Faculdade de Educação Física Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação Racismo e Injúria Racial no futebol brasileiro: um olhar sobre o impacto da informação no Esporte Amanda Regina Rodrigues Soeira Medeiros Orientador: Prof. Dr. Paulo Henrique Azevêdo Brasília, julho de 2017
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Faculdade de Educação Física
Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação
Racismo e Injúria Racial no futebol brasileiro: um olhar sobre o impacto da
informação no Esporte
Amanda Regina Rodrigues Soeira Medeiros
Orientador:
Prof. Dr. Paulo Henrique Azevêdo
Brasília, julho de 2017
Amanda Regina Rodrigues Soeira Medeiros
Racismo e Injúria Racial no futebol brasileiro: um olhar sobre o impacto da
informação no Esporte
Monografia apresentada como requisito parcial
para obtenção do título de Graduada em Educação
Física – Bacharel, na Faculdade de Educação
Física da Universidade de Brasília, sob a
orientação do Prof. Dr. Paulo Henrique Azevêdo.
Brasília, julho de 2017
Amanda Regina Rodrigues Soeira Medeiros
Racismo e Injúria Racial no futebol brasileiro: um olhar sobre o impacto da
informação no Esporte
Banca Examinadora:
Prof. Dr. Paulo Henrique Azevêdo (Orientador)Faculdade de Educação Física – Universidade de Brasília
Prof. Dr. José Gustavo Souza de Alvarenga (Membro)Faculdade de Educação Física – Universidade de Brasília
Prof. Dr. Victor Lage (Membro Suplente)Faculdade de Educação Física – Universidade de Brasília
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus que em sua maravilhosa graça me concedeu o dom
da vida: “Como é bom render graças ao Senhor e cantar louvores ao teu nome, ó
Altíssimo; anunciar de manhã o teu amor leal e de noite a tua fidelidade.” (Salmos
92:1 e 2).
Agradeço aos meus pais, que além de seu carinho, amor, dedicação, se esmeraram
em oferecer a melhor educação, as melhores oportunidades, os melhores conselhos
e ensinamentos a mim e as minhas irmãs. Obrigada por sempre apoiarem os meus
projetos de vida.
Meu pai, Luiz Geovani, que é minha referência de profissionalismo e amor. Minha
mãe, Albenira, que é minha referência de força, dedicação, sabedoria e doçura. As
minhas irmãs, Nathalia Cristina e Ana Luisa pelo carinho, amizade, puxões de orelha
e incentivo para que eu nunca desistisse de ser uma profissional formada pela
Universidade de Brasília. Tenho muito orgulho de ser uma Soeira com raízes tão
fortes e, que se esmera em alcançar sempre a versão melhor de si a cada novo dia.
Um agradecimento especial ao meu esposo, meu grande amor, André, por todas as
madrugadas acordando mais cedo para me deixar no ponto de ônibus, as noites que
dormi tarde ou que nem dormi me dedicando a conclusão das atividades
acadêmicas e da pesquisa desta monografia, pelos momentos de ajustes nas rotinas
diárias. Obrigada pelo suporte, a compreensão, o companheirismo, a amizade, o
respeito e o amor que me permitiram chegar até esse momento tão importante.
Obrigada por se manter firme mesmo quando eu fraquejava. Obrigada por ser o
exemplo de profissional que és. Obrigada por ser meu presente melhor que a
encomenda.
Não poderia deixar de agradecer a todos os meus professores da Faculdade de
Educação Física da Universidade de Brasília, que contribuíram a sua maneira pra
minha formação profissional.
Agradeço ao meu professor, supervisor, orientador e amigo, professor doutor Paulo
Henrique Azevêdo por todos os conselhos, ensinamentos, exemplos, orientações
profissionais e de vida que me engradeceram como profissional e como ser humano.
Obrigada pela confiança, pela compreensão, pelas cobranças, pelo incentivo e pela
gentileza com que me sempre me tratou.
Desde 2015 faço parte do quadro de colaboradores/estagiários do Laboratório de
Pesquisa sobre Gestão do Esporte – GESPORTE e, não poderia deixar de
agradecer aos colegas que estiveram comigo durante esse tempo: Jéssica Caroline,
pela doçura, paciência e amizade que sempre me tratou; professor doutor Antonio
Carlos Bramante, por me ensinar sobre postura, serenidade e concentração; Marco
Antonio, por me ensinar sobre atenção e generosidade; Melyssa Inda, por me
ensinar sobre mansidão e simpatia; Juliana Albuquerque, por me ensinar sobre
maturidade e força; Raíssa Luaemar, por me ensinar sobre humildade, sensibilidade
e amizade; aprendi muito com todos vocês ao longo destes 5 anos de Universidade
e 2 anos de GESPORTE.
E, por fim, um agradecimento aos meus familiares e amigos que sempre torceram
por minha formação e desenvolvimento pessoal e profissional.
ii
RESUMO
Com a chegada do esporte durante o século XIX com os imigrantes que
desembarcaram aqui, ao título de modalidade mais praticada e favorita, o futebol
tornou-se um forte e relevante elemento da cultura nacional e, portanto, integrante
da “identidade brasileira”. Mesmo que a duras penas, o futebol é um dos principais
caminhos que o negro tem para ascensão social. Mas ter sucesso no esporte, não
garante estar isento dos atos preconceituosos. Não se assume no Brasil o racismo
existente, o que torna normal as atitudes preconceituosas. O objetivo geral foi
analisar a relevância e importância dos casos de racismo e injúria racial ocorridos
entre janeiro de 2014 a dezembro de 2016, com o envolvimento de atletas
brasileiros de futebol ou árbitros (profissionais) em jogos ou campeonatos nacionais.
Foi um estudo qualitativo de caráter exploratório e descritivo, com coleta de dados
por meio de levantamento documental e bibliográfico. A pesquisa foi construída
através de análise de alguns sites de jornalismo esportivo e a amostra foi de 52
casos. Constatou-se que a falta de punição inibe as denúncias pelos atletas, o que
favorece e fortalece comportamentos preconceituosos e racistas. Meramente a
divulgação não impactará na informação esportiva, sendo necessária mudança de
paradigmas, com construção e disseminação coerente e constante dos conceitos e
das consequências do racismo e da injúria racial.
Palavras-chave: Racismo, Racismo no Futebol, Futebol Brasileiro, Informação,
Informação Esportiva.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Goleiro Aranha no momento da insulta racista durante o jogo ..………...........… 34
Figura 2 – Torcedora foi identificada nas redes sociais............................................. 34
Figura 3 – Patrícia Moreira cometendo os insultos racistas contra o goleiro
Gráfico 3 – Estados com os maiores registros de casos de racismo e injúria racial……… 30
Gráfico 4 – Punições nos casos de racismo e injúria racial .....................................……… 31
Gráfico 5 – Características das Punições nos casos de racismo e injúria racial .....……… 32
Gráfico 6 – Responsáveis pelas punições nos casos de racismo e injúria racial ..……… 33
v
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS
CBJD: Código Brasileiro de Justiça Desportiva.
ESPN: Entertainment ans Sport Programming Network.
FIFA: Fédération Internationale de Football Association (original). Federação Internacional
de Futebol (Português).
FGTS: Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.
FPF: Federação Paulista de Futebol.
STJD: Superior Tribunal de Justiça Desportiva.
TJD: Tribunal de Justiça Desportiva.
vi
SUMÁRIO
CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO..........................................................................................................................................5
CAPÍTULO II – O FUTEBOL BRASILEIRO.....................................................................................................................17
2.1 – DOS PRIMÓRDIOS INGLESES ATÉ OS CAMPOS BRASILEIROS.....................................................................17
2.2 – A REALIDADE DO NEGRO NO FUTEBOL BRASILEIRO.....................................................................................19
2.3 – PRECONCEITO E INJÚRIA RACIAL, RACISMO E O FUTEBOL BRASILEIRO...................................................22
CAPÍTULO III – MATERIAIS E MÉTODOS.....................................................................................................................25
3.1 – TIPO DE PESQUISA..............................................................................................................................................25
3.2 – INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS..........................................................................................................26
3.3 – ANÁLISE DOS DADOS..........................................................................................................................................27
CAPÍTULO IV – RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................................................................28
4.1 – ANÁLISE DOS RESULTADOS..............................................................................................................................28
4.2 – CASOS MARCANTES DE RACISMO E INJÚRIA RACIAL NO FUTEBOL BRASILEIRO EM 2014......................33
4.3 – CASOS MARCANTES DE RACISMO E INJÚRIA RACIAL NO FUTEBOL BRASILEIRO EM 2015......................42
4.4 – CASOS MARCANTES DE RACISMO E INJÚRIA RACIAL NO FUTEBOL BRASILEIRO EM 2016......................46
4.5 – O IMPACTO DA INFORMAÇÃO ESPORTIVA NOS CASOS DE RACISMO E INJÚRIA RACIAL NO FUTEBOL BRASILEIRO..........................................................................................................................................................49
CAPÍTULO V – CONCLUSÃO........................................................................................................................................55
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Capítulo I – Introdução
Historicamente, o Brasil é conhecido como o país do futebol e recebe toda a
importância e reconhecimento mundial por tal atribuição, mesmo que a sua
concepção e planejamento tal como conhecemos hoje tenha acontecido na
Inglaterra.
Desde a chegada do esporte durante o século XIX com os imigrantes que
desembarcaram aqui, ao título de modalidade mais praticada e favorita, o futebol
tornou-se um forte e relevante elemento da cultura nacional e, portanto, integrante
da “identidade brasileira”. Segundo Lucena (2002):
O futebol surge no Brasil num contexto específico de nossa sociedade, cada
vez mais urbana e com o encontro de culturas diferentes, com o fim do
trabalho escravo, o aumento da imigração e uma série de mudanças que
favoreceram a ampliação de ações no sentido de um redirecionamento ao
estilo europeu de vida. (LUCENA, 2002, p. 35).
Desta maneira, a compreensão da construção histórica que relaciona futebol com a
chamada “identidade brasileira” é imprescindível para que se possa refletir sobre
outros pontos importantes envolvidos neste contexto. Segundo Almeida et al (2012,
p.60) o esporte está incrustado na sociedade, tornando-se um meio indispensável
para a formação do homem e para a convivência em sociedade. Para Assunção et al
(2010, p.93), o esporte não pode ser pensado apenas como um fenômeno
biofisiológico, ele é um espetáculo do mundo moderno, está presente no cotidiano
das pessoas e movimenta um grande mercado de bens, produtos e serviços.
De acordo com Caldas (1989, p.24), os ingleses precursores desse esporte em
nosso país faziam parte da elite da sociedade paulista e carioca e somente os
brasileiros ricos tinham acesso à prática do futebol. Portanto, o preconceito racial, o
racismo, a discriminação e a injúria racial são companheiros do futebol brasileiro
desde seus primórdios. Pois, assim como em outras esferas sociais, a prática
esportiva está repleta de casos de que envolvam estas vertentes.
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Mesmo que o registro histórico não seja tão preciso e fiel, sabe-se que o jogador do
Fluminense Carlos Alberto, em 13 de maio de 1914 ganhou o apelido de “Pó de
Arroz” em referência ao pó que usava em seu rosto para parecer mais claro antes
das partidas na tentativa de ser aceito pelo clube e consequentemente pela torcida.
Em 1933 acontece a profissionalização do futebol dando aos jogadores negros e
mestiços a possibilidade de ascensão social e econômica dando um caráter
democrático ao esporte. O domínio brasileiro no campo esportivo (BORDIEU, 1983,
1990) em questão, expresso não somente pelos títulos em Copas do Mundo, mas
também por um estilo de jogar chamado de “futebol-arte” (VOGEL, 1982, DAMATTA
1994, GIL 1994, HELAL e GORDON JÚNIOR, 1999), fez com que nossos
futebolistas fossem altamente valorizados no mercado de trabalho.
Portanto, mesmo que a duras penas, o futebol é um dos principais caminhos que o
negro tem para ascensão social. Mas ter sucesso no esporte, não garante estar
isento dos atos preconceituosos. O grande problema que existe no Brasil, é não se
assumir como um país racista e, por não se assumir, atitudes preconceituosas se
tornam normais. Elias (1992) diz que os esportes modernos estão envolvidos na
tentativa constante entre manter certa tensão provocada pelos jogos e o controle da
violência.
Com o passar do tempo, novas tecnologias surgiram e a própria evolução da
sociedade refletiu no uso e no impacto da informação no esporte, principalmente no
futebol. E o papel da mídia nessa relação é transformador, seja de maneira positiva
ao divulgar os atos preconceituosos visando a educação, visando coibir atos futuros,
ou de maneira negativa, ao propagar o discurso racista e exaltar as atitudes tidas
por alguns jogadores ou torcedores.
O racismo é um problema que sempre esteve presente no futebol brasileiro, mesmo
que de maneira velada. No entanto, a partir de 2014 inúmeras demonstrações e
práticas racistas foram vistas dentro e fora dos estádios com mais frequência. E com
o advento da internet, muitos atos passaram a ser cometidos através das redes
sociais na tentativa de mascarar e dificultar a identificação dos agressores. Os casos
envolvendo o goleiro Aranha e o jogador Arouca (em 2014) foram amplamente
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divulgados pela mídia e este tipo de informação se torna relevante e ganha
importância para jogadores, clubes, comissão técnica, torcedores e meios de
comunicação.
A mídia tem relevante papel na vida das pessoas, seja para informar ou para
entreter, pois integra a paisagem social moderna e penetra em todas as esferas da
vida social, no meio urbano ou rural. Não se restringindo em penetrar nossos meios
de expressão e de comunicação, ela modifica nossa visão de mundo à medida que
nos impõe novos modos de representação e de ação sobre o real. (HATJE, 2000).
Segundo Alcoba (1987, p.48) o esporte proporciona um tipo de informação distinta
dos demais. Sobre o impacto da informação esportiva, encontramos em Digel (1995)
cinco características destes efeitos através das mensagens: conhecimento a
respeito de um fato, alterações e padrões de linguística, ações sociais, atitudes e
emoções.
Carvalho e Tavares (2001, p.7) dizem que a informação está presente em
praticamente todas as atividades em que o ser humano realiza. Desta maneira, para
este estudo, levaremos em consideração os casos de racismo e injúria racial que
tenham acontecido no período de janeiro de 2014 a dezembro de 2016 e, que
tenham envolvido atletas brasileiros de futebol ou árbitros (profissionais) em jogos
ou campeonatos nacionais. Tendo como objetivo analisar a relevância e importância
dos casos de racismo e injúria racial no futebol brasileiro diante da divulgação e
exposição que é dada pela mídia.
1.1 – Cenário
O futebol é referência no Brasil desde sua chegada no início do século passado. De
acordo com DaMatta (2006, p.111) foi o futebol que juntou hino e povo e popularizou
a ideia de nação que pertence a todos, desde o pobre que mora do subúrbio das
grandes cidades até os “doutores” que ocupam altos cargos.
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Mas para ter acesso ao esporte, que hoje é o mais popular do mundo, os negros
tiveram que enfrentar muitas dificuldades. Rossi e Mendes Júnior (2014, p.39)
relatam que há pouco mais de um século, quando o futebol nascia no Brasil,
jogadores negros não só eram xingados impunemente em campo, como mal eram
admitidos no gramado. Os resquícios da escravidão no Brasil e das teorias raciais
do século XIX eram empecilhos, mas, não impediram esta inserção:
(...) sublimando tanto do que é mais primitivo, mais jovem, mais elementar,
em nossa cultura, era natural que o futebol, no Brasil, ao engrandecer-se em
instituição nacional, engrandecesse também o negro, o descendente de
negro, o mulato, o cafuzo, o mestiço. E entre os meios mais recentes - isto é,
dos últimos vinte ou trinta anos - de ascensão social do negro ou do mulato
ou do cafuso no Brasil, nenhum excede, em importância, ao futebol.
(FREYRE, 1947).
Nomes como Leônidas da Silva, o Diamante Negro, Fausto, Domingos da Guia, Pelé
e tantos outros jogadores negros colocaram o Brasil no topo do mundo no futebol
mas, sofreram com reforçando a ideia defendida por Oliveira (2008) que através dos
esportes nos quais o poder econômico não é fator determinante, como o atletismo, o
boxe e o futebol, o negro passa do papel de inferioridade para o papel principal, um
exemplo a ser seguido, e assim atinge o patamar de ídolo.
Até o ano de 2005, os casos de racismo e a injúria racial no futebol brasileiro vinham
sendo divulgados esporadicamente, sem muita ênfase e sem representação das
vítimas (os jogadores) e muito menos seus agressores, que na maioria das vezes,
eram os torcedores que nunca tinham rosto ou nomes divulgados. Esse cenário
mudou em 2014 com a visibilidade e proporção que o caso envolvendo o Goleiro
Aranha e a torcedora Patrícia Moreira tomaram.
Segundo Santin (2006, p.173) “parece que o esporte exerce um certo domínio sobre
a imprensa devido a seu grande apelo populacional. A mídia encontra consumidores
de seus programas por veicularem eventos ou espetáculos esportivos. Nesse
sentido os meios de comunicação dependem do esporte”. Desta maneira,
atualmente o esporte e a mídia caminham juntos.
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Pois segundo DaMatta (1982) o futebol se coloca na contemporaneidade como um
campo simbólico de disputas, capaz de canalizar identidades e tensões, reproduzir
dilemas e valores sociais. Portanto, o cenário desta pesquisa são os casos de
racismo e injúria racial que aconteceram de janeiro de 2014 a dezembro de 2016 e
foram divulgadas pela mídia e, que tenham envolvido atletas brasileiros de futebol
ou árbitros (profissionais) em jogos ou campeonatos nacionais.
1.2 – Objetivo Geral
Analisar a relevância e importância dos casos de racismo e injúria racial no futebol
brasileiro diante da divulgação e exposição que é dada pela mídia.
1.3 – Objetivos Específicos
Analisar, a partir das notícias veiculadas pela mídia, os casos de racismo e
injúria racial que tenham acontecido entre janeiro de 2014 a dezembro de
2016 e, que tenham envolvido atletas brasileiros de futebol ou árbitros
(profissionais) em jogos ou campeonatos nacionais.
Verificar se existe relação entre o preconceito e a injúria racial, o racismo e o
futebol brasileiro.
Identificar como o futebol brasileiro é influenciado pela divulgação através da
mídia dos casos de racismo e injúria racial.
Analisar a relevância do impacto da informação esportiva no futebol brasileiro
a partir dos casos de racismo e injúria racial.
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1.4 – Justificativa
Com a abolição da escravatura em 1888, as mudanças nas camadas sociais
começaram a acontecer. Tais transformações atingiram diretamente o esporte e a
sociedade, impactando na relação que havia entre os praticantes.
Segundo Assunção et al (2010) enquanto que nas classes sociais mais elevadas, o
esporte é praticado por lazer, sociabilidade, estética, qualidade de vida e para
ostentar certo status e posição social, nas camadas mais populares, crianças e
adolescentes procuram nele um caminho para a ascensão social, uma maneira de
transpor as barreiras culturais e sociais, se submetendo aos “peneirões” das
categorias de base de equipes profissionais.
Para o esportista negro as transformações na sociedade não trouxeram grandes
avanços. O negro “objeto” virou cidadão livre, mas não adquiriu status pleno de
liberdade, porque conforme o pensamento progressista vigente na época, os
brancos seguiram superiores aos negros, conforme salientam Rossi e Mendes
Júnior (2014, p.39).
A profissionalização do futebol transformou o lazer em universo de trabalho
passando a gerar renda para os jogadores, alterando significativamente o tipo de
envolvimento que havia com o esporte. De acordo com Oliveira (2008) o negro era
considerado como um ser inferior pelo movimento evolucionista que considerava os
negros como primitivos, e pelo movimento eugênico que tinha como objetivo a
correção das degenerações humanas e considerava a raça negra como uma dessas
degenerações.
O esporte como fenômeno social e, aqui representado, pelo futebol brasileiro é um
instrumento capaz de reproduzir a segregação social e racial, dividindo e
distinguindo as camadas sociais e raciais. Para Pires (1998, p.28) há interesses
específicos das elites nos meios esportivos. Já para Assunção et al. (2010, p.95) a
discriminação de classe se dá através das condições para que a prática esportiva
seja realizada.
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Dessa maneira, o processo de exclusão social é evidente no ambiente esportivo do
futebol brasileiro e, pode-se dizer que o processo de exclusão racial também é.
Ainda tratando sobre o pensamento defendido por Assunção et al. (2010, p.94)
revelando que as diferenças étnico-raciais marcam a realidade esportiva. Esta
identificação também ocorre com a questão racial.
Enxergar jogadores de futebol pobres e negros em posições de destaque e
reconhecimento dá uma dose, mesmo que homeopática, de esperança aos
espectadores e fãs do esporte de que a ascensão, a glória, as conquistas e o
reconhecimento financeiro é possível. No entanto, a identificação racial também
acontece quando os casos de preconceito racial e racismo surgem e são levados à
tona pela mídia e repudiados pela sociedade.
Portanto, o esporte e, nesta faceta, o futebol brasileiro, passa a ser um espaço de
construção e reafirmação de identidades, de comportamentos e de atitudes, de
maneira a reproduzir a lógica ou a ilógica que existe na sociedade.
É contraditório pensar que em uma sociedade miscigenada como a brasileira, que
foi berço de diversas nacionalidades, origens e costumes, o racismo, o preconceito e
a injúria racial façam parte de sua concepção deste o princípio e, ainda resistam
fortemente nos dias de hoje.
Mesmo que haja uma ampla cobertura por parte da mídia e que até alguns casos
evoluam para a esfera esportiva e judicial, a maioria dos casos ainda são tratados
de maneira superficial. Portanto, este trabalho se justifica pelo aumento considerável
no número de casos de racismo e injúria racial no futebol brasileiro.
1.5 – Glossário
Neste trabalho, os termos a seguir listados foram arrolados com os seguintes
conceitos:
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Crime de Injúria Racial
O crime de Injúria Racial está descrito no artigo 140, no Capítulo V, na parte especial
do Código Penal dos crimes contra a honra, que consiste em ofender a honra de
alguém valendo-se de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem.
Os crimes são enquadrados neste caso quando acontece uma conduta
discriminatória a determinada pessoa, e a pena é muito mais leve, o réu pode
responder em liberdade desde que pague a fiança. De maneira geral, o crime de
injúria racial é associado ao uso de palavras depreciativas referentes à reça ou cor
na intenção de ofender a honra da vítima.
Crime de Racismo
De acordo com a Lei n. 7.716/1989, o crime de Racismo significa conduta
discriminatória dirigida a determinado grupo ou coletividade e, geralmente, refere-se
a crimes mais amplos.
Nesta situação, os casos elencados nesta categoria são julgados pelo Ministério
Público que tem legitimidade para processar o acusado. Segundo a lei, recusar ou
impedir acesso a estabelecimento comercial, impedir o acesso às entradas sociais
em edifícios públicos ou residenciais e elevadores ou às escadas de acesso, negar
ou obstar emprego em empresa privada, entre outros se encaixa dentro da
descrição de crime de racismo. O racismo é um crime, imprescritível e inafiançável.
Discriminação Racial
De acordo com Bordieu (2004) a discriminação racial é multifacetada, pois está
presente em vários setores do campo esportivo. Podemos enxergar essa
característica no meio dos próprios jogadores de futebol, dentro dos clubes, nas
torcidas e, principalmente dentro da mídia.
Esporte na Mídia e Esporte da Mídia
Segundo Betti (2002), existe uma clara diferença entre a cobertura do esporte no
que chama esporte na mídia, que é como deveria ser a abordagem da temática nos
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veículos de comunicação, e o esporte da mídia, cobertura em que os assuntos
esportivos são sempre mediados pelos olhares interessados dos diversos meios.
Analisando mais especificamente a televisão (o que não exclui a aplicação a outros
meios), o autor defende que o esporte da mídia é limitado, não cumpre a abordagem
ideal por estar baseado em cinco características: ênfase na falação, monocultura
esportiva, supervalorização da forma em relação ao conteúdo, superficialidade e
prevalência dos interesses econômicos.
Segundo Assunção et al. (2010, p.96) a mídia influi e interfere no comportamento do
público em geral, assim como dos esportistas. Através da mídia, o público pode ser
manipulado. Ela age estimulando, restringindo e condicionando os telespectadores,
estabelecendo padrões de consumo e formas de participação.
Informação
De acordo com Carvalho e Tavares (2001) as organizações alimentam-se de
informações, e ao mesmo tempo são direcionadas por elas, de forma que fornece o
sentido de uma organização ser. A cada momento, informações são processadas
pelos colaboradores de uma organização; as informações procedem de fontes
internas e externas.
Segundo Côrtes (2007) “quando dados passam por algum tipo de relacionamento,
avaliação, interpretação ou organização, tem-se a geração de informação”. Segundo
Valentim (2008, p.18), a informação é “[...] ao mesmo tempo, objeto e fenômeno,
visto que pode ser destacada e analisada por si mesma e, também, pode ser parte
de um processo”.
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Informação Esportiva
A informação esportiva é conceituada por Clarke (2000 Apud Monteiro; Botelho,
2009, p.58) como [...] informação especializada, que diz respeito ao domínio
específico das atividades físicas desportivas e do lazer, e que os usuários dos
serviços estão cada vez mais exigentes com relação à eficácia do serviço e à boa
adequação dos produtos de informação às suas necessidades.
A informação esportiva é um dado contido no cenário esportivo que, ao se relacionar
com um determinado sujeito vinculado a uma organização esportiva, transforma-o
em informação esportiva. (Bitencourt, 2013 p. 61).
Beluzzo (2009) relaciona a importância do uso da informação esportiva por seus
usuários, com o intuito de gerar conhecimento para uma determinada aplicação, ou
seja, corrobora a importância da relação do usuário com o ambiente informacional
de modo que possa transformar a informação em conhecimento. E, de fato, a
informação é e o seu uso gera conhecimento.
Preconceito
De acordo com Jones (1972), o preconceito é uma atitude negativa em relação a
uma pessoa ou grupo, sempre baseado num padrão de comparação social. A
manifestação comportamental do preconceito seria a discriminação.
Já Lima (2002, p.30) entende o preconceito da seguinte forma: “(...) um processo de
hierarquização, exclusão e discriminação contra um indivíduo ou toda uma categoria
social que é definida como diferente com base numa marca física externa (real ou
imaginária), a qual é resignificada em termos de uma marca cultural interna que
define padrões de comportamento”. Para Wieviorka (2007, p.19-25), o preconceito é
uma forma elementar do racismo.
Preconceito Racial
O antropólogo Munanga (1998, p.47), nos mostra que o preconceito racial não é
exclusivamente fruto da ignorância de uma pessoa. Se o preconceito racial fosse
somente produto da ignorância, seria fácil utilizar a educação para erradicar este e o
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racismo. Na realidade, o preconceito racial está embutido na própria ideologia
racista de nossa sociedade.
Segundo Blummer (1958), é o próprio preconceito que constitui o grupo racial, pois
este não teria existência independente de nossa percepção, sem estar relacionado
ao nosso sistema de valores. O que ele chamava de “sentimento de posição do
grupo” é a própria definição de um grupo racial em relação a outro, a sua
constituição, as fronteiras que o preconceito expressa, delimita e sanciona.
Racismo
Para Wieviorka (2007, p.19-25), o racismo é assim, uma ideologia essencialista que
imputa características negativas reais ou supostas a um determinado grupo, as
quais justificam um tratamento desigual deste grupo definido perante o resto da
sociedade.
A obra do autor Allport (1954, p.7) é considerada um dos marcos para o estudo
sobre preconceito, conforme ele o racismo é “uma atitude aversiva ou hostil face a
uma pessoa pertencendo a determinado grupo, simplesmente por causa da sua
pertença a esse grupo, e em que se pressupõe que esta possui as características
atribuídas a esse grupo”.
Lima e Vala (2004, p. 402) dizem que o racismo, por sua vez, diferentemente do
preconceito, é muito mais do que uma atitude. Segundo Guimarães (2005, p.355)
falar em racismo extrínseco e intrínseco seria a melhor forma de definir o racismo,
pois “permite considerar todas as possibilidades nas quais a ideia de raça empresta
um sentido subjetivamente visando à ação social, cobrindo, portanto, aquele campo
que podemos definir, de modo estrito, como o campo das relações raciais”.
Raça
Segundo Schwarcz (2002) o termo “raça” surgiu no século XVI durante a descoberta
de que os homens eram diferentes entre si. Com base no valor heurístico da “raça”,
no século XVIII foram criadas teorias para dar inteligibilidade e sustentação à
dominação entre as “raças”, bem como definir a moralidade e o devir dos povos. De
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acordo com Malik (1982) “raça” foi um dos conceitos que serviram para analisar,
diferenciar e hierarquizar os grupos dentro de um Estado-nação.
Para Elias (1993) “raça” foi um dos primeiros conceitos elaborados para estabelecer
a desigualdade biológica entre grupos, assim como o de civilização. Posteriormente,
o uso do termo, ao final do século XIX, teria passado a descrever comportamentos,
habilidades, deficiências e atitudes dos povos de pele escura, principalmente os
negros (Stocking Jr.,1982).
No Brasil, a aplicação do termo segundo Guimarães (2008) passou a ser usado num
sentido biológico, enquanto “classe” ou “homens de cor” seria usado em um sentido
social. Já Rezende e Maggie (2002, p.15) ressaltam seu aspecto social. Para elas,
palavras como negro, branco e moreno “tornam-se atribuições que podem variar de
acordo com quem fala, como fala e de que posição fala. As formas de manipular
esse sistema de classificação não se dão, entretanto, por acaso.
De acordo com Gordon Jr. (1996, p.77) as representações dos negros no futebol
estiveram vinculadas a expressões naturais e inatas exclusivas da “raça negra”, tais
como “irracionalidade, impulsividade, excesso, musicalidade, ginga, arte, malícia”.
Muitos destes termos são vistos e aplicados a realidade do futebol brasileiro e são
qualidades dadas a jogadores negros.
17
Capítulo II – O Futebol Brasileiro
2.1 – Dos primórdios ingleses até os campos brasileiros
A história que trata do início do futebol é cercada por diversas hipóteses. Uma delas
relata o início na Inglaterra, na Universidade de Oxford – Charles Wreford-Brown
quando um estudante britânico teria sido questionado se jogaria rugger (em
referência ao rúgbi) e, a resposta foi que ele jogaria soccer, que era o manuseio da
bola com as mãos que posteriormente seria oficializado com a criação das regras no
século XIX e, também uma variação linguística que era moda na elite inglesa da
época.
Segundo Elias e Dunning (1992) as primeiras normatizações desse jogo de bola
com os pés foram feitas nas escolas públicas inglesas entre 1845 e 1862. Mas o
marco oficial da “criação” do futebol, como um esporte moderno, foram os últimos
meses do ano de 1863, quando foi fundada a Associação de Futebol inglesa
(Football Association – FA). Porém o primeiro clube inglês de futebol surgiu em
1857, quando este jogo de bola com os pés ainda não havia se tornado um esporte.
Estes estudos nos dizem que o futebol foi aceito independente das estruturas dos
países que aderiram à sua prática e/ou tornaram-no um espetáculo.
Os primeiros países que aderiram a este novo tipo de esporte e lazer foram os
europeus sendo também os precursores na criação das federações de futebol, o que
seria um marco importante para compreensão do futebol como um esporte moderno.
Esse crescimento trouxe consigo os elementos que constituam o jogo, a linguagem,
a maneira que o futebol era organizado, os hábitos de terem adeptos assistindo aos
jogos aqueles que, atualmente, chamamos de espectadores ou de torcedores.
Os autores Poli e Carmona (2006) no Almanaque do Futebol contam que sob o
comando de Ebenezer Cobb Morley, considerado um dos primeiros cartolas do
esporte, 11 escolas passaram então a integrar e a seguir as regras estipuladas pela
F.A. A medida que o futebol se desenvolveu, em 1880, foi criado a International
Football Association Aboard (IFAB) para tornar homogêneas as regras do futebol
18
inglês, escocês e irlandês, era uma maneira de preservar e unificar o esporte entre
as nações.
Em 1904, o futebol já era patrimônio mundial e sete associações europeias se
uniram em Paris para criarem a Fédération Internationale de Football Association
(que se transformaria na global FIFA em 1913). Atualmente, a FIFA é considerada a
instituição máxima do futebol com 209 países/territórios associados, o que torna este
esporte, um dos mais populares do mundo.
Ainda no pensamento dos autores Poli e Carmona (2006, p.3) em 150 anos, o
futebol redefiniu a palavra esporte, interrompeu guerras, gerou ídolos, lendas,
celebridades. Virou e revirou a indústria do entretenimento, estendeu sombras
enormes de corpos franzinos, transformou meninos pobres em ícones planetários,
criou modas, gerou empregos e se tornou o jogo mais jogado no mundo. No Brasil, o
esporte da elite inglesa chegou através dos imigrantes e virou lazer para a alta
sociedade brasileira, como descreve Luis Fernandes:
Um esporte praticado quase que exclusivamente por clubes de engenheiros
e técnicos ingleses e suas famílias no início do século XX. Do fascínio pelo
novo esporte por jovens da elite metropolitana que conviviam com os
ingleses e seus clubes. Da organização de clubes para a prática do futebol
nos bairros da elite social da Capital, que se tornaram, igualmente,
importantes centros de convivência das “famílias de bem. (FILHO, 2003
p.13).
De acordo com a compreensão da maioria dos autores, o futebol se inicia no Brasil
em 1894 com a chegada de Charles Miller, que era filho de ingleses (cônsul
britânico) e havia ido estudar na Inglaterra na falta de escolas que ensinassem em
inglês e transmitissem os costumes britânicos. Foi em Southampton que o jovem
teve contato com o futebol, naquela época, os colégios estimulavam a prática
esportiva (críquete, rugby football e o football association) como parte essencial na
formação educacional.
De acordo com Rosenfeld (1993, p.63) ( ...) para difundir o futebol entre os ingleses,
que viviam em São Paulo e jogavam cricket, Miller entregou-se a uma fervorosa
19
atividade de missionário. O primeiro círculo que cultivou o jogo numa forma
organizada foi formado por sócios de um clube inglês São Paulo Athletic Club, que
havia sido fundado para a prática do cricket e ao qual Miller se associou. O clube
reunia altos funcionários ingleses da Companhia de Gás, do Banco de Londres e da
São Paulo Railway. Então, dia 14 de abril de 1895 há um registro como sendo o
primeiro jogo de futebol no Brasil.
2.2 – A Realidade do Negro no Futebol Brasileiro
A história mais popular sobre a chegada do futebol no Brasil é através da figura de
Charles Miller, mas há diferentes versões e outros personagens que também seriam
responsáveis pela introdução do esporte no país. De acordo com Santos Neto
(2002), em 4 de maio de 1894, em busca de novas oportunidades, o escocês
Thomas Danoe embarcou para o Brasil. Meses depois, em agosto, a família de
Danoe fez o mesmo trajeto saindo de Glasgow e trazendo como encomenda de
Thomas bolas de futebol. Danoe teria organizado partidas informais antes de Miller,
que só chegou no Brasil em outubro de 1894. Para o autor, Thomas não teve a
preocupação em anotar, registrar a prática, enquanto Miller documentou a novidade
no país.
Para a maioria dos autores, as atividades praticadas com bola e os pés não
poderiam ser confundidas com a institucionalização do futebol. Mills (2005) defende
com veemência que todos os cronistas esportivos concordam com a figura de Miller
como percursor. O futebol tornou-se quase que matéria obrigatória em escolas
militares e nos internatos administrados por padres católicos. Há um registro que a
primeira bola de couro cru teria sido produzida por Manuel Gonzales, um padre do
Colégio Vicente de Paula, que comandava jogos para cerca de 40 alunos (FILHO,
2003).
Inicialmente, o futebol foi organizado de maneira direcionada a abranger as
camadas superiores da sociedade, já que tinha um caráter mais social e elitista,
sendo praticando majoritariamente pela elite inglesa e brasileira. Ir a um jogo de
20
futebol era uma prática social que exigia um código de conduta. De acordo com o
historiador Mário Filho (2003 p.11), o domínio da elite sobre o futebol estava
chegando ao fim:
Não se ganhava campeonato só com times de brancos. Um time de brancos,
mulatos e pretos era o campeão da cidade. Contra esse time, os times de
brancos não tinham podido fazer nada. Desaparecera a vantagem de ser de
boa família, de ser estudante, de ser branco. O rapaz de boa família, o
estudante, o branco tinha de competir, em igualdade de condições, com o pé-
rapado, quase analfabeto, o mulato e o preto, para ver quem jogava melhor.
(FILHO, 2003 p,11).
Um fato interessante chama a atenção, segundo Caldas (1990 apud RODRIGUES
2004, p.272) no ano de 1919, o então Presidente da República Epitácio Pessoa
proibiu a convocação de jogadores negros para representar o país. Segundo Neto et
al (1989, p.50) o Palmeiras, o Flamengo, o Fluminense, o Botafogo, são alguns
exemplos de grandes times que impediam o acesso do negro à prática do futebol no
começo do século passado.
Para Rodrigues (2004, p.273) com o início do profissionalismo do futebol em 1933,
os caminhos aos poucos foram sendo abertos para os jovens das camadas sociais
mais baixas, o futebol começa a se tornar um instrumento de emancipação social
dos negros, possibilitando sua ascensão social, independentemente do seu atual
poder econômico e do nível de escolaridade.
Desta maneira, segundo Negreiros (2003, p.127) quando esse esporte deixa de ser
o lugar de encontro de uma elite – sempre desvinculada e avessa aos problemas
populares –, novos setores sociais se fizeram presentes. Ao mesmo tempo em que o
futebol foi perdendo seu caráter branco e elitista, veio o desprestígio social. A essas
elites só restou desdenhá-lo como uma manifestação da irracionalidade, do atraso,
da desordem, da violência, da ausência de caráter educativo. Em última análise,
demonstrava-se a incapacidade de o futebol estar nas mãos dos setores populares.
Destes só poderiam ser esperados atos inconsequentes. Não havia como fazer o
futebol desaparecer. Portanto, era preciso discipliná-lo, era preciso uma ordenação
que viesse de cima e a partir da intervenção do poder público.
21
Durante as décadas de 30 a 50, os jogadores negros afirmaram o seu valor e suas
habilidades dentro de campo sendo responsáveis por grandes conquistas nos clubes
e na seleção brasileira. Em contrapartida, quando os jogadores negros perdiam a
“inferioridade racial” transparecia e voltava à tona.
Um exemplo marcante é a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de
1950, em que perdemos o título. Como consequência, houve o “ressurgimento” do
racismo e o questionamento sobre a raça brasileira e sobre o futuro do país. De
acordo com Franco Júnior (2007, p. 85), era necessária a identificação dos culpados
pela frustração do povo. Afinal, "o futebol expressava nitidamente o sentimento de
identidade nacional forjada sob a batuta autoritária".
Já segundo Rodrigues Filho (2003, p. 290), foram escolhidos como bodes
expiatórios o "frangueiro" Barbosa, o "covarde" Bigode e o "cachaceiro" Juvenal,
enquanto outros negros e mulatos (Zizinho, Bauer e Jair) e os brancos do time não
foram acusados de nada. Os jogadores Bigode e Barbosa, por exemplo, foram
acusados de serem os responsáveis pela derrota na final da Copa de 50, já que
devido a sua “raça” “afrouxaram” diante dos uruguaios.
Com o advento das primeiras conquistas de títulos mundiais e a importância da
participação de atletas negros, como o Rei Pelé, os questionamentos e dúvidas que
haviam sobre a capacidade dos jogadores negros terminou e o discurso freyriano foi
recuperado e os negros passaram a ser o nosso “elemento surpresa” no futebol
(FREYRE, 1938).
Rodrigues (2004, p.276) relata que o famoso e vencedor estilo brasileiro de jogar
futebol, onde dribles e fintas são utilizados costumeiramente, na realidade é fruto do
racismo neste esporte, pois negros e mulatos tinham que se desviar constantemente
dos brancos, não era permitido que houvesse contato corporal do negro com o
branco, sob o risco de advertências bastante severas. Esse constante e exigido
desvio dos negros e mulatos em relação aos brancos foi se tornando cada vez mais
coordenado e eficaz, se transformando nos dribles e nas fintas. Uma falta normal era
visto como desrespeito e muitas vezes eles apanhavam por isso.
22
Vejamos a fala de Fausto dos Santos:
"Pensei em me adiantar, avançar com a bola e ajudar o Prego… Quem sabe
a gente até empatava… Aí me lembrei que era o único preto do time… E se
sofrêssemos um gol lá atrás, sem eu ter voltado… Bater já não batiam mais,
mas a culpa vinha toda para cima de mim". (A Noite, 28/07/1930, p. 34 apud
MURAD, 1999, p. 14).
Freyre (1938) defendeu a tese de que o problema do país estava relacionado às
disparidades sociais e culturais, mas não com a cor da pele da sua população:
“De maneira inconfundível formou-se um estilo brasileiro de futebol; e esse
estilo é uma nova expressão da nossa mulatice, perito em assimilação,
domínio e abrandamento coreógrafo sinuoso e musical das técnicas
européias e norte-americanas, que são muito angulosas para o nosso gosto
– trata-se de técnicas de jogo ou de arquitetura. Pois nosso tipo de mulatice
[...] é inimigo do formalismo apolíneo, é o dionisíaco na sua mobilidade. [...]
No futebol, como na política, a mulatice brasileira caracteriza-se pelo prazer
da elasticidade, da surpresa, da retórica, que lembra passos de dança e
fintas de capoeira. (FREYRE, 1945, p.421-222).
2.3 – Preconceito e Injúria Racial, Racismo e o Futebol Brasileiro
“Xingar um negro de macaco não tem esse peso todo – para quem xinga. É tão
comum que a pessoa nem mais percebe a intenção que é botar a pessoa ofendida
pra baixo, lembrar-lhe que é inferior e assim, quem sabe, afetar seu desempenho
em campo.” (LA PENÃ, 2014). Essa frase foi dita pelo humorista Helio de La Penã
em seu blog no post intitulado “A Teia do Aranha” no dia 06 de setembro de 2014 em
alusão ao caso do Goleiro Aranha, ocorrido em agosto.
Segundo o humorista, o goleiro tomou a atitude correta ao parar o jogo e procurar o
juiz quando foi ofendido pois, chamou a atenção para o fato, o que provocou uma
decisão inédita. Decisão tal que viria na tentativa de frear e coibir esse tipo de
preconceito no ambiente esportivo e, fundamentalmente, no futebol brasileiro.
23
Tratar sobre as questões raciais e de preconceito no Brasil é um tanto quanto
delicado e exige sutileza. Vivemos sob a atmosfera da democracia e da igualdade
racial. Transita sobre a concepção da sociedade, que tais questões estão superadas
e que vivemos em um país não racista. Nos acostumamos as situações de
preconceito e intolerância racial, que em vários momentos, absorvemos o conceito
de democracia racial. Democracia Racial não é puramente a harmonia nas relações
raciais de pessoas pertencentes a estoques raciais diferentes ou “raças” distintas.
Democracia significa, fundamentalmente, igualdade racial, econômica e política.
Guimarães (2002, p.168) postula que para a militância negra e para alguns
intelectuais brasileiros contemporâneos a democracia racial representa um mito que
dá acesso para a interpretação do racismo e da cultura brasileira:“morta a
democracia racial, ela continua viva enquanto mito, seja no sentido de falsa
ideologia, seja no sentido de ideal que orienta a ação concreta dos atores sociais,
seja como chave interpretativa da cultura.
Para o sociólogo Vieira (2003, p.242), a crença de que neste esporte não existem
práticas e atitudes discriminatórias contra negros e pardos só mascara um processo
que ocorre em toda a sociedade brasileira, além de dar a incorreta sensação de que
em algum lugar e de alguma forma eles podem não ser vítimas de discriminação.
Helal (1990) salienta que:
A situação inicial de qualquer competição esportiva é sempre de simetria, de
total igualdade, com os competidores se encontrando no mesmo plano,
classificados horizontalmente, sem distinção hierárquica; ao final das
disputas, que ocorrem a partir de regras que são as mesmas para todos (o
que faz com que todos tenham as mesmas oportunidades), teríamos uma
disjunção, em que os competidores, não mais horizontalizados, seriam
verticalizados e hierarquicamente desigualados. (HELAL, 1990).
Os termos que são direcionados aos jogadores negros ou mulatos no futebol são
ofensivos e racistas. A insignificância e a futilidade é tanta, que chamar de “macaco”,
“preto fedido” e “negão” por muitos já faz parte do jogo, ou seja, é um aspecto
cultural do futebol e, sendo assim, passa a ser permitido e aceito dentro do ambiente
24
esportivo. Tanto que na maioria das vezes, os acontecimentos acabam passando
desapercebidos pela arbitragem e nem chegam a ser relatados em súmula e,
quando evoluem para a esfera judicial se torna ainda mais difícil provar a veracidade
dos fatos.
Rossi e Júnior (2014, p.39) falam que “a dificuldade em detectar e punir o racismo é
histórica no tribunal. Usualmente, ofensas desse gênero são qualificadas como fruto
do calor da partida, uma parcimônia consoante à cultura nacional e, mais
especificamente, ao contexto em que se desenvolveu o futebol”.
Logo, existe uma linha tênue entre o Racismo e a Injúria Racial e tratando do nosso
tema, ofensas como o “Macaco” e “Preto fedido”, que foram dirigidas aos jogadores
são atitudes racistas, mas que segundo a Lei são julgadas como injúria racial, já que
foram destinadas a uma única pessoa.
25
Capítulo III – Materiais e Métodos
3.1 – Tipo de Pesquisa
O presente trabalho se caracteriza como qualitativo de caráter exploratório e
descritivo, com coleta de dados por meio de levantamento documental e
bibliográfico. A metodologia, segundo Correia (2009), é a descrição completa, clara e
objetiva dos procedimentos adotados no decorrer do trabalho de pesquisa e
compreende tanto os métodos escolhidos quanto as técnicas utilizadas pelo
pesquisador.
Quanto à natureza, trata-se de uma pesquisa qualitativa que procura descrever o
que acontece em determinado ambiente. Não se apresenta como uma proposta
rigidamente estruturada, já que a pesquisa qualitativa permite que a criatividade dos
investigadores os leve a propor trabalhos que explorem novos enforques (GODOY,
1995). Para Minayo (2001), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de
significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a
um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não
podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.
Quanto ao objetivo a pesquisa é exploratória e descritiva. Pretende desenvolver,
esclarecer e modificar modelos e ideais, e ainda descrever características de
determinado fenômeno. A pesquisa exploratória permite a consideração de diversos
aspectos relativos à questão a ser estudada (GIL, 2002), e a descritiva se
caracteriza pela necessidade de explorar novas situações as quais precisam de
outras informações mais aprofundadas (LEOPARDI et al. 2001).
Segundo Rudio (2000), a pesquisa descritiva é aquela que procura obter informação
do que existe, com o intuito de poder descrever e interpretar a realidade. Interpreta
“o que existe” e relaciona condições, dados que não consistem apenas na tabulação
de dados, mas inclui a interpretação e a conclusão.
26
Quanto aos procedimentos técnicos, trata-se de uma pesquisa por meio de
levantamento documental e bibliográfico, aliado a análise de conteúdo. A pesquisa
foi documental, por meio de livros, periódicos, produção de internet, jornais
impressos e online. Souza (2001, p.59) diz que todo e qualquer trabalho acadêmico
requer um conhecimento sobre os livros, artigos, periódicos de modo impresso,
eletrônico, etc, sendo imprescindível um processo metodológico, um certo caminho a
seguir, como forma de ser racional e econômica para aquele que realiza a pesquisa.
Apesar de serem termos parecidos, existem diferenças entre eles. Segundo Marconi
e Lakatos (1992), a pesquisa bibliográfica é o levantamento de toda a bibliografia já
publicada, em forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita. A
sua finalidade é fazer com que o pesquisador entre em contato direto com todo o
material escrito sobre um determinado assunto, auxiliando o cientista na análise de
suas pesquisas ou na manipulação de suas informações.
Já de acordo com Fonseca (2002, p.32) a pesquisa documental trilha os mesmos
caminhos da pesquisa bibliográfica, não sendo fácil por vezes distingui-las. (...) A
pesquisa documental recorre a fontes mais diversificadas e dispersas, sem
tratamento analítico, tais como: tabelas estatísticas, jornais, revistas, relatórios,
documentos oficiais, cartas, filmes, fotografias, pinturas, tapeçarias, relatórios de
empresas, vídeos de programas de televisão, etc.
3.2 – Instrumentos de Coleta de Dados
A pesquisa foi construída através de análise de alguns sites de jornalismo esportivo,
dentre eles: Espn Brasil (http://espn.uol.com.br/), Jornal O Estado de São Paulo
(http://www.estadao.com.br/), o Uol Esportes (https://esporte.uol.com.br/) ligado ao
Jornal Folha de São Paulo (http://www.folha.uol.com.br/), o Globo Esporte
(http://globoesporte.globo.com) ligado à Rede Globo de Televisão. Além da utilização
das bases de dados Periódicos Capes, Scielo e Periódicos da UnB sendo que as
palavras chaves utilizadas foram: Racismo, Racismo no Futebol, Futebol Brasileiro,