-
181meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun.
2011
6
Da contribuio da tica discursiva de Karl Otto Apel resoluo dos
conflitos fundirios no Estado de Mato Grosso do
Sul na atualidade1
Rogrio Santos dos Prazeres* Jos Moacir de Aquino**
Heitor Romero Marques***
* Acadmico do Curso de Licencitatura em Letras da Universidade
Catlica Dom Bosco (UCDB) na rea de Cincias Humanas ligada
Pr-Reitoria de Ensino e Desenvolvimento. Aluno do Programa de
Iniciao Cientfica (PIBIC/ UCDB). E-mail:
[email protected].
** Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG). Bacharel em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura
em Filosofia da UCDB (2001-2011) na rea de Cincias Humanas ligada
Pr-Reitoria de Ensino e Desenvolvimento. Membro da Comisso Prpria
de Avaliao (CPA) da UCDB. Orientador da pesquisa. E-mail:
[email protected]
*** Bacharel em Cincias e Pedagogia com especializao em
Filosofia e Histria da Educao pela Faculdade Unidas Catlicas de
Mato Grosso (FUCMT). Mestre em Educao (Formao de professores) pela
UCDB). Doutor em Desarrollo Local y Planteamiento Territorial, pela
Universidad Complutense de Madrid. Membro do Comit de tica em
Pesquisa, da UCDB. Membro do Ncleo de Apoio Pedaggico (NAP) da
UCDB. Professor no mestrado no Programa de Ps-Graduao em
Desenvolvimento Local em Contexto de Territorialidade, ligado
Pr-Reitoria de Pesquisa e Ps-Graduao. Professor na graduao dos
cursos de Licenciaturas e Direito. Coordenador do Projeto de
Pesquisa interdisciplinar No contexto dos direitos humanos em Campo
Grande e a intersubjetividade em termos da tica e da alteridade: um
estudo jurdico-filosfico e educacional (DHIEA) do Programa de
Iniciao Cientfica da Universidade Catlica Dom Bosco-PIBIC/
UCDB)-2009-2011. E-mail: [email protected].
1 Artigo resultante de estudos realizados no projeto de pesquisa
na Universidade Catlica Dom Bosco (UCDB) denominado No contexto dos
direitos humanos em Campo Grande e a intersubjetividade em termos
da tica e da alteridade: um estudo jurdico-filosfico e educacional.
Parte do contedo desta pesquisa foi apresentada em uma comunicao
oral no 3 Coloquio Interamericano Educao y Derechos Humanos:
tayectorias/ fortalezas/ propuestas, que ocorreu nos dias 9 e 10 de
maro, na Universidad Nacional de Quilmes, em Buenos Aires,
Argentina.
-
182
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
resumo: Neste trabalho, explicita-se a tica do discurso de Karl
Otto Apel como contribuio terica e prtica, pautada pela
universalizao dos interesses relativos resoluo dos conflitos
fundirios no Mato Grosso dos Sul. Como tal, trata-se de demonstrar
que a fundamentao racional j pressuposta em todo discurso
argumentativo, por via da qual todos os afetados devem ser
considerados seriamente, substancial para instaurar a justia e a
ordem social. A arquitetura dessa tica em duas partes, A e B,
permite constatar que, por um lado, a soluo dos conflitos est
minada pelas condies histricas marcadas por interesses estratgicos
de manuteno de poder e, por outro, que se deve postular sob a
mediao do dilogo, contrafacticamente, o acordo mais razovel possvel
entre os envolvidos nos conflitos.
Palavras-chave: Linguagem. tica do discurso.
Intersub-jetividade. Conflito fundirio.
1 INTRODUO
Contemporaneamente, a tarefa de fundamentao da prxis tica se
defronta com a tendncia de desconstruo e relativizao dos modelos e
formas de vida. A crise de fundamentos parece rumar em favor do
apregoamento do niilismo tico. Em face disso, o bem tico, em meio
ao jogo desmedido travado pelas mltiplas formas de vida e expresses
axiolgicas, afigura-se carente de critrios e prticas consistentes
de justia. Da que a tematizao da fundamentao da tica, possivelmente
para subsidiar sua aplicao racional ao mundo da vida, impe-se de
maneira imperativa e consequente. evidente a demanda oriunda dos
indivduos e das sociedades por contribuies procedentes da reflexo
filosfico-tica e das instncias normativas que resultem em maior
comprometimento com a fundamentao dos valores, de maneira a nortear
o pensar e o agir humanos com sentido e validade.
-
183
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
Neste texto, trata-se, de forma preambular, da problemtica
concernente exigncia de uma concepo de tica que possibilite mediar
o conflito fundirio2, na atualidade, entre indgenas e setores de
explorao econmica do agronegcio no Mato Grosso do Sul. Em
especfico, o ncleo desse conflito concerne inoperncia estatal para
demarcar as terras indgenas do povo Kaiow e Guarani3, o que
configura evidente violao aos direitos humanos. No momento atual, a
sociedade brasileira aguarda a resposta jurdica para a resoluo
desse conflito. Os arts. 231 e 232 da Constituio Federal Brasileira
de 1988 preconizam o reconhecimento aos povos indgenas de sua
organizao social, costumes, lnguas, crenas e tradies, bem como a
competncia da Unio Federal para demarcar suas terras, com o intuito
de proteger e fazer respeitar todos os seus bens4. Mas, por conta
dos interesses polticos e econmicos, vige o impasse por mais de
duas dcadas. Apesar do recente julgamento pelo Supremo Tribunal
Federal no caso da demarcao da terra indgena Raposa Serra do Sol5,
at
2 Cf. SILVA FILHO, Gercino Jos. Preveno e mediao de conflitos
luz da questo agrria e dos direitos humanos no Brasil. Revista de
Direitos Humanos, p. 39.
3 Embora Kaiow e Guarani sejam um s povo, constata-se haver
vrias maneiras de denomin-lo, de modo que eles tambm se
identifiquem. Como exemplo dessa diversidade, : Kaiow Guarani;
Kaiow Guarani; Kaiow/Guarani; e, Guarani Kaiow. Entretanto a
preferncia pela denominao Kaiow e Guarani se d neste trabalho por
motivos bibliogrficos, em virtude de assim exatamente constar na
obra de ALMEIDA, Rosemeire A. de. A questo agrria em Mato Grosso do
Sul: uma viso multidisciplinar. Campo Grande: UFMS, 2008, que foi
usado como referencia para as pesquisas.
4 Cf. BRASIL. Constituio (1988). Constituio Federal de 1988,
art. 231-232. Disponvel em: . Acesso em: 2 nov. 2010.
5 YAMADA, E. M.; VILLARES, L. F. O julgamento da terra indgena
Raposa Serra do Sol: todo dia era dia de ndio. Revista Direito GV,
p. 143-157. Disponvel em: . Acesso em: 6 abr. 2011.
-
184
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
ento no existem mediaes suficientes para a soluo do conflito
fundirio no Brasil, em especfico no Mato Grosso do Sul.
Posto isso, segue-se uma questo fundamental: necessrio
considerar a tica, como cincia dos princpios e valores, para
contribuir nessa discusso e, tanto quanto possvel, delinear
postulados basilares em vista de alguma soluo consensual razovel.
Contudo, qual concepo tica? possvel uma tica que possibilite o
consenso entre as partes, que considere as particularidades
culturais, econmicas e geogrficas desse conflito fundirio? A
hiptese, neste trabalho, de que a tica de Karl Otto Apel pode
contribuir nessa empreitada. Nesse horizonte, explicita-se o
conflito fundirio em Mato Grosso do Sul considerando a lgica
produtiva vigente no Estado e a etnia Kaiow e Guarani; em seguida,
a estrutura da tica de Karl Otto Apel; e, por fim, apresenta-se a
possvel aplicabilidade dessa tica em vista da resoluo do conflito
em questo.
2 CoNFLITo FUNDIrIo EM MATo GroSSo Do SUL E VIOLAO DOS DIREITOS
HUMANOS
O Estado de Mato Grosso do Sul foi criado em 1977, com a diviso
do Estado do Mato Grosso6, e alcanou uma dimenso de produo rural
expressiva no cenrio agropecurio nacional. Segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), sua rea de 357.145,836
km, com uma populao estimada, em 2010, de 2.449.341
habitantes7.
6 PORTAL MS: o guia on line de Campo Grande e Regio. Histria de
Mato Grosso do Sul: a histria do surgimento do nosso estado. Campo
Grande-MS. Disponvel em: . Acesso em: 21 jun. 2010.
7 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATSTICA (IBGE).
Estados@ Mato Grosso do Sul. Disponvel em: . Acesso em: 7 abr.
2011.
-
185
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
O Estado de Mato Grosso do Sul se destaca, no ramo
agro-pecuarista, como regio produtora de soja e milho responsvel
por quase 20% da safra nacional de soja, que de aproximadamente 60
milhes de toneladas, e 8% das quase 60 mil toneladas de milho
produzidas no Brasil8. A respeito da estrutura fundiria, o senso
agropecurio de Mato Grosso do Sul, em 1995, revelou que o Estado se
caracterizava pela alta concentrao de terra9, voltada para o
desenvolvimento na produo agrcola. O Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatstica (IBGE), em 2007, constatou um total de
2.972.221 toneladas de milho, em gros, produzidos10. Em 2008, o
efetivo bovino era de 22.365.219 cabeas. Tambm em 2008, a colheita
de soja, apresentou o rendimento mdio de 3.050 kg/ha, que suplantou
em 4,2% o antigo recorde de 2.926 kg/ha que vinha se mantendo desde
200111. Alm do milho e da soja, a cana-de-acar
8 RODRIGUES, Nadir. Pesquisadores estudam o aumento da produo de
soja e cana de acar no pas. Disponvel em: . Acesso em: 20 jun.
2010.
9 Segundo Almeida, na dcada de 1970 que ocorreu o impulso
colonizador no Estado de Mato Grosso do Sul, especificamente quando
chegaram fazendeiros e granjeiros provenientes das regies Sul e
Sudeste do Brasil, principalmente dos Estados do Rio Grande do Sul
e Paran, a fim de trabalhar com maquinrios em roas de cereais. O
Estado de Mato Grosso do Sul tambm se mostrou com a vantagem da
vocao agrria no sucesso da criao bovina, que se faz acompanhar da
concentrao fundiria, da modernizao da tcnica e da intensificao de
mtodos capitalistas no campo, o que caracteriza um grande xodo
rural no perodo ocorrido entre 1970 a 2005. (ALMEIDA, Rosemeire A.
de. A questo agrria em Mato Grosso do Sul: uma viso
multidisciplinar, p. 117-119)
10 EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECURIA (Embrapa). A soja
no Brasil. Disponvel em: . Acesso em: 7 abr. 2010.
11 EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECURIA (Embrapa). Sala de
imprensa: levantamento sistemtico da produo agrcola. Disponvel em:
. Acesso em: 21 jun. 2010.
-
186
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
tem sido avaliada como satisfatria por parte da indstria
canavieira no Estado, a qual tem investido e instalado usinas que
aumentam a produo no setor da economia nacional. Subsistem no
Estado, ainda, outros investimentos em cultivos fazendrios, como
cevada, feijo, trigo, aveia, mandioca, negcios ou ramos de carnes
para prover aougues, alm de outros rebanhos, predominantemente
caprinos e ovinos, que esto tambm em franca extenso12. Em suma, o
Estado do Mato Grosso do Sul contribui significativamente nos
resultados do agronegcio nacional, que aceleram a marcha do
desenvolvimento econmico do Brasil e fomentam as expectativas e
investimentos dos produtores e empresrios do abastecimento
mercantil interno e internacional.
Essa ascenso agropecuria e econmica, realizada na extenso das
atividades dos empresrios rurais, choca-se historicamente com as
tradies indgenas no tocante posse da terra no Mato Grosso do Sul,
provocando, assim, conflitos fundirios. Esses conflitos so
caracterizados pela intensa discusso e violncia13 em vista
12 Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
(IBGE), a revoluo socioeconmica e tecnolgica protagonizada pela
soja no Brasil Moderno pode ser comparada ao fenmeno ocorrido com a
cana de acar, no Brasil Colnia e com o caf, no Brasil
Imprio/Repblica, que, em pocas diferentes, comandou o comrcio
exterior do Pas. (EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECURIA. A
soja no Brasil. Disponvel em: . Acesso em: 7 abr. 2010)
13 Em todo o territrio brasileiro, a quantidade de denncias
alarmante, embora sobressaiam o silncio e o medo por parte dos
ofendidos e a no configurao de denncias aos rgos competentes. A
carncia de provas e a persistncia nas investigaes, quando estas so
devidamente efetivadas, tornam-se invalidadas pela
contra-argumentao da outra parte. Em muitos dos casos, diante dos
esforos para tratar devidamente a violncia e a opresso, os rgos de
segurana so obrigados a arquivar o processo por inviabilidade de
procedimento policial. Historicamente, segundo o Relatrio de 2009,
o nmero de ameaas de morte cresceu. Foram registrados 8 casos tanto
em 2006 quanto em 2007, 12 casos em 2008 e 13 casos em 2009. As
ameaas ocorreram no Amazonas, Maranho, Mato Grosso, Mato Grosso do
Sul, Par, Paraba, Roraima e Santa Catarina.
-
187
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
de garantias de posse da terra, isto , em torno do usufruto
pleno da propriedade e seus benefcios. At ento, as discusses e
violncias tm sido tratadas pelo prisma da juridicidade, focando o
vis da legalidade da posse da terra, o que consubstancia a grande
quantidade de aes judiciais e reivindicaes no Estado, tanto por
parte dos empresrios rurais quanto pelas etnias indgenas, tal como
a do povo Kaiow e Guarani.
O caso do povo Kaiow e Guarani emblemtico para se entender a
fenomenologia desse conflito fundirio. Esse povo foi descoberto
pelo mundo colonial entre 1750 e 1760, e considerado descendente do
povo Itatim, cujo territrio se estendia desde o rio Apa at o rio
Miranda, a leste, at a serra de Amamba, a oeste, at o rio Paraguai.
Em 1767, o governo portugus criou o Forte Iguatemi, denominado na
poca por Povoao e Praa de Armas Nossa Senhora dos Prazeres e So
Francisco de Paula do Iguatemi, que em 1771 foi elevado categoria
de vila e depois transformado no mais antigo povoado do Mato
Grosso. Esse Forte situava-se em territrio onde est atualmente a
aldeia Kaiow Yvykuarusu/Paraguassu, s margens do rio Iguatemi, no
municpio de Paranhos. Em 1822, constituiu-se a provncia de Mato
Grosso. Foi na dcada de 1830 que se iniciou, de fato, o povoamento
por no ndios das
Destes, 12 tinham uma ligao direta com a luta pela terra.
Especificamente no Mato Grosso do Sul, o caso de Rolindo Vera, do
Povo Kaiow Guarani, na terra indgena Piraju, no municpio de
Paranhos, figura o status dessa violncia percebida contra esses
indgenas: Quando a comunidade Ypoi retomou o seu Tekoha, ela foi
atacada violentamente por um grupo de 60 homens armados. Rolindo
Vera estava na retomada, junto com seu primo Genivaldo Vera, ambos
professores. Foram arrastados por alguns agressores para dentro da
mata e no voltaram mais comunidade. [CONSELHO INDGENA MISSIONRIO
(CIMI). Violncia contra os povos indgenas no Brasil: relatrio 2009.
Disponvel em: . Acesso em: 7 abr. 2011]. O corpo de Genivaldo foi
encontrado, mas o de Rolindo, ainda no. O caso permanece
indefinido.
-
188
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
terras, que constituem, hoje, o Estado de Mato Grosso do Sul, e
isso se deu pelos campos de Miranda, serra de Maracaju, entrando
pelo rio Paranaba, rios Sucuriji e Tequarussu14. Atualmente, o povo
Kaiow e Guarani se concentra nos seguintes municpios: Dourados,
Caarap, Amamba, Paranhos, Tacuru, Laguna Caarap, Japor, Bela Vista,
Douradina, Juti, Aral Moreira, Antnio Joo e Eldorado.
O povo Kaiow e Guarani tem uma relao existencial e dependncia
cultural de origem religiosa com a terra, e tradicio-nalmente
denominam os lugares que ocupam de tekoha:
Designando o lugar fsico (terra, mato, campo, guas, animais,
plantas, remdios, etc) onde se realiza o teko, isto , o modo de
ser, o estado de vida guarani. O tekoha engloba a efetivao de
rela-es sociais de grupos macro familiares que vivem e se
relacionam em um espao fsico determinado. Idealmente, esse espao
inclui, necessariamente, o kaaguy (mato), que elemento apreciado e
de grande importncia na vida desses indgenas na medida em que fonte
de coleta de alimentos, matria-prima para construo de casas, produo
de utenslios, lenha para fogo, remdios etc. O kaaguy tambm
importante elemento na construo simblica de sua cosmologia, sendo
palco de narraes mitolgicas e morada de inmeros espritos.
Indispensveis no espao guarani so as reas para plantio da roa
familiar ou coletiva e a construo de suas habitaes e lugares para
atividades religiosas15.
14 Somente cerca de 250-260 anos passados depois do registro de
Pero Vaz de Caminha foi que, segundo Almeida, fez-se contato com os
povos Kaiow e Guarani, portanto aproximadamente o mesmo perodo
tempo, tambm aproximado, de contato com esse povo vivido at o
momento. As provas documentais e a historiografia do Brasil denotam
os resultados desse encontro. Em 21 de abril do corrente ano
completam 5011 anos desde a chegada dos portugueses ao Brasil. (Cf.
ALMEIDA, Rosemeire A. de. A questo agrria em Mato Grosso do Sul:
uma viso multidisciplinar, p. 45-49)
15 NUNES, Valder Antonio Gomes de Albuquerque. Tecoha: espao
vital da cultura indgena. Disponvel em: . Acesso em: 28 jun.
2010.
-
189
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
Nota-se que os lugares que ocupam so referenciais da organizao
social e poltica: O territrio indgena o suporte material para as
relaes sociais, a cultura, as tradies e as crenas de cada
comunidade indgena16. Considerando isso, o povo Kaiow e Guarani
postula a definio jurdica na demarcao de suas terras, com a qual
garantiriam as condies de relaes interativas necessrias entre
eles17 e a terra. A tenso entre o povo Kaiow e Guarani com os
produtores rurais em torno da demarcao das terras aponta, tambm,
para o problema da proteo e da manuteno do meio ambiente. Na falta
de interlocuo entre os interessados, que impossibilita, em muitos
casos, a definio das questes, com prejuzo do meio ambiente18,
urbano e rural, de um lado, os produtores rurais defendem a
concentrao dos recursos da produo fundiria e a predominncia da
grande propriedade agropecuria, o que gera desigualdades sociais e
interfere na relao do homem com o meio ambiente, com a fauna e a
flora, bem como com os seres humanos.
Segundo dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agrope-curia
(Embrapa), o Pantanal tem enfrentado o dilema entre a proteo
ambiental e a necessidade de aumentar a eficincia de produo de
alimentos num pas com problemas de fome e subnutrio19. De outro, o
povo Kaiow e Guarani constata que
16 VILARES, Luis Fernando. Direitos e povos indgenas, p. 97.17 A
populao indgena no Mato Grosso do Sul totaliza 32.519 indivduos.
Nessa
composio, segundo a Fundao Nacional do ndio (Funai), os grupos
indgenas no Mato Grosso do Sul somam-se nove etnias ao todo:
Atikum, Guarany (Kaiw e Nhandwa), Guat, Kadiwu, Kamba, Kinikinawa,
Ofai, Terena e Xinquitinano. [FUNDAO NACIONAL DO NDIO (FUNAI).
Grupos indgenas: Mato Grosso do Sul. Disponvel em: . Acesso em: 27
jun. 2009]
18 VILARES, Luis Fernando. Direitos e povos indgenas, p. 194.19
NUNES, Valder Antonio Gomes de Albuquerque. Tecoha: espao vital da
cultura
indgena. Disponvel em: . Acesso em: 28 jun. 2010.
-
190
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
sua produo est paulatinamente se reduzindo e, ademais, sua
tecnologia tradicional no funciona mais, obsoleta20. Desse modo,
torna-se cada vez mais patente a consequente prevalncia da carncia
dialgica entre essas formas culturais, onde se verifica os limites
evidentes de espao entre reservas indgenas e terreno agrcola21.
Decerto, a exigncia mesma da preservao e sustentabilidade do
ecossistema necessrio, tanto para as fazendas quanto para o modo de
vida indgena, exige ultrapassar os limites presentes nas indefinies
de mbito legal22.
Enfim, no processo do avano do potente agronegcio no Mato Grosso
do Sul, a continuidade da organizao social, costumes, lnguas,
crenas, tradies e direitos originrios sobre as terras dos povos
indgenas est em cheque, alm das implicaes atinentes conservao dos
recursos naturais. Na base desse conflito est a indefinio
territorial. Hoje, vinte e dois anos aps a promulgao da Constituio
Federal de 1988, dezessete aps
20 A compreenso das consequncias da insuficincia de recurso dos
Kaiow e Guarani diante da crise histrica de sua prpria decadncia
figura em documentos da Fundao Nacional da Sade (FUNASA) em 2005,
que remete aos problemas persistentes de desnutrio que foram
noticiados no mesmo ano, cuja populao, na poca, era de 37.317
pessoas, desse total, concentrados estavam 19.638 em terras
demarcadas pelo Servio de Proteo ao ndio (SPI-Dourados) em Amamba e
Caarap, numa rea de 9.498 hectares de terra. Desse ponto, no h como
explicar, segundo Almeida, o fato de que durante sculos, povos que
produziram alimentos no s suficientes, mas abundantes, como atestam
os cronistas do sculo XVI e a documentao de perodos mais recentes,
hoje se encontrem na condio de crescentes de dependncia das cestas
bsicas e outros programas assistenciais implementados pelo Governo.
(Cf. ALMEIDA, Rosemeire A. de. A questo agrria em Mato Grosso do
Sul: uma viso multidisciplinar, p. 46-47)
21 VILARES, Luis Fernando. Direitos e povos indgenas, p. 190. 22
Cf. REALE, Miguel. Memrias, p. 297 apud MIGUEL NETO, Suliman.
Questo
agrria: doutrina, legislao e jurisprudncia p. 244: A civilizao
tem isto de terrvel: o poder indiscriminado do homem abafando os
valores da natureza. Se antes recorramos a esta para dar uma base
estvel ao Direito (e, no fundo, essa a razo do Direito Natural),
assistimos, hoje, a uma trgica inverso, sendo o homem obrigado a
recorrer ao Direito para salvar a natureza que morre.
-
191
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
o prazo final de cinco anos para a concluso das demarcaes, o
Estado de Mato Grosso do Sul permanece no impasse em face da
ineficcia e irresponsabilidade do Governo Federal em lidar
respeitosamente com o modo de viver das populaes indgenas e, ao
mesmo tempo, tambm pela justa considerao dos interesses dos
produtores rurais e do setor empresarial comprometido com o
desenvolvimento do agronegcio.
Tal como se apresenta, esse conflito configura veemente violao
aos direitos humanos, pois atentam diretamente contra a dignidade
do povo Kaiow e Guarani, contra suas necessidades vitais e
elementares. Desse modo, observa-se a morosidade do cumprimento do
preceito constitucional por quem tem o dever de proteger e fazer
respeitar todos os bens indgenas23, bem como seus direitos e
garantias fundamentais, aplicveis a qualquer cidado.
Os direitos humanos so naturais e universais, pois no se referem
a um membro de uma nao ou de um Estado, mas pessoa humana na sua
universalidade. So naturais, porque so vinculados natureza humana e
tambm porque existem antes e acima de qualquer lei, e no precisam
estar legalmente explicitados para serem evocados24.
A efetiva improbidade por parte do Estado implica inconteste
falha, e isso notoriamente se percebe justamente pelo dever de
23 A salvaguarda da organizao social indgena prevista no art.
231 da Constituio Federal e os direitos originrios sobre as terras
que tradicionalmente ocupam devem ser considerados como direitos
fundamentais. So fundamentais porque a sua finalidade dignificar o
ndio como ele , respeitar sua humanidade, garantir a sua liberdade
real e a sua igualdade de direitos frente ao restante da sociedade
brasileira. (VILARES, Luis Fernando. Direitos e povos indgenas, p.
43)
24 BITTAR, Eduardo C. B. Educao e metodologia para os direitos
humanos: cultura democrtica, autonomia e ensino jurdico. In:
SILVEIRA, Rosa Maria Godoy et al. Educao e direitos humanos:
fundamentos terico-metodolgicos, p. 327.
-
192
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
verossmil zelo e respeito aos direitos j reconhecidos e procla-
mados oficialmente em nossa Constituio e em todas as convenes e
pactos internacionais dos quais o Brasil signatrio, e que no podem
ser revogados25, alterados ou supressos, mas, sim, evocados e
exercidos pelo Estado.
3 ESTRUTURA DA TICA DO DISCURSO DE KArL oTTo APEL
As grandes transformaes em curso no modo de viver indgena e a
prtica desenvolvimentista do empresariado rural, sustentada pela
poltica econmica de abastecimento e consumo26, demandam a
necessidade de uma reflexo luz de exigncias ticas fundamentais para
os conflitos fundirios em Mato Grosso do Sul.
Sob esse pleito, a escolha da proposta da pragmtica
trans-cendental de Karl Otto Apel, nascido em 1922, na cidade alem
Dsseldorf, atualmente professor emrito de filosofia da
Universidade
25 BITTAR, Eduardo C. B. Educao e metodologia para os direitos
humanos: cultura democrtica, autonomia e ensino jurdico. In:
SILVEIRA, Rosa Maria Godoy et al. Educao e direitos humanos:
fundamentos terico-metodolgicos, p. 327.
26 A globalizao econmica opera a substituio da poltica pelo
mercado transnacional, que passa a atuar como instncia de regulao
social. Essa atuao exerce impacto desagregador sobre as estruturas
poltico-institucionais e os princpios da soberania e
territorialidade, bem como mitiga os valores atinentes aos direitos
humanos e a democracia. Seus valores bsicos liberdades pblicas,
igualdade substantiva e afirmao de interesses ps-materiais colidem
frontalmente com os imperativos categricos da transnacionalizao dos
mercados, dos quais se destacam a eficcia, a produtividade e a
competitividade. O clculo econmico e a razo produtiva, em outras
palavras, revelam-se potencialmente incompatveis com os princpios
bsicos de convivncia e sociabilidade no mbito de formas
organizacionais e institucionais dotadas de um mnimo de
legitimidade jurdica e equilbrio social. (FARIA, Jos E. C de
Oliveira. Direitos humanos e globalizao econmica: notas para uma
discusso. In: Estudos Avanados. Disponvel em: . Acesso em: 2 mar.
2011)
-
193
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
de Frankfurt, no que concerne delimitao terico-metodolgica,
talvez seja o elemento inovador deste empreendimento reflexivo.
Apel entra na discusso atual da tica filosfica contempornea e
desenvolve seu pensamento no constante vaivm da argumentao, cujo
itinerrio empreende sempre novas tentativas para justificar ou
refutar objees oriundas, destacadamente, do confronto com os
adversrios do universalismo tico e do consenso, tais como Michel
Foucaut, Jean-Francois Lyortard, Richard Rorty, Odo Marquard e
Hermann Lbbe. Trata-se de um interlocutor srio que dialoga com as
mais relevantes propostas de nosso tempo: a hermenutica, a
semitica, a pragmtica e, especificamente, com as ideias de Kant,
Heidegger, Wittgenstein, Peirce, Habermas, com os quais compartilha
explicitamente grande parte das propostas. Em verdade, Apel mais
uma aposta, a fim de suscitar os possveis ganhos decorrentes de seu
intento, na esteira do paradigma da linguagem e da discusso sobre a
intersubjetividade, visando aplicar sistematicamente a fundamentao
tico-filosfica no mbito dos direitos humanos.
Aqui, a explicitao da arquitetura da tica apeleana mais genrica,
primando pela exposio da estrutura geral de sua proposta tica.
Antes, convm considerar que Apel intenta uma resposta crise de
fundamentao ps-moderna. No obstante, o intento de Apel no conforma
um sistema. Antes, concerne a uma proposta filosfica prpria
organizada arquitetonicamente27,
27 Segundo Adela Cortina, Apel empreende uma elaborao de uma
proposta filosfica que se enquadra no marco de um humanismo
quase-renascentista; ele une linguagem, histria e filosofia, desde
um ponto de vista cada vez mais filosfico, um filosfico enraizado
em tradies continentais. Ele encarna algo como a ideia platnica
filosfica, a saber, o homem convencido, profissional e vitalmente,
de que a reflexo filosfica possui uma especificidade e que preciso
mant-la a qualquer custo, visto que dela resulta uma contribuio
indispensvel para o saber e o agir humanos. Nos termos de Cortina,
esa fidelidad insobornable a la especificidad de lo filosfico, en
lo que se refiere al mtodo, los criterios
-
194
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
cujo alvo uma resposta especificamente filosfica para os
problemas modernos, que vem se compondo de uma antropologia do
conhecimento, uma hermenutica e pragmtica transcendentais com base
em uma semitica transcendental como prima philosophia, uma teoria
dos tipos de racionalidade, uma teoria consensual da verdade e uma
tica discursiva. Nesse horizonte, Apel defende a necessidade de uma
fundamentao filosfica ltima como salvaguarda do totalitarismo e
dogmatismo irracional. Para tanto, ele discute as possveis
implicaes ou contribuies decorrentes da transformao da filosofia
transcendental clssica (da conscincia) em uma filosofia
transcendental da linguagem reconhecida pelo carter dialgico e
validade intersubjetiva do discurso argumentativo em vista da
resoluo dos conflitos que afetam a humanidade.
A tica do discurso , substancialmente, constituda de duas partes
interativas: A e B28. A parte A, a priori, comunidade ideal
de la filosofa, es lo que le lleva a parecer poco flexible ante
las conveniencias del momento, poco prudente y diplomtico en
tiempos de frivolidad y relativismo, en los que suena excesivamente
rotunda la pretensin de alcanzar una fundamentacin ltima (cf.
CORTINA, A. Introduo: Karl-Otto Apel: verdad e responsabilidad. In:
APEL, Karl-Otto. Teora de la verdad y tica del discurso, p. 9-10).
Sobre a concepo pragmtica transcendental da verdade em Apel, cf.
APEL, Karl-Otto. Falibilismo: teora consensual da verdade e
fundamentao ltima. (1986). In: APEL, Karl-Otto. Teora de la verdad
y tica del discurso, p. 35-145.
28 Para Apel, desde o ponto de partida, a tica do discurso
deriva da transformao pragmtico-transcendental dos pressupostos
metafsicos da tica kantiana e, em especfico, divide-se
arquitetonicamente em duas partes: A, de fundamentao abstrata, e B,
de fundamentao referenciada na histria, que, condicionada parte A,
retorna de novo ao plano de fundamentao pragmtico-transcendental do
princpio de fundamentao das normas e das situaes nos discursos
prticos, exigveis pelos princpios D e U. tica do discurso necessrio
que se produzam discursos reais (suscetveis de fundamentao ltima)
pelos afetados, ou pelos seus representantes, para garantir o mximo
de adequao aberta aos saberes dos especialistas considerveis nos
conflitos, no que se diz respeito s conseqncias e subconsequncias
previsveis vinculadas falibilidade. Esses princpios tm que
fundamentar a si mesmos como princpios procedimentais discursivos.
(Cf. APEL, Karl-Otto. Teora de la verdad y tica del discurso, p.
160)
-
195
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
de comunicao, e a parte B, comunidade real de comunicao, que se
configura com base na perspectiva histrica da comunidade real. A
parte A se ocupa da fundamentao racional da correo das normas, a
parte B se preocupa em desenhar o quadro racional de princpios
permitindo aplicar na vida cotidiana o princpio descoberto na parte
A29. A parte A traz, em seu bojo, pressupostos procedimentais; a
finalidade trazer tona a reflexo moral-normativa, consequente com a
fundamental ideia de consenso na comunidade ideal de comunicao, com
a qual se deve estabelecer, correspondentemente, quatro
pressupostos argumentativos como condies de possibilidade:
a) primeira, a pretenso de compartilhar um significado
intersubjetivamente vlido com os meus companheiros; b) segunda, a
pretenso de verdade como pretenso e consentimento virtualmente
universal; c) terceira, a pretenso de veracidade ou sinceridade de
os meus atos de fala tomados como expresses
das minhas intenes; d) e quarta, a pretenso de correo
moralmente relevante dos meus atos de fala tomados como aes
comunicativas no sentido mais amplo ao dirigir-se a possveis
interlocutores30.
Reconhecida a moralidade que est vinculada no discurso, factvel
o comprometimento universal pelas resolues tomadas pelo consenso31.
Esse consenso verificvel na parte B da tica proposta por Apel:
trata-se do exame atento do contexto e das condies de possibilidade
para a resoluo do conflito abarcada em uma compreenso hermenutica
dos fatos:
29 CORTINA, Adela; NAVARRO, E. M. tica, p. 152.30 VILELA, M.
Dicionrio de pensamento contemporneo, p. 283.31 SILVA, A W.
Canabrava. Fundamentos e estrutura da tica do discurso em Karl
Otto Apel, f. 75.
-
196
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
O princpio da autonomia da vontade pressupe o imperativo moral
de abrir-se ao dilogo como o nico modo de resolver racionalmente os
conflitos nas relaes inter-humanas e de fundamentar normas. Ele
reformulado como princpio dialgico normativo que atua como norma
procedimental de toda argumentao terica ou prtica que supere o
solipsismo metdico32.
A tica do discurso comporta a considerao de dois princpios
procedimentais discursivos: D e U. O princpio D corresponde
compreenso de validade universal na discusso para todos os
envolvidos nos discursos e afetados pelas argumentaes, livres de
qualquer coao, em que se pressupe a aceitao sria de compromissos. O
princpio U diz respeito validade e aceitao universal de todas as
consequncias das proposies assumidas por todos os afetados, estando
estes comprometidos em respeitar as regras lgicas, dizer a verdade,
dar ateno s objees que nos sejam feitas e fornecer razes para as
afirmaes33. Nesse sentido, todos os indivduos possuem o mesmo
direito de expor suas razes na busca da justia, exclusivamente como
vontade constante e perptua de dar a cada um o que seu34, afigurada
no propsito instaurador do bem comum, como uma prtica construda no
dilogo, em vista da ordem social:
Pela primeira vez na histria do homem, possvel assumir a
responsabilidade solidria pelas conseqncias de atividades coletivas
dos homens em escala mundial como, por exemplo, a aplicao
industrial da cincia e tecnologia e organizar tal responsabilidade
como prxis coletiva. O indivduo, como o
32 HERRERO F Javier. Correntes fundamentais da tica
contempornea, p. 171-172.
33 VELASCO, Marina. tica do discurso: Apel ou Habermas?, p.
18.34 ABBAGNANO, N. Dicionrio de filosofia, p. 594.
-
197
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
destinatrio de uma moralidade convencional, no pode assumir esta
tarefa sozinho, por mais co-responsvel que se sinta35.
Na tica do discurso, a boa vontade dos indivduos se constitui
como elemento principal do agir moral dos sujeitos sociais.
Trata-se de uma concepo de liberdade que no se condiciona no
cumprimento da lei, ou uma ao conforme a moralidade na ideia de que
um indivduo obrigado a agir em vista do costume. A tica do discurso
deontolgica36porque a liberdade, ou seja, a razo prtica que age e
que doa finalidade a si e s coisas, se dirige ao conhecimento das
coisas, enquanto princpio de ao determina o que deve acontecer37. a
razo que faz com que o sujeito procure um fim respeitador para suas
aes, empregando a ideia de ao moral correspondentemente com o
entendimento de que os indivduos que compem a comunidade de
comunicao, no exerccio das suas atividades e nos argumentos
determinados em U, mediante a percepo de validade universal, para
todos os outros indivduos no impregnados de senso somente no
dever:
Boa vontade, dever, respeito, lei: eis os conceitos que se
encontram no conhecimento moral comum e que por sua
35 APEL, Karl-Otto. La tica del discurso como tica de la
responsabilidad: una transformacin posmetafsica de la tica de Kant,
p.148.
36 Para Adela Cortina, a resoluo racional de conflitos passa
pelo planejamento de exigncias que sejam verificadas na demanda de
atitudes e coerentes com os princpios embasadores dos acordos. No
entanto, o objeto que se pretende realizar pode no estar acessvel
por inadequao s obrigatoriedades de ordem da lei. Isso se apresenta
no assentimento de serem propostas novas abstraes, na ocupao de
evitar conflitos sobre a base do acordo, justificado pelas normas
desfavorveis que caream de reformulao. A caracterstica deontolgica
da tica do discurso se firma cognitiva, formal e universalista, uma
vez que esses elementos esto entrelaados na conjuntura dos fenmenos
do conflito, sem necessidade de coao, porm, imbudos de
solidariedade. (Cf. CORTINA, Adela. Razn e comunicativa y
responsabilidad solidaria, p. 222-223)
37 SALGADO, Joaquim C. A idia de justia em Kant: seu fundamento
na liberdade e na igualdade, p. 172.
-
198
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
prpria natureza, s podem ser atribudos razo pura prtica,
emergindo analiticamente como conceito propriamente filosfico na
passagem do conhecimento moral comum ao conhecimento
filosfico38.
Nesse cenrio, Apel considera o solipsismo metdico39 (ou
individualismo metdico, ou modo de pensar monolgico) como o
principal adversrio ao propsito de resoluo tica dos conflitos. O
solipsismo consiste na postura metodolgica que parte da convico de
que o indivduo, quer no campo terico, quer no prtico, anterior
constituio da sociedade e recorre a esta, em ltimo caso, para
satisfazer suas necessidades, interesses e desejos por meio de aes
instrumentais e estratgicas. O solipsismo metdico at reconhece que
o homem possui uma dimenso social, todavia defende que os indivduos
podem atuar com sentido e pensar com validade sem recorrer a
qualquer comunidade, bem como prescindir de semelhante recurso no
momento de decidir por seus interesses objetivos. O critrio ltimo
da moralidade o bem subjetivo, e, por sua vez, um produto da
conscincia individual; uma resposta solidria s ameaas ticas em
escala planetria no prescritvel incondicionalmente, seno
aconselhvel, uma vez que produz benefcios ao prprio indivduo. O
mais grave do individualismo metdico so suas consequncias prticas,
e isso legitima ideologicamente o egosmo social, visto que
justifica na convivncia humana a racionalidade estratgica. Quer
dizer, por esse ngulo, a racionalidade tica se degenera em discurso
de clculo de benefcios e satisfaes individuais e, consequentemente,
impossibilita uma resposta tica universal:
38 VAZ, Enrique C. de Lima. Escritos de filosofia IV: introduo a
tica filosfica, p. 327- 329.
39 VAZ, Enrique C. de Lima. Escritos de filosofia IV: introduo a
tica filosfica, p. 33.
-
199
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
A lei moral s se transmuta em dever-ser (sollen), para o ser que
se constitui de razo e sensibilidade, de liberdade e de necessidade
[...] somente o ser cuja vontade pode ser perturbada pelos impulsos
e inclinaes sensveis pode ser destinatrio de um comando que se
expresse na forma imperativa: tu deves40.
O propsito de Apel, que se confronta com o solipsismo metdico, o
de demonstrar que ele produto de uma falcia abstrativa que se
incorre quando se prescinde da dimenso pragmtica da linguagemCom
base na semitica tridimensional de Charles S. Peirce, Apel expe o
erro da filosofia da conscincia e da anlise da linguagem (reduzida
s dimenses sinttica e semntica): supor que o homem possa forjar seu
pensar e agir sem estar j sempre inserido em uma comunidade
comunicao; no considerar que ns somos um dilogo (Hlderlin). Pela
via da reflexo filosfica sobre a trplice dimenso da linguagem,
praticada sem abstraes, Apel mostra, como condio de possibilidade
do pensar e querer com sentido, a verdade do socialismo pragmtico
diante do solipsismo metdico, a verdade do pensar dialgico diante
do monolgico41. A tica do discurso prope uma quebra do paradigma
ideolgico, ratificando a responsabilidade englobada na histria e a
perspectiva de futuro instaurada com base no princpio de
universalizao dos interesses42, que deve ser o ponto de partida
para exprimir os desejos a fim de proporcionar, uns
40 SALGADO, J C. A idia de justia em Kant: seu fundamento na
liberdade e na igualdade, p. 211
41 CORTINA, Adela. Razn comunicativa y responsabilidad
solidaria, p. 52-54.42 Na concepo de K. Otto Apel, toda norma vlida
deve satisfazer a condio de
que possam ser aceita, com liberdade por todos os afetados, as
conseqncias dos efeitos colaterais que previsivelmente resultem de
seu cumprimento generalizado, para a satisfao dos interesses de
cada um, possibilitando o carter vinculante de regulao consensual
discursiva de um conflito em desenvolvimento. (APEL, Karl-Otto.
Teora de la verdad y tica del discurso, p. 178)
-
200
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
aos outros, a organizao da vida prtica. E isso implica assumir
responsavelmente o que foi definido pelas normas consensuais em
todos os aspectos na prxis democrtica, possibilitando a plenitude
da eticidade, do direito e da justia.
A parte B da tica como tica da responsabilidade, relativa
histria e faticidade, contm agora tambm uma anlise da relao entre a
moral particular e a moral institucional: Abaixo do nvel das
instituies aparecem atores por assim dizer, como sujeitos privados;
no nvel das instituies ou em instituies, os sujeitos tm a funo de
portadores individuais de deveres; e, acima do nvel das instituies
(organizadas como Estados nacionais), os atores constituem-se como
sujeitos do discurso e da dimenso pblica, portanto, como sujeitos
dos discursos entendido como metainstituio da comunidade primordial
do discurso da humanidade43.
Na perspectiva de Apel, todo aquele que argumenta seriamente j
est implicado com pressupostos que facultam o consenso. O itinerrio
das premissas de quem argumenta deve pressupor que: 1) necessrio
prever as condies de uma situao ideal de fala, ou
contrafactualmente, uma comunidade ideal de comunicao44; 2) preciso
assumir a condies histricas e contingentes da situao real de fala
ou comunidade real de comunicao45; 3) j se aceitou as condies
ideais processuais eticamente obrigatrias, as regras que regulam os
conflitos no mundo real, tendo em conta a diferena de aceitar as
condies ideais e reais46, com a obrigao de ajudar os outros a
superar as diferenas especficas, fazendo, assim, valer, a estrutura
basilar da tica do discurso.
43 MARCEL, Niquet. Teora realista da moral, p. 125.44 CORTINA,
Adela. Razn e comunicativa y responsabilidad solidaria, p. 254.45
CORTINA, Adela. Razn e comunicativa y responsabilidad solidaria, p.
54.46 CORTINA, Adela. Razn e comunicativa y responsabilidad
solidaria, p. 54.
-
201
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
4 PoSSVEL APLICABILIDADE DA TICA Do DISCUrSo DE APEL Ao CoNFLITo
FUNDIrIo EM MATo GroSSo Do SUL
A aplicabilidade da tica do discurso nos conflitos fundirios em
Mato Grosso do Sul depara-se com dificuldades de ordem histrica e
filosfica. Na perspectiva histrica, observa-se que no h condies
histricas possveis que sustentem o princpio de universalizao dos
interesses (princpio U). As condies fticas so adversas
dialogicidade entre as partes. A desigualdade social repercute nas
condies de possibilidade de simetria entre os interlocutores, e
cada parte compreende a outra como rival, inimiga, diante da qual
se deve adotar uma postura estratgica. Faticamente, a vontade de
poder e a mobilizao fragmentada em vista dos prprios interesses
predominam sobre a vontade de verdade e de resoluo tica dos
conflitos. patente a adoo da mentalidade moderna solipisista47,
visto que os direitos e deveres
47 preciso interpretar a linguagem dos proponentes no marco da
tentativa de superao da diferenciao positivista entre os discursos
normativo-prescritivos (da ordem do dever-ser) e os
explicativo-descritivos dos fatos (de anlise valorativa neutra). O
cientificismo positivista, uma vez que opera a separao
epistemolgica entre -deve, fatos-normas, teoria-prxis, classifica
como racional o discurso sobre os fatos e de irracional o discurso
sobre normas. Com isso, sustenta a objeo ao carter racional da
tica. Essa viso positivisto-cientificista da cincia veda qualquer
intento de fundamentar os enunciados da tica como objetivos e
racionais. Daqui decorre uma exigncia paradoxal: as consequncias
decorrentes do uso da cincia e tcnica reclamam uma tica universal,
todavia, em razo da concepo cientificista da cincia em equiparar a
validade intersubjetiva com a objetividade das constataes empricas,
valorativamente neutras; e das inferncias lgicas, as normas
faticamente vlidas, cuja validade decorre de convenes, que so
classificadas como derivadas de acordos de decises pr-racionais e
subjetivas. Tal quadro configura uma situao dilemtica, visto que
implica a escolha das seguintes alternativas: 1) liberdade pessoal
e cincia livre, porm sem compromisso intersubjetivo com normas
ticas, valores e fins; e 2) uma mediao institucionalizada e fixada
dogmaticamente entre teoria e prxis, porm sem oportunidade de
mediao baseada na livre deciso da conscincia individual. (Cf. APEL,
Karl-Otto. Estudios ticos, p. 105-73)
-
202
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
no so consensuados legitimamente por todos os afetados. No
cenrio do conflito fundirio em Mato Grosso do Sul, nota-se a fora
econmica, poltica e social do empreendimento rural em relao s
demandas por demarcao das terras do povo Kaiow e Guarani. Subsistem
limitaes histricas que mitigam a aplicao do princpio de
universalizao dos interesses. Ainda assim, imprescindvel viabilizar
a participao isonmica de todos os afetados na construo de um novo
modelo tico, com a quebra da lgica da desigualdade social.
Para Apel, isso resulta na necessidade de buscar uma mediao
dialtica entre objetividade e subjetividade48. Nesse horizonte, o
bem tico seria aquele dever que o que bom para todos, ou o que
dever, por princpio, ser um fim universalizvel para ambas as
partes, contanto que menos prejudicial. Assim, por conta do
interesse pelo bem, o indivduo, responsavelmente, deveria se
limitar em relao pretenso de incondicionalidade de suas aes, a fim
de que no haja dicotomia. necessrio, para Apel evocar a
plausibilidade das relaes inter-humanas na constituio do que
satisfatrio para todos os indivduos, assumindo, assim, uma
responsabilidade solidria compatvel com a liberdade e autonomia
moral do indivduo que reflita estritamente o propsito de superao
dos limites histricos referidos aos problemas fundirios vinculados
racionalidade estratgica49.
48 APEL, Karl-Otto. Estudos de moral moderna, p. 11.49 Adela
Cortina distingue cinco tipos de racionalidades que, delimitadas
mediante
as abstraes, inferem nos discursos ou nas argumentaes: 1)
racionalidade lgico-matemtica, a racionalidade abstrata que impera
no sentido do princpio de no contradio entre proposies ou funes
proposicionais; 2) racionalidade cientfico-tcnica, no sentido da
pressuposio recproca entre a interveno instrumental efetiva e a
anlise causal experimental; 3) racionalidade estratgica, no sentido
de uma aplicao de racionalidade instrumental na interao
comunicativa humana, especificamente recproca reflexiva; 4)
racionalidade consensual-comunicativa das aes, em virtude da fora
vinculante com os atos da
-
203
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
Em sua arquitetura, a tica do discurso uma tica de princpios e
de responsabilidade histrica. Como tal, ainda que com fora formal,
ela preconiza o reconhecimento de todos os afetados. Esse pode, de
fato, constituir o ponto de partida para a superao da lgica
maniquesta entre os diretamente afetados o povo Kaiow e Guarani e
os produtores rurais no Mato Grosso do Sul.
5 CONCLUSO
Este texto resultado de um processo de aproximao de uma
realidade bastante complexa, o conflito fundirio em Mato Grosso do
Sul entre Kaiow e Guarani e proprietrios rurais. Inicialmente,
procurou-se distinguir os elementos significativos do conflito
fundirio e a arquitetura do modelo tico de Apel considerados
relevantes para a compreenso e a proposio de soluo do conflito.
Nesse cenrio, so notrias a desigualdade social e a fora do
empreendimento rural em relao ao povo Kaiow e Guarani. As partes A
e B da tica do Discurso identificam os limites histricos de aplicao
dessa tica e, simultaneamente, os princpios procedimentais
discursivos, que remetam universalizao dos interesses. Essa
arquitetura, no contexto de Mato Grosso do Sul, ainda se apresenta
insuficiente apara a soluo do conflito fundirio no Estado.
Conclui-se este estudo com a constatao de que se faz neces-sria
uma investigao filosfica atenta aos prejuzos culturais da cultura
Kaiow e Guarani em Mato Grosso do Sul, bem como o aprofundamento da
tica do Discurso no tocante sua aplicao, sobremaneira quanto aos
direitos humanos, e possveis impactos direcionados reviso das leis
federais e sua factibilidade.
fala; 5) racionalidade discursiva, prpria do questionamento
crtico e revalidao reflexiva das pretenses de validez da
racionalidade consensual comunicativa, em conformidade com o
princpio da no contradio performativa. (Cf. CORTINA, Adela. Razn e
comunicativa y responsabilidad solidaria, p. 257)
-
204
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
The contribution of Karl-otto Apels discursive ethics to the
resolution of current land conflict in the State of Mato
Grosso do Sul
Abstract: This paper seeks to review KarlOtto Apels Discursive
Ethics as a theoretical and practical contribution to the
resolution of land conflicts in Mato Grosso do Sul as it favors a
universalistic approach to equal rights. As such, it shows that the
rational groundwork that is already presupposed in every
argumentative discourse, which implies all parties must be taken
seriously, is crucial for establishing justice and social order.
The architecture of that ethic consisting of two parts, A and B,
shows that, on one hand, the solution to the conflict is undermined
by historical conditions marked by strategic interests in
maintaining power and, secondly, that one must postulate under the
mediation of dialogue, counterfactually, the most reasonable
possible agreement among those involved in the conflicts.
Key words: Language. Discursive ethics. Intersubjectivity. Land
conflict.
REFERNCIAS
ABBAGNANO, N. Dicionrio de filosofia. So Paulo: Martins Fontes,
2000.
ALMEIDA, Rosemeire A de. A questo agrria em Mato Grosso do Sul:
uma viso multidisciplinar. Campo Grande: UFMS, 2008.
APEL, Karl-Otto. Estudios ticos. Barcelona: Alfa, 1985.
APEL, Karl-Otto. Estudos de moral moderna. Petrpolis, RJ: Vozes,
1994.
APEL, Karl-Otto. Falibilismo: teora consensual da verdade e
fundamentao ltima. (1986). In: _____. Teora de la verdad y tica del
discurso. 2. ed. Barcelona: ICE; Paids, 1995.
-
205
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
APEL, Karl-Otto. La tica del discurso como tica de la
responsabilidad: una transformacin posmetafsica de la tica de Kant.
Barcelona: Hurope, 1991.
APEL, Karl-Otto. Teora de la verdad y tica del discurso. 2. ed.
Barcelona: ICE; Paids, 1995.
BITTAR, Eduardo C. B. Educao e metodologia para os direitos
humanos: cultura democrtica, autonomia e ensino jurdico. In:
SILVEIRA, Rosa Maria Godoy et al. Educao e direitos humanos:
fundamentos terico-metodolgicos. Joo Pessoa: Universitria,
2007.
BRASIL. Constituio (1988). Constituio da Repblica Federativa do
Brasil, 1988. Disponvel em: . Acesso em: 2 nov. 2010.
CONSELHO INDGENA MISSIONRIO (CIMI). Violncia contra os povos
indgenas no Brasil: relatrio 2009. Disponvel em: . Acessado em: 7
abr. 2011.
CORTINA, A. Introduo: Karl-Otto Apel: verdad e responsabilidad.
In: APEL, Karl-Otto. Teora de la verdad y tica del discurso. 2. ed.
Barcelona: ICE; Paids, 1995.
CORTINA, Adela. Razn comunicativa y responsabilidad solidaria.
2. ed. Salamanca: Sgueme, 1988.
CORTINA, Adela; NAVARRO, E. M. tica. So Paulo, Loyola, 2005.
EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECURIA (Embrapa). A soja no
Brasil. Disponvel em: . Acesso em: 7 abr. 2010.
EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECURIA (Embrapa). Sala de
imprensa: levantamento sistemtico da produo agrcola. Disponvel em:
. Acesso em: 21 jun. 2010.
-
206
ROGRiO SANTOS DOS PRAzERES, JOS MOACiR DE AqUiNO E HEiTOR ROMERO
MARqUES
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
FARIA, Jos E. C de Oliveira. Direitos Humanos e globalizao
econmica: notas para uma discusso, in: Estudos Avanados. Disponvel
em: . Acesso em: 2 de maro de 2011.
FUNDAO NACIONAL DO NDIO (FUNAI). Grupos indgenas: Mato Grosso do
Sul. Disponvel em: . Acesso em: 27 jun. 2009.
HERRERO F Javier. Correntes fundamentais da tica contempornea.
2. ed. Petrpolis, RJ: Vozes, 2001.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATSTICA (IBGE). Estados@
Mato Grosso do Sul. Disponvel em: . Acesso em: 7 abr. 2011.
MARCEL, Niquet. Teora realista da moral. So Leopoldo: Unisinos,
2002.
MIGUEL NETO, Suliman. Questo agrria: doutrina, legislao e
jurisprudncia. Campinas: Bookseller, 1997.
NUNES, Valder Antonio Gomes de Albuquerque. Tecoha: espao vital
da cultura indgena. Disponvel em: . Acesso em: 28 jun. 2010.
PORTAL MS: o guia on line de Campo Grande e Regio. Histria de
Mato Grosso do Sul: a histria do surgimento do nosso estado. Campo
Grande-MS. Disponvel em: . Acesso em: 21 jun. 2010.
REALE, Miguel. Memrias. So Paulo: Saraiva, 1987 apud MIGUEL
NETO, Suliman. Questo agrria: doutrina, legislao e jurisprudncia.
Campinas: Bookseller, 1997.
RODRIGUES, Nadir. Pesquisadores estudam o aumento da produo de
soja e cana de acar no pas. Disponvel em: . Acesso em: 20 jun.
2010.
-
207
DA CONTRibUiO DA TiCA DiSCURSivA DE KARL OTTO APEL RESOLUO DOS
CONFLiTOS...
meritum Belo Horizonte v. 6 n. 1 p. 181-207 jan./jun. 2011
SALGADO, Joaquim C. A idia de justia em Kant: seu fundamento na
liberdade e na igualdade. Belo Horizonte: UFMG, 1986.
SILVA FILHO, Gercino Jos. Preveno e mediao de conflitos luz da
questo agrria e dos direitos humanos no Brasil. Revista de Direitos
Humanos, Braslia, Secretaria de Direitos Humanos, junho de 2010,
Especial PNDH-3, n. 5, p. 38-40.
SILVA, A W. Canabrava. Fundamentos e estrutura da tica do
discurso em Karl Otto Apel. 2005. 105 pginas Monografia (Monografia
de Graduao em Filosofia) Curso de Filosofia da Universidade Catlica
Dom Bosco (UCDB), Campo Grande-MS, 2005.
VAZ, Enrique C. de Lima. Escritos de filosofia IV: introduo a
tica filosfica. So Paulo: Loyola, 1999.
VELASCO, Marina. tica do discurso: Apel ou Habermas? Rio de
Janeiro: Faperj; Mauad, 2001.
VILARES, Luis Fernando. Direitos e povos indgenas. Curitiba:
Juru, 2009.
VILELA, M. Dicionrio de pensamento contemporneo. So Paulo:
Paulus, 2000.
YAMADA, E. M.; VILLARES, L. F. O julgamento da Terra Indgena
Raposa Serra do Sol: todo dia era dia de ndio. Revista Direito GV,
p. 143-157. Disponvel em: . Acesso em: 6 abr. 2011.
Enviado em 4 de maio de 2011. Aceito em 16 de junho de 2011.