeita O fio natildeo liga nada nem as falas uma agrave outraE nunca foram muitas as conversasCom quem da outra a essecircncia natildeo conheceNatildeo quis conhecerNa expectativaDe ter trazido ao mundo uma soacutesia dela

Mulheres abundantes em mamaDe casas Casinhas e casotas amantesGirando poderosas em torno das panelas

Fluida falavas com ela de comidaE pouco mais em comumHavia Entre esta pobre velha que ainda vive

5

E esta pobre filha Que usa folhas de flandresPara escrever agrave morte

Cumprimentos para toda a famiacutelia ndash repeteEcoa a mais estrangeira das matildeesSalve RainhaMatildee imaculada tronoDe misericoacuterdiaSalve ReginaMater misericordiaVita dulcedo et spes nostra salveTu que pedes perdatildeoPor ainda velares por noacutesMater DolorosaStabat Apesar de Jaacute natildeo posso fazer nadaAs grandes matildees que natildeo beijamNatildeo dizem Filho FilhaNatildeo se usava o sentimentoNa geraccedilatildeo delasAs Cibeles as GaiasHabituadas a parecer aacutelgidasBocados de geloRecusam gestos de afeto que Para elas natildeo valem nadaDepois da dececcedilatildeo tremenda

Eacute soacute mentiras ndash reclamaMatildees secas como gavetas de pinhoQue natildeo tocam natildeo falam de amor Que em vez disso datildeo de comer E em dar de comer eacute no que pensamE dizem Como ela se pocircs Soacute pensa em comerAs grandes Terras-MatildeesDe tanto filho da putaSumidaAd te suspiramos gementesParece uma anatildezinhaComo noacutes ficamos em velhosPassamos a caber numa noz

Do seu trono de rodas amarrada pela cinturaPara natildeo cair falaDeixa sair Esta gente toda

6

(Esta gente toda que jaacute natildeo ouve nem reza o terccedilo)E depois vai laacute dentro ao frigoriacuteficoAinda deve ter sobrado Alguma coisa do almoccediloPara comeres~~~

Salve ReginaIn hac lacrimarum valleO clemensO piaO dulce Virgo Preciosa

Gare du Nord

De novo a flamenga regiatildeoVai desfilar pelos vidros daCarruagem Lagos em que as lembranccedilasNavegamTendo no horizonteAacutefrica onde fundear acircncora Estas secas paisagens Apesar disso afundam-se Em cacircntarosDe aacutegua

Vais diante de mim sentadaOacute estrangeira Stella Carbono

Como no espelho a imagem mareadaNa expectativa de futuro medonho Gare du Nord ndash esta zona de Paris eis um Exemplo franceses natildeo exibeSim uma explosatildeo de indianos chinas e MuccedilulmanosDe cofioacute e belas djilabas esvoaccedilantesVindos do SenegalBateram-se em Tacircnger contra Cila e Cariacutebdis burocraacuteticosFiltros poliacuteticos da migraccedilatildeoAntes de o ferry os transportar para a utopiaEuropeia Outros por laacute ficaram Suspensos

7

Entre nenhures E parte algumaEm tracircnsito alfandegaacuterio intermitenteUm dia a invasatildeo haacute de ultrapassarOs limites do toleraacutevel E entatildeo vai Explodir Racista A bomba Xenoacutefoba em Peacutelagos de oacutedio

Na banda passadaFactos meio delidos ascendem HuacutemidosDo bauacute das memoacuteriasEacute a velha matildee ndash seca boca de taacutebuaNa sua saacutebia demecircnciaPosta de peacute num templo anteriorA gritar o que envergonha a ambasAgraves trecircsAgraves filhas todasAo governo agrave banca ao mundoA DeusNo seu trono flamejanteDe goacutetico gordoEste Deus que jaacute soacute servePara as velhas lhe darem de comer

Gare Lille Flandres

Tavernas onde barroca cervejaDourada RiE tambeacutem nadando em natas o rubicundo mexilhatildeo

Lembro lido em memoacuterias Ou roteiro flosoacutefico (sem erro ortograacutefico)De Joatildeo da Silva FeijoacuteA nota sobre os bandos de flamengos

8

Que estacionavam Sobre as roacuteseas salinas de Pedra LumeEm Cabo Verde Chega a inflamada sobremesaNeste famoso bar de nome Aux Trois BrasseursA fachada evocadoraDo goacutetico fotografasteDecerto para o facebook Flama devia ser o nuacutecleoEmbrionaacuterio desta famiacutelia que natildeo eacute soacuteDe aves em rubros bandos Natildeo concordas C Refiro-me ao flamejanteTambeacutem com a sua muacutesica Danccedilam saias de bolas e folhosE rapazes empertigados sobre saltos altosO drama em som e movimentoE o flamenco a preto e branco Tatildeo cheio deMachidade E empolgante Soacute o nosso fandango Mesmo sem etimologia Flama eacute o que na matriz danccedilaQueijo Rubens enfim o que eacute llamejanteO que eacute labaredaE chamativo o que eacute Espiacuterito Santo Em liacutenguas vermelhas

O que flui nos regos da escrita eacute sangue ndash rematarias tuHH Hans Memling ndash pintor flamenco (Na versatildeo espanhola da palavra)

Recebi um postal teu Herberto com uma imagem Dele ndash a SibilaSambetha uma que os versos te arrebateDo turbilhatildeo do segredo e abra em doisComo valvas de vieira de Santiago a concha PectenA pintura entreabre A porta a signos dourados asas em bardosDe flamingos vindos de umaEspetacular imagemNum filme cujo tiacutetuloNatildeo eacute Aacutefrica nossa apesar de o contraacuterioNos terem garantido

9

Cada um devia ter a suaBissau eacute dela Mindelo eacute teuE Angola eacute nossa

Aacutefrica Aacutefrica ndash na voz de Cesaacuteria Eacutevora ndash Aacutefrica Bbbbbbbbbbbbberccedilo di mundoAs belas dolicoceacutefalas cabeccedilasQue os faraoacutes e as cleoacutepatras imitaram~~~~Aacutefrica tua com o esplendor do poilatildeoE o pavor do Eacutebola

Ponto de fuga ndash refuacutegio ndash a velha matildee Que tambeacutem deacutecadas passou na GuineacuteNatildeo recorda o passado A sua maacutegoa eacute presenteViva flama rediviva Ela reside no passadoArde Ana Prima Ana Chama os bombeirosNatildeo recorda o teu pai natildeo se lembra de AacutefricaVive pela terceira e quarta vez cenas muito seletasNa panoacuteplia do que de mais infeliz lhe aconteceu ndashUma filha libertaacuteria sexualmente livre Natildeo sei como te tornaste tatildeo Rebelde Agrave tua matildeeA outra a roubar-lhe terra e terratenecircnciaCom abuso de confianccedila e burlaSofre pela segunda e terceira vezComo se fora agora ndash dor flamboyante Ascende No restaurantePelas colunas do ceacuteu inebriaCom o seu perfume accedilucaradoDe sobremesaOs olhos num ecircxtase de Aacutevila Santa Teresa as papilas Gustativas antecipando deliacuterios perfumadosDo que jaacute pouco existe ndash Bravos-de-esmolfoRainhas-claacuteudias ou cagoiccedilosFigos pingo-de-melNecircsperasUvas moscatel eMaccedilatildes camoesas

Foi para antes e para fora

10

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 6: FOLHAS DE FLANDRES

E esta pobre filha Que usa folhas de flandresPara escrever agrave morte

Cumprimentos para toda a famiacutelia ndash repeteEcoa a mais estrangeira das matildeesSalve RainhaMatildee imaculada tronoDe misericoacuterdiaSalve ReginaMater misericordiaVita dulcedo et spes nostra salveTu que pedes perdatildeoPor ainda velares por noacutesMater DolorosaStabat Apesar de Jaacute natildeo posso fazer nadaAs grandes matildees que natildeo beijamNatildeo dizem Filho FilhaNatildeo se usava o sentimentoNa geraccedilatildeo delasAs Cibeles as GaiasHabituadas a parecer aacutelgidasBocados de geloRecusam gestos de afeto que Para elas natildeo valem nadaDepois da dececcedilatildeo tremenda

Eacute soacute mentiras ndash reclamaMatildees secas como gavetas de pinhoQue natildeo tocam natildeo falam de amor Que em vez disso datildeo de comer E em dar de comer eacute no que pensamE dizem Como ela se pocircs Soacute pensa em comerAs grandes Terras-MatildeesDe tanto filho da putaSumidaAd te suspiramos gementesParece uma anatildezinhaComo noacutes ficamos em velhosPassamos a caber numa noz

Do seu trono de rodas amarrada pela cinturaPara natildeo cair falaDeixa sair Esta gente toda

6

(Esta gente toda que jaacute natildeo ouve nem reza o terccedilo)E depois vai laacute dentro ao frigoriacuteficoAinda deve ter sobrado Alguma coisa do almoccediloPara comeres~~~

Salve ReginaIn hac lacrimarum valleO clemensO piaO dulce Virgo Preciosa

Gare du Nord

De novo a flamenga regiatildeoVai desfilar pelos vidros daCarruagem Lagos em que as lembranccedilasNavegamTendo no horizonteAacutefrica onde fundear acircncora Estas secas paisagens Apesar disso afundam-se Em cacircntarosDe aacutegua

Vais diante de mim sentadaOacute estrangeira Stella Carbono

Como no espelho a imagem mareadaNa expectativa de futuro medonho Gare du Nord ndash esta zona de Paris eis um Exemplo franceses natildeo exibeSim uma explosatildeo de indianos chinas e MuccedilulmanosDe cofioacute e belas djilabas esvoaccedilantesVindos do SenegalBateram-se em Tacircnger contra Cila e Cariacutebdis burocraacuteticosFiltros poliacuteticos da migraccedilatildeoAntes de o ferry os transportar para a utopiaEuropeia Outros por laacute ficaram Suspensos

7

Entre nenhures E parte algumaEm tracircnsito alfandegaacuterio intermitenteUm dia a invasatildeo haacute de ultrapassarOs limites do toleraacutevel E entatildeo vai Explodir Racista A bomba Xenoacutefoba em Peacutelagos de oacutedio

Na banda passadaFactos meio delidos ascendem HuacutemidosDo bauacute das memoacuteriasEacute a velha matildee ndash seca boca de taacutebuaNa sua saacutebia demecircnciaPosta de peacute num templo anteriorA gritar o que envergonha a ambasAgraves trecircsAgraves filhas todasAo governo agrave banca ao mundoA DeusNo seu trono flamejanteDe goacutetico gordoEste Deus que jaacute soacute servePara as velhas lhe darem de comer

Gare Lille Flandres

Tavernas onde barroca cervejaDourada RiE tambeacutem nadando em natas o rubicundo mexilhatildeo

Lembro lido em memoacuterias Ou roteiro flosoacutefico (sem erro ortograacutefico)De Joatildeo da Silva FeijoacuteA nota sobre os bandos de flamengos

8

Que estacionavam Sobre as roacuteseas salinas de Pedra LumeEm Cabo Verde Chega a inflamada sobremesaNeste famoso bar de nome Aux Trois BrasseursA fachada evocadoraDo goacutetico fotografasteDecerto para o facebook Flama devia ser o nuacutecleoEmbrionaacuterio desta famiacutelia que natildeo eacute soacuteDe aves em rubros bandos Natildeo concordas C Refiro-me ao flamejanteTambeacutem com a sua muacutesica Danccedilam saias de bolas e folhosE rapazes empertigados sobre saltos altosO drama em som e movimentoE o flamenco a preto e branco Tatildeo cheio deMachidade E empolgante Soacute o nosso fandango Mesmo sem etimologia Flama eacute o que na matriz danccedilaQueijo Rubens enfim o que eacute llamejanteO que eacute labaredaE chamativo o que eacute Espiacuterito Santo Em liacutenguas vermelhas

O que flui nos regos da escrita eacute sangue ndash rematarias tuHH Hans Memling ndash pintor flamenco (Na versatildeo espanhola da palavra)

Recebi um postal teu Herberto com uma imagem Dele ndash a SibilaSambetha uma que os versos te arrebateDo turbilhatildeo do segredo e abra em doisComo valvas de vieira de Santiago a concha PectenA pintura entreabre A porta a signos dourados asas em bardosDe flamingos vindos de umaEspetacular imagemNum filme cujo tiacutetuloNatildeo eacute Aacutefrica nossa apesar de o contraacuterioNos terem garantido

9

Cada um devia ter a suaBissau eacute dela Mindelo eacute teuE Angola eacute nossa

Aacutefrica Aacutefrica ndash na voz de Cesaacuteria Eacutevora ndash Aacutefrica Bbbbbbbbbbbbberccedilo di mundoAs belas dolicoceacutefalas cabeccedilasQue os faraoacutes e as cleoacutepatras imitaram~~~~Aacutefrica tua com o esplendor do poilatildeoE o pavor do Eacutebola

Ponto de fuga ndash refuacutegio ndash a velha matildee Que tambeacutem deacutecadas passou na GuineacuteNatildeo recorda o passado A sua maacutegoa eacute presenteViva flama rediviva Ela reside no passadoArde Ana Prima Ana Chama os bombeirosNatildeo recorda o teu pai natildeo se lembra de AacutefricaVive pela terceira e quarta vez cenas muito seletasNa panoacuteplia do que de mais infeliz lhe aconteceu ndashUma filha libertaacuteria sexualmente livre Natildeo sei como te tornaste tatildeo Rebelde Agrave tua matildeeA outra a roubar-lhe terra e terratenecircnciaCom abuso de confianccedila e burlaSofre pela segunda e terceira vezComo se fora agora ndash dor flamboyante Ascende No restaurantePelas colunas do ceacuteu inebriaCom o seu perfume accedilucaradoDe sobremesaOs olhos num ecircxtase de Aacutevila Santa Teresa as papilas Gustativas antecipando deliacuterios perfumadosDo que jaacute pouco existe ndash Bravos-de-esmolfoRainhas-claacuteudias ou cagoiccedilosFigos pingo-de-melNecircsperasUvas moscatel eMaccedilatildes camoesas

Foi para antes e para fora

10

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 7: FOLHAS DE FLANDRES

(Esta gente toda que jaacute natildeo ouve nem reza o terccedilo)E depois vai laacute dentro ao frigoriacuteficoAinda deve ter sobrado Alguma coisa do almoccediloPara comeres~~~

Salve ReginaIn hac lacrimarum valleO clemensO piaO dulce Virgo Preciosa

Gare du Nord

De novo a flamenga regiatildeoVai desfilar pelos vidros daCarruagem Lagos em que as lembranccedilasNavegamTendo no horizonteAacutefrica onde fundear acircncora Estas secas paisagens Apesar disso afundam-se Em cacircntarosDe aacutegua

Vais diante de mim sentadaOacute estrangeira Stella Carbono

Como no espelho a imagem mareadaNa expectativa de futuro medonho Gare du Nord ndash esta zona de Paris eis um Exemplo franceses natildeo exibeSim uma explosatildeo de indianos chinas e MuccedilulmanosDe cofioacute e belas djilabas esvoaccedilantesVindos do SenegalBateram-se em Tacircnger contra Cila e Cariacutebdis burocraacuteticosFiltros poliacuteticos da migraccedilatildeoAntes de o ferry os transportar para a utopiaEuropeia Outros por laacute ficaram Suspensos

7

Entre nenhures E parte algumaEm tracircnsito alfandegaacuterio intermitenteUm dia a invasatildeo haacute de ultrapassarOs limites do toleraacutevel E entatildeo vai Explodir Racista A bomba Xenoacutefoba em Peacutelagos de oacutedio

Na banda passadaFactos meio delidos ascendem HuacutemidosDo bauacute das memoacuteriasEacute a velha matildee ndash seca boca de taacutebuaNa sua saacutebia demecircnciaPosta de peacute num templo anteriorA gritar o que envergonha a ambasAgraves trecircsAgraves filhas todasAo governo agrave banca ao mundoA DeusNo seu trono flamejanteDe goacutetico gordoEste Deus que jaacute soacute servePara as velhas lhe darem de comer

Gare Lille Flandres

Tavernas onde barroca cervejaDourada RiE tambeacutem nadando em natas o rubicundo mexilhatildeo

Lembro lido em memoacuterias Ou roteiro flosoacutefico (sem erro ortograacutefico)De Joatildeo da Silva FeijoacuteA nota sobre os bandos de flamengos

8

Que estacionavam Sobre as roacuteseas salinas de Pedra LumeEm Cabo Verde Chega a inflamada sobremesaNeste famoso bar de nome Aux Trois BrasseursA fachada evocadoraDo goacutetico fotografasteDecerto para o facebook Flama devia ser o nuacutecleoEmbrionaacuterio desta famiacutelia que natildeo eacute soacuteDe aves em rubros bandos Natildeo concordas C Refiro-me ao flamejanteTambeacutem com a sua muacutesica Danccedilam saias de bolas e folhosE rapazes empertigados sobre saltos altosO drama em som e movimentoE o flamenco a preto e branco Tatildeo cheio deMachidade E empolgante Soacute o nosso fandango Mesmo sem etimologia Flama eacute o que na matriz danccedilaQueijo Rubens enfim o que eacute llamejanteO que eacute labaredaE chamativo o que eacute Espiacuterito Santo Em liacutenguas vermelhas

O que flui nos regos da escrita eacute sangue ndash rematarias tuHH Hans Memling ndash pintor flamenco (Na versatildeo espanhola da palavra)

Recebi um postal teu Herberto com uma imagem Dele ndash a SibilaSambetha uma que os versos te arrebateDo turbilhatildeo do segredo e abra em doisComo valvas de vieira de Santiago a concha PectenA pintura entreabre A porta a signos dourados asas em bardosDe flamingos vindos de umaEspetacular imagemNum filme cujo tiacutetuloNatildeo eacute Aacutefrica nossa apesar de o contraacuterioNos terem garantido

9

Cada um devia ter a suaBissau eacute dela Mindelo eacute teuE Angola eacute nossa

Aacutefrica Aacutefrica ndash na voz de Cesaacuteria Eacutevora ndash Aacutefrica Bbbbbbbbbbbbberccedilo di mundoAs belas dolicoceacutefalas cabeccedilasQue os faraoacutes e as cleoacutepatras imitaram~~~~Aacutefrica tua com o esplendor do poilatildeoE o pavor do Eacutebola

Ponto de fuga ndash refuacutegio ndash a velha matildee Que tambeacutem deacutecadas passou na GuineacuteNatildeo recorda o passado A sua maacutegoa eacute presenteViva flama rediviva Ela reside no passadoArde Ana Prima Ana Chama os bombeirosNatildeo recorda o teu pai natildeo se lembra de AacutefricaVive pela terceira e quarta vez cenas muito seletasNa panoacuteplia do que de mais infeliz lhe aconteceu ndashUma filha libertaacuteria sexualmente livre Natildeo sei como te tornaste tatildeo Rebelde Agrave tua matildeeA outra a roubar-lhe terra e terratenecircnciaCom abuso de confianccedila e burlaSofre pela segunda e terceira vezComo se fora agora ndash dor flamboyante Ascende No restaurantePelas colunas do ceacuteu inebriaCom o seu perfume accedilucaradoDe sobremesaOs olhos num ecircxtase de Aacutevila Santa Teresa as papilas Gustativas antecipando deliacuterios perfumadosDo que jaacute pouco existe ndash Bravos-de-esmolfoRainhas-claacuteudias ou cagoiccedilosFigos pingo-de-melNecircsperasUvas moscatel eMaccedilatildes camoesas

Foi para antes e para fora

10

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 8: FOLHAS DE FLANDRES

Entre nenhures E parte algumaEm tracircnsito alfandegaacuterio intermitenteUm dia a invasatildeo haacute de ultrapassarOs limites do toleraacutevel E entatildeo vai Explodir Racista A bomba Xenoacutefoba em Peacutelagos de oacutedio

Na banda passadaFactos meio delidos ascendem HuacutemidosDo bauacute das memoacuteriasEacute a velha matildee ndash seca boca de taacutebuaNa sua saacutebia demecircnciaPosta de peacute num templo anteriorA gritar o que envergonha a ambasAgraves trecircsAgraves filhas todasAo governo agrave banca ao mundoA DeusNo seu trono flamejanteDe goacutetico gordoEste Deus que jaacute soacute servePara as velhas lhe darem de comer

Gare Lille Flandres

Tavernas onde barroca cervejaDourada RiE tambeacutem nadando em natas o rubicundo mexilhatildeo

Lembro lido em memoacuterias Ou roteiro flosoacutefico (sem erro ortograacutefico)De Joatildeo da Silva FeijoacuteA nota sobre os bandos de flamengos

8

Que estacionavam Sobre as roacuteseas salinas de Pedra LumeEm Cabo Verde Chega a inflamada sobremesaNeste famoso bar de nome Aux Trois BrasseursA fachada evocadoraDo goacutetico fotografasteDecerto para o facebook Flama devia ser o nuacutecleoEmbrionaacuterio desta famiacutelia que natildeo eacute soacuteDe aves em rubros bandos Natildeo concordas C Refiro-me ao flamejanteTambeacutem com a sua muacutesica Danccedilam saias de bolas e folhosE rapazes empertigados sobre saltos altosO drama em som e movimentoE o flamenco a preto e branco Tatildeo cheio deMachidade E empolgante Soacute o nosso fandango Mesmo sem etimologia Flama eacute o que na matriz danccedilaQueijo Rubens enfim o que eacute llamejanteO que eacute labaredaE chamativo o que eacute Espiacuterito Santo Em liacutenguas vermelhas

O que flui nos regos da escrita eacute sangue ndash rematarias tuHH Hans Memling ndash pintor flamenco (Na versatildeo espanhola da palavra)

Recebi um postal teu Herberto com uma imagem Dele ndash a SibilaSambetha uma que os versos te arrebateDo turbilhatildeo do segredo e abra em doisComo valvas de vieira de Santiago a concha PectenA pintura entreabre A porta a signos dourados asas em bardosDe flamingos vindos de umaEspetacular imagemNum filme cujo tiacutetuloNatildeo eacute Aacutefrica nossa apesar de o contraacuterioNos terem garantido

9

Cada um devia ter a suaBissau eacute dela Mindelo eacute teuE Angola eacute nossa

Aacutefrica Aacutefrica ndash na voz de Cesaacuteria Eacutevora ndash Aacutefrica Bbbbbbbbbbbbberccedilo di mundoAs belas dolicoceacutefalas cabeccedilasQue os faraoacutes e as cleoacutepatras imitaram~~~~Aacutefrica tua com o esplendor do poilatildeoE o pavor do Eacutebola

Ponto de fuga ndash refuacutegio ndash a velha matildee Que tambeacutem deacutecadas passou na GuineacuteNatildeo recorda o passado A sua maacutegoa eacute presenteViva flama rediviva Ela reside no passadoArde Ana Prima Ana Chama os bombeirosNatildeo recorda o teu pai natildeo se lembra de AacutefricaVive pela terceira e quarta vez cenas muito seletasNa panoacuteplia do que de mais infeliz lhe aconteceu ndashUma filha libertaacuteria sexualmente livre Natildeo sei como te tornaste tatildeo Rebelde Agrave tua matildeeA outra a roubar-lhe terra e terratenecircnciaCom abuso de confianccedila e burlaSofre pela segunda e terceira vezComo se fora agora ndash dor flamboyante Ascende No restaurantePelas colunas do ceacuteu inebriaCom o seu perfume accedilucaradoDe sobremesaOs olhos num ecircxtase de Aacutevila Santa Teresa as papilas Gustativas antecipando deliacuterios perfumadosDo que jaacute pouco existe ndash Bravos-de-esmolfoRainhas-claacuteudias ou cagoiccedilosFigos pingo-de-melNecircsperasUvas moscatel eMaccedilatildes camoesas

Foi para antes e para fora

10

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 9: FOLHAS DE FLANDRES

Que estacionavam Sobre as roacuteseas salinas de Pedra LumeEm Cabo Verde Chega a inflamada sobremesaNeste famoso bar de nome Aux Trois BrasseursA fachada evocadoraDo goacutetico fotografasteDecerto para o facebook Flama devia ser o nuacutecleoEmbrionaacuterio desta famiacutelia que natildeo eacute soacuteDe aves em rubros bandos Natildeo concordas C Refiro-me ao flamejanteTambeacutem com a sua muacutesica Danccedilam saias de bolas e folhosE rapazes empertigados sobre saltos altosO drama em som e movimentoE o flamenco a preto e branco Tatildeo cheio deMachidade E empolgante Soacute o nosso fandango Mesmo sem etimologia Flama eacute o que na matriz danccedilaQueijo Rubens enfim o que eacute llamejanteO que eacute labaredaE chamativo o que eacute Espiacuterito Santo Em liacutenguas vermelhas

O que flui nos regos da escrita eacute sangue ndash rematarias tuHH Hans Memling ndash pintor flamenco (Na versatildeo espanhola da palavra)

Recebi um postal teu Herberto com uma imagem Dele ndash a SibilaSambetha uma que os versos te arrebateDo turbilhatildeo do segredo e abra em doisComo valvas de vieira de Santiago a concha PectenA pintura entreabre A porta a signos dourados asas em bardosDe flamingos vindos de umaEspetacular imagemNum filme cujo tiacutetuloNatildeo eacute Aacutefrica nossa apesar de o contraacuterioNos terem garantido

9

Cada um devia ter a suaBissau eacute dela Mindelo eacute teuE Angola eacute nossa

Aacutefrica Aacutefrica ndash na voz de Cesaacuteria Eacutevora ndash Aacutefrica Bbbbbbbbbbbbberccedilo di mundoAs belas dolicoceacutefalas cabeccedilasQue os faraoacutes e as cleoacutepatras imitaram~~~~Aacutefrica tua com o esplendor do poilatildeoE o pavor do Eacutebola

Ponto de fuga ndash refuacutegio ndash a velha matildee Que tambeacutem deacutecadas passou na GuineacuteNatildeo recorda o passado A sua maacutegoa eacute presenteViva flama rediviva Ela reside no passadoArde Ana Prima Ana Chama os bombeirosNatildeo recorda o teu pai natildeo se lembra de AacutefricaVive pela terceira e quarta vez cenas muito seletasNa panoacuteplia do que de mais infeliz lhe aconteceu ndashUma filha libertaacuteria sexualmente livre Natildeo sei como te tornaste tatildeo Rebelde Agrave tua matildeeA outra a roubar-lhe terra e terratenecircnciaCom abuso de confianccedila e burlaSofre pela segunda e terceira vezComo se fora agora ndash dor flamboyante Ascende No restaurantePelas colunas do ceacuteu inebriaCom o seu perfume accedilucaradoDe sobremesaOs olhos num ecircxtase de Aacutevila Santa Teresa as papilas Gustativas antecipando deliacuterios perfumadosDo que jaacute pouco existe ndash Bravos-de-esmolfoRainhas-claacuteudias ou cagoiccedilosFigos pingo-de-melNecircsperasUvas moscatel eMaccedilatildes camoesas

Foi para antes e para fora

10

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 10: FOLHAS DE FLANDRES

Cada um devia ter a suaBissau eacute dela Mindelo eacute teuE Angola eacute nossa

Aacutefrica Aacutefrica ndash na voz de Cesaacuteria Eacutevora ndash Aacutefrica Bbbbbbbbbbbbberccedilo di mundoAs belas dolicoceacutefalas cabeccedilasQue os faraoacutes e as cleoacutepatras imitaram~~~~Aacutefrica tua com o esplendor do poilatildeoE o pavor do Eacutebola

Ponto de fuga ndash refuacutegio ndash a velha matildee Que tambeacutem deacutecadas passou na GuineacuteNatildeo recorda o passado A sua maacutegoa eacute presenteViva flama rediviva Ela reside no passadoArde Ana Prima Ana Chama os bombeirosNatildeo recorda o teu pai natildeo se lembra de AacutefricaVive pela terceira e quarta vez cenas muito seletasNa panoacuteplia do que de mais infeliz lhe aconteceu ndashUma filha libertaacuteria sexualmente livre Natildeo sei como te tornaste tatildeo Rebelde Agrave tua matildeeA outra a roubar-lhe terra e terratenecircnciaCom abuso de confianccedila e burlaSofre pela segunda e terceira vezComo se fora agora ndash dor flamboyante Ascende No restaurantePelas colunas do ceacuteu inebriaCom o seu perfume accedilucaradoDe sobremesaOs olhos num ecircxtase de Aacutevila Santa Teresa as papilas Gustativas antecipando deliacuterios perfumadosDo que jaacute pouco existe ndash Bravos-de-esmolfoRainhas-claacuteudias ou cagoiccedilosFigos pingo-de-melNecircsperasUvas moscatel eMaccedilatildes camoesas

Foi para antes e para fora

10

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 11: FOLHAS DE FLANDRES

Tremula nas chamas infernais do PassadopresenteE nisto senhores BB PPr de todos os BosquesE BB IIr da AlvenariaQue vos assentais agrave sombra da mesma acaacutecia Consiste a senilidade Senilitaacute

O romance famoso de Iacutetalo SvevoAcode-te agrave lembranccedila Boa PrimaStella C

Eis que nos aguarda agrave porta de casaA mais impaciente das harpias ndash Borrasca de seu nome as garras e as mamas de falcatildeo Prontas a dilacerar-nos a carnendash Oxalaacute natildeo venhas a saber O que eacute isso da senilidade Boa Prima CarbonoConcedam-te o B Pr Jesus Cristo e o nosso protetorS Teobaldo a graccedilaDe morreres antes ndash sem dor de suacutebitoFulminada pelos ldquorais de JuacutepiterrdquoCom que tantas vezes ameaccedilava o pai

Companheiro

Aguardas o nosso companheiro de viagemOcultando o que escrevinhasComo se contra ele tramasses Crime de alta traiccedilatildeo Um noacute na garganta Aperta-te como aneacuteis de Boa constrictor Natildeo deixa deglutir a banhada Sanduiacuteche Em maionese de laacutegrimas

Tempo hirsutobaacuterbaro

11

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 12: FOLHAS DE FLANDRES

Dito de austeridademiseraacutevelTempo de pulhas Que pilhamQue se governam em vez de governarem PutasCom a dor alheia Assim se despedeUm pai de famiacutelia assim se atira para o desempregoUm homem de idade jaacute incompatiacutevelCom um recomeccedilar longe Noutro paiacutes Inglaterra Canadaacute Franccedilaquem sabeAfinal foi aqui que estudouQue altos graus recebeu E para quecircNuma das mais fabulosas universidades do mundo Nascida entre frades num beco Junto agraveObscura catedral de Notre Dame

Sim foi o Credo A primeira liccedilatildeo da Sorbonne

Assim se diz adeus aos cidadatildeos mais que promissoresPorque cumpriamMais garantes de futuro e honestidadeDo que se queria um paiacutes brilhanteDo que essa merdiocraciafinanceirae poliacuteticaQue dia a dia afundaEste pobre TitanicNum odre de miseacuteria e borrasTanta gente que natildeo tem onde dormir E anda pelas noites Encapotadas Agrave cata Nos caixotes do lixoDealgumacoisinhapara comer Estes versos dearame farpadoferem a bocaAlgueacutem imagina o que eacute natildeo ter abrigoAndar sem fito Em bolandas Sem pingo de referecircncias Sem pousada Sem ningueacutem agrave espera ImpacienteAtraacutes da porta

12

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 13: FOLHAS DE FLANDRES

Com o jantar A esfriar em cima da mesaO destino catastroacutefico Do tamanho da galaacutexia pela frente Como uacutenica esperanccedilaCholdraresmoneia um Corjaescarraria o outroBando de necroacutefagosPassarotildees merdiacuteofesImbecis na competecircnciaReacutecua de maus comediantesBandalhosChicos-espertosBoccedilaisNulidades em bafora-Das de mau haacutelitoEm striptease de corruptosQuase tatildeo constantes nos telejornais Como os treinadores de futebol da ModaE hemos que aturar tais tiposAssim despedem o futurocom um chutoNo raboVatildeo depois para as Bruxelas da papeladaGanhar milhares E o paiacutes que limpe com a liacutengua As suas cagadas

Hocirctel Pelican drsquoOr

O Pelicano ave sagradaCriacutestico-maccediloacutenica esvai-se no sangue com queAlimenta os filhosMitos Mirtos Mirtilos Altos MalvaiacutescosO que transborda do logos vai para aleacutem do RasputinaacutevelDeveras surrealista

Isso natildeo penses Stella Carbono espanta-te ouAtira a razatildeo agraves malvas ndash nobiliacutessimos MalvaiacutescosO que natildeo eacute naturalOu o eacute tanto como flamingos a arder

13

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 14: FOLHAS DE FLANDRES

Na sua proacutepria lhamaTransfere para aleacutem do legislaacutevelIloacutegicos Malvaiacutescos

Como a matildee Ardente em febres no hospital A afastar de si a roupaE a suplicar que chamem os bombeirosVai consumindo A sua proacutepria brasa

E tu pensas ndash foi para isto a vida ParaBeber sem fim a poccedilatildeo amaraE de Epicuro nem a pequena satisfaccedilatildeo De um caacutelice de aacutegua polvilhada comAccediluacutecarTatildeo mais crediacuteveis os extraterrestres satildeoDo que o solitaacuterio Deus No hareacutem dos seus santosTantos santosTodos-os-SantosTodos santos satildeo os que rezam missaMissas para meia duacutezia de velhasque nada ouvem do que diz O padreE Se ouvissem Nada entenderiam

Oh Nobiliacutessimos Malvaiacutescos Que me ultrapassaisem alturaCobri-me a grimpa a precisar de Navalha de poda

Lille 19052014

Paisagem com terrils

Tambeacutem eu pendurei nos salgueirosOs oacutergatildeos com que cantava ndash a passarinhaMais ludicamente Liacutebido Desligada da correnteNatildeo entristece nada

14

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 15: FOLHAS DE FLANDRES

Porque natildeo sentimos faltaAliacutevioFinalmente C Respiras fundoOacute dispensada

A folha de flandres trespassada com a esferograacuteficaNever moreFelizmente Haacute males que vecircm por bemEsperaste pacata pelo fimSabendo que outra vida principiava

Folhas em rolo impressionaacutevel prateadasPanelas Formas para bolos Copos FunisA verdadeira antiga panela De assar castanhas Latas para conserva Raladores de cenouraE mil outras aplicaccedilotildeesMais industriaisDessa baccedila flandre que afinal Sabes laacute distinguir da Lata e do latatildeo Ou da folha de alumiacutenio Escrever-lhe em cimaPara que conste e dureEis o que importaA raiva destes tempos molesSem honra nem vergonhaCovardes Sem liacutederesGovernados por homuacutenculosConvictos de que satildeo Super-HomensPeroram dos piacutencaros de peacutenisDe trecircs miliacutemetros de altesura

Quem dera pereciacutevel toda a dor Como a alma que faz latejar A passarinha oh Indolor ah-ahAssim o nirvanaDesta paisagem lisa como camaNa sua colcha de esmeralda Que jaacute soacute conserva resiacuteduosDos mineacuterios da antiga lavraApesar de montes gigantes^^^^^^Imensas piracircmides de escoacuteria

Ora coberta de verdura

15

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 16: FOLHAS DE FLANDRES

Ei-la ndash muda Muda ei-laO visual adotado pela funccedilatildeo clorofilinaCabeccedilos cobertos de erva Verdejante ndash eis o que resta Passado o tempo de gloacuteria das minas e do Petroacuteleo ndash e vacasUacuteberes inchados Caladas Pachorrentas Vacas e natas

Assim o crime a vergonhaSob a maquilhagem de gente boa Sonsa A mentiraAbre sorrisos pepsodentesRadiante de laacutebia Nada tem dentro Soacute brilho de lata Tempos pequenosDe dias menores que o habitualNatildeo atingem sequer as vinte e quatro horasE esta paz ndash colcha narciacutesica sobre a sepulturaEacute este tempo de likes e links e facebooksE fotos de perfil Com lata Deitadas Abertas as pernas De par em parAo olharProacuteprioSelfies como siacutelfidesAgrave beira de um lago Revestem-no todo com obsidiantes narcisos

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkAgrave miacutengua de toques afagos palavrasQue reconfortem o egoJasmineiros a ocultar maus cheirosE um cipreste pronto a assinar de cruzHieraacutetico secretaacuterio de passagens clandestinasDa noite para o diaEis-nos na Flandres pintando Com luz E gema de ovo

Paisagem espectral a que soacute falta o navioSobre os telhados agachados noVazio abandonadas as casas com o despedi-Mento geral Uma vez encerradas as minas

16

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 17: FOLHAS DE FLANDRES

Paisagem cubista na neblina como segunda camada de tintaA esconder a primitiva flamenga Uma senhora de barriga Ssssssssob lento vestido vermelhoOu ceia de burgueses Com faisatildeo agrave luz da vela

Descendo agrave terra esta terra comOs ladrotildees coitados Apanhados nas malhas De uma lei ineptaJuram que vatildeo lutar pela honra Os bandalhos Os ladrotildees de colarinho sujoPreocupados com a honra depois de Sssssssaqueadas as algibeirasDe tanto coitadoDepois das luvas de milhotildeesPara facilitar limpeza de dinheiro Vvvvvindo do traacutefico de oacutergatildeos De armas De crianccedilas e de drogas

A mentira mostra os sorrisos branqueados De banaboias satisfeitos

Que bom estares ali deitada sem sentires nada Num quadroDe maja desnuda ou de pijama tanto fazDesde que baste estar deitadaCom o papo em exibiccedilatildeoE a distraiacuteda matildeoNa perna pousadaDesde que natildeo sintas nadaNem frio nem quenteDesde C que te natildeo sintas Nem feliz nem infeliz Nem seca nem aguadaNem nada seres uma natildeo-gente uma natildeo-letraUma menos C Que seria do CO2 menos CNem metade de um copo de aacutegua

A calma do tempo anterior agrave vida o equiliacutebrio estaacutevelDo big-bang antes do surto de moleacuteculasAmibasSapos e ratildes e tudo aquilo que mexe no esverdeado caldo BioloacutegicoAteacute que tatildeo tardiamente aparecesse a espeacutecie MaccedilatildeEntalada no gorgomilo Filhos que somos do logos e do mito

17

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 18: FOLHAS DE FLANDRES

Como tudo isto deve estar Errado valha-teO ozono o oxigeacutenio o carbono matricial Antes do que conhecemosExistiram civilizaccedilotildees mais aceleradas do que a nossaOu entatildeo nada se entende do que se passa Nem piracircmides Nem triacircngulos fazem sentidoFiquemos aqui para averiguar e natildeoA menos que a dor adormeccedila nesses terrilsEscondidos pela erva tenra Onde natildeo haacute falta Onde se vive com abastanccedilaFrui a calma do natildeo ser leite roseacuteO2 nem aacutegua

Os mineiros despedidos Abandonaram as casas O que desliza agora pelas Vidraccedilas do TGVSatildeo cidades-fantasma

La Maison Blanche

Natildeo eacute o Cafeacute Flore nem o Chat NoirE ainda menos palaacutecio presidencialEacute poreacutem uma dessas tiacutepicas esplanadas parisiensesDiante da Gare du NordCorridas a vidro e tinta vermelhaCom cadeiras de palhinha chamada La Maison BlancheAqui me sento a pensar por escritoNessa demecircncia materna manifesta no reviverRemotas maacutegoas que lhe causaacutemosNum tempo muito antigo enterradoDebaixo da laacutepide do conveniente olvido

Desgraccedila Que grande desgraccedila o Alberto E tu perplexa Que Alberto Matildee que aconteceu

18

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 19: FOLHAS DE FLANDRES

Entatildeo o Alberto morreu que grande desgraccedila

O Alberto morreu tatildeo novoEacute bem verdade que o levouA pneumoacutenica ou a tuberculoseGrande a desgraccedila Mas morreu haacute quantos anos Em que seacuteculoEla agora vive tudo crises sucessivas Viagens viagens no tempoQuase cem anos tem de idade Desliza do presente para o passado sem Precisar da cadeira de rodasOs olhos de maacutertir para o teto doHospital lanccedilados Pergunta prenheNa cama do seu quarto branco e novo Em que perpassam batas de enfermeiras Agitando o ar impregnado de desinfetantes Eacute menino ou menina

Paris 185 2014

Temple des Charbonniers

A tangerina pousada no tejadilhoDo boca de sapo eacute tatildeo grande como ele Arte de rua em LillePublicitaacuteria urbanaAssim o mineiroMete as matildeos nas algibeirasSem fundo Revolta-se passa a charbonnier IniciaccedilotildeesAgrave floresta agrave aacutervore agrave poda da grimpaAo fumo e ao fogoPoda faz-se com tesoura dependendoDa grossura dos ramos

19

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 20: FOLHAS DE FLANDRES

Em geral usa-se a serra eleacutectricaA plaina para desbastar NivelarDiminuir a espessura da prancha de madeira Afagar Com todo o meu carinho uma belaPeccedila de marcenaria pranchaBalauacutestre O que quiseres

C de Carbono de carvatildeo de carbonaacuteria StellaNome de uma soacute letra como tatildeo bem reparasteHerberto Mestre ndash o C matricial de qualquer forma deVida Ambos sabemos sem nas aulasTermos aprendido o saber infuso e Adquirido agrave forccedila de Batermos com a cabeccedila nas paredesA dor ensinaA dor tambeacutem eacute doce A dor eleva O mystes inebriaComo um perfume secreto Arrepia como visatildeo doSublime

A dor eacute mestra Acautela a tua natildeo se torne acadeacutemica Tal a de Camotildees morrendo de amoresAgrave imagem dos trovadores Pela sua damaE aqueles da ainda mais antiga SafoDevedores Sim tambeacutem a de Lesbos Morria de amorE confessava ao voltar para ela a sua Tracircnsfuga Aacutetis Sem ti Definhava e agora inflamaste-me o coraccedilatildeo E puseste-o a arder de amor

Dor acadeacutemica dor indolor autoacutenoma da gente ndash a despeito Da lhamaCardiacuteaca cristalizada na linguagemTentaste arrancar da madeira a letra uacutenicaDo nome ndash o C da Carbonaacuteria ndash gostas que te mexa no poteDos versos com a gadanha da alma longe da AcademiaLonge do peripatos pertinho das sensaccedilotildees Em carne-vivaNatildeo vai para Antueacuterpia este comboioMas imagina tu Herberto para onde vai a carvoeiraPara um templo aberto na floresta dos siacutembolos

20

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 21: FOLHAS DE FLANDRES

Verdes na Flandres algures Nordeste de FranccedilaPor onde tu de comboio tambeacutem viajaste na Fronteira com a Beacutelgica das vacas No limite da fome Em AntueacuterpiaCantando flamencoDanccedilando fandangoAliaacutes era o tango Nos bares de putas e marinheiros

Um templo na floresta Entre Lille e Valenciennes poraiacuteJunto a um pavilhatildeo de caccedila que guardam gansos E catildees de longas orelhas Com rodas baixas

Aqui reuacutenem os Bons PrimosBelgas e francesesE praticam o Rito Florestal ao ar livreSoacute com avental de borrego Como paramentosSopre o vento ou caia neve

Na floresta como temploDes Bons Cousins CharbonniersRecorda-se Megravere CateauEssa que lhes abriaEm toda a sua doccedilura femininaO coraccedilatildeo e as pernasDando-lhes a passarinha Et le potage aux chouxBela perspetiva que te havia de inspirar Desde a cabeccedila truculentaAteacute agraves tripas ndash poeta sem metafiacutesica tu assim o dizesPoeta das sensaccedilotildees paleoliacuteticasRespira Faz uma pausa

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

Douai ndash o TGV paacutera por instantesA recobrar focirclegoEnquanto o Bon Cousin Pierre aponta para o repolhoComo lustre de vidrilhos de MuranoDe uma piracircmide de ramos suspensoLaacute no templo oculto entre as aacutervores esbeltasA lembrarem as paranaenses bracatingasQue tambeacutem escondem altas vendas de madeiraEntre os ramos

21

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 22: FOLHAS DE FLANDRES

Por baixo o pote de ferro ao lume de chatildeoCom que Megravere Cateau cozinha o caldo E o bouillon de langue de boeufNatildeo sei se jaacute se conhecia a folha de flandresLiga de ferro e accedilo com um risinho de estanho Um sorrisinho estanhadoPara panelas tambeacutem luz o alumiacutenioLigas ndash lata latatildeo ndash antigos artesatildeos e perdidas artesLigas passado ao futuroVai ser duro ficar na estaccedilatildeoA ver-vos partir no trem para a terra do nunca maisPara a terra do nunca mais partiram e partiratildeoTanoeiros e cesteirosFogueteiros cordoeiros e violetistasFerreiros e alquimistasFerradores e latoeirosMarceneiros lampianistas e vareirasOleiros moleiros e lenhadoresAzeiteiros alfaiates pedreiros calceteiros Funileiros e cantoneirosSapateiros rachadores ilusionistasLadrotildees e almocrevesCostureiras e bordadeirasPadeiros amoladores de tesouras e canivetes Varinas e lavadeirasE fazedores de obuses metralhadoras e canhotildeesQue tambeacutem dos metais da guerra estaacute prenheO chatildeo da Flandres

Mais ao norte na NormandiaQuantos natildeo morreram nesse dia DEm que Pegravere Naurois ornitoacutelogo perito nas avesDa Macaroneacutesia ndash ilhas atlacircnticasEm especial Cabo Verde Priacutencipe e Satildeo TomeacuteSe tornou heroacutei do desembarque medalhado por De Gaulle

E ossos tambeacutem devem sobreviver tiacutebiasUacutemeros peroacuteneos e astraacutegalos Raacutedios cracircnios e cinturas peacutelvicasDe tanto rapazinho virgemCom o ferro e o estanho misturadosNos terrils e no huacutemus E tudo isto faz floriremBatatais broacutecolos campos de beterraba nabo aboacuteboraCenoura repolho E as inevitaacuteveis couves-de-bruxelasTambeacutem temos hortas assim diz Cesaacuterio Verde Laacute para os lados de Loures Malveira e Odivelas

22

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 23: FOLHAS DE FLANDRES

O cheiro quente e podre dos legumesFlui quase tangiacutevel entre faias e silvasDefine o periacutemetro do temploPara o desenrolar do rito que inicia o cobridorEnroupado numa pele de ursoCorre por fora agrave volta das piracircmides de troncosTraccedilando com o pau nuO maacutegico ciacuterculoQue protege dos lobos a assembleia sacra

Voga o TGV como veleiro No silecircncio e solidatildeo dos ares Em que erguemos as incandescentes vozesDe Salut et FraterniteacuteAvantage et Bonne Vie

Vantagem e Boa VidaSauacutede e Fraternidade

Pensas C em bonecas russasDe madeira umas nas outras encaixamAteacute se perder na uacuteltima a noz do significado

Regressaste agrave terra Esse foi o teu maior pecado Voltar sem nenhum retornoApenas porque a matildee ainda esboccedila palavrasPerto do seu imenso sono Quando partirFicas agrave mercecirc das ondasPor cima dos hieroacuteglifos do Nilo

Ah sim bailaraacute o sarcoacutefago dos teus nomes Por cima dos hieroacuteglifos doNilo

Restos de fuligem deixam rastosNa paisagem fabril e carvoeiraTrespassada pelos carris do mito

Meus BB PPrEis uma grande liccedilatildeoAttention mes BB CCLe couteau agrave greffe ndash a navalha de enxertia ndash eacute Bem mais penetrante que le couteau de coupe ndash que a navalha dePoda

23

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 24: FOLHAS DE FLANDRES

Jorra luz do seu corte Ilumina ateacute agrave terceira visatildeo ao passo Que a navalha de poda soacute apara Umas grimpas soacute serve para polir Umas cascas grossasJorra da sua lacircmina leda e niacutetida a estrela flamiacutegera

Le couteau de coupe nrsquoa pas de preacutecision deixaria Morrer o paciente agraves matildeos do cirurgiatildeo Ao passo que da navalha de enxertia Raia a estrela flamiacutegeraFalta agrave navalha de poda o fio fino que atacaPela raiz a ignoracircnciaE a intensidade voltaica para os olhos descerrar Agrave revelaccedilatildeo

RespiremosRespira C Respira ateacute agrave hulha mais hermeacuteticaAquecida nos fornos do carvatildeo de coqueParados em Douai jaacute a Tia Cateau teve tempoDe erguer as saias e temperar o caldo com umas faiacutescasDe cominhos pimenta preta E flor de sal

Talvez tenhas posto os peacutesNo tapete de hortelatilde outrora pisado pelo eremitaQue o caminho agrave noite alumiavaCom a candeia a afastar para os lados a Persiana debreu Aurai-je mis mes pieds aveuglesTerei pisado com os peacutes cegosO rasto de luz que velhos carvoeirosDeixaram a cintilar na floresta Para mostrar a via raacutepidaAs folhas mortas das aacutervores a humidade do arA erva a molhar as botas ndash era Novembro no bosque Flamengo de Francisco I dito ldquole Pegravererdquo cognominado ldquoFranccedilois au grand nezrdquo fundador do Collegravege de France ndash devia Meter o nariz em tudo O curioso Iniciado nos segredosDo carvatildeo Como Saint Thibaud Conheceste-o comigo CViste o pote de ferro com que a Tia Cateau

24

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 25: FOLHAS DE FLANDRES

Satisfazia os Bons Primos lenhadores e carvoeiros

E contudo contudohellipA luz que mais fere neste temploDe ramos erguidos em piracircmideProveacutem do altar ndash natildeo eacute de pedra a ara meus BB PPrNatildeo eacute da nossa santa madeira O altar eacute metaacutelico ffffffffffffffffffEsplecircndida nas dimensotildees E na vetusta ferrugem Ali junto ao pote da pitanccedila Preside A bigorna ndash siacutembolo maior dos trabalhos Iniciaccedilatildeo agrave Idade do Ferrofffffffffff

Stella CarbonoTGV LilleParis novembre 2013 Palaacutecio dos Melos Viseu agosto de 2014

Comboios que natildeo vatildeo para Singapura

Atravessas a flamenga regiatildeoNo outono As carnudas cores de RubensCom pinceladas de erva sobre folha de flandresEspelham A ex-mineira paisagem Jaacute na segunda viagem primaverilWatteau usa graccedila como tintaPara toucar de flores a meacutedia-luz

Comboios flamengosNatildeo satildeo os teus HerbertoNatildeo satildeo comboios para AntueacuterpiaNem para Singapura nem para a Idade do FerroA idade natildeo eacute a mesmaNem o vaso de gratildeos que chama na lonjuraNada nos ata A natildeo ser os noacutes apertados do fioDas palavras

25

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 26: FOLHAS DE FLANDRES

Viajamos no TGVApesar de em carruagem econoacutemicaE ao contraacuterio de tiMunidas de responsaacuteveis documentos

Em frente uma senhora inebriada com o que dizFaz trejeitos de atriz que precipitam o marido Nos negrumes de uma caverna

Natildeo somos duas marginais apesar de a Stella Assinar com nome de carbonaacuteriahellipE levamos connosco algum dinheiro vivoE cartotildees de creacutedito que nos distinguemDessa geraccedilatildeo de fugidos agrave guerraColonial aquiDo Vietname na literatura americanaUns e outros Pedrados tesos revoltados contra tudo De amor famintosNatildeo apareci depoisPoreacutem soacute me levantei da camaNa deacutecada seguinte Ateacute laacuteErrei Movimentaccedilotildees erraacuteticasNo feminino Natildeo satildeo por isso nossos os teus comboios Para Singapura cariacutessimoMas eacute dela o nome de uma letra soacute ndash C de Carbono ndash com Que desejas te queime as matildeos miraculadasEntediam-te os acadeacutemicos os que natildeo sentem dorNem a causam soprando brasasEsses que ficam encostados agravePorta das paisagensA ver passar as vacas e bisovacas Mas natildeo provam o leite da virgemNem o orvalho de maioTiacutemidos de se despenharem das altas faleacutesiasDa linguagemE aterrados pelas margens Da vida Corridas a arame farpado

Os comboios atravessam a pastagem flamengaCom as vacas ndash se as tecircm ndash de Columbano e Gratildeo VascoTatildeo carnosas sob a luz quenteDe Rubens e Van Dick e Johannes Vermeer o que deu um brinco de peacuterolaA Scarlett Johansson a BelaGostas delaPaisagens que abrem de teacutedio a boca ruminantesE no entanto Com misteriosasChispas smaragdiacuteneas Missangas Na voz chiante dos metais

26

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 27: FOLHAS DE FLANDRES

Debaixo do pasto

Natildeo Herberto os comboios satildeo diferentes apesar De as mesmas palavras te pousarem nas matildeosComo andorinhas pretas levando e trazendo Desnecessaacuterias mensagens secretasSoacute porque sim soacute porque servem tambeacutem para issoSoacute para ocultarem o pensamentoDos Mestres poetas Temos direito agrave noiteAgraves passagens estreitasA natildeo banalizar os nomesQue sentido faria o telemoacutevelNatildeo existia no nosso mundoFechadoPor um periacutemetro maacutegico

No nosso usavas telefone fixoE hoje duvido que saibas lidar com os misteacuterios Tremendos do correio eletroacutenico ndash vulgoE-mail

Nosso era o tempo da maacutequina de escrever- Tippa eis a marca da minha ndash E das tuas viagens de comboio desde SingapuraAteacute ao 333 ndash nuacutemero alquiacutemico por objetivo Acaso quem havia de dizer Surreais coincidecircnciasNatildeo natildeo houve aqui nenhuma Determinaccedilatildeo hermetizanteMas a falta de intenccedilatildeo natildeo descarta o signoDos valoresE projetos simbolizantes que lhe satildeo proacuteprios

Vamos laacute amigo natildeo eacute soacute tua a liacutenguaNatildeo eacutes proprietaacuterio de uma liacutengua privativaComo essa que te lambe os dentesPor muito que a trabalhes nesse uacutenicoSentido Na parte em que tambeacutem eacute dos outrosHemos de contar com os usos que lhe datildeoE porventura nos escapamPorque distraiacutedos Ou ateacute ignorantes

Mexem connosco as tuas idas e vindasAindaTambeacutem elas queimam ndash as tuas palavras minhas ndashPodiacuteamos ter morrido uma tarde Num uacuteltimo versoPodiacuteamos ter partido para a terra Com laje em cima Num comboio comprimido

27

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 28: FOLHAS DE FLANDRES

Ou para o passeio de cimento saltadoComo querias Para quecirc Que resultado daiacute alumbrariaO desejo despejado do vivo para o inexistenteNem sequer te sobrariam dedosPara lavrar o obituaacuterio do rocambolesco incidenteDe qualquer modo olha fica a porta abertaSe me quiseres mandar algum recado do aleacutemCaso vaacutes primeiro e deixa a tua soacute encostadaPara a C te visitarCaso faccedila as malas primeiro Nunca se sabePrometamosEscrever-nos prometamos vencer esse ridiacuteculoObstaacuteculo da morte num Caminho tatildeo debruado a Laurus A laurissilva que te reveste de gloacuteriaA ilha

Naquele tempo natildeo nada de pactos dessesMais facilmente saltaria hoje de matildeos dadasPelo gosto apenas de ir contigo Ateacute Singapura Na maisDesconfortaacutevel carruagemFruir a paragem o sentimento do inexistirE depois disso varrer a mente o negrumeDe uma paisagem zeradaSem o SOS do Um

Satildeo tatildeo diversos os meus comboios HH Nada nos liga a natildeo serUma liga de palavras e tudo o que elas apontamReferemPossuemComo etimologia e usoTudo enfim nos religa mais no futuroDo que no passado e no presente

Matildee respondo natildeo se preocupeEla preocupada com o que tem e natildeo tem no frigoriacuteficoAli no Lar de Santo Antoacutenio continuaComo antes A dar comida em vez de afetoOlhai para a Tia Cateau a saacutebiaQue natildeo trocava as cousasNatildeo tinha medo de nada mais valente que Anita GaribaldiAbria o pote e as pernas e servia a refeiccedilatildeo totalAos habitantes da Floresta

28

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 29: FOLHAS DE FLANDRES

Tatildeo diferentes as vias e os processosNatildeo escreverei os meus poemas mais subidosNa retrete do terceiro andarDe um antigo preacutedio parisienseNatildeo dormirei sob a ponte dos cadeados no SenaMais conhecida por Pont des ArtsNatildeo sobreviverei agrave morte ndash Para quecirc entatildeo o mortal abraccedilo

Teraacutes o necessaacuterio agrave sobrevivecircncia ndash um chip inteiroNas bibliotecas do mundo com os teus livros eReferecircncias

Entretanto o presente comboioSegue o rio ateacute agrave fozE um outro seguia para ArrasPor foro de Espanhandash Alcaacutecer Alcaacutecer por nosso capitatildeo Fernatildeo VasquezEscrevia Alexandre Herculano ao contar a histoacuteria deD Fernando o Formoso a quem couberam em sorteTrecircs mulheresChamadas Leonor

Assim outros na vida colecionaram IsabeacuteisAbelhas vindas do reino de YsComo o Ernesto de SousaEste ldquoArrasrdquo natildeo eacute sinal sim cidade no percursoNorte de Franccedila Pas-de-Calais paleta regiatildeo flamencaEm que rubros queijos danccedilam Alterado flamingo

Os comboios satildeo turbulentosFecham-se sobre o seu proacuteprio movimentoE microcosmosAberto locus claususMundos de descoberta e veemecircnciaCrime no Expresso do OrienteO comboio da meia-noiteE o outro com Gary Cooper e Grace KellyQue apitou trecircs vezesDiz o heroacutei agrave porta da carruagemEm The lady vanishes de Hitchcock Vamos para qualquer lugar Sssssssssssssssssssssossegado um lugar Onde natildeo haja comboios

Viajas no sentido das palavrasNas referecircncias culturais que te transportamViajas no viajarComo qualquer alquimista

29

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 30: FOLHAS DE FLANDRES

Ou aprendiz de marceneiroDisposta a reconstituir o templo de madeiraDe Salomatildeo Ou sem objetivo nenhumFora o de conhecer os Bons PrimosFlamengosOs BB PPr franceses e belgasQue reuacutenem aleacutem dos carris num templo ao ar livreNo centro matriz da florestaComo conveacutem agrave la Franc-Maccedilonnerie du Bois ndashQue aliaacutes eles rejeitam por natildeo serem maccedilons ndash Praticam o Ritual com avental de pele de cordeiroA proteger o baixo-ventreEles satildeo jaacute velhosEles satildeo mais velhos do que tuEles satildeo subversivosEles desafiam o manualzinho reacionaacuterioDas Constituiccedilotildees de AndersonNatildeo por admitirem mulheres ndash a Maccedilonaria Verde eacute androacutegina E preza as Megraveres Cateau ndash Sim por admitirem esse BPr quase cego e esta senhoraDe cabelos brancos em cadeira de rodasMais pobres uns do que outros e descrentes em Deus todos ouSoacute algunsAnderson proiacutebe os pobres as mulheres os deficientes eEsses idiotas dos ateusNatildeo fala de negros mas eacute racistaComo competia agrave sua eacutepocaPor isso os negros constituem as suas proacuteprias lojasA que pertencem das brancas excluiacuteveisHomens como Barak ObamaLiacuteder dos Estados Unidos da Ameacuterica

Na verdadeQuase nada disto interessaMais religante eacute o teatro que lhe presideE determina a festaA festa da comunidadeO valor do grupoA cidadaniaEspaccedilo mental vazioTudo o restoSim Herberto ndash plena como a luaNo seu redondo espelhoEacute a poesiaNatildeo o mito

Manhatilde neblinanteQuando eu morrer quero ir de comboioPara as terras de Aleacutem

30

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 31: FOLHAS DE FLANDRES

Nem penses C Vamos isso simPara um lugar sossegadoUm paiacutes onde natildeo haja comboios

Hotel Bristol

Em Valenciennes perto da fronteiraPouco importa a Beacutelgica sim os limitesO cercoO perigo de saltar de dentro paraFora do periacutemetro da ideiaDelimitamos espaccedilos de seguranccedilaOu tatildeo perigosos como precipiacutecios Mas onde nos sentimos segurosEm razatildeo de aparatos policiaisMoraisE tantos mais eis o exemploO ciacuterculo maacutegicoTraccedilado com pau nu agrave volta do temploPara impedir os lobos de entraremPelo BPr CobridorCoberto com pele de urso Assim A matildeeSaltou para aleacutem do que a convenccedilatildeoTem por normal E considera disparates Ao que eacute reviver desgraccedilas Dores o que a impediu de ser felizApesar de tanto cuidado em se manter dentro dos limitesOu quem sabe se natildeo foi issoQue fez da sua vida o que agora vemosDesfilar no espelho da loucuraComo procissatildeo inteacutermina de um Senhor dos Passos Noacutes definimos os caminhosNingueacutem escolheu por voacutes Tendes o voto na matildeo Soacute vos falta lideranccedila Gente correta e saacutebiaEm quem depositar confianccedila

Doacutei-me

31

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 32: FOLHAS DE FLANDRES

Doacutei-te Doacutei-nos a dor da matildeePobres matildeesAs matildees herbertianas fogemFogem dos lares de idosos em pensamentoRegressam a sua casaAos seus espaccedilos de seguranccedilaEsses precipiacutecios abertos sobre precipiacuteciosA cada passadaE tu fugiraacutes tambeacutem um diaPara Inferno ou Paraiacuteso das ideiasAgrave forccedila de repetires palavrasObsessivasSempre as mesmas frasesUma soacuteO ceacuterebro ocupado sempre com essa ideiaQueres livrar-te dela e natildeo podesMastigas a frase como patildeo duroNavio que te transporta devagar para o Templo na florestaCorres com o pau a traccedilar o ciacuterculo maacutegicoAgrave volta de um repolho e de uma bigornaSomos ursosDefendemo-nos de lobos mausAs pernas impotentes para andarPresa como estaacutes agrave cadeira de rodas Foge matildee Foge muito Corre o mais que puderes Para longe de noacutesNatildeo te voltes para traacutesNatildeo haacute nada por que esperarFoge com as pernas que te restam na ideiaNatildeo paresCorre pela savana que nem recordasCorre pelos jardins da FlandresCorre pelos tempos de Vidago matildee os uacutenicosOnde dizes ter sido feliz

As matildees deviam todas fugir para VidagoE os filhos tambeacutemUm dia matildee hei de como tu fugirFugirFugirMas natildeo para o InfernoNem para casaMatildee um dia hei de fugir deles como tuMas hei de fugir para Vidago

32

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 33: FOLHAS DE FLANDRES

II DESGARRADASamp

DIVERSAS FOLHAS

Barahona

De suras revestidoNum tapete de versos a MuhammadVoando eisRashid Na sua concha de ostra iniciado

Pela rota da seda errou tambeacutemBarahona O peacuteriplo indiano in-CumpridoNas sendas da Bhagavad Gicircta

Trazes Antoacutenio uma santinha na lapelaFaacutetima A Senhora deve serFilha de MuhammadlaquoAbenccediloado seja o seu Nomeraquo

33

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 34: FOLHAS DE FLANDRES

Sem o catolicismo tatildeo profundamenteMarianoFicaria mais pobre a tua gestaSem o islamismo tatildeo desfiado Em tassbisNatildeo tocaria os teus versos a graccedila do divinoCom a pimenta dos cacircnticos hindusBrotam mais portuguesas Letras As tuas liacutericas

Satildeo muitos os templos poreacutemAo amor uacutenico rezas - Triplo e uno como a Trindade

Importa Antoacutenio eacute que alcanccedilasteO cume da montanha Aos demais inacessiacutevelCom os teus morenos dedos tocasteO que a tantos poetas eacute interdito A religante beleza Do Livro Sagrado

O artista Antoacutenio Barros

Escreve e pinta nas paredes de xistoOs dedos alimentados com tintas vivasAcende-te o que escreves e o que pintas Desde as escarpas mais antigasDe Foz Cocirca Ou das grutas de AltamiraPassando por sortileacutegios aztecas e incasE mesopotacircmios e hindusNa China Como na IacutendiaEssa fabulosa ilha de PaacutescoaEntronizada com os nossos antepassadosPois todos partilhamos Com a NaturezaA primeira ceacutelula dividida em vaacuterias

34

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 35: FOLHAS DE FLANDRES

Depois instala e performa e Pratica arte de rua e a mail artConhece Vostell em MalpartidaE Veneza Madrid Nova IorqueSem esquecer o CAPC em Coimbra E a DiferenccedilaEm Lisboa na casa outrora habitada porSara Afonso e Mestre AlmadaE depois galeria por tantosHermitas frequentada Como Helena Almeida Nuno Teotoacutenio Pereira Ernesto de Sousa Monteiro Gil Leonel Moura Jorge Lima Barreto Irene Buarque Pedro Calapez Pedro Proenccedila Pedro Cabrita Reis Que coroa a luz dos astrosE por fimChegado o tempo futuroCom a sua sede de festaAcende o lume Com torgas secasE potildee-lhe em cima o cadinho Dos afetosPara transmutar a utopia em ouro

Morna da Baiacutea das Gatas

Mal atracava o Alfredo da SilvaAo Porto Grande de S VicenteVinham pescadores oferecer lagostaVinham meninas acenar com lenccedilosAos passageiros Debruccedilados da amuradaOs adeuses ruidosos dos garotosO sol muito agudo trespassando O veacuteu de areia fina chegado

35

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 36: FOLHAS DE FLANDRES

Nos ventos dos areais Do Sahara

Era sempre uma chegadaChegada sempre era Partida

As meninas tatildeo sonhadoras e saudosasDanccedilam descalccedilas pela noite foraColadeiras e mornas que falam de partidas Mais que de ChegadasPor isso as mornas e as meninas Dormem Tatildeo sonhadoras e saudosas

Fui um dia de romagemAgrave praia da Baiacutea das GatasChorar nha cretcheu PartidoAo mergulhar Nas rochas basaacutelticas

Foi a despedidaHora di bai chorada

Arrebatou-me toda A socircdadeEnlutou-me a Baiacutea das Gatas

Ai hora di bai choradaMorna Baiacutea das Gatas

Uma cadela em casa de xisto

Dois velhos bem velhosEle ainda mais do que elaViviam numa casa de lousaNa companhia da cadela

A quinta nos altos socalcos do DouroVia em baixo raiar o rioNas manhatildes de neblina friaRefletia a aacutegua

36

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37

Page 37: FOLHAS DE FLANDRES

Amendoeiras em flor vinhas e Pomares de espinho

Os velhosUm diaFecharam a porta do lagarDeixando presa laacute dentro a amada cadelaJaacute ambos surdosNatildeo ouviam ganidos nem latidosMesmo quando passavam pela gateiraAtraacutes da qual chorava ela

Passou um dia dias passaramAflitosOs velhos buscavam o animalPreso pela liacutengua mais aindaQue pela porta do lagar

Entatildeo a cadela discorreu se me natildeo ouvemPreciso de dizer que estou aquiTrocando o som Por diverso sinalNa base da porta luziaBuraco onde natildeo cabia inteiraMas a cauda se a enfiasse na gateiraE a pusesse a acenar na ruaA atenccedilatildeo dos velhos chamaria

Dia apoacutes dia com o rabo acenouAteacute os velhos o veremE comovidos libertarem A esfomeada companheira

Passou-se este caso em LigaresTerra de Guerra JunqueiroJunto agrave Quinta da BatocaOnde viveu o poetaAleacutem dos velhos jaacute surdosE da caudoacutefona cadela

37