-
U n i v e r s i d a d e d o P o r t o F a c u l d a d e d e C i
n c i a s d o D e s p o r t o e d e E d u c a o F s i c a
Exerccios Complexos de Treino
Influncia das variveis espao, tempo e nmero de
jogadores na intensidade do esforo de um exerccio
de treino
Dissertao apresentada com vista obteno do grau de Mestre em
Cincias de Desporto, na rea de especializao de Treino em Alto
Rendimento, realizada sob a orientao do Professor Doutor Antnio
Natal (FCDEF-UP).
Pedro Joo Ramos Amorim S O u t u b r o / 2 0 0 1
-
i
Resumo
Este trabalho tem por objectivo estudar a influncia das variveis
tempo, espao e nmero de
jogadores na intensidade do esforo do exerccio complexo de
treino, recorrendo
monitorizao da Frequncia Cardaca.
A amostra foi constituda por 15 jogadores de futebol do escalo
Sub-16 de uma equipa que
disputou o Campeonato Nacional de Juniores B, na poca desportiva
2000/2001.
O exerccio estudado consistiu num jogo entre duas equipas (3x3
ou 4x4) jogado num
quadrado (20mx20m ou 30mx30m), com o apoio de 2 jogadores por
equipa que se
encontravam fora do referido quadrado. O objectivo deste
exerccio era passar a bola de um
lado do quadrado para outro diametralmente oposto, sem perder a
posse da bola.
A Frequncia Cardaca dos jogadores foi monitorizada atravs de
cardiofrequencmetros
portteis (Polar Vantage NVTM
). Os batimentos cardacos foram registados em intervalos de
15
segundos.
A Frequncia Cardaca mxima dos jogadores no Yo-Yo Test apresentou
um valor mdio de
197 bat.min-1
e um desvio padro de 6 bat.min-1
.
As mdias da Frequncia Cardaca respeitantes a cada variante em
estudo situaram-se entre
os 154 bat.min-1
e os 165 bat.min-1
(ANOVA: p>0,05).
As mdias das percentagens da Frequncia Cardaca mxima em cada
variante do exerccio
estudado oscilaram entre os 78,5% e os 84,0% (ANOVA:
p>0,05).
Em 50% do tempo de durao do exerccio estudado, os valores da
Frequncia Cardaca
situaram-se entre os 151 e os 190 bat.min-1
(75% - 94% da Frequncia Cardaca mxima).
O Impulso de Treino relativiza a Frequncia Cardaca mdia obtida
em exerccio com a
Frequncia Cardaca mxima, a Frequncia Cardaca de repouso e o sexo
do indivduo. O
Impulso de Treino parece ser uma medida mais robusta para
avaliar o impacto fisiolgico do
exerccio do que os valores absolutos da Frequncia Cardaca
tomados per se. Os valores do
Impulso de Treino oscilaram entre os 22,04 e os 34,5 nas
variantes do exerccio estudado
(ANOVA: p
-
ii
Abstract
The aim of this work is to study the influence of the variables
of time, space and number of
players in the intensity of the effort of the complex exercise
of training, going through the
monitorizing of the Heart Rate.
The sample was constituted by 15 football players of the echelon
sub-16 who made part of a
team which disputed the National Championship of the younger
set, in the sportive season
2000/01.
The studied exercise consisted in a game between two teams (3x3
or 4x4) played in a square
(20mx20m or 30mx30m), with de help of two players per team, who
were out of the referred
square. The aim of this exercise was to pass the ball from one
side to the other of the square,
diametrically opposite, without losing the possession of the
ball.
The Heart Rate of the football players was monitorized through
the portables sets (Polar
Vantage NVTM
). The Heart Rate were registered in intervals of 15
seconds.
The maximum Heart Rate of the players in the Yo-Yo Test showed a
average value of 197
beats.min-1
and a standard deviation of 6 beats.min-1
.
The averages of percentages of the maximum Heart Rate in each
variant of the studied
exercise oscillated between the 78% and 84% (ANOVA:
p>0,05).
In 50% of the duration of time of the studied exercise, the
values of Heart Rate were situated
between the 151 and the 190 beats.min-1
(75%-94% of maximum Heart Rate).
The Impulse of Training relativize the average of Heart Rate
obtained in exercise with the
maximum Heart Rate, the rest Heart Rate and the sex of the
person. The Impulse of Training
seems to be one better measure to evaluate the physiologic
impact of the exercise than the
absolute values of Heart Rate taken itself. The values of the
Impulse of Training oscillated
between the 22,04 and 34,05 in the variants of studied exercise
(ANOVA: p
-
iii
Rsum
Ce travail a pour objectif d'tudier l'influence des variables
temps , espace et nombre de joueurs
sur l'intensit de l'exercice complexe d'entranement, l'aide du
monitoring de la Frquence
Cardiaque.
L'chantillon se composait de 15 joueurs de foot-ball de la
catgorie moins de 16 ans qui ont
disput le Championnat National Junior B, pendant la saison
2000/2001.
L'exercice tudi tait un match entre deux quipes (3 contre 3 ou 4
contre 4) disput dans
carr (20mx20m ou 30mx30m), avec l'aide de deux joueurs par
quipe, qui se trouvaient
l'extrieur dudit carr. Le but de cet exercice tait de faire
passer le ballon d'un ct du carr au
ct oppos, sans s'en faire dpossder.
La Frquence Cardiaque des joueurs a t mesure au moyen de
d'appareils portatifs (Polar
Vantage NVTM
). Les pulsations cardiaques ont t enregistres toutes les 15
secondes.
La Frquence Cardiaque maxime des joueurs au Test du Yo-Yo s'est
leve en moyenne 197
pulsations par minute et une drive patron de 6 pulsations
min-1.
Les moyennes de Frquence Cardiaque pour chaque variante se sont
situes entre 154
pulsations min-1 (ANOVA : p>0,05).
Les moyennes des pourcentages de la Frquence Cardiaque pour
chaque variante de
l'exercice ont oscill entre 78,5% et 84,0% (ANOVA :
p>0,05).
Sur 50% du temps qu'a dur l'exercice tudi, les valeurs de la
Frquence Cardiaque se sont
situes entre 151 et 190 pulsations min-1 (75% - 94% de la
Frquence Cardiaque maxime).
L'impulsion d'entranement tient compte de la Frquence Cardiaque
moyenne obtenue en
activit par la Frquence Cardiaque maxime, de la Frquence
Cardiaque au repos et du sexe
de l'individu. L'impulsion d'entranement semble tre une mesure
plus solide pour valuer
l'impact physiologique de l'exercice que les valeurs absolues de
la Frquence Cardiaque
considrs en soi. Les valeurs de l'Impulsion d'entranement ont
oscill entre 22,04 et 34,5 pour
les variantes de l'exercice tudi (ANOVA: p
-
iv
ndice
1 Consideraes prvias
_________________________________________________________ 1
2 Introduo
___________________________________________________________________
6
3 Reviso da Literatura
__________________________________________________________ 10
3.1 Capacidade de Rendimento em Futebol uma determinada
Capacidade de Jogo (CJ) __ 10
3.2 O treino de futebol
_________________________________________________________ 13
3.3 Alterao de paradigma do treino: Associao de factores vs
construtivismo ___________ 14
3.4 Os Exerccios Complexos de Treino (ECT)
_____________________________________ 18
3.4.1 Modelo de Jogo Adoptado (MJA) vs. Modelo de Treino
Adoptado (MTA) a
necessidade de uma especificidade
______________________________________ 24
3.5 A construo dos exerccios as variveis em jogo
______________________________ 37
3.6 O impacto fisiolgico dos ECT contributo para a modelizao dos
ECT ______________ 46
3.6.1 A Frequncia Cardaca (FC) meio de avaliao fisiolgica do
esforo nos ETC __ 49
3.6.2 Impulso de Treino (IT)
_________________________________________________ 57
4 Material e mtodos
___________________________________________________________ 60
4.1.1 Estudo exploratrio
___________________________________________________ 61
5 Apresentao e discusso dos resultados
_________________________________________ 64
6 Concluses
_________________________________________________________________
87
7 Limitaes e sugestes para novos trabalhos
______________________________________ 89
8 Bibliografia
__________________________________________________________________
91
-
v
ndice de Grficos
Grfico 3-1 Comportamento da FC ao longo do jogo (adaptado de
Rebelo, 1999:11) _____ 53
Grfico 3-2 FC de um jogador durante um jogo de 7x7 em metade do
campo. Depois de
limitar o nmero de toques para dois por jogador a Fcmdia
aumentou 11bat.min-1
(adaptado de Bangsbo, 1997:151).
___________________________________ 55
Grfico 5-1 Mdia e desvio padro da FC para cada variante do
exerccio estudado. _____ 65
Grfico 5-2 Comportamento da FC do jogador A na variante 1 (V1).
Legenda: ex - perodo de
exercitao em situao de jogo 3x3; jk - perodo de exercitao em
situao de
JK; rp - repouso
__________________________________________________ 68
Grfico 5-3 FC dos jogadores no perodo ex3 (grfico5-2) de uma das
equipas que
realizaram a variante 1 (V1) do ET por ns estudado.
____________________ 71
Grfico 5-4 Percentagem da FCmx em cada variante do exerccio
estudado. ___________ 73
Grfico 5-5 Percentagens da FC em exerccio (todas as variantes)
em cada intervalo de 10
bat.min-1.
_______________________________________________________ 76
Grfico 5-6 Mdia e desvio padro do IT para cada variante do
exerccio estudado. _____ 79
Grfico 5-7 Comparao da FC das variante 1 (vermelho 20mx20m) e 2
(azul 30mx30m)
para o jogador A.
_________________________________________________ 80
Grfico 5-8 Comparao da FC das variante 3 (vermelho 20mx20m) e 4
(azul 30mx30m)
para o jogador A.
_________________________________________________ 80
Grfico 5-9 Comparao da FC das variante 5 (vermelho 20mx20m) e 6
(azul 30mx30m)
para o jogador A.
_________________________________________________ 81
Grfico 5-10 Comparao da FC das variante 7 (vermelho 20mx20m) e 8
(azul 30mx30m)
para o jogador A.
_________________________________________________ 81
-
vi
ndice de Quadros
Quadro 3-1 Quadro resumo das designaes adoptadas por vrios
autores para os ECT. _ 19
Quadro 3-2 Classificao dos exerccios (Oliveira, 2000a).
__________________________ 38
Quadro 3-3 Classificao dos ET- adaptado de Bragada (2000).
_____________________ 39
Quadro 3-4 Parmetros modelizveis nos ECT (Mombaerts, 1996:61).
________________ 44
Quadro 3-5 Valores de FC obtidos em jogo.
_____________________________________ 52
Quadro 3-6 Valores de referncia para a FCrep.
___________________________________ 56
Quadro 3-7 Frmulas predictoras da FCmx.
____________________________________ 57
Quadro 4-1 Variantes do ECT Mudana de Flanco em estudo.
_____________________ 63
Quadro 5-1 Mdia e desvio padro da FC (bat.min-1) para cada
variante do exerccio
estudado.
_______________________________________________________ 65
Quadro 5-2 Percentagem da FCmx nas variantes do exerccio
estudado. ______________ 73
Quadro 5-3 Distribuio de frequncias da FC para cada intervalo de
10 bat.min-1, em cada
variante do exerccio
estudado.______________________________________ 74
Quadro 5-4 IT para cada variante do exerccio estudado.
___________________________ 77
Quadro 5-5 Tabela de dupla entrada referente s mdias das
variantes que se diferenciam
estatisticamente no IT.
____________________________________________ 78
Quadro 5-6 Relao entre o espao de jogo e o nmero de jogadores
envolvidos nas
variantes do ECT escolhido e do jogo formal.
__________________________ 83
-
vii
ndice de Figuras
Figura 3-1 Crculo de ajuste das variveis dos ECT adaptado de
Bangsbo (1997:150). _ 45
Figura 4-1 Mudana de Flanco. O espao de jogo pode ser limitado
pela colocao de
cones de sinalizao nos vrtices do
quadrado._________________________ 62
Figura 5-1 Centro do Jogo rea definida pelo crculo que envolve
os jogadores que
desenvolvem aces prximas da bola no sentido de cumprirem os
princpios do
jogo (adaptado de Castelo, 1994:170).
________________________________ 84
Figura 5-2 Espao de Jogo Efectivo rea poligonal definida pelas
linhas que unem os
jogadores que se encontram na periferia do espao ocupado pelas
equipas que
se defrontam, exceptuando os guarda-redes, num instante
determinado e dentro
do espao de jogo regulamentar (adaptado de Grhaigne, 1992:55)
________ 84
-
viii
Codificao de Abreviaturas
CJ Capacidade de Jogo
EA Exerccios Analticos
ECT Exerccios Complexos de Treino
ET Exerccios de Treino
FC Frequncia Cardaca
FCex Frequncia Cardaca em Exerccio
FCmx Frequncia Cardaca Mxima
FCmdia Frequncia Cardaca Mdia
FCrep Frequncia Cardaca de Repouso
FJS Formas de Jogo Simplificadas
IT Impulso de Treino
JC Jogos Condicionados
JDC Jogos Desportivos Colectivos
JK Joker
MJA Modelo de Jogo Adoptado
MTA Modelo de Treino Adoptado
SNA Sistema Nervoso Autnomo
VO2max Consumo Mximo de Oxignio
-
1
1 Consideraes prvias
As investigaes realizadas no mbito do futebol salientam
propriedades
que lhe permitem constituir-se como um objecto de estudo1 se
utilizarem meios
e mtodos que obedeam a preceitos de natureza cientfica
(Garganta,
2001:2).
O constante dilogo da cincia com a prtica enriquece o saber
acerca
do saber fazer, o que se reflecte retroactivamente no incremento
da qualidade
do jogo e da sua evoluo.
Apesar dos meios cada vez mais sofisticados, nem sempre os
modelos
de investigao cientfica se afiguram compatveis com a
especificidade do
futebol (Garganta, 2001:8). Muitos dos estudos cientficos em
futebol incidem
analiticamente sobre a dimenso energtico-funcional (Garganta,
1997:11) ou
sobre outras dimenses sem preservar a complexidade inerente ao
fenmeno.
No entanto, estudos recentes tm enfatizado uma abordagem
sistmica
do futebol, considerando-o um sistema aberto (Queiroz, 1986;
Oliveira, 1991;
Grhaigne, 1992; Mombaerts, 1996; Garganta, 1996 e 1997; Pinto,
1996; Pinto
& Garganta, 1996; Cerezo, 2000).
Concordamos com Garganta & Silva (2000:6) quando referem que
o
futebol um dos exemplos mais eloquentes do caos determinista2.
Qualquer
perturbao, por mnima que seja, pode afectar o estado geral do
sistema, a
1 O que confere cientificidade a um objecto de estudo a forma
como realizada a
sua abordagem (Garganta, 2001:2). 2 (...) comportamento no
peridico de sistemas dinmicos, isto , de sistemas
capazes de evoluir a partir de condies iniciais s quais so
extremamente sensveis (Silva, 1999:104).
-
Erro! Utilize o separador Base para aplicar Ttulo 1 ao texto que
pretende que aparea
aqui.
2
curto ou a longo prazo, e impedir a exactido da previso nestes
sistemas3
(Reeves, 1998:133; Reason & Goodwin, 1999:2) Tnues diferenas
nas
condies iniciais podero, em certas circunstncias, levar a
mudanas
maiores no comportamento do sistema, ou seja, um microfacto pode
ter
macroconsequncias ao nvel do decurso do jogo e do seu
resultado
(Garganta, 2001:8).
A imprevisibilidade, a aleatoriedade e a inovao esto presentes
nos
sistemas abertos, onde (...) os agora virgens so feitos de
acontecimentos
novos, marcados mas no determinados pelo passado. As suas
chegadas
influenciam o futuro e arrastam na sua esteira a possibilidade
de outros
acontecimentos inditos. Os agoras preparam outros agoras
(Reeves,
1990:127)
A noo de sistema aberto tem origem no segundo princpio da
termodinmica que refere a tendncia para a entropia4, isto , para
a perda de
qualidade da energia (Reeves, 1998:164). A noo de sistema aberto
surge em
oposio ao de sistema fechado. Um sistema fechado no efectua
trocas de
energia ou matria com o exterior e permanece em equilbrio5. J os
sistemas
abertos dependem do fluxo energtico que estabelecem com o
exterior para
evitar a sua desregulao organizacional (Morin,1990:30), ou seja,
a sua
3 Este fenmeno refere-se extrema sensibilidade aos dados
iniciais, sendo conhecido
como efeito borboleta. Deve o seu nome ao meteorologista Edward
Lorenz e pode enunciar-se da seguinte forma: (...) uma borboleta
que agite o ar hoje em Pequim pode influenciar tempestades no
prximo ms em Nova Iorque (Gleick, 1994:31). Ou, numa referncia mais
popular: Por um prego, perdeu-se a ferradura; Por uma ferradura,
perdeu-se o cavalo; Por um cavalo, perdeu-se o cavaleiro; Por um
cavaleiro, perdeu-se a batalha; Por uma batalha, perdeu-se o reino!
(Gleick, 1994:49)
4 (...) num universo em expanso, e enquanto esta durar, o estado
de entropia mxima
nunca ser atingido (Reeves, 1990:178). 5 Um sistema fechado,
como uma pedra, uma mesa, est em estado de equilbrio, ou
seja, as trocas em matria/energia com o exterior so nulas
(Morin, 1990:31).
-
Erro! Utilize o separador Base para aplicar Ttulo 1 ao texto que
pretende que aparea
aqui.
3
diminuio de informao (Reeves, 1998:164).
Investigadores dos sistemas sociais, da biologia, da gesto
empresarial
e do desporto tm utilizado a noo de sistema aberto por analogia
com o que
sucede em termodinmica.
Os sistemas abertos so considerados complexos6 e funcionam
na
fronteira do equilbrio (ordem) e do desequilbrio (desordem)7.
Quando sofrem
um desequilbrio (desordem) recorrem a processos espontneos
de
organizao coerente para novos padres, estruturas ou
comportamentos8
(Mitleton, 1997) - auto-organizao9 (Santos, 1988:27).
Os sistemas complexos utilizam a informao do meio em que
esto
inseridos e adaptam o seu comportamento de forma a optimizar o
seu
desempenho - A este nvel o sistema complexo torna-se adaptativo
(Reeves,
1998:34).
6 A complexidade surge da inter-relao, interaco e
inter-conectividade dos
elementos que constituem um sistema e entre o sistema e o seu
ambiente (Mitleton-Kelly, 1997:2). Convm aqui desfazer o possvel
equvoco de se confundir complexo com complicado: (...) diz-se que
um sistema complicado quando contm numerosos elementos sem relaes
de conjunto (...). Num sistema complexo, pelo contrrio, a integrao
e a interdependncia dos elementos originam o aparecimento de
propriedades novas, chamadas emergentes, ausentes do sistema
complicado (Reeves, 1998:35). Por exemplo, um conjunto de msicos em
que cada um com o seu instrumento produz sons dspares dos demais,
representa o complicado. Uma orquestra, onde os msicos tocam em
harmonia uma sinfonia, representa o complexo.
7 Morin (1990:32) refere que (...) as leis da organizao do ser
vivo no so de
equilbrio, mas de desequilbrio, recuperado ou compensado, de
dinamismo estabilizado. ... um sistema complexo pode dar origem
turbulncia e coerncia ao mesmo tempo (Gleick, 1994:86).
8 Ou estruturas dissipativas. Estruturas dissipitativas so uma
outra forma de olhar para
os sistemas complexos. Quando um sistema sofre uma flutuao que
afecta a sua estabilidade forado para uma condio longe do equilbrio
e alcana um ponto de bifurcao. inerentemente impossvel determinar
antecipadamente a direco que tomar. O sistema pode desintegrar-se
ou saltar para um novo nvel ou ordem de organizao, chamado
estrutura dissipativa. (Mitleton-Kelly, 1998).
8 (...) comportamento no peridico de sistemas dinmicos, isto ,
de sistemas
capazes de evoluir a partir de condies iniciais s quais so
extremamente sensveis (Silva, 1999:104).
9 Ou auto-eco-organizao ou ecosistema (Morin, 1990:127). Este
conceito envolve o
sistema e o contexto interagindo mutuamente (...) o sistema s
pode ser compreendido incluindo-se nele o meio (ibid.: 33); (...) a
parte est no todo e o todo est na parte (ibid.:128).
-
Erro! Utilize o separador Base para aplicar Ttulo 1 ao texto que
pretende que aparea
aqui.
4
A abordagem ao futebol como um sistema aberto e complexo em
constante inter-relao com o contexto, insere-se na perspectiva
filosfica do
paradigma10 construtivista.
Em oposio ao positivismo11 cartesianista,12 que tudo pretende
reduzir
para melhor conhecer, o construtivismo, ao contemplar a
complexidade
essencial sem a mutilar (Le Moigne, 1987:12), concebe modelos
inteligveis
que representam a realidade - a complexidade13 (...) no sendo
simplificvel,
pode no entanto ser inteligvel (Le Moigne, 1994:164).
Modelos estes concebidos como representaes operatrias capazes
de
orientar o fazer, como por exemplo, um engenheiro que traa um
projecto de
uma casa ou um viajante que se guia por um mapa (Le Moigne,
1987:7).
10
Paradigma, o m. q. modelo, arqutipo, prottipo (Enciclopdia Verbo
On-line, http://enciclopediaverbo.clix.pt). Conceito fundamental da
epistemologia de Kuhn. Designa uma teoria cientfica ou uma viso do
mundo, incluindo mtodos e recursos, experincias e resultados
obtidos, indicando linhas de investigao que congregam a comunidade
cientfica, estabelecendo metas e objectivos comuns. Assume-se como
um quadro conceptual com uma funo dogmtica que orienta a actividade
da cincia normal constituindo-a como uma actividade de soluo de
enigmas (puzzle-solving). o paradigma que estabelece os problemas a
resolver e as solues aceitveis. Enquadra a actividade da cincia
normal impedindo a disperso, rejeitando questes que no se revelem
importantes para a sua consolidao, excluindo todos os que a ele no
adiram, impedindo o dispndio de esforo em polmicas sobre os
fundamentos da cincia. O falhano de um paradigma introduz uma crise
e, com ela, a fase de cincia extraordinria; no sendo ultrapassada,
ter lugar uma revoluo cientfica e a instaurao de um novo paradigma
(Instituto de Inovao Educacional,
http://www.iie.min-edu.pt/proj/actividades/webquests/kuhn/paradigm.htm).
Um paradigma um tipo de relao lgica (incluso, conjuno, disjuno,
excluso) entre um nmero de noes ou categorias mestras. Um paradigma
privilegia certas relaes lgicas em detrimento de outras, e por isso
que um paradigma controla a lgica do discurso (Morin, 1990, p.
162).
11 Onde o conhecer significa (...) dividir e classificar para
depois poder determinar
relaes sistemticas entre o que se separou (Santos, 1988: 15).
Onde s pensvel o que pode ser matematicamente pensvel (Moigne,
1994:47). De entre os nomes mais sonantes do positivismo cientfico
salientam-se Auguste Comte e Laplace.
12 (...) se reduzirmos gradualmente as proposies complexas e
obscuras a
proposies mais simples, e se de seguida, partindo da intuio das
mais simples de todas, tentarmos elevar-nos pelos mesmos degraus at
ao conhecimento de todas as outras (in Ouvres Philosophiques,
Descartes, Regles pour la diretion de lespirit, Tome I, pp.
100-101). Contrariamente, Le Moigne (1994:122) refere que quanto
mais se pretende clarificar disjuntando conceitos imbricados mais
se empobrece a inteligibilidade do conhecimento construda pela
interaco deliberada desses conceitos.
13 Seria mais correcto dizer que na realidade s h acontecimentos
complexos. Os
simples so falsamente simples (Reeves, 1990:125).
-
Erro! Utilize o separador Base para aplicar Ttulo 1 ao texto que
pretende que aparea
aqui.
5
A modelao sistmica permite olhar para os sistemas
apercebidos
como complexos14, ou seja, para aqueles que a priori se
considera no
poderem ser conhecidos pela simples decomposio analtica (Le
Moigne,
1994:100). Permite ainda reconhecer e integrar o acaso, a
imprevisibilidade, a
aleatoriedade e a desordem (Morin, 1990:52).
Ser esta a perspectiva que orientar o nosso trabalho. A procura
de um
modelo de representao operatria (Le Moigne, 1987:7) para os
Exerccios de
Treino (ET) que se desenvolvam num contexto dinmico de oposio
e
resoluo de problemas.
14
Um sistema complexo um sistema que no pode ser caracterizado a
partir da reunio das caractersticas e qualidades das suas partes
constituintes, e cujo comportamento no pode ser previsto a partir
das partes componentes (Silva, 1999:119). (...) a complexidade a
propriedade de um sistema modelizvel susceptvel de manifestar
comportamentos que no sejam todos predeterminados (necessrios)
ainda que potencialmente antecipveis (possveis) por um observador
deliberado desse sistema (Le Moigne, 1994:191). Trata-se de um
princpio transaccional que faz com que no nos possamos deter apenas
num nvel do sistema sem ter em conta as articulaes que ligam os
diversos nveis (Garganta, 2001:3).
-
6
2 Introduo
A opo por uma maior percentagem de utilizao de exerccios
especficos parece ser uma tendncia actual do treino de futebol
(Bezerra,
2001:23), pois estes permitem uma maior transferibilidade para o
jogo de
comportamentos subordinados concepo de jogo do treinador e
reproduzem, parcial ou totalmente, o contedo e a estrutura do
jogo (Queiroz,
1986:22). A recolha de informao acerca dos efeitos dos ET,
assim
concebidos, permitir construir modelos de exerccios mais
eficazes e
assegurar uma periodizao mais adequada.
Neste trabalho, a modelizao dos EC como representao
operatria
focaliza-se num exerccio por ns seleccionado.
A seleco deste ET teve como critrio a sua pertinncia no
desenvolvimento do Modelo de Jogo Adoptado (MJA)15 pelo
Departamento
Juvenil do Clube a que pertencia a equipa cujos jogadores
constituiram a
amostra deste trabalho. Enquanto treinador da referida equipa,
tivemos
oportunidade de avaliar o ET em estudo quanto sua pertinncia
para o
desenvolvimento de comportamentos adequados em situao de
jogo.
A observao dos treinos e dos jogos, apesar de subjectiva, ou
seja,
sem recurso a tcnicas e mtodos de acordo com preceitos
cientficos
adequados, permitiu recolher informao positiva quanto aos
efeitos deste
exerccio de treino no referido MJA.
O problema do jogo que este exerccio pretendia solucionar era
a
mudana do corredor de ataque sob presso defensiva do
adversrio.
15
O conceito de MJA ser abordado na pg. 25.
-
Erro! Utilize o separador Base para aplicar Ttulo 1 ao texto que
pretende que aparea
aqui.
7
Observou-se que a mudana de corredor de ataque em jogo e sob
as
condies de presso defensiva do adversrio ocorria gradualmente
com mais
fluncia, segurana e propsito medida que o ET em estudo era
aplicado ao
longo da poca desportiva.
Se a pertinncia do exerccio pela influncia positiva que exercia
na
consecuo do MJA era elevada, o doseamento do esforo do exerccio
era
realizado sobretudo pela observao subjectiva do estado de fadiga
dos
jogadores. Embora socorrendo-nos de alguns exemplos da
literatura em
relao durao dos tempos de exercitao e de repouso, do espao e
do
nmero de jogadores em exerccios idnticos, persistiam dvidas
quanto ao
impacto fisiolgico (carga interna) provocado nos jogadores pelo
exerccio em
causa.
Concordamos com Bezerra (2001) quando refere que o ET deve
identificar-se o mais possvel com MJA pelo treinador nas suas
componentes
tcnicas e tcticas, mas tambm deve reflectir o modelo de esforo
que est
subjacente a essa forma de jogar. Da o interesse especfico em
saber como se
reflectiria fisiologicamente nos jogadores a aplicao do referido
ET por ns
escolhido para este trabalho.
A utilizao da Frequncia Cardaca (FC), atravs da sua
monitorizao
com cardiofrequencmetros em situao de exercitao, pareceu-nos um
meio
adequado para aceder a um melhor conhecimento da carga interna
do ET em
causa.
O estudo exploratrio da variao da FC em exerccio, pela
manipulao
das suas variveis espao, tempo e nmero de jogadores, permitir
recolher
informao sobre o impacto fisiolgico provocado no organismo dos
jogadores
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8
nas diferentes variantes do ET estudado. Permitir ainda recolher
informao
sobre a maior ou menor influncia de cada uma das variveis
manipuladas
(espao, tempo e nmero de jogadores) na FC em exerccio dos
jogadores.
Um melhor conhecimento do impacto fisiolgico provocado no
organismo dos jogadores por cada uma das variantes do ET
estudado poder
contribuir para a concepo de modelos de exerccio que
correspondam a
distintos objectivos de treino, sem interferir negativamente na
sua
complexidade. Que, a acontecer, empobrec-la-ia pela reduo
linear
simplificante16.
Toda a informao que possamos retirar do nosso estudo s ter
sentido
se for devolvida com informao adicional ao treino (Garganta,
2001:8), no
sentido de enriquecer a prtica atravs do referido modelo de
representao
operatria dos ECT.
Quanto a esta possibilidade de devoluo de informao acrescida
pensamos que ter aplicao concreta na concepo do treino,
nomeadamente
no desenho mais cuidado dos ET e na sua periodizao.
O estudo no pretende ser exaustivo no que diz respeito
modelizao
de todos os ET. Nem podia ser!
Partimos do princpio que os exerccios devem ser construdos
segundo
uma orientao intimamente ligada concepo de jogo do treinador
e
subjacente a um contexto que a determina. Por isso, os exerccios
so
especficos relativamente sua concepo, aplicao e efeitos
pretendidos.
As condies materiais, o clima, o nvel de competio, as
caractersticas morfo-funcionais e scio-culturais dos jogadores,
os objectivos
16
(...) aceito a reduo consciente de que reduo e no reduo
arrogante que cr possuir a verdade simples Morin (1990, p.
148).
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9
da equipa e outros factores que possam afectar as condies de
treino
constituem o contexto ao qual a concepo do treinador tem que se
subordinar
para ser concretizvel e operacionalizvel (Pinto & Garganta,
1996:86).
Ao seleccionarmos um determinado exerccio de treino, no o
fazemos
com o intuito de o normalizar de forma a ser utilizado
indistintamente por uma
qualquer equipa. Mas, to s, como um possvel exemplo de modelizao
de
representao operatria para a concepo de ECT.
Este modelo de representao operatria pretende auto-organizar
contributos oriundos de vrias aproximaes ao treino, dando
sentido frase: o
todo mais que a soma das partes. Por isso, a reviso bibliogrfica
procurar
introduzir conceitos de treino que contemplam e privilegiam a
complexidade.
Conceitos que focam na complexidade o seu modus faciendi e
permitem a
abordagem ao treino de uma forma integradora.
-
10
3 Reviso da Literatura
A reviso da literatura abordar a problemtica do treino de
futebol,
sobretudo no que diz respeito concepo, organizao e avaliao dos
ET.
Sero referenciados, entre outros, os seguintes conceitos:
capacidade
de jogo (CJ), abordagem sistmica ao jogo, treino de futebol,
treino integrado,
exerccios complexos de treino (ECT), modelo de jogo adoptado
(MJA),
impacto fisiolgico dos ECT e frequncia cardaca (FC).
3.1 Capacidade de Rendimento em Futebol uma
determinada Capacidade de Jogo (CJ)
Garganta (1997:21; 1999:6) ao analisar o futebol como Jogo
Desportivo
Colectivo (JDC) salienta o contexto de elevada variabilidade,
imprevisibilidade
e aleatoriedade tpico desta modalidade. O futebol, tal como
outros JDC,
caracteriza-se pelo confronto entre duas equipas e pelas
complexas relaes
de cooperao e oposio que se estabelecem na disputa da
vitria.
O futebol um jogo eminentemente perceptivo com elevada
solicitao
de habilidades abertas ou de regulao externa17 (Cerezo, 2000:2;
Losa et al.,
2001:2). Para se desenvolver uma habilidade aberta ou de regulao
externa
necessrio uma constante adaptao e regulao aos factores
externos.
Losa et al. (2001:2) referem-se ao futebol como um desporto de
situao
de natureza problemtica e contextual, em que o desempenho motor
dos
jogadores est estritamente relacionado com a capacidade de
estes
17
So aquelas que permitem ao indivduo adaptar-se, decidindo por um
comportamento, a uma srie de condies ambientais imprevisveis e em
constante mudana (Grhaigne, 1992:20; Arajo, 1997:14, Moreno &
Moreno, 1998:39; Tani, 2000).
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11
responderem de uma forma eficaz s constantes modificaes do
contexto.
Apesar do rendimento em futebol depender da cooperao colectiva
que
este tipo de jogos pressupe, deve ter-se em linha de conta que
este
rendimento depende tambm da capacidade de rendimento do
adversrio e,
por isso, ser sempre relativo (Konzag et al., 1995:10).
As relaes de oposio existentes, originadas pelo antagonismo
protagonizado pelas duas equipam na procura do objectivo do
jogo, determina
uma lgica que gera uma dinmica de movimento global de uma baliza
para a
outra, cujo sentido pode inverter-se a cada instante (Garganta
& Silva, 2000:5).
Grhaigne (1992:14) destaca a reversibilidade das fases do jogo
nos
JDC. O problema fundamental dos JDC consiste em, numa constante
relao
de oposio, coordenar as aces dos companheiros para
recuperar,
conservar, fazer progredir a bola para o objectivo do jogo e
finalizar.
Para Teodorescu (1984:24), os JDC so considerados como um
processo organizado de cooperao. A coordenao das aces dos
jogadores
de uma equipa, tem como objectivo desorganizar a cooperao do
adversrio.
Garganta (1997:81), baseando-se na teoria dos jogos, nas cincias
do
caos, na teoria das organizaes, nas cincias da cognio e na
teoria da
aco considera a equipa como um sistema organizado. Cada aco
individual
coordenada com um projecto colectivo, onde os aspectos tcnicos,
fsicos
estratgicos e tcticos articulam-se em funo das relaes de oposio
que
se estabelecem, na procura de uma actuao eficaz.
Ao considerar-se a equipa como um sistema organizado, deve
salientar-
se a inter-relao entre os seus elementos e a correspondente
entidade
colectiva que da sobressai. A equipa ser ento mais do que a soma
das suas
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12
partes18. Ter propriedades emergentes19 que nenhum dos seus
elementos
constituintes, por si s, possui.
Konzag et al. (1995:10) caracterizam a inter-relao entre os
jogadores
de uma equipa como sendo um processo de sintonizao e adaptao
colectiva com base na comunicao verbal e no verbal (sinais
relevantes para
a aco) e a disponibilidade para cooperar.
Godik & Popov (1997:94) referem que o jogo de futebol tem
adquirido
cada vez mais um carcter colectivo e salientam a importncia dos
jogadores
subordinarem as suas aces ao objectivo colectivo apesar das
distintas
funes que cada jogador desempenha em jogo (Rebelo, 1993:8).
Garganta (1997:84) considera que a aleatoriedade, a
imprevisibilidade e
a variabilidade de comportamentos e aces fazem apelo dimenso
estratgica-tctica e capacidade decisional.
O aspecto tctico parece ser determinante na capacidade de
rendimento
nos JDC, nos quais se integra o futebol (Schn, 1981; Frade,
1982; Konzag,
1986 e 1995; Dugrand, 1989; Garganta, 1996, 1997, 2000; Pinto
& Garganta,
1996; Garganta & Oliveira, 1996).
Numa perspectiva no desintegradora da complexidade do
rendimento
18
Morin (1990:124) diz-nos tambm que o todo menor que a soma das
partes. Para uma melhor ilustrao, Edgar Morin refere o exemplo de
uma tapearia. A tapearia constituda por fios de vrios tipos e cores
e a soma dos conhecimento das leis e princpios respeitantes a cada
fio seria insuficiente para conhecer as propriedades da tapearia,
bem como, a sua forma e configurao o todo mais que a soma das
partes. Mas, simultaneamente no possvel a cada fio que faz parte da
tapearia exprimir plenamente todas as suas propiedades por isso, o
todo menor que a soma das partes (ibid.).
19 O ser complexo possui uma coerncia interna que rene de
maneira
interdependente todos os seus elementos, garantindo-lhes um
comportamento global e unificado, isto , um eu (Reeves, 2000:34),
ou seja, o todo mais que a soma das partes. Reeves (1990:36), a
propsito das propriedades emergentes dos sistemas complexos, d os
seguintes exemplos: (...) a palavra azul evoca uma cor que no
evocada, nem sequer parcialmente, por cada uma das suas quatro
letras, a gua dissolvente, mas o hidrognio e o oxignio,
constituintes das suas molculas, no o so. A emergncia, que surge da
co-evoluo de um sistema complexo, cria novas qualidades ou outras
respostas que no podiam ser previstas pelo simples estudo
individual dos elementos envolvidos no processo (Espejo, 1997).
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13
nos JDC proposta a CJ.
Para Tavares & Faria (1996:45), a CJ um pr-requisito
fundamental
para o rendimento nos JDC. A CJ considerada complexa e
combina
tacticamente uma grande diversidade de capacidades psicolgicas e
fsicas,
bem como, um repertrio de habilidades tcnicas e de aces de
jogo
complexas que permitem resolver da forma mais eficaz os
problemas do jogo.
Para Konzag (1986:3) a CJ tem um carcter especfico
relativamente
modalidade em causa, desenvolve-se num processo de confronto
activo com
as condies do jogo e pode definir-se como (...) a capacidade
complexa de
utilizar, complementarmente as capacidades condicionais,
coordenativas e
qualidades psquicas, assim como as capacidades e as habilidades
tcnico-
tcticas necessrias nas situaes de ataque e defesa, para poder
enfrentar e
resolver de modo racional (adequado a cada situao) os problemas
existentes
no jogo, e que mudam continuamente....
O treino parece ser o meio mais eficaz para o desenvolvimento da
CJ
dos jogadores de futebol. Desenvolve-se como uma capacidade
especfica
para um jogo num processo de treino activo (Konzag et al.,
1995:12).
A capacidade de rendimento colectivo no futebol ser tanto maior
quanto
mais elevadas e complementares forem as CJ dos jogadores que
constituem a
equipa.
3.2 O treino de futebol
Cerezo (2000:9) refere que a capacidade de rendimento em
futebol
consequncia do desenvolvimento interdependente das capacidades
e
habilidades dos jogadores e que se atinge mediante um processo
complexo de
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14
treino.
O treino tem como objectivo fundamental optimizar as capacidades
dos
indivduos, levando-os a um estado de prestao competitiva mais
elevado
(Mesquita, 1991:65).
Teodorescu (1984:55) define treino nos JDC, depois de considerar
a
treinabilidade20 como premissa fundamental na preparao dos
jogadores,
como (...) um processo especializado de desenvolver e formar a
personalidade
do jogador considerado tanto individualmente como integrado em
equipa
sob o aspecto do seu aperfeioamento fsico-desportivo, com vista
realizao
duma capacidade mxima de performance, duma disponibilidade
para
alcanar resultados muito elevados, com carcter permanente.
Para Godik e Popov (1993:69) o treino desportivo constitui-se
como
sendo um processo pedaggico cujo fim a obteno de resultados
desportivos o mais elevados possvel.
Os ltimos desenvolvimentos na teoria do treino apontam para
uma
crescente especificidade, ou seja, para uma maior aproximao dos
contedos
e mtodos de preparao s exigncias da competio (Seirul-lo,
1987:58;
Tschiene, 1990; Thiesse, 1995; Silva, 1998; Verkonshanskij,
2001a e b;
Bezerra, 2001).
3.3 Alterao de paradigma do treino: Associao de factores
vs construtivismo
No passado, o treino do futebol foi muito influenciado pelos
mtodos
ligados aos desportos individuais, sobretudo ao atletismo
(Silva, 1989:36;
20
Treinabilidade para Weineck (1986:7) (...) exprime o grau de
adaptabilidade ao esforo de treino.
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15
Oliveira, 1991:30; Cerezo, 2000:1).
A valorizao da preparao fsica, no sentido estrito do termo, era
uma
preocupao que relegava para papeis inferiores os demais factores
da
preparao e, sobretudo o seu trabalho de forma integrada (Cerezo,
2000:1).
A anlise detalhada do esforo especfico da modalidade permitiu
a
criao de mtodos analticos para o desenvolvimento parcelar das
diferentes
capacidades motoras (Silva, 1989:39; Oliveira, 1991:30; Cerezo,
2000). Este
desenvolvimento parcelar das capacidades motoras pretendia uma
melhoria
global do rendimento desportivo (Silva, 1989:39) e orientava
exclusivamente o
planeamento do treino (Oliveira, 1991:30).
A diviso em factores de rendimento (tctico, tcnico, fsico e
psicolgico), para assim serem treinados, controlados e avaliados
em
separado, muito luz das teorias mecanicistas da aprendizagem
motora, foi
prtica comum no passado (Cerezo, 2000:7). A integrao, pela
simples
associao dos factores de rendimento fazia-se, muitas vezes,
somente a
posteriori, ou seja, no jogo. Este mtodo de aprendizagem
baseava-se num
conceito de aprendizagem sem erros e o comportamento pretendido
para o
jogo resultava da soma e acumulao das componentes fsicas,
tcnicas,
tcticas e psicolgicas (ibid.:7).
Grhaigne (1992:46) e Garganta (2001:8) referem que no caso de
um
sistema altamente complexo como o futebol, a simples adio
das
capacidades dos jogadores anteriormente trabalhadas
separadamente
inoperante. A aproximao sistmica ao jogo de futebol, em
contraposio
aproximao analtica, permite substituir o permanente pelo mvel, a
rigidez e
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16
a estabilidade pela adaptabilidade21.
Pinto & Garganta (1996) questionam os conceitos do que
habitualmente
se designa como preparao fsica, como preparao tctico-tcnica
e,
sobretudo a sua abordagem independente. Os autores sugerem que o
treino de
futebol deve fazer-se atravs de uma abordagem mais global e
integrada.
Schn (1981) sustentou que no passado, reportando-se
especialmente
ao caso da ex-RFA, o grau de preparao fsica era tudo e adianta
que, o
conceito actual do treino de futebol deve integrar as dimenses
que influenciam
o rendimento de acordo com as necessidades do jogo.
Mombaerts (1996:10), ao referir-se ao treino tradicional do
futebol,
considera-o como uma adio de factores e que, pelo facto da sua
estrutura
ser excessivamente simplificada e trabalhada separadamente,
perde toda a
sua especificidade geradora para o jogo. Considera ainda que os
modelos que
suportam esta aproximao so obsoletos e inadaptados
reversibilidade da
aco do jogo em futebol adiantando as seguintes razes: i) a
insuficincia do
trabalho realizado a propsito do papel jogado pelos processos
cognitivos
dentro da realizao das habilidades abertas e complexas; ii) a
predominncia
de uma concepo analtica; iii) a dificuldade em propor elementos
concretos
para uma formao tctico-tcnica do jogador.
Por isso, Mombaerts (1996:12) prope uma nova aproximao ao
treino
a partir do jogo de acordo com trs correntes complementares: i)
a primeira
consiste na necessidade de utilizar um modelo de interaco que
restitua a
composio multifactorial do treino de futebol; ii) a segunda
inclui-se dentro da
necessidade de colocar o jogador em situao de resoluo de
problemas e
21
Ver a propsito da adaptabilidade no futebol a pg. 26.
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17
em situao de projecto a fim de desenvolver a sua bagagem
tctico-tcnica;
iii) a terceira consiste em o treinador, a partir de um
compromisso pessoal
sobre um projecto de jogo, identificar os problemas de jogo da
equipa e as
suas solues pedaggicas.
As recentes meta-teorias22 da cincia enfatizam uma viso mais
global
perante os sistemas abertos.
Para Grhaigne (1992:45), Garganta (1997:81), Silva (2000:151)
e
Garganta & Silva (2000) o futebol entendido como um sistema
complexo
auto-organizado.
A aproximao sistmica ao jogo permitiu uma nova abordagem
metodolgica ao treino de futebol (Grhaigne, 1992:134). O
paradigma do
treino que privilegiava a associao de factores (tctico, tcnico,
fsico e
psicolgico) treinados em separado parece estar a ser substitudo
por aquele
que contempla a complexidade do jogo sem a mutilar (Queiroz,
1986;
Grhaigne, 1992; Godik & Popov, 1993; Mombaerts, 1996;
Castelo, 2000;
Cerezo, 2000; Leal & Quinta, 2001; Bezerra, 2001).
Godik & Popov (1993:95) salientam o aumento do volume de
exerccios
complexos especializados que se tem vindo a reflectir no
processo de treino,
em que a simultaneidade do aperfeioamento das aces
tcticas-tcnicas
com as capacidades motoras e volitivas favorece a mestria dos
jogadores.
Apesar de nos referirmos complexidade do jogo como mote
fundamental na criao das situaes de treino, no a reduzimos
exclusivamente ao jogo formal, alis, no deve ser a nica situao a
privilegiar
no treino de futebol.
22
Tais como, as teorias da ciberntica (Ashby, 1956), da sistmica,
dos fractais (Mandelbrot, 1991), do caos determinista (Gleick,
1994; Ekeland, 1995) e da complexidade (Morin, 1990; Moigne,
1994).
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18
Concordamos com Cerezo (2000) que refere a respeito da concepo
do
treino, que este no ter que ser sempre constitudo por uma situao
global
ou integral pura23, mas antes por actividades que sejam
simuladoras parciais
da competio e onde se seleccionam alguns aspectos que se
queiram
desenvolver ou melhorar. Igualmente, atravs da manipulao das
condies
de realizao dos mesmos exerccios, podemos provocar melhorias
especficas
ao nvel fsico, tcnico ou tctico.
Surge, a propsito desta nova forma de conceber o treino, o
conceito de
treino integrado (Ortega, 1996; Cerezo, 2000). O treino
integrado consiste na
preparao integrada das capacidades tcticas, tcnicas, fsicas e
psicolgicas
de forma a desenvolver capacidades no contexto em que intervm no
jogo
(Ortega, 1996:13).
3.4 Os Exerccios Complexos de Treino (ECT)
Mesquita (1996:96), ao referir-se s tarefas motoras de oposio
e
cooperao como meios de treino, destaca a sua complexidade que
resulta de
trs factores: a instabilidade do meio, o carcter arbitrrio na
durao da tarefa
e o grau de especificao do fim a atingir.
Cerezo (2000:10) refere que a prioridade no treino deve estar
orientada
no sentido de que os jogadores adquiram a habilidade especfica
de se
adaptarem e resolverem distintas situaes do jogo atravs da
resoluo de
situaes/problema24 em confronto dinmico de cooperao/oposio.
Esta
23
Situao formal de jogo de 11x11. 24
Segundo Courtay et al. (1990) uma situao de resoluo de problemas
pode ser definida como (...) uma aquisio de competncias necessrias
para cumprir a tarefa que constitu o objectivo, ou seja, o problema
a resolver dever ser um obstculo real cuja resoluo supe (...) um
conjunto de nico de solues que no possvel descobrir sem
aprender.
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19
forma de abordagem, atravs de situaes integradas, baseia-se nas
teorias
cognitivas da aprendizagem e permitem-nos colocar em evidncia
formas de
treino mais holsticas que envolvem todos os factores que incidem
no
rendimento (tcnicos, tcticos, fsicos, psicossociais).
Tm sido adoptadas vrias designaes para os exerccios que
contemplam na sua estrutura situaes parciais de simulao do jogo,
de forma
condicionada e com o objectivo de desenvolver
multifactorialmente a CJ (ver
quadro 3-1).
Quadro 3-1 Quadro resumo das designaes adoptadas por vrios
autores para os ECT.
Autor Designao
Teodorescu (1987: 41) Exerccios polifuncionais
Corbeau (1989:22) Exerccios complexos
Godik & Popov (1993:95) Exerccios complexos
especializados
Garganta (1994) Jogos condicionados
Veleirinho (1996) Jogos reduzidos
Arajo & Mesquita (1996) Formas de jogo simplificadas
Cervera (1998:19) Jogos simplificados
Cerezo (2000:11) Situaes integradas
Os exerccios, por ns aqui designados como ECT, pretendem
identificar
os exerccios que so usados no treino futebol cujos contedos e
objectivos
contemplam a possibilidade de deciso no totalmente
pr-determinada por
parte dos jogadores. So exerccios situacionais com elevada ligao
aos
problemas do jogo, contemplam a presena do adversrio e, pela
modificao
de alguns parmetros, fazem salientar determinados padres de
comportamento desejveis com elevadas possibilidades de inovao e
criao.
Para Corbeau (1989) os exerccios complexos so formas de
trabalho
que se aproximam das condies reais de jogo. A presena do
adversrio
uma condio essencial e condiciona as aces dos jogadores a
uma
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20
adaptao s constantes modificaes ambientais.
A quantidade de informao susceptvel de ser transmitida ou
perdida
num sistema tem sido usada como medida de complexidade25 (Morin,
1990:38;
Le Moigne, 1994:181). Assim, uma situao ser tanto mais complexa
quanto
mais quantidade de informao for necessria para o sistema se
organizar, ou
seja, no caso do futebol, quanto maior for o apelo capacidade de
deciso
tctico-estratgica dos jogadores.
A deciso nos JDC de grande complexidade. essencial para o
jogador adequar a sua resposta motora s exigncias inerentes
situao
(Faria & Tavares,1996; Arajo, 1997), ou seja, agir
estrategicamente A
aco estratgia (Morin, 1990:116).
Estratgia no significa ter um programa predeterminado que
aplicado
indistintamente das condies do contexto - A estratgia permite, a
partir de
uma deciso inicial, encarar um certo nmero de cenrios para a
aco,
cenrios que podero ser modificados segundo as informaes que vo
chegar
no decurso da aco e segundo os imprevistos que vo surgir e
perturbar a
aco (Morin, 1990:116).
Garganta (1999b:12) prope que no treino deve ser criado um
contexto,
no qual, as experincias motoras vivenciadas pelos jogadores
favoream a
identificao de determinadas regularidades quanto aos seus
efeitos.
A adaptao faz-se pelo reconhecimento de padres
qualitativamente
semelhantes (Tavares & Faria, 1996:43; Arajo, 1997:13).
25
De certa forma complementa aquela que proponha que a medida de
complexidade corresponde ao nmero de possibilidades que uma situao
apresenta (Espejo, 1997), de acordo com a Lei da Variedade
Necessria de Ashby (1956). Morin (1990:38) sugere o conceito de
neguentropia, ou seja, o desenvolvimento da organizao da
complexidade, em oposio ao de entropia que corresponde sua
deteriorao.
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21
O jogador adapta-se pelo confronto entre cenrios gerados no
decorrer
do prprio jogo e aqueles que, sob a forma de modelos, residem e
se
desenvolvem continuamente na sua mente, que, por sua vez,
resultam da
experincia acumulada, tanto em treino como em competies
anteriores26
(Tavares & Faria, 1996:43).
Arajo (1997:14) refere que os padres de resposta so formas
de
resoluo de problemas que, ao serem interiorizados pelo indivduo,
passam a
fazer parte da sua experincia e caracterizam-no enquanto
jogador.
Estes cenrios parecem poder ser criados atravs da utilizao
de
determinadas e apropriadas condicionantes27 nas variveis dos ECT
(espao,
tempo, nmero de jogadores, nmero permitido de toques na bola,
regras,
etc.)28, de forma a proporcionar um maior nmero de repeties
das
26
Garganta (1999, p. 7), citando Jalabert, refere que ... o
jogador de alto nvel invoca as experincias passadas para prever as
consequncias das aces que realiza. Damsio (1994, p. 112),
designa-as por imagens evocadas ... ao utilizarmos imagens
evocadas, podemos recuperar um determinado tipo de imagem do
passado, a qual foi formada quando planemos qualquer coisa que
ainda no aconteceu, mas que esperamos venha a acontecer.... Segundo
o mesmo autor, os nossos pensamentos constituem-se por imagens,
umas, aquelas que nos chegam pelos rgos dos sentidos a cada
instante, as perceptivas, e outras, aquelas que evocamos a partir
do passado ou como forma de planear o futuro. Grhaigne (1996:143)
designa-as por representaes.
27 Ou Constraint (Manoel, 2000:38). Constraint significa
constrangimento,
restrio ou reduo dos graus de liberdade (por exemplo, limitao do
nmero permitido de toques na bola a cada jogador). Os
constrangimentos em situao de treino, ao limitar os graus de
liberdade de aco dos jogadores, so geradores de variedade porque
solicitam a explorao de novas solues mediante as restries impostas
e, ao mesmo tempo, de estabilidade, porque essas mesmas restries
condicionam as suas aces para determinados padres de comportamentos
desejveis. Por exemplo, limitar o nmero permitido de toques por
jogador em determinado exerccio provocar certamente um
constrangimento ao nvel do tempo que o jogador possui para percepo,
deciso e execuo das suas aces. Esse constrangimento, por sua vez,
levar o jogador imaginao de novas solues para os problemas tcticos
que a situao impe, ou seja, um novo estado de organizao. conhecido
o incremento da velocidade da circulao da bola e jogadores quando o
nmero de toques permitido por jogador diminui, ou a repercusso na
intensidade do esforo quando obrigatria a marcao individual (Godik
& Popov, 1993:79).
28 Ver A construo dos exerccios as variveis em jogo, pg. 37.
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22
possibilidades de deciso criativa desejadas29. Estas
possibilidades de deciso
criativa s podero ser promovidas atravs de ET onde a convivncia
com a
variabilidade das situaes exige decises a cada momento o que
acontece
no jogo!
Cervera (1998:19) destaca o papel ECT no fomento da
criatividade30 e
improvisao. O mesmo autor (ibid.) salienta ainda que a
criatividade e a
improvisao so determinantes para o desenlace da partida, pois,
perante
distintas situaes de jogo com mltiplas possibilidades de resoluo
tctica,
os jogadores que as tiverem mais desenvolvidas percebem uma
jogada e
rapidamente solucionam a situao do jogo.
Os ECT devem, por isso, solicitar adaptaes constantes s
situaes/problema, onde a criatividade, a improvisao e o timing31
obrigam
os jogadores a recorrerem com elevada frequncia aos aspectos de
deciso
(tctico/estratgicos).
Arajo (1997:13) refere que o treino desportivo deve respeitar
a
especificidade da modalidade, nomeadamente no que diz respeito
sua lgica
de funcionamento e ao seu envolvimento. As intenes e os
consequentes
comportamentos devem estar presentes nas situaes que o
indivduo
experimenta (treino) para uma melhor adequao competio.
Os exerccios que contemplam situaes/problema em contexto
competitivo similar ao do jogo produzem adaptaes mais adequadas
s
exigncias competitivas dos Jogos Desportivos Colectivos (JDC)
(Pinto, 1991;
29
A criatividade aqui vista como inovao. A Inovao como explorao do
espao de possibilidades (Mitleton, 1997). Ver, a propsito da
explorao do espao de possibilidades, nota de rodap da pg. 26.
30 Pode-se dizer que a criatividade uma manifestao da
auto-organizao (Dimitrov,
2000). 31
Timing - (...) pode ser considerado um conceito geral de
coordenao para a cincia do movimento; o acto ptimo exige a
competncia e a aptido de estar no momento certo, no lugar certo e
com a dose ptima de fora e velocidade (Hotz, 1999:10).
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23
McGown, 1991; Grhaigne,1992; Godik & Popov, 1993;
Mombaerts,1996;
Arajo & Mesquita, 1996; Garganta, 1997 e1998; Leal, 1998;
Hotz, 1999;
Castelo, 2000; Leal & Quinta, 2001).
Faria &Tavares (1996:37) salientam a importncia fundamental
da
adopo, no processo de treino, de exerccios competitivos32,
alegando a
sua maior transferibilidade para o jogo e um aumento
significativo da motivao
dos jogadores.
Godik & Popov (1993:96) referem-se aos ECT atribuindo-lhes
um triplo
papel: 1) unem os elementos tcnicos do domnio da bola num
esquema lgico
de preparao tctica; 2) permitem delimitar estruturas tcticas em
funo dos
objectivos a conseguir; 3) servem de recurso bsico para o
treino. Sustentam
ainda os mesmos autores que, para se conseguir um maior efeito
nos
exerccios acima referidos, deve existir uma correlao ptima entre
os factores
da carga (intensidade, durao, nmero de repeties, e regime de
alternncia
dos exerccios com o repouso).
O jogo de futebol, sobretudo o de alto nvel de rendimento,
apela
actualmente para uma maior velocidade de jogo. Parece-nos que
este aumento
da velocidade no se far somente pelo treino da componente
neuromuscular,
mas tambm pela sua solicitao em situaes complexas que apelem
aos
32
A competitividade nos ET aumenta o nvel de complexidade dos
prprios ECT, pois, aos jogadores exigida uma constante adaptao
multifactorial s situaes de competio, sobretudo nos
constrangimentos psicolgicos gerados pela ansiedade de ganhar. Alm
deste constrangimento de origem psicolgica, a oposio realizada
pelos seus colegas em situao de treino assemelha-se s esperadas na
competio, o que representa mais um constrangimento ao nvel da
percepo, deciso e realizao das aces de jogo. Ver, a propsito do
papel dos constrangimentos nos ECT, nota de rodap na pg. 22. A
competio como fermento da complexidade em analogia com o conceito
de competio escala biolgica em que as estirpes adaptadas tem mais
possibilidades de sobrevivncia (Reeves 2000:168) - ou seja, uma
constante procura da adaptabilidade (pg. 26). De salientar que, num
sistema complexo (...) a integrao e a interdependncia dos elementos
originam o aparecimento de propriedades novas, chamadas emergentes
(Reeves, 2000, p.35) facto observvel na alterao da forma de jogar
de uma equipa pela substituio de alguns dos seus jogadores.
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24
processos de percepo, deciso e execuo de cada jogador e
coordenao dos vrios jogadores de uma equipa.
Garganta (1999b:11) prope uma solicitao conjunta e integrada
das
valncias perceptivas, decisionais e neuromusculares no treino da
velocidade
nos JDC. O mesmo autor refere ainda que a velocidade no futebol
(...) est
sempre relacionada com os companheiros e os oponentes e
considera que
(...) a capacidade de previso permite que um jogador, mesmo
sendo mais
lento do que outro do ponto de vista neuro-muscular, possa
chegar primeiro
a um determinado lugar do terreno de jogo porque previu e
antecipou a
resposta (Garganta, 1997:75).
Bangsbo (1997:200) refere que se deve optar principalmente
por
situaes similares s do jogo para o treino da chamada velocidade
funcional
preparando assim, os jogadores para a previso e reaco s
distintas
situaes do jogo.
3.4.1 Modelo de Jogo Adoptado (MJA) vs. Modelo de Treino
Adoptado
(MTA) a necessidade de uma especificidade
(...) se no houvesse algo que ligasse o jogo a um territrio de
possveis previsveis,
deixaria de fazer sentido insistir-se e investir-se no futuro,
na preparao de uma equipa
(Silva, 1999:160).
O princpio da especificidade refere que os programas motores
revelam
particularidades singulares e que a sua adaptao especfica e est
ligada
tarefa ou actividade realizada (McGown, 1991). Por isso, os ET
devem procurar
uma elevada transferncia das aces seleccionadas para o jogo
(McGown,
1991; Garganta, 1998 e 1999a). Pelo contrrio, a no
especificidade do
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25
exerccio de treino pode condicionar a transferncia dos programas
motores
adequados para o jogo, bem como aumentar a dificuldade de
melhorias
posteriores a esse nvel (Castelo, 2000).
McGown (1991:19) refere ainda que, (...) quando uma pessoa
aprende
alguma coisa que como tal passa a fazer parte da sua memria, a
informao
relativa disposio daquele que aprende, e o prprio ambiente
de
aprendizagem, so tambm armazenados na memria junto da
respectiva
informao.
Castelo (1996:458) refere que o exerccio de treino especfico
quando
consubstancia uma estrutura (objectivo, contedo, forma) que no
seu conjunto
provoca adaptaes de base que esto na origem da elevao do
rendimento
dos jogadores e das equipas.
Apesar de concordarmos com a generalidade do que acima foi
referido,
somos da opinio que o ECT desenvolve a adaptabilidade33 e no a
adaptao
(Frade, 1982; Garganta, 1997:74; Silva, 1999:159).
A adaptabilidade consiste na possibilidade de adaptao criada
pelo
treino s situaes complexas do jogo por parte dos jogadores ou
equipas e
no adaptaes a priori34 para a execuo de uma tarefa
pr-determinada.
Teodorescu (1984:23) fala-nos na capacidade de adaptao s situaes
em
permanente modificao durante o jogo e Cerezo (2000:5) em
respostas
adaptadas aos problemas.
33
Ou adaptao cultural para Alcaras & Lacroux (sd:9) ou,
capacidades autnomas para Garganta (1997:75).
34 (...) os jogadores principiantes seleccionam na maior parte
do tempo a priori as
solues que eles vo realizar privando-se das suas possibilidades
de adaptao (Tavares, 1996:28).
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26
Perante os constrangimentos do jogo de futebol35, os jogadores,
em
coerncia com o quadro de referncias estabelecido colectivamente
pelo treino,
exploram o seu espao de possibilidades36 com base nos padres
de
comportamento treinados. Ao explorar o seu espao de
possibilidades, os
jogadores estabelecem inovadores relaes entre as suas estruturas
de
comportamento. A inovao gerada representa um incremento do
repertrio
tctico e tcnico dos jogadores e das equipas.
Assim, os jogadores ou as equipas denunciam o seu rendimento no
jogo
na forma como se adaptam individual e colectivamente s
condies
complexas e, entre o universo mais ou menos vasto de solues
proporcionadas pela criao de cenrios possveis no treino e por
anteriores
experincias, se ajustam e solucionam com inovao e eficcia as
situaes
concretas do jogo motricidade adaptvel (Grhaigne, 1997:51).
As sucessivas adaptaes que acontecem durante os treinos e os
jogos
s situaes concretas, sempre variadas nos seus pormenores,
mas
semelhantes nos seus padres37, fazem aumentar o territrio de
possveis
previsveis (Silva, 1999:160). Podem ser considerados fenmenos
de
35
Os constrangimentos do jogo so: a imprevisibilidade,
aleatoriedade, as regras, o adversrio, as condies do piso, as
condies atmosfricas, etc.
36 Inovao como explorao do espao de possibilidades: (...) As
cincias da
complexidade tm mostrado que para uma entidade (...) sobreviver
e prosperar precisa explorar o seu espao de possibilidades e
encorajar a variedade Mitleton-Kelly (1997). De referir que,
somente quando o sistema no est em equilbrio e no possvel aplicar
uma soluo estandardizada, se solicita a explorao do espao de
possibilidades Mitleton-Kelly (1997). Da a importncia das
condicionantes nos ECT (nmero permitido de toques na bola, espao de
jogo, imposio de determinados comportamentos individuais e/ou
colectivos, durao, etc.). Ver a propsito A construo dos exerccios
as variveis em jogo na pgina 37.
37 De modo anlogo, as teorias do caos determinista revelam-nos
que, apesar de no
ser possvel prever exactamente o futuro, (...) ao longo do
tempo, um sistema evolui (converge) para uma configurao estvel e
previsvel (bacia de atraco) (Reeves, 2000:137). Gleick (1994:161)
fala-nos em atractores estranhos referindo-se, por exemplo, ao
movimento de um pndulo sujeito a atrito. Um sistema no linear, na
procura do equilbrio, manifesta a preferncia por uma regio do espao
(bacia de atraco) e as suas trajectrias tendem para um determinado
padro em volta do atractor estranho (Silva, 199:107).
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27
contingncia - recurso a uma multiplicidade de possibilidades de
resoluo da
situao do jogo - e convergncia - tendncia para
comportamentos
padronizados e previsveis38. Isto , consubstanciam aquilo que
Frade (1982)
designa como padres de comportamento futebolstico, que Tavares
& Faria
(1996, p.43) designam como padres qualitativamente semelhantes e
que
Garganta (1997:125) designa como padres de jogo.
Garganta & Silva (2000:7) referem que (...) apesar de
determinadas
variaes serem imprevisveis, por vezes evidenciam o mesmo padro
quando
as comparamos com variaes para grandes lapsos de tempo
(quantidades de
sequncias).
Estes padres desenvolvem modelos mentais que, por sua vez
permitem lidar com novas e inesperadas situaes baseadas na
analogia e
similitude de experincias anteriormente vivenciadas - (...)
trata-se de saber
detectar as regularidades patentes no jogo e focalizar a
organizao das
tarefas do treino de acordo com a consistncia de comportamentos,
sob o
ponto de vista estrutural e funcional (Mesquita (1996:100).
38
Reeves (2000) d alguns exemplos de fenmenos de convergncia
(expresso da legislao) e contingncia (expresso do jogo), entre os
quais, destacamos o que se refere evoluo dos seres vivos: A
logstica da sobrevivncia acarreta uma convergncia dos fenmenos
biolgicos para o desenvolvimento de certos comportamentos vitais. A
forma exacta que essas evolues tomam contingente das condies fsicas
em que elas se produzem (ibid., 2000:210). Um outro exemplo
ilustrativo destes fenmenos, aquele que nos d uma imagem da chegada
de vrios navios a um porto. Mal termina a acostagem, os marinheiros
sequiosos vagueiam pela cidade procura de um bar. No sabemos com
exactido, qual vai ser o trajecto de cada uma deles (contingncia),
mas com certeza podemos adiantar a seguinte previso: vo ao bar!
(convergncia).
Manoel (2000:40), na rea da aprendizagem motora e aludindo
determinncia macroscpica e indeterminncia microscpica de Paul Weiss
(1969), refere que (...) a interaco dinmica de elementos leva
formao de um padro caracterstico que tende a se manter
(determinncia macroscpica). Os elementos so livres para variarem
dentro de certos limites (indeterminncia microscpica).
De acordo com estas duas teorias anlogas, o treino do pressing,
por exemplo, revela um padro que consiste na orientao agressiva dos
jogadores para a bola e eliminao das linhas de passe ao adversrio
com bola (convergncia ou determinncia macroscpica) e, ao mesmo
tempo, diversidade de comportamentos que, cada jogador por si ,
toma em relao posio que ocupa no terreno, s suas capacidades,
etc.(contingncia ou indeterminncia microscpica).
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28
Assim, a eficcia dos ET ser tanto mais elevada quanto mais
previr
esta possibilidade de colocar o jogador a decidir e a agir
perante contextos que
no estejam totalmente predeterminados e que incluam
variabilidade - A
dinmica do jogo no permite aces demasiado preestabelecidas e que
o
jogador possa reproduzir sempre com exactido (Konzag,
1986:3).
Queremos com isto dizer que as situaes de treino devem
revelar
padres de tal forma perceptveis que possibilitem uma identificao
dos
comportamentos desejveis por todos os jogadores da equipa
(convergncia)
e, simultaneamente, no impea opes estratgicas criativas por
parte dos
jogadores (contingncia) - (...) isoladamente imprevisvel e
globalmente
estvel (Gleick, 1994:78).
Parece-nos que, tal como defende Garganta (2000), o futebol
apresenta
uma dinmica catica, onde a sucesso de jogadas determinadas
pelas
opes estratgicas dos jogadores mediante as situaes que se
lhes
deparam, aparentemente desordenadas, parecem evidenciar, no seu
conjunto,
uma certa ordem - (...) nesta situao irrompem padres que
denunciam o
comportamento catico, pequena escala, mas que denunciam,
grande
escala, uma certa regularidade (Garganta, 2000:7) - (...) um
sistema
complexo pode dar origem turbulncia e coerncia ao mesmo
tempo
(Gleick, 1994:86), enfim, (...) uma desordem ordenada
(ibid.).
Alcaras & Lacroux (sd:9) sustentam, a propsito, apesar das
reas de
interveno no serem coincidentes com as nossas, que uma organizao
que
escolha aumentar a variedade dos seus comportamentos possveis,
tendo em
vista uma posterior adaptao s condies do contexto para a qual
foi criada,
tem provavelmente mais possibilidades de permanecer vivel do que
outra que
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29
mantenha esses mesmos comportamentos invariveis.
Tambm Silva (1999:159) sugere que (...) a mxima
estereotipia,
corresponde mnima variabilidade, corresponde, tambm, mnima
adaptabilidade. O mesmo autor (ibid.:102) considera ainda que a
variabilidade
um optimizador da performance, pois esta, por se constituir como
um
processo de descoberta, s ter a ganhar se surgir de um quadro de
incerteza,
ou seja, de variabilidade contextual.
Grhaigne (1997) sustenta, referindo-se lei da variedade
necessria39
de Ashby (1956), que o enredo do jogo que assegura a regulao
das
interaces entre os jogadores e o seu ajustamento aos
constrangimentos do
confronto deve dispor de uma variedade suficiente de solues,
isto , a equipa
ter a capacidade de dentro de determinados limites precisos,
mudar ou fazer
evoluir as modalidades de interaco dos seus jogadores para a
adopo de
este ou aquele tipo de tctica, em funo da importncia do jogo, da
evoluo
do resultado, do decorrer do tempo de jogo, etc.
Tambm Konzag (1995:24) pe em evidncia a importncia da
variabilidade na realizao das aces de jogo nos ET. Esta
variabilidade
permite uma realizao adequada situao do jogo.
Araujo (1997:15) refere que, num desempenho motor complexo,
o
mecanismo de deciso no pode ficar restrito a um modelo de deciso
fixo. A
resposta ter que ser adaptvel s exigncias da situao, no
encadeamento
de anteriores decises e de acordo com as alternativas motoras
dominadas
pelo jogador.
39
A Lei da Variedade Necessria (Requisite Variety) de Ashby (1956)
refere que para um sistema complexo sobreviver ter que possuir um
mnimo de variedade. Por exemplo, a diversidade gentica dos seres
vivos tem sido apontada como uma arma fundamental para a
sobrevivncia e adaptao das espcies s vrias mudanas no meio
ambiente.
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30
Parece, portanto, importante que no treino sejam criadas situaes
de
jogo que privilegiem regularidades, que tenham como objectivo
a
exercitao/consolidao de determinados comportamentos individuais
e
colectivos julgados fundamentais (padres de comportamento
futebolstico) e
possibilidades de irregularidades, que consubstanciam a
variabilidade
requerida para respostas adequadas s situaes do jogo.
Salienta-se o papel construtivo da variabilidade no que toca
construo
adaptativa de projectos motores - (...) sem variabilidade, no h
motricidade
no sentido interactivo, no sentido ecolgico, adaptativo (Silva,
1999) - (...)
vantajoso que os processos de treino se habituem a conviver com
a
variabilidade que resulta desta circunstncia, e a fazer dela uma
fora
suplementar, em vez de a tentar esconjurar (ibid.).
A exigncia da variabilidade nos ECT resulta da complexidade
da
prpria cooperao entre os elementos da equipa e dos
constrangimentos
impostos pelos adversrios (Konzag, 1995 p. 24). O mesmo autor
(ibd.)
referencia ainda a variao do momento do incio e desenvolvimento
da aco,
da velocidade, da fora utilizada, do desenvolvimento espacial,
etc. como
factores que podem produzir variabilidade.
Castelo (1999:21) refere-se variabilidade da situao do jogo
pondo
em evidncia as elevadas exigncias dos mecanismos
perceptivo-decisionais,
que solicitam aos jogadores uma constante concentrao no jogo.
Uma leitura
correcta deve conduzi-los opo por respostas motoras
simultaneamente
adaptadas a essa mesma variabilidade e coerentes com o quadro
de
referncias da prpria equipa. O mesmo autor estabelece o conceito
de
equilbrio dinmico como necessidade para o estabelecimento de
uma
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31
organizao interna da equipa, (...) o qual dever manter o nvel de
eficcia da
equipa dentro de certos limites independentemente da
variabilidade do
contexto, da situao de jogo ou da competio desportiva (equipa
adversria)
(Castelo, 1996:8).
Queiroz (1986:42) evidencia as condies de variabilidade
permanente,
caractersticas da estrutura e contedo do jogo, na estrutura e
organizao dos
ET no futebol. O mesmo autor refere ainda que perante aquela
variabilidade o
jogador deve ser levado resoluo tctico-estratgica da situao
complexa,
de acordo com o referencial comum dos jogadores da mesma equipa
(ibid.).
Este referencial comum denomina-se por Modelo de Jogo
Adoptado
(MJA) e reflecte as caractersticas fundamentais da concepo do
jogo por
parte do treinador e pretende, por um lado, regular a actividade
dos jogadores
e, por outro, constituir-se como um referencial na interveno do
treinador
(Garganta, 1997:120; Cervera, 1998:19) - (...) a importncia do
objectivo final
(base conceptual modelo de jogo) estar constantemente a ser
visualizado,
isto , mantendo-se o futuro como elemento causal do
comportamento (Frade,
1982).
Grhaigne (1992:51) salienta a importncia que este quadro de
referncias, constitudo por princpios gerais estveis e
facilmente
comunicveis, desempenha na performance colectiva.
Para Silva (1996) ... a concepo do jogo entende-se como um
conceito
amplo, mas estruturante de todo o desenvolvimento que se
pretende, devendo
por um lado respeitar as tendncias do seu mais elevado nvel, e
reflectir, por
outro lado, as contribuies originais introduzidas pelo
treinador, atendendo s
restries impostas pelo nvel de experincia dos seus praticantes.
A mesma
-
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32
autora destaca a importncia da simultaneidade que o MJA deve
assumir no
fomento da criatividade individual dos jogadores e da coerncia
dessa mesma
criatividade num quadro de referncias de propsitos colectivos
aco
colectiva (ibid.).
Teodoresco (1984) considera a equipa um sistema complexo e
dinmico, que revela determinadas particularidades ou
caractersticas da
aplicao da tctica. Estas caractersticas resultam da concepo de
jogo por
parte do treinador e da sua adaptao especificidade dos jogadores
e da
equipa - As aces dos jogadores so integradas numa determinada
estrutura,
segundo um determinado modelo, de acordo com certos princpios e
regras
(ibid., 1984:23).
Leal (1998:25) concebe o modelo de jogo como sendo (...) a
concepo
de jogo idealizada pelo treinador, no que diz respeito a um
conjunto de factores
necessrios para a organizao dos processos ofensivos e defensivos
da
equipa, tais como os princpios de jogo, os mtodos de jogo
ofensivos e
defensivos, os sistemas de jogo e todo o conjunto de
comportamentos, valores
que permitam caracterizar a organizao dos processos
ofensivos-defensivos
quer em termos individuais quer em termos colectivos da referida
equipa.
Leal & Quinta (2001:27), acerca da filosofia da formao dos
jogadores,
pem em evidncia a importncia da adopo de um modelo de jogo que
deve
orientar a concepo de um modelo de treino adequado. Por sua vez,
este
modelo de treino deve constituir-se por um complexo de exerccios
que
consubstanciem os comportamentos previstos pelo MJA.
O MJA ser a referncia para a concepo do MTA e este
influenciar
retroactivamente aquele. Neste caso, a especificidade dos ECT
poder ser
-
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33
avaliada na medida em que influencia positivamente o MJA,
desenvolvendo a
consistncia e a coerncia dos padres de comportamento
futebolstico
desejados.
Teodorescu (1984:52) alerta para o facto de que a adopo de
um
modelo de jogo deve ter em conta o modelo enriquecido40, a sua
ignorncia
poder determinar a estagnao tcnico-tctica, diminuir a eficincia
e reduzir
a possibilidade de evoluo.
Pinto & Garganta (1996:86) entendem o MJA como um ponto
de
referncia e no como um modelo a atingir em absoluto. Referem
ainda que o
MJA deve ter em conta as caractersticas do modelo de jogo mais
evoludo, as
caractersticas morfo-funcionais e scio-culturais dos jogadores,
bem como as
condies climatricas predominantes.
Uma das tarefas fundamentais do treinador na concepo do MJA
o
ajuste e potencializao das diversas capacidades individuais de
cada jogador
para um objectivo comum (Konzag et al., 1995:12; Vingada,
sd).
Mombaerts (1996:12) sustenta que o treinador, a partir de um
compromisso pessoal por um MJA, deve identificar e propor
solues
pedaggicas para os problemas de jogo da equipa.
Oliveira (1991) destaca que o MJA e, por inerncia, os seus
princpios,
ser o guia condutor do processo de treino directamente
correlacionado com as
novas metodologias do treino e a especificidade da
modalidade.
Para que as caractersticas fundamentais do MJA sejam exercitadas
e
consolidadas num contexto complexo, parece-nos fundamental que o
desenho
e a adopo de ECT faam salientar, pela exteriorizao dos
comportamentos
40
O modelo de jogo enriquecido tem em linha de conta as tendncias
evolutivas do jogo. considerado prospectivo (Teodorescu,
1984:52).
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34
desejveis em jogo, essas mesmas caractersticas aumentando a CJ,
isto , a
adaptabilidade ao jogo. Este aumento da CJ seria assim, uma
especificidade
com identidade prpria41 e respeitante ao colectivo construda a
partir de um
MTA que, por sua vez, se basearia no MJA.
Parece-nos tambm que, a estandardizao42 de determinados
comportamentos individuais e colectivos (esquemas e combinaes
tcticas)
que, quando treinados, se constituiro em programas motores43 no
devem ser
de todo rejeitados. Os programas motores estandardizados so teis
para
fases do jogo em que as configuraes do jogo so mais previsveis44
e fazem
parte do MJA.
O treino das combinaes e esquemas tcticos parecem ser mais
simples que aqueles que tratamos at aqui. A sua menor
complexidade e
variedade podem e devem ser aumentadas no treino45. O aumento
da
complexidade, alm de causar um maior efeito surpresa no
adversrio, permite
uma maior adaptabilidade e consequente possibilidade de aplicao
em
41
Ver, a propsito das propriedades emergentes, nota de rodap da
pg. 12. 42
Teodorescu (1987:39) define exerccios estandardizados como sendo
(...) o tipo de exerccios, dos quais, se forem aplicados em condies
similares, so aproximadamente conhecidos os resultados (mensurveis)
e a eficcia.
43 O programa fundado sobre uma referncia aos modelos mecnicos,
metablicos e
neurolgicos da performance que tendem a reduzir o sujeito a
simples piloto de uma mquina ciberntica (Courtay et al., 1990:32).
Um programa uma sequncia de aces predeterminadas que deve funcionar
nas circunstncias que permitem o seu cumprimento. Se as
circunstncias exteriores no so favorveis, o programa pra ou
fracassa (Morin, 1990, p.130).
44 Por exemplo: esquemas tcticos para situaes de reposio da bola
em jogo e
determinadas combinaes tcticas. O pensamento complexo no recusa
de modo algum a clareza, a ordem, o
determinismo. Acha-os insuficientes, sabe que no se pode
programar a descoberta, o conhecimento, nem a aco (Morin,
1990:121
45 Tani (2001), acerca do conceito de prtica no processo de
aprendizagem motora,
refere que a (...) prtica implica repetio sem repetio, pois se
essa condio for negada, ela se tornar uma simples repetio mecnica
de movimentos.
Quanto variedade necessria: nos esquemas tcticos, sugerimos que
existam pelo menos dois para cada situao em que a bola est parada;
nas combinaes tcticas o princpio mantm-se, ou seja, pelo menos duas
para cada situao estandardizada. No que diz respeito complexidade,
ou melhor, ao seu aumento em situao de treino para uma melhor
adequao ao jogo, os constrangimentos de um tempo preciso para a sua
realizao, bem como, o acrescento progressivo de adversrios garantem
uma simulao mais real.
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35
situao de jogo. As caractersticas mais deterministas46 das
situaes
estandardizadas no devero impedir o jogador ou a equipa de
agir
estrategicamente47.
Baseando-se no conceito de treinabilidade do desportista
proposto por
Teodorescu (1984), Pinto & Garganta (1996:89) salientam a
especificidade dos
efeitos em relao aos meios de treino utilizados e a sua adequao
ou no
aos objectivos pretendidos. Esta especificidade, segundo os
mesmos autores
(ibid.), dever revelar-se a nvel colectivo pela congruncia dos
objectivos do
processo de trabalho proposto com o MJA e destacam a influncia
recproca
que os aspectos estruturais (tctico-tcnicos) e os
energtico-funcionais
(fsicos) exercem uns sobre os outros, formando uma s
unidade.
Do acima referido, o conceito de especificidade relativamente
aos ECT
centra-se, quanto a ns, na procura de adequao dos efeitos de
treino no s
modalidade em causa, mas tambm ao MJA (Godik & Popov,
1993:97), ou
seja, (...) a importncia do objectivo final (base conceptual
modelo de jogo)
estar constantemente a ser visualizado, isto , mantendo-se o
futuro como
elemento causal do comportamento (Frade, 1982).
A transferibilidade dos efeitos dos ECT para o jogo, de acordo
com o
46
(...) conhecendo-se com preciso o estado inicial de qualquer
sistema, ser possvel enunciar o estado desse sistema num qualquer
momento, a partir das leis que descrevem a sua evoluo (Silva,
1999:95).
47 Em situao normal a pilotagem automtica possvel, mas a
estratgia impe-se
desde que surge o inesperado ou o incerto (Morin, 1990:121). Por
exemplo, num jogo de futebol, a melhor estratgia ser aquela que
tenha em conta os acasos que vo perturbar a aco e utilizar os erros
da equipa adversria; a construo do jogo faz-se na desconstruo do
jogo adversrio (Courtay et al., 1990:32). Toda a estratgia em JDC
uma conscincia aguda do risco ligada incerteza. (...) a estratgia
permite (...) conjugar as diferenas e preservar o potencial de aco
criativa de cada um (ibid.)
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36
MJA, permite tratar os problemas colocados pelo jogo atravs de
heursticas48.
Assim, os princpios definidos pelo MJA eliminam hipteses de
comportamentos menos viveis ou no privilegiados, portanto
menos
plausveis.
Arajo (1997:15) refere que quando existe demasiada informao a
ser
tratada, os jogadores tentam antecipar alguns acontecimentos.
Assim, o
jogador diminui o tempo de deciso atribuindo uma probabilidade
ocorrncia