ENCONTRO INTERNACIONAL PARTICIPAÇÃO, DEMOCRACIA E POLÍTICAS PÚBLICAS: APROXIMANDO AGENDAS E AGENTES 23 a 25 de Abril de 2013 FCLar/UNESP -Faculdade de Ciências e Letras do campus de Araraquara/SP A GESTÃO LOCAL E A ESCOLA ENQUANTO ORGANIZAÇÃO SOCIAL COMUNITÁRIA: alguns apontamentos para o fortalecimento da gestão participativa Adriana Marques Guimarães Dias Edson do Carmo Inforsato FCLar/UNESP - Faculdade de Ciências e Letras do câmpus de Araraquara
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ENCONTRO INTERNACIONAL PARTICIPAÇÃO, DEMOCRACIA E · modernidade, do Estado e das instituições, enquanto organização social e a constituição da identidade brasileira no contexto
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ENCONTRO INTERNACIONAL PARTICIPAÇÃO, DEMOCRACIA E
POLÍTICAS PÚBLICAS: APROXIMANDO AGENDAS E AGENTES
23 a 25 de Abril de 2013
FCLar/UNESP -Faculdade de Ciências e Letras do campus de
Araraquara/SP
A GESTÃO LOCAL E A ESCOLA
ENQUANTO ORGANIZAÇÃO SOCIAL COMUNITÁRIA:
alguns apontamentos para o fortalecimento da gestão participativa
Adriana Marques Guimarães Dias
Edson do Carmo Inforsato
FCLar/UNESP - Faculdade de Ciências e
Letras do câmpus de Araraquara
I – Apresentação
Este trabalho tem como objetivo analisar algumas ideias em torno das
possibilidades de se efetivar a gestão participativa nas unidades de ensino
como metodologia para se recuperar a concepção comunitária da escola.
Para tanto, buscou-se compreender, em linhas gerais, a crise da
modernidade, do Estado e das instituições, enquanto organização social e a
constituição da identidade brasileira no contexto moderno.
A partir da gestão social, apontaram-se alguns caminhos revelados nos
estudos em torno da gestão local, mais especificamente pela regulação da
instituição escolar, recuperando a função do Estado, dos profissionais de
ensino e das famílias de modo articulado e integrador.
Todas as análises aqui expostas são indicativas para se considerar as
possibilidades e limites da democracia brasileira e da cidadania negada pelos
processos históricos de formação da Nação por meio da concretização de um
modelo de gestão das escolas que possibilite a participação de todos os
segmentos nela envolvidos.
II - A crise da instituição escolar, da modernidade, do Estado e a identidade
brasileira: alguns apontamentos.
O modelo atual de instituição escolar é fruto de um longo processo de
modernização que se iniciou no século XV. Com o advento do Estado-Nação e
a necessidade premente de integração social, a escola foi o veículo ideológico
mais propício para empreender valores universais como a democracia e
atender às exigências do mercado. Nesse contexto, os professores foram a
personificação dos ideais modernos e os protagonistas de uma história da
educação com características próprias de estatização, fundadas na
racionalidade técnica: centralismo, formalismo e segmentação. Contudo, a
escola tem enfrentado vários desafios nas últimas décadas, gerando uma crise
da educação.
Essa crise extrapola a simples questão de objetivos a serem alcançados
(melhorar o desempenho dos alunos, diminuir a repetência e a evasão escolar,
modificar o método utilizado na aprendizagem e etc), pois as transformações
sócio-econômicas e culturais modificaram as relações sociais a ponto do
modelo institucional escolar se encontrar obsoleto para enfrentar a realidade
contemporânea. Portanto, se há algumas décadas a crise era conjuntural, pois
se acreditava que a escola possuía objetivos sociais, atualmente a crise é
estrutural, já que a incerteza da contemporaneidade não garante que a escola
e demais instituições continuem exercendo o seu papel social original.
(TEDESCO, 1998)
Segundo Touraine (1994), o modelo de organização social calcado na
modernização entrou em crise, pois há uma contradição entre os seus dois
pilares de sustentação: a racionalidade e a subjetividade. A racionalidade
garantiria o processo de modernização caracterizado pela busca idealizada de
uma coerência lógica entre a produção eficiente (proveniente da Ciência e da
Tecnologia), a organização social e sua regulação por meio das Leis. Por outro
lado, a subjetividade garantiria o desenvolvimento integral da personalidade,
pois só a modernização promoveria a libertação de todas as limitações sociais
ou culturais. No entanto, durante o processo de modernização a ênfase se deu
no primeiro aspecto, ou seja, na racionalidade e nos seus imperativos: a
universalidade por meio de regras impessoais (vida pública). Essa
característica procurava eliminar qualquer particularismo, sentimento ou paixão
natural da vida privada, já que só o coletivo e seus aspectos sociais poderiam
garantir a “igualdade e a fraternidade”, tão apregoada pela Revolução
Francesa. Porém, a “liberdade”, que também era um dos lemas da vida
moderna, ou da modernidade, não poderia se dar sem considerarmos os
aspectos individuais da personalidade. Desse modo, a objetividade (racional) e
a subjetividade (individual) se encontram em posições antagônicas e por isso
não se completam e nem podem atender à intenção de ordem e totalidade,
almejada pela modernização.
Nesse contexto, a Escola foi a instituição que protagonizou o embate
entre a racionalidade (Razão) e a subjetividade (Sujeito).
O objetivo central da instituição escolar no início da modernidade foi
promover a coesão social por meio de valores universais, deixando os
aspectos próprios da personalidade e dos sentimentos a cargo da família, já
que essa deveria responsabilizar-se pela socialização primária da criança.
Sendo assim, havia um modelo idealizado de articulação entre essas duas
instituições para que cada uma cumprisse o seu papel. Contudo, essa
premissa de impingir maior impessoalidade ao ensino é alterada com as ideias
de Rousseau e seus seguidores (Pestalozzi, Froëbel, etc), pois o modelo de
educação familiar e da vida privada invade a pedagogia, apontando a
necessidade de educação integral das crianças e jovens. Por isso, as
“pedagogias ativas” e as teorias modernas sobre a aquisição do saber
enfatizaram a importância dos aspectos afetivos para o processo de
aprendizagem, buscando a síntese entre o cognitivo e as condições pessoais e
de personalidade de cada pessoa. Assim, observa-se que os movimentos
progressistas em educação apontaram a contradição ou incompatibilidade
existente entre a reivindicação por uma educação que em primeiro plano
priorizou a quantidade (acesso da população aos bancos escolares),
culminando com a democratização do ensino, mas que desconsiderou a
importância da qualidade enquanto máxima de uma pedagogia que atualmente
considera as ‘diferenças’ como mote.
Atualmente, a função da escola pauta-se no respeito às diferenças, ou
seja, é preciso considerar as individualidades e as subjetividades como
elementos indispensáveis para aprendizagem, mas o sistema continua
burocratizado e regido pela racionalidade.
Para Nogueira (2007), o Estado e as organizações padecem de um
“sofrimento institucional” proveniente de todas as transições modernas,
gerando uma modernidade radicalizada que nos países periféricos da
economia mundial ganha uma angústia própria. Essa tese considera o
momento contemporâneo como o resultado dos anseios por modernidade, já
que o universalismo abstrato, o individualismo, o racionalismo, a produtividade
e a competitividade se impõem em novas formas que se reorganizam sem
cessar. Nesse sentido, a mudança e o movimento constante do “vir-a-ser”
promove uma reflexividade da própria modernidade. A auto-afirmação da
modernidade se vê sob o signo do excesso. Há uma hipermodernidade (apud
Lipovetsky, 2004), na qual o capitalismo se radicalizou na tradução da
globalização liberal, sem deixar de enfrentar suas contradições e as
tecnologias, que também se hiperdimensionalizaram. Porém, se constata um
acentuado valor no indivíduo e por isso as antigas bandeiras, como a justiça
social, a distribuição de renda e o controle da propriedade privada, cedem
espaço a anseios como o direito, identidade, privacidade, prazer,
desarticulando os objetivos das organizações e instituições que
tradicionalmente se fundaram no bem comum e na coletividade.
Esse contexto se torna ainda mais complexo e radical nos países da
América Latina e África, pois a modernidade radicalizada “ ... passa então a
conviver com formas “pré-modernas” de autoridade e a interagir com uma
sociabilidade explosiva, pouco cívica e pouco democrática. A radicalização do
moderno se objetiva de modo inevitavelmente paradoxal, desigual e
contraditório.” (NOGUEIRA, 2007, p. 47)
A relativização do poder permitiu que tudo fosse questionado, criticado,
mas isso promoveu uma crise nas referências sociais. Sendo assim, o projeto
moderno calcado na democracia não encontra atores em contextos e com
objetivos comuns, já que a participação requer o envolvimento pessoal de cada
indivíduo por um tempo considerável e uma construção ou concepção da
democracia brasileira. Nesse cenário, as práticas sociais e os relacionamentos
se encontram sem controle, promovendo a desordem e fragmentação das
ações institucionais.
Para Touraine (apud Nogueira, 2007), é preciso um novo paradigma que
possa superar a concepção econômica e social do Estado que ainda tem a
industrialização como modelo de ordenação da sociedade por um que
considere as demandas culturais dos sujeitos como norte.
A realidade contemporânea nos países ocidentais aponta para as
possibilidades da autonomia e ao mesmo tempo de anomia na configuração de
uma nova organização social. Também se observa alta dose de
fundamentalismos, violência e de medo como ingredientes da vida cotidiana.
O Estado brasileiro e sua ação calcada em um modelo de
desenvolvimento capitalista dos antigos países europeus, no qual a
modernidade originou-se, se concebeu a partir de uma história colonial de
dependência. Desse modo, a burguesia brasileira não conseguiu atualizar os
ideais da modernidade europeia no contexto do país.
As ideias universais modernas provenientes da cultura dos países
centrais quando chegam em determinada localidade dos países periféricos
sofrem continuamente um tipo de atualização que não eliminam a tradição
local, gerando um outro paradigma que não deixa de ser moderno, porque é
novo, mas não tem o mesmo significado que aquele do contexto europeu. Esse
paradoxo revela que o novo e o antigo são também as antíteses que
constituem o moderno:
A modernidade enquanto moda e momento é também a permanência
do transitório e da incerteza, a angústia cotidiana da incerteza em face
do progresso linear e supostamente infinito: a vida finita posta em face
da realidade social, do futuro, supostamente sem fim. A modernidade
não está apenas nem principalmente na coleção dos signos do
moderno que atravessam de diferentes modos a vida de todos nós.
Modernidade é a realidade social e cultural produzida pela consciência
da transitoriedade do novo e do atual. (MARTINS, 2008, p. 19)
Analisar a modernidade nos países latino-americanos torna-se um
grande desafio, já que eles estão historicamente datados depois da
modernidade europeia e por isso sua História começa na própria modernidade.
Sendo assim, tem-se a sobreposição de temporalidades. Ao mesmo tempo, é
um espaço, um contexto bem diverso da Europa, o que também causa uma
sobreposição de contextos, pois uma das características da nossa tradição foi
transplantar a cultura europeia. Além disso, o sentido futurista também dá uma
característica bastante particular a qualquer país latino-americano, já que sua
constituição também está ligada à ideia de nação jovem que futuramente
poderá efetivar seu projeto moderno.
O significado de futuro, de início já nos conduz a outra concepção do
que seja a modernidade brasileira, metáfora do paradigma que sintetiza o
particular e o universal, o novo e o antigo, o ontem e o amanhã, que se revelam
na História atual, nos conflitos cotidianos ou na existência de vários Brasis por
meio da transitoriedade e simultaneidade de tempos e espaços que ganham
configurações próprias.
O contexto brasileiro e sua situação periférica na cultura das sociedades
ocidentais confere um caráter inconcluso para o sentido da modernidade
padrão, já que a miséria ainda persiste nos seus contornos mais cruéis e em
vários níveis da consciência brasileira. Mas, é fundamental apontarmos que a
modernidade é continuamente o movimento da sociedade entre o possível,
aquilo que as sociedades centrais realizaram, e o impossível, aquilo que está
posto, mas parece inalcançável para a sociedade brasileira. Esse descortinar
das condições brasileiras no contexto mundial só foi possível porque a
modernidade sobrevive da sua autocrítica, do seu movimento dialético que
mostra o antimoderno do moderno e vice-versa. Nesse sentido, a modernidade
é:
(...) também a consciência crítica do moderno, isto é, a recusa da
transitoriedade e da impotência que ele implica. A modernidade só o é
na perspectiva da História e da historicidade do homem; na perspectiva
da certeza, e não da incerteza, de que a vida e a práxis conduzem à
constituição do humano, à humanização do homem, e não
simplesmente e permanentemente à sua coisificação. Essa realidade
só pode se constituir onde as virtualidades da racionalidade do capital
se propõem plenamente e abertamente; por certo, não se propõem no
Terceiro Mundo senão de modo inacabado, incerto e dissimulado.
(MARTINS, 2008, p.21)
O contexto brasileiro e a eterna busca por uma atualização moderna
desafiam o paradigma moderno justamente porque no Brasil suas contradições
são exacerbadas.
Segundo Martins (2008), de modo mais intenso e dinâmico que a
racionalidade da cultura ocidental, o pensamento moderno promoveu a reflexão
sobre as irracionalidades da sociedade capitalista.
A compreensão sobre a constituição da identidade dos brasileiros na
contemporaneidade não poderia se dar sem a reflexão sobre a tradição, que a
modernidade buscou eliminar, pois representava o conservadorismo, e sobre o
novo. Como se deu a incorporação do modelo estrangeiro e em especial do
poder do capital sobre o cotidiano num país marcado pela dominação e
exploração? Quais são as nossas raízes, nossa tradição, já que a racionalidade
colonial também conseguiu importar os primeiro prenúncios modernos, dos
quais as grandes navegações são a expressão mais evidente?
Para interpretarmos os sentidos da modernidade brasileira para os
brasileiros, é necessário que alguns pontos essenciais da modernidade
europeia possam ser repensados quando atualizados no Brasil: crença no
progresso científico e garantia dos direitos individuais, por meio da presença de
um sistema econômico (Capitalismo).
Fernandes (2006) analisa as estruturas do capitalismo brasileiro a partir
de uma questão que busca compreender a lógica do capital, tendo como
modelo a sociedade europeia. Nesse sentido, observa-se que no Brasil não
houve uma revolução burguesa como se deu na Europa, já que a burguesia
local optou por se unir às forças oligárquicas que ainda sobreviveram após a
Proclamação da República. Desse modo, os valores próprios de uma
sociedade liberal, que fundamentalmente deve ser uma ordem social