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carter que frisa o urbano, o moderno, o global, construindo uma
cultura que se situa
entre a arte e a vida, o sagrado e o profano (SILVA, 2000,
p.89).
A importncia do fenmeno para a populao a valorizao da tradio,
isso se
mostrou claro nas centenas de respostas dadas antes, durante e
depois da festa. Na tradio
da festa religiosa em questo, so adicionados rituais que a torna
mais popular. A religio
catlica a que reuni maior nmero de fiis no Brasil, e com a adio
de caractersticas
carnavalescas festa, ela se transforma e trs no s os devotos,
como tambm parte da
populao que quer apenas participar do movimento popular. A
carnavalizao torna o
fenmeno mais popular do que j o , misturando festa procisso,
sendo o festeiro o
prprio devoto, contudo um devoto que, devido carnavalizao, age
em certo momento
formalmente (rezando) em outro momento informalmente (danando e
pulando). uma
forma pela qual os diferentes grupos tendem a expressar sua
adeso aos valores sociais
comuns a toda sociedade (ALVES, 1980, p.104). Mas tambm uma
expresso que traz
seus conflitos.
A questo final que, sendo uma realizao que acontece dentro de
uma sociedade
e dela faz parte, e em meio a inevitvel globalizao do sistema
capitalista, ela pode e deve
ser vista como um fator que pode agregar e disseminar o
Desenvolvimento Local, muito
alm da noo somente econmica, passando para o estgio, to
necessrio hoje em dia, do
desenvolvimento social e humano. Nesse contexto, a cultura se
torna a forma pela qual os
indivduos se comunicam, interagem e criam meios de transformar o
cotidiano e serem
transformados pelo mesmo, numa relao dialtica do aprender a
desaprender para um
novo aprender (MARTN et alii, 2001).
No caso da Festa de So Joo Batista de Corumb, os atores sociais
devem aprender
a desaprender a noo de desenvolvimento que extingui a cultura do
seu significado, e
aprender o desenvolvimento que valoriza o ser humano e seu meio,
de forma horizontal
para um crescimento substancial da comunidade onde vive. Enfim,
fazer do arraial seu
territrio de encontro com outras pessoas e consigo, aonde exista
a metabolizao de
insumos para a continuidade e, cada vez maior, troca de
sinergias que possam manter e
transmitir essa cultura durante geraes.
-
CONCLUSO
Com este estudo mostrou-se que as denominadas festas de santo tm
sua
importncia principal pelo envolvimento de um grupo especfico, de
um municpio e/ou de
uma regio do estado ou pas. No geral concluiu-se que o aspecto
que tornou especial a
festa do Banho de So Joo em Corumb est relacionado,
primeiramente, a sua dimenso
enquanto festa, segundo, seu poder aglutinador cultural,
terceiro, sua importncia para o
corpo social e quarto, suas caractersticas podem, se trabalhadas
da maneira correta, servir
um meio para o desenvolvimento local.
No caso de Corumb, o envolvimento se d no espao de um municpio,
mas que
tem o reconhecimento de ser uma festa de importncia no calendrio
festivo do Estado e
Nacional. Corumb no perodo da festa se transforma, seguindo um
ritual que vai desde a
organizao do Arraial do Banho de So Joo, at a preparao dos
arraiais de menor porte,
mas no de menor importncia. Os espaos se misturam. As
brincadeiras, o parque, as
comidas, os shows, o concurso de quadrilha, o cortejo, o banho,
entre outros, se tornam
momentos nicos e atemporais durante o perodo da festa e,
principalmente, durante o
processo ritual do banho. Os objetos e aes, que no dia a dia so
apenas usados com suas
devidas funes, na festa se tornam parte de um ciclo ritualstico,
adquirindo significados
extraordinrios. O trnsito de pedidos e promessas circula entre
as necessidades e a
expectativa de transformar o cotidiano, tudo dentro de um curto
espao de tempo, porm,
vivido com extrema intensidade por muitos que participam daquele
momento,
transparecidos atravs de gestos e rezas que cresce em cada um
dos indivduos de forma a
percorrer o cu e a terra a uma velocidade inexecutvel, por meio
de um louvor a um
santo que tem sua importncia para a religio (no apenas a
catlica) e que agora serve de
intermedirio de Deus. As funes se transformam de uma festa rural
para uma festa de
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81
espao. Esse territrio de conflitos/conexes de poderes deve ser
trabalhado para que o ator
social se sinta um ser pertencente em tal comunidade, para,
assim, empoderar-se, e fazer da
festa sua festana.
No caso especfico do banho de So Joo Batista, o desenvolvimento
local se
encontra no turismo cultural-religioso, pois nem sempre as
pessoas so adeptas do santo,
mas aderem festa, ou seja, tanto num caso como noutro a cultura
ponto chave para o
desenvolvimento.
-
80
conhecimento desses patrimnios naturais, histricos e culturais,
[...] tem dificultado as
aes de valorizao e de conservao desses bens e valores (materiais
e imateriais). Essa
citao cai como uma luva no caso do municpio de Corumb, apesar do
autor ter se
referido ao Estado de modo geral. A questo fundamental fazer da
cultura corumbaense o
ponto de encontro, primeiramente, das prprias pessoas do lugar
e, posteriormente, das
pessoas que vm visit-las. Os moradores da cidade at tem noo da
importncia da
cultura, mas isso apenas demonstrado na forma de um orgulho
passageiro, como em frase
do tipo: Corumb j teve o terceiro maior carnaval do Brasil, A
cidade j foi palco da
Guerra do Paraguai, entre outras. O problema que as pessoas no
percebem que so
nessas memrias que o desenvolvimento pode se fazer.
Irving et alli (2002, p.137-139), destaca trs tendncias em relao
ao turismo que
podem servir, seno como incentivo, mas tambm como algo a se
pensar no caso
corumbaense:
Primeiro, a inverso dos fluxos migratrios, no sentido
centro-periferia, j de forma perceptvel, caracterizando o fenmeno
conhecido como reverso da polarizao. Uma espcie de redescoberta do
caminho da roa, provocando movimento de interiorizao, co modificaes
conseqentes na vida urbana e rural. Segundo, a ampliao progressiva
da noo de patrimnio coincidentemente com o empenho de dar
visibilidade a comunidades tradicionais. Ganha destaque, assim,
todo potencial de contribuies representativas do patrimnio humano.
Terceiro, o reconhecimento, nos meios acadmicos, da histria oral
como mtodo de pesquisa. O fato dever ter repercusso importante na
recuperao da memria, sobretudo dos povos grafos e de comunidades
tradicionais que guardam e transmitem, atravs da oralidade, seus
estilos de vida.
As tendncias se voltam ao turismo tico e de valorizao do ser
humano e do
ambiente. Tudo se une na questo do Estado de Mato Grosso do Sul,
porm o que se deve
ter em mente que isso no acontece de uma hora para outra, ou
para citar um exemplo do
caso brasileiro, de uma eleio para outra. A continuidade de bons
projetos encontra
barreira no egocentrismo partidrio, onde o que vale quem est
fazendo, e no o que foi
bom e est sendo aproveitado, sem desmerecer o ponta p dado pela
gesto anterior. O trip
que seria montado na sociedade em questo seria feito pelo homem,
com a cultura e seu
-
79
Banho de So Joo (organizado pela prefeitura com apoio do governo
do Estado) uma
festa para o povo. O povo neste ponto espectador do evento, o
que no participa da parte
religiosa do festejo, ou que participa, mas fica para aproveitar
os atrativos a mais que o
arraial da prefeitura tem. A mesma Dona Natalcia exps que a
festa do porto uma
forma de chamar a populao para a festa. Corroborando com essa
idia a Prof Eunice
fala que a festa da prefeitura serve como chamarisco pra chamar
turista e arrecadar
dinheiro. Tm-se dois pontos a serem analisados: no primeiro, o
arraial organizado pela
Prefeitura serve de chamariz para que o ritual do banho do santo
se torne mais popular; e no
segundo, a ateno voltada para o fato de os organizadores do
arraial do porto terem
interesse somente no lucro que a festa pode lhe dar. Em
contra-posio, essa forma limitada
de agir, se no feita, ser sentida pela populao, pois se tornou
obrigao do governo local
e estadual faz-la. Contudo os rgos governamentais podem fazer
muito mais como ser
observado neste captulo ainda.
Os motivos pelos quais Corumb no vai para frente, em termos de
estrutura,
muitas pessoas tentam explicar, como no caso do senhor Agripino
que tenta resolver a
questo dizendo que a culpa de Corumb no ir para frente por falta
de representao
poltica. Essa tentativa de explicar a decadncia do municpio pode
ser vista em muitas
entrevistas, quando o fato vem tona. Corumb era uma coisa que
crescia que dava gosto
de se ver, essa uma das memrias que so contadas pelas pessoas
mais idosas que
viveram o bom tempo da Corumb que quase virou capital. Foi
colocado, em captulo
referente histria do municpio, que Corumb o ponto de encontro de
diversas culturas,
e teve durante toda sua histria grandes momentos, pode-se dizer,
econmicos. O que vale
ressaltar, e este o ponto chave para este captulo, que o
desenvolvimento passou por
Corumb, mas no fez deste municpio morada. Contudo, o que fica, e
isto encontrado de
forma muito forte em Corumb, a cultura. Mesmo o turismo de
pesca, tem em Corumb
seu ponto de encontro, mas acaba partindo para os ranchos
pesqueiros localizados a
quilmetros da cidade. A cultura corumbaense um forte elemento
que pode servir de
propulsor do desenvolvimento local. Segundo Martn et alii (2001,
p. 34), o
desconhecimento dos bens e valores patrimoniais da natureza e da
cultura o pouco
-
78
similares s economias que formam o atual centro do sistema
capitalista. [...] essa idia tem sido de grande utilidade para
mobilizar os povos da periferia e lev-los a aceitar enormes
sacrifcios, para legitimar a destruio de formas de culturas
arcaicas, para explicar e fazer compreender a necessidade de
destruir o meio fsico, para justificar formas de dependncia [...]
Cabe, portanto, afirmar que a idia de desenvolvimento econmico um
simples mito (FURTADO, 1983, p.75).
Essa viso pode ser pessimista de desenvolvimento econmico, mas
no passa da
realidade divulgada h anos no Brasil a qual, municpios como o de
Corumb, espera
alcanar. H a esperana de algum dia instalar uma grande empresa
que absorva a mo-de-
obra excedente, trazendo emprego e renda, gerando um dinamismo
no comrcio local.
A viso desenvolvimentista tem que dar lugar ao desenvolvimento
em escala
humana (MARTN et alii, 2001, p.21-22), pois esta se constri a
partir do protagonismo
do real, verdadeiro de cada pessoa. Em conseqncia, se deve
privilegiar toda a diversidade
cultural, tnica, total, igual autonomia dos espaos em que cada
pessoa esteja se sinta
protagonista. Do mesmo livro, o autor mostra as variveis em que
o estado de Mato
Grosso do Sul pode trabalhar em cima. Entre eles est o patrimnio
natural e cultural, e
nesta segunda variante que se deve dar foco.
Em muitos relatos da festa, os conflitos, entre populao e rgos
governamentais,
so observados. A maioria deixa claro que os rgos governamentais,
no do incentivo
algum para a festa, somente faz o arraial no Porto Geral. Ou
seja, a prefeitura, ou pode-se
dizer as prefeituras durante os tempos, procuram apenas cumprir
com o seu papel,
disponibilizando algo a mais como atrativo festa, pois, como
observado nas entrevistas,
nem todo mundo vai para o ritual do banho de So Joo. Com isso,
as instituies do
governo e prefeitura, aproveitam a festa para no somente fazer
propaganda, que render
frutos nas prximas eleies, mas para tambm arrecadar fundos. No
entanto, o que se
compreende que a festa ficou centralizada no arraial do porto,
deixando de, pouco a
pouco, retornar ao arraial de origem, e isso confirmado pelo
senhor Sebastio, quando ele
mesmo diz que a festa ficou mais centralizada na beira do rio,
por causa do arraial da
prefeitura. Aqui se encaixa a fala da Dona Natalcia, onde ela
coloca que o Arraial do
-
77
Observa-se que a noo de desenvolvimento, disponibilizada por
Elizalde, oposta
a dita anteriormente (no segundo pargrafo deste captulo). O
desenvolver, parte das
prprias pessoas e no de uma instituio governamental, ou
no-governamental. Vem ao
encontro da proposta do Desenvolvimento Local onde o primeiro
passo o desabrochar das
capacidades, competncias e habilidades de uma comunidade
definida. O mximo que os
agentes externos do desenvolvimento (instituies pblicas e
privadas) podem fazer
propor idias, sensibilizando o local. Contudo, as opinies
propostas devem ser
contextualizadas com a cultura e o modo de vida das pessoas
daquele lugar, e a
sensibilizao no deve ser apenas um jogo de seduo, mas sim, um
dilogo entre as
partes envolvidas. A sensibilizao talvez seja a parte mais
importante, pois nela que o
valor humano deve ser ressaltado, mostrando, assim, as
capacidades e como a comunidade
pode agir e modificar o meio aonde vive. No basta dar
ferramentas tcnicas, petrechos e
maquinrios, se no h alta estima, tanto do ator social com o
meio, como tambm, dele
com ele mesmo. Neste contexto encontram-se as relaes primrias, a
confiana, entre
outros fatores mostrados anteriormente que atuam como pilares do
Desenvolvimento Local.
O grande problema da interpretao do que vem a ser
desenvolvimento, que o
termo confundido com a ideologia de progresso, uma crena muito
forte e, arrisca-se
dizer, enraizado na cultura de muitos grupos. Isso faz com que a
idia de desenvolvimento
seja algo frente, ou seja, se uma famlia possui bens domsticos o
suficiente para
sobreviver, ela considerada menos desenvolvida do que uma famlia
aonde existe vrios
aparelhos de televiso, muitos celulares e diversos outros
petrechos eletroeletrnicos. O que
ocorre nesta analogia, que o ter medido em escalas, dentro do
termmetro chamado
status social. Celso Furtado questiona esse modo de viver
capitalista que acirra mais ainda
essa disputa, onde quem sai perdendo so todos, pois acaba por
acelerar o consumo dos
bens no-durveis como o petrleo, o gs e os minerais, ainda
necessrios. Citando-o a
respeito do assunto temos que:
[...] o desenvolvimento econmico a idia de que os povos pobres
podem algum dia desfrutar das formas de vida dos atuais povos ricos
simplesmente irrealizvel. Sabemos agora de forma irrefutvel que as
economias da periferia nunca sero desenvolvidas, no sentido de
-
5 ANLISE E INTERPRETAO DOS DADOS COLETADOS
Neste captulo ver-se- que a festa de So Joo Batista em Corumb
pode servir de
exemplo para a riqueza que a primeira vista no aparece, mas fica
mais exposta quando
feita a anlise dos dados e contextualizado com uma teoria mais
humana, onde o homem
no o centro e sim um elemento do meio em que vive sendo o nico
capaz de mud-lo
consideravelmente. A anlise em si se volta mais aos aspectos do
desenvolvimento local
para melhor compreender a ponte entre cultura e
desenvolvimento.
Sempre quando se aborda de desenvolvimento a esperana cresce aos
olhos dos
habitantes onde estes pretendem agir. Assim, acaba sendo um ente
a ser personificado, ou
mesmo montado como um brinquedo de encaixar, porm ele no final
se torna um mito.
Como no mito do retorno (Eliade, 1999), a histria da construo
primordial relembrada,
s que nas conversas dirias da esperanosa populao. So citados
exemplos de sucessos
passados, e at mesmo os sucessos alcanados por populaes mais
avanadas. O
desenvolvimento surge como um Santo Graal o qual se deve
encontrar preservar e desfrutar
do seu sucesso, contudo, como em muitas produes humanas vividas
no mundo capitalista,
esse sucesso no tem limite, a sede no saciada e, ento, os homens
correm atrs de outro
mito. Nesse momento o mito acaba por se confundir com o conceito
de utopia.
No aporte de Elizalde (2002, p. 125) pode-se chegar a uma
definio de
desenvolvimento que fuja do senso comum, a saber:
La nocion de desarollo se refiere al despliegue del potencial
interno (endgeno) contenido en cada ser humano y en toda forma de
vida, incluso an en las ms simples. La sustentabilidad tiene que
ver con la adaptacin del contexto, es decir, del potencial externo,
que a su vez es la condicin de posibilidad y el producto o
resultado del desarrollo.
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75
Quadro 5: Diagrama da procisso feita pela igreja Santurio Maria
Auxiliadora.
Com isso as pessoas, em um ritmo mais lento e pelo mesmo caminho
adotado na
maioria dos cortejos do dia anterior, chegam s margens do Rio
Paraguai e aps darem o
banho nos santos retornam s suas respectivas casas. Talvez, o
fato de a igreja realizar a
descida todo o ano no mesmo dia e horrio, depois de terminado o
ciclo de descidas, se
deva pelo motivo de simbolicamente, fazer o fechamento oficial
deste ciclo, ou pela
opo de evitar a aglomerao de fiis em um nico cortejo podendo at,
talvez, abafar
os outros cortejos que descem no dia anterior. A resposta sobre
este assunto se tornou
muito confusa, pois eram bastante dispares as respostas (entre
as pessoas entrevistadas) em
torno deste acontecimento. Contudo, o que se viu, foram vrios
fechamentos.
E assim, com a demonstrao desta missa, que se pode concluir o
estudo sobre o
fenmeno e passar para a anlise e, posteriormente, para as
consideraes finais, a respeito
da Festa do Banho do So Joo Batista.
-
74
compreenso do local, demonstrada, a seguir, um esquema de como
est estruturada a
missa da igreja:
Quadro 4: Igreja Santurio Maria Auxiliadora.
Aps a missa, as pessoas saem do recinto e se posicionam frente
de um carro de
som que os acompanhar at a beira do rio para que o santo, ou os
santos por se tratarem de,
no total, trs andores, um retrato e uma imagem de barro, seja(m)
banhado(s). A nica
funo do carro de som, mais especificadamente do locutor, exaltar
a importncia do
acontecimento, no geral, e dar incentivo aos gritos viva em
louvor a So Joo. O
fogueteiro fica na parte mais frente do cortejo, as pessoas se
posicionam ao lado e atrs do
andor, e a banda permanece atrs do carro de som. A organizao
dessa descida fica mais
bem visualizada no grfico a seguir:
-
73
A respeito dos alimentos, dentro de um estudo baseado na teoria
de Lvi-Strauss
sobre o cru e o cozido, aonde o cozido corresponde ao chamado
endo-cozinha e o assado
correspondendo ao exo-cozinha, o endo-cozinha , segunda a
teoria, feito no mbito
familiar mais formal. O exo-cozinha feito no mbito festivo aonde
se faz a comida para,
por exemplo, a comunidade (rua). O que se v na festa de So Joo a
mistura, mas pouco
significativa, do endo com o exo cozinha, pois se encontram para
comer na rua
(arraiais) coisas como milho (cozido), espetinho (assado), porm
os alimentos assados
so mais feitos e vendidos. Todavia, ao voltar do banho do santo,
retornam para o arraial,
aonde so encontradas mais pessoas ligadas famlia, se v o
exo-cozinha (assado) mantido
como alimento principal, dando ao So Joo em Corumb um carter
sempre informal.
Assim, a comida ao invs de assumir um duplo papel simblico,
tendo de um lado, como
expresso de um cdigo culinrio voltado para o grupo familiar e,
de outro, como expresso
de uma unidade social ampla, aparecendo como cdigo ideal,
unificador, numa situao em
que se ope sociedade real (ALVES, 1980, p.67), mantm seu carter
informal de festa.
O ltimo banho de santo, pois, no se trata de um arraial em si, a
ser estudado,
organizado pela Igreja Santurio Maria Auxiliadora. A descida
para o banho do So Joo
da Igreja Santurio Maria Auxiliadora realizada um dia depois em
relao aos demais,
ocorrendo aps uma missa (a missa tem incio s 19 h do dia 24 de
junho).
A missa comea com a entrada de um andor, carregado por quatro
beatas, ao som do
consagrado hino tocado por uma banda, porm o hino tocado de
forma lenta, compassada
e com o volume baixo. Percebe-se a presena de alguns msicos que
tocaram no dia
anterior no Arraial da Secretaria de Turismo e Cultura de
Corumb, como tambm para
tantos outros cortejos.
Este andor que entra na igreja posto na parte esquerda, em cima
de uma mesa, do
local onde o padre rezar a missa. Junto com ele se encontram
mais dois andores, uma
imagem de barro (sem andor) e um quadro com a imagem do santo
impressa. Para maior
-
72
4.3.3 O Cortejo acabou, a Festa no!
Aps o banho do So Joo, as pessoas responsveis pelo seu
respectivo andor junto
com uma parcela de populares que o acompanharam, retornam aos
seus arraiais. No local
do arraial encontram-se pessoas ligadas famlia do organizador da
festa, pessoas do bairro
ou somente os familiares quando se trata de um arraial na casa
(interno). O exemplo a
seguir de um arraial visitado e que por motivo de promessa se
fez, mas como muitos, se
tornou tradicional, e este vai servir para se demonstrar um
pouco sobre o que acontece aps
o banho.
O responsvel pelo arraial se chama Roberto da Silva, e foi
contado que o primeiro
arraial ocorreu aps o cumprimento de um pedido feito a So Joo,
pela bisav, que se
realizou, e, ento, comeou a ser feito o arraial. O que se
observou foi a diminuio do
nmero de pessoas depois, em relao ao nmero encontrado antes do
banho do santo.
Talvez isso ocorra pela diminuio do entusiasmo. O arraial, no
comeo, cercado de
ansiedade, de levar e banhar o santo, de encontros com pessoas
conhecidas, com
comentrios se o arraial do porto est melhor ou pior do que o do
outro ano, etc. No arraial,
depois da descida, as pessoas esto cansadas e mais calmas, como
se tivessem cumprido
com sua funo no ritual. Segundo Roberto, h o comparecimento
maior das pessoas
denominadas mais chegadas da famlia para uma conversa mais
ntima. Ao ser indagado
sobre o no levantamento do mastro, ele explicou que no se ergue
mais o mastro porque
ele fica exposto (na rua) e que muitas vezes encontrou o mastro
depredado.
Ento a Festa de So Joo em Corumb pode ser, como observado,
dividida em trs
momentos: o arraial antes (da descida do andor para o banho do
So Joo), o cortejo
correspondendo ao durante (a descida) e o arraial depois (a
subida no sentido de
retorno ao arraial), sendo que a nica diferena percebida entre o
arraial antes e o arraial
depois so a intensidade, dos sentidos (sensoriais) e do
entusiasmo das pessoas. Por
exemplo, o antes h uma banda ou qualquer tipo de msica em bom
volume (alto), e o
depois no h banda e a msica em tom mais suave (baixa).
-
71
Fotografia 10: O banho do Santo. Fonte: Felipe Coelho Senna /
junho de 2003.
Com a aproximao da meia noite, anunciada no palco, atravs dos
altos falantes,
que est chegada a hora da queima dos fogos de artifcio
(oficiais), marcando o fim do
Arraial do Banho do So Joo, mas isso no impede que a
comercializao de comidas e
bebidas continue. Neste ano (2003), os fogos finais foram soltos
em outro lugar, diferente
de outros anos em que foram soltos ou em embarcaes fluviais ou
na margem oposta do
rio.
Com isso, tanto os ltimos andores, como os primeiros, foram
retornando aos seus
respectivos locais de origem e as pessoas foram se dispersando e
optando entre continuar
no arraial do porto, ir embora para suas casas ou voltar para o
arraial do andor que
acompanhou.
-
70
Nesse ir e vir, na ladeira, a ao da passagem por baixo do andor,
de acompanhar o
cortejo, mesmo que apenas observando, que ocorre o encontro de
classes sociais
diferentes (antagnicas), como ocorre na manifestao do Crio de
Nazar (ALVES, 1980,
p.49):
Numa situao como a descrita, os opostos se cruzam e/ou se
neutralizam permitindo a emergncia de novas categorias, de ao.
Assim, o contgio entre as categorias sociais diferentes que na vida
cotidiana estariam separadas por uma gramtica de smbolos
perfeitamente legveis (um modo de vida, status, papis
desempenhados, modos de vestir, profisses, etc.), neutralizado por
um grau de purificao expresso no sacrifcio da promessa.
O banho de So Joo acaba por ser um evento neutralizador das
diferenas sociais,
pelo menos naquele momento mgico do ritual do antes, durante e
depois da festa que, na
verdade, formam apenas um. A purificao e sacrifcio esto, neste
fenmeno em estudo,
mais relacionados s pessoas que organizam um arraial, adornam e
banham o santo, do que
com as pessoas que fazem a ao de passar por baixo do andor, pois
ao passarem por
debaixo do andor elas esto em xtase (alegres) e nem devem se
lembrar do cansao
causado pela ao de subir e descer a ladeira, ou nem devem se
cansar, porque os andores
vo ao encontro da populao necessitando, assim, de um curtssimo
trecho para se passar
por baixo do mesmo. Pde-se observar que h a ao de uma troca
simblica do santo
com os participantes do cortejo, e pode-se dizer, ainda, que
sobre essas trocas simblicas
que se constitui, na prtica, uma festa de santo (BRANDO, 1978,
p.49).
-
69
Quando h o encontro de um cortejo com o outro, ocorre uma espcie
de
cumprimento entre eles, aonde os dois abaixam os andores
simultaneamente. Existe
momento em que ocorre a queda do santo, que fica no alto do
andor, que fica quebrado, s
vezes, mas esse empecilho no diminui a alegria dos participantes
dos cortejos, pois o santo
colocado de volta ao seu local de origem (topo do andor) e
levado para o banho ou para
o arraial do jeito que ficou. Com o passar do tempo e com a
aproximao da passagem de
um dia para o outro (meia noite), aumenta o fluxo de cortejos
que descem e sobem a ladeira,
criando um tumulto na beira do rio. s margens do Rio Paraguai,
as pessoas benzem o
santo e se benzem, posteriormente, em uma ao recproca semelhante
feita por Joo e
Jesus e que descrita no consagrado hino, Joo batiza Cristo,
Cristo batiza Joo. E
nesse momento, em que as pessoas banham o santo, que se joga gua
para todos os lados
molhando quem estiver perto. Mas teve um momento inusitado em
que uma pessoa, que
pela sua fisionomia e comportamento, se encontrava bbada, ao se
ver molhada, caiu no rio,
e a cada banho do santo, a cada grito de louvao a So Joo (Viva
So Joo), jogava
gua em todos que acompanhavam o cortejo, porm ningum se alterou
a ponto de querer
brigar com esta pessoa, afinal, So Joo carnaval, um momento
extraordinrio que
articula de maneira diferente os momentos ordinrios da rotina
cotidiana e, alm de torn-la
inteligvel, institui uma outra rotina para que os indivduos
participantes compreendam as
diferenas entre o natural e o cultural (ALVES, 1980, p. 25).
Fotografia 9: Cumprimento dos andores. Fonte: Felipe Coelho
Senna / junho de 2003.
-
68
Fotografia 7: Participantes passando por baixo do andor. Fonte:
Felipe Coelho Senna / junho de 2003.
So poucas as pessoas que acompanham o cortejo com algum tipo de
fantasia, como
no carnaval, ou que levam lanternas, que composta por uma vareta
de bambu ligada por
um arame (no formato de um v) que se prende a uma armao na forma
de um cilindro,
feito de papel crepom, com o fundo fechado com um papelo, aonde
levada uma vela
acesa.
Fotografia 8: Pessoas acompanhando o cortejo. Fonte: Felipe
Coelho Senna / junho de 2003.
-
67
Apesar do consagrado hino ser longo, talvez, as partes que mais
se repetem so a
primeira e a segunda parte. Quando cantado o primeiro verso do
hino, as pessoas,
acompanhadas da banda ou no, executam um estilo mais compassado,
lento do verso,
porm quando se d o incio do segundo verso as pessoas comeam a
pular e a passar por
baixo do andor. No caso de andores acompanhados por uma banda, o
trompetista faz um
chamado e posteriormente tocada uma marchinha de carnaval bem
acelerada acontecendo
o que sucede no caso anterior (passagem por baixo do andor).
exatamente por esse
motivo que as pessoas do cortejo que no possui banda, quando
cantam o segundo verso do
hino, comeam a pular e executar o caminho descrito acima. H
cortejos que descem a
ladeira silenciosamente, os acompanhantes banham o santo e
retornam (para a casa ou
arraial de origem). Esse ltimo fato ocorre, geralmente, em
cortejos que so acompanhados
por um grupo extremamente reduzido de pessoas. A ao de passar
por baixo do andor
advm da crena em que o indivduo que fizer isso, repetindo a ao
por sete vezes ter
casamento certo at o prximo So Joo. Alguns dizem que preciso
mentalizar a pessoa
com quem se deseja casar, pois aumenta a possibilidade de se
tornar fato a crena. O
interessante de se ver a funo que dada a So Joo, a de casar as
pessoas que
cumprirem com a ao explanada anteriormente. A funo de
casamenteiro, segundo a
Prof. Eunice, era de So Gonalo, mas o santo que se popularizou
no restante do Brasil
como casamenteiro, foi Santo Antnio e em Corumb essa funo foi
dada a So Joo.
O(s) motivo(s) pelo(s) qual (ais) ele foi colocado popularmente
como santo casamenteiro,
no municpio, no foi explicado.
-
66
andores vm de diversos pontos da cidade, se convergindo na parte
frontal da Praa da Repblica
em frente ao arco da ladeira L 1 do croqui 1, afunilando-se na
ladeira Cunha e Cruz e geralmente
possuem a seguinte formao:
Quadro 2: Um dos diversos tipos de formao dos andores
(procisso).
O grfico demonstra a formao completa de um cortejo na descida da
ladeira Cunha e
Cruz para realizar o banho do santo, mas deve-se lembrar que no
se trata de uma regra para todos
os andores, uma vez que alguns deles no possuem banda e/ou
fogueteiro (pessoa responsvel pela
queima dos fogos de artifcio). A maioria destes andores
acompanhada pelo canto do consagrado
hino:
I. Deus te salve, Joo Batista sagrado O teu nascimento Nos tem
alegrado O teu nascimento Nos tem alegrado
II. Se So Joo soubesse Que hoje era o teu dia Descia do cu a
terra Com prazer e alegria Descia do cu a terra Com prazer e
alegria
III. Joo Batista Santo Como Deus usou A quem batizaste A vs
batizou A quem batizaste A vs batizou
IV. Joo batiza Cristo Cristo batiza Joo Onde foram batizados No
Rio Jordo Onde foram batizados No Rio Jordo
Quadro 3: Ladainha de So Joo. Fonte: PREZ, ngela (org.). So Joo
- Mato Grosso do Sul (Testemunhos Literrios). Edies
Caravela: Porto Alegre RS, 1988.
-
65
A ordem colocada por Megale no fixa, pois o orix Xang, segundo
algumas informaes,
corresponde tambm a So Joo. Existe outra verso para o incio das
prticas do sincretismo. O
relato do Sr. Sebastio, da Tenda Esprita de Umbanda Caboclo
Estrela do Norte (Corumb-MS),
disse que os negros escravos eram impedidos de cultuar os seus
deuses (orixs), ento, eles
comearam a celebrar seus deuses utilizando as imagens de santos
do catolicismo, sendo assim
ficavam livres para celebr-los. Em um estudo, Moura (1981, p.77)
encontrou num terreiro em
Porto Alegre a ligao entre Xang-Aganju e as fogueiras de So Joo,
mais especificamente com
So Joo Batista.
Existe uma diferena na utilizao das palavras e religies,
Candombl e Umbanda, sendo
que mesmo no havendo unidade, nem sequer de denominao, so muito
semelhantes entre si,
mas aparecem com as seguintes denominaes: Candombl na Bahia e
tambm no Rio de
Janeiro; Umbanda no Rio de Janeiro e adjacncias (MELATTI, s.d.,
p.75). Todavia, o mesmo
autor (s.d. p.77) relata que a Umbanda aglutina [...]
catolicismo, espiritismo e ocultismo. Pode
existir uma explicao melhor que separe o termo Candombl do termo
Umbanda, porm, o que se
v, que na prtica, eles se misturam em sentido e ao.
Continuando, percorrendo a cidade durante o dia 23 de junho, ao
anoitecer, pode-se observar
que foram colocadas frente de algumas casas, umas fogueiras e/ou
um mastro (cada um com seu
tipo de adorno). Estas casas no possuam arraial (particular),
talvez seja uma reminiscncia da
poca descrita pelo Sr. Sebastio, na qual o So Joo era comemorado
em casa. Essa linguagem
para ser eficaz tem que ser percebida e entendida pelos que
emitem e recebem da o carter
redundante do ritual (ALVES, 1980, p.24). Isso faz com que os
gestos ritualsticos sejam vlidos,
na medida em que se acredite neles. Lvi-Strauss apud Brando
(1978, p.72) afirma tal explicao
colocando que no porque so eficazes que se repetem, porque se
repetem que se tornam
eficazes.
A descida dos andores para o banho do So Joo d-se incio s 22h,
com um
espaamento maior de tempo entre um andor e outro, mas diminuindo
com o passar do tempo. Os
-
64
A caracterstica geral desses cultos a possesso da divindade pelo
crente, ou melhor, sobre o crente iniciado para tal fim. Geralmente
so as Filhas de Santo consideradas cavalos em que montam quando a
da possesso. Estas divindades so denominadas Orixs, existindo ainda
as figuras de Exu e If, o primeiro, mensageiro entre os homens e os
orixs e este uma espcie de orculo, que transmite aos homens os
pensamentos dos orixs; o adivinho por excelncia.
Fotografia 6: Parte externa do terreiro Maria Aparecida de
Souza. Fonte: Felipe Coelho Senna / junho de 2003.
Contudo, v-se a presena de um orix do candombl numa festa
catlica, porm este orix
representado pela imagem de So Joo no terreiro e no andor. A
isso foi dado o nome de
sincretismo:
Existe um sincretismo muito grande entre os orixs e os santos
catlico, porque os negros, chegados ao Brasil, notaram que haviam
santos invocados para os mesmos fins dos seus orixs, da confundirem
as mesmas entidades. Por exemplo: Omolu, orix que protege contra as
pestes, o chamado deus da bexiga, se confundiu com os santos que
defendem, contra as epidemias: S. Lzaro, S. Roque e S. Sebastio. O
deus supremo Olorum ou Zaniapombo se confunde com Jesus. Oxal, pai
dos orixs o Senhor do Bonfim. Os Ibej, orixs meninos, gmeos, so
confundidos com S. Cosme e S. Damio. Outros orixs so: Xang,
representao dos raios e tempestades, identificado com S. Jernimo;
Oxoce, deus da caa, S. Jorge; o deus do ferro Ogum se identifica
com Santo Antnio, que na Bahia tinha posto de capito do
exrcito;Oxun-mar, o arco-ris est identificado com S. Bartolomeu,
crido de Xang e tem a forma de uma serpente (MEGALE, 1999:76).
-
63
transformao. Os ritos so momentos no-rotinizados, apresentam-se
como situaes
extraordinrias, da a importncia dada ao sagrado ou a sacralizao
que seria inerente a
performance ritual.
Em primeiro lugar, demonstrar os ritos do terreiro de candombl.
S se pode acompanhar a
parte catlica, como se ver a seguir, das rezas, pois o tempo foi
escasso para uma investigao
de suma importncia.
Dona Natalcia, a responsvel pela Tenda Nossa Senhora Conceio que
pertence ao
Terreiro Maria Aparecida de Souza, relatou que existem trs
momentos na festa: a reza, o banho
(do So Joo) e a festa. Ela mesma nos convidou a comparecer no
trabalho de candombl, que iria
acontecer no dia 22 de junho s 19h. Todavia, isso s foi possvel
somente no dia 23 de junho s
21h, sendo esse dia o responsvel pela parte catlica.
O local da parte catlica estava armado com uma aparelhagem de
som, monitorado por
um DJ (Disck Jockei) cadeiras, mesas e com o andor sobre uma
mesa maior. A cerimnia ocorreu
fora da rea de trabalho, como um dos participantes chamou a
parte do terreiro responsvel pela
parte de candombl, em um tipo de galpo, ao lado do mesmo. frente
do terreiro havia algumas
pessoas vendendo licores, cerveja e comida, suas estruturas
pareciam at mesmo igual a dos
autnomos sem barraca do Arraial do Banho do So Joo. Algumas
pessoas comearam a chegar
e esperar pela rezadeira, que a princpio pensava-se ser a Dona
Natalcia, que na verdade j tinha
chegado. Tratava-se de uma senhora idosa, mais ou menos 80 anos,
que cansada de esperar pela
Dona Natalcia, resolveu dar incio reza. Todos se posicionaram,
em p, em frete ao andor, ento a
rezadeira deu incio s oraes. Foi rezado o tero inteiro com
alguns intervalos de louvao a So
Joo e outros santos catlicos. Aqui cabe uma explanao a respeito
dos cultos de Candombl e
Umbanda.
Geralmente os cultos e rezas de um terreiro de candombl
acontecem de um modo diferente
do que se viu, supe-se que isso acontecera no dia anterior, como
observou Megale (1999, p.73):
-
62
Pode-se observar este esprito em diversas comemoraes, tem-se
(DORCS, s.d. apud
MONTES s.d., p.143):
Sempre que encontramos reunidas em um s gesto vrias intenes
contraditrias, o resultado estilstico pertence categoria do
Barroco. O esprito barroco, para diz-lo vulgarmente e de uma vez
por todas, no sabe o que quer. Quer ao mesmo tempo, o pr e o
contra. Quer eis aqui estas colunas cuja estrutura um paradoxo
pattico gravitar e voar. Quer recordo-me de certo anjito numa certa
grade de uma certa capela de certa igreja de Salamanca levantar o
brao e baixar a mo. Afasta-se e cerca-se em espiral. Ri-se das
exigncias do princpio de no contradio.
O barroco cabe tambm nesta festa, como em tantas pelo Brasil
afora, citadas anteriormente.
Montes (s.d., p.144) ressalta o barroco quando comenta que:
Para um antroplogo ou historiador das mentalidades, a revelao
desta extraordinria continuidade viria com a descoberta de que uma
verdadeira cultura da festa, barroca em suas Santurio Maria
Auxiliadoraes, impregna em profundidade o fazer e o sentir
brasileiro, visvel ainda, longe dos cnones eruditos da arte
contempornea dos museus, nas formas das chamada cultura popular.
Lugar de confluncia da vida social [...] torna-se assim ndice
privilegiado de mentalidade e estilo de vida, permitindo-nos
explorar o significado da marca barroca que, como herana ela
carrega e a que ela permiti ainda manifestar-se, forma vida de
cultura e no simples sobrevivncia, no mundo contemporneo
Assim pode-se afirmar que a festa do povo, e que ele exprime uma
capacidade de
conformismo ao resistir, capaz de resistir ao se conformar.
4.3.2 Cultura em Movimento
Neste tpico sero apresentados os acontecimentos relativos ao
fenmeno em movimento,
isto , o banho e os movimentos de devoo, subida e descida da
ladeira do Arraial do Banho de
So Joo. Para isso falar-se- do rito, que tem como significado,
comunicao. Comunicao com o
que? Com o mundo espiritual e suas foras sobrenaturais, atravs
de gestos, sinais, rezas que
possuem significao. Todas as religies possuem algum tipo de
comunicao com o mundo
espiritual como forma de respeito, cura ou agradecimento. No
conceito de Alves (1980, p.21),
articular elementos simblicos, os eventos rituais so propcios
interpretao, comunicao e
-
61
Outro arraial visitado foi o da Dona Titina, como gosta de ser
chamada. O arraial se localiza
na Rua Major Gama, entre as ruas Cabral e Cuiab, e segue a mesma
estrutura encontrada em
outros arraiais, mas que, como o Arraial do Banho de So Joo
vende, o vatap. Dona Titina pde
nos informar, em poucos minutos de entrevista, que por causa de
uma beno concebida a um
familiar que se fez o primeiro arraial, com o banho no So Joo, e
que isto comeou a ser repetido,
ano aps ano, at o arraial se tornar tradio. Alis, h um consenso
entre todos os entrevistados, a
de que a Festa de So Joo nos moldes em que feito em Corumb, se
tornou uma tradio do
municpio que envolve o poder pblico, a igreja e diversas classes
sociais. Como ocorre na Festa
do Esprito Santo em Pirinpolis-GO, os agentes da Festa trabalham
no sentido de preservar o que
consideram suas tradies, para eles o motivo quase nico pelo qual
tem sentido repeti-la todos os
anos (Brando, 1978, p.45). No arraial de Dona Titina o
interessante foi observar que, quando a
descida do andor para o banho do santo era anunciada, as pessoas
comearam a esvaziar o mesmo,
pois segundo algumas pessoas, como o Porto fica muito longe
prefervel ir de carro at as
proximidades da ladeira Cunha e Cruz, e de l esperar e
acompanhar o santo deste arraial.
Para finalizar, falar-se- do papel da Igreja, que no passado
entrou em conflito com a festa.
Em entrevista com o Sr. Fbio Alexson, obteve-se a informao de
que, existiu um padre,
responsvel pela Igreja Santurio Maria Auxiliadora, que tentou
acabar com a festa por causa do
esprito carnavalesco que envolvia o culto ao santo. O padre a
que se referiu Alexson no mais
toma conta da parquia em questo.
Fotografia 5: Igreja Santurio Maria Auxiliadora. Fonte:
Disponvel no site < www.corumba.com.br> acesso
14/06/2006.
http://www.corumba.com.br>
-
60
Fotografia 4: Ladeira Cunha e Cruz e o rio Paraguai, ao fundo.
Fonte: Felipe Coelho Senna / junho 2003.
A regio marcada com o nmero 4 corresponde s lojas que, fora do
perodo da festa,
trabalham com a venda de produtos para pesca, passeios tursticos
e bares, que durante o perodo da
festa vem a oportunidade de comercializam comidas, como lucro
extra, montando mesas e
vendendo, alm de bebidas e comida, artesanato com temas
relacionados com o Pantanal, chapus
de palha, entre outros produtos. O R 1 o trecho aonde ocorre o
arraial e corresponde avenida
porturia. E por ltimo, a regio demarcada com o nmero 5, se trata
de uma rea de passeio na
qual as pessoas tentam escapar do tumulto, e aonde se encontra o
brinquedo pula-pula.
Por toda as cidade so montados Arraiais. Observou-se que a
Secretaria de Cultura e
Turismo organiza seu prprio arraial, na sede da mesma, e que
nele esto envolvidos os Cururueiros,
as pessoas que danam o Siriri, a banda marcial e os comes e
bebes gratuito, e o arraial do
Rottary Clube.
-
59
O L 1 e o L 2 correspondem respectivamente s ladeiras que do
acesso ao arraial, sendo
que pela primeira, a Ladeira Cunha e Cruz, que descem as pessoas
para banhar o santo exatamente
no ponto 1. Todos, sem exceo, descem essa ladeira para banhar o
santo.
Segundo alguns relatos, houve um ano em que a Prefeitura tentou
organizar a descida pela
ladeira L 2 e a subida pela L 1, mas fez com que o encontro dos
andores no ocorresse, este um
dos pontos de importncia para o movimento do banho do So Joo. O
que se v nas ladeiras, que
os autnomos (sem barraca) se posicionam nelas, pois as mesmas so
as portas de entrada da festa e
por serem o nico meio de se chegar ao arraial oficial, porm os
mais privilegiados so os que se
localizam na ladeira L 1, porque por ali que passaro os andores
para a lavagem do santo. O porto
tem outros dois acessos, mas que ficam nos extremos, portanto,
muito distantes do arraial. Os
retngulos demarcados com o nmero 2 so as barracas que foram
leiloadas pela prefeitura, sob
as condies estipuladas, como foi visto anteriormente. Na regio
demarcada com o nmero 3,
encontra-se um vazio cercado de folhas de bacuri (tipo de
palmeira) a meia altura (mais ou menos
com um metro de altura) com a funo de separar a parte externa
por onde passam as pessoas, pois
ali reservado s pessoas que, se quiserem, podem danar. Mas tambm
o espao no qual
acontece a apresentao dos grupos concorrentes no Concurso de
Quadrilha que, segundo
informaes, recebem premiaes de acordo com a posio que foi
conquistada.
-
58
comidas [...] Est claro que as noites do arraial so de encontro,
de circulao de pessoas, de namoro e de um conjunto de fatos que por
sua prpria natureza no esto sob o controle da Diretoria da Festa e
muitas vezes exigem a interveno de outros mecanismos de fora como a
polcia e agentes da prpria diretoria.
Estes acontecimentos que ocorrem com o Arraial do Crio, ainda
acontecem em pequena
escala no Arraial do Banho do So Joo, mas so artifcios que
buscam chamar a ateno do
espectador enquanto os andores no descem (a ladeira), ou
durante, porque no todo mundo que
acompanha a descida dos andores. A festa comea na noite do dia
21 de junho (sbado neste ano),
e vai at a passagem da noite do dia 23 de junho para a madrugada
do dia 24 de junho (segunda-
feira para tera-feira neste ano).
As bebidas e comidas so vendidas, tambm, por autnomos que
possuem petrechos
precrios e sem a estrutura metlica das barracas oficiais; assim
improvisam com pequenas
churrasqueiras (para a venda dos espetinhos) e/ou isopores com
gua, cerveja e refrigerantes. Eles
ocupam duas posies estratgicas, como pode ser percebido por meio
de um croqui (1) do Arraial
do Banho do So Joo a seguir:
Quadro 1: Porto de Corumb.
-
57
No ano em que foi feita a visita a campo (2003), a Prefeitura
buscou o apoio do Governo
para a realizao do Arraial, para amenizar os custos, que em anos
anteriores vinham somente da
Prefeitura e da Secretaria Municipal de Turismo e Cultura,
trazendo a possibilidade da realizao de
um espetculo com mais atraes e grandiosidade. Foram contratados
artistas regionais (usa-se
este termo para designar os artistas que pertencem, no sentido
de moradia, no Estado e nem sempre
tocam msicas regionais, como a polca, o chamam e o sertanejo,
enfim, ritmos musicais que foram
incorporados festa de So Joo e que foram reincorporados na festa
local). Dentro desta festa da
prefeitura, o arraial oficial13, foi feito um tipo de leilo para
que as pessoas pudessem montar sua
venda dentro do arraial oficial com a estrutura (a barraca)
fornecida pela mesma. Segundo o Sr.
Fbio Alexson, que trabalha no ILA (Instituto Lus de
Albuquerque), as barracas so autorizadas a
serem montadas a partir do pagamento de um valor que fica entre
150 (cento e cinqenta) e 300
(trezentos) reais, sendo que neste leilo d-se a prioridade s
barracas, que nos dias de festa,
vendam comidas e bebidas tpicas da festa do ms junino, como
p-de-moleque, paoca de carne
seca (um tipo de farofa), arroz carreteiro, milho assado,
espetinho (churrasco com pequenos
pedaos de carne estacados em espetos, de proporo bem menor que o
convencional, que podem
ser acompanhados de mandioca cozida e uma poro de vinagrete
[pedaos de cebola e tomate
picados misturados com gua e leo formando um tipo de molho]). As
bebidas tpicas seriam os
licores, de diversos sabores, e quento; as brincadeiras que so
tradicionais nas festas juninas so a
pesca, a priso, etc. Contudo o que se viu foram barracas no s
com comidas, bebidas e
brincadeiras tpicas, mas tambm com a venda de vatap, comida
tpica dos Estados do Nordeste
brasileiro, coquetis das mais variadas bebidas, tendo at a opo
da prpria pessoa fazer seu
coquetel (um self service alcolico), e uma brincadeira igual
encontrada em parques de diverso
(o pula-pula uma espcie de colcho de ar, muito procurado pelas
crianas).
O que fica claro o mesmo fenmeno que se encontra no arraial do
Crio de Nazar,
conforme (ALVES, 1980, p.75):
Nota-se que o arraial em que se desenrola a festa, no ponto de
encontro [...] a caracterstica principal do arraial so os
brinquedos, termo que indica o parque de diverso, barracas pequenas
ou grandes destinadas venda de bebidas e
13 A denominao arraial oficial para diferenciar dos demais
arraiais que no so organizados pela prefeitura.
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56
esquinas e deve medir de seis a sete metros de altura. Neste
arco encontram-se impressos o ttulo do
Arraial (Arraial do Banho do So Joo), e tambm as logomarcas com
os respectivos nomes das
instituies que patrocinam (Governo do Estado de Mato Grosso do
Sul e a Prefeitura Municipal de
Corumb) e organiza o evento (somente a Prefeitura Municipal de
Corumb).Este arco encontra-se
na outra ladeira que d acesso festa.
Fotografia 3: Arco da entrada localizado na ladeira Cunha e
Cruz. Fonte: Felipe Coelho Senna / junho de 2003.
Eles possuem a mesma funo com o descrito por Alves (1980, p.83)
sobre os arcos
encontrados no Crio de Nazar:
o arraial um espao demarcado por entradas e sadas, onde so
armados os arcos iluminados [...] Observa-se que os arcos
restringem o espao ritual sob a gide da imagem da Santa. Contudo
esse espao, consagrado como o da festa, compreendem situaes ditas
sagradas e profanas, na medida em que ele permite uma intensa
comunicao entre as pessoas [...]
Os arcos restringem o espao ritual mostrando que no s o lugar do
arraial, mas tambm
onde h a descida dos andores (Ladeira Cunha e Cruz) e ali se
manifestam todos os movimentos, a
festa e o banho do So Joo.
-
55
esperana de livrar todo seu corpo, mente e alma, dos males que
as afligem, causados por mau-
olhado, inveja, entre outros fatores que s vezes mesclam
atitudes sociais com efeitos corporais.
Talvez o banho seja feito no rio Paraguai, pelo fato da populao
acreditar que o rio possui
propriedades curativas como o rio Jordo, devido importncia que
ele tem para a regio, mas isso
seria difcil de se afirmar com clareza. O que se pode afirmar
que esse rito acontece por ser uma
re-atualizao do mito cosmognico em que Joo batizou Cristo e esse
batizou Joo.
Enfim, os elementos permeiam os rituais de diversas religies,
fazendo parte do rito e da
magia, dando corpo ao ritual em seu aspecto geral, tornando-o no
apenas uma festa religiosa, mas
um local aonde se forma, segundo Lvi-Strauss (s.d. apud ALVES
1980, p.24), um vaste systme
de communication entre individus et l groups, ou mesmo quando,
segundo Leach apud Alves
(1980:24), apontar sobre a mesma idia a reformula afirmando que,
a ritual sequence when
perfomed in full, tends to be very repetitive whatever the
message may be that is supposed to be
conveyed, the redundancy factor is very high. Este sistema passa
de signos para significados, que
dentro de uma comunicao entre as pessoas e essas com o santo
formam uma rede que se repete
com a esperana da efetivao do milagre, ou da magia.
4.3 O PROCESSO DOS ARRAIAIS
4.3.1 Antes do Arraial
a partir daqui que se traar o objetivo principal da Festa de So
Joo em Corumb,
intitulado pelas instituies locais com o nome Arraial do Banho
do So Joo, que o de
contextualizar as relaes sociais e fenmenos simblicos na
festa.
Primeiramente, como o ttulo sugere, falar-se- da preparao do
espetculo, as atraes a
serem apresentadas e sobre a prpria estrutura da festa: oficial
(organizada pela Prefeitura do
Municpio) e no oficial (arraiais espalhados pela cidade). A
partir do ponto mais alto da Ladeira
Cunha e Cruz so colocados adornos, como as tradicionais
bandeirolas, e na parte aonde a ladeira
faz esquina com a Rua de Lamare, foi colocado uma espcie de arco
que toca as pontas das
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54
flores, dinheiro e frutas. Esses adornos de cunho alimentcios so
reflexos das culturas pr-crists,
nas quais em certas religies, havia o culto a diversos
deuses.
A gua o elemento ltimo a ser analisado. A gua abenoa, porque
simboliza a soma
universal das virtualidades: so fons et origo, o reservatrio de
todas as possibilidades de existncia;
precedem toda forma e sustentam toda criao (ELIADE, 1999,
p.110). E mais:
No ciclo vida e morte, essa dualidade dos sentidos da gua se
manifesta assumindo, em muitos casos, simultaneamente, o smbolo da
morte e da regenerao. nas guas que o sentido mstico das crianas
malficas, presente no universo das culturas antigas tradicionais,
parece se realizar: a gua permite o expurgo dos males, evitando-se
que as crianas toquem a terra (DIEGUES, 2000, p.21)
Somado a esse trecho pode-se dizer que o fato da gua possuir
sal, como as guas do mar,
tornam-na mais purificadora ainda, sendo o sal um fator somtico.
Eliade (1999, p. 111-112),
baseado em Tertuliano (De Batismo III-V) e Joo Crisstomo
(Homil.in Joh., XXV, 2) relata:
Foi a gua que produziu o que tem vida, a fim de que o nosso
espanto cessasse quando ela gerasse um dia a vida no batismo [...]
Toda gua natural adquire [...] a virtude da santificao no
sacramento [...] O homem velho morre por imerso na gua e d
nascimento a um novo ser regenerado.
E a gua faz parte da Festa de So Joo de Corumb, porque um dos
raros lugares em que
ainda continua o fenmeno de dar banho na imagem do santo, seja a
imagem feita de barro levada
em um andor (espcie de mesa sem pernas, mas com quatro hastes na
horizontal por onde quatro
pessoas levam o santo), ou levada em uma foto com moldura, ou
impressa em uma medalha na
corrente para colocar no pescoo. com a gua que as pessoas se
benzem ao entrar na igreja,
quando so batizadas, quando so purificadas em festividades em
louvor a um santo do candombl
(gua de cheiro), quando querem se purificar, por exemplo, quando
lhe pedido que tome um
banho de descarrego, solicitado por um pai ou me-de-santo, ou at
mesmo por uma pessoa
responsvel por um centro esprita (ou uma varincia de um templo
esprita). No caso do banho de
descarrego as pessoas somam gua, sal grosso, ramos de arruda,
guin, essncias, com a
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53
V-se a inter-relao de conceitos, entre Radcliffe-Brown e Chau em
certos pontos, sendo
que Chau destaca a lngua para exprimir sua idia, apesar do ltimo
autor (a) no ter
tradicionalmente estudos voltados para a religio, vlida a
citao.
Outro smbolo presente na festa o mastro. Este est ligado, entre
muitos significados, ao
fato de Isabel ter prometido a Maria, o levantamento do mesmo,
para o nascimento de Joo. O
levantamento do mastro, na festa de So Joo, sempre acompanhado
de rezas e cantorias. A
busca pela madeira e seu corte devem ser feitos em uma
sexta-feira, por trs pessoas, com a lua, de
preferncia, em quarto minguante. A respeito disso o Sr. Agripino
relatou exatamente o que foi
descrito acima, porm no se tem o motivo pelo qual o corte
realizado nestas condies. O
erguimento do mastro se assemelha ao rito descrito por Eliade
(1999, p.36-41):
O poste sagrado dos achilpa sustenta o mundo deles e assegura a
comunicao com o Cu. Temos aqui o prottipo de uma imagem cosmolgica
que teve uma grande difuso: os pilares csmicos que sustentam o Cu e
ao mesmo tempo abrem a via para o mundo dos deuses [...] Essa
coluna csmica s pode situar-se no prprio centro do Universo, pois a
totalidade do mundo habitvel espalha-se volta dela. O mesmo
simbolismo do Centro explica outras sries de imagens cosmolgicas e
crenas religiosas, entre as quais vamos reter as mais importantes:
(a) as cidades santas e os santurios [...] (b) os templos so
rplicas da Montanha csmica e, consequantemente, constituem a ligao
por exelncia entre a Terra e o Cu; [...]
Isso concede ao mastro a condio de Axis Mundi, o eixo de
comunicao entre a terra e o
Cu, lugar aonde vivem os seres celestes, divinos.
Em certos arraiais ou mesmo festas, existem pessoas designadas
pelo festeiro, chamado de
padrinho do corte. Quem prepara o mastro o capito que pode
pint-lo de vrias cores. Num rito
organizado, o alferes da bandeira tambm tem suas
responsabilidades e obrigaes (DELLA
MNICA, 1982, p.26).
No ponto mais alto do mastro so colocados adornos que variam de
quem vai ser o
responsvel pelo mastro. Pode-se ver coroa, retrato de So Joo,
fitas coloridas, bandeira, entre
outros. Mas h locais, fora desse nicho de estudo, em que se
colocam, na ponta do mastro, milho,
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52
A este foram convidados pessoas ilustres, inclusive o rei, a
rainha e a princesa. Entre os convidados destacava-se um, de
aspecto msculo e bem apresentvel. Era So Joo Batista. A princesa
deixou-se encantar pelo convidado e ofereceu-se para com ele danar.
Apesar da insistncia, no conseguiu, o que muito a irritou.[...]
Tomada dessa confuso de sentimentos amor prprio ferido, dio e
satisfao e, ao mesmo tempo, sentindo-se lisonjeada pelas atenes de
que era alvo, a princesa foi ter com sua me, Herodias, para
aconselhar-se com ela. O que deveria pedir ao rei, disse-lhe a me,
era a cabea de Joo Batista [...] O rei, chamando um de seus
soldados, mandou que fosse cumprida a sentena. A cabea de So Joo
Batista foi entregue a princesa, numa bandeja e exibida perante os
convidados como um trofu [...] este havia sido atirado a uma
fogueira [...] Todavia o corpo de So Joo Batista deu-lhe novo
alento, as chamas se elevaram para o alto e o corpo, ao invs de
queimar-se e escurecer-se, permanecia ntegro, mais alvo e
brilhante.
Essa seria apenas um das diversas verses que se encontra. A
outra explicao do costume
de se fazer fogueira vem da histria bblica onde Maria, me de
Jesus, ter combinado com Jos, pai
de Jesus, que o avisaria do nascimento de Joo acendendo uma
fogueira defronte a casa de Zacarias
e Isabel, pais de Joo, onde Maria estava hospedada espera do
nascimento. Sendo assim, de um
simples aviso, a fogueira se tornou smbolo de louvor a So Joo.
Alencar (1994, p.8) afirma que o
fogo louvor, a fogueira um smbolo. E atravs deste smbolo, e de
outros, que se cria o
significado, e atravs dos significados que se expressam as aes.
Para RadCliffe-Brown (1978,
p.13) o significado de uma palavra, um gesto, um rito, est no
que ele expressa, e isso
determinado por suas associaes com um sistema de idias,
sentimentos e atividades mentais.
A festa se torna uma rede de significados que se interligam,
exercendo uma funo social e
essa funo serve, no articular de Radcliffe-Brown (1978, p.13)
para denotar os efeitos de uma
instituio (costume ou crenas) enquanto concerne sociedade e sua
solidariedade ou coeso.
Ento, essa rede traz consigo, no mnimo, o aspecto de aproximao,
no s de pessoas, mas
destas com o divino. Assim, a lngua o meio para o dilogo
ritual:
[...] a lngua uma entidade isolada nem uma essncia, mas a
dimenso da vida cultural em sua particularidade histrica,
exprimindo relaes com a natureza com os demais membros da
sociedade, o espao, o tempo, o visvel, o invisvel, o sagrado e o
profano, o poder, o possvel e o impossvel, com o ser e o agir
(CHAU, 1989, p.110).
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51
de se negar a unio do til ao agradvel, quando o arraial, para o
turista, representa diverso e
para os organizadores, arrecadao, propaganda e prestgio para a
empresa e organizao
envolvidos. No se trata aqui, ainda, de um turismo religioso nas
propores do Crio de Nazar
(Belm-PA), da Festa do Divino Esprito Santo (Pirinpolis-GO) e da
Festa de So Benedito
(Aparecida-SP), mas de um turismo cultural emergente.
Existem tambm muitas escolas, tanto municipal, estadual e
particular, que fazem suas
descidas com a imagem do santo pela ladeira at beira do rio para
lav-la. Entre as muitas
escolas foram observadas, por acaso, a Escola Municipal Lus
Feitosa Rodrigues, Escola Estrela do
Oriente e a Escola Tenir. Outras, realizam o arraial, nos moldes
costumeiros de festas juninas, sem a
descida do santo ao rio Paraguai.
4.2 ELEMENTOS: A GUA, O FOGO E O MASTRO
Deve-se lembrar que os elementos da natureza como o fogo, a gua,
o ar e a terra, esto
presentes nos cultos religiosos anteriores ao cristianismo e
continuam at os dias de hoje. Assim,
alguns desses elementos foram conservados e utilizados como
parte das festividades crists.
O fogo simboliza a purificao, representa o sol, e ganhou sua
identidade simblica com o
povo. Alencar (1994, p.7), a respeito do fogo, lembra que a
frente dos altares dos deuses sempre
havia uma pira de fogo ardendo [...] Da pira ardente ao
artifcio, seu simbolismo ganhou identidade
[...].
H pessoas que praguejam outras as destinando para o fogo com
expresses como voc
arder no fogo do inferno (ALENCAR, 1994). O fogo foi, ento,
lentamente incorporado s festas,
entre elas a de louvor a So Joo Batista. O fogo representado na
festa de So Joo pelas fogueiras.
Para o fogo, Rocha (1997, p.31) busca a explicao de uma pessoa
do meio folc (popular) (Sr.
Agripino S. de Magalhes):
Antigamente, a fogueira no tinha nenhum significado especial.
Era acesa de acordo com as necessidades. Certo dia, houve uma
grande festa e, nela um baile.
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50
realizaram seu papel porque a Prefeitura alegou no ter verba,
mas teve verba para um evento
grande, para as atraes que se apresentaram no palco principal e
para os fogos de artifcio.
Existe tambm o arraial que organizado pelo Hotel Nacional com
apoio do Rottary Clube,
e se localiza na Rua Amrica entre as ruas Antnio Maria Coelho e
Frei Mariano, um ponto bem
conhecido pelos citadinos.
Fotografia 2: Arraial do Hotel Nacional / Rottary Club. Fonte:
Felipe Coelho Senna / junho 2003.
Nele h barracas com bebidas e comidas tpicas, um grupo sertanejo
e um andor. O que
interessante de se ver a presena de um arraial organizado por um
hotel (aspecto turstico), e que
tem o apoio de uma instituio internacional, v-se, ento, a
confluncia que a festa traz para o
municpio. Elementos que se distanciam no dia-a-dia, mas que
convergem no dia da festa. Seria este
arraial apenas um atrativo para os turistas que se hospedam no
hotel, ou um arraial como os outros?
Pode-se ver como um arraial para exclusivos, primeiramente,
porque cobrada uma taxa para
participar do arraial, mas segundo o administrador do mesmo, o
dinheiro arrecadado destinado a
instituies carentes. Contudo, mesmo que cheguemos a concluses
romnticas ou radicais, no h
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49
Outra caracterstica do arraial organizado pela prefeitura so as
barracas, que s podem ser
montadas pela Prefeitura que as alugam a um preo que varia entre
150 e 300 reais, com o
compromisso de se vender apenas comidas e bebidas tpicas, mas
verifica-se que isso no acontece.
O aparato de sonorizao, palco, contratao de msicos regionais e
ornamentao do local tudo
patrocinado pela Prefeitura, com apoio do Governo do Estado, e
empresas particulares. A Prefeitura
tambm organiza o concurso de quadrilhas, e oferece prmios12.
Segundo o Sr. Fbio Alexson, membro do Instituto Luiz Albuquerque
(ILA) a festa
profana, porque no a Igreja Catlica que realiza e sim a populao,
mas que a Prefeitura faz uma
parceria com o Governo do Estado para engrandecer a festa.
Percebe-se o significado de profano,
para ele sendo apenas o que no organizado pela Igreja Catlica.
Hoje a festa, continua Senhor
Alexson, criou ares de show e o santo passou a ser coadjuvante e
que h uma concorrncia do
show com o banho do santo. Pode-se dizer que por parte de muitas
pessoas que foram observadas e
entrevistadas informalmente (sem questionrio especfico), no h o
interesse pelo rito do banho do
santo, mas sim pela festa no seu aspecto geral. Essa viso pode
ser primria de uma entrevista; no
obstante, o que se v so trs tipos de participantes na festa; os
que participam da celebrao do
santo (participando do arraial e seus preparativos, da descida
ao rio Paraguai, ou em apenas um
desses ritos), outra como expectadora do banho e outra que se
interessa somente pelos
entretenimentos (shows, comidas, brinquedos, etc.). A senhora
Natalina d uma descrio bem
interessante nesse caso. Indiretamente ela observa dois tipos de
festa popular: uma festa pro povo
e outra feita pelo povo. A primeira se refere organizada pela
prefeitura do municpio, e a segunda
preparada pelas pessoas nas suas casas, ruas, bairros.
H, ainda, a queima dos fogos de artifcio, mais uma alegoria a
ser inserida nos festejos. No
de exclusividade do festejo, mas tambm cobre vrias ocasies como
exposies, comcios,
eventos em geral. Eles completam o So Joo, como muitos
entrevistados disseram, mas h certas
pessoas que reclamam a respeito da demasiada importncia que dada
aos fogos, sendo at
motivo de discrdia. O Sr. Fbio Alexson explica que, houve So Joo
em que os Cururueiros no
12 O arraial organizado pela Prefeitura, com o apoio (naquele
ano) do Governo do Estado, pode ser denominado de diversas maneiras
pela populao, entre elas: Arraial da Prefeitura, Arraial do Banho
de So Joo e Arraial do Porto.
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48
culto indgenas, afro-brasileiros e, mais recentemente, espritas
kardecistas (BRANDO, 1987, p.41-42).
Esta uma parte para esclarecer a questo de tantos andores e
arraiais organizados sem
interveno de um agente da Igreja. Isso pode ser explicado de
maneira mais concisa quando, mais
uma vez, Brando (1987, p.109-110) elucida tal fato enunciando
que:
Mais do que todos outros aspectos, entretanto, h um que define o
modo de ser catlico no Brasil. Mais do que politicamente dominante
em seu campo de relao de poder, o catolicismo foi e ainda , a
religio de todos. Ateno isto no significa apenas que
demograficamente uma religio de uma maioria uniforme de iguais
praticantes; significa, antes, que o catolicismo socialmente a
possibilidade de todas as categorias de sujeitos sociais possurem
uma mesma religio e diferenciarem, no seu interior, modalidades
prprias de sua religiosidade.
Em paralelo aos andores populares h o andor que desce s sete
horas do dia 24 de junho,
e organizado pela Igreja Santurio Maria Auxiliadora de Corumb
(descrevera-se posteriormente).
Mas, o Arraial que mais chamou a ateno foi o que a Secretaria de
Cultura local organiza. Nele
participam os Cururueiros e o grupo de Siriri, como tambm a
banda marcial da prefeitura que toca
msicas regionais (polca, chamam, etc.). So distribudas comidas e
bebidas enquanto a banda
marcial toca.
O arraial da Secretaria de Cultura, tem por funo divulgar o
turismo e a cultura, mas agrega,
exclusivamente, os servios artsticos dos Cururueiros e o do
grupo de Siriri. Pode ser que os dois
grupos foram secretaria e solicitaram a ajuda, mas isso no foi
dito pelos entrevistados, e sim que
a Prefeitura, atravs da Secretaria de Cultura, procurou e pagou
cada um dos grupos para participar
da festa justificando que para lembrar a antiga tradio da festa
(Senhor Alexson). O certo que
eles so pagos e posteriormente descem para o Porto Geral, onde
esto armadas barracas e um palco,
e ali se realiza o levantamento do mastro oficial, acompanhado
de rezas e ao som das cantorias e
das violas-de-cocho e, posteriormente, os grupos se apresentam
no palco principal da festa. A
Prefeitura efetua, ainda, o pagamento do transporte do grupo de
Cururu e Siriri at o local aonde se
realizar o arraial, para o qual foram contratados, a fim de
animarem e mostrarem a tradio (parte)
da festa.
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47
Ele relata ainda que, antigamente a comida era oferecida
gratuitamente, e a Prof. Eunice
confirma isso na entrevista feita a respeito deste assunto, como
ocorria nas fazendas, mas hoje em
dia no possvel proceder da mesma forma, pelo aumento da
popularidade que atingiu a festa e
que todas as religies participam, menos a protestante; e que a
festa aumenta de ano em ano.
Conforme a mesma, apenas para fazer uma comparao, a festa de So
Joo Batista em Portugal
feita nos lares e que foi no Brasil ela se tornou coisa das
ruas. Segundo Seu Sebastio, h mais
de 500 terreiros em Corumb11, porm os principais, ou maiores, so
os que foram visitados, por
serem os mais lembrados pelas pessoas quando perguntados sobre a
existncia de terreiros na festa.
Para explicar o fato de pessoas ligadas ao protestantismo no
participarem da festa temos a seguinte
afirmao:
Diferentemente do protestantismo, onde o fiel precisa ser para
participar, e tambm de modo diverso dos cultos afro-brasileiros,
onde absolutamente comum a pessoa participar sem ser, no
catolicismo, tal como o povo brasileiro o vive e significa, h uma
pluralidade de modos de ser que configura uma equivalente
pluralidade de maneiras de participar (BRANDO, 1987, p.112, grifo
nosso).
Percebe-se que, ao contrrio das religies protestantes, o
catolicismo permite uma fluidez
maior na participao de suas festas, principalmente pelo fato de
existir uma separao entre
catolicismo popular e eclesistico. O primeiro se caracteriza
pelo fato de ser praticado fora do
mbito eclesistico e celebrado por agentes camponeses de cultos
coletivos, e o segundo pelo fato
de ser administrado por padre regidos por uma matriz e
realizados dentro do templo (igreja). O
catolicismo popular:
[...] preservou da doutrina cannica e do imaginrio fantstico da
Igreja colonizadora ibrica quase toda a estrutura de smbolos e de
articulaes de cdigos e princpios de conduta social [...] Elas
atingiram sempre mais agentes de culto e fiis eruditos, de classes
mdias para cima [...] Por isso at hoje, fora o caso de sujeitos e
grupos populares associados ao trabalho pastoral das dioceses,
parquias e comunidades definitivamente ps-conciliares, a influncia
eclesistica pequena e em pouco modifica habitus populares
resultantes do trabalho cultural e religioso de agentes ibricos,
mesclando a influncia de sistemas de crena e
11 No se tem registro oficial em cartrio para confirmar tal
fato. Contudo, colocada a fala para ttulo de informao, e no de
confirmao de que existam na mesma quantidade.
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46
Os elementos mais observados no percorrer da pesquisa, na
vspera, durante e depois da
festa foram mastros, fogueiras, andores (no arraial ou casa do
devoto, at mesmo na descida da
Ladeira Cunha e Cruz para a lavagem s margens do Rio Paraguai) e
arraias. Estes elementos que
fazem parte do ritual foram observados de acordo com a rede de
significados que os mesmos
formam.
grande o nmero de pessoas que vm prestigiar, como dizem vrios
entrevistados, a
Festa de So Joo em Corumb. Muitos vm do pas vizinho, a Bolvia,
talvez por devoo ou
mesmo pelo interesse pela tradio que representa. Antigamente
existia uma organizao por parte
dos festeiros (pessoas que descem com andor), com pessoas
designadas ou at mesmo sorteadas
com funes especficas como capito do mastro e alferes da
bandeira, mas isso se perdeu, segundo
alguns relatos. Foi dito, em entrevista feita com a Sr.
Natalina, da Tenda Nossa Senhora da
Conceio, correspondente ao Terreiro Maria Aparecida de Souza,
que existia uma Irmandade para
cada terreiro, onde (ou era) feito o sorteio e/ou votao para
eleger o festeiro e os outros
componentes organizadores do festejo. Ela deixou esse assunto
muito implcito em suas falas, e deu
a sugesto de entrevistar o Senhor Rosildo Gonalves Dias, dito
como presidente da Irmandade
daquele ano, que no estava disposto a dar a entrevista por
motivos de sade. Existe uma conexo
entre os centros (terreiros), isso ficou claro. H uma fluidez
entre eles, pois, de acordo com o
Senhor Sebastio e com a Senhora Natalina, pessoas que participam
de um arraial vo para outro, e
vice-e-versa. Talvez seja uma forma com que os centros tm para
se integrarem, assim,
prestigiando um ao outro. Muitos turistas visitam as duas tendas
de umbanda solicitando
trabalhos relativos a Xang (So Joo).
Seu Sebastio, que participa h 30 anos, disse que existe um
responsvel pela Irmandade e
que todo o ano no terreiro so eleitas pessoas para as diversas
funes, aps a descida do andor ao
Rio Paraguai, como:
. Capito do Mastro este adorna o mastro e o responsvel pelo
mesmo;
. Alferes da Bandeira responsvel pela bandeira de So Joo e;
. Encarregado do Andor quem enfeita e cuida do andor.
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45
primeira observao, a presena de terreiros de candombl nesta
festividade, pois o mesmo So
Joo corresponde a Xang nessa religio.
Alguns arraiais foram visitados durante a pesquisa de campo,
como o da Dona Titina,
realizado na rua Major Gama, o da Dona Cacilda (Tenda Nossa
Senhora da Conceio), o Arraial
Sinh Ona, realizado pelo Instituto Luiz Albuquerque, o do Sr.
Celso Roberto da Silva e o do Sr.
Sebastio (Tenda de Umbanda So Jorge), entre outros que poderiam
ter sido entrevistados, mas
devido ao baixo contingente de pessoas e pouco tempo no foi
possvel, pois eles ocorrem quase
todos ao mesmo tempo.
Existe outro arraial que realizado pela Secretaria de Cultura do
municpio, no qual esto
envolvidos os Cururueiros. O Cururu vem a ser uma msica tocada
com a viola-de-cocho e ganz
(tipo de reco-reco). A viola foi trazida pelo Sr. Agripino
Magalhes de sua cidade natal, Cceres em
Mato Grosso, onde ocorrem festas ao som da viola at os dias de
hoje. Segundo o Sr. Agripino,
existe um ritual de preparao da rvore que ser cortada. So feitas
rezas e, posteriormente, o corte
e a confeco do instrumento, que antigamente era composto de
cordas preparadas com as tripas do
macaco. O corte da madeira no um simples ato de marcenaria,
segundo Eunice Ayala, ele deve
ser feito em lua minguante, para a madeira no carunchar (eles
que dizem isso 10), e as pessoas
que cortam, carregam o mastro at o local onde ser preparado.
Junto com o Cururu est o Siriri, que uma dana realizada ao som
da viola-de-cocho, do
reco-reco e do mocho consistindo na formao de casais que, em
sincronia com a msica
(entonao e chamados), realizam evolues no decorrer de suas
apresentaes. Os Cururueiros se
vestem com lenos no pescoo e tambm fazem algumas evolues
sapateando e, desde os
primrdios, o Cururu tocado somente por homens. No Siriri as moas
colocam vestidos longos e
coloridos e os moos vestem cala jeans, bota, camisa e leno no
pescoo. Muitas das msicas
executadas so composies antigas e tratam de diversos
assuntos.
10 A Prof Eunice Ayala se refere aos Cururueiros que cortam a
madeira, pois somente eles tm a explicao, mesmo que esse fato seja
oculto e embutido na tradio.
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comportamento e os trajes serem de cunho pejorativo. No Nordeste
brasileiro o Baio e o Xote
foram estilos musicais incorporados ao festejo com o acrscimo de
letras, muitas vezes, de carter
malicioso e muitas vezes ertico.
4.1 OS ARRAIAIS
Os arraiais descritos abaixo no sero colocados de forma
cronolgica, mas sim de forma
espontnea de como os dados foram expostos para o observador que
os estudou. Talvez a falta de
uma diviso especfica, para melhor separ-los, seja at melhor para
exp-los, pois aqui sero
apenas apresentados os arraiais, algumas entrevistas e algumas
caractersticas que os cercam,
deixando para posterior captulo o processo ritual completo de
como eles ocorrem.
Sendo assim, comea-se com uma entrevista concedida pela Prof.
Eunice8 aonde se obteve
a informao que as festas de So Joo vm das comemoraes que
ocorriam na regio, no s
por boas colheitas como tambm por um milagre pedido e concedido
pelo santo, e eram feitas,
primeiramente, em fazendas da regio. Nessas fazendas as pessoas
comiam e bebiam, com o intuito
de se esbaldarem, porque a festa o momento para isso. Como mesmo
o Senhor Satyro Manoel
Coelho relatou, com as bebidas feitas com licores de leite (
melote ), e outros sabores, ou pinga
mesmo. Foi s com o passar do tempo que veio a cerveja, sendo que
no comeo era bebida quente
(temperatura ambiente). As festas nas fazendas foram diminuindo,
talvez pela diminuio da
importncia do latifndio, ou mesmo pelo crescimento das cidades.
Porm o que se v o
crescimento da festa na cidade.
Dentre os Arraiais que descem, com seus andores9, a Ladeira
Cunha e Cruz, a maioria
afirmou a participao por beno alcanada que originou a tradio,
pois as primeiras descidas
para o banho do So Joo ocorreram devido ao atendimento de
necessidades, concedidos por este
santo. Muitos afirmam que por causa disso a festa no municpio
virou tradio. Destaca-se, em
8 A professora Eunice Ajala Rocha ex-membro da Secretaria de
Educao, ex-docente da UFMS do Campus de Corumb e estudiosa do
assunto. 9 Andor consiste em uma espcie de mesa porttil onde em
cada canto h um brao onde as pessoas podem segurar (quatro pessoas
somente). Em cima dele que so feitos os adornos e colocado o
santo.
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. Moeda na fogueira - benzer a moeda na fogueira meia noite, e
no dia seguinte dar ao
primeiro pobre que aparecer;
. Colocar em um prato com gua papis com nomes no outro dia
deve-se observar o papel
que abriu sozinho, ento, este nome ser o da pessoa com quem voc
ir se casar.
Essas so s algumas dentre muitas que pretendem a efetuao da
magia, porque isso o
que elas so,