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SEGURANA JURDICA NO NOVO CARF
Paulo de Barros Carvalho
Sumrio. 1. Palavras introdutrias. 2. Ncleo semntico do
sobreprincpio da segurana jurdica. 3. O primado da segurana jurdica
no processo. 4. O procedimento administrativo tributrio como forma
de atividade de controle do lanamento, da penalidade e da notificao
dirigida ao sujeito passivo. 5. Compatibilidade entre a modificao
de exegese do CARF e o primado da segurana jurdica. 6. Revogao e
anulao dos atos jurdicos administrativos. 7. Algumas reflexes e
subseqentes sugestes a propsito do procedimento administrativo
tributrio
1. Palavras introdutrias
O procedimento de tomar o direito como fato da cultura, de
reconhecer-lhe o carter retrico e de compreend-lo como produto
efetivo de um tempo histrico marcado pela presena sensvel de
invariantes axiolgicas est longe de ser mera ttica aproximativa do
estudioso para tentar compreender a textura do fenmeno jurdico.
Ainda que, em certos momentos, a ordem normativa possa parecer
mero
Professor Emrito e Titular de Dir. Tributrio da PUC/SP e da USP;
Coordenador do programa de ps-
graduao da PUC/SP; e Chefe do Departamento econmico e financeiro
da USP.
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conjunto de estratgias discursivas voltadas a regrar condutas
interpessoais e, desse modo, concretizar o exerccio do mando,
firmando ideologias, tudo isso junto h de processar-se no mbito de
horizontes definidos, em que as palavras utilizadas pelo
legislador, a despeito de sua larga amplitude semntica, ingressem
numa combinatria previsvel, calculvel, mantida sob o controle das
estruturas sociais dominantes. A possibilidade de estabelecer
expectativas de comportamento e de torn-las efetivas ao longo do
tempo impede que o direito assuma feio catica e d-lhe a condio de
apresentar-se como sistema de proposies articuladas, pronto para
realizar as diretrizes supremas que a sociedade idealiza.
Com efeito, os valores e sobrevalores que a Constituio proclama
ho de ser partilhados entre os cidados, no como quimeras ou formas
utpicas simplesmente desejadas e conservadas como relquias na
memria social, mas como algo pragmaticamente realizvel, apto, a
qualquer instante, para cumprir seu papel demarcatrio, balizador,
autntica fronteira nos hemisfrios da nossa cultura. A propsito,
vale a afirmao peremptria de que o direito positivo, visto como um
todo, na sua organizao entitativa, nada mais almeja do que
preparar-se, aparelhar-se, pr-ordenar-se para implant-los.
Ora, a sociedade brasileira vive momentos de inquietao. A
introduo de dois novos dispositivos de lei, no ano de 1999,
respectivamente art. 27 da lei 9.868/99 e art. 11 da lei 9.882/99
deu a luz a novos debates sobre matrias de extrema relevncia: a
modulao de efeitos em deciso de (in)constitucionalidade. Hoje, nos
tribunais superiores, admite-se em benefcio do interesse pblico e
em situao excepcional, isto , nas hipteses em que a declarao de
nulidade, com seus normais efeitos ex tunc, resultaria em grave
ameaa a todo o sistema legislativo vigente, atribuir efeito pro
futuro declarao incidental de inconstitucionalidade. A referida
inovao conduziu nossas conscincias, de maneira vertiginosa, ao
questionamento de princpios fundamentais. Aquilo que h de mais caro
para a dignidade de um sistema de direito positivo est sendo
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em tela de juzo, desafiando nosso esprito e estimulando nossas
inteligncias, ao reivindicar uma tomada de posio firme e
contundente. Chegando-se a esse ponto, no cabem mais tergiversaes e
os expedientes retricos somente sero admitidos para fundamentar a
deciso de manter a segurana jurdica, garantindo a estabilidade das
relaes j reconhecidas pelo direito, ou de anunciar, em alto e bom
som, que chegou o reino da incerteza, que o ordenamento vigente j
no assegura, com seriedade, o teor de suas diretrizes, que as
pomposas manifestaes dos tribunais superiores devem ser recebidas
com reservas, porque, a qualquer momento, podem ser revistas,
desmanchando-se as orientaes jurdicas at ento vigentes, sem outras
garantias para os jurisdicionados.
Trata-se de pura idealizao pensar na possibilidade de
funcionamento de um subsistema social qualquer sem a boa integrao
dos demais subsistemas que formam o tecido social pleno. No cabe
cogitar da implantao de um primoroso modelo econmico, por exemplo,
sem a sustentao das estruturas polticas e jurdicas que com ele se
implicam. As virtudes da Constituio de 1988, que so muitas, fizeram
imaginar um Brasil avanado e democrtico, em que os direitos e
garantias dos cidados se multiplicariam em vrias direes. Mas bastou
a prtica dos primeiros anos para nos fazer ver que as previses da
Carta Suprema no se concretizariam sem o suporte de um judicirio
digno de suas decises.
O sistema jurdico brasileiro surgiu no mago desse processo
emprico onde o direito aparece e comparece como autntico produto da
cultura, acumulando-se no seu historicismo para projetar o
entusiasmo de uma sociedade que olha para o futuro e pretende
viv-lo com a conscincia de suas conquistas e com a fora do seu
esprito.
Sua configurao jurdica reflete bem a complexidade das instituies
bsicas de um Estado igualmente complexo. Seria at ingenuidade supor
que num sistema em que convivem pessoas dotadas de autonomia
legislativa, financeira, administrativa e poltica, pudessem existir
diretrizes simples e transparentes que,
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em conjugao elementar com outras providncias, tivessem o condo
de esquematizar uma organizao operativa e eficiente.
O sistema que temos foi forjado na prtica das nossas instituies,
nasceu e cresceu entre as alternncias de uma histria poltica
agitada, irrequieta, no meio de incertezas econmicas internas e
externas. Sua fisionomia a do Brasil dos nossos tempos, com suas
dificuldades, suas limitaes, mas tambm com suas grandezas e, para
que no dizer, com a surpreendente vitalidade de um pas jovem, que
marca, incisivamente, sua presena no concerto das naes.
Tenho para mim que tais lembranas devem ser consignadas, no
momento mesmo em que entra em jogo a prpria manuteno da integridade
sistmica do Estado brasileiro. Vivemos o processo de uma deciso
significativa e importante. E a melhor contribuio que o jurista
poderia oferecer est na manifestao axiologicamente neutra (na
medida do possvel) a respeito do quanto percebe existir no trato
com o real. Se a pretenso alterar, efetivamente, a modulao dos
efeitos das decises em controle de (in)constitucionalidade, assunto
delicado que pode abalar em seus fundamentos a organizao jurdica
nacional, requer-se domnio tcnico e conhecimento especializado
sobre a matria.
Eis um ponto de real interesse, que envolve diretamente o bom
funcionamento das instituies, garantindo, no domnio do direito
tributrio, o contribuinte e o prprio Estado-administrao contra
excessos que a Carta Magna esteve longe de conceber e de autorizar.
Por que no aproveitarmos o ensejo para estabelecer os limites que
esto faltando? Por que no emendarmos a Constituio em trechos como
esse, atendendo s reivindicaes dos especialistas, para aperfeioar
um sistema que vem sendo construdo como a projeo do sentimento
histrico da sociedade brasileira?
2. Ncleo semntico do sobreprincpio da segurana jurdica
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Vivemos um tempo histrico de grandes questionamentos
constitucionais, sobretudo em matria tributria. As razes do nosso
sistema, cravadas no Texto Supremo, fazem com que a ateno dos
estudiosos seja convocada para o inevitvel debate sobre o contedo
de princpios fundamentais, conduzindo os feitos apreciao do Supremo
Tribunal Federal. Fica at difcil imaginar assunto tributrio que
possa ser inteiramente resolvido em escales inferiores, passando
margem das diretrizes axiolgicas ou dos limites objetivos
estabelecidos na Carta Magna. Por sem dvida que tal considerao
eleva, desde logo, esse ramo do direito pblico, outorgando-lhe
status de grande categoria, pois discutir temas de direito
tributrio passa a significar, em ltima anlise, resolver tpicos da
mais alta indagao jurdica, social, poltica e econmica.
Por outro lado, a estabilidade das relaes jurdicas tributrias,
diante das manifestaes da nossa mais alta corte de justia, torna-se
assunto sobremaneira delicado, requerendo ateno especialssima do
intrprete, porquanto est em jogo o sobreprincpio da segurana
jurdica.
Entre as grandes diretrizes que formam o estrato axiolgico das
normas tributrias no Brasil, algumas se apresentam como contedos de
enunciados expressos, enquanto outras se encontram na implicitude
dos textos do direito posto. Todas, porm, com a mesma fora
vinculante. A circunstncia de figurarem no texto, ou no contexto,
no modifica o teor de prescritividade da estimativa, que funciona
como vetor valorativo que penetra as demais regras do sistema,
impregnando-lhes, fortemente, a dimenso semntica. Por isso mesmo so
colocadas no altiplano da Constituio. De l, precisamente onde
comeam todos os processos de positivao das normas jurdicas, descem
aqueles primados para os vrios escales da ordem legislada, at
atingir as regras terminais do sistema, timbrando os preceitos que
ferem diretamente as condutas em interferncia
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intersubjetiva, com a fora axiolgica dos mandamentos
constitucionalmente consagrados.
O princpio da certeza do direito traduz as pretenses do primado
da segurana jurdica no momento em que, de um lado, (i) exige do
enunciado normativo a especificao do fato e da conduta regrada, bem
como, de outro, (ii) requer previsibilidade do contedo da
coatividade normativa. Ambos apontam para a certeza da mensagem
jurdica, permitindo a compreenso do contedo, nos planos concretos e
abstratos. Pensamos que esse segundo significado (ii) quadra melhor
no mbito do princpio da segurana jurdica.
Mas, ao lado da certeza, em qualquer das duas dimenses de
significado, outros valores constitucionais, explcitos e implcitos,
operam para concretizar o
sobrevalor da segurana jurdica. Diremos que em um dado sistema
existe este sobreprincpio, pairando sobre a relao entre Fisco e
contribuinte, sempre que nos depararmos com um feixe de
estimativas, integradas para garantir o desempenho da atividade
jurdico-tributria pelo Estado-administrao.
No temos notcia de que algum ordenamento a contenha como regra
explcita. Efetiva-se pela atuao de outros princpios, como o da
legalidade, da anterioridade, da igualdade, da irretroatividade, da
universalidade da jurisdio, etc. Isso, contudo, em termos de
concepo esttica, de anlise das normas, de avaliao de um sistema
normativo sem considerarmos suas projees sobre o meio social. Se
nos detivermos em um direito positivo, historicamente dado e
isolarmos o conjunto de suas normas (tanto as somente vlidas, como
tambm as vigentes), indagando dos teores de sua racionalidade; do
nvel de congruncia e harmonia que as proposies apresentam; dos
vnculos de coordenao e de subordinao que armam os vrios patamares
da ordem posta; da rede de relaes sintticas e semnticas que
respondem pela tessitura do todo; ento ser possvel imitirmos um
juzo de realidade que conclua pela existncia do primado de
segurana, justamente porque neste ordenamento emprico esto cravados
aqueles
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valores que operam para realiz-lo. Se a esse tipo de verificao
circunscrevemos nosso interesse pelo sistema, mesmo que no
identifiquemos a primazia daquela diretriz, no ser difcil
implant-la. Bastaria instituir os valores que lhe servem de
suporte, os princpios que, conjugados, formariam os fundamentos a
partir dos quais se levanta. Assim, vista por esse ngulo, ser
difcil encontrarmos uma ordem jurdico-normativa que no ostente o
princpio da segurana. E, se o setor especulativo o do Direito
Tributrio, praticamente todos os pases do mundo ocidental, ao
reconhecerem aqueles vetores que se articulam axiologicamente,
proclamam, na sua implicitude, essa diretriz suprema.
Apesar de tudo o que se disse, o direito existe para cumprir o
fim especfico de regrar os comportamentos humanos nas suas relaes
de interpessoalidade, implantando os valores que a sociedade almeja
alcanar. As normas gerais e abstratas, principalmente as contidas
na Lei Fundamental, exercem um papel relevantssimo, pois so o
fundamento de validade de todas as demais indicam os rumos e os
caminhos que as regras inferiores havero de seguir. Porm, nas
normas individuais e concretas que o direito se efetiva, se
concretiza, se mostra como realidade normada, produto final do
intenso e penoso trabalho de positivao. o preciso instante em que a
linguagem do direito toca o tecido social, ferindo a possibilidade
da conduta intersubjetiva. Da porque no basta o trabalho preliminar
de conhecer a feio esttica do ordenamento positivo. Torna-se
imperioso pesquisarmos o lado pragmtico da linguagem normativa,
para saber se os utentes desses signos os esto empregando com os
efeitos que a viso esttica sugere. De nada adiantam direitos e
garantias individuais, placidamente inscritos na Lei Maior, se os
rgos a quem compete efetiv-los no o fizerem com a dimenso que o bom
uso jurdico requer. Agora, j na pragmtica da comunicao jurdica se
fcil perceber e comprovar os limites objetivos, outro tanto no se d
com os valores. Este o caso do sobreprincpio da segurana
jurdica.
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No preciso dizer mais. Convencionou-se que tal valor ,
basicamente, a igualdade, a legalidade e a legalidade estrita, a
universalidade da jurisdio, a vedao do emprego do tributo com
efeitos confiscatrios, a irretroatividade e a anterioridade, ao
lado do princpio que consagra o direito ampla defesa e ao devido
processo legal, todos, em verdade, limites objetivos realizadores
do valor da segurana jurdica.
Experimentemos associar segurana jurdica o limite objetivo da
anterioridade. Com base neste preceito de direito tributrio, se o
tributo foi introduzido por ato infralegal, o que se prova com
facilidade, ficaremos seguros em dizer que o princpio foi violado.
Fique bem claro que o tributo cuja norma foi publicada em
determinado exerccio somente poder incidir sobre fatos que vierem a
ocorrer no ano seguinte, dando margem para que os destinatrios
planejem suas atividades econmicas, j cientes do custo representado
pelo novo encargo. limite objetivo que opera, decisivamente, para a
realizao do sobreprincpio da segurana jurdica. Seu sentido
experimenta inevitvel acomodao neste primado, vetor axiolgico do
princpio da anterioridade, de modo que o contribuinte no seja
surpreendido com exigncia tributria inesperada.
Da mesma forma se d com o princpio da legalidade, limite
objetivo que se presta, ao mesmo tempo, para oferecer segurana
jurdica aos cidados, na certeza de que no sero compelidos a
praticar aes diversas daquelas prescritas por representantes
legislativos, e para assegurar observncia ao primado constitucional
da tripartio dos poderes. O princpio da legalidade compele o
intrprete, como o caso dos julgadores, a procurar frases
prescritivas, nica e exclusivamente, entre as introduzidas no
ordenamento positivo por via de lei ou de diploma que tenha o mesmo
status. Se do conseqente da regra advier obrigao de dar, fazer ou
no-fazer alguma coisa, sua construo reivindicar a seleo de
enunciados colhidos apenas e to-somente no plano legal.
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E assim tambm o com o princpio da irretroatividade das leis.
Renovo, neste momento, a posio segundo a qual, abaixo da justia, o
ideal maior do direito a segurana jurdica, sobreprincpio que se
irradia por todo o ordenamento e tem sua concretizao viabilizada
por meio de outros princpios, tal como o da irretroatividade das
leis. Com ela no se compatibiliza dispositivo que, alm de
determinar ao Judicirio que este modifique orientao pacificada,
pretende ser aplicado retroativamente. Eis que o tema pede maiores
reflexes.
3. O primado da segurana jurdica no processo
Tm-se empregado o termo processo para designar, invariavelmente
tanto a discusso que se desdobra perante o Poder Judicirio, quanto
as controvrsias deduzidas no mbito da Administrao Pblica, sobre
temas tributrios ou meramente administrativos. A palavra, contudo,
no parece revestir a riqueza semntica que se lhe quer outorgar,
sugerindo uma dimenso mais restrita, um sentido mais estreito,
justamente em obsquio ao rigor da preciso dos conceitos
jurdicos.
De fato, processo, nos domnios do Direito, o nome que se d ao
instrumento de composio de litgios, ou ao complexo de atos e termos
voltados aplicao do direito positivo a uma situao controvertida.
Nele, realiza o Estado, na plenitude, sua funo jurisdicional,
aplicando a lei e tornando efetivos os ideais de Justia. Como
acentua Jos Frederico Marques:1 No se confunde processo e
procedimento. Este a marcha dos atos do juzo, coordenados sob
formas e ritos, para que se atinjam os fins compositivos do
processo. J o processo tem um significado diverso, porquanto
consubstancia uma relao de direito que se estabelece entre seus
sujeitos durante a substanciao do litgio.
1 Jos Frederico Marques. Instituies de Direito Processual Civil,
Forense, 2 ed., 1962, p. 31.
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A figura do processo est jungida ao campo da jurisdio, em que se
pressupe a existncia de um rgo estatal, independente e imparcial,
credenciado a compor conflitos de interesse, de maneira peremptria
e definitiva.
Seu carter teleolgico exalado por Augustin A. Gordillo,2 que
distingue o vocbulo na sua concepo ampla, daqueloutra concepo
estrita. Anota, porm, aquilo que chama de perigo da noo ampla,
porquanto, usualmente, processo sinnimo de juzo, e poderia chegar a
entender-se que a deciso prolatada pela Administrao, ouvido o
interessado, resolveria definitivamente acerca dos direitos
debatidos. O insigne autor argentino sublinha a necessidade de
reservarmos ao processo uma atribuio especfica, que vai alm de
simplesmente ouvir o interessado, mas que pressupe a existncia de
um julgador imparcial e independente, qualidades estas que em
nenhum caso pode reunir plenamente a Administrao. E assevera: Por
esta razn tambin es conveniente reservar el concepto de proceso y
por ende de juicio para el proceso o juicio estrictamente judicial,
evitando com esta terminologa posibles confusiones como Ias que se
acaban de recordar.
Estamos em crer que imperiosa a distino entre processo e
procedimento. Reservemos o primeiro termo, efetivamente, composio
de litgios que se opera no plano da atividade jurisdicional do
Estado, para que signifique a controvrsia desenvolvida perante os
rgos do Poder Judicirio. Procedimento, embora sirva para nominar
tambm a conjugao dos atos e termos harmonizados na ambitude da
relao processual, deve ser o timo apropriado para referir a
discusso que tem curso na esfera administrativa.
Firmadas estas premissas, lcito deduzir que a locuo adequada
para aludirmos impugnao de atos administrativos, junto prpria
Administrao, no que tange matria tributria, procedimento
administrativo tributrio, ao contrrio do que faz supor o ttulo do
presente trabalho.
2 A. Gordillo. Tratado de Derecho Administrativo, Macchi-Lopes,
Buenos Aires, XVII-1 a XVII-5.
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Dito isso, para empreender uma anlise da aplicao do princpio da
segurana jurdica no projeto Novo CARF ser fundamental delimitar
esse estudo sua atuao no que tange ao procedimento administrativo
tributrio. E, procedendo esse corte exegtico, faremos insurgir os
limites objetivos que ele impe a esta atividade. De fato o primado
da segurana jurdica, como j visto, efetiva-se pela atuao de outros
princpios, estes em regra mais objetivos e, por tal condio, o que o
realiza topicamente. Isso ocorre de tal modo que podemos asseverar
que, no procedimento administrativo, segurana jurdica, em alguns
momentos, legalidade objetiva, oficialidade, informalismo em favor
do interessado, e, em outros tempos, diremos que devido processo
legal, contraditrio e ampla defesa; ou ainda, afirm-la-emos como
processo em linguagem escrita, ausncia de custas ou mesmo rapidez,
simplicidade e economia do procedimento. Seja qual for o nome que
se a d ou o vnculo que se a atribua a outros princpios mais
objetivos, a boa verdade que a segurana jurdica se investe de cada
um desses aspectos para se tornar eficaz juridicamente. E por estas
e outras razoes que falar sobre a segurana jurdica no procedimento
administrativo enunciar sobre todos esses princpios que rege a
matria procedimental direta ou indiretamente. Nessa linha, segundo
Agustin A. Gordillo,3 os princpios que informam o procedimento
administrativo, dizendo, expressamente, com o objetivo fundamental
que a sucesso de atos e termos persegue, so de dois tipos,
aparecendo, contudo, um terceiro grupo, que se prende a
caractersticas externas do procedimento, e que valem
considerados.
Os princpios ligados ao primeiro tipo e, portanto, intrnsecos ao
procedimento, guardam semelhana com formulaes do processo penal,
destacando seu carter oficial, instrutrio, donde se irradiam a
chamada impulso de ofcio e a verdade material, como dado
prioritrio; os cnones do segundo tipo visam a garantir a participao
das pessoas no curso do procedimento, aparecendo, nesse nvel, o
informalismo a favor do administrado, o da defesa adequada, com
3 A. Gordillo. Procedimento y Recursos Administrativos, Macchi,
Buenos Aires, 2 ed., pp. 55.
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ampla possibilidade de prova, o princpio do contraditrio e da
imparcialidade.
Entre os princpios exgenos, teramos, ainda na trilha do
juriscultor argentino, aqueles que asseguram o carter escrito do
procedimento, o da ausncia de custas e outros mais que no
interferem propriamente com a estrutura procedimental.
Passemos a examinar, topicamente, esses postulados capitais, que
nos permitem compreender o procedimento administrativo tributrio
dentro de uma viso global e orgnica.
I Princpio da legalidade objetiva
O procedimento administrativo tributrio deve seguir seus trmites
no mbito daquilo que se conhece por realizao do contedo objetivo
das normas jurdicas, para preservar o imprio da legalidade e da
justia. Como cometido Administrao aplicar a lei de ofcio, havero de
procurar, seus agentes, a forma mais concreta, adequada e
verdadeira de realizar os comandos jurdicos. Esse princpio, que
ilumina toda a marcha do procedimento, atina, de maneira plena, com
a ratio essendi da figura, posto que j examinamos, com alguma
insistncia at, que o procedimento existe para garantir ao Poder
Pblico o aperfeioamento da inteleco da mensagem legislada,
expedindo atos inteiramente consonantes com o sistema jurdico
vigente. Nessa exata dimenso, a legalidade que deve presidir a
celebrao e anexao dos atos, no quadro procedimental, no vem em
favor ou detrimento de qualquer das partes, antes pressupe o
objetivo cardeal de efetivar os comandos legais nos seus precisos e
estritos termos.
Obtempera GordilIo,4 que em funo desse primado, se explica que
o
4 A. Gordillo. Procedimento y Recursos Administrativos, Macchi,
Buenos Aires, 2 ed., pp. 53 a 54.
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procedimento tenha carter instrutrio e que a autoridade possa
proceder de ofcio; que nele prevalea o princpio da verdade
material, em oposio ao da verdade formal; que exista amplitude para
considerar apropriadamente interpostos recursos e impugnaes,
facilitando assim, no possvel, o controle dos superiores
hierrquicos sobre a boa marcha e legalidade da administrao pblica.
Aduz, finalmente, que em virtude desse princpio se esclarece porque
desistncia do recorrente no veda Administrao prosseguir na busca da
ligitimidade do ato prolatado, o que tambm ocorre com o falecimento
do interessado.
Com supedneo nesse postulado, apreendido em toda a sua
abrangncia, emerge a necessidade de conferir-se ampla defesa ao
administrado, no s como requisito erigido nos sistemas liberais, em
homenagem pessoa humana do particular, mas, sobretudo, como
disposio tcnica para assegurar a efetiva e correta aplicao da
legalidade objetiva.
II Princpio da oficialidade
Do princpio da oficialidade se desprende a regra de que o
impulso do procedimento deve caber Administrao, quer como
desdobramento do prprio cnone da legalidade objetiva, seja como
imperativo de que a atividade, primeiro que diga respeito ao
interesse do particular, envolve um interesse pblico e da
Administrao mesma, na medida em que por seu intermdio se controla a
precisa e correta aplicao da lei.
Isso no quer exprimir que o incio do procedimento no possa caber
ao administrado ou, ainda, que certos atos procedimentais no sejam
cometidos sua iniciativa. Expressa, nica e exclusivamente, que
compete ao Poder Pblico zelar pelo curso regular do procedimento,
evitando que seu progresso fique tolhido por
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manifestaes de inrcia do interessado, com o comprometimento dos
objetivos finais que norteiam sua existncia.
Demora-se aqui um fator de dessemelhana com relao ao Direito
Processual Civil, em que prevalece a diretriz segundo a qual a lei
atribui s partes assegurarem o caminhar do procedimento judicial,
na busca da tutela jurisdicional do Estado.
Convm advertir que quando se fala em impulso de ofcio, no se
alude a um carter absoluto, mas apenas preponderante, variando, em
sua intensidade, conforme o tipo de interesse que se coloca como
contedo da controvrsia. Tratando-se de atos jurdicos de ndole
tributria, vigora o princpio com grande fora e vitalidade, de tal
modo que se torna admissvel asseverar, sem qualquer extravagncia,
que foi deferida Administrao cuidar do avano procedimental,
afastando todas as hipteses em que a sucesso de atos fique
truncada, frustrando-se por essa via, o controle de legalidade dos
atos praticados.
Deflui, tambm, da mxima da oficialidade o preceito do timbre
instrutrio que h de acompanhar o procedimento administrativo,
entendendo-se por isso a circunstncia de que a produo de provas e
todas as demais providncias para a averiguao dos fatos subjacentes
cabem tanto ao Poder Pblico quanto parte interessada. Por evidncia
que no plexo das disposies normativas que vamos encontrar a quem
compete realizar esta ou aquela prova; tomar esta ou aquela
providncia no sentido de atestar os acontecimentos. Alguns
expedientes so, por natureza, privativos da Administrao, enquanto
outros s ao administrado quadra produzir. No feixe de tais
contribuies reside o carter instrutrio do procedimento
administrativo tributrio e, com ele, a forma encontrada pelo
Direito para o esclarecimento dos fatos e subseqente controle da
legalidade dos. atos.
De corolrio, aparece o postulado sobranceiro da verdade
material, como inspirao constante do procedimento administrativo,
em geral, e tributrio, em
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particular. Mais uma vez nos defrontamos com trao singular ao
procedimento administrativo, em cotejo com o judicial. Neste ltimo,
prepondera a norma da verdade formal, havendo o juiz de ater-se s
provas trazidas ao processo civil. No que atina discusso que se
opera perante os rgos administrativos, h de sobrepor-se a verdade
material, a autenticidade fctica, mesmo em detrimento dos
requisitos formais que as provas requeridas ou produzidas venham a
revestir.
Agustin A. Gordillo5 bastante eloqente ao versar esse tema,
aduzindo sugestivas ponderaes. Vejamo-las: en el procedimiento
administrativo el rgano que debe resolver est sujeto al principio
de la verdad material, y debe en consecuencia ajustarse a los
hechos, prescindiendo de que ellos hayan sido alegados y probados
por el particular o no, por ejemplo, hechos o pruebas que sean de
pblico conocimiento, que estn en poder de Ia administracin por
otras circunstancias, que estn en expedientes paralelos o
distintos, que la administracin conozca de su existencia y pueda
verificarIos, etc. Si Ia decisin administrativa no se ajusta a los
heehos materialmente verdaderos, su acto estar viciado por esa sola
circunstancia (o grifo no do autor).
Ajeitando-se o enfoque para o nosso procedimento administrativo
tributrio, fcil verificar o teor de ilogicidade das decises que no
consideram, por exemplo, o fato jurdico da prescrio, singelamente
porque no foi suscitado pela parte. Esta espcie de capricho, que
encontra respaldo em disposies expressas do direito positivo, negam
a funcionalidade daquele princpio da verdade material, com efeitos
prticos por vezes adversos aos precpuos interesses da prpria
Fazenda Pblica.
III Princpio do informalismo em favor do interessado
5 A. Gordillo. Tratado de Derecho Administrativo, Macchi-Lopes,
Buenos Aires, XVII-21-22.
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O informalismo um sainete bem prprio ao procedimento
administrativo. Por ele deve entender-se a ausncia de formas
estritas, de modelos exclusivos, que pode ser interpretado com
alcances at discrepantes. Por um lado, o informalismo muitas vezes
conduz arbitrariedade, pela ausncia de frmulas determinadas, que se
afiguram como autnticas garantias da segurana das relaes
procedimentais. Por outro, contudo, o informalismo significa a
aceitao de um quadro amplo de direitos e prerrogativas, no que
respeita realizao da verdade material, objeto do interesse da
Fazenda e do particular. E com tal acepo que h de ser acolhido,
presumindo-se que todos os efeitos favorveis que venha a suscitar,
beneficiem o administrado. Da a referncia expressa a informalismo
em favor do interessado/
Adscrever-se um aspecto formal rgido para governar os atos
praticados pelo particular significaria, em ltima anlise, criar
empeos e sugerir embaraos a um relacionamento que h de ser simples
e objetivo, por natureza. Esse critrio no de aplicar-se atividade
administrativa, na pauta de sua interveno procedimental. Favorece o
interessado, o particular, a parte, no a Fazenda Pblica, cujos atos
sero celebrados e acompanhados com imprescindvel rigor.
Como aplicao prtica desse princpio, temos a tolerncia quanto
denominao de recursos e peas impugnatrias; a considerao de medidas
endereadas a autoridades diversas, dentro do mesmo rgo, ou dentro
de certos limites. O que interessa, no caso, a vontade de impugnar,
o desejo de interpor recurso, ficando para segundo plano os
requisitos formais que dizem com a compostura da pea.
Acresce ponderar que a Administrao, no quadro de seus
poderes-deveres, tem que promover as devidas correes, sanando as
possveis irregularidades formais de seus atos e, com especial
nfase, dos atos promovidos pelas partes. Deparamos, neste passo,
com outra emanao do princpio do informalismo em favor do
interessado.
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17
Em sumula estreita, vale acentuar que o critrio do informalismo,
que permeia o procedimento administrativo, inscreve-se no plano das
prerrogativas do administrado, vindo a favorec-lo, benefici-lo e
criar pressupostos para que participe em igualdade de condies com o
Poder Pblico no contexto procedimental. No aproveita, porm,
Fazenda, que dever ater-se ao espectro de requisitos formais que
inspiram suas manifestaes. Acaso admitssemos o informalismo em
favor da Administrao e entraramos nos perigosos domnios do arbtrio
e no mar revolto das solues extralegais.
IV O princpio do devido processo
A diretriz suprema do devido processo legal, que anima a
composio de litgios promovida pelo Judicirio, e que garante ampla
liberdade s partes para exibir o teor de juridicidade e o
fundamento de justia das pretenses deduzidas em Juzo, se aplica com
assomas de princpio capital ao procedimento administrativo
tributrio. Existe o chamado devido processo legal, como instrumento
exclusivo de preservar direitos e assegurar garantias, tornando
concreta a busca da tutela jurisdicional ou do ato jurdico
administrativo que consubstancia a manifestao final da Fazenda, em
questes tributrias que dependam de um ato formal expressivo de sua
vontade.
com estribo nesse primado que no se concebe, nos dias atuais,
algum ser apenado sem que lhe seja dado oferecer todas as razes
favorveis, que justifiquem ou expliquem seu comportamento. direito
que mereceu referncia explcita em nossa Carta Constitucional,
consoante se v do art. 5, LV da CF/88, in verbis: Aos litigantes,
em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral so
assegurados o contraditrio e ampla defesa, com os meios e recursos
a ele inerentes.
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Fique assinalado que locuo aos acusados em geral, se equipara,
em tudo e por tudo, a situao de todos os administrados que tenham
ameaados seu patrimnio e sua liberdade, por fora de imposies
tributrias. J mencionamos que o poder de imprio do Estado, na
plataforma dessas imposies, h de manifestar-se de forma
extremamente cuidadosa, inspirada pelo zelo que a magnitude desses
direitos sugere, tratando-se, como se trata, de prerrogativas
fundamentais ao ser humano, no convvio com seus semelhantes.
A observncia de to elevado critrio, porm, no h de inscrever-se
no aparente quadro de faculdades externas e rotineiras, preservadas
como singelos deveres dos agentes da administrao, no decurso de
procedimento. Antes de tudo, so imposies constitucionais, que
embora expressas naquele j citado preceito, penetram inmeros outros
dispositivos, quer no Texto Magno, quer de diplomas de inferior
estatura hierrquica. A ele devem curvar-se todos os funcionrios
incumbidos de intervir na marcha do procedimento, curando, de
ofcio, e sem necessidade de qualquer instncia do particular, de sua
preservao e do sentido e da profundidade de sua existncia, enquanto
critrio sobranceiro, diretriz primeira e conquista inarredvel do
moderno Estado de Direito, assim concebido como aquele que se
submete lei e jurisdio.
O direito ao devido processo, o due process of law, antessupe a
verificao de uma srie de desdobramentos, que podem ser assim
enumerados:
1 Direito a ser ouvido, que abrange, por sua vez:
a) ampla publicidade de todos os atos do procedimento, mxime
aqueles privativos da Administrao, firmando-se, nesse plano, o
direito de vista do particular, que no pode ser tolhido sob
qualquer pretexto. Admoesta Gordillo6 que o ato secreto del
procedimiento slo se justifica en casos excepcionales y por decisin
expresa de autoridad competente;
6 A. Gordillo. Procedimento y Recursos Administrativos, Macchi,
Buenos Aires, 2 ed., pp. 82.
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19
b) oportunidade de expressar suas razes em momentos que
antecedam a expedio do ato administrativo, e tambm, por
desdobramento lgico, em instantes subseqentes celebrao e
publicidade do ato;
c) manifestao expressa da autoridade que est incumbida de
apreciar o feito, com relao a cada um dos argumentos e das questes
propostas, ressalvando-se, naturalmente, aquelas que refugirem do
segmento circunscrito na lide;
d) dever da Administrao de decidir explicitamente os pedidos,
impugnaes e recursos, fundamentando as solues alvitradas e
analisando, topicamente, os pontos levantados pelas partes;
e) direito de fazer-se representar por profissional
especializado, o que se explica nas adnumerveis situaes em que o
sujeito passivo no tem o desejado conhecimento da sistemtica que
preside a exigncia fazendria. Essa faculdade, todavia, no elide a
defesa do prprio interessado, muitas vezes impossibilitado de
contratar algum para represent-lo.
2 Direito a oferecer e produzir a prova adequada defesa de suas
pretenses. Essa prerrogativa traz tambm, como pressupostos:
a) direito a que toda prova, razoavelmente proposta, seja
produzida, ainda que tenha que faz-lo a prpria Administrao, como
atestados, certides, informaes, esclarecimentos, etc.;
b) direito a que a produo da prova seja efetivada antes que o
Poder Pblico adote alguma posio definitria sobre o contedo da
questo;
c) direito a participar na produo da prova feita pela
Administrao, seja ela pericial ou testemunhal, como outra
manifestao do princpio da publicidade.
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V Princpio da contradio
O princpio da contradio no assume, propriamente, a categoria de
um primado independente, mas tem como premissa a configurao
procedimental dentro da amplitude do devido processo legal. A
realizao desse cnone tem como corolrio imediato que se estabelea
uma seqncia contraditria, em que Administrao e administrado se
coloquem numa situao de equilbrio, apta a propiciar o desdobramento
do feito e ensejar a edio do ato conclusivo, para o qual
propende.
Cabe asseverar que a cada expediente de iniciativa do particular
corresponde um ato ou uma providncia da Fazenda, de tal sorte que
se configura a contradio inspiradora do procedimento, enquanto
cadeia de atos e termos, associados orgnica e harmonicamente, para
o fim deliberado de obter-se um ato final, substanciador da vontade
administrativa. A recproca tambm verdadeira, uma vez que todo o ato
administrativo suscita, ou pode suscitar (no se tratando da
manifestao derradeira), um pedido de reviso, uma pea impugnatria,
ou um recurso.
imperioso reconhecer que o princpio do contraditrio no se
perfaz, apenas e to-somente, com a possibilidade de o administrado
ou a Administrao oferecer argumentos e provas que contradigam atos
ou peas interpostas no procedimento. Requer, sobretudo, que isso
ocorra num ambiente de rigoroso equilbrio, opondo-se eqitativa e
uniformemente, as razes de ambas as partes.
Deve ser vista com inusitada reserva, por exemplo, a prtica
utilizada no procedimento administrativo do Estado de So Paulo, no
que concerne ao imposto sobre operaes relativas circulao de
mercadorias, em que o oferecimento de razes de defesa ou de recurso
d espao manifestao do fiscal autuante, para depois subir,
respectivamente, apreciao do rgo de primeiro grau ou da Corte
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21
Administrativa que decide em segunda instncia. Parece bvio que
esse vezo rompe com o equilbrio procedimental, atribuindo-se
participao maior Fazenda que ao particular. Sobre violar o carter
contraditrio, acaba por favorecer a Administrao, muito embora venha
em detrimento da busca da verdade material, objetivo tambm
especfico no desenrolar da lide administrativa.
Entrefigura-se importante ressaltar que o princpio do
contraditrio est jungido observncia de um certo grau de
imparcialidade na soluo do litgio. No se pretende, claro, que haja
aquela imparcialidade absoluta que caracteriza, teoricamente, as
emanaes do Poder Judicirio. O esquema estrutural que governa a
existncia do procedimento, desenvolvido nos cancelos da Administrao
Pblica, em que esta aparece como interessada no deslinde do
problema suscitado, por si s j afasta a possibilidade de uma soluo
imparcial e equiponderante. Sabe-se que a autoridade julgadora est
premida por contingncias que a tornam mais prxima do ato
administrativo, que abriu ensanchas controvrsia, do que impugnao
deduzida pelo interessado. verdade incontendvel e que no pode ser
desprezada sem desapreo do exame objetivo e cientfico da realidade
que se estuda com o procedimento. Em contraponto, faz-se mister a
existncia de um mnimo de independncia e imparcialidade, para que se
possa falar em contraditrio e, por via de conseqncia, em
procedimento administrativo tributrio.
VI Outros princpios
Consoante salientamos, na esteira do juspublicista argentino,
outros princpios h, que podem ser identificados como exteriores ao
procedimento, mas que servem para distingui-lo de outras entidades
jurdicas, interessando, portanto, enunci-los.
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1 O carter escrito do procedimento, que assume relevo na dimenso
em que os momentos de oralidade so muito reduzidos e quase
inexistentes. Essa particularidade se traduz como um imperativo que
inibe arbitrariedades e afasta presses esprias, que por uma razo ou
por outra, poderiam macular o curso normal do procedimento. Assim,
at as provas testemunhais ho de ser reduzidas a escrito,
circunstncia que permite, a qualquer tempo, aferir-se o grau de
legitimidade dos atos do procedimento.
2 A ausncia de custas outro pormenor que marca, ainda que de
maneira exterior, a realidade do procedimento administrativo
tributrio, principalmente em cotejo com o processo. judicial
tributrio. A justificao repousa no interesse que a Administrao
devota ao curso do procedimento, que tem por escopo a edio de um
ato final controlador da legalidade de atos anteriormente
praticados. O procedimento interessa Fazenda, que no pode pretender
o exerccio de direitos que a lei no lhe comete ou no deve
extrapassar os limites consignados no direito positivo para o
implemento das imposies legalmente atribudas. Embora de feio
exgena, a ausncia de custas se prende ao sentido de existncia
jurdica do procedimento como um todo.
3 A rapidez, simplicidade e economia so tambm fatores externos,
mas que devem inspirar a figura do prottipo de procedimento
administrativo tributrio. A rapidez interessa a todos. O direito
existe para ser cumprido e o retardamento na execuo de atos ou nas
manifestaes de contedo volitivo ho de sugerir medidas coibitivas,
tanto para a Fazenda, como para o particular. Nesse domnio se situa
a estipulao de prazos para a celebrao de atos administrativos, bem
como a interposio de peas e outros expedientes que interessem aos
direitos do administrado. No se compaginam com os ideais de
segurana e garantia das relaes jurdicas certas situaes indefinidas,
qualificadas pela inrcia de agentes da administrao ou do titular de
direitos subjetivos.
A rapidez liga-se a simplicidade, posto que expedientes e
providncias
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complexas no poderiam responder ao requisito da celeridade suso
mencionada. Os atos administrativos realizados no decurso do
procedimento, assim como todos os momentos que qualificam a
participao do interessado devem obedecer a disposies singelas, a
pressupostos de fcil compreenso, a medidas de entendimento imediato
ao comum dos homens, em ordem a que se torne possvel assegurar o
caminho do procedimento, em clima de rapidez e segurana. Ainda
quanto aos atos administrativos seria admissvel certa implexidade,
firmada a convico de que o agente competente para efetiv-lo seja
tambm competente na acepo vulgar do termo. Entretanto, no que
entende ao particular, pareceria desatinado exigir o cumprimento de
formas complicadas, que no em casos excepcionais, onde as prprias
circunstncias requerem manifestaes complexas.
Se rapidez se liga a simplicidade, lcito dessumir que da
conjugao dos dois requisitos nasce a economia. De fato, no se pode
pensar em economia, se nos deparamos com uma cadeia iterativa de
atos complexos, de providncias rebuscadas, de expedientes
estrambticos, de exigncias esdrxulas, tudo isso associado numa
organizao que prima pela ausncia de prazos determinados para ambas
as partes. No h exagero em afirmar-se que a economia procedimental
decorrncia lgica e cronolgica da simplicidade e da rapidez.
Vimos de ver os postulados endgenos e exgenos que devem inspirar
o procedimento administrativo tributrio, para que ele se realize
como sucesso itinerria e encadeada de atos administrativos tendendo
todos a um resultado final e conclusivo, no dizer de Celso Antonio
Bandeira de Mello,13 ou, segundo Alberto Xavier,14 como a sucesso
ordenada de formalidades tendentes prtica ou execuo de um ato
administrativo por parte de uma autoridade ou rgo
administrativo.
Seja como for, a coalescncia de todos aqueles primados,
derramando luzes sobre a sucesso articulada de atos e termos,
outorga ao procedimento um sentido jurdico de grande significao,
aparecendo como instrumento valioso para o
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surgimento, no universo do Direito, de uma sadia e adequada
manifestao de vontade do Estado, enquanto Administrao Pblica.
4. O procedimento administrativo tributrio como forma de
atividade de controle do lanamento, da penalidade e da notificao
dirigida ao sujeito passivo
A cadeia sistemtica de atos e termos, que do sentido de
existncia ao procedimento administrativo tributrio, j pde ser
examinada no seu contedo, como uma sucesso de providncias viradas
ao fim precpuo de se aplicar, de ofcio, mas rigorosamente, a lei
tributria. E tal observao no encerraria qualquer curiosidade, uma
vez que cedio o princpio, segundo o qual, a toda aplicao de
penalidades deve preceder uma verificao contraditria da verdade
material, em consonncia com inmeros postulados, entre eles o da
ampla defesa. Acontece que o procedimento administrativo tributrio
no surde luz, na ordem jurdica vigente, apenas no que pertine
aplicao das chamadas multas ou outras sanes fiscais. Tem cabida,
igualmente, no que concerne exigncia do tributo, concebida dentro
dos mesmos parmetros e cercada de idnticos cuidados. Por qu?
Precisamente porque a pretenso tributria esbarra em dois primados
carssimos, na estrutura do direito positivo brasileiro: o direito
de liberdade e o direito de propriedade. A singela ameaa a esses
dois direitos substanciais motivo suficiente para que se
desencadeie toda aquela sucesso de expedientes, alguns do Fisco,
outros do sujeito passivo, conduzindo-se a discusso de tal arte que
se promova, iterativamente, o controle de legalidade dos atos
praticados no plano de gesto dos tributos.
Muitos autores, mais preocupados com a possvel existncia de uma
Justia Administrativa, tm procurado deslocar o cerne do problema,
entendendo que o
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procedimento deva se ater a outras diretrizes, quem sabe mais
amplas, contudo, juridicamente menos verdadeiras e autnticas. No se
pretende, com isso, afastar do plano da correta aplicao da lei, nos
domnios da relao do Ente Pblico com o administrado, os ideais de
Justia. Quer apenas significar que o procedimento no persegue, como
finalidade primeira e imediata, a concretizao de critrios de
Justia. Tais anseios por certo que penetram o encadeamento das peas
integradoras da sucesso harmnica que culmina com a manifestao final
da vontade do Estado. Devem permear a celebrao dos atos e inspirar
todas as providncias que se fizerem necessrias no curso do
procedimento, mas no o objetivo capital, a razo ltima, o desgnio
pronto e direto que o particular e a Administrao almejam conseguir.
Esta meta est circunscrita, em carter primordial, aplicao
escorreita dos preceitos da lei, entendido este vocbulo na
plenitude de seu contedo semntico. Ao Judicirio, entretanto, cabe a
aplicao do direito positivo, compondo litgios e realizando, com
todo o vigor, os mais elevados padres de Justia. Reside aqui,
precisamente, a distino entre as funes da Administrao, no contexto
do procedimento administrativo e a do Judicirio, quando se trata do
processo tributrio. A tutela jurisdicional do Estado concebida como
atividade que se desempenha imediatamente voltada aos ideais de
Justia. No h exagero at em afirmar-se que o Estado exerce a
Jurisdio para celebrar a Justia, muito embora o faa tambm aplicando
o direito, de ofcio.
Entretecidas essas consideraes, fiquemos com a afirmao de que o
procedimento administrativo tributrio se traduz num plexo de
formalidades, armadas para o escopo de exercitar o controle de
legalidade de certos e determinados atos administrativos, como o
lanamento, a imposio de penalidades e a notificao. De ver est que
outros existem, suscitando tambm um controle de legalidade, e nesta
medida seria admissvel afirmar que todo ato administrativo deve
estar submetido verificao de sua legitimidade. Interessa-nos, por
ora, o procedimento administrativo tributrio, razo pela qual
centralizaremos nossas atenes naqueles especficos atos.
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26
Desse modo, sempre que dvida pairar sobre o teor de juridicidade
do lanamento, por exemplo, caber ao sujeito passivo impugnar o ato,
suscitando aquele controle. Desencadear, assim, uma cadeia de
outros atos e termos, propiciando o ensejo para a deciso de
primeira instncia, que nada mais que a manifestao de um rgo
superior ( autoridade competente para realizar o ato de lanamento)
acerca da validade do ato praticado. Insatisfeito, ainda, o
particular pode interpor recurso da deciso expedida pelo rgo a quo,
provocando, novamente um controle de legalidade, agora mais
especializado, e cercado de prerrogativas mais solenes e
importantes: a deliberao de um rgo colegial, de estrutura paritria
(Tribunal de Impostos e Taxas, Conselho de Contribuintes, etc.).
Acresce notar que no pra a o exerccio do controle da legitimidade
dos atos administrativos pela prpria Administrao, uma vez que
outros atos sero praticados, invariavelmente compostos para aquele
fim. A culminncia o ato de apurao da dvida ativa, seguida de sua
inscrio no livro de registro da dvida pblica. Convm memorar, neste
ponto, a grande importncia de que se reveste esse ato, quase sempre
relegado pela prpria Fazenda a uma posio de secundrio relevo. que o
ato de apurao da dvida ativa e subseqente inscrio no registro
adequado, no s expressa o derradeiro instante em que a Administrao
pode desenvolver um especfico controle da legitimidade dos atos
praticados, como tambm, muitas vezes o ato celebrado por
verdadeiros especialistas. Na verdade, por uma srie de razes que no
frisa retomar, as autoridades que decidem, na esfera
administrativa, no tm formao jurdica especializada. Em inmeras
oportunidades vamos encontrar profissionais de outras reas do
conhecimento exercitando o mister de analisar o teor de
juridicidade de atos administrativos, sem que congreguem, para
tanto, as condies intelectuais que o juzo crtico requer. Cremos que
o nico ato realizado, obrigatoriamente, por profissionais
habilitados na interpretao jurdica, o de apurao e inscrio da dvida
ativa, porquanto se consubstanciam em atividade privativa dos
Procuradores da Fazenda. Se enlaarmos esta nota circunstncia, j
mencionada, de ser esse o ltimo instante
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para que o controle de legalidade seja exercido, ver-se-, de
modo claro e insofismvel, o grande valor que representa.
5. Compatibilidade entre a modificao de exegese do CARF e o
primado da segurana jurdica.
Durante muitos anos, a modificao de posicionamento pelo poder
executivo ou judicirio foi mal vista pela comunidade cientfica,
como fator desestabilizador da segurana jurdica. Acontece que entre
os axiomas da atual lingstica do texto, dois fatores existem para
impedir, decisivamente, a estagnao das construes interpretativas:
intertextualidade e inesgotabilidade do sentido.
O primeiro, desde logo, pe a produo de linguagem em contato com
todos os demais textos existentes, a ele ligados direta ou
indiretamente; ao passo que o segundo leva em conta a
irrepetibilidade do real, fsico e social, para concluir ser
impossvel a reproduo exata das condies pragmticas em que foi
expedida a mensagem. Ainda que emissor e receptor sejam os mesmos e
idntico o teor digital da comunicao, ter-se- alterado o meio
envolvente, o que provoca, inevitavelmente, modificao
interpretativa.
Essas consideraes conduzem o pensamento a mutaes constantes
diante do objeto do conhecimento, e de forma mais enftica quando se
tratar de bens da cultura, como o direito, em que os valores
fazem-se presentes de modo invarivel.
o que se d com a modificao jurisprudencial do CARF. O passar do
tempo vai levantando dvidas, estruturando problemas, sugerindo
novos esquemas de avaliao dos dados da experincia, rendendo espao,
assim, ao aparecimento de diferentes propostas de compreenso. E
nosso direito positivo, no seu plano emprico, tem oferecido
discusses demasiadamente interessantes. A todo
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momento deparamo-nos com situaes conflitivas que envolvem a
tomada de diferentes opinies pelos conselheiros, muitas vezes
diametralmente opostas, transpondo, por esse modo, o importante
obstculo das ideologias no momento mesmo da positivao de suas
decises administrativas.
A jurisprudncia administrativa, ao seu jeito, vai construindo o
sentido que lhe parece ser o mais justo, refletindo a inconstncia
dos relacionamentos sociais, enquanto a doutrina acompanha esse
processo de configurao, procurando encontrar o perfil de uma
outorga de competncia que o legislador constituinte no adscreveu de
maneira expressa. Enquanto doutrinador, renovo a posio segundo a
qual, abaixo da justia, o ideal maior do direito a segurana
jurdica, sobreprincpio que se irradia por todo o ordenamento e tem
sua concretizao viabilizada por meio de outros princpios, tal como
o da irretroatividade das leis. Com ela no se compatibiliza
dispositivo que, alm de determinar ao CARF que este modifique
orientao pacificada, pretende ser aplicado retroativamente.
Qualquer violao a essas diretrizes supremas compromete,
irremediavelmente, a realizao do princpio implcito da certeza, como
previsibilidade, e, ainda, o grande postulado da segurana
jurdica.
6. Revogao e anulao dos atos jurdicos administrativos
Os atos jurdicos administrativos podem desaparecer do mundo
jurdico pela -revogao ou pela anulao.
Hely Lopes Meirelles7 chama a ateno para a destrina, mencionando
a Smula 473, do STF, que ps fim imperdovel equiparao. A administrao
revoga ou anula o seu prprio ato; o Judicirio somente anula o ato
administrativo.
7 Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro, Ed.
Revista dos Tribunais, 1976, 4 ed., p. 171-2.
-
29
Isso porque a revogao o desfazimento do ato por motivo de
convenincia ou oportunidade da Administrao, ao passo que a anulao a
invalidao por motivo de ilegalidade do ato administrativo. Um ato
inoportuno ou inconveniente s pode ser revogado pela prpria
Administrao, mas um ato ilegal pode ser anulado, tanto pela
Administrao, como pelo Judicirio.
O ato jurdico administrativo de lanamento pode ser nulo, de
pleno direito, se o motivo nele declarado a ocorrncia de
determinado fato jurdico tributrio, por exemplo inexistiu. Tambm
ser nulo quando, a ttulo de modelo, for identificado sujeito
passivo diverso daquele que deve integrar a obrigao tributria.
Igualmente nulo o lanamento de imposto de renda, pessoa fsica,
celebrado antes do termo final do prazo legalmente estipulado para
que o sujeito passivo apresente sua declarao de rendimentos e de
bens, hiptese de forma em desacordo com a prescrio em lei.
Como exemplos de anulao de lanamentos, temos os conhecidos erros
de fato, to freqentes em nossos dias: troca de nmeros, substituio
de valores, etc.
Conviria lembrar, principalmente no que tange categoria do
lanamento tributrio, a classe dos atos irregulares a que alude
Seabra Fagundes.8 Tais entidades estariam eivadas de pequenos vcios
que, por irrelevantes, no justificariam a anulao do ato. O nome do
contribuinte, ainda que permitindo sua identificao, no est
corretamente consignado. Nesses casos, suficiente ser leve
retificao que no determina, por si s, qualquer mudana jurdica no
relacionamento entre Administrao e Administrado.
De final, pequena advertncia acerca da procedente distino
assinalada por Hely Lopes Meirelles. Para evitar perigosos
equvocos, no convm falarmos em revogao de lanamento, visto como foi
que a revogao seria o desfazimento do ato por motivo de convenincia
ou oportunidade da Administrao. Ora, se no
8 Seabra Fagundes. O Controle dos Atos Administrativos pelo
Poder Judicirio, Forense, 1967, p 54.67.
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30
plano das imposies tributrias, ao menos quanto ao ato de
lanamento, estamos diante de atividade vinculada, e no
discricionria, descabe qualquer aluso a critrios de convenincia ou
oportunidade. Empreguemos, em obsquio preciso da fraseologia
jurdica, o termo anulao, o nico compatvel com o reconhecimento,
pela Administrao ou pelo Judicirio, da ilegalidade do ato.
Mas, a doutrina correta entendemos estar expressa nas lies de
Celso Antonio Bandeira de Mello,9 quando prefere o termo invalidade
antitese de validade e invalidao, para se referir a defeito jurdico
e no problema de inconvenincia, de mrito, do ato. Um ato ajustado
aos termos legais vlido perante o Direito, ainda que seja
considerado inconveniente por quem pretenda suprimi-lo. No se deve,
pois, chamar de invalidao retirada por motivo de mrito.
Por isso indesejvel a terminologia de alguns autores, inclusive
nacionais, que usam a voz invalidao para referir a retirada tanto
por motivo de ilegitimidade quanto por motivo de inconvenincia ou
inoportunidade (revogao).
Pode-se conceituar invalidao do seguinte modo: Invalidao a
supresso, com efeito retroativo, de um ato administrativo ou da
relao jurdica dele nascida, por haverem sido produzidos em
desconformidade com a ordem jurdica.
O esclio do notvel administrativista traz luzes ao tema que
versamos, justamente porque o procedimento administrativo est, todo
ele, virado produo de um ato final e conclusivo, que diga da
validade de ato originrio, que tanto pode ser o de simples exigncia
de tributo, como tambm de penalidade ou mesmo da notificao de
ambos.
7. Algumas reflexes e subseqentes sugestes a propsito do
procedimento
9 Celso Antonio Bandeira de Mello. Elementos de Direito
Administrativo, Ed. Revista dos Tribunais, p. 87-8.
-
31
administrativo tributrio
a) O procedimento administrativo tributrio no se confunde, j
vimos, com o processo judicial tributrio. Assente esta premissa, no
nos parece recomendvel a adoo de institutos e formas inerentes ao
campo da relao processual, vale dizer, tudo aquilo que diga
respeito ao processo, enquanto processo. No queremos afastar a
possibilidade de enriquecer o procedimento administrativo tributrio
com figuras hauridas no Direito Processual. Todavia, estamos em
crer que o legislador deva polarizar suas atenes nas entidades
tcnicas que asseguram a marcha do procedimento judicial. para
traslad-las ao segmento da discusso que se desdobra perante as vias
do Poder Executivo. A diferena surge de certa forma sutil. De nada
serve para animar o procedimento administrativo tributrio, por
exemplo, chamar a deciso de primeiro grau de sentena, utilizando,
com isso, terminologia do Processo Judicial. A sentena uma
instituio processual que revela a prestao jurisdicional do Estado,
na sua primeira manifestao. Por outro lado, frmulas tcnicas como a
perempo. a precluso, a contagem dos prazos, assumem feio de
operatividade e praticidade, quando transportadas para o plano do
procedimento administrativo tributrio. Este o primeiro ponto.
b) Agilizar o procedimento com a estipulao de prazos definidos e
obrigatrios, para ambas as partes.
Reside a um fator de equilbrio procedimental que no vem sendo
observado nos procedimentos conhecidos, quer no plano federal, como
no estadual ou municipal. Traduz um imperativo do contraditrio,
sombra do princpio da igualdade. Se tanto a Administrao, quanto o
particular perseguem a verdade material, o fenmeno jurdico
subjacente, surpreendido na sua plenitude, j que o interesse
precpuo a cabal aplicao do direito objetivo, no se h de compreender
que os prazos fluam em detrimento exclusivo do administrado,
-
32
compelindo-o a celebrar certos atos, sob pena de v-los
comprometidos pelo decurso do tempo. Se mal que em homenagem
supremacia do interesse pblico sobre o do particular se assinem
prazos maiores para o cumprimento dos atos da Administrao, ainda
assim inadmissvel a liberdade plena e irrefletida, a consagrao da
inconseqncia, da tolerncia sem peias e da absoluta falta de
parmetros para os expedientes, as providncias e os prprios atos
decisrios que ho de ser exarados pela autoridade competente. Urge a
consignao de prazos para a Administrao, como forma de atinncia a
esses princpios e, tambm, como imposio inarredvel dos mais
elementares princpios de segurana na vida das relaes jurdicas.
c) Assume propores de inteira oportunidade a exigncia do ttulo
de bacharel em Direito para que o representante da Fazenda, que se
vai manifestar sobre a validade ou invalidade do ato, possa faz-lo
de maneira especfica e responsvel.
A funo de aplicar a lei aos casos concretos, solucionando
conflitos de interesses, seja de natureza judicial ou mesmo
administrativa, pressupe conhecimento profundo, no apenas do corpo
de regras que disciplinam a matria, mas, fundamentalmente, dos
grandes princpios de Direito Constitucional, Administrativo, Civil,
Comercial, Tributrio, sem falar, claro, nas diretrizes que a Teoria
Geral do Direito e a Filosofia do Direito estabelecem, e que do
cunho de cientificidade ao mtodo jurdico.
A alegao de que os assuntos sobre os quais decidem os rgos
administrativos, singulares ou coletivos, tm subjacncia econmica ou
contbil, nada traz em detrimento daquela idia, porquanto toda norma
jurdica disciplina um segmento da realidade social, do que se
poderia supor que a aplicao do Direito teria como antecedente lgico
o conhecimento de todos os fenmenos sociais, o que absurdo.
-
33
Sobremais, aceitando-se como vlido o argumento, haveramos de
negar competncia intelectual aos Juzes Federais e, bem assim, aos
Ministros do Tribunal Federal de Recursos e do Supremo, para o
julgamento de questes tributrias, raciocnio que envolveria
inusitado despropsito.
Acresce repontar que a estipulao guarda coerncia com aqueles
preceitos que aconselham se utilize o Cdigo de Processo Civil, como
legislao supletiva. Ressalta mais pura evidncia que se espera do
julgador conhecimentos especializados de Direito Processual Civil,
matria das mais tcnicas e difceis de quantas h no universo do saber
jurdico.
O requisito da formao jurdica especializada deve ser observado
para todas as funes de direo do procedimento e, mui especialmente,
para aquelas que expressam a manifestao de vontade da
Administrao.
d) No que toca composio dos tribunais administrativos, algumas
ponderaes devem ser feitas.
Conceber-se rgo dotado de certa autonomia e independncia, que se
possa colocar, dentro do possvel, salvo de presses e influncias,
assim das Fazendas, que das entidades de classe, no se compagina
com as funes temporrias que sero exercidas por seus membros, mais
precisamente no que diz com o funcionrio da Fazenda.
ineludvel que o representante da Fazenda Pblica, Federal,
Estadual ou Municipal, investido das elevadas atribuies de membro
de Conselhos ou Tribunais administrativos, ficar sujeito ao Juzo de
convenincia que sobre ele, periodicamente, manifestar a Administrao
Pblica, tendo em vista a renovao de seu mandato. Alm disso, na
hipteses de no ser reconduzido, ver-se- rebaixado s funes que
exercera outrora, circunstncia que tambm no se coaduna com a
existncia de rgo que desfrute de certa autonomia e
independncia.
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Medida de grande efeito, nesse sentido, seria o provimento, por
concurso de provas e ttulos, entre os funcionrios que exeram as
atribuies de julgador de primeira instncia (j com formao
especializada), posta a experincia que se presume hajam adquirido,
no desempenho de seus misteres.
A composio das Cortes Administrativas, desse modo, ficaria
estruturada em nvel de estabilidade dos membros da Fazenda, que no
teriam mandato determinado, disputadas as vagas porventura
existentes, entre os funcionrios julgadores de primeiro grau,
consoante provas e ttulos.
e) O captulo das nulidades merece considerao adequada.
Se correto afirmar-se que o procedimento no pode ficar
prejudicado por irregularidades de somenos, irrelevantes no
contexto genrico da controvrsia, no de menor acerto o enunciado de
que certos atos h, cuja perfeio jurdica deve ser observada, a
qualquer ttulo, ainda que a falha no venha em detrimento do direito
de defesa do sujeito passivo. A orientao traduz mera aplicao da
teoria geral dos atos administrativos e do controle de sua
legalidade.
Falando pela via ordinria: deciso de primeiro grau, em que a
autoridade competente mantm a exigncia do gravame e impe penalidade
pecuniria, sem, contudo, tipificar a infrao, descrevendo-a ou
aludindo ao dispositivo de lei transgredido. Mesmo que o
interessado oferea razes de recurso voluntrio, em prazo oportuno,
demonstrando conhecer os fundamentos jurdicos da deciso,
contingncia que exibe no ter havido preterio do direito de defesa,
ainda assim de decretar-se a nulidade do procedimento, por virtude
da inexistncia jurdica do ato. Faltou-lhe requisito de essncia, o
motivo de sua celebrao.
Vem a ponto notar, a bem do rigor, que a indigitada nulidade no
seria do ato, mas do procedimento que se desenvolveu ulteriormente
a ele, porquanto jamais existiu, juridicamente, como ato
administrativo, a mingua de um dos pressupostos de sua tecitura
intrnseca.
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Os atos administrativos, primordialmente os vinculados, devem
hospedar o motivo ou causa de sua celebrao. Caso contrrio ser
impossvel a verificao de sua legalidade e isso, sabemos, no pode
ocorrer com os atos de competncia vinculada.
A rigidez diria com poucos atos do procedimento: auto de infrao,
notificao de lanamento, deciso de primeiro grau e outras peas de
grande momento da lide.
O tema das nulidades, tal qual concebido nos textos atuais, est
em flagrante desalinho com a tradicional teoria dos atos
administrativos, fazendo prevalecer o procedimento em desfavor de
atos de importncia cabedal para a dilucidao do conflito.
De fora parte os argumentos expostos, que entenderiam mais com
ditames de Direito Administrativo, cumpre agregar que a Teoria do
Direito Processual Civil igualmente consagra hipteses de
imprestabilidade de atos jurisdicionais, por ausncia de certos
pressupostos, desde a inpcia de peties que no trazem o supedneo
legal, at a inexistncia ou, em alguns casos, nulidade absoluta de
sentenas que se edificaram sem elemento de essncia.
Os diplomas normativos que venham a disciplinar essa matria
deveriam expressar, se no quiserem distinguir os planos da
existncia e da validade dos atos administrativos, ao menos
estabelecer como inquinados de nulidade absoluta todos aqueles que
forem erigidos sem observncia de elemento estrutural, segundo a
doutrina acolhida pelos bons autores de Direito Administrativo.