-
91
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014ARTIGO
Experimentos didticos de cristalizao
Ideval Souza CostaMuseu de Geocincias, Instituto de Geocincias,
Universidade de So PauloFbio Ramos Dias de AndradeDepartamento de
Mineralogia e Geotectnica, Instituto de Geocincias, Universidade de
So
ABSTRACT DIDACTIC CRYSTALLIZATION EXPERIMENTS This paper
presents experiments with sixteen water-soluble compounds, whose
saturated solutions evaporated at ambient condition to assess their
ability to produce macroscopic, idiomorphic crystals. Of the
compounds tested, two yielded seeds and macroscopic crystals in two
weeks (co-pper sulfate pentahydrate, sodium chloride coarse salt),
six produced macroscopic crystals after two weeks (ammonium
phosphate monobasic, sodium bromate, magnesium sulfate
heptahydrate, sulfate nickel chloride hexahydrate, aluminum
potassium sulphate dodecahydrate, sodium tartrate tetrahydrate and
potassium), and eight did not produce macroscopic crystals (calcium
acetate monohydrate, copper acetate monohydrate, analytical grade
sodium chloride, sodium chromate tetrahydrate, sodium nitrate,
potassium ferrocyanide trihydrate, sodium chlorate, potassium
chloride). The experimental results indicate that the solutions of
compounds that allow a higher degree of supersaturation, i. e. a
wider metastable zone, have better performance in crystallization
experiments in terms of formation of macroscopic crystals. These
experiments allow addressing various topics of the National
Curriculum Parameters for primary and secondary education, and
higher education in disciplines as fundamental chemistry and
crystallography.
KEYWORDS: crystals, crystallization, evaporation,
metastability
RESUMO Este trabalho apresenta experimentos para avaliar a
capacidade de produzir cristais idiomrficos de dezes-Este trabalho
apresenta experimentos para avaliar a capacidade de produzir
cristais idiomrficos de dezes-seis compostos solveis em gua, cujas
solues saturadas evaporaram em condio ambiente. Dos compostos
testados, dois produziram sementes e cristais macroscpicos em duas
semanas (sulfato de cobre pentahidratado, cloreto de sdio tipo sal
grosso), seis produziram cristais macroscpicos aps duas semanas
(fosfato monobsico de amnia, bromato de sdio, sulfato de magnsio
heptahidratado, sulfato de nquel hexahidratado, sulfato de alumnio
e potssio dodecahidratado, tartarato de sdio e potssio
tetrahidratado) e oito no produziram cristais macroscpicos (acetato
de clcio hidratado, acetato de cobre monohidratado, cloreto de sdio
pureza analtica, cromato de sdio tetrahidratado, nitrato de sdio,
ferrocianeto de potssio trihidratado, clorato de sdio, cloreto de
potssio). Os resultados experimentais indicam que as solues de
compostos que permitem maior grau de supersaturao, ou seja, maior
largura da zona metaestvel, apresentam melhor desempenho nos
experimentos de cristalizao, em termos da formao de cristais
macroscpicos idiomrficos. Estes experimentos permitem abordar
diversos contedos dos Parmetros Curriculares Nacionais para os
Ensinos Fundamental e Mdio, e do Ensino Superior, em disciplinas
como cristalografia e qumica fundamental.
PALAVRAS-CHAVES: cristais, cristalizao, evaporao,
metaestabilidade
-
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
92
te domstico, permitindo que a cristalizao seja acompanhado
diariamente, com o desenvolvimen-to das formas simtricas dos
cristais macroscpicos.
Materiais e mtodosOs equipamentos utilizados nos
experimentos
incluem bqueres de vidro (250 ml), basto de vidro, gaze,
elstico, palitos de madeira, balana de preciso, termmetros e
agitador magntico. Os compostos utilizados e suas respectivas
solubi-lidades a 20o C esto relacionados na Tabela 1. As solues
foram preparadas por dissoluo em 100 ml de gua destilada
temperatura ambiente, com 10 % em peso de excesso soluto alm da
saturao; o excesso de soluto tem por objetivo supersaturar a soluo
e evitar que haja perda da semente de cristalizao no momento em que
esta inserida na soluo. Os experimentos foram cobertos com gaze
para evitar a queda de partculas externas na soluo. Os compostos
usados nos experimentos so de baixo custo e tm aplicaes diversas em
nossa vida cotidiana, seja na farmacologia, culi-nria ou em
indstrias de transformao. Estas aplicaes fogem ao escopo deste
trabalho, mas a pesquisa escolar neste campo uma boa atividade
complementar aos experimentos de cristalizao.
Na primeira fase dos experimentos foram obtidas sementes de
cristalizao, que so peque-nos cristais que posteriormente so
imersos em soluo para crescimento e obteno dos cristais
macroscpicos. As semente foram obtidas a partir de soluo
supersaturada em repouso em recipiente aberto de vidro, com grande
superfcie livre para evaporao (20 x 30 cm).
As sementes obtidas foram imersas nas solues supersaturadas para
observao do crescimento cristalino, presas por linha com um n
corredio e suspensas na soluo por um palito de madeira atravessado
na abertura do bquer (Figura 1).
As medidas das taxas de crescimento cristalino e de evaporao
foram feitas em intervalos de 48 horas, durante duas semanas. A
taxa de evaporao foi medida pesando-se o bquer com soluo em balana
de preciso, computando a variao em massa. A taxa de evaporao foi
medida para avaliar o efeito do campo inico do soluto sobre
evapo-rao da gua. Para efeito de comparao, em cada experimento foi
monitorada em paralelo a taxa de evaporao de gua destilada em um
bquer de mesma capacidade, mantido nas mesmas condies ambientais do
bquer com a soluo salina.
IntroduoA primeira constatao de que a forma externa
simtrica dos cristais poderia ser consequncia do arranjo da
matria no interior dos cristais se deve ao dinamarqus Niels Stensen
(latinizado Steno, 1638-1686) que percebeu a constncia dos ngu-los
entre faces equivalentes em cristais de uma mesma substncia. No
sculo XVIII, Ren Hauy (1743-1822) props que os cristais pudessem
ser compostos por partculas minsculas organizadas de maneira
regular, sendo as faces simtricas dos cristais expresses
macroscpicas deste arranjo ordenado. Entretanto, apenas no incio do
sculo XX foi possvel confirmar esta hiptese com os experimentos de
difrao de raios X em cristais, realizados por Max von Laue, em
1914, e posterior-mente por William Henry Bragg e William Lawren-ce
Bragg, respectivamente pai e filho, em 1915.
A quase totalidade dos slidos naturais e artifi-ciais se
encontra no estado cristalino, mas, apesar disto, a nucleao e o
crescimento cristalino no fazem parte de nossa observao cotidiana.
No obstante, cristais macroscpicos idiomrficos podem ser produzidos
em laboratrio atravs de experimentos simples (e.g. Wood, 1972),
pela eva-porao temperatura ambiente de solues aquo-sas
supersaturadas. O presente trabalho explora os cristais e o
processo de cristalizao quanto s suas aplicaes didticas.
Neste trabalho, foram testados compostos solveis em gua, cujas
solues supersaturadas foram analisadas quanto s taxas de
crescimento cristalino e de evaporao, bem como quanto forma dos
cristais obtidos, para selecionar os mais recomendveis para uso em
ambiente escolar. Os experimentos so simples, de baixo custo e
podem ser inseridos nas prticas de cincias dos Ensinos Fundamental
e Mdio, com diferentes aborda-dio, com diferentes aborda-com
diferentes aborda-gens de acordo com os Parmetros Curriculares
Nacionais, envolvendo conceitos como solubili-dade, concentrao,
estequiometria, cristalizao, simetria e anisotropia, entre outros.
Tambm em cursos de nvel superior possvel aplicar experi-mentos
deste tipo.
A observao da evaporao de solues salinas ao microscpio ptico de
luz polarizada, com a consequente cristalizao dos solutos, uma
prtica clssica em cursos de mineralogia e cristalografia. Os
experimentos aqui propostos, por sua vez, prescindem do uso do
microscpio e podem ser realizados em sala de aula ou mesmo em
ambien-
-
93
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
O experimento com acetato de cobre monohi-dratado produziu mais
de um material cristalino a partir de uma mesma soluo. Estes
materiais foram analisados em difratmetro de raios X Siemens D5000,
com radiao K de cobre ( = 1,54178 ), no intervalo angular de 3 a 65
2, passo de 0,05 e velocidade angular de 1 seg/passo.
Dois recursos adicionais foram testados neste trabalho para
acelerar a nucleao e o crescimen-to, que foram a agitao da soluo e
a insero de fragmentos de rocha na soluo. Nos experimentos em que
foi usado agitador magntico, foi colocada placa de isopor com
espessura de 4 cm entre o agi-tador e o bquer, para evitar que o
calor do aparelho interferisse no experimento. O uso de fragmentos
de rocha segue a proposta de Teixeira et al. (2007), onde este
fragmento estimula a nucleao cristalina e acelerar o processo de
cristalizao; fragmentos de granito inseridos na soluo de tartarato
de sdio e potssio mostraram resultados positivos.
Cristalizao: nucleao e crescimentoPraticamente toda a matria
slida conheci-
da, seja terrestre ou extraterrestre, se encontra no estado
slido cristalino, ou seja, seus tomos esto dispostos em arranjo
peridico e ordenado em trs dimenses. Vrios materiais biolgicos
(ossos, den-Vrios materiais biolgicos (ossos, den-tes, clculos
renais) e artificiais (metais, cermicas) tambm so cristalinos. A
formao espontnea de materiais altamente ordenados aparentemente
solubilidade(g/100ml)
toxicidade
acetato de clcio hidratado, (CH3COO)2Ca.H2O 34,7 atxico
acetato de cobre monohidratado, C4H6CuO4.H2O 8,6 mdia
bromato de sdio, NaBrO3 36,4 baixa
clorato de sdio, NaClO3 95,9 baixa
cloreto de potssio, KCl 34,2 atxico
cloreto de sdio (pureza analtica), NaCl 35,9 atxico
cromato de sdio tetrahidratado, Na2CrO4.4H2O 84,0 mdia
ferrocianeto de potssio trihidratado, K4Fe(CN)6.3H2O 28,2
baixa
fosfato monobsico de amnia, NH4H2PO4 37,4 atxico
nitrato de sdio, NaNO3 87,6 atxico
sulfato de alumnio e potssio dodecahidratado, KAl(SO4)2.12H2O
12,0 atxico
sulfato de cobre pentahidratado, CuSO4.5H2O 32,0 baixa
sulfato de magnsio heptahidratado, MgSO4.7H2O 33,7 atxico
sulfato de nquel hexahidratado, NiSO4.6H2O 44,4 mdia-alta
tartarato de sdio e potssio tetrahidratado, KNaC4H4O6.4H2O 63,0
atxico
Tabela 1. Sais utilizados nos experimentos de cristalizao e sua
solubilidade a 20o C (Haynes, 2012).
Figura 1. Etapas de um experimento de cristalizao: (a) sementes
de cristalizao aps a evaporao da soluo; (b) semente selecionada
para crescimento, presa linha; (c) semente imersa na soluo
saturada, (d) cristal obtido, ainda fixo linha. O exemplo ilustrado
com cristais de sulfato de cobre pentahidratado.
(a)
(b)
(c)
-
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
94
completamente excludentes, para explicar a nucle-ao e o
crescimento cristalino.
A teoria clssica da nucleao se baseia na ter-modinmica proposta
por J. W. Gibbs no sculo XIX, e considera a combinao das variaes de
energia livre de superfcie e de volume dos cristais (Figura 2). A
energia livre de superfcie (Gs) de refere interface entre o cristal
e a soluo, que aumenta proporcionalmente ao quadrado do raio do
cristal (r2), com o crescimento cristalino. A ener-gia livre de
volume (Gv), por outro lado, varia de modo inversamente
proporcional ao cubo do raio do cristal (r3). Na etapa que precede
a nucleao em uma soluo superstaurada, minsculas part-culas de
estrutura ordenada, denominadas clusters, so formadas e
redissolvidas pela soluo. A ins-tabilidade se deve ao seu pequeno
tamanho, que corresponde a uma grande superfcie especfica em relao
a um volume pequeno. Entretanto, a partir de um certo raio,
denominado raio crtico, o ncleo passa a ser estvel. O raio crtico
(rc, Figura 2) o ponto onde a resultante entre a diminuio de
ener-diminuio de ener-gia livre referente ao aumento de volume
supera o aumento da energia livre referente ao aumento de superfcie
do cristal. As relaes de energia livre so discutidas em detalhe por
diversos autores (e.g. Nvlt et al., 2001; Sunagawa, 2007).
Ao atingir seu raio crtico, a semente se torna estvel, deixa de
ser redissolvida pela soluo e tende a crescer e consumir o excesso
de soluto da soluo supersaturada, cuja concentrao retornar ao seu
limite de solubilidade. As solues em esta-dos variados de saturao
podem ser sumarizadas em um diagrama de fases esquemtico (Figura 3)
de concentrao versus temperatura, onde se dis-tinguem trs campos:
soluo insaturada (siste-ma monofsico), soluo supersaturada (sistema
monofsico) e soluo saturada coexistindo com cristais (sistema
bifsico). A zona metaestvel se situa entre as curvas de saturao e
de supersatura-o, um campo de estabilidade aparente, no qual a
soluo ainda no atingiu o excesso de soluto sufi-ciente para
permitir a formao de ncleos estveis. A largura da zona metaestvel
varia em funo de diversos fatores, como solubilidade, taxa de
res-friamento, presena de impurezas, entre outros (Nvlt et al.,
2001). A supersaturao necessria para a formao de ncleos estveis,
pois em um sistema situado exatamente sobre a curva de satu-rao, o
consomo de soluto para a formao de ncleos cristalinos torna a soluo
insaturada, que redissolve estes ncleos .A supersaturao faz com
contraria a segunda lei da termodinmica, segun-do a qual todos
os sistemas tendem a um nvel mximo de entropia. A leitura da
segunda lei da termodinmica pode induzir a erros se traduzir-mos
entropia por desordem, no sentido de nossa percepo cotidiana. A
segunda lei se refere dis-sipao das diferenas de energia entre
sistemas, com a minimizao do gradientes energticos e da dissipao da
energia livre dos sistemas como um todo. Neste sentido, a
cristalizao ocorre esponta-neamente pela dissipao de energia dos
sistemas, em decorrncia da otimizao geomtrica das liga-es qumicas
entre ctions e nions, formando padres tridimensionais altamente
ordenados. As propriedades fsicas e morfolgicas dos materiais
cristalinos so definidas em pela sua composio qumica e pela
simetria de sua estutura.
H vrias obras de referncia que tratam do processo de cristalizao
em detalhe, dentre as quais Mullin (1972), Holden & Morrison
(1982), Nvlt et al. (2001) e Sunagawa (2007). H obras relativamente
antigas, mas no menos interessantes, que tratam da cristalizao para
o pblico em geral e escolar, como Bunn (1972) e Wood (1972). Na
breve reviso que segue, abordaremos de modo resumido contedos que
podem ser usados na discusso dos experimentos de cristalizao a
partir de solues aquosas supersaturadas.
A quantidade de um slido que pode ser dis-solvida em um lquido
limitada pela solubilidade, que varia de acordo com o par
slido-lquido e com as condies intensivas do ambiente,
prin-cipalmente temperatura. Neste trabalho todos os experimentos
foram realizados com gua destilada como solvente. Os sais
dissolvidos em gua se dis-is dissolvidos em gua se dis-gua se dis-
se dis-sociam em nions e ctions, que so solvatados, ou seja,
envoltos por camadas de gua eletricamente orientadas em funo de
seus dipolos. Os ons per-turbam o campo eletrosttico da gua na
soluo, que passa a ter comportamento distinto da gua destilada, em
aspectos como condutividade eltrica, volume especfico, taxa de
evaporao, entre outros.
A primeiro etapa da cristalizao a nucleao, ou seja a formao de
ncleos, tambm denomi-nados de sementes ou grmens, que so pequenos
cristais estveis, a partir dos quais ocorre o cres-cimento. A
nucleao e o crescimento ocorrem em solues supersaturadas, seja pelo
aumento na concentrao (p. ex. por evaporao do solvente) ou por
variaes na temperatura; na maioria das solues, a diminuio da
temperatura favorece a cristalizao. H duas abordagens tericas,
no
-
95
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
que as sementes formadas no sejam redissolvidas e a barreira
energtica da nucleao seja transposta. O grau de supersaturao uma
das mais impor-tantes variveis para a nucleao e o crescimento
cristalino em solues aquosas (e.g. Bordui, 1987). A largura da zona
metaestvel corresponde ao grau
-Frank), proposta por Burton et al. (1951), consi-dera que o
crescimento se d pela ligao sucessiva de tomos ou molculas
individuais de forma orde-nada na superfcie dos cristal,
encaixando-se em defeitos cristalinos como degraus e deslocamentos
de planos atmicos.
Os modelos no clssicos de cristalizao, recentemente sumarizados
por Teng (2013), baseiam-se em dados observacionais obtidos nas
ltimas dcadas, principalmente devido aos avanos recentes na
microscopia eletrnica de transmisso e no imageamento de alta
resoluo. Este modelos consideram que a cristalizao ocorre pela
coales-cncia de nanopartculas ou clusters de tomos ou molculas, que
inicialmente podem ser organizados ou no, e que se reorganizam aps
a coalescncia, orientando-se de acordo com direes cristalo-grficas
definidas e produzindo slidos cristalinos homogneos.
Chakraborty & Patey (2013) consideram que o processo de
crescimento melhor explicado peos estgios de maturao segundo a
regra de Ostwald (apud Chakraborty & Patey, 2013), ao invs da
teoria clssica de crescimento. Neste modelo, os ncleos se formam em
regies onde a concentrao da soluo excede a concentrao mdia, gerando
um arranjo inicial pouco ordenado de ons, com teor significativo de
gua, que progressivamente removida na medida em que o cristal se
torna estvel e cresce, adquirindo estrutura ordenada e composio
estequiomtrica. Na cristalizao de slidos orgnicos, como as
protenas, os cristais
Figura 2. Diagrama esquemtico indicando a variao de energia
livre (G, linha tracejada) resultante da variao de energia livre de
volume (Gv) e da energia livre de superfcie (Gs) em funo do tamanho
do cristal. O raio crtico (rc) o raio a partir do qual a semente
passa a ser estvel e a cristalizao progride pela diminuio da
energia livre total do sistema.
Figura 3. Diagrama de fases esquemtico representando os estados
de soluo insaturada, supersaturada (metaestvel) e saturada contendo
cristais. A curva de solubilidade indica o comportamento da maioria
dos compostos, cuja solubilidade aumenta com a temperatura. A curva
de nucleao indica o grau de supersaturao necessrio para que ocorra
a nucleao de cristais a linha tracejada porque a largura da zona
metaestvel sensvel a diversos parmetros fsicos e qumicos da
soluo.
de supersaturao necessrio para que as sementes de cristalizao
atinjam o raio crtico. H sem-pre uma disputa entre as taxas de
nucleao e de crescimento, cujo resultado varia desde um grande
nmero de pequenos cristais at um pequeno nmero de cristais de maior
tamanho. A partir da linha de supersaturao, com a disponibilidade
de ncle-os estveis, os cristais crescem e adquirem forma resultante
da combinao das energias livres individuais de cada face do
cristal, o que definir a forma final do cristal ou hbito
cristalino.
A teoria clssica da cristali-zao, tambm conhecida como modelo
BCF (Burton-Cabrera-
-
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
96
Tabela 2. A seguir so apresentados os principais resultados dos
experimentos de cristalizao de cada composto, divididos conforme
seu desempenho na cristalizao.
Solues que produziram cristais macroscpicos em duas semanas
a) Sulfato de cobre pentahidratado: este composto permite
abundante produo de sementes idiomr-ficas de dimenses milimtricas,
aps poucos dias de evaporao da soluo. Entretanto, os cristais
quando suspensos por linha e imersos em soluo so sensveis a
oscilaes em temperatura, que podem ser parcialmente dissolvidos.
Este composto produz cristais azuis idiomrficos e com pinacides bem
definidos, do sistema triclnico (Figura 4). Apesar de sua baixa
toxicidade, recomendvel para experimentos didticos, contanto que
manu-
podem inicialmente conter restos de soluo em sua estrutura ainda
pouco ordenada, sendo que a soluo tende a ser expulsa com o
progressivo aumento do grau de ordenamento da estrutura (Tilley,
2007).
A nucleao pode ser espontnea (nucleao primria) ou induzida
(nucleao secundria). Para que a nucleao primria possa ocorrer
necessrio haver uma supersaturao capaz de transpor a bar-reira
energtica do sistema. A nucleao secundria, por sua vez, induzida
pela introduo de ncleo j formado no sistema e requer um grau menor
de supersaturao. Embora no presente trabalho tenha sido buscada a
nucleao primria para a formao das sementes de cristalizao, em
condies experi-mentais no controladas a introduo de partculas de
poeira e imperfeies nos recipientes agem como stios favorveis
nucleao, em uma situao mais prxima da nucleao secundria.
A agitao mecnica do conjunto cristal-soluo aumenta as taxas de
nucleao e crescimento, eli-minando gradientes de concentrao na
soluo e elevando a taxa de evaporao (Wilcox, 1983), podendo ser
feita por bombeamento da soluo ou por rotao do cristal. Entretanto,
o crescimento cristalino acelerado tende a produzir cristais com
faces estriadas e formas menos regulares.
Resultados
CristalizaoO desempenho dos sais testados nos experi-
mentos de cristalizao encontra-se resumido na
resultado dos experimentos compostos
cristais macroscpicos em duas semanas sulfato de cobre
pentahidratadocloreto de sdio (sal grosso)
cristais macroscpicos aps duas semanas fosfato monobsico de
amniabromato de sdiosulfato de nquel hexahidratadosulfato de
alumnio e potssio dodecahidratadosulfato de magnsio
heptahidratadotartarato de sdio e potssio tetrahidratado
agregados de cristais microscpicos acetato de clcio
hidratadoacetato de cobre monohidratadocloreto de sdio (pureza
analtica)cromato de sdio tetrahidratadonitrato de sdioferrocianeto
de potssio trihidratadoclorato de sdiocloreto de potssio
Tabela 2. Compostos agrupados conforme desempenho nos
experimentos de cristalizao.
Figura 4. Cristais triclnicos idiomrficos de sulfato de cobre
pentahidratado.
-
97
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
seado com luvas de segurana. Este composto de colorao azul
intensa tambm ocorre na natureza como o mineral calcantita, em
ambientes evapo-rticos, como por exemplo nos desertos de sal do
norte do Chile.
b) Cloreto de sdio: foram testados o cloreto de sdio de pureza
analtica (PA) e o sal grosso comer-cial (SG). Os experimentos
feitos com sal de pureza analtica no produziram sementes,
entretanto, o sal grosso contm em si abundantes sementes
idiomrficas, sendo, portanto, recomendvel para experimentos
didticos de cristalizao, alm de ser atxico, de baixo custo e
amplamente dispon-vel no comrcio. Os cristais obtidos so cbicos,
idiomrficos a subidiomrficos, de dimenses centimtricas (Figura
5).
Solues que produziram cristais macroscpicos aps duas semanas
a) Fosfato monobsico de amnia: aps duas sema-nas sem produzir
sementes, a soluo foi mantida em repouso nas semanas subsequentes,
sem a pro-teo da gaze, tendo produzido cristais idiomrfi-cos
incolores, na forma de prismas tetragonais de dimenses centimtricas
terminados em pirmides (Figura 6).
b) Tartarato de sdio e potssio: cristais prismticos ortorrmbicos
macroscpicos se formaram aps duas semanas do incio do experimento,
sobre um fragmento de rocha colocado no fundo do reci-piente
(Figura 7). Foi escolhido o maior deles (3,2 g) para ser preso a
uma linha e imerso na soluo supersaturada; aps trs dias do incio do
experi-mento, houve dissoluo parcial deste cristal, que se
desprendeu da linha e caiu no fundo do recipiente. Esta perturbao
do crescimento cristalino est relacionada a oscilaes na temperatura
e umidade do ambiente. A soluo produziu grande quantida-de de
cristais no fundo e nas paredes do recipiente. Por ser atxico e
produzir cristais idiomrficos, este composto recomendvel para
experimentos didticos de cristalizao.
c) Bromato de sdio: experimentos realizados por mais de duas
semanas e sem a proteo de gaze produziram sementes cristalinas
idiomrficas e de tamanhos variados. Uma semente foi inserida em
soluo e permitiu a obteno de cristais cen-timtricos idiomrficos
cubo-octadricos hipi-diomrficos. Este composto recomendvel para
experimentos didticos de cristalizao de durao maior que duas
semanas, apesar de ser levemente Figura 7. Cristais ortorrmbicos
idiomrficos de tartarato
de sdio e potssio.
Figura 5. Cristais cbicos de cloreto de sdio, obtidos a partir
de sal grosso comercial.
Figura 6. Cristais de fosfato monobsico de amnia, exibindo hbito
prismtico com terminao em pirmide.
-
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
98
os microcristais dendrticos so uma mistura de acetato de cobre
hidrxi-hidratado (C2H6Cu2O5.H2O), acetato de cobre hidratado e com
quantidade subordinada de carbonato-sulfato de cobre
hidrxi--hidratado (Cu8(SO4)4(CO3)(OH)6.48H2O)). A presena de
pequena quantidade de sulfato no material dendrtico pode estar
relacionada a con-taminao atmosfrica. Um possibilidade plausvel que
o material dendrtico seja um precursor da cristalizao; neste caso,
o acetato de cobre mono-hidratado no teria sido produzido
diretamente a partir da soluo, mas sim a partir da evoluo em estado
slido da mistura cristalina dendrtica, provavelmente por processos
de difuso e redistri-buio das fases volteis. Este composto
recomen-dvel para experimentos cristalizao, por permitir a obteno
de mais de um produto cristalino a partir de um nico composto
inicial. Devido sua toxicidade moderada, este composto no deve ser
manipulado por crianas.
e) Sulfato de magnsio heptahidratado: aps cerca de um ms do
incio do experimento, com a evapo-rao total da soluo, obteve-se
camada compacta de cristais prismticos de dimenses milimtricas
(Figura 9), fortemente aderida ao fundo do reci-piente,
impossibilitando a retirada de cristais indi-viduais para dar
prosseguimento aos experimentos de crescimento cristalino. Apesar
de no ter sido possvel obter cristais idiomrficos individuais, este
composto produz cristais prismticos ortor-rmbicos em agregados
radiais, que podem ser observados com lupa de pequeno aumento. Em
suas ocorrncias naturais, o sulfato de magnsio heptahidratado
corresponde ao mineral epsomita e aparece com frequncia como
eflorescncias em patologias de concreto.
txico, o que exige o acompanhamento do experi-mento por
adultos.
d) Acetato de cobre monohidratado: no perodo de duas semanas, os
experimentos com este compos-to produziram apenas microcristais nas
paredes do recipiente e na superfcie da soluo, que no puderam ser
recuperados para experimentos de crescimento cristalino. Aps 35
dias do incio do experimento, com a evaporao total da gua, foram
observados cristais macroscpicos e idio-mrficos de cor azul escura,
depositados no fundo do recipiente, envoltos por agregados de
cristais dendrticos de cor azul clara, revestindo a parede do
recipiente (Figura 8). Os dois materiais crista-linos foram
analisados por difratometria de raios X, que indicou tratarem-se de
materiais distintos no apenas no hbito, mas tambm na composio. Os
cristais macroscpicos so de acetato de cobre monohidratado
(C4H6CuO4.H2O), enquanto que
Figura 9. Camada de cristais ortorrmbicos prismticos de sulfato
de magnsio heptahidratado, no fundo do recipiente.
(a)
(b)
Figura 8. (a) Materiais obtidos pela cristalizao a partir de
soluo de acetato de cobre monohidratado, na forma de cristais
macroscpicos de cor azul escura envoltos por mistura cristalina
fibrosa dendrtica. Os cristais macroscpicos so de acetato de cobre
monohidratado, enquanto que a mistura microcristalina dendrtica
composta por mistura de acetato de cobre hidrxi-hidratado, acetato
de cobre hidratado e menor quantidade de carbonato-sulfato de cobre
hidrxi-hidratado. (b) Detalhe de monocristal de acetato de cobre
monohidratado.
-
99
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
dar prosseguimento ao crescimento cristalino em suspenso. Esta
segunda semente recolhida no se dissolveu e o cristal apresentou
crescimento mdio de 0,2 g/dia. Este composto se cristaliza no
sistema cbico, produzindo cristais cubo-octadricos idio-mrficos
(Figura 11), incolores; por ser atxico, recomendvel para
experimentos didticos.
Solues que no produziram cristais macroscpicos Dentre os
compostos testados, os seguintes
no produziram cristais macroscpicos de tama-cristais
macroscpicos de tama-nho suficiente para serem fixados em linha e
uti-lizados nos experimentos de cristalizao: acetato de clcio
hidratado; cloreto de sdio de pureza analtica; cromato de sdio
tetrahidratado; ferro-cianeto de potssio trihidratado; clorato de
sdio; cloreto de potssio. As taxas de evaporao destes compostos
foram medidas durante o intervalo de duas semanas.
Taxa de evaporao das soluesAlm dos experimentos de cristalizao,
o
acompanhamento da evaporao das solues ofe-rece uma forma simples
de demonstrar diferenas entre solues salinas e gua destilada. A
taxa de evaporao das solues foi medida em intervalos de 48 horas,
mesmo nas solues que no produ-ziram cristais adequados. Como o
ambiente no foi controlado, houve oscilaes ao longo das duas
semanas de durao de cada experimento e entre um experimento e
outro, j que os mesmos no foram realizados simultaneamente. Para
permitir a
f) Sulfato de nquel hexahidratado: as sementes cristalinas deste
composto foram obtidas um ms aps o incio da evaporao. Apesar da
dificuldade na obteno de sementes, o crescimento cristalino ocorreu
em taxa elevada: dois dias aps a imerso da semente na soluo
supersaturada, o cristal atingiu peso 125 % maior que seu peso
inicial; 232 % de seu peso inicial no sexto dia; 688 % no oitavo
dia; e 1318 % do peso inicial no dcimo dia. Os cristais obtidos so
de cor verde intensa e forma prismti-ca tetragonal (Figura 10),
atingindo dimenses de vrios centmetros em poucos dias de
crescimento. Ocorreu formao de microcristais nas paredes do
recipiente e a formao de uma camada micro-cristalina sobre a soluo.
Pela sua toxicidade, este composto deve ser manipulado com luvas e
mscara de proteo, no devendo ser manuseado por crian-as.
Considerando-se as condies de segurana no manuseio, este composto
pode ser considerado recomendvel para experimentos didticos.
g) Sulfato de alumnio e potssio dodecahidratado: as sementeiras
de evaporao em repouso no produ-ziram sementes no perodo de duas
semanas. Para o crescimento cristalino, foi escolhida uma semente
(0,7 g) e inserida na soluo sob ao do agitador magntico. Aps um
dia, a semente se desprendeu da linha. A soluo foi mantida por nove
dias em repouso, at que outro cristal crescesse no fundo do
recipiente, que foi novamente preso linha para
Figura 10. Cristais de sulfato de nquel hexahidratado, com forma
prismtica tetragonal, terminada em pirmide.
Figura 11. Cristais cubo octahdricos de sulfato de alumnio e
potssio.
-
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
100
as taxas mdias de evaporao das solues e da gua destilada nas
mesmas condies, alm das razes entre elas. Neste trabalho so
apresentadas apenas as taxas de evaporao em repouso, tanto da gua
destilada como da soluo. Todas as solues apresentaram taxas de
evaporao inferiores s da taxa de evaporao da gua destilada, como de
se esperar em solues salinas (Fakir & Toerien, 2009; Kokya
& Kokya, 2008).
comparao das taxas de evaporao, apesar de suas oscilaes, foram
mantidos, ao lado dos recipientes com as solues, recipientes de
mesma capacida-de com gua destilada, cuja taxa de evaporao foi
medida nos mesmos intervalos. A razo da taxa de evaporao da soluo
pela taxa de evaporao da gua destilada evaporada nas mesmas condies
permite eliminar as oscilaes nos valores absolu-tos das taxas. A
Tabela 3 e a Figura 12 apresentam
A B A/B
cloreto de sdio (pureza analtica) 0,43 1,53 0,28
nitrato de sdio 0,44 1,53 0,29
clorato de sdio 0,91 2,10 0,43
cloreto de sdio (sal grosso) 0,68 1,53 0,44
acetato de clcio hidratado 0,90 1,53 0,59
sulfato de nquel hexahidratado 1,21 1,98 0,61
cloreto de potssio 1,28 1,98 0,64
cromato de sdio tetrahidratado 1,33 1,83 0,72
tartarato de sdio e potssio tetrahidratado 1,18 1,52 0,78
sulfato de magnsio heptahidratado 1,19 1,53 0,78
fosfato monobsico de amnia 1,32 1,52 0,87
bromato de sdio 1,64 1,83 0,90
acetato de cobre monohidratado 1,37 1,53 0,90
sulfato de cobre pentahidratado 1,72 1,83 0,94
ferrocianeto de potssio trihidratado 1,97 2,10 0,94
sulfato de alumnio e potssio dodecahidratado 1,52 1,53 0,99
Tabela 3. Razo entre (A) taxa de evaporao da soluo salina
(ml/dia) e (B) taxa de evaporao de gua destilada (ml/dia) nas
mesmas condies.
Figura 12. Razes entre as taxas mdias de evaporao das solues
salinas divididas pela taxas mdias de evaporao de gua destilada nas
mesmas condies.
-
101
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
crio dos dados; (j) interpretao e elaborao de listas, tabelas
simples, de dupla entrada e grficos de barra para comunicar a
informao obtida.
Cincias Naturais: (a) conceitos cientficos bsicos, associados
energia, matria, transforma-o, espao, tempo, sistema, equilbrio e
vida; (b) combinar leituras, observaes, experimentaes, registros,
etc., com a coleta, organizao, comu-nicao e discusso de fatos e
informaes; (c) valorizar o trabalho em grupo, sendo capaz de ao
crtica e cooperativa para a construo coletiva do conhecimento;
PCN Ensino Mdio Os PCN para o Ensino Mdio so divididos
em quatro partes e esto assim apresentados: Parte I - Bases
Legais, Parte II - Linguagens, Cdigos e suas Tecnologias, Parte III
- Cincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias, Parte IV -
Cincias Humanas e suas Tecnologias. Os experimentos de cristalizao
tratam de temas relacionados Mate-mtica e Cincias da Natureza
(Parte III). Apesar de os experimentos de cristalizao no
representarem exemplos de reaes qumicas propriamente ditas, as
frmulas qumicas e sua estequiometria, e a dis-sociao inica,
permitem uma viso macroscpica dos compostos qumicos.
Qumica: (a) cdigos e smbolos da Qumica; (b) traduzir a linguagem
discursiva em linguagem simblica da Qumica e vice-versa; (c)
traduzir a linguagem discursiva em outras linguagens usadas em
Qumica: grficos, tabelas, e relaes matemti-cas; (d) compreender e
utilizar conceitos qumicos dentro de uma viso macroscpica
(lgico-empri-ca); (e) compreender os fatos qumicos dentro de uma
viso macroscpica (lgico-formal); (f) com-preender dados
quantitativos, estimativa e medidas, compreender relaes
proporcionais presentes na qumica; (g) reconhecer tendncias e
relaes a par-tir de dados experimentais ou outros; (h) selecionar e
utilizar ideias e procedimentos cientficos para a resoluo de
problemas qualitativos e quantitati-vos em qumica, identificando e
acompanhando as variveis relevantes; (i) reconhecer ou propor a
investigao de um problema em qumica, selecio-nando procedimentos
experimentais pertinentes; (j) reconhecer aspectos qumicos
relevantes na interao individual e coletiva do ser humano com o
ambiente.
Matemtica: (a) ler, interpretar e utilizar repre-sentaes
matemticas (tabelas, grficos, expres-
Aplicaes didticas de experimentos de cristalizao
Os dezesseis compostos solveis em gua, testados neste trabalho,
apresentaram comporta-mentos variados nos experimentos e
cristalizao. Na maioria dos casos, o perodo de quinze dias foi
insuficiente para a obteno de cristais macroscpi-cos. A escolha dos
compostos testados foi arbitrria e pode ser ampliada, de acordo com
o interesse e a disponibilidade do pblico. A realizao dos
expe-rimentos em ambiente no controlado foi uma forma de reproduzir
a situao mais comum em sala de aula. A realizao de experimentos
deste tipo em condies controladas reduz as oscilaes, principalmente
na taxa de crescimento cristalino, que chegou a apresentar valores
negativos, nos casos onde ocorreu dissoluo parcial dos
cristais.
Atravs de experimentos simples e de baixo custo possvel
demonstrar como as formas sim- possvel demonstrar como as formas
sim-demonstrar como as formas sim-tricas surgem em consequncia do
empacotamento ordenado dos tomos nos slidos cristalinos. Em
paralelo, os experimentos permitem demonstrar diferenas expressivas
entre a evaporao da gua pura e das solues salinas, em consequncia
do campo inico dos solutos.
Os experimentos de cristalizao so interdisci-plinares e permitem
discutir conceitos fundamen-tais de qumica, fsica, mineralogia e
cristalografia, alm de exercitar prticas de matemtica, desde o
planejamento dos experimentos at a organizao e o tratamento dos
dados. A seguir esto listados tpi-cos dos Parmetros Curriculares
Nacionais (PCN) para os Ensinos Fundamental e Mdio, que podem ser
abordados com experimentos de cristalizao.
PCN Ensino FundamentalOs PCN para o Ensino Fundamental esto
divididos em 10 volumes, dos quais os volumes de Matemtica (vol.
3) e Cincias Naturais (vol. 4) contm temas que podem ser tratados
atravs de experimentos de cristalizao.
Matemtica: (a) poliedros; (b) elementos geom-tricos nas formas
da natureza e em materiais criados pelo homem; (c) semelhanas e
diferenas entre cubos e quadrados, paraleleppedos e retngulos,
pirmides e tringulos, esferas e crculos; (d) uni-dades de tempo;
(e) comparao entre grandezas de mesma natureza; (f) unidades de
medida; (g) iden-tificao de quantidade (aspecto cardinal), adio,
subtrao, multiplicao e diviso; (h) sistema de numerao decimal; (i)
coleta, organizao e des-
-
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
102
e potssio dodecahidratado, tartarato de sdio e potssio
tetrahidratado) tambm podem ser usa-dos com sucesso em experimentos
deste tipo. O intervalo de tempo estabelecido a priori de duas
semanas foi insuficiente para a maioria dos expe-rimentos
realizados. As medidas em intervalos de 48 horas foram adequadas
para o acompanhamento do crescimento cristalino e da taxa de
evaporao. Os demais compostos produziram massas micro-cristalinas
com a evaporao da gua da soluo.
A cristalizao de sais em condies no con-troladas de difcil
anlise, mesmo que compa-rativa, em funo das fontes de rudo no
sistema, principalmente as oscilaes de temperatura e de umidade,
que afetam a taxa de evaporao e, portanto, a taxa de incremento da
supersaturao. A temperatura, alm de afetar a evaporao, afeta tambm
a solubilidade dos compostos. Outro rudo no desprezvel so as
partculas slidas atmosf-ricas, partculas de celulose da linha e da
gaze uti-lizadas, ranhuras nos bqueres estas impurezas e defeitos
fornecem stios de nucleao, facilitando a transposio da barreira
energtica da nucleao. Um exemplo interessante do efeito das
impurezas a diferena de desempenho entre o cloreto de sdio de
pureza analtica e o sal grosso comercial. O sal grosso produziu
cristais macroscpicos, ao contrrio do sal de pureza analtica, que
formou agregados microcristalinos. Isto se deve provavel-mente
presena de iodo e potssio no sal grosso, que altera o equilbrio
quimico do sistema, e a presena de resduos slidos insolveis, que
podem favorecer a nucleao.
Quanto taxa de evaporao, as oscilaes podem ser desconsideradas
atravs da diviso dos valores absolutos da taxa de evaporao da soluo
pelos valores da taxa de evaporao da gua desti-lada nas mesmas
condies (Figura 12). A taxa de evaporao das solues menor que a da
gua destilada, devido ao campo eletrosttico gerado na solvatao dos
ons pelas molculas de gua e do efeito dos ons sobre a tenso
superficial da soluo (Hribar et al., 2002; Kokya e Kokya, 2008;
Kowacs et al., 2010).
As diferenas de comportamento das solu-es no processo de
cristalizao no apresentam correlaes simples com a solubilidade, com
o tipo de ction e nion, ou com o potencial ini-co; tampouco h relao
entre o desempenho na cristalizao e a taxa de evaporao da soluo.
Uma possvel explicao para estas diferenas est na largura da zona
metaestvel. A principal fora
ses, etc.); (b) transcrever mensagens matemticas da linguagem
corrente para linguagem simblica (equaes, grficos, diagramas,
frmulas, tabelas, etc.) e vice-versa; (c) utilizar corretamente
ins-trumentos de medio e desenho; (d) identificar problemas; (e)
procurar, selecionar e interpretar informaes relativas ao problema;
(f) formular hipteses e prever resultados; (g) aplicar
conheci-mentos e mtodos matemticos em situaes reais, em especial em
outras reas de conhecimento; (h) utilizar adequadamente
calculadoras e computador, reconhecendo suas limitaes e
potencialidades.
Ensino Superior No ensino superior, em particular nos cursos
das reas de geologia e qumica, estes experimen-tos podem ser
aplicados em matrias como qu-mica fundamental e cristalografia
fundamental. Na qumica fundamental, so abordados tpicos
relacionados solubilidade e geometria molecular. Os experimentos de
cristalizao podem ser sofis-ticados, com a mistura de mais de um
composto solvel, para mostrar que a cristalizao pode ser usada como
forma de purificao de substncias.
As aulas de cristalografia fundamental podem utilizar os
cristais obtidos nos experimentos des-critos para discutir os
sistemas cristalinos, discutir as relaes dos ndices de Miller e das
faces cris-ndices de Miller e das faces cris- e das faces
cris-talinas com a forma macroscpica dos cristais, a simetria do
empacotamento atmico, os nmeros de coordenao, as regras de Pauling,
geminaes, entre outros.
Discusso e conclusoOs dezesseis compostos escolhidos foram
testados quanto sua capacidade de produzir cris-tais
macroscpicos a partir de solues aquosas temperatura ambiente, com o
intuito de selecionar os melhores compostos para experimentos
didti-cos de cristalizao em condies no controladas e com gua
destilada.
Os dois compostos que apresentaram o melhor desempenho foram o
sulfato de cobre pentahi-dratado e o cloreto de sdio (tipo sal
grosso), que produziram cristais macroscpicos idiomrficos em duas
semanas. Os seis compostos que produ-ziram sementes e cristais
macroscpicos aps duas semanas (fosfato monobsico de amnia, bromato
de sdio, sulfato de magnsio heptahidratado, sul-fato de nquel
hexahidratado, sulfato de alumnio
-
103
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
quantidade de cristais de pequeno porte. Por outro lado, os
compostos que atingem uma maior super-saturao so aqueles com maior
dificuldade de nucleao nestes casos, o excesso relativamente grande
de soluto consumido pelos poucos ncleos formados, produzindo
cristais macroscpicos. A formao de ncleos em sistemas deste tipo
pode ser facilitada pela presena de partculas e impurezas no
sistema, como discutido anteriormente.
O experimento com acetato de cobre hidratado um bom exemplo de
que h materiais cristalinos solveis em gua que no se precipitam
diretamente a partir de solues saturadas aquosas. Neste
expe-rimento, foram produzidos cristais macroscpicos idiomrficos de
acetato de cobre hidratado envol-tos por agregados microcristalinos
composto por mistura de acetatos de cobre com graus distintos
de
testadas neste artigo. Dados parciais compilados por Couper et
al. (2005, Captulo 16), cobrindo alguns dos sais usados neste
trabalho, revelam dis-crepncias entre dados de diferentes autores
para um mesmo composto.
A Tabela 4 apresenta dados de Mullin (1972) da largura da zona
metaestvel de alguns sais a 25 oC, expressa na forma de
supersaturao mxima (C, g/100 g de gua) e superresfriamento mximo
possvel (DT, oC). Os dados mostram consistncia entre a supersaturao
e o desempenho nos expe-rimentos de cristalizao: compostos com bom
desempenho tm supersaturao igual ou maior que 1 g/100 g de gua
(Figura 13). Entretanto, no h correlao entre a capacidade de
superresfria-mento do sistema e a produo de cristais macros-cpicos.
A partir do pequeno conjunto de dados
Figura 13. Largura da zona metaestvel expressa na forma de mxima
supersaturao (C, g/100 g de gua) e mximo superresfriamento (DT,
oC), a 25 oC (Mullin, 1972). O desempenho dos compostos na
cristalizao se refere aos esultados dos experimentos didticos deste
trabalho.
C DT desempenho
CuSO4.5H2O 1.0 1.4 bom
MgSO4.7H2O 1.3 1.0 bom
NH4H2PO4 2.3 2.5 bom
NiSO4.6H2O 4.4 4.0 bom
KCl 0.3 1.1 ruim
NaCl 0.2 4.0 ruim
NaNO3 0.7 0.9 ruim
Tabela 4. Dados de mxima supersaturao (C, g/100 g de gua) e
mximo superresfriamento (DT, oC) a 25 oC (Mullin, 1972) e
desempenho nos experimentos didticos de cristalizao, quanto produo
de cristais idiomrficos macroscpicos.
motora da cristalizao em solues o grau de supersaturao
(Sunagawa, 2007; Kowacs et al., 2010; Bogacz & Wjcik, 2014).
Como mencionado no Item 3, a zona metaestvel a regio onde a solu-o
j transps seu limite de solubilidade, mais ainda no atingiu a
supersaturao necessria para produzir ncleos estveis de cristalizao.
Mesmo em experimentos controlados difcil definir precisamente a
largura da zona metaestvel, que depen-de da combinao de diversos
fatores e da configurao experimental para sua medi-o. A largura da
zona metaestvel pode ser indicada em termos de grau de supesatu-rao
e de grau de superresfriamento na maioria das substncias, a
solubilidade diretamente proporcional temperatura. Entretanto, no h
na literatura, bancos de dados sistemticos com a largura da zona
metaestvel para todas as substncias
disponveis sobre a largura da zona metaestvel, notamos que os
sistemas mais propcios for-mao de cristais macroscpicos so aqueles
com zona metaest-vel mais larga. Compostos com zona metaestvel mais
estreita formam ncleos cristalinos est-veis mais facilmente, em
menor grau de supersaturao; desta modo, h a formao de abun-dantes
ncleos, que competem entre si pelo excesso de soluto a soluo,
produzindo grande
-
TERR DIDATICA 10-2:91-104 2014
104
Chakraborty, D., Patey, G. N. 2013. How crystals nucleate and
grow in aqueous NaCl solution. J. Phys. Chem. Letters,
4:573-578.
Couper, J. R., Penney, W. R., Fair, J. R., Walas, S. M. 2005.
Chemical process equipment: selection and design, 2nd ed.,
Burlington: Gulf Professional Publishing, 814p.
Fakir P. D., Toerien A. 2009. Evaporation rates on brine
produced during membrane treatment of mine water. In: Intern. Mine
Water Conf., Preto-ria, South Africa. Abstracts Pretoria: Cilla
Taylor Conferences. pp. 666-670.
Haynes W.M. 2012. Handbook of Chemistry and Phys-ics, 93rd ed.
Boca Raton: CRC. Section 5, 205p.
Holden A., Morrison P. 1982. Crystals and Crystal Growing.
Cambridge: MIT. 318p.
Hribar B., Southall N.T., Vlachy V., Dill K.A. 2002. How ions
affect the structure of water. J. Am. Chem. Soc.,
124:12302-12311.
Kokya B. A., Kokya T. A. 2008. Proposing a formula for
evaporation measurement from salt water resources. Hydrological
Processes, 22:2005-2012.
Koxacs, M., Prieto, M., Putnis, A. 2010. Kinetics of crystal
nucleation in ionic solutions: electrostat-ics and hydration
forces. Geochim. Cosmoch. Acta, 74:469-481.
Mullin J. W. 1972. Crystallization, 2nd ed. London:
Butterworth-Heinemann. 471p.
Nvlt J., Hostomsk J., Giulietti M. 2001. Cristaliza-o. So
Carlos: Edufscar. 160p.
Sunagawa I. 2007. Crystals: growth, morphology and perfection.
Cambridge: Univ. Press, 295p.
Teng H.H. 2013. How ions and molecules organize to form
crystals. Elements, 9:189-194.
Teixeira C., Andr V., Loureno N., Rodrigues M.J. 2007.
Crescimento de cristais por nucleao he-terognea: On the rocks
Revisited. Cincia e tecnologia dos cristais, 19(1/2):66-77.
Tilley R.J.D. 2007. Crystals and crystal stuctures. London: John
Wiley & Sons. 255p.
Wilcox W.R. 1983. Influence of convection on the growth of
crystals from solutions. J. Crystal Growth, 65:133-142.
Wood E. A. 1972. Crystals.A handbook for school teachers.
Commission on Crystallographic Teach-ing of the International Union
of Crystallogra-phy (IUCr). URL:
http://www.iucr.org/__data/assets/pdf_file/0004/15862/20.pdf,
Acesso em 19/07/2014.
hidratao com carbonato-sulfato de cobre hidrxi--hidratado. A
posio dos cristais macroscpicos no centro da massa microcristalina
sugere que esta seja a precursora da cristalizao do acetato de
cobre hidratado.
Os experimentos de cristalizao so uma rica fonte de contedos
didticos, que podem ser explo-rados em diferentes nveis de
escolaridade.
AgradecimentosOs autores agradecem Pr-Reitoria de Cul-
tura e Extenso Universitria da Universidade de So Paulo
(PRCEU-USP), por recursos alocados no projeto pelo Edital de
Fomento s Iniciativas de Cultura e Extenso (processo
2009.1.242.44.6; Laboratrio Interativo: Experimentos Didticos de
Cristalizao).
RefernciasBogacz W., Wjcik J. 2014. The metastable zone of
aqueous solutions. CHEMIK, 68(3):198-201Bordui P. 1987. Growth
of large single crystals from
aqueous solution: a review. Journal of crystal gro-wth,
85:199-205.
Brasil, Ministrio da Educao. Secretaria de Educa-o Fundamental.
1997a. Parmetros curriculares na-cionais: introduo aos parmetros
curriculares nacionais. Braslia: Ministrio da Educao. 126p.
Brasil, Ministrio da Educao. Secretaria de Edu-cao Fundamental.
1997b. Parmetros curriculares nacionais: cincias naturais, Ensino
de primeira a quar-ta sries. Braslia: Ministrio da Educao.
136p.
Brasil, Ministrio da Educao. Secretaria de Edu-cao Fundamental.
1997c. Parmetros curriculares nacionais: parte III - cincias da
natureza, matemtica e suas tecnologias, Ensino Mdio. Braslia:
Ministrio da Educao. 58p.
Brasil, Ministrio da Educao. Secretaria de Edu-cao Fundamental.
1998. Parmetros curriculares nacionais: cincias naturais, Ensino de
quinta a oita-va sries. Braslia: Ministrio da Educao. 138p.
Bunn C.W. 1972. Cristais: seu papel na natureza e na cincia. So
Paulo: Cia. Ed. Nacional. 292p.
Burton W.K., Cabrera N., Frank F.C. 1951. The growth of crystals
and the equilibrium structure of their surfaces. Royal Society of
London Philosophi-cal Transactions, A243:299-358.