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Ergatividade cindida, papel temtico e
causativizao na lngua Kaapor1
Split ergativity, theta role and causative verbsin the Kaapor
language
Fbio Bonfim DuarteUniversidade Federal de Minas
GeraisUniversidade Federal de Minas GeraisUniversidade Federal de
Minas GeraisUniversidade Federal de Minas GeraisUniversidade
Federal de Minas Gerais
Mrio Alexandre GarciaUniversidade Federal de Minas
GeraisUniversidade Federal de Minas GeraisUniversidade Federal de
Minas GeraisUniversidade Federal de Minas GeraisUniversidade
Federal de Minas Gerais
AbstractThis paper examines the Case and theta role assignment
to DPs in theKaapor language. Our hypothesis is that Kaapor
manifests a split Casesystem, which may be triggered either by the
semantic nature of stativepredicates or by the DPs that receive the
theta role paciente/theme.In addition to this, we propose that the
enclitic particle [.ke] may bedescribed as the (absolutive) Case
and thematic role assignment toobject and to subject of
unaccusative verbs. We also postulate that thecausative prefix {mu-
~ m-}, which occurs in ergative predicates, is themorphological
manifestation of the light verb. Finally, we propose toextend the
obligatory Case parameter in order to explain the split Casesystem
of the Kaapor. Thus, we suggest that Spec-TP is activated
forassigning the (nominative-absolutive) structural Case to the
subjectsof active transitive, unergative and unaccusative verbs and
Spec-vP isactivated for assigning the absolutive Case to the object
and to the subjectof stative verbs.
KeywordsSplit Case, theta role, causative verb and Obligatory
Case Parameter(OCP).
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DUARTE; GARCIA 216
Resumo
Este artigo trata da atribuio de Caso, Papel Temtico e da
realizaodo verbo causativo na lngua Kaapor. Procuramos demonstrar
que alngua Kaapor manifesta uma ciso no sistema de Caso, a
saber:nominativo-absolutivo. Esta ciso conseqncia da natureza
semnticados DPs e dos verbos estativos. Com relao aos verbos
estativos, ocaso absolutivo marcado por meio dos prefixos
absolutivos. J osDPs sujeito de verbos inacusativos e estativos, e
objeto de verbostransitivos recebem caso absolutivo por meio da
partcula [.ke], quecodifica, alm do Caso, o papel temtico
[+paciente/tema]. Sobre overbo causativo, propomos que o prefixo
{mu ~ m}, que ocorre empredicados ergativos, a manifestao
morfolgica do verbo causativoleve. E por fim, buscamos explicar a
ciso no sistema de Caso doKaapor, utilizando o Parmetro de Caso
Obrigatrio (OCP). Sugerimosque Spec-TP ativado para atribuir caso
estrutural (nominativo-absolutivo) aos sujeitos de verbos
transitivos, inergativos e inacusativose Spec-vP ativado para
atribuir o Caso absolutivo ao objeto e ao sujeitode verbos
estativos.
Palavras-chaveciso no sistema de Caso, papel temtico, verbo
causativo e ParmetroObrigatrio de Caso (OCP)
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0. INTRODUO0. INTRODUO0. INTRODUO0. INTRODUO0. INTRODUO
ste artigo tem por objetivo mostrar que, na lngua Kaapor2,
diferentementede outras lnguas Tupi-Guarani, possvel estabelecer
uma ntidadistino sinttica entre predicados inergativos e
inacusativos, se
tomarmos por base o papel temtico e o Caso (estrutural) que
atribudo aoDP sujeito desses verbos. Buscamos ainda motivar que o
prefixo causativo{mu- ~ m-}, que pode ser acrescentado a verbos
descritivos/estativos,inacusativos, inergativos e, at mesmo a
verbos transitivos, pode ser vistocomo sendo o reflexo, na
morfologia, do verbo leve (light verb) que encabeao ncleo da
estrutura v-VP. Conforme anlise que desenvolveremos na seo3, este
prefixo pode c-selecionar VPs mondicos e didicos, produzindoverbos
ergativos de dois lugares.
Os dados colhidos at o momento mostram que o DP sujeito dos
verbosintransitivos descritivos/estativos e inacusativos, ao
contrrio do DP sujeitodos verbos inergativos e transitivos de ao,
pode vir marcado por meio dapartcula [.ke], que geralmente vem
encltica ao DP sobre o qual estabeleceescopo sinttico-semntico,
conforme se v pelos dados abaixo:
INACUSATIVOS
(1) ihe ) ke a-ar (Silva, 2001:47)eu ABS eu-cairEu caio
(2) ihe ) O-jiwa ke u-pen ti ) (Silva, 2001:19)meu POSS-brao ABS
3-quebrar REPMeu brao quebrou
E
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DUARTE; GARCIA 218
DESCRITIVOS
(3) ae ta ke i-akang ke i-juhar ti) (Silva, 2001:9)ela PL ABS
POSS-cabea ABS ABS-ter coceira REPElas, as cabeas deles esto coando
[lit: tm coceiras].
Conforme veremos na seo 2, uma das principais funes da
partcula[.ke] tornar visvel o papel temtico [+AFETADO/+PACIENTE]
dos DPs com osquais co-ocorre. Por sua vez, DPs sujeitos agentivos
de verbos inergativosno recebem essa partcula. interessante
observar que essa restrio sintticasinaliza uma importante diferena
na marcao dos sujeitos dos verbosmonoargumentais na lngua Kaapor.
Comparem os dados em (1) a (3) depredicados inacusativos e
descritivos com os exemplos em (4) e (5), abaixo,de predicados
inergativos:
INERGATIVOS
(4) jane ja-jengar ja-in (Silva, 2001:20)ns ns-cantar ns-estarNs
estamos cantando
(5) arauxu O-ahem uhu (Kakumasu, J. 1986:331)Arajo 3-gritar
muitoArajo gritou muito
Todavia, alm do DP sujeito dos verbos descritivos e
inacusativos, em(1) a (3), tambm DPs na funo sinttica de objeto
podem vir marcados pormeio da partcula [.ke], conforme se v pela
presena dessa partcula juntoaos DPs objetos dos predicados
transitivos em (6) a (11) abaixo. Notem aindaque os DPs sujeitos
dos verbos transitivos no vm marcados com a partcula[.ke]:
TRANSITIVOS
(6) ihe ) tayn ke a-mu-e (Silva, 2001:15)eu criana ABS
eu-CAUS-aprenderEu ensino a criana [lit: fao-a aprender]
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(7) ihe ) narj ke a-pirok (Silva, 2001:39)eu laranja ABS
eu-descascarEu descasco a laranja
(8) tayni hj-okwen ke Oi-kina (Caldas, 2001:22)criana POSS-porta
ABS 3-fecharA crianai fecha a porta (delaj)
(9) ihe ) ae ke a-mu-eo (Silva, 2001:22)eu ele ABS eu-CAUS-ter
cansaoEu o cansei
(10) ihe ) ae ke a-mu-wa:wak (Silva, 2001:19)eu ele ABS
eu-CAUS-rodarEu o fiz rodar
(11) Cristina ihe ) O-jiwa ke O-pyhyk (Caldas, 2001:22)Cristina
minha POSS-brao ABS 3-segurarCristina segura meu brao
Tomando por base o que o conjunto de dados acima indica, a
hipteseque exploraremos neste trabalho de que a ocorrncia da
partcula [.ke] juntoa DPs no aleatria, mas, ao contrrio, tem a funo
gramatical de assinalara natureza semntica [+AFETADO/+PACIENTE] do
sujeito de verbos inacusativose do objeto de verbos transitivos de
ao, fato que sugere um interessantealinhamento sinttico-semntico
entre o DP sujeito de verbos intransitivos(descritivos e
inacusativos) com o DP objeto. Este tipo de alinhamento lembramuito
o sistema que Dixon (1979, 1994) denomina de ergatividade cindida
(splitergativity). Nessa linha de investigao, outro propsito deste
artigo encontraruma resposta para a questo formulada em (12):
(12) ser a partcula [.ke] reflexo da atribuio do papel theta
[+AFTEADO/+PACIENTE] e do Caso estrutural aos DPs na funo sinttica
de sujeito(S) de verbos descritivos/estativos, inacusativos e de
objeto (O) deverbos transitivos de ao?
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DUARTE; GARCIA 220
Para responder a esta e a outras questes relativas predicao
verbalna lngua Kaapor, dividimos este texto em quatro sees. Na seo
(1),fornecemos uma breve descrio do sistema de concordncia que se d
entreo sujeito e o verbo em predicados monoargumentais e
transitivos; na seo2, tomando por base as propriedades
sinttico-semnticas da partcula [.ke],propomos subdividir os verbos
intransitivos da lngua Kaapor em, pelomenos, duas subclasses: os
descritivos/estativos e inacusativos, por um lado,e os inergativos,
por outro; na seo 3, averiguamos os tipos de alternnciacausativa
que aumentam a valncia de predicados descritivos,
inacusativos,inergativos e transitivos e propomos que o prefixo
{mu- ~ m-} seja interpretadocomo realizao do verbo leve causativo,
o qual equivale aos verbos FAZER/CAUSAR/PROVOCAR; e, por fim, na
seo 4, estando ciente da ciso na marcaode Caso dos argumentos (S)
dos predicados monoargumentais, utilizamos omecanismo de atribuio
de Caso (estrutural), acompanhando o ParmetroObligatrio de Caso
(OCP), conforme proposto por Laka (1993) e Bobaljik(1993).
1. SISTEMA DE CONCORDNCIA VERBAL NA LNGU1. SISTEMA DE
CONCORDNCIA VERBAL NA LNGU1. SISTEMA DE CONCORDNCIA VERBAL NA
LNGU1. SISTEMA DE CONCORDNCIA VERBAL NA LNGU1. SISTEMA DE
CONCORDNCIA VERBAL NA LNGUA KAA KAA KAA KAA
KAAPORAPORAPORAPORAPOR
Na lngua Kaapor, assim como em outras lnguas da famlia
lingsticaTupi-Guaran, usa-se indistintamente a srie de prefixos
pessoais nominativospara codificar tanto o sujeito de verbos
transitivos como o sujeito de verbosintransitivos (=inacusativos e
inergativos). Para facilitar a compreensodos dados da anlise,
arrolamos o inventrio completo dos pronomespessoais e dos prefixos
pessoais nominativos na tabela 1 abaixo:
TABELA 1Marcadores pessoais
pronomes pessoais prefixos pessoais nominativos
ihe) eu a- eune tu ere- tujane ns ja- nspehe vs pe- vsae
ele(s)/ela(s) o-/u- ele(s)/ela(s)razes monossilbicas
O- ele(s)/ela(s) razes com mais de umaslaba.
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A ocorrncia dos prefixos pessoais nominativos em verbos
transitivos,inacusativos e inergativos pode ser visualizada por
meio dos paradigmas deconjugao verbal arrolados abaixo. Notem que o
prefixo pessoal de terceirapessoa assumir a forma {O-} quando a
raiz verbal contiver mais de uma slaba,como no paradigma em
(15):
INERGATIVO
(13) ihe) a-por eu pulone ere-por tu pulasjane ja-por ns
pulamospehe) pe-por vs pulaisae u-por ele pula
INACUSATIVO
(14) ihe) ke a-ar eu caione ke ere-ar tu caisjane ke ja-ar ns
camospehe) ke pe-ar vs caieisae ke u-ar ele cai
TRANSITIVO
(15) ihe) a-mue eu ensino (algum)ne ere-mue tu ensinas
(algum)jane ja-mue ns ensinamos (algum)pehe) pe-mue vs ensinais
(algum)ae OOOOO- mue ele ensina (algum)
Os dados acima mostram que o sistema de concordncia por meio
dosprefixos pessoais nominativos no nos permite estabelecer uma
distinomorfossinttica clara entre as duas classes de verbos
monoargumentais3, umavez que a mesma srie de prefixos pode figurar
na raiz de verbos inacusativose de verbos inergativos,
independentemente do fato de os inacusativos c-selecionarem um DP
com o papel theta [+AFETADO] e os inergativos, um DP como papel
theta [+AGENTE]. Todavia, o padro flexional dos verbos
monoargumenataisestativos difere do padro flexional dos verbos
monoargumenatais em (13) e(14) por utilizarem a srie de prefixos
absolutivos para codificar o DP na funosinttica de sujeito. A
tabela 2 a seguir mostra o inventrio desses prefixos:
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DUARTE; GARCIA 222
TABELA 2Prefixos absolutivos
tema em consoante4 tema em vogal
adjacncia do complemento O r-no adjacncia do complemento i-
h-
Os alomorfes {- ~ r-} aparecem nos contextos em que o DP
vemadjacente ao verbo na estrutura e os alomorfes {i- ~ h-}, por
sua vez, denotamo fato de o DP no vir imediatamente adjacente ao
verbo, seja porque foideslocado para uma posio mais alta na
estrutura ou seja porque foisimplesmente omitido. Os exemplos
abaixo mostram os contextos deocorrncia desses prefixos:
(16) ihe ) r-ury ym (Silva, 2001:5)eu ABS-ter alegria NEGEu no
tenho alegria
(17) ihe ) OOOOO-jeje ym ko a-xo (Silva, 2001:5)eu ABS-estar
sozinha NEG aqui eu-estar em movimentoAqui, eu no estou sozinha
(18a) [aej ta ke ik -akangj ke]i ii-juhar ti) (Silva, 2001:9)ela
PL ABS POSS-cabea ABS ABS-ter coceira REPElas, as cabeas deles esto
coando
(18b) _____proi _________ ii -juhar ti )ABS-ter coceira REP
(Elas= as cabeas) esto coando
(19a) [ko mee) ywy] i h iaku (Silva, 2001:8)esta PART terra
ABS-estar quenteEsta terra est muito quente
(19b) _____pro i ________________ h i -akuABS-estar quente
(Ela = a terra) est muito quente
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Observem que, em (18a) e (19a), o DP sujeito e o verbo esto
situadosem posies distintas na estrutura, visto que as propriedades
denotacionaisdos prefixos {i-} e {h-}5 apontam para a no-adjacncia
do sujeito em relaoao verbo. Este fato pode ser captado se propomos
que o DP sujeito se move paraa posio de SPEC de uma projeo
funcional acima da posio sinttica emque situa o verbo, conforme se
v pela configurao proposta em (18c) e (19c):
(18c) [FP [DP aej ta ke ik-akangj ke]i .......[VP..tDP
...ii-juhar ti... ]
(19c) [FP [DP ko mee) ywy]i .......[VP..tDP ... hi-aku ... ]
Tomando por base o padro de concordncia sujeito-verbo exposto
nosdados (13) a (19) acima, notamos haver uma ciso parcial no
sistema deconcordncia condicionada pela natureza semntica dos
predicados estativos/descritivos. Para explicar esta ciso,
utilizaremos a terminologia introduzidapor Dixon a partir de 1979,
de maneira que faremos referncia ao argumentoagente de um verbo
transitivo de ao por meio da sigla (A) e abreviaremoso argumento
tema/paciente por meio de (P). Por sua vez, o nico argumentodos
verbos intransitivos ser referido por (S). O sistema nominativo e o
sistemaergativo, propostos por Dixon (ibid), podem ser observados
em (20):
(20)Sistema SistemaNominativo arg. Ergativo
A Ergativo
Nominativo {S
} AbsolutivoAcusativo O
Conclumos que, nos dados em (13) a (19), o sujeito (S) de
verbosestativos codificado pelos prefixos absolutivos e o sujeito
(S) dos verbosinacusativos e inergativos codificado por meio dos
prefixos nominativos.Este fato nos permite, ento, propor a seguinte
ciso na codificao doargumento (S) dos predicados monoargumentais6
na lngua Kaapor:
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DUARTE; GARCIA 224
(21)Sistema SistemaNominativo arg. Ergativo
Nominativo Sa
}So Absolutivo
Vejam que, em (21), (Sa) faz referncia ao sujeito de verbos
inergativose inacusativos, por um lado, e (So), ao sujeito dos
verbos estativos/descritivos,por outro. Na prxima seo, mostraremos
que, embora o sistema deconcordncia sujeito-verbo marque
indistintamente o sujeito [+PACIENTE/+AFETADO] do verbo inacusativo
e o sujeito [+AGENTE] do verbo inergativo pormeio dos prefixos
pessoais nominativos, a distino semntica entre os doisargumentos
pode ser codificada pela possibilidade de ocorrncia da
partculaencltica [.ke] junto ao DP sujeito de verbos inacusativos e
descritivos/estativos. O comportamento desta partcula nos servir
como um interessantediagnstico sinttico-semntico para distinguirmos
os verbos inacusativos(e tambm os descritivos/estativos) dos verbos
inergativos.
2. PROPRIED2. PROPRIED2. PROPRIED2. PROPRIED2. PROPRIEDADES
SINTTICAS E SEMNTICAS DADES SINTTICAS E SEMNTICAS DADES SINTTICAS E
SEMNTICAS DADES SINTTICAS E SEMNTICAS DADES SINTTICAS E SEMNTICAS
DA PA PA PA PA PARTCULA KEARTCULA KEARTCULA KEARTCULA KEARTCULA
KE
Dados retirados dos trabalhos elaborados por Kakumasu, J.
(1986);Kakumasu, J. & Kakumasu, K. (1990), Silva (2001) e
Caldas (2001) nosrevelam que a partcula [.ke], em geral, denota que
o argumento envolvido noevento recebe a interpretao de
[+AFETADO/+PACIENTE]. Tal intuio ,particularmente, confirmada
quando comparamos a ocorrncia dessa partculano objeto de verbos
transitivos com a sua ocorrncia no sujeito de
predicadosdescritivos/estativos e inacusativos, conforme se v em
(22) a (29):
ORDEM [SOV] EM TRANSITIVOS DE AO
(22) aerehe taru Nexi ke7 O-jook (Kakumasu, J., 1986:327)por
esta razo Taru Nexi ABS 3-pegarPor essa razo, Taru pegou Nexi.
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(23) ihe ) ne ke a-kutuk-ta (Silva, 2001:40)eu tu ABS
eu-furar-IMINEu vou te furar
(24) ae ok ke O-muj (Silva, 2001:39)ele casa ABS 3-fazerEle faz
casa.
ORDEM [SV] EM DESCRITIVOS/ESTATIVOS
(25) Ana ke h-e) y (Caldas, 2001:26)Ana ABS ABS-ter cansao
PERF.1Ana j cansou
ORDEM [SV] EM INACUSATIVO
(26) ihe ) ke a-ar (Silva, 2001:47)eu ABS eu-cairEu caio
(27) arapari) ke u-e ta ki ) (Caldas, 2001:62)lamparina ABS
3-apagar IMIN INTA lamparina vai apagar.
(28) tayn ta ke O-jixiu ja-jur rahcriana PL ABS 3-chorar ns-vir
quandoAs crianas choravam, quando ns viemos. (Silva, 2001:46)
ORDEM [VS] EM INACUSATIVO
(29) a-pyhyj ta ihe ) ke1-cochilar IMIN eu ABSEu (tenho
necessidade de) cochilar. (Silva, 2001:46)
Tomando por base os dados mostrados acima, defenderemos
doravantea hiptese de que a funo da partcula [.ke] na lngua Kaapor
tornar visvel,
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DUARTE; GARCIA 226
ao nvel do componente sinttico-semntico, o papel temtico de
[+AFETADO/+PACIENTE] dos DPs na funo sinttica de sujeito e dos DPs
na funo sintticade objeto. A conseqncia terica que essa proposta
traz para nossa anlise que teremos de admitir, ento, que a partcula
[.ke] est possivelmenteassociada realizao de Caso estrutural dos
DPs. No mbito da gramticagerativa, assume-se que Caso estrutural
responsvel por tornar visvel o papeltemtico dos DPs. Segundo Mioto
et alli (2005:174-175):
a categoria gramatical de caso necessria para qualquer lnguana
medida em que permite que os DPs sejam interpretados (....).Sem o
caso, no seria possvel recuperar qual o papel temtico doDP. Esta
necessidade de caso se verifica mesmo para lnguas queno dispem de
um nico morfema para este fim. Como todas asoutras, esta lngua
precisa indicar qual o papel- do DP e isso feitopor meio do Caso
abstrato.
Se essa proposta estiver mesmo correta, ento, ficamos em
condiesde responder a questo levantada em (12), de sorte que
postularemos que oescopo da partcula [.ke], na lngua Kaapor,
constitui um dos mecanismospara realizar o Caso8 estrutural do DP
sujeito de inacusativos e descritivos/estativos e do DP objeto de
verbos transitivos. Vejam que esta propostaencontra evidncia
adicional no fato de o sujeito (So) e o objeto (O) poderemambos
receber a partcula encltica [.ke], conforme evidenciam os dados
em(22) a (29) acima. Nestas oraes, verifica-se o alinhamento do DP
sujeito dospredicados inacusativos e descritivos/estativos com o DP
objeto do predicadotransitivo. Uma possvel explicao para esse
alinhamento pode estarcorrelacionada com o que Dixon (1979:89)
denomina de ciso determinadapela natureza semntica dos argumentos
(S) dos verbos intransitivos:
(...) in most examples of split conditioned by the semantic
natureof verbs, bound affixes are involved; whereas, in most
examples ofsplit conditioned by the semantic nature of NPs,
case-marking isinvolved. This is surely what could have been
predicted: that kindof morphological marking split is CONDITIONED
by the semantic natureof the verb is most often REALIZED BY an
affix to the verb; that varietyof split which is CONDITIONED BY the
semantic nature of NPs is usuallyREALIZED BY affixes or particles
attached to NPs.
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Notem que o padro de marcao em Kaapor parece coincidirexatamente
com o previsto por Dixon acima, porquanto a ciso
semnticacondicionada pela natureza semntica dos predicados
descritivos, conformedescrito na seo 1, realizada por meio dos
prefixos absolutivos. J a cisocondicionada pela natureza semntica
dos D/NPs codificada por meio dapartcula encltica [.ke], conforme
os dados em (22) a (29) acima. Este fatorefora nossa hiptese de
que, em Kaapor, a partcula [.ke] tem a funogramatical de tornar
visvel o papel temtico [+AFETADO/+PACIENTE] e realizar oCaso
estrutural dos DPs com os quais figura encltica. No mbito da
tipologiasinttica, costuma-se denominar este Caso sob o rtulo de
absolutivo.
Contudo, a mesma situao no se verifica com a codificao do
sujeito(Sa) dos verbos inergativos e com a codificao do sujeito (A)
dos verbostransitivos de ao, tendo em vista que, nestes predicados,
os DPs agentivosna funo de sujeito no vm marcados pela partcula
[.ke], conforme se vpelos exemplos abaixo:
INERGATIVOS
(30) jane ja-jengar ja-in (Caldas, 2001:47)ns ns-cantar
ns-estarNs estamos cantando
(31) ne re-wa:wak mi ? (Silva, 2001:18)tu tu-rodar PROBTu
rodastes?
(32) jane ja-piku)j mi ? (Silva, 2001:11)ns ns-remamos PROBNs
remamos?
(33) ae ta o-por mi ? (Silva, 2001:11)ele PL 3-pular PROBEles
pularam?
(34) ihe ) a-jeeng a-in (Silva, 2001:12)eu eu-falar
eu-estar.sentandoEu estou falando sentando
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DUARTE; GARCIA 228
TRANSITIVOS
(35) taynj hi-okwen ke Oj-nupa u-amcriana POSS-porta ABS 3-bater
3-estar em pA crianaj est (em p) batendo porta (dele(a)i) (Caldas,
2001:50)
(36) isawia upa ihe ) O-mae ke O-suu:suurato tudo minha
POSS-roupa ABS 3-roer:roerO rato roeu toda a minha roupa (Caldas,
2001:53)
Tomando por base o contraste entre os dados (22) a (29), por um
lado,e os dados em (30) a (36), por outro, notamos que o escopo
sinttico-semntico da partcula [.ke] em predicados monoargumentais
nos permiteoperar uma importante distino gramatical entre verbos
inacusativos e verbosinergativos. Portanto, o fato de os sujeitos
agentivos dos predicadosinergativos no receberem a partcula [.ke]
servir como um importantediagnstico sinttico para diferirmos as
duas subclasses de verbosmonoargumentais na lngua Kaapor. Chegamos,
assim, ao seguinte sistemacindido de marcao de Caso dos argumentos
nucleares A, Sa, So e O, nalngua Kaapor:
(37)Sistema cindido de codificao dos argumentos em Kaapor
A
Caso Nominativo {Sa
Oke Caso Absolutivo
} Soke Caso Absolutivo
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Vejam que o sistema em (37) mais amplo e incorpora o
sistemaproposto em (21). Neste ltimo, a ciso determinada apenas
pela naturezasemntica do predicado descritivo/estativo e pela
ocorrncia dos prefixosabsolutivos, enquanto, no sistema proposto
acima, a ciso est intimamentecorrelacionada com o escopo
sinttico-semntico da partcula [.ke]. Porconseguinte, a ciso de (S)
em (37) nos permite alocar os verbos monoargumentaisem, pelo menos,
duas subclasses: a subclasse dos descritivos/estativos
einacusativos, por um lado, e a subclasse dos inergativos, por
outro, conformemostramos pela lista de verbos na tabela 3
abaixo:
Predicados monoargumentais que marcamDPs sujeito por meio da
partcula ke
Descritivos Inacusativos
-e: ter cansao -kajum:perder, fugir-yaj: ter suor -pen:
quebrar-se-pahar:ter pressa -karuk: urinar-kya: ter sujeira -man:
morrer-pyai: ter tristeza, -mano:ano: debater ter saudade, ter
paixo -pak:acordar-aku: ter quentura -pyhyj:cochilar-juhar: ter
coceira -jixiu: chorar-pui: ter finura -hyk: chegar-katu: ter
bondade -siryk: escorregar-ahy: ter dor -ar: cair-akym: ter umidade
-pyrii: tropear-axer: ter ruindade -e: apagar-taj: ter ardor-nge:
ter sede-risan: ter frio-kau: ter tonteira-membek: ser macio
Predicados monoargumentaisque no marcam DPs com apartcula ke
Inergativos
-xe: entrar-jahuk: tomar banho-piku)j: remar-por: pular-hem:
sair-wata: andar-jeen: falar-wapik: sentar-se-nin: deitar-se-pum:
levantar-se-ker: dormir-jengar: cantar-wa:wak: rodar-jan:
correr-purahaj: danar-hendu: ouvir-hem: gritar-jawir: errar
TABELA 3Subclasses de verbos monoargumentais
Na seo (4), discutimos a atribuio do Caso nominativo e
absolutivo luz do Parmetro Obrigatrio de Caso (OCP), conforme Laka
(1993) eBobaljik (1993). Antes, faz-se necessrio que apresentemos
como os verbos
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DUARTE; GARCIA 230
descritivos, inacusativos, inergativos e mesmo transitivos podem
mudar suavalncia por meio do acrscimo do prefixo causativo {mu- ~
m-}. Nossahiptese ser que este prefixo a realizao do verbo leve
(light verb), o qual juntado (merged) na posio de ncleo da projeo
mais alta da concha v-VP.
3. PROPRIED3. PROPRIED3. PROPRIED3. PROPRIED3. PROPRIEDADE
GRAMAADE GRAMAADE GRAMAADE GRAMAADE GRAMATICAL DO PREFIXTICAL DO
PREFIXTICAL DO PREFIXTICAL DO PREFIXTICAL DO PREFIXO CAO CAO CAO
CAO CAUSAUSAUSAUSAUSATIVTIVTIVTIVTIVO {O {O {O {O {mu- ~ m-mu- ~
m-mu- ~ m-mu- ~ m-mu- ~ m-}}}}}
Em Kaapor, verbos podem, em princpio, se ergativizar9, alterando
asua valncia por meio do acrscimo do prefixo causativo {mu-}~
{m-}10.Desse modo, este morfema pode afixar-se a razes de verbos
descritivos,inacusativos, inergativos, e ainda a razes de verbos
transitivos, resultando emuma mudana na valncia dos predicados.
Nota-se que este prefixo vem antesda raiz verbal e situa-se depois
dos prefixos nominativos, resultando naseguinte ordem interna dos
prefixos verbais {AGR+CAUS+VERBO}, conformeos dados abaixo:
DESCRITIVO ERGATIVO
(38a) ihe ) O-a ke i-akym ti) (Silva, 2001:23)meu POSS-cabelo
ABS ABS-ter umidade REPO meu cabelo est molhado
(38b) ae ihe ) O-a ke O-mu-akym ti)ele meu POSS-cabelo ABS
3-CAUS-ter umidade REPEle fez o meu cabelo ficar molhado
(39a) upa O-mae kase ke h-aku O-pytu (Silva, 2001:23)tudo
G-coisa caf ABS ABS-ter quentura 3-ter manhaTodo o caf est
morno
(39b) ihe ) kase ke a-mu-akueu caf ABS eu-CAUS-ter quenturaEu
fao o caf ficar quente
INACUSATIVO ERGATIVO
(40a) ihe ) O-jee-ha ke upa O-kajim o-hominha POSS-falar-NOMI
ABS tudo 3-perder-se 3-irMinha fala toda vai fugindo (Silva,
2001:18)
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jun./dez. 2006 231
(40b) ihe ) O-jee-ha ke upa a-mu-kajim a-hominha POSS-falar-NOMI
ABS tudo eu-CAUS-perder-se eu-ir(Eu) fao a minha fala toda
fugir
INERGATIVO ERGATIVO
(41a) ne re-wa:wak mi (Silva, 2001:19)tu tu-rodar PROBTu
rodastes?
(41b) ihe ) ae ke a-mu-wa:wakeu ele ABS eu-CAUS-rodarEu o fiz
rodar
(42a) jane ja-jengar ja-in (Silva, 2001:20)ns ns-cantar
ns-estarNs estamos cantando
(42b) ihe ) ae ke a-mu-jengareu ele ABS eu-CAUS-cantarEu o fao
cantar
TRANSITIVO ERGATIVO
(43a) a-sak ae O-po r-ehe (Silva, 2001:25)eu-ver ele POSS-mo
OBLQ-com respeito aEu vejo a mo dele
(43b) ne ihe ) ke re-mu-sak ytu eu ABS tu-CAUS-ver PERF.1Tu me
fizestes ver
Nas alternncias acima, observa-se que o DP sujeito dos exemplos
em(a) promovido a objeto do verbo ergativo e, geralmente, vem
marcado coma partcula [.ke], situao sinttica que sinaliza mudana do
papel temticodos DPs sujeitos dos verbos inergativos e transitivos
em (41a), (42a) e (43a),os quais assumem o papel temtico
[+AFETADO/PACIENTE]11 em (41b), (42b) e(43b). Esta alterao de
valncia do predicado e do papel temtico dos
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DUARTE; GARCIA 232
argumentos pode ser ainda sentida pela concordncia que se
estabelece entreo sujeito e o verbo. Por isso, nas sentenas em (b),
a concordncia sujeito-verbo s pode dar-se por meio do prefixo
nominativo, nunca por meio doprefixo absolutivo.
Existe ainda a possibilidade de um verbo transitivo (indireto)
serergativizado por meio do acrscimo do prefixo {mu-}. Nesses
contextos, oDP, que o sujeito do verbo transitivo (indireto),
promovido para a funosinttica de objeto direto do predicado
ergativo e tem seu papel temticoalterado, o que sinalizado pela
ocorrncia da partcula [.ke]:
(44a) ne re-parahy ihe ) r-ehe (Silva, 2001:24)tu tu-ter raiva
eu OBLIQ-deTu tens raiva de mim
(44b) ihe ) ne ke a-muparahyeu tu ABS eu-CAUS-ter raivaEu te fiz
ficar com raiva (Silva, 2001:25)
(45a) ne re-pya y m ihe ) r-ehe ytu tu-pensar NEG eu OBL-em
PERF.1Tu no pensaste em mim
(45b) ae ne ke O-mu-pya ihe ) r-ehe yele tu ABS 3-CAUS-pensar
mim OBLQ-em PERF.1Ele te fez pensar em mim
Quanto aos argumentos nucleares12, nota-se que a ordem sinttica
maisrecorrente SOV, conforme vemos nos exemplos acima, e no exemplo
(46)abaixo em que figura o verbo ergativo -mu-karuk fazer
urinar:
ORDEM [SOV]
(46) ihe ) ae ke a-mu-karuk (Silva, 2001:21)eu ele ABS
eu-CAUS-urinarEu o fao urinar
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Rev. Est. Ling., Belo Horizonte, v. 14, n. 2, p. 215-255,
jun./dez. 2006 233
Vemos que o prefixo {mu- ~ m-} tem como funo principal mudar
avalncia dos predicados verbais. Uma maneira de captarmos esta
alternncia assumirmos que esse prefixo seja a instanciao, no mbito
do componentemorfossinttico, do verbo leve abstrato (light verb) na
concha v-VP [cf. Halee Keyser (1993a, 2000)]. Com base nessa
hiptese, assumamos que o prefixocausativo {mu- ~ m-} seja juntado
como ncleo de vP, podendo, em princpio,c-selecionar tanto VPs
transitivos quantos VPs intransitivos, conformeindicamos pelas
representaes abaixo:
C-SELEO DE INACUSATIVOS E DESCRITIVOS/ESTATIVOS
(47) [vP .....mu- [VP DPke V ]13
C-SELEO DE INERGATIVOS
(48) [vP ......mu- [VP DP V ]
C-SELEO DE TRASITIVOS DIRETOS
(49) [vP ......mu- [VP DP V DPke]
C-SELEO DE TRASITIVOS INDIRETOS
(50) [vP ......mu- [VP DP V PP]
Assim sendo, na sentena (51a) abaixo, o prefixo causativo
c-selecionaum VP mondico, o qual exibe, na posio de SPEC-VP, o DP
[ne ke].Suponhamos ainda que sua natureza afixal14 torna obrigatria
a incorporaodo verbo descritivo, resultando o verbo [-mu-purah]
fazer ter raiva. Aincorporao do verbo pode ser visualizada pela
configurao sinttica em(51b):
(51a) ihe ) ne ke a-mu-parahy (Silva, 2001:24)eu tu ABS
eu-CAUS-ter raivaEu te fiz ficar com raiva
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DUARTE; GARCIA 234
(51b)vP
eiDP vihe) ei vo VP mu- ei DP V ne ke ! Vo
-parah
Veja que a ordem linear observada na sentena (51a) pressupe que
omovimento do verbo lexical para ncleo de vP deve ser seguida do
movimentodo DP objeto e do DP sujeito para posies em que possam
verificar Caso.Se adotarmos a hiptese de que o Caso estrutural do
objeto pode ser atribudoem SPEC externo de vP, ento, segue-se que o
DP objeto em (51a) move-se paraSpec-vP. J o DP sujeito elevado at
SPEC-TP, posio em que recebe o Casonominativo, conforme a derivao
em (52):
(52c)
TPeiDP T! eiihe) vP ei DP v ! ei ne ke DP v ! ei tsuj vo VP ! ei
mu-parah tobj V ! tv
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jun./dez. 2006 235
Por isso, a questo que se coloca para nossa anlise saber em
quemedida o movimento dos DPs para receber Caso (estrutural) est
correlacionadocom o Parmetro Obrigatrio de Caso (OCP) e com a
natureza morfossintticados ncleos To e vo. Na prxima seo,
acompanhando a proposta de Laka(1993), Bobaljik (1993), Aldridge
(2005) e Rackowski e Richards (2005),exploraremos a idia de que, em
Kaapor, o ncleo To de oraes transitivas,inergativas e
inacusativa
inserido na derivao com o trao de Caso
nominativo a atribuir aos DPs que sobem para a posio de Spec-TP.
Por suavez, em predicados estativos, To no estar ativo para
atribuir Caso, de modoque, nesses predicados, ser o ncleo vo que
atribuir o Caso absolutivo aossujeitos dos verbos descritivos. De
maneira semelhante, nossa hiptese ade que o ncleo vo nos predicados
transitivos entra na derivao com o traode Caso estrutural
(absolutivo) a atribuir ao DP objeto.
4. O P4. O P4. O P4. O P4. O PARMETRO OBRIGAARMETRO
OBRIGAARMETRO OBRIGAARMETRO OBRIGAARMETRO OBRIGATRIO DE CASOTRIO DE
CASOTRIO DE CASOTRIO DE CASOTRIO DE CASO
Laka (1993) e Bobaljik (1993) desenvolvem uma teoria em que
aatribuio do Caso ao nico argumento de verbos intransitivos estar
sujeita parametrizao, o que ir depender de qual Categoria
funcional, responsvelpela atribuio de Caso a esse argumento,
estiver ativa. Assim sendo, numalngua nominativa, o nico argumento
do verbo monoargumental recebe Casonominativo na posio de SPEC-TP,
independentemente do fato de ser o verboinacusativo ou inergativo.
J, em lnguas ergativas, o sujeito do verbointransitivo poder
receber o Caso absolutivo na posio de SPEC da projeovP. Atribui-se
o Caso ergativo/nominativo nos contextos em que h dois Casosa serem
atribudos: o ergativo ao DP sujeito e o absolutivo ao DP objeto,
nosistema ergativo; e o nominativo ao DP sujeito e o acusativo ao
objeto, nosistema nominativo. O parmetro de atribuio de Caso no se
aplica aospredicados transitivos, mas somente a predicados
intransitivos, visto que, aosujeito (S) de verbos intransitivos,
poder ser atribudo o nominativo ou oabsolutivo, a ocorrncia de um
ou outro Caso depender das escolhasparamtricas de cada lngua.
Tomando por base a proposta de Laka (1993) eBobaljik (1993),
assumiremos que Caso nominativo corresponde ao ergativoe o Caso
acusativo, ao absolutivo. Em consonncia com esta abordagem:
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DUARTE; GARCIA 236
(...) ergative and nominative are two different names for the
Caseassigned in the SPEC of Agr1 [i.e. AGRSP] (...) and
absolutive/accusative both refer to the Case assigned in the SPEC
of AGR2 [i.e.AGROP](...)
Uma maneira de adaptarmos a proposta acima estrutura da orao
emque se eliminam a projees AGRSP e AGROP no mecanismo de verificao
dotrao de Caso considerarmos que as duas categorias responsveis
pelaatribuio dos Caso nominativo/ergativo e acusativo/absolutivo so
TP e vP,respectivamente. Para facilitar nossa exposio, rotularemos
o Caso nominativo/ergativo atribudo por TP de C1 e o Caso
acusativo/absolutivo atribudo porvP de C2, conforme mostramos pela
configurao sinttica abaixo:
(53) TPeiC1 T ei vP ei C2 v ei v ei vo VP ei
V
Levando-se em considerao que o parmetro de natureza binria e
quepode ativar os Casos C1nominativo ou C2absolutivo nos predicados
monoargumentais,proporemos que o acionamento do Caso estrutural ao
sujeito (S) pode resultarnas seguintes possibilidades
tipolgicas:
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jun./dez. 2006 237
PARMETRO OBRIGATRIO DE CASO
LNGUAS NOMINATIVAS
(54) Se C1nominativo estiver ativo(a) Vtransitivo (C1nom,
C2acc)(b) Vintransitivo (C1nom)
LNGUAS ERGATIVAS
(55) Se C2absolutivo estiver ativo
(a) Vtransitivo (C1erg, C2abs)(b) Vintransitivo (C2abs)
Exemplos de lnguas que acionam positivamente a escolha
paramtricaem (54) e que alinham (S) com (A) so o Ingls e o Latim,
conforme os dadosem (56a-c) e (57a-c). Notem que, em (57a-c), o
Caso nominativo dos sujeitosde transitivos e intransitivos atribudo
pelo ncleo finito To, o que se evidencia,por exemplo, pela
concordncia morfolgica sujeito-verbo no Latim. Almdisso, observa-se
que o sistema de atribuio de Caso nessas lnguas noreflete a distino
semntica entre verbos inacusativos e inergativos.
(56a) SheC1 saw her C2.(56b) She C1 fell.(56c) She C1
laughed.
(57a) Mullier C1 mulierem C2 vide.(57b) Mullier C1 cade.(57c)
Mullier C1 ride.
J, no Inuit (cf. Bobaljik 1993), que uma lngua ergativa, o
sujeito doverbo transitivo recebe o Caso ergativo, i.e. C1, e o
sujeito do verbointransitivo recebe o Caso absolutivo, i.e. C2, o
mesmo que marca o objetodo verbo transitivo. Veja que essa marcao
casual dos argumentos nitidamentecontrasta com o paradigma exposto
em (56) e (57) acima.
-
DUARTE; GARCIA 238
(58a) Jaani-upC1 natsiqC2 kapi-jaNaJaani-ERG seal
stab-TRANSJaani stabbed a seal.
(58b) inukC2 tikit-tuqperson-ABS arrivedThe person arrived.
(58c) ilinniaqtitsiji C2 uqaq-tuqteacher-ABS spokeThe teacher
spoke.
Em sntese, v-se que as lnguas que acionam o sistema
nominativoatribuem C1 ao sujeito do verbo intransitivo. Esta
atribuio ocorre numaposio funcional mais alta, i.e., em SPEC-TP.
Alm disso, s fazem uso daposio de atribuio de C2 na posio mais
baixa quando existem dois DPsrequerendo Caso, ou seja, em contextos
de predicados transitivos. J aslnguas ergativas atribuem C2 ao
sujeito do verbo intransitivo na posiofuncional mais baixa, i.e.,
em SPEC-vP, que a mesma posio estrutural emque o objeto recebe Caso
(absolutivo) e C1 (=Caso ergativo) ao sujeito doverbo transitivo na
posio funcional mais alta, i.e., em SPEC-TP.
A questo que se coloca para nossa anlise como conciliar
oParmetro de Caso Obrigatrio ao sistema cindido de marcao de Caso
doKaapor, em que a atribuio de Caso ao sujeito do verbo
monoargumentaldepende (i) da natureza semntica do predicado
(estativo); (ii) do papel temticodo DP e (iii) da concordncia
morfolgica visvel entre o sujeito e o verbo,conforme esquematizado
no quadro em (37), repetido a seguir como (59):
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Rev. Est. Ling., Belo Horizonte, v. 14, n. 2, p. 215-255,
jun./dez. 2006 239
(59)Sistema cindido de codificao dos argumentos em Kaapor
A
Caso Nominativo {Sa
Oke Caso Absolutivo
}Soke Caso Absolutivo
Para explicarmos a ciso na atribuio do Caso a (Sa) e (So) dos
verbosintransitivos da lngua Kaapor, proporemos alargar a gama de
possibilidadestipolgicas previstas pelo Parmetro Obrigatrio de
Caso. Assim, alm daspossibilidades em (54) e (55), teremos uma
outra em que C1 e C2 podem seracionados simultaneamente, resultando
na ciso em (59), conforme expomosem (60).
PARMETRO OBRIGATRIO DE CASO
LNGUAS COM CISO NA ATRIBUIO DE CASO A (SA) E (SO)
(60) Se C1nominativo e C2acusativo/absolutivo so ativos
(a) Vtransitivo (C1nom, C2abs)(b) Vinergativo (C1nom)(b)
Vinacusativo (C2abs)
A alternativa que existe a de que lnguas com sistema cindido
exibemuma possibilidade tipolgica no prevista em (54) e (55), visto
que acionamSPEC-TP para atribuir C1 ao sujeito dos verbos
transitivos, inergativos einacusativo e SPEC-vP para atribuir C2 ao
sujeito dos verbos estativos e aoobjeto do transitivo, situao que,
na lngua Kaapor, fica particularmenteevidenciada em virtude da
ocorrncia da partcula encltica [.ke] a DPs que
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DUARTE; GARCIA 240
recebem o papel theta [+AFETADO/PACIENTE] e pela alternncia
entre concordncianominativa e absolutiva, conforme mostram os
exemplos repetidos abaixo:
(61) CristinaC1 ihe ) O-jiwa ke C2 O-pyhyk (Caldas,
2001:22)Cristina meu POSS-brao ABS 3-segurarCristina segura meu
brao
(62) arauxu C1 O-ahem uhu (Kakumasu, J. 1986:331)Arajo 3-gritar
muitoArajo gritou muito
(63) Anai kei C2absolutivo hi-e) y (Caldas, 2001:26)Ana ABS
ABS-ter cansao PERF.1Ana j cansou
Uma questo fica em aberto: como pode ser que os verbos
intransitivospossam atribuir Caso absolutivo/acusativo, conforme se
nota em (63), tendoem vista a generalizao de Burzio, segundo a
qual:
a verb may only assign object Case to its complement if it
assignsa theta-role to its agent. Expressed in terms of structural
relations,this implies that a verb can only assign Case to its
complement if itassigns a theta-role to its specifier () [cf.
Holmer, (2001:9)]
No entanto, dados das lnguas que acionam o sistema ergativo,
comoo Inuit, e o sistema cindido, como o Kaapor, mostram claramente
que oschamados verbos inacusativos podem sim atribuir Caso
estrutural ao seucomplemento, contrariando assim a predio elaborada
por Burzio (1986). Talfato pode ser observado pelos dados em (58) e
(63). Uma maneira decontornarmos essa questo pode ser encontrada se
propusermos, ento, quea generalizao de Burzio (ibid) vlida apenas
para as lnguas nominativas.Essa opo nos permite, por sua vez,
propor que as lnguas, dependendo decomo o Parmetro de Caso
acionado, podem ser agrupadas em dois grandessubtipos, a saber:
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Rev. Est. Ling., Belo Horizonte, v. 14, n. 2, p. 215-255,
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(64) TIPO 1
Lnguas acusativasGeneralizao de Burzio se aplicaC1nominativo
acionado como o Caso do sujeito do verbo intranstivoSPEC-TP
licenciado possvel a voz passiva
(65) TIPO 2
Lnguas ergativas e cindidasGeneralizao de Burzio no se
aplicaC1nominativo ou C2acusativo/absolutivo podem ser acionados
como o Caso dosujeito dos verbos intransitivosSPEC-vP licenciado
possvel a formao de antipassivas
Uma ltima questo que fica em aberto em nossa anlise saber qual
exatamente a posio estrutural que o DP sujeito de verbos
inacusativos emKaapor recebe Caso. A hiptese que desenvolvemos a de
que essa posiocorresponde a Spec-TP, e no a Spec-vP, apesar de a
partcula [.ke] vir juntoaos DPs sujeitos dos inacusativos, conforme
sugere o exemplo (1), repetidoabaixo como (66).
(66) ihe ) ke a-ar (Silva, 2001:47)eu ABS eu-cairEu caio
Essa hiptese muito semelhante anlise desenvolvida por
Aldridge(2005:1-4), segundo a qual, em lnguas ergativas, o Caso
absolutivo pode serchecado pelos ncleos vo ou To, o que depender da
transitividade dopredicado. Nessa linha de raciocnio, a autora
levanta vrias evidncias de que,na lngua Tagalog, o ncleo vo de
predicados transitivos possui trao EPP forte,o que explicar o
movimento longo do DP objeto para o sistema CP, emperguntas
tipo-qu. No curso do movimento cclico para Spec-CP, o objetodireto
verifica o Caso absolutivo em Spec-vP. J, em predicados
intransitivos,vP no possui trao EPP forte e tambm no licencia
verificao do Casoabsolutivo ao sujeito, visto que o ncleo com trao
de Caso estrutural a ser
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DUARTE; GARCIA 242
atribudo To. As evidncias empricas apuradas a partir da atribuio
de Casoaos argumentos nucleares em Tagalog conduziram Aldridge
(ibid) a tomar umadireo oposta em relao ao que Murasugi (1992),
Bittner e Hale (1996) eUra (2000) assumem no mbito do programa
minimalista, segundo a autora:
absolutive Case is checked by either v or T, depending on
thetransitivity of the verb. This is a clear departure from
traditionalapproaches to syntactic ergativity (..) under which
absolutive isequated with nominative. The position taken by this
paper is thatabsolutive DPs do not necessarily have the properties
of subject() absolutives in transitive clauses, which check their
case withv, function more like objects than subjects, while
external arguments,regardless of whether they have absolutive or
ergative case, behavemore like subjects.
Tomando por base a teoria desenvolvida por Aldridge (2005),
assumiremosento que vo
, em predicados inacusativos, no Kaapor, no entra na derivao
com trao-EPP forte e nem possui trao de Caso estrutural
(=absolutivo) aatribuir ao seu sujeito (i.e. ao argumento interno,
gerado em Spec-VP). Nessesentido, o ncleo que disponibilizar esse
Caso ser To, e no vo. Uma forteevidncia a favor dessa anlise surge
do fato de que os sujeitos dos inacusativos,diferentemente dos
sujeitos dos verbos estativos/descritivos, no engatilhama
concordncia sujeito-verbo por meio dos prefixos
relacionais/absolutivos,mas, ao contrrio, acionam somente a srie
dos prefixos pessoais nominativos.Por isso, a configurao abaixo
indica que o local de verificao do Casoestrutural ao sujeito do
verbo inacusativo idntica ao ponto na estrutura emque o sujeito dos
verbos inergativos verifica o Caso estrutural. Nossa hiptese que
esta posio corresponde a Spec-TP, conforme a seguir.
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Rev. Est. Ling., Belo Horizonte, v. 14, n. 2, p. 215-255,
jun./dez. 2006 243
(67)
TPeiC1 T ei To vP [+C1absolutivo] | v ei vo VP ei
Vo DPke
Veja que a proposta acima est em consonncia com a teoria
desenvolvidapor Alexiadou e Anagnostopoulou15 (2001:211) segundo a
qual os Casosnominativo e acusativo, por um lado, e ergativo e
absolutivo, por outro, podemser tratados formalmente como sendo
idnticos, a diferena entre um e outroresidir apenas no fato de onde
eles so licenciados na sentena. Nesse sentido,o que os dados do
Kaapor e de outras lnguas ergativas (cindidas) sugerem que o Caso
absolutivo pode ser atribudo tanto pelos ncleos vo quanto
pelosncleos To
, dependendo da natureza do predicado. Assim sendo, termos
como
nominativo, absolutivo, acusativo, ergativo etc. seriam apenas
rtulosdescritivos. O que devemos considerar a posio na estrutura em
que o Casoestrutural dos DPs sujeito e objeto licenciado.
5. CONSIDERAES FINAIS5. CONSIDERAES FINAIS5. CONSIDERAES
FINAIS5. CONSIDERAES FINAIS5. CONSIDERAES FINAIS
Neste texto, mostramos que a lngua Kaapor possui um sistema de
casocindido que se caracteriza pela natureza semntica dos
predicados e pelanatureza semntica dos DPs. Com relao primeira,
pde-se verificar queos predicados descritivos/estativos acionam
prefixos absolutivos, enquantoos predicados inacusativos,
inergativos e transitivos acionam os prefixosnominativos. A ciso de
caso pela natureza semntica dos DPs se realiza pormeio da partcula
encltica [.ke] que tem a funo gramatical de realizar o papeltemtico
[+AFETADO/+PACIENTE] e caso estrutural. DPs sujeitos de
predicados
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DUARTE; GARCIA 244
descritivos/estativos, inacusativos e objetos de predicados
transitivos seromarcados com a partcula [.ke]. J DPs sujeitos de
predicados inergativos etransitivos no recebem a partcula [.ke]
sinalizando, por meio dessealinhamento, o caso nominativo. A ciso
no sistema de caso por meio danatureza semntica dos DPs
permitiu-nos, adicionalmente, distinguir ospredicados
monoargumentais em duas classes: os descritivos e inacusativos,por
um lado, e os inergativos, por outro. Tal ciso no determinada
pelanatureza semntica dos predicados, mas, ao contrrio, tem por
base o papeltemtico que o nico argumento do verbo intransitivo
(Sa/So) recebe.
Tambm verificamos que a alternncia causativa nos permite propor
aexistncia de, pelo menos, cinco subclasses de verbos, a saber: (i)
descritivos/estativos; (ii) inacusativos; (iii) inergativos; (iv)
transitivos simples (direto eindireto) e (v) ergativos. Vejam que
essas subdivises sugerem que a distinotradicional entre transitivos
e intransitivos no agrega a possibilidade tipolgicade uma distino
mais detalhada entre verbos intransitivos. Esta propostaproporciona
uma anlise mais refinada dos vrios subtipos de verbos na
lnguaKaapor.
E por fim, considerando a proposta de Laka (1993) e Bobaljik
(1993),propusemos alargar o Parmetro de atribuio de Caso de modo a
dar contade lnguas que acionam ciso no sistema de caso como o
Kaapor. Nossaproposta que, nessas lnguas, existe uma terceira
escolha paramtrica, a saber:o Caso do sujeito do verbo inergativo e
inacusativo licenciado em SPEC-TPe o Caso do sujeito do verbo
estativo atribudo em SPEC-vP, a mesma posioem que o objeto recebe
Caso estrutural. Por fim, entretivemos a idia de
queergativo/nominativo e acusativo/absolutivos so, ao final das
contas, diferentesnomes para o mesmo fenmeno: o primeiro conjunto
so nomes do Casoatribudo pelo ncleo To; o segundo so os nomes do
Caso transmitido peloncleo vo.
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Rev. Est. Ling., Belo Horizonte, v. 14, n. 2, p. 215-255,
jun./dez. 2006 245
NONONONONOTTTTTASASASASAS
1 A lngua Kaapor pertence ao ramo VIII da famlia Tupi-Guarani
juntamentecom o Takunyap, Wayampi, Wayampipuk, Emrillon, Amanay,
Anamb,Turiwra, Guaj (cf. Rodrigues, 1985). Atualmente, os ndios
Kaapor vivem nadivisa dos Estados do Par e do Maranho. Estima-se
que na regio hajaaproximadamente 1.000 ndios distribudos em onze
aldeias, a saber:
(1) Xie pyhun r-endacuri preto GEN-lugarLugar do curi preto
(2) Parakuy r-endaparacu GEN-lugarLugar da Paracu
(3) Pakury-y r-endabacuri-rvore GEN-lugarLugar do
bacurizeiro
(4) Urutawy r-enda coruja GEN-lugarLugar da Coruja
(5) ximbo r-endaximbo GEN-lugarLugar do ximb
(6) waxi ngy r-endauaxingui GEN-lugarLugar do uaxingui
(7) arasa-ty r-endaarasa-plantao GEN-lugarLugar da plantao de
arasa
(8) pykya-y r-endapiqu-rvore GEN-lugarLugar da rvore do Piqu
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DUARTE; GARCIA 246
(9) kumaru-y r-endacumaru-rvore GEN-lugarLugar da rvore
Cumaru
(10) jatahuty r-endababau GEN-lugarLugar do Babau
(11) xixindustio novoStio Novo
2 As oraes analisadas foram coletadas dos estudos elaborados por
Kakumasu,J (1986); Corra da Silva (1997); Kakumasu, J. e Kakumasu,
K. (1990), Silva(2001) e Caldas (2001). Em Kakumasu (1986),
encontra-se uma proposta dedescrio da lngua Kaapor baseado nas
narrativas coletadas pelo autor. Otrabalho de Corra da Silva (1997)
trata de uma descrio diacrnica da lnguaKaapor comparando esta com
as lnguas Temb, Wayamp, Tupinamb e aLngua Geral Amaznica. O
trabalho de Kakumasu, J. & Kakumasu, K. (1990)contm quinze
narrativas indgenas que foram transcritas na dcada de 60 na
aldeiagua Preta. Mais especificamente, as transcries foram
documentadas nos anosde 1962 a 1965 e 1967. Os trabalhos de Caldas
(2001) e Silva (2001) constituem-se numa descrio geral das classes
verbais e dos morfemas de aspecto e modoem Kaapor. O corpus das
pesquisas de Caldas (2001) e Silva (2001) estobaseados em 62 horas
de gravao com palavras, sentenas isoladas, narrativasindgenas,
msicas cantadas e conversas espontneas entre os ndios Kaapor.
3 No mbito da literatura gerativista, distinguem-se duas classes
de verbosmonoargumentais: os inacusativos e os inergativos.. Em
consonncia com Levine Rappaport (1995:3): an unergative verb takes
a D-structure subject and noobject, whereas an unaccusative verb
takes a D-structure object, be it clausal
or a simple NP and no subject.
4 H uma alternncia morfofonolgica nos prefixos absolutivos.
Quando o prefixopreceder uma raiz verbal iniciada por consoante,
ento teremos os prefixos zero{O-} e {i-}. J em razes iniciadas por
vogal, teremos os prefixos {r-} e {h-}.5 Em Tenetehra, os prefixos
{i- ~ h-} podem denotar inclusive a elevao deDPs objetos para a
posio de foco contrastivo, como se v pelos exemplosabaixo, retirado
de Duarte (2005:18).
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(ia) w-exak Fbio Mrcia3-ver Fbio MrciaFabio viu a Mrcia
(ib) upaw Mrcia Fbio h-exak OOOOOtoda Mrcia Fbio ABS-ver-
DESLOCTODA A MRCIA, Fabio viu[lit: viu-a por inteiro,
integralmente, e no parcialmente]
(iia) u-u teko pira3-comer a gente peixeA gente come peixe
(iib) upaw pira teko i-u-ntodo peixe a gente ABS-comer-DESLTODO
O PEIXE, a gente come.
6 A lngua Guarani exibe uma ciso muito semelhante ao do Kaapor,
visto que aclasse de verbos estativo/descritivos, denominados por
Gregorez e Surez deverbos de qualidade (=quality verbs), tambm
tomam os prefixos absolutivos.Conforme Dixon (1979:83):
quality verbs (.....) take prefixes that are almost identical to
objectprefixes on transitive verbs. Most quality verbs would
correspond toadjectives in other languages, although the classe
does contain remember,forget, tell a lie, and weep.
7 Vejam o que afirma Kakumasu em relao ao escopo
sinttico-semntico dapartcula [.ke]:
The morpheme ke normally follows a noun or a noun phrase,
includingpronouns and demonstratives (....) In transitive clauses
where two nominalsoccur, one of them may be marked with ke to
indicate that the markedone is the object, that is the one to whom
the action is done. (Kakumasu,1986:350-351)
Object marking is no, however, the only function of ke. It can
occur withthe subject nominal of intransitive (.....) (Kakumasu,
1986:137-138)
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DUARTE; GARCIA 248
8 Conforme Duarte (2005:2), podemos afirmar que a categoria de
Caso no uma propriedade privativa das lnguas que a exibem na
morfologia, como asituao do Latim, do Grego, do Alemo, do Russo,
dentre outras lnguas.Chomsky (1981a) incorpora a noo tradicional de
Caso teoria gerativa e postulaque a marcao de Caso nos NPs deve ser
entendida como um princpio universalda Gramtica. Para Chomsky,
todos os NPs foneticamente realizados precisamreceber Caso abstrato
na sintaxe, o qual pode ou no receber manifestaofonolgica, o que
depender das propriedades morfossintticas das lnguasparticulares.
Assim sendo, a diferena entre o Latim e o Portugus deve-se aofato
de haver ou no a realizao de Caso no componente morfolgico.9 Nas
pesquisas da rea da sintaxe e semntica, h dois sentidos para o
termoergativo. Um dos significados tem a ver com o caso ergativo
que os DPs agentesassumem nos sistemas de caso ergativo-absolutivo.
Nesse sistema, a lngua trataos argumentos sujeito de verbo
intransitivo (S) da mesma forma que o objeto deverbo transitivo (O)
codificando, assim, o caso absolutivo, e diferencia o sujeitoagente
de verbos transitivos (A), o qual recebe o caso ergativo (cf.
Dixon, 1979,1994; Comrie, 1981; Seki, 2000; Whaley, 1997). J no
segundo significado, otermo ergativo faz referncia aos verbos
transitivos que alternam a sua valncia,possuindo ora uma configurao
didica ora uma configurao mondica(=inacusativa), exemplos (i) O sol
secou a madeira e (ii) A madeira secou. Nessaalternncia da valncia,
h o rearranjo de argumentos nucleares, de maneira queo sujeito (S)
do verbo intransitivo secar passa a ocupar a posio de objeto (O)do
verbo transitivo. Esse rearranjo lembra a marcao de caso ergativo
apontadopor Lyons (1968:352), conforme citao abaixo:
...the term that is generally employed by linguists for the
syntacticrelationship that holds between (1) The stone moved and
(3) John movedthe stone is ergative: the subject of an intransitive
verb becomes theobject of a corresponding transitive verb, and a
new ergative subject isintroduced as agent (or cause) of the action
referred to. This suggeststhat a transitive sentence, like (3), may
be derived syntactically from anintransitive sentence, like (1), by
means of an ergative, or causativetransformation.
10 Em geral, o prefixo causativo {mu-} torna-se {m-} diante de
vogais:/mu/ /m-/ /
______ [ +VOGAL ]
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11 Para a classificao dos Papis Temticos, adotamos as propostas
de Canado& Ciraco (2005) e Canado (2005) que consideram os
papis temticos comoum grupo de propriedades semnticas derivadas.
Segundo as autoras, os papistemticos no so noes primitivas, mas se
definem como o grupo de
propriedades atribudas a um determinado argumento a partir
dos
acarretamentos estabelecidos por toda proposio na qual esse
argumento se
encontra. (Canado & Ciraco, 2005:8). Algumas propriedades
semnticas dospapis temticos estabelecidas por Canado (2005) so:
(i) controle est associada a capacidade de se interromper uma
ao,um processo ou um estado:
(a) Joo quebrou o vaso Joo contm a propriedade de controle;
(ii) desencadeador faz referncia ao argumento que desencadeia
oevento:
(a) Joo quebrou a janela Joo tem as propriedades de controle
edesencadeador;
(b) Joo quebrou o vaso com o empurro que levou do irmo Joo tem a
propriedade de desencadeador;
(iii) Afetado corresponde mudana de estado:
(c) Joo matou seu colega colega possui a propriedade de
afetado;(d) Joo recebeu uma herana Joo possui as propriedades
de
controle e afetado;
(iv) Estativo definida por no alterar as caractersticas do
argumentonum intervalo de tempo:
(f) Joo leu um livro livro contm a propriedade de estativo
12 Kakumasu (1986:327) considera que a ordem predominante nas
sentenas SOV: I now consider SOV to be the basic word order in the
transitive clause,not OSV as in Kakumasu (1976). In the least
marked clauses which have both
subject and object nominals, the most frequent order is SOV.
13 Consoante Hale e Keyser (1993:16), unaccusatives are simply
composite1p-dyadic verbs. The specifier, whose projection is a
defining feature of the
composite dyadic argument structure configuration, corresponds
to the internal
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DUARTE; GARCIA 250
argument (....) It is a specifier, not a complement; it appears
as an object
only in appropriate sentential syntactic uses of the transitive
alternant.
14 No italiano, Guasti (1997) aponta que predicados ergativos so
formados pelagramaticalizao do verbo lexical ao verbo causativo
fare, constituindo assimuma unidade morfossinttica. Esta unidade
entre o verbo causativo e o verbolexical no pode ser quebrada.
Dentre as evidncias que demonstram a unidadeentre os dois verbos, a
autora destaca os seguintes exemplos:
(a) Em predicados ergativos, o DP interno, o qual gerado na
posiode especificador do verbo lexical, sempre ocorre na posio
ps-verbal:
(ia) Elena fa lavorare Gianni
(ib) *Elena fa Gianni lavorareElena fez Gianni trabalhar
(iia) Il tren ha fatto arrivare Gianni in ritardo
(iib) *Il tren ha fatto Gianni arrivare in ritardoO trem fez
Gianni chegar tarde
(b) Em predicados ergativos, clticos ocorrem sempre em prclise
aoverbo causativo, conforme (iiia); enquanto, em predicados
noergativos, a ocorrncia do cltico em nclise ao verbo
lexical,conforme (ivb)
(iiia) Elena la fa ripare a Gianni
(iiib) *Elena fa riparela a GianniElena consertou o carro para
Gianni
(iva) Gianni promise di leggere il libro
(ivb) Gianni promise di leggerloGianni prometeu ler o livro
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(c) Em predicados ergativos na forma passiva, o DP interno
move-separa a posio de sujeito do verbo causativo:
(va) La machinai stata fatta riparare ti a GianniO carro est
sendo consertado por Gianni
15 Consoante Alexiadou e Anagnostopoulou (2001:211):
there is no nominative Case feature distinct from an accusative
Casefeature. There is just a Case feature on v and a Case feature
on T. Thetwo featues are identical for the computational system
(....). They comeout differently in the morphological component,
which spells outaccusative on the DP relating to the lower feature
in opposition to theDP relating to the higher feature by virtue of
the fact that accusative isa dependent case downward in accordance
with a case realizationhierarchy suggested by Marantz (1992).
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APNDICE
1. ABREVIATURASABS: caso absolutivo; AGR: agreement (concordncia
nmero-pessoa); AUX: verboauxiliar; CAUS: morfema causativo; IMIN:
iminente; INT: inteno; NOML:nominalizador; NEG: partcula de negao;
PERF1: perfectivo de no-exclusividade;PL: partcula de plural; PROB:
probabilidade; POSP: posposio, OBL: caso oblquo;POSS: prefixo que
indica o possuidor; REL: relativizador; REP: repetio;
TRANS:transitividade; VER: verdadeiro, genuno;
2. ORTOGRAFIA USADAConsiderando o padro fonmico dos sons da
lngua Kaapor, adotamos a seguinteortografia cujo objetivo principal
facilitar a leitura dos dados usados em nossaanlise. Os grafemas
so:
(i) consoantes: p, t, k, kw, , m, n, ng, ngw, s, x, h, r, w,
j
(ii) vogais: (a) orais: i, y, e, a, o, u; (b) nasais: i), y), e
), , , u)
Os grafemas kw, ng, ngw, x, y, correspondem respectivamente aos
seguintesfonemas: kw oclusiva velar no-vozeada labial /kw/; ng
nasal velar vozeada/N/; ngw nasal velar labial vozeada /Nw/; x
fricativa alveo-palatal /S/; y vogal oral alta central oral //; y)
- vogal nasal alta central / )/ e o diacrtico oclusiva glotal
no-vozeada ///.