Estudo sobre “O Enquadramento Legal do Arrendamento Urbano e o Mercado de Arrendamento “ Elaborado por: Ana Cristina Borges RSA- Raposo Subtil e Associados
Estudo sobre
“O Enquadramento Legal do
Arrendamento Urbano e o Mercado
de Arrendamento “
Elaborado por: Ana Cristina Borges
RSA- Raposo Subtil e Associados
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 2
Índice
Conteúdo 1.Introdução ............................................................................................................................................ 4 2.Breves notas sobre a evolução histórica do mercado de arrendamento em Portugal ..................................................................................................................................................... 7
2.1.A primeira fase do Arrendamento Urbano - A fase liberal. ........................................ 7 2.2. A segunda fase - Início da regulamentação do mercado de arrendamento ...... 8 2.3.A fase da Codificação ............................................................................................................... 8 2.4. A Integração do Regime do Arrendamento Urbano no Código Civil ..................... 9 2.5. A regulamentação no período de instabilidade constitucional - novos constrangimentos ao mercado de arrendamento .................................................................. 9 2.6. Após a normalização Constitucional ................................................................................ 10 2.7. O Regime do Arrendamento Urbano de 1990 (RAU) ................................................ 11
3. Enquadramento jurídico do mercado de arrendamento .................................................. 16 3. 1. Análise do Regime Legal - O Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) ................................................................................................................................................................ 17 3.2. Arrendamento habitacional ................................................................................................. 19
3.2.1.Normas gerais ................................................................................................................... 19 3.2.2.Regime Transitório .......................................................................................................... 21 3.2.3.A Ação de Despejo .......................................................................................................... 32 3.2.4. O regime do arrendamento Urbano no Código Civil ......................................... 33
3.3. Arrendamento não habitacional ........................................................................................ 37 3.4. Apreciação Critica ................................................................................................................... 40 3.5. Legislação e regulamentos relevantes para o mercado de arrendamento ....... 42
3.5.1. Decreto-Lei 156/2006 de 8 de Agosto, aprova o Regime de Determinação e Verificação do Coeficiente de Conservação .................................................................... 42 3.5.2. Decreto-Lei 157/2006 de 8 de Agosto, aprova o Regime Jurídico das Obras em Prédios Arrendados ................................................................................................ 43 3.5.3. Decreto-Lei 158/2006 de 8 de Agosto, aprova os Regimes da
Determinação do Rendimento Anual Bruto Corrigido e a atribuição do Subsídio de Renda nos arrendamentos para habitação .................................................................. 44 3.5.4. Decreto-Lei 159/2006 de 8 de Agosto, aprova a definição do conceito fiscal de prédio urbano ou fração autónoma devolutos ................................................ 46 3.5.5. Decreto-Lei 160/2006 de 8 de Agosto, aprova os elementos do contrato de arrendamento e os requisitos a que obedece a sua celebração .......................... 47 3.5.6. Decreto-Lei 161/2006 de 8 de Agosto, regula as Comissões Municipais Arbitrais ........................................................................................................................................... 48 3.5.7. Portarias/Avisos .............................................................................................................. 49
3.6. Enquadramento Jurídico da Reabilitação e Regeneração Imobiliária ................. 51 3.7. Fundos de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional .............. 65
3.7.1. Regime fiscal dos FIIAH ............................................................................................... 71 3.8. Programa de Apoio ao Arrendamento Urbano ............................................................. 73
4. Regime Fiscal incidente sobre o património imobiliário ................................................... 76 5. Breve análise estatística .............................................................................................................. 79
5.1. Síntese dos dados estatísticos ........................................................................................... 79 5.1.1.População e famílias residentes (INE) ..................................................................... 79 5.1.2.Parque Habitacional (INE) ............................................................................................ 81 5.1.3.Parque Habitacional Arrendado (INE) ...................................................................... 83 5.1.3.Índice de Rendas Confidencial Imobiliário ............................................................. 86 5.1.4.Dinâmica de Oferta e Arrendamento (Ci) ............................................................... 88 5.1.5.Panorama Internacional ................................................................................................ 93
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6. Caracterização da situação actual do mercado de arrendamento ............................... 95 6.1. Caracterização da política de arrendamento ............................................................... 99
7. Identificação dos principais bloqueamentos do mercado de arrendamento .......... 101 7.1. A dinamização do mercado imobiliário ......................................................................... 103 7.2. Processo de alteração legislativa em curso ................................................................ 104 7.3. A Proposta de Alteração ao Regime Jurídico do Arrendamento: ........................ 108 Proposta de Lei 38/XII ................................................................................................................. 108
8.Breve estudo de direito comparado ........................................................................................ 116 8.1.Características do mercado de arrendamento na Alemanha ................................ 116 8.2.Características do mercado de arrendamento na Inglaterra ................................ 122 8.3.Características do mercado de arrendamento Espanhol......................................... 127 8.4.Características do mercado de arrendamento Francês ........................................... 131 8.5. A solução holandesa ............................................................................................................ 134
9.Síntese das Sugestões /Recomendações .............................................................................. 136 9.1. A questão das rendas ......................................................................................................... 136
9.1.1. Alteração do regime de comprovação/ quitação do pagamento de rendas .......................................................................................................................................................... 137
9.2.A ação de despejo ................................................................................................................. 138 9.3. Liberalização da contratação ............................................................................................ 140 9.4.Reforçar a atuação do Plano de Emergência Social Habitacional ........................ 141 9.5.Enquadramento fiscal ........................................................................................................... 142 9.6. A constituição de um Fundo de Garantia ao Arrendamento ................................ 143 9.7.Reabilitação Urbana .............................................................................................................. 144 9.8. Dinamização dos Fundos de Investimento imobiliário para o Arrendamento Habitacional ..................................................................................................................................... 145 9.9.Arrendamentos Não Habitacionais .................................................................................. 146
10. Bibliografia .................................................................................................................................... 147 11. Índice dos Anexos ...................................................................................................................... 149
11.1 Dados sobre o mercado de arrendamento ................................................................ 149 11.2. Estudos sobre o mercado de arrendamento ............................................................ 149 11.3 Enquadramento legal ......................................................................................................... 149 11.3.1.Regime legal do arrendamento urbano .................................................................. 149 11.3.1.1. Novo Regime do arrendamento Urbano ............................................................ 149 11.3.1.2. Proposta de lei para a revisão Regime do arrendamento Urbano ........... 149 11.3.1.3.Diplomas complementares....................................................................................... 149 11.3.1.4.Diplomas sobre de rendas e coeficiente de actualização ............................. 150 11.3.2 Regime legal da Porta 65 ............................................................................................. 152 11.3.3.Regime legal da Reabilitação Urbana ...................................................................... 152 11.3.4 Regime legal dos Fundos de Investimento Imobiliário para o Arrendamento Urbano ............................................................................................................................................... 153 11.3.5 Regime legal do Crédito á Habitação ....................................................................... 153
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1. Introdução
O Arrendamento Urbano, intimamente ligado com a questão da habitação
nas grandes cidades, constitui um dos temas polémicos da actualidade sendo
alvo de debates nos mais variados fóruns.
O Estado tem a incumbência de desenvolver políticas públicas de
habitação que sejam equilibradas e articuladas com todas as componentes de
mercado e que permitam assegurar o direito à habitação, tal como está
consagrado na Constituição da República Portuguesa.
A importância do contrato de arrendamento não se limita às questões
relacionadas com a política de habitação, de edificação e do ordenamento do
território, reflectindo-se, outrossim noutras áreas fulcrais de intervenção
política relacionadas com outras questões económicas, como seja a questão do
investimento, da aplicação de poupanças e do recurso ao crédito ou questões
sociais relacionadas com a mobilidade dos trabalhadores e com a qualidade de
vida das famílias.
Este estudo pretende dar uma panorâmica sobre o mercado de
arrendamento em Portugal e a forma como tem evoluído ao longo dos anos
com o objectivo de identificar constrangimentos ao desenvolvimento do
mercado e apresentar sugestões com vista a ultrapassá-los.
Já no decurso do presente estudo, o governo apresentou uma proposta
de alteração do regime do arrendamento urbano, dando assim cumprimento
ao compromisso que o Estado português assumiu no “Memorando com a
Troika”.
A reforma do regime do arrendamento urbano é crucial para a
requalificação do património imobiliário e para a melhoria das condições de
habitação e de vida da população portuguesa. Assim, não podemos deixar de
proceder a uma análise desta proposta de lei. Consideramos, no entanto, que
se trata de uma oportunidade perdida porque não procede a uma reforma de
fundo nem apresenta soluções inovadoras. Nesta medida, o presente estudo
continua a apresentar relevância por se entender que, não obstante o processo
legislativo em curso, é necessário proceder a uma reforma mais profunda do
regime do arrendamento urbano, que não se traduzam em meras inovações na
continuidade de um regime que em nada contribui para os objetivos que se
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pretendem alcançar.
Com este objectivo, faremos uma breve viagem histórica, que permitirá
identificar traços distintivos da filosofia seguida pelos sucessivos legisladores,
procurando caracterizar os bloqueios ao mercado do arrendamento que
resultam de algumas das opções legais tomadas.
Segue-se uma análise do enquadramento jurídico em vigor onde
procuramos caracterizar o regime do arrendamento urbano, bem como outras
normas relevantes que regulam o contrato de arrendamento, o enquadramento
normativo da Reabilitação e Regeneração Imobiliária e a regulamentação dos
Fundos de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional. Por fim,
uma breve análise do regime fiscal incidente sobre o património imobiliário.
Para além da legislação em vigor, é essencial caracterizar as práticas de
mercado e a forma como essa legislação é aplicada, neste sentido
apresentamos uma breve análise estatística evolutiva do mercado de
arrendamento e os resultados de um inquérito que procurou identificar os
factores de estrangulamento deste mercado
Prosseguiremos, com a caracterização da política de arrendamento quer
no que toca ao arrendamento habitacional, quer quanto ao arrendamento não
habitacional, procurando identificar as principais coordenadas do mercado do
arrendamento urbano.
Coligida a informação, partiremos para uma abordagem analítica e crítica
com vista à caracterização dos principais constrangimentos do mercado de
arrendamento que constituem obstáculos à dinamização do mercado
imobiliário e, consequentemente, à conservação e regeneração urbana. Por
outro lado, não podemos deixar de contextualizar esta problemática na actual
conjuntura económica, procurando reflectir sobre as implicações da situação
actual no mercado de arrendamento.
Veremos ainda em que termos está a ser discutida esta problemática
procurando fazer um ponto de situação sobre as várias sensibilidades que
resultam do processo de alteração legislativo inerente.
No sentido de chegarmos a sugestões e recomendações para os vários
problemas identificados não nos podemos fechar, remetendo-nos apenas à
nossa experiência. Acreditamos que, outras experiências legislativas podem
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ser relevantes na busca de soluções, por esta razão procederemos a um breve
estudo de direito comparado na tentativa de identificar pontos comuns e
soluções alternativas que possam servir de mote às nossas sugestões.
Por fim, cabe-nos fazer uma síntese que reflita o diagnóstico feito aos
constrangimentos do mercado de arrendamento em Portugal, tendo em vista o
apontar de caminhos que possam responder aos problemas identificados.
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2.Breves notas sobre a evolução histórica do mercado de arrendamento em Portugal
Ao traçar estas breves notas sobre a evolução histórica do mercado de
arrendamento e do seu enquadramento jurídico, optamos por identificar
algumas das grandes fases, que nos permitam uma análise sumária, mas
elucidativa, da forma como o arrendamento urbano evoluiu, tentando
identificar algumas das razões que ainda hoje, estão na base da actual
situação do arrendamento urbano em Portugal.
Antes, porém, e ainda que de uma forma sucinta, não podemos deixar de
referir a discussão doutrinal relativa à natureza jurídica do contrato de
arrendamento cuja génese remonta ao Direito Romano, entendido como um
contrato de locação de coisa imóvel, é um contrato consensual que tem como
principal característica o carácter temporário, acompanhado da obrigação de
restituição da coisa findo o contrato.
Numa tentativa de proceder a uma breve referência às várias posições
doutrinais acerca da natureza jurídica do contrato de arrendamento, importa
referir a orientação, expressamente acolhida pelo Código Civil português, no
sentido de considerar o contrato de arrendamento como um direito pessoal de
gozo. Contudo, alguma doutrina, tende a classificar o direito do locatário como
um verdadeiro direito real, na medida em que lhe assistem todas as
características desta categoria de direitos, nomeadamente, a inerência, a
sequela, a oponibilidade a terceiros e a tutela dos meios de defesa da posse.
2.1.A primeira fase do Arrendamento Urbano - A fase liberal.
Fortemente influenciado pela tradição romanista, o regime legal do
arrendamento urbano era caracterizado pela sua consensualidade.
Assim, o contrato de arrendamento não estava sujeito a forma, podendo o
inquilino provar a existência do contrato por qualquer meio de prova,
designadamente, através da exibição dos recibos de renda.
A lei limitava-se a regular as formas de cessação do contrato procurando
evitar a expulsão arbitrária do locatário.
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A intervenção legal mais relevante situa-se no domínio processual relativo
à acção de despejo, limitando o recurso à execução do despejo em algumas
situações, designadamente, em casos de doença do arrendatário.
2.2. A segunda fase - Início da regulamentação do mercado de arrendamento
Com a proclamação da República e sob a influência da Primeira Grande
Guerra Mundial, assistimos ao início da regulamentação do mercado de
arrendamento urbano, caracterizada por várias intervenções legislativas
parciais entre 1914 e 1917. Durante este período, foi determinado o
congelamento das rendas, como medida transitória explicada pelas
consequências económicas impostas pela guerra; foram, de igual modo,
limitadas as condições de cessação dos contratos de arrendamento, o recurso
à acção de despejo e foi ainda imposta a obrigação de arrendamento de
prédios devolutos.
Em suma, podemos caracterizar esta fase pelo início da regulamentação
em duas matérias que reportamos da maior importância para o
desenvolvimento do mercado de arrendamento, a liberdade de celebração do
contrato por parte do senhorio e a faculdade de actualizar os valores das
rendas.
2.3.A fase da Codificação
Após várias intervenções legislativas, o acervo normativo do
arrendamento era disperso e fragmentado, assim foi decidida a constituição de
uma comissão coordenada por Castanho Menezes e Barbosa Magalhães com o
objectivo de proceder à codificação do regime do arrendamento urbano, dando-
lhe um tratamento unitário e conferindo-lhe unidade sistemática. Em 17 de
Abril de 1917, foi publicado o Decreto 5411 que reunia toda a legislação em
matéria de arrendamento e que não obstante as críticas de que foi alvo e as
consecutivas alterações legislativas posteriores, conferiu ao regime do
arrendamento um carácter institucional. Esta codificação operou a distinção
entre normas já consolidadas e normas de urgência com carácter transitório,
cuja vigência seria justificada enquanto as circunstâncias que as motivaram
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se mantivessem. São exemplos, o caso do congelamento de rendas, a
obrigatoriedade de celebrar o contrato de arrendamento ou os limites impostos
ao recurso à acção de despejo. Contudo, a instabilidade económica, não só
manteve estas normas em vigor como operou outras alterações ao regime no
mesmo sentido.
Na verdade, o congelamento de rendas associado à desvalorização da
moeda levou a uma degradação do rendimento dos senhorios. Esta situação
motivou várias intervenções legislativas, entre 1922 e 1928, no sentido de
permitir a subida do valor das rendas com base no critério do valor matricial
dos prédios. Na prática, este critério revelou-se insuficiente uma vez que os
valores matriciais estavam desactualizados. Outros diplomas se seguiram,
apresentando soluções mais ou menos complexas que pretendiam, sem
sucesso, resolver o problema da actualização das rendas.
Em 1940, uma alteração de natureza fiscal permitiu, por via da avaliação
do local arrendado, a actualização de rendas para o arrendamento comercial.
2.4. A Integração do Regime do Arrendamento Urbano no Código Civil
A reforma do regime do arrendamento urbano, operada pela Lei 2030 de
22 de Julho de 1948, permitiu a actualização de rendas, mas manteve o
bloqueamento nos dois grandes centros urbanos de Lisboa e Porto. Este
regime veio, posteriormente, a ser integrado no Código Civil de Seabra, tendo-
se mantido o congelamento das rendas nos dois principais centros urbano e
limitado a actualização ao valor matricial sujeito a avaliação fiscal. Acresce,
que se limitaram as situações de cessação do contrato de arrendamento,
conferindo-lhe características de perpetuidade.
2.5. A regulamentação no período de instabilidade constitucional - novos constrangimentos ao mercado de arrendamento
As várias alterações legislativas que se seguiram à revolução de 1974-75
vieram aprofundar os vários constrangimentos à liberdade económica no
âmbito do arrendamento. Alargou-se o congelamento de rendas a todo o país e
foram suspensas as avaliações fiscais com vista a actualização de rendas. Foi
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ainda suspenso o direito à demolição e à denúncia do contrato por parte do
senhorio e foi imposta a celebração de contratos de arrendamento
compulsórios como forma de legalizar as ocupações com fins habitacionais.
De salientar que, a intervenção do legislador no funcionamento do
mercado de arrendamento vai ao ponto de, pela primeira vez, serem
estabelecidos limites máximos para a fixação de renda nos primeiros e novos
contratos de arrendamento1.
Em 19772, foi consagrado o direito de preferência do inquilino na venda
ou dação em cumprimento do local arrendado.
2.6. Após a normalização Constitucional
Foram registadas várias tímidas iniciativas para restabelecer as
condições de normal funcionamento do mercado de arrendamento através do
estabelecimento de critérios de actualização anuais de rendas, com base em
coeficientes fixados pelo governo, independentemente da data da sua
constituição. Tendo em vista o descongelamento das rendas, foram fixados
dois regimes distintos: o regime de renda livre e o regime de renda
condicionada3. O sistema de renda livre permitia a livre estipulação inicial da
renda mas, não poderia ser alvo de futuras actualizações, no sistema de renda
condicionada a estipulação da renda era efectuada de acordo com critérios
fixados na lei mas, podia ser actualizada em função de um coeficiente
anualmente fixado. Quanto às rendas anteriores a 1980, poderiam ser alvo de
uma actualização escalonada, tendo em conta as condições do prédio.
Estabeleceu-se, assim, um regime extraordinário de correcção de rendas uma
vez que a mera actualização anual ordinária não era suficiente devido aos
valores irrisórios das rendas.
Este regime de actualização extraordinária era baseado numa tabela
publicada em anexo à lei de 19854, que previa índices de correcção de acordo
com o ano da última fixação de renda, localização do prédio e características
do imóvel. Porém, esta correcção estava vedada às rendas que já tinham sido
1 Estabelecidos no Decreto Lei 445/74 de 12 de Setembro de 1974
2 Lei 63/77 de 25 de Agosto de 1977
3 Decreto Lei 148/81 de 4 de Junho 1981
4 Decreto Lei 46/85 de 20 de Setembro de 1985
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alvo de ajustamentos em virtude de obras de beneficiação.
Acresce que as rendas sujeitas a factores extraordinários de correcção
não podiam ser simultaneamente alvo de actualizações anuais.
Na verdade, a actualização verificada ficou muito aquém das normais
condições de mercado e revelou-se insuficiente face à necessidade de fomentar
o mercado de arrendamento.
Foi criado o programa de recuperação de prédios degradados (RECRIA-
Regime Especial de Comparticipação na Recuperação de Imóveis Arrendados)5
que previa um regime de apoio financeiro para custear parte das obras de
recuperação e beneficiação de imóveis arrendados. Esta comparticipação, a
fundo perdido, podia ser concedida aos senhorios ou aos arrendatários e
municípios, quando estes se substituíam aos senhorios na realização das
obras6.
2.7. O Regime do Arrendamento Urbano de 1990 (RAU)
O Decreto-Lei 321-B/90, de 15 de Outubro, proclamou como objectivo
principal alterar o mercado do arrendamento urbano para o tornar mais
atractivo e dinâmico. Assim, propõe-se proceder a uma codificação com o
objectivo de preencher lacunas, evitar contradições e prevenir desarmonias.
Talvez por estas razões tenham ficado de fora do RAU as matérias que pela
sua transitoriedade e mutabilidade encontram, certamente, melhor
acolhimento em diplomas avulsos, designadamente, a regulamentação dos
subsídios de renda ou a fixação dos índices de cálculo das actualizações
extraordinárias das rendas.
O RAU, propõe, entre outras alterações, a reposição do carácter
temporário do arrendamento, permitindo a celebração de contratos de duração
limitada7 e o combate à degradação dos imóveis, regulando o regime de obras.
Porém, não apresenta soluções eficazes para resolver o problema do
5 Instituído pelo Decreto Lei 4/88 de 14 de Janeiro de 1988
6 Alguns anos mais tarde, com a revisão deste regime operada pelo Decreto-Lei 329 C/200 de 22
de Dezembro de 2000 e pela Portaria 56A/2001 de 29 de Janeiro de 2001, completou-se o quadro de
apoio financeiro através da concessão de um garantia aos empréstimos efectuados pelo senhorio para
financiar a parte dos custos que não é alvo de compartição. 7 Fixando no seu artigo 10º, como prazo supletivo, na ausência de convenção das partes, 6 meses.
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congelamento de rendas8, mantendo no essencial a aplicação do regime
anterior para os contratos celebrados antes de 1990. Desta forma, o RAU
perpetua a situação de injustiça gerada pela existência de rendas de valor
muito abaixo do mercado por um lado e, por outro, continua a permitir o
agravamento da degradação dos imóveis, também ele fruto do baixo nível de
rendas, com reflexos graves no património edificado, na falta de segurança e
da depreciação da imagem das cidades.
Não obstante e reconhecendo a gravidade deste problema, o RAU
procurou ampliar a competência dos poderes locais no domínio das obras de
conservação e beneficiação dos imóveis e permitiu que as beneficiações do
prédio tivessem reflexo na renda, através de um ajustamento anual da renda
por motivo de obras9.
No que toca ao regime das rendas, o RAU, prevê a renda livre, renda
condicionada e renda apoiada.
A renda livre é acordada pelas negociações entre as partes, cabendo-lhes
ainda determinar o respectivo regime de actualização, com base num critério
convencional diferente do coeficiente legal, desde que satisfeitos certos
requisitos temporais.
O regime de renda condicionada é supletivo e, embora resulte da
negociação das partes, não pode exceder o limite estabelecido num coeficiente
fixado por portaria ministerial10. Acresce que o RAU estabelece os casos em
que o regime de renda condicionada é obrigatório, prevendo ainda situações de
conversão em renda condicionada de arrendamentos já em vigor.
No que concerne ao regime de actualização de rendas, eliminou-se a
distinção entre arrendamento habitacional e não habitacional, estipulando um
regime único. Mais tarde, as várias alterações às disposições do RAU vieram
repor a diferenciação de regime.
Assim, o coeficiente de actualização das rendas resulta da totalidade de
8 Neste domínio reproduz no essencial o regime estabelecido no Decreto-Lei 46/85.
9 No caso de obras coercivas, aplicam-se os critérios de actualização estabelecidos no RECRIA.
Quando as obras são realizadas por acordo das partes, cabe-lhes convencionar o aumento da renda
compensatório. 10
O regime de renda condicionada não pode exceder por mês o duodécimo do produto resultante
da aplicação da taxa das rendas condicionadas ao valor actual do fogo , no ano da celebração do contrato.
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variação do índice de preços ao consumidor, excluindo a habitação, apurado
pelo INE. Mantém-se o regime de actualização anual extraordinária de rendas,
reflexo de que, não obstante as actualizações e as correcções, as rendas
continuavam muito abaixo do seu justo valor11.
Cabe ao senhorio notificar o inquilino da actualização e em que termos foi
efectuada, com antecedência mínima de 30 dias. Nas situações em que o
inquilino discorde da aplicação dos critérios de actualização de renda, poderá
recorrer á intermediação de uma Comissão especial de natureza arbitral12 ou
ao tribunal de comarca competente.
Ainda no que toca à obrigação de pagar a renda, não é permitida a
antecipação do pagamento de renda superior a um mês.
Quanto à forma exigida para o contrato de arrendamento, veio
estabelecer, sem margem para dúvidas, o princípio do formalismo,
abandonando a regra da consensualidade ao estipular que o contrato de
arrendamento que não for reduzido a escrito é nulo. Esta invalidade pode ser
invocada, a todo o tempo, por qualquer interessado. Os contratos sujeitos a
registo devem ser celebrados através de escritura pública 13. Ainda assim, o
RAU permitiu que a exibição dos recibos de renda pudessem sanar esta
invalidade, sujeitando estes contratos ao regime de renda condicionada.
Acresce a obrigação de exibição da licença de utilização ou de construção, bem
como a sua menção expressa no contrato, desde logo por razões de
ordenamento urbanístico e territorial.
Quanto à transmissão da posição do arrendatário à revelia do senhorio,
constitui uma questão muito sensível, quer do ponto de vista dos direitos
sociais do inquilino, quer para o senhorio. Por esta razão, apenas se estipula a
transmissão por morte uma única vez, no caso de falecimento do arrendatário
primitivo. São contemplados: (I) o cônjuge, com equiparação à união de facto
de pessoa que viva com o arrendatário em condições análogas à dos cônjuges
há mais 2 anos, (II) as pessoas que convivam em economia comum pelo
mesmo período, (III) ascendentes, e (IV) descendentes, com equiparação ao
11
Prevê ainda um caso especial de actualização imediata da renda até ao limite do valor
praticado no regime de renda apoiada para as situações em o inquilino residindo nas áreas metropolitanas
de Lisboa ou Porto, possua outra residência capaz de satisfazer as suas necessidades habitacionais. 12
Coube à Portaria 38/93 de 3 de Maio, em execução do artigo 36 nº 1 da RAU, regular a
constituição das Comissões Especiais. 13
È o caso dos contratos de arrendamento celebrados por um prazo superior a 6 anos.
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vínculo de adopção, que convivam com o arrendatário há mais de um ano. A
transmissão não se verifica quando o beneficiário tenha residência na mesma
comarca capaz de satisfazer as suas necessidades habitacionais. Nas
situações de transmissão do direito de arrendamento em que o beneficiário
tem entre 26 e 65 anos aplica-se o regime de renda condicionada desde que
não envolva a diminuição do valor da renda14. Em alternativa à transmissão do
direito ao arrendamento, o RAU permite que o senhorio exerça o direito de
denúncia mediante o pagamento de uma indemnização, correspondente a 10
anos de rendas.
Acresce as situações em que o RAU prevê o direito a novo arrendamento
por morte do arrendatário primitivo, em favor das pessoas que vivam em
economia comum com o arrendatário há mais de 5 anos e os
subarrendatários, desde que não tenham residência na mesma comarca capaz
de satisfazer as suas necessidades habitacionais. Havendo pluralidade de
beneficiários o direito é atribuído em favor do parente mais próximo e mais
idoso. Este novo contrato tem duração limitada, podendo o senhorio recusar-
se a celebrá-lo quando pretenda alienar o imóvel, habitá-lo ou destiná-lo à
habitação de parentes em linha recta, ou ainda, quando pretenda realizar
obras ou afectar o imóvel a outro destino económico.
O RAU prevê a cessação do contrato de arrendamento por acordo das
partes, resolução e denúncia.
Nos contratos de duração limitada, sujeitos a renovação automática15, o
senhorio pode denunciar o contrato com antecedência mínima de um ano
sobre o fim do prazo e mediante notificação judicial avulsa. O arrendatário
poderá a todo tempo denunciar o contrato com antecedência de 90 dias,
mediante comunicação por escrito dirigida ao senhorio.
Mantém-se a diferenciação de regime relativo à resolução contratual,
sendo que o inquilino pode resolver o contrato nos termos gerais, com base no
incumprimento do senhorio, enquanto que a resolução pelo senhorio está
vinculada aos fundamentos legalmente previstos e tem que ser declarada
judicialmente.
14
Nos termos do artigo 87º, a conversão da renda não ocorre quando o beneficiário é portador de
deficiência ou invalidez absoluta. 15
De acordo com o artigo 100º a renovação é automática por períodos mínimos de 3 anos se
outro prazo não for estipulado pelas partes.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 15
A efectivação da desocupação do local arrendado, por via da acção de
despejo, poderá ser diferida de acordo com um conjunto de critérios
relacionados com razões sociais e económicas, designadamente, o prejuízo
causado ao inquilino, a insuficiência de meios, a inexistência de outra
possibilidade de residência e ainda as circunstancias relacionadas com a
idade, ou, estado de saúde do inquilino, bem como das pessoas que com ele
coabitam.
As várias tentativas infrutíferas para eliminar os bloqueamentos do
mercado de arrendamento prosseguem, a autorização legislativa concedida ao
governo pela Lei 16/2000 de 8 de Agosto, cujo principal objetivo assumido foi
combater a preocupante degradação dos imóveis que integram o parque
habitacional arrendado, correspondendo a um pacote legislativo que
pretendeu aperfeiçoar o programa RECRIA. Foram, igualmente, determinados
os termos em que as rendas deveriam ser ajustadas quando são realizadas
obras16, alterado o regime relativo à acção de despejo por demolição de imóveis
degradados e fixados critérios para actualizar as rendas condicionadas.
Numa breve síntese podemos afirmar que a partir de 1974 a proliferação
legislativa relativa ao arrendamento foi claramente inspirada numa filosofia de
protecção do inquilino, desequilibrando a justa regulamentação desta relação
jurídica em desfavor do senhorio.
Por um lado, as sucessivas alterações legislativas não lograram obter
êxito na resolução do problema do congelamento de rendas.
Por outro, os meios adjetivos demonstraram-se ineficientes, quer pela sua
morosidade, quer pelo fato do senhorio ter que suportar o onús de atender às
condições sociais e económicas do arrendatário para executar a desocupação
do imóvel. Assim, a confiança no mercado foi sendo destruída, assistindo-se a
situações em que face ao incumprimento das obrigações do arrendatário, o
senhorio não disponha de meios adequados de tutela dos seus interesses.
16
Decreto Lei 329-A/2000 de 22 de Dezembro de 2000.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 16
3. Enquadramento jurídico do mercado de arrendamento
Atualmente, o regime legal do arrendamento urbano encontra-se disperso
por vários diplomas legais, nomeadamente:
- Pelas normas do Código Civil (artigos 1022 a 1113º);
-Pelas disposições gerais da Nova Lei do Arrendamento Urbano (NRAU),
aprovado pela Lei 6/2006 de 27 de Fevereiro (artigos 9º a 25º), bem como
pelas normas transitórias de actualização de rendas dos contratos
habitacionais celebrados antes da vigência do RAU e dos contratos não
habitacionais celebrados antes do Decreto Lei 257/95 de 30 de Setembro,
constantes nos artigos 30º a 56º e, ainda, pelas normas relativas à
transmissão dos contratos de arrendamento previstas nos artigos 57º e 58 º e
normas transitórias previstas nos artigos 26º a 29º do NRAU;
- Pelas normas do Código de Registo Predial;
- Por determinadas normas de natureza adjectivas constantes no Código
de Processo Civil (artigos 46º, 307º, 678º, 692, 805º, 810º, 811º, 811ºA,
811ºB, 812º, 812ºA, 812ºB, 813º a 820º e 928º a 930ºE);
-Por vários diplomas de natureza fiscal, designadamente, o Código de
Imposto Municipal sobre Imóveis, o Código de Imposto Municipal sobre
Transmissões Onerosas de Imóveis, o Código de Imposto de Selo, o Estatuto
dos Benefícios Fiscais, o Código de IRS e do IRC ;
-Pela Constituição da República Portuguesa ( artigos 62º a 65º).
Para além destes diplomas, fazem igualmente parte do regime legal do
arrendamento urbano a legislação complementar de regulação do NRAU, nas
seguintes matérias: comunicação e notificações; justo impedimento;
associações; consignação em depósito; determinação do rendimento anual
bruto e do coeficiente de conservação; o regime de atribuição do subsídio de
renda; ou ainda matérias como ao regime jurídico das obras coercivas ou o
conceito fiscal de prédio devoluto, que constam dos seguintes diplomas:
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 17
Decreto-Lei 156/2006 de 8 de Agosto, aprova o Regime de Determinação
e Verificação do Coeficiente de Conservação
Decreto-Lei 157/2006 de 8 de Agosto, aprova o Regime Jurídico dos
Prédios Arrendados
Decreto-Lei 158/2006 de 8 de Agosto, aprova os Regimes da
Determinação do Rendimento Anual Bruto Corrigido e a atribuição do
Subsídio de Renda
Decreto-Lei 159/2006 de 8 de Agosto, aprova a definição do conceito
fiscal de prédio devoluto
Decreto-Lei 160/2006 de 8 de Agosto, aprova os elementos do contrato de
arrendamento e os requisitos a que obedece a sua celebração
Decreto-Lei 161/2006 de 8 de Agosto, regula as Comissões Municipais
Arbitrais
3. 1. Análise do Regime Legal - O Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU)
O NRAU, aprovado pela Lei 6/2006 de 27 de Fevereiro, teve como
principal desafio a resolução do problema dos arrendamentos anteriores a
1990, cujo valor de rendas praticado está muito abaixo do valor de mercado.
Na verdade, o consenso gerado à volta desta lei não assenta tanto nas
críticas ao anterior regime, mas antes, na necessidade de resolver a questão
das rendas antigas.
Assim, procura-se um sistema que permita, de forma faseada, a
actualização das rendas antigas, daí que, este regime se aplique a todos os
contratos, muito embora, no sentido de salvaguardar as legitimas expectativas
das partes nos arrendamentos celebrados antes da entrada em vigor da lei, se
estabeleça um regime transitório.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 18
Por outro lado, pretendia-se ainda dar resposta à necessidade de
recuperação dos imóveis, criando condições para a realização de obras de
conservação e de melhoramento. Tendo presentes estes objectivos, no NRAU, o
legislador pretendeu modernizar o mercado de arrendamento conferindo-lhe
equilíbrio.
O regresso da regulamentação do contrato de arrendamento ao Código
Civil significa que estamos perante um novo regime do arrendamento aplicável
a todos os contratos, sem prejuízo da aplicação do regime transitório.
Em suma,17
podemos identificar 4 pilares do NRAU
- O regresso do Regime do Arrendamento Urbano ao Código Civil,
marcado pelo fim das renovações automáticas e forçadas dos contratos.
- Alteração das disposições adjetivas, reforçando a Acção executiva para
entrega de coisa certa.
- Estabelecimento de normas gerais, designadamente, sobre
comunicações, justo impedimento ou consignação em depósito das rendas.
- Previsão de um regime transitário aplicável aos contratos celebrados
antes da entrada em vigor do RAU e na sua vigência.
Relativamente à aplicação do NRAU, das disposições conjugadas do nº1
do artigo 26º e do artigo 59º da Lei 6/2006, resulta que as normas do NRAU
são, em princípio, aplicáveis aos contratos de arrendamento urbano que
subsistam à data da sua entrada em vigor, quer esses contratos tenham sido
celebrados durante a vigência do RAU, quer tenham sido celebrados em data
anterior, sem prejuízo da aplicação do regime transitório quando estão em
causa as situações salvaguardadas nos artigos 26º e seguintes e ainda no caso
de estarmos perante normas supletivas. De fato o nº 3 do artigo 59º, prevê que
as normas supletivas constantes deste diploma só se aplicam aos contratos
celebrados antes da sua entrada em vigor quando não estejam em sentido
contrário ao da norma supletiva em vigor aquando da celebração do contrato,
porque neste caso será essa a norma aplicável.
17
Citando, Martins, Manteigas; Subtil, A.Raposo e Carvalho, Luís Filipe, in “O Novo Regime do
Arrendamento Urbano” 2ª Edição , Vida Económica , Lisboa, 2006, ISBN 972-788-192-0.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 19
3.2. Arrendamento habitacional
3.2.1.Normas gerais
O NRAU impõe, sob pena de nulidade, a comunicação sob a forma escrita
sobre todas as questões relacionadas com as com as seguintes matérias:
cessação do contrato, alteração de rendas e realização de obras. As referidas
comunicações, devem ser assinadas pelo declarante e remetidas por carta
registada com aviso de receção para o local arrendado, quando o destinatário
for o inquilino ou, para o local que consta no contrato, quando se destinam ao
senhorio. De sublinhar a importância das comunicações conterem a morada
completa do declarante e da obrigatoriedade das partes comunicarem
qualquer alteração de morada.
Porém, a lei é mais exigente no que toca à comunicação de cessação do
contrato por incumprimento da obrigação de pagamento de rendas18, impondo
que a mesma seja concretizada mediante notificação judicial avulsa, ou, por
contato pessoal de advogado, solicitador ou solicitador de execução na pessoa
do notificando.19
Com exceção desta situação e quanto à eficácia da comunicação,
adotaram-se as regras estabelecidas para processos pendentes, nos termos da
qual a comunicação não deixa de produzir efeitos pelo fato de ter sido
devolvida, sempre que o destinatário se recuse a recebê-la, ou, quando não a
levantar no prazo estabelecido pelos serviços postais e ainda quando o aviso
tenha sido assinado por pessoa diferente do destinatário. Porém, quanto às
comunicações efectuadas pelo senhorio que se destinem a atualizar a renda
ou sirvam de título executivo para o despejo, exige-se uma nova
comunicação20, no prazo de 30 a 60 dias sobre a data de envio da primeira
carta e se a mesma voltar a ser devolvida, em circunstâncias similares,
considera-se a comunicação efectuada no 10º dia posterior ao seu envio.
18
Nos termos do nº 1 do artigo 1084º do Código Civil. 19
No ato de notificação deve ser ainda proceder-se á entrega do duplicado da comunicação e cópia
dos documentos que acompanhem, devendo o notificando assinar o original. 20
Nos termos do artigo 10º do NRAU.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 20
No caso de existir pluralidade de senhorios, a comunicação deve ser
subscrita por todos ou por quem os represente. Quanto à pluralidade de
arrendatários, salvo indicação em contrário, a comunicação deve ser destinada
àquele que figura em primeiro lugar no contrato de arrendamento, exceto
quando se tratar de comunicação para atualização de renda ou para efeitos de
despejo, situação em que a comunicação deve ser dirigida a todos os
arrendatários.
Quando o local arrendado constituir casa de morada de família21, as
comunicações devem ser dirigidas a ambos os cônjuges22.
A impossibilidade de receção das comunicações ou, de prática atempada
de outros atos pelas partes, pode ser justificada por justo impedimento. Cabe
à parte que invoca o justo impedimento, a sua fundamentação.
O NRAU atribui legitimidade processual às associações representativas
dos senhorios, arrendatários e comerciantes23 para promoverem a defesa
judicial dos interesses dos seus associados, nomeadamente, quando estão em
causa interesses de natureza coletiva, tornando o acesso à justiça menos
oneroso. Por outro lado, as associações de senhorios e de arrendatários
integram as CAM.24
21
Vide artigo 1673º Código Civil. A definição de casa de morada de família, tendo em conta o nº
2 do artigo1775º e o nº 3 do artigo 1793 do Código Civil, é o local onde habitam os cônjuges de forma
regular e habitual. 22
Nos termos do artigo 12º do NRAU as comunicações devem ser dirigidas a ambos os cônjuges
nas situações previstas no artigo 1682ºB do Código Civil, designadamente, denúncia ou resolução do
contrato de arrendamento, subarrendamento, entre outras. 23
De acordo com o artigo 13º do NRAU, as associações devem cumprir os seguintes requisitos
cumulativos: terem personalidade jurídica e cujo escopo seja a defesa dos interesses dos seus associados;
não terem finalidade lucrativa e representarem pelo menos 3000 associados, no caso de serem associações
nacionais; 500 ou 100 no caso de terem âmbito respectivamente regional ou local. 24
Nos termos do Decreto Lei 161/2006 de 8 de Agosto.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 21
3.2.2.Regime Transitório
O estabelecimento de um regime transitório não teve a intenção de
subtrair os contratos de arrendamento antigos à aplicação do NRAU, mas
antes prever especificidades no regime jurídico aplicável a estes contratos.
O âmbito de aplicação do regime transitório pretende abranger os
contratos de arrendamento habitacionais celebrados antes e no decurso da
vigência do RAU e ainda os contratos não habitacionais celebrados antes e na
vigência do Decreto-Lei 257/95 de 30 de Setembro.
O legislador optou por construir um regime transitório com recurso a
dois critérios, por um lado, a duração limitada ou ilimitada do contrato 25 e,
por outro, a natureza finalística do contrato, habitacional ou não habitacional.
O regime transitório mantém, para os contratos habitacionais a natureza
vinculística, porém, nos contratos não habitacionais prevê condições
impeditivas da sua perpetuidade.
Neste âmbito, estabelecem-se normas relativas à renovação, denúncia,
actualização de rendas, direito a obras e direito a benfeitorias nas situações de
cessação do contrato.
No que toca à renovação dos contratos de duração limitada26, prevê-se a
sua renovação automática por um período de 3 anos, se outro prazo superior
não tiver sido estabelecido contratualmente. Quanto à possibilidade de
oposição à renovação é necessária a comunicação escrita, com o prazo mínimo
de antecedência de 1 ano, no caso do senhorio, e de 120 dias para o
arrendatário. Relativamente a estes contratos é ainda conferido ao
arrendatário a faculdade de, após 6 meses de duração efectiva do contrato,
proceder à sua denúncia com antecedência não inferior a 120 dias do termo
pretendido.
Quanto aos contratos de duração ilimitada, estabelecem-se limites à
faculdade de denúncia do senhorio, que está vedada nos seguintes casos: (I)
quando o arrendatário tiver 65 anos de idade, (II) ou, independentemente da
25
Nos termos do NRAU, a denominação é respetivamente, contratos com prazo certo e contratos
de duração indeterminada. 26
É o regime que resulta da conjugação dos artigos 26º e 9º da NRAU e dos artigos 1054º nº1,
1097º e 1098º do Código Civil.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 22
idade, quando se encontre numa situação de reforma por invalidez,27 (III)
quando sofra de incapacidade total para o trabalho ou seja portador de
deficiência superior a dois terços e, ainda, (IV) nas situações em que, o
arrendatário ou o seu cônjuge, que beneficiou da transmissão do
arrendamento, se encontre no local arrendado há mais de 30 anos28.
Mais acresce, o fato do senhorio não poder exercer a faculdade de
denúncia prevista no artigo na alínea c) do artigo 1101º29 do Código Civil,
ficando, por conseguinte, limitado à denúncia do contrato nos casos em que
invoque a necessidade de habitação para si próprio ou para descendentes em
1º grau, ou, quando esteja em cauda a demolição ou realização de obras de
restauro profundo no imóvel 30. Nestas situações o senhorio fica sujeito ao
pagamento de uma indemnização equivalente a um ano de rendas calculadas
de acordo com os critérios estabelecidos para a sua actualização.
Estas limitações desaparecem quando se verifique a transmissão mortis
causa do contrato de arrendamento para filho ou enteado, ocorrida após a
entrada em vigor da presente lei.
A atualização de rendas
Tendo como objectivo a actualização das rendas antigas para valores de
mercado, o NRAU estabelece para os contratos celebrados antes da entrada
em vigor do RAU, um sistema baseado em dois critérios: a avaliação fiscal do
imóvel e o seu nível de conservação. Por outro lado, estabelece-se um limite
máximo para o valor da renda atualizada, cujo valor anual não poderá exceder
4 % do valor patrimonial do locado.
A fórmula de cálculo da renda resulta de um conjunto de operações: em
primeiro lugar opera-se a multiplicação do valor fiscal do imóvel pelo seu
coeficiente de conservação; depois, este produto é multiplicado pelo limite
máximo de actualização, isto é 4 %; finalmente, divide-se este valor por doze
para obter o valor mensal da renda.
27
Contempla situações de invalidez absoluta e ainda casos em que beneficia de pensão de
invalidez. 28
Mantêm-se assim em vigor as limitações ao direito de denúncia anteriormente previstas no
artigo 107º do RAU. 29
Denúncia efectuada com um pré-aviso de 5 anos sem necessidade de invocar uma justificação. 30
Nos termos da alínea b) do artigo 1101º e do artigo 1102º do Código Civil.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 23
O processo de actualização especial é progressivo, regra geral, durante
um período de 5 anos, podendo apenas em situações específicas ser de 10
anos, quando o arrendatário tenha idade igual ou superior a 65 anos ou, seja
portador de deficiência com grau de incapacidade superior a 60 %, ou ainda,
quando aufere um rendimento anual bruto inferior a 5 RMNA31.
A aplicação deste último critério para um período de faseamento alargado
diz respeito ao Rendimento Anual Bruto Corrigido do ano civil anterior ao da
comunicação, cabendo ao arrendatário o ónus da prova do seu rendimento
anual32. Por outro lado, qualquer alteração de circunstância relativa ao
rendimento do arrendatário deverá ser comunicada ao senhorio, que poderá
alterar o período de faseamento das rendas33.
Esta actualização de rendas tem um teto máximo de 50 euros mensais no
primeiro ano e de 75 Euros nos segundo a nonos ano, salvo se este valor for
inferior ao que resultaria da actualização anual, caso em que é este o valor
aplicável.
Porém, esta atualização gradual pode ser reduzida para um período de
dois anos em duas circunstâncias: sempre que o arrendatário aufira
rendimentos superiores a 15 RMNA mas não possua idade igual ou superior a
65 anos nem sofra de deficiência com grau de incapacidade superior a 60% e
ainda nas situações em que o arrendatário não tenha no locado habitação
permanente34.
Assim, para proceder à atualização especial da renda, o senhorio deve
dispor da avaliação do imóvel efetuada há menos de 3 anos pelas Finanças e
da determinação do nível de conservação do imóvel, realizada pela CAM35, que
deve pelo menos ser classificado de “médio”. Com estes elementos, cumpre ao
senhorio comunicar ao arrendatário a intenção de actualizar a renda,
acompanhada de cópia do resultado da avaliação do local arrendado e da
determinação do seu nível de conservação; o valor do Rendimento Anual Bruto
Corrigido36 fixado para aquele ano e a indicação ao arrendatário de que dispõe
31
Retribuição Mínima Nacional Anual 32
O arrendatário deve, na sua resposta, enviar o documento comprovativo emitido pelos serviços
das finanças competentes. 33
Ao abrigo do artigo 47º do NRAU. 34
De acordo com o artigo 45º NRAU. 35
As Comissões Arbitrais Municipais são entidades oficiais não judiciárias com autonomia
funcional, desempenhando funções administrativas e decisórias. 36
Vide Decreto Lei 158/2006 de 8 de Agosto que estabelece os regimes de determinação do
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 24
de 40 dias para invocar alguma das circunstâncias previstas no nº 3 do artigo
37º NRAU. O arrendatário dispõe de 40 dias para responder, podendo invocar
alguma das circunstâncias previstas na lei para alargamento do período de
actualização e, ainda, caso não concorde com a avaliação fiscal, requerer uma
nova avaliação fiscal ou em alternativa proceder à denúncia do contrato. Neste
caso, o arrendatário terá 6 meses para desocupar o imóvel, mas tem direito a
ser indemnizado pelo valor das benfeitorias que realizou no locado. Acresce
que o Senhorio tem o dever de comunicar às finanças o plano faseado de
atualização das rendas ou sua intenção de não atualizar.
Tendo em conta que o processo de atualização extraordinária das rendas
pode implicar para o arrendatário um esforço económico incomportável,
particularmente nos últimos anos de actualização, a lei prevê a atribuição de
um subsídio de renda37 com base em dois critérios, o rendimento e a idade do
arrendatário. A lei prevê ainda uma taxa de esforço do arrendatário de acordo
com os períodos de faseamento da actualização das rendas e um limite
máximo para o subsídio, que não poderá ultrapassar o montante estabelecido
para a Retribuição Mínima Mensal Garantida.
No que toca às rendas relativas aos contratos posteriores à entrada em
vigor do RAU, o NRAU38 mantém como critério supletivo de atualização anual,
o valor da inflação, cujo coeficiente é publicado anualmente. O senhorio
deverá comunicar ao arrendatário a intenção de atualização com antecedência
de 30 dias.
Ora, da análise destas normas relativas à atualização extraordinária de
rendas, não esquecendo que o objetivo do legislador era repor a justiça no
domínio das rendas antigas, equiparando-as aos valores de mercado, podemos
concluir que o período geral de cinco ano é muito extenso, até porque durante
este período as rendas não poderão ser alvo de uma atualização regular de
acordo com a taxa de inflação, pelo que dificilmente se conseguirá a
equiparação aos valores de mercado. Quanto ao período alargado de 10 anos,
a lei continua a impor sobre os proprietários o esforço de solidariedade social
que deveria caber a toda a sociedade em geral e portanto, incumbir ao Estado.
Rendimento Anual Bruto Corrigido e de Atribuição do Subsídio de Renda. 37
Nos termos do Decreto Lei 158/2006 de 8 de Agosto, o RABC é o somatório dos rendimentos
ilíquidos dos membros do agregado familiar do arrendatário corrigido com recurso a alguns factores,
nomeadamente, o número de pessoas que vivem com o arrendatário e o número de dependentes.O
diploma fixa uma taxa de esforço a partir da qual o arrendatário terá direito à atribuição de subsidio. 38
Prevê no seu artigo 24º.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 25
Acresce que, o valor patrimonial do imóvel que serve de critério à atualização,
não corresponde ao seu valor de mercado e, dado o baixo valor de rendas
praticado, a actualização extraordinária não repõe o valor real da renda.
Finalmente, em termos práticos, o mecanismo de atualização
extraordinário de rendas pressupõe um investimento inicial do senhorio em
matéria de obras, tendo em conta que as rendas mais antigas correspondem a
imóveis com maiores problemas de conservação, os quais dificilmente serão
avaliados com o nível 3. Ora, este investimento só poderá ser rentabilizado ao
fim de 5 ou 10 anos, o que se afigura claramente desproporcionado. Por outro
lado, tendo em conta a obrigação legal do senhorio de proceder a obras de
conservação num período de 8 anos, muitas das vezes é exigido um novo
investimento no imóvel, sem que o investimento anterior esteja minimamente
amortizado.
Por estas razões, o recurso aos mecanismos de actualização
extraordinária de rendas não foi expressivo, mantendo-se em vigor um grande
número de rendas desajustadas, com todos os prejuízos que isto implica, em
especial no que toca à degradação dos imóveis.
O Depósito de Rendas
O arrendatário pode proceder ao depósito das rendas39, sempre que lhe
seja permitido fazer cessar a mora por falta de pagamento40
, quando esteja
pendente uma acção de despejo e quando ocorram os pressupostos da
consignação em depósito.41.
O depósito deverá ser efetuado em qualquer instituição de crédito, à
ordem do tribunal competente da situação do prédio e deve ser comunicado ao
senhorio, ou, quando esteja pendente uma acção de despejo, a junção das
guias de depósito são equiparadas à referida comunicação. Enquanto as
causas que fundamentaram a consignação em depósito se mantiverem, o
arrendatário poderá continuar a efetuar o depósito da renda sem necessidade
39
A possibilidade de depositar das rendas é extensível às despesas ou outros encargos que sejam
imputáveis ao arrendatário. 40
Nos termos do nº 2 do artigo 1041 do Código Civil 41
Nas situações em que o arrendatário não puder efetuar o pagamento da renda por razões que
não lhe são imputáveis; por motivos de segurança relacionados com o senhorio, ou ainda, quando o
senhorio se encontre em mora, designadamente, por se recusar a receber a renda.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 26
de comunicação subsequente ao senhorio.
Quanto à impugnação do depósito, o NRAU vem alargar o prazo de que
dispõe o senhorio para apresentar a sua resposta para 20 dias. Uma vez
impugnado o depósito, o senhorio só pode levantar o montante depositado
após decisão judicial.
Quanto às benfeitorias
O direito a benfeitorias, de acordo com o regime estabelecido para o
possuidor de boa fé, é atribuído ao arrendatário habitacional cujo contrato
tenha sido celebrado antes da entrada em vigor do RAU e aos contratos não
habitacionais celebrados antes do Decreto Lei 257/95 de 30 de Setembro. A
norma aplica-se mesmo que as partes tenham acordado que a realização de
obras não daria lugar ao pagamento de indemnização, isto porque estes
contratos estão agora sujeitos a um regime de atualização especial de rendas
não previsto pelas partes, o que configura uma alteração das circunstâncias.
No caso de cessação do contrato, em virtude da atualização especial das
rendas, o arrendatário tem direito a ser indemnizado pelas benfeitorias
necessárias, direito a levantar as benfeitorias úteis, desde que tal não implique
a deterioração do locado, ou, em alternativa, ser indemnizado nos termos do
enriquecimento sem causa e finalmente direito a levantar as benfeitorias
voluptuárias se tal for possível. Assim, independentemente do estipulado no
contrato, este regime aplica-se às situações em que, na sequência do processo
de actualização de rendas, o arrendatário denuncia o contrato42 e quando
ocorra a cessação do contrato de arrendamento não habitacionais em virtude
de trespasse ou locação de estabelecimento já após a entrada em vigor do
NRAU, ou ainda, quando o arrendatário é uma sociedade e ocorre a
transmissão de posições sociais que implique a alteração da titularidade em
mais de 50%.
As Obras Coercivas43
42
Nos termos do nº 5 do artigo 37º do NRAU a resposta do arrendatário no seguimento da actualização
faseada de rendas prevista nos artigos 39º,40º e 41º do NRAU 43
Regulado no Decreto lei 157/2006 de 8 de Agosto que estabelece o regime jurídico das obras
em prédio arrendados, ao abrigo da autorização legislativa estabelecida na alia a) do nº1 do artigo 63º da
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 27
Cabe ao senhorio proceder às obras de conservação e beneficiação do
imóvel, estando o direito de atualização de rendas dependente do
cumprimento desta obrigação. Quando o senhorio não efectuar as obras de
conservação, o NRAU permite que o arrendatário solicite a intervenção de uma
Comissão Arbitral Municipal (CAM)44 com vista a determinar o coeficiente de
conservação do imóvel. Sempre que o nível de conservação seja inferior a 3,
isto é, considerado mau ou muito mau, o arrendatário pode instar o senhorio
a realizar as obras necessárias à conservação do imóvel. Decorridos seis
meses, no caso do senhorio não iniciar as obras, o NRAU prevê que o
arrendatário possa optar por uma de quatro hipóteses: (I) realizar ele próprio
as obras, notificando o senhorio e a CAM; (II) solicitar à Câmara Municipal a
realização de obras coercivas, (II) resolver o contrato quando o estado de
conservação do imóvel ponha em causas as suas condições de habitabilidade45
e (IV) comprar o locado, pelo valor que resulta da avaliação realizada nos
termos do CIMI, com obrigação de executar as obras sob pena de reversão.
Quanto à primeira hipótese, o arrendatário pode realizar ele próprio as
obras46, mas deve comunicar a sua intenção ao senhorio e à Câmara
Municipal, podendo depois efectuar a compensação do valor das obras nas
rendas.
Quando à quarta opção47, após intimar o senhorio para a realização das
obras e tendo decorrido seis meses sem que este as tenha iniciado e após
solicitar à Câmara Municipal a realização de obras coercivas e tendo decorrido
seis meses sem que a Câmara inicie as referidas obras, poderá então o
arrendatário comprar o locado pelo valor que resulta da sua avaliação fiscal48 e
assumir pessoalmente a realização das obras de conservação. Neste caso, o
Lei 6/2006. 44
Nos termos do artigo 48º do NRAU. De salientar que o funcionamento das CAM e a
regulamentação relativa aos encargos estão reguladas em diploma próprio. Esta regulamentação, vertida
no Decreto-Lei n.º 161/2006, de 8 de Agosto, prevê como principais competências da CAM: 1.Coordenar
o processo de determinação do coeficiente de conservação dos edifícios/locados, o qual tem reflexos na
renda a pagar; 2.Decidir as reclamações relativas à determinação do coeficiente de conservação; 3.
Decidir as questões levantadas por senhorios ou arrendatários relativas a obras a realizar no
locado, nomeadamente, quanto à responsabilidade, custo, compensações com o valor da renda,
necessidade de desocupação e adequação do realojamento, bem como da falta de utilização do locado
pelo arrendatário; 4.Informar os interessados acerca dos procedimentos relativos à actualização das
rendas; 5.Recolher e encaminhar informação relativa aos prédios arrendados no Município, de forma a
permitir a monitorização da aplicação prática do NRAU; 45
Neste caso ao abrigo do disposto no artigo 1083º do código Civil. 46
Nos termos do artigo 30º e seguintes do Decreto-Lei 157/2006 de 8 de Agosto 47
Prevista no artigo 35º e seguintes do Decreto-Lei 157/2006 de 8 de Agosto 48
Nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis
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arrendatário fica vinculado à realização das obras sob pena de reversão da
compra do locado. O direito de compra do locado deverá ser exercido
judicialmente, dispondo o arrendatário do prazo de 3 anos para intentar a
competente acção.
Esta solução configura uma verdadeira aquisição forçada e apresentando
problemas de compatibilização com o direito de propriedade
constitucionalmente garantido. Ainda assim, o direito de propriedade admite
limitações de natureza pública, designadamente, os institutos jurídicos da
requisição e da expropriação por utilidade pública. Ora, se por um lado o
NRAU pretendeu com esta solução promover a regeneração urbana e a
necessidade de requalificação do património urbano, por outro, deixa no
domínio da vontade do particular, neste caso, do arrendatário, a possibilidade
de acionar medidas que pretendem prosseguir o interesse público. E, nesta
medida, a venda forçada do imóvel por falta de cumprimento dos deveres de
manutenção do senhorio não pode deixar de levantar dúvidas de
constitucionalidade.49
Acresce que, esta solução pode suscitar ainda outro tipo de problemas,
no caso do imóvel não estar constituído em propriedade horizontal, como
poderá o arrendatário exercer esta prerrogativa.
Outra questão prende-se com o facto de alguma jurisprudência50 ter
declarado situações em que o senhorio foi isento da realização de obras
quando o valor das rendas é muito baixo, tornando, desproporcional o custo
das obras face ao rendimento obtido e podendo gerar situações de
endividamento do senhorio, situação esta que configura um verdadeiro abuso
de direito.
Na verdade, tendo em conta a situação resultante do congelamento de
rendas no mercado de arrendamento, o legislador não pode apenas tomar em
consideração a condição económica do arrendatário e ignorar a condição
económica do senhorio e o fato de este não dispor de meios para realizar as
obras de conservação.
49
Para Ricardo Nascimento, trata-se de uma verdadeira expropriação por utilidade particular,
vide artigo sobre “O (Novo) Regime do Arrendamento Urbano “, in Compilações Doutrinais, Verbo
Jurídico, Agosto, 2006. 50
Por exemplo no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16/12/2004, cujo relator foi
Oliveira Barros, disponível para consulta no endereço www.dgsi.pt.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 29
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 30
As Comissões Arbitrais Municipais
As CAM51, são entidades oficiais, não judiciárias com autonomia
funcional. Compete à CAM, entre outras funções, proceder à verificação dos
coeficientes de conservação dos prédios; acompanhar os processos de
avaliação; exercer arbitragem em questões relacionadas com obras,
designadamente quanto à responsabilidade, valor e forma como poderão ser
compensadas nas rendas e ainda situações em que o locado não está a ser
utilizado52. As decisões da CAM têm o valor jurídico equivalente às decisões
arbitrais pelo que poderão ser alvo de recurso para os tribunais de comarca.
Tendo em conta a natureza das suas competências, o bom
funcionamento das CAM é essencial para o sucesso de algumas das mais
importantes medidas do NRAU.
Sabemos que as CAM não desempenharam o papel que lhes estava
atribuído por lei, quer pela demora no seu processo de constituição, quer pela
falta de meios, porém, a verdade é que a grande maioria das CAM apenas
foram criadas formalmente não tendo, na prática, cumprido a sua missão.
Transmissão do Contrato de arrendamento
O NRAU operou uma alteração significativa ao regime jurídico da
transmissão do contrato de arrendamento por morte do arrendatário. O regime
transitório53, aplicável aos contratos de arrendamento celebrados antes e na
vigência do RAU, estabelece uma excepção à regra da caducidade do contrato
por morte do arrendatário a favor das pessoas previstas nos artigos 57º e 58
do NRAU. Em primeiro lugar aparece o cônjuge, sendo que a união de fato
goza da mesma proteção54, desaparecendo a imposição do prazo mínimo de
51
Cabe ao Decreto Lei 161/2006 de 8 de Agosto regular a composição, as competências e o
funcionamentos das Comissões Arbitrais Municipais. A sua composição conta com representantes dos
senhorios e dos inquilinos, quer dos inquilinos habitacionais, quer dos inquilinos não habitacionais,
representantes do Estado, quer ao nível local , quer ao nível dos serviços das finanças, representante da
Ordem dos Engenheiros, Ordem dos Arquitetos e da Ordem dos Advogados, entre outros elementos. 52
Excepto nas situações de força maior previstas nos artigos 45º e 56º do NRAU 53
Regime que resulta da remissão operada pelo artigo 26 nº2 para os artigos 57º e 58º do NRAU.
Os contratos celebrados após a entrada em vigor do NRAU são regulados pelo disposto nos artigos 116,
1107 e 1113 do Código Civil.
54 O conceito legal de união de fato estabelecido na Lei 7/2001 que regula as medidas de
proteção à união de fato, impõe uma vida em comum há pelo menos dois anos.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 31
vivência. Por outro lado, prevê-se que a transmissão possa ocorrer mais do
que uma vez, estabelecendo assim, um regime mais favorável que o previsto
no RAU55. Em contrapartida, reduziu a classe de sucessíveis ao eliminar as
pessoas que viviam com o arrendatário em economia comum, afins da linha
reta e os descendentes em segundo grau.
Em suma, a transmissão ocorre, de forma prioritária a favor do cônjuge
ou equiparado, ascendentes e filhos ou enteados.
55
Por exemplo, nos termos do nº 3 do artigo 57º do NRAU, quando a transmissão opera a favor dos
ascendentes, pode ocorrer a transmissão por morte entre eles.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 32
3.2.3.A Ação de Despejo
O NRAU procede a uma alteração profunda dos meios adjetivos da
cessação do contrato de arrendamento, quer no que toca à sua estrutura,
autonomizando a fase declarativa da fase executiva e criando mecanismos
extrajudiciais para determinadas situações de resolução do contrato por
iniciativa do senhorio, quer no que toca aos novos títulos executivos
extrajudiciais. A acção de despejo tem como objectivo proceder à cessação do
contrato de arrendamento, cabendo à acção executiva para entrega de coisa
certa a efectiva desocupação do locado.
Quanto à possibilidade de resolução extrajudicial por iniciativa do
senhorio, prevêem-se duas situações: (I) a mora superior a 3 meses no
pagamento das rendas encargos ou despesas e (II) a oposição do arrendatário
à realização de obras ordenadas por entidade pública. Nestas situações,
poderá o senhorio recorrer à notificação judicial avulsa para a resolução do
contrato de arredamento. O contrato de arrendamento e o comprovativo da
citação pessoal, efectuada pelo solicitador de execução e, ainda quando
aplicável, o comprovativo, emitido pela autoridade competente, da oposição à
realização de obra, constitui título executivo, não sendo necessário recorrer à
acção de despejo.
Nestes termos, a acção de despejo destina-se às situações em que o
senhorio, não dispondo de título executivo, pretende cessar o contrato de
arrendamento seja por incumprimento das obrigações e deveres legais do
arrendatário56, situações previstas no nº 2 do artigo 1083º do Código Civil, que
fundamentam a resolução por incumprimento grave que torna inexigível a
manutenção do contrato, seja em casos de denúncia57 .
Com o intuito de agilizar e tornar mais céleres os meios processuais, o
NRAU veio conferir força executiva a determinados documentos
cumulativamente com o contrato de arrendamento. Assim, no domínio da ação
executiva para entrega de coisa certa, prevêem-se seis novos titulo executivos
de natureza extrajudicial. As comunicações, referidas no artigo 15 º do NRAU,
que cumpram os requisitos legais, previstos nos artigos 9º e 10º do mesmo
diploma, passam a dispor, por força de disposição especial, de natureza
executiva. Por outro lado, no âmbito da ação executiva para o pagamento de
56
Ao abrigo do nº 1 do artigo 1083º do Código Civil. 57
Nos termos do artigo 1101º e das alíneas a) e b) do artigo 1103º do Código Civil.
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quantia certa, relativo ao pagamento de rendas, prevê-se um novo título
executivo que deverá acompanhar o contrato de arrendamento: a comunicação
efetuada pelo senhorio ao arrendatário do montante em dívida.
3.2.4. O regime do arrendamento Urbano no Código Civil
O Código Civil define o contrato de locação como o contrato pelo qual
uma das partes se obriga a proporcionar a outrém o gozo de uma coisa
mediante o pagamento de uma retribuição. O regime civil enuncia um
conjunto de disposições de natureza geral aplicáveis à locação,
nomeadamente, os direitos e deveres das partes58, o modo e lugar do
cumprimento da obrigação de pagamento da renda ou aluguer, as situações de
mora e as suas consequências, bem como a possibilidade do locatário fazer
cessar a mora, mesmo quando o locador se recuse a receber a renda, através
do depósito da renda59. Segue-se a regulamentação da obrigação de restituição
da coisa e a distribuição do risco pela perda ou deterioração da coisa60.
Em matéria de resolução contratual, assinalamos a possibilidade, por
parte do locador, de a fazer extrajudicialmente61. No caso do arrendamento, a
resolução estará sujeita a comunicação, através de notificação judicial avulsa,
ou citação pessoal, dispensando o recurso à ação de despejo em casos de mora
no pagamento de rendas, encargos ou outras despesas superior a três meses e
nas situações em que o arrendatário se opõe à realização de obras ordenadas
por entidade pública62. O arrendatário pode fazer caducar o direito à resolução
se proceder ao pagamento, depósito ou consignação em depósito dos
montantes em dívida acrescido de uma indemnização de 50% do valor devido,
porém só poderá exercer este direito uma vez no decurso do contrato.
No que concerne à caducidade do contrato, a nova redação do artigo
58
Nos artigos 1031º e seguintes do Código Civil. 59
Regulado nos artigos 17º a 23 da Lei 6/2006 de 27 de Fevereiro que aprova o NRAU, nos
termos dos quais, deixou de ser exigida a notificação judicial bastando uma comunicação do locatário ao
locador. 60
Nos termos dos artigos 1043º e seguintes do Código Civil. 61
De acordo com o artigo 1047º do Código Civil. 62
Ao abrigo do artigo 1048º do Código Civil
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1053º C.C. alarga para seis meses o prazo a partir do qual, verificadas as
causas de caducidade, pode ser exigido a restituição do imóvel.
No que toca à renovação do contrato, mantém-se o princípio da
renovação automática63 O Código Civil regula ainda as matérias da
transmissão da posição contratual no âmbito da locação64 e da sublocação65.
O regime específico dos arrendamentos urbanos previsto no Código Civil
é aplicável aos contratos celebrados após a entrada em vigor do NRAU, já que
os contratos de arrendamentos anteriores beneficiam das adaptações
reguladas no regime transitório.
O contrato de arrendamento está sujeito a forma escrita, sob pena de
nulidade,66 sempre que tenha duração superior a seis meses.
O NRAU admite, de forma expressa, a celebração de contratos de
arrendamento de duração limitada por período não inferior a 5 anos. Estes
contratos renovam-se automaticamente por períodos sucessivos de três anos,
se contratualmente não for previsto um prazo superior e se nenhuma das
partes se opuser á sua renovação67. Quanto aos contratos de duração
indeterminada, prevê-se a possibilidade das partes poderem exercer a
denúncia, no caso de ser o senhorio, nos termos do artigo 1101º do Código
Civil68, no caso de ser o arrendatário, nos termos do artigo 1100º do mesmo
diploma.
Para além do prazo, as outras menções obrigatórias do contrato de
arrendamento são reguladas em diploma especial69.
63
Nos termos dos artigos 1054º a 1056º do Código Civil. 64
Nos artigos 1057º a 1059º do Código Civil. 65
Previstas nos artigos 1060º a 1063º do Código Civil 66
Sendo-lhe aplicável o disposto nos artigos 220º e 285º do Código Civil. 67
A oposição à renovação por parte do senhorio, nos termos do artigo 1097º, deve cumprir um
período de pré-aviso de um ano, se a oposição for deduzida pelo arrendatário deve, nos termos do artigo
1098º respeitar um pré-aviso de 120 dias. A oposição deve ser comunicada através de carta, de acordo
com o artigo 9º da Lei 6/2006. 68
Nos termos do artigo 1101º do Código Civil, prevêem-se três situações que fundamentam a
denúncia, sendo que se possibilita a denúncia mesmo sem justa causa desde que feita mediante pré aviso
de 5 anos. Porém, esta possibilidade apenas é aplicável aos novos contratos, celebrados ao abrigo deste
novo regime. Quanto aos restantes contratos mantém-se a possibilidade de denúncia pelo senhorio se este
demonstrar ter necessidade de habitação própria ou dos seus descendentes em 1º grau, ou em caso de
demolição para realização de obras, mediante o pagamento de uma indemnização que não será inferior a 1
ano de rendas no primeiro caso e de dois anos de rendas no segundo caso. A denúncia deve ser exercida
através da acção de despejo com antecedência de 6 meses. 69
Decreto-lei 160/2006 de 8 de Agosto.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 35
Em relação ao uso do imóvel, o arrendatário, está obrigado a fazer uso do
mesmo para o fim acordado70. A lei determina que podem residir com o
arrendatário todas as pessoas que vivem com ele em economia comum71 e,
salvo cláusula em contrário, um máximo de três hóspedes. No que toca às
obrigações de manutenção do imóvel, as obras cabem ao senhorio, embora as
partes possam convencionar o contrário72. O arrendatário pode realizar obras
urgentes ou previamente autorizadas pelo senhorio73.
A regulamentação das rendas permite uma antecipação até três meses e
a possibilidade das partes caucionarem o cumprimento das obrigações,
designadamente, através do recurso à fiança, como garantia do cumprimento
da obrigação de pagamento de renda74. Consagra-se o princípio da liberdade de
estipulação em matéria de atualização do valor das rendas, prevendo-se como
critério supletivo o coeficiente estabelecido por portaria governamental. Igual
regime é estabelecido no que concerne às despesas e encargos, deixando às
partes liberdade de estipulação e prevendo como regime supletivo, no caso de
arrendamento de fração autónoma, que cabe ao senhorio o pagamento das
despesas relativas às partes comuns do edifício75.
Relativamente às formas de cessação do contrato de arrendamento, a lei
estipula regras de natureza imperativa, prevendo quatro formas de cessação:
(I) A cessação por acordo das partes, pode acontecer a qualquer momento
dando lugar à revogação do contrato.
(II) A resolução contratual, nos termos gerais de direito, pressupõe a
ocorrência de um incumprimento contratual, por qualquer um dos
contraentes, que pela sua gravidade, torne inexigível a manutenção do vínculo
contratual. A resolução por iniciativa do senhorio deverá ser fundamentada
70
Nos termos do artigo 1092 º do Código Civil, o arrendatário pode desenvolver actividade de
indústria doméstica, salvo se as partes excluíram esta possibilidade. 71
Referência da alínea a) do artigo 1093º do código Civil, o conceito de economia comum
abrange as pessoas em comunhão de vida, isto é, comunhão de mesa e de habitação. 72
Nos termos do artigo 1083º Código Civil, o não cumprimento desta obrigação, quando possa
colocar em causa a segurança e a habitabilidade do imóvel, constitui fundamento para a resolução do
contrato por parte do arrendatário. 73
Ao abrigo do artigo 29º da Lei 6/2006, salvo estipulação em contrário, o arrendatário tem
direito, no final do contrato, a ser indemnizado nos termos do possuidor de boa fé. 74
A mora superior a três meses da obrigação de pagar a renda pode ser fundamento para a
resolução extrajudicial do contrato de arrendamento, tal como está previsto no artigo 1084º do Código
Civil. 75
Nos termos do artigo 1078º do Código Civil, o pagamento de despesas relativas ao
fornecimento de bens relativos ao imóvel cabem ao arrendatário.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 36
numa justa causa76 e não carece de ser declarada judicialmente quando o
fundamento seja a mora superior a três meses no pagamento da renda, ou, a
oposição do arrendatário á realização de obras ordenadas por entidade
pública. Porém, nestas situações, o arrendatário pode fazer cessar a mora,
tendo três meses para o efeito. Nas restantes situações o senhorio pode
recorrer à acção de despejo para resolver o contrato.77.
(III) Quanto à denúncia, que se consubstancia numa declaração de uma
das partes de que não pretende manter o contrato, deverá ser comunicada à
outra parte no prazo fixado pela lei 78.
(IV) Finalmente, a caducidade faz cessar o contrato pela verificação de um
fato a que lei atribui essa consequência79 e sem necessidade de qualquer
declaração das partes.
Cessando o contrato, sem que o arrendatário desocupe o imóvel, o
senhorio que detenha um título executivo80 pode socorrer-se da acção
executiva para entrega de coisa certa, embora se não tiver título (contrato),
tem que recorrer previamente à acção de despejo. Não podemos deixar de
sublinhar que nos termos do NRAU, em caso de resolução do contrato por
falta de pagamento das rendas, o arrendatário tem 3 meses para desocupar o
imóvel, enquanto que nos casos de caducidade tem seis meses para o efeito.
O Código Civil vem alterar a regulamentação do direito de preferência do
arrendatário na venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais
de 3 anos, abrangendo quer os contratos por tempo indeterminado, quer os
contratos com prazo certo. Confere-lhe, ainda, este direito, na celebração de
outro contrato de arrendamento quando, caducado o seu contrato, o senhorio
pretenda nos 6 meses subsequentes voltar a arrendar o imóvel.
76
O artigo 1083º do Código Civil apresenta uma enumeração de causas, não taxativa, que podem
levar o senhorio ou o arrendatário a resolver o contrato. Para além destas causas poderão ser invocadas
outras desde que preencham a cláusula geral, isto é, que pela sua gravidade torne inexigível a manutenção
do contrato. 77
Nos termos do artigo 1085º do Código Civil, o direito à resolução contratual caduca um ano
após a ocorrência do fato que a fundamenta. 78
Nos termos dos artigos 1098º, 1099º, e 1104º do Código Civil. 79
Vide artigo 1051º do Código Civil 80
Previsto no artigo 15º da Lei 6/2006.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 37
3.3. Arrendamento não habitacional
O NRAU optou por uniformizar a disciplina jurídica dos arrendamentos
não habitacionais, embora contenha disposições especialmente destinadas aos
arrendamentos para o comércio, para indústria ou para exercício de profissão
liberal. O regime do arrendamento urbano para fins não habitacionais aplica-
se aos arrendamentos de terrenos rústicos que não estão sujeitos a regime
especial81, nomeadamente, os terrenos para prática desportiva, feiras, ou,
exposições.
Consagra-se o princípio da liberdade de estipulação das partes em
matérias fundamentais, como por exemplo, em relação ao prazo de vigência do
contrato ou ao regime de denuncia e de oposição à renovação, estabelecendo
como regra supletiva, ou seja, na falta de convenção das partes, que o
contrato foi celebrado por um prazo de 10 anos e que o direito à denúncia não
pode ser exercido antes de decorrido um ano. Aplicam-se, ainda,
subsidiariamente, as regras estabelecidas para o arrendamento habitacional.
Por outro lado, passa a vigorar a regra segundo a qual qualquer uma das
partes pode resolver o contrato com base no incumprimento que pela sua
gravidade, torne inexigível a manutenção da relação contratual. A mora no
pagamento de rendas ou outros encargos, superior a três meses, ou a oposição
do arrendatário à realização de obras, passa a constituir fundamento de
resolução do contrato sem que seja necessário o recurso à acção de despejo.
No que diz respeito à actualização das rendas, no arrendamento não
habitacional, o critério tem por base a avaliação fiscal do imóvel82 .
Nas actualizações extraordinárias, o NRAU estabelece um regime faseado
de 10 anos,83 (I) quando o arrendatário é uma micro-empresa ou uma pessoa
singular; (II) quando o arrendatário tenha sido adquirido por trespasse o
estabelecimento há menos de 5 anos; (III) nos casos em que o estabelecimento
se situe numa área crítica de recuperação, reconversão urbanística; (IV) ou
quando a actividade exercida no locado tenha sido classificada de interesse
nacional ou municipal.
81
O regime jurídico do arrendamento rural, consagrado no Decreto Lei 385/88 de 25 de Outubro
e o regime jurídico do arrendamento florestal, previsto no Decreto Lei 394/88 de 8 de Novembro 82
Nos termos do artigo 52º NRAU. 83
De acordo com o artigo 53º NRAU.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 38
Nas restantes situações, o faseamento será de 5 anos.
Porém, o senhorio poderá proceder á actualização imediata da renda nas
seguintes situações; (I) quando o estabelecimento estiver fechado, salvo motivo
de força maior, ou, ausência forçada84; (II) quando o estabelecimento tenha
sido alvo de trespasse ou de locação, após a entrada em vigor do NRAU; (III)
quando ocorra alteração de controlo da sociedade arrendatária por
transmissão de posições sociais.
A locação de estabelecimento comercial, com natureza temporária, antes
designada por cessão de exploração de estabelecimento comercial, embora não
careça de autorização, passou a estar sujeita a comunicação ao senhorio no
prazo máximo de um mês. Esta comunicação deve ser efetuada por carta
registada com aviso de receção85.De sublinhar que a locação de
estabelecimento realizada após a entrada em vigor do NRAU, confere ao
senhorio o direito de denunciar o contrato86 com pré-aviso de 5 anos e
proceder à atualização87 imediata da renda.
No que toca à transferência definitiva do direito de gozo e exploração do
estabelecimento para outrém que continue a exercer a mesma actividade, ou
seja, o trespasse88, a lei não exige a autorização do senhorio, mas obriga a que
lhe seja comunicada no prazo de 15 dias através de carta registada com aviso
de receção89 para efeitos do exercício do direito de preferência.
Relativamente aos contratos celebrados antes de Setembro de 1995, a
cessação do contrato que seja motivada por trespasse, locação de
estabelecimento ou por alteração de mais de 50% do capital social da
sociedade arrendatária, confere ao arrendatário o direito a compensação pelas
obras realizadas.
84
Nas situações em que o estabelecimento se encontra fechado devido a motivo de força maior ou
ausência forçada por prazo inferior a dois anos aplica-se o disposto no nº 3 do artigo 45 do NRAU. 85
De acordo com os autores da obra “Novo Regime do Arrendamento Urbano - Notas práticas” ,
por precaução deve ser observada a forma prevista no artigo 9º da Lei 6/2006 . 86
Ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 1101º do Código Civil conjugado com os artigos
26º nº6 e 28 º da Lei 6/2006. 87
Nos termos da alínea b) artigo 56 da Lei 6/2006. 88
Consiste na transmissão definitiva da posição do arrendatário acompanhada da transmissão de
todos os instrumentos e mercadorias, bem como do aviamento da empresa e de outros elementos
necessários para a continuação da prossecução da mesma actividade. 89
É o que resulta da alínea g) do artigo 1038º Código Civil, sob pena do senhorio poder resolver
o contrato nos termos da alínea e) do nº2 do artigo 1083º do Código Civil.. A forma deverá ser a prevista
no artigo 9 da Lei 6/2006.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 39
No domínio da realização de obras, vigora o princípio da liberdade de
estipulação, porém, na falta de acordo, cabe ao senhorio realizar as obras de
conservação com vista a manter o locado apto para o fim a que se destina. Se
o senhorio não cumprir as suas obrigações pode o arrendatário realizar as
obras exigidas por lei e as que forem necessárias para prevenir danos. O
arrendatário pode resolver o contrato se o senhorio não cumprir as obrigações
de conservação do locado e ficarem comprometidas as condições do mesmo
para o fim a que se destina, tendo ainda direito a ser indemnizado pelas obras
que licitamente realizou no imóvel. 90
Quanto à renovação dos contratos, o regime transitório estipula que, nos
contratos de duração limitada celebrados após Setembro de 1995, opera-se a
renovação automática por um período de 5 anos, na primeira vez, seguida de
períodos de 3 anos. Nos contratos de duração ilimitada, o senhorio só poderá
efectuar denúncia, vinculada aos fundamentos legalmente previstos, com
antecedência de 5 anos.
Por fim, no que toca à transmissão por morte e para os contratos
anteriores á entrada em vigor do NRAU, apenas se prevê as situações de
transmissão por morte do direito de arrendamento quando o sucessor explore
em comum o estabelecimento há mais de 3 anos, e manifeste ao senhorio a
intenção de continuar a sua exploração. Por sua vez, os novos contratos,
celebrados já na vigência do NRAU, não caducam por morte do arrendatário,
cabendo aos sucessores renunciar à transmissão do arrendamento e
comunicar a morte do arrendatário primitivo no prazo de 3 meses a contar do
óbito.
Não podemos deixar de salientar que o regime jurídico relativo ao
arrendamento não habitacional e, em particular, a questão relacionada com o
congelamento das rendas comerciais, designadamente, a imposição do sistema
progressivo de actualização é manifestamente infundado. Estamos perante
uma situação em que o senhorio se vê obrigado a investir em negócio alheio. A
manutenção de rendas antigas muito abaixo de valor real constitui não só
uma distorção da concorrência como também um entrave à conservação do
parque imobiliário do País, em especial em zonas centrais das cidades e vilas
portuguesas.
90 vide Decreto Lei 157/2006 de 8 de Agosto.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 40
3.4. Apreciação Critica
Pensamos que o NRAU falhou no que toca a um dos seus principais
objectivos, o de repor a justiça relativamente ao valor das rendas antigas.
Na verdade, o NRAU impõe um sistema de actualização de rendas assente
em dois pressupostos questionáveis, por um lado, assenta num investimento
prévio do senhorio que só a muito longo prazo poderá rentabilizar, por outro,
impõe um sistema burocratizado que depende do funcionamento das CAM e
do estabelecimento de um coeficiente de conservação que assenta num
processo moroso e pouco eficiente. As CAM não dispõem de meios que lhes
permitam cumprir as suas atribuições, na medida em que, na grande maioria
dos casos, apenas foram criadas formalmente não tendo, na prática, cumprido
a sua missão.
Desta forma, o NRAU acabou por contribuir para o aumento do Imposto
Municipal sobre Imóveis sem que tal aumento se possa fazer repercutir no
valor da renda.
Quanto aos limites impostos à correção das rendas antigas e ao
alargamento do prazo para dez anos para atualização faseada, com base no
Rendimento Anual Bruto Corrigido do Arrendatário, consideramos não ser o
mais adequado porque ignora o rendimento do agregado familiar, gerando
situações de manifesta injustiça sempre que o agregado familiar tenha
rendimento elevados mas o arrendatário aufira baixos rendimentos. Situação
idêntica passa-se quanto ao critério da idade do arrendatário, que mesmo
tendo uma excelente situação patrimonial é beneficiado com um período de
dez anos, desde que, tenha idade superior a 65 anos. Estas situações, fazem
recair sobre o senhorio um esforço de solidariedade social que deveria ser o
Estado a suportar.
Ora, tendo em conta a situação resultante do congelamento de rendas no
mercado de arrendamento, o legislador não pode apenas tomar em
consideração a condição económica do arrendatário e ignorar a do senhorio,
designadamente o fato de este não dispor de meios para realizar as obras de
conservação necessárias.
Acresce que na nossa opinião, o congelamento de rendas permanece,
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 41
quer no âmbito dos arrendamentos habitacionais, quer no domínio dos
arrendamentos comerciais, não se vislumbrando qualquer razão que possa
sustentar a continuação desta situação O senhorio acaba por estar a financiar
um negócio alheio, contribuindo para uma distorção às regras do mercado.
Por outro lado, a manutenção do caráter vinculístico do arrendamento
em nada contribui para a dinamização do mercado. A imposição do prazo de
cinco anos como termo para o contrato de arrendamento, ou, as situações de
transmissão forçada do contrato, não são compatíveis com a dinâmica do
mercado.
Por fim, a ineficácia comprovada dos meios adjetivos, que não conferem a
segurança e confiança necessárias ao mercado de arrendamento.
A estes constrangimentos soma-se um enquadramento fiscal que penaliza
os rendimentos provenientes do arrendamento.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 42
3.5. Legislação e regulamentos relevantes para o mercado de arrendamento
3.5.1. Decreto-Lei 156/2006 de 8 de Agosto, aprova o Regime de Determinação e
Verificação do Coeficiente de Conservação
O NRAU estabelece como pressuposto de atualização das rendas antigas
a determinação do nível de conservação do locado. Assim, este diploma vem
regulamentar o método de avaliação com vista a determinar o nível de
conservação dos imóveis, construídos há mais de 10 anos.
O pedido de avaliação, dirigido à Comissão Arbitral Municipal, pode ser
efectuado pelo proprietário, usufrutuário, superficiário, ou, ainda, pelo
arrendatário no caso dos contratos antigos. Tal direito permite ao
arrendatário, em caso de inércia do senhorio e verificando-se que o locado se
encontra no estado de mau ou péssimo, lançar mão das prerrogativas que lhe
decorrem do disposto no artigo 48.º das normas transitórias da Lei 6/2006, de
27 de Fevereiro.
Quando a CAM não esteja constituída cabe à Câmara Municipal
determinar o nível de conservação do locado.
As vistorias são efetuadas por um engenheiro ou por um arquitecto,
sorteado por forma a garantir a imparcialidade do processo, cabendo-lhes
analisar os vários elementos do prédio e avaliar o seu estado de conservação.
Porém, a lei prevê a possibilidade das partes, por comum acordo,
dispensarem a determinação do nível de conservação, entendendo que o
locado se encontra num bom estado de conservação e podendo assim
simplificar o processo de atualização das rendas antigas, mas, neste caso, o
coeficiente de atualização só poderá ser de 0,9.
Sem prejuízo do supra referido, pode ainda ser dispensada a
determinação do nível de conservação, quando o senhorio entenda que o
prédio se encontra em estado de conservação bom ou excelente. Nestes casos
entrega na CAM comunicação de que vai proceder à atualização da renda, e do
nível de conservação em que avalia o imóvel. Contudo, e no uso desta
faculdade, apenas poderá atualizar a renda aplicando o coeficiente de
conservação 0,9, correspondente ao nível de conservação 3.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 43
O arrendatário poderá reagir a esta pretensão alegando que o estado de
conservação é mau ou péssimo, caso em que o senhorio deverá solicitar à CAM
a determinação do nível de conservação, aplicando-se à nova renda o
coeficiente que resultar da determinação efectuada.
A lei prevê 5 níveis de conservação correspondendo o nível 1 ao estado
péssimo de conservação e o nível 5 ao estado excelente91, sendo que sempre
que o imóvel seja classificado com o estado mau ou péssimo a renda não
poderá ser atualizada.
Quando um imóvel é classificado com o nível 1, cabe à CAM determinar
se o prédio pode ser reabilitado, ou, no caso de representar perigo para a
segurança ou saúde pública, se deve ser demolido por não ser tecnicamente
possível a sua reabilitação.
3.5.2. Decreto-Lei 157/2006 de 8 de Agosto, aprova o Regime Jurídico das Obras em
Prédios Arrendados
Este diploma vem regulamentar o regime de obras relativo aos contratos
antigos e aos contratos novos celebrados após a entrada em vigor do NRAU,
designadamente a realização de obras coercivas pelos municípios.
No que concerne aos contratos antigos (celebrados antes da entrada em
vigor do RAU e os não habitacionais celebrados antes da entrada em vigor do
Decreto-Lei257/95 de 30 de Setembro), regulamenta as obras efetuadas pelo
senhorio que impliquem a desocupação do locado, prevendo-se a suspensão,
ou a denúncia do contrato que tem sempre como contrapartida a obrigação de
realojamento do arrendatário.
Quanto à intervenção do arrendatário, prevê-se a possibilidade de efetuar
obras com vista a evitar a degradação do imóvel e obter posteriormente a
compensação no valor da renda. Com o objectivo de combater a degradação
urbana, este diploma vem regular, ainda, a possibilidade do arrendatário vir a
91
Estado de conservação
Níveis Coeficientes
Excelente 5 1,2
Bom 4 1
Médio 3 0,9
Mau 2 0,7
Péssimo 1 0,5
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 44
adquirir a propriedade pelo valor da avaliação efetuada nos termos do Código
do Imposto Municipal de Imóveis, sempre que o estado de conservação do
locado seja classificado de mau ou péssimo e, quer o proprietário quer o
Município, instado a realizarem obras de reabilitação do imóvel degradado,
não o tenham feito.
De realçar que o exercício do direito de aquisição por parte do
arrendatário obriga-o a reabilitar o imóvel e a mantê-lo, pelo menos, no estado
de conservação médio, durante os vinte anos subsequentes à aquisição.
No que toca aos contratos celebrados após a entrada em vigor do RAU, o
senhorio pode denunciar o contrato com vista à realização de obras de
remodelação e restauro profundo mediante o pagamento de uma indemnização
não inferior a dois anos de renda, ou, em alternativa e em caso de acordo com
o arrendatário, proceder ao seu realojamento.
Finalmente, quanto às obras coercivas, o município só pode proceder ao
despejo administrativo após o realojamento do arrendatário. O arrendatário
deverá proceder ao depósito das rendas, cujo valor correspondente a 50%
reverte a favor do município.
3.5.3. Decreto-Lei 158/2006 de 8 de Agosto, aprova os Regimes da Determinação do
Rendimento Anual Bruto Corrigido e a atribuição do Subsídio de Renda nos
arrendamentos para habitação
Este diploma é de fundamental importância para os arrendatários de
rendimentos mais débeis, pois o valor do Rendimento Anual Bruto Corrigido
(RABC) do respectivo agregado familiar é, além de determinante para o
faseamento da actualização da renda, fundamental para possibilitar o acesso
ao subsídio de renda.
O NRAU prevê um período padrão de 5 anos para a atualização de rendas
antigas, um período alargado de 10 anos para as situações em que o
arrendatário comprove que o seu rendimento anual bruto corrigido é inferior a
cinco retribuições mínimas nacionais anuais e um período mais curto de 2
anos, nas situações em que o RABC do arrendatário é superior a 15 RMNA.
Assim, o legislador estabeleceu critérios e limites para atualização
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 45
extraordinária das rendas. Ora, um dos critérios utilizados para a
determinação do período de faseamento da atualização das rendas é ao RABC.
Este conceito também é relevante para a atribuição do subsídio de rendas aos
arrendatários mais carenciados, tendo em vista evitar ruturas sociais e no
sentido de assegurar o direito à habitação.
Este diploma adota, por razões de coerência jurídica e de respeito pelo
princípio de igualdade de tratamento, os mesmos critérios fiscais para definir
o conceito de agregado familiar. Fazem parte do agregado familiar do
arrendatário, desde que com ele vivam em comunhão de habitação, o cônjuge,
os dependentes, a pessoa que com ele viva em união de há mais de 2 anos e
restantes dependentes, ascendentes do arrendatário, do cônjuge ou da pessoa
com quem vive em união de fato. São considerados como dependentes os
filhos, adotados e enteados menores e ainda os menores sob tutela que não
tendo idade superior a 25 anos, frequente escolaridade e não tenham
rendimentos superiores à retribuição mínima mensal garantida.
Depois de definir o conceito de dependente o diploma passa a enunciar a
noção de rendimento anual bruto do agregado familiar, de acordo com o
Código IRS92, que corresponde à soma dos rendimentos anuais ilíquidos
auferidos por todos os elementos do agregado familiar.
Porém, a lei elegeu um fator com vista a proceder a uma correção deste
rendimento para o tornar mais justo e consentâneo com a realidade sócio-
económica do arrendatário. O fator que é ponderado é o número de pessoas
que vivam em comunhão no agregado familiar há mais de um ano, devendo
deduzir-se 0,5 do RMNA por cada pessoa dependente ou pessoa portadora de
incapacidade superior a 60%. O produto desta operação constitui o RABC
(Rendimento Anual Bruto Corrigido)do agregado familiar do arrendatário.
Quanto ao subsídio de renda, estabelece-se como limite máximo o valor
da retribuição mínima mensal garantida. O pedido de atribuição do subsídio é
instruído perante os serviços de Segurança Social da área de residência do
arrendatário e a decisão é tomada pelo Instituto Nacional da Habitação no
prazo de 45 dias. Têm direito a um subsídio de renda os arrendatários cujo
agregado familiar recebe um RABC inferior a 3 RMNA, ou o arrendatário que
tenha idade igual ou superior a 65 anos e cujo agregado obtenha um
rendimento inferior a 5 RMNA.
92 Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 46
O subsídio é concedido por um período de 12 meses, sendo renovável
tendo em conta o aumento de renda. O arrendatário tem a obrigação de
comunicar qualquer alteração de circunstâncias relevantes face aos
pressupostos de atribuição do subsídio.
3.5.4. Decreto-Lei 159/2006 de 8 de Agosto, aprova a definição do conceito fiscal de
prédio urbano ou fração autónoma devolutos
Tendo presente que a política de dinamização do mercado de
arrendamento se deve desenvolver nos vários domínios da intervenção
legislativa, designadamente no domínio do regime fiscal e tendo em conta a
necessidade de penalizar, em sede fiscal, os proprietários pela não utilização
do seu património imobiliário por representar custos para a sociedade em
geral, nomeadamente, a degradação dos imóveis, foi necessário regulamentar
o conceito de prédio devoluto para efeitos de aplicação da taxa do imposto
municipal sobre imóveis (CIMI).
Assim, o prédio urbano devoluto está sujeito ao dobro da taxa do Imposto
Municipal sobre Imóveis (IMI)93
Nestes termos, o prédio devoluto é definido por este diploma como sendo
um prédio urbano ou fração autónoma que se encontra desocupada há mais
de um ano, constituindo índices desta situação a inexistência de contratos e
de faturação relativa a consumos de fornecimento serviços de
telecomunicações, água ou electricidade.
Discutível será a compatibilização do disposto na alínea c) do artigo 3.º
deste diploma com a previsão da alínea e) do artigo 9.º do Código do Imposto
Municipal de Imóveis, já que, enquanto daquela disposição legal decorre que,
passado um ano sobre a conclusão de uma construção ou sobre a emissão de
licença de utilização, encontrando-se o prédio devoluto, passará a pagar em
dobro a taxa de IMI, esta determina que, tratando-se de prédio destinado a
venda, o IMI só passará a ser devido a partir do terceiro ano seguinte,
inclusive, àquele em que tenha passado a figurar como activo circulante da
empresa que o tenha para venda.
93
Ao abrigo do disposto no artigo 102º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis com a redacção
da Lei 6/2006 de 27 de fevereiro.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 47
Porém, são excluídos deste conceito os prédios destinados a
arrendamentos de curta duração, prédios que se encontram em reabilitação
ou que se destinam a residência de emigrantes 94. Cabe ao município proceder
à identificação dos prédios devolutos e notificar os seus proprietários para que
possam exercer o direito de audição prévia. Da decisão que declare o prédio
como sendo devoluto cabe recurso para o Tribunal Administrativo nos termos
do Código de Processo Administrativo.
3.5.5. Decreto-Lei 160/2006 de 8 de Agosto, aprova os elementos do contrato de
arrendamento e os requisitos a que obedece a sua celebração
Este diploma vem regular a matéria que antes tinha assento nos artigos
8º e 9º do RAU, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/98, de 15 de Outubro, e
o atual artigo 1070º do Código Civil, regulando os elementos do contrato de
arrendamento e os requisitos a que está sujeito a sua celebração.
O contrato de arrendamento deve ser reduzido a escrito sempre que o seu
prazo seja superior a 6 meses, devendo conter a identidade das partes, a
identificação do locado, o valor da renda, o fim habitacional ou não
habitacional do contrato, a data de celebração e a existência da licença de
utilização.
Foi abolida a exigência antes contida no n.º 1 do artigo 9.º do RAU que
determinava que só podiam ser objecto de arrendamento os edifícios ou suas
fracções autónomas cuja aptidão para o fim pretendido fosse atestada por
licença de utilização passada mediante vistoria realizada menos de oito anos
antes da celebração do contrato.
A licença de utilização é exigível para os imóveis edificados depois de
1951, sendo que a mudança de finalidade e o arrendamento para fim não
habitacional de prédios ou frações não licenciados devem ser sempre
previamente autorizados pela Câmara Municipal.
Em situações de urgência basta a referência ao documento comprovativo
de que a licença foi requerida. A falta de referência à licença de habitação
sujeita o senhorio ao pagamento de uma coima e pode ainda constituir um
94
Nos termos do artigo 3º do Decreto- Lei 323/95 de 29 de Novembro.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 48
motivo de resolução do contrato pelo arrendatário e os contratos de
arrendamento celebrados para fins diversos do licenciado são nulos, tendo o
arrendatário, em ambas as situações, direito a indemnização.
De notar que, incompreensivelmente, o legislador comina com a nulidade
o arrendamento para fim diverso do licenciado, enquanto que arrendamentos
relativos a prédios sem qualquer licenciamento são, apenas, passíveis de
resolução pelo arrendatário, sendo-lhes, consequentemente, conferida
validade.
Devem constar do contrato, entre outros elementos, a titularidade do
senhorio face ao imóvel, número de inscrição na matriz predial e a existência
de um regulamento de propriedade horizontal. Os contratos de arrendamento
que não contenham estes elementos não são inválidos, desde que esta falta
possa ser suprida e desde que os requisitos de forma sejam observados.
3.5.6. Decreto-Lei 161/2006 de 8 de Agosto, regula as Comissões Municipais
Arbitrais
O NRAU atribui às CAM um papel fundamental na dinamização do
mercado de arrendamento, designadamente no domínio da actualização das
rendas dos contratos de arrendamento mais antigos, cabendo-lhes a
coordenação do processo relativo à determinação do coeficiente de
conservação do imóvel.
Para tanto, as CAM têm poder para indicar os técnicos responsáveis pela
avaliação, dirimir os conflitos relativos às obras, nomeadamente, definir quais
as obras necessárias para a obtenção de um nível de conservação superior, e
conflitos relativos à efectiva utilização do locado ou ainda monitorizar a
aplicação prática do NRAU.
De acordo com este diploma de regulamentação, as CAM são entidades
oficiais não judiciais com autonomia funcional, constituídas por um
representante da Câmara Municipal, dos Serviços das Finanças, dos
senhorios, nomeado pela associação de senhorios e dois representantes dos
arrendatários, nomeados pelas associações dos arrendatários habitacionais e
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 49
não habitacionais, um representante da Ordem dos Engenheiros, da Ordem
dos Arquitectos e da Ordem dos Advogados.
Nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto podem, ainda, ser cooptados
para a Comissão até três cidadãos com qualificações no domínio da habitação
e reabilitação urbana. Cabe ao Município assegurar os meios técnicos e
administrativos, humanos e materiais necessários para o funcionamento das
CAM. Podem ainda ser celebrados protocolos com o Instituto Nacional de
Habitação no sentido de fornecer apoio técnico às CAM.
As decisões das CAM têm natureza arbitral, cabendo recurso para o
Tribunal de Comarca. A decisão que determina o estado de conservação do
imóvel é válida por um período de 3 anos.
3.5.7. Portarias/Avisos
Portaria n.º 1192-A/2006 - Aprova o modelo único simplificado através
do qual senhorios e arrendatários dirigem pedidos e comunicações a diversas
entidades no âmbito de procedimentos de atualização das rendas relativas a
contratos de arrendamento habitacional celebrados antes da vigência do RAU
e contratos não habitacionais celebrados antes da vigência do Decreto-lei
nº257/95, de 30 de Setembro.
Portaria n.º 1192-B/2006 - Aprova a ficha de avaliação para a
determinação do nível de conservação de imóveis locados, nos termos do n.º 2
do artigo 33.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, que aprovou o Novo
Regime do Arrendamento Urbano, regula os critérios de avaliação, as regras
necessárias a essa determinação e estabelece a remuneração dos técnicos
competentes e dos árbitros das comissões arbitrais municipais, ao abrigo dos
Decretos-Lei n.º s 156/2006, 157/2006 e 161/2006, todos de 8 de Agosto.
Portaria 291/2011, de 4 de Novembro que determina os preços da
habitação por metro quadrado para efeitos de cálculo da renda condicionada.
Portaria 295/2011, de 15 de Novembro que determina os fatores de
correção extraordinária das rendas para o ano de 2012.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 50
Aviso 19512, que determina o coeficiente de actualização dos diversos
tipos de arrendamento.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 51
3.6. Enquadramento Jurídico da Reabilitação e Regeneração Imobiliária
A reabilitação urbana assume hoje, indubitavelmente, uma prioridade na
agenda política do país, sendo um factor determinante para a sustentabilidade
do desenvolvimento económico e social de Portugal, no geral, e um elemento
estruturante na qualificação da política das cidades e da habitação, em
particular.
Resultado de políticas frugais e pouco adequadas, de uma legislação
pouco efetiva e também da atual conjuntura socioeconómica dos últimos anos,
fato é que o estado do parque habitacional e não habitacional urbano se
encontra manifestamente degradado, a que acresce uma deficiente condição
das infra-estruturas públicas e do património histórico e cultural.
No âmbito do tema em referência, após um simples exórdio com noções
introdutórias e exposição da importância do tema, faremos uma pequena
resenha sobre o atual regime jurídico da reabilitação urbana, introduzido pelo
Decreto-Lei n.º 307/2009 de 23 de Outubro, e bem assim, uma análise
sucinta à proposta 24/XII que o Governo submeteu á aprovação da
Assembleia da República, tendo em vista a revisão do referido regime jurídico.
A reabilitação urbana consiste numa operação urbanística integrada que
tem como objetivo reabilitar um espaço urbano que se considere degradado do
ponto de vista urbanístico e da qualidade de vida. Pressupõe, pois, a
manutenção do património urbanístico e imobiliário, no todo ou em parte
substancial, tendo como princípio orientador a preservação dos traços
urbanísticos e das identidades socioculturais do espaço a reabilitar, através da
realização de obras de remodelação ou beneficiação dos sistemas de infra-
estruturas urbanas, dos equipamentos e dos espaços urbanos ou verdes de
utilização coletiva e de obras de construção, reconstrução, ampliação,
alteração, conservação ou demolição dos edifícios.
A Lei95 define ainda o conceito de “área de reabilitação urbana» como a
área territorialmente delimitada que, em virtude da insuficiência, degradação
ou obsolescência dos edifícios, das infra-estruturas, dos equipamentos de
95
Nos termos do artigo 2º do Decreto Lei 307/2009 de 23 de Outubro que aprova o regime jurídico da
Reabilitação Urbana.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 52
utilização colectiva e dos espaços urbanos e verdes de utilização coletiva,
designadamente no que se refere às suas condições de uso, solidez,
segurança, estética ou salubridade, justifique uma intervenção integrada,
podendo ser delimitada em instrumento próprio ou corresponder à área de
intervenção de um plano de pormenor de reabilitação urbana.
Em primeiro lugar, cabe-nos sublinhar a importância da política de
reabilitação urbana no desenvolvimento das cidades e na melhoria da
qualidade de vida das populações. Com efeito, torna-se num elemento
indispensável no domínio dos equipamentos públicos, promovendo a
qualidade da habitação e das infra-estruturas, contribuindo para o
melhoramento das acessibilidades urbanas e regionais. Por outro lado, é um
instrumento inequívoco de desenvolvimento económico, criando emprego e
condições de atração para as empresas, mas também como fator de coesão
social, regenerando zonas urbanas socialmente problemáticas.
Não obstante o reconhecimento geral da reabilitação urbana enquanto
fator dinamizador e essencial ao desenvolvimento do tecido urbano existente, a
verdade é que ao longo das últimas décadas se continua a assistir a uma
reduzida e ineficiente cultura de conservação e reabilitação do património
urbanístico e imobiliário edificado, proliferando, de norte a sul do país, o
fenómeno da crescente degradação e obsolescência dos edifícios e
infraestruturas urbanas, quer detido pelas entidades privadas, quer pelos
entes públicos.
Como é sobejamente reconhecido, são variados os motivos subjacentes à
falta de manutenção e reabilitação do tecido urbano em Portugal. Desde logo,
a massificação do crédito à habitação, a par dos níveis tendencialmente baixos
das taxas de juros, despoletou uma política que apostou na construção nova e
expansão dos centros habitacionais, em detrimento da reabilitação do
edificado existente, designadamente nos centros das cidades. Sobre esta
matéria, atente-se nos dados disponibilizados pelo INE que revelam, por
referência a 2008, e acompanhando uma tendência estrutural de anos
anteriores, que a maioria dos processos de licenciamento se destinava a
construções novas, cerca de 72,3%, sendo que, em 2009, esta percentagem
reduziu para 67,5%, o que revela alguma evolução na tendência para a
reabilitação urbana e uma saturação do mercado de novas habitações.
Todavia, Portugal faz parte dos países europeus com o menor índice de
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 53
reabilitação urbana96, e por outro lado, ocupa os lugares cimeiros no ranking
da taxa de proprietários.
Acresce que, a política de congelamento de rendas que vigorou durante
décadas, bem como os demais constrangimentos no mercado de arrendamento
identificados no presente Estudo, com destaque para a dificuldade e
morosidade inerente às acções de despejo e consequente recuperação do
locado e o excessivo vinculismo contratual, provocaram um decréscimo nos
rendimentos dos senhorios e a falta de confiança no mercado de
arrendamento, conduzindo a um entrave fundamental à capacidade de
investimento na reabilitação e manutenção dos edifícios.
Por outro lado, é inequívoco que o fomento e dinamização do sector da
reabilitação urbana dependem, de igual modo, do acesso aos regimes de apoio,
incentivos fiscais e financiamentos por dos proprietários, promotores,
investidores e construtores. Nesta conformidade, passemos à análise dos
principais programas de incentivos à reabilitação urbana, entretanto criados, e
que enquadram o regime de concessão de financiamento e de benefícios fiscais
por parte do Estado e dos municípios.
Dos vários programas de apoio à reabilitação, o RECRIA97
é destinado a
apoiar a recuperação de imóveis arrendados, e tem por objectivo o
financiamento partilhado da execução de obras de conservação e beneficiação
de imóveis degradados, mediante concessão de apoios pelo Estado e pelos
Municípios.
Podem aceder a este programa os senhorios e proprietários, que tenham
pelo menos uma fracção habitacional cujas rendas tenham sido alvo de uma
correção extraordinária e ainda os inquilinos e os municípios que se
substituam aos senhorios na realização de obras nestes imóveis. São
comparticipadas pelo programa RECRIA as obras de conservação ordinária,
conservação extraordinária e ainda as obras de beneficiação que sejam, nos
termos da lei, exigíveis para a concessão de licença de utilização sobre fogos
96
De acordo com o Estudo ”Fazer Acontecer a regeneração Urbana” da CIP- Confederação Empresarial
de Portugal, “Portugal faz parte dos países onde os trabalhos de reabilitação de edifícios residenciais
têm menor peso na produção total do sector com um rácio de 6,2%, situando-se logo acima da Roménia,
que se encontra na última posição. A reabilitação adicionada à manutenção dos edifícios representa em
Portugal cerca de 16 % do valor global da produção da construção”. 97
Aprovado pelo Decreto Lei 4/88 de 6 de Junho e alterado pelo Decreto Lei 104/96 de 31 de Julho;
Decreto Lei 418/99 de 21 de Outubro; Decreto Lei 329-A/2000 de 22 de Dezembro; Decreto Lei 329-
B/2000 de 22 de Dezembro; Portaria 56-A/2001 de 29 de Janeiro e Portaria 1172/2010 de 10 de
Novembro.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 54
ou partes comuns de edifícios em que, pelo menos uma das frações, tenha
sido alvo de correção de renda extraordinária. Os incentivos concedidos nestes
programas, apenas são cumuláveis com os que são atribuídos no âmbito do
programa SOLARH.
Importa, ainda, salientar que os incentivos podem contemplar a
comparticipação a fundo perdido e concessão de financiamento até ao
montante correspondente à parte do valor das obras não comparticipado, sob
forma de empréstimos aos proprietários dos imóveis, com prazo máximo de
reembolso de oito anos.
Posteriormente, e como forma de extensão do programa RECRIA, surgiu
o REHABITA98
, o qual visa apoiar as Câmaras municipais na recuperação de
zonas urbanas antigas.
Foi criado, ainda, o RECRIPH·, que apresenta um regime especialmente
vocacionado para a comparticipação e financiamento de obras de conservação
das partes comuns dos prédios urbanos em regime de propriedade horizontal.
Finalmente, o SOLARH99
consubstancia um programa de apoio financeiro
especial para a reabilitação de habitações próprias e permanentes, de
habitações devolutas de que sejam proprietários pessoas singulares ou outras
instituições, designadamente, instituições de solidariedade social ou
municípios, permitindo a concessão de empréstimos sem juros.
Ainda no contexto destes programas e iniciativas, cabe referir a “Iniciativa
Jéssica”, que se trata de um veículo inovador de aplicação de fundos
estruturais comunitários concedidos aos Estados Membros em intervenções ao
nível da reabilitação urbana. Esta iniciativa teve início, em Portugal, em
Novembro de 2008, sendo no entanto possível a sua aplicação até finais de
2015. A grande preeminência deste fundo, é o facto de conseguir conciliar o
seu principal objectivo de reabilitação urbana, com a dinamização ao nível do
investimento privado, ou seja, são criadas condições bastante atrativas ao
investimento privado em Fundos de Desenvolvimento Urbano (FDU).
No que respeita ao enquadramento fiscal da reabilitação, importa referir o
importante contributo do Decreto-Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro de
2007 - Lei do Orçamento de Estado para 2008 - que introduziu o regime
extraordinário de apoio à reabilitação urbana, instituído pelo artigo 82.º, com
98
Aprovado pelo Decreto Lei 105/96 de 31 de Julho 99
Aprovado pelo Decreto Lei 7/99 de 8 de Janeiro
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 55
vista à concessão de incentivos fiscais às ações de reabilitação.
Posteriormente, o referido artigo 82.º foi revogado pela Lei 64-A/2008, de 31
de Dezembro (cf. art. 101º), que aprovou o Orçamento de Estado para o ano de
2009. No entanto, por disposição do artigo 99º da mesma Lei, foi aditado o
artigo 71º ao Estatuto dos Benefícios Fiscais que, por sua vez, acolhe grande
parte daquele regime extraordinário de apoio à reabilitação.
Com efeito, nos termos do referido preceito, é consagrado um conjunto de
incentivos à reabilitação urbana aplicáveis aos imóveis objeto de acções de
reabilitação iniciadas após 1 de Janeiro de 2008 e que se encontrem
concluídas até 31 de Dezembro de 2020, entre os quais se destaca: (i) a
dedução à colecta, em sede de IRS, até ao limite de € 500,00, de 30% dos
encargos suportados pelo proprietário com a reabilitação de imóveis; (ii)
tributação à taxa autónoma de 5% das mais-valias auferidas por sujeitos
passivos de IRS residentes em território português, desde que inteiramente
decorrentes da alienação de imóveis situados em Área de Reabilitação Urbana
(ARU), recuperados nos termos das respectivas estratégias de reabilitação (iii)
tributação à taxa de 5% dos rendimentos prediais auferidos por sujeitos
passivos de IRS residentes em território português, quando sejam
inteiramente decorrentes do arrendamento de imóveis; (iv) isenção em sede de
imposto municipal sobre imóveis (IMI) por um período de 5 anos a contar da
data da conclusão da reabilitação, podendo ser renovada por um período
adicional de 5 anos; (v) isenção de imposto municipal sobre as transmissões
(IMT) nas aquisições de prédio urbano ou fracção autónoma de prédio urbano
destinado exclusivamente a habitação própria e permanente, na primeira
transmissão onerosa do prédio reabilitado, quando localizado em ARU.
De salientar que podem beneficiar do presente regime as acções de
reabilitação que tenham por objeto os prédios urbanos nos quais vigorem
contratos de arrendamento susceptíveis de sofrerem actualização
extraordinária de renda, de acordo com as regras estabelecidas no NRAU (para
fim habitacional celebrados antes da entrada em vigor do D.L. n.º 321-B, de
15/10 – RAU e para fim não habitacional celebrados antes da entrada em
vigor do Decreto Lei n.º 257/95, de 30/09) ou os prédios localizados em área
de reabilitação urbana.
Relativamente aos impostos sobre o património e contrariamente às
isenções supra referidas, existem, ainda, isenções que se aplicam a todos os
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 56
prédios, independentemente da área de localização, ficando, no entanto,
dependentes de reconhecimento pela câmara municipal, nos termos previstos
no artigo 45º do Estatuto dos Benefícios Fiscais. Assim, os prédios objeto de
Reabilitação urbana, estão isentos de IMI pelo período de dois anos a contar
do ano, inclusive, da emissão da respectiva licença camarária. No que respeite
ao IMT, ficam isentas as aquisições de prédios urbanos destinados a
reabilitação urbanística, desde que, no prazo de dois anos a contar da data da
aquisição o adquirente inicie as respectivas obras. Note-se que este regime de
isenções não é cumulativo com outros benefícios de idêntica natureza e aplica-
se a todos os prédios, independentemente da sua localização, ficando apenas
dependentes do reconhecimento pela Câmara Municipal.
No que respeita ao IVA, aplica-se a taxa reduzida de 6% tanto para as
empreitadas de reabilitação urbana realizadas em imóveis ou espaços públicos
localizados em áreas de reabilitação urbana delimitadas nos termos legais, ou
no âmbito de operações de requalificação e reabilitação de reconhecido
interesse público nacional, como nas empreitadas de reabilitação de imóveis
que sejam contratadas diretamente pelo Instituto da Habitação e Reabilitação
Urbana (IHRU). Beneficiam, ainda, da taxa reduzida as empreitadas realizadas
no âmbito de regimes especiais de apoio financeiro ou fiscal à reabilitação de
edifícios ou ao abrigo de programas apoiados financeiramente pelo IHRU,
sendo que neste caso não terá relevo quanto à sua aplicação, a localização da
empreitada.
Por outro lado, as empreitadas de beneficiação, remodelação, renovação,
restauro, reparação ou conservação de imóveis ou partes autónomas destes
afectos à habitação, com excepção dos trabalhos de limpeza, de manutenção
dos espaços verdes e das empreitadas sobre bens imóveis que abranjam a
totalidade ou uma parte dos elementos constitutivos de piscinas, saunas,
campos de ténis, golfe ou minigolfe ou instalações similares à semelhança das
anteriores, estão, de igual modo, sujeitas à taxa de 6%. De realçar que esta
taxa reduzida só abrange os materiais incorporados caso estes não excedam
20% do valor global da prestação de serviços.
Ainda no que concerne ao quadro fiscal da reabilitação urbana saliente-
se, por fim, a eficiência fiscal na promoção do mercado do arrendamento
habitacional por fundos de investimento Imobiliário de arrendamento
habitacional (FIIAH), cujo regime especial foi aprovado pela Lei nº 64-A/2008,
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 57
de 31 de Dezembro, conferindo a estes veículos um carácter mais atractivo e
inovador, por via do respectivo estatuto fiscal diferenciado, o qual mereceu um
tratamento autónomo no presente Estudo.
Relativamente ao enquadramento jurídico da reabilitação urbana, é certo
que ao longo dos últimos anos se assistiu ao esforço do legislador no sentido
de apresentar um quadro normativo mais apto a conferir maior
sustentabilidade à gestão e organização das cidades, com observância de
novos parâmetros, (em função das diferentes opções estratégicas que iam
sendo adotadas), procurando-se uma mudança no tecido urbano, que pudesse
incrementar o respectivo valor, tanto na vertente económica como na
dimensão social, ambiental e cultural.
A este propósito, valerá a pena fazer um breve exercício retrospectivo,
invocando a memória recente de alguns diplomas conexos com este tema,
designadamente, o DL n.º 104/2004, de 07 de Maio, já revogado, e que previa
o Regime Excepcional de Reabilitação Urbana para as Zonas Históricas e
ACRRU, privilegiando, sobretudo a disciplina das Sociedades de Reabilitação
Urbana (SRU). Neste particular, importa referir que estas sociedades
consistem em empresas municipais com especiais poderes de intervenção,
nomeadamente, poderes de autoridade administrativa, cujas principais
competências são licenciar e autorizar operações urbanísticas, proceder a
operações de realojamento, fiscalizar obras de reabilitação urbana e ainda
poderes de expropriação de imóveis. O principal objetivo destas empresas foi
dinamizar os processos de revitalização tendentes a evitar as situações de
degradação urbanística. A ideia anexa e estruturante das SRU, seria a de que,
caberia aos proprietários a reabilitação dos seus imóveis que poderia ser feita
diretamente pelos mesmos, ou, através das SRU com acordos sobre os termos
da reabilitação. Em termos de celeridade procedimental, este Decreto-lei
também veio trazer algumas novidades, com alterações ao Código
Procedimento Administrativo na parte concernente aos prazos legais que
foram reduzidos e o recurso ao deferimento tácito em todas as situações. Além
do objetivo referido e implícito da reabilitação urbana, pretendeu-se captar
investimentos e mobilizar recursos privados.
Posteriormente, surgiu a Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro, mais conhecida
por NRAU e que é objecto central da análise no presente Estudo. De salientar,
de igual modo, o Decreto Lei n.º 157/2006, de 8 de Agosto que aprovou o
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 58
Regime Jurídico das Obras em Prédios Arrendados, nele se prevendo a
possibilidade de suspensão e de denúncia dos contratos de arrendamento, em
caso de demolição ou de realização de obras de remodelação ou restauro
profundos, o qual, apesar de recentemente alterado, continua com uma
aplicação praticamente virtual, considerando a manifesta dificuldade em fazer
cessar os respectivos contratos de arrendamento antigos, dado que o
procedimento continua refém de uma acção judicial.
Por fim, em 2009, e com o objectivo de dar seguimento a uma estratégia
de requalificação e revitalização das cidades, entrou em vigor o novo Regime
Jurídico da Reabilitação Urbana. A aprovação deste regime jurídico foi
acompanhada de medidas de natureza fiscal, em matéria de incentivos à
reabilitação urbana100 e medidas financeiras que operaram a exclusão da
reabilitação urbana dos limites de endividamento municipal.
O legislador reconhece a existência de desafios e necessidades que o
presente Diploma procura satisfazer, desde logo, assegurar a coordenação
entre as responsabilidades privadas de reabilitação dos edifícios e as
responsabilidades públicas de qualificação dos equipamentos e infra-
estruturas urbanas através de operações integradas de reabilitação que
possam concentrar recursos e beneficiar de incentivos fiscais nas “áreas de
reabilitação urbana”. Por outro lado, é essencial diversificar os modelos de
gestão e criar novos instrumentos que permitam aos proprietários encontrar
outros parceiros privados e ultrapassar os obstáculos à reabilitação. Por fim, é
ainda necessário agilizar os procedimentos de controlo das operações
urbanísticas de reabilitação.
A este nível, e com o escopo de alcançar os resultados a que se propõe,
este regime jurídico adotou um conjunto de princípios, entre os quais o
principio de subsidariedade da intervenção pública, ou seja, em primeira linha,
os principais responsáveis pela reabilitação dos imóveis serão sempre os
proprietários, havendo apenas lugar à intervenção de órgãos da Administração
direta, indireta e autónoma para fazer face a situações que os proprietários
não sejam capazes de assegurar.
Surgem, também, princípios como o Princípio da responsabilização dos
proprietários e titulares de outros direitos, ónus e encargos sobre os edifícios;
Princípio da coordenação, que visa convergir as acções de iniciativa pública e a
100
Aprovadas pela Lei 64-A/2008 de 31 de Dezembro.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 59
privada, o Principio da solidariedade intergeracional, cujo objectivo é garantir
uma passagem de testemunha das áreas urbanas devidamente organizadas e
reabilitadas, entre outros.
Este regime jurídico reúne vários instrumentos relacionados com a
recuperação urbana, tais como, o reforço de poderes dos municípios neste
domínio, dando-lhes competência para delimitar territorialmente a área de
intervenção e o tipo de reabilitação a realizar. A delimitação territorial, é feita
pelos municípios através da aprovação por parte da Assembleia Municipal de
instrumento próprio ou dos Planos de Pormenor de Reabilitação, os quais, no
entanto, deverão de obedecer a três requisitos: (i) especificação do
enquadramento da operação a desenvolver no âmbito das opções de
desenvolvimento urbano do Município; (ii) definição do tipo de operação de
reabilitação em causa e por último, (iii) a especificação da estratégia e do prazo
da reabilitação urbana. Esta delimitação da área define quais os proprietários
com acesso aos apoios e aos incentivos e ainda aqueles que ficam sujeitos ao
regime legal consagrado neste diploma.
Quanto ao tipo de operações de reabilitação urbana, estas podem ser
simples ou sistemáticas. As simples consistem numa “intervenção integrada de
reabilitação urbana de uma área, dirigindo-se primacialmente à reabilitação do
edificado, num quadro articulado de coordenação e apoio da respetiva
execução” e são promovidas pelos proprietários ou titulares de outros direitos,
ónus ou encargos existentes na área abrangida pela operação. As complexas,
por sua vez, consistem numa “intervenção integrada de reabilitação urbana de
uma área, dirigida à reabilitação do edificado e à qualificação das infra-
estruturas, dos equipamentos e dos espaços verdes e urbanos de utilização
coletiva, visando a requalificação e revitalização do tecido urbano, associado a
um programa de investimento” sendo estas promovidas através de um
programa estratégico de reabilitação urbana.
Este regime legal tem sido alvo de grandes polémicas, designadamente no
que se refere aos institutos das obras coercivas, empreitada única, direito de
preferência, reestruturação da propriedade, expropriação e a venda forçada
que permite, em alternativa à expropriação, e no âmbito de uma operação de
reabilitação, proceder à venda do imóvel quando os proprietários não
cumpram as suas obrigações.
A este propósito, não podemos deixar de sublinhar, que as áreas com
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 60
elevado grau de degradação correspondem a situações onde maioritariamente
existem contratos dos arrendamentos antigos com rendas muito baixas em
que os proprietários não possuem condições para se envolverem na
reabilitação. Desta forma, o poder conferido aos municípios101
para delimitar a
área de intervenção e que sujeita a um conjunto alargado de proprietários, é
no mínimo uma questão que levanta sérios problemas de justiça social. No
que diz respeito à venda forçada, a questão que se levantou e que não pode ser
olvidada foi a sua eventual inconstitucionalidade já que, segundo os que
defendiam esta posição, a propriedade é um direito constitucionalmente
garantido e apenas pode ser vedado ao seu proprietário em casos de
expropriação sob pretexto de utilidade publica do bem e concessão de justa
indemnização. Esta posição não logrou e, em Agosto de 2009, o Tribunal
Constitucional considerou “que nenhuma das normas em causa era
inconstitucional”. O que o diploma impõe, neste âmbito, é que nos casos em
que o proprietário não venha a ressarcir o custo das obras coercivas levadas a
cabo pela Sociedade gestora e não arrende o imóvel em causa, no prazo
mínimo de 5 anos, afetando dessa maneira o valor das rendas ao pagamento
das despesas efetuadas pela sociedade gestora, poderá ser imposto um
arrendamento forçado através de concurso público e no limite a sua venda
forçada com direito de preferência estabelecido a favor da entidade gestora.
Por último, relativamente ao direito de preferência, é atribuído às entidades
gestoras, um direito de preferência na transmissão de edifícios, terrenos e
frações que se encontrem nas áreas de reabilitação urbana. Este direito só
pode ser exercido em casos estritos quando se entenda que determinado
imóvel necessita de reabilitação sendo imperativo que se refira a intervenção
de que o imóvel carece e o prazo no qual vai ser executado.
O regime da reabilitação urbana mantém o ónus de realojamento dos
inquilinos, o que tendo em conta o estabelecido no NRAU em matéria de
cessação do contrato por motivos de obras profundas, constitui um verdadeiro
bloqueamento à reabilitação urbana.
Tendo em conta o estado atual da conservação do património edificado
torna-se necessário simplificar o processo de criação das chamadas Áreas de
Reabilitação Urbana (ARU) e instituir mecanismos mais eficazes de incentivo,
101
Que nos termos do Decreto Lei 307/2009 de 23 de Outubro, o município pode em instrumento
próprio ou através de um plano de pormenor delimitar a zona de intervenção sujeitando-se a parecer
prévio do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 61
mormente, através da atribuição apoios financeiros públicos e incentivos
fiscais que permitam fomentar o investimento na recuperação urbana.
Por outro lado, a lei apenas considera as operações de reabilitação
urbana que são desenvolvidas no âmbito das áreas das mesmas, o que deixa
de fora as intervenções isoladas ainda que tenham objectivos de recuperação
urbana.
Também neste domínio se registaram indicações por parte da Troika,
sugerindo uma reforma legislativa, devendo o governo adotar legislação para
simplificar os procedimentos administrativos em matéria de reabilitação. Esta
simplificação deverá abranger os procedimentos para obras de reabilitação,
requisitos de segurança, licenças de utilização e formalidades para inovações
que beneficiem e aumentem a qualidade e o valor do edifício (por exemplo em
matéria de poupança de energia). Por sua vez, é ainda necessário simplificar
as regras para o realojamento temporário de inquilinos de um edifício sujeito a
obras de reabilitação e permitir que os senhorios possam pôr termo ao
contrato de arrendamento devido a obras de renovação significativas (afetando
a estrutura e a estabilidade do edifício.
Impõe-se ainda a normalização das regras que determinam o nível do
estado de conservação dos imóveis e das condições para a demolição de
edifícios em ruínas.
Tendo em conta a importância do mercado de arrendamento como fator
de fomento para a reabilitação urbana, o governo pretende discutir em
conjunto a Proposta de 24/XII, que procede á reforma do regime jurídico da
reabilitação urbana com a proposta de lei que altera o regime jurídico do
arrendamento urbano. O objetivo é permitir uma análise e discussão
articulada das duas propostas de lei.
A proposta 24/XII elege como principais objetivos a flexibilização e a
simplificação do procedimento de criação de áreas de reabilitação urbana, a
criação de um procedimento simplificado de controlo prévio de operações
urbanísticas, bem como, fazer abranger pela reabilitação urbana, operações
urbanísticas isoladas, que tenham por objeto edifício ou frações, ainda que
localizados fora de áreas de reabilitação urbana, cuja construção tenha sido
concluída há pelo menos 30 anos e que, em virtude da sua insuficiência,
degradação ou obsolescência, justifiquem uma intervenção de reabilitação
destinada a conferir adequadas características de desempenho e de
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 62
segurança.
Em matéria de simplificação das áreas de reabilitação urbana, o regime
atual determina que na criação de uma área de reabilitação urbana está em
causa a respetiva delimitação territorial e a definição da operação a
desenvolver, com a estruturação concreta das intervenções a efetuar no
interior da área de reabilitação urbana. O que se propõe é a possibilidade de
fasear o procedimento de criação de uma área de reabilitação urbana,
permitindo que a aprovação da delimitação de áreas de reabilitação urbana
passa numa fase prévia à aprovação da operação de reabilitação urbana a
desenvolver nessas áreas. O município, pode assim delimitar as áreas de
reabilitação urbana, tendo em conta as circunstâncias urbanísticas,
económicas, sociais e ambientais do seu território e proceder mais tarde à
aprovação das concretas operações de reabilitação a efectuar nessas áreas.
Quanto ao controlo prévio de operações urbanísticas, cria-se um
procedimento simplificado, com o objetivo de eliminar os obstáculos à
realização de obras que estejam em consonância com o plano de pormenor de
reabilitação urbana previamente aprovado, sujeitando-as a um procedimento
de comunicação prévia
A propósito deste procedimento, cumpre-nos acrescentar alguns fatos:
a. O procedimento de comunicação fica centralizado numa única
entidade pública que poderá ser o município, uma entidade
designada por este, ou, em ultimo caso, um órgão criado para o
efeito, composto por técnicos com competências funcionais
adequadas.
b. A proposta apresenta ainda um regime específico de proteção do
existente, partindo do princípio que o cumprimento de algumas
regras de construção torna a execução de uma obra de
reabilitação difícil ou mesmo inexequível uma vez que estão em
causa regras aprovadas muito tempo depois da construção
original do edifício, sendo desadequadas á situação concreta dos
edifícios antigos. Nestes casos, o autor do projecto de reabilitação
deve identificar as regras que se afiguram desajustadas e
fundamentar a sua pretensão, comprometendo-se através de
termo de responsabilidade.
c. O procedimento para as operações urbanísticas fica dependente de
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 63
comunicação prévia por parte do particular e no caso do Município
não rejeitar a comunicação, o particular poderá dar inicio às
obras.
d. Finalmente, no que toca à simplificação do procedimento de
autorização de utilização dos imóveis, objeto de operações
urbanísticas com recurso a procedimento simplificado, prevê-se
que quando o município não realize a vistoria no prazo de 10 dias,
o interessado possa juntar o termo de responsabilidade,
acompanhado do requerimento de autorização de utilização e do
comprovativo da apresentação de ambos à entidade gestora,
valendo como autorização de utilização e substituindo o alvará de
utilização.
A proposta regulamenta, igualmente, o regime das operações de
reabilitação urbana “isoladas”, podendo também nestes casos, ser aplicado o
procedimento simplificado de controlo prévio das operações urbanísticas, com
o intuito de dar cobertura aos casos que recaiam sobre edifícios ou frações que
se encontrem fora das áreas demarcadas de reabilitação urbana, em que a
construção foi concluída há mais de 30 anos e que justifiquem uma
intervenção ao nível da sua reabilitação, garantindo dessa forma, melhores
condições de desempenho e segurança. Todavia, a aplicação nestes casos do
procedimento simplificado está sujeita, a três requisitos cumulativos: (i) terão
de preservar as fachadas principais do edifício; (ii) têm de manter os elementos
arquitetónicos e estruturais de valor patrimonial, bem como o numero de
pisos e a configuração da cobertura; (iii) e, não poderão reduzir a sua
resistência estrutural.
No domínio da propriedade horizontal, simplifica-se o procedimento de
constituição da propriedade horizontal quando o edifício foi objeto de
operações urbanísticas de reabilitação urbana e altera-se a formação da
maioria necessária para a realização de certas obras de valorização nas partes
comuns de edifícios.
São também alteradas as maiorias necessárias para a realização de obras
de valorização das partes comuns dos edifícios, passando assim a ficar
dependentes de uma maioria simples, devendo no entanto essa maioria
representar 2/3 do valor total do prédio. Para os casos especiais de instalação
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 64
de gás canalizado e colocação de ascensores, em edifícios que tenham pelo
menos oito frações autónomas essa maioria terá que representar o valor total
do prédio e não apenas os 2/3.
Uma importante alteração introduzida, e que vai de encontro a uma
garantia constitucional da incumbência do Estado, foi a proteção conferida
aos portadores de deficiência. Assim, se alguma das pessoas do agregado
familiar tiver mobilidade condicionada, qualquer condómino pode, sob
condição de prévia de comunicação ao administrador com 15 dias de
antecedência e desde que em conformidade com as normas técnicas de
acessibilidade previstas em legislação especifica, colocar rampas de acesso
e/ou colocar plataformas elevatórias, quando não exista ascensor com porta e
cabina de dimensões que permitam a sua utilização por uma pessoa em
cadeira de rodas. Estas modificações feitas pelo condómino, poderão
posteriormente ser levantadas pelo mesmo desde que exista um acordo com os
restantes condóminos e não haja detrimento do edifício. Caso tal não seja
possível, o condómino terá de receber o respetivo valor de acordo com as
regras do enriquecimento sem causa.
Por último, cumpre referir que se procede à uniformização dos critérios
para a determinação do estado de conservação dos imóveis, aplicando as
regras de determinação do nível de conservação dos prédios e frações
autónomas arrendadas.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 65
3.7. Fundos de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional
Os Fundos de Investimento Imobiliário especificamente vocacionados
para o investimento em imóveis destinados ao arrendamento habitacional
foram introduzidos pela Lei 64-A/2008, de 31 de Dezembro102
. Anunciada
como uma das medidas anti-crise, a criação desta figura teve como objetivo,
por um lado, apoiar as famílias com dificuldades em cumprir os seus encargos
financeiros e, por outro, dinamizar o mercado do arrendamento habitacional.
Coube à Portaria n.º 1553-A/2008, de 31 de Dezembro concretizar os
termos e critérios a que estão sujeitas a transmissão de imóveis para o Fundo,
a determinação do valor da renda, a actualização do preço do imóvel e o direito
de opção de compra.
A ratio legis subjacente à instituição dos FIIAH configura tais veículos
como instrumentos dinamizadores do mercado do arrendamento habitacional
e, em especial, como solução alternativa de resolução do problema do crédito à
habitação mal parado.
Com efeito103
, verifica-se que o legislador privilegiou a aquisição de ativos
imobiliários, originariamente adquiridos com recurso ao financiamento à
habitação, promovendo-se o seu arrendamento aos transmitentes da
propriedade, com a estipulação de uma opção de compra a exercer até 31 de
Dezembro de 2020.
Não obstante, não se vislumbram impedimentos legais à constituição
destes veículos de investimento por investidores particulares, fora do contexto
do crédito à habitação, contanto que sejam observadas as disposições legais
que regulam o respetivo funcionamento, em especial, no que concerne às
regras de composição e afetação dos ativos dos FIIAH.
A constituição e o funcionamento dos FIIAH, bem como a comercialização
das respectivas unidades de participação, regem-se pelo disposto no Regime
Jurídico dos Fundos de Investimento Imobiliário e, subsidiariamente, pelo
disposto no Código de Valores Mobiliários.
Assim, nos termos do regime jurídico dos Fundos de Investimento
102
Lei do Orçamento de Estado para 2009. 103
Nos termos do artigo 104º da Lei 64A/2008 de 31 de Dezembro, que consagra o artigo 5º do
Regime jurídico dos FIIAH.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 66
Imobiliário104
, a constituição de fundos de investimento está sujeita a
autorização simplificada da CMVM e depende da apresentação de
requerimento subscrito pela entidade gestora, que terá de ser acompanhado
dos projectos do regulamento de gestão, dos projectos dos contratos a celebrar
com o depositário, com as entidades comercializadoras e, sendo o caso, com as
entidades subcontratadas, bem como, dos documentos comprovativos de
aceitação de funções de todas as entidades envolvidas na actividade do fundo
de investimento imobiliário.
De salientar que a CMVM poderá solicitar à sociedade gestora
informações complementares ou sugerir as alterações aos documentos que
considere necessárias.
O prazo de notificação da decisão da CMVM à requerente é de 15 dias a
contar da data de entrada do requerimento ou, quando aplicável, a contar da
data de entrada das informações complementares ou das alterações aos
documentos supra referidos.
Caso a CMVM não notifique a sociedade gestora no referido prazo, opera-
se a presunção de indeferimento tácito do pedido.
Note-se, de igual modo, que a autorização caduca se a sociedade gestora
a ela expressamente renunciar ou se o fundo de investimento não se constituir
no prazo de 180 dias após a data de recepção da notificação da autorização.
O Fundo de Investimento Imobiliário considera-se constituído no
momento em que a importância correspondente à primeira subscrição de
Unidades de Participação for integrada no respectivo ativo, devendo esta data
ser comunicada à CMVM
Dada a especificidade dos ativos a integrar no Fundo que se pretende
constituir – imóveis vocacionados para arrendamento habitacional – e as
características do regime especial aplicável a estes fundos setoriais, importa
considerar determinados pressupostos que deverão ser acautelados no
Regulamento de Gestão do Fundo.
Quanto à política de investimentos, à semelhança dos Fundos de
Investimento Imobiliário “normais”, o objetivo do FIIAH consistirá em alcançar,
numa perspectiva a médio e longo prazo, uma valorização crescente do capital,
em obediência a critérios de segurança, rendibilidade e liquidez.
A política de investimentos de um FIIAH caracteriza-se pela sua
especialização setorial, na medida em que, 75% do seu activo será composto
por imóveis/frações autónomas destinados a arrendamento para habitação
104
Artigo 20º RJFII
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 67
permanente, sitos em Portugal.
No que concerne ao remanescente (25%), verificar-se-á uma
especialização residual, ou seja, resultará do Regulamento de Gestão a
possibilidade de o Fundo dirigir 25% do seu ativo para o investimento em
imóveis/frações autónomas destinados a arrendamento habitacional e/ou
imóveis destinados a arrendamento não habitacional, projetos de urbanização
e construção de imóveis, participações em sociedades imobiliárias,
participações noutros fundos de investimento imobiliário, liquidez, etc.
De salientar que, a aquisição de participações em sociedades imobiliárias
terá de observar determinados pressupostos, 105
nomeadamente:
- O objeto social da sociedade imobiliária deve enquadrar-se
exclusivamente numa das actividades que podem ser diretamente
desenvolvidas pelos fundos de investimento;
- O ativo da sociedade imobiliária deve ser composto por um mínimo de
75% de imóveis passíveis de integrar diretamente a carteira do fundo de
investimento;
- A sociedade imobiliária não deve possuir participações em quaisquer
outras sociedades;
- A sociedade imobiliária deve ter a sede estatutária e efectiva num dos
Estados membros da União Europeia ou da OCDE no qual o respetivo fundo
de investimento pode investir;
- As contas da sociedade imobiliária deverão ser sujeitas a regime
equivalente ao dos fundos de investimento em matéria de revisão
independente, transparência e divulgação;
- A sociedade imobiliária deve comprometer-se contratualmente com a
entidade gestora do fundo de investimento a prestar toda a informação que
esta deva remeter à CMVM
- Aos imóveis e outros ativos que integrem o património da sociedade
imobiliária ou por esta adquiridos, explorados ou alienados, estão sujeitos aos
princípios equiparáveis ao regime aplicável aos fundos de investimento,
especialmente no que respeita a regras de avaliação, conflitos de interesse e
prestação de informação;
No que toca aos limites ao investimento, as percentagens relativas à
composição do património do FIIAH, supra referidas, deverão ser respeitadas
no prazo de dois anos a contar da data da constituição do fundo ou de um ano
da realização de aumento de capital (conforme aplicável).
105
Requisitos estabelecidos no artigo 25º A do RJFII.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
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Ora, nos primeiros dois anos de vida do FIIAH, poderá o mesmo dirigir
mais de 25% do seu ativo para o desenvolvimento de projectos de construção
destinados a arrendamento para habitação permanente, desde que, decorrido
aquele prazo, os referidos projetos não representem mais de 25% do activo
total.
Assim só decorridos dois anos, desde a constituição do FIIAH, será
obrigatória a verificação das percentagens legalmente estabelecidas106.
A subscrição do Fundo poderá ser feita em dinheiro ou em espécie. De
sublinhar, no entanto que, caso o fundo se constitua sob a forma de fundo
fechado objeto de oferta pública de subscrição, só será admissível a subscrição
em espécie a título excepcional e mediante autorização da CMVM.
No plano contratual, a subscrição de unidades de participação em
espécie, bem como a sua correspondente integração no activo do FII, será
realizada por via de contrato permuta, no qual poderão ser consagrados
especiais direitos ao participante, entre os quais, o direito de opção de compra
dos imóveis transmitidos. Neste caso, deverá constar do Regulamento de
Gestão, a permissão da “liquidação em espécie ” no ato de subscrição e/ou
aumento de capital, sendo que, o correspondente valor de incorporação dos
imóveis a integrar no património do Fundo deverá ser inferior ao valor
apurado por avaliações previamente realizadas e autorizadas por todos os
participantes.
Acresce que, a opção da subscrição em espécie, designadamente, através
106
Actividade / Activo % do activo total do FII
Valor dos imóveis destinados a
arrendamento para habitação permanente Limite mín. 75%
Projectos de construção destinados a
arrendamento para habitação permanente Limite máx. 25%
Um imóvel ou activo equiparável Limite máx. 25%
Concentração / arrendamento Limite máx. 25%
Participações em Sociedades Imobiliárias. Limite máx. 25%
Participações em FII Limite máx. 25%
(do activo total do FII
participado)
Investimento fora da EU Limite máx. 25%
Endividamento Limite máx. 33%
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 69
da celebração de um contrato de permuta, afasta a prevalência de quaisquer
preferências legais e contratuais, quer em relação a arrendatários quer em
relação ao Estado e aos municípios.
Compete à Comissão de Acompanhamento verificar a aplicação do regime
legal e regulamentar que este tipo de Fundos de Investimento Imobiliário
deverá respeitar, bem como a observância dos princípios de bom governo, que
lhe são exigíveis, nomeadamente em matéria de implementação da política de
investimentos e composição da carteira do Fundo. Com efeito, do Regulamento
de Gestão do Fundo deverá constar a existência desta comissão, a sua
composição, competência e deliberações.
No que concerne à sua composição, deverá ser composta por três pessoas
independentes nomeadas pelo membro do Governo responsável pela área das
finanças, de acordo com critérios de competência, idoneidade e experiência
profissional.
As deliberações da comissão, são tomadas por maioria simples, sendo
obrigatório o seu registo em ata e envio à CMVM.
Mais se acrescenta, que a Comissão deverá pautar a sua atuação nos
domínios da atividade do Fundo, tendo em conta o espírito legislativo
subjacente à criação deste novo tipo setorial de Fundos de Investimento
imobiliário, especialmente no que concerne ao seu papel enquanto
instrumento de resposta ao problema do crédito à habitação mal parado, com
o fito de apoiar as famílias com dificuldades em cumprir os respectivos
encargos financeiros. Foi neste contexto que o funcionamento da Comissão de
Acompanhamento foi projetado.
Não se verificando a operacionalidade dos FIIAH´s exclusivamente
adstrita às Instituições de Financeiras e respetivas operações de crédito à
habitação, equacionando-se, pelo contrário, a possibilidade destes veículos
serem promovidos por promotores particulares com vista à sua afectação ao
mercado do arrendamento para a habitação, entendemos defensável que o
funcionamento da Comissão de Acompanhamento revela-se, nestes casos,
descontextualizado.
Acresce, neste sentido, que mesmo para os FIIAH em que os
participantes são Instituições de Crédito, não existe, salvo melhor opinião, um
funcionamento efetivo da Comissão de Acompanhamento no âmbito dos
Fundos, não obstante a sua previsão expressa nos respectivos regulamentos
de gestão.
No que toca à política de rendimentos, o Fundo caraterizar-se pela
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 70
distribuição de rendimentos aos Participantes.
Assim, e por imposição do regime especial aplicável, os resultados
líquidos do Fundo serão distribuídos com uma periodicidade mínima anual,
em montante não inferior a 85% dos resultados líquidos do Fundo.
De salientar que poderão ser distribuídos 100% dos resultados líquidos,
desde que, a Sociedade Gestora, em atenção à boa gestão do Fundo, entender
não ser necessário capitalizar parte dos resultados (num montante máximo de
15%).
Finalmente, não podemos deixar de equacionar a efetiva aplicação dos
FIIAH, pois na verdade existem atualmente poucos fundos ativos. Ora, coloca-
se a questão de saber porque razão este instrumento não obteve o sucesso que
seria de esperar. Na verdade, não obstante o enquadramento fiscal ser
vantajoso, os fundos não conseguiram reunir as condições logísticas
adequadas para operarem no mercado. À excepção da Caixa Geral de
Depósitos, que beneficiou de um acervo patrimonial prévio, os outros fundos
falharam na captação de recursos que lhes permitisse reunir a massa crítica
adequada para operarem.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 71
3.7.1. Regime fiscal dos FIIAH
É o conjunto de incentivos fiscais associados aos FIIAH que lhes
conferem um caráter mais atrativo e inovador.
Eficiência fiscal do veículo – Fundos constituídos entre
01/01/09 e 31/12/13
Tributação na esfera do Fundo
IRC
(rendimentos de qualquer natureza) Isento
IMT
(prédios ou frações destinados a arrendamento
para habitação permanente)
Isento
IMI
(prédios ou fracções destinados a
arrendamento para habitação permanente)
Isento
Tributação na esfera dos Participantes
IRS – Isento IRC – Isento
Mais-valias pela alienação de UP´s 20%
Nos termos do Regime Jurídico dos Fundos e Sociedades de Investimento
Imobiliário para Arrendamento Habitacional107, estão isentos de IRC os
rendimentos de qualquer natureza obtidos pelos Fundos, estão igualmente
isentos de IRS e de IRC os rendimentos relativos às unidades de participação
obtidos pelos seus titulares e as mais-valias que resultem da transmissão de
imóveis a favor do Fundos, sempre que se verifique a conversão do direito de
propriedade em direito de arrendamento, assim como são dedutíveis as
despesas suportadas nestas operações pelos arrendatários.
107
Aprovado pelo Decreto Lei 64-A/2008 de 31 de Dezembro.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 72
Os prédios urbanos que constituem património dos FIIAH estão isentos
de IMI. Estão igualmente isentos de IMT as aquisições de prédios urbanos
destinados a arrendamento bem como as aquisições que resultem do exercício
da opção de compra pelos arrendatários dos imóveis que constituem o fundo.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 73
3.8. Programa de Apoio ao Arrendamento Urbano
O Programa Porta 65 – Jovem é um sistema de apoio financeiro ao
arrendamento para jovens, com idades compreendidas entre os 18 e os 30
anos, que pretende estimular uma maior autonomia por parte dos jovens,
através de um conjunto de apoio no acesso á habitação.
O acesso ao mercado de arrendamento por parte dos jovens é essencial
para fomentar a mobilidade residencial que lhes permita mais vantagens no
acesso ao mercado de trabalho, mas também uma maior flexibilidade para
apostar na formação profissional.
Os principais objetivos deste programa são:
-dar resposta às necessidades habitacionais, através de soluções de
arrendamento com vista a promover a autonomia dos jovens
-promoção da mobilidade residencial dos jovens
-dinamizar soluções público-privadas com vista a promover a
disponibilidade de fogos para a habitação, sem comprometer a sua
rendibilidade e combater a crescente existência de fogos devolutos
-desenvolver a gestão integrada do parque habitacional e revitalizar o
parque de arrendamento
-incentivar a integração dos apoios de vocação social das várias
entidades
O programa Porta-65 prevê a adoção de vários instrumentos,
designadamente, o Programa Porta-65 Bolsa de Habitação e Mobilidades, que é
um instrumento de gestão de disponibilidade de habitações públicas e
privadas para arrendamento; o Programa Porta- 65 Jovem que contempla o
apoio financeiro aos jovens para o arrendamento; o Programa Porta-65 Gestão
e Proximidade, que visa gerir o parque de arrendamento e o programa Porta-65
Residência Apoiada, que pretende promover as soluções de arrendamento de
residências colectivas direcionadas para grupos com necessidades específicas.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 74
No âmbito do programa financeiro concedido aos jovens para o
arrendamento, o apoio é concedido sob a forma de subvenção mensal para
financiar os custos do arrendamento para residência permanente.
Podem aceder a este programa os jovens, com idade igual ou superior a
18 anos e inferior a 30 anos, embora nas situações de casais de jovens, um
dos elementos pode ter até 32 anos, desde que sejam titulares de um contrato
de arrendamento e não usufruam de outros subsídios ou apoio à habitação,
que não sejam proprietários ou arrendatários de outros prédios para fins
habitacionais. Por razões de transparência, a lei exige ainda que nenhum dos
jovens do agregado familiar tenha relações de parentesco com o senhorio.
Quanto ao rendimento mensal108 auferido pelo jovem candidato ou pelo
agregado familiar não pode ser inferior a uma vez, nem superior a quatro vezes
o valor da renda máxima admitida. Por outro lado, a soma dos rendimentos
brutos auferidos deve ser compatível com uma taxa de esforço máxima de
40%, tendo em conta o peso que o valor da renda tem no rendimento dos
candidatos, assim, o valor da renda terá que ser igual ou inferior a 60% do seu
rendimento bruto.
A lei prevê ainda situações de jovens em coabitação, com idade igual ou
superior a 18 anos e inferior a 30 anos, que partilham uma habitação para
residência permanente.
No atual regime em vigor, é possível apresentar a candidatura com um
contrato de promessa de arrendamento.
A candidatura deve ser apresentada109, por via eletrónica, no Portal da
Habitação, cabendo ao Instituto da habitação e Reabilitação Urbana a gestão e
o controlo da aplicação do programa.
A decisão é tomada tendo em conta as verbas estabelecidas para cada
período e ponderação de critérios relacionados com o rendimento do
candidato, assim como dos seus ascendentes e a existência de pessoas com
deficiência.
108
Na acepção do artigo 5º do Decreto Lei 308/2007 de 3 de Setembro. 109
E devidamente instruída nos termos do Decreto Lei 308/2007 de 3 de Setembro
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 75
O apoio é concedido por um período de 12 meses, findo o qual podem ser
apresentadas novas candidaturas até a um período máximo de 36 meses.
O apoio financeiro pode ser majorado quando o contrato incida sobre um
imóvel situado numa zona histórica e, ainda, quando o jovem é portador de
uma incapacidade superior a 60%.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 76
4. Regime Fiscal incidente sobre o património imobiliário
Atualmente, sobre o arrendamento Urbano incidem três tipos de
Impostos: Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis
(I.M.T.); Imposto Municipal sobre Imóveis (I.M.I.); Imposto Sobre o Rendimento
das Pessoas Singulares (I.R.S.) ou Imposto sobre o Rendimento das Pessoas
Colectivas (I.R.C.).
Começando pelo I.M.T., é um imposto sobre as transações que incide
sobre o valor da venda de imóveis e que, no âmbito do arrendamento, assume
uma influência indireta, na medida em que, aumentando o custo da
propriedade, provocará, pelo menos teoricamente, um aumento do valor da
renda, a fim de que a taxa de rendimento desejada para o investimento se
mantenha inalterada. Na prática, e sendo certo que o valor da renda é definido
pelo mercado, o montante do imposto causa apenas uma menor apetência por
este tipo de aplicação de capitais e, consequentemente, uma menor eventual
expansão do mercado de arrendamento.
O I.M.I. é um imposto sobre o Património, independentemente do uso
dado a um imóvel (arrendamento, habitação própria, etc.) o imposto a pagar
será calculado apenas com base no valor tributário do imóvel. A determinação
do valor tributário obedece a regras concretas, bem definidas e independentes
do rendimento real ou presumido da propriedade. Por outro lado, e por se
tratar de uma receita Municipal, a taxa a aplicar ao referido valor tributário
varia de concelho para concelho, dentro de limites estabelecidos, conforme
deliberação anual. Este imposto fundamenta-se na ideia de que um imóvel,
apenas por existir, acarreta despesas para o Município em que se situa, pelo
que o seu proprietário encontra-se obrigado contribuir para estas despesas.
Porém, no caso do imóvel se encontrar arrendado, poderá estar isento deste
imposto.110
110
De acordo com o artigo 46º do ESTATUTO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS
“3 - Ficam igualmente isentos, nos termos da tabela a que se refere o n.º 5, os prédios ou parte de prédios
construídos de novo, ampliados, melhorados ou adquiridos a título oneroso, quando se trate da primeira
transmissão, na parte destinada a arrendamento para habitação, desde que reunidas as condições referidas
na parte final do n.º 1, iniciando-se o período de isenção a partir da data da celebração do primeiro
contrato de arrendamento.
5 - Para efeitos do disposto nos nºs 1 e 3, o período de isenção a conceder é determinado em
conformidade com a seguinte tabela:
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 77
Acresce que, estando o imóvel arrendado, a verba deste imposto e das
outras taxas específicas, é deduzida no Imposto sobre o Rendimento, como se
de uma despesa inerente à manutenção da propriedade se tratasse.
Partindo do pressuposto que um contrato de arrendamento dá origem a
uma receita para quem arrenda, na medida em que configura a contra
prestação de colocar o espaço arrendado ao serviço do arrendatário. Sobre este
rendimento incide, genericamente, no caso de se tratar de pessoas singulares,
o I.R.S. e, no caso de pessoas coletivas, o I.R.C..
O I.R.S. é sem dúvida o imposto que mais incidência tem no
arrendamento. Trata-se de um Imposto sobre o Rendimento, apresentando
taxas fortemente progressivas, chegando a atingir 45% do valor coletável.
Todavia, para colocar e manter um espaço disponível para arrendamento
ou arrendado, tal implica um conjunto de despesas de elevado montante, pelo
que o I.R.S. incide apenas sobre a receita líquida, efetivamente, obtida111.
10 - O disposto nos nºs 1 e 3 não é aplicável quando os prédios ou parte de prédios tiverem sido
construídos de novo, ampliados, melhorados ou adquiridos a título oneroso por entidades que tenham o
domicílio em países, territórios ou regiões sujeitos a um regime fiscal claramente mais favorável,
constantes de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças, excepto se o valor anual da renda
contratada for igual ou superior ao montante correspondente a um 1/15 do valor patrimonial tributário do
prédio arrendado.
12 - A isenção prevista no n.º 3 pode ser reconhecida ao mesmo sujeito passivo por cada prédio ou fração
autónoma destinada ao fim nele prevista.
13 - Podem beneficiar da isenção prevista neste artigo os emigrantes, na definição que lhes é dada pelo
artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 323/95, de 29 de Novembro, desde que verificados os condicionalismos
previstos, salvo quanto ao prazo para a respetiva afetação do imóvel a sua habitação própria e permanente
ou do respectivo agregado familiar.”
111
Dispõe o artigo 41º do Código de IRS que, “Aos rendimentos brutos referidos no artigo 8.º deduzem-
se as despesas de manutenção e de conservação que incumbam ao sujeito passivo, por ele sejam
suportadas e se encontrem documentalmente provadas, bem como a contribuição autárquica que incide
sobre o valor dos prédios ou parte de prédios cujo rendimento tenha sido englobado.
2 - No caso de fração autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, deduzem-se também os
encargos de conservação, fruição e outros que, nos termos da lei civil, o condómino deva
obrigatoriamente suportar, por ele sejam suportados, e se encontrem documentalmente provados.”
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 78
Quando o locado se encontra em processo de atualização faseada de
rendas e foi objeto de reabilitação prevê-se uma dedução de parte das
despesas efetuadas112.Contemplando-se, igualmente, uma dedução dos
encargos financeiros obtidos para financiar a beneficiação dos imóveis113 .
Ao invés, consagra-se um tratamento mais benéfico para os rendimentos
provenientes do arrendamento quando o imóvel se situa numa ”área de
reabilitação urbana” ou, quando está sujeito ao processo de atualização e
rendas previsto no NRAU114.
Como forma de aliviar a carga excessiva de imposto sobre os rendimentos
provenientes do arrendamento, a dedução das despesas relacionadas com o
arrendamento, em sede de IRS, poderia prever uma majoração ao nível das
deduções específicas de determinado tipo de despesas, designadamente no
âmbito da conservação e requalificação dos imóveis. Estas medidas poderiam
ser, simultaneamente, um incentivo ao investimento na reabilitação urbana.
112
Nos termos do nº4 do artigo 71º da Lei-A/2008, “São dedutíveis à colecta, em sede de IRS, até ao
limite de (euro) 500, 30 % dos encargos suportados pelo proprietário relacionados com a reabilitação de:
a) Imóveis, localizados em 'áreas de reabilitação urbana' e recuperados nos termos das respectivas
estratégias de reabilitação; ou
b) Imóveis arrendados passíveis de actualização faseada das rendas nos termos dos artigos 27.º e
seguintes do Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de
Fevereiro, que sejam objecto de acções de reabilitação.
113
Ao abrigo do nº1 do artigo 85º do CIRS que estipula” São dedutíveis à colecta 30 % dos encargos a
seguir mencionados relacionados com imóveis situados em território português ou no território de outro
Estado membro da União Europeia ou no espaço económico europeu desde que, neste último caso, exista
intercâmbio de informações:
a) Juros e amortizações de dívidas contraídas com a aquisição, construção ou beneficiação de imóveis
para habitação própria e permanente ou arrendamento devidamente comprovado para habitação
permanente do arrendatário, com excepção das amortizações efectuadas por mobilização dos saldos das
contas poupança-habitação, até ao limite de (euro) 591;”
114
Nos termos do nº6 do artigo 71º da Lei-A/2008, “Os rendimentos prediais auferidos por sujeitos
passivos de IRS residentes em território português são tributadas à taxa de 5 %, sem prejuízo da opção
pelo englobamento, quando sejam inteiramente decorrentes do arrendamento de:
a) Imóveis situados em 'área de reabilitação urbana', recuperados nos termos das respectivas estratégias de
reabilitação;
b) Imóveis arrendados passíveis de actualização faseada das rendas nos termos dos artigos 27.º e
seguintes do NRAU, que sejam objecto de acções de reabilitação.”
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 79
5. Breve análise estatística
5.1. Síntese dos dados estatísticos
5.1.1.População e famílias residentes (INE)
O INE divulgou em Dezembro de 2011 os resultados provisórios do XV
Recenseamento Geral da População e do V Recenseamento Geral da
Habitação, abreviadamente designados por Censos 2011. Os resultados
provisórios revelam que em 2011 a população de Portugal é de 10.561.614
habitantes, o que traduz um aumento de 2% da população residente em
Portugal face a 2001. No entanto o crescimento registado entre 1991 e 2001
foi maior do que o atual, tendo-se fixado nos 5%.
Numa análise por Nomenclatura Comum das Unidades Territoriais
Estatísticas (NUTS II), destaque para a perda de população no Alentejo, sendo
a única região que desde 1991 tem vindo a perder habitantes continuamente,
e que em 2011 registou um decréscimo populacional de -2,5 face a 2011. A
região Centro também registou uma ligeira redução de população face a 2001,
-1%. Por seu turno, as regiões do Algarve, Região Autónoma da Madeira e
Lisboa, registaram acréscimos de população bastante significativos face a
2001, +14,1%, +9,3% e +6% respetivamente. A Região Autónoma dos Açores
apresenta um ligeiro acréscimo de 2%, enquanto a região Norte parece ter tido
uma estabilização da população face a 2001 (+0,1%). Saliente-se que de 1991
para 2001 apenas as regiões do Alentejo e Madeira perderam habitantes em
Portugal.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 80
Finalmente, e no que respeita às Áreas Metropolitanas de Lisboa e do
Porto, ambas registaram aumento de população entre 2001 e 2011, com
evoluções de +7,1% e +2,7% respetivamente. Estes dados são indicadores do
movimento de concentração da população junto das grandes áreas
metropolitanas de Lisboa e Porto. Note-se contudo que, quer o município de
Lisboa, quer o município do Porto perderam população na última década, o
que aponta para um aglomerado de população em redor destas duas cidades.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 81
5.1.2.Parque Habitacional (INE)
Relativamente à distribuição territorial do parque habitacional, os
Censos de 2011 voltaram a revelar um forte crescimento do parque face a
2001, ainda que menor, comparativamente ao assistido entre 1991 e 2001.
Em 2011 os Censos registaram 5.877.991 alojamentos e 3.543.595 edifícios
destinados à habitação recenseados, o que representa um aumento face a
2001 de 16,3% e 12,1% respetivamente. Estes resultados comparam com os
crescimentos de 20,5% e 10,4% registados ao nível dos alojamentos e edifícios
entre 1991 e 2001.
Numa desagregação por NUTS II, desde 1991 que tem havido um
aumento generalizado do parque habitacional em todas as regiões do país. Foi
na região do Algarve que se verificou o maior aumento do parque habitacional
desde 2001, verificando-se um crescimento de 36,5% nos alojamentos e 23,9%
nos edifícios. De igual modo, o Algarve foi também a região que registou o
maior aumento habitacional entre 1991 e 2001. Por oposição, o Alentejo
apresenta-se como a região em Portugal que menos cresceu em termos de
parque habitacional desde 1991.
Além da grande densidade populacional, as Áreas Metropolitana de
Lisboa (AML) e do Porto (AMP) têm também um parque habitacional em
constante crescimento desde 1991. Em 2011 os Censos registaram 1.066.754
alojamentos e 277.201 edifícios na AML, ao passo que a AMP contabiliza
623.596 alojamentos e 273.469 edifícios. Numa análise por município, Lisboa
concentra 5,5% do total de alojamentos em Portugal enquanto o Porto
representa 2,3%. No que toca ao número de edifícios, Lisboa representa 1,5%
e o Porto 1,3% do total nacional. De notar que, na última década a maioria dos
municípios portugueses registaram aumentos tanto no número de edifícios
como no número de alojamentos.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 82
Na última década, o número de alojamentos familiares em Portugal
aumentou cerca de 16%, fixando-se em 5.865.390. No entanto entre a década
de 1991 e de 2001 o número de alojamentos familiares cresceu cerca de 21%.
A maioria dos alojamentos é de residência habitual, 68,2% em 2011 e 70% em
2001. O panorama por regiões em 2011 é muito idêntico a nível nacional, com
exceção do Algarve onde a residência habitual representa apenas cerca de 47%
dos alojamentos familiares. Na última década as regiões que mais cresceram
em alojamentos de residência habitual foram a Madeira (28%), o Algarve
(23%), os Açores (16%) e Lisboa (15%). Por outro lado a região do Alentejo e do
Centro entre 1991 e 2011 apenas registaram aumentos em 4% e 8%,
respetivamente, neste indicador.
Em 2011 existem em Portugal 734.846 alojamentos vagos, o que
representa cerca de 13% do total de alojamentos familiares. Numa análise por
NUTS II, todas as regiões apresentam percentagens no intervalo entre os 11%
a 14%. Comparativamente a 2001 as regiões que registaram maior aumento
de alojamentos vagos foram o Algarve (92%), a Madeira (77%), o Centro
(51,5%) e a região Autónoma dos Açores (47%). Os aumentos menos
significativos registaram-se nas regiões do Alentejo, Lisboa e Norte, que têm
33%, 24% e 21% em alojamentos vagos, respetivamente.
Em 2001 os Censos contabilizaram 734.846 alojamentos familiares
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 83
vagos, nomeadamente para venda e para arrendamento. Do total de
alojamentos vagos, 110.207 encontravam-se para arrendar em 2011, o que
traduz um acréscimo 38% face a 2001. Numa análise por regiões observam-se
variações muito distintas: por um lado, a região Norte apenas registou um
aumento de 2% de alojamentos vagos para arrendar, por outro o Algarve e a
Madeira aumentaram em cerca de 103% e 85% os alojamentos vagos para
arrendar. A região de Lisboa aumentou igualmente em cerca de 75% os
alojamentos vagos para arrendar.
5.1.3.Parque Habitacional Arrendado (INE)
Para o conjunto do país, em 2011 o parque habitacional arrendado
registou um aumento de cerca de 6,3% face a 2001. Em 2011 Portugal tem
aproximadamente de 786.904 alojamentos familiares clássicos de residência
habitual, arrendados ou subarrendados.
Destaque para a região de Lisboa e Norte, que em conjunto representam
cerca de 73% deste parque. A região de Lisboa representa 39% e a região do
Norte 34%. Excetuando a Região Centro (14%), todas as restantes regiões têm
índices de representatividade inferiores a 6%. De salientar que a Área
Metropolitana de Lisboa representa 30% do total do parque de arrendamento e
que o município de Lisboa representa cerca de 13%. Por seu turno, a Área
Metropolitana do Porto representa cerca de 13% e o município do Porto
concentra 5% do total.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 84
A respeito da evolução do parque de arrendamento entre 1991 e 2001,
constatamos que a situação foi completamente inversa com a atual, com os
alojamentos familiares para arrendamento a decrescer 12% nesse período. Em
2001 haviam 740.425 alojamentos para arrendamento enquanto que em 1991
foram contabilizados 841.528 alojamentos. Em 2001, as regiões de Lisboa e do
Norte representavam novamente mais de 75% do mercado de arrendamento.
Em termos evolutivos, em 2011 as regiões que mais aumentaram os
alojamentos arrendados, foram os Açores (+41,5%), o Algarve (+27,5%) e a
Madeira (+27,3%). Por oposição, a região que menos cresceu foi o Alentejo com
0,5%. Comparativamente a 2001 a região de Lisboa cresceu cerca de 6,2%,
tendo esta ponderação influenciado a média nacional, dado o peso desta
região nos valores totais. Com um parque de arrendamento mais estabilizado
temos a região do Centro, que cresceu 9,8% e a região do Norte que cresceu
apenas 1,8%.
As Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, também cresceram face a
2001, registando evoluções de 7,1% e 7,5%, respetivamente. Não obstante, os
municípios de Lisboa (-6,5%) e do Porto (-4%) já registaram uma quebra nos
alojamentos arrendados face a 2001. Entre 1991 e 2001, como já referido, os
alojamentos arrendados decresceram cerca de 12%. De realçar a região do
Algarve que foi a única que cresceu, cerca de 4%. Quanto às restantes regiões,
todas registaram quebras entre 9% e 24%.
Os Censos 2011 apuraram que em Portugal os contratos de
arrendamento com duração indeterminada dominam o panorama nacional,
com cerca de 56% do total dos contratos, o que corresponde a 444.527
contratos. Os contratos com prazo certo representam cerca de 18%, seguindo-
se os contratos com renda social ou apoiada (8%) e, com reduzida expressão,
encontra-se ainda o subarrendamento (2%). Em 2001 a distribuição dos
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 85
contratos de arrendamento apresentava uma distribuição idêntica: os
contratos com duração indeterminada representavam cerca de 69%, os
contratos com prazo certo, cerca de 18% e os contratos com renda social e o
subarrendamento representavam conjuntamente cerca de 11%.
Relativamente à percentagem do parque habitacional arrendado face aos
alojamentos com proprietário ou coproprietário, assistiu-se a uma ligeira
diminuição dos alojamentos arrendados entre 2001 para 2011. Para Portugal,
em 2011 a percentagem de alojamentos arrendados e de casa própria é de
20% e 73% respetivamente, num parque habitacional total de 3.997.378
alojamentos de residência habitual. Em 2001, estes mesmos indicadores
apresentavam valores de 21% e 75%, respetivamente. No entanto, importa
referir que a repartição dos alojamentos recenseados em 1991 pelo regime de
ocupação revela que a percentagem de alojamentos arrendados era de 27% e
alojamentos com proprietário 64%.
Numa análise por regiões, destaque para a região de Lisboa, onde 27%
dos alojamentos ocupados como residência habitual são arrendados. Quer a
região do Norte, quer a do Algarve têm um parque de arrendamento que
representa cerca de 20% dos alojamentos clássicos ocupados. Na região do
Alentejo e da Madeira os alojamentos arrendados representam 15% do seu
parque habitacional. Os Açores têm um parque de arrendamento de 13% e,
com menos expressão, a região Centro, onde os alojamentos arrendados
representam cerca de 12%.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 86
Com realidades um pouco diferentes temos as Áreas Metropolitanas de
Lisboa e do Porto, onde os alojamentos arrendados representam 29% e 28%,
respetivamente, do parque habitacional. Estes valores são em parte
influenciados pelo peso que o mercado de arrendamento tem nos municípios
de Lisboa e do Porto. O município de Lisboa tem cerca de 98.984 alojamentos
arrendados, o que representa cerca de 42% dos alojamentos ocupados com
residência habitual. No município do Porto, os alojamentos arrendados pesam
43% no parque habitacional, o que equivale a cerca de 42.962 alojamentos.
Os Censos 2011 apuraram que os alojamentos com proprietário e
comproprietário aumentaram em cerca de 9% em 2011 face a 2001. Destaque
para o aumento nas regiões de Lisboa (+15%), Norte (+10%), Algarve (+16%) e
Madeira (+23%). Por outro lado, e com aumentos menos significativos, as
regiões do Alentejo (+1%), Centro (+3%) e Açores (+9%). Contudo, entre a
década de 1991 e 2001 estes aumentos de casa própria foram muito mais
significativos: nesse período, no conjunto do país, os alojamentos com
proprietários ou comproprietários aumentaram em cerca de 36%. Recorde-se
que a década entre 1991 e 2001 ficou marcada pelo aumento da construção
nova, maior facilidade ao crédito à habitação, benefícios fiscais à aquisição de
casa própria, fatores que, uma vez conjugados, levaram a que o número de
alojamentos com proprietários ou comproprietário tenha aumentado
significativamente nesses dez anos em detrimento dos alojamentos
arrendados, especialmente nas regiões de Lisboa, Norte e Algarve.
5.1.3.Índice de Rendas Confidencial Imobiliário
A Confidencial Imobiliário tem um “Índice Ci” que foi lançado em 1988,
sendo a mais antiga série sobre imobiliário em Portugal, este índice tem como
objetivo medir a evolução dos imóveis residenciais, traduzindo a “inflação” no
mercado habitacional. Para além do “Índice Ci”, a Confidencial Imobiliário tem
ainda um Índice de Rendas que mede a evolução do valor das rendas em
Portugal e em várias regiões do país, nomeadamente Áreas Metropolitanas de
Lisboa e Porto. Desde 2001 que o Índice de Rendas tem apresentado intervalos
de valores entre os -2,9% e +1,5%, o que significa que nos últimos dez anos
não se têm registado grandes variações nos valores das rendas. Estes valores
são explicados em parte pela fraca dinâmica que o mercado de arrendamento
teve na última década.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 87
Em 2011, o índice manteve-se em terreno positivo no final do 1º
trimestre, embora registando um crescimento trimestral mais reduzido que no
final de 2010 (– 0,4%). No 2º trimestre de 2011 o índice voltou a cair,
atingindo uma taxa de variação trimestral de -0,5%. Passando para o 3º
trimestre, o índice apresentou uma variação quase nula de 0,02%. Em termos
homólogos, a variação do valor das rendas em 2011 tem-se mostrado positiva
e crescente, passando a taxa de variação homóloga de 0,4%, no 1º trimestre,
para 0,6% no 2º trimestre do ano.
O Índice regista a evolução de valor na Área Metropolitana de Lisboa (AM
Lisboa) desde 2005, onde, tal como a nível nacional, o valor das rendas variou
entre -2,8% e +1,8%. Desde 2008 que o índice de rendas desvalorizou em
média cerca de -0,01%. Acompanhando a tendência nacional, em 2011 as
rendas na AM Lisboa têm vindo a decrescer desde o 2º trimestre, com a taxa
de variação trimestral a cifrar-se em – 0,20%. Este comportamento contraria a
evolução positiva do valor das rendas na AM Lisboa verificada no 4º trimestre
de 2010 e no 1º trimestre de 2011, em que este indicador se situou em 0,9% e
em 0,2%, respetivamente. Considerando as variações homólogas do índice na
AM Lisboa, desde o 4º trimestre de 2010 que estas se mostram positivas,
tendo passado de 0,2% no final de 2010 para 0,3% no 3º trimestre de 2011.
Na Área Metropolitana de Porto (AM Porto), voltou a repetir-se a
tendência já registada a nível nacional e na AML, com o valor das rendas a
variar entre -1,6% e +1,7%. Desde 2008 que as rendas tiveram uma ligeira
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 88
valorização na AM Porto, em média de 0,1%. Entre o 3º trimestre de 2009 e o
2º trimestre de 2010, as rendas habitacionais na AM Porto registaram o mais
longo período de queda, de acordo com o Índice de Rendas Confidencial
Imobiliário, período durante o qual as taxas de variação trimestrais oscilaram
entre -0,9% e -1,4%. Iniciou-se, seguidamente, um período de recuperação
desde o 3º trimestre de 2010 até ao 3º trimestre de 2011, demonstrando uma
valorização de 0,5%. Entre o 4º trimestre de 2009 e o 4º trimestre de 2010, a
taxa de variação homóloga tem estado em terreno negativo. No entanto, desde
o início de 2011, esse indicador taxa tem atingido valores positivos. No 2º e 3º
trimestre de 2011, a taxa de variação homóloga foi de 1,6% e 2,1%,
respetivamente.
5.1.4.Dinâmica de Oferta e Arrendamento (Ci)
De acordo com o portal Lar Doce Lar, no 3º trimestre de 2011, Portugal
Continental tinha cerca de 23.185 imóveis em oferta para arrendamento.
Conjuntamente, a Área Metropolitana de Lisboa (58%) e Porto (26%)
concentram 85% da oferta total no portal. Extrapolando para um valor de
renda média e valor por fogo para Portugal Continental, chegamos ao preço
médio por de 9,6 €/ m² para os imóveis em oferta no portal. Todavia, este
valor estaria influenciado pelo peso dos concelhos de Lisboa, Porto, Cascais na
base de dados.
Na AM Lisboa, no 3º trimestre de 2011 a oferta de fogos no mercado de
arrendamento ascendeu a 13.573 imóveis, que se concentrava essencialmente
nos concelhos de Lisboa, Cascais e Oeiras, que conjuntamente detinham
cerca de 65% da oferta na AM. O concelho de Lisboa tem cerca de 5.300
imóveis em oferta para arrendamento, já os concelhos de Cascais e Oeiras têm
cerca de 2.500 e 1.100 respetivamente. Nestes concelhos também se verificam
as rendas mais elevadas em toda a região. Em Lisboa o valor ascendia a
10,9€/m², sendo este o valor mais elevado a nível Nacional. Já em Cascais e
Oeiras os valores ascendiam a 9,7€/m² e 8,6€/m² respetivamente
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 89
Ao analisar mais detalhadamente o município de Lisboa, é no eixo
central das Avenidas Novas que encontramos as principais bolsas de oferta a
nível concelhio, com 25% e 16% da oferta destinada a arrendamento. No
entanto, nestas áreas as rendas/m² não se mostravam, em média, as mais
elevadas do concelho, atingindo 11,3 € e 10 €, respetivamente. A Baixa da
cidade é a zona mais cara em termos de arrendamento habitacional, com uma
renda média 12,8 €/ m², possuindo, apenas 1% do total de fogos em oferta no
mercado. Seguia-se no ranking a zona histórica de Lisboa em que as rendas
atingiram 11,5 €/ m².
Mas ao analisar a procura no mercado de arrendamento constatamos
valores ligeiramente abaixo da oferta. Para analisar os valores de transação
utilizamos o Ci SIR, um serviço exclusivo da Ci (Confidencial Imobiliário) que
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 90
agrega informação fogo a fogo sobre a atividade de vendas/arrendamento de
fogos de uma pool de mais de 100 promotores e mediadores imobiliários. Na
AM Lisboa até ao 2º trimestre de 2011 os imóveis arrendados tinham um valor
médio por m² de 7,49€ o que equivalia a aproximadamente a um preço de
645€ por fogo. Em média, estes fogos demoravam quatro meses a ser
colocados no mercado, apresentando taxas de desconto de 4%. Isto significa
que o valor final de arrendamento era em média 4% mais baixo do que o valor
inicialmente pedido pelo fogo.
O Ci SIR apurou que, no concelho de Lisboa, em média os imóveis são
arrendados a 9,16€/m², o que equivale a um valor por fogo de 768€,
demorando aproximadamente quatro meses a serem colocados no mercado.
Outros concelhos da AM Lisboa que apresentaram boa dinâmica no mercado
de arrendamento foram Cascais, Oeiras, Sintra e Seixal. Em Cascais e Oeiras
os imóveis estavam a ser arrendados a um valor médio de 780€ e 653€
respetivamente. No entanto, e comparativamente a Lisboa, ambos os
concelhos têm um tempo de absorção de 5 meses. Por seu turno, o município
de Sintra demorava 3,5 meses a colocar um fogo no mercado de
arrendamento, mas por um valor inferior, 550€. O município do Seixal
registou uma boa dinâmica no 2º trimestre ao colocar imóveis no mercado de
arrendamento a um preço médio de 445€, ainda que a taxa de absorção neste
concelho tenha sido de 7 meses.
No 3º trimestre de 2011, o Portal Lar Doce Lar tinha em base dados cerca
de 6.014 fogos em oferta para arrendamento na AM Porto. A maioria dos fogos
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 91
disponíveis para arrendamento localizava-se no concelho do Porto, que
agregava mais de 53% do conjunto da oferta. Os concelhos de Matosinhos e
Vila Nova de Gaia também se apresentaram com alguma expressão, com 18%
e 14% dos alojamentos destinados a arrendamento naquela área
metropolitana. O concelho do Porto tem cerca de 3.200 imoveis em oferta para
arrendamento, já os concelhos de Matosinhos e Vila Nova de Gaia têm cerca
de 1.100 e 860 respetivamente. Nestes concelhos também se verificam as
rendas mais elevadas em toda a região, com o Porto a liderar ( 7,3 €/m²),
seguido de Matosinhos (6,8 €/m²) e Vila Nova de Gaia ( 5,5 €/m²).
Relativamente ao município do Porto, as freguesias que mais
contribuíram para a sua posição de destaque foram Paranhos (17%), Cedofeita
(16%) e Ramalde (15%), abarcando quase metade da oferta de arrendamento
do concelho. Ao invés, a oferta apresentava-se bastante diminuta nas
freguesias pertencentes à zona histórica da cidade, como Vitória, Miragaia,
São Nicolau e Sé. Atentando ao valor médio das rendas, no 3º trimestre de
2011 os concelhos do Porto e Matosinhos voltaram a sobressair, apresentando
as rendas mais elevadas da AM Porto: 7,3 €/m2 e 6,8 €/m². Por seu lado, os
mercados mais baratos eram Valongo e Vila do Conde, com rendas de 4,3
€/m². No Porto as freguesias de Nevogilde e Foz do Douro apresentaram-se
como as mais caras, com as rendas a atingirem valores médios por m² de 9,2 €
e 8,8 €.
No que diz respeito à procura, na AM Porto, analisando o Ci SIR, até ao
2º trimestre de 2011, os imóveis arrendados tinham um valor médio de
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 92
5,65€/m² o que se traduzia em média num preço por fogo na ordem dos 436€.
Estes imóveis em média demoravam 12 meses a ser colocados no mercado.
Isto indica que, em média os fogos na AM Porto demoram mais 8 meses a ser
arrendados que na AM Lisboa. Na AM Porto, as taxas de desconto dos fogos
arrendados rondam 1%, o que significa que os valores de oferta estão muito
próximos dos valores da procura.
De acordo com o Ci SIR, no concelho do Porto os imóveis são arrendados,
em média, a 6,35€/m², o que equivale a um valor por fogo cerca de 649€.
Estes imóveis demoram cerca de 18 meses a ser colocados no mercado. Outros
concelhos da AM Porto que apresentaram boa dinâmica no mercado de
arrendamento foram, segundo o Ci SIR, Matosinhos, Póvoa de Varzim e Braga
(no Ci SIR a AM Porto estende-se até Braga). Em Matosinhos os imóveis na
base de dados estavam a ser arrendados a um preço médio por 7,28€/ m², o
que correspondia a um valor de 562€, e registando períodos de absorção
inferiores a 3 meses. O município da Póvoa de Varzim e de Braga tinham
valores efetivos por fogos arrendados de 307€ e 320€ respetivamente.
Numa análise à base de dados do portal Lar Doce Lar, no 3º trimestre de
2011 o valor médio das rendas foi de 3,1 €/m² na região Norte e em 3,8 €/m2
no Centro. Os concelhos que possuíam, no 3º trimestre de 2011, um maior
volume de oferta no Norte – Braga, Guimarães e Santa Maria da Feira -
apresentavam rendas por m2 de 3,8 €, 4,0 € e 3,3 €, respetivamente.
Ao analisar mais detalhadamente a região do Algarve, e segundo o portal
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 93
Lar Doce Lar, no 3º trimestre de 2011 as rendas médias mais elevadas da
região encontravam-se em Loulé, Albufeira e em Vila Real de Santo António,
situando-se em 7,5 €/m², 6,6 €/m²e 6,5 €/m², na devida ordem. Pelo
contrário, com rendas médias abaixo de 4,4 €/m², os concelhos de Castro
Marim e São Brás de Alportel apresentavam-se como os mais baratos.
5.1.5.Panorama Internacional
Agora, numa perspetiva de investimento institucional, realizamos uma
análise dos Índices produzidos pelo Investment Property Databank (IPD), para
saber como o imobiliário residencial europeu se comportou nos últimos 10
anos. O IPD realiza índices Europeus que nos oferecem um quadro geral
relativo ao sentimento do mercado Europeu / Mundial. O IPD é líder mundial
na avaliação de performance de investimento imobiliário, apresentando os
dados numa perspetiva de investimento, que embora diferente da que já foi
falada anteriormente, é importante para perceber qual foi a reação dos
mercado de habitação Europeus nos últimos 10 anos. Assim, analisámos o
índice residencial de 3 países na Europa.
Entre 2001 e 2007 os mercados residenciais de Inglaterra, Suécia e
Holanda registaram retornos positivos entre os 5% e os 17%. O mercado
imobiliário sempre foi uma classe de ativos com menos volatilidade quando
comparado com o mercado de ações ou obrigações, mas quando em 2008 a
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 94
crise dos subprime se fez sentir nos Estados Unidos da América, rapidamente
os mercados Europeus reagiram. Nunca o IPD tinha registado retornos totais
tão baixos como em 2008, por exemplo o Reino Unido, um mercado habituado
a devolver retornos em média de 14%, registou nesse ano um retorno negativo
de 15,8%.
O mesmo se passou com a Suécia e a Holanda que também em 2008
devolveram retornos de -4,9% e 1-1% respetivamente. Nos últimos dois anos
estes mercados voltaram a reagir positivamente e devolveram retornos
positivos. Contudo esta classe de ativos continua a registar retornos inferiores
aos que já se registaram em décadas anteriores, não que o mercado esteja
mais volátil, mas a maior competitividade nos mercados, as crises de dívida
soberana e a diminuição do financiamento bancário vão estar sempre
correlacionados com a performance do mercado imobiliário.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 95
6. Caracterização da situação actual do mercado de arrendamento
A explosão da construção de edifícios novos, nas periferias das cidades e
a especulação imobiliária a que assistimos nestes últimos anos, em grande
parte sustentada pela descida das taxas de juros, conduziu o mercado de
arrendamento a uma estagnação ainda mais acentuada, e levou a que se
apresentasse um dos maiores ratios de habitação própria, por agregado
familiar, da União Europeia. Não obstante o aumento da oferta de fogos para
aquisição, o preço médio por metro quadrado da habitação em Lisboa era um
dos mais elevados da União Europeia115. Por outro lado, a opção de aquisição
de casa própria em detrimento do arrendamento gerou uma situação de
endividamento estrutural das famílias portuguesas e, consequentemente, um
estrangulamento do seu rendimento disponível.
Esta situação teve implicações ao nível social no que diz respeito à gestão
dos orçamentos familiares, designadamente, em matéria de investimento na
educação e na formação, mas também ao nível da mobilidade dos
trabalhadores.
Na verdade, o setor da habitação esteve concentrado na construção de
edifícios novos em detrimento da requalificação e reabilitação do património
imobiliário existente.
Uma breve análise dos números revelam esta tendência, enquanto que
em 1981, apenas 57% dos alojamentos, destinados a residência habitual,
eram ocupados pelos proprietários, registando-se uma percentagem de cerca
de 39% de arrendatários, em 2001, mais de 75% dos fogos eram ocupados
pelo respetivo proprietário, tendo o número de arrendatários descido para
cerca de 21%.
O mercado de arrendamento sofreu uma forte contracção desde 1980 até
2001.
Por outro lado, um terço dos contratos de arrendamento foram
115
De acordo com o estudo “Retrato da Habitação em Portugal, elaborado por Mónica Fréchaut,
promovido pela Associação Lisbonense de Proprietários, 2011,os preços médios por metro quadrado da
habitação em Lisboa situa-se nos 3552 euros, enquanto em Berlim, país onde os salários são em media o
triplo dos portugueses, o mesmo metro quadrado custa 1400 euros.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 96
celebrados antes de 1975, cerca de 16,5% foram celebrados entre 1975 1986 e
5,9% foram celebrados entre 1987 e 1990, enquanto que apenas 39,4% forma
celebrados após 1990. Assim, a maioria dos contratos de arrendamento em
vigor são anteriores a 1990.
Esta situação pode ser explicada por duas ordens de razão, por um lado
a política de fomento ao investimento público e privado na habitação, por
outro, a evolução do mercado financeiro e do acesso ao crédito.
Quanto ao primeiro fator, a adesão de Portugal à então Comunidade
Económica Europeia potenciou um grande investimento no domínio das infra-
estruturas alavancado pelos financiamentos comunitários. Ao que acresce, o
aumento da população portuguesa no início da década de oitenta, que levou
ao aumento das carências habitacionais. Desta forma, o mercado carecia de
oferta de habitação, o que originou um forte índice de construção que
culminou com a Expo 98. Assim, a década de noventa foi marcada por elevado
índice de construção que superou o crescimento das famílias, levando a que
em 2001 se registasse uma elevada taxa de desocupação dos fogos para
habitação. Cerca de 11% estavam vagos.
Quanto à evolução do mercado financeiro, a criação da zona euro levou a
que as entidades nacionais deixassem de controlar as taxas de juro praticadas
no mercado interbancário, transferindo esta competência para o Banco
Central Europeu. A fixação da taxa de referência (Euribor) para o crédito à
habitação, desceu progressivamente durante a década de noventa, tendo
atingido o seu valor mais baixo em 1999, cerca de 5.0%. Esta descida
acentuada da taxa de juro acompanhada de politicas de acessibilidade ao
crédito e de incentivos à aquisição de casa própria, nomeadamente o regime
do crédito bonificado, concorreram para distorcer o mercado de habitação,
levando, a uma especulação sobre o preço dos imóveis e ao crescimento da
taxa de endividamento das famílias.
Não podemos deixar sublinhar que a opção massiva das famílias
portuguesas na aquisição de habitação foi o resultado de uma falta de
alternativa devido à inexistência de políticas integradas de habitação e às
consequentes distorções neste mercado, note-se que os novos arrendamento
em regime de renda livre eram mais caros do que as mensalidades
correspondentes ao crédito à habitação, por outro lado os mecanismos de
suporte à habitação social eram inadequados. Em suma, o mercado de
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 97
aquisição de casa própria era muito mais competitivo do que o mercado de
arrendamento.
Esta tendência teve consequências ao nível do endividamento excessivo,
na verdade assistimos hoje às repercussões do excessivo recurso ao crédito à
habitação e ao aumento incontrolável dos encargos financeiros para as
famílias. De acordo com dados do Banco de Portugal o crédito à habitação que
representa atualmente cerca de 79,6% do total do endividamento das famílias.
Fruto desta realidade, e de acordo com dados do Banco de Portugal, só
no primeiro trimestre de 2011, as construtoras entregaram 3060 habitações
às instituições financeiras por falta de condições para assegurar o integral
cumprimento do crédito.
No fim da década de 90 o mercado de habitação própria sofreu alterações
profundas e registava um excedente, resultado de um crescimento
desproporcional do mercado de construção
Após o crescimento verificado na década de 90, o mercado está hoje
substancialmente diferente, por um lado do setor da construção encontra-se
em contração, fruto da redução drástica de investimento público, por outro, a
incerteza dos mercados financeiros provocada pela crise financeira
internacional gerou um aumento das taxas de juros e a imposição de fortes
restrições de acesso ao crédito à habitação.
As taxas de juro apresentam, ainda hoje, uma tendência para o
crescimento repercutindo-se no valor da prestação do crédito à habitação.
Assistimos, em particular, desde 2008 a uma forte queda dos níveis de
confiança no setor da habitação e a uma redução expressiva no número de
fogos concluídos e licenciados.
Perante uma crise declarada no setor imobiliário, a revitalização do
mercado de arrendamento surge como uma solução. Sendo cada vez mais
restrito o acesso ao crédito, e verificada a tendência para a subida das taxas
de juros, acompanhada da instabilidade gerada pela crise económica
Torna-se imperativo inverter a atual situação de desequilíbrio do mercado
em que o baixo retorno financeiro proveniente dos arrendamentos antigos
convive com os preços elevados dos arrendamentos praticados recentemente.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 98
De acordo com dados do INE de 2004, mais de metade dos arrendatários
pagam menos de 100 euros mensais de renda, dos quais cerca de 16% pagam
rendas inferiores a 14.96 euros, apenas 24% paga rendas que situam entre os
99.76 e os 249.39 euros e uma percentagem marginal de cerca de 2% paga
renda superior a 498.80 euros.
Acresce que, a caracterização dos proprietários é um fator que não
podemos deixar de ter em conta, na verdade um estudo efectuado pela
Associação Lisbonense de Proprietários, revela que 40,3% dos senhorios têm
mais de 66 anos e que cerca de 24% têm entre 51 e 65 anos, enquanto que
apenas 31.1% têm idades compreendidas entre os 36 e os 50 anos. Assim, a
maioria são reformados, cerca de 53.1%, 27% são trabalhadores por conta de
outrem e apenas 9.2% são trabalhadores por conta própria. Quanto ao grau
de instrução, a maioria apresenta licenciatura ou grau de instrução superior,
45.9%, 22 % têm escolaridade até ao 9ºano e cerca de 14.8% possui o 12 º ano
de escolaridade.
No que toca ao rendimento que obtêm da atividade de proprietário,
representa para a maioria entre 0 a 25% do seu rendimento e apenas 9.7%
dos proprietários vivem em exclusivo dos rendimentos das suas propriedades.
Podemos traçar uma breve panorâmica, os proprietários pertencem a
uma faixa etária elevada, o rendimento que obtêm das suas propriedades é
muito baixo e dedicam pouco tempo à atividade. Assim, não dispõem de
capacidade financeira e enfrentam obstáculos de acesso ao crédito, desde logo
devido à sua idade, por outro lado não têm de disponibilidade para obterem
informação sobre os programas de reabilitação urbanas nem os consideram
atrativos devido ao baixo nível de rendimento que obtém na atividade.
116
Estudo efectuado entre Abril e Maio de 2011 a um universo de 196 associados cujos
resultados constam no Estudo da Associação Lisbonense de Proprietários “Retrato da Habitação em
Portugal “ e que anexamos ao presente trabalho.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 99
6.1. Caracterização da política de arrendamento
A atual situação do mercado de arrendamento é marcada por uma
política de arrendamento inconsistente e caracterizada pela rigidez do regime
jurídico, em particular no que respeita ao congelamento de rendas, que data
da Primeira República e que foi perpetuada durante o regime do Estado Novo.
Esta política só começou a ser corrigida em 1985, ainda assim a intervenção
revelou-se insuficiente. Quando em 1990 o Regime do Arrendamento Urbano
pretendeu fomentar o mercado de arrendamento, já estavam estruturados os
incentivos à aquisição de casa própria, pelo que o seu efeito não foi o
esperado, por outro lado, não ficaram resolvidos os problemas relativos aos
contratos antigos cujas renda estavam completamente desatualizadas. O
processo de atualização de rendas proposto pela RAU é complexo, implicando
uma avaliação fiscal do imóvel e a conjugação com o coeficiente de
conservação do imóvel, o que exige do proprietário disponibilidade financeira
para investir no imóvel antes mesmo de poder atualizar a renda.
As consequências desta política são visíveis, o enfraquecimento do
mercado de arrendamento e o empobrecimento dos proprietários que tem
colocado em causa a conservação e reabilitação urbana. De acordo com dados
da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas117
existem
cerca de 800 mil imóveis a necessitar de obras e cerca de 200 mil em muito
mau estado de conservação.
O Novo Regime do Arrendamento Urbano teve como principal objetivo
solucionar as questões relativas aos arrendamentos anteriores a 1990.
O NRAU pretendia restaurar o equilíbrio no mercado de arrendamento,
mas cinco anos volvidos desde a sua entrada em vigor, verifica-se que os
resultados ficaram muito aquém do esperado. Na verdade, permanecem
muitos dos entraves de ordem burocrática, financeira e fiscal e assim
continuam por resolver muitas das situações relacionadas com os contratos
antigos, o que se traduz no agravamento da degradação do património
imobiliário.
O atual Governo inscreve no seu programa o objetivo de tornar o mercado
117
Estudo “Retrato da Habitação em Portugal , elaborado por Mónica Fréchaut, promovido pela
Associação Lisbonense de Proprietários, 2011.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 100
de arrendamento mais eficiente e criar condições de confiança, com vista a
fomentar a mobilidade dos trabalhadores, a redução do endividamento das
famílias e a dinamização do setor imobiliário. Para tanto, o programa a prevê a
necessidade de melhorar os mecanismos legais relevantes para o
arrendamento. Neste domínio propõe-se reforçar o princípio a liberdade
contratual, criar um sistema extrajudicial de despejo, em caso de falta de
pagamento de rendas, a introdução de mecanismos de correção das rendas
antigas, com base na negociação das partes e tendo em conta as condições de
habitabilidade do imóvel e a revisão das normas relativas aos prazos dos
contratos. Por último, o estabelecimento de mecanismos de proteção e
compensação social. Pretende ainda transformar o regime jurídico da
reabilitação urbana.
Tem-se consciência de que não é possível resolver a curto prazo
deficiências acumuladas ao longo de largas dezenas de anos, mas impõe-se a
tomada de medidas facilitadoras interligadas com a promoção da reabilitação
urbana e do desenvolvimento das cidades.
Com este objetivo, é essencial tomar um conjunto de medidas com vista à
revisão do regime vinculístico, em condições de sustentabilidade social e à
criação de condições de confiança para quem queira colocar imóveis no
mercado de arrendamento. Assim, as medidas a implementar deverão ser
sempre acompanhadas da estipulação de regras de protecção social, que
tenham em conta as situações económicas e sociais específicas dos
arrendatários.
Acresce que, no âmbito do compromisso assumido pelo Estado português
com a Troika, a reforma do arrendamento é um dos objectivos previstos e
calendarizados.
Assim, e tendo em conta as intenções do atual governo, podemos afirmar
que a política de arrendamento está a atravessar um período de reforma e que
é vista como uma das prioridades para dar resposta aos problemas
relacionados com o acesso à habitação e resolução de problemas relacionados
com o endividamento excessivo das famílias no âmbito do crédito à habitação.
A consequente existência de muitos fogos devolutos, quer porque os seus
compradores não conseguiram cumprir os compromissos perante a banca,
quer porque ao nível da construção a oferta de imóveis está
sobredimensionada face á atual procura. Finalmente, a necessidade de
dinamizar o mercado de arrendamento, conferindo-lhe mais confiança, como
forma de facilitar a mobilidade dos trabalhadores.
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Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 101
7. Identificação dos principais bloqueamentos do mercado de arrendamento
Ao longo deste estudo temos vindo a identificar vários bloqueamentos de
natureza legal ao mercado de arrendamento, pelo que iremos, de seguida,
proceder a uma síntese.
No que se prende com o mercado de arrendamento urbano, verificámos a
incapacidade da lei atual para tornar o arrendamento atrativo quer para o
senhorio quer para o inquilino. Assim, podemos identificar bloqueamentos no
mercado para ambas as partes.
Se para o senhorio o regime legal comporta vários constrangimentos à
sua rentabilidade e não oferece confiança, para o arrendatário o mercado não
lhe proporciona oferta suficiente e adequada, e os preços praticados são muito
elevados.
O que significa que, para os senhorios ou potenciais senhorios, tem de
ser minimamente atrativo fazer obras e requalificar os imóveis, e para os
inquilinos a renda tem de se situar substancialmente abaixo da prestação
financeira correspondente à compra de casa. Neste momento, urge
desbloquear uma série de obstáculos que na lei atual têm impedido a
concretização destes objetivos. Importa também criar condições para o
crescimento, nos centros urbanos, da oferta de habitações com tipologias mais
adequadas às necessidades das famílias.
O excessivo vinculísmo que o atual enquadramento legal confere ao
contrato de arrendamento é um constrangimento à dinâmica do mercado,
tornando muito difícil a recuperação de imóveis dados em arrendamento.
No âmbito da tutela dos legítimos interesses do senhorio, a morosidade
do atual mecanismo de despejo e da efectiva desocupação do locado retira a
confiança ao mercado e sublinha a tendência para a prática de preços
elevados já a contar com os custos destes procedimentos.
De fato, um dos principais bloqueamentos à confiança no mercado é a
falta de garantia de cumprimento da obrigação de pagar as rendas, em
especial no decurso de um processo de despejo.
Relativamente às rendas antigas, a dependência do estado de
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 102
conservação do imóvel com a renda exigível, associada ao fato de não ser
possível a correção automática das rendas, constitui uma situação
desproporcionada onerando os senhorios com um encargo de protecção social
dos arrendatários que deveria, em primeira linha, caber ao estado. Esta
situação é tanto mais gravosa e incompreensível no domínio dos
arrendamentos não habitacionais, constituindo mesmo um falseamento das
regras da concorrência do mercado.
Ainda no que diz respeito aos contratos de arrendamento antigos, a
quase impossibilidade de cessação do contrato e as situações de transmissão
forçada do arrendamento impossibilitam estes fogos de entrarem no mercado
em condições mais atrativas e impede a regeneração urbana. Na verdade, é
um forte bloqueamento ao aparecimento de uma oferta de habitação mais
diversificada e mais condizente com as necessidades das famílias.
Outro bloqueamento grave, prende-se com o tratamento fiscal dos
rendimentos provenientes do arrendamento que face a outro tipo de
investimento não é atrativo.
Fora do âmbito da legislação do arrendamento, mas com uma relação
especial com este mercado, podem ser identificados outros constrangimentos,
nomeadamente, a morosidade e complexidade dos licenciamentos na área da
regeneração urbana e o acesso aos incentivos à reabilitação urbana.
De sublinhar ainda a inexistência de mecanismos financeiros que apoiem
o mercado de arrendamento. A falta de dinamização dos FIIAH, a par da
inexistência de mecanismos de seguro de cumprimento das rendas,
constituem nesta matéria, constrangimentos relevantes.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 103
7.1. A dinamização do mercado imobiliário
A dinamização do mercado de arrendamento depende, para além de uma
reforma legislativa que seja capaz de eliminar os bloqueamentos existentes no
mercado, de soluções criativas que constituam instrumento ativos de
promoção do mercado de arrendamento. Destacamos a titulo de exemplo uma
iniciativa diferenciada que conseguiu obter sucesso e pode ser um exemplo
para que outras iniciativas deste tipo se possam desenvolver.
A Câmara Municipal de Gaia está a desenvolver um projecto inovador
denominado "Programa Arco-Íris - Novos Horizontes para o Arrendamento", cujo
objetivo é apostar no mercado social de arrendamento, criando oportunidades
de habitação para famílias da classe média que, não estando na situação de
beneficiar do direito a habitação social, não possuem rendimentos suficientes
para adquirir casa própria.
O projeto deu lugar à constituição de um Fundo de Investimento
Imobiliário Fechado, intitulado "Gaia de Ouro" que, a par do investimento de
uma instituição bancária, se revelou um instrumento essencial para as
intervenções de reabilitação urbana desenvolvidas pela Câmara, tendo
abrangido 48 habitações para arrendamento em condições diferenciadas.
Estes fogos têm como destinatários casais jovens e agregados familiares da
classe média com dificuldades económicas.
Esta política passa por utilizar os Fundos de Investimento Imobiliário
para Arrendamento Habitacional (FIIAH) para a reabilitação de prédios
devolutos com vista ao mercado de arrendamento.
O projeto pretende, em primeira linha, resolver as dificuldades
habitacionais mas também rentabilizar o crescente património imobiliário que
os bancos têm adquirido no âmbito da falência das empresas construtoras.
Por outro lado, resolve um problema de caráter urbanístico gerado pelos
empreendimentos inacabados e pelos edifícios que carecem de reabilitação.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
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7.2. Processo de alteração legislativa em curso
A necessidade de reformar o enquadramento legal do arrendamento
urbano é hoje uma certeza tendo em conta a necessidade de dinamizar este
mercado como forma de responder aos desafios da atual situação económica.
São já vários os documentos tornados públicos que procuram dar o seu
contributo para esta reforma. No presente estudo, fazemos uma síntese da
proposta apresentada pela Associação Nacional de Proprietários por
entendermos que se trata de um documento que procura equilibrar os
interesses do senhorio e do arrendatário e a necessidade de dinamizar o
mercado de arrendamento .
A proposta elege duas questões que considera essenciais, por um lado,
identificar as modificações à legislação do arrendamento com vista a atrair
investidores para o mercado da habitação e por outro, quais as medidas
necessárias para alcançar um equilíbrio na relação contratual entre senhorio e
arrendatário.
De acordo com o documento, as duas questões partilham de um mesmo
problema, ou seja, o congelamento histórico das rendas que não proporciona
meios para o investimento no parque imobiliário e que, simultaneamente,
desequilibra, em desfavor do senhorio a relação contratual de arrendamento.
Na verdade, as sucessivas reformas legislativas não lograram ter êxito na
solução do problema, assim propondo-se, à semelhança da opção espanhola, a
correção do valor das rendas tendo em conta o coeficiente de desvalorização da
moeda, calculado a partir do índice de preços ao consumidor, sem habitação.
A correção monetária das rendas, ainda que não seja suficiente para nivelar a
preços de mercado as rendas mais antigas, seria uma medida capaz de
relançar a negociação entre senhorios e arrendatários e tornar mais
equilibrada esta relação jurídica.
Ainda na generalidade, outra questão considerada essencial é a ação de
despejo que deverá ser rápida e eficiente promovendo a desocupação do imóvel
nas situações de incumprimento do arrendatário. A proposta sugere que a
desjudicialização do processo resolveria cerca de 90% das situações.
Também se sugerem alterações no domínio da fiscalidade e no domínio
do procedimento de aprovação de obras.
Especificamente a proposta apresenta as seguintes alterações:
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
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No que toca ao regime transitório:
- Eliminar a imposição do senhorio pagar a compensação por obras feitas
pelo arrendatário nas situações de cessação ou de denúncia do contrato no
âmbito da correção de rendas.118
-Estabelecer como critério de correção o coeficiente de desvalorização da
moeda, eliminando ao limites à correção. Assim, o valor alvo resulta da
multiplicação do valor inicialmente contratado pelo coeficiente de
desvalorização da moeda relativo ao ano do contrato das rendas relativas aos
contratos habitacionais celebrados antes da entrada em vigor do RAU e não
habitacionais antes da entrada em vigor do Decreto-Lei 257/95.119
-Revogar o conceito de valor do locado que se estabelece com base numa
avaliação nos termos do Código de Imposto Municipal, o que tem conduzido a
avaliações superiores ao valor objectivo dos imóveis com consequências fiscais
gravosas inibindo os proprietários de procederem à atualização das rendas.
-Revogar também, o conceito de coeficiente de conservação, sendo que,
estes dois conceitos deixam de ser pressupostos para a atualização das
rendas, a qual passará a ser calculada de acordo com o fator de desvalorização
da moeda referente a esse ano. Em consonância com estas alterações a
comunicação do senhorio ao arrendatário deve apenas conter o montante da
renda futura e o modo de cálculo.120
- Quanto ao faseamento do processo de correção das rendas, cujo
objetivo é permitir que o arrendatário se adapte aos novos custos de habitação
propõe-se dois prazos distintos: um prazo geral de 3 anos (6 semestres) e um
prazo especial de 6 anos (12 semestres) para as situações em que o
arrendatário aufira um rendimento anual bruto corrigido inferior a 3
retribuições mínimas nacionais anuais, ou, quando o arrendatário seja
portador de grau de incapacidade superior a 80%.121
-Revogar a disposição que confere ao arrendatário o direito a obras e
revogar a disposição que prevê as Comissões Arbitrais Municipais122
.
118
Alteração sugerida ao artigo 29º do NRAU 119
Alteração sugerida aos artigos 30º e 31º do NRAU 120
Alteração sugerida aos artigos 32º a 36º do NRAU 121
Alteração sugerida aos artigos 37 a 41º do NRAU e com as necessárias adaptações aos artigos 42º a
47º do mesmo diploma. 122
Alteração sugerida aos artigos 48º e 49º do NRAU
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 106
No que toca às alterações ao Código Civil:
- A redução da comunicabilidade do arrendamento ao cônjuge primitivo
de arrendatário.123
- O alargamento da possibilidade de antecipação de rendas por um
período não superior a 3 meses para além da renda relativa ao mês inicial e da
caução.124
- A simplificação do meio de comunicação por parte do senhorio do
aumento anual do valor da renda, através da comunicação eletrónica.125
- Redução do prazo, para 45 dias, no caso de mora no pagamento das
rendas para a fundamentação da resolução contratual pelo senhorio e redução
do período para o arrendatário pôr termo à mora para igual período. 126
- A necessidade de reconhecimento expresso para ratificar o
subarrendamento não autorizado.127
- Limitar o direito de preferência às situações de dação em cumprimento
do locar arrendado, eliminando assim o direito de preferência da venda que
contribuía para a diminuição do poder negocial do proprietário. Por outro lado,
elimina-se igualmente o direito de preferência por um novo arrendamento,
retirando o caráter vinculístico ao contrato, até porque não é apenas a renda
que preside ao interesse contratual, outras questões assumem relevância
especial, como por exemplo, a conservação do imóvel ou a boa vizinhança, pelo
que a escolha da pessoa do arrendatário deverá estar no poder de decisão do
senhorio.128
- Qanto às pessoas que podem residir no local arrendado, em particular,
a união de fato, exige-se que a convivência em economia comum perdure por
mais de um ano e uma comunicação escrita ao senhorio.129
- Liberalizar os prazos para a celebração de contratos de arrendamento
por período determinado, estabelecendo o prazo de 5 anos como prazo
supletivo.130
123
Alteração sugerida ao artigo 1068º Código Civil 124
Alteração sugerida ao artigo 1076º Código Civil 125
Alteração sugerida ao artigo 1077º Código Civil 126
Alteração sugerida aos artigos 1083º e 1084 º Código Civil 127
Alteração sugerida ao artigo 1088º Código Civil 128
Alteração sugerida ao artigo 1091º Código Civil 129
Alteração sugerida ao artigo 1093º Código Civil 130
Alteração sugerida ao artigo 1095º Código Civil
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 107
-Na oposição à renovação automática do contrato por parte do senhorio,
encurta-se o período de pré-aviso, estabelecendo um prazo supletivo de 6
meses.131
- Redução dos prazos de pré-aviso para oposição à renovação automática
por parte do arrendatário para 60 dias.132
- Clarificação do requisito para denúncia do contrato por parte do
senhorio. Propondo-se que a redação do artigo seja mais clara, objetivando a
condição do senhorio dispor de casa própria ou arrendada que satisfaça as
suas necessidades habitacionais ou dos seus descendentes em 1º grau,
dentro na área metropolitana de Lisboa ou Porto, ou, no resto do País, em
conselho limítrofe.133
-Nas situações de transmissão por morte, clarificação de que a
transmissão ocorre apenas relativamente ao arrendatário primitivo e que a
união de fato deve ser comprovada.134
131
Alteração sugerida ao artigo 1097º Código Civil 132
Alteração sugerida ao artigo 1098º Código Civil 133
Alteração sugerida ao artigo 1102º Código Civil 134
Alteração sugerida ao artigo 1106º Código Civil
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Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 108
7.3. A Proposta de Alteração ao Regime Jurídico do Arrendamento:
Proposta de Lei 38/XII
De acordo com o compromisso assumido por Portugal no “Memorandum
da Troika” o governo português assumiu a iniciativa de apresentar um pacote
de medidas para promover o mercado de habitação. Os principais objetivos a
alcançar e que deverão servir de parâmetros às alterações legislativas são:
melhorar o acesso das famílias à habitação, melhorar a qualidade da
habitação promovendo uma melhor utilização do parque habitacional e reduzir
os incentivos legais que promovem o aumento do endividamento das famílias e
reformar o regime jurídico do arrendamento.
Neste domínio, o governo assumiu o compromisso de apresentar um
projeto de alteração da Lei do Arrendamento até ao terceiro trimestre do ano
de 2011, no sentido de repor o equilíbrio entre os direitos e obrigações das
partes, em particular, tendo em consideração as necessidades específicas dos
arrendatários mais vulneráveis
Esta reforma deverá flexibilizar a renegociação dos arrendamentos
residenciais sem termo, designadamente:
-Limitando as situações de transmissão do contrato a parentes de
primeiro grau;
-Prevendo a redução do aviso prévio de rescisão de contratos de
arrendamento para os senhorios;
-Fomento ao mercado de arrendamento, liberalizando as rendas e
simultaneamente criando mecanismos de apoio aos mais vulneráveis
socialmente; -Agilização dos procedimentos adjetivos, nomeadamente, prevendo um
procedimento extrajudicial de despejo por quebra de contrato, com vista a
reduzir o tempo de despejo para três meses, e reforçar a utilização dos
procedimentos extrajudiciais existentes para os casos de partilha de bens
herdados.
Assim, a Proposta de Lei 38/XII tem como principais objectivos:
- a alteração ao regime substantivo, vertido no Código Civil;
- a revisão do sistema de transição dos contratos antigos para o novo
regime;
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 109
-. a agilização do procedimento de despejo; e
- a melhoria do enquadramento fiscal.
Face a estes objetivos a proposta de lei apresenta as seguintes inovações:
-Quanto à duração do contrato, cabe ao inquilino e proprietário
acordarem, o seu período de vigência e respectivas actualizações, na falta de
estipulação, para os contratos habitacionais, o contrato considera-se
celebrado com prazo certo por um período de dois anos; nos contratos não
habitacionais considera-se celebrado por um período de cinco anos, não
podendo o arrendatário denunciá-lo com antecedência inferior a um ano. O
regime determina o fim dos contratos vitalícios135.
- Quanto à atualização das rendas, propõe-se que a atualização das
rendas antigas passe por uma negociação entre proprietários e inquilinos, tal
como acontece nos contratos recentes. O senhorio avança com um valor, ao
qual se pode seguir uma contraproposta do inquilino. O valor médio indicado
pelas duas partes servirá de base ao pagamento de uma indemnização por
parte do senhorio.
- Quanto aos regimes especiais, a proposta prevê mecanismos de
excepção para três situações: pessoas idosas, pessoas com deficiência superior
a 60% e casos de carência económica, definidos como agregados familiares
com rendimento anual bruto corrigido inferior a cinco retribuições mínimas
nacionais anuais. Cabe ao inquilino provar as carências económicas para que
a atualização da renda antiga beneficie de um período de transição de cinco
anos. No caso dos idosos com idade superior a 65 ano e de pessoas com grau
de incapacidade superior a 60%, pode existir atualização da renda, mas o
arrendatário nunca poderá ser expulso do imóvel caso não entre em acordo
com o proprietário. Assim, os agregados familiares com um rendimento
mensal até 500 euros só poderão ter uma atualização de renda de casa até
10% da sua taxa de esforço. Nos casos dos agregados com rendimento mensal
entre 2.000 a 2.500 euros, a atualização não poderá ser superior a 25% da
135
Contratos de arrendamento habitacionais, a redacção que a Proposta de Lei estabelece para o artigo
1094º do CC; Contratos de arrendamento não habitacionais, a redacção que a Proposta de Lei estabelece
para o artigo 1110º do CC.
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Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 110
taxa de esforço do agregado familiar. As situações de carência económica têm
de ser comprovados pelas Finanças. Fora destas excepções, o senhorio pode
em qualquer altura iniciar o processo de atualização das rendas anteriores a
1990.
- A Proposta prevê a criação de um “mecanismo especial de despejo”,
sendo que a sua tramitação caracteriza-se por uma estrutura que assenta
num procedimento extrajudicial junto do Balcão Nacional do Arrendamento;
uma fase judicial que pode ser despoletada pela iniciativa/oposição do
arrendatário e, de forma independente, a acção de despejo.
O Balcão Nacional do Arrendamento é criado, junto da Direcção-Geral da
Administração da Justiça, mas não se integra na orgânica judicial. Tem como
principal função assegurar a tramitação do procedimento extrajudicial de
despejo com competência em todo o território nacional136. A direcção do BNA é
atribuída ao secretário a quem compete a direcção do procedimento
extrajudicial de despejo, nomeadamente, a notificação ao requerido do
requerimento de despejo, a conversão do requerimento de despejo em título de
desocupação e a apresentação à distribuição do requerimento após deduzida
oposição pelo arrendatário.
Quanto ao âmbito do procedimento extrajudicial junto do BNA aplica-se
nas seguintes situações: cessação do contrato por revogação; caducidade do
contrato de arrendamento pelo decurso do prazo; cessação do contrato por
oposição à renovação; cessação do contrato de arrendamento por denúncia
livre pelo senhorio; cessação do contrato de arrendamento por denúncia para
habitação do senhorio ou filhos ou para obras profundas; à cessação do
contrato de arrendamento por denúncia pelo arrendatário; bem como à
resolução do contrato de arrendamento por não pagamento de renda por mais
de 2 meses, ou, por oposição pelo arrendatário à realização de obras coercivas.
A principal finalidade do procedimento extrajudicial de despejo é efetivar
a cessação do arrendamento, independentemente do fim a que se destina,
quando o arrendatário não desocupe o locado na data prevista na lei, ou, na
data prevista por convenção entre as partes.
Acresce que, no âmbito do procedimento extrajudicial de despejo, o
pedido de pagamento de renda, encargos ou despesas pode ser deduzido
136
Nos termos da Proposta de Lei no artigo 15º A NRAU.
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Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 111
cumulativamente com o pedido de desocupação do locado137. Evita-se, desta
forma, a instauração em tribunal de duas acções distintas: uma para efectivar
o despejo e outra para obter o pagamento das rendas em atraso.
- O procedimento extrajudicial de despejo desenvolve-se por iniciativa do
senhorio, que apresenta junto do Balcão Nacional do Arrendamento o
requerimento de despejo. O Balcão Nacional do Arrendamento promove a
notificação ao arrendatário e se o arrendatário não deduzir oposição ao pedido
de despejo, o balcão emite o título de desocupação do imóvel arrendado, sendo
que com base neste documento, o senhorio pode proceder ao despejo imediato.
No caso do arrendatário se recusar a proceder a entrega voluntária do
locado, haverá lugar à intervenção de tribunal, com natureza urgente, para a
obtenção da autorização de entrada no seu domicílio, o que indicia que a
intervenção do tribunal para obtenção desta autorização, limita-se as
situações de desocupação de imóveis objecto de contratos de arrendamento
para habitação, excluindo os contratos de arrendamento não habitacionais.
A proposta de lei prevê algumas causas de suspensão do procedimento
especial de despejo, nomeadamente, tratando-se de arrendamento para
habitação, há lugar à suspensão das diligências executórias, quando se
mostre, por atestado médico, que a diligência põe em risco de vida a pessoa
que se encontra no local, por razões de doença aguda, deve ainda indicar,
fundamentadamente, o prazo durante o qual se deve suspender a execução.
Por outro lado, o arrendatário pode requerer o diferimento da
desocupação do locado 138, por razões sociais imperiosas, por um período de
cinco meses. O diferimento de desocupação do locado para habitação é
decidido de acordo com o prudente arbítrio do tribunal, devendo o juiz ter em
consideração as exigências da boa fé; a circunstância de o arrendatário não
dispor, imediatamente, de outra habitação; o número de pessoas que habitam
com o arrendatário; a sua idade; o seu estado de saúde e, em geral, a situação
económica e social das pessoas envolvidas.
Até à dedução da oposição ou, na sua falta, até ao termo do prazo de
oposição, o requerente pode desistir do procedimento especial de despejo.
137
Nos termos da proposta na alínea e) do nº2 do artigo 15ºB do NRAU. 138
De acordo com a redacção que a Proposta de Lei estabelece para os artigos 15º-O a 15º-P do NRAU e
artigos 930º-C e D do Código Processo Civil.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 112
Caso não seja apresentada oposição ao requerimento de despejo pelo
requerido (arrendatário), dentro do respectivo prazo, ou, tendo sido deduzida,
não se tenha verificado o pagamento, ou, o depósito das rendas vencidas, este
converte-se em título para desocupação do locado.
Porém, o título de desocupação pode ser impugnado, sendo que a
impugnação tem sempre efeito meramente devolutivo, seguindo, com as
necessárias adaptações, a tramitação do recurso de apelação, nos termos do
Código de Processo Civil139.
- A fase judicial decorre da iniciativa/oposição do arrendatário nas
situações em que, após a notificação pelo BNA, este deduz oposição ao pedido
de despejo por não verificação do fundamento invocado pelo senhorio. Neste
caso, há lugar à intervenção do juiz, num processo judicial especial e urgente,
mas apenas nos casos em que é prestada caução, paga a taxa de justiça e, no
decurso do mesmo, efectuado o depósito das rendas vencidas.
No âmbito da apreciação judicial140, o juiz decide todas as questões
referentes ao pedido de despejo apresentado no procedimento especial,
devendo a decisão final incluir a autorização para a entrada imediata no
domicílio do arrendatário, caso considere que o despejo deve ser efectivado.
Evita-se, desta forma, o reenvio do processo ao tribunal quando o arrendatário
se recuse a sair do locado.
O procedimento judicial desenvolve-se do seguinte modo:
(I) Deduzida oposição, o secretário do BNA apresenta os autos à
distribuição e remete ao requerente cópia da oposição;
(II) Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes para, no prazo de 5
dias, aperfeiçoarem as peças processuais;
(III) Não julgando logo procedente alguma excepção dilatória ou nulidade
que lhe cumpra conhecer, ou não decidindo logo do mérito da causa, o juiz
ordena a notificação das partes da data da audiência de julgamento.
(IV) Havendo lugar a audiência de julgamento, esta realiza-se no prazo de
20 dias, a contar da distribuição.
(V) Findo o julgamento, a sentença, sucintamente fundamentada, é logo
ditada para a acta. 139
Nos termos dos artigos 692º e seguintes do Código de Processo Civil. 140
Ao abrigo da redacção da Proposta de Lei nos artigos15º-H, 15º-I e 15º-M NRAU.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 113
Independentemente do valor da causa e da sucumbência, da decisão
judicial para desocupação do locado cabe sempre recurso de apelação, nos
termos do Código de Processo Civil, o qual tem sempre efeito meramente
devolutivo.
Nestes termos, em relação ao incumprimento, por falta de pagamento de
rendas, passa a ser possível avançar para a resolução contratual em caso de
mora igual ou superior a dois meses no pagamento da renda, ou de quaisquer
outras despesas que incorram por conta do arrendatário e, ainda, quando o
arrendatário se constitua em mora por um período superior a oito dias, no
pagamento da renda, por mais de quatro vezes seguidas ou interpoladas, num
período de doze meses, com referência a cada contrato.
Perante esta situação, o senhorio deverá interpelar o arrendatário, para a
resolução do contrato, por uma das seguintes formas: I) notificação judicial
avulsa; (II) contato pessoal de advogado ou solicitador de execução; (III) escrito
assinado e remetido pelo senhorio, mediante carta registada com aviso de
receção, faculdade esta que, apenas é conferida nos contratos de
arrendamento que tenham sido celebrados por escrito e em que tenha sido
convencionado o domicílio.
Se o arrendatário não proceder á regularização da situação, mediante o
pagamento das rendas, nem proceder á entrega do imóvel locado, o senhorio
pode lançar mão do procedimento especial de despejo, junto do Balcão
nacional do Arrendamento. Desta forma, a proposta torna mais célere o
despejo de um inquilino com rendas em atraso, optando pela via extra-
judicial. Abrem-se no entanto duas excepções, que podem levar a que muitas
acções se mantenham nos tribunais: é obrigatória a intervenção do juiz
quando o inquilino "se oponha" à via extra-judicial e quando é preciso forçar a
entrada no imóvel. De sublinhar que, no âmbito de um regime transitório de
cinco anos, os inquilinos com mais de 65 anos, com grau de incapacidade
superior a 60% ou com carências económicas não podem ser despejados.
- A Proposta de Lei vem alterar a natureza do título, passando a designá-
los com documentos que “…podem servir de base ao procedimento…”, e que
são os seguintes141:
141
Previstos na Proposta no nº 2 do artigo 15º do NRAU.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 114
a) Em caso de revogação, o contrato de arrendamento, acompanhado do
acordo previsto no n.º 2 do artigo 1082.º do Código Civil;
b) Em caso de caducidade pelo decurso do prazo, não sendo o contrato
renovável, o contrato escrito donde conste a fixação desse prazo;
c) Em caso de cessação por oposição à renovação, o contrato de
arrendamento acompanhado do comprovativo da comunicação prevista no
artigo 1097.º, ou, no n.º 1 do artigo 1098.º do Código Civil;
d) Em caso de denúncia por comunicação, o contrato de arrendamento,
acompanhado do comprovativo da comunicação prevista na alínea c) do artigo
1101.º, ou, no n.º 1 do artigo 1103.º do Código Civil;
e) Em caso de resolução por comunicação, o contrato de arrendamento,
acompanhado do comprovativo da comunicação prevista no n.º 2 do artigo
1084.º do Código Civil, bem como, quando aplicável, do comprovativo, emitido
pela autoridade competente, da oposição à realização da obra;
f) Em caso de denúncia pelo arrendatário, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do
artigo 1098.º do Código Civil, do artigo 34.º ou do artigo 53.º, o comprovativo
da comunicação da iniciativa do senhorio e o documento de resposta do
arrendatário
- Quanto á acção de despejo142, destina-se a fazer cessar a relação
jurídica do arrendamento, sempre que a lei imponha o recurso à via judicial
para promover tal cessação, ou seja, nas situações não abrangidas pelo
mecanismo especial de despejo.
Da interpretação do artigo 1048º do Código Civil, com a redacção que lhe
é dada pela Proposta de Lei, parece resultar que o procedimento especial de
despejo e a acção de despejo são meios alternativos ao dispor do senhorio.
A acção de despejo segue a forma do processo comum declarativo
prevista do Código de Processo Civil. No que toca à tramitação da acção de
despejo, importa sublinhar algumas situações especiais:143
(I) Na pendência da acção de despejo, a rendas vencidas devem ser pagas
ou depositadas, nos termos gerais.
(II) Se as rendas, encargos ou despesas, vencidos por um período igual
ou superior a dois meses, não forem pagos ou depositados, o arrendatário é
142
Nos termos da redacção dada pela Proposta de Lei ao artigo 14º NRAU. 143
Previstas nos nºs 3, 4 e 5 do artigo 14º da Proposta de Lei.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 115
notificado para, em 10 dias, proceder ao seu pagamento ou depósito acrescido
da importância da indemnização devida, juntando prova aos autos, sendo, no
entanto, condenado nas custas do incidente e nas despesas de levantamento
do depósito, que são contadas a final.
(III) Em caso de incumprimento pelo arrendatário desta obrigação, o
senhorio pode requerer o despejo imediato144.
- Prevê-se que, em caso de obras profundas ou demolição do imóvel, que
obriguem à desocupação, o contrato cessa com indemnização, não se impondo
a obrigatoriedade de alojamento, salvo se, estiverem em causa idosos com
idade igual ou superior a 65 anos, ou, pessoas com incapacidade superior a
60%.
O novo regime de arrendamento urbano, depois de aprovado deverá
entrar em vigor no segundo trimestre do próximo ano.
Acresce que, com vista a dinamizar o mercado de arrendamento, o
Governo anunciou que irá proceder a alterações no enquadramento fiscal dos
rendimentos provenientes do arrendamento, aproximando-o da tributação dos
rendimentos de capital145. Espera-se que a tributação dos rendimentos
prediais possa ser alvo de uma taxa liberatória sobre as rendas, que são
atualmente englobadas na declaração anual de IRS e tributadas portanto, à
taxa correspondente ao escalão de rendimento do proprietário dos imóveis.
144
Aplicando-se, em caso de deferimento do requerimento, com as necessárias adaptações, o disposto no
n.º 6 do artigo 15.º e dos artigos 15.º-J, 15.º-L e 15.º-N a 15.º-P do NRAU. 145
Espera-se que esta proposta conste no Orçamento de Estado para 2012.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 116
8.Breve estudo de direito comparado
Neste capítulo faremos uma breve abordagem ao enquadramento legal do
arrendamento em vigor noutros países europeus. O estudo e a análise de
outras soluções legais encontradas nos nossos parceiros comunitários pode
constituir um contributo importante na busca de novas abordagens e de
soluções criativas para o nosso ordenamento jurídico. Desde logo, porque na
maioria destes países o mercado de arrendamento já representa mais de 40 %
da actividade imobiliária, por exemplo em países como a Alemanha, França,
Holanda, Áustria e Suécia, enquanto que em Portugal não ultrapassa os
13%.146Ora, tendo em conta a necessidade de revitalizar o mercado de
arrendamento importa perceber quais as principais características destes
mercados.
8.1.Características do mercado de arrendamento na Alemanha
No mercado imobiliário alemão o arrendamento absorve cerca de 57 % e
embora apenas 14% da população de Berlim possua casa própria, esta taxa
eleva-se a 42% considerando a totalidade do território.
A política do governo em matéria de habitação tem vindo incentivar a
aquisição de casa própria como uma componente importante dos planos de
reforma. Por outro lado, o governo lançou um conjunto de incentivos fiscais e
subvenções maciças para ajuda à reconstrução de Berlim Oriental e da antiga
Alemanha Oriental. Esta situação gerou um excesso de oferta e um mercado
baseado na especulação imobiliária. Quando os incentivos fiscais foram
abolidos, no final de 1990, os preços começaram a cair.
A política de construção assenta num sistema liberal em que os
particulares têm direito a construir, nos termos da Constituição alemã, desde
que não existam disposições legais contrárias. Assim, sempre que a
construção se enquadre no plano de ordenamento, o particular tem direito ao
parecer favorável das autoridades competentes. Os governos locais,
146
De acordo com dados fornecidos pela UEPC (União Europeia dos Construtores Promotores)
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 117
competentes para elaborar os planos de ordenamento, são diretamente
interessados neste processo, uma vez que o seu financiamento depende do
número de habitantes, assim este desenvolvimento é incentivado até como
forma de aumentar os seus orçamentos.
Apesar dos esforços do governo no sentido de incentivar a aquisição de
casa própria, o arrendamento ainda é a forma mais comum de habitação na
Alemanha, consequentemente, o sistema político é altamente sensível aos
direitos dos inquilinos, controlando o valor das rendas e conferindo aos
inquilinos uma ampla protecção sendo, por vezes, difícil para os proprietários
fazerem cessar o contrato. Por este motivo, alguns senhorios são muito
cautelosos ao escolher os futuros inquilinos.
O mercado de arrendamento confere ao mercado da habitação uma
elevada estabilidade e é um fator que contribui para que os alemães não
apostem na aquisição de casa própria. Como tal, a Alemanha não sofreu o
impacto da crise de especulação imobiliária. Na verdade, o mercado de
arrendamento representa cerca de 60% do mercado de habitação. A maioria
dos arrendamentos, cerca de 90%, estão sujeitos à lei privada e apenas os
restantes 10% são regulados por legislação especial de direito público
aplicável à habitação social.
De acordo com o artigo 535º BGB147, um contrato de arrendamento
(Mietvertrag) é definido como a concessão do uso de uma coisa em troca de
dinheiro.
O enquadramento jurídico do contrato de arrendamento, muito
influenciado pelas suas origens românicas, caracterizava-se pela sua natureza
dispositiva, não existindo normas especiais de proteção aos inquilinos.
Porém, a inexistência de uma política de apoio à construção, aliada às
consequências da Primeira Grande Guerra Mundial, gerou um deficit
habitacional no pós-guerra e potenciou muitos abusos por parte dos senhorios
face aos direitos dos arrendatários. Esta situação legitimou a intervenção do
Estado, que promulgou um regime de protecção dos inquilinos e um conjunto
de mecanismos de controlo do parque habitacional, designadamente, o registo
dos fogos disponíveis, o poder de distribuir estes fogos e de decidir sobre a
validade da cessação dos contratos de arrendamento, bem como uma política
de controlo de rendas. Na verdade, esta política, que foi aprofundada durante
147
O BGB contém regras sobre a lei de arrendamento em seu Livro II (Direito das Obrigações).
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 118
o terceiro Reich com a lei do congelamento de preços, provou ser totalmente
ineficaz para promover o investimento na habitação.
Após a Segunda Guerra Mundial e em virtude da escassez habitacional,
mantem-se o controlo rigoroso do mercado imobiliário. Foi no início dos anos
sessenta que o legislador alemão, consciente da necessidade de dinamizar o
mercado de habitação, por forma a incentivar os investidores, deu início a um
processo gradual de liberalização Por outro lado, o legislador assumiu a
necessidade de garantir condições de habitação suficiente para a sua
população, especialmente, os socialmente desfavorecidos. Desde esta altura
que os incentivos á construção têm sido suportados através de investimento
público.
E, embora a legislação alemã tenha caminhado no sentido da
liberalização, permaneciam ainda influências significativas de um sistema
germânico fortemente regulamentado, por exemplo, a obrigação do adquirente
do bem continuar vinculado ao contrato de arrendamento existente, ou, a
política de controlo de rendas.
Os críticos argumentavam que estas disposições contribuíam para
impedir o desenvolvimento do mercado. Registaram-se várias tentativas para
liberalizar o mercado e, na década de noventa, o apelo a uma "unificação" dos
vários estatutos de arrendamento de direito privado tornou-se mais evidente.
Entre 2001 e 2002, quer a lei do arrendamento, quer o Código Civil
alemão sofreram grandes reformas. O legislador modificou a estrutura e a
substância do Código Civil alemão (Bürgerliches Gesetzbuch = BGB).
O governo alemão promulgou a Lei de Reforma do Arrendamento148, que
operou a simplificação do regime do arrendamento e modernizou o Direito das
Obrigações constante no Código Civil149
A reforma legislativa foi fortemente influenciada por uma perspectiva
constitucional, nomeadamente no que diz respeito ao papel que o direito da
família150 ocupa na legislação do arrendamento e procurou ainda codificar
jurisprudência relevante. O regime jurídico do arrendamento é ainda
influenciado pela legislação comunitária em matéria de protecção dos
consumidores151.
148
Em vigor desde 1 de Setembro de 2001 149
Em vigor em 1 de Janeiro de 2002. 150
Por exemplo, por morte do arrendatário, o cônjuge ocupa, ipso iure,a sua posição no contrato. 151
A Diretiva 93/13/CEE do Conselho de 5 de Abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 119
As regras em matéria de arrendamento são fortemente marcadas pela
auto-regulação, na verdade, quer as associações de inquilinos, quer as
associações de senhorios desempenham um papel muito ativo, participam na
elaboração de tabelas de rendas, prestam serviço de consultadoria aos seus
associados e, em particular, as associações de senhorios, elaboram
regularmente contratos-tipo. No que toca á resolução extrajudicial de conflitos,
estas associações podem constituir centros de mediação, quando o centro é
aprovado pelo Ministério de Justiça configura uma autoridade de conciliação e
as suas decisões têm força executória.
Outros mecanismos de resolução extrajudicial são criados pela Lei dos
Länder, como o poder de impor a conciliação obrigatória como forma de aliviar
os tribunais comuns.
A celebração do contrato de arrendamento só está sujeita a forma nos
contratos habitacionais celebrados por um prazo superior a um ano152.
Se a forma escrita não for observada, o contrato de locação deve ser
considerado como celebrado por tempo ilimitado. Assim, a exigência de forma
não é sancionada com a validade contratual, gerando antes um problema
probatório em caso de litígio judicial.
Embora não exista um registo público dos contratos de arrendamento, o
direito de residência deve estar registado no registo predial.
Quanto à duração do contrato de arrendamento, a regra no direito
alemão é o contrato por duração indeterminada. O senhorio só pode celebrar
um contrato de arrendamento a termo se invocar que pretende utilizar o
imóvel para si mesmo, pretende demolir ou fazer obras de restauro profundas
sendo a permanência do inquilino prejudicial, ou, se pretende arrendar o
imóvel a um empregado. Fora destas situações, o contrato considera-se
prorrogado por tempo indeterminado. Porém, nas situações em que lei alemã
permite a celebração do contrato por tempo determinado, o cumprimento do
contrato é vinculativo para ambas as partes incluindo para arrendatário.
As principais obrigações do arrendatário são pagar pontualmente a
renda, usar o locado no cumprimento dos deveres de cuidado e devolver o
locado findo o contrato de arrendamento em perfeitas condições de
conservação, estando obrigado a efectuar obras de conservação no final do
de consumo 152
Pode ser celebrado por via eletrónica com recurso à assinatura digital.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 120
contrato. É prática corrente o arrendamento de imóveis mobilados, neste caso
deve ser realizado um inventário de todos os bens e das condições em que se
encontram uma vez que o arrendatário, findo o contrato, tem a obrigação de
os devolver nas mesmas condições. As obrigações do senhorio são a concessão
de posse ao arrendatário, garantia de proporcionar o uso do locado e
cumprimento dos encargos que nos termos contratuais lhe cabem.
No início do contrato é frequente o senhorio exigir um depósito caução,
no máximo de 3 rendas que deve ser depositado numa conta específica, findo
o contrato, é devolvido acrescido de juros. No entanto, se algum dano for
identificado no locado o senhorio pode reter este montante.
Em relação às rendas é necessário distinguir os vários elementos que a
compõem, por um lado, a renda líquida que diz respeito ao espaço arrendado e
por outro lado os respectivos encargos e despesas relacionados com os
serviços públicos, designadamente despesas de recolha de lixo, despesas de
seguros, água, consumo de aquecimento e electricidade ou custos de limpeza
da casa. Os custos adicionais estão directamente relacionados com o local do
imóvel e com a dimensão do locado. Quanto aos consumos pessoais é fixada
uma taxa mensal fixa e no final do ano o arrendatário será reembolsado valor
que pagou em excesso ou paga a diferença.
O arrendatário é, nos termos do contrato, responsável pelo pagamento de
uma parte dos serviços públicos bem como dos consumos relacionados com o
locado. Quanto à renda líquida, depende da livre estipulação entre as partes.
Porém, no direito alemão existe um conjunto de mecanismos de controlo do
valor das rendas, o senhorio não pode praticar preços que sejam superiores
em 20% ao preço médio do mercado praticado para imóveis comparáveis.
Quanto à atualização, pode verificar-se uma atualização legal ou
convencional que depende de consentimento do arrendatário. As partes podem
ainda vincular a atualização de rendas ao índice estabelecido pelo Escritório
Federal de Estatística. O senhorio pode, quando efectuou obras de
modernização do locado aumentar a renda até um limite de 11% dos custos de
construção. O arrendatário, depois de notificado do aumento de renda, dispõe
de dois meses para se pronunciar e aceitando o valor actualizado passa a
vigorar 3 meses após a comunicação. No caso de não haver acordo o senhorio
pode recorrer a tribunal.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 121
O senhorio tem ainda uma garantia creditória sobre as rendas que
incide sobre os bens móveis do arrendatário sob a forma de penhor.
Quanto às causas de cessação do contrato, a cessação por parte do
senhorio ocorre, nas seguintes situações.
- O aviso normal, com uma antecedência mínima de 3 meses, que de
acordo com a duração do contrato pode ir até 12 meses, geralmente aplicável
nos casos em que o contrato de arrendamento foi celebrado por um período
ilimitado e que exige que o senhorio tenha um interesse legítimo em fazer
cessar o contrato, nomeadamente quando o inquilino estiver em violação
manifesta de uma obrigação contratual; se o senhorio demonstrar
necessidades habitacionais para si ou para a sua família, ou ainda, quando o
senhorio demonstre que a existência do contrato de arrendamento o impede de
fazer um uso economicamente justificável das instalações.
-o aviso imediato nas situações em que uma das partes viola as suas
obrigações contratuais153, constituindo assim a justa causa para a cessação.
No caso do senhorio, o aviso prévio específico, ou, ”aviso imediato com base em
uma razão importante", quando tem por fundamento incumprimento da
obrigação de pagar a renda, ou, quando o inquilino coloca as instalações
arrendadas em risco, produz efeitos imediatos.
Quanto ao arrendatário pode livremente denunciar o contrato tendo
apenas que respeitar um período de pré-aviso de 3 meses.
No que toca á transmissão por morte, depois do falecimento do senhorio,
o seu herdeiro torna-se parte no contrato de arrendamento ipso iure, o mesmo
se verifica nas situações de morte do arrendatário, o seu herdeiro tem direito a
celebrar o contrato, sendo que o cônjuge que vive em conjunto com o
arrendatário torna-se parte do contrato ipso iure. O cônjuge sobrevivente pode
declarar dentro de um mês após a notificação da morte se pretende continuar
o contrato. Sempre que o cônjuge ou parceiro registado se abstém de exercer
este direito, os filhos e até mesmo as pessoas com quem o inquilino falecido
manteve uma casa comum podem celebrar o contrato de arrendamento.
153
De sublinhar que os regulamento do condomínio são parte integrante do contrato, nomeadamente
regras quanto ao ruído, ou á existência de animais, a violação destas regras constitui assim violação do
contrato e é justa causa de resolução contratual.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 122
8.2.Características do mercado de arrendamento na Inglaterra
O mercado de arrendamento inglês foi desde sempre influenciado pela
sua própria conceção de propriedade e pela proteção conferida à posse. Por
outro lado e, tendo em conta o sistema jurídico Common Law, a fonte
primordial é o direito comum definido pelos tribunais, ao qual se associa uma
multiplicidade de regulamentos, de fonte legal, que torna o enquadramento
jurídico do arrendamento multifacetado e com vários regimes diferenciados.
A essência de um contrato de arrendamento no ordenamento jurídico
inglês pressupõe posse exclusiva, isto é, o direito de excluir todos os outros,
incluindo o proprietário.
Na sequência da Segunda Grande Guerra Mundial, a necessidade de
construir habitações aliada à incapacidade da iniciativa privada para
responder a esta necessidade, levou a que os poderes públicos, através das
autoridades locais e de associações da sociedade civil, subsidiassem
programas de construção civil, no entanto, permanecia a ideia de que cabia ao
sector privado esta tarefa. Desde a década de 70, que a jurisprudência inglesa
começou a desenvolver os direitos dos inquilinos, reforçada por uma
campanha levada a cabo por associações de defesa dos consumidores.
Até 1965 as rendas foram controladas, mas desde então o mercado
liberalizou-se, este movimento chegou á tutela jurídica da posse que também
sofreu uma degradação a partir de 1989.
De fato, a Lei da Habitação (Housing Act) veio diminuir a protecção
conferida ao inquilino, permitindo que uma ordem judicial efetue o despejo,
embora lhe confira certos direitos de informação sobre determinados aspectos
da gestão da habitação. Esta lei veio ainda reduzir o número de transmissões
do contrato de arrendamento por morte do inquilino. Introduziu-se uma nova
forma de arrendamento, a curto prazo, que embora goze da mesma proteção
conferida ao inquilino, permite que o senhorio possa rescindir o contrato com
pré-aviso de dois meses, após obter uma ordem judicial para o efeito. O fato do
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 123
Tribunal não dispor, nestes casos, de poder discricionário para rejeitar o
pedido do senhorio originou polémica e foi entendido como uma violação da
Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
Este regime jurídico criou uma profunda clivagem face aos
arrendamentos seguros, onde o inquilino goza de uma protecção muito forte
que quase se sobrepõe à propriedade, uma vez que a segurança do regime da
posse é mais forte e são titulares de um leque significativo de direitos. Em
1985, e com vista a ultrapassar esta questão e dar resposta a questões
relacionadas com comportamentos anti-sociais, foi introduzida uma nova
modalidade contratual a que se chamou de “arrendamento estágio”,
permitindo que durante um ano o inquilino estivesse à experiência, findo este
prazo o arrendamento transforma-se em arrendamento seguro. Durante o
período de estágio, o senhorio pode recorrer ao tribunal para requerer ao
despejo do inquilino. O inquilino tem direito de resposta para se defender e
desta forma ultrapassa-se a questão da incompatibilidade com a CEDH.
A par dos contratos de arrendamento seguros, arrendamentos
assegurados e dos arrendamentos de curto prazo, existem muitas relações de
locação inominadas que não conferem ao inquilino qualquer tipo de protecção.
Podemos concluir que o regime jurídico inglês é caracterizado pela sua
liberalização e pela diversidade de regimes jurídicos no âmbito do
arrendamento.
Assim, a caracterização dos principais traços do regime do arrendamento
deve sempre ter em conta a tipologia do contrato.
No que diz respeito ás exigências de forma, o principal objectivo é
prevenir as situações de fraude e ainda a susceptibilidade de opor os direitos
do inquilino a terceiro. O contrato de arrendamento deve ser reduzido a escrito
incorporando todos os elementos e os termos do acordo. Não estão sujeitos a
forma escrita os contratos celebrados por um prazo inferior a três anos. No
caso dos contratos de arrendamento garantidos o senhorio deve, pelo menos,
emitir uma declaração sobre a natureza do contrato. Quando o contrato tem a
duração superior a sete anos deve ainda ser registado no registo predial.
No regime do arrendamento seguro, regulado pelo Housing Act de 1980,
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 124
o proprietário é uma autoridade local e o inquilino é um pessoa singular que
ocupa todo a casa, o direito de arrendamento inclui as licenças e posse
exclusiva.
A rescisão do contrato e a consequente reintegração de posse só pode ser
efetivada mediante ordem judicial e com base num dos 18 motivos
estabelecidos. Cabe ao tribunal apreciar a razoabilidade da pretensão do
senhorio. A renda será estabelecida de acordo com o critério da “renda
razoável”. Por morte do arrendatário sucedem-lhe no direito ao arrendamento
cônjuge sobrevivo ou membro da família que com ele resida há pelo menos 12
meses. Para além dos direitos expressamente previstos no contrato, o inquilino
tem direito à reparação, direito de comprar, direito à informação, direito de
consulta, direito de sublocar e direito de gerir.
O inquilino deve manter um comportamento tranquilo e é responsável
pela manutenção dos espaços exteriores do locado.
No regime do arrendamento introdutório ou estagiário regulado no
Housing Act de 1996, o senhorio é uma autoridade local e o inquilino está
submetido a um período de estágio que tem a duração de um ano. Assim, a
rescisão do contrato depende apenas de um pedido dirigido pelo senhorio ao
tribunal, porém o inquilino pode sempre defender-se e solicitar a revisão da
decisão. Está igualmente sujeita a uma renda estabelecida de acordo com o
critério da “renda razoável”. Por morte do arrendatário, sucedem-lhe no direito
ao arrendamento cônjuge sobrevivo ou membro da família que com ele resida
há pelo menos 12 meses Para além dos direitos expressamente previstos nos
contrato, o arrendatário tem direito à reparação, direito à informação, direito
de consulta e direito de gerenciar.
O arrendamento assegurado, regulado no Housing Act de 1988, resulta
do acordo das partes mas pode ser negociado através de uma agência de
arrendamento. Os senhorios são entidades privadas ou a categoria de
"Proprietários Sociais Registados".
Os proprietários sociais registados são um grupo de proprietários, sem
fins lucrativos, com origens históricas e que têm desempenhado um papel
importante no mercado habitacional inglês. Foram alvo de muitos benefícios e
investimentos públicos com vista á construção de habitações.
No arrendamento assegurado, a renda é livremente acordada entre as
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 125
partes e os critérios de actualização podem ser submetidos a uma Comissão .
Quando é uma RSL a arrendar deve praticar as rendas estabelecidas pela
Housing Corporation. Depois de 1996, o senhorio é obrigado a emitir uma
declaração de que o arrendamento é assegurado. A rescisão do contrato só
pode ser fundamentada num dos motivos estabelecidos e no caso de ser uma
RSL só deve recorrer à rescisão como último recurso, não havendo alternativa
razoável. Por morte do arrendatário, podem continuar o contrato, cônjuge
sobrevivo, incluindo a união de fato, ou pessoas que vivem juntos como
marido e mulher e que ocuparam a propriedade como sua única ou principal
habitação.
Finalmente, o arrendamento a curto prazo assegurado, regulado no
Housing Act de 1988, com as alterações introduzidas pelo Housing Act de
1996, neste caso o senhorio é uma entidade privada e o inquilino usa o locado
como única ou principal habitação. Depois das alterações de 1996, o senhorio
é obrigado a emitir uma declaração de que o contrato é de curto prazo
assegurado. O contrato pode ser rescindido mediante ordem judicial com aviso
prévio de dois meses. Quanto à renda, é livremente acordada entre as partes,
sendo que os critérios de actualização podem ser submetidos a uma
Comissão.
A inexistência de traços de vinculismo em algumas das modalidades do
contrato de arrendamento associada à volatilidade dos preços, em parte devido
às restrições da oferta de habitação levaram a uma forte inflação do preço do
arrendamento, Na verdade, o mercado habitacional inglês sofre de alguns
constrangimentos, por um lado, o fato das principais cidades estarem
envolvidas nos chamados "cinturões verdes" que limitam o crescimento
urbano, por outro lado, por que o sistema fiscal não incentiva as autoridades
locais a desenvolver o mercado habitacional, por último porque o planeamento
tem privilegiado uma política de contenção urbana.
Embora o mercado de crédito na Inglaterra tenha estado completamente
desregulamentado, possibilitando a concessão de crédito hipotecário e o
fomento da aquisição de casa própria, após a crise financeira, a concessão de
crédito tem sofrido severas contenções tendo uma forte repercussão no
mercado imobiliário. Esta situação tem levado as famílias a optarem pelo
mercado de arrendamento. Para fazer face a esta tendência, os governos têm
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 126
desenvolvido um espirito de cooperação no sentido de revitalizar o sector,
designadamente, através de incentivos fiscais ao arrendamento.
No entanto, os vários diplomas legislativos têm vindo a formar um
ordenamento jurídico complicado, desde logo porque cada uma das reformas
procurou não interferir com a reforma anterior. As reformas sucessivas, sem
consolidação, traduziram-se na existência de múltiplos regimes legais para o
arrendamento. Esta situação levou à constituição de uma Comissão de
Direito, cuja principal missão é consolidar e simplificar a lei. Esta Comissão
apresenta uma simplificação legal, que assenta na protecção do consumidor, e
que propõe dois tipos de contratos de arrendamento, o contrato a longo prazo
e o contrato a curto prazo.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 127
8.3.Características do mercado de arrendamento Espanhol
Durante o período que sucedeu à Guerra Civil Espanhol, o governo de
Francisco Franco iniciou uma política proteccionista do arrendatário,
regulando o valor das rendas e protegendo-o face ao mecanismo de despejo. A
Espanha experimentou, durante várias décadas, um regime jurídico altamente
proteccionista que acabou por bloquear o mercado de arrendamento. Os
rendimentos dos senhorios foram-se degradando e o investimento na
construção diminuiu acentuadamente. Esta tendência manteve-se durante
largos anos, não obstante algumas tentativas frustradas de imprimir algum
dinamismo ao mercado de arrendamento. Em 1985 e em face da pouca oferta
que o mercado proporcionava de fogos para arrendar, o governo introduziu
alterações profundas no regime do arrendamento154, designadamente três
medidas importantes, a liberdade do senhorio para converter alguns dos
contratos celebrados ao abrigo do regime anterior em contratos de
arrendamento, a faculdade do senhorio acordar o montante da renda e a
liberdade de determinar o prazo do contrato. A tendência que se verificou foi a
proliferação de contratos de curto prazo que provocaram uma forte
instabilidade no mercado imobiliário de locação. Assim, a aquisição de casa
própria continuou a ser a opção da maioria das famílias espanholas.
Em 1994, a Lei de Arrendamento Urbano apresentou como principal
objetivo restabelecer um certo equilíbrio entre inquilinos e senhorios e
promover o mercado de arrendamento como um elemento-chave da política de
habitação.
Foi estabelecido um prazo mínimo de cinco anos para o contrato de
arrendamento e as rendas passaram a estar sujeitas a uma actualização com
base no índice de preços ao consumidor.
Porém, foi necessário resolver a delicada questão do regime transitório a
aplicar aos contratos de arrendamento celebrados antes de 1985 (LAU) e aos
contratos celebrados ainda na vigência do LAU, entre 1985 e 1994.
154
Através de um dipositivo legal que ficou conhecido pelo nome do seu mentor Decreto Boyer (LAU)
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 128
Quanto aos primeiros, optou-se por suprimir a possibilidade do
arrendatário transmitir a sua posição por negócio jurídico inter vivos e por
limitar as situações de transmissão mortis causa. No que toca á questão da
actualização das rendas, permite-se uma actualização extraordinária
progressiva com vista a recuperar as variações de inflação que não foram tidos
em conta a partir da celebração do contrato, ou da sua última revisão legal. Os
arrendatários com carências económicas graves foram excluídos destas
actualizações e em contrapartida criou-se um sistema fiscal compensatório
para os proprietários que permitia imputar a depreciação destes ativos sendo
deduzidos como um encargo no pagamento dos impostos anuais.
Quanto aos segundos, foi estabelecido que ficariam sujeitos ao regime
anterior até á data da sua renovação e que após a renovação passariam a
estar sujeitos ao regime em vigor.
O mercado de arrendamento espanhol era marcado por uma dicotomia
de regimes, porque sendo a legislação de 1964 altamente protecionista dos
direitos dos inquilinos, a legislação de 1985 era muito mais liberal provocando
uma desigualdade expressiva. Na verdade, o regime transitório tinha como
meta que no período de 8 anos a grande maioria dos contratos de
arrendamento tivessem já atingido a paridade, quer quanto ao regime legal,
quer quanto ao nível das rendas.
No que toca ao regime legal, este diploma vem estipular que quanto ao
prazo do contrato de arrendamento, cabe às parte acordarem o prazo, porém
sempre que o contrato seja inferior a 5 anos, a renovação é automática até
perfazer este prazo, podendo o inquilino opor-se à renovação mediante pré-
aviso de 30 dias. Findo os cinco anos, o senhorio pode opor-se à renovação
nos mesmos termos que o inquilino, mas se não o fizer a renovação ocorre por
um período de 3 anos. Portanto, o proprietário é legalmente vinculado à
extensão do contrato de arrendamento até os primeiros cinco anos, salvo se
precisar do locado para habitação permanente para si ou para sua família.
A renda é livremente acordada entre as partes e o senhorio tem a
obrigação de dar quitação ao inquilino do seu pagamento. A actualização da
renda, durante os primeiros 5 anos do contrato, é fixada através do índice de
preços ao consumidor (RPI) e mediante uma comunicação do senhorio ao
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 129
inquilino. Porém, a partir do sexto ano a actualização pode ser feita de acordo
com o critério estabelecido pelas partes no contrato.
Outros encargos associados ao arrendamento e estabelecidos no contrato
podem contemplar o pagamento por parte do inquilino do imposto sobre
imóveis e taxas de comunidade. O inquilino deve fazer um seguro de
responsabilidade para o locado.
As seguradoras reservam-se ao direito de verificar se a renda cobrada
está dentro dos limites praticados no mercado e de avaliar se o estado de
conservação do imóvel oferece adequadas condições de habitabilidade.
Assim, para além da caução inicial, no momento da celebração do
contrato, a lei permite que as partes acordem qualquer outro tipo de garantia
com vista a assegurar o cumprimento pelo inquilino. Esta prática permite
diminuir o risco por parte do senhorio associado à lentidão dos procedimentos
judiciais. Outra forma é através da garantia bancária, funcionando o banco
como garante do cumprimento da obrigação de pagar a renda.
O Inquilino tem direito de preferência na venda do imóvel e nas situações
de transmissão da propriedade do imóvel o adquirente está vinculado ao
cumprimento do contrato de arrendamento.
A sublocação está sujeita a autorização prévia do senhorio e pode
abranger apenas uma parte do locado, mas não poderá ser cobrada uma
renda superior aquela que o inquilino paga.
Quanto á transmissão por morte da posição do arrendatário, têm direito
à sub-rogação no contrato o cônjuge ou pessoas que vivem em união de fato
e ainda os descendentes sujeitos à autoridade parental ou tutela, os
ascendentes, outros parentes do terceiro grau colateral, tios e sobrinhos, com
uma incapacidade igual ou superior a 65% que vivam com o inquilino há
mais de dois anos.
No que toca às obras de conservação, cabem ao senhorio e não implicam
actualização extraordinária da renda, o senhorio é obrigado a manter as
condições de habitabilidade, salvo quando a deterioração é imputável ao
inquilino, ou, quando ocorreram danos não imputáveis ao senhorio como é o
caso de incêndio, inundação ou terremoto.
A promoção do arrendamento tem contado com diversas iniciativas
públicas e privadas que, nos termos do Plano de Habitação 2009-2012 do
Ministério da Habitação, contempla não só um sistema de rendas apoiadas,
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 130
mas também planos de financiamento e incentivo à construção de fogos para o
arrendamento especialmente dedicados à camada da população mais jovem. A
iniciativa privada beneficia de incentivos e financiamento para a construção e
depois vincula-se a arrendar o fogo durante um período que pode ir de 10 a 20
anos, após este período pode dispor do imóvel. O Plano de Habitação prevê
ainda a construção de fogos para arrendamento com opção de compra. Nesse
caso, o locatário poderá adquirir o imóvel contando com benefícios fiscais,
sendo que o preço de venda é deduzido, de forma parcelar em, pelo menos,
30%, no valor da renda paga pelo inquilino.
A cessação do contrato de arredamento ocorre por caducidade, findo o
prazo e quando as partes se opõem, nos termos da lei, à sua renovação; ainda
por acordo das partes devendo ser elaborado um acordo de rescisão e de
quitação de todas as despesas e encargos e ainda por rescisão devido ao
incumprimento contratual pelas partes. Nesta situação, será necessário a
intervenção de um tribunal.
A nova Lei do arrendamento tem como principal objectivo revitalizar e
reforçar a confiança no mercado de arrendamento.
Tal como em Portugal, o governo sentiu a necessidade de alterar o regime
jurídico da acção de despejo, em especial, nas situações de incumprimento de
rendas, identificada como uma das situações que estava a bloquear o normal
funcionamento do mercado de arrendamento.
Pretende-se que o inquilino desocupe o imóvel 15 dias após a sentença
que determina o despejo. Mesmo nas situações em que o contrato é resolvido
por via de acordo, por exemplo quando o senhorio perdoa a dívida resultante
das rendas, cabe ao tribunal ordenar que o despejo deve ser efectuado neste
prazo. Quanto à celeridade processual o juiz dispõe de 5 dias para se
pronunciar podendo fazê-lo oralmente.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 131
8.4.Características do mercado de arrendamento Francês
A lei francesa define o contrato de locação como o contrato em que uma
das partes, locador, cede à outra, locatário, o gozo de uma coisa mediante o
pagamento de um preço. O contrato encontra-se previsto no Código Civil de
1804, mas gradualmente foram criados estatutos especiais que estabeleceram
as diferenças essenciais entre o arrendamento para a habitação e o
arrendamento comercial. É de sublinhar que o enquadramento legal do
arrendamento sofre ainda influências das decisões jurisprudenciais.
Ainda no âmbito do código napoleónico, o arrendamento era verbal e os
inquilinos não dispunham de quaisquer meios de defesa face aos abusos dos
senhorios. Já no início do século XX e fruto do desenvolvimento das cidades,
foi criada a primeira associação de locatários intimamente ligada às
organizações representativas dos trabalhadores, que lideraram um movimento
contra os trabalhadores alvo de despejo. Em 1948, uma lei sobre a habitação
procura impedir a inflação das rendas como consequência do pós-guerra. Data
de 1982, a primeira lei de enquadramento do arrendamento com um pendor
claramente protecionista do inquilino, protegendo-o face à total
desregulamentação que existia até então. A lei vem impor a forma escrita,
limitar as causas de cessação do contrato e ainda estabelecer a negociação
colectiva das rendas. Esta lei gerou uma forte polémica tendo sido encarada
como atentado contra o direito de propriedade.
A mudança de governo provocou de imediato a revogação da lei de 82 e o
novo regime desregulamentou de novo o arrendamento, permitindo a
liberalização total das rendas e a desregulamentação da cessação do contrato.
Também esta solução durou pouco tempo, em de 6 de Julho de 1989 foi
aprovado um regime jurídico que procurava um equilíbrio entre os direitos e
interesses das partes, beneficiando de consenso, foi sendo alvo de alterações
de natureza técnica mas manteve até aos dias de hoje as grandes opções em
matéria de politica de arrendamento.
Este regime vem sujeitar o contrato de arrendamento à forma escrita e
estipula que os contratos orais estão sujeitos às regras supletivas. Não
obstante, o contrato de arrendamento é um contrato consensual e nos termos
do Código Civil o contrato pode ser escrito ou oral. Partilhando este
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 132
entendimento, a jurisprudência considera que um contrato verbal é válido.
O contrato tem, regra geral, uma duração não inferior a 3 anos, porém as
partes podem invocar motivos que legitimem a celebração de contratos por
períodos inferiores desde que superiores a 1 ano. Quanto á renovação do
contrato, será automática, salvo, se o inquilino se opuser à sua renovação com
pré-aviso de 3 meses. Este pré-aviso pode ser reduzido nas circunstâncias
previstas na lei e tratadas pela jurisprudência, por exemplo, quando o
inquilino arranja outro emprego e precisa de mudar de habitação. O senhorio
só pode opor-se à renovação invocando um dos motivos previsto para a
cessação e com um pré-aviso de seis meses.
A atualização de renda é realizada tendo em conta uma indexação ao
preço do aumento de construção.
As partes podem ainda prever uma cláusula que permite uma rescisão
automática por violação dos termos do contrato.
De sublinhar, que o contrato está sujeito ao regime das clausulas
abusivas que podem ser submetidas á sindicância dos tribunais e declaradas
nulas.
Se o proprietário decidir vender o imóvel durante o prazo do
arrendamento, o inquilino tem direito de preferência que se sobrepõe a todos
os restantes. Porém, o contrato não é afetado por esta venda, o inquilino pode
permanecer no local até que o novo proprietário o possa notificar, nos termos
da lei, da denúncia do contrato de arrendamento.
A cessação do contrato pelo senhorio pode ser motivada pela decisão de
vender ou passar a residir no locado e ainda nas situações em que o inquilino
viola os deveres contratuais e ofenda os seus legítimos interesses. O senhorio
comunica a intenção de por termo ao contrato através de carta registada ou
através de um procedimento de notificação judicial, dando ao inquilino um
pré-aviso. Findo o período de pré-aviso, o inquilino é privado de qualquer
título de ocupação do locado.
Porém, a lei estabelece um regime especial para as situações em que o
arrendatário tem mais de 70 anos, aufere baixos rendimentos e não dispõe de
habitação que possa satisfazer as suas necessidades na mesma zona
geográfica, no entanto estas limitações não se colocam nas situações em que o
próprio senhorio tem mais de 70 anos e também aufere baixos rendimentos.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 133
De fato, a lei toma em consideração a situação de ambas as partes ao
estabelecer o regime de especial protecção.
Devido ao fato dos tribunais estarem saturados e não conseguirem dar
uma resposta célere aos conflitos relacionados com o arrendamento, a
resolução extrajudicial dos conflitos relacionados com o arrendamento é
muitas vezes imposta antes do recurso aos meios judiciais.
Para fazer face à falta de oferta de fogos para arrendar, o governo francês
adotou vários mecanismos. Em 1990 criou um procedimento que habilita as
associações de habitação pública para celebrar acordos com a iniciativa
privada com o objectivo de reabilitar os seus edifícios, em troca do uso da
habitação para um determinado período de tempo. Em 1995, foi adotado um
procedimento extraordinário de requisição de cerca de 700 habitações vazias
para as destinar ao arrendamento. No entanto, estas iniciativas revelaram
pouco sucesso. Na verdade, o mercado de arrendamento francês está muito
constrangido, em algumas cidades, como Paris, é muito difícil encontrar um
alojamento e os preços aumentaram drasticamente. Esta situação deve-se em
parte ao elevado nível de protecção do inquilino e à dificuldade de efectuar o
despejo que levam a que os senhorios não tenham confiança no mercado.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 134
8.5. A solução holandesa
O regime jurídico do arrendamento sofreu em alguns períodos influências
do direito francês e noutros momentos influências do direito alemão.
O contrato de arrendamento não está sujeito a forma mas é habitual que
as partes regulamentem com alguma extensão o conteúdo contratual.
O valor das rendas é livremente acordado pelas partes e a sua
atualização é fixada ao nível ministerial. Porém, os imóveis estão sujeitos a
uma avaliação para determinar o seu estado de conservação, sendo-lhes
atribuída uma classificação que é relevante para sindicar o valor máximo de
renda cobrada e a faculdade de proceder a atualizações. Esta sindicância é
levada a cabo pelas autoridades judiciais.
O papel que as entidades públicas e as pessoas colectivas de direito
privado (corporações) desempenham no mercado de arrendamento holandês é
fundamental, sendo responsáveis por, aproximadamente, metade das
habitações disponíveis para o arrendamento.
As corporações - unidas numa organização de coordenação (Aedes), têm
na realidade mais influência do que próprios os inquilinos. As associações de
inquilinos e de senhorios desempenham um papel ativo no desenvolvimento
da política de habitação dos bairros e distritos. Em matéria de arrendamento,
pronunciam-se sobre o conteúdo dos acordos de arrendamento, estabelecendo
processos de consulta entre locadores e locatários.
É frequente as partes recorrem à formalização do contrato de
arrendamento através dos contratos-tipo, elaborados pelas associações de
inquilinos e de proprietários. O conteúdo destes contratos deve estar de
acordo com o regime jurídico imperativo e com o regime das cláusulas
abusivas. O ordenamento jurídico holandês prevê o procedimento das acções
colectivas, no entanto não existe ainda, em matéria de arrendamento,
jurisprudência sobre estes contratos –tipo.
A Lei do Arrendamento para a Habitação (Huisvestingswet) atribui
muitas competências aos municípios.
Outra característica do ordenamento jurídico holandês prende-se com a
intervenção dos mecanismos alternativos de resolução de conflitos, em
particular a mediação e os processos de conciliação que levam a que os
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 135
conflitos sejam dirimidos com uma pequena percentagem de recurso aos
tribunais e com uma reduzida taxa de despejo.
O regime jurídico do arrendamento não tem características de
vinculismo, aceitando-se várias causas de cessação do contrato. Acresce que
nas situações de incumprimento contratual, o processo que conduz à cessação
do contrato e à efectiva desocupação do locado é muito célere e raramente o
inquilino solicita a suspensão do processo.
Finalmente, outra solução inovadora que podemos encontrar no mercado
de arrendamento holandês, são os fundos de gestão de arrendamento.
Estes fundos têm como principal objetivo assegurar, perante os
proprietários, o pagamento pontual das rendas. O fundo é constituído com
uma primeira contribuição por parte dos proprietários e participado através de
uma percentagem mensal do valor da renda. Alguns fundos beneficiaram de
uma participação financeira do Estado. As funções do Fundo passam por
cobrar as renda, proceder ao cumprimento das obrigações fiscais, garantir o
pagamento das rendas em situações de incumprimento pelo arrendatário,
ficando sobrogados nesses direitos e proceder às notificações e demais
providências legais para a desocupação do imóvel em casos de
incumprimento.
Podemos afirmar que o mercado de arrendamento holandês é dinâmico e
caracteriza-se por ter mecanismos inovadores que asseguram a confiança no
mercado quer por parte dos proprietários quer pelos arrendatários.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 136
9.Síntese das Sugestões /Recomendações
Antes de mais, importa salientar a oportunidade, nas condições atuais,
de uma revisão do enquadramento legal do arrendamento. De fato, a atual
situação financeira, a subida das taxas de juros e as dificuldades de acesso ao
crédito, levaram a uma acentuada quebra na compra de habitação própria.
Esta realidade gerou, do lado da procura, uma necessidade acrescida de
encontrar alternativas à aquisição de casa própria e, consequentemente, a
uma procura acrescida no mercado de arrendamento. Do lado da oferta,
verifica-se que os promotores imobiliários dispõem de uma oferta excedente de
imóveis que não conseguem escoar do mercado da compra e venda, mas cujos
investimentos carecem de rentabilização e, sendo assim, o arrendamento é
naturalmente uma alternativa, designadamente a possibilidade de efectuarem
contrato de arrendamento com opção de compra futura.
O mercado de arrendamento está assim confrontado com novos
movimentos, quer do lado da oferta, quer do lado da procura. Neste âmbito
estamos perante um momento crucial para a discussão da reforma do regime
jurídico do arrendamento urbano, no sentido de dar resposta a estas
necessidades.
9.1. A questão das rendas
O congelamento de rendas imposto desde 1948, gerou constrangimentos
graves no mercado de arrendamento e levou a uma degradação do parque
imobiliário, em especial, nos grandes centros urbanos de Lisboa e Porto.
O baixo peso do rendimento proveniente do património desincentiva os
proprietários a investirem tempo e recursos nesta atividade, por entenderem
que a valorização do seu património imobiliário não é rentável, o que constitui
um bloqueio à reabilitação urbana. Por outro lado, o período imposto para a
correção faseada das rendas antigas é manifestamente excessivo, impondo ao
proprietário um investimento nas obras de conservação cujo retorno é muito
lento. Acresce que, no período estabelecido para as situações especiais, 10
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 137
anos, o senhorio será novamente chamado a efetuar obras de conservação, no
prazo de 8 anos, quando ainda não recuperou o valor atualizado da renda.
Por tudo isto, é fundamental que o controlo administrativo das rendas
seja eliminado e que a atualização das rendas até ao seu justo valor de
mercado seja feita de forma célere, deixando ao mercado a tarefa de equilibrar
o valor da renda. Para este efeito importa eliminar, ou simplificar os dois
pressupostos impostos ao senhorio para a correção do valor da renda,
relacionados com a conservação do imóvel e com a avaliação fiscal, por
exemplo, fazendo depender a correção extraordinária das rendas antigas do
critério da desvalorização monetária.
Importa ainda, diminuir o período de faseamento para a correção da
renda, propondo um período geral de 3 anos e um período especial de 5 anos.
Estas medidas deverão ser acompanhadas de um programa de apoio às
rendas por forma a garantir o acesso à habitação dos grupos mais vulneráveis.
E independentemente dos custos financeiros destes programas, o
proprietário não deverá continuar a assumir os custos da proteção social dos
mais desfavorecidos , tarefa que incumbe ao Estado
9.1.1. Alteração do regime de comprovação/ quitação do pagamento de rendas
Neste âmbito, propõem-se as seguintes medidas:
-criação de uma conta bancária tipo e específica para efeitos do pagamento
das rendas acordadas no contrato de arrendamento e emissão de extratos
detalhados a pedido do respectivo titular / senhorio (adaptação do regime da
conta bancária para efeitos de consignação em depósito de rendas – artigo 17º
do NRAU);
-estipulação no contrato de arrendamento de que a Instituição Bancária em
que se encontre aberta a conta de depósito de rendas (CDR), decorridos 2
meses sem pagamentos, emitirá um extrato comprovativo do “não depósito da
renda”, o que constituirá título executivo para efeitos de despejo do inquilino,
após a comunicação da referida falta de pagamento ao Instituto da Habitação
e Reabilitação Urbana (IHRU);
- indicação no contrato de arrendamento do número da conta bancária para
efeitos de pagamento de rendas (CDR) e declaração de que o extrato da
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 138
mesma, após comunicação ao IHRU, constitui título executivo na hipótese da
falta de pagamento das rendas acordadas;
9.2.A ação de despejo
Tendo em conta que o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU)
estabeleceu como trave mestra da reforma a criação de títulos executivos de
formação extrajudicial, nomeadamente o título que resulta da notificação
judicial do arrendatário, em caso de falta de pagamento de rendas por mais de
2 meses, acompanhado do respetivo contrato de arrendamento, (artigo 15º nº2
do NRAU);
Tendo em conta que um diploma complementar ao NRAU fixou os
requisitos essenciais dos contratos de arrendamento, indispensáveis à
verificação da sua validade e eficácia;
Considerando que o Código do Processo Civil (CPC) foi alterado no
sentido da acção de execução para entrega da coisa locada ser mais expedita,
tendo sido criado um procedimento específico para a execução de títulos
extrajudiciais, que admite a oposição do arrendatário com efeito suspensivo do
despejo;
Considerando que a tramitação da acção executiva para cobrança de
rendas ou para resolução do contrato de arrendamento com fundamento na
falta de pagamento de renda, nos termos do CPC, pode ser assegurada por um
agente de execução escolhido pelo mandatário forense do senhorio.
Ora, partindo destes considerandos, como se explica que não exista
confiança e segurança jurídica na execução dos títulos de formação judicial,
ou, extrajudicial, que viabilize o despejo das “casas arrendadas” em que o
arrendatário não paga a renda fixada no contrato, sem qualquer razão ou
fundamento?
Antes de mais, teremos de reconhecer que o sistema judicial, na vertente
do funcionamento dos Tribunais, não é eficiente, nem contribui para o reforço
da confiança no regime jurídico substantivo do arrendamento.
Ou seja, toda a eficiência e segurança jurídica que se pretenda alcançar
com o recurso a um procedimento/ processo a desenvolver nos Tribunais, por
razões de sistema, será difícil de alcançar em pleno.
Daí que, resta-nos fazer uma opção entre a apresentação de uma
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 139
proposta de reforma da Organização Judiciária que se traduza na criação de
Tribunais/Juízos autónomos para julgamento de litígios relativos a contratos
de arrendamento, ou a alternativa de encontrar uma solução sustentada na
desjudicialização dos procedimentos a adotar.
Aquilo que se afigura imperativo é que o atual regime processual deverá
ser revisto, tendo em vista enquadrar de modo mais favorável o novo modelo
de contrato de arrendamento, assim como o procedimento específico para a
sua resolução com fundamento na falta de pagamento de rendas.
Na verdade é essencial simplificar os mecanismos de tutela face às
situações de incumprimento contratual no sentido de reforçar a confiança no
mercado de arrendamento.
Assim, é necessário simplificar o procedimento da ação de despejo,
desjudicializando este processo.
Porém, a desjudicialização do processo de despejo deverá ser
acompanhada de um reforço de meios efectivos para a concretização prática
da desocupação dos imóveis. Independentemente das entidades que conduzam
o processo, a inexistência de meios, designadamente, meios policiais, céleres e
expeditos que concretizem no plano prático a desocupação do imóvel tem
levado a que, em média, as acções despejo demorem cerca de 4 a 5 anos para
se concretizarem.
O procedimento poderia ser conduzido por outros agentes,
designadamente, advogados, agentes de execução ou solicitadores, prevendo-
se a intervenção de um juiz a pedido do inquilino para aferir da regularidade
do processo.
Por outro lado, é essencial criar meios alternativos de resolução destes
conflitos, reforçando as vias extrajudiciais
Em suma, considerando a necessidade de criar um mecanismo expedito e
seguro para a resolução do contrato de arrendamento com fundamento na
falta de pagamento de rendas, sugerimos as seguintes alterações:
- A supressão do período mínimo 3 meses para efeitos da formação do
título executivo consagrado no NRAU:
- Alteração da natureza do processo executivo para processo urgente, de
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 140
modo a tornar o mesmo mais expedito;
- Extinção do efeito suspensivo previsto para a oposição apresentada pelo
arrendatário (artigo 930-B do CPC), salvo se efetuada prova documental do
pagamento das rendas, da caução, bem como do pagamento de rendas na
pendência da execução;
- Previsão da efetivação do despejo com recurso a serviços especializados
da Policia Municipal, após solicitação do agente de execução responsável pelo
processo;
- Agravamento das consequências legais do atraso na entrega do locado
nas situações de incumprimento do contrato de arrendamento155
.
- Fixação convencional/ obrigatória do foro arbitral no contrato de
arrendamento 156
, tendo em vista a tramitação da execução dos títulos
(extracto da CDR) por falta de pagamento de rendas e, consequente, resolução
do contrato de arrendamento;
- Concretização da efectivação do despejo (entrega do andar arrendado),
após decisão do Tribunal Arbitral, por via da participação dos serviços
especializados da Policia Municipal.
E ainda,
- Diminuição do prazo a partir do qual o senhorio pode recorrer à ação de
despejo, uma vez verificada a caducidade do contrato;
9.3. Liberalização da contratação
O regime jurídico substantivo do arrendamento urbano foi
profundamente alterado, tendo sido integrado, no plano sistemático, no
Código Civil (CC) e, simultaneamente, reconhecida a importância do princípio
da liberdade contratual, cuja concretização fica aquém daquilo que era
esperado.
Mantêm-se assim a necessidade de conferir maior liberdade contratual e
de reduzir o caráter vinculístico do contrato de arrendamento, propondo-se,
155
Para além da prevista no artigo 1045º do CC, por exemplo, inclusão na lista geral de
arrendatários devedores. 156
Por exemplo, o Tribunal Arbitral da Ordem dos Advogados com competência para estes
litígios.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 141
neste sentido, a limitação das situações de transmissão do direito de
arrendamento e a liberalização do termo do contrato de 5 anos para 1 ano. Em
consonância com esta recomendação, propomos o encurtamento dos períodos
do pré-aviso para as partes se oporem à renovação automática do contrato.
Por outro lado, propomos a alteração do regime jurídico substantivo da
locação, estabelecendo o conteúdo (direitos e obrigações) da opção de compra
estipulado num contrato de arrendamento, assim como a possibilidade de
registo predial da mesma, situação esta, que permitiria fomentar o
arrendamento como via da aquisição do locado, dinamizando o mercado
imobiliário e o acesso à habitação.
Com efeito, a conjugação de um contrato de arrendamento com uma
promessa de compra e venda, em algumas situações, poderá constituir uma
solução para comprometer o arrendatário na aquisição do local arrendado, em
especial quando efetuou o pagamento de um sinal relevante.
9.4.Reforçar a atuação do Plano de Emergência Social Habitacional
Tendo em conta que a reforma do regime do arrendamento urbano deverá
tomar medidas no sentido de:
-Proceder à correção das rendas antigas e considerando e encurtar os
períodos de correcção, em especial o período alargado de 10 dez anos;
-Agilizar os mecanismos de tutela face a situações de incumprimento
contratual, designadamente, o incumprimento do pagamento das rendas, com
vista reforçar a confiança no mercado de arrendamento.
- O tratamento mais favorável conferido, quer no domínio do regime
transitório, quer no âmbito do Código Civil, aos idosos ou portadores de
incapacidade, deverá ainda ter em conta os rendimentos do agregado familiar
do arrendatário.
É fundamental ativar o Plano de Emergência Social Habitacional, para
responder a estas necessidades de habitação, por forma a desonerar o
senhorio do esforço económico de solidariedade cuja incumbência pertence,
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 142
em primeira linha, ao Estado. A existência de prédios devolutos, poderia
constituir uma bolsa de fogos especialmente direccionados para a satisfação
destas necessidades sociais, incumbindo às Câmaras Municipais a avaliação
das situações concretas do arrendatário e a gestão de arrendamentos
celebrados ao abrigo do Plano de emergência.
9.5.Enquadramento fiscal
Quanto à reforma da tributação fiscal do rendimento proveniente do
arrendamento propormos duas soluções: uma primeira proposta que implica
uma alteração de fundo no sistema de tributação e que vai de encontro às
sugestões dos proprietários; uma outra proposta alternativa, que não implica
alterações de fundo, mas que procura, ainda assim, repor alguma justiça
fiscal e contribuir para o fomento do mercado de arrendamento.
Quanto à primeira solução, defendemos que o rendimento proveniente
das rendas não deveria ser englobado no rendimento do sujeito passivo. De
fato, esta opção traduz-se num agravamento da carga fiscal sobre o
arrendamento resultando numa tributação diferenciada do valor das rendas
tendo em conta os outros rendimentos do senhorio e, originando um
agravamento do valor das rendas praticadas. Assim, propõe-se o
estabelecimento de uma taxa liberatória para as rendas, que poderia ser paga
trimestralmente pelo arrendatário, retendo o valor do imposto, no caso de ser
uma pessoa coletiva ou pelo senhorio.
Outra solução alternativa, mantém o englobamento dos rendimentos
provenientes do arrendamento no rendimento total do sujeito passivo, mas
cria um conjunto de deduções fiscais específicas relacionadas com este
rendimento157
. A previsão de uma majoração quanto às deduções fiscais no
que toca aos encargos com obras de conservação, recuperação e reabilitação,
157
Por exemplo, a possibilidade de deduzir, em sede de IRS as despesas que o senhorio tem que
realizar nas situações em que o arrendatário deixa de pagar rendas e que é necessário o recurso ao
tribunal. Quer as custas judiciais quer os custos com o patrocínio judiciário constituem despesas inerentes
ao negócio que deveriam ser alvo de dedução em sede de rendimento. Ou, ainda a dedução de uma parte
da indemnização paga ao arrendatário nas situações de cessação do contrato por motivos de reabilitação
urbana.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 143
podendo o legislador estabelecer uma lista do tipo de despesas elegíveis158
, que
irá contribuir para fomentar o mercado de arrendamento. Estas deduções
poderiam ser efetuadas de forma faseada durante um determinado período.
Ainda com vista à dinamização da reabilitação urbana, propomos uma
dedução anual de uma parte do investimento realizado com a aquisição ou
com obras de reabilitação em prédios destinados ao mercado do arrendamento
ao rendimento colectável em IRS ou em IRC do proprietário. Esta dedução
deveria vigorar durante um período não inferior a dez anos, sendo estabelecido
um limite da respetiva matéria colectável.
A medida poderia ser acompanhada da criação de “Contas Poupança-
Reabilitação”, com benefícios fiscais semelhantes aos que vigoraram para as
“Contas Poupança-Habitação”.
O objetivo é repor a justiça fiscal e, também, fomentar a recuperação e a
reabilitação dos imóveis.
Por outro lado, deveria ser criado um incentivo fiscal aos senhorios que
demonstrem não ter recebido as rendas acordadas no contrato de
arrendamento, decorridos “x” meses de execução do título sem que o locado
lhe tenha sido entregue, (benefício em sede de IRC/ IRS semelhante ao da
recuperação do IVA nas situações de créditos incobráveis verificados em
tribunal).
A eventual perda de receita fiscal, ainda que não expetável, poderia ser
compensada ao nível do Imposto Municipal sobre Imóveis, quer limitando as
isenções temporárias, quer por via da actualização periódica das avaliações
fiscais dos imóveis.
Por outro lado, importa sublinhar que a reforma da tributação fiscal do
património, designadamente, a reavaliação fiscal dos imóveis depende
necessariamente do levantamento do congelamento das rendas.
9.6. A constituição de um Fundo de Garantia ao Arrendamento
158
Nomeadamente, as despesas de condomínio quando o fogo é destinado ao arrendamento.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 144
O Fundo de Garantia ao Arrendamento teria como um dos principais
objetivos assegurar a continuidade do rendimento do proprietário. Este fundo
seria constituído com uma primeira contribuição por parte dos proprietários,
que poderia ser o primeiro mês de renda e com uma participação financeira do
Estado e seria reforçado através de uma percentagem mensal do valor da
renda. As funções do Fundo seriam as de cobrar a renda, proceder ao
cumprimento das obrigações fiscais, garantir o pagamento das rendas em
situações de incumprimento pelo arrendatário, durante os primeiros 3 meses e
proceder às notificações e demais providências legais para a desocupação do
imóvel em casos de incumprimento. O Fundo, com personalidade jurídica e
autonomia administrativa e financeira deveria estar munido de legitimidade
processual para accionar o arrendatário.
Em simultâneo, poderia ser criada a figura do seguro de renda, um
enquadramento legal que prevê esta operação, o que iria permitir que as
companhias de seguros pudessem garantir o pagamento das rendas em falta
durante um período transitório, até as ações de despejo estaremconcretizadas.
9.7.Reabilitação Urbana
A Proposta de lei que pretende reformar o regime jurídico da reabilitação
urbana deve assentar numa visão estratégica da regeneração urbana que
tenha em conta os vários os impatos económicos, financeiros, sociais,
ambientais, culturais e também, políticos e que seja economicamente
sustentada, envolvendo empresas do setor, senhorios, investidores e
população em geral.
Deverão ser tomadas medidas de simplificação dos processos de
licenciamento, simplificação das formalidades e dos processos relativos à
reabilitação urbana.
Por outro lado, nos grandes centros urbanos as entidades locais
poderiam disponibilizar serviços técnicos de apoio e aconselhamento às
intervenções de conservação dos imóveis através da criação de um gabinete de
apoio e aconselhamento, que a pedido dos proprietários, elaborassem
projectos de intervenção a custos acessíveis.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 145
Seria ainda desejável a criação de mecanismos de realojamento
temporário dos inquilinos cujos imóveis careçam de desocupação para
poderem ser intervencionados.
É igualmente necessário simplificar o processo de fusão de lotes ou
propriedades existentes, quando da aprovação de um projeto que preveja o
estabelecimento de um imóvel único nos lotes ou propriedades pré-existentes,
bem como a previsão de um regime de licenciamento em áreas de Regeneração
Urbana que permita a simplificação dos procedimentos e exigências e que,
simultaneamente, assegure a transparência e objectividade nas regras. Ainda
neste domínio, deve promover-se a redução das taxas e a criação de
instrumentos padronizados nos processos, com vista a encurtar prazos,
reduzir a carga burocrática e sua complexidade técnica.
Urge igualmente, em particular num momento de escassos recursos
financeiros, implementar modelos de Parcerias Público-Privadas com as SRU –
Sociedades de Reabilitação Urbana e as Autarquias, para soluções de
Regeneração Urbana orientadas para a revitalização de espaços públicos.
Por último, a reforma legislativa deveria abrir a porta para a constituição
de sociedades gestoras de capitais exclusivamente privados.
9.8. Dinamização dos Fundos de Investimento imobiliário para o Arrendamento Habitacional
Tendo em conta a atual situação económica, pensamos que seria
benéfico alargar os benefícios previstos para os Fundos de Investimento
Imobiliário para Arrendamento Habitacional, criados pela Lei nº 64-A/2008,
de 31 de Dezembro, às empresas de construção e promoção imobiliária,
permitindo-lhes colocar os fogos que detêm em carteira e para os quais não
conseguem escoamento no mercado.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 146
9.9.Arrendamentos Não Habitacionais
Finalmente, no que toca aos arrendamentos não habitacionais, é
fundamental, até por razões de salvaguarda da concorrência do mercado,
proceder a uma correção de rendas antigas de forma imediata, embora se
possa impor um limite máximo para o valor da renda. A sujeição a este limite
deveria estar diretamente relacionada com o volume de faturação da empresa.
Ainda, no âmbito do regime transitório, equiparar o tratamento dado às
situações de trespasse e de cessão de quotas.
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 147
10. Bibliografia
ASCENSÂO, José de Oliveira - Estudos em honra do Prof. Doutor José de
Oliveira Ascensão. Coimbra : Almedina, 2008. ISBN 9789724035697. ISBN
9789724035680.
COELHO, F. M. Pereira - Arrendamento : direito substantivo e processual-
D0202-707.ULFD,1988
FERREIRA, Durval - Duração dos Arrendamentos Urbanos no NRAU - Actuais
e de Pretérito. Petrony,2009. ISBN9789896391218
FROTA, Mário - Arrendamento urbano : comentado e anotado : regime geral,
continente, regiões autónomas, território de Macau, doutrina jurisprudência.
D0202-543. ULFD,1987
FURTADO, Jorge Henrique da Cruz Pinto - Manual de Arrendamento Urbano,
Volume I. 5ª Edição revista e actualizada. Coimbra. Almendina, 2009. ISBN
9789724038094
FURTADO, Jorge Henrique da Cruz Pinto - Manual de Arrendamento Urbano,
Volume II. 5ª Edição actualizada. Coimbra. Almendina, 2011. ISBN
9789724043050
FURTADO, Jorge Henrique da Cruz Pinto-Manual do Arrendamento Urbano -
Edição Cartonada.3ª Edição revista e actualizada. Coimbra Almedina, 2001.
ISBN 9789724015590
FURTADO, Jorge Henrique da Cruz Pinto - Manual do arrendamento urbano -
D0202-740. ULFD, 2001
FURTADO, Jorge Henrique da Cruz Pinto - Manual do arrendamento urbano -
D0202-740/A. ULFD, 1996
GOMES, Manuel Januário da Costa - Arrendamentos para Habitação.
Coimbra. Almedina, 1996. ISBN 9789724009551
GOMES, M. Januário C.- Arrendamentos para habitação- D0202-773. ULFD,
1996
GOUVEIA, Jorge Bacelar - Arrendamento Urbano, Constituição e Justiça. O
Espírito da Leis, 2004. ISBN 9789729020070
LEITÃO, Luís Manuel Teles de Menezes - Arrendamento Urbano.4ª Edição.
Coimbra. Almedina, 2010. ISBN 9789724041964
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 148
LOUREIRO, José Pinto - Tratado da locação - D0202-279. ULFD,1946
MAGALHÃES, David - A Resolução do Contrato de Arrendamento Urbano.
Coimbra. Coimbra Editora, 2009. ISBN 9789723216769
MARTINS, Manteigas, SUBTIL A. Raposo e CARVALHO, Luís Filipe - O Novo
Regime do Arrendamento Urbano - Anotado.2ª Edição: Porto. Vida Económica
Editorial SA, 2006. ISBN 9789727881925
MORAIS, Fernando de Gravato - Falta de Pagamento da Renda no
Arrendamento Urbano. 3ª Edição. Coimbra. Almedina, 2010. ISBN
9789724042510
MORAIS, Fernando Gravato de - Novo Regime do Arrendamento Comercial. 3ª
Edição. Coimbra. Almedina, 2010. ISBN 9789724046747
ROCHA,Isabel e ESTIMA Paulo - Novo Regime do Arrendamento Urbano -
Notas práticas.1ª Edição.Porto.Porto Editora, 2006.ISBN 9789720061278
SEIA, Jorge Alberto Aragão - Arrendamento urbano : anotado e comentado -
D0202-794/A. ULFD, 2003
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 149
11. Índice dos Anexos
11.1 Dados sobre o mercado de arrendamento
11.2. Estudos sobre o mercado de arrendamento
Estudo da CIP – Confederação Empresarial Portuguesa “FAZER ACONTECER
A REGENERAÇÃO URBANA”, Novembro de 2010
Estudo do Instituto da habitação e da Reabilitação Urbana “RELATÓRIO
DINÂMICA DO MERCADO” de Abril de 2009
Estudo da Associação Lisbonense de Proprietários “Retrato da Habitação em
Portugal: Características e Recomendações”, 2011
11.3 Enquadramento legal
11.3.1.Regime legal do arrendamento urbano
11.3.1.1. Novo Regime do arrendamento Urbano
Lei 16/2000 de 8 de Agosto que Autoriza o Governo a legislar sobre o Regime
Jurídico do Arrendamento Urbano
Lei 6/2006 de 27 de Fevereiro que aprova o Novo Regime do Arrendamento
Urbano
11.3.1.2. Proposta de lei para a revisão Regime do arrendamento Urbano
Proposta de Lei de Alteração ao Regime do Arrendamento Urbano
11.3.1.3.Diplomas complementares
Decreto-Lei 156/2006 de 8 de Agosto aprova o Regime de Determinação e
Verificação do Coeficiente de Conservação
Decreto-Lei 157/2006 de 8 de Agosto aprova o Regime Jurídico dos Prédios
Arrendados
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Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 150
Decreto-Lei 158/2006 de 8 de Agosto aprova os Regimes da Determinação do
Rendimento Anual Bruto Corrigido e a atribuição do Subsídio de Renda
Decreto-Lei 159/2006 de 8 de Agosto aprova a definição do conceito fiscal de
prédio devoluto
Decreto-Lei 160/2006 de 8 de Agosto aprova os elementos do contrato de
arrendamento e os requisitos a que obedece a sua celebração
Decreto-Lei 161/2006 de 8 de Agosto regula as Comissões Municipais
Arbitrais
Declaração de Rectificação nº 24/2006 de 17 de Abril
Portaria n.º 1192-A/2006 - Aprova o modelo único simplificado através do
qual senhorios e arrendatários dirigem pedidos Arrendamento
Portaria n.º 1192-B/2006 - Aprova a ficha de avaliação para a determinação
do nível de conservação de imóveis
11.3.1.4.Diplomas sobre de rendas e coeficiente de actualização
Decreto Lei 13/1986 de 23 de Janeiro
Decreto Lei 329-A/2000 de 22 de Dezembro
Aviso 13 052-A de 2001
Aviso 10 012 de 2002
Aviso 10 280 de 2003
Aviso 9277 de 2004
Aviso 8457 de 2005
Aviso 8457 de 2006
Aviso 23786 de 2008
Aviso 16247 de 2009
Aviso 18370 de 2010
Aviso 19512 de 2011
Portaria 946-A de 31 de Outubro1988
O Enquadramento Legal do Arrendamento e o Mercado de Arrendamento
Cristina Borges, Raposo Subtil e Associados, 151
Portaria 946-B de 31 de Outubro1988
Portaria 1133-A de 31 de Outubro de 1991
Portaria 1133-B de 31 de Outubro de 1991
Portaria 1024 de 31 de Outubro de 1992
Portaria 1025 de 31 de Outubro de 1992
Portaria 1103-A de 31 de Outubro de 1993
Portaria 1103-B de 31 de Outubro de 1993
Portaria 975-A de 31 de Outubro de 1994
Portaria 975-B de 31 de Outubro de 1994
Portaria 616-A de 30 de Outubro1996
Portaria 616-B de 30 de Outubro 1996
Portaria 1300-A de 31 de Outubro de 1995
Portaria 1300-B de 31 de Outubro de 1995
Portaria 1089-C de 31 de Outubro de 1997
Portaria 1089-D de 31 de Outubro de 1997
Portaria 982-A de 30 de Outubro de 1999
Portaria 982-B de 30 de Outubro de 1999
Portaria 1062-B de 31 de Outubro de 2000
Portaria 1261-B de 31 de Outubro de 2001
Portaria 1368 de 19 de Outubro de 2002
Portaria 1238 de 29 de Outubro de 2003
Portaria 1402 de 13 de Novembro de 2004
Portaria 1126 de 31 de Outubro de 2005
Portaria 1151 de 30 de Outubro de 2006
Portaria 1425-A de 31 de Outubro de 2007
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Portaria 1240-A de 31 de Outubro de 2008
Portaria n.º 246/2008 de 27 de Março
Portaria 1379-A de 30 de Outubro de 2009
Portaria 1190 de 18 de Novembro de 2010
Portaria 291/2011 de 4 de Novembro
Portaria 295/2011 de 15 de Novembro
11.3.2 Regime legal da Porta 65
Decreto-Lei 308/2007 de 3 de Setembro
Decreto-Lei 43/2010 de 30 de Abril
Declaração de Rectificação 22/2010 de 10 de Julho de 2010
Portaria 1515-A/2007 de 30 de Novembro
Portaria 249-A/2008 de 28 de Março
Portaria n.º 277-A/2010 de 21 de Maio
Resolução do Conselho de Ministros 128/2007 de 3 de Setembro
11.3.3.Regime legal da Reabilitação Urbana
Aprovado pelo Decreto Lei 105/96 de 31 de Julho
Aprovado pelo Decreto Lei 106/96 de 31 de Julho
Aprovado pelo Decreto Lei 7/99 de 8 de Janeiro
Decreto-Lei 104/2004 de 7 de Maio
Lei 64-A/2008 de 31 de Dezembro
Decreto Lei 307/2009 de 23 de Outubro
Proposta de Lei 24/XII Regime Jurídico da Reabilitação Urbana
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RECRIA
Decreto Lei 4/88 de 14 de Janeiro
Decreto-Lei 104/96 de 31 de Julho
Decreto Lei 197/92 de 27 Setembro
Decreto-Lei 418/99 de 21 de Outubro
Decreto-Lei 329-A/2000 de 22 de Dezembro
Decreto-Lei 329-C/2000 de 22 de Dezembro
Portaria 56-A/2001 de 29 de Janeiro
Portaria 1172/2010 de 10 de Novembro
RECRIPH
Decreto-Lei 106/96 de 31 de Julho
Portaria 711/96 de 9 de Dezembro
11.3.4 Regime legal dos Fundos de Investimento Imobiliário para o Arrendamento Urbano
Lei 64-A/2008 de 31 de Dezembro
Portaria 1553-A/2008 de 31 de Dezembro
11.3.5 Regime legal do Crédito á Habitação
Decreto-Lei 240/2006 de 22 de Dezembro
Decreto-Lei 51/2007 de 7 de Março
Decreto-Lei 171/2008 de 26 de Agosto
Decreto-Lei 192/2009 de 17 de Agosto
Aviso do Banco de Portugal nº 2/2010 de 30 Março
Instrução nº 10/2010
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Anexo: 11.1 Dados sobre o mercado de arrendamento
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Proprietário Arrendamento Proprietário Arrendamento Proprietário Arrendamento 1991 2001 2011
Portugal 1.978.087 841.528 2.688.469 720.878 2.931.931 786.904 27% 21% 20%
Norte 596.863 290.151 870.230 255.336 954.192 267.880 29% 22% 20%
Centro 577.504 111.498 705.651 98.780 727.932 111.095 15% 12% 12%
Lisboa 445.128 333.309 658.320 279.418 758.690 303.435 40% 29% 27%
Alentejo 185.201 57.807 227.540 42.533 228.778 43.932 21% 15% 15%
Algarve 76.782 27.059 109.035 27.206 126.264 36.038 23% 19% 20%
R.A. Açores 50.333 8.164 59.054 6.874 64.200 10.317 13% 10% 13%
R.A. Madeira 46.276 13.540 58.639 10.731 71.875 14.207 21% 15% 15%
1991 2001 2011 % Parque Arrendamento
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