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7/23/2019 Enfermagem Pre Hospitalar - Afirmacao Profissional 2012 Tese
O exercício profissional dos enfermeiros na actividade pré-hospitalar tem respondido ao
benefício da intervenção clínica precoce como forma de garantir a excelência de
cuidados e a prática de acordo com a evidência neste domínio. No entanto, a dificuldade
em afirmar a diferenciação do seu exercício neste contexto permanece até hoje, sendo
até conhecida alguma contestação social interna e externa à profissão. O facto de ser um
âmbito inexplorado, pouco conhecido e esclarecido, motivou a realização deste trabalho
com o objectivo de analisar em contexto, como é percebido o exercício pré-hospitalardos e pelos enfermeiros.
Realizámos um trabalho de campo de cariz qualitativo, com recurso à “Grounded
Theory”, de acordo com Strauss e Corbin, tendo como fontes de dados entrevistas não
estruturadas a 12 enfermeiros, a observação participante, a experiência da investigadora,
a legislação e 12 testemunhos de enfermeiros na Suécia, França e Espanha.
Da análise emergiu o conceito central: Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar:Esforço Contínuo de Afirmação Profissional. O contexto pré-hospitalar caracteriza-se
por especificidades próprias, como a pluridisciplinaridade da intervenção, a abrangência
pluripatológica em todo o ciclo vital e a diversidade dos espaços de trabalho.
A este conceito associam-se factores mediadores, como por exemplo a formação
académica, a experiência profissional, a evolução da prática pré-hospitalar e a
comparação com outros contextos internacionais, factores cuja ambiguidade determina
maior complexidade e empenhamento profissional.
Como causas para o maior esforço para se afirmarem profissionalmente, os enfermeiros
identificam, as lacunas na formação específica, as indefinições na regulação da
actividade, entre outras.
Surgem várias estratégias de reforço interno, como a procura da formação, o trabalho de
equipa e a prestação de cuidados globais que diferenciam o cuidar dos enfermeiros.
Associam-se ao fenómeno várias consequências, positivas e menos positivas ao nível
dos três vectores de intervenção: os doentes que têm acesso precoce aos cuidados
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The professional activity of nurses in pre-hospital has responded to the clinical benefits
of early intervention in order to guarantee the excellence in care and practice in
accordance with the evidence in this area. However, the difficulty in the differentiation
of its use in this context remains up to this day, being known even a certain social
protest inside and outside the profession. The fact of being an unexplored field, not
much known and understood, motivated this work with the aim of analyzing in context,
how the practice of pre-hospital of and by nurses is understood.
We conducted a field study of qualitative nature, using the “Grounded Theory”,
according to Strauss and Corbin, having as data sources semi-structured interviews with
12 nurses, participant observation, the experience of the researcher, legislation and 12
testimonies of nurses in Sweden, France and Spain.
From the analysis the central concept has emerged: Practice of Pre-Hospital Nursing:
Continuous Effort of Professional Claim. The pre-hospital context is characterized byspecific features, such as multidisciplinary intervention, pluripathological coverage
throughout the entire life cycle and the diversity of work places.
To this concept mediator factors are associated, such as educational background,
professional experience, the evolution of pre-hospital practice and comparison with
other international contexts, factors which ambiguity determine a greater complexity
and professional commitment.
As causes for the increasing effort for professional affirmation, nurses identify gaps in
specific areas, uncertainties in the regulation of activity, among others.
Several strategies of internal reinforcement arise, such as a search for training,
teamwork and global care which is what distinguishes nurses’ care.
Several consequences are associated to the phenomenon, positive and less positive, in
terms of 3 areas of intervention: patients who have early access to special care, nurses
who demonstrate professional development, but also feel frustrated with the
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uncertainties in the activity; the system/organization that wins care differentiation but
doesn’t take advantage of the resources.
It is concluded that the effort of nurses´ professional affirmation in this area is madethrough their skills, technical, scientific, ethical, help for the relationship and by its
belief in the ability and need for intervention in this area.
Based on the results, we understand that in this structure there is some resistance to
nurses’ professional affirmation, co-sustained by some conditions which did not benefit
from effective strategies.
These assumptions allowed us some conceptualization of nurses´ pre-hospital practice,
and present some suggestions of work and research, convinced that a better
understanding of this process will help define this activity fully and in an assertive way.
Keywords: nursing, pre-hospital, professional practice
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L´exercice professionnel des infirmiers en pré- hospitalier a répondu à l’avantage d´une
intervention clinique précoce afin de garantir l’excellence des soins infirmiers et la
pratique en conformité avec les découvertes dans ce domaine. Cependant, la difficulté
d’affirmer la différenciation de son exercice dans ce contexte, continu jusqu’à
maintenant réel, ayant même connu une certaine protestation social a l’interieur et á
l’exterieur de la profession. Le fait qu’il s’agit d’un domaine inexploré, trés peu connu
et compris, a motivé ce travail dans le but d’analyser dans son contexte comment est perçu l’exercice pré-hospitalier des et para les infirmiers. Nous avons mené une etude
sur le terrain de nature qualititative, en utilisant “Grounded Theory” selon Strauss et
Corbin, ayant comme référence les interviews semi-structurées de 12 infirmiers,
l’observation participante, l‘experience du chercheur, la legislation et 12 témoignages
d’infirmiers en Suede, en France et en Espagne.
De l‘analyse a émergé le concept central: La Pratique d’Infirmier en Pré-
Hospitalier: Èffort Continu d’Affirmation Professionnelle. Le contexte pré-
hospitalier est caracterisé para des traits spécifiques tels que l’intervention
multidisciplinaire, la couverture pluripatologique tout au long du cycle de vie et la
diversité des espaces de travail.
A ce concept s’associent des facteurs mediateurs, tels que la formation scolaire,
l’experience professionnelle, l’évolution de la pratique pré-hospitalière et la
comparaison avec d‘autres contextes internationaux, facteurs dont l’ambiguites
détermine une plus grande complexité et engagement professionnel.
Comme causes de l‘augmentation de l’éffort d‘affirmation professionnelle, les
infirmiers identifient, les lacunes dans la formation spécifique, les incertitudes en
relation á la régulation de l‘activité professionnelle, entre autres.
Aparaissent plusieurs stratégies, comme la recherche de formation, le travail d’équipe et
la pratique de la prise en charge globale qui permettent de distinguer les soins
infirmiers.
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S’associe à ce phénomène plusieurs conséquences, positives et moins positives au
niveau de trois domaines d’intervention: les patients qui ont l’accés précoce aux soins
specifique; aux infirmiers qui font preuves de perfectionnement professionnel, mais qui
ressentent aussi une certaine frustration face aux incertitudes de l activité; le
systeme/organisation qui gagne la différenciation du secours, mais aussi qui néglige les
compétences.
On conclu que l’éffort d’affirmation professionnelle des infirmiers dans ce domaine se
fait gràce a ses compétences, techniques, scientifiques, éthique, d’aide pour la relation et
par sa croyance en la capacité et le nécessite de l’intervention dans ce domaine.
Sur la base de ces résultats, nous comprenons que dans cette structure il existe desrésistances à l'affirmation professionnelle des infirmières, étayée par un certain nombre
de conditions qui n'ont pas reçu des stratégies efficaces.
Ces hypotéses nous ont permis une certaine conceptualisation de l’exercice pré -
hospitalier des infirmiers, et de présenter certaines suggestions de travail et de
recherche, convaincus qu’une meilleur compréhension de ce processus aidera à une
définition plus assertive et complète de cette activité.
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A intervenção de profissionais de saúde fora do âmbito hospitalar é cada vez mais uma
realidade no nosso país e no mundo. A actividade pré-hospitalar está enraizada na
história das Profissões de Saúde, desde os primórdios, desenvolveu-se cruzando ao
longo dos tempos cataclismos e catástrofes, como as guerras, as pestes, e as fomes, para
chegar aos nossos dias preocupando-se verdadeiramente com a Urgência Individual e
mais recentemente com a Urgência Colectiva Civil, uma vez que a Urgência Colectiva
Militar foi buscar a sua organização e estrutura ao tempo das Campanhas Napoleónicas
(Bandeira, 2008).
Se quisermos fazer um pequeno percurso cronológico por alguns dos marcos históricos
da intervenção pré-hospitalar, é inevitável começar pela actividade militar. São
precisamente as Campanhas Napoleónicas, que evidenciam a importância de acções
precoces e céleres no tratamento de feridos de guerra imediatamente no campo de
batalha. O Barão Dominique Larrey, é talvez a primeira grande referência histórica da
moderna organização da assistência médica urgente, cirurgião militar nestas campanhas,
criou o conceito de ambulâncias volantes, que levavam cirurgiões e outro pessoal
sanitário até ao campo de batalha, para resgatar e realizar cirurgia de controlo de danos
imediatamente aos estropiados de guerra (Giroud, 2006; Bandeira, 2008).
Prosseguindo neste percurso, é interessante verificar que a primeira alusão à
Enfermagem Pré-hospitalar, se pode confundir com a própria História da Enfermagem.
Na Guerra da Crimeia inicialmente as “Filles de Charité” da Ordem de São Vicente de
Paulo, foram integradas nos hospitais militares por um Regulamento dos Serviços de
Saúde Francês de 1865, embora desde há muito acompanhassem as ambulâncias do
Exército nos campos de batalha (Bandeira, 2008, parafraseando Guillermand, 1988). É
ainda na Guerra da Crimeia que a fiel depositária do epíteto da “maternidade” daenfermagem moderna Florence Nithingale, dá visibilidade a esta profissão,
desembarcando na Turquia com mais 38 enfermeiras Britânicas, perspectivando a
intervenção em campos de batalha e hospitais de campanha (Collière, 1989; Bandeira,
2008).
Bandeira (2008) refere que a evolução da assistência pré-hospitalar, deve muito do seu
desenvolvimento às lições aprendidas em cenários de guerra e de catástrofe, os seus
princípios e regras florescem na América do Norte e na Europa posteriormente àintervenção nas duas Grandes Guerras Mundiais e no Vietname, onde se fomenta o uso
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do transporte aéreo medicalizado de feridos, a triagem e classificação das urgências, a
abordagem sistematizada e o controlo de complicações que colocam de imediato a vida
em perigo.
Rocha et al (2003) corroboram as afirmações anteriores, e referem que, precisamente
durante a II Guerra Mundial se assiste a um importante desenvolvimento da
Enfermagem Norte Americana, com a exigência da remoção de todos os feridos em
aviões de carga, com três leitos cada, assistidos por “ flight nurses”. Os enfermeiros
integravam as Forças Armadas Americanas, quer no Exército, quer na Marinha, com
cerca de 69.000 profissionais, desenvolvendo a sua actividade na frente em Hospitais de
Campanha, nas bases ferroviárias e terrestres.
Posteriormente as Guerras da Coreia (1950) e do Vietname (1962), demonstram que o
uso da evacuação aeromédica do campo de batalha, reduz a mortalidade apesar dos
potentes armamentos utilizados, atribuindo-se o facto ao tratamento precoce definitivo
do ferido, e ao amplo espaço interno do helicóptero Bell 205, que permite o tratamento
das vítimas em trânsito com técnicas de suporte de vida. Na Guerra da Coreia, com a
presença obrigatória do enfermeiro na região de conflito, observa-se o reconhecimento
dos militares às “ flight nurses” que removem aproximadamente 10000 feridos atravésdos helicópteros da Marinha. No Vietname, 5000 enfermeiros integraram as fileiras
Americanas, colaborando na remoção de aproximadamente um milhão de pessoas civis
e militares. Estes profissionais foram os precursores do desenvolvimento do transporte
aeromédico civil Americano, que contemporaneamente conta com mais de 250
programas desta actividade com recurso a enfermeiros (Rocha et al ., 2003).
Ainda no âmbito militar, não podemos também esquecer a nível nacional, a fundamental
intervenção no helitransporte de feridos de guerra das Enfermeiras Paraquedistas
durante a Guerra Colonial em África.
No âmbito civil, segundo Bandeira (2008, p. 51), “a noção de socorros medicalizados é
impulsionada por Cot, médico chefe dos Sapadores Bombeiros de Paris, concretiza-se
de 1924 a 1930 nesta cidade”, Cot cria o Serviço Móvel de Urgência, prefigurando os
actuais Service d’Aide Medical Urgent (SAMU) e centra-se no pensamento de que no
domínio das urgências e acidentes graves:
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É o médico ou a equipa médica que se desloca a caminho do paciente, e não o
paciente que é deslocado de primeira intenção para o hospital;
Os primeiros cuidados no local devem ser prestados rapidamente a fim de
estabilizar a situação patológica;
A transferência para o centro hospitalar só será autorizada após estabilização das
principais funções vitais;
Os cuidados são essencialmente dirigidos à sintomatologia, e baseiam-se em
técnicas que já provaram a sua eficácia em meio hospitalar;
O transporte só deverá ser feito numa ambulância devidamente apetrechada para
esse efeito, sob vigilância médica que prossiga com os cuidados prestados
inicialmente (Bandeira, 2008).
Contudo, este conceito tão actual e vanguardista no tempo, não teve uma repercussão
tão rápida e generalizada como seria desejável no espaço para além da sua origem,
todavia, criou uma “escola” reconhecida internacionalmente nesta área que é a “escola
francesa”, onde muito mais tarde, muitos países foram “beber” princípios e métodos de
trabalho para implementar o SIEM, nomeadamente Portugal.
A actividade pré-hospitalar na assistência da emergência, teve uma evolução rápida nasegunda metade do século XX. Até aos anos 50, quase todas as urgências ou
emergências eram atendidas ao domicílio. Posteriormente, desenvolveu-se a assistência
hospitalar com especialistas, limitando-se a intervenção pré-hospitalar a “carregar o
doente e correr” para o hospital (Rodríguez, Mendoza e Gil, 2003).
Os mesmos autores referem que este conceito começa a mudar de novo, no final dos
anos 60, considera-se o benefício da atenção no local, a estabilização e posterior
transferência assistida por pessoal clínico para o hospital adequado, ou seja o que é
capaz de tratar a patologia que apresenta a pessoa. Esta transferência assistida, exige a
avaliação, tratamento inicial de complicações que possam surgir, e a resolução se
possível. Estabelece-se então um esquema de desenvolvimento de SIEM, sendo a actual
forma de entender a assistência na urgência como a atenção integral.
Este esquema pressupõe uma estrutura com um conjunto de recursos humanos,
materiais e equipamentos, integrados e coordenados para assegurar uma resposta
completa a qualquer emergência. Estão envolvidos os serviços de emergência médica,
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mas também os componentes não médicos que permitem o controlo de uma situação:
bombeiros, agentes de segurança, técnicos de emergência, etc. (Silva, 1984; Rodríguez,
Benito e Peiro, 2003; Leiva, 2005; Giroud, 2006; Bandeira, 2008).
A criação do SAMU Francês na década de 60, os seus princípios e experiência
espevitam o desenvolvimento da emergência médica Europeia (Giroud, 2006). O
imperativo da necessidade de assistência pré-hospitalar medicalizada à comunidade em
Portugal, e a sua responsabilidade, foi sendo alvitrado com frequência nas décadas de
70 e 80, até com alguns projectos que acabaram por não vingar, como foi a tentativa de
implementar em 1981 um SAMU no Hospital Geral de Santo António em protocolo
com o Serviço Nacional de Ambulâncias criado na década de 70. O Serviço de Urgência
desse hospital, dispunha-se a fornecer uma equipa médica e material sempre que se
justificasse a intervenção em situações de acidente ou doença súbita na cidade do Porto
(Bandeira, 2008).
Esta prática, era no entanto comum em muitos hospitais de província, como por
exemplo Faro, estava estabelecido tacitamente, e mesmo em alguns planos de
emergência de estruturas regionais como o do Aeroporto de Faro (1990), que patrulhas
da Brigada de Trânsito da Guarda Nacional Republicana (GNR) se deslocavam aohospital para transportar equipas médicas para o local de acidentes mais graves que
ocorressem.
O início da prática da emergência médica pré-hospitalar, começa a ser referido
oficialmente pela primeira vez modernamente em Portugal por Rocha da Silva (1984, p.
4), explicando que,
“…os Serviços de Urgência Hospitalar devem ser tomados como uma peça fundamental num sistema de saúde pública, não devendo, por isso, alhear-se doque se passa com os doentes da verdadeira urgência antes da sua chegada aohospital. Só o hospital está em condições de dar apoio a esses serviços pré-hospitalares quer através das equipas médicas de reanimação, quer
participando activamente no planeamento dos serviços de urgência a nívelregional”.
Este autor, foi o grande impulsionador da criação do SIEM no nosso país, e o
responsável pela criação do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), no
artigo citado anteriormente, diz a respeito destas estruturas e das urgências hospitalares,
que a sua responsabilidade passa pela formação em emergência médica dos
intervenientes deste processo, para que possam no local do sinistro ou doença súbita,
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realizar uma correcta triagem e conseguir que aos doentes urgentes seja garantido no
menor tempo possível o tratamento mais apropriado à sua situação.
Talvez possamos também dizer, que a primeira referência à Enfermagem Pré-hospitalarcontemporânea em Portugal, é feita por Rocha da Silva numa obra conjunta com
Henriques (1986, p. 16), quando dizem,
“… veículos que actuam na fase pré-hospitalar de um sistema de emergênciamédica (…) devem ser tripuladas por um médico, ou enfermeiro com bonsconhecimentos das técnicas de manutenção da vida, e ter possibilidades dechegar ao local o mais depressa possível. As tripulações devem não só estarbem treinadas nas operações de rotina como ter prática das técnicas deemergência mais avançadas”.
Todos estes pressupostos, princípios, necessidades, motivaram o desenvolvimento da
actividade pré-hospitalar de enfermagem, tanto nas Viaturas Médicas de Emergência e
Reanimação (VMER), nos Helicópteros de Emergência Médica (HEM), como mais
recentemente com a criação do Projecto de Ambulâncias de Suporte Imediato de Vida
(SIV), nas ambulâncias SIV e nas centrais de emergência médica, colocando os
enfermeiros como “actores” nesta intervenção.
Da experiência da investigadora como enfermeira no pré-hospitalar, de mais de oito
anos como operacional de VMER do Hospital de Faro EPE, de mais de um ano como
operacional de helitransporte no HEM 5 do INEM, de mais de seis anos como
formadora externa do INEM na área do pré-hospitalar, ainda da sua percepção como
enfermeira atenta à evolução social da profissão, e também como cidadã interessada nos
cuidados de saúde disponibilizados à comunidade, fica a percepção de que o contexto de
intervenção deste domínio do exercício profissional da enfermagem é ainda,
inexplorado, pouco conhecido e esclarecido.
Neste âmbito, considerámos pertinente o estudo do contexto da Enfermagem Pré-
Hospitalar. Embora como referimos, a história nos diga que a actividade tem uma
existência longa, como domínio de intervenção prática reconhecido no nosso país, tem
ainda um percurso curto. Tem sofrido muita contestação social externa e mesmo interna
à profissão. A nossa tutela foi mesmo muito renitente ao reconhecimento desta
competência profissional. Se analisarmos, a primeira referência e regulação da
actividade pré-hospitalar por parte da Ordem dos Enfermeiros, data de Janeiro de 2007,
com a publicação de um texto com Orientações Relativas às Atribuições do Enfermeiro
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no Pré-Hospitalar. O reconhecimento deste âmbito de actividade como área do exercício
profissional dos enfermeiros, apenas foi conferido com a publicação da nova carreira de
enfermagem pelo artigo 6º do DL. Nº 184 de 22 de Setembro de 2009.
A dificuldade de afirmar a diferenciação do exercício profissional dos enfermeiros,
sempre esteve presente no desenvolvimento da profissão. Até hoje sempre tivemos
dificuldade em demonstrar as áreas onde a enfermagem se diferencia pelos resultados
que visa quando comparamos com as tarefas de outros, em produzir resumos mínimos
de dados de enfermagem de forma a produzir informação válida acerca do contributo
dos cuidados de enfermagem para a saúde das populações.
Sentimos que não é diferente neste contexto de trabalho, se repararmos na actualidadesocial da actividade, constatamos que a contestação em torno da nossa intervenção e
da sua necessidade junto da população é quase constante e latente. Embora para os
actores enfermeiros lhes pareça óbvia e imprescindível a sua intervenção, incomoda-nos
que até hoje ainda não tenhamos conseguido demonstrar esta importância e
imprescindibilidade, no interior e no exterior da classe. E a este propósito, Bandeira
(2008) diz que as acções de urgência extra-hospitalares, não são médicas nem deixam
de o ser. As pessoas é que precisam ou não de auxílio, médico, de enfermagem ou paramédico.
Reflectindo no nosso desempenho da actividade, na troca de experiências e na partilha
de percepções com os enfermeiros e outros pares neste cenário de intervenção tanto
nacional, como internacionalmente, ficamos com a noção que o trabalho desenvolvido
pela Enfermagem Pré-Hospitalar, não está suficientemente descrito e documentado.
Embora a actividade das VMERs já conte com quase duas décadas, e já contarmos com
mais de quatro anos de experiência de ambulâncias SIV, temos até agora disponíveis
poucos documentos ou trabalhos que regulem, explanem ou documentem a actividade.
A ausência de qualquer conceptualização ou teorização por parte dos próprios
enfermeiros desta actividade, justifica o interesse da temática.
Em Portugal ainda não é requerida especialização médica ou de enfermagem para a
prestação de cuidados no pré-hospitalar, a complexidade das situações clínicas deste
contexto pelo confronto frequente com o doente em estado crítico, requerem,
naturalmente, um desempenho técnico altamente qualificado no atendimento ao
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contexto de urgência, para além de outras capacidades, como sejam, disponibilidade,
calma, disciplina, destreza e resistência física (Bandeira, 2008). Na prática, sentimos no
entanto, que persiste um vazio na definição concreta da formação necessária e das
competências conferidas aos enfermeiros neste âmbito de intervenção.
O documento relativo às atribuições dos enfermeiros no pré-hospitalar, diz que
“só o enfermeiro pode prestar cuidados de enfermagem ao indivíduo, família ecomunidade, em situação de acidente e/ou doença súbita, da qual poderáresultar a falência de um ou mais funções vitais, pelo que deve integrarobrigatoriamente a equipa de socorro pré-hospitalar” (Ordem dosEnfermeiros, 2007, p.1).
O mesmo texto, refere que na actuação, o enfermeiro deve respeitar o seuenquadramento legal na estabilização de funções vitais, garantia de acompanhamento e
vigilância das mesmas funções no transporte até à unidade hospitalar, na transmissão de
informação na unidade hospitalar de referência, bem como na garantia da informação e
acompanhamento da família por forma a minorar o seu sofrimento.
Apesar destas directrizes aferirem a actividade, são muito latas, parece-nos que não são
por si só reveladoras deste contexto específico do exercício profissional, nem todos os
conceitos foram identificados, desenvolvidos, ou compreendidos, não foram mesmoatestados conceptualmente para o contexto de actuação, isto leva-nos a questionar:
Somos específicos e objectivos na expressão do exercício profissional nesta
área?
Que competências desenvolvemos no âmbito da actividade?
Qual a diferenciação das nossas competências face a outros actores na
intervenção?
Existem definições e registos das intervenções de enfermagem neste contexto?
Que benefícios trás à população a intervenção pré-hospitalar dos enfermeiros?
Estas inquietações e motivações constituíram o ponto de partida para o presente trabalho
investigação. Com ele, esperamos cumprir a finalidade de analisar o contexto onde se
inscreve o exercício da enfermagem pré-hospitalar, queremos conhecê-lo melhor, e
contribuir para o tentar definir.
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Então, definimos como questão de investigação, “Como é percebido o exercício pré-
hospitalar dos e pelos enfermeiros?” Desta questão, no que toca ao trabalho de campo
que desenvolvemos, formulámos os seguintes objectivos gerais:
Analisar o contexto da prática de enfermagem no pré-hospitalar;
Comparar o exercício da actividade pré-hospitalar em Portugal com contextos
internacionais semelhantes e diferentes;
Descobrir conceitos do contexto da actividade pré-hospitalar de enfermagem.
Uma vez que pretendemos conceptualizar, e se possível teorizar o contexto da
Enfermagem Pré-Hospitalar, centrar a atenção na compreensão absoluta e ampla do
fenómeno em estudo, através das percepções e da observação dos actores na intervenção
pré-hospitalar, também dos documentos e regulamentos inerentes, optámos por um
estudo de natureza qualitativa, usando como abordagem metodológica a “Grounded
Theory”, no intuito de fundamentar o domínio da actividade.
O foco inicial da investigação, foi como referimos “o contexto do exercício pré-
hospitalar dos enfermeiros”. A metodologia que nos propusemos utilizar, evidenciou
outros focos e delimitou o estudo na sua amplitude.
O presente estudo é constituído por seis partes fundamentais. A primeira é destinada à
abordagem da “Grounded Theory” como metodologia escolhida para o estudo. A
segunda parte é dedicada à abordagem metodológica, descrevendo pormenorizadamente
a aplicação da “Grounded ” na perspectiva de Strauss e Corbin, para o conhecimento do
Contexto do Exercício Pré-hospitalar da Enfermagem, identificando os processos de
selecção dos informantes, de colheita de informação, de proposta de análise e validação
da informação colhida, referenciando ainda as preocupações éticas e deontológicas.Surge depois a apresentação dos resultados desta investigação, explanando a
“navegação” da metodologia nos dados recolhidos. A quinta parte ilustra a necessária
“carta de navegação” da “Grounded Theory” na discussão dos resultados rumo a um
“porto seguro”. Por último apresentamos as conclusões e sugestões que obtivemos nesta
rota, que consideramos poderem figurar em futuras “cartas de marear ” rumo ao “porto”
descoberto na investigação desenvolvida.
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Antes de concluirmos esta introdução, importa ainda definir alguns aspectos, que
consideramos necessários para esclarecimento do nosso posicionamento relativamente a
algumas questões, contribuindo para a uniformização ao longo do trabalho.
Todas as citações directas efectuadas de literatura internacional consultada, figurará na
língua original não correndo o risco de interpretações dúbias na tradução.
Esclarecemos também alguma terminologia a utilizar, a referência feita ao longo do
trabalho ao nosso alvo de cuidados individual será, “a pessoa”, abandonando
terminologia como doente, cliente, utente ou até vítima, pensamos que este termo é
aquele que hodiernamente melhor caracteriza a visão que a Enfermagem pretende na
construção da sua intervenção no âmbito da saúde. Esta aliás, é a terminologia que cadavez mais figura nos documentos emanados pela Ordem dos Enfermeiros, na literatura
mais recente das Teorias de Enfermagem, e é também aquela em que filosófica e
paradigmaticamente nos revemos.
Por último, apenas referir que este trabalho não é narrado com as normativas impostas
pelo novo acordo ortográfico à língua de Camões, por este ainda não ser uma imposição
legal, mas, sobretudo pelas reticências e desacordo que merece à autora esta renovada
forma de escrita.
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1 – A ESTRATÉGIA DE INVESTIGAÇÃO E A ESCOLHA DA GROUNDEDTHEORY
A sociedade mexe, fervilha e agita-se constantemente na busca de mais conhecimento,
os procedimentos modificam-se e alteram-se, e diz-se que cada vez mais com base na
evidência proveniente da ciência que evolui.
No entanto, esta mesma ciência continua sempre controversa e ambígua relativamente
aos seus métodos, algumas discussões se têm perpetuado neste domínio. Uns defendem
a ciência baseada em números, em quantificação, em mensuração, em generalização e
replicação, criticando a falta de cientificidade, objectividade, a negligência e
desorganização metodológica dos métodos qualitativos.
Os defensores dos métodos qualitativos, sustentam que essa perspectiva de rigor
científico é redutora, “um rigor que quantifica e que, ao quantificar, desqualifica, um
rigor que, ao objectivar os fenómenos, os objectualiza e os degrada, que, ao caracterizaros fenómenos, os caricaturiza. É, em suma e finalmente, uma forma de rigor que, ao
afirmar a personalidade do cientista, destrói a personalidade da natureza.” (Sousa
Santos, 1988, p. 11e 12).
Mas, muitos autores alheios a esta polémica, como Pope e Mays (2005, p. 12) chamam
a atenção para um aspecto que consideramos importante, as “distinções entre as diversas
posturas teóricas são geralmente apresentadas como precisas, mas, na prática, os
contrastes, com frequência são menos aparentes”. O que de facto deve estar subjacente à
escolha do método, a premissa básica para essa decisão, prende-se com a área do
problema e a questão de pesquisa, embora as convicções pessoais, a postura teórica e o
treino do pesquisador também possam ser considerados (Streubert e Carpenter, 2002;
Pope e Mays, 2005; Driessnack, Sousa e Mendes, 2007; Strauss e Corbin, 2008).
Partilhamos da postura defendida por estes autores, que revela o benefício das duas
metodologias para o conhecimento, não excluindo qualquer delas por princípio,
convictos que o que deve definir o método de pesquisa são o problema e a questão que
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lhe está subjacente. Face a estes pressupostos, seleccionámos para este estudo a
Metodologia Qualitativa, utilizando como abordagem metodológica a “Grounded
Theory” ou Teoria Fundamentada, por considerarmos que dão uma resposta consistente
às exigências da nossa investigação.
A nossa pretensão, vai no sentido de obtermos uma visão mais profunda e ampla do
exercício pré-hospitalar dos enfermeiros, obter informações do seu contexto, desocultar
as suas percepções, as suas relações, e as opiniões dos profissionais intervenientes neste
domínio.
Segundo Fortin (2000) e Pollit e Hungler (1995) a metodologia qualitativa deve ser
utilizada quando o investigador pretende debruçar a sua atenção na compreensão plena evasta do fenómeno em estudo. Preocupando-se em observar, descrever, interpretar e
apreciar o meio, o fenómeno e a experiência humana, tal como acontece no seu cenário
natural, tal como é vivida e como é definida pelos próprios autores desta acção, pelo que
assim se justifica a preferência pela metodologia.
Dependendo da metodologia escolhida, o quadro de referência que contenha as bases
teóricas ou conceptuais da investigação, que possibilite ordenar conceitos para a
concretização do estudo, está implícito ao projecto de investigação. Segundo Mendes
(2009), o quadro de referência é habitualmente produzido pela revisão de literatura, que
reúne um conjunto de publicações pertinentes sobre determinado assunto da
investigação, ou sobre a abordagem metodológica adoptada.
Esta autora refere que segundo Fortin (2000) o objectivo deste quadro de referência,
consiste em organizar os componentes de uma pesquisa, fornecendo-lhes um contexto
para a interpretação dos resultados.
Algumas abordagens metodológicas da pesquisa qualitativa, implicam que antes de
qualquer conceptualização sobre o contexto do estudo, se comece por conceptualizar a
própria metodologia.
Assim, apenas vamos conceptualizar a metodologia que nos propomos a utilizar neste
estudo. Começamos por fazer uma abordagem sucinta de alguns princípios da
Metodologia Qualitativa, para então passarmos ao enquadramento conceptual da
“Grounded Theory”.
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A METODOLOGIA QUALITATIVA
Embora o mundo de hoje, gire cada vez mais sob a forma de números, a ciência sejaainda muito associada a uma abordagem quantitativa, vigora cada vez mais um novo
paradigma na pesquisa científica proveniente da corrente filosófica do positivismo, que
reflecte sobre a necessidade de estudar fenómenos que desafiam a medição,
fundamentalmente os fenómenos humanos e sociais (Sousa Santos, 1988; Streubert e
Carpenter, 2002; Pope e Mays, 2005; Martins, 2008).
Esta noção de ciência, é completamente oposta à visão tradicional que prevaleceu
durante muitos anos como a única exacta, pensava-se que para obter conhecimento
científico tinha que se objectivar e mensurar tudo. Esta concepção, teve origem em
Descartes, que desenvolveu a ideia da realidade objectiva, em que tudo tem explicação
com base no princípio de causa efeito (Streubert e Carpenter, 2002)
Em determinada época, do ponto de vista filosófico, passou a acreditar-se que é
necessária especial atenção ao estudo dos seres humanos, dos seus comportamentos e da
natureza, com uma leitura para além da causa efeito associada á tradicional visão
Cartesiana do paradigma naturalista. Surgem os estudos numa perspectiva humanista,
filosoficamente enraizados em modelos descritivos de ciência associados a Kant, que a
dada altura questiona a referida realidade Cartesiana e inicia a discussão da razão
humana, como uma realidade cuja percepção vai para além do simples acto de
observação (Streubert e Carpenter, 2002; Martins, 2008). A noção da interpretação, da
compreensão, valorização do comportamento humano, a aproximação do investigador
aos sujeitos de investigação, ganham então espaço.
A interacção do ser humano com o ambiente e a partilha de experiências humanas, são
premissas da concepção desta nova visão, que diz que os fenómenos humanos e sociais
precisam ser conhecidos e identificados como forma de produzir conhecimento útil e
prático à própria vida humana, como forma de lhe dar sentido. É quase como se
houvesse necessidade de ir um pouco mais atrás, até às origens, à essência da própria
natureza humana e das suas relações para alcançar um novo saber científico (Sousa
Santos, 1988; Martins, 2008).
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A metodologia qualitativa, surge da preocupação de descrever padrões fundamentais de
pensamento e comportamento humano através da percepção que como dissemos, vai
para além da simples observação, uma vez que, nem toda a realidade é explicada por um
processo investigativo linear, baseado na fiabilidade, na predição e na replicabilidade.
A natureza não é independente do pensamento ou da razão. O que se observa não é a
única realidade, pois a realidade, são de facto realidades (Streubert e Carpenter, 2002;
Pope e Mays 2005;). A este propósito, consideramos o paralelismo de uma afirmação do
centenário cineasta Português Manoel Oliveira numa entrevista à Revista Visão (2008,
p. 121), “podem-se fazer vários retratos da mesma pessoa: a pessoa é a mesma, os
retratos são diferentes”. São estes diferentes retratos, diferentes planos de um filme,
diferentes realidades, concepções ou dimensões, que a pesquisa qualitativa tenta
compreender de forma profunda, são as explicações, as proposições e as representações
observadas pelos sujeitos e pelo investigador de forma muito próxima, que interessam a
esta pesquisa e permitem retratar de forma fiel determinado fenómeno.
Há uma necessidade cada vez mais premente, de uma ciência sustentada numa visão
mais abrangente e profunda da natureza e da sociedade, baseada e reprodutível no senso
comum, obtida através de pluralidade metodológica. Defende-se uma ciência cujo rigoradvém do cumprimento do método, em que o “seu estilo é uma configuração de estilos
construída segundo o critério e a imaginação pessoal do cientista (…) que prefere a
compreensão do mundo à manipulação do mundo”(Sousa Santos, 1988, p. 16).
Esta ciência “relacionada aos significados que as pessoas atribuem às suas experiências
do mundo social e a como as pessoas compreendem esse mundo. Tenta, portanto,
interpretar os fenómenos sociais (…) em termos dos sentidos que as pessoas lhes dão;
em função disso, é comummente referida como pesquisa interpretativa” (Pope e Mays,
2005, p.13).
Tem-se assistido a um crescente interesse por estas pesquisas, particularmente nas áreas
das ciências humanas e sociais, Roxo (2004), citado por Martins (2008) refere que,
parece que se redescobriu a urgência de pôr em causa o modelo científico clássico que
visava a quantificação dos fenómenos sociais, por ser em muitas circunstâncias,
extremamente redutor.
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O interesse desta metodologia é referido por Turato (2005), quando diz que nas Ciências
Humanas, não se busca estudar o fenómeno em si, mas compreender o seu significado
individual ou colectivo para a vida das pessoas, é indispensável saber o que os
fenómenos representam para elas. O “significado” tem função estruturante, ao nível do
que as coisas significam, fazendo com que as pessoas organizem de certo modo a sua
vida, o seu pensamento e a sua acção.
O autor atrás citado, refere que os objectivos das pesquisas qualitativas, contemplam
uma visão sociológica, em que se agrega a questão do significado e da intencionalidade
como inerentes aos actos, às relações, e às estruturas sociais. Neste contexto o termo
“significado” associa-se às estruturas sociais, procurando o “querer dizer”das estruturas para os sujeitos sob estudo. Devemos pensar nesta “metodologia como uma forma de
reunir conhecimento sobre o mundo social” (Strauss e Corbin, 2008, p. 18), perspectiva
que nos interessa face aos nossos objectivos.
Streubert e Carpenter (2002, p.13) referem algumas características comuns aos vários
métodos de abordagem da pesquisa qualitativa, enunciando como pressupostos sete
condições definidas por Sigsworth (1995):
“(1) a investigação deve ser focada nas experiências da população estudada, nas suas percepções e nas suas verdades; (2) as dicotomias artificiais e as fronteirasdefinidas são suspeitas em investigação que envolva seres humanos; (3) ahistória e os acontecimentos concorrentes são sempre considerados quando se
planeia, realiza, analisa e interpreta resultados; (4) as perguntas colocadas sãotão importantes como as respostas obtidas; (5) a investigação não deve serhierárquica; (6) as assumpções, vieses e pressuposições dos investigadores fazem
parte da investigação; e (7) os investigadores e os participantes na investigação são parceiros cujas descobertas conduzem à compreensão”.
Relativamente aos pesquisadores qualitativos, Strauss e Corbin (2008, citando Rew,
Bechtel e Sapp 1993), referem que lhes devem estar implícitos os seguintes atributos:
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adequação, autenticidade, credibilidade, intuição, receptividade, reciprocidade e
sensibilidade. O acreditar na relevância académica e não académica do estudo, e a
disponibilidade para o trabalho intenso e exigente são duas características que Strauss e
Corbin (2008) acrescentaram às já referidas.
Tendo em conta os objectivos propostos, a questão de partida e estando perante uma
temática ainda pouco explorada pela investigação, escolhemos como abordagem dentro
do paradigma qualitativo, utilizar o método da “Grounded Theory”. Este pareceu-nos o
método mais adequado para explorar de forma mais abrangente o contexto do exercício
pré-hospitalar dos enfermeiros, na perspectiva de, como sugere Martins (2008, p.164),
citando Crooks (2001), “conseguirmos uma imagem daquilo que se faz, como se faz e
porque se faz”.
O método augura ainda a fundamentação detalhada, para posteriormente, examinar de
forma sistemática os dados e fazer uma comparação constante entre estes, que
possibilite descobrir conceitos que façam emergir teoria, perspectiva sublinhada por
Streubert e Carpenter (2002) quando referem, a meta da “Grounded Theory” é,
descobrir explicações teóricas completas dos fenómenos, tentando observar e
compreender o fenómeno a partir do ponto de vista dos participantes.
A escolha recaiu então neste método, por nos possibilitar explorar em profundidade
todo o contexto social da Enfermagem Pré-Hospitalar, no que se refere ao seu exercício,
às suas relações, às suas consequências. Até porque este contexto, como a maioria dos
contextos sociais, é complexo, pluridisciplinar, e em permanente transformação,
intervêm nele inúmeras variáveis e condições, pelo que a sua apreensão e compreensão
não cabem fora do seu âmago.
Seguidamente, escalpelizamos um pouco o método, as suas características e
capacidades.
1.1. – ENQUADRAMENTO CONCEPTUAL DA GROUNDED THEORY
A “Grounded Theory”, geralmente conhecida após tradução para Português comoTeoria Fundamentada, é uma abordagem metodológica da investigação qualitativa, que
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significa teoria resultante dos dados. É utilizada para desvendar os processos sociais nas
interacções humanas. Ou seja, estudar fenómenos que envolvem processos sociais
sublinhando experiências e comportamento humano (Driessnack, Sousa e Mendes,
2007). Uma forma de reunir conhecimento sobre o mundo social, ver além do comum e
atingir uma nova compreensão da vida social (Strauss e Corbin, 2008), focando os
padrões, processos e formas de um grupo interpretar a sua realidade através das
interacções sociais.
Esta metodologia consiste num método de construção de teoria, é escolhida quando os
investigadores têm como objectivo criar novos entendimentos teoricamente expressos,
descobrir conceitos fundamentados em dados empíricos, que são analisados
sistematicamente até emergir teoria.
O termo teoria é definido por Strauss e Corbin (2008, p. 29) como, “um conjunto de
conceitos bem desenvolvidos relacionados por meio de declarações de relações que,
juntas, constituem uma estrutura integrada que pode ser usada para explicar ou prever
fenómenos”.
A “Grounded Theory” é um método de investigação apropriado para o estudo de
fenómenos sociais complexos na perspectiva dos diversos actores sociais, e das
múltiplas variáveis no contexto histórico onde ocorre (Lopes, 2003; Martins, 2008,
referindo Carrero Planes, 2000)
Foi desenvolvida e descrita pela primeira vez em 1967, na obra The Discovery of
Grounded Theory, por dois sociólogos, Barney Glaser e Anselm Strauss sob influência
da tradição interpretativa do interacionismo simbólico, definindo o seu fundamento nos
dados empíricos no estudo de fenómenos sociais (Streubert e Carpenter, 2002; Scott,
2004; Strauss e Corbin, 2008).
Nesse sentido, a “Grounded Theory”, pode ser definida como uma metodologia em que
os dados obtidos do mundo empírico são sistematicamente colhidos, organizados,
associados, analisados e comparados no decurso da pesquisa, com o objectivo de
descobrir conceitos e produzir teoria. Em todo o processo de investigação, as etapas de
colheita de dados, análise, comparação e descoberta de eventual teoria, mantém sempre
uma relação de reciprocidade e proximidade, crescendo e desenvolvendo-se quasesimultaneamente desde o início. Ao contrário de outros métodos, não se preconiza
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começar por uma teoria para a provar, mas antes identificar uma área de estudo,
esperando o emergir do que é relevante para essa área (Strauss e Corbin, 2008).
Este método de pesquisa, frequentemente referido também como, método decomparação constante, é uma tradição qualitativa construída sobre a comparação de
conceitos (Scott, 2004, referindo Glasser e Strauss, 1967). Segundo Scott (2004), o
enunciado deste método de comparação constante, sugere que dados similares sejam
agrupados e conceptualmente classificados. As categorias, são criadas e organizadas por
relações, são desenvolvidos conceitos e dimensões, emergindo finalmente a teoria.
Enquanto método de pesquisa qualitativa, é definida como investigação de campo, na
medida em que pretende estudar, explorar, explicar, compreender e descrever profundamente fenómenos oriundos das práticas, dos comportamentos, das crenças, das
atitudes dos indivíduos ou dos grupos no seu ambiente natural, tal como hospitais,
clínicas, lares, escolas, empresas, comunidades e colectividades sociais, grupos de
estudo antropológico, estudos do âmbito da psicologia, etc. (Streubert e Carpenter 2002;
Strauss e Corbin, 2008).
O alvo dos estudos que empregam a “Grounded Theory” é a descoberta de
entendimentos teóricos completos de um fenómeno complexo, utilizando técnicas
sistemáticas e processos de análise que permitam ao investigador desenvolver uma
teoria substancial que demonstre critérios de boa ciência, ou seja de significância,
congruência entre a teoria e os dados observados, generalidade, reprodutibilidade,
precisão, rigor e verificação (Streubert e Carpenter, 2002). Assim, a teoria desenvolvida
diferencia o conhecimento e o significado da prática (Strauss e Corbin, 2008).
A teoria surge como referimos, da análise comparativa constante dos dados, as etapas de
investigação de colheita e análise de informação, desenvolvem-se simultaneamente. Os
dados são constantemente analisados comparativamente, na tentativa de descoberta de
conceitos, cada conceito que surge, é comparado com todos os outros conceitos. A
teoria que emerge através deste processo interpretativo, indutivo e dedutivo é,
normalmente, conceptualmente consistente e rica de relações entre os vários conceitos,
permitindo-nos compreender e explicar o fenómeno em estudo (Martins, 2008).
Na “Grounded Theory” são considerados três elementos fundamentais: os conceitos, ascategorias e as proposições. Os conceitos são as unidades básicas de análise,
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Segundo Streubert e Carpenter (2002, p.116), na teoria do interacionismo simbólico
“acredita-se que as pessoas se comportam e interagem de acordo com o modo como
interpretam ou atribuem significado a símbolos específicos nas suas vidas, tais como
estilos de vestuário, ou de expressões verbais e não verbais ”, a este propósito as
mesmas autoras citando Moxley (1982) referem que “é também através do significado e
valor que estes símbolos possuem para nós que tentamos interpretar o nosso mundo e os
actores que interagem connosco. Desta forma, tentamos ler mentes, e agimos de acordo
com isso”.
Assim, o interacionismo simbólico considera de extrema relevância o significado que as
“coisas” têm para o comportamento humano, um significado que emerge
simultaneamente da interacção entre as pessoas. Pelo que, a sociedade humana, ou a
vida humana em comunidade, é personificada por actores que se relacionam e cujas
acções acontecem em reciprocidade de relação (Martins, 2008).
Sob influência do interacionismo simbólico, a “Grounded Theory” f oi “descoberta” por
dois sociólogos, Barney Glasser e Anselm Strauss em 1967, com o desenvolvimento da
obra “The Discovery of Grounded Theory: Strategies for Qualitative Research” . A
metodologia propõe-se contribuir para o esclarecimento de múltiplos fenómenossociais, que não conseguiram ser explicados por outros métodos, ou o foram de forma
parcial (Strauss e Corbin, 2008, citando Glasser e Strauss, 1967). A definição dada na
altura para a “Grounded Theory” pelos seus “descobridores” é, “método da análise
comparativa constante”. Método a que posteriormente também foi dado o epíteto de
“não método” (Bryant e Charmaz, 2007).
Como método de investigação qualitativa, a “Grounded Theory” inicialmente, e
durante as primeiras décadas do seu desenvolvimento foi muito utilizada pela
sociologia. Contudo, com a difusão do método na década de 90, o uso da metodologia
tem granjeado um interesse crescente por parte de outras disciplinas, nomeadamente a
antropologia e a área da saúde, em particular a enfermagem (Streubert e Carpenter,
2002; Lopes, 2003; Driessnack, Sousa e Mendes, 2007; Strauss e Corbin, 2008).
Serão inúmeros os motivos para esta crescente aplicação, mas segundo Lopes (2003,
p.63) “o estádio de desenvolvimento conceptual da enfermagem bem como a natureza
dos problemas que aí se colocam, estão provavelmente entre as mais relevantes”,
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também não pode ficar alheio a isto, o facto de a enfermagem ocorrer num contexto
natural e não num controlado.
Na opinião de Streubert e Carpenter (2002), a “Grounded Theory” é um método deinvestigação relevante para o estudo de fenómenos de enfermagem. A riqueza e a
diversidade da experiência humana são exploradas eficazmente por esta abordagem,
contribuindo para o desenvolvimento de teorias de enfermagem de médio alcance. Até
porque, é inteiramente aceitável que o interesse na “Grounded Theory” seja a criação
de teorias conceptuais abstractas. “Attributing meaning is not the goal of Grounded
Theory; rather, its goal is to offer the reader a conceptual explanation of a latent pattern
of behavior that holds significance within the social setting under study” (Bryant e
Charmaz, 2007, p. 38).
Desde a sua criação, têm sido inúmeros os autores a escrever sobre este método,
suscitando o seu desenvolvimento, mas, gerando também alguma polémica e
contradição com outras “versões” que arriscaremos explorar.
A obra original de Glasser e Strauss (1967) é a primeira grande referência à teoria. Para
além desta merece evidência, “Basics of Qualitative Research: Techniques and
Procedures for Developing Grounded Theory” da autoria de Anselm Strauss e Juliet
Corbin, com a primeira edição em 1990. Isto porque esta obra produziu algumas
apreciações menos positivas por parte de Glasser, que expressou o seu profundo
desacordo pelos “afastamentos” relativamente à metodologia original, e ainda porque a
segunda edição em Português de 2008, serviu de referência a este trabalho.
Os principais desenvolvimentos da teoria relativamente aos postulados originais,
prendem-se com uma maior sistematização das etapas do processo no sentido de lhe
conferir padronização e coerência, maior credibilidade, rigor e confiança, prevendo a
verificação e confirmação das teorias emergentes e até a generalização. Estas
remodelações e “acrescentos” à teoria clássica formulados por autores como Guba e
Lincoln (1985), Strauss e Corbin (1990) e tantos outros, mereceram sempre a refutação
de Glasser que considera, que os procedimentos de controlo e verificação aplicados à
teoria a corrompem, retiram do paradigma positivista e a recolocam no naturalismo,
embora num naturalismo pós-positivista e refinado (Glasser, 2003).
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Nesta perspectiva para alguns autores, a “Grounded ” surge como tentativa de ruptura
com os paradigmas vigentes, transcendendo as suas fronteiras e distinções. Como
metodologia tenta distanciar-se de questões epistemológicas e ontológicas, sendo
considerada neutra deste ponto de vista (Bryant e Charmaz, 2007).
No entanto, por acreditarmos que esta metodologia livre e fundamentada em dados do
contexto natural e empírico, beneficia de procedimentos que permitam objectivar o
pensamento científico e a utilização dos resultados com base na evidência e na boa
ciência, optámos pela referida perspectiva de Strauss e Corbin na edição em português
de 2008.
Outras roupagens do método têm sido propostas por outros autores modernamente, nemsempre consubstanciadas e consolidadas adequadamente, alguns peritos reportam e
sugerem, a necessidade do investigador ser específico sobre o método e explicar como
decorreu todo o processo de estudo do fenómeno que permitiu desenvolver a teoria
(Streubert e Carpenter, 2002; Martins, 2008).
1.2. – O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO UTILIZANDO A METODOLOGIA DAGROUNDED THEORY
O desenvolvimento sistemático por etapas, respeitando alguns procedimentos rigorosos
de análise de dados organizados numa sequência lógica que tende para a complexidade
e integração é uma exigência da “Grounded Theory” na perspectiva que escolhemos
(Strauss e Corbin, 2008), como em qualquer outra metodologia. O processo preconizado
pela abordagem, ocupa o espaço seguinte deste trabalho.
A questão de pesquisa e a “arquitectura” da investigação
As características do problema de investigação com que o investigador se confronta, e a
maneira como se enuncia a questão de pesquisa, são importantes, porque determinam
em grande parte a metodologia de investigação a adoptar (Strauss e Corbin, 2008).
Nesse sentido, se o intuito da investigação é explorar os processos sociais com a
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finalidade de desenvolver teoria, confrontamo-nos com uma problemática que demanda
a utilização da “Grounded Theory”.
A decisão do tópico de pesquisa ou fenómeno de interesse, é um dos aspectos maiscríticos da realização de pesquisa. Esta dificuldade prende-se com a necessidade de
delimitar e clarificar o fenómeno de interesse. Nesse aspecto, a “Grounded Theory”
diferencia-se de outras metodologias, a sua natureza solicita aos investigadores o
refinamento da pergunta de investigação no decurso da colheita e análise dos dados,
porque o foco do estudo pode alterar-se, dependendo dos dados colhidos (Martins,
2008).
Streubert e Carpenter (2002) dizem-nos que a questão de pesquisa original, apenasaponta o foco do estudo inicial. Strauss e Corbin (2008), referem que é uma declaração
que identifica o fenómeno a ser estudado. Na teoria fundamentada, não faz sentido e é
“impossível formular uma pergunta de investigação verdadeiramente rigorosa antes de
começar qualquer estudo (Streubert e Carpenter, 2002, referindo Hutchinson, 1986).
Contudo o enunciar da pergunta inicial de investigação é importante, para a escolha da
abordagem metodológica, e também para a selecção da amostra da pesquisa (Lopes,
2003).
A colheita de dados
Nesta teoria, são os dados (não os casos) o centro da atenção do investigador, estes
devem ser recolhidos independentemente da sua natureza, mas tendo em atenção a
necessidade de confirmação de uns com os outros (Martins, 2008). Assim a colheita de
dados efectuada segundo um método isolado, ou através da combinação de vários tipos
de fontes é uma das características elementares da teoria.
O principal interesse do investigador quando selecciona os recursos para a colheita de
dados, deve centrar-se na escolha de fontes que possam fornecer o máximo de
experiências e informação sobre o estudo a investigar (Streubert e Carpenter, 2002;
Glasser, 2003; Scott, 2004; Strauss e Corbin, 2008). A selecção das fontes dos dados é,
pois, um aspecto fulcral.
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Por exemplo na utilização de entrevistas, o investigador, deve ter o cuidado de
seleccionar “bons informantes”, sabendo-se que o “bom informante” é aquele que tem o
“conhecimento e a experiência requeridas, possui habilidade para reflectir, que se
exprime com clareza, que dispõe de tempo para ser entrevistado e que está disponível
para tal” (Martins, 2008, p. 171 e 172).
Por este motivo, a teoria fundamentada utiliza como método de amostragem, a
amostragem teórica. Um tipo de amostragem, que não contempla a definição do número
de participantes envolvidos. A dimensão da amostra é determinada apenas pelos dados
colhidos e pela sua análise simultânea, o objectivo da amostra é continuar a colher
dados à medida que os vários conceitos e categorias vão emergindo, até a saturação da
informação ser adquirida (Streubert e Carpenter, 2002) e não surgirem dados novos
(Scott, 2004). Ou seja a amostragem teórica, é dirigida pelo objectivo dos
procedimentos de codificação de dados, e pela sensibilidade desenvolvida pelo
investigador ao longo do tempo de convívio com os dados. (Strauss e Corbin, 2008).
A proveniência da informação, como já dissemos pode ter origem em várias fontes, a
observação participante e a entrevista são recursos de dados privilegiados, contudo,
legislação, documentação, literatura, imprensa, são exemplos de fontes perfeitamenteadmissíveis a utilizar separadamente ou de forma combinada (Strauss e Corbin, 2008).
No que se refere à entrevista, Martins (2008), refere que esta pode ser formal ou
informal, no caso da primeira, pode ser estruturada ou semi- estruturada. A entrevista
não estruturada ou semi-estruturada permite conhecer de forma mais profunda os pontos
de vista dos informantes e guiar a necessidade de colheitas de dados adicionais.
De acordo com a “Grounded Theory”, o investigador não deve ir para o campo sem um
foco de interesse e questões iniciais demandadas pela experiência ou por alguma
literatura, no entanto, para não restringir a qualidade da informação emergente do
trabalho de campo deve colocar questões amplas, que lhe permitam ajustar e
redireccionar as questões em função das categorias que vão resultando, alcançando a
amostragem teórica.
Nesta altura do processo, a “Grounded Theory” preconiza a resposta às questões,
Quem? Onde? Porquê? Como? Com que consequências? para descobrir relações entre
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as categorias, que permitam a interpretação e geração de teoria (Scott, 2004, citando
Strauss e Corbin, 1998).
A utilização de entrevistas informais, ligadas a conversas quotidianas, são fundamentaisem situação de observação participante sob a forma de notas de campo, permitem-nos
preencher lacunas deixadas pela entrevista formal (Martins, 2008).
O papel do investigador e da sua experiência pessoal para compreender o problema, é
um instrumento de pesquisa adicional na perspectiva da “Grounded Theory”, ele não se
deve retirar do estudo, uma vez que trabalha dentro da matriz onde acontecem os
diversos processos de investigação. O viés de que pode ser acusada a teoria por este
princípio, é colocado em contraponto com o rigor da análise de dados e da suacodificação e categorização (Streubert e Carpenter, 2002; Strauss e Corbin, 2008).
Análise dos dados
Esta fase, é a mais específica e determinante desta abordagem metodológica, é fulcral.
O caminho da descoberta de uma variável principal, não é seguro e tranquilo, é exigente
e difícil, mas também desafiante e motivador. O surgimento de uma variável principal é
a finalidade da “Grounded T heory”, ela elucida e fornece entendimento ao que se passa
com os dados, servindo como conceito fundamental para a produção de teoria (Streubert
e Carpenter, 2002).
Na opinião dos autores atrás citados, que fazem referência à obra de Strauss (1987), as
características principais da variável principal, são:
Ocorrer frequentemente nos dados;
Relacionar vários dados;
Sendo central, permitir explicar a grande variação de todos os dados;
Possuir aplicações para uma teoria mais geral ou formal;
Concorrer para o avanço da teoria à medida que se torna mais detalhada;
Admitir a máxima variação e análise.
A teoria fundamentada, obriga a que o investigador, colha, codifique, e analise os dados
desde o início do estudo (metodologia de comparação constante). É denominado como
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A construção de uma estrutura conceptual coerente e consistente, depende da análise
dos dados. Esta permite ao pesquisador, descobrir as categorias e suas características, a
sua relação com as subcategorias e com a categoria central ou variável principal,
possibilita ainda perceber a necessidade de recolher novos dados (Lopes, 2003).
A CODIFICAÇÃO NA GROUNDED THEORY
A construção de teoria provém do processo central de codificação, este pode definir-se
como a operação através da qual os dados são “quebrados, e repostos juntos de novo”(Lopes, 2003, p. 68), sendo que este é um processo dinâmico, fluido e simultâneo. São
definidos três tipos ou níveis básicos de codificação, passamos a falar deles
sucintamente.
Codificação Aberta ou de Nível I
A codificação aberta pode ser definida como, o processo analítico por meio do qual os
conceitos são identificados, e as suas propriedades e dimensões são encontradas nos
dados (Strauss e Corbin, 2008). Nesta análise o investigador procede ao exame
minucioso dos dados e identifica os processos existentes, procurando disparidades e
semelhanças, atribuindo um nome ou código.
Como codificam a substância dos dados, estes códigos são denominados de códigos
substantivos. A utilização das palavras dos informantes é frequente, embora também
possam ser construídos pelo investigador, com base nos conceitos contidos nos dados.
Simultaneamente desde o início, estes códigos devem ser agrupados sob a forma de
conceitos, tendo em conta a ideia, a imagem o significado que evocam, os eventos, as
acções, as interacções, ou os objectos conceptualmente semelhantes em natureza,
características comuns ou relacionamento. Este procedimento é importante, porque
permite ao investigador reduzir o número de unidades com que trabalha, associando-os,
de forma a encontrar termos explicativos mais abstractos, ou seja as categorias.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Codificação Axial ou de Nível II
A codificação axial ou categorização, é o processo pelo qual se relacionam categorias às
suas subcategorias, ao nível das suas propriedades e dimensões, denomina-se axial porque ocorre em torno do eixo de uma categoria (Strauss e Corbin, 2008). Trata-se de
um processo de listar e qualificar dimensionalmente, examinando como as categorias se
cruzam e se associam entre si.
Durante a codificação aberta, pretende-se fundamentalmente “partir” os dados, a axial
tem como finalidade juntá-los de novo, em função das suas propriedades, tentando
estabelecer interligações entre eles, descobrindo-lhes novos sentidos (Lopes, 2003).
Strauss (1987), citado por Strauss e Corbin (2008), define quatro tarefas básicas e
fundamentais para a realização de codificação axial, são elas:
Evidenciar as propriedades e dimensões de uma categoria, tarefa que tem início
ainda na codificação aberta;
Identificar as diversas condições, acções, interacções e consequências associadas
ao fenómeno;
Relacionar uma categoria com as suas subcategorias por meio de declaraçõesque demonstrem as suas inter-relações;
Procurar indícios nos dados que evidenciem como as principais categorias
podem estar relacionadas entre si.
Relativamente às subcategorias, Strauss e Corbin (2008), esclarecem que estas são
também categorias. Diferenciam-se contudo, por serem menos abrangentes.
Inicialmente o investigador, pode ter dificuldade em distinguir se está perante uma
categoria ou uma subcategoria, no entanto, isto não deve constituir problema, uma vez
que essa distinção tornar-se-á evidente no decorrer do processo de análise.
As categorias devem ser sempre comparadas entre si no sentido de garantir que são
mutuamente exclusivas.
Sistematizando, a resposta a questões do fenómeno do tipo, Como? Onde? Porquê?
Quem? Quando? De que forma? Quais as consequências? pode evidenciar as
subcategorias, procurando contextualizar o fenómeno, relacionando a estrutura com o
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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processo, e dando-lhe assim, um maior poder explicativo (Scott, 2004; Bryant e
Charmaz, 2007; Strauss e Corbin, 2008).
É nesta fase que Strauss e Corbin (2008), preconizam pela primeira vez na ediçãoinaugural da sua obra em 1990, a utilização do Modelo Paradigma de Codificação,
como um instrumento analítico desenhado para proporcionar ao investigador uma
grande ajuda na integração da estrutura com o processo. Deste modelo, fazem parte as
condições, as estratégias, e as consequências. Estas, devem ser analisadas numa
perspectiva dedutiva e indutiva procurando o entendimento do fenómeno. Para
compreender melhor, sistematizar e caracterizar estes conceitos, recorremos ao seguinte
quadro que sintetiza a perspectiva destes autores.
Ilustração 2 - Quadro 1 – Descrição do Modelo Paradigma da Codificação
M o d e l o P a r a d i g m a d a
c o d i f i c a ç ã o
C o n d i ç õ e s
Causais Representam um conjunto de acontecimentos que influem
sobre um fenómeno. Respondem à questão: Porquê?
Intervenientes Variáveis que alteram o impacto das condições causais
sobre o fenómeno. Respondem à questão: Como?
Contextuais Variáveis específicas que se entrecruzam com as dimensões
no tempo e lugar para criar as circunstâncias em que as
pessoas respondem com estratégias de acção. Respondem à
questão: Onde e Quando?
Estratégias São actos efectuados ou deliberados para resolver um
problema.
Consequências É o resultado de uma acção ou interacção, ou falta dela.
Adaptado de: Mendes (2009, p. 24).
A utilização desta técnica de codificação, foi criticada por Glasser (2003), por entenderque “força” os dados e a teoria, que na sua opinião devem emergir de forma natural.
Contudo, outros autores refutam esta perspectiva, referindo que tal como o
conhecimento evolui, também as metodologias devem ser revistas e reexaminadas,
melhor explicadas e clarificadas, contribuindo para melhor ciência (Scott, 2004;
Martins, 2008).
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Codificação Selectiva ou de Nível III
Para Strauss e Corbin (2008), codificar selectivamente, é o processo de integrar e de
refinar as categorias para que adquiram a forma de teoria. Os dados categorizados nos processos anteriores são integrados e reduzidos a uma categoria central com poder
analítico, que representa o tema principal da pesquisa. A redução de dados a conceitos,
a transformação destes em categorias e subcategorias, que permitem identificar uma
categoria central, e todas as relações que se estabelecem neste processo, possibilitam
criar uma teoria explicativa do fenómeno em estudo.
Os autores atrás citados, referem que a categoria central é uma abstracção, consiste no
produto de toda a análise, sintetizado em algumas palavras, que parecem ilustrar,explicar e representar a temática principal da investigação.
Estes autores referem ainda algumas características particulares da categoria central:
Deve possuir poder analítico e aglutinador de todas as outras categorias, que têm
de se poder relacionar com ela, formando um todo com capacidade explicativa;
Aparece frequentemente nos dados, em todos os casos ou na maioria, há indícios
que referem o conceito; A explicação que se desenvolve da interacção das categorias não resulta de
dados forçados, é sólida e lógica;
Deve ser capaz de explicar grande parte da variação dentro das categorias, assim
como o foco principal evidenciado pelos dados, embora as condições variem a
explicação permanece consistente e segura;
O nome ou frase utilizado para descrever a categoria deve ser necessariamente
abstracto, podendo desta forma ser utilizado para produzir investigação noutrasáreas substantivas, e contribuir para o desenvolvimento de uma teoria mais
geral;
O refinamento analítico por meio da integração com outros conceitos, deve
permitir a ampliação da teoria em profundidade, compreensão e poder
explicativo.
Escolher a categoria central é sem dúvida uma tarefa difícil. O distanciamento dos
dados para perceber qual é a ideia central que surge, é importante nesta fase.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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2 – MÉTODOS
A metodologia seleccionada garante o sentido de visão, que o investigador quer seguir
com a pesquisa (Strauss e Corbin, 2008), esse objectivo foi cumprido no capítulo
anterior, aí explanámos os princípios subjacentes à metodologia escolhida para a
resposta à nossa questão de investigação.
Os autores citados, referem que as etapas, as técnicas e os procedimentos (método), por
outro lado fornecem os meios para transformar a visão em realidade, reflectindo o
percurso a desenvolver no decurso da investigação, esta é a finalidade deste capítulo.
O enfoque nos processos a utilizar para a recolha de informação e para o tratamento da
mesma, assume um papel fulcral no projecto de investigação, uma vez que essa
definição dita muitas vezes o sucesso da investigação (Streubert e Carpenter, 2002).
Nesta terceira parte do trabalho, propomo-nos descrever o tipo de estudo que realizámos
e o contexto do seu desenvolvimento. Definimos o processo de selecção das fontes de
informação, e as várias abordagens utilizadas para a colheita da mesma.
Reservamos ainda um espaço para, a descrição da estratégia de análise e validação da
informação que utilizámos. Os procedimentos formais e éticos, tal como outras
considerações que cumprimos para a realização do nosso estudo, serão também aqui
abordados.
2.1. – QUESTÃO DE INVESTIGAÇÃO, OBJECTIVOS E TIPO DE ESTUDO
O fenómeno da Enfermagem Pré-Hospitalar, está inscrito nas raízes da profissão,
contudo até há pouco tempo, nunca tinha sido definido como uma área do exercício
profissional em Portugal. Embora seja um campo de actuação muito específico e
particular, a documentação, a regulação, a literatura, os estudos, as normas e boas práticas dos cuidados contam com poucas publicações em termos globais (Miró e
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Burillo-Putze, 2012), sendo que este problema se agrava quando escrutinamos o
contexto nacional.
Mesmo no âmbito das profissões da área da saúde, abundam uma série de ideias e“mitos” associados a este exercício profissional que revelam algum desconhecimento
deste campo de actuação dos enfermeiros. No nosso país, embora a actividade pré-
hospitalar como a conhecemos hoje, em parte, já conte com aproximadamente duas
décadas, continuamos a perceber muitas indefinições, muitas dúvidas, e algumas
incertezas relativamente ao futuro desta prática profissional, o que revela alguma
complexidade inerente.
Mas, porque é que isto acontece? Como é que os enfermeiros deste exercício profissional percebem a actividade? Como a definem? Quem consideram como
interventores neste exercício? Que competências os diferenciam de outros
interventores? Que consequências percebem da sua acção?
Queremos assim, cumprir a finalidade de analisar o contexto onde se inscreve o
exercício da enfermagem pré-hospitalar, queremos conhecê-lo melhor, e contribuir para
o tentar definir.
Estas inquietudes, permitiram-nos definir à partida, o foco inicial desta investigação “ o
contexto do exercício pré-hospitalar dos enfermeiros”, que pretende esclarecer os
seguintes objectivos:
Analisar o contexto da prática de enfermagem no pré-hospitalar;
Estabelecer algumas comparações do exercício da actividade pré-hospitalar em
Portugal com contextos internacionais semelhantes e diferentes;
Descobrir conceitos do contexto da actividade pré-hospitalar de enfermagem;
Para dar resposta a estes objectivos, formulámos a seguinte questão de pesquisa inicial:
“Como é percebido o exercício pré-hospitalar dos e pelos enfermeiros?”
Já referimos que é um tipo de questão que claramente sugere uma abordagem do tipo
qualitativo. As opiniões, as percepções, as convicções, as relações, um contexto
socioprofissional, não produzem dados mensuráveis, objectivos, precisos, nem estes são
obtidos através do entendimento corrente.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Temos visto que os métodos qualitativos, são indicados quando o fenómeno em estudo
é complexo, de natureza social e não tende à quantificação, quando o entendimento do
contexto social e cultural é um elemento importante para a investigação, quando
precisamos centrar a nossa atenção na compreensão absoluta de um fenómeno, e ainda
quando precisamos conhecer melhor determinada realidade e os estudos na área
temática são escassos (Streubert e Carpenter, 2002).
De entre as várias abordagens qualitativas, a escolha recaiu na “Grounded Theory”. A
opção teve em conta a intenção de realizar um estudo que privilegiasse os dados e a
acção, que em consequência, permitisse olhar para além do comum e atingir uma nova
compreensão do contexto do exercício pré-hospitalar dos enfermeiros tentando
conceptualizá-lo e se possível teorizá-lo.
Os dados que se esperavam, eram dados complexos que se relacionam com ideias,
representações, significações, abstracções, construções, que dão sentido ao existencial
humano e social, acrescentando novas perspectivas à reflexão e compreensão do
fenómeno (Martins, 2008), isto quer dizer, como referimos no capítulo anterior, que o
próprio decorrer do processo de investigação delimitou o estudo e redefiniu de algum
modo o foco da pesquisa permitindo-nos uma visão mais ampla e esclarecida dofenómeno.
Nesse sentido, o uso da “Grounded Theory” para explorar os processos sociais da
enfermagem que se apresentam com as interacções humanas, examinando a riqueza e a
diversidade da experiência humana, foi igualmente de extrema importância, até porque,
“por um lado, a necessidade que a enfermagem tem, enquanto profissão edisciplina de conceptualizar as suas práticas para, desse modo , afirmar a sua
especificidade: e por outro as características dos problemas com que lida, ou seja situações complexas, que envolvem diversos actores e múltiplas variáveisde natureza diversa (…) ju stifica o uso de uma metodologia que responda em
simultâneo quer a uma quer a outra destas vertentes fundamentais.” (Lopes,2003, p. 63)
Sintetizando, trata-se de um estudo exploratório, descritivo, a realizar com uma
abordagem dedutiva, interpretativa e indutiva, utilizando a “Grounded Theory” como
referencial metodológico para a recolha, análise de dados e sistematização da
informação na perspectiva de Strauss e Corbin (2008).
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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2.2. - CONTEXTO E DESENVOLVIMENTO DO ESTUDO
A definição de um âmbito para a realização do estudo, é um passo fundamental quando
se faz investigação. Por querermos ampliar o conhecimento de um dos domínios de
intervenção da Enfermagem, elegemos como contexto para o estudo, o exercício pré-
hospitalar da enfermagem.
A Enfermagem Pré-Hospitalar em Portugal exerce-se de forma organizada na estrutura
do INEM, entidade responsável por coordenar o SIEM e por dotar - em cooperação com
outras entidades intervenientes - o sistema de recursos humanos, materiais e
equipamentos para responder às exigências da sociedade actual.
Os enfermeiros fazem parte, entre outros, dos recursos humanos intervenientes nos
meios que o INEM detém para dar resposta ao SIEM. Desses meios constam, Motos,
Ambulâncias de Suporte Básico de Vida (SBV), Ambulâncias SIV, VMER, HEM, e
Unidades Móveis de Intervenção Psicológica de Emergência (UMIPE). No caso de
situações de excepção contam ainda com Viaturas de Intervenção em Catástrofe (VIC),
e um Hospital de campanha (Costa, 2011; INEM, 2012).
Os enfermeiros operam especificamente no contexto das Ambulâncias SIV, nas VMER
nos HEM, na VIC e no Hospital de Campanha, o INEM (2012) define estes meios da
seguinte forma.
A Ambulância SIV tem por missão garantir cuidados de saúde diferenciados, tais como
manobras de reanimação. A tripulação é constituída por um enfermeiro e um tripulante
de ambulância de emergência, e visa optimizar os cuidados prestados em ambiente pré-
hospitalar às pessoas, se necessário até estar disponível uma equipa com capacidade
para Suporte Avançado de Vida (SAV). Dispõe de um monitor desfibrilhador, diversos
fármacos e capacidade de transmissão de electrocardiograma e sinais vitais.
A VMER é um veículo de intervenção pré-hospitalar, que permite o transporte rápido
de uma equipa médica ao local onde se encontra a pessoa. A equipa é composta por um
médico e um enfermeiro que dispõem de equipamento de SAV. As VMER actuam na
dependência directa dos Centros de Orientação de Doentes Urgentes (CODU), mas têm base hospitalar. Pretendem a estabilização pré-hospitalar e acompanhamento médico no
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transporte para as pessoas vítimas de acidente ou doença súbita em situações de
emergência.
O HEM é utilizado no transporte de doentes graves entre unidades de saúde (transportesecundário), ou entre o local da ocorrência e a unidade de saúde (transporte primário). A
tripulação é constituída por um médico, um enfermeiro e dois pilotos, estão equipados
com material de SAV.
A VIC é utilizada em situações com múltiplas vítimas. Transporta no seu interior,
diversos materiais de SAV similar ao da VMER, que permite a montagem de um Posto
Médico Avançado (PMA), com capacidade para tratar 8 pessoas. Possui ainda uma
célula de telecomunicações que permite criar uma rede de comunicações com asdiversas entidades intervenientes no SIEM.
O Hospital de Campanha é uma estrutura móvel composta por várias partes
armazenadas num contentor de um veículo longo quando está inactiva, possibilitando
assim o seu fácil transporte por via aérea, marítima ou terrestre. Constituído por 17
tendas insufláveis modulares, com uma área de 2400 m2, pode ser montado total ou
parcialmente de acordo com a necessidade. Para além da estrutura hospitalar, inclui
zona de alojamento da equipa e zona de comando da operação. Está dotado de
equipamento que lhe garante autonomia logística (geradores, purificação de água,
iluminação, unidades de climatização, de pressão positiva, cozinhas de campanha, casas
de banho, depósitos de água, combustíveis, etc.). É uma estrutura pré-hospitalar
multifacetada para intervenção nacional e internacional, que possui as seguintes
valências: Admissão e Triagem, Reanimação, dotada de três camas com possibilidade
de ventilação, Ambulatório destinado a patologias ligeiras, Pequena Cirurgia/Ortopedia,
Serviço de Observação, Bloco Operatório, Unidade de Cuidados Intensivos com 5
camas, quatro Enfermarias de 10 camas, Imagiologia, Laboratório para exames
hematológicos e bioquímicos, com capacidade total de 60 camas.
São estes os contextos operacionais da actividade pré-hospitalar dos enfermeiros.
Assim, seleccionámos para realizar este estudo um conjunto de profissionais que
intervêm nestes âmbitos na região do Algarve, por ser a mais acessível à investigadora.
No entanto, não deixámos de considerar o contacto que a investigadora tem comquaisquer outros âmbitos do trabalho pré-hospitalar para a recolha de informação: tanto
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Para além deste método de recolha de informação, utilizámos a legislação, e normativas
nacionais e internacionais relativas ao exercício pré-hospitalar, publicações e literatura
sobre o contexto.
A entrevista informal e a observação participante da pesquisadora na qualidade de
interventora na área, registadas sob a forma de notas de campo num “caderno da
pesquisadora”, também foram incluídas gradualmente quando necessário ao
demonstrarem a sua acuidade no estudo.
A inclusão dos investigadores como fonte de dados ao realizar observação,
reconhecendo-se a sua subjectividade na pesquisa, é referida e defendida por Strauss e
Corbin (2008). Contemporaneamente aceita-se esta intervenção, pela presença demomentos de descoberta e redescoberta, a busca de informação não é vista como neutra
ou objectiva, analisam-se os fenómenos no seu meio natural, a investigação é entendida
como um processo interactivo, dependente do poder e dos valores (Fernandes e Maia,
2001). Contudo, a objectividade é acrescentada quando os investigadores se
comprometem a minimizar a sua intromissão na análise, utilizando sistematicamente os
passos previstos na metodologia e tendo o cuidado de “dar voz” aos participantes.
A observação consiste em seleccionar e registar comportamentos de um conjunto de
actores num determinado contexto. Entende-se que os observadores gerem a sua
orientação de forma deliberada, sendo nessa altura instrumentos de recolha de dados no
terreno, que registam os acontecimentos através das notas de campo (Mendes, 2009,
citando Fortin, 2000). Assim as notas de campo definem-se como anotações realizadas
pelos investigadores, tornando-se parte integrante dos dados (Streubert e Carpenter,
2002).
Como referimos, inicialmente estabelecemos contacto com operacionais da região do
Algarve na actividade pré-hospitalar, tanto no INEM, como no Hospital de Faro EPE.
Por pretendermos confirmar dados internacionalmente, estabelecemos contacto pessoal
ou por “email ” com sistemas que utilizam enfermeiros no pré-hospitalar em França, em
Espanha, na Suécia e na Holanda.
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sujeitos. O uso de termos como participantes ou informantes ilustra a posição que os
investigadores qualitativos subscrevem”.
Seleccionámos os informantes, através de critérios que permitissem uma relação de proximidade com o fenómeno em estudo, os critérios de operacionalidade na área de
exercício, de coordenação da mesma, de maior competência na formação e facilidade de
expressão, foram alguns dos considerados. O que vai de encontro, ao que a abordagem
metodológica sugere, Streubert e Carpenter (2002) referem que a escolha dos
participantes, deve recair em pessoas que pelo seu papel, postura, experiência e
capacidade de expressão, garantam qualidade da informação a recolher.
Para cumprir os propósitos desta pesquisa, começámos por abordar através da entrevistacom recurso ao já enunciado guião semi-estruturado (Apêndice III) 10 profissionais de
Enfermagem Pré-Hospitalar a operar no Algarve, recorremos aos que actuam no
contexto das VMER, aos que agem nos meios na dependência directa do INEM, no
âmbito das ambulâncias SIV e HEM 5, sendo que destes seleccionámos alguns que
também tenham assumido funções no CODU, “back office”, formação e coordenação.
A emergência de alguns conceitos e categorias, bem como os indícios da categoria
central no decurso da interpelação dos informantes, revelou a necessidade de incluirmos
como fonte de informação enfermeiros que tivessem algumas responsabilidades na
gestão deste exercício pré-hospitalar, e também que explanassem o posicionamento da
Tutela de Enfermagem (Ordem dos Enfermeiros). Nesta selecção adicional de
informantes entrevistámos mais dois enfermeiros utilizando o mesmo guião de
entrevista (Apêndice III), uma vez que pretendemos apenas alargar as perspectivas da
informação. Relativamente à questão da gestão do exercício, por questões de
proximidade mantivemos o critério regional no contacto, mas nas questões da tutela
optámos pelo âmbito nacional. Estabeleceu-se o critério de estes informantes serem
também operacionais deste contexto prático do exercício de enfermagem.
As entrevistas decorreram entre o dia 19 de Agosto e o dia 1 de Novembro de 2010,
num total de doze entrevistas, com uma duração média de 35 minutos, tendo a mais
curta 24 minutos e a mais longa 43 minutos.
Ocorreram em momento e local favorável ao informante e ao investigador. Nessesentido ocorreu sempre um contacto telefónico prévio em que se explanaram os
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objectivos da colaboração, se solicitou verbalmente o consentimento informado
(assinado posteriormente no dia do encontro – Apêndice IV) e se definiram estratégias
para a entrevista propriamente dita.
Os motivos para a escolha da abordagem aos profissionais do Algarve, e as
características da selecção, prendem-se com o facto de esta região ser a área de
intervenção da pesquisadora. Deste modo, temos um melhor conhecimento dos
profissionais, da estrutura hierárquica e administrativa que os tutela, um melhor
conhecimento da cobertura de meios pré-hospitalares da região, para além de termos
proximidade da área de residência. Estes factores foram tidos em conta, uma vez que
facilitaram o acesso aos que considerámos bons informantes, enriquecendo a qualidade
de informação colhida, favorecendo o cumprimento de prazos. Características
consideradas importantes na selecção dos informantes neste método (Lopes, 2003;
Martins, 2008; Strauss e Corbin, 2008; Mendes, 2009).
A nível internacional, no que diz respeito a contextos onde existe intervenção dos
enfermeiros, pela facilidade de contacto por razões de amizade com profissionais
médicos do exercício pré-hospitalar em França e Espanha (Dr. Patrick Hertgen e Drª
Ruth Munoz), por “email ” solicitámos a estes a distribuição de um pequenoquestionário com questões abertas a enfermeiros deste campo de actuação (Apêndice
V). A pesquisa na “web” de estudos relacionados com o exercício pré-hospitalar levou-
nos ainda a estabelecer contacto por “email ” com um investigador Sueco, o Enfermeiro
Mats Holmberg, a quem solicitámos ajuda na distribuição do mesmo questionário
(Apêndice V), solicitação prontamente atendida com a distribuição do questionário na
sua base. Tentámos ainda o contacto por “email ” com dois enfermeiros holandeses,
sem qualquer resposta. Esta recolha de informação decorreu nos meses de Outubro e Novembro de 2010.
Caracterização dos Informantes
A caracterização dos informantes é feita com base nas suas características socio-
demográficas, no seu perfil de intervenção e tempo de exercício profissional. A
Ilustração 3 com a Tabela nº 1 que se segue resume as principais especificidades.
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utilizados códigos simbólicos (reticências) para a designação de pausas e hesitações no
discurso.
Usámos na análise o já referenciado Modelo Paradigma de Codificação, desta forma otexto “Word ” foi sublinhado com diferentes cores representativas das unidades de
registo e conceitos encontrados, formatado com uma margem direita de seis centímetros
que permitiu a anotação de referenciais para o primeiro nível de codificação selectiva.
Estas unidades de registo foram posteriormente transpostas para novos ficheiros
“Word ” com cores representativas da codificação axial em categorias e subcategorias,
formatados igualmente com uma margem direita que possibilitou a anotação da procura
das várias ligações e interligações entre os conceitos, as categorias e subcategorias,
possibilitando a descoberta do conceito central que explica o contexto em estudo. As
unidades de registo das entrevistas ilustrativas dos resultados, serão identificadas neste
trabalho através da letra E seguida do número atribuído ao informante, como por
exemplo E4.
No “caderno da investigadora” também fomos anotando ao longo do processo,
múltiplas notas de campo, memorandos e esquemas expressivos da análise que fomos
efectuando até chegarmos a diagramas finais representativos do fenómeno. O resultadodessa análise surge no capítulo seguinte, que intitulamos de “navegando...”.
Já enunciámos que considerámos adicionalmente, o uso de algumas estratégias de
validação que segundo muitos autores permitem aumentar o rigor, a coerência e a
generalização dos resultados (Streubert e Carpenter, 2002; Scott, 2004; Strauss e
Corbin, 2008), assim, de acordo com a metodologia cumprimos algumas etapas:
Validação dos conceitos nos dados; Validação com os participantes individualmente;
Validação com outros investigadores, neste caso, com colegas peritos da área e
com o orientador do estudo, que também já utilizou a metodologia;
“Focus Group” com informantes privilegiados na informação fornecida para a
validação dos resultados.
Verificámos a necessidade de ampliar a análise com a validação individual dos
resultados obtidos com todos os entrevistados, devolvendo-lhes a entrevista e os
resultados da categorização por “email ” e após contacto telefónico. Obtivemos apenas
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resultados parciais nesta validação, uma vez que apenas seis entrevistados responderam
ao nosso apelo.
A estratégia de alcançar redundância na informação colhida e na análise que ia sendoelaborada, conseguiu-se ainda com a validação da interpretação dos dados com o
orientador deste trabalho, e com duas peritas da área a exercer funções noutra latitude
geográfica no território nacional, para isso enviámos por “email ” a estas peritas duas
entrevistas transcritas e um organigrama rudimentar de análise, solicitámos-lhe a
realização do seu próprio organigrama analítico, este plano também nos permitiu
confirmar a categorização e ampliar conceitos.
Este propósito também se reflectiu na troca de experiências e opiniões informais comoutros elementos da equipa de trabalho pré-hospitalar, como por exemplo alguns
médicos durante os turnos de trabalho da investigadora na actividade pré-hospitalar.
No sentido de verificar ainda de forma mais reflexiva a análise empreendida, realizámos
um “Focus Group” final com os entrevistados que residiam no Algarve, para a
validação da informação e categorização obtida. O resultado desta estratégia foi
condicionado pela disponibilidade dos entrevistados, que possibilitou a reunião conjunta
unicamente com três elementos. No entanto, desse encontro, da troca de informação
individual com os entrevistados nas mudanças ocasionais de turno no decorrer do
exercício profissional pré-hospitalar, e após contactos telefónicos estabelecidos com a
entrevistadora por mais cinco informantes, obtiveram-se importantes contributos para a
investigação, permitindo confirmar conceitos e alargar dimensões do trabalho.
O retorno ao campo para refinar e consolidar as categorias foi um procedimento que a
metodologia preconiza e que se utilizou em vários momentos neste estudo, com a
repetida audição áudio das entrevistas, no sentido de apreender sentido às expressões e à
categorização efectuada. A comparação do modelo teórico emergente com a literatura e
investigação existentes, e com as opiniões dos enfermeiros recolhidas
internacionalmente que foram alvo de análise similar, foram o “passo final” para
aumentar a consistência e validade do estudo. Um trabalho de análise da informação que
só será realçado posteriormente, quando se fizer a discussão dos resultados.
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As asserções das opiniões dos enfermeiros recolhidas internacionalmente, aparecerão
citadas neste documento através da letra F, seguida do número atribuído ao informante,
tomando como exemplo F2.
Convém agora clarificar aspectos dos procedimentos éticos e formais que tivemos em
conta.
2.5. – PROCEDIMENTOS ÉTICOS E FORMAIS
No que respeita à investigação as considerações éticas são sempre de consideraçãocrítica. O comprometimento com um estudo de investigação implica à partida, a
responsabilidade pessoal e profissional de assegurar um desenho consistente do ponto
de vista ético e moral (Streubert e Carpenter, 2002).
Solicitámos autorização para o contacto com os informantes à tutela hierárquica dos
profissionais (Apêndice I) por “email ”, em que se anexou o guião com perguntas
orientadoras, quer no Hospital de Faro EPE, quer no INEM, a que obtivemos prontas
respostas positivas (Apêndice II). Este procedimento, não invalidou a abordagem
informal prévia dos participantes seleccionados, no sentido de conhecer a sua
disponibilidade para a participação no estudo.
O mesmo “email ” traduzido na língua adequada (francês, inglês e espanhol), a que se
anexou o já citado questionário com três questões abertas (Apêndice V), foi também
utilizado no contacto pessoal que estabelecemos com os sistemas que utilizam
enfermeiros no pré-hospitalar em França, em Espanha, na Suécia e na Holanda.
Depois de acordada a realização da entrevista, para a sua execução, não dispensámos a
leitura do documento em que consta o pedido do consentimento informado que foi
assinado (Apêndice IV), a explicitação dos objectivos, a garantia de novo da
voluntariedade da participação. Face aos objectivos do estudo, a confidencialidade dos
dados e o anonimato, bem como a possibilidade de em qualquer momento retirar a sua
entrevista da investigação, também foram acauteladas em conversa prévia ao início da
entrevista.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
68
No final da conversa, não deixámos de agradecer aos entrevistados a sua participação
nesta pesquisa.
Mesmo fazendo uma revisão ética inicial, as ponderações e reflexões éticasimprevisíveis, despontam sempre dentro do contexto de um estudo, podendo constituir
limitações à investigação, respeitámos o compromisso de estar atentos a estas
possibilidades gerindo a resposta às mesmas com o uso apropriado dos dados. As
limitações surgidas serão enunciadas apenas na conclusão.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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3 – NAVEGANDO... - APRESENTAÇÃO DA INFORMAÇÃO OBTIDA
A audácia para iniciar este capítulo do trabalho não foi uma decisão fácil, a insegurança,
a dúvida e a incerteza sobre a classificação de dados obtidos foram sentimentos difíceis
de controlar, contudo, foi uma resolução necessária para progredir nesta tarefa. Para
isso, socorremo-nos da ajuda dos autores da “Grounded Theory” que estamos a seguir,
Strauss e Corbin (2008, p. 239), referem que na altura de decidir escrever a história
analítica do fenómeno, “a classificação pode até levantar algumas dúvidas sobre a
história analítica ou apontar algumas quebras na lógica. Se isso ocorrer, o pesquisador
não deve-se desencorajar; o pior que pode acontecer é a história analítica tornar-se
qualificada e, dessa forma aperfeiçoada.” É esse aperfeiçoamento que almejamos ter
atingido escrevendo este capítulo.
Pretendemos que esta parte do trabalho constitua o âmago da investigação em torno do
primeiro objectivo. Aqui vamos apresentar passo a passo os resultados de várias rotas
traçadas rumo ao esclarecimento do fenómeno em estudo. Ambicionamos objectivar deforma narrativa, os conceitos, as categorias encontradas, as suas propriedades e
dimensões, começar por induzir algumas preposições e a sua variabilidade, explanando
os critérios, as reflexões e o raciocínio que lhe deram origem.
Esta é a oportunidade, de tentar começar a perspectivar uma conceptualização do
Exercício da Enfermagem Pré-Hospitalar, expondo em texto muitas das anotações
riscadas e redigidas em papel, digitadas e redigitadas, diagramadas múltiplas vezes no
“caderno da pesquisadora” e em vários ficheiros do computador. Desta forma,
arriscamos conceptualizar a natureza de uma realidade analisando-a através dos olhares
e sentires dos seus intervenientes no campo, buscando a concepção dos processos que
lhe estão subjacentes e a sua conectividade, explicitando sempre as estratégias que nos
permitiram produzir este conhecimento.
Do título deste capítulo faz parte o termo “NAVEGANDO...” justifica-se por dois
motivos. Por um lado é uma terminologia associada à “diáspora” portuguesa dos
descobrimentos, cada viagem de navegação proporciona descobertas, novos mundos,
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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entrevistados, frisam as particularidades da complexidade da actividade pré-hospitalar
em asserções como as que se seguem.
E6 “(...) não é a mesma coisa actuar num contexto... de rua, digamosassim... de, de pré-hospitalar, do que actuar digamos assim num ambiente
em que há, digamos um contexto controlado... que... onde há um conjunto
de recursos que estão adaptados à... e que estão disponíveis para podermos,
digamos intervir de uma forma mais adequada... (...)”
E11 “relativamente às pessoas intervenientes e... ao processo de
funcionamento (...) o modelo de activação (...) penso que quando estamos a
falar nisso tudo (...) se montarmos aqui um teatro (...) em que estão presentes para além de uma... das equipas do INEM de SAV, SIV, SBV e
outras equipas dos Bombeiros de SBV, do desencarceramento, a autoridade
e etc... nomeadamente elementos do CDOS [Comando Distrital de
Operações de Socorro]... eu acho que nós temos, nós temos as pessoas
necessárias, temos os meios necessários, temos a orgânica necessária e... o
sistema, o sistema integrado de emergência, ele existe (...)”
E12 “o pré-hospitalar (...) interage com... outras situações e mais
propriamente com outras instituições... porque trabalhamos fora do
hospital, e fora do hospital nós temos depois, dependendo do cenário, temos
outros interlocutores... com quem temos de interagir.”
Relativamente a esta categoria, considerando a dinâmica da intervenção, o objecto da
intervenção e o espaço da intervenção, percebemos que engloba claramente três
subcategorias que caracterizam de forma mais explícita este ambiente de trabalho dos
enfermeiros. Observemos a primeira.
No que respeita à estrutura orgânica que edifica este campo de acção, verifica-se que os
enfermeiros actuam nesta área num contexto muito mais complexo e lato,
nomeadamente, de intervenção em equipa pluridisciplinar que é a base desustentação de uma dinâmica conhecida como SIEM, onde a maioria dos entrevistados
Intervenção Pluridisciplinar
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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E9 “(...) porque no pré-hospitalar é muito importante que haja
organização. Que haja definição de, de... que haja alguém que... saiba ter o
papel de leader naquela equipa.”
E9 “num determinado cenário... o facto de a equipa conseguir funcionar
(...) sem haver atropelos, sem haver confusões... aí consegue-se perceber a
forma como é que a equipa está a trabalhar. Portanto é muito importante
que saibam ouvir, que saibam reconhecer aquela pessoa que é mais
diferenciada e que deve ser o leader... e ... e pronto que trabalhem bem
juntos...“
Como vimos, o contexto do exercício pré-hospitalar, é uma área a que está implícita atomada de decisão partilhada, com base nas competências individuais, mas está
preconizado um modelo de liderança com um “team leader” , os entrevistados dizem
que em contexto de SAV, VMER ou HEM esse papel é habitualmente atribuído ao
médico.
E2 “(...) claro que cada um tem a sua competência, o médico continua a ser
o team leader, ou aquele que, que... responsável pelas decisões, embora
numa situação multivítimas a coisa possa ser diferente.”
Já no âmbito de intervenção SIV, os enfermeiros referem que esta função é parte
das suas atribuições.
E1 “temos de ser nós a liderar aquela equipa, ou seja, saber (...) avaliar a
vítima (...) fazer a primeira abordagem (...) pôr acessos e depois informar o
médico [regulador] , é aí que é a grande diferença, coisas que não
acontecem no hospital (...)”
E3 “os meios SIV (...) em que o enfermeiro é... enfim…, para além de “team
leader ” , é ele... as mãos (...) os olhos (...) o cérebro... naturalmente... em
ligação com o médico regulador do CODU, mas...no local e a, e a frieza,
tudo aquilo que tem de ser feito de forma assertiva cabe ao enfermeiro.”
Os enfermeiros também referem que neste contexto pluridisciplinar, a liderança e a
responsabilidade têm muitas vezes em conta a necessidade de articulação funcional
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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dos vários actores, acontecendo frequentemente um esbatimento de fronteiras nas
funções.
E5 “Muitas vezes há coisas que escapam e falham e é preciso que este segundo elemento, com este mesmo nível de conhecimentos ( … ) sugira, que
alerte… que alguma coisa está a fugir ao procedimento… que estava
previsto ou que é aquilo que está pré estabelecido… ”
E6 “(...) há zonas onde a interpenetração, onde, digamos a articulação
funcional tem de ser de tal maneira que as coisas acabam por ser um pouco
diluídas”
E8 ” Até pode ser visto como uma questão positiva, ou seja, as coisas já
estão de tal forma abrangidas por todos e todos nós conseguimos abranger,
não há interrupções nos cuidados em que chegamos a um ponto em que
cada um começa o seu e acaba o do outro.“
As relações são a base fundamental no desenvolvimento saudável de qualquer
actividade profissional. O ambiente laboral é composto por humanos que interagem,
pelo que as relações que se estabelecem, devem ser relações positivas, mas, sabemostambém que são relações que precisam de ajustamentos em alguns momentos.
No que respeita a esta questão, os enfermeiros referem que a sua experiência pessoal é
maioritariamente de boas relações no exercício da actividade pré-hospitalar.
E7 “(...) tenho boas relações com todas as classes...”
E8 “... a relação que se tem vindo a produzir com todos estes intervenientes
a nível das equipas do pré-hospitalar... cada vez estão a ser maisextraordinárias (...)”
E10 “(...) eu não tenho tido qualquer tipo de problema interpessoal, e só
tenho de realçar que tem sido muito positivo esse trabalho em equipa.”
Referenciam as boas relações como fundamentais para o bom desempenho da
equipa pluridisciplinar nesta prática profissional, pois contribuem na prossecução do
objectivo comum.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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E3 “essas relações têm forçosamente de ser relações saudáveis, relações
cordiais, relações que se baseiem na confiança... da equipa, entre os vários
elementos não é.”
E2 “(...) é impensável em ter relações de discórdia... mais não seja
enquanto se está a trabalhar no local. (...) não é possível de se trabalhar
em, nessa, nessa situação.”
Os entrevistados referem até que neste campo de acção, têm relações menos
estratificadas do ponto de vista hierárquico – mais de “igual para igual” em que cada
um contribui com a sua experiência, as suas competências e conhecimentos específicos
para atingir o mesmo objectivo em equipa.
E2 “ ( ...) deixa de haver aquela relação clássica de médico e enfermeiro de,
de... ou de enfermeiro superior ao técnico, ou de médico superior ao
enfermeiro (...) começa a ser uma relação mais de igual para igual, claro
que cada um tem a sua competência (...) mas trabalha-se muito mais em
equipa, as decisões são tomadas muito mais em conjunto.”
Embora as relações sejam predominantemente positivas, a existência de algumascrispações ou atritos também é referenciada. É descrita como natural ao desempenho,
tendo em conta as relações humanas, a interdependência da articulação funcional, e o
“stress” associado à necessidade de celeridade de procedimentos típica desta área
profissional.
E4 “(...) há pequenos ajustes como em todas as coisas, há sempre ajustes
a... cada cenário tem sempre os seus... os seus... problemas a resolver e as
suas pequenas correcções a... para resolver (...)”
E9 “(...) vai havendo menos conflitos. (...) ainda os há... em determinadas...
entre instituições, entre as pessoas e...”
E10 “ (...) reconheço que muitas vezes não há uma empatia global...”
E11 “(..,) as relações (...) também são condicionadas por agentes externos
(...) o stress (...) a necessidade de... de estabelecer procedimentos de forma
atempada (...) a personalidade das pessoas intervenientes.”
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Alguns enfermeiros referem que essas crispações, são mais comuns nos “bastidores”
do campo de acção do que no terreno. O sentido profissional dos intervenientes e o bom
senso fruto da experiência, por norma imperam, conseguindo-se a eficácia pretendida no
desempenho das equipas pluridisciplinares.
E6 “(...) as pessoas genericamente têm bom senso (...) quando nós estamos
perante uma vítima que precisa de nós, eu acho que tendemos todos
naturalmente (...) a concentrar-se efectivamente naquilo que é importante
para a vítima (...) colocamos claramente para segundo plano aquilo que
são todas estas questões que são meramente acessórias de tudo isto.”
E8 “(...) [as relações] estão a ser mais extraordinárias porque aocontrário... às vezes nos bastidores poderá haver mais guerras de cada um
dos intervenientes (...) mas, a nível do campo, do terreno...”
Os entrevistados referem que para este relacionamento profissional efectivo, contribui a
relação interpessoal que todos os intervenientes têm localmente ou regionalmente. O
bom ambiente de trabalho e a boa articulação de todos os intervenientes, é favorecido
pelo conhecimento pessoal uns dos outros, sendo mais fácil relacionarem-se e terem
confiança mútua.
E9 “Eu acho que... cada vez vai havendo menos conflito, também porque já
se... as pessoas já se vão conhecendo, já se vão relacionando umas com as
outras, já vão tendo mais confiança no trabalho dos outros...”
E12 “ Agora todos nós nos conhecemos e conhecemos não só pela parte
profissional, conhecemos um bocado... (...). fora do contexto de trabalho, e
isto facilita muito... a intervenção em termos de... de contexto pré-
hospitalar.”
Vejamos neste momento o que diz respeito à segunda subcategoria.
A actividade pré-hospitalar visa dar resposta à generalidade das situações de emergênciaque possam surgir socialmente. Assim, a intervenção a este nível faz-se respondendo a
Intervenção abrangente no ciclo vital
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Nota de Campo: 2010/10/03 – Reunião informal de enfermeiros de
VMER, reflectem para a realização de um trabalho numas jornadas e
referem que este é um contexto de trabalho desafiante, que responde: à
pediatria; à obstetrícia; à psiquiatria; à neonatologia; à área médica que
engloba, doença súbita, doença crónica, doenças associadas ao
envelhecimento e cuidados paliativos; ao trauma; às situações de
excepção e catástrofe, etc.
Os alvos de cuidados dos enfermeiros são identificados por estes, não só como a
pessoa que vive a situação emergente, mas também a sua família e a comunidade ,
integrada no seu ambiente. Podemos constatá-lo em afirmações como as que se seguem.
E1 “Muitas vezes quem precisa de ajuda não é a pessoa é a família que está
à volta, é toda aquela gente que gira à volta daquela pessoa...”
E2 “(...)o que é que lhes está a acontecer... estando a pessoa consciente ou
com os familiares (...)”
Segundo os entrevistados, estes alvos de cuidados podem encontrar-se em qualquer
das fases do ciclo vital desde o nascimento até à morte. Esta perspectiva é referida por um dos entrevistados concretamente, e é sugerida por outros em muitos dos
exemplos de acção que citam, é ainda alvo das suas reflexões.
E5 “Sim desde pediátricos… a geriátricos…”
E3 “… a mãe teve apoio... pré e pós parto… a criança, foi -lhe dada toda a
atenção possível e … pronto... foi uma vida ajudada por nós.”
Nota de Campo: 2010/10/03 - Reunião informal de enfermeiros de VMER,reflectem para a realização de um trabalho numas jornadas e referem que
este é um contexto de trabalho complexo que intervém em situações desde o
nascimento até à morte.
O objectivo do exercício pré-hospitalar, é responder à globalidade das situações de
emergência em saúde da sociedade, inclusive situações multivítimas ou de excepção em
que se passa do paradigma da urgência individual para a urgência colectiva, já
referenciadas em afirmações anteriores. Assim, contestar as necessidades da pessoa em
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- Actores:Interventores do SIEM; intervençãoclínica com dois elementos.
- Responsabilidades:partilhada; todos os interventoresimportantes; hierarquia da
responsabilidade; modelo de liderançacom “team leader” ; articulaçãofuncional.
- Relações:fundamentais ao bom desempenho;menos estratificadashierarquicamente; crispações e atritosmais comuns aos bastidores;favorecidas pelo conhecimentopessoal.
SUBCATEGORIA
INTERVENÇÃO ABRANGENTENO CICLO VITAL
- Necessidades de cuidados:várias índoles patológicas esociais.
- Alvos de Cuidados:a pessoa, a família e a
comunidade; eventos do ciclovital do nascimento à morte.
- Pessoa em situação crítica:elevado grau decomplexidade; aptidões para aintervenção; competênciaspara além da intervenção napessoa em situação crítica.
SUBCATEGORIA
DIVERSOS ESPAÇOS DETRABALHO
Diversos espaços físicos;cuidados hospitalaresemergentes nestesespaços; desafioprofissional; necessáriapreparação e
competênciasespecíficas
Paralelamente à diversidade deste contexto de acção, percebido quem dele faz parte,
quando acontece e onde, os informadores identificam um conjunto de mediadores que
intervêm no seu exercício nesta actividade. Enunciamos seguidamente a nossa segunda
categoria, a dos mediadores.
Os mediadores são variáveis que actuam no contexto, têm de alguma forma a
capacidade de ingerência no mesmo mobilizando a sua influência. São um conjunto de
aspectos que permitem o exercício pré-hospitalar dos enfermeiros, explicativos de como
acontece.
CATEGORIA 2 – CONDIÇÕES INTERVENIENTES
OS MEDIADORES
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Os enfermeiros mostram-nos um contexto que se diferencia bastante dos seus
tradicionais campos de exercício profissional. A actividade pré-hospitalar acontece no
ambiente pluridisciplinar do SIEM: bastante mais complexo e ampliado no número de
actores, mas com intervenção clínica muitas vezes limitada a dois elementos; em que as
responsabilidades são partilhadas num modelo de liderança com “team leader”, em
estreita relação e articulação funcional dos intervenientes. Um contexto de permanente
desafio, que abrange a resposta da saúde a todos os eventos do ciclo vital das pessoas,
família e comunidade, sobretudo os emergentes. Onde quer que esses eventos
aconteçam fora da esfera hospitalar. Um âmbito de intervenção que exige assim, um
forte empenhamento no cumprimento dos seus propósitos.
O desempenho profissional neste campo de acção conta com vários factores
intervenientes: a diferenciação da formação académica dos enfermeiros, que contudo
tem grandes lacunas na formação específica da área; a experiência clínica hospitalar dos
enfermeiros, que deve caber num perfil de estreito contacto com a pessoa em situação
crítica sob pena de perda de eficácia no exercício; a evolução da prática pré-hospitalar,
que se fez com o recurso à prática hospitalar a que o desempenho dos enfermeiros está
implícito, contribuindo estes com diversas funções, desde a formação à área
operacional; a comparação com outros contextos mundiais justifica a acção dos
enfermeiros, mas diferencia-os no reconhecimento, nas responsabilidades e nas
competências. Todo este processo, de mediação e influências ambíguas na acção, impõe
aos enfermeiros uma necessidade de maior dedicação ao desempenho.
Este conjunto de condições específicas do contexto, e os factores intervenientes
reconhecidos na acção, exigem um grande investimento dos enfermeiros neste campo de
exercício profissional. Esta constatação revela-nos, que o exercício pré hospitalar dosenfermeiros é um contexto de esforço contínuo de afirmação profissional, o que
constitui a categoria central do fenómeno que estudamos.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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E5 “A nível da enfermagem sinto… sinto… realmente que há um grande
investimento desta classe nesta área.”
E8 “(...) temos um problema grave que é onde é que começa a fronteira,
onde é que começa a... as funções de uma actividade profissional e acabam
as outras. (...) no nosso caso muito específico acontece também este
problema (...) o problema é um problema social que está a acontecer comquem integrou outras actividades... (...)”
E11 “(...) se nos voltássemos a lembrar desta conversa que tivemos hoje,
que o papel dos enfermeiros já fosse mais significante, mais importante e
mais bem definido não é nesta questão do pré-hospitalar.”
Definido o contexto onde acontece o fenómeno, com quem e quando, respondida a
questão de como ele ocorre, para completar o seu entendimento, falta responder àquestão porquê. A apresentação daquilo que os enfermeiros consideram as causas
directas deste contínuo esforço de afirmação profissional, vai permitir-nos uma melhor
compreensão da categoria central. Aparece assim a terceira categoria.
Os entrevistados, apontam porquês ao fenómeno, revelam o que o determina, aludem a
algumas razões quando reflectem sobre o seu exercício profissional no pré hospitalar.
Emergiram quatro principais motivos que constituem as subcategorias em que se divide
esta categoria.
A primeira é a que culpabiliza a formação específica da actividade pré hospitalar.
CATEGORIA CENTRAL
EXERCÍCIO DE ENFERMAGEM PRÉ-HOSPITALAR
ESFORÇO CONTÍNUO DE AFIRMAÇÃO PROFISIONAL
CATEGORIA 3 – CONDIÇÕES CAUSAIS
FOCOS CAUSAIS
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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constituem um obstáculo à afirmação profissional. Não há consideração dos enfermeiros
em geral pela actividade, e os enfermeiros dos vários meios de emergência pré-
hospitalar demonstram falta de coesão da classe profissional.
E9 “(...) uma das barreiras muitas das vezes são a visão que os próprios
enfermeiros têm dos enfermeiros que andam no pré-hospitalar... e a forma
como eles se relacionam.”
E11 “(...) com esta situação da situação específica da SIV, em que a gente
teve de criar a... o nosso espaço, em que depois... criaram-se ou pré-
estabeleceram-se ideias em relação aos enfermeiros da SIV e à SIV. (...)
sem conhecer o, realmente o valor de cada um, ou... ou do global.“
E12 “O 1º entrave é logo a própria mentalidade do enfermeiro... do
profissional que... não encara o pré-hospitalar como um todo. Encara
com... ou seja se eu fizer SIV estou a um nível, mas se fizer Viatura médica
sou um enfermeiro acima... desse nível, e se fizer helicóptero realmente
estou a um nível superior...”
A própria filosofia da profissão muito arreigada no chavão tradicionalista do cuidar emalgumas facções da sociedade profissional, querendo afastar-se do contexto das
necessidades biomédicas que atribuem ao contexto da emergência pré-hospitalar,
segundo os informantes, tem sido um obstáculo á união dos enfermeiros para se
afirmarem e regulamentarem a actividade.
E9 “...é um bocado difícil nós conseguirmos perceber onde é que nós
podemos fazer a diferença ou o que é que nós podemos definir como o
nosso papel em termos de pré-hospitalar. (...) existe muito a ideia do pré-
hospitalar do fazer, do fazer rápido... do tomar decisões e da técnica... e
nós sabemos que em termos de enfermagem não é só isso a enfermagem não
é... temos a parte do cuidar e (...) é que eu acho que é um bocado difícil nós
definirmos o que é cuidar no pré-hospitalar (...)“
Os registos de intervenção são um aspecto fundamental na demonstração da
efectividade de qualquer actividade profissional, sendo hoje considerados um elemento
fundamental na acreditação da qualidade em qualquer âmbito. Segundo os
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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muito nós conseguirmos... realmente definir qual é que é que é o papel
existente neste momento...”
Ainda neste âmbito das ameaças externas ao seu desempenho, os entrevistados percepcionam as hipotéticas mudanças de modelos de intervenção, como ajustamentos
políticos de cariz economicista, considerando que trazem prejuízo às pessoas e à
enfermagem, exigindo-lhes o tal empenhamento na justificação da sua importância para
o sistema.
E6 “Direi que oficialmente, politicamente as coisas extremaram-se um
pouco efectivamente... direi que... neste momento porque, parece haver
efectivamente alguma, algum balanço de ajustamento funcional... as coisasestão... formalmente não estão muito serenas, sobretudo entre, nalguns
domínios entre os enfermeiros e o técnicos de ambulância de emergência.”
E8 “(...) se calhar em termos políticos traria alguma, algum interesse numa
questão provavelmente economicista, mas em termos da dignidade e da
capacidade de cuidar doentes, e de fazer com que os doentes efectivamente
os doentes consigam ganhar, e qualidade à partida, qualidade de cuidados
a nível de pré-hospitalar (...)”
A definição desta categoria por “focos causais”, tentou afastar -se um pouco da relação
pura de “causa-efeito” como determinadores do fenómeno. De facto, a complexidade
deste contexto não nos permite a leviandade de circunscrever a relação a esta fórmula.
Identificámos assim um conjunto de factores que, na perspectiva dos enfermeiros,
alicerçada na sua vivência do contexto com as suas interferências, foram focos
motivadores, que sobressaem ao longo de todo o processo, e por isso, estão na sua
génese.
Importa agora observarmos a representação gráfica desta categoria.
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- Lacunas na formaçãoinicial:porque é insuficiente epouco profunda;porque é de curtaduração; porque é
indiferenciada para osinterventores
- Dificuldade emrealizar FormaçãoContínua:porque é poucodisponível no contextoprofissional; porquenão é organizada;porque a que existetem cariz avaliativo;
porque tem elevadoscustos económicos e érealizada com prejuízodos tempos livres;porque não háformação reconhecidapela tutela ; fazempercurso autodidacta
SUBCATGORIA
INDEFINIÇÕES DAACTIVIDADE
- No exercício profissional: porque não há definiçãoformal de referencial decompetências; porque aindefinição causa conflitos;são responsabilidades da
tutela; porque aindefinição prejudicaperformances; tem origemna falta de coesãoprofissional; tem origem nafilosofia da profissão
- Ausência do registosistemático dasintervenções: porque registos são nulosexcepto SIV; porque não
Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
113
A formação oriunda da manutenção da experiência e prática clínica, que permite
manter actualizar e adquirir competências para a excelência de cuidados.
E4 “(...) sempre proveitoso aproveitar a experiência clínica de quemtrabalha dentro das 4 paredes de um hospital e transportar essaexperiência clínica para a rua.”
E5 “Eh pá por toda a formação académica que têm, por toda aexperiência intra-hospitalar que têm… por todas as situações que já
passaram…”
E8 “(...) temos uma preparação e um conhecimento diário que, e
naturalmente depois a partir da parte da teoria (...)”
A formação pós graduada específica neste campo do exercício profissional é
inexistente no nosso país, mas, os informantes consideram essencial como estratégia de
afirmação profissional realizá-la, assim, frequentam os cursos que mais proximidade
têm com a área.
Nota de campo : Na recolha de dados sociodemográficos na VMER de
Faro, que a investigadora realizou no contexto de elaboração do Plano de
Formação em Serviço de que é responsável, constata-se que a maioria dosenfermeiros, possui ou frequenta formação pós graduada, sobretudo na
área do doente crítico, com pós graduações em urgência/emergência,
cuidados intensivos, pós licenciaturas de especialização em enfermagem
médico cirúrgica. A frequência de outros estudos pós graduados como,
Especialização em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria ou
Pediatria, são outras áreas que os enfermeiros referem escolher por serem
do âmbito de intervenção no contexto pré-hospitalar.
Mas, neste seguimento do esforço, os enfermeiros não deixam de considerar
estrategicamente essencial na afirmação das suas competências, o desenvolvimento de
um contexto académico específico que contemple a actividade pré hospitalar.
E4 “Tanto a F aculdade de Medicina como as Escolas de Enfermagem são
as que têm mais capacidade e deveriam iniciar esse processo de
especialização na área da emergência hospitalar e pré-hospitalar para
poder dar ao país um nível de formação mais diferenciado e todos os
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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nos falar e de nos ajudar não é!!...Sem dúvida que a questão relacional
influencia a dinâmica operacional, uma coisa influencia a out ra.“
Outro mecanismo que os enfermeiros seleccionam neste âmbito de acção da estratégiade trabalho de equipa, é o incremento pelo respeito da inter-dependência funcional da
actividade, fomentado na formação segundo os mesmos princípios orientadores e
“ guidelines ” , que permite responder aos focos causais (categoria 3), trazendo alguma
uniformização ao trabalho e evitando divergências de actuação.
E2 “(...) o curso é muito semelhante, mais específico para médico e
enfermeiro do que para os técnicos... mas... todos vamos para o mesmo
objectivo, todos temos a formação no mesmo âmbito, na mesma forma deabordar a vítima... e essas guidelines, fazem-nos obrigar, e vamos assim
trabalhar em equipa, trabalhar para o mesmo objectivo.”
Por último, mas não menos importante surge a última subcategoria.
Os enfermeiros consideram que o seu grande trunfo neste empenho na afirmação
profissional nesta actividade, passa pela própria essência da enfermagem, pela sua
capacidade de prestar cuidados mais abrangentes, prestar cuidados dirigidos à
globalidade dos problemas das pessoas, e não apenas à resolução de sinais e sintomas
clínicos que motivam um pedido de ajuda. Esta convicção é visível quando referem que
a sua estratégia é de distinção dos outros profissionais, por conseguirem uma
intervenção que considera variáveis para além das óbvias e imediatas, para isso utilizam
expressões no âmbito do “cuidar”, da “visão holística”, de “olhar a pessoa como um
todo”.
E3 “Não vamos fazer aquilo que a gente chama por regra o tratament o
sintomático, não é. Nós tratamos a pessoa no seu todo. E nesse sentido,
obviamente que nos distinguimos de qualquer outro técnico.”
E5 “na minha perspectiva a profissão de enfermagem dentro desses
intervenientes que existem no pré hospitalar parece-me ser a mais
abrangente. (…) parece-me ser aquela que consegue de uma forma
Prestação de Cuidados Globais
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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optimizar, sermos bons observadores (...) Portanto há pormenores, sempre
coisas, há sempre mais alguma coisa que a gente pode fazer (...)”
Nesta prestação de cuidados abrangente, os informantes consideram a amplitude dosalvos de cuidados. Referem ser fundamental para além da pessoa ou das pessoas, ter em
conta também a atenção ao ambiente e família, isto permite-lhes melhorar a condição
das pessoas, reduzindo níveis de ansiedade.
E4 “Não custa nada quando nós saímos, quando nós metemos o doente
dentro da ambulância dizer à família, olhe nós vamos para aquele hospital,
(...) podemos eventualmente dizer qual é a nossa suspeita do problema de
saúde... estamos a tentar diminuir o sofrimento... estas palavras muitas dasvezes são... são vitais, são importantes, são, são um conforto que nós
conseguimos dar às pessoas...”
E 6 “Porque a questão quase nunca se cinge àquela pessoa que tem aquele
problema muito específico, há uma envolvência sempre... quer em relação à
pessoa, quer ao contexto daquela pessoa ou daquelas pessoas que têm
aquela situação de emergência...”
E8 “(...) se nós tentarmos olhar para o doente como um todo, equilibramos
o doente, temos atenção à família, temos necessidade de saber em que
contexto é que aquele utente... se insere...”
Esta estratégia de prestação de cuidados globais com todas as suas variáveis, permite
uma intervenção mais consubstanciada e metodológica, fazendo uso do juízo clínico
estruturado, que determina o sucesso de qualquer intervenção.
E9 “muitas das vezes é aí tu fazes a diferença, da forma como tu consegues
analisar aquilo, dos teus conhecimentos que tu tens também, alguns em
termos clínicos, consegues perceber se calhar mais facilmente o que é que
se passa com aquela pessoa, consegues se calhar resolver a situação ali...”
E10 “do pouco tempo que nós estamos com as pessoas… naqueles…
naqueles… pequenos minutos ou… algumas vezes horas, o que nós
desenvolvemos autonomamente é sem dúvida essa parte, é a parte dequerermos conhecer… o problema mais profundamente (...)”
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uniformização da prática- Formação da experiência e práticaclínica
- Formação Pós Graduada:Frequentam cursos de maiorproximidade da área; sugerem anecessidade de desenvolver contextoacadémico específico
- Formação Periódica e Certificação deCompetências:
Consolida o saber.
SUBCATEGORIA
TRABALHO EM EQUIPA
- Aptidão mais desenvolvida
nos enfermeiros; perícia nasrelações interpessoaisfacilita-o; fomentado pelaformação de todos os actoressegundo as mesmas linhasorientadoras
SUBCATEGORIA
PRESTAÇÃO DECUIDADOS GLOBAIS
- Essência daenfermagem: habilidade oriunda daformação académica
- Capacidade de atençãoao pormenor
- Atenção ao ambiente efamília
- Uso do juízo clínicoestruturado
- Capacidade de actuarpor protocolos e "guidelines"
Terminada a exposição das estratégias que os enfermeiros seleccionam, neste
movimento contínuo de esforço de afirmação no exercício profissional na emergência
médica pré hospitalar, falta apresentar a última categoria deste fenómeno, que reflecteos resultados da sua dinâmica de acção. Observemos então a quinta categoria.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
121
E8 “...é o serviço de urgência de um hospital, transpô-lo para fora e levá-
lo... de uma forma um bocadinho proactiva...”
Os entrevistados consideram assim, que o seu exercício profissional nesta área deactividade proporciona, cuidados precoces segundo as boas práticas. O cumprimento
da “legis artis” e das “ guidelines” de cuidados mais diferenciados, e dos tempos de
intervenção mais adequados, são possíveis com este modelo de intervenção.
E1 “(...) temos a capacidade de muitas vezes seguir o que já foi investigado
e foi provado que estava bem, é aí que nós fazemos a diferença!”
E3 “(...) enfartes, situações de Vias Verdes, AVCs, muitos mais... são
identificadas muito previamente por nós, o que faz com que, o tempo de
evolução da doença seja menor e o tempo de recuperação... e de mazelas da
pessoa… doente … também seja claramente menor.”
Segundo os enfermeiros, esta precocidade de intervenção profissional, pode mesmo ter
um impacto significativo ao nível da mortalidade e da morbilidade , sobretudo das
pessoas em situação crítica.
E1 “em situações críticas de edemas a gudos em que nós temos que actuar
(...) situações de enfartes (...) e o profissionalismo naquilo que se faz... (...)
os nossos conhecimentos e as competências que temos, fazem a diferença...
e muitas vezes é aquela diferença entre a vida e a morte...”
E6 “Para quem como eu iniciou a actividade profissional numa urgência
num outro tempo, numa outra realidade, percebe que apesar de tudo hoje
há... digamos uma diminuição séria da morbilidade, digamos assim. (...)
percebe-se claramente o estado em que chega uma vítima à urgência vindo
acompanhada por uma equipa VMER ou não (...) há alguma diferença e eu
acho que isto são ganhos que... eu não tenho dúvidas (...)”
A qualidade e a segurança de cuidados, também são asseguradas nesta precocidade de
intervenção segundo as boas práticas pela experiência hospitalar dos enfermeiros.
E1 “E acima de tudo o cid adão, o utente, o cliente, a vítima ganha um
enfermeiro ao pé dele, onde ele precisa!“
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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E12 “...somos digamos uma profissão que abrange muitas áreas e temos
um conhecimento muito geral na área da saúde, era uma mais valia saber
aproveitá-los.”
Este desaproveitamento de recursos humanos reiterado, manifesta-se na decepção dos
enfermeiros com a evolução do exercício profissional nacional no sistema/organização.
Há profissionais insatisfeitos e desmotivados.
E6 “é um país pobre na forma como efectivamente... passa a vida a... a não
aprender com os seus próprios erros e com os erros que outros vão
cometendo não é...”
E7 “se queres fazer enfermagem ou pré-hospitalar tens de ter a outra parte
que te ajude, tanto política, como financeira, como... tudo, isso dá todo um
suporte que tem de ser... agora como é, eu sinto por vezes, não é
reconhecido a esse nível, por isso essas barreiras vão surgir sempre.”
Fica nesta categoria também demonstrada a complexidade e ambiguidade deste contexto
do exercício, tal como vinha a ser descrito, permanecendo o confronto entre os focos
causais não resolvidos por estratégias sugeridas, mas não implementadas. Continuandoassim evidente, o reflexo na necessidade de continuidade do compromisso com a
afirmação profissional dos enfermeiros no presente.
Na página que se segue podemos ver a síntese gráfica desta categoria na Ilustração 10 –
Tabela 6.
Está quase pronta a apresentação dos vários conceitos, e categorias explicativo do
fenómeno, tal como o percebemos. Talvez seja útil apresentar a sua representação
gráfica até ao momento, podemos observá-lo agora na Ilustração 11 – Diagrama 3 já
composto com todas as categorias.
A globalidade e a conjuntura do fenómeno estão agora mais perto do seu entendimento
após a apresentação das várias categorias e subcategorias. Nesta conturbada navegação,
aproximamo-nos agora do tão desejado porto de abrigo, o espaço da completa
explicação do fenómeno em estudo.
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- Cuidados Hospitalares no terreno:impacto na morbilidade e mortalidadena pessoa situação crítica; qualidade esegurança de cuidados
- Continuidade de cuidados:conhecimento das necessidades de
cuidados e mecanismos do sistema;encaminhamento para estruturasadequadas; antecipar cuidados edirecionar precocemente intervenções
- Cuidados multidimensionais:proporcionam bem estar às pessoas
SUBCATEGORIA
PARA OS ENFERMEIROS
- Evolução do desempenhoprofissional:voto de confiança com oprojecto SIV
- Reconhecimento Social
- Incertezas, quebra deexpectativas, desmotivaçãoe frustrações: perda de funções no CODU;défice de enquadramentolegal e dificuldadesformativas; desadequaçãodos protocolos de actuaçãoface às competências;protocolos condicionam aautonomia da prática
SUBCATEGORIA
PARA OSISTEMA/ORGANIZAÇÃO
- Diferenciação decuidados da rede desocorro pré-hospitalar:uso mais racional dosserviços de saúde
Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
132
Esta dinâmica vai objectivando a continuidade da influência entre as várias categorias,
que por outro lado também mantém interligações dominantes entre si. Nomeadamente:
entre as especificidades, as estratégias e as consequências; os mediadores, as estratégias
e as consequências; os focos causais e as consequências. São ainda visíveis interligações
não dominantes com efeitos de retro alimentação entre as consequências, as estratégias
e os focos causais, que mantêm activo este esforço de afirmação profissional.
Embora o aspecto gráfico sugira muita complexidão, estas interligações não são difíceis
de entender. As especificidades (complexidade) do contexto do exercício na emergência
pré hospitalar estão intimamente interligadas com a ambiguidade dos mediadores que
permitem a acção, e com os focos causais, com preponderâncias e recíprocos efeitos
cumulativos. Assim, propagam influências determinando a necessidade de um maior
empenhamento na afirmação profissional nesta área.
A forte influência entre os mediadores e os focos causais, também está presente,
resultando igualmente num efeito cumulativo. Existe uma proximidade colaborativa
entre os vários aspectos, cuja ambiguidade dificulta a acção neste contexto complexo.
Os estudiosos da “Grounded Theory”, apontam sempre uma forte proximidade entre as
condições causais e intervenientes. Contudo da nossa experiência com estesinformantes, parece-nos haver uma relação mais profunda, de clara influência e
deliberação.
Depois, as estratégias adoptadas ou sugeridas pelos enfermeiros neste esforço contínuo
de afirmação são claramente influenciadas pelas especificidades do contexto, pelos
mediadores de acção e pelas causas da necessidade deste esforço. Contudo, os
resultados deste contínuo esforço de afirmação, sofrem a influência das estratégias, mas
também das condições do fenómeno A complexidade das condições do contexto e a
impossibilidade de concretização de algumas estratégias sugeridas, geram fenómenos de
retro alimentação que mantém a presença e dinâmica do fenómeno activos.
Esta constatação, leva-nos a perceber que a explicação do fenómeno não está ainda
totalmente desocultada, há ainda uma ténue neblina que esconde o porto de abrigo em
que queremos atracar.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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procedimento técnico, mas existe mediante... um conjunto de pressupostos
(...) que têm de estar inerentes.”
Importa verificar a terceira subcategoria.
Todos sabemos que os princípios éticos são, uma pedra basilar no âmbito de qualquer
ambiente laboral. A competência ética é do domínio do código deontológico dos
enfermeiros, e é também muito referenciada pelos entrevistados como necessária ao
desempenho do exercício pré-hospitalar. Emergem das suas afirmações princípioséticos ligados à dignidade humana, como por exemplo: o dever de informar.
E2 “Com a vítima mais importante ainda, ou tão importante para não
permitir que a sua, que a sua condição piore... a pessoa se tiver
conhecimento do que é que se está a passar ou pelo menos que estamos a
fazer o melhor, e ter esse, ter esse conhecimento, explicarmos o que é que
estamos a fazer, tudo isso... vai diminuir muito o seu stress (...) a meterem-
lhe cintas à volta e a espetarem-lhe agulhas no corpo e a meterem-lhe
coisas pelo nariz, e ele não souber o que é que lhe estão a fazer, os seus
níveis de stress vão aumentar muito mais... é importantíssimo haver esta
explicação, esta relação com a pessoa que... que o enfermeiro está
habilitado a fazer.“
E7 “(...) a transmissão da informação do médico para o utente, ou o doente
é um bocado fria, e é por isso que o enfermeiro está aí para... para aquecer
um bocadinho essa informação. (...) ajustamos a nossa informação às
condições do utente, isso é uma das coisas que nós enfermeiros aprendemos
(...) acho que isso é uma coisa que escapa um bocado a outras áreas de
saúde.”
A garantia dos direitos das pessoas e da não maleficência.
E5 “por exemplo de situações de maus tratos… (...) mas muitas vezes, ter a
capacidade de verificar que aquilo que somos activados ou o mecanismo de
Competências Éticas
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- Princípios éticosligados à dignidadehumana:Dever de informar;direitos das pessoas enãomaleficência;dignidadehumana nos hábitos,cultura, pudor,vivência da morte
SUBCATEGORIA
COMPETÊNCIASDE AJUDA PELA
RELAÇÃO
- Necessidade daintervenção:Recursos:empatia,intervençãopsicológica,aptidãocomunicacional,toque;intervenção noprocesso de luto;mais preparaçãopela suaformação
SUBACATEGORIA
RECONHECIMENTODE CAPACIDADEPROFISSIONAL
INTRÍNSECA
- Percepção da suacapacidade deIntervenção
Qualquer actividade profissional conta com os seus recursos para o exercício. Num
contexto de esforço de afirmação profissional, estes têm tendência a realçar-se no
sentido da confirmação de habilidades de intervenção. Neste sentido, os enfermeiros
enfatizam todas as suas normais aptidões profissionais para confirmar a acção neste
contexto. Referem ter um sentimento intrínseco de capacidade profissional para agir
nesta área. Possuir, competências técnicas, científicas, éticas, e uma habilidade muito
própria da enfermagem, a competência de ajuda pela relação que consideram de grande
utilidade neste exercício profissional.
Este esclarecimento adicional da categoria central, pode ser apresentado graficamente
desta forma.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Ilustração 14 - Diagrama 5 - A Categoria Central Percepcionada pelos Enfermeiros
É seguramente útil passar á representação gráfica total do fenómeno (Ilustração 15 –
Dagrama 7) incluindo os conceitos que acabámos de definir, mostrando assim o nosso
porto de abrigo depois desta encrespada navegação nos dados.
Com esta representação gráfica, pretendemos finalmente desembarcar no tal porto
seguro, completando a explanação do fenómeno como o observámos através das ondas
de dados das entrevistas dos enfermeiros e da observação participante. Recordando, que
na investigação com recurso à “Grounded”, o investigador não é uma parede branca,
está repleta de “grafittis”, inscrições, rabiscos e correcções, ou seja, a análise e a
edificação dos resultados têm um cariz seu, estão presentes as suas experiências, as suas
vivências, alguns dos seus sentimentos e provavelmente até as suas expectativas.Pensamos que as práticas, as percepções, as intuições e as experiências de partilha de
informação que nos dispusemos a explorar nesta parte do trabalho, foram devidamente
escrutinadas, tendo conseguido demonstrar a complexidade de que ainda se reveste a
intervenção neste âmbito profissional.
Exercício pré-hospitalar dosenfermeiros -
Esforço contínuode afirmaçãoprofissional
CompetênciasTécnicas
CompetênciasCientíficas
CompetênciasÉticas
Competênciasde Ajuda pela
Relação
Reconhecimentode Capacidade
Profissionalintrínseca
7/23/2019 Enfermagem Pre Hospitalar - Afirmacao Profissional 2012 Tese
Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Pudemos, compreender melhor o contexto do exercício pré hospitalar da enfermagem,
um ambiente de esforço contínuo de afirmação profissional. Esta necessidade de
constante empenhamento dos enfermeiros acontece, num meio de especificidades, com
diferenças na pluridisciplinaridade da acção no âmbito do SIEM, com a abrangência da
intervenção pluripatológica no ciclo vital, e amplitude geográfica. Esta intervenção
recorre a mediadores de acção ambíguos como a formação académica que tem lacunas,
a experiência clínica que deve centrar-se no doente crítico, a evolução da prática pré-
hospitalar ou a comparação da intervenção com outros contextos internacionais,
impondo assim, maior complexidade e empenhamento na afirmação profissional. Na
opinião dos enfermeiros, as causas deste desafio acrescido, provêm da influência da
ambiguidade dos intervenientes que resultam em lacunas na formação específica,indefinições no exercício da actividade, baixo estatuto social da enfermagem e
percepção de ameaças externas por parte de outros interventores.
Os enfermeiros desenvolvem e propõem estratégias de resposta, com base nas condições
anteriores, particularmente nos focos causais, referenciam a formação, o trabalho em
equipa, e a prestação de cuidados globais. Sendo esta última definida como essência da
enfermagem, revelam o recurso à sua capacidade de atenção ao pormenor, à extensão do
cuidado ao ambiente e família, ao uso da sua habilidade no juízo clínico e na actuação por protocolos. A intervenção dos enfermeiros e as suas estratégias têm resultados, que
se fazem sentir nas pessoas que são alvos dos seus cuidados, nos enfermeiros e na
organização do SIEM.
No entanto, ficou também claro que estes resultados não são apenas positivos para os
enfermeiros e para a organização, observam-se frustrações e desajustamentos no
aproveitamento de recursos organizacionais, que são retroalimentados pelos focos
causais sem estratégias eficazes na resposta, como as indefinições da actividade.Justifica-se assim, a permanência e continuidade deste esforço de afirmação profissional
por parte dos enfermeiros.
Um esforço que desenvolvem convictos, da sua capacidade de intervenção nesta área,
das suas competências profissionais no domínio técnico, científico, ético e de ajuda pela
relação, aspecto que realçam pela maior exclusividade entre os interventores, e pelo seu
contributo para os cuidados de excelência.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Conduzimos a discussão seguindo os pontos de análise dos dados apresentados,
segundo as categorias, deixando da mesma forma para o final o escrutínio da categoria
central.
É inquestionável que o ambiente de intervenção pré-hospitalar é particular e complexo,
provocando todos os seus intervenientes, particularmente os da área da saúde, uma vez
que os desafia a enfrentar uma grande quantidade de problemas distintos do seuquotidiano, a trabalhar em colaboração com outras instituições, a usar materiais
diferentes dos que habitualmente se utilizam no meio hospitalar e a lidar com a
pluripatologia (Leiva, 2005; Bandeira, 2008; Holmberg e Fagerberg, 2010; Arizona
State Board of Nursing (AZBN), 2011).
Assim, é com naturalidade que confirmamos as afirmações dos nossos entrevistados, de
que o contexto de intervenção pré-hospitalar é diferente do contexto controlado e de
disponibilidade de recursos que vivenciam a nível hospitalar, encontramos também eco
desta perspectiva nas opiniões que recolhemos na Suécia, em França e em Espanha,
como podemos verificar quando um enfermeiro Sueco refere.
F7 “ Pre-hospital environment is unique in the way we see patients in a
different environment than anyone else is familiar with.”
O contexto de intervenção da actividade pré-hospitalar, inscreve-se no âmbito dos
Sistemas de Emergência Médica (SEM), é um contexto pluridisciplinar, tal como ocontexto hospitalar, no entanto é distinto deste nos interventores, nas funções e nas
responsabilidades (Rocha et al , 2003; Committee on the Future of Emergency Care in
the United States Health System (CFECUSHS), 2007; Holmberg e Fagerberg, 2010).
Em Portugal este espaço de acção denomina-se SIEM, coordenado pelo INEM, tem
como missão a prestação do socorro desde o local da ocorrência, o transporte assistido
para o local mais adequado e a articulação entre os vários intervenientes do sistema
(Tribunal de Contas, 2010; Costa, 2011). Como em todos os SEM, corresponde a um
conjunto de entidades que cooperam entre si com o objectivo de prestar assistência às
CATEGORIA 1 – AS ESPECIFICIDADES
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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evocada por um dos enfermeiros franceses (F2) questionados que actua num contexto
com médico, quando diz que em contexto de múltiplas vítimas têm de existir estas
capacidades.
Estas afirmações deixam antever a fundamental necessidade de articulação funcional
entre os intervenientes neste meio da emergência plural, onde as fronteiras no que diz
respeito à responsabilidade não podem ser reduzidas a um qualquer tipo de
procedimento, tratamento ou contexto, tendo de ser partilhadas (Decreto Lei Nº
248/2009) Fica claro o entendimento da complexidade da responsabilidade no contexto
pré-hospitalar onde no âmbito clínico, frequentemente se restringe a
interdisciplinaridade e se resolvem as situações apenas com dois elementos
(médico/enfermeiro ou enfermeiro/tripulante de ambulância de emergência), não
estando assim disponível a colaboração de outros colegas ou profissionais de saúde para
aferir a tomada de decisão (Holmberg e Fagerberg, 2010; Jerry Nolan et al , 2010;
Powell, 2010; Breckwoldt et al , 2011).
Qualquer actividade profissional, vive de relações entre pares, pelas descrições que
temos vindo a fazer, é lógico que esta aptidão é imprescindível nas mais variadas tarefas
neste campo de acção (Ciconet, 2009). Muitos autores referem mesmo que as boasrelações são fundamentais tanto à satisfação pessoal como ao bom desempenho da
equipa, promovendo a qualidade de cuidados, a segurança e o “outcome” (resultados)
das pessoas atendidas a vários níveis (Melby, 2000; Machen, 2007; Manser, 2009).
Neste aspecto relacional, alguns estudos (Kronohage e Linder, 2005; Machen, 2007;
Oliveira, 2011; Schuppen e Bierens, 2011) demonstram ainda que a interdependência
funcional, pela imprescindibilidade do trabalho conjunto, associado ao reduzido
número dos membros da equipa, às diferentes experiências e competências profissionais
dos interventores, e o conhecimento pessoal que têm uns dos outros, favorecem o
verdadeiro trabalho de equipa e a existência de relações talvez até menos estratificadas
e cordiais. No estudo de Machen (2007) entre enfermeiros e paramédicos, é referido o
enorme respeito existente entre ambos, a elevada consideração pelos conhecimentos e
capacidades profissionais de ambos, referindo que a gestão relacional no trabalho de
equipa é feita usando o termo “gentleman’s agreement”.
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Mollebjerg e Rasmussen (2010) reiteram estes conceitos, e explicam a complexidade
deste campo profissional, quando relatam que os enfermeiros, providenciam Suporte
Avançado de Vida, mas também exploram e tratam múltiplas necessidades das pessoas,
com o seu entendimento sobre a situação actual integrada na sua história passada,
garantindo-lhes satisfação e confiança. Numa intervenção que segundo estes autores,
passa cada vez mais pela acção na doença crónica como a diabetes, epilepsia, doenças
cardiovasculares, cerebrovasculares e psiquiátricas. Mas também na prestação de
cuidados de saúde nas situações agudas a toda a comunidade, incluindo as emergências
neonatais, obstétricas, pediátricas, dos adultos, dos idosos, e de todos os outros com
necessidades especiais (Conn, 2009; AZBN, 2011; Kruger et al , 2011). Esta perspectiva
de complexidade também foi partilhada por um dos enfermeiros espanhóis quecontestou o nosso pedido de informação.
F9 “El cuidado de enfer mería pre hospitalario exige participación y por
lo mismo preparación en diferentes áreas, cuidado a problemas
cardiovasculares, respiratorios, neurológicos, emergencias de adultos,
niños y ancianos, catástrofes, atención primaria, nociones de salvamento
y rescate, legislación y bioética, aspectos psicológicos, seguridad en
atenciones de accidentes de tránsito o atentados terroristas”.
Esta afirmação indicia-nos também os alvos de cuidados desta área. Tradicionalmente
neste campo de actuação profissional, identifica-se sobremaneira o cuidado médico e
técnico à pessoa vítima da situação súbita na sua vida (Rocha et al , 2003; Kronohage e
Linder, 2005; Melby e Ryan, 2005; Holmberg e Fagerberg, 2010), mas, na opinião
destes autores, para os enfermeiros esta perspectiva é mais abrangente, uma vez que nos
seus alvos de cuidados englobam sem qualquer sombra de dúvida uma assistênciaglobalizada aos familiares ou pessoas significativas no seu ambiente, tanto em
situações graves como de baixa prioridade.
Esta perspectiva confirmada pelos nossos entrevistados, é também referida por grande
parte dos colegas que questionámos lá fora, sobretudo os Suecos. E começa a estar cada
vez mais na ordem do dia, nomeadamente quando se repensam os SEM a nível mundial,
e se começa a pretender colocar no terreno uma resposta mais integrada com os sistemas
de saúde, com recurso a profissionais clínicos, mesmo em ambulâncias de baixa prioridade, tendo em vista a promoção da saúde.
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Isto tem como objectivo responder ao amplo espectro de situações encontradas pelos
SEM contemporaneamente, visando apenas transportar para os hospitais as pessoas que
realmente precisam, respondendo assim à sobrelotação dos Serviços de Urgência (SU).
Sabemos que acontece desde há largos anos nos países nórdicos como a Suécia, a
Noruega e a Dinamarca (Kronohage e Linder, 2005; Holmberg e Fagerberg, 2010;
Mollebjerg e Rasmussen, 2010), e começa a acontecer no Reino Unido (Machen, 2007),
particularmente na Irlanda e na Escócia (Melby e Ryan, 2005), também em Espanha na
região da Galiza, e é nos últimos anos investigado e proposto para o futuro, por vários
documentos estruturantes da área da saúde e do pré-hospitalar nos Estados Unidos da
América (Committee on the Future of Emergency Care in the United States Health
System [CFECUSHS], 2007; NHTSA, 2009; Committee on the Robert Wood JohnsonFoundation Initiative on the Future Nursing [CRWJFIFN], 2011).
Contudo, a emergência médica pré-hospitalar continua a estar conotada sobretudo com
situações críticas e de grande gravidade, situações em que o tempo urge, e em que a
intervenção se baseia numa “corrida” contra o tempo, para ganhar espaço de manobra
que permita potenciar as funções vitais e a vida das pessoas, quer seja na emergência
médica ou no trauma. (Mollebjerg e Rasmussen, 2010; Kruger et al , 2011; Mollberg et
al , 2011; Sisak et al, 2011; Wesley e Washick, 2012).
Encontrámos também esta percepção nos enfermeiros que entrevistámos, eles associam
este espaço de acção a um elevado grau de complexidade, pela urgência na rapidez
de intervenção, pela diversidade e gravidade dos cuidados, e pela necessidade de
instituir procedimentos técnicos, tendo em vista a optimização do estado clínico da
pessoa. Estas convicções encontram paralelo em múltiplos estudos que tivemos acesso.
São famosos os conceitos de “golden hour” no trauma grave, o “door to baloon” ou“door to needle” na doença cardio e cerebro vascular, a urgência da resposta na
desfibrilhação para as paragens cardiorespiratórias, a necessidade de rapidez e
precocidade de intervenção na sépsis, na insuficiência respiratória aguda, e nas
emergências obstétricas. Tudo isto medido por um conhecido indicador “standard”, o
tempo de resposta inferior a oito minutos (Ting et al , 2008; Bohm et al , 2011; Kruger et
al , 2011; Mollberg et al , 2011; Pothitakis et al , 2011; Gonzalez et al , 2011; Murphy,
Colwell e Pineda, 2012; Wesley e Washick, 2012; Blanchard et al , 2012; Studnek et al ,
2012).
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Neste sentido, os nossos informantes referem que neste ambiente de acção, é preciso
deter capacidades e aptidões para agir assertivamente nos vários cenários da pessoa
em situação crítica. Associam-se usualmente a estes cuidados o foco nas competências
biomédicas (Melby e Ryan, 2005; Holmberg e Fagerberg, 2010), mas, estes autores, e
ainda, Leiva (2005) e Bandeira (2008) definem outras capacidades exigidas para este
domínio do exercício, como, ser flexível, criativo e humilde na abordagem das tarefas,
ter força interior e estabilidade que permita a acção. Rocha et al (2003, p. 698)
completam, que os profissionais desta área devem “demonstrar equilíbrio emocional e
domínio técnico adequado, mesmo em situação de estresse”.
Os entrevistados também referiram, que o leque de competências para o exercício pré-
hospitalar, está muito para além da habilidade de intervenção na pessoa em situação
crítica, até porque nem todas as situações são graves e críticas neste ambiente (Hjalte et
al , 2007; Kruger et al , 2011). Há muitos estudos que referenciam valores de 10 a 20%
para o número de chamadas dos SEM que constituem verdadeiras emergências,
demonstrando-se que os enfermeiros podem ser um excelente recurso na optimização
desse tipo de ocorrências (Suserud e Haljamae, 1999; Melby e Ryan, 2005; Mollebjerg
e Rasmussen, 2010).
Holmberg e Fagerberg (2010) reiteram os entrevistados, mencionando, que para o
cuidado pré-hospitalar dos enfermeiros também é imprescindível a habilidade da relação
significativa com a pessoa. A este propósito, muitos estudos mostram que a área da
emergência pré-hospitalar é muito mais complexa, precisando de capacidades para além
das competências clínicas no cuidar no contexto de emergência (Melby, 2000;
Holmberg e Fagerberg, 2010). O cuidado médico e de enfermagem são centrais na
prática dos enfermeiros, o pensamento cognitivo e as competências técnicas sãofundamentais no seu labor, mas a profissão de enfermagem não pode ser reduzida a este
nível. O cuidar dos enfermeiros pressupõe o encontro com o ser humano, em que o foco
são várias dimensões éticas e morais que emergem da proximidade com a pessoa e
família, o que se tem demonstrado muito útil neste contexto (Holmberg e Fagerberg,
2010).
Nas peculiaridades deste campo do exercício profissional que exigem preparação e
investimento por parte dos enfermeiros, estes referenciaram ainda, a diversidade doespaço físico de trabalho fora das paredes de uma instituição de saúde, expostas a
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
154
múltiplas condições adversas. A este propósito alguns autores referem que, pelo facto
das equipas trabalharem numa área reduzida, muitas vezes em condições inadequadas
(espaço, tempo, recursos humanos, equipamentos e materiais), se verifica que há
necessidade destes profissionais pré-hospitalares terem uma formação adequada, e
desenvolverem conhecimento específico destas actividades (Rocha et al , 2003; Melby e
Ryan 2005; Leiva, 2005; Bandeira 2008; ASTNA, 2010; Holmberg e Fagerberg, 2010;
AZBN, 2011; Breckwoldt et al , 2011). Assim, o desafio é transpor cuidados
hospitalares urgentes para estes espaços de trabalho, demonstrando qualificações
para o desenvolver (Breckwoldt et al , 2011; Franschman et al , 2011; Nutbeam, 2011;
Schuppen e Bierens, 2011). Os enfermeiros têm respondido ao desafio, demonstrando
estas qualificações e capacidades com preparação e competências específicas nosmais variados locais do mundo (Melby e Ryan, 2005; Kronohage e Linder, 2005;
2011; Schuppen e Bierens, 2011). A afirmação de mais um dos respondentes em
Espanha confirma esta perspectiva dos nossos informantes.
F11 “ Mi t rabajo como enfermero pre hospitalario es una extensión de
mi experiencia de hospital a un contexto absolutamente diferente y
desprovisto del espacio físico de un hospital y de todo lo que le
proporciona lo que obliga a una enorme capacidad de adaptación y
flexibilidad técnica y humana”.
As particularidades do contexto pré-hospitalar, deixam antever o seu elevado grau de
complexidade, que requer o desenvolvimento de competências acrescidas por parte dos
enfermeiros para garantir a intervenção (Rocha et al 2003; ASTNA, 2010; AZBN,
2011), pensamos que ficou manifesta esta percepção. Torna-se agora necessário prosseguir este debate identificando os mediadores da intervenção neste meio.
O entendimento de como acontece o exercício pré-hospitalar dos enfermeiros, das
variáveis que o influenciam e determinam, tem sido explorado ao longo do tempo pela
CATEGORIA 2 – OS MEDIADORES
7/23/2019 Enfermagem Pre Hospitalar - Afirmacao Profissional 2012 Tese
Pelas suas características multidimensionais, a formação académica dos enfermeiros
permite ainda prestar cuidados mais abrangentes e satisfatórios para as pessoas neste
contexto (Rocha et al , 2003; ASTNA, 2010; Holmberg e Fagerberg, 2010; Mollebjerg e
Rasmussen, 2010), o que tem permitido optimizar o funcionamento dos sistemasescandinavos e holandês, sobretudo. Uma valia, hoje significativamente procurada para
o futuro, por exemplo pelo sistema Inglês, Americano e também Português, que buscam
um SEM mais integrado nos sistemas de saúde (Bristish Association for Imediate Care,
2008; NHTSA, 2009; Tribunal de Contas, 2010; CRWJFIFN, 2011).
Um enfermeiro Francês que nos respondeu, tem uma expressão que confirma e ilustra
um pouco esta abrangência de cuidados que os enfermeiros dizem procurar e
proporcionar, mas que lhes exige mais investimento neste ambiente.
F3 “cela implique que l’ infirmier travaille dans une puissante routine
gestuelle pour exercer des gestes parfaits tout en étant capable de se
concentrer sur ce qu’il entend, voire de répondre aux questions du patient
dans le même temps. C’est à mon avis une des principales difficultés d u
travail en tant qu’ infirmier en pré hospitalier”.
Contudo, os enfermeiros também são conscientes de muitas lacunas na formaçãoacadémica específica para um melhor desempenho neste campo do exercício
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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profissional, referindo que não os prepara para esta intervenção. Esta área de actividade
embora seja antiga na génese dos profissionais de saúde, esteve adormecida e afastada
durante algum tempo da sua prática pelas mudanças nos paradigmas de acção vigentes,
que durante algumas décadas preconizaram a ida da pessoa aos cuidados de saúde, e não
dos cuidados de saúde à pessoa (Rodríguez, Mendoza e Gil, 2003).
Mas num novo paradigma de cuidados, a actividade pré-hospitalar, é hoje uma área
nova e em expansão (Rocha et al , 2003; Rodriguez, Benito e Peiro, 2003; CRWJFIFN,
2011). Sofreu um forte desenvolvimento nas últimas décadas face à demanda de
cuidados imediatos imposta pela sociedade contemporânea, especialmente no trauma
associado aos acidentes de viação, na emergência médica pelas doenças vasculares
(Oliveira, 2011), e nos últimos anos pelas catástrofes tecnológicas e naturais ocorridas
(11 de Setembro, 11 de Março, Katrina, Tsunami na Ásia), que revelaram fragilidades
na resposta impostas pelo afastamento dos profissionais de saúde do contexto externo às
paredes das instituições de saúde (Leiva, 2005; NHTSA, 2009; Schulz e Koenig, 2009).
Este afastamento deveu-se em grande parte, à ausência de formação específica da
actividade pré-hospitalar na grande maioria dos currículos académicos de base das
profissões de saúde, que segundo muitos autores agora têm urgentemente de integrar edesenvolver esta disciplina (Rocha et al , 2003; Chew, 2009; Wilson, 2009; Schulz e
Koenig, 2009; Andress, 2011; Hyde et al , 2011; Nutbeam, 2011).
Esta ausência curricular dos cursos de base dos enfermeiros, levou algumas associações
de enfermeiros de alguns estados americanos, como é o caso Kentucky Board of
Nursing (2005, p. 4, 5), a dizer “the curricula of prelicensure pratical nurse education
programs do not prepare the licensed practical nurse for practice outside a traditional
healthcare facility; therefore, a licenced pratical who provides care in the prehospital
emergency care environment should hold certification as an EMT or paramedic”,
exigindo-lhes assim formação complementar na área como técnicos de emergência
médica, uma realidade durante alguns anos se estendeu a alguns estados Americanos.
Estas questões atestam o esforço de afirmação profissional dos enfermeiros nesta
actividade também fora de Portugal, e levaram a Emergency Nurses Association (ENA)
e a ASTNA, a tomar posições oficiais que esclarecem o papel dos enfermeiros no
ambiente pré-hospitalar, refutando a exigência de certificados aos enfermeiros como
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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O perfil de competências associado ao serviço de proveniência dos interventores neste
campo do exercício é muito diverso e variável, o que nem sempre permite a melhor
eficiência à intervenção (NHTSA, 2009; Nutbeam, 2011). Neste sentido a literatura
também confirma os nossos achados, quando referenciam o perfil de competências mais
favorável à acção, ligado ao cuidado da pessoa em situação crítica. Na Holanda por
exemplo, os enfermeiros que actuam no pré-hospitalar, provêm e mantêm o seu
desempenho, acumulando funções em Unidades de Cuidados Intensivos (Franschman
et al , 2011; Shuppen e Bierens, 2011), na Suécia e Dinamarca, têm de manter a sua
experiência nos serviços ligados à pessoa em situação crítica, como a Urgência, os
Cuidados Intensivos, o Bloco Operatório, ou mesmo ter especializações em pré-
hospitalar, tiveram preponderância durante muitos anos os enfermeiros anestesistas,uma vez que detêm melhores competências no manuseio da via aérea e administração
de drogas de emergência (Kronohage e Linder, 2005; Mollebjerg e Rasmussen, 2010).
A selecção da experiência clínica na Dinamarca, recai mesmo na selecção destes
enfermeiros anestesistas com um mínimo de 6 anos de prática (Mollebjerg e
Rasmussen, 2010). Segundo Suserud (1998), citado por Kronohage e Linder (2005),
ficou mesmo demonstrado o benefício da experiência clínica e das competências destes
enfermeiros anestesistas, relativamente à intervenção médica e paramédica.
A evolução da prática pré-hospitalar tem acompanhado os progressos e
desenvolvimentos sociais e científicos, tal como as restantes actividades ao longo dos
anos. Particularmente como atrás referimos, nas últimas décadas, em que se percebeu de
novo que as pessoas vítimas de acidentes ou doença súbita beneficiam de uma
intervenção diferenciada precoce no local (NHTSA, 2009; Franschman et al , 2011;
Gonzalez et al , 2011; Oliveira, 2011; Schuppen e Bierens, 2011; Sisak et al , 2011).
Os enfermeiros têm sido chamados a integrar esta evolução desde sempre, em Portugal
o mentor do INEM, Rocha da Silva, desde o início defendeu a necessidade de ter estes
profissionais na rua para qualificar a intervenção pré-hospitalar (Silva, 1984).
Progressivamente em complementaridade com médicos, foram integrando a actividade
nas VMER, e contribuindo para a construção do SIEM Português e para a sua expansão
no território, ainda em complementaridade clínica foram incluídos no serviço de
helitransporte nacional, e mais recentemente com a criação do modelo SIV, sob
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Assim, o ideal seria ter sempre equipas médicas disponíveis, no entanto, os recursos
económicos e humanos não permitem cumprir esse desiderato em todos os sistemas,
pelo que os enfermeiros pela sua experiência e conhecimento têm demonstrado cumprir
de forma muito eficaz esta necessidade (Kronohage e Linder, 2005), há mesmo um
estudo holandês que compara as competências dos médicos e enfermeiros do seu SEM,
que revela não haver assim tantas diferenças nas mesmas, e logicamente que estas se
situam em procedimentos específicos de SAV, dando como exemplo a
pericardiocentese que não faz parte do currículo académico dos enfermeiros (Schuppen
e Bierens, 2011).
Neste contexto evolutivo, os enfermeiros têm sido chamados como referimos a
desempenhar várias funções, respondendo aos vários desafios profissionais que lhe
tem proposto a expansão do sistema. Para além das funções do desempenho clínico de
enfermagem nos vários meios de emergência que operam (veículos rápidos,
ambulâncias e helicóptero), que lhes exigiu formação específica (INEM, 2010; Oliveira,
2011), os entrevistados referiram ter tido de se empenhar para responder à ampliação de
competências que trouxe o desenvolvimento da actividade. Neste momento, as suas
competências são transversais a toda a actividade de emergência médica, desde a
formação, a coordenação, a gestão e área operacional nos vários meios, onde em alguns
também desempenham o papel de liderança de equipas. Foram ainda chamados durante
algum tempo a realizar funções no CODU no acompanhamento dos meios SIV ao local
e às unidades hospitalares, actividade que de forma polémica cessaram em Julho de
2010.
Estas funções, correspondem ao desempenho que encontrámos descrito a nível
internacional, os enfermeiros desempenham um papel fundamental na formação dosenfermeiros e de outros interventores (Melby e Ryan, 2005; NHTSA, 2009; ASTNA,
2010; Mollebjerg e Rasmussen, 2010), função que por exemplo os enfermeiros
espanhóis inquiridos também referenciam de forma muito veemente. Desempenham
ainda cargos na coordenação e gestão do SEM (NHTSA, 2009; ASTNA; 2010), na área
operacional nos vários meios de emergência (veículos rápidos, ambulâncias ou
helicópteros) (Melby e Ryan, 2005; Kronohage e Linder, 2005; Holmberg e Fagerberg,
2010; Franschman et al , 2011; Nutbeam, 2011; Schuppen e Bierens, 2011), e em alguns
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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países como a Suécia, acrescentam também competência clínica às centrais de
emergência (Forslund, Kihlgren e Sorlie, 2006).
Este exercício de comparar os nossos achados com a literatura, é um pouco o espelho doúltimo mediador de intervenção que encontrámos, que é a comparação que os
enfermeiros fazem com outros contextos internacionais, para justificar a sua
intervenção nesta área, pensamos que os dados que temos estado a desfiar da literatura,
são suficientes para confirmar que os enfermeiros sintam, que tal como nos outros SEM
desempenham um papel importante neste campo do exercício profissional. O Tribunal
de Contas (2010, p. 29) na referida auditoria à actividade do INEM evidencia esta
utilidade, quando se refere ao “Socorro Medicalizado, que tal como em outros países,
procura assegurar a assistência pré-hospitalar às vítimas por pessoal médico”.
Contudo, os entrevistados sentem diferenças no reconhecimento do seu trabalho, se
comparado com outros contextos internacionais. Analisando a literatura, de facto se
confrontarmos a implementação da enfermagem pré-hospitalar e o reconhecimento das
suas funções com países como a Suécia ou a Holanda, os enfermeiros têm razão, uma
vez que é notório em muitos estudos nesses países desde há muito, o reconhecimento do
profissionalismo e da elevada qualidade de cuidados que os enfermeiros prestam(Holmberg e Fagerberg, 2010; Franschman et al , 2011). A este propósito, Holmberg e
Fagerberg (2010, p. 1) explicam que, “ bringing RNs into the ambulance service are
judged, according to earlier studies, to lead to a degree of professionalism with a higher
quality of medical care”.
No entanto, se repararmos como vimos atrás, na necessidade das tomadas de posição de
algumas associações americanas de enfermeiros sobre a actividade pré-hospitalar,
percebemos que as dificuldades no reconhecimento também se fazem sentir noutras
latitudes (Wilson, 2009; ASTNA, 2010; AZBN, 2011), justificando o esforço de
afirmação profissional descrito para este fenómeno.
Os enfermeiros também evidenciam que sentem diferenças nas responsabilidades que
lhes são atribuídas pelo sistema. Até agora, embora os enfermeiros existam e sejam
reconhecidos como actores no SIEM nacional, embora figurem como operacionais dos
meios de emergência nas definições do INEM (INEM, 2010; Tribunal de Contas, 2010),
as suas responsabilidades na acção, na regulação e avaliação da actividade têm pouca
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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definição conhecida, aliás a auditoria realizada pelo Tribunal de Contas (2010) à
actividade do INEM dá conta da pouca definição de responsabilidades e normalização
de toda esta área de actividade, faz mesmo referência à inexistência de determinação
concreta de muitas das atribuições do SIEM nacional. O primeiro documento oficial que
faz referência mais concreta aos recursos humanos pré-hospitalares, é o atrás referido
Plano Estratégico dos Recursos Humanos da Emergência Pré-Hospitalar (INEM, 2010),
que é publicado posteriormente à auditoria citada, e surge no mês anterior à recolha de
dados deste trabalho.
A desregulação desta área do exercício profissional para o pessoal clínico é também,
assumidamente reconhecida em alguns países como por exemplo os Estados Unidos e o
Reino Unido, que utilizam preferencialmente um modelo paramédico onde se verifica
neste momento, uma enorme onda de esforços de mudança com a publicação de
múltiplos planos de acção estruturantes para o futuro com maior preponderância de
pessoal e conhecimento clínico (CFECUSHS, 2007; NHTSA, 2009; Nutbeam, 2011;
CRWJFIFN, 2011).
Por outro lado, observa-se uma sustentada e estruturada organização deste campo
profissional em países como a Holanda, a Suécia e a Dinamarca, onde se afirma estar perfeitamente definido e regulamentado o exercício profissional dos enfermeiros, pelos
vários organismos tutelares nacionais competentes (Kronohage, e Linder, 2005;
Holmberg e Fagerberg, 2010; Mollebjerg e Rasmussen, 2010; Franschman et al , 2011;
Schuppen e Bierens, 2011).
Nesta comparação da actividade no plano internacional, os enfermeiros também
comentam as diferenças nas competências atribuídas pelo sistema onde intervêm.
Embora os enfermeiros exerçam actividade pré-hospitalar há mais de 20 anos em
Portugal, o primeiro reconhecimento contemporâneo do exercício pré-hospitalar dos
enfermeiros, data de 2007 do já citado enunciado de posição da Ordem dos
Enfermeiros, vimos também que apenas com o Decreto Lei 248/2009 se atribui aos
enfermeiros este campo do exercício profissional, e só a publicação do Regulamento das
Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem em Pessoa em
Situação Crítica em 2010, dá um vislumbre da intervenção nesta área, introduzindo
inclusive a competência de intervenção em catástrofe (Ordem dos Enfermeiros, 2010).
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Assim, é com naturalidade que entendemos este ambíguo sentimento dos enfermeiros.
A experiência pessoal da autora na actividade confirma-nos a impressão que os
entrevistados citados têm fundamento, quando consideram não estarem definidas ou
optimizadas as competências dos enfermeiros neste campo em Portugal. Consideram
que não lhes é permitido colocar ao dispor da população uma intervenção que vise a
prevenção, que possibilite a triagem e avaliação clínica com utilização de diagnósticos
de enfermagem, com vista à correcta utilização dos recursos de saúde, evitando por
exemplo a sobrelotação das urgências hospitalares. Este défice de optimização dos
recursos do sistema de saúde nacional é uma visão que encontrámos criticada pelo
Tribunal de Contas (2010) no seu relatório, e que percebemos estar mais desenvolvida
em países como a Suécia, a Dinamarca, ou o Reino Unido (British Association forImediate Care, 2008; Holmberg e Fagerberg, 2010; Mollebjerg e Rasmussen, 2010), e
estar em desenvolvimento nos planos estruturantes do sistema de saúde Americano dos
últimos anos (NHTSA, 2009; CRWJFIFN, 2011).
Discutidos os mediadores que permitem a intervenção dos enfermeiros, e
compreendidas as suas idiossincrasias, começa a ser notório o esforço que os
enfermeiros têm granjeado para se afirmarem profissionalmente neste campo. É
indispensável agora analisar na literatura as suas causas.
Os enfermeiros na sua reflexão sobre a actividade pré-hospitalar, tentam obter a
compreensão do porquê deste esforço acrescido de afirmação profissional. Como
pudemos constatar, apontam como primeiro foco de desarmonia, as lacunas na
formação específica e complementar necessária à intervenção.
Já comprovámos anteriormente, que os défices de formação académica específica na
área exigem dos profissionais clínicos do pré-hospitalar, uma formação complementar
que deve ser rigorosa e de qualidade para garantir o cumprimento de práticas de
excelência com base na evidência também no pré-hospitalar (Kronohage e Linder;
2005; Schulz e Koenig, 2009; Andress, 2011; Nutbeam, 2011). A este propósito a
CATEGORIA 3 – OS FOCOS CAUSAIS
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A responsabilidade da Formação em Emergência Médica em Portugal está atribuída
ao INEM, pelas normativas legislativas que regulam a sua actividade (INEM, 2010). No que aos enfermeiros diz respeito, a formação para o Curso de VMER tem uma
duração de duas semanas, e para o Curso SIV quatro semanas, é teórico prática com
posteriores estágios tutelados com o objectivo de cumprir um mínimo de situações de
trauma e emergência médica. Sucintamente, engloba, competências de SAV adulto,
pediátrico e neonatal, protocolos de intervenção em emergências médicas, obstétricas e
trauma, breves enunciados de intervenção em situações de excepção, técnicas de
imobilização e extracção no trauma, noções de salvamento e desencarceramento commétodo SAVER, e comunicações em emergência médica. No caso do helitransporte, o
Curso de Fisiologia de Voo, tem a duração de dois dias e é apenas teórico.
Embora reconheçam qualidade à formação do INEM, os informantes encontram
lacunas na formação complementar, classificam-na de insuficiente e pouco profunda
para fazer de facto a necessária diferença na intervenção, referem ser pouco organizada
e algo avulsa. Podemos recordá-lo.
E10 “Barreiras e obstáculos. Existem algun s (...) Nomeadamente (..). na
componente de formação deveria ser (...) mais... objectiva (...) mais
profunda, acho que falta formação ainda aos enfermeiros... na parte do pré-
hospitalar penso eu que podemos melhorar nesse sentido.”
Se pensarmos em todo o conteúdo programático enunciado, e recorrendo à experiência
da autora como formadora neste contexto, parece-nos que de facto os cursos têm curta
duração para responder aos desafios propostos diariamente pela actividade pré-hospitalar, particularmente na área pediátrica, obstétrica, neonatal e da catástrofe.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Assim, se observarmos os vários cursos modulares internacionais que cobrem as várias
valências da temática, disponibilizados também em Portugal por várias entidades
privadas (Advanced Cardiac Life Suport, Advanced Trauma Care for Nurses,
Fundamentals Critical Care Suport, Prehospital Trauma Life Suport; Pediatric
Education for Prehospital Professionals, Cursos de Emergências Obstétricas; Curso de
Emergência Trauma e Catástrofe, Fundamental Disaster Management, SAV, SAV
Pediátrico, SAV Neonatal, Geriatric Education for Emergency Medical Services, etc.),
facilmente percebemos que para obtermos mais profundidade teríamos de cumprir mais
tempo de formação.
Este tipo de formação modular, é a tipologia de competências de intervenção proposta e
requerida, pelas diversas Associações Americanas de Enfermagem de emergência e
intervenção pré-hospitalar (ASTNA e ENA), que inclui ainda módulos de formação
exclusiva na área do transporte, quer seja terrestre ou aéreo (ASTNA, 2010; AZBN,
2011). Já no caso da Holanda e da Suécia, não encontrámos referência específica a
todos os conteúdos formativos incluídos, mas transparece que estão definidos pelos
sistemas requisitos. Citando Franschman et al , (2011, p. 827) “In the Netherlands,
ambulance paramedics are trained Intensive Care Unit nurses with an extended 2 years
training in prehospital care...”, parafraseando Kronohage e Linder, (2005, p. 25,26) na
Suécia, “the carrying out of qualified medical procedures requires a minimum level of a
registered nurse with pre-hospital care experience, plus an additional training course in
ambulance medical care. For duty on the emergency car, an additional course in
anesthesia is desirable”.
Em Portugal, embora o INEM exija para a actividade o Curso de VMER, de SIV, ou de
Fisiologia de Voo, embora até sejam conhecidos pré-requisitos de experiência clínica para acesso à formação (nem sempre respeitados), a definição concreta das
competências específicas da formação pré-hospitalar, não está até hoje esclarecida de
forma inequívoca. Recentemente a Ordem dos Enfermeiros na já enunciada tomada de
posição sobre o Plano de Recursos Humanos Pré-Hospitalares do INEM (2010),
mencionou pela primeira vez conteúdos formativos modulares a associar à formação
complementar, no entanto foi pouco concreta ou ambiciosa nesta enunciação (só fez
referência ao SAV adulto e pediátrico). O próprio INEM, prepara-se neste ano de 2012
para alterar o seu modelo formativo em algumas vertentes, para um modelo modular
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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ainda pouco conhecido. Pode ser o início da construção de uma nova formação
específica com mais efectividade.
Ainda no que respeita à formação específica complementar, os enfermeiros referiramque o facto de ser indiferenciada relativamente aos outros interventores lhes
dificulta o desenvolvimento da perspectiva de enfermagem na actividade. Na verdade os
conteúdos programáticos do Curso de VMER Médicos e Enfermeiros é similar, e o
Curso de Fisiologia de Voo é comum, versando preferencialmente protocolos de
tratamento clínico. Mas, segundo Holmberg e Fagerberg, (2010), se este aspecto é
positivo num contexto pluridisciplinar, muito dependente da interdisciplinaridade nas
competências médicas, não deixa de ser relevante para a profissão desenvolver um
conjunto de conhecimento dos fundamentos da enfermagem num contexto tão
complexo e distinto como o do exercício pré-hospitalar, que possam ser depois
incluídos na sua formação especializada.
Os nossos informantes atribuem também como causa deste maior empenhamento na
afirmação profissional, o facto de terem grande dificuldade de realizarem formação
contínua, quer seja porque é pouco disponível ou organizada no contexto
profissional do SIEM, ou porque tem apenas um cariz avaliativo, ou porque é muitoonerosa e penalizadora dos tempos livres, ou ainda porque não é preconizada ou
reconhecida pela tutela dos enfermeiros, o que leva a um percurso autodidacta que
não é o ideal.
Pudemos constatar que a formação profissional contínua é reconhecidamente para os
enfermeiros, uma forma de manter e optimizar competências na adaptação aos seus
cargos ou funções (Moreira da Silva, 2011), no entanto, este modelo formativo está de
facto desenvolvido de forma incipiente no exercício pré-hospitalar, esta é uma área que
contrariamente a outras - como por exemplo o Controlo de Infecção Associado aos
Cuidados de Saúde - não tem qualquer expressão na programação da Formação
Contínua das unidades de saúde onde estão sediados os meios de emergência pré-
hospitalar. Nem o INEM, que tem a responsabilidade da Formação, tem qualquer plano
estruturado de Formação Contínua ou Recertificações na actividade para os
profissionais clínicos.
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O que existe a este nível, é o desenvolvimento de alguns Planos de Formação em
Serviço internos em alguns meios - como é o caso da VMER de Faro, a que pertence a
autora - onde se cumprem as normativas legais da Formação em Serviço dos
Enfermeiros, ou, o desenvolvimento de actividades desgarradas por iniciativa avulsa
dos profissionais. Na região do Algarve, também esteve em vigor durante algum tempo
um plano de Recertificação de SAV para os operacionais de VMER, cuja aprovação
determinava a continuidade na actividade, situação que não tinha qualquer
comparabilidade com outras regiões do país, o que justifica a referência destes
enfermeiros ao cariz avaliativo e punitivo que divulgámos. Quando se referem aos
custos pessoais e económicos da formação, os enfermeiros estão a reportar-se à sua
frequência voluntária dos cursos internacionais disponíveis no mercado que jámencionámos. Cursos que alguns frequentam na perspectiva de colmatar as suas lacunas
formativas, o que como sabemos, tem custos muito elevados - sempre acima dos 300 a
400 euros - e que por não haver formação específica definida, depois não têm qualquer
reconhecimento no seio do SIEM ou da tutela dos enfermeiros.
Transparece assim um contexto em que impera o percurso autodidacta, com a
construção da perícia a ficar a cargo de cada um. Segundo Martins (2009), o que nem
sempre tem os resultados mais desejáveis neste contexto da urgência/emergência.
Este panorama é bastante distante da situação descrita por Schuppen e Bierens (2011, p.
323) no que respeita à Holanda, quando referem. “ambulance nurses maintain their
competencies by attending four regional and two national refresher training days per
year. To reassess their competencies, they have to pass a theory examination each year,
a scenario-based examination once in every 5 years and attend the refresher courses of
the Prehospital Trauma Life Support Course.
As indefinições e alguma desregulação no exercício pré-hospitalar em Portugal, são
sentidas pelos enfermeiros, mas também são conhecidas socialmente, o Relatório do
Tribunal de Contas à Actividade Pré-Hospitalar de 2010, é bastante contundente na
descrição de algumas insuficiências e faltas de estruturação desta actividade, que são
reveladoras deste maior empenhamento para os enfermeiros e talvez até dos outros
interventores, se afirmarem profissionalmente.
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Embora o já citado Plano Estratégico dos Recursos Humanos do Pré-Hospitalar (INEM,
2010) mencione um perfil funcional dos interventores, como temos estado a analisar,
não existe formalmente um referencial de competências dos mesmos, não estão
claramente estabelecidos os papéis, as funções ou competências específicas dos
enfermeiros ou dos outros actores nesta actividade, o que claramente prejudica o
saudável entendimento interprofissional. É imprescindível, então nesta área, que na
formação de uma equipa de trabalho, esteja claro quais são as responsabilidades de cada
indivíduo (Moreira da Silva, 2011). Opinião confirmada por Scuppens e Bierens (2010,
p.326), “when ambulance nurses and MMT physicians know each other’s competencies,
an improvement of cooperation can be expected”.
A motivação para o exercício pré-hospitalar, é uma condição essencial ao desempenho,
segundo Bandeira (2008) e Moreira da Silva (2011), nem todos possuem o perfil
necessário, que requer a selecção de características específicas como já enunciámos
neste trabalho. Mas, tem sido esta forte vontade de operar neste campo de acção, que é
altamente desafiante, motivador e promotor de fortes emoções e recompensas
(Mollebjerg e Rasmussen, 2010), que tem sido o garante dos enfermeiros na
continuidade do trabalho e na luta contra todas as vicissitudes que têm encontrado para
se afirmarem profissionalmente.
As responsabilidades atribuídas a estas indefinições recaem, internamente na classe
de Enfermagem, nomeadamente na sua tutela, a Ordem dos Enfermeiros, que entre
outros motivos, por uma postura tradicionalista de cuidar, durante muitos anos se quis
afastar das necessidades biomédicas atribuídas a este contexto não o regulando. E
também nos próprios enfermeiros, que não demonstram um espírito de coesão na
defesa de um campo do exercício profissional que informalmente lhes está atribuído hámais de duas décadas e formalmente desde 2009.
Analisando a cronologia da actividade e as suas definições legais, até 2007, apenas a
referência aos enfermeiros no Grupo de Saúde e Evacuação Secundária na disposição
legal do Plano Nacional de Emergência de 1994 (Costa, 2011), justifica a sua presença
neste domínio de acção. Apenas em 2007 - como nos recordamos depois de muitas
pressões por parte destes profissionais - a Ordem dos Enfermeiros reconhece a
actividade pré-hospitalar, através de um documento muito vago com duas páginas quecontém breves orientações relativas às atribuições dos enfermeiros no pré-hospitalar.
7/23/2019 Enfermagem Pre Hospitalar - Afirmacao Profissional 2012 Tese
Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
172
uma revista não científica, que atribuêm aos enfermeiros o terceiro lugar entre as
profissões que mais confiança inspiram aos Portugueses. A enfermagem tem tido uma
evolução ímpar como profissão e também como ciência, no entanto, é ainda uma arte
nova que continua a luta para se impor socialmente, marcando a sua diferença da
profissão médica com conhecimento novo oriundo da análise e reflexão na sua prática
(Collière, 1989; Benner, 2001).
O défice de reconhecimento social sentido pelos enfermeiros, tem expressão no olhar
que, quer a população, quer os pares de intervenção têm sobre o seu desempenho.
“A construção da visão social da profissão resulta da percepção dos seus clientes acerca
do valor que podem obter pelo serviço prestado” (Amaral, 2011 , p.2), e também dadefinitiva desagregação das profissões da saúde à submissão ao mito perene do “acto
médico” (Colliére, 1989; Benner, 2001). A visão social percebida tem sido dominada
pelas actividades que os enfermeiros têm desempenhado face às prescrições médicas, e
pela menor valorização daquelas que compõem o seu core de intervenção e resultam da
sua tomada de decisão no âmbito do seu conhecimento disciplinar (Amaral, 2011).
Já Benner (2001, p. 16), dizia que “as práticas do cuidar precisam de ser apresentadas e
recuperadas (tornadas públicas, por forma a que possam ser legitimadas e valorizadas)
porque elas sustêm as relações de confiança que tornam a promoção da saúde, a sua
restauração e reabilitação possíveis”.
Assim, a construção de um outro olhar depende sobremaneira dos enfermeiros e da sua
prática, da sua capacidade de afirmação na demonstração de resultados e ganhos em
saúde para as pessoas (Holmberg e Fagerberg, 2010; Margato, 2011), significa refundar
a definição do valor dos cuidados de enfermagem, as fronteiras da sua prática, explicar
os seus valores e a sua utilidade social (Amaral, 2011). Um desígnio que tem sido
dificultado neste campo de acção, quer pelos défices formativos já referidos - pois a
formação é o garante da construção do conhecimento dos enfermeiros e do seu
desenvolvimento (Colliére, 1989; Benner, 2001; Moreira da Silva, 2011) – quer pelas
indefinições da prática que temos supramencionado, nomeadamente o défice de
regulação e a incapacidade de demonstrar valor e ganhos em saúde para a população
pelo não registo da actividade.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
173
Um outro contributo para a dificuldade da validação profissional dos enfermeiros na
actividade pré-hospitalar, segundo os informantes advém da percepção que estes têm
de ameaças externas ao seu desempenho, que nos “subúrbios” da actividade – já vimos
que estas não se fazem sentir propriamente no contexto da prática quotidiana –
frequentemente questionam a continuidade do desempenho pré-hospitalar dos
enfermeiros. As mudanças e o desenvolvimento do modelo do SIEM em Portugal, à
semelhança de outros países, tem sido um pouco conturbada e incerta, pela
indiferenciação e diversidade da formação dos interventores, pela falta de regulação,
normalização e homogeneidade dos sistemas (Chew, 2009; NHTSA, 2009; Nutbeam,
2011; Hyde et al , 2012), mas sobretudo pela falta de clareza e esclarecimento de
objectivos, metas e modelos a implementar no nosso país (Tribunal de Contas, 2010).Isto tem levado á necessidade de várias tomadas de posição, por parte da Ordem dos
Enfermeiros e da Associação Portuguesa dos Enfermeiros de Emergência Pré-
Hospitalar, na resposta a este percebimento de ameaças ao desempenho dos
enfermeiros. Relembramos Shuppens e Bierens (2011), pois, são precisamente a
obscuridade das indefinições e a não delimitação de competências que contribuem para
um ambiente profissional conturbado, pouco solidário e cooperante.
Analisando estas ameaças:
Cada vez mais na actualidade, se questiona a ausência de equipas médicas na
intervenção pré-hospitalar; esta área é nos dias que correm alvo de uma especial
atenção clínica pelas dificuldades da ausência de cuidados de excelência à luz da
legis artis e evidência científica, o que requer grandes mudanças nos modelos
dos SEM por todo o mundo (Dick, 2003; NHTSA, 2009; Brekwoldt et al , 2011;
CRWJFIFN, 2011; Franschman et al , 2011; Kruger et al , 2011; Nutbeam, 2011;Schupen e Bierens, 2011; Hyde et al , 2012);
Realçamos a este propósito a preocupação actual dos Britânicos na dificuldade
de implementação da rede nacional de trauma, pela carência sistemática de
disponibilidade de equipas médicas treinadas em cuidados críticos (Hyde et al ,
2012);
Já percebemos que o treino e a manutenção da expertise no contexto clínico da
prática hospitalar da pessoa em situação crítica, são referenciados como tendo
7/23/2019 Enfermagem Pre Hospitalar - Afirmacao Profissional 2012 Tese
2011), particularmente dos cuidados de enfermagem (Collière, 1989; Amaral, 2011). O
entendimento da ameaça pela motivação economicista foi mesmo referido na tomada de
posição da Associação Portuguesa dos Enfermeiros de Emergência Pré-Hospitalar,
sobre o Plano Estratégico dos Recursos Humanos do Pré-Hospitalar em 2010.
Mas, Amaral (2011) contrapõe que a noção de valor dos cuidados tem de ser central nagestão dos sistemas e organizações de saúde, é um conceito essencial para a
sustentabilidade dos sistemas, tendo a sua análise de ir para além dos custos, e incluir a
perspectiva de qualidade, no sentido de obter a satisfação dos clientes e garantir ganhos
reais em saúde. Refere ainda que os cuidados de enfermagem não são apenas custos,
pelo valor que acrescentam e pela eficiência que introduzem nas unidades de cuidados,
os enfermeiros pagam-se a si mesmos, cita até um estudo Inglês que reporta um ganho
de 38000 libras pelo incremento de um enfermeiro.
Pensamos que ficam esclarecidas as motivações dos focos causais que fomentam o
esforço da afirmação profissional dos enfermeiros, importa passar à discussão das
estratégias que estes seleccionam neste empenhamento.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
175
A compreensão dos meandros, dos intervenientes no fenómeno, das suas causas e
porquês, é o primeiro passo para uma acção assertiva e concertada, observando-se
estratégias e soluções. Analisemos então o que os enfermeiros têm feito neste
compromisso com o exercício pré-hospitalar.
A primeira e óbvia escolha dos enfermeiros como estratégia para enfrentar a maior
complexidade deste contexto profissional, e se afirmarem nesta prática clínica recai na
Formação. Os enfermeiros têm perfeita consciência que a educação do pessoal da área
da saúde deve transcorrer de modo contínuo ou permanente (Moreira da Silva, 2011),
enfrentando continuamente o desafio do desenvolvimento (Benner, 2001; Martins,
2009) assim, consideram esta uma forma de aprimorar o seu desempenho.
Neste sentido, Benner (2001, p. 201) diz que na perspectiva de desenvolvimento
profissional e promoção da perícia em enfermagem, hoje os enfermeiros são
profissionais clínicos com muitos conhecimentos, “cuja complexidade e
responsabilidade do papel profissional requer esse desenvolvimento contínuo e a longotermo”. Esta concepção vai de encontro à selecção estratégica dos nossos informadores,
que consideram necessário e se disponibilizam a incrementar a sua formação
permanente e a manterem a prática clínica no sentido da excelência. O problema é que
nestas estratégias os enfermeiros contemplam mais do que a formação que realizam,
consideram também a necessária que não está disponível pelos motivos que atrás
referenciámos na análise das causas desta contínua dedicação neste exercício.
Na senda desta perspectiva da formação dos enfermeiros, não deixam de ser relevantes
os múltiplos estudos que se vão divulgando relativos à necessidade de mudança do
ensino/formação dos enfermeiros, destacamos o de Backes e Erdmann (2009), que
referem um novo horizonte formativo dos enfermeiros sobre um olhar tão em voga nos
tempos que correm, que é o olhar do empreendedorismo social. Reconhecido como um
novo paradigma de intervenção social, capaz de potenciar acções locais e protagonizar
novas possibilidades pela criatividade e inovação nas contradições sociais emergentes,
pode ampliar o conceito de cuidado de saúde e a exploração de novos espaços deactuação profissional. È uma perspectiva formativa interessante e inovadora, que nos
CATEGORIA 4 – AS ESTRATÉGIAS
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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parece dever merecer a atenção dos construtores dos novos modelos formativos dos
enfermeiros para incrementar a sua formação e afirmação profissional, e que pela
responsabilidade social imposta, nos parece poder ser útil a esta área de cuidados.
Na estratégia formativa, os enfermeiros reconhecem as Recertificações, a Formação
Contínua e em Serviço e a manutenção da prática clínica como recursos para
aumentar a sua competência e uniformizar procedimentos. É uma formação fomentada
na aprendizagem de áreas estratégicas em contexto clínico, que Benner (2001) e Martins
(2009) afirmam dever ser um esforço consecutivo das instituições para que os
enfermeiros possam preparar-se correctamente na profissão. Moreira da Silva (2011, p
225) define a necessidade deste tipo de formação nesta área do exercício, para ampliar a
base de habilidades dos profissionais. Denomina-a como treinamento/desenvolvimento.
“O treinamento também pode ser definido como o processo educacional decurto prazo, aplicado de maneira sistemática e organizada, através do qual as
pessoas aprendem conhecimentos, habilidades e competências em função deobjectivos definidos; envolve a transmissão de conhecimentos específicosrelativos ao trabalho, atitudes frente a aspectos da organização, da tarefa e doambiente e desenvolvimento de habilidades e competências. O desenvolvimentocertamente envolve um processo de aprendizagem, no entanto, é voltado aocrescimento da pessoa em nível de conhecimento, habilidade e atitude”.
Citando Martins (2009), o plano de formação dos enfermeiros que trabalham nesta área
da urgência/emergência, deve incluir a actualização de competências técnico/científicas
em áreas como o suporte básico e avançado de vida, gestão de via aérea ou trauma entre
outras competências. Nestas outras, Tavares (2010) acrescenta por exemplo o treino de
intervenção em catástrofe.
Sabemos que este é um esforço que se vai fazendo e que tem os seus frutos no
crescimento dos profissionais, mas, como já mencionámos, da nossa experiência e do
estudo de Oliveira (2011), também temos noção que o desenvolvimento desta
actividade educativa e a selecção do perfil de manutenção da prática clínica é neste
momento um pouco incipiente nos meios de emergência pré-hospitalar, carecendo de
mais organização e definição. A este nível, encontrámos referências mais concretas na
estrutura deste tipo de formação tanto em Espanha, através das respostas que obtivemos
às nossas questões sobre a actividade, como no SEM Holandês que tem definidos
planos anuais de treino, formação teórica e recertificações que já relatámos
(Franschman et al , 2011), e ainda do Americano, do Britânico ou do Tailandês, que
definem o dever dos profissionais demonstrarem e manterem proficiência nas
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
177
competências requeridas por exemplo mantendo a já referenciada prática em serviços de
contacto com o doente crítico como a Urgência, os Cuidados Intensivos ou o Bloco
Operatório, a fim de garantir a excelência de cuidados na actividade (Machen et al ,
2007; British Association for Imediate Care, 2008; Moli, Thosingha e Sindgu, 2008;
ASTNA, 2010). Ou até do Dinamarquês, que para manterem a competência, além da
obrigatoriedade dos enfermeiros anestesistas que actuam no pré-hospitalar conservarem
paralelamente prática hospitalar no Bloco Operatório, têm de garantir a participação
obrigatória em frequentes exercícios teóricos e práticos.
Os enfermeiros declaram ainda como estratégia de afirmação profissional, a Formação
Pós Graduada. Benner (2001, p. 208) confirma que “uma especialização precoce num
domínio poderá ser extremamente vantajosa no sentido que ela dará aos estudantes a
ocasião de adquirir conhecimentos clínicos particulares”.
Os enfermeiros por não disporem em Portugal de formação especializada específica
neste campo do exercício, procuram aquela que melhor se adapta a esta área de
cuidados, nesse sentido há uma grande prevalência de enfermeiros que optam pelas Pós
Graduações em Urgência/Emergência ou Cuidados Intensivos, pela Especialidade em
Enfermagem Médico Cirúrgica, por ser a que tem mais proximidade e está direccionada para o cuidado à pessoa em situação crítica. Contudo, face à pluridisciplinaridade deste
âmbito não é rara a procura de Especializações em Pediatria, Reabilitação, Saúde
Mental, e mesmo Saúde Comunitária ou Materna.
Neste âmbito formativo complementar, destaca-se uma vez mais, o reconhecimento da
crescente necessidade sentida pelos profissionais de saúde e pelos SEM de formação no
âmbito da catástrofe. Os multiplamente citados eventos catastróficos mais recentes no
panorama internacional, têm feito emergir esta necessidade de forma muito clara e
urgente (Schulz e Koenig, 2009; Tavares, 2010; Andress, 2011). E neste aspecto, não
deixa de ser relevante verificar, que esta formação existe até desde há algum tempo em
Portugal, por exemplo na Universidade do Porto no Instituto de Ciências Biomédicas
Abel Salazar, inicialmente como formação Pós-Graduada e posteriormente desde 2000
como Mestrado para profissionais de saúde (médicos e enfermeiros) em Medicina de
Catástrofe (Bandeira, 2011), tem sido amplamente frequentada por enfermeiros, sendo
até estes profissionais os que mais sucessos têm tido na sua conclusão. A recenteintrodução da componente da Catástrofe no referencial do Regulamento das
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem em Pessoa em
Situação Crítica (Ordem dos Enfermeiros, 2010), tem implementado esta formação nos
currículos das Especialidades em Enfermagem Médico Crúrgica de múltiplas escolas de
enfermagem do nosso país.
Mas, cumpre destacar ainda, que o reconhecimento da importância da criação de sub
ou pós especializações para os profissionais clínicos neste campo profissional, é
neste momento já muito referenciado internacionalmente, tanto nos Estados Unidos,
como no Reino Unido (CFECUSHS, 2007; British Association for Immediate Care,
2008; Chew, 2009; Nutbeam, 2011; Hyde et al , 2012) E segundo Kronohage e Linder
(2005), e ainda informação do Enfermeiro Mats Holmberg facultada por “email ” no
âmbito da pesquisa deste trabalho, é já uma realidade fortemente implementada na
Suécia.
Muitos estudos têm provado, que o trabalho de equipa promove a prevenção de
eventos adversos na actividade de emergência. Comprovam que quando percepcionado
pelos membros da equipa, promove a liderança, a satisfação no trabalho, a segurança
dos cuidados às pessoas e a redução do erro clínico (Machen et al , 2007; Manser, 2009;
Kilner e Shepard, 2010). Ilustrando esta ideia, é interessante recordar um dosentrevistados, e um dos inquiridos internacionalmente.
E5 “muitas vezes… no momento de stress, quem está a liderar…. Muitas
vezes há coisas que escapam e falham e é preciso que este segundo
elemento, com este mesmo nível de conhecimentos… não é que chame a
atenção, mas que sugira, que alerte… que alguma coisa está a fugir ao
procedimento… que estava previsto ou que é aquilo que está pré
estabelecido… ”
F10 “El papel es fundamental pues en pocas otras situaciones el trabajo
en equipo va a tener unas repercusiones (ya sean positivas o negativas)
tan rápidas e inmutables en el paciente”.
O trabalho de equipa é definitivamente reconhecido como estratégia promotora de boas
práticas pelos enfermeiros ouvidos. A literatura, também reconhece que a articulação
funcional é uma característica imprescindível ao desenvolvimento da actividade pré-hospitalar (Holmberg e Fagerberg, 2010; Franschman et al , 2011). Se todos os
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
179
contextos de cuidados de saúde vivem do trabalho de equipa e da sua performance
(Manser, 2009), o pré-hospitalar, não dispensa que a colaboração seja plena (Rocha et
al , 2003; Machen et al , 2007; Moli, Thosingha e Sindgu, 2008; Shuppen e Bierens,
2011), até porque ninguém cuida sozinho de uma pessoa em situação crítica (Kronohage
e Linder, 2005).
Neste sentido ainda, a formação e a experiência clínica hospitalar dos enfermeiros
desenvolve-lhe uma especial capacidade de trabalho entre pares, a sua reflexão
prática promove a identificação de competências relacionais, comunicacionais e de
colaboração, bem como o estabelecer de novas formas de desenvolvimento do
conhecimento clínico (Benner, 2001). É com estas capacidades que os enfermeiros
contam quando referem um maior desenvolvimento da aptidão do trabalho de equipa
face a outros interventores. Os enfermeiros deixam transparecer, a noção que as
organizações dependem de equipas para atingir metas estratégicas e operacionais, as
contribuições de cada indivíduo não decorrem apenas dos conhecimentos, capacidades e
aptidões individuais, mas da interacção de todos os integrantes da equipa (Moreira da
Silva, 2011).
Recordando Holmberg e Fagerberg (2010), estes dizem mesmo que a colaboraçãointerprofissional é o fundamento e a condição para a responsabilidade dos enfermeiros.
Assim, esta preocupação com a cooperação está tão ligada aos enfermeiros, que as
várias Associações Americanas de enfermagem pré-hospitalar enunciadas neste trabalho
a consideram um dever destes. Citando Powel (2010, p.2) “the team operates as a
cohesive unit, respecting and reinforcing the strengths and capabilities of each member
in the single desire to obtain the best possible outcome for patients”.
Os enfermeiros referem também, que a sua perícia nas relações interpessoais e os
cuidados sob os mesmos princípios orientadores facilita o trabalho de equipa, neste
contexto com fronteiras funcionais mais esbatidas. Os estudos de Machen et al (2007) e
de Holmberg e Fagerberg (2010) confirmam esta perspectiva, mostrando a satisfação de
enfermeiros e paramédicos Britânicos e Suecos com o “teamwork” que desenvolvem no
exercício pré-hospitalar, propiciador de um grande respeito, partilha e crescimento
mútuos de competências, a que os paramédicos reconhecem influência positiva para a
sua prática futura (Machen et al , 2007).
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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responsabilidade e autonomia (Holmberg e Fagerberg, 2010). Estes autores realizaram
um estudo que explorou as experiências da responsabilidade de cuidar dos enfermeiros
no serviço de ambulâncias Sueco, no encontro com o desconhecido da actividade pré-
hospitalar. Revelam alguns aspectos em que emerge a valia da relação inseparável entre
o cuidado clínico e o cuidado de enfermagem proporcionado pelo diagnóstico e
planeamento de cuidados dos enfermeiros.
Divulgam a este propósito conhecimento disciplinar próprio que advém desta
intervenção, e que achamos interessante partilhar. Por exemplo, as pessoas no contexto
pré-hospitalar, experienciam o sentimento de necessidade de existir, de “Ser Alguém”,
enquanto se desenvolve a responsabilidade das equipas no tratamento médico, devendo
assim ser conduzidas neste de forma a ganharem e percepcionarem de novo o controlo
da sua vida. Enquanto os enfermeiros assumem o controlo das suas funções vitais, as
pessoas devem ser guiadas a concentrar-se na sua autonomia e em “Ser Alguém”.
Mesmo que estejam gravemente feridas, continuam a ser um ser humano único que o
enfermeiro encontrou e que deve ser convidado a participar no seu cuidado e a manter a
sua responsabilidade e autonomia.
Embora o cuidado de enfermagem como produto tenda a ser muito simplificado e poucovalorizado pelos não enfermeiros (Amaral, 2011), esta capacidade de atenção ao
pormenor, é o exemplo de como o trabalho dos enfermeiros é diferente daquele que é
levado a cabo por outros com menores competências ou formação. Segundo Amaral
(2011), esta diferenciação do cuidar dos enfermeiros é o espelho do valor que
acrescentam e da eficiência que introduzem no sistema de prestação de cuidados,
permitindo entre outras coisas, diminuir a demora média, prevenir as úlceras de pressão,
a infecção e proporcionar que os doentes e as pessoas em geral obtenham maior bem-estar e possam de forma mais rápida e eficaz recuperar a saúde.
Nesta perspectiva abrangente do encontro único dos enfermeiros com as pessoas, estes
não esquecem que o ser humano é gregário, que tem uma família, pessoas
significativas e está integrado numa comunidade com o seu ambiente (Ordem dos
Enfermeiros, 2010), esta é mais uma das posições clássicas do cuidado de enfermagem
que Holmberg e Fagerberg (2010) também observaram no referido estudo. Os autores
relatam que nunca perdendo de vista o foco clínico da intervenção pré-hospitalar, estadeve ser revestida de uma perspectiva de atenção, física, psicológica e social, sendo este
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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Terminada a análise das estratégias que os enfermeiros seleccionam para se afirmar
profissionalmente, percebe-se que estes se socorrem dos instrumentos mais básicos da
sua experiência e prática clínica, que eles constroem o caminho de valorização das suas
competências autónomas, do seu conhecimento próprio e intervenção própria com vista
à obtenção de resultados, um caminho que Amaral (2011) defende levar à melhoria das
respostas em saúde das pessoas, afinal o desígnio maior da profissão de enfermagem.
Contudo, também percepcionámos nesta análise bloqueios e resistências que mantém
vivo este esforço dos enfermeiros em se afirmarem neste campo. Nomeadamente, pela
desorganização da formação contínua e indiferenciação da formação especializada ou
sub especializada, e ainda pelo valor social percebido dos cuidados de enfermagem.
Passamos à discussão das consequências deste empenhamento dos enfermeiros nadeterminação profissional.
Importa agora discutir os efeitos da conjuntura deste fenómeno e das estratégiasdefinidas ou sugeridas internamente neste percurso. Quando realizamos um esforço em
qualquer situação da nossa vida, pretendemos resultados. Mas, quando falamos em
resultados, interessa sobremaneira uma pronunciação sobre a efectividade, ou seja a
capacidade de produzir um efeito, como medida concreta da aplicação de qualquer
intervenção (Margato, 2011).
Os resultados em saúde, são neste momento um tema na ordem do dia, Amaral (2011),
citando Porter (2009), refere que o esforço de todos os profissionais desta área conduz à
saúde e ao valor associado aos cuidados de saúde, através do desenvolvimento das
potencialidades das pessoas produzirem a sua saúde. Está encontrado o paralelismo para
a discussão dos resultados ou consequências do esforço de afirmação profissional dos
enfermeiros no exercício pré-hospitalar. Percebemos assim que a afirmação profissional
e o valor associado a essa afirmação, se processa através do desenvolvimento do
empenho dos enfermeiros, contudo temos o tal problema da efectividade, pois sabemos
também que tal como na saúde, este esforço encontra bloqueios e impedimentos quecondicionam a eficiência dos ganhos.
CATEGORIA 5 – AS CONSEQUÊNCIAS
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Os resultados do exercício profissional dos enfermeiros processam-se numa estrutura,
onde interagem os vectores da tríade pessoas, enfermeiros e unidade de cuidados,
sendo que os processos e as consequências desta interacção dependem da influência
destas variáveis entre si (Margato, 2011).
O esforço de afirmação profissional dos enfermeiros na actividade pré-hospitalar tem
logicamente, consequências para as pessoas, para a sua família ou pessoas de
referência e comunidade. Como já referimos atrás, a saúde das pessoas, é o «capital dos
capitais», a obtenção de ganhos reais em saúde para as pessoas é o maior objectivo do
trabalho de enfermagem (Amaral, 2011), que deve acontecer onde as pessoas mais
precisarem.
Neste sentido, a literatura confirma a visão dos enfermeiros que consideram como
consequência da sua intervenção a possibilidade dos cuidados hospitalares no
terreno, podemos percebê-lo quando Mollebjerg e Rasmussen (2010) dizem que a
intenção do trabalho pré-hospitalar dos enfermeiros é assegurar o contacto rápido com
profissionais de saúde, que permite aumentar o sentimento de segurança dos cidadãos e
o recurso correcto às unidades hospitalares mais adequadas. Esta tem sido aliás uma
crescente preocupação universal dos vários SEM, pois como já expusemos percebe-secada vez mais a necessidade de proporcionar cuidados precoces segundo as boas
prática e a evidência clínica que norteia a prática hospitalar, neste contexto extra-
hospitalar (Suserud, Wallman C:Son e Halljamae, 1998; Suserud e Haljamae, 1999;
Kronohage e Linder, 2005; CFECUSHS, 2007; Chew, 2009; Holmberg e Fagerberg,
2010; Franschman et al , 2011; Shuppen e Bierens, 2011; Nutbeam, 2011; Hyde et al ,
2011).
Esta precocidade de intervenção clínica com profissionais de saúde quer seja em
equipas médicas, ou com participação autónoma dos enfermeiros sob protocolo e
direcção médica, tem o reconhecimento do seu benefício sobretudo nas situações mais
críticas de emergência médica e trauma, estando demonstrada a redução da
mortalidade e morbilidade nestas áreas. É uma realidade no trauma grave (Kronohage
e Linder, 2005; Lorenzo, Serra e Liera, 2005; Trauma Nursing Core Course [TNCC],
2008; Breckwoldt et al , 2011; Franschman et al , 2011; Kruger et al , 2011; Sisak et al ,
2011), é descrita na doença coronária (Dracup et al , 2006; O’Donnel, Condell e Begley,2006; Ting et al , 2008), na sépsis grave (Studnek, 2012), e ainda na doença crónica dos
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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consequência benéfica que os nossos entrevistados perceberam deste seu esforço de
afirmação profissional na sua acção com as pessoas.
Os alvos de cuidados dos enfermeiros beneficiam também da sua estratégia de cuidadosmultidimensionais no exercício pré-hospitalar, com a obtenção de maior bem-estar,
que como referimos, Amaral (2011) confirma advir desta diferenciação do cuidar.
Como mencionámos também anteriormente, a literatura confirma alguns dos exemplos
referenciados pelos nossos entrevistados na preocupação com o conforto e a atenção às
pessoas e à família, são exemplos, as situações de morte ou a intervenção na pediatria
(Holmberg e Fagerberg, 2010).
Seguramente que neste processo de determinação profissional, os resultados também sefazem sentir para os enfermeiros. Os entrevistados referenciam que este
empenhamento lhes dá um sentimento de evolução no seu desempenho profissional.
As adversidades e particularidades do ambiente de intervenção do exercício pré-
hospitalar, fomenta o desenvolvimento de várias aptidões, nomeadamente na triagem,
destreza técnica, raciocínio rápido e capacidade de improvisação, que acrescentam
competência à prática profissional (Bandeira, 2008; Holmberg e Fagerberg, 2010;
Mollbjerg e Rasmussen, 2010), esta visão é bem perceptível na opinião de um dosnossos inquiridos na Suécia.
F5 “The nurse is accustomed to working out on the field and in many
different situations. Resolves situations based on knowledge but also
through improvisation. When we have big disasters exercises is
immediately evident difference between the pre-hospital nurse and the
group of nurses from the hospital, which will hit the spot. The pre-
hospital nurse is accustomed to working in poor conditions and
environment. Is it easier to prioritize and resolve situations.”
Na senda evolutiva da prática pré-hospitalar, os enfermeiros ganharam recentemente um
voto de confiança com a prática autónoma no projecto SIV, o sentimento de
aprovação de capacidades percepcionado pelos enfermeiros, é o corolário do esforço
que os enfermeiros têm feito para ver reconhecida a sua prática pré-hospitalar. Encontra
paralelismo em alguns estudos consultados na Suécia após o início do exercício pré-
hospitalar dos enfermeiros naquele território, que confirmam a sua utilidade ao SEM
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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desde há largos anos (Suserud, Wallman C:Son e Halljamae, 1998; Suserud e Haljamae,
1999; Melby e Ryan, 2005; Kronohage e Linder, 2005), permitindo também a expansão
e desenvolvimento do papel dos enfermeiros neste novo paradigma a nível mundial.
Os enfermeiros também já vão percepcionando do seu empenho, algum novo
reconhecimento social, e quando o referem, nos exemplos que dão, fazem alusão ao
reconhecimento veiculado pela sua prática autónoma, pelo seu conhecimento
disciplinar, pelos cuidados resultantes da sua tomada de decisão. Este resultado, é
consentâneo com a opinião de Amaral (2011), quando refere que a visão social
percebida se obtém pela valorização dos cuidados do nosso core de intervenção e pela
visibilidade que lhes conseguirmos dar. Holmberg e Fagerberg (2010) e Oliveira (2011),
também dão conta da valorização das suas intervenções autónomas por parte das
pessoas assistidas no Serviço de Ambulâncias Sueco e numa ambulância SIV em
Portugal.
Contudo, os informantes não encontram apenas resultados positivos neste
empenhamento, continuam ainda a confrontar-se com resistências que justificam a
continuidade do esforço. Referem que no exercício pré-hospitalar, ainda experimentam
incertezas, quebra de expectativas, desmotivação e frustrações seguramente ligadasàs condições deste fenómeno, particularmente alguns mediadores e focos causais que
não obtiveram estratégias efectivas. Este é um campo do exercício profissional com
uma ampla progressão nos últimos anos, porém, como temos estado a analisar e
segundo Nutbeam (2011), os cuidados pré-hospitalares carecem ainda de muita
regulação. Na opinião do autor, o papel dos vários interventores no ambiente pré-
hospitalar não está ainda completamente definido: não há ainda competências formais
estabelecidas, os interventores provêm dos mais variados perfis da prática médica e deenfermagem. Esta variação da base das competências clínicas coloca enormes
disparidades no “ standard ” de cuidados prestados, para além de colocar os
profissionais fora da zona de conforto das suas competências clínicas adquiridas.
A perda de funções no CODU no ano 2010, é uma das quebras de expectativas
sentidas, este acontecimento foi como que um recuo na afirmação profissional e no
reconhecimento do trabalho dos enfermeiros no pré-hospitalar. Sobretudo porque
identificam a sua utilidade funcional na qualificação da resposta das centrais deemergência (Associação Portuguesa dos Enfermeiros de Emergência Pré-Hospitalar,
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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2010), e sabem que o argumento utilizado de não haver paralelismo europeu desta
função, não é verdadeiro. Uma situação prontamente denunciada pela Ordem dos
Enfermeiros em 2010, e identificada por nós, pois existem até estudos que analisam o
cargo dos enfermeiros nas centrais de emergência (Forslund, Kihlgren e Sorlie, 2006).
Quando analisámos os focos causais, foi referenciado o défice de enquadramento
legal concreto da actividade pré-hospitalar, da sua formação, responsabilidades e
competências, quer seja no interior do próprio SIEM, quer seja pela própria tutela dos
enfermeiros. Esta realidade nacional é publicitada pelo próprio Tribunal de Contas
(2010, p. 26) no seu relatório, “no contexto actual não existe um quadro legal de
referência para o SIEM que clarifique o âmbito e limites de intervenção das entidades
que nele intervêm, respectivas responsabilidades e competências, com especial
incidência na acção coordenadora atribuída ao INEM”.
Mas como já analisámos, também se verifica esta situação internacionalmente. É esta,
falta de regulação, de definição de competências, de formação específica e a
heterogeneidade dos actores nos vários sistemas que promove frustração, conflito,
insegurança profissional e nos cuidados, com consequentes problemas de cooperação
entre os interventores, desconfiança e incerteza profissional (Kronohage e Linder, 2005;
CFECUSHS, 2007; Chew, 2009; Nutbeam, 2011; Shuppen e Bierens, 2011).
Os enfermeiros referenciam ainda algumas limitações às suas competências na
intervenção balizada por protocolos, que consideram restritivos e limitadores da sua
autonomia. Oliveira (2011), no seu estudo sobre experiências de ser enfermeiro em
SIV, faz também referência a esta decepção dos enfermeiros. A própria Ordem dos
Enfermeiros (2010), na tomada de posição sobre o já sobejamente referenciado Plano de
Recursos Humanos de Emergência Pré-Hospitalar, refere a título do perfil funcional,que é visível o estreitamento do campo de acção dos enfermeiros, sem consideração
pelo enquadramento legal da profissão, mais propriamente o seu Regulamento do
Exercício Profissional (REPE).
Na análise que fizemos de alguns SEM nesta pesquisa, percebe-se que existem de facto
sistemas com protocolos mais abrangentes nas competências, mas, também
percepcionámos alguns que talvez até sejam mais fechados. Do que entendemos, o
importante é a definição concreta das competências atribuídas pelos protocolos(Kronohage e Linder, 2005; Schuppen e Bierens, 2011), um pressuposto que sabemos
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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não estar completamente esclarecido em Portugal, sabemos até que o INEM reconhece
falhas nestes protocolos e a necessidade da sua revisão. Não deixa de ser caricata a
situação referida, da competência adquirida por formação no que concerne a vários
procedimentos, e na actuação protocolar terem de ser administrados apenas de forma
automática ou precisarem de validação.
Todavia, parece-nos que neste aspecto importa é clarificar e desmistificar para os
enfermeiros este conceito de autonomia que referem na actuação por protocolos, pois
parece-nos ter mais profundidade do que aquela que classicamente lhe é atribuída.
Segundo, Roehrs e Malagutti (2011) podemos dizer que o princípio da autonomia está
ligado à capacidade que as pessoas têm para actuar de acordo com a sua vontade, por
meio de escolhas que estão ao seu alcance e mediante objectivos que pré-determinaram.
Está relacionado com a capacidade que a pessoa tem para decidir sobre aquilo que julga
ser melhor para si mesma. Para isso a pessoa deve racionalizar (desenvolver a
capacidade de compreender, analisar logicamente uma situação), e deliberar (habilidade
para escolher entre várias possibilidades), com o objectivo de decidir intencionalmente
por uma das alternativas que lhe são apresentadas. Estes pressupostos incluídos na
prática de enfermagem, que tem um corpo de conhecimentos próprio altamente
diferenciado, que lhes possibilita uma valorização assertiva de dados que nenhum
protocolo pode ter em conta (Ordem dos Enfermeiros, 2010), tem de conferir sempre
aos enfermeiros autonomia na sua prática.
Assim, pensamos que neste esforço de afirmação profissional esta frustração com a
autonomia, deve ser revertida para a necessidade de criar “ protocolos” de intervenção
autónoma de enfermagem - na troca de informação com os Enfermeiros Suecos
percebemos que estes já têm alguns desenvolvidos - e desenvolver investigação sobrediagnósticos/problemas de enfermagem específicos do contexto pré-hospitalar visando a
melhoria dos cuidados. Este é aliás um dever instituído pela Ordem dos Enfermeiros em
Portugal, que vimos replicado nas várias Associações de Enfermagem Pré-Hospitalar
Americanas examinadas, sendo amplamente referenciado pelos vários estudos Suecos
consultados.
Neste processo do compromisso dos enfermeiros com o exercício pré-hospitalar,
existem também consequências para a unidade de cuidados em que operam, ou seja oSistema/Organização da emergência médica nacional.
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Os entrevistados acreditam contribuir para a diferenciação de cuidados da rede de
socorro pré-hospitalar do SIEM. Esta validação chega pelo já muito referido Relatório
do Tribunal de Contas (2010), que reconhece a acção dos enfermeiros no “Socorro
Medicalizado”, que pretende assegurar o socorro pré-hospitalar às pessoas por pessoal
médico. É ainda confirmado no mesmo relatório (2010, p.30) pelo próprio Presidente do
Conselho Directivo do INEM na referência que faz à implementação e crescimento das
ambulâncias SIV, quando diz “este crescimento não significa apenas mais um meio,
mas uma nova cobertura, por um nível diferenciado de uma tipologia de meios que
aumenta a qualidade e efectividade da assistência em situação de emergência”.
O SIEM usufrui ainda da experiência clínica hospitalar dos enfermeiros, e do seu
conhecimento dos processos de relação entre as várias unidades de cuidados, que
permite informalmente o uso mais racional das estruturas e serviços do Sistema
Nacional de Saúde na continuidade de cuidados. Confirmamos a descrição desta
capacidade por Holmberg e Fagerberg (2010), que como actuam também nas chamadas
de baixa prioridade, fazem alusão à intervenção formal no encaminhamento assertivo
das pessoas para as estruturas de saúde mais apropriadas após a sua avaliação.
No entanto, os já descritos défices de regulação da actividade e restrição funcional docampo de acção dos enfermeiros leva ao desaproveitamento destes recursos pelo
sistema. Os entrevistados sentem não estarem a ser consideradas todas as suas
capacidades e aptidões, o que leva à desmotivação e insatisfação.
Recordando um dos informantes.
E12 “E aí a nossa dificuldade em nos afirmarmos. Porque o próprio
sistema não nos atribui praticamente competências nenhumas (...)
começaram-nos a cortar os mecanismos para nós desenvolvermos as
nossas competências...”
A abrangência de conhecimentos e a diferenciação das competências dos enfermeiros
têm potencial para optimizar de forma mais eficaz o supramencionado uso racional dos
recursos do Sistema Nacional de Saúde, a capacidade de triagem de prioridades dos
enfermeiros poderia ser aproveitada, como referem Holmberg e Fagerberg (2010) para
um encaminhamento mais efectivo – sobretudo nas chamadas de baixa prioridade - das pessoas para as unidades de cuidados mais adequadas, evitando por exemplo a
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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característica sobrelotação dos SU típica do nosso país e dos países anglo-saxónicos,
que como sabemos é mais rara nos países nórdicos onde é desenvolvido este modelo.
Esta é contudo, cada vez mais uma depreensão dos SEM anglo-saxónicos, que nosvários documentos de intenção de reformas dos seus Sistemas Nacionais de Saúde,
recomendam uma visão integrada e integradora entre os SEM e os Sistemas Nacionais
de Saúde, optimizando as competências dos profissionais de saúde na emergência
et al , 2012). Nos propósitos que norteiam o documento das reformas do SEM
Americano, a Emergency Medical Services Agenda for the Future (NHTSA, 2009),
refere que na evolução dos SEM deve estar implícito que estes representam a
intersecção da segurança pública, da saúde pública, e dos sistemas de cuidados de
saúde, devendo os princípios e recursos de cada um ser empregues pelo SEM na
promoção da saúde das pessoas. Este entendimento também é discutido por cá na
própria definição do SIEM, mas,
“ Note-se que ainda não existe legislação específica que enquadre o SistemaI ntegrado de Emergência Médica no âmbi to do Serviço Nacional de Saúde ,designadamente o conceito e âmbito da prestação dos cuidados de socorro pré-hospitalar, os poderes de coordenação e supervisão do INEM em relação aoutras entidades que integrem o sistema e sua articulação com as entidades queintegram outras redes de prestação de cuidados de saúde primários,hospitalares e continuad os.” (Tribunal de Contas, 2010 p.33).
Um dos nossos entrevistados - tomando como exemplo a chamada para uma pessoa com
uma crise hipertensiva por má adesão terapêutica e sem sinais de gravidade, com a
impossibilidade de decisão de deixar a pessoa em casa com encaminhamento para o
médico de família, e a obrigatoriedade do sistema de ser transportada ao SU de uma
unidade hospitalar - ilustra esta realidade com a afirmação que se segue.
E12 “...se o projecto fosse feito de forma a rentabilizarmos, nós aí
podíamos definir o que é que são as nossas verdadeiras competências
(...) ou seja, dentro do sistema pré-hospitalar nós podemos ser um
elemento de triagem muito mais valorizado e com muito mais
competências na triagem, para sabermos canalizar bem o doente para
onde é que havemos de ir”
Concluímos o esclarecimento destes resultados para o sistema/organização com umaafirmação do Tribunal de Contas (2010, p. 46) sobre os ganhos em saúde que este
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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proporciona, que pensamos ser esclarecedora destes aspectos que temos estado a
analisar.
“ A aferição da eficiência pressupõe o conhecimento da limitação dos recursosconjugado com a apresentação de evidência sobre a mensuração dos ganhosem saúde, o que não tem sucedido nas decisões tomadas pelo INEM, nem foievidenciada nas alegações apresentadas pela Tutela, através da apresentaçãode indicadores próprios que demonstrassem a aplicação do “(…) binómio
ganhos em saúde/recursos totais alocados(…)”. Completámos a discussão das consequências do esforço contínuo de afirmação
profissional dos enfermeiros no exercício pré-hospitalar, analisando as várias
influências nos três vectores de acção nesta estrutura. Percebemos que os resultados do
processo de determinação profissional dos enfermeiros, embora muito positivos e
demonstrativos do seu conhecimento disciplinar e habilidades, ainda não estão
completamente estabelecidos, têm um amplo espaço de progressão neste domínio,
aguardando sobretudo a sua regulação efectiva. Resta-nos apenas controverter
internamente o fenómeno central, para finalizar esta confirmação de dados na literatura
e a sua compreensão.
4.2. – CONFERINDO AS CONVICÇÕES DOS ENFERMEIROS SOBRE O SEUEXERCÍCIO NA ACTIVIDADE PRÉ-HOSPITALAR
O esforço de afirmação profissional dos enfermeiros é um empenhamento convicto, das
suas aptidões, das suas capacidades e também da sua importância de intervenção.
A análise das convicções dos entrevistados é a última tirada, até ao porto de atracagem
que esclarece o fenómeno que temos discutido. As competências de que se reveste estecompromisso dos enfermeiros com esta actividade, caracterizam internamente o
fenómeno, expressam a sua dinâmica no exercício.
Analisemos então a nossa categoria central e a estrutura de suporte do esforço contínuo
de afirmação profissional dos enfermeiros na actividade pré-hospitalar!
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Como toda e qualquer prática complexa que requer atendimento especializado, a
actuação profissional no cenário pré-hospitalar exige competência profissional, ou seja,
deter conhecimentos, habilidades e atitudes próprias para a execução de determinadas
tarefas (Moreira da Silva, 2011).
A permanência do esforço de afirmação profissional nesta área de actividade, nem lhe é
estranha, uma vez que o projecto de desenvolvimento profissional na área daurgência/emergência é algo que nunca está acabado, o constante avanço técnico e as
alterações periódicas nas recomendações internacionais para a gestão do doente crítico e
reanimação, são uma necessidade imperativa (Martins, 2009). O mesmo autor considera
a indispensabilidade da construção de uma rota dinâmica de perícia que sustente a acção
neste domínio laboral.
Amaral (2011), não tem dúvidas em afirmar que os enfermeiros, continuam a sua luta na
afirmação do valor dos seus cuidados, e que é com a sua prática autónoma, que utiliza
um corpo de conhecimentos disciplinares próprios e uma intervenção própria, que se
obtêm resultados que não seriam alcançados por outros com a mesma eficácia. É esta a
convicção que encontrámos nos achados obtidos da análise das entrevistas, das
informações internacionais, e também do quotidiano da observação participante nesta
área de cuidados.
O maior desafio dos enfermeiros que trabalham na área da urgência/emergência é de
serem capazes de buscar continuamente a excelência do seu cuidar, (Martins, 2009), os
enfermeiros estão conscientes deste repto, e continuam a contenda da demonstração do
mesmo, esgrimindo com as armas de que dispõem o seu empenhamento.
O autor diz ainda que, o outro grande desafio dos enfermeiros nesta área de cuidados é
centrar todas as intervenções na pessoa, actuar no seu melhor interesse. Esta actuação
pressupõe, aceitar o outro como pessoa, respeitando a sua dignidade e os seus direitos,
adoptando uma conduta ética e actuando de acordo com os mais elevados “standards” científicos.
CATEGORIA CENTRAL
EXERCÍCIO DE ENFERMAGEM PRÉ-HOSPITALAR
ESFORÇO CONTÍNUO DE AFIRMAÇÃO PROFISIONAL
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Os enfermeiros sabem que o empenhamento na construção da perícia profissional, se
centra sempre no desenvolvimento de competências, não basta o saber, é sempre
fundamental o saber fazer da competência (Benner, 2001; Martins, 2009).
Competência é então “a capacidade de realizar algo, implicando mobilização integração
e aplicação de conhecimentos a uma situação concreta. Competência é ainda ser capaz
de actuar com responsabilidade” (Martins, 2009, p. 181). Há vários tipos de
competências que são centrais à construção da perícia e afirmação profissional dos
enfermeiros na área da urgência/emergência. Elas estão na maioria das vezes
intimamente relacionadas na prática, a sua separação apenas acontece por questões
teóricas (Martins, 2009), situação que também ocorreu nos resultados desta pesquisa.
Analisemos então as capacidades e as competências em que os enfermeiros
convictamente acreditam, para continuar este esforço na afirmação profissional.
A capacidade técnica dos enfermeiros, é uma referência de múltiplos autores que
escrevem sobre competências dos profissionais de enfermagem na área da
urgência/emergência, estes fazem também alusão à imprescindibilidade desta
capacidade, que não dispensa uma aturada prática, treino e constante reciclagem, no
sentido de garantir um nível de competência técnica elevado (Martins, 2009; Moreira da
silva, 2011; Roehrs e Malagutti, 2011). Os últimos autores afirmam ainda ser esta uma
das vantagens dos enfermeiros no cuidado à pessoa em situação crítica.
Roehrs e Malagutti (2011), mencionam também neste domínio técnico, a vantagem da
habilidade dos enfermeiros na actuação autónoma e na padronização de condutas
por meio de protocolos pré-estabelecidos e conhecidos por toda a equipa, que
facilitam a tarefa e minimizam o risco de iatrogenias à pessoa.
Na área do doente crítico, as competências gerais e específicas para intervir de forma
efectiva, numa situação de trauma ou doença aguda são primordiais, e devem obter a
atenção de cada enfermeiro (Kronohage e Linder, 2005; Martins, 2009; Holmberg e
Fagerberg, 2010; Moreira da Silva, 2011). Isto porque como já referimos, importadestreza e rapidez de execução, cada segundo conta, a atenção deve abranger desde os
Competências Técnicas
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gestos técnicos mais simples, como providenciar um acesso venoso ou colocar um
adjuvante da via aérea, até aspectos mais complexos, como providenciar um acesso
intraósseo, colocar tubo endotraqueal, máscara laríngea ou mesmo reconhecer um ritmo
cardíaco de periparagem ou paragem e actuar em conformidade (Martins, 2009).
A prática é um todo integrado que solicita que o profissional desenvolva o carácter, o
conhecimento, e a competência contribuindo para o desenvolvimento da própria prática
(Benner, 2001). Assim, está hoje estabelecido para a enfermagem que a actuação
baseada na evidência, relacionada com, o recurso a um corpo de conhecimentos
disciplinares próprios, granjeiam a sua competência científica, constituindo uma das
relevâncias dos enfermeiros no cuidado à pessoa em situação crítica.
A este propósito alguns autores, relatam que na área de cuidados da
urgência/emergência devemos conduzir a actuação e tomar todas as decisões com
fundamento em evidências científicas, seguindo protocolos terapêuticos previamente
delineados, tendo sempre em atenção a eficácia previsível da intervenção (Martins,2009; Holmberg e Fagerberg, 2010; Franschman et al , 2011; Schuppen e Bierens 2011).
Isto solicita competência científica e técnica, saber e saber fazer, agilidade mental e
treino constante (Martins, 2009). Periodicamente, os organismos científicos como o
International, Liaison Committee on Ressuscitation, as sociedades de cardiologia, de
cirurgia e trauma, de pneumologia e outras, reúnem consensos e publicam directrizes e
linhas orientadoras, que traduzem a evidência científica referente à prática, devendo
assim guiar a prática quotidiana. Os exemplos desses “ standards” terapêuticos dizem
respeito às mais variadas situações de emergência, entre as quais: a reanimação; gestão
da dificuldade respiratória ou da asma; doença coronária isquémica, ou acidente
cerebrovascular; gestão do politraumatizado ou da via aérea difícil (Martins, 2009;
Schuppen e Bierens, 2011).
Os enfermeiros reconheceram a precisão desta competência, uma vez que a comunidade
científica tem entendido que a forma mais eficaz de gerir um evento crítico é actuando
de acordo com algoritmos previamente definidos em função das evidências científicasdisponíveis. O ónus da questão hoje não deve ser, dizer “fiz tudo o que sabia...”, mas
Competências Científicas
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poder afirmar “fizemos o que a ciência actual diz que se faça...”. Centrados nas pessoas,
com respeito pelos seus direitos, mas tanto mais de acordo com a evidência científica,
quanto menor for a capacidade da pessoa exercer a sua autonomia (Martins, 2009, p.
180).
O uso do método científico, com recurso ao seu conhecimento disciplinar, é
reconhecido pelos enfermeiros neste estudo como uma habilidade útil a esta área de
cuidados, é à partida também, uma característica dos cuidados de enfermagem
certificada pelo REPE (Ordem dos Enfermeiros, 1998), que ficou perceptível com os
exemplos que os entrevistados citaram - focar para além do problema médico, análise
criteriosa do ambiente, dos sinais e sintomas para a precocidade da intervenção,
conhecimento de interacções nos mecanismos fisiológicos – e que mostra uma prática
questionada, reflexiva e problematizada, com uma elevada capacidade de juízo crítico e
tomada de decisão. Martins (2009), denuncia este método na prática dos enfermeiros
quando diz que, a reflexão contínua sobre as práticas é indispensável à melhoria dos
cuidados prestados, as respostas às questões “como fazemos?”, “porque fazemos?” e
“porque fazemos de determinada forma”, são fundamentais, isto porque podemos
organizá-las face à actualidade e ao conhecimento, para além de devermos abordar os
aspectos referentes à centralidade da nossa acção, ou seja a pessoa. Esta perspectiva
emergiu de forma categórica nos resultados da nossa pesquisa.
A fundamentação científica no domínio da técnica, foi outra capacidade referenciada
pelos enfermeiros neste seu empenhamento profissional, sem dúvida que a prática dos
enfermeiros é mais que uma colecção de técnicas, pois estas não são suficientes para a
perícia profissional, é a relação da ciência aliada à tecnologia que promove o
desenvolvimento de uma prática de excelência como a de enfermagem (Benner, 2001).
Os enfermeiros demonstraram uma elevada maturidade pessoal e profissional ao
demonstrarem ter em conta as competências éticas na sua acção, sendo um elemento
reconhecidamente estruturante na construção da perícia no âmbito do doente crítico
(Martins, 2009, Holmberg e Fagerberg, 2010). Esta conduta no exercício das suasfunções é, obviamente também, um imperativo legal consagrado pelo REPE (Ordem
Competências Éticas
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dos Enfermeiros, 1998) no seu artigo 8º e pelo Código Deontológico dos Enfermeiros
(Ordem dos Enfermeiros, 2003).
A ética precisa estar presente, para promover a discussão das nossas práticas e a suaverificação com as nossas crenças e necessidades, regulando assim as relações sociais
do homem com o objectivo de garantir a coesão social e harmonizar interesses sociais e
colectivos (Roehrs e Malagutti, 2011), e deve ser promovida numa área tão dilemática
como a do doente crítico na urgência/emergência.
Na sua reflexão sobre que competências utilizam, o domínio ético surgiu para justificar
o zelo dos enfermeiros pelos princípios éticos ligados à dignidade humana. O guiar
da pessoa através dos cuidados, cuidando do dever de informar para promover aautonomia, o conforto e o bem-estar da pessoa e da família, foi referenciado pelos
enfermeiros e já foi aqui amplamente explicado a propósito da diferenciação do cuidar
dos enfermeiros no estudo de Holmberg e Fagerberg (2010).
O cuidado humanizado, é fundamentado na ética, como reflexão crítica sobre o
comportamento humano que permite, interpretar, discutir e problematizar os valores, os
princípios e as regras morais, para o saudável convívio social. A ética orienta a prática
profissional para o respeito à vida, à dignidade e aos direitos da pessoa, para a sua
integridade, liberdade e saúde. Significa atenção ao bem-estar da pessoa (Reppetto e
Hupsel, 2011), princípios revelados de forma veemente pelos nossos entrevistados.
Martins (2009) expõe, que o contexto de tomada de decisão da área do doente crítico,
com frequência coloca a questão do dilema ético que manifesta a necessidade de um
referencial ético. O autor considera, que a proposta de 1979 de Beauchamp e Childress é
um dos mais utilizados mundialmente, e um dos que melhor responde aos cuidados de
saúde. Referencia que é composto de quatro princípios: autonomia, beneficiência, não
maleficiência e justiça. Cada um destes princípios, expressa a imposição de respeito
por um determinado valor, aperfeiçoando um corpo coeso e coerente de valores, em que
cada um deles vale pelo valor que representa, sendo complementado pelos outros. A
atribuição de supremacia a qualquer deles depende sempre de múltiplos factores, entre
os quais, o tipo de situação, as pessoas, envolvidas, a urgência na resolução ou a
cultura em vigor. Estes quatro princípios têm sido considerados a “bíblia” da bioética
na literatura dos últimos anos, corporalizando o princípio moral da dignidade da
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pessoa humana e revelando-se como um pilar estrutural e estruturante da ética em
cuidados de saúde.
Foram estes preceitos éticos que pudemos ver espelhados nas opiniões dos nossosinformantes, que para além do referido, também lhes tem permitido por exemplo
aproximarem-se o suficiente da pessoa e da família numa situação de morte, sem
também eles morrerem um pouco (Martins, 2009; Holmberg e Fagerberg, 2010).
Muito já discorremos neste trabalho sobre a distinção do cuidar dos enfermeiros e sobreos seus conhecimentos disciplinares próprios. As competências relacionais são talvez
uma das características mais marcantes e diferenciadoras do cuidado dos enfermeiros,
levando Martins (2009) a dizer que, negando ou esquecendo a relação, a actuação fica
incompleta, amputada, mesmo nos cuidados ao doente crítico. Esta necessidade da
competência relacional está expressa nas opiniões dos nossos entrevistados, garantindo
que estas são verdadeiramente mais importantes na garantia do cuidado humano na
emergência, proporcionando a criação de uma realidade menos agressiva e hostil para as pessoas (Reppetto e Hupsel, 2011).
Holmberg e Fagerberg (2010), no seu trabalho sobre responsabilidades dos enfermeiros
no cenário pré-hospitalar, reconhecem a especial formação e preparação dos
enfermeiros nesta componente do cuidar, desocultando o seu contributo no suporte ao
cuidado técnico e científico cooperando para a excelência da prática. Esta perspectiva é
notória na asserção de um dos nossos informadores Suecos quando afirma.
F7 “Nurses assesses and treats all patients based on their own
knowledge and experience. She collects all available knowledge about
the patient from the situation of the patient is in. It can be from relatives,
or a passer-by and sometimes no one of the symptoms the patient shows.
The nurse provides nursing care is unique to each patient and
opportunity. The care that nurses provide, she can take the support of
our treatment guidelines...”
Competências de Ajuda pela Relação
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A construção da determinação profissional dos enfermeiros, e da sua perícia, tem de
passar obrigatoriamente pelo desenvolvimento da competência na relação, e pela
valorização desta componente nos cuidados emergentes. A actuação centrada no doente
e o planeamento de estratégias de intervenção mais adequadas depende do tempo
dedicado ao doente, e do investimento na relação para que se manifestem as suas
características pessoais. O uso de uma atitude empática positiva em relação ao outro,
influencia a relação, deixando ambos os intervenientes mais satisfeitos, permitindo
tomadas de decisão mais partilhadas, maior satisfação das pessoas pelos cuidados
recebidos. Esta atitude positiva representa um conjunto de demonstrações de interesse
pelo outro e pelos seus problemas, de respeito por tudo o que o outro é e de verdadeira
disponibilidade à relação. Tem que ver com a atenção ao outro, aos seus sentimentos e pensamentos, integrando-os na sua visão da pessoa e da doença, no sentido de conhecer
as prioridades, as crenças e as necessidades da pessoa, favorecendo assim inclusive, a
adesão terapêutica ao tratamento (Martins, 2009). Podemos recordá-lo.
E2 “O nível pré-hospitalar é isso mesmo, é esse explicar o que é que se
vai fazer (...) acho muito importante a intervenção do enfermeiro nesse
sentido... no acalmar as pessoas, no ter essa, estas capacidades que nos
distinguem de, de... podermos comunicar com elas, de (...) diminuir estes
níveis de ansiedade, não só da família, como da própria vítima, que já
está numa situação... precária a nível de saúde e que os níveis de stress e
de ansiedade a podem piorar.”
Os entrevistados reconhecem a diferença da aptidão comunicacional no cuidar no
contexto de urgência, como poderosa ferramenta para o estabelecimento desta atitude
positiva, pelas quais as competências de ajuda pela relação englobarão sempre acapacidade de estabelecer uma comunicação efectiva com a pessoa e família (Martins,
2009; Holmberg e Fagerberg, 2010; Reppetto e Hupsel, 2011). O toque pelo conforto
que proporciona à pessoa, é também reconhecidamente, um valioso instrumento no
cuidar pré-hospitalar (Holmberg e Fagerberg, 2010).
Ainda relativamente às competências de ajuda pela relação, Martins (2009), refere que a
comunicação de más notícias, a capacidade de negociação e a relação interpares e
com outros profissionais (fundamentalmente em situações limite) são habitualmenteáreas em que se faz notar esta capacidade. Se nos recordarmos, foram muitas as
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
200
descrições dos nossos informantes que manifestam o uso efectivo desta competência
como estratégia.
E2 “A nível de relações, é exactamente a mesma coisa... a nível profissional o enfermeiro tem essa formação, utiliza-a diariamente no
hospital, durante muito tempo com as pessoas, com várias pessoas. Tem
uma experiência, uma estaleca completamente diferente nesse sentido. O
que o torna apto, muito mais apto para esse tipo de relação com a
pessoa e com a situação de stress, uma situação diferente e muito
específica como é o pré-hospitalar.”
Torna-se mesmo evidente que as práticas de cuidar associadas aos papéis deinformação/orientação e de ajuda dos enfermeiros, são fundamentais para o sucesso de
intervenções médicas de elevado cariz técnico, porque tornam essas intervenções
seguras proporcionando grande confiança aos doentes (Benner, 2001).
Sem dúvida que para a afirmação profissional, a competência de acreditar em si próprio
e na sua capacidade, é fundamental e necessária para o sucesso na intervenção. Esta é
uma forte e firme convicção dos enfermeiros na prática pré-hospitalar. Os nossos
entrevistados têm certeza da sua capacidade e habilidade para a efectividade dos
cuidados pré-hospitalares. Este convencimento não é injustificado, e como já referimos
está bem esclarecido no enunciado de posição da Ordem dos Enfermeiros (2007, p.1)
sobre as Orientações Relativas às Atribuições do Enfermeiro no Pré-Hospitalar.
“O enfermeiro possui formação humana, técnica e científica adequada para a prestação de cuidados em qualquer situação, particularmente em contexto demaior complexidade e constrangimento, sendo detentor de competênciasespecíficas que lhe permitem actuar de forma autónoma e interdependente,integrado na equipa de intervenção de emergência, em rigorosa articulaçãocom os CODU e no respeito pelas normas e orientações internacionalmenteaceites”.
A Ordem dos Enfermeiros (2007, p.1), como sabemos afirma que: “só o enfermeiro
pode assegurar os cuidados de enfermagem ao indivíduo, família e comunidade, em
situação de acidente e/ou doença súbita, da qual poderá resultar a falência de uma ou
Reconhecimento de capacidadeProfissional Intrínseca
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
201
mais funções vitais, pelo que deve integrar obrigatoriamente a equipa de socorro pré-
hospitalar”.
Os enfermeiros manifestam como vimos o seu sentimento de capacidade para estaintervenção pelos seus conhecimentos disciplinares próprios e pela sua prática
clínica, e no que a isto respeita, Benner (2001, p.15), refere que,
“a prática de enfermagem é bem mais complexa do que aquilo que a maioriadas teorias formais de enfermagem preconizam (...) os enfermeiros na práticademonstram níveis muito elevados de raciocínio. Por exemplo: as enfermeirasidentificam, precocemente, sinais de aviso, que salvam a vida dos doentes comalterações súbitas do seu estado clínico; as enfermeiras ajustam de formainstantânea terapêuticas de acordo com as respostas do doente; as práticas decuidar, incluindo as interacções que promovem e acompanham a recuperação ea cura, ajudam os pacientes e as suas famílias a viver com as suas doença s”.
Ficou aqui evidente o acreditar dos enfermeiros neste esforço de afirmação profissional.
Com as suas capacidades e convicções neste esforço, completámos o esclarecimento do
fenómeno à luz do quadro conceptual utilizado.
4.3. – ENSAIANDO UM MODELO EXPLICATIVO – FUNDAMENTAÇÕES DO
ESFORÇO CONTÍNUO DE AFIRMAÇÃO PROFISSIONAL
Segundo Strauss e Corbin (2008), a descoberta da categoria central, que agrega e integra
ao seu redor todas as outras categorias, significa sintetizar toda a história arquitectada
com base nos achados obtidos, explicando as similitudes e diferenças do fenómeno
investigado.
Um dos objectivos delineados para este trabalho de campo, comprometia-se com atentativa de desenvolver uma teoria de médio alcance que sustentasse a compreensão do
contexto de exercício profissional dos enfermeiros na actividade pré-hospitalar, aliás,
este é como vimos um propósito da “Grounded” que corroboramos, convencidos de
que, contemporaneamente, a investigação deve ter origem na teoria e concorrer para a
teoria, sob pena de se produzir apenas informação desgarrada e avulsa.
Segundo Martins (2008), o fenómeno inclui-se até, na área de influência das teorias de
médio alcance, que são o nível menos abstracto do conhecimento teórico, revelando-se
úteis por exemplo, no esclarecimento de pormenores característicos da prática de
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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enfermagem como informações que indicam a situação ou estado de saúde, os alvos de
cuidados ou a sua faixa etária, o estabelecimento ou área de prática e a
actuação/intervenção de enfermagem.
A riqueza dos resultados que obtivemos, a sua abundância e distinção, proporcionou
algumas dimensões que nos merecem alguma atenção, indícios que nos permitem talvez
ensaiar um modelo explicativo e formular algumas enunciações ou postulados
esclarecedores da caracterização do fenómeno de esforço contínuo de afirmação
profissional dos enfermeiros no exercício pré-hospitalar. Porém, não arriscamos
formular a referida teoria de médio alcance, seria muita pretensão face a alguns factos
que nos parecem conferir algumas limitações ao estudo. Em primeiro lugar, devido á
complexidade do fenómeno, que envolve múltiplos factores e intervenientes. Depois
porque esta foi uma “nova rota na travessia oceânica” da investigação para a autora, a
sua inexperiência com o método, a sua parca disponibilidade e a sua fase de perícia
profissional, aumenta a probabilidade de erro ou interpretação deficiente das cartas de
marear, não pretendemos o naufrágio nesta fase.
Todavia, no sentido de conceder significado ao conhecimento, pelo auxílio na descrição,
elucidação e compreensão de uma área prática do exercício profissional dosenfermeiros, acreditamos que o Modelo Explicativo que ensaiamos em seguida, poderá
ser uma modesta contribuição, para a confirmação e autonomia profissional, para a
regulação, para o desenvolvimento do ensino de novos modelos formativos, para a
investigação e em última análise, para a excelência dos cuidados da prática de
enfermagem na área pré-hospitalar.
Assim, o esquema ilustrativo mais adiante pretende encerrar a caracterização da
categoria central, afirmando-se como o Modelo Teórico Final do Esforço Contínuo de
Afirmação Profissional dos Enfermeiros no Exercício Pré-Hospitalar.
Antes de prosseguirmos neste modelo explicativo, importa clarificar que tivemos como
ponto de partida, o paralelismo de alguns princípios de uma proposta de McGillis e
Doran (2001) para a avaliação de impacto do papel desempenhado pelos enfermeiros,
baseado na estrutura-processo-resultado de cuidados de qualidade. O propósito deste
estudo das autoras foi contribuir para o campo da gestão de enfermagem, examinando as
relações nas mudanças entre a diferenciação na qualificação das equipas de enfermagem
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
203
e as pessoas, o sistema (considerando qualidade e custos), e os resultados em saúde
obtidos pelos enfermeiros.
Para Margato (2011), a demonstração do valor dos cuidados de enfermagem e o seuimpacto, depende do desenvolvimento de projectos direccionados à obtenção de
resultados em saúde, que considerem as diferentes componentes das actividades
desenvolvidas pelos enfermeiros no dia-a-dia, usando a orientação anterior ou outra.
Assim, conhecendo um pouco melhor a proposta (no original e através de Margato,
2011), temos que, o componente de estrutura compreende, enfermeiro, pessoa e
unidade de cuidados, variáveis que influenciam os processos e os resultados de saúde. A
componente do processo, que se baseia na evidência de intervenções independentes einterdependentes. Salientam-se no papel autónomo dos enfermeiros as actividades de
avaliação das pessoas, tomada de decisão, intervenções sensíveis aos cuidados de
enfermagem e acompanhamento do processo terapêutico. A função interdependente
compreende as actividades e responsabilidades que os enfermeiros compartem com
outros elementos da equipa de saúde, como funções que promovem a continuidade, a
coordenação e a integração do atendimento às pessoas, e as actividades relacionadas
com prescrições e acompanhamento de tratamentos médicos. A componente deresultado deve incluir a caracterização do estado de saúde e a saúde percebida dos
beneficiários dos cuidados de enfermagem e os custos directos e indirectos a eles
associados. São estes pressupostos que nos permitem considerar a efectividade e
determinar o valor dos cuidados de enfermagem, designadamente o valor social, aliado
à equidade no acesso e justiça social, valor político, associado aos custos económicos e
valor operacional, ligado aos resultados.
Com base nestes princípios e concepções passamos ao ensaio do modelo explicativo,
que apresenta propostas no percurso da afirmação profissional, que demonstram
bloqueios e a necessidade de redefinir estratégias operativas na acção do compromisso
profissional dos enfermeiros com esta actividade.
O esforço contínuo de afirmação profissional no exercício da actividade pré-hospitalar
surge, como um constructo que se desenvolve numa estrutura onde interagem os
enfermeiros, as pessoas que precisam dos seus cuidados, e a unidade de cuidados pré-
hospitalares a quem compete oferecer cuidados de saúde precoces. A relação entre estes
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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três intervenientes fomenta o fenómeno e o seu desenvolvimento, contribuindo de
formas distintas para as suas consequências na obtenção de resultados.
Os enfermeiros são os actores principais deste processo, procurando a afirmação profissional num contexto de maior complexidade e exigência, em que operam no
percurso de evolução desta área de trabalho que exige uma resposta diferenciada para o
socorro pré-hospitalar Actuam com base na diferenciação dos seus cuidados,
demonstrando no entanto, fragilidades próprias e impostas pelos outros vectores na
acção.
As pessoas e a sociedade com a sua evolução tecnológica e científica interagem nesta
estrutura, com a demanda na exigência da excelência de cuidados para além das paredesdas tradicionais unidades de cuidados hospitalares, criando um novo e complexo padrão
de exercício profissional.
Por outro lado, temos o sistema/organização de resposta à emergência pré-hospitalar,
que face ao novo conhecimento disponível, à exigência da globalização da sociedade
tecnológica e científica que prolonga e encurta a vida das pessoas – com a ciência
médica que estende os anos e o desenvolvimento tecnológico que cria novas ameaças e
perigos - à diversidade de novos e crónicos protótipos patológicos, procura a
uniformização e diferenciação dos seus cuidados com base na evidência neste domínio,
sem no entanto distinguir uma padronização e organização efectiva desde a concepção à
monitorização e avaliação deste sistema.
Esta intrincada estrutura relacional, os seus interesses, os seus custos e necessidades,
fazem emergir uma nova complexidade de intervenção, que solicita o maior
compromisso e empenho dos enfermeiros na senda da determinação profissional.
Estudado o esforço neste contexto específico, percebemos que se desenrola um processo
de afirmação, que sofre no entanto resistências, retroalimentando-se em condições e
estratégias pouco efectivas que resultam na continuidade do fenómeno, solicitando
reformulações urgentes.
No processo de compromisso com a afirmação profissional, os enfermeiros respondem
sobretudo com os seus recursos mais diferenciadores na prestação de cuidados de saúde.
A sua formação diferenciada fomentada por um percurso académico na área dasciências da saúde, que lhes permite uma importante base conceptual e massa crítica,
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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associado também a um percurso de formação permanente no quotidiano da prática e na
frequência de formação pós graduada. As suas competências de intervenção, que
agregam um corpo de conhecimento próprio de cariz técnico, científico, ético, relacional
e de atribuição legal na prestação de cuidados de enfermagem, ainda a sua experiência
clínica, que lhes permite uma actuação com base na evidência e de acordo com a “legis
artis”. Não esquecem também uma capacidade muito própria de intervenção em equipa,
que acreditam incrementar a eficácia dos resultados em saúde e a satisfação dos
profissionais. Contam igualmente, com algum reconhecimento que o seu core próprio
de intervenção começa a granjear socialmente.
Porém, este processo encontra algumas resistências à afirmação dos enfermeiros, tendo
como resultado a continuidade deste esforço, compreendemos como obstáculos e
bloqueios aspectos estruturais da organização de um efectivo sistema de prestação de
cuidados de saúde. O défice de regulação da actividade, que verificámos ser
proveniente, quer do sistema/organização da actividade, quer do interior da enfermagem
pela imaturidade da sensibilidade a esta área do exercício, tanto nos órgãos tutelares
como na própria classe profissional, indefinições que se fazem sentir na acção, na real
distribuição de competências pelos interventores, na formação complementar, seja ela
académica ou profissional, e ainda na ausência concreta de monitorização, auditoria e
avaliação da actividade pré-hospitalar. O valor social percebido dos cuidados de
enfermagem, continua ainda a ser um importante condicionamento à determinação
profissional dos enfermeiros, uma visão difícil de mudar enquanto se mantiver o estado
deficitário da demonstração de resultados sensíveis à prática dos enfermeiros.
Este decurso do processo de afirmação profissional dos enfermeiros denotou a
necessidade de empreender novas estratégias centradas na estrutura descrita, constituída pelos enfermeiros, pessoas e sistema/organização, ao invés de serem apenas
concentradas nas capacidades e habilidades dos enfermeiros, pois essas estão
devidamente estabelecidas e reconhecidas. Assim, a confirmação profissional na
actividade pré-hospitalar passa pela regulação efectiva da actividade pré-hospitalar, no
seu planeamento, objectivos, recursos, acção, monitorização e auditoria, ainda na clara e
concreta definição das competências dos interventores. Passa ainda pelo
desenvolvimento de instrumentos de avaliação dos ganhos em saúde produzidos pela
prática dos profissionais, percebemos que o registo da actividade e das intervenções dos
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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enfermeiros, carece de normalização e evidência de resultados. A excelência dos
cuidados, fundamentados no core de intervenção da enfermagem e na evidência clínica,
têm de ser promovidos e divulgados demonstrando a sua demanda social. Demonstrou-
se também, que a especificidade e complexidade desta área de intervenção reclamam o
desenvolvimento de novos modelos formativos específicos, tanto no domínio
académico, como profissional ou permanente.
Fica assim completo o Modelo Teórico Final que obtivemos da decomposição dos
dados, e que podemos observar graficamente na Ilustração 16 – Diagrama 7 na página
seguinte.
Partindo da análise efectuada, e do refinamento analítico que conseguimos obter dosconceitos, a que associámos a perspectiva da literatura e de outros interventores
internacionais, que ampliaram a informação, mas que de um modo geral foram
congruentes com os nossos achados, consideramos conseguir deixar algumas indicações
estratégicas com interesse prático.
Sabendo que neste momento não podemos chegar a postulados teóricos, visto não
termos desenvolvido declaradamente uma teoria, devido às limitações que surgiram e
que posteriormente fomos definindo, pensamos ter no entanto pistas que nos indiciam:
A determinação profissional dos enfermeiros na área pré-hospitalar faz-se
através do seu corpo de conhecimentos próprio que distingue os seus cuidados;
O trabalho de equipa é estruturante da prática de cuidados na actividade extra-
hospitalar;
Os bloqueios e obstáculos à afirmação profissional dos enfermeiros centram-se
predominantemente em aspectos estruturais da organização e regulação do
sistema pré-hospitalar;
A afirmação profissional dos enfermeiros na actividade pré-hospitalar passa por
uma regulação mais efectiva da actividade e por uma definição mais
esclarecedora das competências dos vários interventores;
O desenvolvimento de diagnósticos, problemas, e padrões de qualidade de
cuidados de enfermagem na prática pré-hospitalar determinam a sua autonomia;
7/23/2019 Enfermagem Pre Hospitalar - Afirmacao Profissional 2012 Tese
Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
209
CONCLUSÃO
Quando decidimos empreender este trabalho pretendíamos obter informações que nos
permitissem conhecer melhor o exercício da enfermagem pré-hospitalar e contribuir
para o definir, tínhamos como finalidade compreender em contexto, como é percebido
este exercício profissional dos e pelos enfermeiros. Para isso realizámos um estudo de
cariz qualitativo, utilizando a “Grounded Theory” ou Teoria Fundamentada, através do
método de Strauss e Corbin, para a conceptualização desta área de cuidados, fundadosnos testemunhos dos actores enfermeiros, na análise da literatura e no trabalho de
campo.
Chegados ao fim das rotas de navegação impostas por esta pesquisa, não podemos dizer
que esta foi uma viagem fácil. Foram algumas as limitações e dificuldades surgidas,
destacamos alguns factores que considerámos mais limitadores, por poderem
condicionar a eficácia e a eficiência do processo de investigação:
A inexperiência da investigadora na metodologia da “Grounded Theory”, a
inovação, a criatividade, a constante comparação de dados e o questionamento
sempre presente, não foram fáceis de gerir;
A dissemelhança da intervenção dos enfermeiros nos múltiplos SEM pelo
mundo, provoca a diversidade da literatura em algumas temáticas, e também a
sua escassez e falta de especificidade noutras;
A carência de estudos na área do fenómeno em Portugal, dificultou a
comparação com o referencial teórico e a orientação metodológica desta
pesquisa para melhor explorar as concepções interpretativas da problemática;
A dificuldade de conciliar no tempo e espaço o acesso da investigadora aos
informantes, por reciprocidade de motivos, pessoais e profissionais;
O elevado número de dados a analisar, pela ingenuidade metodológica da
investigadora, podem ter sido desperdiçados.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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As características de permanente envolvimento nos dados da “Grounded”, pela já
citada inexperiência da investigadora, deixaram-lhe sempre alguns sentimentos de
insegurança e de incerteza no seguimento de todas as pistas e indícios que foram
surgindo, ficando sempre a incerteza da consistência e amplitude dos resultados se
tivéssemos seguido outros rumos. Porém, todas estas dificuldades foram ultrapassáveis
com a sábia orientação académica desta pesquisa, deixando a convicção de termos
alcançado os objectivos inicialmente definidos para esta viagem de navegação pelo
contexto da enfermagem pré-hospitalar.
Estamos conscientes que a estratégia e o planeamento determinados permitiram alcançar
importantes conclusões para os domínios dos três objectivos gerais definidos: Análise
do contexto da prática de enfermagem no pré-hospitalar; Comparação do exercício da
actividade pré-hospitalar em Portugal com contextos internacionais semelhantes e
diferentes; Descoberta de conceitos do contexto da actividade pré-hospitalar de
enfermagem. Essencialmente tendo como base estas dimensões, extraíram-se algumas
conclusões:
A – ANÁLISE DO CONTEXTO DA PRÁTICA DE ENFERMAGEM NO PRÉ-
HOSPITALAR
O ambiente de intervenção pré-hospitalar é feito de especificidades que o
diferenciam e lhe acrescentam complexidade. Salienta-se a sua
pluridisciplinaridade de acção em articulação funcional com diferentes actores
e funções para além do âmbito clínico, o seu contexto relacional menos
estratificado de interdependência funcional que cria alguns conflitos de papéis ecrispações por indefinição concreta de funções. Distingue-se também a sua
amplitude de intervenção em todo o ciclo vital e a sua multiplicidade
patológica, com elevada prevalência de situações críticas nas necessidades dos
seus alvos de cuidados, constituídos pelas pessoas, família e comunidade.
Necessidades que vão no entanto para além das situações críticas, exigindo
habilidades e aptidões específicas. Evidencia-se ainda a diversidade do espaço
físico de trabalho fora das paredes hospitalares, que desafia a transposição dos
cuidados dos enfermeiros para a “rua”.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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O exercício profissional dos enfermeiros conta com mediadores, que se
constituem como variáveis de acção, cuja ambiguidade neste âmbito, determina
um maior empenhamento. A formação académica é um recurso facilitador da
aprendizagem neste contexto e diferencia a intervenção, porém, a ausência de
formação curricular específica da área é limitadora da afirmação profissional. A
experiência clínica, sobretudo na área do doente crítico, favorece a acção e
distingue a resolução de situações mais complexas. O exercício dos enfermeiros
nesta área de cuidados, acompanhou a sua necessidade de evolução e contribuiu
para o desenvolvimento do socorro medicalizado através da sua actividade em
várias funções, desde a área operacional, á formação e gestão. A comparação
com os contextos internacionais também medeia o exercício dos enfermeiros,
com referências para diferentes competências, responsabilidades e
reconhecimento.
Os enfermeiros percebem que operam num contexto de esforço contínuo de
afirmação profissional e identificam as suas causas. Questionam a formação
específica complementar sob responsabilidade do INEM, reconhecendo-lhe
lacunas na profundidade e duração, na indiferenciação relativamente a outros
interventores e na desorganização da formação contínua. Admitem indefiniçõese desregulação no exercício pré-hospitalar, nomeadamente na ausência formal
de um referencial de competências dos interventores que prejudica a
interdisciplinaridade funcional, atribuem esta responsabilidade ao afastamento
da área por parte da tutela dos enfermeiros durante anos, e também à
imaturidade e falta de sensibilidade da classe para o reconhecimento deste
exercício. Englobam ainda nestas indefinições, a ausência de registo sistemático
das intervenções de enfermagem nos vários meios de emergência queimpossibilita a visibilidade de ganhos em saúde sensíveis à intervenção dos
enfermeiros, e também a investigação da sua prática. Consideram igualmente a
carência de sistemas de monitorização, auditoria e avaliação que desenvolvam a
excelência de cuidados. A atribuição de baixo valor aos cuidados de
enfermagem, e a percepção de ameaças externas ao seu desempenho, são
também motivos de um maior compromisso dos enfermeiros no esforço para a
afirmação profissional nesta actividade.
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Exercício de Enfermagem Pré-Hospitalar: Esforço Contínuo de Afirmação Profissional
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A fundamentação das conclusões aqui expostas, suportadas nos resultados que
obtivemos ao longo de todo o trabalho, evidenciam a pertinência de aqui deixar algumas
sugestões de trabalho e de investigação que apontamos:
Incentivar os enfermeiros da actividade pré-hospitalar a realizar sempre os
registos da sua intervenção autónoma nos cuidados prestados, e a reforçar a
passagem dessa informação na transferência e encaminhamento nas unidades de
saúde;
Promover o desenvolvimento de uma plataforma de registos próprios de
enfermagem na actividade pré-hospitalar;
Fomentar a interdisciplinaridade entre o sistema nacional de saúde e a tutela dosenfermeiros, para o desenvolvimento de modelos de aferição dos ganhos em
saúde sensíveis à prática dos enfermeiros;
Incluir de forma mais estruturada nos currículos de enfermagem, de base e pós
graduados, esta vertente do exercício profissional dos enfermeiros, dando
especial atenção ao desenvolvimento de competências específicas nesta área;
Desenvolver e aplicar planos de formação de curta duração conjuntos, dirigidos
aos vários actores do pré-hospitalar, com o objectivo central de desenvolver
competências relacionadas com o trabalho de equipa;
Replicar estudos desta natureza a diferentes populações e SIEMs, à procura de
relações entre as competências definidas, os bloqueios percepcionados e a
afirmação profissional dos enfermeiros;
Realizar um estudo de investigação nacional, que identifique todas as
competências específicas e interdependentes executadas pelos enfermeiros na
actividade pré-hospitalar;
Desenvolver estudos internacionais conjuntos, para consensos na investigação e
definição das competências específicas dos enfermeiros neste exercício
profissional.
Fomentar o desenvolvimento de um conjunto de pesquisas centradas nas
consequências da intervenção dos enfermeiros neste domínio profissional.
O exercício pré-hospitalar dos enfermeiros é um campo novo ou renovado da sua
intervenção profissional, que carece ainda de definição e estruturação no sentido doesclarecimento da sua acção para a obtenção de resultados em saúde. Do que
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linha], Vol. 22, Nº 1, (2009), p. 25-45 [consult. 2010.08.30]. Disponível em
Ao Conselho de Administração do Hospital de Faro EPE
Catarina Gonçalves Tavares, Enfermeira Graduada do Serviço de Cardiologia do
Hospital de Faro, EPE e das Viaturas Médicas de Emergência e Reanimação do mesmo
hospital, na qualidade de estudante do III Curso de Pós-Licenciatura de Especialização
em Enfermagem Médico Cirúrgica, da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra,
pretende desenvolver um projecto de investigação intitulado “O Contexto da
Enfermagem Pré-hospitalar”, tendo como orientador o Professor Doutor José Carlos
Martins, Professor Adjunto da referida Escola.
Considerando que a actividade Pré-hospitalar de Enfermagem é um âmbito de
intervenção relativamente novo e pouco estudado no nosso país, parece-nos que
beneficia de um maior esclarecimento e definição, contribuindo assim para uma melhor
estruturação e actuação no socorro e cuidados pré-hospitalares a prestar à população,
pelo que o nosso estudo tem como objectivos: 1- Analisar o contexto da prática de
enfermagem no pré-hospitalar; 2 - Comparar o exercício da actividade pré-hospitalar emPortugal com contextos internacionais semelhantes e diferentes; 3 - Descobrir conceitos
do contexto da actividade pré-hospitalar de enfermagem.
O estudo a realizar é de natureza qualitativa. Para o efeito, pretendemos utilizar como
métodos de recolha de informação, a análise de legislação, regulamentos e documentos
que regem a actividade a nível nacional e internacional, a observação participante como
enfermeira no exercício pré-hospitalar, a entrevista a profissionais de enfermagem no
exercício pré-hospitalar, podendo com o decorrer do estudo ser necessária a entrevista a
pessoas de outra categoria profissional no exercício pré-hospitalar ou com
responsabilidades sobre o mesmo, quer em Portugal quer no estrangeiro. Pretendemos
utilizar um guião semi-estruturado, com perguntas orientadoras que segue em ANEXO.
Tendo em conta a natureza da nossa pesquisa e os objectivos a que nos propomos, o
estudo exige o contacto com a equipa multidisciplinar que desempenha funções pré-
hospitalares na instituição que representa. É neste sentido, que pedimos autorização para
a colheita de dados, através da abordagem de alguns elementos dessa equipa para a
7/23/2019 Enfermagem Pre Hospitalar - Afirmacao Profissional 2012 Tese
realização das referidas entrevistas, que serão acordadas voluntariamente e realizadas
em horário pós-laboral e em espaço a definir entre o entrevistado e o entrevistador.
Todos os dados recolhidos neste estudo têm apenas como objectivo de aplicação ocontexto académico, não se pretendendo realizar qualquer comparação entre serviços e
instituições, mas antes analisar os dados no seu contexto de acção.
O zelo pela ética e deontologia profissional no seu tratamento é um princípio que nos
comprometemos a exercer. O carácter voluntário da participação, o consentimento
informado, o esclarecimento da possibilidade de abandono da pesquisa em qualquer
altura são requisitos que serão cumpridos e que seguem esclarecidos no guião da
entrevista que segue em anexo.
Comprometemo-nos ainda, a entregar a cada serviço ou instituição envolvida um
exemplar do relatório final de investigação quando concluído.
Estando cientes que o êxito deste estudo depende maioritariamente da colaboração na
anuência ao acesso às pessoas que nos podem facultar grande qualidade nos
testemunhos que pretendemos, solicitamos desde já a vossa melhor atenção para esta
possibilidade, no sentido de podermos prosseguir o nosso trabalho com alguma brevidade.
Exmº Sr. Delegado Regional do Algarve do Instituto Nacional de Emergência Médica
Catarina Gonçalves Tavares, Enfermeira Graduada do Serviço de Cardiologia do
Hospital de Faro, EPE e das Viaturas Médicas de Emergência e Reanimação do mesmo
hospital, na qualidade de estudante do III Curso de Pós-Licenciatura de Especialização
em Enfermagem Médico Cirúrgica, da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra,
pretende desenvolver um projecto de investigação intitulado “O Contexto da
Enfermagem Pré-hospitalar”, tendo como orientador o Professor Doutor José Carlos
Martins, Professor Adjunto da referida Escola.
Considerando que a actividade Pré-hospitalar de Enfermagem é um âmbito de
intervenção relativamente novo e pouco estudado no nosso país, parece-nos que
beneficia de um maior esclarecimento e definição, contribuindo assim para uma melhor
estruturação e actuação no socorro e cuidados pré-hospitalares a prestar à população,
pelo que o nosso estudo tem como objectivos: 1- Analisar o contexto da prática de
enfermagem no pré-hospitalar; 2 - Comparar o exercício da actividade pré-hospitalar emPortugal com contextos internacionais semelhantes e diferentes; 3 - Descobrir conceitos
do contexto da actividade pré-hospitalar de enfermagem.
O estudo a realizar é de natureza qualitativa. Para o efeito, pretendemos utilizar como
métodos de recolha de informação, a análise de legislação, regulamentos e documentos
que regem a actividade a nível nacional e internacional, a observação participante como
enfermeira no exercício pré-hospitalar, a entrevista a profissionais de enfermagem no
exercício pré-hospitalar, podendo com o decorrer do estudo ser necessária a entrevista a
pessoas de outra categoria profissional no exercício pré-hospitalar ou com
responsabilidades sobre o mesmo, quer em Portugal quer no estrangeiro. Pretendemos
utilizar um guião semi-estruturado, com perguntas orientadoras que segue em ANEXO.
Tendo em conta a natureza da nossa pesquisa e os objectivos a que nos propomos, o
estudo exige o contacto com a equipa multidisciplinar que desempenha funções pré-
hospitalares na instituição que representa. É neste sentido, que pedimos autorização para
a colheita de dados, através da abordagem de alguns elementos dessa equipa para a
7/23/2019 Enfermagem Pre Hospitalar - Afirmacao Profissional 2012 Tese
realização das referidas entrevistas, que serão acordadas voluntariamente e realizadas
em horário pós-laboral e em espaço a definir entre o entrevistado e o entrevistador.
Todos os dados recolhidos neste estudo têm apenas como objectivo de aplicação ocontexto académico, não se pretendendo realizar qualquer comparação entre serviços e
instituições, mas antes analisar os dados no seu contexto de acção.
O zelo pela ética e deontologia profissional no seu tratamento é um princípio que nos
comprometemos a exercer. O carácter voluntário da participação, o consentimento
informado, o esclarecimento da possibilidade de abandono da pesquisa em qualquer
altura são requisitos que serão cumpridos e que seguem esclarecidos no guião da
entrevista que segue em anexo.
Comprometemo-nos ainda, a entregar a cada serviço ou instituição envolvida um
exemplar do relatório final de investigação quando concluído.
Estando cientes que o êxito deste estudo depende maioritariamente da colaboração na
anuência ao acesso às pessoas que nos podem facultar grande qualidade nos
testemunhos que pretendemos, solicitamos desde já a vossa melhor atenção para esta
possibilidade, no sentido de podermos prosseguir o nosso trabalho com alguma brevidade.
My name is Catarina Gonçalves Tavares, I am conducting a research study under theMaster of Medical Surgical Nursing, entitled "The Context of Pre-Hospital Nursing."
To that end, I need to gather information from nurses for their professional experiencein Pre-hospital, so I ask for your cooperation.The study aims at examining the context inwhich falls the practice of nursing pre-hospital care, we want to know him better, andcontribute to try to define.
The objectives of the study are:• Analyze the context of nursing practice in the pre-hospital care;• Know the pursuit of pre-hospital in Portugal, and international contexts similar anddifferent;• Discover the business concepts of the context of hospital nursing.
I emphasize that all information provided will only be used for this research study. The privacy of participants will be ensured and the data will be pooled with those collectedfrom other participants, so that you can not be identified from the responses. Your
participation is voluntary, safeguarding the right to stop answering at any time, withoutthere arises any repercussions for you. If you have any questions to ask before decidingto participate, feel free to be held for email [email protected]. Thank you in advance for your cooperation to participate in this study, brieflyanswering the questions that follow.
Catarina Gonçalves Tavares
ISSUES
1 - I'd like you tell me a little about the practice of Nursing Pre-hospital, there contextand action, the role of nurses in this context.
3 - From your experience what are the gains for the population with the exercise of thePre-Hospital Nurses, can you describe some of your experiences that illustrate thesegains.
Je m’appelle Catarina Gonçalves Tavares, je mène une étude dans le cadre du Master desoins infirmiers médico-chirurgical, intitulé «Le contexte de la pré-hospitaliers de soins
infirmiers." À cette fin, j'ai besoin de recueillir des informations auprès des infirmières pour leur expérience professionnelle en pré-hospitalier, donc je demande votrecollaboration.
L'étude vise à examiner le contexte dans lequel s'inscrit la pratique des soins infirmierssoins pré-hospitaliers, nous voulons le connaître mieux, et de contribuer à essayer dedéfinir.
Les objectifs de l'étude sont les suivants:
• Analyser le contexte de la pratique infirmière dans les soins pré-hospitaliers;
• Connaître la poursuite de la pré-hospitalière au Portugal, et des contextesinternationaux semblables et différents;• Découvrez les concepts d'affaires du contexte de l'infirmier de pré.hospitalière.
Je tiens à souligner que toutes les informations fournies ne seront utilisées que pourcette étude. La vie privée des participants sera assurée et les données seront regroupéesavec celles collectées par d'autres participants, de sorte que vous ne pouvez pas êtreidentifiés à partir des réponses. Votre participation est volontaire, la sauvegarde du droitde ne plus répondre à tout moment, sans qu'il se pose des répercussions pour vous. Sivous avez des questions à poser avant de décider de participer, n'hésitez pas à être tenu
Merci d'avance pour votre collaboration pour participer à cette étude, brièvementrépondre aux questions qui suivent.
Catarina Gonçalves Tavares
QUESTIONS
1 - Je voudrais me parler un peu de la pratique des soins infirmiers pré-hospitaliers, horsde leur contexte et de l'action, le rôle des infirmières dans ce contexte.
Yo, Catarina Gonçalves Tavares soy enfermera, estoy realizando un estudio deinvestigación en la Maestría en Enfermería Médico Quirúrgico, titulado "El contexto de
la Enfermería Pre-Hospitalaria". A tal fin, tengo que recabar información de losenfermeros por su experiencia profesional en Enfermería pre-hospitalaria, por lo que pedimos su cooperación.
El estudio tiene como objetivo examinar el contexto en el que se inscribe la práctica dela enfermería de atención pre-hospitalaria, queremos conocerlo mejor, y contribuir atratar de definir.
Los objetivos del estudio son:
• Analizar el contexto de la práctica de enfermería en la atención pre-hospitalaria;
• Conocer lo ejercicio de la actividad pre-hospitalaria en Portugal, y los contextosinternacionales similares y diferentes;• Descubrir los conceptos del contexto de la enfermería pre-hospitalaria.
Insisto en que toda la información proporcionada sólo será utilizada para este estudio deinvestigación. La privacidad de los participantes se llevará a cabo y los datos secombinaron con los obtenidos de otros participantes, por lo que no puede identificarse a
partir de las respuestas. Su participación es voluntaria, salvaguardando el derecho adejar de contestar en cualquier momento, sin que surja ninguna repercusión para usted.Si usted tiene alguna pregunta que debe hacer antes de decidirse a participar, no dude encontactar [email protected] por correo electrónico.
Gracias de antemano por su cooperación para participar en este estudio, para lo que pidouna breve respuesta a las preguntas que siguen.
1 - Me gustaría que me dijera un poco de la práctica de Enfermería pre-hospitalaria, queme hablara de su contexto y la acción, e de el papel de las enfermeras en este contexto.
2 - Me gustaría que he mencionado las habilidades que usted piensa que la enfermera
desarrolla en su actividad pre-hospitalaria. ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________
3 - Desde su experiencia, cuáles son los beneficios para la población con el ejercicio dela Enfermería Pre-Hospitalaria, puede describir algunos experimentos que ilustran estoslogros.